Apostila de Extensão Rural 2 pdf
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE
CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS AGROPECUÁRIAS
EXTENSÃO RURAL
PAULO MARCELO DE SOUZA
CAMPOS DOS GOYTACAZES, DEZEMBRO DE 2005
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CAPÍTULO I
BREVE HISTÓRICO DA EXTENSÃO RURAL NO BRASIL
1. Introdução
Criado no Brasil a mais de meio século, o serviço de extensão rural foi constituído
com o propósito declarado de atuar em favor do desenvolvimento rural. Durante esse
período, a agricultura passou por várias transformações, que podem ser atribuídas em
parte ao trabalho dos técnicos que atuaram no serviço de extensão rural, os
extensionistas.
Tradicionalmente, a agricultura brasileira era pouco especializada, voltada para a auto-
suficiência e para o mercado externo de alguns poucos produtos tropicais. No processo
produtivo, utilizava-se de insumos produzidos internamente, fabricando a maior parte
de seus utensílios, máquinas e implementos, empregando força animal e utilizando
adubos orgânicos. Seus produtos, quando necessitavam ser processados, o eram dentro
da própria fazenda que, portanto, possuía internamente o que hoje denominamosagroindústrias.
Atualmente, em virtude das transformações ocorridas, a agricultura perdeu grande
parte daquelas características. De um modo crescente, a busca de auto-suficiência dá
lugar à especialização da fazenda na única e exclusiva atividade de produção agrícola.
As unidades produtivas normalmente se dedicam a um ou poucos produtos, voltados
agora não só para o mercado externo, mas também para o mercado interno, que se
ampliou significativamente. Se, no passado, os insumos e demais elementos
necessários ao processo produtivo eram obtidos internamente, de maneira artesanal,
agora devem ser comprados1 das indústrias produtoras de máquinas e insumos, as
1 Fazendo a ressalva de que não se trata apenas de transferir a produção dos insumos e equipamentos da fazendapara a indústria, uma vez que esta última irá produzir novos insumos, tais como tratores, colheitadeiras,fertilizantes, produtos químicos para controle de pragas e doenças, etc., inexistentes na agricultura anterior.
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chamadas indústrias para a agricultura, que compõem o segmento dito antes da
porteira. E, de um modo crescente, os produtos da fazenda passam a ser processados,
mas fora dela, nas chamadas agroindústrias. Tamanhas foram as mudanças, e tal o grau
de interdependência entre a agricultura e a indústria que isso acarretou, que foi criado
um novo termo, os chamados complexos agroindústrias, para denominar os diversos
produtos agrícolas e suas relações com as indústrias situadas “antes e depois da
porteira da fazenda”.
De um lado, não há dúvidas quanto à importância dessas alterações e seus efeitos
positivos sobre a economia brasileira. A modernização por que passou a agricultura
possibilitou aumento de produtividade, contribuiu para maior inserção dos produtos
brasileiros no mercado internacional, possibilitando, com isso, saldos positivos nabalança comercial e entrada de divisas no país. Adicionalmente, houve redução nos
preços dos produtos agrícolas que, portanto, se tornaram mais acessíveis à população
menos favorecida.
Por outro lado, não podem ser dissociadas desse mesmo processo várias conseqüências
graves para a sociedade brasileira, dentes as quais podem ser citadas o acelerado êxodo
rural, a concentração de terras e de renda, a degradação ambiental, a violência nocampo e na cidade, dentre outras. Poder-se-í-a dizer que esse é o preço a ser pago pelo
processo de desenvolvimento industrial que, dentre mortos e feridos, avançou no
Brasil, em grande parte sustentado na agricultura. Porém, várias análises demonstram
que os custos sociais citados decorrem, principalmente, da forma como foi conduzido
o processo de modernização da agricultura brasileira, no qual tomou parte a extensão
rural.
Por essa razão, não são poucas as críticas acerca do trabalho desenvolvido pela
extensão no período, e do tipo de desenvolvimento rural por ela buscado. Segundo
alguns autores, os erros do serviço de extensão rural no Brasil, cometidos ao longo de
sua existência, não constituem meros desvios em seu caminho na busca do
desenvolvimento rural. Na verdade, segundo essas abordagens, a extensão rural já
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nasce como um projeto de desenvolvimento “viciado” pois, embora prevendo o
desenvolvimento rural, sua principal finalidade é transformar a agricultura para que
possa servir aos interesses de setores industriais e financeiros.
Com base nessas abordagens, o presente capítulo procura fazer um breve relato
histórico do surgimento da extensão rural no Brasil. Esse relato começa por descrever
as condicionantes da criação do serviço de extensão rural nos Estados Unidos, país que
foi, para nós, bem mais do que mera fonte de inspiração.
2. As raízes da extensão rural norte-americana
Para se compreender o surgimento e as condicionantes históricas da criação da
extensão rural no Brasil, deve-se considerar, inicialmente, o contexto do surgimento
desse serviço nos Estados Unidos, no início do século XX. O contexto em que se deu a
criação da extensão rural nesse país ajuda a explicar os objetivos e a razão de ser do
modelo de extensão posteriormente implantado no Brasil, sob a influência norte-
americana.
Já na segunda metade do século XIX, as transformações pelas quais a sociedade norte-
americana havia passado tinham resultado na redução do poder dos agricultores em
favor dos comerciantes e industriais. Nesse momento, a agricultura já se encontrava
baseada no modo capitalista de produção, e se tornava, de modo crescente, palco do
interesse de processadores de matérias-primas de origem agrícola e fornecedores de
máquinas, implementos e insumos agrícolas.
Nesse contexto, era indispensável a criação de um mecanismo que levasse aos
agricultores as novas tecnologias, e os fizesse conceber a atividade agrícola como
negócio. Buscava-se, na verdade, transformar os agricultores em produtores eficientes
de matérias-primas mais baratas para a indústria, e, ao mesmo tempo, torná-los
consumidores de insumos agrícolas, também fornecidos pela indústria.
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Embora essas atividades pudessem ser efetuadas por representantes dos próprios
interessados, as indústrias, na prática essa tentativa não tardou a mostrar suas
limitações. Era inevitável que os agricultores manifestassem desconfiança dos técnicos
que lhes visitavam, por serem eles portadores dos interesses de comerciantes,
indústrias e demais empresas com interesse no setor.
Nesse sentido, a constituição do serviço de extensão oficial, com a Lei de Smith –
Lever, em 1914, adequou-se perfeitamente ao propósito dos grupos interessados na
modernização da agricultura norte-americana. Essa lei possibilitou a constituição do
famoso tripé ensino, pesquisa e extensão, visto que duas leis anteriores, a Lei Merril
(1862), determinando a doação de terras com finalidade de constituir instituições deensino agrícola superior, e a Lei Hatch (1877), prevendo a criação de estações de
pesquisa, já haviam criado os sistemas de ensino e pesquisa na agricultura,
respectivamente.
A partir desse instante, técnicos do serviço de extensão oficial, trabalhando em prol do
“desenvolvimento rural”, atuariam no sentido de fazer a desejada conversão dos
agricultores, até então tentada sem muito sucesso pelas empresas interessadas namodernização do setor. Portanto, interesses de empresas financeiras, comerciais e
industriais prevaleceram na gestação do modelo de extensão rural que, posteriormente,
nos foi apresentado. A concepção do serviço de extensão rural norte-americano,
baseada na idéia de que a miséria dos agricultores é decorrente de sua precária
instrução, somente pode ser entendida como o reflexo dessa nova correlação de forças.
3. A Extensão Rural no Brasil
Na década de 40, quando se discute a conveniência da implantação de um serviço de
extensão rural no país, classes dominantes e agências internacionais eram unânimes
em crer na importância de disseminação das inovações, necessária para realizar a
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transformação de agricultura. Via-se a necessidade de, mediante a disseminação dessas
inovações, transformar a agricultura tradicional, auto-suficiente, voltada para o auto-
consumo e tecnologicamente atrasada, numa agricultura moderna, especializada, com
laços estreitos com os demais setores da economia e tecnologicamente avançada. Tal
transformação não previa alteração na estrutura fundiária (Queda, 1987).
Como destacado por Oliveira (1999), em todos os países adotantes da extensão rural, a
influência norte-americana quanto à filosofia, princípios, métodos e meios de
comunicação foi marcante. No contexto da Guerra Fria que se seguiu à Segunda
Guerra Mundial, as tentativas no sentido de alavancar o desenvolvimento capitalista no
Brasil, e de superar o atraso na agricultura, foram discutidos sob a influência
hegemônica dos Estados Unidos (Queda, 1987).
No Brasil, o nascimento da extensão rural, em 1948, foi fruto de convênios firmados
com os Estados Unidos, e sua implementação se deu sob o comando de Nelson
Rockefeller, mensageiro especial da missão americana no Brasil. Nesse ano, com a
implantação do Programa Piloto de Santa Rita do Passa Quatro, no Estado de São
Paulo, e na fundação da Associação de Crédito e Assistência Rural/Acar-Minas
Gerais, teve início o serviço de extensão rural no Brasil (Fonseca, 1985).
Segundo Oliveira (1999), pode-se dizer, em termos sintéticos, que a extensão rural no
Brasil é fruto de:
a) Uma concepção religiosa sobre a ação social, qual seja a da concepção puritana de
filantropia, adaptada pelos americanos para o presente século. Nessa perspectiva, a
ajuda concedida pela ação social deveria gerar “os resultados mais vantajosos”. Por
essa razão, possivelmente, a ACAR primava por trabalhar os “mais capazes”, dada a
possibilidade de acionar os mecanismos sociais de difusão com maior eficiência, ainda
que essa escolha pudesse ser excludente.
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b) Um projeto de poder dos americanos, inicialmente gerido pelo capital privado, e
posteriormente pelo governo, assim que se instaurou a guerra fria. Se, no primeiro
momento, a perspectiva era basicamente econômica e comercial, em seguida a
preocupação com a segurança nacional e continental passou a orientar as ações de
cooperação internacional, calcada nos regimes militares que se espalharam pela
América Latina.
c) Um modelo do agronegócio nascente, com ações articuladas em vários pontos de
diferentes cadeias de produtos2.
d) Uma corrente política, o liberalismo.
Durante sua existência, a extensão rural sofreu algumas mudanças, orientadas para se
adequar aos projetos de desenvolvimento e para atender aos anseios dos setores com
interesses na agricultura. Normalmente, as mudanças mais significativas podem ser
agrupadas em três fases ou períodos da história da extensão rural no Brasil.
A primeira delas inicia-se com a constituição do serviço de extensão rural no país, eperdura até o início da década de sessenta. Nessa primeira fase, denominada
“humanismo assistencialista” (Lisita, 2005), os objetivos do extensionista eram os de
aumentar a produtividade agrícola e melhorar o bem estar das famílias rurais, com o
aumento da renda e a diminuição da mão-de-obra necessária para produzir. Em geral,
as equipes locais eram formadas por um extensionista da área agrícola e um da área de
Economia Doméstica. Seus métodos, nesse período, eram marcados por ações
paternalistas, que não favoreciam o desenvolvimento autônomo dos agricultores
assistidos. Ou seja, tratava-se de um conjunto de medidas com o intuito de induzir
mudanças de comportamento, por meio de metodologias que não favoreciam o
2Segundo Oliveira (1999), o modelo proposto por Nelson Rockefeller apresentava inúmeras peças articuladas,
com interesses na indústria de montante (máquinas, equipamentos, pesticidas e fertilizantes químicos) e a jusante (processamento de grãos e carnes, financiamento, pesquisa agropecuária e extensão rural)
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florescimento da consciência crítica nos indivíduos, atendendo apenas a suas
necessidades imediatas.
Embora alguns argumentem que a extensão rural tenha sido concebida como um
projeto mais amplo de desenvolvimento rural, que apenas posteriormente teria sido
desvirtuado para se converter num mero programa de assistência técnica e de indução
ao uso de insumos industriais, os objetivos previstos desde a criação da ACAR
mostram o contrário, como destacado por Queda (1987). De fato, desde sua fundação,
e em todo o período de 1948 a 1968, o projeto extensionista esteve, basicamente,
voltado para a assistência técnica e a distribuição de insumos, adquiridos graças aos
recursos do crédito rural.
Capítulo especial desse processo é representado pela Economia Doméstica, que
buscava reeducar as famílias e promover a mudança de hábitos em favor de uma
melhoria da qualidade de vida das populações rurais. Na verdade, a atuação desse
serviço culminava no aumento do complexo de necessidades da população rural que,
por conseguinte, passaria a representar um crescente mercado para os produtos
industriais.
Essa primeira fase da extensão rural aconteceu no final da implementação do processo
de industrialização que, segundo Rodrigues (1997), buscava derrotar o Brasil rural,
agrário e atrasado, e criar um mercado consumidor de massa. Segundo esse autor,
buscava-se, mediante o trabalho da extensão, “inculcar nos imaturos” uma nova “tábua
de valores”, com uma abordagem pedagógica tradicional, onde existe um responsável -
o extensionista - para conduzir o processo.
A segunda fase, denominada “difusionismo produtivista”, situa-se no período de
atuação das políticas de modernização agrícola (1964 a 1980), marcado pela
abundância de crédito rural subsidiado (Listia, 2005). Nesse momento, a emergência
da burguesia industrial começa a romper com a tradicional dominação das oligarquias
rurais, e a modernização da agricultura se apresenta como um projeto de interesse sob
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todos os aspectos. Nessa fase, marcada pelo regime militar, iniciado com o golpe em
1964, a agricultura passa a ser concebida como um amplo mercado para a produção da
indústria, e como fornecedora de matérias primas para ela. Partindo de diagnósticos
apontando atraso da agricultura, que a impediriam de atender a seus papéis no
desenvolvimento econômico industrial, o projeto de modernização agrícola projeto
trazia, como recomendações para o setor: a assistência técnica; o estímulo à formação
de profissionais ligados ao setor; a multiplicação de escolas rurais; o treinamento de
trabalhadores; a implantação de indústrias de máquinas e equipamentos; o uso de
insumos diversos; e, a oferta de crédito (Queda, 1987).
Nesse período criou-se, com o objetivo de evitar ações independentes e duplicidade de
esforços, a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural –EMBRATER3, em 1974, em substituição à Associação Brasileira de Crédito e
Assistência Rural – ABCAR, que havia sido criada em 1956. Em 1976, foi criado o
Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR, com a finalidade de assistir as
empresas agrícolas na elaboração e execução de programas de formação profissional
para o seu pessoal.
Esse período foi marcado por grande expansão do serviço de extensão rural no país
4
.Nessa fase, sua atuação buscou estimular os agricultores a adquirir um pacote
tecnológico modernizante, com uso intensivo de capital (máquinas e insumos
industrializados), e contribuiu para inserir os agricultores na dinâmica da economia de
mercado. Sua tarefa consistia, nessa etapa, em persuadir os produtores para que
adotassem as novas tecnologias, desprezando os conhecimentos empíricos desses
agricultores e suas reais necessidades. Há que se destacar ainda que, como a atuação
dos extensionistas era condicionada pela existência do crédito agrícola, os pequenos
3 A estatização dos serviços de extensão, advinda dessa mudança, perdurou até 1990, quando a EMBRATER foi
extinta no governo Collor (Queda, 1987).4
Em 1960, apenas 10% dos municípios no Brasil contavam com esse serviço e, em 1980, a extensão ruralchegou a 77,7% dos municípios do país (Lisita, 2005).
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agricultores familiares que não tiveram acesso ao crédito também ficaram à margem
do serviço de extensão rural (Lisita, 2005).
Com o término da atuação das políticas de modernização agrícola no início dos anos
oitenta, principalmente com a falência da política de crédito rural subsidiado, inicia-se
uma terceira fase, que prevalece até os dias atuais, preconizando a construção de uma
“consciência crítica” nos extensionistas. Nessa fase, denominada “humanismo crítico”,
assume importância o “planejamento participativo”, ou seja, envolvendo os
extensionistas e os produtores, e baseado na pedagogia da libertação desenvolvida por
Paulo Freire. Nessa nova etapa, defende-se o uso de metodologias de intervenção rural
que considerem os aspectos culturais do público alvo e, principalmente, que permitam
a participação ativa dos agricultores, possibilitando-lhes atuar como agentes do
processo de mudança (Lisita, 2005).
Entretanto, segundo Lisita (2005), apesar dessa nova orientação, a maioria das
empresas de assistência técnica continua com a mesma orientação básica: “incluir” o
pequeno agricultor familiar na lógica do mercado, torná-lo cada vez mais dependente
dos insumos industrializados, subordinando-o ao capital industrial. Nesse contexto,argumenta o autor, o desafio dos órgãos de pesquisa, universidades e movimentos
sociais é o de criar estratégias para colocar em prática metodologias participativas de
assistência técnica e extensão rural, que incluam os agricultores familiares desde a
concepção até a aplicação das tecnologias, transformando-os em agentes no processo,
valorizando seus conhecimentos e respeitando seus anseios.
Sob o aspecto de sua orientação pedagógica, a extensão rural no Brasil passou tambémpor três fases, segundo Kreutz (2005), que coincidem com as finalidades adotadas
pelos setores agroindustriais a montante e a jusante da agricultura.
A primeira etapa, a da organização da extensão rural no Brasil, esteve baseada em
ações educativas tradicionais. Nesta perspectiva, a educação deveria elevar o nível das
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necessidades das populações rurais. Entendia-se que o bom extensionista deveria
envolver os agricultores com o padrão de produção e consumo hegemônicos,
altamente dependentes de insumos externos.
A segunda fase é marcada pela forma difusionista, que começa a ser implementada no
final dos anos sessenta. A pedagogia consistia numa abordagem tecnicista, que
concebia o extensionista como aquele que possui o controle científico. Nesse período,
segundo Mussoi (2003), implanta-se uma matriz tecnológica altamente especializada e
produtivista, e organizam-se as instituições de extensão rural dentro de uma concepção
centralizada e descendente, com ampliação de seus instrumentos de controle e
supervisão.
A terceira fase começa nos anos oitenta, com a crescente percepção de crise do modelo
de desenvolvimento agrícola, e a busca de formas alternativas de fazer a extensão rural
(Kreutz, 2005). Nessa fase, a retirada do Estado de algumas ações que já não são mais
consideradas estratégicas para os interesses empresariais, atinge o serviço público de
extensão, que passa a depender praticamente só de recursos dos governos estaduais5.
Esse último período revela uma conturbada mudança na concepção de educação que,até a terceira fase, foi trabalhada hegemonicamente como algo que se estabelecia entre
aqueles que eram considerados os detentores do saber e aqueles que precisam ser
ensinados. Para Kreutz (2004), nesse contexto é preciso repensar a atuação das
instituições de ATER, buscando uma concepção mais dialógica e desprovida de alguns
dogmas. O desafio consiste em conceber ações que sejam alimentadas pela
compreensão de suas finalidades e não reduzidas ao treinamento de como aplicar
determinados recursos. Isto certamente passa pela constituição de uma nova estrutura
institucional, que permita que os extensionistas rurais tenham condições de gerar
5 Talvez o fato de a agricultura da agricultura ter se modernizado, atendendo com isso aos interesses industriaisdo setor de máquinas, insumos e processamento de produtos agrícolas, explique o porque do desmantelamentodo serviço de extensão rural no Brasil. Ou seja, a extensão rural já cumpriu seu objetivo, o de transformar aagricultura em grande consumidora de produtos industriais. Difícil é confundir essa mudança comdesenvolvimento rural, visto que a grande maioria dos agricultores familiares encontra-se em situação deempobrecimento, e ainda necessitando de uma extensão rural que os promova.
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emancipação dos agricultores, através de um processo educacional libertador, diante
dos diversos programas de desenvolvimento, principalmente aqueles que são dirigidos
aos mais pobres do meio rural.
4. Cronologia
Encerrando o capítulo, apresentamos a seguinte cronologia, descrita por FERNANDES
(2006), que resume os principais eventos que marcaram a história da extensão rural no Brasil:
•••• 1948:
É assinado convênio entre o Governo do Estado de Minas Gerais e a American
Internacional Association - AIA, pertencente à família Rockefeller, iniciando-se os
serviços de Extensão Rural no Brasil; Implanta-se o Programa Piloto de Santa Rita do
Passa Quatro - São Paulo; Funda-se a Associação de Crédito e Assistência Rural de
Minas Gerais - ACAR/MG.
•••• 1949:
Têm início as atividades da ACAR/MG.
•••• 1950:
O Governo Brasileiro e dos EE.UU assinam Acordo de Cooperação Bilateral, dedica-
do ao fomento das riquezas dos países pouco desenvolvidos.
••••
1956:É criada a Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural - ABCAR, órgão
central com a finalidade de coordenar o trabalho extensionista a nível nacional.
•••• 1974:
Através da Lei 6.126, o Governo Federal cria a Empresa Brasileira de Assistência
Técnica e Extensão Rural - EMBRATER, que passa a coordenar o Sistema Brasileiro
de Extensão Rural.
•••• 1988:
O Governo da "NOVA REPÚBLICA" do Presidente José Sarney, inicia a
"OPERAÇÃO DESMONTE" e, por decreto, extingue a EMBRATER. A Federação
das Associações de Servidores da Extensão Rural - FASER promove uma campanha
nacional - "SOS EXTENSÃO RURAL" - contra o desmonte do serviço de extensão e
pela manutenção da EMBRATER.
•••• 1988:
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Extensionistas de todo Brasil fazem a "MARCHA SOBRE BRASÍLIA" e acampam no
Congresso Nacional em busca de apoio político para o serviço de ATER.
•••• 1989:
O Congresso Nacional realoca recursos para a extensão e recria a EMBRATER
através de Decreto Legislativo.•••• 1990:
Através de Medida Provisória, posteriormente referendada pelo Congresso Nacional, o
Governo do "BRASIL NOVO", do Presidente Fernando Collor, extingue a
EMBRATER. Os servidores são demitidos e o patrimônio da empresa é transferido
para a EMBRAPA. Por toda a década a crise no Sistema de Extensão Rural se alastra e
se aprofunda.
•••• 1995:
Realiza-se em Brasília o Seminário Nacional: Agricultura Familiar e Extensão Rural
(CONTAG/FASER)
•••• 1996:
É criado o Programa Nacional de Agricultura Familiar - PRONAF (Decreto
Presidencial nº1946/96)
•••• 1997:
Workshop Nacional: discute o Serviço de Extensão Rural no Brasil (PNUD/FASER)
•••• 2002:
A FASER promove Seminário Nacional em Brasília para discutir a Extensão Rural.
•••• 2003:
MDA/SAF/DATER lança a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural
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CAPÍTULO II
AS PRINCIPAIS CRÍTICAS À ATUAÇÃO DA EXTENSÃO RURAL NO BRASIL
1. Introdução
Em teoria a extensão rural se diferencia da assistência técnica pela dimensão de seus
objetivos, que são mais amplos do que os dessa última. Por definição, assistência
técnica é o serviço que se presta aos produtores que, já participando de uma agricultura
empresarial, requerem apenas mais e melhores informações tecnológicas. A extensão
rural, por sua vez, pode ser entendida como a metodologia capaz de contribuirefetivamente no fortalecimento das instituições que visam à promoção do
desenvolvimento rural. Como princípios básicos, o trabalho extensionista deve:
basear-se na realidade rural; trabalhar com programa definido, que prevê os objetivos a
serem alcançados; fazer avaliação constante do trabalho; não ser paternalista; ser
cooperativo; usar pessoal altamente treinado; adotar métodos e processos de
desenvolvimento de comunidade; usar a liderança rural; ser apolítico; e, ter planos de
ação em consonância com a política de desenvolvimento nacional (Queda, 1987).
Apesar dessa distinção entre extensão e assistência técnica, questiona-se se a atuação
da extensão rural no Brasil tenha contribuído, de fato, para o desenvolvimento rural.
Várias críticas são feitas ao serviço de extensão rural no Brasil, incidindo, de modo
geral, sobre sua concepção pedagógica, sua perspectiva de atuar somente na questão
tecnológica e na disseminação de inovações e sua relação com os agricultores e a
pesquisa. Nesse capítulo, faz-se uma descrição resumida dessas abordagens críticas ao
papel da extensão no desenvolvimento rural brasileiro.
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2. A crença no poder absoluto da disseminação das novas tecnologias
Embora estudos revelem impactos positivos da extensão rural, tais como altas taxas de
retorno para investimento em extensão rural e alta correlação entre extensão rural e
ganhos de produtividade, algumas críticas têm sido feitas ao trabalho extensionista,
como salientado por Queda (1987). Nesse sentido, tem sido destacado que: a extensão
atinge pequena parcela de proprietários que, de modo geral, tendem a ser os mais
ricos, com maior grau de escolaridade; seus objetivos são equivocados; o treinamento
dos técnicos tem sido inadequado; há incapacidade, de modo geral, de dar respostas às
questões técnicas; há pouca habilidade para lidar com situações imprevistas; as
técnicas de ensino para a difusão de informações são inadequadas; e, do ponto de vista
dos assalariados, pequenos parceiros, arrendatários e pequenos proprietários, sobre osquais recaiu o ônus desse processo, sua atuação foi um fracasso.
Uma crítica freqüente à atuação da extensão rural incide sobre sua crença no poder das
inovações tecnológicas, de que sua disseminação no campo é suficiente para resolver
todos os problemas dos agricultores. Segundo Queda (1985), apesar da distinção
formal entre extensão rural e assistência técnica, na prática não tem havido distinção
alguma entre esses serviços, já que ambos têm se preocupado apenas com a difusão e aadoção de tecnologias modernas. A promoção humana, presente no discurso
extensionista, surge apenas para ocultar as conseqüências sociais do progresso
tecnológico propagado pelo serviço de extensão rural.
No desenvolvimento do programa extensionista, pressupõe-se que a disseminação das
inovações contribui para aumentar a produção e a produtividade, levando ao
crescimento da renda e do bem-estar das famílias rurais, tudo isso em harmonia com o
meio ambiente. A percepção de base para o trabalho extensionista é a de que a
educação6, por si só, é um instrumento capaz de superar todos os problemas de miséria
e desigualdade no campo. Nessa percepção, não cabem preocupações sobre as relações
6 Educação, nesse caso, admitida como mera transmissão de conhecimentos sobre novas tecnologias e insumos
agrícolas.
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sociais e a estrutura agrária do país, que não são percebidas como fatores de
manutenção e geração de desigualdades.
Embora a implementação de um projeto educativo, de fato, possa contribuir
significativamente para a superação da pobreza e da desigualdade, resumir esse projeto
à mera difusão tecnológica é um tremendo equívoco7. Ora, é necessário reconhecer
que toda educação é um ato político, isto é, não é neutra. De alguma forma, toda
educação baseia-se numa certa visão de mundo e, por mais que a extensão enfatize
utilizar determinada metodologia, que lhe assegure certa racionalidade técnica e
neutralidade científica, nem assim ela pode se dizer neutra.
Sabe-se que a miséria e a desigualdade existentes no meio rural decorrem, em grandeparte, de processos históricos que culminaram na existência de grandes propriedades,
de um lado, e de grande número de pequenos proprietários, parceiros, arrendatários,
posseiros e assalariados, de outro. Nesse contexto, nenhum programa de
desenvolvimento rural, criado a meio século, poderia ter desconsiderado a precária
distribuição da terra no país como origem de grande parte dos problemas do campo,
que posteriormente se tornaram também das cidades, com o acelerado êxodo rural que
se seguiu. Diante desse contexto, um programa de desenvolvimento rural quedesconsidere esse problema com certeza não está sendo neutro ou apolitico8!
E, independente dessa questão, o fato é que a maior parte da solução dos problemas
dos agricultores envolve a via política da organização. A formação de associações,
sindicatos e cooperativas é fundamental para que agricultores e trabalhadores rurais
7 Como destacado por Freire (1977), todo desenvolvimento é modernização, mas nem toda modernização é
desenvolvimento. 8 Nas escolas voltadas para o ensino de ciências agrárias, é comum que alguns ostentem, com certo orgulho, o
fato de serem apenas técnicos e cientistas. Nesse raciocínio, tendem, pejorativamente, a tachar de políticas todas
as discussões que fujam ao caráter estritamente técnico dos problemas da agricultura. Ao contrário do que se
pensa, também esses não estão sendo apolíticos, e estão, com certeza, passando uma visão de mundo consistente
com a ideologia reinante, adequada aos interesses de certos grupos.
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possam ter uma inserção positiva no mercado e assegurar melhores condições de
trabalho. Desenvolvimento rural, distribuição de renda e erradicação da pobreza não
são uma questão estritamente de produção agrícola, como concebido pela extensão
rural.
A estrutura concentrada é uma das principais características do mercado de produtos
agrícolas: na compra dos insumos, máquinas e implementos, os agricultores se
deparam com poucas firmas vendedoras, constituindo um oligopólio e, na hora de
venda do produto, encontram poucos compradores, que constituem um mercado
oligopsônico. Em razão dessa estrutura de mercado concentrada, os agricultores ficam
espremidos entre dois setores, o “antes” e o “depois da porteira”, que têm poder de
barganha suficiente para lhes impor o preço que desejam na venda dos insumos e nacompra dos produtos. Como conseqüência, por mais que os agricultores adotem novas
tecnologias, se modernizem, isso pode não lhes assegurar maior rentabilidade, pois sua
margem de lucro pode estar sendo achatada pelos setores com os quais negociam.
É preciso considerar, além disso, que a tecnologia não é neutra, isto é, seus efeitos não
são iguais para todos os grupos de agricultores, e em algumas situações podem,
inclusive, beneficiar aqueles setores que a produzem em detrimento dos produtores. Atecnologia não é um bem em si, universal, e seus benefícios decorrem de sua
adequação às especificidades dos produtores. Quando se fala em tecnologia, é
necessário perguntar quais tecnologias, para quem são produzidas e a quem
interessam. É fato reconhecido que algumas das tecnologias que foram divulgadas pela
extensão rural não são adequadas à situação da maior parte dos agricultores, mormente
os pequenos, com terras menores e de condições ecológicas impróprias ao emprego
das mesmas.
Além disso, é forçoso reconhecer que a modernização tecnológica, em qualquer
atividade econômica, tende a contribuir para agravar, em vez de diminuir, as questões
sociais e de distribuição de renda. Fosse a tecnologia capaz, por si só, de resolver os
problemas do campo, o incremento do uso de tecnologias modernas que se tem
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observado na agricultura brasileira, principalmente a partir da segunda metade dos
anos sessenta, teria transformado o campo brasileiro num verdadeiro paraíso terrenal.
Contribuindo para agravar essa situação, no processo de disseminação das novas
tecnologias, a extensão rural procurou atingir os produtores mais capazes, isto é,
aqueles com melhores condições (terra, recursos financeiros, nível educacional) de
adquirir e utilizar os insumos modernos. Assim, sendo esperado que disparidades
normalmente ocorressem no processo de modernização, o fato é que as intervenções
da extensão quase sempre deixaram de incluir pequenos parceiros, arrendatários,
posseiros e pequenos proprietários, potencializando e agravando as desigualdades e
conseqüências da modernização. E, passado cerca de meio século desde o início do
serviço de extensão no Brasil, devemos reconhecer que essas conseqüências não sãopoucas: proletarização de grande parte dos pequenos agricultores, concentração de
renda, concentração da estrutura fundiária, êxodo rural, inchamento das grandes
cidades, etc9.
3. A tendência de queda persistente nos preços dos produtos agrícolas
Outra percepção equivocada, mantida por boa parte de profissionais das ciências
agrárias, e dentre eles os extensionistas, é de que o aumento da produção e da
produtividade, decorrente da adoção de novas tecnologias, é suficiente para assegurar
o aumento de renda e do bem-estar das famílias rurais. Ao contrário do que se pensa, a
tecnologia contribui, no longo prazo, para o declínio dos preços recebidos pelos
agricultores.
9 Isso sem falar que o modo de produção divulgado pelos extensionistas, e fomentado pelas
demais políticas de modernização agrícola, em especial a do crédito rural subsidiado, vem
sendo crescentemente questionado por suas implicações para o meio ambiente.
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De fato, os primeiros agricultores a adotar a nova tecnologia obtêm o produto com
menores custos unitários e, em decorrência disso, obtêm lucro. Enquanto os preços se
mantiverem no nível inicial, eles continuarão a obter esse lucro, e os preços certamentecontinuarão assim se a tecnologia mantiver-se restrita a poucos agricultores. Porém, como
a nova tecnologia propicia melhor rentabilidade, é provável que ela venha a ser, de modo
crescente, utilizada por novos agricultores, que passarão a imitar os primeiros adotantes.
O processo tende, portanto, a uma crescente disseminação da inovação tecnológica entre
agricultores, que nela vêm a possibilidade de elevar a lucratividade do empreendimento.
Entretanto, a conseqüência da adoção da nova tecnologia por um número cada vez maior
de agricultores é o aumento da oferta do produto e, tudo o mais permanecendo constante, aredução de seu preço. Ora, nessas condições, a tendência é a de que, com a disseminação
da nova tecnologia entre os agricultores, os preços caiam até o ponto em que os benefícios
econômicos que estimularam a sua adoção sejam eliminados, deixando o agricultor numa
situação semelhante àquela que desfrutava antes de adotar a tecnologia.
Dessa discussão, poder-se-í-a concluir que a nova tecnologia de nada adiantou e que, porisso, melhor teria sido que o agricultor não a adotasse, uma vez que, no final das contas, os
preços caíram e ele ficou na mesma situação. Entretanto, é necessário ressaltar que, se de
um lado, os agricultores que inovaram não conseguiram reter os ganhos advindos da maior
produtividade e dos custos unitários mais baixos, de outro, aqueles que não adotaram a
nova tecnologia passam, na nova situação, a ter que enfrentar um mercado com preços
mais baixos do que antes, porém produzindo ao mesmo custo. É obvio que, para esses
últimos, torna-se impossível permanecer no mercado, já que sua estrutura de custos é
incompatível com os novos preços que nele são praticados.
Uma pequena prova da validade desse raciocínio, que foi originalmente proposto por
COCHRANE (1958), pode ser inferida a partir da observação do comportamento dos
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preços reais de um produto da pecuária que é exemplo de avanço tecnológico: o frango de
corte. Como pode ser constatado na Figura 1, os preços recebidos por quilo desse produto
passam de cerca de R$ 3,00, no início do período, para aproximadamente R$ 0,50 no
último ano. Pode-se ainda observar uma tendência inequívoca de declínio, principalmente
ao longo dos últimos 25 anos.
0,00
0,50
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
j a n / 6 7
j a n / 6 9
j a n / 7 1
j a n / 7 3
j a n / 7 5
j a n / 7 7
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j a n / 9 5
j a n / 9 7
j a n / 9 9
j a n / 0 1
Mês
P r e ç o ( R $ / k g )
Figura 1. Evolução dos preços do frango, Brasil, janeiro de 1967 a julho de 2002.
Fonte: Fundação Getúlio Vargas, 2003.
Sabe-se que a avicultura de corte passou por grande progresso tecnológico e, nem por isso,
se pode afirmar, com certeza, que os produtores de frango vivem melhor hoje do que
ontem. As constantes reclamações dos produtores atestam em contrário10.
Mas, de outro lado, seria possível a um avicultor manter-se produzindo frangos como no
passado, para vendê-los aos preços de hoje? Poderia ele produzir galinha caipira para
vendê-la como frango de granja? Com essa pergunta, cuja resposta é por demais óbvia para
5 É situação comum entre os avicultores o ressentimento para com as agroindústrias integradoras, com as quaisse relacionam mediante contratos que nem sempre lhes favorecem. Nessa situação, os ganhos advindos daredução dos custos de produção, propiciados pela adoção da tecnologia, são apropriados pelas agroindústrias.Esse caso ilustra o fato de que, na maioria dos casos, o desenvolvimento dos agricultores não depende apenas daadoção de novas tecnologias, mas sim da capacidade de conseguirem uma inserção mais favorável, viaorganização, no mercado de insumos e produtos agrícolas.
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ser dada, podemos chegar a uma importante conclusão: a tecnologia não é a salvação do
agricultor, mas jamais poderá deixar de ser adotada por ele!
Antes de encerrarmos essa discussão, é importante ressaltar um aspecto até agora não
mencionado, e cujo esquecimento faz parecerem inúteis todos os esforços feitos nas
diversas universidades e instituições de pesquisa, para a geração de novas tecnologias, bem
como pelos profissionais da área de extensão rural, para disseminá-las entre os agricultores.
Embora seja fato que os ganhos da adoção da tecnologia tendam a se exaurir à medida que
ela se dissemine entre os agricultores, isso não implica que os esforços envolvidos em sua
geração e disseminação tenham sido inúteis. Ao contrário, esses esforços se revertem em
benefícios para os consumidores que, graças às inovações tecnológicas, podem adquirir umproduto mais barato, e antes inacessível a uma grande parte da população. Em resumo, a
sociedade sai beneficiada pelos investimentos na geração e difusão de tecnologia, e o caso
da produção avícola, aqui utilizado apenas para ilustrar o processo de adoção de tecnologia
e seus reflexos nos preços, é prova disso.
4. A concepção pedagógica da ação extensionista
Aspecto dos mais questionados relativos à atuação da extensão rural no Brasil refere-
se ao “processo educativo” por ela desenvolvido. A crítica mais expressiva foi
efetuada por Paulo Freire, que identificava no projeto extensionista a ausência de uma
pedagogia libertadora, que contribuísse para um questionamento da realidade e do
sistema capitalista no qual se inseriam as propostas de modernização. A visão ingênua
da realidade, e a relação de superioridade e de dominação que o técnico estabelececom os agricultores, são alguns dos fatores que ajudam a explicar a incapacidade da
extensão de contribuir para um desenvolvimento rural verdadeiro.
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Freire (1977) se opõe ao conceito de educação propalado pela extensão rural. Embora
defendido com um projeto educativo, o trabalho extensionista é centrado na
propaganda, que procura induzir os agricultores a aceitar, sem refletir, a necessidade
de adotar um conjunto novo de tecnologias e insumos para que ele se torne
“moderno”. A pedagogia subjacente ao projeto extensionista é de negação, aos seus
agricultores, de um papel ativo na superação de seus problemas.
Nessa visão do trabalho extensionista, o agricultor não é admitido como sujeito no
processo de superação de suas dificuldades, mas sim como coisa, como mero objeto de
ações vindas de fora, consistentes com planos de desenvolvimento que lhes são
estranhos. Além disso, ressalta o autor, o conhecimento não é obtido passivamente
pela aceitação de um conteúdo ou saber vindo de outro. Ao contrário, o conhecimentorequer uma busca constante, uma presença curiosa do sujeito em face da realidade.
Não se recebe conhecimento; conhecimento deve ser buscado, ativamente.
Até em seu significado, salienta o autor, a palavra extensão rural está associada a uma
rejeição dos saberes populares como forma de conhecimento. Ao contrário, pressupõe
que os técnicos, portadores do conhecimento científico, devem levar aos agricultores
“incultos” as tecnologias que irão solucionar os seus problemas. Na raiz desse conceitoé que se pode encontrar a razão para que alguns extensionistas, concebendo seu
trabalho como educativo, não se sintam em contradição ao afirmarem que:
persuadir as populações rurais a aceitar nossa propaganda e aplicar essas
possibilidades (técnicas e econômicas) é uma tarefa das mais difíceis e esta
tarefa é justamente a do extensionista, que deve manter contato permanente
com as populações rurais.
A propaganda, qualquer que seja seu conteúdo, ressalta o autor, é sempre
domestificadora. Optando por uma ação libertadora, não se deve persuadir ou
submeter os agricultores à força mítica da propaganda, mas sim atuar no sentido de
dialogar e problematizar sua situação concreta, para que a captem e atuem sobre ela
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criticamente. Para Freire (1977), à extensão rural, termo que mais se aproxima da
noção de invasão cultural, deve-se opor a comunicação. A comunicação, o diálogo, em
oposição à persuasão e à propaganda, é que são a base de uma verdadeira educação.
Como destacado por Sardan (1995), citado por Kreutz (2005), os extensionistas, que
em princípio deveriam ser mediadores entre os conhecimentos técnicos e os
conhecimentos populares, acabam atuando como simples porta-vozes dos
conhecimentos técnico-científicos. Na quase totalidade dos casos, continua o autor, os
agentes de desenvolvimento não aprenderam a ser mediadores entre dois sistemas de
conhecimentos, em especial porque a sua competência técnica foi construída, nos
bancos escolares tradicionais, sobre uma negação e uma rejeição dos conhecimentos
populares.
Não por acaso, essa visão crítica do trabalho extensionista deu origem à percepção de
que seu projeto tratava-se, na verdade, de um “um projeto educativo para o capital”,
como defendido por Fonseca (1985). Um dos argumentos dessa análise enfocava que o
projeto educacional extensionista teria sido, em sua fase inicial, de 1948 a 1968, um
projeto educacional, atuando sobre os pequenos e médios agricultores, na perspectiva
de educá-los e ensinar a ajudarem-se a si mesmos na busca de melhores condições devida. Entretanto, no período pós 1968, com vistas a atender às necessidades de
expansão do sistema produtivo brasileiro, esse serviço teria sofrido mudanças em sua
orientação, e reduzido seus objetivos à mera transferência de tecnologia para os
produtores rurais.
Sobre esse aspecto, Oliveira (1999) argumenta que não há educação em suspenso,
desatrelada do mundo real e das relações sociais e econômicas onde se dão as práticas
pedagógicas. Nesse sentido, o que impulsionou as ações extensionistas nos EUA, e
que Nelson Rockefeller buscou reproduzir aqui, foi a combinação do ganho de lucros -
para os capitalistas - com a ampliação de oportunidades que o capitalismo consegue
operar.
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Por outro lado, o mesmo autor rejeita a afirmação de que a extensão rural, de início
pura, um verdadeiro projeto educativo para o campo, teria se desvirtuado para se
tornar, no período pós- 1968, um projeto educativo para o capital. Para o autor, a
extensão rural, como fruto da doutrina liberal, hegemônica nas nações ocidentais, é,
portanto, inerente ao sistema econômico e político do capitalismo. Indo além, o autor
argumenta que a extensão é um “projeto educativo para o capital” tanto quanto o são
as escolas formais e informais, as universidades e seus serviços de extensão
universitária, os serviços de rádio e televisão, os setores de pesquisa, etc, etc, etc.
Para o autor, essa é uma questão óbvia e, em sua acepção, a mudança ocorrida teria de
outra natureza. Ao deslocar suas ações do “pequeno” para o “grande” produtor, a
extensão teria apenas escolhido outro tipo de capitalismo, abandonando a vertentedemocrática e criadora de oportunidades, e optando pela versão patrimonialista,
concentradora e excludente.
O fato é que, diante das críticas feitas à concepção pedagógica da extensão rural,
algumas mudanças vêm sendo tentadas. Porém, segundo Kreutz (2005), a
incorporação de uma educação construtivista nas empresas de assistência técnica e
extensão rural acontece lenta e timidamente. A conduta de muitos técnicos,professores e cientistas ainda persiste na lógica antiga, paradigma no qual fizeram seus
estudos. Segundo Neves (1998), alguns agentes consideram portadores da função (ou
missão) pedagógica, destinada a mudar comportamentos e visões de mundo.
De acordo com Kreutz (1995), com a crise institucional das empresas de extensão rural
nos anos 1980, foram surgindo posições distintas entre os extensionistas com respeito
ao processo educativo a ser desempenhado.
Assim, há os que aderem a um processo educacional passivo, de veneração de todas as
manifestações do saber popular, mas sem contribuir com o conhecimento acadêmico
para a superação dos problemas enfrentados pelos agricultores.
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Um segundo grupo, o mais representativo do corpo de extensionistas, é representado
por aqueles que, embora abrindo espaço para maior participação do público, ainda se
consideram portadores de um conhecimento superior, atuando, essencialmente, como
transmissores do conhecimento técnico. Embora recorram a ferramentas
metodológicas participativas, e se assumam como moderadores, sensibilizadores,
animadores, facilitadores, entre outras denominações, na prática apenas repassam seus
conhecimentos, não raramente desqualificando o conhecimento popular.
E há, ainda, aqueles que, no seu trabalho, pressupõem a existência de dois sujeitos que
respeitam e reconhecem os mundos distintos, e buscam na educação construtivista sua
forma de exercer a tarefa extensionista. Nessa perspectiva, segundo Kreutz (2005), a
relação entre populações rurais e agentes externos deve assegurar a participação dosprimeiros nas diferentes etapas do trabalho, para assim estabelecer uma comunicação
(disposição de dialogar) de natureza intersetorial. Deve-se sobretudo evitar, nesse
diálogo, o discurso hegemônico, alienígena, culturalmente eurocêntrico,
historicamente colonizador, o qual, embora pretensamente a serviço dos agricultores,
na prática se justifica apenas do ponto de vista dos interesses das classes dominantes.
Como destacado por Hall (2003), é necessário abandonar a perspectiva de uma
atuação neutra, baseada na pressuposição de uma homogeneidade cultural, paraassumir a realidade multicultural, reconhecendo as necessidades sociais diferenciadas
e a diversidade cultural dos grupos sociais.
Segundo Kreutz (2005), alguns esforços nesse sentido surgiram a partir da metade da
década de 1980, quando ocorreu o repensar da extensão rural em todas as instituições
estaduais. Desses esforços resultaram orientações, ao final da década de noventa, no
sentido de promover mudanças estruturais nas EMATERs e definir uma opção
estratégica pelo fortalecimento da agricultura familiar.
Entretanto, argumenta o autor, várias dificuldades vêm sendo encontradas nessa nova
fase, como a falta de processos pedagógicos construtivistas fundamentados em uma
mediação de conflitos, que reconheçam o despreparo da maioria dos extensionistas e
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pesquisadores em trabalhar com a complexidade (agroecossistemas), os diferentes
saberes locais e a dificuldade de consolidar redes entre as entidades parceiras.
Conforme Kreutz (2005), as empresas de extensão rural que resistiram à sua
desestruturação encontram-se, de modo geral, em profunda crise de identidade. Não
compreendendo o contexto das mudanças, tendem a se apegar ao passado, sem
reconhecer que aquelas condições, inerentes a um dado contexto econômico, não
pertencem mais ao momento histórico atual. Segundo o autor, essas empresas
encontram dificuldades para trabalhar a partir de princípios pedagógicos
construtivistas, encontram-se presos aos procedimentos metodológicos, e não
mudaram suas estruturas internas verticalizadas, que impedem seu quadro funcional de
pensar um processo de desenvolvimento construído com os atores sociais (Kreutz,2005).
5. A relação entre a extensão rural, os agricultores e a pesquisa agropecuária
Uma das idéias mais simplistas a respeito da relação entre a pesquisa e a extensão
rural, criticada por Queda (1987), é a de os extensionistas representam o elo de ligaçãoentre a pesquisa e a agricultura. Nessa perspectiva, à extensão caberia realizar um
levantamento da realidade rural, e leva-la às estações de pesquisa. Posteriormente, as
soluções desenvolvidas pela pesquisa retornariam aos agricultores pelos
extensionistas, como descreve o modelo primitivo de extensão rural, esquematizado na
Figura 1.
Figura 1 – A extensão como elo de ligação entre a pesquisa e os agricultores.
Pesquisa AgriculturaExtensão Rural
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Ou, quando expressa de uma forma mais elaborada, como no modelo de articulação
abaixo, a extensão rural é vista como a instituição com maiores possibilidades de
contato com agricultores e produtores. Nesse sentido, ela poderia estabelecer uma
ponte para a comunicação entre a maior parte dos produtores e as instituições de
pesquisa, visto que, sem ela, apenas alguns agricultores teriam acesso direto aos
pesquisadores. Esse modelo teria sua razão de ser a partir da criação da EMBRAPA,
pela Lei no. 5.851, de 07.12.1972, e da EMBRATER, pela Lei n o. 6.126, de
06.11.1974.
Agricultores
Pesquisa
Extensão
Figura 2 – A extensão como o setor com maior superfície de contato simultâneo com a
pesquisa e os agricultores.
Essa perspectiva acerca da relação entre produtores e pesquisadores, mediada pela
extensão, possibilitaria inferir que, em última análise, são os agricultores que definem
os temas de pesquisa, segundo suas necessidades, ou seja, a tecnologia é definida
segundo os interesses dos agricultores. É preciso conceber, entretanto, que a tecnologia
é determinada por razões econômicas interentes ao capitalismo, ao qual se subordina o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia.
Sobre esse aspecto, é preciso considera que, a partir das duas últimas décadas do
século XIX, a revolução técnico-científica passa a ter um caráter consciente e
proposital até então ausente. Ou seja, as inovações tecnológicas se tornam cada vez
menos espontâneas, tornando-se a ciência uma mercadoria. Nessa situação, empresas
privadas, universidades e Estado criam uma complexa rede de articulações no processo
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de produção de conhecimento, onde os interesses dos agricultores são apenas uma
parte, e a de menor expressão, dentro da teia de interesses conflitantes11.
É necessário ainda lembrar que, com o surgimento do complexo agroindustrial, são os
setores industriais que impõem demandas sobre o processo agrícola e, assim o
fazendo, impedem que a tecnologia tenha qualquer relação com as demandas dos
agricultores. Em suma, os maiores interessados no progresso técnico as indústrias, que
têm no campo mercado para máquinas, implementos e insumos diversos.
6. Comentários finais
Apesar das críticas feitas nesse capítulo, não se deve, entretanto, negar ao serviço de
extensão rural no Brasil alguns resultados favoráveis decorrentes de seus esforços. É
inegável que a extensão rural teve um papel fundamental no processo de modernização
agrícola, à qual estão associados vários resultados positivos para o país. O aumento da
produtividade proporcionado pelas novas tecnologias tem possibilitado ao país
produzir alimentos a preços decrescentes, competitivos no mercado internacional e
mais acessíveis à população.
Além disso, as transformações por que passou a agricultura tornaram-na capaz de
satisfazer as demais exigência do processo de crescimento industrial, tais como
fornecer matérias-primas, transferir capital, gerar e poupar divisas e criar mercado para
os produtos industriais. Em suma, o país, tradicionalmente uma economia agrária,
industrializou-se aceleradamente com o auxílio da modernização agrícola, anunciada
pela extensão rural.
11 Recentemente, a polêmica em torno do plantio da soja transgênica ilustra essa questão. O desenvolvimentodessa nova tecnologia, que se baseia em grande parte no conhecimento gerado nas universidades e instituiçõespúblicas de pesquisa, não foi promovido pela demanda dos agricultores. Estes, após desenvolvida a tecnologia,são apenas induzidos a comprar esse novo insumo, mediante o pagamento de royalties à empresa que a“desenvolveu”, a Monsanto. Mais uma vez, o que se argumenta é que essa nova tecnologia poderá elevar a rendados agricultores e de suas famílias e contribuir para acabar com a fome no mundo.
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Se essa industrialização e o crescimento econômico a ela associado beneficiaram
igualmente o conjunto da população, é outra história, sobre a qual silenciam-se os
principais formadores de opinião. Nesse silêncio é que devem ser buscados as
limitações e os equívocos da extensão rural no Brasil.
Finalizando, não se pode concluir que a atuação da extensão tenha contribuído para
elevação e distribuição de renda, tópicos que sequer podem ser admitidos com
constantes de seu ideário. Mediante esse processo foi consolidado o complexo
agroindustrial, a partir do qual a geração de inovações, e também sua difusão, passam
a ser conduzidas, de forma crescente, por interesses de setores industriais e
financeiros.
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CAPÍTULO III
O PROCESSO DE COMUNICAÇÃO
1. Introdução
A comunicação é a base da ação recíproca entre os homens, mediante a qual enviamos
e recebemos mensagens, e aprendemos sobre fatos e coisas. Seus objetivos podem ser
informar, persuadir, divertir, entre outros e, em um grande número de situações, mais
de um objetivo pode estar incluído num ato de comunicação. Um programa televisivo,um filme, a leitura de um livro, a audição de uma música ou simplesmente um “bate-
papo” com amigos, por exemplo, são situações em que informação e prazer podem
estar unidos.
Como destacado por Berlo (1986), a importância da comunicação nos dias atuais tem
sido tão importante que nossa era tem sido às vezes denominada “a idade de
manipulação dos símbolos”, visto que muitos têm ganhado a vida manipulandosímbolos, em vez de coisas. A criação de diferenças entre produtos semelhantes,
mediante propaganda e criação de uma fidelidade à marca é um exemplo dessa
situação. Não são raras as situações em que a ascensão profissional encontra-se mais
na dependência da capacidade do trabalhador de trabalhar a comunicação do que
trabalhar qualquer outro material.
Nesse capítulo, são dadas algumas noções sobre comunicação, extraídas do texto de
Berlo (1986). A perspectiva é a de que o conhecimento dessas noções contribua para
facilitar a resolução dos problemas de comunicação no ambiente de trabalho, em
particular dos problemas relativos ao trabalho da extensão rural.
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2. Um modelo de processo de comunicação
Embora corriqueira, a comunicação constitui-se num processo relativamente
complexo, que nem sempre atinge seus objetivos. Dizer que a comunicação se
apresenta como um processo, significa dizer que sua natureza é constituída de partes
intimamente relacionadas, que não podem ser consideradas isoladamente das demais.
No processo educativo, por exemplo, ainda que se disponha dos vários ingredientes,
isto é, os alunos, os professores, os livros, as aulas, a biblioteca, os recursos
audiovisuais, etc, ainda assim não se pode afirmar, com certeza, que os estudantes
receberam educação. Os ingredientes são necessários, mas insuficientes, e o que
importam são as inter-relações dinâmicas entre os ingredientes, surgidas durante o
processo.
A comunicação deve ser também entendida como um processo pois, ainda que seus
ingredientes possam ser separados para fins de análise, a inter-relação entre eles é um
dos aspectos mais importantes para a efetividade da comunicação. De um modo
simplificado, como definido por Aristóteles, o processo de comunicação tem como
ingredientes “quem fala”, “o discurso” e a “audiência”.
De uma forma mais detalhada, pode-se dizer que todo o processo de comunicação
implica na existência dos ingredientes:
1. Fonte: uma pessoa ou grupo de pessoas com um motivo qualquer para entrar
num processo de comunicação.
2. Mensagem: é a forma em que o objetivo da fonte deve ser expresso, isto é, em
que os objetivos e intenções da fonte são convertidos num conjunto sistemático
de símbolos.
3. Codificador: é o ingrediente responsável pela codificação das idéias e objetivos
da fonte, exprimindo-as em forma de mensagem. Na comunicação interpessoal
são as habilidades motoras, que permitem à fonte falar, escrever, gesticular, etc.
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4. Canal: é o condutor da mensagem, que pode ser, por exemplo, transmitida pelo
ar, para serem ouvidas, podem ser impressas, para serem lidas, etc.
5. Decodificador: é o elemento responsável pela decifração da mensagem, para
que essa possa ser útil para o receptor. Na comunicação interpessoal, são as
habilidades sensoriais, que permitem ao receptor ouvir, ler, compreender
gestos, etc.
6. Receptor: é o alvo da comunicação, podendo constituir-se de uma pessoa ou
grupo de pessoas.
Esses ingredientes são essenciais ao processo de comunicação e, a partir do momento
em que os reconhecemos, podemos enumerar várias situações em que o processo de
comunicação se frustra, como, por exemplo, nos casos de: falta de uma corretadefinição dos objetivos pela fonte; erro de codificação do objetivo, e conseqüente
mensagem inadequada ou equivocada; incapacidade de codificação da mensagem, por
questões como idioma, classes sociais, nível de instrução, cultura, etc.; incapacidade
de decodificação da mensagem, devido a questões de idioma, classes sociais, nível de
instrução, cultura, etc.; deficiência do canal, etc.
3. Fidelidade da comunicação e seus determinantes
Havendo um objetivo a comunicar e uma resposta a obter, o comunicador espera que
sua comunicação seja o mais fiel possível, e que ele obtenha o efeito desejado. Isso
nem sempre é conseguido, em virtude da presença de ruídos. Por definição, ruídos são
os fatores que, atuando em cada um dos ingredientes da comunicação, podem reduzir
sua fidelidade. Nesse sentido, há alguns fatores, presentes na fonte, no receptor, na
mensagem e no canal, que têm significativo impacto sobre a fidelidade de
comunicação. Esses fatores são apresentados a seguir.
3.1. Condificador-fonte
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Há, pelo menos, quatro tipos de fatores, associados à fonte, que podem aumentar a
fidelidade da comunicação: suas habilidades comunicativas; suas atitudes; seu nível de
conhecimento; e, sua posição no sistema sócio-cultural.
As habilidades comunicativas da fonte, tais como a escrita, a palavra e o pensamento
ou raciocínio, têm grande impacto sobre a fidelidade da comunicação, já que
interferem diretamente na capacidade da fonte de definir seus objetivos e codificá-los
em uma mensagem adequada. As habilidades comunicativas afetam a fidelidade da
comunicação ao influenciarem nossa capacidade de analisar nossos objetivos e
intenções e, além disso, influencia a capacidade de codificar uma mensagem que
exprima esses objetivos corretamente. Ou seja, é importante reconhecer que o domínioda linguagem, principalmente, influencia nossos próprios pensamentos.
Uma hipótese provável é a de que o pensamento tenha como unidades básicas as
unidades de linguagem e, por isso, pensamos mais facilmente em coisas que já
experimentamos e para as quais temos denominação. Portanto, a denominação, a
linguagem, é essencial para que o pensamento possa se desenvolver. Quem não
domina bem a palavra ou a escrita tem, por conseguinte, dificuldades de pensar, isto é,seu pensamento fica confinado aos estreitos limites impostos pela pobreza de sua
linguagem.
Também as atitudes da fonte contribuem para afetar a fidelidade da comunicação.
Atitude pode ser entendida como a predisposição, tendência ou desejo que alguma
pessoa tem de aproximar-se ou afastar-se de alguém ou de alguma coisa. Ou seja, são
atitudes o gostar ou não gostar de alguém ou alguma coisa, ser-lhe favorável ou não,
etc. Nesse aspecto, há, pelos menos, três maneiras pelas quais a comunicação é
influenciada pode ser influenciada: pelas atitudes para consigo, pelas atitudes para com
o assunto e pelas atitudes para com o receptor.
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As atitudes que a fonte tem para consigo afetam a forma como ela irá transmitir sua
mensagem. A auto-avaliação excessiva pode afetar o tipo de mensagem criada,
afetando, portanto, a fidelidade do processo de comunicação.
As atitudes da fonte para com o assunto transparecem na mensagem, afetando a
comunicação. É extremamente difícil falar bem daquilo de que não se gosta, sem que
isso fique evidente na conversação. Um exemplo pode ser dado pela atitude de
vendedores, que em geral têm que convencer os potenciais consumidores acerca das
virtudes do produto. Par isso, é importante que eles tenham uma atitude favorável em
relação a esse produto, têm que gostar dele ou, em outras palavras, têm que “vestir a
camisa do produto” pois, do contrário, qualquer desconfiança transpareceria em sua
conversação.
Finalmente, é importante que a fonte mantenha uma boa atitude para com o receptor .
Atitudes negativas para com os receptores afetam a mensagem da fonte e influenciam
a maneira pela qual essas pessoas receberão e reagirão à mensagem. É importante
lembrar que a comunicação é um processo, com forte interdependência entre fonte e
receptor, sendo este último livre para decidir se aceita ou não participar ativamente da
comunicação. Se, em virtude de determinada atitude da fonte, o receptor passa arecusar sua mensagem, ou a recebe-la com desconfiança, o fluxo da comunicação
reduz-se ou é obstruído completamente.
Outro fato que afeta significativamente a comunicação é o nível de conhecimento que
a fonte tem sobre determinado assunto. Falar a respeito de algo sobre o qual pouco se
sabe gera dificuldades na comunicação. Uma das conseqüências é a de que a fonte,
conhecedora de suas limitações, tende a evitar certos temas, reduzindo a fluência do
discurso, e evitar perguntas, gerando desconfiança dos receptores. Nesse sentido, é
importante que a fonte aumente seu nível de conhecimento a respeito do assunto a
comunicar.
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Nenhuma fonte é capaz de se comunicar sem que seja influenciada pela sua posição
no sistema sócio-cultural. Aspectos relativos aos grupos aos quais pertence, a seus
valores, a sua concepção de vida, a seu posto hierárquico, entre outros, certamente
afetam a forma pela qual a fonte se comunica. Há, inclusive, um ditado que diz que se
pode conhecer o caráter de uma pessoa pela forma como ela se comunica com
superiores e inferiores. Não é preciso ter muito senso de observação para concluir que
algumas pessoas, que se portam de uma forma extremamente submissa diante de
superiores, mostram-se, por outro lado, arrogantes e tiranas no contato com inferiores.
Isso mostra o quanto a posição no sistema sócio-cultural afeta a comunicação.
Portanto, as habilidades comunicativas, as atitudes, o nível de conhecimento e a
posição no sistema sócio-cultural são fatores que devem ser levados em consideraçãono processo de comunicação, visto que eles afetam o comportamento da fonte e sua
eficiência quando comunica seus objetivos a outras pessoas.
3.2. O receptor-decodificador
De modo semelhante ao que foi dito para a fonte, também para o receptor ashabilidades comunicativas, as atitudes, o nível de conhecimento e a posição no sistema
sócio-cultural afetam a fidelidade da comunicação.
Assim, a fidelidade da comunicação é afetada pelas habilidades comunicativas do
receptor, em particular as habilidades de ouvir, ler e de pensar. Essas habilidades
afetam a transmissão e a decodificação da mensagem e, portanto, interferem na
fidelidade da comunicação.
Com relação às atitudes, a forma como o receptor decodifica a mensagem é também
função das atitudes para consigo, para com a fonte e para com o assunto. Atitudes de
desconfiança ou de descrença em relação à fonte, atitudes de auto-avaliação, do tipo
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“não conseguirei jamais compreender esse assunto”, e atitudes de desinteresse em
relação ao assunto, afetam negativamente a fidelidade da comunicação.
A capacidade de decodificar e de compreender a mensagem depende, em grande
medida, do nível de conhecimento do receptor. Embora atitudes de excessiva auto-
avaliação devam ser evitadas, por afetar a comunicação, é inegável que, por mais que
o receptor tenha uma boa atitude para consigo mesmo, há situações em que se torna
difícil compreender o assunto pelo fato de se ter pouco conhecimento sobre o mesmo.
Nesse sentido, informar-se previamente sobre o assunto aumenta significativamente a
fidelidade do processo de comunicação.
Por outro lado, há várias situações em que o receptor deixa de compreenderplenamente a mensagem, não pelas limitações específicas ao assunto, mas por que lhe
faltam conhecimentos gerais, como noções básicas das diversas áreas do
conhecimento, vocabulário, noções de atualidades, dentre outras. Por essa razão,
atualizar-se, ler bons livros, assistir bons filmes, ouvir boa música e, em suma, ter
interesse sobre assuntos gerais, são comportamentos que elevam a capacidade do
indivíduo de decodificar e entender as mensagens, contribuindo para torna-lo um bom
comunicador.
Finalmente, a posição no sistema sócio-cultural também irá influenciar a forma pela
qual o receptor recebe e interpreta as mensagens. Como exemplo, provavelmente um
empregado deve receber com certa desconfiança uma mensagem procedente o patrão.
Com muita freqüência, pessoas de uma dada religião se recusam a ouvir o sermão de
um líder de outra religião e, mesmo quando o ouvem, tendem a desqualifica-lo. Na
situação atual, certamente a interpretação que um muçulmano dá a uma mensagem
proveniente do presidente americano é grandemente afetada, não só em razão dos
conflitos bélicos, mas também pelo fato de se tratarem de culturas muito diferentes. De
modo semelhante, agricultores normalmente pertencem a um sistema cultural bastante
distinto do dos técnicos, o que pode gerar grandes dificuldades na comunicação entre
eles.
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3.3. A mensagem
A mensagem pode ser definida como o produto físico real do codificador-fonte,
podendo ser ela um discurso, um texto, um conjunto de gestos, etc. Pelo menos três
fatores devem ser levados em consideração no preparo da mensagem: o código, o
conteúdo e o tratamento.
Código pode ser definido como qualquer grupo de símbolos capaz de ser estruturado
de maneira a ter significação para alguém. Os idiomas, a música, a pintura, a dança são
alguns exemplos de códigos. Ao codificar uma mensagem, há que se decidir qual o
código usar, quais os elementos desse código e que método para estruturar esseselementos deve ser empregado. O conteúdo consiste no material da mensagem,
escolhido pela fonte para exprimir seus objetivos. As decisões que a fonte toma para
selecionar e dispor tanto o código como o conteúdo da mensagem é o que se chama
tratamento da mensagem. Ou seja, uma vez determinado o código ou o conteúdo, são
as demais medidas tomadas pela fonte com a finalidade de tornar a mensagem mais
palatável para o receptor.
O receptor é o elo mais importante da comunicação e uma das maiores preocupações
do comunicador, enquanto fonte, é alcança-lo. Assim, quando a fonte escolhe um
código para a mensagem, deve usar um que seja conhecido pelo receptor. Quando
seleciona um conteúdo, este deve ter um significado para o receptor. Portanto, no
preparo de mensagens, deve-se levar em conta os fatores que, presentes nos receptores,
afetam sua capacidade de recebe-las e interpreta-las. Ou seja, o preparo de mensagens
deve considerar as habilidades comunicativas, as atitudes, o nível de conhecimento e a
posição no sistema sócio-cultural dos receptores.
3.4. O canal
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Pode-se definir o canal de comunicação como os sentidos através dos quais o receptor-
decodificador percebe a mensagem codificada e transmitida pela fonte-codificadora. A
escolha do canal mais adequado é importante na determinação da qualidade e
efetividade da comunicação.
As decisões sobre a seleção do canal não são independentes da decisão sobre a
mensagem. O conteúdo, o código, o tratamento da mensagem tem relação com a
escolha dos canais. Por exemplo, uma mensagem inicialmente escrita, deve ter seu
conteúdo, seu código e seu tratamento alterados se a fonte desejar que seus receptores
também a vejam, a toquem, e assim por diante. Da mesma forma, as características do
receptor têm relação com a escolha dos canais: terá ele maior facilidade de decodificar
a mensagem pela visão, pelo ouvido ou pelo tato? A própria fonte tem relação com ocanal que escolhe, pois deverá ser aquele em que ela melhor se expressa: escrevendo,
falando, demonstrando, etc.
Finalmente, de tudo o que foi visto neste capítulo, é importante destacar que, além das
condições apresentadas, que podem definir boas fontes-codificadores e bons
receptores-decodificadores, a relação entre esses ingredientes é o aspecto mais
importante. Por exemplo, não se pode definir uma boa fonte a partir de suascaracterísticas, isoladamente, sem que se conheçam as características do receptor. Ou
seja, não basta ter as habilidades mencionadas, é preciso que elas estejam em sintonia
com as habilidades interlocutor, isto é, com as habilidades do receptor, quando se é
fonte, e da fonte, quando se é receptor.
4. O processo de aprendizagem
4.1. Introduçao
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Sendo uma das finalidades da comunicação, e da extensão rural em particular,
influenciar o comportamento, provocar mudança de hábitos, é necessário compreender
as variáveis e os processos que determinam o comportamento e sua mudança. Para
entender o processo de aprendizagem de um determinado comportamento, é preciso
definir os conceitos de estímulo e resposta. Estímulo pode ser entendido como
qualquer coisa que o indivíduo pode receber através de um dos sentidos, que produza
sensação no organismo humano. Qualquer coisa que esse indivíduo faça como
resultado da percepção do estímulo consiste numa resposta, que nada mais é do que
reação do indivíduo ao estímulo.
Boa parte da teoria sobre o comportamento humano baseia-se na suposição de que o
homem, em presença de ambigüidade, da ausência de forma, age sob tensõesfisiológicas. Alguns exemplos cotidianos de ambigüidade que, por mais simples que
sejam, causam desconforto, são a indecisão sobre ir ou não a uma festa, sobre que
roupa usar em determinado evento, sobre que rua tomar diante de uma encruzilhada,
etc.
Por essa razão, procuramos reduzir a ambigüidade, reduzindo a incerteza quanto à
natureza do meio ambiente. Para fazer isso, procuramos impor uma estrutura, dandoum significado ao nosso ambiente, eliminado a ambigüidade pela construção de
relações estímulo-resposta estáveis. Pelo processo de aprendizagem, chegamos a
algumas relações estímulos respostas simples. Por exemplo, sabemos, por que
aprendemos, que dois mais dois são quatro, que para a dor devemos tomar analgésico,
que ao recebermos um bom dia, respondemos com outro bom dia, que diante de
ocasiões fúnebres devemos mostrar respeito, e assim por diante. A música
Diariamente, de Nando Reis, ilustra a noção de relações estimula-resposta estáveis,
que construímos por aprendizagem:
Para calar a boca: Rícino
Pra lavar a roupa: Omo
Para viagem longa: Jato
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Para difíceis contas: Calculadora
Para o pneu na lona: Jacaré
Para a pantalona: Nesga
Para pular a onda: Litoral
Para lápis ter ponta: Apontador...
Nesse sentido, pode-se definir a aprendizagem como o processo de criação de relações
estímulo-resposta estáveis que, na maior parte dos casos, envolve a destruição de uma
relação estímulo-resposta anterior, isto é, envolve uma mudança na relação estável
entre um estímulo que o organismo percebe e a resposta que ele formula. Assim, um
indivíduo aprendeu se ele: transfere a resposta que dava a um estímulo a outro
estímulo diferente; ou, passa, diante de um mesmo estímulo, a dar resposta distinta daque dava anteriormente.
A aprendizagem requer a quebra de determinada relação estímulo-resposta e sua
substituição por outra. Ao fazer isso, ela aumenta a tensão psicológica e, se o
indivíduo não percebe alguma possibilidade de maior recompensa proveniente da nova
relação, ele não a considera, continuando a se comportar da forma que está
acostumado. Requer-se, portanto, a possibilidade de que exista uma posterior reduçãode tensão pela criação de uma maior certeza e uma estrutura mais útil da realidade.
Em geral, tratamos qualquer situação de comunicação com a atitude de “que vantagem
eu levo nisso?” Mesmo a seleção e interpretação de um estímulo tem relação com a
nossa expectativa de recompensa. Na ausência de qualquer expectativa de recompensa,
freqüentemente nos recusamos até a selecionar e a interpretar um estímulo.
Pode-se dizer, portanto, que a modificação da conduta de um indivíduo é determinada
pelo balanço entre a recompensa esperada e a energia necessária. Nessa lógica, a
efetividade da comunicação e da mudança do comportamento dos receptores pode ser
aumentada quando se eleva a recompensa e/ou quando se reduz a energia envolvida no
processo de aprendizagem.
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4.2. Os ingredientes do processo de aprendizagem
Pode-se dizer que o processo de aprendizagem é constituído dos seguintes
ingredientes:
1. Apresentação do estímulo
2. Percepção do estímulo pelo organismo
3. Interpretação do estímulo
4. Resposta experimental ao estímulo
5. Percepção das conseqüências da resposta experimental
6. Reinterpretação das conseqüências e preparo das novas respostas7. Criação de uma relação estímulo-resposta estável: o hábito
A apresentação do estímulo consiste no primeiro requisito do processo de
aprendizagem. Uma vez apresentado, é preciso que esse estímulo seja percebido e
depois interpretado. Para que haja aprendizagem, o comportamento reflexivo não
basta. É preciso que o organismo, após receber o estímulo, interprete-o e dê a ele uma
resposta. Essas primeiras respostas podem ser consideradas experimentais: oorganismo a fornece para ver o que ocorre. No momento seguinte, percebendo as
conseqüências da resposta experimental, o indivíduo irá manter essa resposta, se suas
conseqüências são compensadoras, e, em caso contrário, ele passa para o seguinte
passo, que consiste no preparo das novas respostas. Esse processo deverá ser repetido
até que se chegue a uma relação estímulo-resposta estável, o hábito.
Portanto, a aprendizagem não é, em geral, processo de um só turno, já que consiste em
receber estímulos continuamente, interpreta-los, responde-los, observar as
conseqüências da resposta, reinterpreta-los, formular novas respostas, e assim por
diante. Porém, uma vez criado o hábito, deixamos de interpretar o estímulo, passando
a responde-lo automaticamente, sem análise. O comportamento habitual é tão
irracional que, se alguém nos perguntasse a razão de alguns de nossos comportamentos
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ou procedimentos diante de determinada situação, provavelmente nem saberíamos
responder.
4.3. Determinantes da força do hábito
Grande parte de nosso comportamento cotidiano é habitual, pois, criando o hábito,
reduzimos o esforço necessário para a realização de respostas. Entretanto, como visto
anteriormente, os comportamentos habituais são meramente reflexivos, não envolvem
mais um raciocínio lógico em sua realização. Por essa razão, são freqüentes as
situações em que mantemos certos hábitos ao longo da vida, ainda que, pela lógica,
devêssemos substituí-los por outros.
Um dos objetivos do extensionista é o de produzir aprendizagem nos agricultores,
quebrando certos padrões de hábitos existentes para estabelecer outros. Contribui para
o desempenho dessa tarefa, que é também enfrentada por professores, pais,
publicitários, etc., o conhecimento dos princípios da criação do hábito. Pelo menos
cinco fatores que influenciam o desenvolvimento da força do hábito podem ser
isolados
12
: a freqüência da repetição recompensada, o isolamento da relação estímulo-resposta, o volume de recompensa, o tempo entre a resposta e a recompensa e o
esforço requerido para a resposta.
No esforço para promover a mudança de um determinado hábito em favor de outro,
percebido como melhor, um dos fatores mais importantes é o volume da recompensa
associado a determinada resposta. Quando mais recompensadora for a resposta, maior
a probabilidade de que o novo hábito prevaleça sobre o anterior. A conduta de gerentes
de pessoal nas fábricas para com os trabalhadores ilustra bem essa relação.
Trabalhadores que respondem com aumento de produtividade podem receber, por
exemplo, aumento salarial ou promoção a um posto mais elevado. Essas
12 Há muitos outros princípios, como destacado por Berlo (1989), mas estes são os mais importantes.
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recompensas13 visam, na prática, a tornar a busca por melhores produtividades um
hábito permanente dos trabalhadores.
Por outro lado, ainda que o volume da recompensa seja elevado, há que se considerar o
tempo existente entre a nova resposta que o indivíduo emite e a recompensa que ele
espera receber. Há dificuldade em se criar novos comportamentos quando as
recompensas dele advindas estão num futuro relativamente distante. Em igualdade de
condições, respostas imediatamente recompensadas tendem a ser mais fortalecidas do
que as recompensadas mais lentamente. Por essa razão, é sempre importante se utilizar
de meios para que os receptores possam receber algum tipo de recompensa mais
rapidamente. É o que se faz, por exemplo, quando se subdivide uma determinada
tarefa, penosa e demorada, em várias tarefas menores. A execução dessas tarefasmenores e mais fáceis tende a proporcionar aos executores uma recompensa mais
rápida, tornando-a menos penosa.
De modo semelhante, a freqüência da repetição recompensada é um fator importante
na determinação do hábito. A força do hábito é determinada em parte pelo total de
vezes que uma determinada relação estímulo-resposta é recompensada. Por exemplo,
se em toda colheita os agricultores são recompensados com maior produtividade, emdecorrência da adoção de determinada prática, eles tenderão a formar mais facilmente
o hábito de utilizar essa prática. Porém, pode ocorrer que em algumas safras a
produtividade seja baixa, ainda que o indivíduo tenha adotado aquela prática e, quanto
mais vezes isso ocorrer, mais dificilmente o hábito de emprega-la será formado. Outra
noção associada a esse princípio é a de que “a prática leva à perfeição”, indicando que,
quanto mais vezes fazemos algo, e o fazemos com sucesso, tendemos a nos tornar
especialistas no assunto, realizando-o com grande perícia.
No que se refere ao isolamento da relação estímulo-resposta, quanto maior a
possibilidade da fonte isolar o receptor, restringindo as mensagens que chegam até ele,
13 A noção de recompensa não está estritamente relacionada a ganhos salariais ou promoção. Um simples elogioou reconhecimento pode constituir recompensa. De qualquer modo, é preciso saber qual o tipo de recompensaalmejada pelo receptor, pois nem todos desejam as mesmas coisas.
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mais facilmente ela será capaz de fazer com que ele mude seus hábitos, suas opiniões,
etc. Governos de regimes totalitários tendem a restringir o acesso de suas populações a
outras fontes de informação além das oficiais, visando com isso faze-las crer em seus
discursos. Em nosso país, também, não podemos considerar que não ocorra restrição
do acesso a informações. Em geral, ainda que não estejamos submetidos a uma única
fonte de informação, os principais meios de comunicação existentes tendem a
reproduzir um mesmo discurso, representativo dos interesses das classes dominantes,
para que aceitemos a ordem vigente sem questionamentos.
Quanto menor o esforço requerido para a resposta, mais provável é o
desenvolvimento do hábito. As respostas fáceis de serem dadas têm mais
probabilidade de serem mantidas do que as difíceis. Por essa razão, deve-se sempreprocurar reduzir o esforço requerido do receptor para que ele emita as respostas
desejadas. Por exemplo, quando se faz uma pesquisa mediante aplicação de
questionários à população, uma forma de facilitar as respostas é formulando um
questionário menor e mais simples, de preferência com questões objetivas. Se esse
questionário for enviado pelo correio, uma forma de facilitar a resposta das pessoas é
enviar-lhes um envelope selado, e assim por diante.
5. Interação: objetivo da comunicação interpessoal
Em qualquer situação de comunicação, fonte e receptor são interdependentes.
Entretanto, os níveis de interdependência variam de situação para situação, podendo
ser distinguidos em: interdependência física e definidora, interdependência de ação e
reação e interdependência das expectativas ou empatia.
Os conceitos de fonte e receptor dependem um do outro fisicamente e por definição, já
que a fonte é emissora de mensagens para alguém (o receptor) e o receptor deve,
necessariamente, receber alguma mensagem de alguém (a fonte). Como a definição e a
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existência de um implica, necessariamente, na definição e na existência do outro, diz-
se que há uma interdependência física e definidora entre fonte e receptor.
Ocorre ainda, entre a fonte e o receptor, uma interdependência de ação e reação. A
ação da fonte influencia a ação do receptor e a reação do receptor influencia a
subseqüente reação da fonte, e assim por diante. Fonte e receptor podem utilizar as
reações do outro, as quais funcionam como feedback . O feedback ou retroinformação
consiste na reação dada pelo receptor à mensagem emitida pela fonte. A capacidade de
observar cuidadosamente as reações dos outros às nossas mensagens é uma das
características da pessoa boa em relações humanas ou sensível como comunicadora14.
O feedback proporciona à fonte informação referente ao seu sucesso ou fracasso narealização de um objetivo. Desse modo, se a fonte recebe um feedback compensador
após emitir determinada mensagem, ela percebe que essa mensagem atingiu seus
objetivos e irá continuar a produzir a mensagens do mesmo tipo. Porém, se em
resposta a alguma mensagem, a fonte recebe um feedback negativo, ela terá que fazer
alterações em sua mensagem no sentido de ter seus objetivos atingidos. Como
exemplo, se um anunciante de uma empresa constata que o produto anunciado obteve
um aumento de vendas ( feedback compensador), ele deverá continuar a produziranúncios semelhantes e, caso as vendas não sejam afetadas pela propaganda ( feedback
não compensador), alguma coisa terá que ser feita visando melhorar a comunicação
entre a empresa e os consumidores. A conduta das emissoras de TV, dos jornais e dos
candidatos a cargos políticos ilustra bem a importância do feedback na comunicação:
eles ficam sempre atentos ao feedback dado pelos telespectadores, leitores e eleitores15,
objetivando produzir uma mensagem que lhes assegure maior audiência, maior
número de jornais vendidos ou maior votação, respectivamente.
14 Por outro lado, como são inconvenientes aquelas pessoas que, não percebendo ou não se importando com areação dos outros (o feedback ), continuam a proferir um discurso que não agrada, falando demais,monotonamente, repetitivamente, sobre assuntos desinteressantes ou mesmo impróprios para a ocasião. São osfamosos “malas”, reconhecidos, com unanimidade, por sua capacidade de afugentar os ouvintes.15 Como receptores, subestimamos nossa capacidade de influenciar a fonte, sempre atenta à nossa reação.Recusando-nos a assistir, ler ou votar nos programas televisivos, jornais ou políticos que não atendem a nossosanseios, estaríamos lhes dando um sinal para que mudassem suas mensagens.
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Num nível mais elevado, ocorre, entre fonte e receptor, uma interdependência das
expectativas ou empatia. Pode-se definir empatia como o processo pelo qual chegamos
às expectativas, às antecipações das condições psicológicas internas dos outros. Toda a
comunicação humana envolve previsões, pela fonte e pelo receptor, quanto à maneira
como outras pessoas responderão à mensagem. Como fontes e receptores, usamos tais
expectativas na codificação, na decodificação e na resposta de mensagens. As
expectativas sobre o receptor influenciam-nos e às nossas mensagens.
Quando criamos essas expectativas, estamos supondo que temos empatia, isto é, a
capacidade de projetar-nos dentro das personalidades das outras pessoas. Como criar
essa capacidade de empatia? Qual o processo que caracteriza a nossa capacidade decriar expectativas sobre os outros, de predizer como se comportarão antes do
momento?
As duas teorias sobre o fundamento da empatia concordam que nossas predições sobre
os estados psicológicos internos humanos são baseadas em comportamentos físicos
observáveis. Concordam que o homem faz previsões pelo uso de símbolos
representativos dos comportamentos físicos e pela manipulação desses símbolos e, apartir daí, elas se dividem em duas vertentes: a teoria da empatia por inferência e teoria
da empatia por adoção de um papel.
A teoria da empatia por inferência assume que o indivíduo pode observar seu próprio
comportamento físico e relacionar esse comportamento com seus estados psicológicos
internos. Tendo por base suas interpretações de si mesmo, o indivíduo tira, a partir da
observação do comportamento físico das outras pessoas, as inferências sobre as
disposições internas dessas pessoas. Já a teoria da empatia por adoção de um papel
sugere que o indivíduo possa criar empatia colocando-se no lugar do outro, isto é,
adotando o papel do outro, extraindo, a partir disso, conclusões a respeito das suas
expectativas. Partindo dessas duas abordagens, pode-se concluir que o homem cria
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expectativas a partir de duas formas, ou seja, cria expectativas assumindo um papel de
outros ou tirando inferências sobre si mesmo, ou ambas as coisas.
Portanto, pode-se concluir que, em certo nível de análise, a comunicação envolve uma
interdependência física entre fonte e receptor, pois cada qual exige o outro, por
definição. Num segundo nível de complexidade, a interdependência pode ser analisada
como uma conseqüência de ação e reação. Num terceiro nível de complexidade, a
análise da comunicação preocupa-se com as habilidades empáticas, com a
interdependência produzida pelas expectativas sobre como os outros responderão à
mensagem. Inferimos os estados internos dos outros comparando suas atitudes com as
nossas próprias e, ao mesmo tempo, empenhamo-nos em assumir papéis, pondo-nos no
lugar de outra pessoa, criando um conceito de pessoa que usamos para tirar inferênciassobre os outros.
O nível seguinte de complexidade é a interação, isto é, o processo de adoção recíproca
de papéis, o desempenho mútuo de comportamentos empáticos. Se dois indivíduos
tiram inferências sobre os próprios papéis e assumem o papel um do outro, e se o seu
comportamento de comunicação depende da adoção recíproca de papéis, então eles
estão em comunicação por interagirem um com o outro. A interação representa umatentativa de conjugar dois organismos, pela produção e recepção de mensagens que
tenham sentido para ambos – é uma tarefa impossível, mas a comunicação interativa
busca esse ideal. Podemos nos comunicar sem interagirmos em grau satisfatório, mas a
nossa efetividade, nossa capacidade de influenciar e ser influenciado se eleva na
medida em que uma situação interativa se instale. Com a crescente interação, os
conceitos de fonte e receptor como entidades distintas perdem significação.
6. Sistemas sociais: matriz da comunicação
A adoção de um papel, a empatia e a interação são instrumentos úteis para melhorar a
eficiência da comunicação. Entretanto, em várias situações esses processos consomem
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muita energia, ou não contam com os pré-requisitos para serem operados. Por
exemplo, podemos ter que nos comunicar com uma pessoa que acabamos de encontrar,
ou sermos limitados pelo canal de comunicação disponível, etc.
Diante disso, outra opção que possibilita a criação de expectativas sobre o
comportamento dos outros é dada pela existência de sistemas sociais, de grupos
humanos organizados.
Os sistemas sociais são as conseqüências da necessidade que tem o homem de
relacionar seu comportamento com os comportamentos de outros, a fim de realizar
seus objetivos. A existência de um sistema social atesta a insuficiência do homem
como auto-determinador dos próprios objetivos, já que ele precisa se tornarinterdependente dos outros. Pode-se considerar, como algumas razões e objetivos da
formação dos sistemas sociais a conservação do grupo e a elevação da produtividade,
visando produzir coisas que não poderiam produzir por si, produzi-las com mais
eficiência, e produzi-las com mais efetividade, etc.
Num sistema social podemos identificar a existência de comportamentos-papéis, que
podem ser definidos como um grupo de comportamentos selecionados, coligidos eassociados a uma pessoa em determinada posição social. Esses comportamentos estão
associados à posição que os indivíduos ocupam na estrutura social, a denominada
posição-papel. Portanto, o papel representado por um individuo pode referir-se a uma
determinada posição que ele ocupa no sistema social ou ao conjunto de
comportamentos que se espera dele, nessa posição.
O sistema social é uma coleção de indivíduos desempenhando funções
interdependentes, as posições-papéis, às quais está associado um conjunto de
comportamentos, os comportamentos-papéis. Dentro de sua posição, é esperado que o
indivíduo deva realizar o seu papel, o que implica dizer que o sistema social lhe cobra
uma conduta que seja consistente com a sua posição, obrigando-o a adotar certos
comportamentos e a evitar outros.
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A comunicação é relacionada com a organização social em pelo menos três formas: os
sistemas sociais são produzidos por meio da comunicação; uma vez criado o sistema
social, ele determina a comunicação de seus membros; e, o conhecimento de um
sistema social pode ajudar-nos a fazer previsões corretas sobre as pessoas, sem
necessidade da empatia, sem necessidade da interação, sem que saibamos coisa
alguma sobre elas a não ser os papéis que desempenham no sistema.
A criação de um sistema social, atribuindo a cada indivíduo uma determinada posição-
papel, presume comunicação prévia entre os membros do sistema. Embora não se
possa afirmar que o desejo de comunicar crie as organizações sociais, pode-se dizer
que a disponibilidade de comunicação aumenta a probabilidade do desenvolvimentosocial e, por essa razão, pode-se afirmar que os sistemas sociais são produzidos por
meio da comunicação.
Uma vez criado o sistema social, ele determina a comunicação de seus membros, visto
que ele influencia o como, o porque, o para quem e de quem, e com que efeitos a
comunicação ocorre. Talvez o aspecto mais importante, dentre as várias determinações
impostas pelos sistemas sociais, seja os meios pelos quais o sistema influencia otratamento que seus membros dão às mensagens. Cada sistema tem o seu estilo.
Finalmente, e o mais importante, o conhecimento de um sistema social pode ajudar-
nos a fazer previsões corretas sobre as pessoas, sem necessidade da empatia, sem
necessidade da interação, sem que saibamos coisa alguma sobre elas a não ser os
papéis que desempenham no sistema. A posição que ocupa o nosso receptor no sistema
social ajuda-nos a predizer: em que ele acredita, o que sabe, e como se comportará em
dada situação. Além desses comportamentos normativos, as crenças, as atitudes e os
conhecimentos do indivíduo são em parte moldados pelos grupos a que ele pertence.
Em razão disso, podemos fazer previsões sobre o comportamento dos indivíduos a
partir das normas as quais deve-se respeitar dentro de seu sistema social.
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Porém, às vezes não é fácil fazer previsões das expectativas dos indivíduos a partir de
seus comportamentos papéis, pois nem sempre essas duas coisas coincidem. As
expectativas, e não as prescrições ou descrições que as pessoas mantêm sobre a
autoridade é que controlam seu comportamento. É freqüente que algumas pessoas,
ocupando determinadas posições, creiam que elas lhes asseguram certos poderes ou
atitudes que estão além daqueles que o sistema lhe confere.
O poder de um indivíduo e a autoridade de sua posição nem sempre coincidem. Se o
poder é menor que a autoridade, ele fica insatisfeito e, se aquele for maior que esta,
seus colegas é que ficam insatisfeitos. As pessoas satisfeitas com sua posição de
autoridade comportam-se diversamente daquelas que desejam mais autoridade, e
daquelas que temem a redução de sua autoridade.
Os sistemas sociais são compostos de papéis interligados, com autoridades
interligadas. Nesse sentido, passar por alto sobre certas posições consideradas
relevantes (não seguir os canais) implica ataque às pessoas que ocupam as posições
ultrapassadas, gerando dificuldades e ruídos na comunicação. Quando o indivíduo
sente que sua posição é atacada, reage negativamente. O desconhecimento ou o
desprezo da importância da posição causa sérios colapsos na comunicação
Outro aspecto importante é que, quando tentamos predizer comportamentos pelo nosso
conhecimento de um sistema social, é importante selecionar os sistemas que sejam
cruciais para o comportamento, visto que o indivíduo pertence a vários grupos sociais.
Por exemplo, um mesmo indivíduo pode, ao mesmo tempo, ser um professor,
pertencer a um partido político, ter uma certa religião, e assim por diante. Em tais
situações, é preciso selecionar os grupos de referência, que são sistemas sociais que
servem como pontos de referência para o indivíduo, grupos cujas normas e
comportamentos-papéis são prognosticadores importantes de seus próprios
comportamentos e crenças. No exemplo citado, mesmo que o indivíduo seja professor
e político, pode ser que a maior parte de seus comportamentos sejam balizados pelas
normas da religião a que pertence.
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Por outro lado, não são raras as situações em que o indivíduo, ao desempenhar um dos
papéis, o faz sem sofrer qualquer influência das demais posições que ocupa. Por
exemplo, um indivíduo que pertence a um grupo religioso, com normas de conduta
bastante rígidas, poderá, no exercício de suas atividades como político, esquecer
completamente as normas prescritas por sua religião! Ainda que esse não seja um
exemplo louvável, despir-se de um papel e vestir-se de outro é normal e muitas vezes
desejável. São normalmente desagradáveis aquelas pessoas que, fora do trabalho e
diante de qualquer pessoa, não se despem de sua roupa de policial, político, professor,
cientista e, principalmente, de vendedor. Ninguém agüenta! Por essa razão, é preciso
considerar a situação específica em que ocorre o comportamento do indivíduo, para
verificar os grupos que a pessoa está usando como referência para o seucomportamento, o papel que, no momento, ela está desempenhando, que posição julga
estar ocupando.
Finalmente, na tentativa de inferir acerca das expectativas de um indivíduo a partir dos
grupos sociais a que pertence, é preciso considerar se esse indivíduo não tem conflitos
com o sistema social. Quando um indivíduo passa de um sistema para outro, pode se
defrontar com conflitos de papéis e normas, já que a posição-papel em um sistemapode ser antagônica à posição ocupada no outro. Por exemplo, indivíduos acostumados
a assumir posições de mando podem sofrer conflitos quando submetidos a uma
posição que lhe requer obediência. Sempre que houver esses conflitos, decrescerá
nossa confiança em nossas previsões sobre o comportamento do indivíduo.
Com essa breve abordagem da importância dos sistemas sociais, encerramos a parte
referente ao processo de comunicação. Num primeiro momento, foram abordados os
meios pelos quais podemos predizer o comportamento de comunicação pelo
conhecimento do indivíduo, de sua personalidade, de sua forma de aprender e das
recompensas que recebe. E, ao final, foram consideradas as possibilidades de previsão
de expectativas a partir dos grupos sociais. Não obstante tal distinção, o fato a
destacar, mais uma vez, é que a comunicação é um processo e, do ponto de vista de
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sua teoria, nenhum aspecto isolado do comportamento humano pode ser analisado
convenientemente, se forem deixados de lado os demais aspectos desse
comportamento. Não compreendemos bem o processo de comunicação se não
tentarmos relacionar todas as variáveis umas com as outras, se não empregarmos todo
o conhecimento possível, para ajudarmos a explicar e a predizer como as pessoas são o
que são, e em que se estão transformando.
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CAPÍTULO IV
A metodologia da extensão rural
1. Introdução
No capítulo II, viu-se que uma das principais críticas sobre a atuação da extensão rural
incidia sobre o seu “método educativo”, que não permitia a participação ativa dos
agricultores, tornando-os objetos da ação do extensionista. É consenso que, numa nova
perspectiva, os agricultores devem ser sujeitos do processo de mudança, e sua relação
com os extensionistas deve privilegiar a reflexão, o raciocínio, a inteligência, aimaginação e a criatividade. Essa perspectiva, destacada no Guia de Metodologia de
Extensão Rural16, da EMATER do estado do Rio de Janeiro, mostra a importância
daquela crítica, e o quanto o serviço de extensão rural tem se preocupado em reorientar
sua atuação no sentido de assegurar uma participação ativa dos agricultores.
Porém, não obstante essa perspectiva, os métodos tradicionais de ensino utilizados
pelo serviço público de extensão rural permanecem. De um lado, essa constataçãopode significar que, apesar dos discursos a favor de maior participação dos
agricultores, na prática a atuação dos extensionistas não tem sido reorientada nesse
sentido. Por outro lado, outra interpretação possível é a de que a atuação da extensão
rural pode, e deve, respeitar a participação ativa dos agricultores na superação de seus
problemas, mesmo empregando seus métodos tradicionais. Ou seja, esses métodos não
seriam obstáculos a uma participação mais democrática e ativa dos agricultores.
Acreditando nessa segunda interpretação, apresentamos, no presente capítulo, uma
descrição resumida dos métodos empregados pelo serviço de extensão rural para
mobilizar os agricultores e apresentar novas práticas e tecnologias. A descrição segue,
16 No mesmo guia, encontra-se a afirmação de que, no atual contexto, o extensionista deve ser considerado um“agente de mudança”, um facilitador do processo de transformação social e de mudança de comportamento.
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basicamente, as orientações constantes do Guia de Metodologia de Extensão Rural da
EMATER do Rio de Janeiro, acrescidas de algumas informações extraídas de Coelho
(2005).
2. A escolha dos métodos de ensino
Um aspecto importante a considerar na escolha dos métodos pelo extensionista é a
escala de aprendizagem. Para entendê-la, é preciso considerar que, num determinado
grupo de agricultores, nem todos se encontram num mesmo grau de conhecimento em
relação à prática que o extensionista propõe adotar. Nesse sentido, o grupo pode conter
desde pessoas que apenas tiveram a atenção atraída pelo tema, até pessoas que jáadotam a prática proposta. Com maior nível de detalhes, pode-se dizer que a escala de
aprendizagem envolve, em sentido crescente, as fases de atenção, interesse, avaliação,
experiência e adoção, como mostra a figura seguinte.
Experiência
Atenção
Interesse
Avaliação
Adoção
Figura 1 – A escala de aprendizagem
Pode-se constatar que essa escala de aprendizagem está relacionada com os
ingredientes do processo de aprendizagem, estudados no capítulo III. Em todo o caso,
o importante a destacar é que essa escala ajuda a identificar a situação em que os
agricultores se encontram com relação a determinado tema ou prática agrícola,
facilitando a escolha dos métodos a serem empregados.
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Um dos pré-requisitos do bom trabalho de extensão é a capacidade do extensionista de
selecionar e combinar os métodos de ensino de forma adequada. A orientação da
EMATER-Rio é que o extesnionista, de forma participativa com as comunidades, faça
um diagnóstico prévio, elabore um plano de trabalho comunitário e estabeleça a
estratégia metodológica, determinando as ações a serem desenvolvidas para se
alcançar os objetivos desejados.
3. Classificação dos métodos
Os métodos empregados na extensão podem ser classificados quanto ao alcance equanto à estrutura. De acordo com essa classificação, os diversos métodos podem ser
agrupados como:
3.1. Quanto ao alcance:
Quanto ao alcance, os métodos podem ser classificados em métodos individuais,
grupais ou indefinidos, como se segue:
3.1.1. Métodos individuais
- Contato
- Visita
- Unidade de observação
3.1.2. Métodos grupais
- Demonstração de método
- Reunião
- Demonstração de resultado
- Unidade demonstrativa
- Excursão
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- Curso
- Treinamento
- Propriedade demonstrativa
- Dia de campo
- Dia especial
- Mutirão
3.1.3. Métodos indifinidos
- Concurso
- Exposição
- Semana especial
- Campanha
3.2. Quanto à estrutura
Com relação a sua estrutura, os métodos podem ser simples, quando puderem ser
empregados isoladamente, como é o caso, por exemplo, do contato, da visita e da
demonstração de método. Métodos complexos são aqueles que exigem a utilização de
outros métodos em conjunto, como ocorre com o curso, o dia de campo e a unidadedemonstrativa, para citar alguns exemplos.
4. Caracterização dos métodos
Nesse item são apresentados, individualmente, os diferentes métodos empregados pela
extensão rural. É importante destacar que, não obstante a descrição individual de cada
método, nenhum deles existe isoladamente, e normalmente são trabalhados como parte
de um conjunto ou combinação de outros métodos.
4. 1. Contato
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O contato é um método auxiliar de outros, não exigindo, necessariamente, um
planejamento de sua execução. O contato com os agricultores pode ocorrer de forma
prevista ou imprevista, em diferentes locais, como no escritório, no campo, na feira de
produtos agropecuários, etc. Pode ser feito com o objetivo de informar, oferecer ou
solicitar cooperação, conhecer a situação, identificar problemas e obter informações.
Esse método tem, como vantagens, o fato de possibilitar a comunicação interpessoal e
de permitir a aproximação e o entendimento entre o técnico e o agricultor. Além de ser
um procedimento rápido, ele possibilita a transmissão de informações simples e a
divulgação informal de trabalhos.
Porém, esse método tem alcance restrito, atingindo a poucos agricultores, além de nãopossibilitar um aprofundamento das informações. Às vezes, pode adquirir um caráter
excessivamente pessoal, contrário à pretensão de imparcialidade e generalidade da
atuação extensionista. Além disso, nem sempre o contato se dá em locais e horários
apropriados, podendo, em algumas situações, ser inoportuno.
4.2. Visita
Diferentemente do contato, a visita é um método planejado. Como tal, antes de realiza-
la, deve-se planejar a época, a duração, o conteúdo, os materiais e os equipamentos,
quando necessários, para que a visita tenha o sucesso esperado.
Um dos objetivos da visita é possibilitar a troca de informações e conhecimentos entre
o técnico e os agricultores. Ela permite ainda capacitar, motivar, planejar, acompanhar
e avaliar as ações junto à unidade familiar.
Em sua execução, as visitas devem evitar alterar a rotina da família, a qual, além disso,
deve ter seus valores respeitados pelo visitante. É importante ainda que o técnico não
esqueça o objetivo de sua visita, discorrendo sobre vários outros assuntos, exceto
aquele que o levou a procurar o agricultor. É necessário também que se respeite o
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tempo do agricultor, não o pressionando para tomar decisões rápidas a respeito de
qualquer questão suscitada pela visita.
Tal como o contato, a visita apresenta alcance restrito e, como agravante, seu custo é
elevado. Além disso, por requerer certo grau de intimidade, há a tendência de que as
visitas se concentrem em pessoas ou famílias com as quais o técnico tem maior
afinidade.
Entretanto, a visita tem a vantagem de estabelecer um clima de confiança mútua entre
o técnico e a família visitada. Ademais, ao possibilitar que o técnico possa se inserir no
ambiente do agricultor e vivenciar um pouco de sua realidade, a visita permite obter
conhecimentos indispensáveis acerca das atitudes, dos problemas e do modo de vidada família. Outra vantagem da visita é que ela contribui, pelas razões citadas, para
facilitar a preparação e a execução de outros métodos.
4.3. Demonstração de método
Consiste de um método planejado, utilizado para introduzir novas práticas ou melhorar
as existentes, demonstrando como faze-las e permitindo que os participantes aspratiquem. Envolve, portanto, o ver, o ouvir e o fazer, potencializando a aprendizagem
dos agricultores17. O objetivo desse método é consolidar a aprendizagem dos
agricultores com relação à determinada prática, por um processo em que se aprende
fazendo e entendendo.
Para o emprego desse método, é condição necessária que o extensionista tenha
suficiente conhecimento, teórico e prático, sobre a técnica que vai demonstrar. É
conveniente que a demonstração possa ser feita por um membro da comunidade que já
17 Relembrando que a comunicação se dá pelos vários sentidos, isso contribui para maior fidelidade dacomunicação. Além disso, como destacado por Pinto (2005), os indivíduos retêm 10% do que lêem, 20% do queescutam, 30% do que vêm, 50% do que vêm e escutam, 70% do que dizem e discutem, e 90% do que dizem elogo realizam.
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tenha adotado a prática, pois, além de ter experiência, esse indivíduo pode dar melhor
testemunho das vantagens da prática proposta.
Havendo um colaborador, é necessário que este seja treinado e informado sobre o
método e os objetivos da demonstração. É necessário ainda considerar aspectos como
o local da demonstração, que deve ser de fácil acesso e do conhecimento de todos, e os
equipamentos a serem empregados, que devem ser testados e avaliados previamente, e
direcionados ao local escolhido.
Na execução desse método inicia-se com a abertura e a exposição do objetivo,
ressaltando a importância da prática proposta. Em seguida, após uma descrição do
material ou equipamento empregado, inicia-se a demonstração propriamente dita, quedeve ser clara, objetiva, participativa, e seguir uma ordem lógica previamente
estabelecida, ou seja, deve seguir um “ritual” ou “roteiro”. Uma vez demonstrada a
prática, todos os participantes devem repeti-la, desde que isso seja possível.
Como vantagens, a demonstração de resultado estimula a ação em grupo e otimiza o
tempo do extensionista. Permite, além disso, que as diversas partes ou informações
relativas à prática demonstrada possam ser vistas, ouvidas e tocadas, e possibilita aosagricultores o aprender a fazer fazendo e entendendo. Porém, como ressalva, deve-se
destacar que esse método requer conhecimento e, sobretudo, habilidade do
demonstrador.
4.4. Unidade de observação
A unidade de observação é um método empregado para observar o comportamento de
determinadas inovações e difundi-las, posteriormente, desde que tenham viabilidade
técnica, econômica e social. Consiste em se destinar determinada área, cedida por um
agricultor colaborador, para a implementação de determinada tecnologia ou prática,
para observação.
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Seu objetivo é experimentar, nas condições locais, a viabilidade de se introduzir uma
ou mais práticas ainda não empregadas na área. Por essa razão, requer um registro
detalhado de todas as informações, para possibilitar a aferição dos resultados técnicos
e econômicos associados à prática em observação.
Como há uma incerteza acerca do sucesso da nova prática em observação, é
importante que o extensionista, e principalmente o colaborador, aquele que vai ceder a
área para a instalação da unidade de observação, estejam conscientes de que os
resultados dessa nova prática podem ser ruins. Quando, porém, os resultados forem
satisfatórios, outros métodos de extensão seriam utilizados para divulga-la para os
agricultores18.
Na fase de instalação da unidade de observação, é necessário atenção na escolha do
colaborador, que deve ser um agricultor disposto à inovação, mas que seja também
representativo da situação dos demais agricultores. Esse colaborador deve ainda ser
informado acerca dos cuidados necessários ao desenvolvimento da unidade de
observação, de seus objetivos e, principalmente, sobre a incerteza quanto ao resultado
da prática que está sendo introduzida.
4.5. Reunião
Consiste em se reunir um grupo de pessoas, com a finalidade de discutir assunto de
interesse comum e que venha a contribuir para encaminhar soluções, tomar decisões,
assumir compromissos ou trocar conhecimentos. A reunião do extensionista com os
agricultores pode ter como objetivos:
- motivar a comunidade na gestão de seu próprio desenvolvimento;
- informar e trocar conhecimentos;
- desenvolver espírito associativista e estimular a cooperação mútua;
- exercitar a habilidade de pensar e falar em grupo;
18 Caso a prática tenha dado resultados satisfatórios, a unidade de observação pode ser utilizada, dependendo daprática, para a demonstração de resultados, por exemplo.
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- avaliar os trabalhos e métodos realizados;
- conscientizar sobre problemas;
- planejar participativamente, etc.
Em geral, a reunião não é utilizada como um método isolado, inserindo-se,
normalmente, como parte de uma combinação de outros métodos e meios de
comunicação. Pode ser importante, em determinadas situações, que a reunião possa
assumir formas mais específicas, com uma estrutura definida, podendo enquadrar-se
como encontro, palestra, seminário, simpósio, etc. Além disso, técnicas de condução
de grupo, como a tempestade de idéias, a análise de problemas, a dramatização, a
discussão de trabalhos, dentre outras, podem ser muito úteis para a dinamização das
reuniões e para a obtenção dos melhores resultados.
Uma das vantagens da reunião é que ela é um é um método econômico e de razoável
alcance, que possibilita atingir um grande número de pessoas. Ela pode ser empregada
para uniformizar o conhecimento dos participantes, para conscientiza-los sobre
problemas comuns e obter deles um compromisso no encaminhamento das soluções.
Ela pode representar, além disso, um importante espaço para a manifestação de
lideranças.
Como desvantagens, as reuniões ocupam muito tempo dos participantes, e exigem
destes um envolvimento nem sempre fácil de se conseguir. Por essa razão requerem,
além disso, bastante habilidade do extensionista, que deve se esforçar para que as
reuniões se tornem mais dinâmicas e proveitosas.
4.6. Demonstração de resultado
Esse método consiste em demonstrar, por meio comparativo, as vantagens técnicas e
econômicas de uma ou mais práticas, já comprovadas, sobre outras tradicionalmente
utilizadas pelos produtores. Como a perspectiva do método é demonstrar a
superioridade de uma determinada prática sobre as demais, é necessário que se tenha
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segurança de que a prática em questão produza melhores resultados. Além disso, para
que os resultados possam ser comprovados, é necessário manter, separadamente, os
registros de todas as despesas e receitas das tecnologias, isto é, tanto da inovadora
quanto da tradicional.
Uma das vantagens desse método é que ele possibilita exemplificar, no local, a
importância da prática que está sendo proposta. Porém, na hipótese de que os
resultados não se mostrem satisfatórios, por uma razão ou outra, a prática ou
tecnologia proposta cairá em descrédito junto aos agricultores, pois seus resultados
estarão à vista de todos.
4.7. Unidade demonstrativa
A unidade demonstrativa é um método que tem como principal característica mostrar
uma ou mais práticas agropecuárias de comprovada eficácia e rentabilidade, sem a
necessidade de comparação, isto é, sem a necessidade de testemunha. Sua perspectiva
é possibilitar a demonstração, a avaliação e a adoção da prática ou práticas propostas.
De modo semelhante ao que foi dito em relação ao método anterior, a unidade
demonstrativa também pode acarretar descrédito em relação à tecnologia proposta e aoextensionista, caso ela não produza bons resultados aos olhos dos agricultores.
A decisão de empregar uma unidade demonstrativa é tomada em conjunto com a
comunidade de agricultores, por ocasião da elaboração do Plano de Trabalho
Comunitário. Geralmente, a unidade demonstrativa é utilizada no final de uma
seqüência de métodos de extensão, como instrumento de reforço para a decisão de
adotar as práticas propostas. E, uma vez instalada, a unidade permite a utilização de
outros métodos durante sua existência, como excursão, demonstração de método,
treinamento, reunião, dentre outros.
4.8. Excursão
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A excursão consiste num método em que o extensionista acompanha um grupo de
pessoas com interesses comuns a regiões onde determinadas atividades ou práticas são
desenvolvidas com sucesso. Seu objetivo é mostrar “in loco” o desenvolvimento e os
resultados associados a uma ou mais práticas.
A excursão, também, não deve ser praticada isoladamente, mas como parte de uma
combinação de outros métodos, visando complementar o processo de aprendizagem
dos agricultores. Por exemplo, a excursão pode ser parte de um curso, no qual
determinas práticas são abordadas teoricamente. A condução dos agricultores a uma
localidade onde essas práticas foram realizadas ou estão sendo desenvolvidas, através
de uma excursão, permite a eles visualizar suas vantagens em nível de campo, o que
pode ser um fator decisivo para a adoção dessas práticas. Numa excursão pode-se,também, empregar outros métodos, como demonstração de resultado, unidade
demonstrativa, demonstração de método, dentre outros.
Algumas das principais vantagens da excursão é que ela fortalece a relação entre os
participantes, permite a visualização do desenvolvimento das práticas “in loco”, além
de motivar e ampliar a experiência dos participantes. Por outro lado, a excursão requer
tempo, tem alcance limitado e demanda recursos adicionais, sendo estas as principaislimitações desse método.
4.9. Curso
Por definição, o curso é um método que aborda conhecimentos de natureza
predominantemente teórica, com programação específica, abrangendo outros métodos
e recursos didáticos, visando determinado grupo de pessoas com interesses comuns.
Nesse aspecto, o curso difere completamente do treinamento que, por natureza,
procura abordar assuntos práticos.
O curso tem como objetivo possibilitar ao público alvo um determinado grau de
conhecimentos teóricos e nivelar o entendimento do grupo para se poder desenvolver,
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através de uma combinação de métodos, uma estratégia de ação na comunidade. O
curso é, portanto, um método adequado para situações em que se deseja, num curso
período de tempo, capacitar, aperfeiçoar ou especializar um grupo homogêneo sobre
uma série de informações práticas e técnicas em um assunto. A realização do curso
pode, também, envolver outros métodos, tais como a demonstração de resultado, a
excursão, a reunião, etc.
Como principais vantagens, o curso otimiza o tempo do extensionista, contribui para
nivelar os conhecimentos, facilitando a ação extensionista, possibilita capacitar maior
número de pessoas em pouco tempo e facilita a aprendizagem pela troca de
informações e experiências. Por outro lado, as dificuldades relativas à programação da
época e do horário mais acessíveis aos participantes, o desnível de conhecimento dosparticipantes e a necessidade de deslocamento dos agricultores de seu meio
apresentam-se como principais limitações desse método.
4. 10. Treinamento
Como referido anteriormente, o treinamento difere do curso pelo fato de dedicar-se a
assuntos eminentemente práticos, requerendo apenas os conhecimentos teóricosmínimos necessários. Como tal, sua preocupação é introduzir novas habilidades ou
modificar as habilidades de determinados agricultores.
Por se tratar de um método voltado para a capacitação prática ou operacional, o
treinamento é executado nas comunidades. Alguns outros recursos, como a
demonstração de método, a excursão, a reunião, etc., podem fazer parte do
treinamento, para facilitar o aprendizado.
Como principais vantagens, o treinamento possibilita o desenvolvimento de habilidade
e destreza, mostra a aplicação prática do conhecimento e acelera a adoção das práticas,
baseando-se na lógica do aprender a fazer fazendo. Como limitações, o treinamento
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requer uma organização antecipada e meticulosa e exige tempo e dedicação de todos
os envolvidos.
4.11. Propriedade demonstrativa
A propriedade demonstrativa consiste num método em que se procura fazer uma
combinação racional dos fatores de produção disponíveis em determinada propriedade,
ou seja, uma combinação racional da terra, do capital e do trabalho existentes. Na
propriedade escolhida, os extensionistas trabalharão no sentido de transforma-la numa
propriedade exemplar, no que diz respeito à utilização racional dos recursos, de forma
progressiva, e com exemplos que vão sendo acompanhados e avaliados pelos
agricultores.
A propriedade demonstrativa deve ser utilizada como uma unidade de divulgação de
atividades econômicas e técnicas integradas, para serem acompanhadas, avaliadas,
experimentadas e adotadas pelos agricultores. A perspectiva é de que todas as ações e
práticas empregadas sirvam de modelo para os agricultores da localidade e de outras
regiões com condições semelhantes.
Uma vez feita a opção por esse método, sua utilização exige um plano de
administração, envolvendo aspectos econômicos, técnicos e sociais. Como ele exige a
participação de um colaborador, o agricultor cuja propriedade servirá de
demonstração, é necessário que este agricultor receba todas as instruções relativas à
condução do método.
Com esse método, obtém-se um efeito demonstrativo das vantagens de uma
propriedade rural representativa, no que diz respeito à melhor utilização dos recursos
disponíveis. O risco de privilegiar poucas famílias nas comunidades e a exigência de
um plano elaborado e completo de condução da propriedade, além de muita dedicação,
são as principais limitações do método.
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4.12. Dia de campo
O dia de campo é um método que reúne grande número de agricultores em uma
propriedade, onde já vêm sendo obtidos bons resultados em determinadas práticas,
com a finalidade de divulgar essas práticas a um maior número de pessoas. As práticas
em questão devem referir-se a um único assunto, para o qual se deseja despertar o
interesse do público, sem a preocupação de ensinar como fazer.
O dia de campo deve ser aproveitado para divulgar o trabalho extensionista. Para
tanto, é necessário que a propriedade escolhida para a realização desse método seja
trabalhada pela extensão rural.
Além de divulgar a atuação da extensão rural em determinada região, ampliando e
fortalecendo a relação entre a equipe de extensionistas e os produtores, o dia de campo
tem a vantagem de despertar o interesse e a atenção de um maior número de pessoas
para determinada questão, tudo em um único dia. Além disso, esse método possibilita
demonstrar ao vivo os resultados já obtidos e apresenta custos relativamente baixos,
considerando-se seu alcance em termos de número de produtores. As principais
desvantagens do método é que ele exige tempo da equipe de preparação e necessita deuma propriedade com bons resultados nas tecnologias divulgadas e trabalhadas pelos
extensionistas.
4.13. Dia especial
Esse método consiste em se eleger um determinado dia, que recebe uma denominação
específica relacionada à atividade objeto do dia especial, no qual é empregado um
conjunto de outros métodos combinados visando abordar essa atividade. Assim, são
exemplos de dias especiais criados com a finalidade de abordar determinadas
atividades ou assuntos de importância para a comunidade, através de diversos
métodos, o Dia da Laranja, o Dia da Caprinocultura, o Dia do Maracujá, o Dia do
Combate à Erosão, e assim por diante.
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O dia especial é um método promocional, motivacional e informativo, que deve estar
combinado com outros métodos, tais como demonstração de método, exposição,
reunião, etc. Tem como objetivo promover determinada atividade, informar sobre
inovações, e uniformizar, aperfeiçoar e melhorar as práticas e conhecimentos das
pessoas envolvidas, bem como fortalecer as relações entre os produtores, as lideranças
e os extensionistas.
Esse método desenvolve-se em ambiente festivo, descontraído, que facilita a adoção.
Combinado a outros métodos, ele permite alcançar um grande número de pessoas e
desenvolver uma série de práticas. É, também, um método que incentiva a relação
entre o setor rural e o urbano, e que possibilita a divulgação e a promoção da atividadea que se refere. Entretanto, esse método exige tempo e dedicação da equipe em sua
preparação e execução e requer grande esforço de coordenação.
4.14. Mutirão
O mutirão é um método grupal, empregado geralmente na comunidade de agricultores,
no qual reúne-se um grupo de pessoas para desenvolver uma ou mais ações embenefício da coletividade. Sua finalidade é, portanto, agregar esforços com a finalidade
de alcançar um benefício comum. Como método de extensão, o mutirão deve ser
utilizado em conjunto com outros métodos.
Como vantagens, o mutirão promove a integração da comunidade, proporciona
soluções de problemas que dificilmente seriam resolvidos de forma individual e
propicia condições para o desenvolvimento de lideranças e iniciativas. Sua principal
limitação é que ele exige habilidade para gerenciar um grupo maior de pessoas e
manter o espírito de colaboração.
4.15. Concurso
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Esse método consiste no estabelecimento de uma competição construtiva e educativa,
na qual os agricultores competirão entre si pela obtenção de melhores resultados em
determinada atividade. Seu objetivo é medir comparativamente os resultados das ações
que os produtores efetivaram no sentido de promover o aumento da produtividade e do
retorno econômico de suas atividades. Um exemplo bastante comum dessa prática é o
concurso leiteiro, normalmente realizado nas exposições agropecuárias municipais.
Como se trata de um evento competitivo, o estabelecimento do concurso requer uma
série de cuidados, visando evitar a desconfiança quanto a sua licitude. Por essa razão,
no planejamento são necessários alguns cuidados. Assim, devem ser evitadas
quaisquer atitudes ou ações de parcialidade, e deve ser elaborado um regulamento do
concurso com as regras que o regerão. O concurso deve ser organizado de forma quepermita a participação voluntária de todos os interessados, deve ser amplamente
divulgado, e deve prever uma forma de premiação para os melhores colocados. Para o
julgamento dos participantes, deve-se criar uma comissão de apuração de resultados,
que deve ser composta, em sua maioria, por produtores rurais.
Uma das vantagens do concurso é que, através dele, os extensionistas podem aferir os
níveis de produtividade alcançado na localidade, e compara-los com outras regiões.Além disso, ele atinge grande número de pessoas, tem efeito estimulante, mostrando e
motivando na prática os resultados da adoção de inovações tecnológicas.
Porém, uma das limitações associadas a esse método é que ele pode gerar competição
pessoal, que pode ser bastante perniciosa em se tratando de pequenos agricultores
familiares, para os quais a cooperação, e não a competição, é a estratégia de
sobrevivência mais importante. Além disso, esse método requer bastante envolvimento
e responsabilidade da equipe de extensionistas e, por mais que seja conduzido com
lisura, pode gerar dúvidas quanto aos seus resultados.
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4.16. Exposição
A exposição é um método que possibilita a utilização simultânea de meios de
comunicação, permitindo o aproveitamento de dois fatores importantes para a
memorização do ensino, que são a repetição da idéia e a visualização da mensagem.
Baseia-se na mostra de produtos, materiais, artesanatos, etc., levando informações de
natureza técnica ou educativa, procurando motivar o público a tomar decisões em
relação a determinados assuntos. Na exposição, vários outros métodos de extensão
podem ser empregados, como a campanha, a semana, o dia de campo, o dia especial,
etc.
As exposições são utilizadas para apresentar e divulgar trabalhos realizados pelaextensão em conjunto com os agricultores. Caracterizam-se, também, como um evento
que promove o meio rural, exibindo, para o público urbano, vários aspectos
relacionados à atividade agrícola e à cultura dos agricultores.
As exposições agropecuárias, que normalmente se destacam como uma das mais
importantes festividades anuais dos municípios do interior, são o exemplo mais
evidente de uso desse método de extensão. É importante destacar que, nem sempre, asexposições são uma iniciativa do serviço de extensão rural. O importante é que,
mesmo nessas situações, os extensionistas podem tirar proveito da exposição realizada
para fins de divulgação de seu trabalho e alcance de outros objetivos.
Algumas das principais vantagens desse método é que ele é massivo, atingindo um
grande número de pessoas, e facilita a introdução de novas práticas e idéias para um
público mais amplo. Porém, ele é um método bastante complexo, que requer um local
adequado para realização, e exige dedicação e empenho de toda a equipe. Além disso,
nem sempre o que é exibido na exposição corresponde à realidade local ou está ao
alcance de todos os agricultores.
4.17. Semana Especial
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A semana especial é um método que se compõe de uma série de atividades
educacionais, abrangendo grupos de pessoas com diversos interesses e de várias
localidades, com programação específica, durante vários dias ou uma semana. Em
vários casos, as semanas transformam-se em eventos periódicos, e em geral anuais.
Por exemplo, a Semana do Produtor, promovida pela Universidade Federal de Viçosa,
foi criada em 1929 e, desde então, vem sendo realizada todo ano, reunindo um grande
número de produtores.
As semanas especiais têm como principais objetivos envolver a comunidade para a
solução de problemas, informar e motivar sobre atividades ou práticas e comemorar
datas de caráter social ou cívico. Como vantagens, esse método tem grande alcance depúblico, possibilita divulgar e estimular o setor agropecuário e promove
relacionamento entre autoridades, líderes, produtores e técnicos. Entretanto, esse é um
método que exige deslocamento da equipe e de produtores para o local do evento e,
além disso, requer um bom relacionamento com autoridades e instituições existentes
na área de atuação.
4.18. Campanha
A campanha é um método complexo, que consiste no emprego ordenado de várias
técnicas de comunicação e atividades educativas realizadas a um tema definido,
durante um período determinado. Seus objetivos são concentrar esforços para
conscientizar e envolver a comunidade no conhecimento e na solução de problemas, e
provocar mudanças no modo de pensar, de sentir e atuar das pessoas.
O princípio básico de sustentação da campanha, como método de extensão, é o de que
a “a freqüência com que uma pessoa recebe uma nova idéia influi decisivamente na
adoção dessa idéia”. Por essa razão, as campanhas são sempre insistentes, repetitivas,
voltadas para promover uma mudança de comportamento em um grande público.
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Como exemplos, podem ser citadas as campanhas de vacinação contra a febre aftosa,
campanha de combate às queimadas, etc.
Uma das principais vantagens da campanha é que ela atinge um grande número de
pessoas. Além disso, ela desperta bastante atenção em torno de um determinado tema e
acelera a adoção dos comportamentos que ela promove. Por outro lado, esse é um
método que exige envolvimento de diversos órgãos e, para ser efetivo, deve envolver
apenas uma única idéia.
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CAPÍTULO V
O planejamento local das atividades de extensão rural
1. Introdução
Para a execução do trabalho de extensão rural, é necessário que se faça um
planejamento das intervenções. O planejamento visa orientar o trabalho da extensão
para o alcance de seus objetivos, dentro dos princípios norteadores do trabalho
extensionista. O presente capítulo, baseado em baseado em Coelho (2005) e
EMBRATER (1981), aborda alguns aspectos relativos a esse planejamento.
A partir das críticas feitas sobre sua atuação no passado, os órgãos públicos de
assistência técnica e extensão rural vêm sendo orientados a desenvolver práticas que
contemplem maior participação de seu público alvo. De fato, as intervenções
tradicionalmente efetuadas pelo serviço de extensão eram feitas “de fora para dentro”,
ou seja, não concediam aos agricultores um papel ativo na definição dessas
intervenções. Embora o objetivo da extensão, o de “promover o desenvolvimentorural”, fosse do interesse dos agricultores mais do que de qualquer outro grupo, em
geral eles não participavam na definição dos problemas e ações necessárias para
supera-los.
Essa nova perspectiva de atuação do serviço de extensão rural, baseada em
intervenções participativas, incide também sobre a etapa de planejamento de suas
atividades. Por essa razão, a abordagem feita no presente capítulo procura fornecer,
sempre que possível, algumas orientações no sentido de assegurar a participação dos
agricultores no processo de planejamento.
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2. Importância do planejamento e orientações gerais
Tal como ocorre com a maior parte das atividades, a atuação da extensão rural não
prescinde um planejamento, que é necessário para orientar suas intervenções no meio
rural. Como vantagens, o planejamento possibilita:
- determinar as necessidades reais da população rural;
- maior integração entre as diversas atividades;
- minimizar prejuízos decorrentes de ações impensadas;
- garantir maior continuidade das ações;
- maior facilidade para realização de trabalhos em cooperação com outras
instituições;
- justificar a aplicação de recursos obtidos; e,- subsídios para futuros planejamentos;
Na realização do planejamento, deve-se considerar as características básicas do
programa de extensão rural, que são:
- basear-se no conhecimento da realidade rural;
- contemplar os problemas mais sentidos;
- ter objetivos alcançáveis e passíveis de soluções- ser permanente e flexível;
- preocupar-se não apenas com os aspectos econômicos e tecnológicos, mas
também com os sociais, educacionais e culturais, de forma integrada;
- ser educacional, contínuo e evolutivo;
- ser elaborado com a participação dos interessados, pessoas de influência e
liderança;
- possibilitar o desenvolvimento da liderança;
- conseguir a cooperação de outras entidades;
- possibilitar a avaliação dos resultados; e,
- estar compatibilizado com as diretrizes e com as políticas governamentais para
o setor agrícola.
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3. O planejamento participativo
No planejamento participativo, a perspectiva é a de que exista uma interação entre os
extensionistas e a população, com os agricultores participando, direta ou
indiretamente, de todas as fases do processo de planejamento. Na forma explicitada
por EMBRATER (1981):
Entende-se que o planejamento participativo constitui um processo político, um
contínuo propósito coletivo, uma deliberada e amplamente discutida
construção do futuro da comunidade, na qual participe o maior número
possível de membros de todas as categorias que a constituem.
Algumas vantagens do planejamento participativo são:
- plano com caráter de maior legitimidade, visto que é baseado nas necessidades
manifestas pelos agricultores;
- possibilita que características qualitativas da comunidade se expressem pois, do
contrário, apenas aspectos quantitativos baseariam o planejamento;
- estimula a comunidade a tomar consciência de seus problemas e a desenvolver
criatividade para soluciona-los;- possibilita a obtenção de um plano mais realista, adaptado à realidade dos
agricultores e consoante os meios existentes na comunidade;
- diminui os riscos de descontinuidade, etc.
Na perspectiva de uma intervenção participativa, a participação do grupo atingido pela
extensão está presente desde os atos de problematização da realidade até os atos de
decisão, incluindo também os momentos de consentimento explícito para atuação
externa no local. Não se trata de trabalho de gabinete, mas de proposta partilhada com
os interessados.
Nessa proposta, as decisões sobre qual conteúdo tecnológico adotar, baseado em
tecnologias industriais ou alternativas, surgem da problematização partilhada, na qual
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vários aspectos, como as questões ambientais, de saúde, os recursos financeiros, o
conhecimento disponível e as implicações econômicas devem ser considerados. Nesse
contexto, a orientação profissional é um direito, não uma imposição. Mas, é bom
frisar, um direito que se torna uma necessidade num mundo dominado pela ciência e
pela tecnologia.
4. As fases do planejamento
O processo de planejamento das atividades da extensão rural pode ser subdividido em
quatro etapas, que são: a etapa de conhecimento da realidade; a etapa de programação;
a fase de acompanhamento e controle; e, a fase de avaliação. Cada uma dessas etapas édescrita a seguir.
4.1. Conhecimento da realidade
Essa etapa consiste na verificação e análise da situação e dos problemas relativos à
população, à propriedade, ao lar e à comunidade. Trata-se de um estudo analítico que
procura estabelecer as causas, fatores ou antecedentes de uma dada situação existenteno meio rural. Consiste em um levantamento de natureza sócio-econômica, análise e
interpretação, com o fim de verificar quais são as características da área de ação dos
agentes locais da extensão rural. Nesse contexto, são aspectos importantes a serem
diagnosticados:
- aspectos físicos do meio rural;
- aspectos humanos (demografia, etnia, etc);
- aspectos sociais (lideranças, relações sociais de trabalho, etc);
- aspectos econômicos e financeiros;
- aspectos culturais (hábitos, atitudes, crenças etc);
- aspectos tecnológicos da agricultura; etc.
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O conhecimento da realidade rural pelos extensionistas é indispensável, e pode ser
feito por meios diretos e indiretos. Os meios indiretos consistem em recorrer às fontes
secundárias disponíveis, como:
- Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – FIBGE;
- Órgãos assistenciais à agricultura (INCRA, CFP, CIBRAZEM, etc);
- Órgãos de natureza médico-sanitária (postos de saúde, etc.)
- Cooperativas, sindicatos, associações, etc.
- Instituições de ensino e Pesquisa;
- Estabelecimentos bancários;
- Coletorias (Federais e Estaduais);
- Organizações comerciais e industriais;
- Instituições religiosas;- Prefeitura; etc.
Por meio direto, entende-se a obtenção das informações diretamente na área rural
objeto da intervenção do extensionista. Essa busca de informações no local é
imprescindível, ao possibilitar maior contato do extensionista com seu público e a
realidade que o envolve. Uma maior aproximação da verdade sobre a realidade rural só
será obtida pela conjugação da interpretação dos técnicos com a dos agricultores. Osagricultores, plenamente inseridos no seu meio físico e social, percebem a realidade,
interpretando-a e explicando-a de acordo com sua cultura e com suas experiências.
Portanto, o estudo da realidade por via direta, através de visita às famílias e reuniões
com as comunidades, é indispensável ao trabalho extensionista.
Como saber, de forma participativa, quais são os desejos, interesses, objetivos,
possibilidades e recursos de determinada realidade ou grupo social? Isso pode ser feito
através de diversas técnicas, como entrevistas, reunião com os agricultores, etc. Porém,
há que se ressaltar que, tão importante quanto as técnicas empregadas, é a atitude
daqueles que a aplicarão, como será discutido mais adiante.
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Dentro da perspectiva das intervenções participativas, um método freqüentemente
sugerido é o do DRPE (Diagnóstico Rural Participativo Emancipador), orientado por
Pereira e Litle (2002) e Pereira (2001), citados por Coelho (2005). Esse diagnóstico
permite identificar os recursos existentes em nível local, e perceber como os interesses
sociais se estruturam e se articulam nesse local. Os valores presentes nesse grupo irão
aparecer nas manifestações que cada membro expressa no DRPE. Nesse diagnóstico, a
função do técnico é criar espaços propícios à realização de formas interativas e
discursivas de discussão e de negociação. Nesse processo, as lideranças surgem como
conseqüência dos trabalhos. O técnico é a figura de apoio, mas a direção política do
processo é resultado do consenso construído pelo grupo e por suas lideranças.
Algumas técnicas, consagradas e de conhecimento dos profissionais que já atuaram emnível de campo, podem auxiliar no desenvolvimento do método do DRPE. Exemplos
dessas técnicas são “calendário sazonal”, “rotina diária”, “mapeamento”, “construção”,
dentre outras, que, juntamente com outras, podem ser encontradas em Coelho (2005).
Essas propostas de atividades, que não descreveremos aqui, são técnicas valiosas de
diagnósticos e de mobilização social, mas requerem que cada coordenador das
atividades tenha uma postura de alteridade, e não de autoridade19. O mais importante é
que o técnico reconheça no outro a capacidade de identificar seus principais problemase de elaborar propostas de solução, sem abrir mão de papel de sistematizador e
orientador do processo. Para isso, é importante que o profissional tenha, antes de ir a
campo, vivenciado as técnicas de diagnóstico, pois a capacidade de coordenar e de
perceber as reações do público, só é obtida pela vivência.
Outro aspecto importante consiste na necessidade de registro sistemático das falas e
vivências realizadas no campo, durante o diagnóstico. Maior segurança nas ações
futuras pode ser obtida pela análise, sistematização e interpretação dessas informações.
Deve-se, por isso, procurar registrar toda a forma de pensar dos agricultores,
transcrevendo, da forma mais fiel possível, suas falas originais. As expressões assim
19 A alteridade implica na capacidade de o indivíduo se colocar no lugar do outro na relação interpessoal, comconsideração, valorização, identificação e disponibilidade de dialogar com o outro. Consiste em ser capaz de vero que há do outro em si mesmo, ver-se no outro.
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captadas põem a mostra os valores, as expectativas e as prioridades mais freqüentes ou
mais importantes para o grupo. Para que isso ocorra, é necessária uma posição neutra
dos técnicos, no sentido de não manifestar posições, contra ou a favor, que poderiam
induzir ou inibir a fala do grupo de agricultores. Isto é, deve-se agir de modo a permitir
e assegurar que o grupo possa se manifestar com a maior espontaneidade possível.
Na proposta participativa, torna-se indispensável ainda retornar com os dados do
diagnóstico para o grupo trabalhado. Além de ser um procedimento para validação e
correção das interpretações dos técnicos, essa conduta é o reconhecimento de que os
resultados também pertencem ao grupo e devem ser com ele debatidos20.
Essa exposição dos resultados pode, e deve, ser realizada de forma criativa, para quemotive o debate, mediante cartazes, dramatizações, mapas, maquetes, etc. A percepção
dos agricultores, favorável ou não às informações sistematizadas, é que vai validar, ou
não, respectivamente, o registro e a interpretação dos problemas feitos pelos técnicos.
4.2. Programação
A programação consiste na etapa de formulação dos objetivos, de definição dasmedidas de intervenção da extensão rural na realidade, e da estratégia de ação a ser
utilizada com base nos problemas identificados na etapa inicial, de diagnóstico. Essa
etapa pode ser subdividida em quatro fases: a seleção de problemas, a elaboração do
programa, a apresentação do programa na reunião da sede e a divulgação do
programa.
4.2.1. Seleção dos problemas
Embora um número significativo de problemas possa ser identificado na etapa de
diagnóstico, na maioria das vezes as limitações enfrentadas pela extensão, em termos
20 Como destaca Coelho (2005), o princípio não é “se fazer sobre os outros”, mas sim “um fazer com os outros”.Logo, as informações não são para o técnico, elas são, também, dos agricultores e para os agricultores.
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de recursos humanos, físicos e financeiros, impedem uma ação abrangente sobre todos
eles. Diante disso, faz-se necessário o estabelecimento de prioridades e a seleção dos
problemas que merecem maior atenção dos agentes da extensão.
É importante destacar mais uma vez que, no planejamento participativo, é
imprescindível que os agricultores tomem parte ativa na seleção dos problemas a
serem incluídos no programa.
4.2.2. Elaboração do programa
Uma vez selecionados os problemas, há que se confeccionar o programa de
intervenção na realidade dos agricultores. Esse programa é constituído de projetos,relacionados a determinado produto, a uma dada categoria de público, certo tipo de
tecnologia, etc. Esses projetos nada mais são do que um conjunto de atividades
previstas, delimitadas no tempo, nos quais devem constar, além do título, as
justificativas, os objetivos, as estratégias, as metas, a área de atuação, o executor, o
cronograma de atividades, os recursos e a repercussão ou os impactos sócio-
econômicos que seriam derivados da execução bem sucedida do projeto.
4.2.3. Apresentação do programa na reunião da sede
Uma vez elaborado o programa, é importante apresenta-lo aos líderes municipais, com
o intuito de consolidar o entendimento entre as lideranças e possibilitar a cooperação e
a sintonia entre as diversas instâncias governamentais. Esse procedimento contribui
para legitimar e enriquecer o programa de trabalho da extensão para o município, dar a
conhecer a forma de atuação do extensionista e obter cooperação dos líderes e outras
pessoas da sede para a execução do programa.
4.2.4. Divulgação do programa
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Uma vez elaborado, o programa deve ser divulgado para a comunidade para a qual ele
é direcionado. Ou seja, os agricultores, que já participaram da discussão e da
elaboração do programa, devem agora ser informados acerca de sua forma final e das
ações que serão efetivadas.
Essa divulgação deve ser feita antes do início das ações, e deve perdurar durante todo
o processo de intervenção, pois os agricultores devem ser informados de todas as
atividades que estão sendo desenvolvidas em sua área. Isso possibilita, ainda, fazer
com que cada agricultor compreenda que o programa é seu, e que somente com seu
interesse e participação a execução dos projetos e das ações será bem sucedida.
4.3. Acompanhamento e controle
Essa etapa consiste em verificar se as ações estão sendo executadas como previstas,
visando ao cumprimento dos objetivos e metas. Deve ser feita pela análise das
informações quantitativas e qualitativas geradas durante a execução do programa. Para
sua execução, deve haver uma organização mínima do trabalho para responder às
necessidades de acompanhamento e controle, tais como:
- listagem de famílias e produtores da área de atuação;- calendário de trabalho, mensal e semanal;
- registro das ações programadas e executadas;
- divisão do trabalho entre membros da equipe;
- relação das comunidades trabalhadas.
Mediante o acompanhamento e o controle da execução do programa, podem ser
identificadas situações e dificuldades imprevistas que ponham em risco a consecução
dos objetivos do programa. Identificadas no momento oportuno, essas dificuldades
podem ser contornadas por mudanças da estratégia e das ações intermediárias, visando
o alcance dos resultados desejados. Esse procedimento permite, além disso,
reprogramar futuras etapas de execução, e montar relatórios para divulgar os trabalhos
concluídos.
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4.4. Avaliação
A avaliação consiste na etapa de verificação do alcance dos objetivos, e deve ser uma
preocupação constante na ação dos extensionistas. Essa avaliação deve verificar se os
objetivos do programa, estabelecidos a partir do conhecimento da realidade e visando
altera-la para uma situação melhor, segundo o entendimento e os valores dos
agricultores e dos técnicos, foram alcançados. Esquematicamente, o processo de
avaliação poder ser representado na figura seguinte.
SITUAÇÃO IDENTIFICADA(ESTUDO DA REALIDADE)
SITUAÇÃO ENCONTRADANO FINAL DO PROGRAMA
SITUAÇÃO DESEJADA(OBJET. DO PROGRAMA)
AN LISE
A partir da comparação entre a situação desejada, expressa nos objetivos do programa,
e a situação encontrada ao final do período de execução do programa, pode-se avaliar
se as ações foram bem sucedidas ou não. Em caso negativo, há que se fazer uma
análise das causas de insucesso do programa. Dessa análise, pode resultar uma
redefinição de objetivos ou mesmo da estratégia de ação, para que futuras intervenções
tenham melhores resultados.
Finalizando, a Tabela 1 apresenta uma síntese dos procedimentos para elaborar o
programa local da extensão rural. No anexo, apresenta-se ainda um roteiro das
atividades para o conhecimento da realidade dos agricultores.
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Tabela 1 - Procedimentos para elaborar o programa local de extensão rural
Fases Ações Objetivos
1. Conhecimento da realidade Identificação de pessoas de influência da sede
Elaboração de roteiros para entrevistasEntrevista com pessoas de influência
Visitas às propriedades rurais
Reuniões nas comunidades rurais
Entrevistar para cole
Orientar a coleta de iColetar dados sobre
Identificar problema
Identificar problema
2. Programação Seleção e classificação prévia dos problemas
Consulta aos produtores
Elaboração e redação do programa
Apresentação do programa aos interessadosDivulgação do programa
Permitir o estabeleci
Selecionar problema
possíveis soluções
Registrar as ações quDiscutir e legitimar o
Dar conhecimento à
sendo realizado
3. Acompanhamento e Controle Registro e análise de informações Adotar medidas corr
4. Avaliação Análise comparativa entre a situação desejada
e a situação encontrada
Constatar o alcance d
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Anexo - Roteiro para conhecimento da realidade rural
Entre os principais dados que poderão servir para o melhor conhecimento das
condições gerais da área de ação do escritório local, podem ser relacionados os
seguintes:
1. Aspectos acerca das condições naturais
1.1. Limites geográficos e dados gerais (superfície, altitude, acidentes geográficos,
etc.)
1.2. Relevo, cobertura vegetal e cursos d’água
1.3. Dados geológicos e do solo (tipos de solo, fertilidade, uso atual, conservação)
1.4. Aspectos climáticos (temperatura, pluviosidade, ventos, geadas, granizo)1.5. Outros recursos do solo e subsolo
2. Aspectos administrativos e econômicos
2.1. Organização administrativa (superfície, comunidades existentes, etc.)
2.1. Organização administrativa (superfície, comunidades existentes, etc.)
2.2. Aspectos fundiários (estratificação das propriedades, concentração da posse,
regime de posse, preços da terra, possibilidades de aquisição)2.3. Distribuição da força de trabalho agrícola e relações de produção existentes
(familiar, assalariados, parceiros, arrendatários, etc.)
2.4. Sistema tributário e fiscal (arrecadação, impostos e taxas, etc.)
2.5. Demografia (população rural e urbana, densidade demográfica, tamanho médio
das famílias, natalidade, mortalidade infantil, emigração, imigração)
2.6. Principais atividades econômicas
2.7. Estatísticas de produção agropecuária e agro-industrial
3. Aspectos da estrutura de serviços
3.1. Transportes e comunicações (tipos de transportes e vias, correios, telégrafos,
telefone, rádio, TV, jornais e revistas)
3.2. Serviços diversos (água, eletricidade na sede e no meio rural)
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3.3. Serviços de apoio à agropecuária (armazenamento, preços mínimos,
comercialização, pesquisa, fornecimento de insumos, etc)
3.4. Cooperativas rurais (cooperativas existentes, número de associados, serviços
prestados aos sócios)
3.5. Financiamento à produção (bancos existentes, linhas de financiamento, juros,
prazos e outras condições para obtenção do crédito)
3.6. Escolas (tipo, nível, capacidade de matrícula, qualificação dos docentes)
3.7. Entidades religiosas (religiões, cultos, número de templos, associações
religiosas)
3.8. Entidades de assistência médico-sanitária (postos de saúde, hospitais,
laboratórios de análise, farmácias, número de médicos)
3.9. Entidades de assistência social (nome, finalidade, programas desenvolvidos)3.10. Organização das unidades de produção (preparo técnico dos produtores,
existência de registros e contabilidade, produção para mercado e produção para
subsistência)
4. Aspectos tecnológicos
4.1. Sistemas de produção das principais culturas e criações (preparo do solo,
plantio, práticas culturais e colheita)4.2. Coeficientes técnicos e custos de produção das principais culturas e criações
(sementes/hectare, homens/dia, etc.)
4.3. Produtividade das principais culturas e criações (rendimento/hectare, taxa de
abate e desfrute, etc.)
4.4. Pragas e doenças das principais culturas e criações
5. Aspectos sócio-culturais
5.1. Associativismo rural (associações, sindicatos, grupos, etc.)
5.2. Alimentação (alimentos preferidos, alimentos produzidos, conservação e
preparação de alimentos, tabus alimentares)
5.3. Habitação (características das construções, disponibilidade de água, etc.)
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5.4. Saúde e higiene (instalações sanitárias, hábitos de higiene, principais doenças,
etc.)
5.5. Cultura e lazer (festas típicas, usos e costumes)
6. Análise e interpretação dos dados
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CAPÍTULO VI
Agricultura Familiar
1. Introdução
Como foi visto no capítulo I, o trabalho desenvolvido pela extensão rural no Brasil
concentrou-se no segmento dos produtores mais capitalizados, principalmente grandes
e médios produtores, deixando em segundo plano os agricultores que não tinham
condições para adquirir as novas tecnologias então divulgadas. Uma das justificativas
para essa preferência é que as novas tecnologias seriam mais facilmente adquiridas poraqueles que tivessem mais recursos: recursos financeiros21, para comprar as novas
tecnologias; recursos físicos, isto é, terras com as dimensões, o relevo e demais
qualidades adequadas às novas tecnologias; e, recursos humanos, ou seja, um certo
nível de conhecimento que facilitasse a adoção e a utilização dessas práticas. Diante
disso, o serviço de extensão procurou centrar seus esforços nesses agricultores, mais
capazes de adotar as tecnologias propostas.
Portanto, do ponto de vista de disseminação das inovações e do potencial de mercado
para as novas tecnologias, o público privilegiado pela extensão rural, o dos médios e
grandes produtores, era o mais adequado. Porém, se forem avaliados os resultados
dessa estratégia em termos de promover o desenvolvimento rural, objetivo tão
propalado pelo serviço de extensão rural desde sua criação, ficam evidentes seus
equívocos. Os pequenos agricultores familiares, segmento em geral marginalizado pela
extensão rural, não conseguiram acompanhar o processo de modernização agrícola, e
encontram-se, em sua maioria, num processo de descapitalização e empobrecimento.
A continuidade desse movimento terminaria por conduzir esses agricultores à
proletarização e à conseqüente migração para os centros urbanos.
21 Esses recursos foram ampliados com a política de crédito rural subsidiado, implementada na segunda metadedos anos 60, que forneceu, aos médios e grandes produtores, vultosa soma de recursos para a aquisição das novastecnologias.
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Diante da percepção dos equívocos da estratégia adotada, o serviço público de
extensão rural vem sendo orientado no sentido de atender, com exclusividade, os
agricultores familiares. Em face dessa nova percepção, e da importância desse
segmento na agricultura brasileira, esse capítulo é dedicado à abordagem dasprincipais questões relativas à agricultura familiar no Brasil.
2. Algumas características da pequena produção e da agricultura familiar
De início, deve-se reconhecer a heterogeneidade do que, convencionalmente, se chama
pequena produção ou produção camponesa22. Uma das características do setor
camponês brasileiro é que ele não é perfeitamente identificável, nem localizado em
regiões delimitáveis ou vinculado a produções específicas. Ao contrário, há uma
grande variedade de situações, envolvendo desde parcerias pouco monetizadas, como
no Nordeste, até a forma de elo na integração vertical das agroindústrias, como ocorre
na Região Sul, onde a unidade camponesa é densamente tecnificada e mercantil.
De fato, existem diferentes tipos de pequenos produtores, cujos destinos, ao que tudo
indica, não parecem convergir para um único ponto, se é que se pode admitir umatendência inexorável quanto ao futuro desses produtores. O fato é que, como destacam
Kageyama e Graziano da Silva (1986), a pequena produção vem passando por um
processo de diferenciação social, no qual tem-se, de um lado, um segmento cuja
tecnificação e capitalização é crescente, formando pequenas empresas familiares e, no
22 Por definição, o campesinato é representado pelo conjunto dos grupos sociais de base familiar que, em graus
diversos de autonomia, se dedicam às atividades agrícolas em determinadas glebas. Caracteriza-se, em termos
gerais, por produzir baseado no trabalho da família, empregando eventualmente mão-de-obra assalariada, possuir
os instrumento de trabalho, ter autonomia total ou parcial na gestão da propriedade, e ser dono de parte ou da
totalidade da produção. Como, na maior parte dos casos, essas condições, que caracterizam o setor camponês, se
aproximam daquelas que definem a agricultura familiar , e descrevem situações geralmente encontradas na
pequena produção agrícola, essas três denominações serão utilizadas como sinônimas ao longo do texto, para
fins de simplificação.
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extremo oposto, um segmento pauperizado, em pleno processo de proletarização.
Entre esses limites, podem ser encontradas situações diversas, mais ou menos
próximas de um ou de outro dos extremos referidos.
Silva et al. (1999) salientam que, não obstante a grande variabilidade de formas da
pequena produção camponesa no Brasil, elas apresentam algumas caraterísticas em
comum, características estas que, de certo modo, condicionam a adoção ou não da
tecnologia. Assim, há, segundo esses autores, pelo menos cinco condições gerais e
comuns às economias camponesas no Brasil, que são:
1.1. Pouca disponibilidade de terra
Essa escassa disponibilidade limita a adoção de técnicas que exigem escala mínima de
produção, como é o caso da mecanização. As possibilidades de contornar essa
limitação podem advir da adequação das máquinas, isto é, através da geração de
máquinas menores, ou através do desenvolvimento de sistemas cooperativos de
compra das máquinas hoje existentes ou através de sistemas de aluguel.
1.2. Condições ecológicas adversas
De um modo geral, os pequenos produtores normalmente ocupam áreas mais
declivosas e menos férteis, uma vez que terras de melhor qualidade têm preço mais
elevado e são, por isso, pouco acessíveis a esses agricultores. Essas condições são
impróprias ao emprego de grande parte das novas técnicas recomendadas, que são
desenvolvidas para ambientes mais adequados. Possível alternativa a essa situação é
uma reorientação da pesquisa agropecuária, no sentido de desenvolver tecnologias
apropriadas àquelas condições, bem como para alterar em parte as mesmas, mediante
drenagem, irrigação, conservação de solo, etc.
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1.3. Policultura
Ainda que cultivem um produto principal, voltado para o mercado, os pequenos
produtores, de um modo geral, se dedicam ao cultivo de vários outros produtos e à
criação de animais diversos, seja para comercializar ou simplesmente para asubsistência da família23. Em tal situação, nem sempre as recomendações técnicas,
geradas para cultivos isolados, são as mais adequadas, adquirindo maior relevância
tecnologias como rotação de culturas, cultivos intercalares, etc.
1.4. Insuficiência de recursos financeiros
Em geral, os agricultores dispõem de poucos recursos financeiros, fruto das própriascondições precárias com que exercem sua atividade, bem como da baixa produtividade
de seu trabalho. É um círculo vicioso, em que, não tendo recursos financeiros para
custear a safra e investir na propriedade, não conseguem elevar seus ganhos que, por
sua vez, impedem que novos investimentos sejam feitos, e assim por diante. A quebra
desse ciclo requer, assim, a oferta de crédito a esses agricultores, em condições
especiais, e em consonância com as especificidades desse segmento.
1.5. Mão-de-obra familiar
Uma vez que as unidades camponesas baseiam-se no trabalho familiar, a introdução de
sistemas especializados e tecnificados tendem a gerar maior descontinuidade das
exigências de mão-de-obra ao longo do ano, promovendo um desequilíbrio entre o
trabalho disponível e o trabalho requerido em determinadas fases do ciclo. Portanto, a
combinação de atividades dentro dessas unidades de produção é condição importante
para que a mão-de-obra possa ser melhor empregada, e para que sua produtividade seja
mais elevada.
23 Há uma justificativa racional para tal comportamento. Uma vez que dispõem de poucos recursos, aespecialização dos pequenos agricultores em um único produto seria muito arriscada, visto que situações dequeda drástica nos preços desse produto colocaria em risco a própria alimentação de suas famílias.
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2. Subordinação da pequena produção
Conforme SILVA (1999), a pequena produção, nas diversas localidades do país,
encontra-se, freqüentemente, subordinada a alguma forma de capital, o que decorre das
suas precárias condições de sobrevivência, bem como de sua falta de organização e
conseqüente baixo poder de negociação.
Uma das formas de subordinação se manifesta através da dependência do agricultor
para com o proprietário fundiário. Essa é a situação de parceiros e arrendatários, que
pagam ao proprietário renda como percentagem da produção ou como renda fixa, em
produção ou em dinheiro, ou através da prestação de serviços ao proprietário por
salários inferiores aos de mercado.
Muitos dos pequenos produtores encontram-se, também, subordinados ao capital
comercial, e têm seu excedente extraído através dos mecanismos extra-oficiais de
financiamento, ou através do abastecimento com insumos e alimentos, compra
antecipada da produção, tudo isso feito a preços dissonantes dos valores de mercado.
Essa situação é mais comum em regiões de fronteira agrícola, onde esses agricultores
estão sujeitos às mais variadas formas do capital comercial, como beneficiadores,bodegueiros, caminhoneiros, intermediários, atacadistas, etc.
Finalmente, é comum a subordinação desses agricultores às agroindústrias e às
cooperativas capitalistas. Tal subordinação é exercida através do financiamento dos
insumos e da assistência técnica, mediante os quais o pequeno produtor se torna
dependente, sendo forçado a adotar novas tecnologias e a vender seu produto para um
mercado monopsônio de matéria-prima agrícola. Essa situação está relacionada à
produção de matérias-primas intensivas em mão-de-obra, situando-se principalmente
na região centro-sul do país, encontrando-se associada aos setores de legumes, frangos,
ovos, frutas de mesa, fumo, vinho, suínos etc.
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Além dessas situações, há ainda o caso da subordinação através da venda direta da
força de trabalho em determinados períodos do ano, sob a condição de trabalhadores
assalariados sazonais.
De acordo com Veiga (1996), a agricultura familiar apresenta as seguintes
características:
- trabalho e gestão intimamente relacionados;
- direção do processo produtivo assegurada diretamente pelos proprietários;
- ênfase na diversificação;
- ênfase na durabilidade dos recursos naturais e qualidade de vida;
- trabalho assalariado complementar;
- decisões imediatas adequadas ao alto grau de imprevisibilidade do processo
produtivo;
- tomada de decisão in loco;
- ênfase no uso de insumos internos;
- gestão das unidades produtivas e dos investimentos;
- fornecimento da maior parte do trabalho; e
- propriedade dos meios de produção.
3. Importância da Agricultura Familiar
Entre os agricultores brasileiros, os agricultores familiares são os que mais geram
empregos e fortalecem o desenvolvimento local, pois distribuem melhor a renda, são
responsáveis por uma parte significativa da produção nacional, respeitam mais o meio
ambiente e, principalmente, potencializam a economia nos municípios onde vivem,como destacam PICINATTO et al. (2000).
A Tabela 1 permite aquilatar a importância da agricultura familiar no Brasil. Esses
dados mostram que 85% dos estabelecimentos agropecuários podem ser caracterizados
como propriedades familiares, totalizando cerca de 4,85 milhões de
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estabelecimentos, com apenas 11% sendo enquadrados como empresas patronais, o
restante ficando por conta de entidades públicas e instituições religiosas.
Tabela 1 - Número de Estabelecimentos, rea e Valor Bruto da Produção, Categorias
Familiares por Tipo de Renda e Patronal
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da ProduçãoNúmero % Hectares % 1000 Reais %
TOTAL 4.859.864 100 353.611.242 100 47.796.469 100Total Familiar 4.139.369 85,2 107.768.450 30,5 18.117.725 37,9Maiores rendas 406.291 8,4 24.141.455 6,8 9.156.373 19,2Renda média 993.751 20,4 33.809.622 9,6 5.311.377 11,1Renda baixa 823.547 16,9 18.218.318 5,2 1.707.136 3,6Quase sem renda 1.915.780 39,4 31.599.055 8,9 1.942.838 4,1Patronal 554.501 11,4 240.042.122 67,9 29.139.850 61
Instit. Religiosas 7.143 0,1 262.817 0,1 72.327 0,2Entidades Públicas 158.719 3,3 5.529.574 1,6 465.608 1Não Identificado 132 0 8.280 0 960 0
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO.
As informações mostram ainda que é baixa a renda gerada por muitos desses
estabelecimentos familiares, sendo que quase 40% deles se enquadram na categoria de
renda quase nula.
Quanto à área ocupada, os valores da Tabela 1 mostram que, apesar de representarem
cerca de 85% do número de estabelecimentos, os agricultores familiares possuem
apenas 30% da área total, ao passo que a agricultura patronal ocupa quase 70% desse
total.
No que diz respeito à contribuição para a produção, os resultados mostram que a
agricultura familiar responde por cerca de 38% do valor da produção, o que é
considerável, quando se leva em conta que esse segmento de produtores ocupa apenas30% da área total dos estabelecimentos agropecuários. Além disso, embora essa
informação não esteja disponível no quadro acima, é fato conhecido o de que a
agricultura familiar tem grande importância na produção de alimentos de consumo
doméstico, respondendo por boa parcela da oferta destes.
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Outra grande importância da agricultura familiar encontra-se em sua capacidade de
absorção de mão-de-obra, o que pode ser de imediato percebido com a observação da
Tabela 2. As informações exibidas dão conta de que os estabelecimentos familiares
ocupam algo próximo a 13,8 milhões de pessoas, o que eqüivale a mais de 75% do
pessoal ocupado na agropecuária, sendo que representam, em termos de área, apenas
30% das terras ocupadas com estabelecimentos agropecuários. Por outro lado, o
pessoal ocupado na agricultura patronal representa apenas 20% do total, contrastando
com a grande proporção de área que ela ocupa, que eqüivale a quase 70% das terras
com estabelecimentos agropecuários.
Tabela 2 - Pessoal Ocupado: Categorias Familiares por Tipo de Renda e Patronal,Brasil.
Categorias Número de Pessoas Ocupadas Proporção (%)Total Familiar 13.780.201 76.85
Maiores rendas 1.743.137 9.72Renda média 3.682.712 20.54Renda baixa 2.785.299 15.53Quase sem renda 5.569.053 31.06
Patronal 3.557.379 19.84Instit. Religiosas 30.248 0.17Entidades Públicas 562.595 3.14Não Identificado 430 0.00
TOTAL 17.930.853 100.00Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE .Elaboração: Convênio INCRA/FAO.
A situação das regiões não difere significativamente da encontrada para o país, como
permitem constatar as Tabelas 3, 4, 5, 6 e 7, cujos resultados podem ser percebidos
mais facilmente através das Figuras 1, 2, 3, 4 e 5, que são apresentadas logo em
seguida.
Tabela 3 - Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, CategoriasFamiliares por Tipo de Renda e Patronal - Região Nordeste
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da ProduçãoNúmero % Hectares % 1000 Reais %
TOTAL 2.326.413 100 78.296.096 100 7.043.359 100Total Familiar 2.055.157 88,3 34.043.218 43,5 3.026.897 43
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Maiores rendas 88.397 3,8 5.476.366 7 1.016.680 14,4Renda média 331.138 14,2 9.984.386 12,8 907.398 12,9Renda baixa 420.558 18,1 6.783.325 8,7 520.341 7,4Quase sem renda 1.215.064 52,2 11.799.140 15,1 582.479 8,3Patronal 161.541 6,9 43.400.169 55,4 3.858.631 54,8Instit. Religiosas 4.583 0,2 55.289 0,1 9.331 0,1
Entidades Públicas 105.030 4,5 790.321 1 148.205 2,1Não Identificado 102 0 7.098 0 295 0
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO
Tabela 4 - Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, CategoriasFamiliares por Tipo de Renda e Patronal - Região Norte
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da ProduçãoNúmero % Hectares % 1000 Reais %
TOTAL 446.175 100 58.358.880 100 2.321.939 100Total Familiar 380.895 85,4 21.860.960 37,5 1.352.656 58,3Maiores rendas 40.080 9 3.844.438 6,6 514.479 22,2Renda média 132.816 29,8 7.927.174 13,6 533.468 23Renda baixa 94.468 21,2 4.415.966 7,6 183.639 7,9Quase sem renda 113.531 25,4 5.673.382 9,7 121.070 5,2Patronal 33.491 7,5 33.753.537 57,8 856.465 36,9Instit. Religiosas 524 0,1 43.583 0,1 3.411 0,1Entidades Públicas 31.265 7 2.700.800 4,6 109.408 4,7Não Identificado - - - - - -
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO
Tabela 5 - Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, CategoriasFamiliares por Tipo de Renda e Patronal - Região Centro-Oeste
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da ProduçãoNúmero % Hectares % 1000 Reais %
TOTAL 242.436 100 108.510.012 100 6.884.856 100Total Familiar 162.062 66,8 13.691.311 12,6 1.122.696 16,3Maiores rendas 22.919 9,5 3.642.316 3,4 620.262 9Renda média 44.814 18,5 3.684.923 3,4 286.146 4,2Renda baixa 30.320 12,5 1.810.780 1,7 91.127 1,3Quase sem renda 64.009 26,4 4.553.292 4,2 125.161 1,8Patronal 70.470 29,1 93.321.482 86 5.654.933 82,1Instit. Religiosas 162 0,1 38.010 0 4.734 0,1Entidades Públicas 9.741 4 1.459.209 1,3 102.418 1,5Não Identificado 1 0 0 0 75 0
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO
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Tabela 6 - Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, CategoriasFamiliares por Tipo de Renda e Patronal - Região Sul
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da Produção
Número % Hectares % 1000 Reais %TOTAL 1.003.179 100 44.360.360 100 15.011.919 100Total Familiar 907.635 90,5 19.428.230 43,8 8.575.993 57,1Maiores rendas 167.545 16,7 6.188.721 14 4.747.656 31,6Renda média 325.132 32,4 6.783.895 15,3 2.594.499 17,3Renda baixa 167.550 16,7 2.629.668 5,9 591.275 3,9Quase sem renda 247.408 24,7 3.825.947 8,6 642.562 4,3Patronal 86.908 8,7 24.601.463 55,5 6.359.953 42,4Instit. Religiosas 880 0,1 37.127 0,1 14.236 0,1Entidades Públicas 7.737 0,8 292.628 0,7 61.578 0,4Não Identificado 19 0 912 0 159 0
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO
Tabela 7 - Número de Estabelecimentos, Área e Valor Bruto da Produção, CategoriasFamiliares por Tipo de Renda e Patronal - Região Sudeste
CategoriasEstabelecimentos Área Total Valor da ProduçãoNúmero % Hectares % 1000 Reais %
TOTAL 841.661 100 64.085.893 100 16.534.397 100Total Familiar 633.620 75,3 18.744.730 29,2 4.039.483 24,4Maiores rendas 87.350 10,4 4.989.614 7,8 2.257.296 13,7Renda média 159.851 19 5.429.243 8,5 989.867 6
Renda baixa 110.651 13,1 2.578.579 4 320.754 1,9Quase sem renda 275.768 32,8 5.747.294 9 471.566 2,9Patronal 202.091 24 44.965.470 70,2 12.409.868 75,1Instit. Religiosas 994 0,1 88.808 0,1 40.615 0,2Entidades Públicas 4.946 0,6 286.616 0,4 43.999 0,3Não Identificado 10 0 269 0 431 0
Fonte: Censo Agropecuário 1995/96, IBGE.Elaboração: Convênio INCRA/FAO
Na Figura 1, pode-se constatar que a importância da agricultura familiar, em termos de
número de estabelecimentos, é elevada para todas as regiões, com destaque
principalmente para as regiões Norte, Nordeste e Sul, onde esse segmento responde
por mais de 80% do número de estabelecimentos.
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0
20
40
60
80
100
NE NO CO SU SE
( %
)
Familiar Pa tronal Entid. Públicas
Figura 1 - Participação dos estabelecimentos familiares, patronais e de entidades
públicas no total de estabelecimentos de cada região, 1995/96
A agricultura patronal atinge maior expressão nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, nas
quais, entretanto, a participação da agricultura familiar, embora menor do que nas
demais regiões, é ainda preponderante.
A Figura 2 permite visualizar aquilo que já fora constatado para o Brasil, isto é, que osestabelecimentos familiares, tendo grande expressão numérica, ocupam, entretanto,
pequena parcela da área total dos estabelecimentos agropecuários, cuja maior parte
encontra-se distribuída entre os estabelecimentos patronais.
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NE NO CO SU SE
(
% )
Familiar Patronal Entid. Públicas
Figura 2 - Participação dos estabelecimentos familiares, patronais e de entidades
públicas na área total ocupada com estabelecimentos agropecuários, por região,
1995/96
Na Figura 3, pode-se constatar que, de modo geral, a agricultura familiar contribui
para o valor bruto da produção em proporção equivalente ou mais elevada do que
representa a área que ela ocupa. Nas regiões Norte e Sul, a participação desse
segmento supera a dos estabelecimentos patronais, atingindo quase 60% do valor bruto
da produção agropecuária destas regiões.
01020
30405060708090
NE NO CO SU SE
( % )
Familiar Patronal Entid. Públicas
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Figura 3 - Participação dos estabelecimentos familiares, patronais e de entidades
públicas no valor bruto da produção, por região, 1995/96
Na Figura 4, pode-se constatar que, de modo geral, é elevada a proporção dosestabelecimentos cuja situação é caracterizada como de renda quase nula,
principalmente no Nordeste, onde essa proporção atinge a mais de 50%, e sudeste,
onde ela supera a 30%.
0
10
20
30
40
50
60
NE NO CO SU SE
( % )
Maiores rendas Renda média Renda baixa Quase sem renda
Figura 4 - Proporção dos estabelecimentos familiares em cada categoria de renda, por
região, 1995/96.
Nas demais regiões, a proporção dos estabelecimentos nessa condição situa-se em
torno de 20%. Por outro lado, as regiões Norte e Sul se destacam como aquelas onde a
proporção de estabelecimentos com renda média é a mais alta, ficando próxima de
30%.
4. Pode a pequena propriedade produzir com eficiência?
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Um dos aspectos envolvendo a questão da pequena produção refere-se `a suposta
presença de economias de escala na produção agrícola, o que terminaria por tornar
mais competitivas e eficientes as propriedades de grande porte. De forma
simplificada, há economias de escala quando os custos médios por unidade produzida
diminuem quando os custos fixos são distribuídos por uma maior quantidade de
mercadorias. Situação oposta caracterizaria uma situação de deseconomias de escala,
ou seja, quando, a partir de determinado tamanho da firma, aumento na escala de
produção eleva os custos médios, o que decorreria, basicamente, do surgimento de
problemas organizacionais, como dificuldades de comunicação, de coordenação, de
tomada de decisões, de administração, etc. Em decorrência disso, há razões para supor
que, abaixo de determinado tamanho, as firmas seriam incapazes de produzir a um
custo mínimo, e por outro lado, as firmas não poderiam crescer indefinidamente, semincorrer em elevação dos custos unitários.
Embora seja esse um tema controverso, algumas pesquisas, como as desenvolvidas por
Hallem (1991) e Britton e Hill (1975), apontam a inexistência de economias de escala
a partir de determinados tamanhos mínimos, ou seja, a curva de custo médio de longo
prazo assumiria a forma de L, e não de U, como ocorre na maior parte das atividadesindustriais. Esse resultado seria decorrente do fato de que as atividades agrícolas são
menos exigentes em equipamentos pesados e indivisíveis, e, portanto, com menores
custos fixos. Se essa hipótes for aceita, não mais se justificaria, com base em
argumentos econômicos, a preferência por grandes propriedades, e a opção política por
estas somente se justificaria por questões ideológicas.
Conforme Veiga (1991), embora exista um certo patamar mínimo de tamanho, abaixo
do qual qualquer empreendimento tende a naufragar, esse patamar é, de modo geral,
bastante pequeno, com exceção mais veemente para pastagens extensivas, que
requerem maior área. Portanto, tal aspecto revela que a oposição entre pequena x
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grande ou média produção, e o diferencial de eficiência entre ambas, normalmente
aceito, não tem justificativa econômica24.
Finalmente, no que diz respeito à pseudo superioridade das maiores propriedades, não
se deve esquecer que, em grande medida, ela decorre dos privilégios a ela concedidos
no período de modernização agrícola, mormente o crédito rural subsidiado. Na prática,
esses privilégios tiveram o efeito de causar uma redução artificial nos custos de
produção das propriedades maiores, criando uma competitividade que, na ausência
daqueles benefícios, provavelmente não existiria.
5. As dificuldades de sobrevivência e desenvolvimento da pequena produção
Não obstante a grande importância da agricultura familiar, que ficou patentemente
demonstrada no item 3, são vários e graves os problemas enfrentados pelos
agricultores familiares no Brasil. Como destacado por PICINATTO et al.(2000), uma
parte significativa desses agricultores não tem acesso à terra, sendo que 39,8% deles
possui, sob qualquer forma, menos de 5 ha de área total, e apenas 16,7% tem acesso a
algum tipo de assistência técnica.
Em razão de várias características da pequena produção, o padrão tecnológico imposto
com a modernização agrícola, orientado para a expansão do complexo agroindusrial,
não foi absorvido pelos pequenos produtores, que, por isso, se mantêm defasados, em
termos de produtividade, face às unidades que puderam se modernizar.
Conforme SILVA (1999), a modernização do setor camponês tem, como fatores limitantes, a
incompatibilidade entre a escala mínima requerida pelo novo padrão e a insuficiência dosrecursos produtivos e financeiros por parte desses agricultores. De fato, o não
24 É importante destacar que essa afirmativa se baseia no conjunto das atividades agrícolas, não querendo issodizer que, em uma atividade específica, não possa existir significativas economias de escala. A redefinição dopatamar tecnológico que hoje vem ocorrendo, elevando os investimentos fixos requeridos em determinadasatividades, como o cultivo de cereais, faz com que o patamar mínimo exigido se eleve, tornando-o inacessível apequenos produtores isolados.
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acompanhamento do novo padrão tecnológico se deu, principalmente, com relação às
tecnologias que exigem uma escala mínima para se tornarem viáveis economicamente, como
é o caso da mecanização. Como reflexo disso, os pequenos produtores absorveram melhor as
tecnologias químico-biológicas.
Disso resulta o fato da produtividade da terra mostrar-se, em geral, mais elevada nos
pequenos estabelecimentos do que nos grandes, o contrário ocorrendo com a produtividade do
trabalho. Como destacado por Graziano da Silva (1999), a elevada produtividade da terra nos
pequenos estabelecimentos se deve à maior intensidade do trabalho empregado, o que se
reflete, em última instância, em baixa produtividade da mão-de-obra. Ou seja, o uso mais
intensivo da terra não é suficiente para compensar a baixa produtividade por pessoa ocupada,
do que resulta a pobreza dos pequenos produtores e de suas famílias25.
Essa informação contraria, portanto, a assertiva, comumente aceita, de que os
pequenos agricultores são atrasados. O que ela mostra é que algumas tecnologias, ao
exigirem escala mínima de produção, não podem ser empregadas por esses
agricultores pela simples razão de que não podem atingir essa escala, dada a pequena
disponibilidade de terra e recursos financeiros com que podem contar. Além disso,
não se deve esquecer que esses agricultores não contaram, tal como os grandes, com o
apoio do governo durante todo o período de modernização agrícola, durante o qual aspolíticas agrícolas privilegiaram sobretudo estes últimos, garantindo-lhes uma posição
dianteira na corrida por maior competitividade.
E é em razão disso, ou seja, da falta de meios de produção, principalmente terra, e da
baixa produtividade do trabalho, fruto das limitações à adoção de determinadas
tecnologias, que o setor camponês está tendendo a reduzir progressivamente sua
importância na geração do produto agrícola, que já foi bem mais elevada no passado.
25 Para entender essa assertiva, basta considerar a seguinte relação:
A
Y x
L
A
L
Y =
em que: Y é a produção; L, o montante de trabalho empregado; e A, a área cultivada. Assim, embora aprodutividade da terra (Y/A) seja alta, decorrente do uso de tecnologias químico-biológicas e do grande volumede trabalho por área, isso não é suficiente para compensar a baixa relação A/L, decorrente da grande intensidadede trabalho, fruto da pequena mecanização das atividades. Disso resulta a baixa produção por trabalhadorocupado, o que se reflete em baixa renda por pessoa.
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6. Sugestões de Políticas
O não reconhecimento da diferenciação de classes sociais na agricultura brasileira,
quando da elaboração da política agrícola, confeccionando-as para regiões e para
produtos, mas não por tipo de produtores, é apontado por Silva et al. (1999) como
responsável pela desigualdade com que se deu a modernização agrícola, beneficiando
a minoria dos grandes produtores rurais, os setores da indústria fornecedora de
insumos, máquinas e equipamentos para a agricultura, as agroindústrias processadoras
de matérias-primas agrícolas e os bancos executores da política de crédito rural.
A política tecnológica para os pequenos produtores camponeses é elemento-chave para
a transformação dinâmica desse setor, que pode se dar no sentido de destruir, manter
ou elevar a economia camponesa a uma maior integração com a economia global. Isto
é, ela pode contribuir para uma diferenciação ascendente (capitalização) ou
descendente (proletarização) do setor camponês.
Face ao problema da exigência de escala mínima para viabilizar a adoção detecnologias mecânicas, Silva et al. (1999) sugerem, como medidas visando facilitar a
tecnificação dos produtores, as seguintes:
- maiores investimentos na pesquisa e difusão de inovações biológicas, como
sementes e matrizes animais;
- incentivos à produção e à difusão de máquinas menores (menos potentes) que se
adaptem às menores escalas de produção;
- desenvolvimento dos sistemas de leasing
26
ou de formas cooperativas de utilizaçãodas máquinas agrícolas;
26 O leasing, também denominado arrendamento mercantil, é uma operação em que o possuidor (arrendador) deum bem móvel ou imóvel cede a terceiro (arrendatário) o uso desse bem por prazo determinado, recebendo emtroca uma contraprestação (Banco Central do Brasil, 2001). O leasing se distingue do aluguel porque o valor dobem arrendado vai sendo gradativamente amortizado durante o pagamento das contraprestações. No final docontrato, o arrendatário tem a opção de adquirir definitivamente o bem arrendado.
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- financiamentos a juros diferenciados quando se tratar de máquinas menos potentes ou de
insumos preferencialmente adotados pelos pequenos produtores.
De qualquer modo, ressalta-se que a eficiência dessas medidas está condicionada à presença
de uma política agrícola que reconheça as especificidades desse segmento de agricultores, oque deve, além disso, ser acompanhado de mudanças no próprio sistema de pesquisa e
assistência técnica.
Nesse sentido, a política de sustentação de preços é condição necessária para que os ganhos
de produtividade por parte dos produtores agrícolas possam ser internalizados. Além disso, a
tecnificação da propriedade implica em crescimento dos gastos monetários, requeridos para a
compra dos vários insumos, resultando daí a possibilidade de endividamento dos produtores
quando da ocorrência de quedas significativas nos preços. Tal situação, que pode sercontornada por uma eficiente política de garantia de preços, poderia acarretar, na ausência de
tal política, a insolvência do agricultor e a conseqüente venda de sua terra, e imediata perda de
sua própria condição de camponês, com a extinção de seu principal e essencial meio de
produção.
Outro aspecto é que a insuficiência de recursos financeiros por parte dos pequenos
agricultores torna-os extremamente dependentes de uma política de crédito favorável, sem a
qual permanecerão na mesma posição retardatária quanto ao uso de tecnologia e à
competitividade frente aos demais estabelecimentos. Esse favorecimento deve se dar por
taxas de juros compatíveis com suas condições de pagamento, como vem sendo feito com o
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar-PRONAF, que será tratado no
item 7.
Deve-se reconhecer também a concentração dos mercados com os quais se deparam os
agricultores de modo geral e, em especial, os pequenos, que não possuem qualquer
poder de negociação. A manutenção de determinado nível de concorrência na
comercialização agrícola é condição importante para que os benefícios das melhorias
tecnológicas sejam de fato apropriadas pelos agricultores. Movimentos associativistas,
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com vistas a conglomerar vários produtores, podem também conferir-lhes maior poder
de barganha.
O acesso dos pequenos produtores às políticas governamentais favoráveis, bem como
o desenvolvimento e a implementação de tecnologias adequadas aos mesmos, embora
seja condição necessária, não é suficiente para que eles internalizem os ganhos
possibilitados pelos aumentos de produtividade, conseguidos através da modernização
de suas atividades produtivas, nem para assegurar-lhes um processo de diferenciação
ascendente, isto é, que os torne empresas familiares (Silva et al., 1999). A condição
para que isso ocorra será definida pelo poder de barganha desses agricultores no
mercado pois, à medida que este for se reduzindo, pode ocorrer um processo de
tecnificação sem capitalização, como ocorre nos casos de integração dos mesmos comas agroindústrias.
A questão fundamental é, portanto, a da apropriação dos frutos do aumento da
produtividade, que traz à tona a importância da organização dos agricultores, visando
elevar seu poder de barganha, possibilitando-lhes a apropriação de, pelo menos, parte
do excedente gerado.
Em termos concretos, a internalização dos ganhos advindos da modernização irá
depender da capacidade de organização e de luta dos produtores, bem como da
condição de serem proprietários dos meios de produção, principalmente a terra. Por
outro lado, é também necessária a existência de competição entre as firmas com as
quais se relacionam os camponeses, sejam elas compradoras ou vendedoras, pois
somente nessas condições os preços de fatores e dos produtos poderão ter reflexos
positivos sobre a rentabilidade da pequena produção moderna.
7. Apoio governamental à agricultura familiar : Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar –PRONAF
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O acesso ao crédito rural pelos agricultores familiares é um importante instrumento
para o desenvolvimento local, principalmente nos pequenos municípios, pois pode
estimular novos investimentos, potencializar experiências de produção e organização
da produção, viabilizar a industrialização e a comercialização da produção, tendo
como conseqüência a geração de empregos e renda (PICINATTO et al., 2000).
A agricultura familiar nunca foi prioridade do governo federal, sendo que, durante o
período de modernização agrícola, quando o crédito rural era abundante e barato,
muitos agricultores familiares tiveram acesso ao crédito, mas o grosso do dinheiro e
dos subsídios foi para empresas agroindustriais e latifundiários, que ficaram com mais
de 80% do valor do crédito rural liberado no período. Muitos agricultores familiares
integrados às indústrias, mesmo sendo pouco capitalizados, têm acesso ao crédito decusteio ou de investimento, mas as atividades financiadas são restritas às
determinações das agroindústrias. Foram as mobilizações das organizações dos
agricultores familiares junto ao governo que garantiram as conquistas e os avanços nas
políticas de crédito voltadas para a agricultura familiar (PICINATTO, A. G. et al.,
2000).
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF, foicriado pelo Decreto nº. 1.946 de 28.06.96, com recursos oriundos do Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT), dos fundos constitucionais de desenvolvimento e da
exigibilidade bancária.
No âmbito do Programa, são financiadas operações de custeio e investimentos de
agricultores familiares, extrativistas, aqüicultores e pescadores artesanais. São ainda
contempladas obras de infra-estrutura nos municípios, a capacitação e
profissionalização de técnicos e agricultores familiares, apoio à pesquisa agropecuária
e apoio a comunidades indígenas.
O PRONAF é um Programa de apoio ao desenvolvimento rural que reconhece a
importância da agricultura familiar, como segmento gerador de postos de trabalho e
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renda, e busca promovê-la, financiando suas atividades em condições preferenciais. O
programa é executado de forma descentralizada, e tem como protagonistas os
agricultores familiares e suas organizações (MINISTÉRIO DO
DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, 2001).
Uma das linhas de ação do Programa é o financiamento de infra-estrutura e serviços
nos municípios, que visa apoiar financeiramente a implantação, a modernização, a
ampliação, a racionalização e a realocação da infra-estrutura necessária ao
desenvolvimento da agricultura familiar no município.
Para que o município tenha acesso ao PRONAF Infra-estrutura e Serviços, ele deve,
antes, ser selecionado por critérios técnicos definidos e após homologado peloConselho Nacional do PRONAF. Esses critérios técnicos definidos priorizam os
municípios onde exista maior predominância de agricultores familiares.
A contrapartida desses municípios pode se constituir de dinheiro, bens ou serviços
mensuráveis monetariamente. Os índices da contrapartida, nos contratos com as
prefeituras municipais ou governos estaduais, são estabelecidos na Lei de Diretrizes
Orçamentárias, aprovada anualmente.
Outra linha de ação do PRONAF é o financiamento da produção da agricultura
familiar. O programa concede crédito aos agricultores e suas organizações
(associações e cooperativas), para que desenvolvam suas atividades produtivas, com
recursos tanto para custeio como para investimento em atividades agropecuárias, de
pesca, de aquicultura e de extrativismo. Agricultores familiares, pescadores,
aquicultores e extrativistas, individual ou coletivamente, que se enquadrarem nos
critérios do Programa, são os grupos que podem ter acesso a esse tipo de
financiamento. A condição necessária para acesso a esses recursos é preenchida por
uma declaração de aptidão, que comprova a condição de agricultor familiar, pescador,
aqüicultor e extrativista, fornecida pela extensão rural pública estadual ou por um
sindicato. No caso das organizações, o processo é o mesmo.
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O PRONAF tem ainda como linha de ação a profissionalização dos agricultores
familiares, mediante liberação de recursos financeiros para as entidades públicas ou
privadas que proporcionam conhecimentos e habilidades, tanto de natureza tecnológica
quanto gerencial, dentro do enfoque de cadeia produtiva na agricultura familiar.
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