APLICAÇÃO DO MDT/SRTM/NASA PARA DETALHAMENTO ... · AB’SABER, Aziz Nacib. Os Domínios de...

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Anais – III Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006 APLICAÇÃO DO MDT/SRTM/NASA PARA DETALHAMENTO GEOMORFOLÓGICO NO SEMI-ÁRIDO LOBÃO, J. S. B. 1 , VALE, R. DE M. C. 2 RESUMO: As regiões semi-áridas apresentam morfologia caracterizada por dois conjuntos de formas contrastantes, os pediplanos e as depressões com relevos residuais típicos, os inselbergues. Para este trabalho foi estudado o inselbergue de Itibiraba, cuja morfologia demonstra feições condicionadas pelo substrato rochoso e pelas condições ambientais. Para tanto se utilizou Modelo Digital de Terreno MDT/SRTM/NASA reamostrado por meio de técnicas de interpolação. Com base nesses produtos foram elaborados perfis topográficos que subsidiaram as análises e interpretações formuladas, que servem de subsídio ao Planejamento de Gestão Territorial. Palavras-Chave: inselbergue, modelagem digital, geomorfologia. ABSTRACT: The semi-áridas regions present morphology characterized by two sets of contrastantes forms, the pediplains and the depressions with typical residual relives, the inselbergs. For this work the inselbergs of Itibiraba was studied, whose morphology demonstrates appearance conditioned by the rocky substratum and the environment conditions. For this was used the Digital Topography Model MDT/SRTM/NASA reshowed by means of interpolation techniques. With basis on these products were elaborated topographical profiles that subsidized the formulated analysis and interpretations, that serve as subsidy to the planning of territorial administration. Key-words: inselberg, digital modeling, geomorfology INTRODUÇÃO: O domínio morfoclimático semi-árido atinge grande área da região nordeste do Brasil, ocupando cerca de 800.000 de Km 2 . Destes, 325.882,37 Km 2 , encontram-se na Bahia, abrangendo 283 municípios do estado. Caracteriza-se por apresentar totais pluviométricos que não ultrapassam a isoieta 800mm (NIMER, 1989) e pela existência de longos e persistentes períodos de seca, ainda de difícil previsibilidade. Esta condição climática controla a dinâmica morfogenética gerando formas de relevo marcadas pela presença de superfícies pediplanadas associadas à inselbergues, ou ilhas de pedra, relevos residuais rochosos. Apesar de não haver ainda consenso com relação à gênese desses modelados, há convergência de hipóteses que apontam para a importância do clima, enquanto variável responsável pela elaboração e desenvolvimento dos mesmos. As formas mais recorrentes e referidas na literatura são os inselbergues dômicos ou bornhardts e os tors ou castle kopje (caos de matacões). Os estudos desses relevos são ainda incipientes, principalmente por serem pontuais e restrito às áreas semi-áridas. O detalhamento destas formas estão sempre associadas à métodos tradicionais. E o MDT/SRTM/NASA, apesar de possuir resolução espacial de 90m, já foi testado em diversos trabalhos com maior detalhamento (PEREIRA, et al, 2004; SOUZA FILHO, 2003; CREPANI, 2004). Neste trabalho o MDT/SRT/NASA, foi utilizado para detalhamentos do Inselbergue de Itibiraba, 1 Mestre em Geografia, Professora UEFS, [email protected], (75)3224-8211 2 Mestre em Geociências, Professora UEFS, [email protected], (75)3224-8211

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Anais – III Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto

Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006

APLICAÇÃO DO MDT/SRTM/NASA PARA DETALHAMENTO GEOMORFOLÓGICO NO SEMI-ÁRIDO

LOBÃO, J. S. B.1, VALE, R. DE M. C.2

RESUMO: As regiões semi-áridas apresentam morfologia caracterizada por dois conjuntos de formas contrastantes, os pediplanos e as depressões com relevos residuais típicos, os inselbergues. Para este trabalho foi estudado o inselbergue de Itibiraba, cuja morfologia demonstra feições condicionadas pelo substrato rochoso e pelas condições ambientais. Para tanto se utilizou Modelo Digital de Terreno MDT/SRTM/NASA reamostrado por meio de técnicas de interpolação. Com base nesses produtos foram elaborados perfis topográficos que subsidiaram as análises e interpretações formuladas, que servem de subsídio ao Planejamento de Gestão Territorial. Palavras-Chave: inselbergue, modelagem digital, geomorfologia. ABSTRACT: The semi-áridas regions present morphology characterized by two sets of contrastantes forms, the pediplains and the depressions with typical residual relives, the inselbergs. For this work the inselbergs of Itibiraba was studied, whose morphology demonstrates appearance conditioned by the rocky substratum and the environment conditions. For this was used the Digital Topography Model MDT/SRTM/NASA reshowed by means of interpolation techniques. With basis on these products were elaborated topographical profiles that subsidized the formulated analysis and interpretations, that serve as subsidy to the planning of territorial administration. Key-words: inselberg, digital modeling, geomorfology

INTRODUÇÃO: O domínio morfoclimático semi-árido atinge grande área da região nordeste do

Brasil, ocupando cerca de 800.000 de Km2. Destes, 325.882,37 Km2, encontram-se na Bahia,

abrangendo 283 municípios do estado. Caracteriza-se por apresentar totais pluviométricos que não

ultrapassam a isoieta 800mm (NIMER, 1989) e pela existência de longos e persistentes períodos de

seca, ainda de difícil previsibilidade. Esta condição climática controla a dinâmica morfogenética

gerando formas de relevo marcadas pela presença de superfícies pediplanadas associadas à

inselbergues, ou ilhas de pedra, relevos residuais rochosos.

Apesar de não haver ainda consenso com relação à gênese desses modelados, há convergência de

hipóteses que apontam para a importância do clima, enquanto variável responsável pela elaboração e

desenvolvimento dos mesmos. As formas mais recorrentes e referidas na literatura são os inselbergues

dômicos ou bornhardts e os tors ou castle kopje (caos de matacões).

Os estudos desses relevos são ainda incipientes, principalmente por serem pontuais e restrito às áreas

semi-áridas. O detalhamento destas formas estão sempre associadas à métodos tradicionais. E o

MDT/SRTM/NASA, apesar de possuir resolução espacial de 90m, já foi testado em diversos trabalhos

com maior detalhamento (PEREIRA, et al, 2004; SOUZA FILHO, 2003; CREPANI, 2004). Neste

trabalho o MDT/SRT/NASA, foi utilizado para detalhamentos do Inselbergue de Itibiraba,

1 Mestre em Geografia, Professora UEFS, [email protected], (75)3224-8211 2 Mestre em Geociências, Professora UEFS, [email protected], (75)3224-8211

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Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006 demonstrando a potencialidade desta análise para estudos ambientais que subsidiem o planejamento e

Gestão Territorial.

ÁREA DE ESTUDO: Localiza-se no município de Itaberaba, nas coordenadas UTM-Zona 24S W

382.384 N 8.617.878, periferia da região semi-árida baiana, uma das mais relevantes áreas de

inselbergues do mundo. O inselbergue estudado, Itibiraba, é o menor, dentre um conjunto de três,

localizados na Fazenda Itaberaba, onde a Pedra de Itaberaba, ou pedra que brilha na língua indígena,

destaca-se na paisagem. Apresenta morfologia dômica associada a conjuntos rochosos e pediplanos de

entorno recobertos por caatinga fragmentada por pecuária. (Fig. 1)

Figura 1 – Localização da área de estudo

MATERIAIS E METODO: Com o objetivo de caracterizar a Geologia e Geomorfologia do

inselbergue Itibiraba, foram gerados produtos para subsidiar análises e interpretações, utilizando-se o

Modelo Digital de Terreno – MDT/SRTM/NASA; o recorte da imagem Landsat ETM+, cena 216-69

que subsidiou os trabalhos de campo; e, dados digitais preexistentes de geologia e geomorfologia.

Com o Modelo Digital de Terreno, realizou-se as análises morfológicas e o mapa de altimetria e

declividade para a elaboração dos perfis topográficos.

A síntese da metodologia empregada pode ser melhor visualizada na Figura 2.

FIGURA 2 - Fluxograma Metodológico

GEOLOGIA/GEOMORFOLOGIA

MDT Imagem Landsat ETM+ Dados pré-existentes

Morfologia Geomorfologia

Delimitação da Área

Inselbergue Itibiraba

Trabalhos de Campo

Altimetria/declividade Geologia Perfil Integrado

Análise Regional

Caracterização em escala de detalhe

Anais – III Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto

Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006

Para detalhamento do inselbergue estudado foi necessário melhorar a resolução espacial do MDT, a

fim de gerar produtos compatíveis com a escala de trabalho. Para isto utilizou-se a metodologia

proposta por Crepani, (2004), reamostrando o MDT/SRTM/NASA, que originalmente, se encontra

disponível com resolução espacial de 90m, para até 10m. A reamostragem foi realizada por meio de

interpolações utilizando o método estatístico do vizinho mais próximo, atingindo-se com isso, novas

classificações altimétricas e maior detalhamento. Além disso, pode-se gerar perfis para detalhamento

da morfologia, caracterizando as feições do morro e associando-as à vegetação da base da encosta, dos

depósitos de tálus, vertentes, patamares e topos. Desta forma foi possível identificar e discutir as

dinâmicas morfogenéticas local e regional, contribuindo assim para estudos ambientais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO: O contexto geológico da área estudada corresponde a rochas ígneas

Pré-cambrianas, deformadas por fraturas e dobramentos de diferentes envergaduras. O inselbergue

Itibiraba desenvolveu-se sobre ortognaisses granulitizados e migmatitos granulíticos do Bloco Jequié,

cujas rochas foram submetidas à alto grau metamórfico produzido pelo ciclo geotectônico Jequié,

ocorrido à 2,7 – 2,8 Ga (SGM, 1996, pg.70). O ciclo Transamazônico (2,1 – 2,0 Ga) gerou

deformações que afetaram as pré-existentes redefinindo o arcabouço geológico mais antigo.

Os ciclos geotectônicos referidos afetaram os blocos rochosos, produzindo fraturas e falhas de grande

expressão regional, de direção predominantemente NW/SE, que, por vezes, definem contatos

litológicos. Esses sistemas estruturais condicionaram o arranjo e o padrão espacial dos inselbergues.

A natureza das feições dos modelados presentes na área de estudo requer uma compreensão regional

dos eventos quaternários que produziram as formas observadas, principalmente os inselbergues e os

pediplanos. Vários estudiosos debruçaram-se sobre essa temática e elaboraram expressiva produção

científica, dentre eles Aziz Ab’Saber (2003), Bigarella (1994), dentre outros, que subsidiará as

reflexões construídas ao longo deste texto.

A gênese dos inselbergues está relacionada à formação das depressões interplanáticas que ocupam

grande parte do domínio semi-árido brasileiro, remontando à passagem do Terciário para o

Quaternário, quando se iniciaram transformações climáticas globais no sentido do resfriamento e do

ressecamento. Tais transformações se repercutiram na região intertropical alterando as condições

bioclimáticas para um contexto ambiental de maior aridez, que resultou na elaboração de áreas semi-

áridas onde anteriormente prevaleciam climas mais úmidos. Os modelados que passaram a se

desenvolver sob a ação de processos geomórficos de natureza essencialmente semi-árida,

caracterizam-se por recuo paralelo das encostas com manutenção dos topos e, subseqüente, abertura de

vales que se alargaram até formar vastas depressões.

Anais – III Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto

Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006 O inselbergue de Itibiraba localiza-se numa área cortada por extenso falhamento que colocou em

contato ortognaisses granulitizados e ortognaisses migmatitos granulíticos do Bloco Jequié, conferindo

ao substrato rochoso comportamentos diferenciados no que se refere aos agentes externos e à erosão

.

dos perfis topográficos representados na figura 3 colocam em evidência as principais feições

morfológicas do inselbergue amostrado, bem como, permite que sejam extraídos dados acerca de sua

morfometria. Estes, foram fundamentais para a caracterização da dinâmica morfogenética da área

estudada. Seguimentos topográficos ressaltam e detalham a morfologia das encostas e formações

vegetais correlatas, sintetizados no quadro 1.

FIGURA 3 – PERFIS TOPOGRÁFICOS

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Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006 QUADRO 1 – CARACTERÍSTICAS MORFOMÉTRICAS E AMBIENTAIS DAS ENCOSTAS

Situação Comp. Máx. Declividade Características Ambientais SW 213 25º < umidade < densidade vegetação e > insolação NE 369 14º > umidade > densidade vegetação e < insolação

O quadro 1 representa as principais diferenças existentes entre as encostas situadas no quadrante SW e

NE, do inselbergue. As de SW apresentam-se curtas (213m) e com declividade acentuada (25º), por

vezes escarpada, devido à sua menor exposição a massas de ar úmidas e maior exposição à insolação,

resultando no predomínio de processos de esfoliação esferoidal, com verticalização, solos incipientes e

baixa densidade de vegetação. Cactos e bromélias ocupam estreitos espaços por entre fendas e

fraturas, fixando-se na própria rocha, visto que sob tais condições praticamente inexistem solos. No

quadrante oposto, NE, tem-se encostas mais longas (369m) sob declividades mais suaves (14º). Nestas

ocorrem umidades mais significativas e menor exposição à insolação, favorecendo os processos

morfogenéticos e pedogenéticos. Patamares escalonados entre seguimentos retilíneos ou convexos

constituem rupturas de declive favoráveis ao maior adensamento da vegetação, bem como fendas mais

contínuas, onde se adensa as matas de grotão. Os tálus, mais pedogenizados e úmidos, são ocupados

por caatinga florestada.

CONCLUSÃO: Os inselbergues são relevos residuais cuja gênese e evolução, estão fortemente

relacionadas à natureza litológica e estrutural do substrato rochoso. Concorre nessa dinâmica as

condições climatológicas, sobretudo no que se refere à umidade e à insolação, cujas taxas variam

conforme a exposição das encostas às mesmas. A forma alongada do inselbergue, com eixo

longitudinal de 580m e transversal de 421m reflete o forte grau de interferência que os alinhamentos

estruturais, impõem na organização espacial destes modelados.

A presença de vegetação está associada às zonas e linhas de fraqueza estrutural, que encontram-se

mais entalhadas no quadrante NE, com aparecimento de ravinas e sulcos, bem como, neosolo litólico

mais contínuo. Estas condições ambientais promovem dinâmicas evolutivas no sentido da geração de

formações vegetais mais complexas, com presença de gramíneas, cactáceas, bromélias, palmeiras,

arbustivas e arbóreas, que integram um sistema morfogenético diferenciado, onde a existência de

maior umidade e menor insolação é o elemento catalizador do mesmo.

Os resultados deste trabalho demonstram o potencial do uso das geotecnologias para estudos

ambientais mais detalhados, onde a associação dos produtos gerados com base no MDT/SRT/NASA,

possibilitam uma caracterização em escala maior, enriquecendo análises que subsidiam o

planejamento de gestão territorial.

BIBLIOGRAFIA:

AB’SABER, Aziz Nacib. Os Domínios de Natureza no Brasil. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003 BIGARELLA J.J. et al. Estrutura e Origem das Paisagens Tropicais e Subtropicais. Santa Catarina: Vol.1 ed. UFSC, 1994

Anais – III Simpósio Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto

Aracaju/SE, 25 a 27 de outubro de 2006 CREPANI, E.. MEDEIROS, J. S. de. Imagens fotográficas derivadas de MNT do projeto SRTM para fotointerpretação na Geologia, Geomorfologia e pedologia. São José dos Campos: INPE, 2004 NIMER, Edmond. Climatologia do Brasil.. Rio de Janeiro: IBGE, 1989 PEREIRA, E. S. et al. Avaliação do Modelo de Elevação Digital de Terreno Utilizando se GPS Topográfico. 2º Seminário de Geotecnologias Aplicado à Geociências. Salvador: SBG/UEFS, 2004 SOUZA FILHO, C. R. O relevo das Américas como nunca antes visto in: InfoGEO. Edição 30, 2003 p. 54-58.