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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO SOCIAL CLAUDIANA LIMA DE SOUSA ANÁLISE SOBRE AS MOTIVAÇÔES QUE LEVARAM OS ADOLESCENTES ATENDIDOS PELA ONG PEQUENO NAZARENO A MORAR NAS RUAS DE FORTALEZA. FORTALEZA- CEARÁ 2013

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

CLAUDIANA LIMA DE SOUSA

ANÁLISE SOBRE AS MOTIVAÇÔES QUE LEVARAM OS ADOLESCENTES ATENDIDOS PELA ONG PEQUENO NAZARENO A

MORAR NAS RUAS DE FORTALEZA.

FORTALEZA- CEARÁ

2013

Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274

S725a Sousa, Claudiana Lima de.

Análise sobre as motivações que levaram os adolescentes

atendidos pela ONG Pequeno Nazareno a morar nas ruas de

Fortaleza / Claudiana Lima de Sousa. Fortaleza – 2013.

96f. Orientador: Prof.ª Ms. Valney Rocha Maciel.

Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.

1. Adolescência. 2. Rua. 3. Institucionalização. I. Maciel,

Valney Rocha. II. Título

CDU 364(813.1)

CLAUDIANA LIMA DE SOUSA

ANÁLISE SOBRE AS MOTIVAÇÔES QUE LEVARAM OS ADOLESCENTES ATENDIDOS PELA ONG PEQUENO NAZARENO A

MORAR NAS RUAS DE FORTALEZA.

Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, outorgado pela Faculdade Cearense - FAC como requisito parcial para a obtenção de grau de Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Ms. Valney Rocha Maciel.

FORTALEZA- CEARÁ

2013

CLAUDIANA LIMA DE SOUSA

ANÁLISE SOBRE AS MOTIVAÇÔES QUE LEVARAM OS ADOLESCENTES ATENDIDOS PELA ONG PEQUENO NAZARENO A

MORAR NAS RUAS DE FORTALEZA.

Monografia apresentada ao curso de graduação em Serviço Social do Centro de Ensino Superior do Ceará, outorgado pela Faculdade Cearense - FAC como requisito parcial para a obtenção de grau de Bacharel em Serviço Social.

Data da aprovação:____/____/____

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Profª. Ms. Valney Rocha Maciel

(Orientadora)

_______________________________________________ Profª. Ms. Rúbia Cristina Martins Gonçalves

_______________________________________________ Assistente Social e Ms. Rebeca Torres Alves Costa

Ao meu grande Deus por ter me dado

forças para chegar até aqui, sem ele nada

teria sentido. A toda minha família, ao

meu esposo e amigos. Em especial a

minha mãe, mulher forte e admirável.

DEDICO

AGRADECIMENTOS

Esse espaço reservado para os agradecimentos se torna pequeno diante da

minha gratidão á todos que, não apenas nesses quatro anos de faculdade, mas

durante toda a minha caminhada estiveram comigo de alguma forma.

Em primeiro lugar, agradeço a Deus, o autor da minha vida, aquele que

esteve comigo desde o ventre da minha mãe e nunca me abandonou, aquele que

me fez superar todas as dificuldades para chegar até aqui, que enxugou minhas

lágrimas quando eu pensava que não ia conseguir que me fez acreditar nos meus

sonhos. Deus, você me mostrou que nada é impossível àquele que crer.

A todos que fazem parte da minha família, pois sei o quanto vocês se

alegram com a minha alegria e também fazem parte dessa conquista. Vocês são a

minha base. Em especial, venho agradecer aos meus pais, Marcos Barros e

Lucimar Lima, por sempre me incentivar e não me deixar desistir nunca. Agradeço

infinitamente a minha mãe por cuidar de mim, dando sempre o seu melhor mesmo

quando não podia. Você é a peça fundamental em minha vida, meu exemplo em

tudo. Amo você minha mãe!

Ao meu irmão, Igor Lima, por sempre me alegrar com seu lindo sorriso. A sua

alegria foi essencial em meio a tantos momentos difíceis, isso você tem de sobra.

A Terezinha Lima, minha amada avó (in memorian). Não poderia deixar de

agradecer a Deus nesse momento pelo o que ela foi nessa terra: uma grande mulher

de Deus, cheia de fé e amor. Você também foi uma das pessoas que sempre me

incentivou e orou para que eu chegasse até aqui.

Ao meu amado esposo, amigo e companheiro fiel, Jefferson Gomes, pois

esteve comigo literalmente desde o início dessa longa caminhada, sempre me

incentivando, agüentando as minhas reclamações, choros e também sempre

disposto a dar o seu melhor a mim. Junto comigo, passou noites acordado,

esperando eu terminar a minha monografia, pois não queria me deixar sozinha em

nenhum momento. A sua amizade e companheirismo foram essenciais para a

realização deste trabalho.

A todos os professores do curso de Serviço Social, os quais contribuíram

para minha formação, foram conhecimentos para toda a vida. Cada um teve sua

importância, sua forma de ensinar, alguns mais sérios, outros não sossegavam

enquanto não tirassem um sorriso do nosso rosto, mas todos foram fundamentais

para que eu tivesse uma formação crítica e ética.

A minha querida orientadora Valney Rocha, pelo o grande carinho, dedicação

e tranqüilidade durante estes momentos no qual muitas vezes nos encontramos

desesperadas. Então ela vinha com aquele sorriso maravilhoso, me abraçava e me

acalmava. Obrigada por me transmitir seus conhecimentos tão valiosos e pela honra

de tê-la como minha professora e orientadora. Foi simplesmente Magnífico!

A todos da turma CSS081 2013.2, foram anos de muito aprendizado,

alegrias, encontros, seminários, confraternizações, choros, provas, trabalhos,

apresentações, etc. Mas o bom é podemos olhar para trás e rir de tudo isso, pois

apesar de termos sofrido um pouquinho, foram momentos que guardaremos para

sempre.

A tod@s os meus amigos além dos muros da faculdade, com vocês o

caminho foi menos doloroso, as lágrimas rapidamente se transformavam em risos,

os desafios eram prazerosos, os trabalhos eram apenas um motivo para passarmos

o dia juntos, os estresses em equipe não duravam dois minutos, pois a amizade era

muito maior que isso. São vocês, Jessica Feitosa, Sherida Costa, Lygia

Negreiros, Paola Abreu, Gisele Castro, Emily Benevides, Luciane Cosme,

Rodrigo Alves e Ricardo Richard.

A Maíra Rodrigues, Janaína Valentim e Lucilene Pinheiro, pelo o

companheirismo e amizade. Foi um prazer estagiar com vocês, pois éramos mais

que colegas, formávamos uma equipe.

A Gizela Castro por me acompanhar desde as minhas primeiras conquistas.

Contribuiu muito para que eu pudesse chegar aqui, esteve ao meu lado em

momentos difíceis com os seus conselhos “duros” e ao mesmo tempo cheios de

carinho (só ela sabe fazer isso), obrigada por sua compreensão, você sabe o quanto

é especial para mim.

A minha banca Rúbia Gonçalves, por me acompanhar nesse processo desde

o primeiro semestre do curso, levarei a sua alegria, sua ética profissional e os

conhecimentos que adquiri durante esses anos. Obrigada por ter aceitado o convite

em participar da banca, foi um prazer imenso.

A Rebeca Torres que também fez parte da banca e foi minha supervisora de

estágio. Não tenho palavras para agradecer a sua dedicação, pois com você me

sentia cuidada, profissionalmente falando, pois fazia questão de nos ensinar o seu

melhor, nos fazia passar por experiências incríveis dentro do campo de estágio.

Posso dizer que valeu a pena todo o sacrifício que eu fazia para estar ao seu lado

aprendendo sempre um pouco mais.

A tod@s os meus amigos que de alguma forma me ajudaram durante esse

percurso, seja através de palavras, mensagens, oração, etc. Os amigos alegram

nossas vidas!

A todos os adolescentes pesquisados, pela contribuição neste trabalho

através das suas histórias de vida. Vocês são guerreiros!

Menino de Rua – Patativa do Assaré

Menino de Rua, garoto indigente

Infanto Carente,

Não sabe onde vai

Menino de Rua, assim maltrapilho

De quem tu és filho

Onde anda o teu pai?

Tu vagas incerto não achas abrigo

Exposto ao perigo

De um drama de horror

É sobre a sarjeta que dormes teu

sono,

No grande abandono

Não tens protetor

Meu Deus! Que tristeza! Que vida esta

tua

Menino de Rua,

Tu andas em vão

Ninguém te conhece, nem sabe o teu

nome

Com frio e com fome

Sem roupa e sem pão

Ao léu do desprezo dormes ao relento

O teu sofrimento

Não posso julgar,

Ninguém te auxilia, ninguém te

consola,

Cadê tua escola,

Teus pais, teu lar?

Seguindo constante teu duro caminho

Tu vives sozinho

Não és de ninguém

Às vezes pensando na vida que levas

Te ocultas nas trevas

Com medo de alguém

Assim continuas de noite e de dia

Não tens alegria

Não cantas nem ri

No caos de incerteza que o seu mundo

encerra

Os grandes da terra

Não zelam por ti

Teus olhos demonstram a dor, a

tristeza,

Miséria, pobreza

E cruéis privações

E enquanto estas dores tu vives

pensando,

Vão ricos roubando

Milhões e milhões

Garoto eu desejo que em vez deste

inferno

Tu tenhas caderno

Também professor

Menino de Rua de ti não me esqueço

E aqui te ofereço

Meu canto de dor

RESUMO

A presente pesquisa tem como objetivo geral compreender as motivações que levaram os adolescentes institucionalizados na ONG o Pequeno Nazareno a morar nas ruas de Fortaleza e como objetivos específicos: traçar o perfil dos adolescentes, indagar o que significa ser adolescente, conhecer o significado de rua para eles, conhecer as mudanças ocorridas em relação à família após a institucionalização e saber suas expectativas quanto ao futuro. Para atingir estes objetivos, foi feita uma acometida contextualizando a adolescência baseando-se em autores diversos, os quais conceituam e caracterizam a categoria adolescência e também apresentamos esse conceito segundo o que os entrevistados pensam sobre essa fase da vida. Deste modo, abordamos também aspectos sobre o significado de rua, como era a rotina dos adolescentes na rua, trato da questão da institucionalização e também busco conhecer os desejos e sonhos dos sujeitos entrevistados. Vale ressaltar que este trabalho é de pesquisa qualitativa, formada de uma pesquisa bibliográfica, documental e de campo. As categorias que foram utilizadas são: Adolescência, rua e institucionalização. Usamos como técnica a observação simples e entrevista semi-estruturada a qual foi realizada com onze adolescentes institucionalizados na ONG o Pequeno Nazareno. Os dados foram coletados através da técnica de análise de conteúdo, procurando assim, organizá-las por categoria. Desse modo, após as análises podemos perceber e compreender as principais motivações que levaram os adolescentes pesquisados a enfrentar o universo das ruas.

Palavras-chave: Adolescência, Rua e Institucionalização.

ABSTRACT

This research has the overall objective to understand the motivations that led adolescents institutionalized in the ONG Small Nazarene to live on the streets of Fortaleza and specific objectives: Define the profile of adolescents, asking what it means to be a teenager, know the meaning of the street for them to know the changes in relation to the family after the institutionalization and know their expectations of the future. To achieve these objective, was made an ill contextualizing adolescence based on several authors who conceptualize and characterize adolescence category and also introduce this concept into what respondents think about this stage of life. Thus, we are also addressing aspects about the meaning of the street, as was the routine of teenagers on the street, dealing with such issues and seek institutionalization also meet the desires and dreams of the interviewees. It is noteworthy that this work and qualitative research, consisting of a bibliographic, documentary and field research. The categories that were used are: adolescence, street and institutionalization. We use the technique as simple observation and semi-structured interview which was conducted with eleven adolescents institutionalized in the ONG Small Nazarene. Data were collected using the technique of content analysis, attempting to organize them by category. Thus, after the analysis we can see and understand the main motivations that led the teens surveyed the universe to face the streets.

Keywords: Adolescence, Street and Institutionalization.

LISTA DE ABREVIATURAS

CAPS AD – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas.

CAPS I – Centro de Atenção Psicossocial Infantil (Juvenil).

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.

FUNABEM-Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor.

LENAD – Levantamento Nacional de Álcool e Drogas.

MNMMR - Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua.

ONG – Organização Não Governamental.

SAM - Serviço de Assistência ao Menor.

SDH/PR – Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

SECULT - Secretaria de Cultura do Estado do Ceará.

% - Por cento.

LISTA DE FIGURA

FIGURA 1 - Visão aérea do sítio Pequeno Nazareno. ---------------------------- 65

LISTA DE QUADRO

QUADRO 1 - Distribuição por motivo de ida para as ruas---------------------------42

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 16

1 - ADOLESCÊNCIA ........................................................................................................... 20

1.1 – Breve contexto sobre adolescente em situação de rua . ............................................20

1.2 - A adolescência e suas particularidades .................................................................... 25

1.3 – A importancia da família na adolescência ................................................................ 30

1.4 – A adolescência e a pobreza ..................................................................................... 33

2. O TRAJETO DA RUA E A INSTITUCIONALIZAÇÃO ..................................................... 39

2.1 – O caminho da rua começa a ser trilhado ................................................................. 39

2.1.1 – Entre a casa e a rua ............................................................................................. 44

2.1.2 – As drogas, a rua e os seus impactos .................................................................... 47

2.2 – Os desafios e as mudanças no processo de institucionalização no Brasil ............... 50

3. DESCOBRINDO NOVOS CAMINHOS: A TRAJETÓRIA DA PESQUISA ....................... 57

3.1. Construção da pesquisa ........................................................................................... 57

3.2 Adentrando o desconhecido ....................................................................................... 59

3.3 Conhecendo a instituição ........................................................................................... 63

3.4 Quem são esses adolescentes? ................................................................................. 66

3.5 Relatos e análises ...................................................................................................... 73

3.5.1 Percepção de adolescência para os entrevistados .................................................. 73

3.5.2 A trajetória de casa para a rua ................................................................................. 75

3.5.3 A rotina, a rua e seu significado na visão dos adolescentes .................................... 78

3.5.4 As mudanças ocorridas em relação a família após a institucionalização ................. 79

3.5.5 E o que eles esperam do futuro? ............................................................................. 82

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 85

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 88

APÊNDICE .......................................................................................................................... 92

16

INTRODUÇÃO

A temática adolescente em situação de rua tem levantado diversas

discussões e têm sido tema de muitos debates por meio de profissionais da

área, estudantes, entre outros. Cada dia mais é perceptível o aumento de

crianças e adolescentes nas ruas, não apenas na cidade de Fortaleza, mas em

todo o Brasil. Diante do exposto, trazemos uma reportagem transmitida na

Rede Globo, através do programa Fantástico1 de Marcelo Canelas onde é

apresentada e retratada essa questão que incomoda a muitos, mas

infelizmente o que se vê é apenas descaso e negligência diante de uma

realidade gritante, pois dizem que eles são o futuro do nosso país. Mas como,

se eles são esquecidos e invisíveis diante da sociedade e do Estado?

“A ONU já falou em cinco milhões. O IBGE nunca contou. O fato é que o

número de meninos e meninas de rua ainda é um mistério” (CANELAS, 2013).

Sendo assim, o projeto “Criança não é de rua” aderiu a uma pesquisa

qualitativa, realizada por educadores sociais. Nessa pesquisa, 565 crianças e

adolescentes foram ouvidos em 10 capitais, trazendo não apenas a

quantidade, mas o perfil desses jovens e o que eles pensam.

Segundo a reportagem, no ano de 2011 o governo federal pagou R$ 1,5

milhões para um instituto de pesquisa poder contá-los, mas na cidade de

Maranhão “só acharam 23 meninos. E o número apurado no Brasil inteiro,

23.973, caiu em descrédito”. Portanto, percebe-se que a questão não será

resolvida ou mesmo amenizada apenas por meio de dados estatísticos, mas

sim através de uma intervenção que o governo precisa realizar frente a essa

problemática tão complexa.

1 Disponível em: g1. globo.com/fantástico/noticia2013/10/pesquisa-mostra-que-esmola-financia-

o-uso-de-drogas-das-crianças-de-rua.html. Acesso em 24/10/2013, às 13 h.

17

Diante disso, essa pesquisa tem como objetivo geral compreender as

motivações que levaram os adolescentes institucionalizados na ONG o

Pequeno Nazareno a morar nas ruas de Fortaleza. Destacamos como objetivos

específicos: traçar o perfil dos adolescentes, indagar o que significa ser

adolescente, conhecer o significado de rua para eles, conhecer as mudanças

ocorridas em relação à família após a institucionalização e saber suas

expectativas quanto ao futuro.

O meu2 interesse pela a temática surgiu em uma visita institucional

propiciada pela disciplina de Política Social, promovida no 3º semestre do

curso de Serviço Social da Faculdade Cearense (FAC). O trabalho era em

grupo e precisávamos procurar uma instituição que trabalhasse com crianças e

adolescentes, assim como os outros do grupo, eu também fui para internet

procurar algum local onde pudéssemos realizar essa visita. Foi justamente

quando encontrei a ONG o Pequeno Nazareno. Logo me encantei com as fotos

do local e em seguida, mostrei ao restante do grupo e todos concordaram em

realizar a pesquisa no Pequeno Nazareno. Foi possível o acesso aos

adolescentes, onde se teve a oportunidade de ouvi-los sobre suas experiências

nas ruas e, principalmente, sobre os motivos que os distanciaram do vínculo

familiar.

Desde então, tive um apego e um grande carinho pelas leituras que

traziam à tona as discussões referentes a adolescentes em situação de rua,

assim como o meu olhar também foi aguçado diante da realidade que já existia,

mas que infelizmente não dava a importância devida, era como se eu os

percebesse, mas não os enxergasse. O meu olhar era o mesmo do censo

comum, tinha medo, às vezes dizia: “Eles estão nas ruas porque querem.

Deviam estar na escola”. Em fim, de certa forma julgava-os, apesar de me

sentir mal quando os via no meio dos carros, no sol, pedindo a um e a outro,

era uma confusão de sentimentos além de todos esses conceitos errôneos já

citados anteriormente.

2Utilizei em alguns pontos da introdução a 1ª pessoa por se tratar da minha justificativa

pessoal.

18

Depois dessa visita e a aproximação com os adolescentes do Sítio O

Pequeno Nazareno, tive a oportunidade de ouvir suas histórias, seu modo de

vida, além de conhecer o sítio com eles, brincar, em fim, quebrar o conceito

que muitos de nós temos em relação a eles. Entre as conversas e brincadeiras

minha paixão por eles silenciosamente acendeu e voltei para casa refletindo

em todos os poucos e bons momentos que vivenciei com aqueles que seriam

os sujeitos da minha pesquisa após alguns anos.

O tempo foi passando e cada dia tinha mais certeza que essa

problemática seria tema da minha monografia, tanto que desde o meu projeto

de pesquisa trato dessa temática e em nenhum momento me interessei em

mudar, pois já estava decidida, apesar de ainda ser muito cedo para definir a

temática do Trabalho de Conclusão de Curso. Por fim, Chegou o momento do

Estágio Obrigatório e o meu pensamento era estagiar em alguma instituição

que me aproximasse da temática pretendida, o que não foi possível. Por motivo

de força maior, o meu estágio foi realizado dois semestres no Centro de

Atenção Psicossocial Álcool e Droga (CAPS AD) e um semestre no CAPS

Infantil.

Foram experiências maravilhosas que contribuíram bastante para o meu

amadurecimento acadêmico e enquanto futura Assistente Social, mas, apenas

para enfatizar, a experiência de estágio no campo citado acima, mesmo que

tenha sido enriquecedora, não me fez perder o interesse e nem a paixão por

esse tema, pois o mesmo já estava fazendo parte do meu cotidiano através de

leituras envolvendo esse tema, reportagens em jornais regionais e programas

de televisão, além das inúmeras vezes em que eu tentava me aproximar

desses (as) meninos (as) nos terminais, pelas calçadas e nas praças. Na

maioria das vezes apenas para observá-los.

Vale ressaltar a importância dessa temática para o Serviço Social, pois

esse profissional está diretamente ligado às expressões da questão social,

enquanto mediador entre a sociedade e o Estado através das políticas públicas

e intervindo diretamente no processo de resgatar o vínculo familiar,

fortalecendo os laços que foram rompidos por diversos motivos. Além da

19

necessidade de levar cada vez mais essas discussões para o espaço

acadêmico. Portanto, o interesse por essa temática perdurou até o 8º semestre,

onde finalmente iniciei a construção de uma pesquisa que resultou na produção

da minha monografia.

O presente trabalho está divido em três capítulos. No primeiro, intitulado

Adolescência, iremos contextualizar os adolescentes em situação de rua

trazendo fatos que marcaram o início dessa problemática e também salientar

as mudanças ocorridas a partir da aprovação do Estatuto da Criança e do

Adolescente de 1990. Em seguida, abordaremos o conceito de adolescência,

suas características físicas, psicológicas e especificaremos algumas de suas

peculiaridades advindas com essa fase. Os principais autores utilizados foram

Bursztyn (Org.) (2003), Pinheiro (2006), Morais; Silva; Koller (Org.) (2010),

Calligaris (2000) e Zagury (2009).

No capítulo seguinte que tem como título O trajeto da rua e suas

estratégias abordaremos a questão da rua, o que ela significa como é trilhar

esse caminho da rua e quais as principais motivações encontradas para que os

adolescentes deixem suas casas e percorram o caminho da rua. Faremos

também uma breve abordagem diferenciando os espaços da casa e da rua,

além disso, discutiremos brevemente se existe alguma ligação entre a rua e o

uso de drogas. Os autores utilizados foram Rizzini (2003,2004 e 2007), Escorel

(1999), Da Matta (1997) e Nascimento (1997).

No terceiro capítulo que tem como título Descobrindo novos

caminhos: a trajetória da pesquisa trataremos do percurso metodológico.

Iremos expor a pesquisa de campo realizada na ONG o Pequeno Nazareno,

situada em Maranguape-Ce, descreveremos o cenário detalhado, as

dificuldades encontradas no decorrer do presente trabalho, o perfil dos sujeitos,

os relatos e análises. Para a realização da pesquisa usamos como técnica a

entrevista semiestruturada. Os autores utilizados neste capítulo foram Gil

(2011), Minayo (2007) e Goldenberg (2004).

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1 - ADOLESCÊNCIA

1.1. Breve contexto sobre adolescente em situação de rua

“Há em cada adolescente um mundo encoberto, um almirante e um sol de outubro”. Machado de Assis

3

Os adolescentes em situação de rua na cidade de Fortaleza são

personagens marcantes da exclusão social e da violação de seus direitos. Para

onde se olha percebe-se meninos e meninas espalhados pelas grandes

avenidas, nos sinais, terminais e debaixo de viadutos. Todos os dias eles lutam

em prol de sua sobrevivência, seja pedindo, limpando carros, vendendo balas

dentro de ônibus e, até mesmo, se prostituindo ou roubando.

Segundo Bursztyn

[...] Os que moram nas ruas, têm por trás de sua situação uma longa história e causas sociais determinadas que se ligam a questões econômicas , de migração, de desagregação familiar, de desemprego, de violência urbana, de drogadição, de alcoolismo, entre outros. (BURSZTYN, 2000, p.89).

De maneira abrangente, geralmente a sociedade pondera as pessoas

que estão nas ruas e coloca nelas um rótulo apenas do que essa sociedade

ouve falar ou pela própria aparência, mas não se preocupa em conhecer seus

relatos de vida, seus lamentos, suas perdas e aflições.

De acordo com uma reportagem de Lavor do Jornal Diário do Nordeste4

publicado no dia 12 de outubro de 2011, dos 191 meninos e meninas

3 Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista,

romancista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839. Disponível em: http://www.releituras.com/machadodeassis_bio.asp. 4 Disponível em: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=10080059. Acesso em:

12/10/11.

21

pesquisados em Fortaleza, exatos 44% estão na rua por conta do ambiente

familiar desconfortável, ou seja, violência e até mesmo condições sub-humanas

de moradia. A pesquisa também mostrou que dos 191 pesquisados, 33,9%

estão no Centro da cidade, 46,9% em terminais, 15,2% na orla e 4% na

comunidade. Sabe-se, segundo os dados da Secretaria de Direitos Humanos

da Presidência da República (SDH/PR)5,que ao todo são 1.575 crianças e

adolescentes em situação de rua em Fortaleza. A violação de direitos as quais

estes jovens estão expostos consiste exatamente na própria situação de

moradia de rua, uso de drogas, exploração do trabalho infantil e sexual.

(DIÁRIO DO NORDESTE, 2011).

Diante desse cenário, destacamos a industrialização como um dos

fatores determinantes dessa problemática. Segundo Pinheiro (2006), a partir

das décadas de 1930 e 1940 ocorreu uma grande migração do campo para a

cidade, onde parte dessa população não se integrava ao sistema social, nem

ao mercado de trabalho. As grandes cidades ficaram aglomeradas de famílias

sem ter para onde ir, sem alimentação e proteção básica. Em conseqüência

disso, a referida autora destaca o crescimento da desigualdade social,

incidindo sobre as condições de vida da classe trabalhadora, trazendo com isso

um aumento significativo da disparidade social.

Os adolescentes também vivenciaram a conjuntura de vulnerabilidade

social desde o início do processo de industrialização brasileira, sendo vítimas

da ausência de políticas sociais públicas. (PINHEIRO, 2006). Assim, a sua

ocupação nas ruas, passou a ser tratada como um incômodo pelo Estado e

uma ameaça à sociedade.

Diante desse contexto, o Estado assume uma postura punitiva baseada

no Código de Menores da América Latina que entrou em vigor em 1927, e a

criação do SAM (Serviço de Assistência ao Menor) em 1940, onde se fazia o

atendimento de “menores” de 18 anos abandonados e delinqüentes.

(KRAMER, 1992; OSTERNE, 1993 apud PINHEIRO, 2006). A autora ressalta,

5 Matéria publicada no Jornal o povo, crianças, infância violada. Fortaleza, quinta-feira, dia 13 de

outubro de 2011.

22

ainda, que esse aparato legal se resguardou do isolamento e da repressão de

crianças e adolescentes, destituindo-os quase sempre do convívio social, pois

representavam uma perturbação para o bem estar da sociedade.

Nessa concepção, a autora afirma que o Código de Menores tinha um

caráter discriminatório e era associado à pobreza e à delinquência, era voltado

para crianças e adolescentes que não tinham condições de sobreviver, ou seja,

carentes, “infratores” ou abandonados. A forma de proteger era a repreensão

como instrumento de correção e o isolamento como cerceamento do convívio

social. O objetivo do isolamento era para que pudessem se reeducar e voltar

ao convívio social, porém não deram bons resultados. Em 1964 no período do

regime militar o SAM foi substituído pela FUNABEM (Fundação Nacional do

Bem-Estar do Menor) a fim de retificar as graves distorções do antigo SAM,

onde era fortemente associado à violência do adolescente como uma forma de

causar perigo á sociedade. (OSTERNE, 1995 apud PINHEIRO, 2006).

Contudo, em 1979 o código de menores teve algumas alterações, onde

passou de instrumento de proteção e vigilância, em que os adolescentes eram

vítimas da omissão e transgressão da família em seus direitos básicos para

instrumento de controle social, nesse caso não era apenas a transgressão da

família, mas também do Estado e da sociedade. (PINHEIRO, 2006).

Então, segundo (RIZZINI et al, 2003), nos meados dos anos 1980, as

crianças e adolescentes em vulnerabilidade já estavam marcados pela

desigualdade social, marcas essas que se alastram até os dias de hoje. Foi

justamente nesse período que eles levaram o título “geração da rua”, no qual

ficou mais conhecido como crianças e adolescentes em situação de rua. Vale

salientar, que em 1984 aconteceu o primeiro encontro do Movimento Nacional

de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR)6, o qual teve uma extrema

6Esse movimento deu início em 1982 e se estabeleceu como uma entidade civil em 1985, hoje

existe cinco sedes espalhadas pelas principais capitais do país. Este movimento não presta atendimento direto aos menores, mas busca movimentar os próprios menores, educadores de rua, instituições, enfim, todos os envolvidos com essa temática. Disponível em http://www.scielo.php?script=sciarttex&pid=s1414-98931988000100007 acesso em 06/10/2013.

23

importância e foi essencial para as conquistas futuras em assuntos

relacionados à garantia de leis.

Finalmente, em 1990 foi aprovado no Brasil, o Estatuto da Criança e do

Adolescente (ECA), resultado de uma série de mobilizações sociais,

substituindo o Código de Menores. Por sua vez, o ECA teve como principal

objetivo a proteção e os direitos de todas as crianças e adolescentes

independente de sua classe social, cor ou religião e o tratamento dado a essas

crianças e adolescentes como pessoas que necessitam de cuidados especiais,

possibilitando um desenvolvimento saudável. O ECA afirma em seu artigo 4º

que a responsabilidade que antes cabia apenas a família, agora é

responsabilidade da família, da sociedade e do Estado. (BRASIL, 1990).

Observa-se que com a criação do Estatuto da Criança e Adolescente, foi

garantida legalmente a proteção ampliada à criança e ao adolescente (Art. 1º,

ECA, 1990), todavia, na realidade, diversos desafios estão postos à efetivação

dessa conquista. É importante frisar que esses (as) meninos (as) em situação

de rua já têm seus direitos infringidos desde o momento que são cerceados do

direito à escola, a convivência familiar, habitação, ao lazer, entre outros, bem

como susceptíveis à violência. Contudo, apesar das mudanças ocorridas ao

longo dos anos a história desses adolescentes teve forte impacto econômico e,

principalmente, social. Como foi supracitado, o período da revolução industrial

acarretou diversos problemas sociais, trazendo para a sociedade o aumento da

desigualdade, pois os que migravam do campo para cidade, vinham à procura

de uma vida melhor, mas o sistema não inseriu todos, causando assim uma

afluência de pessoas sem ter para onde ir.

Para Nascimento

A problemática da criança e do adolescente é ainda [...] um grande desafio, político, econômico, social e cultural, para todas as sociedades, mesmo para aquelas que ingressam em um modo de desenvolvimento considerado hoje pós-moderno e que preconizam os direitos dos indivíduos e dos cidadãos: direito á liberdade de ser sujeito, de ir e de vir, de se expressar, direito á afirmação de sua própria identidade [...]. (NASCIMENTO, 1997, p.13).

24

Esse contexto reflete a realidade de muitos adolescentes que hoje

padecem com a pobreza e vivem à margem da sociedade, muito distante do

que está proposto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Ainda há muito a

se fazer, políticas públicas a serem criadas e projetos a serem aprovados, para

que esses adolescentes não sejam apenas recolhidos como era feito antes e

ainda nos dias de hoje, mas que aconteçam reformas nas políticas públicas e

seja amenizada a triste realidade dessa população de rua que está exposta

todos os dias a todo tipo de violência que a rua apresenta.

Sobre população de Rua Nascimento complementa:

Os mendigos dormindo nas ruas, em pleno dia, e as pessoas que vão as compras ou ao trabalho passando por cima deles ou evitando-os, é uma imagem emblemática. Os prostrados no solo não são visto como semelhantes, mas como bichos, espécies distintas. Estão sujos, cheiram mal e são feios... pedaços perdidos da humanidade. (NASCIMENTO2000, p. 56).

Essa é uma cena corriqueira nos dias de hoje nas grandes cidades.

Quantas vezes não nos deparamos com meninos e meninas de rua nos

lugares públicos? A sociedade e o Estado têm naturalizado esse

acontecimento, que só tem aumentado e trazido diversas discussões no âmbito

acadêmico. Mas apenas falar, não adianta, pois esses adolescentes que estão

nas ruas necessitam de ações urgentes e de políticas públicas que lhes

assistam.

Mas o autor Bursztyn (2000, p.19) salienta que “viver no meio da rua não

é um problema novo”. Isso é fruto das raízes históricas. Esse passado traz

consigo um estigma de que a maioria dos que se encontram em situação de

rua é marginal, a sociedade e o Estado os julgam pelo modo de se vestir, falar

e principalmente pelo próprio fato de estar nas ruas. Desta forma, concordamos

com a afirmação de Medeiros (1995) apud Câmara et al. (2000, s/p) quando ele

diz que:

Não podemos perder de vista que mesmo muitas vezes rotuladas pela sociedade como anti-sociais e

25

infratores, são crianças e adolescentes que se encontram em suas respectivas fases de crescimento e desenvolvimento, e também que apesar de permanecerem pelas ruas sujeitas aos riscos pessoais e sociais característicos do universo da rua, nem sempre compõem um grupo naturalmente predisposto ao crime e à marginalidade.

Essa afirmação nos faz refletir sobre o padrão que a sociedade impõe

sobre os indivíduos e com isso os que estão nas ruas são categorizados como

aqueles que causam perigo a quem quer que seja e não percebem que eles

também estão sujeitos aos perigos eminentes da rua. Não podemos afirmar

com veemência que todos eles não têm envolvimento com a violência e o

crime, mas podemos perceber o quanto esses adolescentes foram excluídos

da sociedade de forma geral, pois estão desvalidos nas ruas, sem orientação,

sem escola, sem o apoio do Estado e a única atitude que se tem é

simplesmente ignorar esse fato que aumenta cada dia mais.

Sendo assim, consideramos relevante uma discussão teórica sobre as

varias faces da adolescência e suas características, perpassando as mais

variadas mudanças que são típicas dessa fase.

1.2 - A adolescência e suas particularidades

Afinal, alguém pode explicar o que é ser um adolescente? O que ele

sente e pensa? Como definir essa fase crucial na vida de uma criança que está

prestes a enfrentar esse momento? São muitas indagações, pois sabemos que

essa etapa vem acompanhada de surpresas.

Falar de adolescência é sinônimo de mudanças. É uma fase

caracterizada por grandes transformações tanto físicas quanto psíquicas.

Segundo Calligaris (2000) “[...] ele não é mais nada, nem criança amada, nem

adulto reconhecido [...]” (pg. 24), ou seja, é um momento em que o adolescente

deixa de ser criança, mas não sabe o que realmente está se tornando, pois ele

26

ainda não é um adulto, isso se torna um momento muito conflituoso na cabeça

do adolescente, pois nem mesmo ele sabe quem é.

Geralmente, a adolescência para a maioria das pessoas é marcada pela

puberdade, ou seja, pelas mudanças ocorridas em seu corpo do jovem,

fazendo com que se torne cada vez mais parecido com um adulto, mas, ao

mesmo tempo, essas modificações não permitem que ele se torne uma pessoa

madura e independente.

Diante do exposto, Calligaris afirma que:

O começo da adolescência é facilmente observável, por se tratar da mudança fisiológica produzida pela puberdade. Trata-se, em outras palavras, de uma transformação substancial do corpo do jovem, que adquire as funções e os atributos do corpo adulto (CALLIGARIS, 2000, pg.19).

A palavra “adolescer”7 vem do latim e significa crescer, desenvolver-se.

Essa fase é o período da busca pela personalidade, das descobertas, das

conquistas, das dúvidas, é a fase das contestações. Eles gostam de viver em

grupos e sentem a extrema necessidade de amar e ser amados. Essa é a

idade em que vivem mudanças rápidas, porém profundas que acabam

influenciando o comportamento, no que diz respeito à família, religião e a

sociedade de forma geral (FIER, 2007).

Essas mudanças no desenvolvimento, segundo Zagury (2009), são

comuns à idade, pois essas modificações tanto físicas como psicológicas tem a

finalidade de preparar esse adolescente para torna-se um adulto futuramente.

O autor destaca também que, para que haja um desenvolvimento saudável

nessa fase da vida, é necessário que os pais mantenham um bom

relacionamento com seus filhos adolescentes, pois assim perceberão o quanto

essa fase é fantástica, e mesmo com as dificuldades que são comuns, poderão

viver momentos incríveis com eles, apesar dos transtornos que a própria fase

traz á tona.

7 Disponível em: http://www.paralerepensar.com.br/josefierapalavraadolescer.htm. Acesso em

16/05/13.

27

O autor francês Áries (1981), em seu livro História Social da Criança e

da Família, afirma que o termo infância foi construído ao longo da História, e

destaca que a criança não era vista como uma pessoa em desenvolvimento. As

crianças e adolescentes tinham acesso a brincadeiras abrasivas, participavam

das festas, das conversas, jogos e trabalhos dos adultos, ou seja, eram

tratados igualmente, não existia ainda nenhuma concepção de que a criança e

o adolescente necessitavam de cuidados especiais de acordo com sua idade.

Após longos anos, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afirma

no artigo 2° que é considerado adolescente aquele entre doze e dezoito anos

de idade incompletos, sendo garantido por lei o direito ao desenvolvimento

físico e social saudável, diferentemente do que foi supracitado por Áries (1981).

Nesse sentido, o ECA nos artigos seguintes enfatiza sobre os direitos inerente

a criança e ao adolescente.

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos

fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção

integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por

outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes

facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em

condições de liberdade e de dignidade.Art. 4º É dever da família, da

comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com

absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à

saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990).

Oliveira (2001) destaca complementando que “[...] a adolescência pode ser

compreendida mais como um trabalho psíquico do que como uma faixa etária,

porque a sua durabilidade não dependerá tanto da idade, mas do peculiar

tempo de cada sujeito para a realização desta operação subjetiva de buscar

um lugar”. (p. 35).

Portanto, a adolescência não é caracterizada apenas pela idade, mas

existe toda uma maturidade a ser alcançada no decorrer dessa fase, uma vez

28

que cada ser humano tem sua subjetividade, seus limites. Portanto, não é

possível classificar definitivamente o que é ser adolescente apenas pelo

período de vida de cada indivíduo.

Frota em seu artigo, afirma que:

A adolescência, portanto, deve ser pensada para além da idade cronológica, da puberdade e transformações físicas que ela acarreta, dos ritos de passagem, ou de elementos determinados aprioristicamente ou de modo natural. A adolescência deve ser pensada como uma categoria que se constrói, se exercita e se reconstrói dentro de uma história e tempos específicos. (FROTA, 2007; p.157).

É de suma importância fazer uma alusão sobre essas características

que geralmente são observadas na fase da adolescência, mas levando em

consideração que esse processo não é sinalizado apenas pelas mudanças

corporais, mas esse período é justamente o de adequação e de aprendizagem,

entretanto também é o momento em que os erros são constantes, ou seja, é

como se tudo o que aprendeu na infância não tivesse tanta importância sendo

agora necessárias certas mudanças na forma de se comportar, falar, se vestir e

até brincar. Também é importante frisar que é preciso ter um olhar peculiar e

específico, pois cada adolescente tem sua cultura, seu desejo, vive em

situações econômicas e sociais diferentes.

Ainda sobre a temática adolescência, vale ressaltar que ser adolescente

está ligado também aos mais variados aspectos sociais, culturais ou

financeiros de cada pessoa. Partindo dessa mesma suposição o autor Osório

(1989) citado por PIMENTEL (2010, p.46) julga que a adolescência é um

privilégio vivido apenas pelas pessoas mais favorecidas, ele estima que é “um

luxo não permitido aqueles que estão empenhados na encarnecida luta por

subsistência. Estes apenas experimentam a puberdade”.

A puberdade geralmente é a primeira característica citada quando se

trata de adolescência, por isso geralmente confundem-se. A primeira distingue-

se pelas mudanças físicas e biológicas enquanto a adolescência corresponde

29

ao próprio desenvolvimento comportamental e psicológico, ou seja, é um

conjunto de mudanças que ocorrem simultaneamente. (CALLIGARIS, 2000).

Portanto, ao fazermos uma síntese sobre os conceitos supracitados

compreendemos que a adolescência é uma metamorfose, pois está em

constante mudança, trazendo em cada adolescente uma ânsia de chegar à

idade adulta, de desfrutar da tão sonhada independência e, principalmente, do

reconhecimento.

Para Calligaris 2000, a adolescência é marcada pela construção de sua

identidade, é o momento em que o jovem está à procura de saber quem ele é,

o que vai ser, quem são seus amigos e o que pensam a respeito dele. É uma

fase em que procura ser reconhecido, pois até então não sabe realmente o que

é ser um adolescente e muito menos até quando vai permanecer nessa fase.

Finalizamos essa categoria com uma citação do autor Becker citado por

Pimentel. Essas palavras finais do autor referido fazem uma síntese de todas

as teorias citadas nesse texto, dessa forma achamos de suma importância

mencioná-la, para complementar os conceitos já aludidos.

Então, um belo dia, a lagarta inicia a construção do seu casulo. Este ser que vivia em contato íntimo com a natureza e a vida exterior, se fecha dentro de uma “casca”, dentro de si mesmo. E dá início á transformação que levará a um outro ser, mais livre, mais bonito(segundo algumas estéticas) e dotados de asas que lhe permitirão voar. Se a lagarta pensa e sente, também o seu pensamento e o seu sentimento se transformarão. Serão agora o pensar e sentir de uma borboleta. Ela vai ter outro corpo, outro astral, outro tipo de relação com o mundo. (BECKER, 1997; p.32).

Frequentemente acontece dessa maneira, o adolescente de repente

acorda e percebe que não é mais o mesmo, o seu corpo está mudando, o seu

humor está constantemente alterando e onde estão os seus brinquedos?

Abandonou-os, pois isso é coisa de criança. As pessoas já não olham mais

para ele como uma criança que precisa de colo, carinho e atenção. Os adultos

começam a cobrar responsabilidades e é justamente nessas circunstâncias

que eles se escondem do mundo e iniciam os seus questionamentos em

30

relação à vida. Entendemos então, que esse momento é crucial para a

construção de uma nova identidade e mais maturidade. Depois dessa etapa,

espera-se que o adolescente compreenda os fatos ocorridos em seu próprio

corpo e mente, levando-o à vida adulta, o momento em que ele mais espera.

Desta forma, devemos salientar a importância da família nesse período de

desenvolvimento dos adolescentes e para tanto, apresentamos algumas

considerações sobre família e o quanto ela pode influenciar em suas vidas.

1.3 – A importância da família na adolescência.

Ao longo dos anos a família vem passando por diversas transformações

em relação a sua estrutura, modelo e costume. Hoje, o conceito de família é

bem diversificado, é quase impossível encontrar uma definição para a mesma,

pois sabemos que, atualmente, família não é somente pai, mãe e irmão, mais

ganhou uma ampliação, de forma que não podemos defini-la como acontecia

anteriormente, ou seja, existia um modelo padrão, o qual foi reproduzido por

muitos anos.

Com base no que foi comentado acima, segundo Gomes& Pereira

(2003) apud Morais (2010) et. al temos que:

Historicamente, a definição de família esteve pautada nas relações de parentesco, as quais envolviam apenas os laços consanguíneos, a filiação e o casamento, definido assim o modelo nuclear como hegemônico perante a sociedade. No entanto mudanças econômicas e sociais mobilizaram novas configurações e formas de organizações familiares. (MORAIS, 2010, p. 178).

Estas transformações que ocorreram trouxeram mudanças significativas

nas relações familiares, pois através delas, segundo Morais et.al. (2010), as

famílias foram divididas em duas classificações: entre a família que é

idealizada e a família em sua realidade, ou seja, existe uma distancia entre o

ideal e o real. O ideal seria a formação de uma família nuclear8, mas o real é o

que certamente é vivenciado diariamente nas relações familiares.

8 Família nuclear é formada por pais e filhos numa mesma casa.

31

O aparecimento de novas configurações familiares9 conseqüentemente

tem causado muitos conflitos, separação dos pais, situação de abandono,

violência, e em muitas circunstâncias, o vínculo familiar é rompido trazendo

conseqüências severas para toda a família, principalmente para as crianças e

adolescentes. Sendo assim, essa fase que por natureza já é turbulenta e

enxurradas de subversões, as dificuldades sofridas por cada família tende a

influenciar em suas relações e conseqüentemente os laços familiares tornam-

se frágeis.

Neste item, a família tem papel fundamental em direcionar o adolescente

em seu caráter, princípios e principalmente ensinar e ter os cuidados básicos

que um adolescente necessita para um desenvolvimento saudável e feliz.

Ainda sobre a importância do papel da família na vida dos adolescentes.

Kaloustian afirma que:

A família é a principal responsável pela alimentação e pela proteção da criança, da infância à adolescência. A iniciação das crianças na cultura, nos valores e nas normas de sua sociedade começa na família. Para um desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança deve crescer num ambiente familiar, numa atmosfera de felicidade, amor e compreensão. (KALOUSTIAN, 2011; p. 05).

Assim, a participação da família é de extrema necessidade na formação

da percepção em relação ao que diz respeito à vida do adolescente em todos

os aspectos, pois é na família que aprendemos o valor do outro, a importância

da educação, do respeito, do afeto, das conquistas, dos relacionamentos

interpessoais, uma vez que todos os dias novos desafios estão postos nesse

período da adolescência, posto que é o momento em que a família se torna um

referencial para a vida adulta.

9 Destacamos algumas configurações familiares: A monoparental é comandada por um único

responsável adulto, as famílias reconstituídas são formadas por padrastos, madrastas e novos irmãos e a família ampliada que é composta por avós, tios, amigos, vizinhos etc.

32

Rizzine (2007), também ressalta que o adolescente tem direito à

convivência familiar, contudo existem milhares deles espalhados por todo

Brasil, tendo seus direitos violados e sofrendo violência e descaso nas ruas,

pois segundo o ECA (1990), como já foi supracitado, é dever da família,

sociedade e do Estado lhes garantir um desenvolvimento favorável e

principalmente direito à uma vivência familiar e comunitária harmoniosa que é

de extrema importância para sua desenvoltura no meio em que vive.

Zagury (2009) comenta que a família é uma grande influenciadora na vida

desses adolescentes, tanto positivamente como negativamente, pois se dentro

de sua casa a vivência é harmônica, há respeito uns pelos outros, diálogo e

paciência a probabilidade dos pais amenizarem a ida desse jovem para as ruas

em busca de amigos, por más companhias, e que provavelmente lhes mostrará

caminhos errôneos, será muita, uma vez que tudo que é importante e

necessário ele encontrará em seu ambiente familiar.

Em contrapartida, existem as famílias que vivem diversos tipos de

dificuldades e toda essa teoria citada infelizmente não é praticada, pois os

problemas são tantos que eles não encontram espaço para esse tipo de

assunto, já que estão mais preocupados com o que precisam fazer para manter

suas famílias. Essa realidade atinge milhares de famílias que hoje vivem

condições sub-humanas e ainda são cobradas e julgadas por não terem

condições de sustentar e educar seus filhos, pois a pobreza os atingiu de tal

forma que nem o básico para viver os pais consegue prover para sua família.

Então, Osório afirma a importância da participação da família e da

sociedade.

A participação de cada um de nós, como cidadãos, é obviamente a gota de água indispensável para que se forme o caldal de boa vontade e espírito coletivo capaz de transformar a sociedade. A família, como unidade matricial do corpo social, tem, contudo, seu papel a desempenhar. A forma como as relações humanas se processam no âmbito da família é o modelo interacional para o funcionamento das coletividades [...]. (OSÓRIO, 1996, p.86).

33

O autor menciona a importância dessas duas participações, pois para

ele são elementares para amenizar a desigualdade e a injustiça social.

Também percebemos o quanto as famílias em situação de vulnerabilidade

precisam de atenção básica, visto que muitas vezes seus filhos lhes são tirados

por não conseguirem mantê-los, com isso o vínculo familiar é quebrado e como

resultado dessa separação, vem o desapego à família, a insensibilidade, em

muitos casos a rebeldia, dentre outros. A seguir, iremos continuar tratando

sobre a adolescência, mas dessa vez sob um ponto de vista diferente, o

adolescente que vive essa fase e ao mesmo tempo enfrenta a pobreza.

1.4 - A adolescência e a pobreza

No filme “Crianças Invisíveis”, dirigido por Veneruso (2005) ocorre uma

cena em que um adolescente chamado Ciro, que vive na periferia de Nápoles,

em uns prédios com aparência de abandonado, sem perceber escuta seu

padrasto e sua mãe brigando por causa da falta de condições financeiras. Em

uma das falas de sua mãe, o garoto a ouve afirmar que não suporta mais

aquela situação, o dinheiro não estava suprindo nem as necessidades básicas

da família e que a partir daquele dia o menino Ciro teria que colocar dinheiro na

mesa e ajudá-la nas despesas de casa.

Nas cenas seguintes, o adolescente começa a se envolver com más

companhias, planejar roubos e conseguir seu próprio dinheiro. Dentre várias

cenas, destaca-se a que ele troca produtos roubados por dinheiro e também

por fichas para brincar em um parque de diversão e comprar algodão doce. No

decorrer da história, ele continua a submergir no mundo da criminalidade, e é

importante frisar que em algumas partes do filme, ele relembra as amargas

palavras de sua mãe. Também podemos perceber o contraste dos desejos

daquele menino, roubava para manter-se, ou até mesmo porque foi o caminho

mais fácil que encontrou para solucionar de imediato seus problemas, mas no

profundo de seus anseios infantis, queria apenas realizar desejos que toda

34

criança e adolescente têm, assim como brincar no parque de diversão, comer

guloseimas e ser feliz.

Mas não, ele se vê na obrigação de se sustentar, mesmo sendo apenas

um adolescente, na verdade, uma criança sozinha, que precisa tão cedo

enfrentar as dificuldades da vida. E infelizmente no final do curta-metragem, o

garoto simbolicamente faz uma arma com sua própria mão e aponta para sua

boca, finge que atira e cai no chão como se estivesse morto. Essa cena

exemplifica a massacrante realidade dos adolescentes que são privados de

seus direitos tão cedo, pois a desigualdade social os acompanha desde o seu

nascimento.

Diante dessa realidade retratada no filme Rizzini complementa dizendo

que:

Além de escapar da incômoda evidência de tanta miséria, preenche-se este vácuo por uma retórica na qual os pobres são desqualificados enquanto pais. Passam a ser vistos como pais que não amam, incapazes de estabelecer vínculos com suas crianças. (RIZZINI, 2003, pg. 53).

Faz-se necessário salientar que as condições econômicas de uma

família não são o mais importante, mas é de extrema necessidade para que os

seus membros venham desenvolver-se em todas as formas, principalmente se

tratando de adolescentes, uma vez que esse período é composto de decisões,

conquistas, alegrias e tristezas, pois quando uma família está bem em todos os

aspectos, ela sente-se segura em apoiar os filhos e dar todo um suporte para

um futuro digno. Mas também não significa dizer que quando determinada

família não tem uma boa condição financeira seja incapaz de proporcionar um

vínculo familiar forte o suficiente para enfrentar as dificuldades juntos e superar

até mesmo a pobreza.

Becker (2011) salienta que abandono e pobreza tende a ser confundido

no seu conceito, pois existem muitas crianças e adolescentes em situação de

rua ou nos abrigos que possuem vínculos com seus familiares em sua maioria.

A causa que os levam a situação de vulnerabilidade na maior parte das vezes

35

não é a negligência dos pais, mas sim uma estratégia de sobrevivência, pois

como foi relatado acima, no filme “Crianças Invisíveis”, podemos perceber essa

relação de pobreza e abandono, e muitas vezes o senso comum que julga as

famílias dizendo que elas abandonam e não sabem educar seus filhos sendo

essa a razão pela qual eles estão nas ruas fazendo o que é errado.

Portanto, é importante desmistificar esse pré-conceito, pois a autora

Becker (2011) afirma que “se abandono existe, não se trata de crianças e

adolescentes abandonados por seus pais, mas de famílias e populações

abandonadas pelas políticas públicas e pela sociedade” (p. 63). O ECA (1990)

frisa também, especificamente no artigo 23, que “a falta ou a carência de

recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão

do poder familiar” e no parágrafo único do artigo 23 afirma que quando a

família não possuir uma boa condição econômica para permanecer com as

crianças e adolescentes no seio familiar, esta deve ser incluída em programas

oficiais de auxílio, para que seja possível efetivar o direito a convivência familiar

e comunitária. (BRASIL, 1990).

Enfim, as políticas públicas têm deixado a desejar quanto a essa

problemática, pois segundo o ECA (1990), o Estado tem o dever de assumir a

responsabilidade nessas situações apresentadas para dar subsídios as famílias

para que possam permanecer com seus filhos e apoiá-las no desenvolvimento

deles.

Kaloustian afirma que:

Por detrás da criança excluída [...] nas favelas, no trabalho precoce urbano e rural e em situação de risco, está a família desassistida ou inatingida pela a política oficial. Quando esta existe, é inadequada, pois não corresponde as suas necessidades e demandas para oferecer o suporte básico para que a família cumpra, de forma integral, suas funções enquanto principal agente de socialização dos seus membros, crianças e adolescentes principalmente. (KALOUSTIAN, 2011, p. 13).

Diante dessa realidade percebemos o quanto as famílias precisam da

mínima atenção básica para que possam exercer o direito que já lhe pertence,

que é o de criar e educar seus filhos de forma que eles sejam inseridos e

36

tenham seus direitos efetivados, tais como: saúde, educação, lazer, moradia,

convivência familiar, entre outros; ou seja, para que esses filhos tenham a

oportunidade de crescer e desenvolver tanto o físico quanto o intelecto, que

venham ser vistos como cidadãos que contribuem para o bem comum e para

que tanto a família como o adolescente possam compreender a importância da

participação familiar em seu crescimento e o quanto ela pode influenciar em

seu futuro.

O autor supracitado afirma que a família não é apenas responsável pelo

comportamento de seus filhos, mas sim pela trajetória de vida que cada

membro vai fazer individualmente, como a formação de uma nova família,

enfrentar o mercado de trabalho, etc. Ele comenta que nas famílias mais

pobres esse trajeto acontece de maneira traumática, pois o processo depende

das condições econômicas e das formas de sobrevivência que se dá em cada

família.

Segundo Carvalho

Vive-se no Brasil hoje um verdadeiro “apartheid” 10

entre ricos e pobres. Não se percebe, mas este “apartheid” é notório especialmente nas regiões metropolitanas, onde a maioria da população vive em cortiços, favelas e casas precárias das periferias, excluídos não apenas do acesso a bens e serviços, mas também do usufruto da própria cidade. A pequena população rica vive em bairros que são verdadeiros condomínios fechados com todos os bens e serviços disponíveis. (CARVALHO, 2011, p. 96).

A desigualdade em todos os aspectos tem causado uma verdadeira

divisão até mesmo geográfica. Segundo o autor referido a população mais

desprovida de recursos financeiros vive o processo de exclusão a começar

pelos serviços básicos que uma sociedade precisa, sem mencionar que

quando algumas comunidades com muito sacrifício constroem seus barracos

ou simples casas de alvenaria, onde o Estado por motivo de higienização, ou

10

Apartheid ("vida separada") é uma palavra de origem africana, adotada legalmente em 1948 na África do Sul para designar um regime segundo o qual os brancos detinham o poder e os povos restantes eram obrigados a viver separados dos brancos, de acordo com regras que os impediam de ser verdadeiros cidadãos. Disponível em http://questionadora.blogspot.com.br/2009/07/o-significado-de-apartheid.html acesso no dia 05/11/2013

37

seja, estética da cidade e também por causa de grandes eventos,

simplesmente dá ordem para demolir suas casas, os seus sonhos.

Nascimento (2000), comenta que “[...] os excluídos não têm lugar.

Vagabundeiam pelos interstícios das cidades [...]”. (p.66). E Bursztyn (2000,

p.38), afirma que os excluídos “[...] São os sem-teto, sem moradia, sem

trabalho, com seus vínculos familiares rompidos, que fazem do espaço da rua

sua morada [...]”. Pelo exposto, percebemos o quanto a desigualdade causa a

exclusão social, pois estamos habituados nessa sociedade a valorizar as

pessoas que possuem algo a oferecer, damos valores aos próprios interesses,

não nos importando com aqueles que estão a vaguear nas ruas sem destino,

sem esperança de dias melhores, como diz a música da banda Jota Quest11:

“Vivemos esperando o dia em que seremos melhores, melhores no amor,

melhores na dor, melhores em tudo [...]. Dias melhores pra sempre [...]”.

Todas as pessoas desejam desfrutar de dias melhores, de uma vida

digna e sem privação de direitos, mas a realidade vivida pelos adolescentes

que por causa da pobreza e da miséria têm suas vidas impactadas e marcadas

pela violência, fome, drogas e abandono escolar, tem como consequência, na

maioria das vezes, a quebra da convivência familiar, uma vez que tanto a

família quanto o adolescente estão excluídos da sociedade, causando

progressivamente a distância entre eles, seja geográfica ou afetivamente.

Por fim, salientamos o quanto é importante compreendermos essa etapa

da adolescência, pois assim saberemos como lidar com as situações postas,

bem como frisar a necessidade da participação da família nesse momento

crucial na vida deles e o quanto ela pode entusiasmá-los a crescer em todos os

aspectos, sem deixar de destacar que os jovens nessa fase que vivem em

situação de vulnerabilidade necessitam de atenção. O que adianta a família ter

vontade de educar e proporcionar um futuro melhor para seus filhos se as

condições financeiras as limitam? Se a sociedade os desprezam e se o Estado

os abandona? No próximo capítulo iremos acompanhar como acontece o

11

Jota Quest é uma banda de pop rock formada em Belo Horizonte em 1993.

38

processo da casa para a rua, como os adolescentes, segundo os autores

referenciados, percebem esse universo e também como se deu o processo de

institucionalização no Brasil e quais as mudanças ocorridas.

39

2. O TRAJETO DA RUA E A INSTITUCIONALIZAÇÃO

2.1 - O caminho da rua começa a ser trilhado

“Desde que sou gente a rua é meu mundo,

vivendo como indigente neste isolamento

profundo”.

Francisco Fernandes Nascimento12

Ao sairmos diariamente de nossas casas passamos por diversas ruas,

seja a pé, de ônibus ou carro, nas quais encontramos um universo cheio de

diversidade, composto por pessoas que seguem individualmente o seu

caminho. E é no espaço da rua que muitas pessoas sobrevivem de maneira

inumana, pois não encontram outra saída além dela. Sendo assim, é relevante

que aprofundemos mais sobre essa categoria, a fim de analisarmos o que a rua

significa para essa população nela habita, especificamente, os adolescentes.

Morais observa que:

Quando pensamos em rua, visualizamos um lugar de passagem, um lugar pelo qual devemos passar para chegar até o nosso objetivo final (escola, trabalho, lojas, casas de familiares, amigos etc.). Ao caminharmos a pé ou nos locomovermos de ônibus e automóvel, a rua mostra-se como um conjunto de estímulos (visuais, sonoros e olfativos) que se multiplicam de forma rápida e dinâmica. Além dos estímulos físicos, encontram-se (em maior ou menor quantidade) as pessoas que dela fazem parte e lhe dão cor e vida. Para a maioria dessas pessoas, a rua continua sendo simplesmente um “lugar de passagem”, de impessoalidade (multidão de desconhecidos) e que gera insegurança. (MORAIS, 2010, p.35)

Para o senso comum, a rua continua sendo apenas um lugar onde

podemos transitar com o intuito de chegar a um determinado local, assim como

também realizar atividades físicas e brincadeiras como: futebol, pipas, etc. Mas

quando chega o final do dia todos caminham em direção as suas casas, seu

12

Francisco Fernandes Nascimento é um poeta, natural de Natal - RN

40

aconchego, seu conforto, pois na rua você está desprotegido, exposto e

inseguro. Resumindo, realmente ela é apenas um local onde muitos passam,

mas preferem voltar as suas casas e ter uma boa noite de sono.

Mas acontece que nem todos podem fazer esse caminho de volta, pois

para muitos a rua não é mais apenas um lugar de transição, mas sim de

moradia e também de sobrevivência. Hoje, tem se tornado cada vez mais

comum vermos os sinais de grandes avenidas repletos de crianças e

adolescentes mostrando o que sabem e o que podem fazer para conseguir o

seu próprio sustento e também o da família. A situação precária nas famílias

traz um peso de responsabilidade muito cedo para esses meninos e meninas

de rua, pois são obrigados a abandonar sua infância, já que precisam trabalhar

para garantir pelo menos uma refeição por dia. Gastam toda a sua força

vendendo balas dentro de ônibus, limpando carros, engraxando sapatos ou

mesmo mendigando.

Rizzini enfatiza sobre suas vivências nas ruas.

Suas vidas são marcadas, desde o início, por adversidades contínuas, forçando-os a circunstâncias desumanas, que vão compondo o pano de fundo de suas trajetórias. Embora ocupem as ruas com sede de viver, suas histórias são pautadas por episódios de fome, brigas, desastres, mortes, perdas, falta de opção, de apoio, de tudo. (RIZZINI, 2003, p.12).

Então, quando esse adolescente por determinada situação sai de seu

ambiente familiar para as ruas, já traz consigo feridas abertas, mágoas,

ressentimentos, solidão e tristeza. A sua ida para as ruas é como se fosse a

solução dos seus problemas, ficam “a mercê da sorte”, vivendo de maneira

inumana, como se fossem o que sobrou da sociedade: o resto, inútil, sem valor

algum. Mesmo que a aproximação com a rua, embora muitas vezes, seja em

prol de sua sobrevivência, o adolescente está tão fragilizado que qualquer

pessoa de má influencia completa o vazio que as circunstâncias da vida lhe

proporcionaram. Dessa forma, a ida para as ruas começa a ganhar um atrativo,

não apenas pelo fato do trabalho, mas sim, pelos vínculos que são feitos.

41

Morais, et.al. (2010) enfatiza que a ida para as ruas não acontece de

repente, existe um processo que acresce gradativamente o elo com as pessoas

que já fazem parte desse espaço, geralmente esse processo de aproximação

com a rua se dá justamente pelo rompimento de vínculo na sua família e

também na sociedade. Com isso, aquele menino que ia para as ruas apenas

para trabalhar ou encontrar os amigos, de repente, percebe que quanto mais

tempo ele passa fora de casa, mais se afasta dos problemas que tanto lhe

perturbam e tiram a sua alegria. Tudo isso vai aproximando ele cada vez mais

das ruas e o distanciando do espaço de casa porque, nesse ambiente

consegue dinheiro e comida, quase sempre pedindo, já que não tinha acesso a

esses itens no meio familiar. Sem nem perceber, esse adolescente se encontra

vivendo nas ruas, mudança essa que se dá por vários fatores, uma vez que a

autora afirma que há uma vulnerabilidade que predispõe crianças e

adolescentes irem para as ruas e na maioria das vezes começam indo para os

sinais como “flanelinhas”, vendendo água, bombons e etc.

Para melhor compreensão, a autora supracitada (2010) define o que é

vulnerabilidade social: “[...] é o resultado negativo da relação entre a

disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores [...] e o acesso

à estrutura de oportunidades sociais, econômicas e culturais que provêm do

Estado, do mercado e da sociedade”. (p. 38). Sendo assim, é possível entender

que a falta de acesso a recursos básicos resulta na precariedade na forma em

que vivem, ou seja, são impossibilitados de suprir por seus próprios meios às

situações de suas vidas em determinados aspectos, sejam eles econômicos,

sociais, entre outros.

Para exemplificar as situações de vulnerabilidade que esses

adolescentes sofrem, trazemos aqui alguns dados para basear o que ocorre

com eles antes de irem para as ruas. De acordo com uma pesquisa13 anual, na

cidade de Fortaleza no ano de 2010, existem alguns fatores determinantes

para que isso aconteça.

13

Disponível em http://www.criançanaoederua.org.br/pdf/Pesquisa_Anua_Fortaleza_2010.

42

Quadro 1 - Distribuição por motivo de ida para as ruas.

Motivação de ida para as

ruas

ABS %

Abuso sexual 2 1,0

Exploração sexual 25 13,1

Amigos 7 3,7

Conflitos comunitários 24 12,6

Drogas 7 3,7

Exploração do trabalho

infantil

9 4,7

Miséria 18 9,4

Vínculos familiares

fragilizados

24 12,6

Violência doméstica 7 3,7

Outros 68 35,6

Fonte: Pesquisa anual de Fortaleza 2010. “Continuação” Quadro 1.

Esses fatores contribuem com a ida de crianças e adolescentes para as

ruas de Fortaleza. Segundo Morais, et.al (2010), esse caminho para as ruas se

mostra como uma alternativa de sobrevivência ao ambiente e situações que

vivenciam diariamente. Alguns dados ganham um maior destaque nas

motivações, dentre eles, enfatizamos a miséria e os conflitos familiares. Com

isso, as ruas acabam de certa forma se tornando um espaço de fuga para

esses meninos que estão nas ruas. Não que a rua seja uma boa opção, mas

de acordo com um estudo realizado por Leite (1991, 1998, 2005), Morais

(2005) e Westphal (2001) apud Morais et.al.

O (a) menino (a) que vai para a rua, inúmeras vezes, está fugindo de dados reais da sua vida, como: condições de moradia precária, insalubridade, “casa cheia”, violência doméstica, fome, exploração pelo trabalho etc. Assim, procuram escapar dos fatores ambientais e psíquicos que lhe causam danos físicos e psicológicos, mesmo que isto não lhes seja consciente. (2010, p. 70).

A rua é o caminho que eles encontram para não encarar as dificuldades

dentro de casa, com isso ela torna-se um espaço diversificado e usado para o

43

trabalho infantil, mendicância e muitos outros. Como conseqüência disso,

ocorre o baixo rendimento escolar ou o abandono, uso de drogas, revolta,

roubos, etc. Por fim, começam a viver longe de casa, tentando de todas as

formas sobreviver como pode, além de enfrentar o medo e a violência que

existem nas ruas. A rua é vista como um local inseguro, principalmente nos

dias atuais em que a violência tem gerado pânico nas pessoas, tendo como

resultado desconfiança e preconceito por aqueles que estão nas ruas. Enfim,

ausentam-se do seu ambiente familiar em busca de sobreviver e resistir às

circunstâncias vividas.

Dirk apud Graciani (1997) apud Gomes e Pereira (2003) esclarece que:

Viver na rua significa viver em um espaço público, um espaço livre e aberto a toda população. Mas, por isso, um espaço anônimo. Ao contrário da casa, na rua as pessoas não têm nome, nem identidade pessoal, apenas funcional. A rua é para todos e para ninguém: indivíduos não têm importância, seus traços desapareceram. Eles se tornam circunstâncias abstratas e podem facilmente ser vítimas de ações gerais de violência e agressão. (2003, p. 115).

Os quem vivem nas ruas acabam tornando-se invisíveis diante da

sociedade, pois não são identificados por seus nomes, não possuem um

espaço confortável para morar, antes, passam a maior parte do seu tempo em

um lugar que pertence a todos, a rua. Os nomes que recebem são pejorativos,

carregados de marcas e estigmas. Entre eles, como já foi citado

“trombadinhas”, “mendigos”, “mirins” “vagabundos”, “sem educação”,

“flanelinhas”. São inúmeras as qualificações dadas a esses adolescentes que

estão a vagar pelas ruas de Fortaleza à procura de serem reconhecidos

simplesmente como seres humanos, adolescentes, sujeitos de direitos, assim

como outros. No próximo tópico iremos abordar as diferenças encontradas no

espaço da casa e da rua, como a sociedade caracteriza esses espaços e como

ela percebe as pessoas que nela vivem.

44

2.1.1 - Entre a casa e a rua

Da Matta (1997), faz uma síntese sobre as diferenças encontradas entre

a casa e a rua. Ele comenta que em casa somos livres para ter certas atitudes,

que na rua seria impróprio e causaria contestações como, por exemplo, “exigir

atenção para nossa presença e opinião, querer um lugar determinado e

permanente na hierarquia da família e requerer um espaço a que temos direito”

(p.19). Quando uma pessoa está em sua casa ela tem um espaço que é seu,

tem um nome, uma classificação, ou seja, é um filho, tio, sobrinho, é alguém,

realiza um papel na sociedade, na comunidade em que vive, mas nas ruas,

quem é por eles? Quem os é?

DaMatta (1997) continua discorrendo que a casa é um local de

tranquilidade, recuperação e comodidade, ou seja, é um espaço de

demonstração de amor, ternura, afeto e cuidado. O autor destaca que em casa

somos todos “supercidadãos”. Mas na rua, será que temos voz, será que

alguém nos enxerga? Qual é a nossa identidade?

Segundo DaMatta (1997, p. 19), na rua somos “[...] indivíduos anônimos

e desgarrados, somos quase sempre maltratados pelas chamadas

“autoridades” e não temos nem paz nem voz. Somos rigorosamente

“subcidadãos” [...].” Diante disso, compreendemos que a rua extrai a

subjetividade daquele que está exposto a ela, não restando nem sequer o

direito de ser respeitado como cidadão e também como ser humano.

Escorel (1999, p.11) enfatiza que “Os cidadãos são indivíduos

portadores de interesses e direitos legítimos, são sujeitos com poder de agir e

falar”. Mas infelizmente, quando se está nas ruas, esse legítimo direito

submerge juntamente com sua dignidade e seus valores, além dos seus

direitos civis que é o acesso à educação, moradia, saúde, entre outros.

Esses indivíduos sem vínculos com o mundo do trabalho e da cidadania

em que não podem usufruir dos direitos que já lhes foram concedidos, além

45

das limitações humanas de sobrevivência, não causam interesse e importância,

são inúteis, exoneráveis e desnecessários para a sociedade. (ESCOREL,

1999). A rua torna-se um lugar de sobrevivência, pois eles vivem o presente,

certos de que o futuro não está as suas vistas, pois “torna-se permanente o

processo de morrer”. (Escorel (1997) Apud Arendt (1989); p,81).

Quando tratamos de adolescentes em situação de rua, temos que eles

vivem à margem da sociedade, estão morrendo socialmente, sendo excluídos

desse sistema capitalista e individualista, onde as pessoas não se importam

com quem está caído em uma calçada, uma vez que essa cena já se

naturalizou. É normal passar pelas ruas de Fortaleza e ver inúmeros

adolescentes encontrando o mundo do crime ao invés de estarem na escola,

no vínculo familiar, na sua comunidade, mas não, estão sozinhos, perdidos e

recusados.

Essa é uma situação degradante, pois cada vez mais esses

adolescentes têm os seus direitos negligenciados e desde muito cedo eles

iniciam o processo da morte social, começando em seu ambiente familiar,

depois em sua ida para as ruas e consequentemente adentram nesse processo

tão desumano e doloroso o qual quando não há a intervenção da família, da

sociedade e do Estado infelizmente os levam a experimentar além da morte

social a morte física, mesmo sem ter vivido plenamente. Sobre a visão que a

sociedade tem da rua e das pessoas que estão nela.

DaMatta ressalta

Até hoje a sociedade parece fiel á sua visão interna do espaço de rua como algo movimentado, propício à desgraças e roubos, local onde as pessoas podem ser confundidas com indigentes e tomadas pelo que não são. Nada pior para cada um de nós do que ser tratado como “gente comum” [...], do que ser tomado como uma “mulher da vida” ou alguém que pertence ao mundo do movimento e do mais pleno anonimato. (DAMATTA, 1997, p. 54).

Necessariamente, quem está nas ruas não é sinônimo de “marginal”,

muito pelo o contrário, em sua maioria são pessoas em busca de escapar da

46

fome, pobreza, violência doméstica, entre outros, em busca de resistirem às

dificuldades que a vida lhe trouxe. Nas ruas, o anonimato prevalece, pois a

sociedade apenas visualiza sua aparência suja, maltratada e pés descalços.

Não observam para além da aparência, os seus nomes, sua história, seus

medos e seus sonhos. Então, essa visão de que a rua é favorável apenas a

acontecimentos ruins, acaba infelizmente trazendo para os indivíduos que nela

habitam essa característica de que a rua é perigosa, portanto quem nela vive,

também é.

Ainda sobre população de rua, Silva (2009, p. 120) salienta que “É muito

comum que as pessoas em situação de rua sejam responsabilizadas pela

situação em que se encontram, por suas “imperfeições” ou “falhas” de caráter.

Muitas vezes também são tratadas como uma ameaça à comunidade”.

Frequentemente vemos esse tipo de insinuação, como se a maior parte das

pessoas que se encontram nas ruas estivessem ali por vontade própria e não

por circunstâncias da vida. Além de colocar em julgamento seu modo de ser e

sua integridade.

Borin apud Silva por sua vez destaca que “os moradores de rua são

muito estigmatizados (...) eles despertam medo, nojo e descaso”. Silva

continua sua linha de pensamento dizendo que:

As práticas higienistas, direcionadas para camuflar o fenômeno, mediante massacres, extermínios ou recolhimento forçado dessas pessoas das ruas, continuam presentes nos tempos atuais, nos grandes centros urbanos do País, até mesmo conduzidas por órgão do poder público. Essas práticas são impregnadas de preconceitos e estigmatizam as pessoas a quem são dirigidas. (BORIN Apud SILVA, 2009; p. 120).

Essas ações realizadas contra a população de rua simplesmente

existem para mascarar o problema, muitas vezes parece que o país está

vivendo um retrocesso, pois ao invés de solucionar essa situação que só tem

aumentado alarmantemente, parece que essa causa não é problema de

ninguém, muito menos do governo, uma vez que as medidas tomadas são

essas imediatistas e carregadas de marcas do passado.

47

Diante do contexto compreendemos que a rua desde muitos anos é

caracterizada como um espaço negativo, um local de todos, mas que ninguém

é valorizado, já que é nesse lugar que estranhos transitam cotidianamente, isto

é, não se conhecem e nem se cumprimentam, este é o espaço da rua. E por

fim, o espaço da casa, onde mesmo que não seja um ambiente agradável ou

como se sonhava é nesse espaço que se dá início ao exercício da cidadania,

uma vez que em casa é possível ser ouvido e percebido, pelo menos deveria

ser assim. Mas sabemos que existem muitas contradições sobre os

relacionamentos familiares em casa, pois muitas das vezes, a violência física e

psicológica começa dentro do próprio lar.

No próximo ponto iremos discutir a questão do uso das drogas,

observando se existe alguma relação com a ida desses adolescentes para as

ruas e qual é a semelhança existente entre elas: a rua e as drogas.

2.1.2 – As drogas, a rua e os seus impactos.

Segundo a reportagem de D’alama (2012) no site G1, através do

Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD)14, o Brasil é o segundo

maior consumidor mundial de cocaína e seus derivados. Segundo a pesquisa

mais de 6 milhões de brasileiros já usaram cocaína e dentro desse grupo 2

milhões já experimentaram o crack e outras drogas. O estudo observou

também que o uso de drogas ilícitas começa muito cedo, pois 45% das

pessoas que usaram a substância pela a primeira vez foram antes dos dezoito

anos de idade. Esse consumo precoce traz consequências prejudiciais ao

longo da vida.

Atualmente podemos perceber o quanto as drogas têm ceifado a vida de

muitas pessoas, principalmente a dos jovens, pois basta assistir a um

14

Disponível em: http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2012/09/brasil-e-o-segundo-maior-consumidor-de-cocaina-e-derivados-diz-estudo.html Acesso em 01/12/2013.

48

programa policial de televisão para observar o quanto ela têm adentrado e

destruído a vida de muitas famílias. As drogas não escolhem a situação

econômica, mas é muito provável que as pessoas que estão vivendo de

maneira precária e vulnerável tenham uma maior possibilidade de se envolver

e iniciar o uso de drogas muito cedo.

Nascimento e Soares ressaltam que:

O contato dos meninos (as) com as drogas é uma das conseqüências inevitáveis de sua situação na rua. Mesmo para aqueles que têm internalizada uma moral da ordem e da religião, o contato se faz pela proximidade com os companheiros que fazem algum uso da droga (...). (NASCIMENTO e SOARES, 1997, p. 44).

Esses contatos dos adolescentes em situação de rua com as drogas

geralmente vêm da relação que eles têm com sua própria comunidade ou até

mesmo os exemplos que são mostrados para eles dentro de suas próprias

casas através de seus familiares, sendo essa uma realidade constante nas

famílias desajustadas e que estão em situação de vulnerabilidade, pois ficam

fragilizados quanto às dificuldades da vida e acabam se entregando a vários

vícios, inclusive as drogas. Os autores citados acima enfatizam também que

mesmo que esse adolescente tenha uma moral internalizada ou tenha

princípios religiosos, ainda assim estão propícios às drogas se estiverem

vivenciando as ruas como um lugar de moradia ou até mesmo de

sobrevivência.

Essa vulnerabilidade que está presente no cotidiano desses

adolescentes facilmente os leva a fazer com que as drogas colaborem como

uma maneira de substituição de determinadas necessidades básicas, assim

como: um simples banho, um local para dormir, a alimentação e muitas outras.

Se em casa muitos deles convivem com essa realidade, e na rua? Como

será?(NASCIMENTO, 1997).

As drogas afetam e destroem não apenas quem as usa, mas de fato

toda a sua família, pois os laços entre eles tornam-se frágeis e debilitados,

49

causando, na maioria das vezes, a violência familiar, tráfico de drogas, baixo

rendimento escolar, a falta de saúde do usuário, além de dificultar diretamente

os vínculos familiares e também na sua comunidade, visto que a droga como

bem sabemos causa dependência e modifica as suas funções físicas,

psicológicas e econômicas,15 além de por vezes definir o rompimento dos

vínculos no ambiente familiar, causando com isso uma severa separação entre

pais e filhos. Essa situação tende a piorar quando esse menino (a) decide ir

para as ruas, pois é nesse ambiente que eles “afogam” suas tristezas, revoltas

e sofrimento, tendo como resultados as mais variadas formas de sobrevivência

nas ruas, entre elas, as drogas como já foi citado, e outras como roubo,

trabalho infantil e mendicância.

Segundo Nascimento (1997, p.22), “[...] a rua oferece muitas

oportunidades de aventuras e aprendizagens e a criança termina mesmo por

ingressar no mundo das drogas, do roubo, da prostituição [...]”. Através destas

oportunidades maléficas os adolescentes vivenciam situações que causam de

imediato boas impressões, pois nas ruas, por meio da mendicância, eles

conseguem se alimentar, situação que nem todo dia eles realizam em casa e

conseguem dinheiro para comprar o que quiserem, inclusive drogas.

De acordo com a reportagem de Madeira (2013) do Diário do Nordeste16,

na cidade de Fortaleza, 46% dos meninos e meninas que estão nas ruas

conseguem dinheiro por meio da mendicância e esse dinheiro geralmente é

gasto com as drogas. Inicialmente, ao chegarem à rua, esses adolescentes têm

a ilusão de que a rua é melhor que a sua própria casa, mas as boas

impressões passam rápido, pois ao longo de dias, meses e anos a rua vai

deixando marcas difíceis de cicatrizar, pois ela de certa forma apresenta-lhes

as drogas que consequentemente os fazem conhecer o caminho do crime.

De acordo com Prates

15

Disponível em: http:portal.saude.gov.br/portal/arquivos/multimedia/adolescente/drogas2.swf. Acesso dia 28/11/2013. 16

Disponível em: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1252919. Acesso dia 01/12/2013.

50

Ninguém nasce com sonho de ser menor infrator, bandido, traficante, detento, e de morrer ainda jovem. O jovem quando escolhe o caminho do crime, só o faz por falta de opção, quando lhe é tirado o direito de escolher o caminho da cidadania, da oportunidade, da chance de ser feliz. É preciso romper com o estigma da delinquência juvenil e do seu envolvimento com crimes relacionados ao tráfico de drogas. O envolvimento de jovens nos crimes relacionados às drogas requer o fim da exploração do trabalho juvenil no tráfico e isto somente se conquista com a adoção das políticas preventivas. (PRATES, 2010, p.169).

Portanto, a rua e a droga tornam o caminho desses adolescentes mais

curto e turbulento. A falta de oportunidades e de acesso a um desenvolvimento

saudável ainda é uma realidade constante em nosso país, pois os direitos

básicos lhes são negados principalmente no que se refere à educação de

qualidade. É necessário investir nesses jovens por meio de políticas públicas

voltadas para ações preventivas, a fim de amenizar a situação de pobreza, da

criminalidade, das drogas e, principalmente, intervir nessa problemática tão

discutida atualmente que é a de crianças e adolescentes em situação de rua.

No entanto, pouco o governo e a sociedade fazem por elas.

No próximo tópico, entraremos na questão da institucionalização de

crianças e adolescentes no Brasil. Apresentaremos um breve contexto de como

se deu inicio a esse processo e enfatizaremos os desafios e as modificações

realizadas através do ECA.

2.2 – Os desafios e as mudanças no processo de institucionalização no

Brasil

No passado, as crianças e adolescentes quando nasciam em situação

de pobreza e miséria e em famílias que apresentavam certas dificuldades na

criação e educação dos filhos, tinham um destino certo, eram direcionadas

para instituições como meninos e meninas órfãos ou simplesmente

abandonados. Exceto, quando a família buscava ajuda do Estado (RIZZINI,

2004).

51

Rizzini (2004) continua a discussão e afirma que o Brasil tem uma

extensa tradição no que se refere à internação de crianças e jovens. Ela

salienta que essa prática era comum na questão da educação, muitos filhos de

famílias ricas e dos setores pauperizados eram ensinados e criados em

colégios internos, seminários, escola de aprendizes, etc. Esse ensino no qual

as crianças e os adolescentes ficavam internos tinha caráter educacional, mas

também apresentavam interesses de ordem social e assistencialista. No

período após a segunda metade do século XX o modelo de internação para os

filhos dos ricos estava chegando ao fim, mas para a classe pobre foi o

contrário. Os menores, como eram chamados, passaram a ser foco de

intervenção do Estado, instituições beneficentes e outras de cunho religioso.

O recolhimento de crianças e adolescentes era a ferramenta usada

pelas instituições de retraimento como um meio de proteção e assistência no

Brasil. Nessas instituições “o indivíduo é gerido no tempo e no espaço pelas

normas institucionais, sob relações de poder totalmente desiguais, é mantida

para os pobres até a atualidade” (p. 22).

Para Silva essa prática de institucionalizar filhos de pobres é uma

questão ainda a ser discuta. Ele afirma que:

As razões que explicam por que algumas famílias pobres ainda acabam por utilizar os abrigos para garantir os direitos fundamentais de seus filhos enquanto outras, apesar da privação material que enfrentam, continuam se responsabilizando pela sobrevivência de seus filhos, ainda não foram suficientemente estudadas. No entanto, aqui também vale a observação de que a pobreza ou a privação material, das quais padece grande parte das famílias brasileiras, é insuficiente para explicar as razões que levam a padrões de comportamento tão distinto entre famílias de uma mesma classe social. Novos estudos nessa área são necessários para fundamentar a questão e para evitar o equívoco de culpabilizaras famílias que deixam seus filhos em abrigos. (SILVA, 2004, p.61).

O autor chama a atenção para essa prática de institucionalizar pelo

motivo das condições financeiras das famílias, levantando a questão de que

algumas famílias, mesmo passando por dificuldades, permanecem com seus

filhos, enquanto outras preferem deixá-los em abrigos para que eles tenham

52

acesso à condições básicas e consigam pelo menos se alimentar e estudar.

Rizzine (2004, p.78) concorda com Silva (2004) quando afirma que “Crianças

não deveriam ser institucionalizadas por serem pobres, mas ainda são”.

Ainda no contexto da institucionalização de crianças e adolescentes no

Brasil, Rizzini (2004) afirma que no período de 1980 essa prática começa a ser

questionada e protestada. O termo “internato de menores” ainda era usado

para se referir as instituições de acolhimento, fosse ele temporário ou

permanente. O período foi marcado por manifestações em defesa de uma nova

forma de realizar a política de internação, pois era um período de “transição

política rumo ao processo de redemocratização do país” (p.46). Houve nesse

momento a participação dos movimentos sociais organizados, o empenho de

profissionais de diversas áreas do conhecimento e também o protesto dos

meninos e meninas internados.

Conforme Rizzini esse movimento supracitado representou:

[...] Uma década de calorosos debates e articulações em todo o país, cujos frutos se materializaram em importantes avanços, tais como a discussão do tema na constituinte e a inclusão do artigo 227, sobre os direitos da criança, na Constituição Federal de 1988. Mas o maior destaque da época foi, sem dúvida, o amplo processo de discussão e de redação da lei que viria substituir o código de menores (1927 1979): o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). (RIZZINI, 2004, pp. 46-47).

O período marcado pela década de 1990 é destacado por importantes

modificações relacionadas com a proteção da criança e do adolescente. É

formidável salientar a inserção do artigo 227 para a constituição que enfatiza

que é dever da família, da sociedade e do Estado garantir o direito à saúde, à

vida, à alimentação, à educação, aos direitos básicos, assim como também à

proteção de toda e qualquer forma de discriminação, violência ou negligência

(BRASIL, 1998).

Estes avanços trouxeram mudanças significativas para eles,

transformando-os em um sujeito de direitos e logo em seguida, no ano de

1990, surge o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que lançou

53

estratégias na contra mão das antigas práticas de institucionalização da criança

e do adolescente e uma política de amparo integral.

Heleno (2010) faz algumas comparações em relação às mudanças

ocorridas depois do ECA, entre elas, está a questão de que a criança e o

adolescente devem ser resguardados, segundo prevê o artigo 101 do ECA.

Esse fato antes não era aceito, os menores eram percebidos como sujeitos de

direitos apenas quando realizava alguma infração e tinham como resultado

uma punição, outro fator importante era a questão das crianças abandonadas

pelos pais, órfãs ou aquelas que eram deixadas nos abrigos até completarem

maior idade porque os pais não tinham condições de criá-las.

Hoje, essa situação é um pouco diferente, pois a institucionalização é

revisada, segundo o ECA, a cada seis meses, uma vez que a equipe

interprofissional e multidisciplinar têm a responsabilidade de enviar relatórios

para a autoridade judiciária competente para que possam realizar a

reintegração da criança e do adolescente no seio da família ou em família

substituta, e a sua permanência em acolhimento institucional não pode

ultrapassar os dois anos, exceto quando apresentar uma necessidade

devidamente comprovada para a autoridade judiciária (BRASIL, 1990).

O ECA enfatiza com veemência a importância da convivência familiar e

afirma que a institucionalização, abrigos ou famílias substitutas é o último

recurso e que em casos nos quais a família não tenha recursos suficientes para

permanecer com seus filhos o governo é responsável de incluir essa famílias

nos programas de orientação e auxílio do governo (BRASIL, 1990).

Diante disso, Helano (2010) afirma que ainda existe um extenso

caminho a trilhar, pois muitas mudanças se realizaram apenas no campo da

teoria, da lei, mas infelizmente não foram completamente efetivadas como

deveriam. Ainda existe muito a se fazer e a realidade é que muitas crianças e

adolescentes ainda encontram-se institucionalizados, longe de suas famílias e

do afeto, em um momento tão crucial da vida, a fase do desenvolvimento.

54

Roman comenta sobre as implicações da institucionalização:

A respeito dos maléficos da institucionalização, verifica-se que, mesmo que se desenvolva uma boa relação entre os acolhidos e acolhedores, nomeadamente com os responsáveis pelo o estabelecimento, a relação será sempre sem vínculos afetivos seguros e com inegável estigma da institucionalização. (ROMAN, 2010, p.102).

Segundo o autor referenciado o ato de institucionalizar não causa bons

resultados, apesar de atualmente ainda ser a saída frequente para a crescente

demanda. Os relacionamentos, em sua maioria, são superficiais, sem vínculos,

já que eles não se sentem pertencentes àquele local e às pessoas, além de

afetar diretamente em seu desenvolvimento, pois como desenvolver e crescer

em um local que não é seu, com pessoas que não fazem parte de sua família,

pessoas que você não sabe se pode confiar, uma vez que o natural do ser

humano é ser assim, desconfiado e inseguro com o desconhecido, certamente

eles, as crianças e adolescentes, agem da mesma forma.

Pilloti Apud Roman ainda sobre a institucionalização complementa:

Acarreta mais danos que benefícios para a maioria das crianças internas, devido ao predomínio das características negativas no ser humano: impossibilidade de interação com o mundo exterior e consequente limitação da convivência social; invariabilidade de ambiente físico, do grupo de parceiros e das autoridades; planejamento das atividades externas das crianças, com ênfase na rotina e na ordem; vigilância contínua; ênfase na submissão, silêncio e falta de autonomia. (PILLOTI 1995, Apud ROMAN 2010; p. 102).

Quando o autor traz essa citação a qual fala que a institucionalização

traz mais perdas do que ganho, significa que esse processo não é totalmente

negativo, já que muitas crianças e adolescentes gostam de estar no abrigo,

pois neste local elas se alimentam, estudam, têm onde dormir e existem

pessoas responsáveis por elas, enfim, não estão nas ruas sofrendo os perigos

e a violência que a rua os destina.

Entretanto, percebemos o quanto a institucionalização é negativa no

sentido geral da vida de uma criança e adolescente, pois quando ela é

abrigada, mesmo que seja provisoriamente, conseqüentemente ela é privada

55

em muitos aspectos, uma vez que será submetida a regras, subordinação e a

rotina que deverá ser mantida por todos. Existe também a questão da

convivência social, pois eles passam a viver somente com as mesmas

pessoas, com o mesmo grupo de crianças, fazendo quase sempre a mesma

atividade, causando provavelmente neles a falta de interação com o ambiente

fora dos muros da instituição.

Diante disso, percebemos o quanto o Estatuto da Criança e do

Adolescente tem permanecido apenas em meras discussões e debates. Souza

Neto concorda quando diz que o que está escrito no Estatuto são:

Palavras belas, intenções corretas, propósitos louváveis, destinados a proclamar a doutrina da proteção integral no tocante aos direitos das crianças e adolescentes; mas que, quanto se sabe, nem de perto alcançaram, ainda, aqueles objetivos. (SOUZA NETO, 2001; p. 7).

Então, os desafios estão visíveis, ainda há muito que rever, pois a

criação do ECA foi um marco histórico para que fique apenas em meras

palavras e belos discursos. É necessário sair da visão imediatista, porquanto

não é dessa forma que o problema de institucionalizar crianças e adolescentes

será amenizado, muito menos resolvido. É preciso a ação do Estado e a

mobilização da sociedade para que as famílias dessas crianças se apoderem

do direito de criar seus filhos como qualquer outra família o faz.

Rizzini (2007) salienta que, nesse exato momento, existem muitas

crianças e adolescentes espalhados pela as ruas da cidade, de um lado para o

outro, dormindo por cima de papelões, pedindo nos sinais, tentando sobreviver

de qualquer forma, indo para abrigos, albergues, em fim, o histórico de idas e

vindas de instituições não são poucos, apesar da maioria desses meninos (as),

terem famílias.

A realidade é que alguns serão encaminhados para suas casas, suas

famílias, enquanto outros, em sua maioria, se conseguirem sobreviver às ruas,

serão constantemente conduzidos para as mais diversas instituições e nesse

percurso poderão não mais voltar para o seu ambiente familiar, já que entre a

rua e as instituições muitas situações podem acontecer, pois sabemos o

56

quanto eles correm perigo tanto na rua, que são os perigos relacionados à

violência, exploração sexual, drogas, entre outros, quanto aos problemas que a

institucionalização causa no desenvolvimento da criança e do adolescente.

Portanto, apesar das mudanças ocorridas no que se refere ao direito da

criança e do adolescente, esta prática de institucionalizar ainda permanece

presente, pois as modificações que o ECA exigiu em relação aos abrigos não

foram efetivadas completamente. Rizzini (2007) afirma que essa situação

apenas aumenta, pois as condições das famílias não são resolvidas e o “ciclo

vicioso” de institucionalizar crianças e adolescentes, considerando que a

família não possui recursos, apenas continua.

Em seguida, apresentamos os caminhos da pesquisa no qual iremos

conhecer o histórico da ONG Pequeno Nazareno, discutiremos as dificuldades

até chegar à instituição, assim como também traremos os relatos e análises da

pesquisa.

57

3. DESCOBRINDO NOVOS CAMINHOS: A TRAJETÓRIA DA PESQUISA

3.1 Construção da pesquisa

“A percepção do desconhecido é a

mais fascinante das experiências. O

homem que não tem os olhos abertos

para o misterioso passará pela vida

sem ver nada”.

Albert Einsten17

Neste trabalho realizamos uma pesquisa de cunho qualitativo, já que

tem a finalidade de compreender e apresentar a realidade dos sujeitos

participantes a partir de suas falas e comportamentos. De acordo com Minayo

(2007, p. 21) “A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares [...]

ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das

crenças, dos valores e das atitudes”. Sendo assim, é possível adentrar ao

mundo real dos sujeitos e interpretar os fatos ocorridos em suas vidas para

compreender a realidade.

Quanto ao tipo de pesquisa, nesse trabalho utilizamos a explicativa, a

qual, segundo Gil tem como princípio perceber os fatores causados por

determinados acontecimentos, ou seja, está interessada nas causas que

contribuem para a ocorrência dos fenômenos, além de ser “o tipo de pesquisa

que mais aprofunda o conhecimento da realidade, porque explica a razão, o

porquê das coisas” (GIL, 2011, P. 28).

Durante essa pesquisa também foi realizado um levantamento

bibliográfico com o objetivo de nos aproximarmos dos autores que tratam da

temática escolhida. Nesse sentido, Gil (2011) afirma que a pesquisa

bibliográfica é realizada a partir de materiais já expostos e compostos,

17

“Albert Einstein foi um físico teórico alemão. Publicou mais de 300 trabalhos científicos, juntamente com mais de 150 obras não científicas. Suas grandes conquistas intelectuais e originalidade fizeram a palavra “Einstein” sinônimo de gênio”. Disponível em http://pt.wikipedia.org/Albert_Einstein

58

sobretudo por livros e artigos científicos, dessa forma é possível aderir

conhecimentos e fundamentar a pesquisa através de determinados autores, a

fim de neutralizar nossa opinião e pensamento em relação ao tema. Também

fizemos uso da pesquisa documental, já que durante a pesquisa descrita no

corpo do texto, utilizamos algumas legislações, como o Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA) e a Constituição Federal de 1988.

Para Gil (2011) a pesquisa documental se assemelha a bibliográfica

tendo como diferença “a natureza das fontes”. Além disso, o trabalho teve

também a observação simples que cooperou bastante para que pudéssemos

compreender os sujeitos da pesquisa, pois é possível analisar de maneira

natural os acontecimentos, sem que eles notem que estamos observando-os.

Para que as entrevistas fossem analisadas foi utilizada a técnica análise

de conteúdo. Sobre essa técnica, Caregnato e Mutti afirmam que:

A maioria dos autores refere-se a AC como sendo uma técnica de pesquisa que trabalha com a palavra, permitindo de uma forma prática e objetiva produzir inferências do conteúdo da comunicação de um texto replicáveis ao seu contexto social. Na AC o texto é um meio de expressão do sujeito, onde o analista busca categorizar as unidades de texto (palavras ou frases), que se repetem, inferindo uma expressão que as representem. (CAREGNATO, MUTTI, 2006; p. 682).

Portanto, através dessa técnica iremos analisar as falas dos sujeitos

entrevistados, identificando-as por categorias, observando-as no que se

repetem e no que diferem uma das outras e também perceber o que está por

trás das falas, fazendo assim, uma possível análise a fim de alcançar o objetivo

proposto já supracitado.

Neste trabalho também realizamos o uso da pesquisa de campo que, de

acordo com Minayo (2007), “[...] permite a aproximação do pesquisador da

realidade sobre qual a formulou uma pergunta, mas também estabelecer uma

interação com os “atores” que conformam a realidade [...]”. A pesquisa de

campo promove essa aproximação com o sujeito estudado, facilitando assim a

articulação com as teorias estudadas, além de nos aprofundar ainda mais na

realidade dos pesquisados.

59

Antes de ter acesso à instituição, foi feito o pedido de um ofício para a

Faculdade Cearense, a fim de facilitar o acesso para a realização da pesquisa

no intuito de oficializar a ação. A administração do Pequeno Nazareno fica

localizada no centro da cidade de Fortaleza. Depois de uma reunião com o

coordenador responsável recebemos a autorização para que fossem feitas

visitas à instituição com a finalidade de realizar a pesquisa. Essa reunião com o

coordenador foi marcada previamente e durante ela conversamos sobre os

objetivos da pesquisa e como pretendíamos realizá-la. Deixamos acordado

que, como se tratava de adolescentes, seria necessário que o próprio

coordenador pudesse apreciar o roteiro de entrevista (ver apêndice B) antes de

iniciá-la.

Então, de acordo com o combinado, antes de ir a campo retornamos à

administração da ONG com o roteiro de entrevista, o ofício e o termo de

consentimento para que ele pudesse assinar como responsável pelos

adolescentes, só depois desse processo foi possível iniciar a pesquisa de

campo. No próximo tópico iremos finalmente nos aproximar dos sujeitos da

pesquisa e conhecer as dificuldades encontradas no caminho para chegar até

eles.

3.2 Adentrando o desconhecido

A primeira visita a ONG o Pequeno Nazareno, foi repleta de aventuras e

desafios, uma vez que a instituição situa-se na cidade de Maranguape-Ce,

sendo assim, um pouco distante para chegar até o local da pesquisa. Para ir de

Fortaleza até as instalações da ONG na região metropolitana da cidade são

necessárias três conduções. Por motivos de segurança, essa pesquisadora foi

acompanhada até o local da pesquisa. Por ser um local distante e também por

motivo de segurança, optei em levar uma pessoa para me acompanhar nessa

aventura. Vale ressaltar que a alguns anos atrás, em grupo, visitamos a ONG

também com fins acadêmicos, nessa ocasião o acesso foi por meio de veículo

60

particular. Sendo assim, não houve maiores dificuldades em chegar ao local

destinado.

Dessa vez, estávamos voltando ao mesmo local, mas não era mais em

grupo, mas nos encontrávamos numa cidade para nós desconhecida, mas

ainda assim, estávamos lá, enfrentado o medo do desconhecido. Nosso

objetivo para o trajeto era ir até o local que dá acesso ao Sítio o Pequeno

Nazareno via transporte público alternativo, já que esse transporte não tinha

itinerário que contemplasse as dependências do sitio, por isso desse ponto

continuaríamos de taxi. No entanto, nosso planejamento foi frustrado uma vez

que não haviam taxis na estrada. Sendo assim, optamos por caminhar até o

local específico.

Não sabemos informar exatamente à distância em quilômetros, mas

ficou evidente que se trata de um longo percurso, sobretudo pelo tempo de

caminhada feito até o local da pesquisa. Depois de muito andar, muito sol e

muita sede, finalmente conseguimos chegar à instituição.

Como o local é muito amplo e não sabíamos onde a Assistente Social

responsável pela visita estava, entramos em contato com a referida e ela logo

veio ao nosso encontro. A Assistente Social foi bem receptiva e antes de

realizar a pesquisa quis saber um pouco mais sobre o trabalho que estávamos

fazendo. Foi um momento agradável, objetivo, onde não apenas ela, mas a

psicóloga que estava presente esclareceram algumas informações sobre os

adolescentes e se dispôs a apoiar-nos durante as entrevistas, no sentido de

orientar e chamar os adolescentes para o local que seria realizada as

entrevistas, etc. Depois, a Assistente Social nos direcionou para a área externa

do sítio e disse que nós poderíamos ficar a vontade para conhecer o mesmo e

também para nos aproximar dos adolescentes.

Fomos à procura deles e logo avistamos um grupo onde todos estavam

em cima de uma árvore tirando manga e logo que nos viram ficaram nos

observando, uns se aproximaram, outros acenaram com a mão e sorriram.

Iniciamos um diálogo com eles, perguntamos os nomes, a idade, para que

61

pudéssemos nos aproximar um pouco mais daqueles que seriam os supostos

sujeitos da nossa pesquisa.

A pesquisadora se apresentou como estudante de Serviço Social e foi

comunicado que haveria outras visitas para a realização efetiva da pesquisa e

que alguns desses adolescentes seriam convidados a participar das

entrevistas. Esse foi um dia muito rico, pois pode-se obter uma aproximação

com os adolescentes, observando, conversando, almoçando com eles, ou seja,

foi criado um vínculo com alguns deles.

A técnica utilizada durante essa pesquisa foi a entrevista semi-

estruturada, acompanhada de um roteiro que consiste de perguntas abertas a

fim de nortear a fala dos entrevistados. Conforme Minayo (2007, p. 64) a

entrevista semi-estruturada “[...] combina perguntas fechadas e abertas, em

que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema em questão

sem se prender à indagação formulada”. A entrevista semi-estruturada leva o

entrevistado a não se prender a pergunta que lhe foi feita, além de ter a

possibilidade de adentrar em assuntos que não estava no roteiro de entrevista.

Ainda sobre entrevistas, Goldenberg (2004) deixa uma observação dizendo

que o pesquisador precisa organizar um roteiro claro e objetivo a fim de não

perder o foco nas questões que são importantes e fazem parte dos seus

objetivos.

Sobre o registro das entrevistas Gil enfatiza que:

A gravação eletrônica é o melhor modo de preservar o conteúdo da entrevista. Mas é importante considerar que o uso do gravador só poderá ser feito com o consentimento do entrevistado. O uso disfarçado do gravador constitui infração ética injustificável. (GIL, 2011, p. 119).

As entrevistas foram todas registradas através de um gravador, mas

antes de iniciá-las foi perguntado individualmente se poderia ser gravado e

também foi explicado o termo de consentimento18. Sendo assim todos os

18

O termo de consentimento continha os objetivos da pesquisa. No corpo do texto eu me comprometia com os adolescentes pesquisados que eles não seriam identificados, os mesmo assinavam duas vias do

62

entrevistados assinaram o termo e autorizaram a gravação da entrevista sem

nenhuma resistência.

As entrevistas foram realizadas em novembro de 2013 e todas

aconteceram dentro de uma sala de aula desocupada. Como os adolescentes

estavam muito eufóricos, correndo do lado de fora da sala, não foi possível

manter o silêncio, mas em nenhum momento fui interrompida por eles, exceto

um deles que pediu licença e entrou para entregar um caju que ele havia

colhido naquele instante. Fora da sala ficava um educador social que era

responsável pelo grupo.

Os adolescentes no início apresentavam muita timidez, mas depois

ficavam mais a vontade para responder as perguntas e falar até sobre

situações de suas vidas que não lhes foram perguntadas, ao passo que outros

responderam apenas o necessário, mesmo sendo instigados a falar. Os

critérios utilizados para selecionar os participantes da pesquisa era a idade,

entre 12 a 14 anos, e o tempo de instituição, mas como o número de

adolescentes era bem reduzido, então prevaleceu apenas o critério da idade,

ressaltando que os adolescentes entrevistados estavam entre doze e treze

anos de idade, já que ao completar a idade de quartoze anos eles são

encaminhados para Fortaleza com o objetivo de inseri-los em cursos

profissionalizantes.

Foram entrevistados onze adolescentes, sendo o total de crianças e

adolescentes assistidos pela ONG de trinta e um, portanto esse número de

participantes representaria uma quantidade significativa. O tempo das

entrevistas durou entre oito e vinte e cinco minutos. É importante enfatizar que

dentre as onze entrevistas duas não foram tão exploradas quanto às outras, já

que os sujeitos entrevistados não atenderam aos objetivos da pesquisa. A

seguir iremos conhecer um pouco da história da ONG o Pequeno Nazareno,

como se iniciou, como é sua estrutura física e etc.

Termo afirmando que permitiu ser entrevistado, assim como também aceitou que elas fossem gravadas. Uma via permanecendo comigo e a outra na Instituição com os profissionais responsáveis.

63

3.3 Conhecendo a Instituição

O cenário da pesquisa foi a instituição o Pequeno Nazareno19, situada

em Maranguape-Ce, no bairro Sapupara S/N. É uma Organização não

Governamental (ONG), sem fins lucrativos e trabalha especificamente com

crianças e adolescentes em situação de moradia nas ruas praticamente há

dezesseis anos. Foi fundada oficialmente no dia 07 de abril de 1998. O seu

atendimento é em Fortaleza e Recife e tem militância em todo o Brasil e na

Europa.

A sua missão é acolher crianças e adolescentes em situação de moradia

nas ruas, contribuir na construção de seus projetos de vida, reatando o vínculo

familiar e comunitário, buscando a garantia dos direitos fundamentais, e a

inclusão social das famílias, visando uma sociedade justa e solidária. E sua

visão é desenvolver um trabalho de excelência na inclusão social de crianças e

adolescentes em situação de moradia nas ruas e de suas respectivas famílias.

A instituição nasceu através da indignação de um homem que morava

na Alemanha, ele se chama Bernad Josef Rosemeyer, mas atende pelo o nome

de Bernardo.20 Está há quase vinte anos na luta pela conquista dos direitos e

de uma vida melhor para as crianças e os adolescentes em situação de

moradia nas ruas. Chegou ao Brasil no ano de 1986, de família pobre,

trabalhava fazendo de tudo um pouco. Aos vinte e dois anos despertou nele um

grande interesse nas questões relacionadas com injustiças sociais, ele disse

que sentiu que seria o despertar de uma vocação. Ele conheceu uma pessoa

que estudou teologia aqui no Nordeste, ele era franciscano; então ele se

interessou e entrou na ordem dos franciscanos que se situava aqui na região

Nordeste, começou a estudar em Recife e foi justamente lá que, pela a primeira

vez, ele viu crianças morando nas ruas. Para ele isso foi um choque, pois uma

19

Disponível em: www.opequenonazareno.org.br/visao.html acesso em 12 de dezembro de 2013. 20

Disponívelem:www.opovo.com.br/app/opovo/paginasazuis/2013/10/14/noticiasjornalpaginasazuis,3145620/sobre-nao-desistir-do-outro.shtmlacesso em 20 de dezembro de 2013.

64

das primeiras cenas que presenciou foi de crianças catando lixo à procura de

comida.

Durante algum tempo ele se aproximou dessa realidade, conversava

com essas crianças, criava vínculos. Por falta de tempo deixou o curso de

teologia, mas permanecendo ainda ligado a Ordem Franciscana. Decidiu vir à

cidade de Fortaleza para estudar direto e também se valeu desse tempo para

observar a realidade das crianças e adolescentes aqui de Fortaleza. Através do

convívio com eles, mesmo nas ruas, Bernardo vivenciou a perdas de algumas

crianças e adolescentes de maneira horrenda. A mais marcante foi a de um

garoto que queria ajudar tirando das ruas, então pediu para uma pessoa que

ele conhecia para que o menino pudesse ficar na Paróquia do Otávio Bonfim

por um período, mas lá ele permaneceu pouco tempo e logo quis voltar para as

ruas, em seguida esse jovem se envolveu numa briga, com uma garrafa de

vidro quebrada, o menino foi ferido de baixo para cima, felizmente ele foi

operado e sobreviveu, mas esse episódio deixou Bernardo inconformado com

essa triste realidade de ter crianças e adolescentes morando nas ruas.

Nesse mesmo período Bernardo recebeu um telefonema de seu irmão, o

informando que tinham pessoas na Alemanha que queriam ajudá-lo,

prontamente ele falou que desejava uma casa. E foi assim que comprou uma

casa na Rua Senador Alencar, 1324, no Centro e logo depois veio o Sítio em

Maranguape-Ce como já foi supracitado.

A estrutura física do sítio21 é muito ampla, com vasta área verde, belas

paisagens arborizadas e tem capacidade para acolher 120 crianças e

adolescentes, mas atualmente22 encontra-se apenas com 31. O sítio tem sete

casas, cada uma tem o nome de uma fruta, mas apenas três estão ativas: a

casa sede (a primeira casa), a mangueira e a sapoti. Cada casa é composta

geralmente de seis ou sete quartos, em cada um deles dormem duas ou quatro

crianças. Os espaços físicos têm em sua estrutura uma escola em que

21

Disponível em htpp//www.opequenonazareno.org.br/acolhimentoinstitucional.html acesso em 23/12/2013 22

As informações atuais foram enviadas via e-mail por uma profissional da instituição e as demais estão no site ONG.

65

funcionam três séries (2º, 3º e 4º ano) quadras poliesportivas cobertas, um

campo de futebol, pista de skate, auditório, refeitório, piscina, almoxarifado,

farmácia, sala do coordenador, sala das técnicas e a casa do presidente da

instituição.

Figura 1 – Visão aérea do sítio o Pequeno Nazareno

Fonte: Site do Pequeno Nazareno

A diretoria é formada pelo presidente da instituição, tesoureiro, secretária

e o conselho fiscal composto por três pessoas. A equipe do sítio é constituída

por seis mães e pais sociais (são os educadores sociais), cada um deles é

responsável por determinado grupo de acordo com a faixa etária, dois

professores, um motorista, duas cozinheiras, o coordenador e duas técnicas

(Assistente Social e Psicóloga). A instituição também tem um programa

chamado “Projeto Gente Grande” 23 que tem parceria com o ministério de

trabalho e também possui o curso de áudio visual do projeto “Luz, Câmera e

Ação” que é patrocinado pela Secretaria de Cultura do Estado do Ceará

(SECULT) e conta com o apoio de mais de sessenta empresas em Recife e

Fortaleza.

Os adolescentes ao completarem 14 anos são inseridos nesses

programas de profissionalização, assim como seus irmãos que tem a mesma

faixa etária também usufruem dessa oportunidade. Eles se preparam para o

23

Disponível em http>www.opequenonazareno.org.br/profissionalizacao.html

66

mercado de trabalho através de cursos como: informática, técnico em venda,

auxiliar administrativo e áudio visual, além de ter palestras sobre ética e

postura profissional.

A partir de agora será conhecido os sujeitos da pesquisa. Onde eles

moram, como são suas famílias, qual sua idade, o que pensam. Em fim, como

são suas vidas.

3.4 Quem são esses adolescentes?

Foram entrevistados onze adolescentes na idade entre 12 e 13 anos e

que estão institucionalizados na ONG o Pequeno Nazareno. Para que suas

identidades fossem mantidas em sigilo apresentamos os perfis através de

nomes fictícios. Com exceção do entrevistado Caio, que mora em Várzea

Alegre, interior do estado, os demais entrevistados residem em Fortaleza-Ce.

DAVI

Davi, 12 anos, reside no bairro Rosa Linda com sua mãe, seu pai e mais

quatro irmãos. Antes de ir para o abrigo tinha parado de estudar, atualmente

cursa a 4º ano, quando questionado sobre suas crenças religiosas, ele

responde que é a capoeira. Davi, apesar de ser um pouco tímido ao falar de

sua história é um menino muito comunicativo e brincalhão e o que ele mais

anseia na vida é ser cantor de “funk”. Demonstra pouco interesse em sua

família, mas gosta muito do seu irmão de onze anos, porém sua companhia

principal era o primo que o acompanhava para qualquer lugar.

Saiu de casa aos 10 anos por vontade própria, mas passando alguns

dias voltava a casa, depois de um tempo saía para as ruas novamente. Davi

roubava para manter o vício da maconha e cocaína, porém para se alimentar

67

pedia nos sinais. Já sofreu tentativa de abuso sexual por um homem. Ficava

preferencialmente no centro da cidade de Fortaleza.

BRUNO

Bruno, 13 anos, reside no bairro Conjunto Esperança com seus pais e

irmãos, antes de ir para o abrigo tinha parado de estudar, mas atualmente faz o

4º ano e não tem religião. Antes de ir para o Pequeno nazareno, ele já tinha

passado por mais três instituições de acolhimento. Bruno é um menino muito

tranquilo, apresenta uma boa comunicação, sonha em ser jogador de futebol.

Ao falar de sua família demonstra amor e muita saudade, apesar de ter saído

de casa por conflitos familiares.

Não lembra a idade com que saiu de casa, mas recorda que saiu porque

sua mãe sempre o mandava pedir nas ruas e seu pai lhe batia. Nas ruas ele

pedia para poder se alimentar, afirma ter roubado apenas uma vez em um

mercantil, e nunca usou drogas, mas assim que chegou às ruas para pedir

sofreu agressão física de outra pessoa que já estava mais tempo que ele

naquele local, era como se ele estivesse invadindo o espaço do outro.

Costumava ficar na Beira-Mar por ter maior fluxo de pessoas para pedir.

LUCAS

Lucas, 13 anos, reside no bairro Bom Jardim com seu pai, mãe e onze

irmãos. Antes de ir para a instituição fazia a 2ª série, atualmente faz o 4º ano,

vendia merenda com seu pai nas ruas, não tem religião. Já passou por outro

abrigo antes do Pequeno Nazareno. Lucas é um menino muito calmo e

receptivo e ao se reportar a sua família ele demonstra muita preocupação,

principalmente com seus irmãos que estão envolvidos com drogas. Seu maior

desejo é que eles deixem de ser usuários.

A sua ida para as ruas foi por conflito com o pai e também por falta de

alimentação em casa, então ia para as ruas pedir e com o dinheiro que

ganhava comprava alimentação. Começou a usar drogas com apenas sete

68

anos, depois que ficou viciado no crack, o dinheiro que conseguia era somente

para o vício. As drogas usadas por ele eram maconha, cola, solvente e aranha.

Ele também roubava para manter o vício. Nas ruas já sofreu violência física dos

guardas nos terminais porque ele estar pedindo, já fugiu algumas vezes da

instituição, quando saía logo ia ao terminal do Siqueira em busca de drogas. O

terminal era o local em que ele permanecia, pois tinha muitos conhecidos e

havia um grande fluxo de pessoas.

HIAGO

Hiago, 13 anos, reside no bairro Jardim Iracema, filho de pais separados

mora com a avó, seu irmão de dez anos e o pai, mas foi criado pela avó

paterna desde os seus dois meses de nascido. Os seus outros dois irmãos

moram com sua outra avó materna. Estudava, mas por causa das drogas

desistiu na 2º série, atualmente faz o 4º ano e também não tem religião. Antes

de vir para o Pequeno Nazareno passou por três abrigos. Durante a entrevista,

Hiago manteve a cabeça baixa, demonstrava um semblante sério e frio ao falar

de sua vida. Sua família mora em um barraco, sua avó cata latinhas para

sustentar a casa, seu pai é usuário de cocaína e geralmente o agride

fisicamente.

Saiu de casa aos dez anos em decorrência de conflitos com o pai, nas ruas

roubava, chegou a sofrer violência física por policiais, usava drogas,

principalmente cigarro, maconha e cocaína. Para manter o vício ele praticava

roubos e traficava, além de ter cometido uma tentativa de homicídio. Um dos

fatos mais marcantes em sua vida foi a morte do seu amigo, morto a tiros em

sua presença. Hiago, mesmo com seu semblante sério e frio, tem um carinho

enorme por sua avó e sempre enfatiza querer ajudá-la para que ela não

trabalhe mais nas ruas e que seu pai se interne em uma clínica de

recuperação. Pouco fala a respeito da mãe. O local que costumava ficar era na

rua Vila Velha, na Barra do Ceará, pois conhecia alguns amigos e também

tinha uma namorada.

69

LUCIANO

Luciano, 13 anos, filho de pais separados, reside no bairro Papicu com sua

mãe e seus três irmãos. Estudava, mas pouco ia à escola. Atualmente faz a 4º

ano e não tem religião. É a primeira vez que está em um abrigo. Luciano,

durante a entrevista, se mostrou muito à vontade em falar dos fatos que

aconteceram em sua vida, sempre atento ao que lhe perguntava e muito

simpático. Sua maior vontade é ajudar sua família e realizar o sonho de ser um

cientista.

Saiu de casa aos 12 anos após a separação dos seus pais, mas o maior

motivo foi as drogas. Depois da separação foi morar com o seu pai, que é

usuário de drogas e acabou se envolvendo com um primo que era traficante,

dessa forma o uso das drogas ficou mais intenso, além de começar andar

armado e praticar roubos junto com esse primo. Ele não permaneceu com seu

pai, foi para as ruas e adentrou o mundo do crime, presenciou a quase morte

de um tio a facadas, vendia drogas e ganhava R$ 200,00 por semana e assim

sobrevivia nas ruas. O local que frequentemente ficava era nas proximidades

do Barroso II por ser mais próximo da casa de seu pai.

ARIEL

Ariel, 13 anos, reside no bairro Siqueira com a mãe, pai e os irmãos.

Perguntamos quantos eram, mas ele não conseguiu definir a quantidade, pois

são muitos, no entanto acha que são oito irmãos. Seu pai é usuário de drogas

e bate em sua mãe. Antes de ir para o Pequeno Nazareno tinha parado de

estudar, mas atualmente faz o 4º ano, às vezes ia a uma igreja evangélica.

Vendia bombons nas ruas e já passou por dois abrigos.

Ele é um menino cheio de energia, gosta muito de brincar, fala bastante,

se irrita com facilidade e sente dificuldade de recordar rapidamente do que

aconteceu em sua vida, mesmo que seja um fato recente. Quando fala em sua

família ele fica emotivo, pois sente muita saudade e deseja muito um dia dar

uma casa melhor para sua mãe. Foi para as ruas porque não gostava de ficar

70

em casa, pois se sentia desconfortável, já que a casa só possuía dois cômodos

e também porque sofria agressões por parte do pai. Sofria também com

ameaças do seu irmão que o obrigava ir ás ruas conseguir lanches para ele.

Ariel usava drogas, roubava, e pedia, no entanto no que ele mais comprava

com o dinheiro era alimentação. O local que ele ficava para sobreviver era o

terminal do Siqueira por ser próximo de sua casa.

CAIO

Caio, 13 anos, filho de pais separados, reside no interior do Ceará,

Várzea Alegre, com sua mãe e mais cinco irmãos. Antes de ir para o Pequeno

Nazareno já estudava, atualmente faz a 3º ano, não tem religião e já passou

por três instituições antes da atual. Durante quase toda entrevista ele puxava

um carrinho de brinquedo no chão, de vez em quando olhava timidamente para

a pesquisadora. Quando ele estava em Várzea Alegre costuma estar nas ruas,

já que sua mãe o mandava pedir e se ele voltasse para casa sem nada, ele

apanhava, em razão disso, muitas vezes preferia permanecer nas ruas.

Durante a maior parte do tempo ficava na rodoviária da cidade.

A história de Caio é gravemente marcada pela violência física praticada

por seus pais. Saiu definitivamente de casa aos sete anos após chegar a sua

casa de mãos vazias e ser pendurado em um armador pela sua mãe. Ao relatar

esse fato ficou muito emotivo e com os olhos lacrimejando. Depois desse

ocorrido, seu pai foi buscá-lo para morar em Fortaleza, mas ele não queria ir.

Ainda assim, seu pai o obrigou deixando sua mãe chorando. O motivo para a

resistência de Caio se deu pelo fato de seu pai ser viciado em cocaína e por

costumeiramente o agredir. Quando chegou a Fortaleza, Caio começou a usar

crack, roubava mercantis e vendia a mercadoria roubada para comprar drogas.

Foi ameaçado por traficantes, por não pagar pelas drogas consumidas. O local

que passava a maior parte do tempo nas ruas de Fortaleza era na praia do

Futuro e na Beira-mar, já que nesses locais o fluxo de pessoas é intenso.

71

DANIEL

Daniel, 13 anos, filho de pais separados, reside no bairro Jangurussu,

mora com sua mãe, seus três irmãos e a namorada de um desses irmãos.

Antes já estudava, mas parou por causa das drogas, atualmente faz a 3º ano,

não tem religião e já passou por um abrigo antes do Pequeno Nazareno. Daniel

aparenta ser um menino sério e pouco comunicativo. Quando falamos em

família ele enfatiza que gosta muito dos seus dois irmãos, pois eles os ajudam

muito, mas nunca esquece o dia em que presenciou um de seus irmãos sendo

ameaçado de morte dentro de casa, por causa de drogas, foi necessário que a

família mudasse de casa. Mesmo diante dessa realidade, Daniel tem muita

esperança de um dia poder ajudar sua família e ter uma vida melhor.

Foi para as ruas com 10 anos, pois esperava ter seu próprio dinheiro

para comprar o que queria, já que sua mãe trabalhava como faxineira e não

tinha condições de comprar o que ele desejava. Daniel e seus irmãos

passavam o dia em casa sozinhos e, na maioria das vezes, não tinham o que

comer. Nas ruas trabalhava limpando carros. Já roubou duas vezes e utilizou

solvente como droga, era pedinte e já foi violentado nas ruas fisicamente por

policiais. O local que Daniel costumava estar ficava nas imediações de um

posto de gasolina no José Walter, pois era melhor de pedir, já que tinha um

grande número de restaurantes e mercantis por perto.

HENRIQUE

Henrique, 12 anos, filho de pais separados, reside no bairro Parque

Santa Maria, com sua mãe e seus três irmãos. Sua mãe é usuária de crack e

seu pai chegou a usar também, mas parou recentemente. Antes de ir para o

abrigo estudava e atualmente faz a 3º ano, não tem religião e já passou por

dois abrigos. Em casa sofria violência física por parte da sua mãe. Ela o fazia

ficar apenas com as roupas de baixo e o agredia com corda e cinturão. O

adolescente diz nunca se esquece disso.

72

Henrique é apenas um menino, mas em algumas situações ele aparenta

ter muita maturidade e ao mesmo tempo age por impulso. Em virtude disso, em

umas vezes que fora agredido por sua mãe, num momento de muita raiva

queimou o sofá de casa. Ele também ficava muito chateado quando sua mãe

usava droga dentro de casa e ainda trazia outros usuários com ela. Nessas

ocasiões ele expulsava a todos e, quando sua mãe vinha brigar, ele preferia

sair para as ruas a ficar em casa vendo aquela situação ou tendo discutindo

com ela. Saiu de casa aos oito anos por conflitos constantes com sua mãe

recebendo incentivo por parte do irmão mais velho que por vezes, sem ter o

que fazer dentro de casa nem o que comer, o chamava para pedir nas ruas.

Não usou drogas ilícitas, mas por um curto período de tem fumou cigarro. O

local que ele tinha preferência em ficar era uma praça nas proximidades de sua

casa, já que todos o conheciam.

EDUARDO

Eduardo, 13 anos, filho de pais separados, reside no bairro Conjunto

Ceará com sua avó, tio e pai. Comenta que sofreu muito com a separação de

seus pais. Começou a estudar quando chegou ao abrigo, atualmente faz a 7º

série, fora da instituição, o transporte do abrigo vai deixar e buscar. A sua

religião é católica.

Eduardo está no abrigo há seis anos, sente muitas saudades de sua

mãe e também muita tristeza por não estar vivendo com sua família. Ele diz

que não gosta do marido de sua mãe, pois ele batia nos seus irmãos. Relata

nunca ter usado drogas, nunca roubou, apenas era muito inquieto dentro de

casa, não ficava parado nenhum momento. Ele disse que por causa disso sua

mãe decidiu levar ele para o Pequeno Nazareno. Ele parecia não querer

aprofundar a sua história de vida, tudo que lhe era perguntado ele respondia

superficialmente de forma muito objetiva e quando aprofundava a pergunta

para tentar entender melhor o que me dizia, ele ficava calado, olhando sempre

para outros lugares, desatento, como se não quisesse responder mais.

73

THALES

Thales, 13 anos, filho de pais separados, reside no Bom Jardim com sua

avó e tio. Antes de ir para o abrigo fazia a 3º série, atualmente faz o sétimo ano

em uma escola fora do abrigo, o transporte vai buscar e deixar. Não tem

religião, antes de estar no atual abrigo ele já passou uma vez por outro, mas foi

pouco tempo. Thales, é muito sereno, fala pouco, demonstra muita timidez.

Quando se trata de família ela ressalta o amor que ele tem por sua avó, pois

ela o criou desde pequeno e quanto a sua mãe ele não mantém nenhum

contato com ela, pois mora no Aracati e em relação ao seu pai ele nunca o

conheceu.

Saiu de casa aos nove anos, pois não suportava mais sofrer agressões

físicas praticadas por seu tio. Ficava a maior parte do tempo no polo de lazer,

mas foi por pouco tempo, pois foi abordado por educadores sociais e o levaram

para um albergue, mas neste local ele apenas se alimentava e depois podia

sair e logo depois foi chamado para ir para o Pequeno Nazareno.

3.5 Relatos e análises

Após analisar os perfis e também as respostas dos entrevistados é

possível identificar prováveis resultados em relação aos objetivos propostos da

pesquisa, assim como o objetivo geral que é compreender as motivações que

levaram os adolescentes da ONG o Pequeno Nazareno a morar nas ruas de

Fortaleza.

3.5.1 Percepção de adolescência para os entrevistados

Em relação à categoria adolescência notam-se algumas semelhanças

nas respostas. Durante as entrevistas percebe-se que eles demonstram um

pouco de dificuldade em falar sobre essa fase, mas em geral eles respondem.

74

Para apresentar o que eles pensam sobre essa fase trazemos respostas de

alguns deles: “Fazer o que é certo, estudar, trabalhar” (LUCAS). “É começar a

estudar, se interessar nos estudo e alguma coisa pra fazer, é quando a pessoa

começa a trabalhar já também” (LUCIANO). “Respeitar os mais velho, ajudar

as família, é quando chegar à idade certa, trabalhar” (CAIO). “Ser uma pessoa

boa, estudar bem muito e trabalhar” (VÍCTOR). “Pensar no futuro, estudar,

fazer faculdade” (EDUARDO). “Quando a pessoa tá ficando [...] tá se

desenvolvendo” (BRUNO).

É dos doze pra cima né não? É trabalhar, trabalhar e brincar também, só que adolescente a pessoa vai fazer uma coisa a mais, trabalhar [...] vai ter que cuidar da casa, vai fazer isso, aquilo, fazer as compra. A minha adolescência foi boa, ruim, terrível, foi tudo isso. Porque tem as vez que eu gosto tem vez que eu num gosto, tem vez que sinto raiva tem vez que num sinto. (ARIEL).

Pra mim é... Ser adolescente é que a gente pensa que quando a gente é menor a gente pode robar, matar que num vai preso, mais um dia vai. Quando ficar maior ai fica marcado na polícia. [...] adolescente é ter uma vida melhor, brincar enquanto é pequeno porque quando é maior é só trabalhar é cuidar da família. (HIAGO).

Para a maioria deles, ser adolescente é estudar, trabalhar, ir à busca de

uma vida melhor, adquirir melhores condições financeiras. De todas as falas

citadas acima apenas uma não falou em trabalhar, mas em apenas estudar.

Portanto, a repetição dessas falas faz com entendamos que a visão deles

quanto à adolescência se fixe prioritariamente ao trabalho, em ajudar sua

família a sobreviver nas supostas condições precárias. Destaco entre eles

Bruno, Ariel e Hiago.

O Bruno traz a questão do desenvolvimento,o qual podemos relacionar

com o próprio ECA (1990) no artigo 6º que afirma que a criança e o

adolescente é uma pessoa em desenvolvimento. Enquanto Ariel apresenta

características típicas dessa fase: confusão de sentimentos, inquietude, não

conseguindo definir com certeza o que sente, mostra diversas definições, entre

elas a questão da responsabilidade que, na visão dele, o adolescente precisa

ter e essa visão se traduz em uma de suas falas quando diz que quando se é

adolescente “vai ter que cuidar da casa”. Já a fala de Hiago traz uma

75

concepção bem diferente de todas, além dele ter mencionado as mesmas

definições ao final de sua fala menciona o fato de ter que trabalhar. Ele nos

define adolescência ao afirmar que adolescente “pode roubar que não vai

preso”.

Percebe-se no relato de Hiago o tipo de adolescência que esse menino

está vivenciando, pois a primeira situação que lhe vem a memória é roubo e

prisão, ou seja, é a partir desses fatos que ele conceitua a adolescência.

Segundo a sua fala, de início ele não consegue representar essa fase como

uma etapa de conquistas, aprendizados, em fim, ele simplesmente marca a

adolescência a partir do momento em que já pode ser preso ou ser fichado pela

polícia.

Diante desses relatos Salum afirma que:

A adolescência é uma época de incertezas, indefinições, de busca de autoafirmação e de pertencimento, enfim, de angústias [...] Dessa forma, eles furtam, muitas vezes para pertencer a um grupo; agridem, sobretudo, para se afirmar e se defender. (SALUM, 2010; p. 61).

O autor supracitado se aproxima dos relatos dos sujeitos quando diz que

a adolescência é marcada por incertezas e indefinições, pois a fala de um dos

adolescentes traz visivelmente essa questão; logo em seguida foi destacado o

menino Hiago que relata sobre roubar na adolescência e o autor em questão

mostra que é uma forma de se afirmar, ou seja, de se sentir reconhecido diante

da sociedade que, muitas vezes, não o enxerga.

3.5.2 A trajetória de casa para a rua

Para um adolescente sair de sua casa e ir morar nas ruas, ou

simplesmente passar uns dias e depois voltar, sempre haverá um motivo, um

fato ocorrido, uma situação desconfortável na qual os levam a fazer escolhas,

na maioria das vezes, trágicas que resultam em rompimento familiar, uso de

76

drogas, etc. Para exemplificar, nada melhor do que trazermos as falas dos

entrevistados relatando o motivo que, infelizmente, os levaram para as ruas.

“Teve um dia que eu sai, fugi de casa e voltei mais não [...] tava

cansado de viver lá [...] eu ficava só saindo de casa ai eu fui e fiquei logo lá [...]

meu pai me batia”. (BRUNO). “Eu num gosto se num tem nada pra mim comer

em casa é o jeito fazer outra coisa, vou pra rua”. (Henrique).

Meu tio pediu pra mim ir comprar um negócio lá, um pão eu acho ai num voltei mais pra casa não [...] dava raiva do meu tio [...] o meu tio me batia com a chinela. O meu pai eu nunca conheci e minha mãe mora lá no Aracati. (THALES). Eu saia e voltava pra casa, já passei dois dias na rua [...] eu num gosto de ficar em casa não, eu gosto de andar, passear [...] Meu pai tava drogado e me batia [...] na rua apanhava do meu irmão e dos cara lá [...] ele queria que eu arrumasse merenda pra ele ai eu num arranjava não. (ARIEL). Foi quando minha mãe se separou do meu pai ai fui morar com ele ai os meninos começaram a me oferecer droga ai comecei ir pra rua [...] aí eu comecei no mundo do crime [...] usava droga (maconha), roubava com um oitão mermo do meu primo que era traficante ai me dava, vendia droga (ganhava R$ 200.00 por semana). Meu pai tá usando droga de novo. (LUCIANO). Minha mãe me amarrou no armador, empendurou meus braços e amarrou uma corrente com um cadeado ai eu fiquei empendurado [...] ai foi que eu comecei a sair mermo. Eu saia de casa, mas eu voltava á noite ai quando ela me amarrou, sai e num voltei mais não [...] em casa me colocava eu pra sair também pra pedir, ai eu saia pra ir pedir quando eu voltava sem nada ela me batia, por isso que eu ficava nas rua. (CAIO).

Diante desses relatos, percebemos algumas motivações mais evidentes,

as quais segundo eles interferiram na ida para as ruas. Todas as falas acima

citam a violência dentro de casa quer seja por tio, irmão ou pais. Essa violência

praticada com esses adolescentes é marcante em suas vidas, pois em algumas

vezes, durante a entrevista, quando se perguntava sobre algo que marcou em

suas vidas, eles perguntavam logo assim: “é coisa ruim é tia”? E muitos deles

respondiam que eram as surras que levavam. Outro fato visível, no qual

podemos perceber é o uso de drogas, pois nas ruas o acesso é mais fácil e o

dinheiro também. Dentre estes, existe um fator que infelizmente está presente

77

na vida de todos eles: a pobreza, a qual também os leva a saírem de suas

casas para a mendicância.

Diante dessa realidade, Nascimento fala sobre essas crianças e

adolescentes que vivem nas ruas:

Essas crianças seriam principalmente crianças trabalhadoras, responsáveis por parte do suprimento familiar. São crianças que, pela falta de condições de seus pais, premidos pela carência material e cultural (desempregados ou subempregados, semi ou completamente analfabetos), não têm condições de prover as crianças do amor, do carinho, dos cuidados básicos de higiene e saúde, de alimentação, moradia e escola de qualidade. Ao contrário têm as crianças como responsáveis pela manutenção da família, forçando-as muitas vezes a irem para a rua, em tenra idade, para criar estratégias de aquisição dos recursos necessários à sobrevivência. (NASCIMENTO, 1997, p. 20).

Caio, no qual cito acima, relata uma cena chocante de violência, pois ele

era obrigado a sair de casa todos os dias para pedir e se retornasse sem nada

ele apanhava. Ele fala que sua mãe já colocou plástico quente em suas costas.

Esse garoto após a separação dos seus pais continuou morando com sua mãe,

mas logo depois, seu pai veio buscá-lo para morar com ele mesmo sendo

contra sua vontade. O seu pai e seu irmão são usuários de drogas.

Enfatizamos esse exemplo, pois é muito semelhante aos outros, exceto a

forma como Caio era fortemente agredido em casa.

Esses exemplos apenas confirmam o que Nascimento (1997) disse em

relação à vida desses garotos, pois em sua maioria a mendicância é a forma de

sobrevivência deles. Faz-se necessário frisar que a família não é a única

culpada de tudo o que acontece, mas a situação em que vivem os leva

infelizmente a passar por tudo isso. Desse modo, as necessidades básicas

como ter uma casa, usufruir da saúde, educação, alimentação, lazer, entre

outras é um direito de todos eles, mas infelizmente não são efetivados e com a

ausência desses direitos essa situação perpassa de geração em geração. E

assim, essa expressão da questão social, adolescentes em situação de rua,

apenas aumenta.

78

3.5.3 A rotina, a rua e seu significado na visão dos adolescentes.

O universo da rua é uma categoria da qual eles falam com propriedade,

mas ao mesmo tempo é um assunto que lembra muitos fatos ruins em suas

vidas, como por exemplo: a violência, as drogas, o rompimento do vínculo

familiar e etc. Diante disso, trazemos algumas falas para exemplificar e

esclarecer melhor esse outro mundo que a rua oferece para esses pequenos

adolescentes, tão frágeis e tão fortes ao mesmo tempo.

A rua pra mim é um ambiente ruim porque só tem gente que num presta. Quando a gente dorme na rua é arriscado alguém entrar entre vida ou morte porque tem gente que mata só por matar mermo. [...] melhor tá em casa do que na rua porque em casa a gente sabe que tá seguro, na rua a gente tá entre vida e morte. A minha rotina era roubar, usar droga, fazer mal os outros [...] eu roubava, as vez a gente batia nos outros. [...] tinha medo de morrer e os outro que eu tinha roubado ir lá me buscar pra me matar, me maltratar. (HIAGO). Dar pra mim andar, da pra mim comprar minhas coisa, roupa nova, da pra fazer um monte de coisa na rua [...] dá pra mim arranjar namorada, até roubar dá. Tem o dia bom, tem o dia ruim. O dia bom é quando Deus manda e o ruim é quando vem a desgraça [...] quando a pessoa oferece droga, quando você bate na pessoa. Eu dormia, virava a noite, botava um papelão debaixo do banco e dormia. Eu pedia, merendava, usava droga [...] solvente, cola, maconha. [...] A rua num tem nada pra mim, num tem o que aprender, se eu for pra rua é só pra me morrer mermo. (ARIEL).

A rua para esses dois adolescentes, Hiago e Ariel, tem significados

fortes. DaMatta (1997, p.54) afirma que “A sociedade parece fiel à sua visão

interna de espaço da rua como algo movimentado, propício a desgraças e

roubos”. Assim também, eles que vivenciaram muitos momentos ruins nas

ruas, sabem o quanto a rua é propícia à violência, ao medo e às drogas. Esses

meninos saem de suas casas por diversos motivos e enfrentam os perigos das

ruas como gente grande. A maioria das respostas continha em suas rotinas a

mendicância, a prática de roubos e o medo da violência e da morte.

79

Durante as entrevistas foram questionados sobre o que mais tinham

medo nas ruas e as respostas foram quase unânimes em afirmar que o pior

momento era a hora de dormir, por isso eles procuravam os lugares mais

movimentados possíveis, como o terminal, restaurantes, Beira-Mar, etc. As

suas falas refletem os seus maiores medos e deixam transparecer a criança

que ainda existe em cada um deles, pois apesar de viverem como adultos

independentes, são carentes de muito amor e atenção, sobretudo de proteção

e segurança. Eles sentem falta da tranquilidade de um lar, de um lugar para

encostar a cabeça e poder dormir sossegados, sem preocupação e medo de

que alguém possa lhes tirar a vida a qualquer momento ou os violentar

fisicamente. Observando algumas falas, temos:

“Tinha medo de dormir de noite [...] dormia nos cantinho das parede [...]

no centro, lá perto da Riachuelo”. (DAVI). “De dormi em algum canto e a

pessoa for e vai faz alguma coisa comigo”. (BRUNO). “Era quando eu tava

dormindo, porque é quando tinha muita violência ai eu ficava com medo de

levar um tiro”. (LUCAS).“Da polícia, de ser pegue, ir preso (...) pelo COTAM e

pelo Raio” (LUCIANO).

Essa é a realidade de muitos adolescentes que enfrentam as noites

perigosas nas ruas da cidade de Fortaleza, eles demonstram o sentimento de

medo até mesmo em suas expressões faciais durante o momento das

entrevistas, contam esses fatos com desprazer e tristeza no olhar, já que essa

não era a vida que eles queriam, uma vida de medo, pânico, insegurança,

desconforto, sem um lugar para dormir, longe da família, longe de seus sonhos.

3.5.4 As mudanças ocorridas em relação à família após a

institucionalização

Os adolescentes entrevistados têm de onze meses a seis anos de

permanência na ONG o Pequeno Nazareno, sendo assim, é possível

acompanhar as mudanças ocorridas nesse período em que eles estão

institucionalizados e distantes da família. Para isso, trazemos relatos de alguns

80

deles com o objetivo de saber dos próprios adolescentes as mudanças que

perceberam ou não no decorrer desses meses e anos.

Ficou melhor, minha família num me dava nada, agora minha família me dar as coisa porque sabe que eu estou bom, bem, estudando, sabendo ler, ai elas traz as coisa pra mim. Quando eu era da rua elas num me dava nada minha família, principalmente minha mãe, minha mãe veio aqui ela trouxe um bocado de coisa pra mim. (HIAGO). É bom, traz coisa pra mim, shampoo, um bocado de coisa, traz alimento também as vez pra me merendar [...] trata bem porque tão sabendo que quero alguma coisa na vida ai tá me ajudando também. Quando tava na rua num me ajudava não porque tava sabendo que eu num queria prestar, me ajudar pra quê se eu num queria prestar? (LUCIANO).

Esses dois adolescentes (Hiago e Luciano) citados acima, quando

perguntamos sobre as mudanças que aconteceram, rapidamente se referem à

forma como a família começou a tratá-los e gratificá-los mesmo que fossem

com presentes simples como um shampoo, por exemplo. Mas a fala deles traz

algo a mais, pois através de uma simples lembrança dada a eles, podemos

perceber que se sentem amados e lembrados e, o principal, eles percebem o

amor e o apoio que a família está oferecendo.

Já Ariel, relata que uma das mudanças ocorridas foi que a ONG o

Pequeno Nazareno começou a ajudar sua família em muitos aspectos, e isso o

deixou muito feliz, mas explica que ficaria bem mais contente se pudesse

vivenciar essas mudanças junto com sua família e não apenas ouvir dos outros

as melhorias. Isso significa o quanto esse garoto anseia estar com sua família

e se alegrar com ela, durante a entrevista ele fala que, mesmo com as

dificuldades, ele preferia estar com sua família. Esse relato abaixo retrata

visivelmente o desejo que ele tem em viver ao lado das pessoas que ele ama.

“Melhorou um pouco, melhorou que eu sinto saudade da minha família e

também eles tão ajudando a minha casa também [...] fico alegre, mas eu fico

mais alegre quando eu vejo com meus próprios olhos”. (ARIEL).

81

Morais et.al. afirma que:

Embora o afastamento não seja uma medida imposta pelos órgãos responsáveis pela proteção da infância e juventude, mas escolha que visa o rompimento com a pobreza, a violência e a vulnerabilidade social, existe o desejo de retorno para o convívio familiar. (MORAES, et al 2010, p. 194).

Ariel é apenas um dentre outros que deseja retornar ao convívio familiar.

Infelizmente a pobreza é um dos maiores fatores que causa esse afastamento,

pois a família prefere que eles estejam na ONG, onde estão se alimentando

todos os dias do que em casa passando fome. Claro que existem outros

motivos, mas a miséria é visivelmente percebida nos relatos dos adolescentes.

Trazemos também mais um relato que chamou bastante atenção sobre a

questão da institucionalização, o relato de Davi. Ele está na ONG há quase

dois anos e quando perguntado sobre sua família ele dá uma resposta curta e

diferente de todos os outros entrevistados. “Tenho saudade não dela não eu já

tô com minha família aqui já [...] Aqui é meu lugar [...]”. (DAVI).

Esse adolescente aparentemente não se interessa mais pela

convivência familiar, para ele tanto faz ter visita ou não. Na entrevista ele relata

que são muito os dias de visita, uma vez na semana, ou seja, o vínculo familiar

literalmente foi rompido pelas circunstâncias de sua vida, fazendo uma

substituição de sua casa pela ONG e de sua família pelas pessoas que

trabalham no Pequeno Nazareno. Por sua vez, Luciano faz uma comparação

que o autor a seguir comenta, ele fala o seguinte: “Eles trata a gente bem, é

como se fosse pai e mãe, cuida da gente”.

Morais et.al afirma esse acontecimento dentro das instituições:

No cotidiano das instituições é fácil ver essas demonstrações recíprocas de carinho e afeto entre eles. Alguns educadores são, ao mesmo tempo, aqueles que acolhem com carinho, mas também aqueles que repreendem quando necessário. Papel muito semelhante ao que é esperado de uma relação pai/mãe/filho, mas da qual eles estão distantes. Certamente, ao reconhecerem alguns educadores como sendo da sua família, esses adolescentes estão dizendo que reconhecem e apreciam o trabalho que os primeiros desenvolvem,

82

assim como dizendo que há entre eles uma relação positiva de afeto, ou seja, um vínculo positivo estabelecido. (MORAES et al, 2010, p. 186).

A realidade é que a maioria deles deseja retornar ao vínculo familiar,

pois sabemos que essa temporária substituição faz parte do processo de

institucionalização, pois nesse período, os adolescente estão distantes de suas

famílias e se sentindo muito fragilizados, mas é preciso ficar atento para que

essa falta da família não se naturalize ao ponto de o adolescente não sentir

mais a ausência de sua família e pensar que vai morar a vida toda na

instituição, pois chegará o dia que precisará seguir seu rumo, voltar a sua

família.

3.5.5 E O QUE ELES ESPERAM DO FUTURO?

Falar de futuro com esses adolescentes é um presente, pois diante de

tanta miséria e desgraça que eles vivenciam, ainda conseguem sonhar; alguns

deles tem sonhos bem desafiadores ao passo que existem aqueles que não

desejam nada, pois já estão tão decepcionados com suas vidas que preferem

não criar expectativas e se frustrarem no futuro. Então, vamos conhecer alguns

desejos desses jovens:

Davi relatou que seu sonho é ser “fankeiro” e quando sair da ONG o seu

desejo é “Só cantar funk”. Para Bruno o seu sonho é ser jogador de futebol,

mas ele vai muito além de se realizar profissionalmente ele diz assim: ”Eu

pretendo trabalhar, ai comprar minhas coisa, ajudar minha família e fazer uma

família”. Henrique relata seu sonho e diz com muita convicção: “Quero ser

polícia pra prender os traficantes, trabalhar e comprar uma casa”.

Para Lucas um dos seus maiores sonhos é esse: “Que os meus irmãos

tudinho saísse das drogas”. Como já foi citado em seu perfil, esse adolescente

tem onze irmãos e segundo ele, infelizmente, todos estão envolvidos com

drogas. Ele também deseja estudar e se realizar profissionalmente, pretende:

83

“Fazer curso, estudar, se eu for estudar, estudar e ir pra faculdade queria ser

administrador”. Para Eduardo e Thales ao perguntar sobre sonhos eles

disseram não ter nenhum, mas ao instigá-los a responder eles falaram

respostas praticamente iguais que é “trabalhar e ajudar minha família” Os

relatos acima são semelhantes, mas em cada um percebemos a singularidade

deles.

Vejamos mais alguns relatos:

Queria sair daqui ficar em casa com minha família, não ir mais usar droga, se eu pudesse trabalhar eu trabalhava pra ajudar minha família [...] fazer minha família ter uma vida melhor, minha vó não sair mais pelas ruas pra ir catar latinha e ajudar ela. Meu pai, eu quero que ele vá pra uma clínica deixar as droga, fique em outa vida melhor, que ele pare. (HIAGO). Queria que eu e minha família mudássemos de vida [...] ter uma casa melhor [...] a minha casa é um pouquinho feia, tem a sala e só tem a cozinha ai pronto. Quero uma casa com sete quarto dos meus irmãos, uma sala, uma cozinha, um banheiro, um quintal, só, uma piscina, uma ruma de brinquedo. Meu futuro é ajudar minha família, tirar a minha família dessa vida réa (sic) ruim. Pra ela num ficar numa casa feia assim, toda feia mermo [...] ajudar meu irmão a sair das drogas. (ARIEL).

Podemos afirmar que os sonhos, em sua maioria, estão voltados em

ajudar suas famílias: comprar uma casa, ajudar algum familiar a sair das

drogas, também se pode perceber o desejo que eles têm em continuar

estudando e se realizar dentro de uma profissão. Luciano não foi citado acima,

mas o seu sonho é ser um cientista, ou seja, ele não enxerga barreiras em sua

frente, ele sonha, planeja e disse que vai lutar para isso.

Neto comenta sobre os sonhos e dar base para as falas dos sujeitos

pesquisados:

O sujeito é também aquele que consegue sonhar e ter um olhar antitrágico, que se apropria de sua história como motivação para um projeto de vida e luta para transformar sua realidade de morte em vida. Cada sujeito inventa e cria sua história. Quem não consegue sonhar e esperar, mesmo com ajuda de outras pessoas, talvez não supere suas tragédias. (NETO, 2001; p. 172).

84

Portanto, o autor enfatiza a importância de sonhar, pois a vida desses

garotos é marcada por episódios violentos e tristes, vivem em uma realidade

massacrante de exclusão, sem infância. Andam por aí nas ruas de Fortaleza à

procura de sobreviver mais um dia. Mesmo vivendo assim, no profundo de

suas almas ainda existem sonhos que fazem com que eles tenham esperança

de um dia viver em melhores condições para que possam realizá-los e viver em

família.

85

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho buscou compreender o que leva um adolescente a

deixar sua casa e ir morar nas ruas, pois desde o primeiro contato com esses

sujeitos sobrevieram-nos os primeiros questionamentos à mente, no qual nos

fez querer saber mais sobre a realidade deles: como era sua adolescência, sua

família, o que eles faziam nas ruas, o que ela significava para eles e o que eles

pensavam para o futuro, tudo isso em busca de responder a essas

inquietações.

No decorrer da realização desse trabalho foi necessária uma maior

aproximação com autores que tratam dessa temática, além de sempre

estarmos atualizados com notícias nos jornais, revistas, televisão, internet,

sempre acompanhando os poucos dados estatísticos e noticiários divulgados

pela mídia. Para que o objetivo da pesquisa fosse alcançado, inicialmente

traçamos o perfil dos adolescentes pesquisados com o intuito de apresentá-los

ao leitor. Em seguida trouxemos uma abordagem sobre a adolescência a fim de

saber como eles estavam vivenciando essa fase. Dos onze entrevistados,

apenas um não falou na questão do trabalho, todos os outros ao responder o

que era ser adolescente incluía essa palavra em sua resposta. Sendo assim,

podemos perceber que a maioria deles enxerga a adolescência da forma como

eles vivenciam essa fase, ou seja, esse momento no qual deveriam estar na

escola, estão nas ruas tentando sobreviver, trabalhando, mendigando e até

roubando.

Outro fator primordial foi saber o porquê deles deixaram suas famílias e

irem para as ruas. Quando eles respondiam, percebia-se em suas falas e olhar

marcas de sofrimento, dor, fome e violência. A suas histórias são marcadas por

perdas, rompimentos de vínculos e pobreza. A maioria dos entrevistados relata

que saiu de casa após o ato de violência física, esse foi um dos pontos mais

marcantes em seus relatos, outro motivo bem evidente foi a falta de condições

dos pais, pois muitos deles afirmam que nem todos os dias que tinham o que

86

comer em casa, precisavam “se virar nas ruas” para conseguir dinheiro e

ajudar a família.

Durante a entrevista, percebemos que muitos deles queriam descrever

como eram suas casas, mesmo quando essa pergunta não fazia parte do

roteiro de entrevista. Eles faziam questão de falar sobre elas: “feias”, “só tem a

sala e a cozinha”, “é um barraco que não tem muito valor”. A pobreza é

perceptível, a vida que eles têm é muito sofrida, literalmente sobrevivem e

tentam todos os dias resistir às dificuldades postas a eles. Alguns dizem que foi

por causa das drogas; oito dos entrevistados usavam drogas, dentre esses,

dois eram traficantes. No entanto, pudemos perceber que a droga era apenas a

consequência de estar nas ruas e não o motivo de sair de casa. Em alguns

casos o motivo principal foi a separação dos pais; de onze adolescentes

entrevistados sete são filhos de pais separados e um afirmou presenciar

violência física contra sua mãe praticada pelo pai.

Em relação ao que eles fazem nas ruas e o que ela significa para eles,

podemos afirmar que a maioria respondeu ter medo de estar nas ruas,

principalmente na hora de dormir. O que mais faziam nas ruas era pedir, usar

drogas e roubar, essa era a rotina da maioria, mas hoje eles acham que a rua

não significa nada para eles, é um lugar que não tem nada a oferecer.

Em relação à família, todos eles têm contato com elas, através dos pais

ou de algum parente. Todos relatam mudanças significativas ocorridas nos

relacionamentos familiares após a institucionalização. Apesar de esses garotos

gostarem de estar na ONG, demonstram o desejo de retornar ao convívio

familiar, falam que sentem muitas saudades e acham que os dias reservados

para as visitas são muito poucos, ainda assim um dos adolescentes afirmou

que sua família é as pessoas da instituição, sendo ali o seu lugar e que visita

para ele não faz diferença. O que percebemos é que a família continua sendo o

alicerce de uma pessoa, pois esses meninos tão sofridos, muitos deles,

violentados dentro de sua própria casa, outros, sendo obrigados a pedir nas

ruas, contudo ainda demonstram o desejo de voltar ás suas famílias. O que faz

um adolescente mesmo sofrendo violência doméstica querer voltar ao convívio

87

familiar? É interessante perceber esse desejo quase que unânime, pois apesar

desse quadro degradante de violência, eles preferem estar juntos a sua família.

Por fim, enfatizamos os sonhos desses adolescentes e notamos que o

que eles mais querem é ajudar suas famílias a melhorar de vida, a ter uma

casa melhor, ver seus familiares longe das drogas, se realizarem

profissionalmente e formar uma família feliz. Aparentemente são sonhos que

geralmente as pessoas conseguem realizar, mas para eles, esses desejos se

tornam desafios frente às circunstâncias vividas, pois não é fácil encarar desde

tão jovem tantos obstáculos, os quais eles ainda não estão preparados para

enfrentar com a maturidade e responsabilidade devida, uma vez que são

apenas adolescentes.

Deste modo, diante de tudo que foi discutido, o que fazer frente a essa

problemática tão complexa? Na realidade é quase impossível tirar todos os

adolescentes das ruas, pois todos os dias mais um sai de sua casa e adentra

ao mundo da rua, e este sai por diversos fatores, entre eles: a violência

doméstica, a pobreza extrema, as drogas, separação dos pais, ou seja,

situações que os levam gradualmente para as ruas e os fazem conhecer e

experimentar o mundo do crime, das drogas, da mendicância, entre outros.

Diante das motivações relatadas pelos entrevistados da pesquisa

percebemos que a desigualdade social é um fator relevante nessa questão,

pois a pobreza é visível e desde o nascimento os seus direitos lhe são negados

na própria família por viverem precariamente, pela a sociedade por excluí-los e

a negligência do Estado diante de uma expressão da questão social tão

discutida, mas pouco resolvida.

Portanto, após essas considerações, ressaltamos que esta pesquisa não

finaliza neste trabalho monográfico, esse assunto é muito amplo, podendo ser

apenas o início de muitas pesquisas que virão e esta também poderá subsidiar

futuras pesquisas relacionadas com a mesma temática, a fim de contribuir

através das informações alcançadas.

88

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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APÊNDICE

93

APÊNDICE A

IDENTIFICAÇÃO E PERFIL DO ADOLESCENTE

Nome:

Idade:

Bairro que morava:

Residia com quem?

Estuda? Se sim, em que série?

Já passou por outros abrigos? Se sim, Quantas vezes?

Já cometeu algum ato infracional? Se sim, Qual?

Você trabalhava? Fazendo o que?

Tem alguma religião?

Já sofreu algum tipo de violência? Qual?

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APÊNDICE B

ROTEIRO DE ENTREVISTASEMI - ESTRUTURADA

SOBRE ADOLESCÊNCIA

O que é ser adolescente pra você?

Qual a lembrança que você tem que marcou a sua infância ou adolescência?

Se você tivesse a oportunidade de realizar um sonho, qual seria?

Quando se lembra de sua família, qual o sentimento que vem em você? Por

quê?

Quem é a pessoa que você mais ama? Por quê?

Como é seu relacionamento familiar?

SOBRE RUA

Com quantos anos você saiu de casa? Você recorda como foi esse dia?

O que te motivou a sair de casa?

O que significa a rua para você?

Quando estava nas ruas como era sua rotina?

Quando estava nas ruas usava algum tipo de drogas? Qual?

O que fazia para conseguir o dinheiro para manter o uso da droga? (caso use)

Onde você passava a maior parte do tempo? Por quê?

Do que mais tinha medo nas ruas?

O que fazia para sobreviver nas ruas?

SOBRE INSTITUIÇÃO

Por qual motivo você aceitou sair das ruas?

O que você acha do ambiente institucional?

Como é seu relacionamento com os profissionais dessa instituição?

Como é tratada a sua relação com a família após a sua entrada na instituição?

Quais suas perspectivas para o futuro quando sair da instituição?

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APÊNDICE C

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado para participar desta pesquisa que tem como

finalidade compreender as motivações que levaram os adolescentes institucionalizados

na ONG o Pequeno Nazareno a morar nas ruas de Fortaleza. Esta pesquisa está sob

execução das pesquisadoras Valney Rocha Maciel (responsável) e Claudiana Lima de

Sousa (participante). Tal pesquisa é requisito para a conclusão do curso de

Bacharelado em Serviço Social pela Faculdade Cearense.

Sua participação é voluntária e se dará por meio de entrevista que será

realizada no âmbito do Pequeno Nazareno, com duração aproximada de 30 minutos, no

dia previamente marcado, de acordo com a sua disponibilidade. Os depoimentos desta

entrevista serão gravados com seu consentimento.

Não há riscos decorrentes da sua participação e você possui a liberdade de

retirar sua permissão a qualquer momento, seja antes ou depois da coleta dos dados,

independente do motivo e sem nenhum prejuízo a sua pessoa e nem ao sua estadia na

Instituição. Se aceitar participar, estará contribuindo para a compreensão do fenômeno

estudado e para a produção de conhecimento científico.

Ressaltamos que tem o direito de ser mantido atualizado sobre os resultados parciais

da pesquisa. Esclarecemos que, ao concluir a pesquisa, será comunicado dos

resultados finais. Não há despesas pessoais para o participante em qualquer fase do

estudo. Também não há compensação financeira relacionada à sua participação. Se

existir qualquer despesa adicional, ela será paga pelo orçamento da pesquisa. Os

pesquisadores assumem o compromisso de utilizar os dados somente para esta

pesquisa. Os resultados da pesquisa serão analisados e publicados, mas sua

identidade não será divulgada, sendo guardada em sigilo.

Em qualquer etapa do estudo, poderá contatar os pesquisadores para o esclarecimento

de dúvidas ou para retirar o consentimento de utilização dos dados coletados com a

entrevista: Valney Rocha Maciel e Claudiana Lima de Sousa, pelo fone: (85)

8665/7206.

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Consentimento Pós–Informação

Eu,___________________________________________________________, fui

informado sobre o que o pesquisador quer fazer e porque precisa da minha

colaboração, e entendi a explicação. Por isso, eu concordo em participar do projeto,

sabendo que não vou ganhar nada e que posso sair quando quiser. Este documento é

emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pelo pesquisador, ficando

uma via com cada um de nós.

________________________________________ Data:__/__/__

Assinatura do Participante

__________________________________________

Assinatura do Pesquisador

__________________________________________

ProfªValney Rocha Maciel

Orientadora/ Faculdade Cearense

_________________________________________________

Assinatura do Coordenador responsável (Pequeno Nazareno)