Apostila_Responsabilidade_Socioambiental

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Responsabilidade Socioambiental Valéria da Vinha

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Responsabilidade Socioambiental

Valéria da Vinha

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Responsabilidade Socioambiental

Índice

Unidade 1 - Contexto e Trajetória do Desenvolvimento Sustentável

1.1. As fases da trajetória ......................................................................................................... 6 Década de 70 e a Conferência de Estocolmo ................................................................................... 6 Década de 80: redefinindo o desenvolvimento sustentável ............................................................... 8

Década de 90: generalização da convenção do desenvolvimento sustentável .................................. 10 1.2. Transição para uma visão integrada de sustentabilidade .................................................... 11 Desenvolvimento sustentável e empresas: cosmética ou enraizamento social? ................................ 12

Cúpula do Milênio e Rio + 10 ....................................................................................................... 13 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ...................................................................................... 13 1.3. A eco-eficiência se impõe ................................................................................................. 14

Inicialmente, era apenas o discurso..... ......................................................................................... 15 O papel dos gerentes ................................................................................................................... 16 1.4. Do berço-ao-túmulo...começa a fase prática ...................................................................... 16

1.5. Contribuição da ciência .................................................................................................... 18 Logística Reversa – uma inovação incremental do tipo “berço ao berço” ........................................ 20 1.6. Principais Diretrizes, Padrões e Certificações ..................................................................... 21

A prática da auto-regulação: o modelo GRI de performance ambiental ........................................... 21 Pontos fracos dos relatórios de sustentabilidade ............................................................................ 24

Revisão do conteúdo .................................................................................................................... 25

Unidade 2 - A Responsabilidade Social Empresarial (RSE) Emerge

Objetivos .................................................................................................................................... 26 2.1. Campo institucional da RSE: O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social .............. 26 2.2. O relacionamento com o Terceiro Setor .................................................................................. 28

2.3. Ambientalismo Empresarial: podem as corporações administrar o mundo? ............................... 29 Protocolo de Quioto ..................................................................................................................... 30 Governança Corporativa ............................................................................................................... 31

Vantagens da Sustentabilidade Corporativa ................................................................................... 32 2.4. A Nova fase da RSE e a visão estratégica da sustentabilidade .................................................. 33 Revisão de conteúdo .................................................................................................................... 35

Unidade 3 - Evolução dos Conceitos e das Práticas da Responsabilidade Social

Empresarial Objetivos .................................................................................................................................... 35

3.1. Por que RS tem várias definições? .......................................................................................... 36 3.2. Diálogo com Stakeholders ..................................................................................................... 41 Na fase exploratória, pretende-se, com a aplicação dessa ferramenta, ............................................ 42

Contribuição do diálogo com stakeholders ao gerenciamento do projeto ......................................... 42 O stakeholder approach trata de públicos e indivíduos que podem afetar, direta ou indiretamente, a organização, e do comportamento gerencial adotado para responder a eles”. (Edward Freeman.

Strategic Management: a stakeholder approach, 1984 ................................................................... 42 Stakeholder: conceito central da responsabilidade social ................................................................ 43 3.3. Articulando Responsabilidade Social Empresarial e Desenvolvimento Sustentável ...................... 44

3.4. A RSE no Brasil ..................................................................................................................... 46 Revisão de conteúdo .................................................................................................................... 48

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Unidade 4 - A RSE no Setor Financeiro e a Norma ISO 26000 Objetivos .................................................................................................................................... 49 4.1. Principais inovações institucionais no setor financeiro .............................................................. 50 Protocolo Verde (1995) ................................................................................................................ 50

4.2. Investimentos Socialmente Responsáveis (ISR) – Histórico e Evolução ..................................... 52 Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE/BOVESPA ................................................................. 53 Investimentos em Empresas de Capital Aberto .............................................................................. 54

4.3. Por que uma norma em responsabilidade social? A Norma ISO 26000 ...................................... 55 4.4. O processo de criação da ISO 26000 ...................................................................................... 56 4.5. Características da ISO 26000 ................................................................................................. 59

4.6. Análise crítica: os prós e contras da ISO 26000 ....................................................................... 60 Limitações da Norma ................................................................................................................... 61 Aspectos positivos da ISO 26000 .................................................................................................. 61

ISO 26000 e NBR 16001: uma breve comparação .......................................................................... 62 4.7. Considerações finais .............................................................................................................. 62

A sinergia Estado/Sociedade ......................................................................................................... 63 Revisão de Conteúdo ................................................................................................................... 64

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................. 65 ANEXOS ............................................................................................................................ 68

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Introdução “A questão ecológica é uma questão social; e hoje a questão social só pode ser elaborada adequadamente como uma questão ecológica”. (Elmar Altvater)

A teoria econômica tradicional baseia-se na premissa de que os homens são racionais e agem egoisticamente de maneira a maximizar a satisfação de seus interesses. Por essa razão, coube a uma

instituição supostamente independente, o mercado, a responsabilidade pelo fluxo de todos os bens e serviços gerados por indivíduos e organizações. Através do livre jogo da oferta e da procura, o mercado seria capaz de garantir a distribuição dos bens entre a totalidade dos membros da sociedade

e, consequentemente, a satisfação de cada um. Contudo, para seu bom desempenho, o mercado precisa de uma grande margem de liberdade, não devendo o Estado interferir ou regular seu funcionamento (SMITH, 1776:1985).

Essa convenção social consolidou-se ao longo da expansão do modelo capitalista inaugurado pela

Revolução Industrial do século XVIII, moldando o comportamento dos agentes econômicos, particularmente do segmento responsável pela produção e distribuição desses bens e serviços: as empresas. No bojo desse processo, ocorreu uma aparente emancipação da esfera econômica em

relação à sociedade e ao Estado, levando ao surgimento de uma classe social historicamente nova: a burguesia em suas distintas facetas (mercantil, industrial e financeira).

Sabe-se, no entanto, que, no mundo real, Economia e Sociedade não estão dissociadas e que o mercado não é uma instituição perfeita. Entre as suas falhas, uma vem ganhando evidência crescente: a incapacidade de dar respostas concretas e duradouras à questão ambiental. A

intensificação dos impactos antrópicos ao longo do século passado impõe seu enfrentamento no nível macro e micro, dentro e fora do mercado, envolvendo todos os segmentos sociais e não apenas os concernentes à esfera pública.

Dessas circunstâncias e preocupações comuns a organizações e a nações de todo o mundo, emergiu uma nova convenção de mercado popularizada no termo “Desenvolvimento Sustentável” (ou,

simplesmente, Sustentabilidade). Sua disseminação tem sido tão rápida que está alterando as regras da concorrência capitalista, obrigando as empresas (sobretudo as multinacionais) a criarem ou a

adquirirem competência para gerenciar práticas socioambientais de maneira a se manterem competitivas. O movimento da Responsabilidade Social Empresarial (ou Corporativa) nasce, assim, organicamente ligado aos princípios do Desenvolvimento Sustentável.

A seguir, descrevem-se e analisam-se as motivações e as principais características e estratégias que pontuam esse processo.

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Unidade 1 Contexto e Trajetória do Desenvolvimento Sustentável

Objetivos Nesta Unidade, você conhecerá o contexto que deu origem ao desenvolvimento sustentável, os principais acontecimentos desta trajetória, e como o segmento empresarial incorporou os novos

conceitos e práticas gerados ao longo deste processo. Ao final da Unidade, que conhecerá os passos que a empresa deve tomar para atender aos princípios da sustentabilidade; e estará apto a identificar

o que mudou no dia-a-dia das empresas; seja no seu processo produtivo, adotando a chamada eco-eficiência, seja na sua relação com a sociedade. E deverá ser capaz de diferenciar as empresas que têm compromissos efetivos com a responsabilidade socioambiental daquelas que adotam apenas o

discurso.

Não está muito distante o tempo em que poluição era sinal de progresso. Há cerca de três décadas, durante a histórica Conferência de Estocolmo (1972) – evento que representou o primeiro alerta de grande repercussão sobre os graves riscos ambientais sofridos pelo planeta –, o representante do

Governo brasileiro defendeu a tese de que o controle da poluição era um entrave ao progresso e articulou a vinda para a cidade de Cubatão1 de indústrias altamente poluidoras, que estavam sendo expulsas dos países desenvolvidos.

Felizmente, o setor privado vem se conscientizando de que o custo financeiro de reduzir o passivo ambiental e de administrar conflitos sociais pode ser mais alto do que o custo de "fazer a coisa certa",

isto é, de respeitar os direitos humanos e o meio ambiente de todos os povos, pois influenciam a percepção da opinião pública sobre a empresa, dificultando a implementação de novos projetos e a renovação de contratos.

Inicialmente, essa mudança de comportamento foi motivada por pressão da sociedade civil, que se

organizou para combater o desmatamento e a poluição, por restrições impostas pela legislação ambiental, mas terminou por influenciar o mercado, alterando as bases tradicionais da concorrência. Se as normas ambientais mais rigorosas representam um custo alto em pagamento de multas e

mitigação dos danos ambientais, os acidentes e crimes ambientais provocam escândalos corporativos que abalam a confiança dos consumidores e acionistas, refletindo-se em queda de vendas e, consequentemente, em prejuízo financeiro.

Outro fator de pressão, cuja influência cresceu significativamente nos últimos anos em decorrência dos inúmeros e sucessivos desastres ambientais atribuídos a ações antrópicas equivocadas (entre

eles, as tsunamis e o furacão Katrina), diz respeito ao risco real de uma crise ambiental de grandes proporções capaz de gerar escassez das matérias-primas e das fontes energéticas que suportam o atual padrão de produção e consumo.

1 Com um grande parque industrial, Cubatão enfrentou no passado a ameaça constante da poluição. Na década de 80, foi

considerada pela ONU como a cidade mais poluída do mundo. Contudo, com a união de indústrias, comunidade e governo, a

cidade conseguiu controlar 98% do nível de poluentes no ar. Por isso, em 1992 recebeu da ONU o título de "Cidade-símbolo da

Recuperação Ambiental".

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Os desastres naturais e meteorológicos mataram 350 mil pessoas nos últimos 12 meses e provocaram prejuízos

econômicos calculados em US$ 200 bilhões. Segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM), além da tsunami e do

terremoto no Paquistão (com 70 mil mortes), em 2005, houve mais tempestades tropicais (26) e mais furacões (14).

Muitos autores consideram que, num futuro próximo, o mais importante impulsionador do uso de novos recursos e do desenvolvimento de tecnologias limpas será o estoque das reservas naturais. Stuart Hart (1977), por exemplo, sugere que a alocação de recursos será tão fortemente orientada

pela disponibilidade física do recurso natural, que não haverá espaço nem para a legislação ambiental nem para as políticas públicas se imporem. Com isso, a determinação e o rigor na implementação de uma política de sustentabilidade ambiental recairia, inevitavelmente, sobre as empresas.

De fato, esse cenário vem preocupando alguns segmentos industriais, particularmente, as indústrias

do setor de petróleo e derivados, responsáveis pelo consumo de fontes não renováveis e por elevadas taxas de emissão de poluentes, além de incontáveis acidentes de grandes proporções. Só para aludir a um caso emblemático, cita-se o derramamento de 11 milhões de óleo bruto do petroleiro Exxon Valdez, no Alasca – o maior da história americana – , que levou o Governo norte-americano a aplicar o método de valoração contingente com o objetivo de avaliar a extensão dos danos e a obrigar a Exxon Corporation a indenizar suas vítimas.

Atualmente, as gigantes do petróleo disputam a primazia de possuir as melhores tecnologias de energia renovável e de superar as metas na redução de emissões numa tentativa de mudar sua

imagem pública desgastada por décadas na liderança da emissão de CO2. Além de ser uma das mais poluentes, a indústria química afeta, particularmente, os países em

desenvolvimento. Segundo dados de 1995, a América Latina consome 40% dos produtos químicos comercializados nos países dessa categoria e, apenas três deles, Brasil, México e Argentina, concentravam 70% da indústria química do Continente, o que explica a ocorrência de tantos

acidentes graves, envolvendo, em média, 40 óbitos ao longo das décadas de 80 e 90 (FREITAS, PORTO e MACHADO, 2002).

Porém, não é apenas nos segmentos citados que essas forças de pressão vêm exercendo influência. Ao menos no plano da retórica, representantes dos mais diversos setores encaram os custos

ambientais como um investimento inerente ao negócio. Ao reconhecer que não tem autonomia para decidir como explorar os recursos de uma determinada região, a empresa demonstra maturidade para o diálogo e abre caminho para a obtenção do que se convencionou chamar “licença social para

operar”. Por serem mais visadas, as indústrias extrativas (mineração, petróleo & gás, indústria florestal) estão

mais sensíveis ao movimento de responsabilidade social, porém outros segmentos, como o financeiro, por exemplo, demonstram maior capacidade de resposta, conforme se exporá ao longo do Curso. Finalmente, na Era da globalização e na da chamada sociedade da informação, os ativos intangíveis

(isto é, o conjunto de recursos não materiais, como o conhecimento e a reputação) adquirem importância estratégica na condução dos negócios. Perder reputação pode representar um prejuízo financeiro incalculável. Em estudo inédito realizado no Reino Unido, com 800 executivos, concluiu-se

que, para a empresa recuperar sua credibilidade junto a opinião pública, seriam necessários, em média, dez anos e oito meses e, decorrer de uma década, e muitas não resistem e pedem falência.

Pesquisa realizada no Brasil, em 2005, ouviu 269 gestores de risco e concluiu que o principal obstáculo enfrentado pelo executivo para gerenciar risco de reputação da sua empresa seria a falta de

instrumentos adequados (ver figura 01).

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Figura 01: ameaças à reputação. Fonte: Matéria Folha de São Paulo28-01-2006. Folha Dinheiro. Pág.2

Esse conjunto de fatores conduziu a uma inevitável revisão dos valores empresariais, muito embora, na visão do empresariado, o desenvolvimento sustentável seja um projeto em construção, de longa

duração. As características e os momentos marcantes da trajetória já percorrida pelos setores produtivo e financeiro na direção da sustentabilidade serão tratados a seguir.

1.1. As fases da trajetória

Década de 70 e a Conferência de Estocolmo

A Terceira Revolução Industrial, ocorrida na década de 70, introduziu novas técnicas de transporte e comunicação, possibilitando uma segmentação da produção nunca antes experimentada. Com isso, cresceram os grandes conglomerados empresariais que passaram a ter poder de ação e de influência

para além de seus territórios nacionais, fazendo com que as economias nacionais atingissem uma integração global. Aliado a esse fenômeno, o surgimento dos ideais neoliberais na década de 80, com Reagan nos EUA e com Tatcher na Inglaterra, contribuiu para ampliar esta integração mundial,

consolidando, em definitivo, o fenômeno conhecido como globalização. Com isso, as decisões políticas e econômicas que, antes ficavam restritas aos Estados nacionais,

ganharam âmbito internacional, já que as preocupações passaram a ser globais. Os órgãos internacionais, como a ONU, e as principais organizações não governamentais, como o Greenpeace,

se expandiram e aumentaram seu poder político. Novas questões entraram na agenda da diplomacia mundial, entre elas a da preocupação ambiental.

Na década de 70, o termo aquecimento global foi mencionado pela primeira vez. A expressão “poluição ambiental” começava a fazer parte do vocabulário científico. Acreditava-se que as principais ameaças à Camada de Ozônio eram as turbinas dos aviões supersônicos (o Concorde tinha acabado

de surgir) e as emissões de gases orgânicos pelos rebanhos. O cenário internacional era bipolar, e a ameaça de ataques nucleares da Guerra Fria ainda era realidade.

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Um grupo de estudiosos integrante do denominado Clube de Roma se propunha a analisar variáveis

como tecnologia, população, alimentos, recursos naturais e meio ambiente com o propósito de apontar possíveis caminhos para evitar o colapso do planeta, previsto para o ano 2000. Desses estudos, surge a publicação The Limits to Growth (“Limites do Crescimento”), que colocou em pauta a

discussão sobre a finidade dos recursos naturais planetários. Esse documento foi um marco histórico para as preocupações ambientais e o caráter global das

mesmas. No entanto, a teoria defendida no documento não foi aceita por nenhuma nação, considerada irreal e inviável. Denominada “teoria do crescimento zero”, ela defendia que os países

parassem de crescer e voltassem suas atenções para a resolução dos impactos ecológicos causados pelo desenvolvimento anterior. Apesar de não ser aceita, a teoria passou a fomentar debates nacionais e internacionais acerca do tema em foco.

Nesse contexto de maior atenção aos crescentes impactos ambientais, surge a ideia, na Suécia, que vinha sofrendo sérios danos em seus lagos devido à chuva ácida decorrente da poluição da Europa

Ocidental, de uma conferência internacional sobre o meio ambiente. Dessa preocupação, nasceu a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, na mesma Suécia, em 1972.

A Conferência de Estocolmo foi o evento que colocou o meio ambiente no foco das preocupações internacionais. Essa discussão reuniu tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento e teve,

como principais ausências, a União Soviética e a maioria de seus aliados, um reflexo da bipolaridade política do período. No evento, foi produzida uma Declaração de 26 princípios e um Plano de Ação com 109 recomendações. Algumas metas específicas foram, então, estabelecidas: uma moratória de

dez anos sobre a caça comercial a baleias, a prevenção de derramamentos deliberados de petróleo no mar e um relatório sobre o uso da energia até 1975.

A Declaração de Estocolmo e seus princípios constituíram o primeiro conjunto de soft laws, ou seja, “leis internacionais apenas intencionais”, sem aplicação obrigatória, para questões ambientais

internacionais. Ainda em 72, por recomendação da Conferência, criou-se o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA/UNEP), para ação e coordenação de questões ambientais no âmbito da ONU. A missão do PNUMA é a de “prover liderança e encorajar parcerias no cuidado com o

ambiente, inspirando, informando e capacitando nações e povos a aumentar sua qualidade de vida sem comprometer a das futuras gerações” (ONU-BRASIL).

No Brasil, que vivia o período da ditadura militar e do milagre econômico, a tese defendida do no relatório Limites do Crescimento foi fortemente rechaçada pelo Ministro do Interior, Costa Cavalcante, representante do País na Conferência de Estocolmo (1972). A repercussão negativa da posição

brasileira, porém, motivou a criação de um órgão nacional de meio ambiente. Cerca de um ano depois, com o Decreto Federal no 73.030, de 30/10/1973, surgia, com competência

bastante limitada, a Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), ligada ao Ministério do Interior e usada como propaganda do Governo Médici.

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Box 01 - Versão resumida dos Princípios da Declaração de Estocolmo (1972)

1. Os direitos humanos devem ser defendidos; o apartheid e o colonialismo devem ser condenados.

2. Os recursos naturais devem ser preservados. 3. A capacidade da Terra de produzir recursos renováveis deve ser mantida. 4. A fauna e a flora silvestres devem ser preservadas.

5. Os recursos não renováveis devem ser compartilhados, não esgotados. 6. A poluição não deve exceder a capacidade do meio ambiente de neutralizá-la. 7. A poluição danosa aos oceanos deve ser evitada.

8. O desenvolvimento é necessário à melhoria do meio ambiente. 9. Os países em desenvolvimento requerem ajuda. 10. Os países em desenvolvimento necessitam de preços justos para as suas exportações, para que

realizem a gestão do meio ambiente. 11. As políticas ambientais não devem comprometer o desenvolvimento. 12. Os países em desenvolvimento necessitam de recursos para desenvolver medidas de proteção

ambiental. 13. É necessário estabelecer um planejamento integrado para o desenvolvimento. 14. Um planejamento racional deve resolver conflitos entre meio ambiente e desenvolvimento.

15. Assentamentos humanos devem ser planejados de forma a eliminar problemas ambientais. 16. Os governos devem planejar suas próprias políticas populacionais de maneira adequada.

17. As instituições nacionais devem planejar o desenvolvimento dos recursos naturais dos estados. 18. A ciência e a tecnologia devem ser usadas para melhorar o meio ambiente. 19. A educação ambiental é essencial.

20. Devem-se promover pesquisas ambientais, principalmente em países em desenvolvimento. 21. Os Estados podem explorar seus recursos como quiserem, desde que não causem danos a outros. 22. Os Estados que sofrerem danos dessa forma deverão ser indenizados.

23. Cada país deve estabelecer suas próprias normas. 24. Deve haver cooperação em questões internacionais. 25. Organizações internacionais devem ajudar a melhorar o meio ambiente.

26. Armas de destruição em massa devem ser eliminadas. Fonte: Clarke & Timberlake,1982, citado em Integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento: 1972-

2002, sítio do Ibama na Internet. Acessado em 28.04.2006.

Década de 80: redefinindo o desenvolvimento sustentável

A década de 80 pode ser definida como um período bastante peculiar em todo o mundo. No âmbito político, o fim do mundo bipolarizado – simbolizado pela queda do muro de Berlim – trouxe importantes mudanças e consequências tanto na esfera européia quanto na mundial. No âmbito

econômico, a crise nos países em desenvolvimento foi um fato extremamente marcante no período. Essas regiões, como a África, a Ásia Ocidental, a América Latina e o Caribe, registravam um aumento pequeno de renda.

Para vários países em desenvolvimento, a década de 80 ficou conhecida como “a década perdida”, a começar pela crise da dívida que atingiu a América Latina em 82. A situação ficou especialmente difícil

em países onde milhões de pessoas se deslocaram por conta de guerras. O número de refugiados passou de cerca de 09 milhões de pessoas em 1980 para mais de 18 milhões no início da década de

90 (UNHCR, 2000). A partir daí, lidar com temas, como pobreza e meio ambiente, tornou-se de extrema importância nos

debates políticos mundiais. Para exemplificar, em 1985 foi publicada, pela primeira vez, por pesquisadores britânicos as medições do tamanho do buraco da camada de ozônio, fato que causou grande surpresa tanto para políticos quanto para cientistas. Como a interdependência entre o meio

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ambiente e o desenvolvimento se tornava cada vez mais óbvia, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Carta Mundial da Natureza (World Charter of Nature), chamando a atenção para o valor

intrínseco das espécies e dos ecossistemas (ONU, 1986) (ver Box 02).

Box 02 - Carta Mundial da Natureza: Princípios Gerais

• A viabilidade genética da Terra não deve ser comprometida; os níveis populacionais de todas as formas de vida, silvestres e domesticadas, devem ser ao menos suficientes para a sua sobrevivência e, com essa finalidade, os habitats necessários devem ser protegidos.

• Todas as áreas do planeta, tanto terrestres quanto marítimas, devem estar sujeitas a esses princípios de conservação; uma proteção especial deve ser dada a áreas singulares, a amostras representativas de todos os diferentes tipos de ecossistema e ao habitat de espécies raras e

ameaçadas de extinção. • Os ecossistemas e os organismos, assim como os recursos terrestres, marinhos e atmosféricos usados pelo homem devem ser manejados de forma a alcançar e a manter uma produtividade

sustentável e em condições favoráveis, desde que não comprometam a integridade dos outros ecossistemas ou espécies com os quais coexistem. A natureza deve ser protegida da degradação

causada por guerras e outras atividades hostis. Fonte: ONU, Resolução nº 37/7, de 28.10.1986.

A década de 80 também presenciou uma série de eventos catastróficos que marcaram de forma permanente o meio ambiente tais como o vazamento de gases letais na Índia na cidade de Bhopal em

19842, o desastre nuclear em Chernobyl, na Ucrânia, em 1986

3 e o acidente do navio Exxon Valdez,

em 1989, que despejou 41 milhões de litros de petróleo em uma área de vida selvagem no Alasca

(EUA). Esses e outros eventos confirmaram que as questões ambientais eram sistêmicas e que lidar com elas requeria estratégias e ações integradas de longo prazo e participação de todos os países e de todos os membros da sociedade.

A Estratégia de Conservação Mundial (World Conservation Strategy) foi um dos documentos mais importantes que ajudaram a redefinir o ambientalismo após a Conferência de Estocolmo. Lançado em

1980, esse documento reconheceu que a abordagem dos problemas ambientais demandaria um esforço em longo prazo e a integração dos objetivos ambientais com aqueles relacionados com o

desenvolvimento. Em 1983, foi criada a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) para realizar audiências em todo o mundo e produzir um relatório sobre suas conclusões. Reuniões foram conduzidas em países desenvolvidos e em desenvolvimento, colhendo as percepções

de diferentes grupos sociais sobre questões relacionadas à agricultura, à água, à energia, à transferência de tecnologias e ao desenvolvimento sustentável em geral.

Nesta década também, o conceito de desenvolvimento sustentável foi apresentado, em 1987, como resultado da Assembléia Geral das Nações Unidas, no relatório Our Common Future (“Nosso Futuro Comum”). O relatório traduziu as preocupações com o meio ambiente que já se instalavam na

sociedade. Nele foi expresso pela primeira vez o conceito utilizado até os dias atuais e definido como aquele que “atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem as suas”, por meio da sustentabilidade do desenvolvimento que implica uma

mudança nas relações econômicas, político-sociais, culturais e ecológicas.

2 A tragédia em Bhopal teve início nas primeiras horas do dia 3 de dezembro de 1984, quando 40 toneladas do veneno

isocianato de metila em estado gasoso começaram a vazar da fábrica de pesticidas da americana Union Carbide, localizada a

menos de 5 quilômetros de Bhopal. A substância, altamente tóxica, causa cegueira e leva ao bloqueio dos alvéolos pulmonares. Em pouco tempo, uma nuvem de gás letal atingiu Bhopal, onde viviam mais de 900 mil pessoas, a maioria em favelas. 3 Em 26 de Abril de 1986, explodiu um reator da central de Chernobyl que libertou uma imensa nuvem radioativa contaminando pessoas, animais e o meio ambiente de uma vasta extensão da Europa.

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Desse modo, a natureza passou a ser vista como parte integrante de um sistema que originalmente deveria ser cíclico, excluindo o comportamento predador do modelo desenvolvimentista

predominante.

Década de 90: generalização da convenção do desenvolvimento sustentável O conceito de desenvolvimento sustentável tornou-se mais compreensível, acompanhando a crescente

globalização dos mercados. A década testemunhou catástrofes ambientais ainda maiores do que as ocorridas nos anos 80, gerando um movimento de conscientização acerca da estreita correlação entre

pobreza e crise ambiental. Ficou claro que um número cada vez maior de atores teria de lidar com as implicações ambientais de suas atividades.

O agravamento da pobreza e da fome no mundo exerceu forte pressão para que se realizasse a

Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida como “Cúpula da Terra” ou “Rio-92”. Essa conferência, realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992, considerada como a maior reunião do gênero já realizada, daria nascimento à Agenda 21 (Box 03).

Ainda durante a década de 90, despontam diversas iniciativas empresariais visando à adequação a essa nova proposta tecnológica. Em 1996, surgiu o selo ISO 14000

4, definindo um novo padrão

voluntário de manejo ambiental na indústria. Entre os brasileiros, duas novas entidades forneceram as diretrizes que orientariam, daí em diante, o setor produtivo, em particular as empresas líderes: o Centro Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), de 1997, braço brasileiro do

WBCSD, e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, em 1998.

4 A International Organization for Standardization (ISO) é uma organização não governamental criada em 1946, com sede em Genebra, na Suíça, formada por representantes de mais de 155 países, funcionando como uma rede integrada internacional de órgãos de normalização em todo o mundo. Uma de suas finalidades é definir um padrão mundial para implementação de normas e diretrizes direcionadas à responsabilidade socioambiental nas organizações.

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Box 03 - Agenda 21 – Por Um Mundo Sustentável

A Rio-92, além de reunir chefes de Estado e representantes oficiais de 179 países, também juntou

organizações não governamentais de todo o mundo em um evento paralelo – o Fórum Internacional

de ONGs e Movimentos Sociais. Daí surgiria a Agenda 21, que se constituiu no documento mais

abrangente dessa conferência e selou um compromisso entre as nações participantes. Apresentou-se,

tanto para o poder público como para a sociedade civil e os setores econômicos, como um guia, um

conjunto de diretrizes, para a promoção de ações que estimulassem a integração entre o crescimento

econômico, a justiça social e a proteção ambiental.

Ao redefinir o conceito de desenvolvimento, assegurando-lhe dimensão não apenas quantitativa, mas

também qualitativa, o documento enfatizava o aumento da produtividade, aliado à justiça social e à

conservação dos recursos naturais, cujas perdas crescentes deveriam ser consideradas contribuição

negativa ao produto interno bruto (PIB) e às contas nacionais. Tal esforço exigia mudanças culturais

de comportamento, inovação tecnológica e rede de cumplicidades formada por todos os setores

sociais a se irradiar nos planos global, nacional e local.

Durante a Rio-92, cada país comprometeu-se a definir sua própria Agenda 21.

Para iniciar as atividades da Agenda, foram escolhidos temas centrais, como agricultura e cidades

sustentáveis, ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável, gestão dos recursos naturais,

infra-estrutura, integração regional e redução das desigualdades sociais como forma a compreender a

complexidade do País e suas regiões dentro do conceito de sustentabilidade ampliada.

O Brasil criou, em 1997, a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável (CPDS), órgão

presidido pelo Ministério do Meio Ambiente, com a função de conduzir a elaboração da Agenda 21

Brasileira. Em 2002, foi concluída a primeira etapa de elaboração da Agenda. Atualmente, está em

curso a segunda etapa, ou seja, a implementação das políticas públicas propostas, bem como a

elaboração e implementação de Agendas 21 Locais.

A Agenda 21 Local é o processo participativo e multissetorial de construção de um programa de ação

estratégico dirigido para o desenvolvimento sustentável local. Seus principais objetivos são a

formulação e a implementação de políticas públicas, por meio de uma metodologia participativa que

una governo e sociedade. A ideia é de que a Agenda 21 Local seja um documento de referência para

a construção ou revisão de Planos Diretores, de orçamentos participativos municipais, de zoneamento

ecológico-econômico, entre outros instrumentos de gestão, contribuindo, dessa maneira, para a

integração de ações de diferentes instituições em uma mesma localidade.

1.2. Transição para uma visão integrada de sustentabilidade

Até a década de 90, crescimento econômico e desenvolvimento eram encarados como

indissoluvelmente conectados, não sendo considerada a possibilidade de se desenvolver sem crescer. Contudo, enquanto, para as economias desenvolvidas do Norte, essa equação vinha sendo administrada pela cartilha da ortodoxia neoclássica, segundo a qual a regulação da economia é tarefa

do equilíbrio entre a oferta e a demanda, nos países do Sul, o estado de pobreza crônica da população requereu a criação de instrumentos econômicos e institucionais para sua superação.

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O Banco Mundial5 sustentava que a extensão do padrão de consumo do Norte ao Sul embutia o elevado risco de comprometer a capacidade de uso e de recuperação dos recursos naturais – vale

lembrar, que o Sul é detentor da maior parte do estoque existente no planeta –, concluindo pela necessidade de redirecionar o desenvolvimento do Sul para um modelo de crescimento econômico ambientalmente sustentável. Já se admitia, portanto, a relativa fragilidade do modelo de

desenvolvimento mundialmente hegemônico. Na visão convencional do Banco Mundial, o fluxo de exportações de mercadorias e de capitais do

Norte para o Sul e o consequente retorno na forma de lucros e juros da dívida só poderiam continuar se a aceleração do crescimento econômico do Sul estivesse condicionada ao combate à pobreza. Tal

raciocínio pressupunha que o ritmo de crescimento das economias industrializadas do Norte se manteria inalterado e, até mesmo, relativamente aumentado, pelo incremento do intercâmbio entre ambos. Essa mensagem significava a negação de limites ecológicos paralisantes ao desenvolvimento,

admitindo-se que os problemas decorrentes do consumo ambientalmente predatório do Sul poderiam ser solucionados através de um padrão de “crescimento sustentável”, por mais paradoxal que isso pudesse parecer.

O Banco Mundial apresentou um relatório ortodoxo, inovando, principalmente, na ênfase dada às políticas de combate à pobreza nos países pobres aliadas à exigência de uma avaliação de impacto

ambiental dos projetos por ele financiados. No entanto, em 1997, uma nova linha de abordagem foi incorporada aos documentos oficiais da instituição, apontando a necessidade de envolver representantes da sociedade no processo de implantação dos empreendimentos. Para as empresas

que atuam em áreas ambiental e socialmente sensíveis em países pobres, essa decisão do Banco foi crucial para a definição de uma política de responsabilidade social.

A problemática crescimento vs. desenvolvimento não tem sido debatida, mas está implícita no debate empresarial sobre responsabilidade social e, certamente, o guiará no futuro próximo. Algumas empresas já estão discutindo seriamente esse cenário, motivadas, sobretudo, pela urgência em

minimizar os efeitos das emissões de gases na atmosfera e seus impactos na mudança climática.

Desenvolvimento sustentável e empresas: cosmética ou enraizamento social?

Existem tantas definições sobre Desenvolvimento Sustentável quantas são as correntes teóricas e indivíduos que sobre ele se pronunciam. Da mesma forma, encontram-se visões distintas no seio do empresariado. Para alguns, essa convenção tem sido responsável pela deflagração de novos valores

morais e éticos, que ajudam a humanizar a empresa frente à sociedade (SCHMIDHEINY, 1995, 1996), enquanto, para outros, trata-se apenas de uma jogada de marketing visando a oportunidades comerciais (KORTEN, 1998).

É fato, contudo, que a compreensão nas empresas sobre o desenvolvimento sustentável está

significativamente ampliada. O meio ambiente adquiriu tamanho prestígio, principalmente entre as multinacionais, que tem sido apoiado pelas funções centrais da firma, como os setores jurídico, relações públicas, marketing e financeiro, além, naturalmente, do Departamento de Pesquisa e

Desenvolvimento, merecendo em muitos casos gerência ou diretoria próprias. Apesar do expressivo número de organizações ambientalistas existentes no Brasil e no mundo, o

diálogo entre elas e o setor produtivo apenas recentemente vem adquirindo um caráter de parceria efetiva, conceitual e operacionalmente falando. Ainda é muito comum a empresa acomodar-se no

5 O Banco Mundial é uma instituição financeira, fundado em 1944, composta de cinco instituições afiliadas (BIRD, AID, IFC, AMGI, CIADI) e tem como missão o combate à pobreza. Com cerca de 183 países membros, inclusive o Brasil, é o principal organismo multilateral internacional de financiamento do desenvolvimento social e econômico, como a maior fonte de financiamento de ajuda ao desenvolvimento. A sua ação destina-se, fundamentalmente, aos países mais pobres do mundo.

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processo “cosmético”, que corresponderia ao que se denomina pejorativamente de "esverdeamento", reagindo apenas à legislação, e modificando o seu discurso mas não a sua prática.

O ideal é a empresa ir além do marco regulatório, evoluindo para a fase normativa (abrindo espaço na estrutura organizacional) e, finalmente, para a cognitiva (isto é, incorporando os princípios da

sustentabilidade na cultura corporativa, independente de instrumentos de coerção ou de pressão). Para tanto, é preciso desenvolverem-se procedimentos e normas destinados a facilitar a interação social. Por isso, presencia-se, hoje, a consolidação de uma nova modalidade de gestão empresarial,

baseada em princípios de responsabilidade social.

Como se tratará ao longo do Curso, mais do que a imposição regulatória e a pressão do mercado, a estratégia adotada pela empresa para gerenciar o relacionamento com a sociedade será a principal fonte de vantagem competitiva, pressupondo que a instituição é uma organização dinâmica, que está

sempre aprendendo e que tem uma compulsão estrutural ao crescimento.

Cúpula do Milênio e Rio + 10 Como decorrência da situação mundial em relação à fome e a pobreza, consolidou-se a consciência

sobre a urgência de se fazer algo a respeito dessas condições. Realizou-se, então, a Cúpula do Milênio, reunião promovida pela Organização das Nações Unidas, em Nova York, em setembro de 2000. Líderes de 189 países firmaram um pacto cujo foco principal é o compromisso de combater a

pobreza e a fome no mundo. Nascia um documento denominado “Declaração do Milênio”, que estabelecia, como prioridade, eliminar a extrema pobreza e a fome do mundo até 2015. Foram acordados oito objetivos denominados “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio”, cada qual com

suas metas e indicadores. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

1. Erradicar a extrema pobreza e a fome;

2. Atingir o ensino básico universal; 3. Promover a igualdade de gênero e a autonomia das mulheres; 4. Reduzir a mortalidade infantil;

5. Melhorar a saúde materna; 6. Combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; 7. Garantir a sustentabilidade ambiental;

8. Estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. (Fonte: Ministério do Meio Ambiente, 2005.)

A Agenda 21 e os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio foram instrumentos que se conjugaram para a realização do desenvolvimento sustentável, aprovados e adotados pelos Estados-membros da Organização das Nações Unidas. Em 2002 e como consequência direta da Rio-92 e da Conferência de

Estocolmo de 1972, ocorreu a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (CMDS), conhecida como Rio+10, em Johannesburgo, na África do Sul.

A Cúpula buscou formular um plano de ação factível, no qual seriam detalhados alguns objetivos alinhados aos princípios já definidos na Rio-92. Entre os desafios expressos no documento, mencionou-se a continuidade de diversos problemas ambientais de caráter global. Algumas metas já

estavam delineadas, como, por exemplo, aumento à proteção à biodiversidade e o acesso à água potável, ao saneamento, ao abrigo, à energia, saúde e segurança, reversão da tendência de

degradação de recursos naturais, restauração de pesqueiros até 2015 e estabelecimento de áreas marinhas protegidas até 2012. Concluiu-se, também, que, para promover o desenvolvimento sustentável dos países, era necessária a ampliação de acesso a mercados alternativos, a diminuição

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dos subsídios às exportações e a promoção de um conjunto de programas, no prazo de dez anos, que incentivassem o consumo e a produção sustentáveis.

1.3. A eco-eficiência se impõe Neste tópico, são desenvolvidas, com mais objetividade, duas fases marcantes do processo de conversão à sustentabilidade: a fase da disseminação dos princípios da eco-eficiência, e a da

institucionalização das mudanças organizacionais provocadas pela aplicação dos princípios e tecnologias associados à sustentabilidade, tanto no plano da produção, quanto no da relação com os stakeholders e principais instrumentos de gestão e boas práticas.

O termo “eco-eficiência” foi introduzido, em 1992, pelo World Business Council for Sustainable

Development (WBCSD) (“Conselho Mundial de Negócios para o Desenvolvimento Sustentável”) por meio da publicação do livro Changing Course (“Mudando o Rumo”), endossado pela Conferência Rio-92 como uma forma de as organizações implementarem a Agenda 21 no setor privado, desde então,

tem-se tornado sinônimo de uma filosofia de gerenciamento que leva à sustentabilidade. De acordo com o WBCSD, a eco-eficiência é obtida pela “entrega de bens e serviços com preços competitivos que satisfazem as necessidades humanas e trazem qualidade de vida, reduzindo progressivamente

impactos ambientais dos bens e serviços, através de todo o ciclo de vida, em linha com a capacidade estimada da Terra em suportá-los”.

Conforme relatado por Stephan Schmidheiny, empresário suíço fundador do WBCSD, o termo eco-eficiência surgiu da necessidade de apresentar uma proposta empresarial de atuação na área ambiental para a Conferência do Rio, em 1992. Segundo ele, foi desafiante para o grupo composto de

50 empresários encontrar algo a dizer sobre meio ambiente e sobre desenvolvimento que "honrasse as realidades básicas do mercado". Depois de acirrado debate, concluiu-se que o termo era o que melhor exprimia a meta de integrar a eficiência econômica e ecológica. Assim, o WBCSD define eco-

eficiência como sendo...

....alcançada mediante o fornecimento de bens e serviços a preços competitivos que

satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida, ao mesmo tempo em que

reduz progressivamente o impacto ambiental e o consumo de recursos ao longo do ciclo de

vida, a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada da Terra.

Esse conceito descreve uma visão para a produção de bens e serviços que possuam valor econômico

enquanto reduzem os impactos ecológicos da produção e sugere, ainda, uma significativa ligação entre eficiência dos recursos (que leva à produtividade e à lucratividade) e responsabilidade ambiental. Portanto, eco-eficiência é o uso mais eficiente de materiais e energia, a fim de reduzir os

custos econômicos e os impactos ambientais. Elementos da Ecoeficiência:

• Reduzir o consumo de materiais com bens e serviços; • Reduzir o consumo de energia com bens e serviços; • Reduzir a dispersão de substâncias tóxicas;

• Intensificar a reciclagem de materiais; • Maximizar o uso sustentável de recursos renováveis; • Prolongar a durabilidade dos produtos;

• Agregar valor aos bens e serviços.

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Inicialmente, era apenas o discurso...

O processo de internalização do conceito de desenvolvimento sustentável não evoluiu da mesma forma em todos os setores industriais e em firmas de todos os portes. Se, nos setores notoriamente poluentes (petroquímico, metalúrgico, papel e celulose) e nas multinacionais, essa prática avançou

mais, deve-se à maior influência dos agentes de pressão anteriormente descritos e à magnitude dos custos associados ao passivo ambiental. Por outro lado, é mais difícil estender uma mudança de forma

homogênea em empresas de grande porte, cuja localização e natureza das operações variam significativamente, com o agravante de que o montante do passivo cresce na proporção dos impactos cumulativos. Assim, as trajetórias em direção à adoção de estratégias ambientalmente sustentáveis

diferem significativamente entre setores e entre empresas. Além disso, o principal obstáculo à adoção da gestão ambiental residia na concepção dominante de

que meio ambiente e lucro eram adversários naturais. Acreditava-se que a implementação da gestão ambiental, além de reduzir lucros, obrigaria a repassar os custos aos consumidores, elevando os preços dos bens negociados. Em grande medida, essa crença devia-se ao fato de o custo da

tecnologia ambiental ser alto em virtude de não estar nem tão disponível, nem tão aperfeiçoada quanto hoje. Contudo, em poucos anos, ficou patente que as tecnologias ambientais tinham um potencial inverso, isto é, reduziam custos através de uma melhor racionalização dos processos

produtivos, particularmente, no uso de insumos e no desperdício. Durante a última década do século passado houve também uma enorme pressão para as empresas

adotarem sistemas de gestão ambiental, de maneira a reduzirem ou eliminarem emissões, efluentes e desperdício nas suas operações, principalmente nas indústrias de petroquímica, papel e celulose,

automotiva e eletrônica. A partir de um modelo de gestão, informações importantes começaram a ser monitoradas e potenciais

ganhos de eficiência mapeados o que permitiu significativa economia de recursos, incrementou a produtividade e a eficiência, resultando em vantagem de custo sobre os competidores. Além disso, a indústria assumiu uma posição mais cooperativa intra e intersetorialmente, induzida pela organização

e compartilhamento de tarefas intrínsecas à gestão ambiental. Apesar de reconhecer que a maturação de novos produtos e processos é lenta, a maioria das

empresas procura em seus programas de gestão ambiental ganhar novos mercados e vantagem competitiva no curto prazo, e ainda existem aquelas que implementam apenas reformas simbólicas e medidas cosméticas (a chamada "lavagem verde") visando responder à legislação ambiental e usá-las

como propaganda institucional. Por essa razão, as empresas sérias procuram se diferenciar das oportunistas. A evidência disso é a

corrida à certificação que agrega valor ao produto representando um selo de confiança no sistema de gestão implementado pela empresa. Os certificados mais procurados são os da série ISO 9000 e ISO 14000 e, mais recentemente, a Norma ISO 26000 foi desenvolvida para tratar de responsabilidade

social (ver tópico a respeito). Administrado pelo Council on Economic Priorities Accreditation Agency (CEPAA), o Social Accountability 8000 (SA 8000) é o primeiro certificado social com reconhecimento

internacional, que verifica, entre outros aspectos, as condições de trabalho em toda a cadeia produtiva, tendo sido motivado pelo crescente clamor popular contra o trabalho infantil.

Os itens verificados na auditoria obrigatória para se candidatar ao SA 8000 são nove: trabalho infantil, trabalho forçado, saúde e segurança, liberdade de associação e direito à negociação coletiva, discriminação, práticas disciplinares, horário de trabalho, remuneração e sistemas de gestão. Mesmo

sendo uma referência em termos de certificação para as condições do trabalho, o número de empresas certificadas é baixo, devido ao elevado custo, mas, também, devido à dificuldade que a empresa encontra em manter um mesmo padrão, considerando a grande diferenciação entre as leis

trabalhistas em cada país. Ainda assim, o Brasil é o quarto país com mais certificados SA 8000,

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perdendo apenas para a Itália, Índia e China, contando, entre suas empresas, a Bahia Sul Celulose e a Avon cosméticos.

Um estudo recente comparou a performance de Companhias abertas que informaram, em seus Relatórios de Informação Anual de 2006 (ano-base 2005), a certificação da ISO 14001 com as

empresas que possuíam algum sistema de monitoramento ambiental e com as empresas que não apresentaram informação relacionada às questões ambientais. As empresas que possuíam certificação ambiental tiveram rentabilidade do ativo, rentabilidade operacional e rendimento do patrimônio líquido

superiores às demais (Grzebieluckas, 2007).

De um modo geral, o contingente de empresas brasileiras certificadas só não é maior porque muitas delas não têm como arcar com os custos da certificação, particularmente as pequenas e médias.

O papel dos gerentes

Inicialmente, a ideia de sustentabilidade passou a ser encarada com seriedade por um número significativo de companhias por iniciativa do seu corpo executivo (Diretores e Gerentes) e, em alguns casos, estimulado pelos próprios acionistas que temem a desvalorização das ações devido aos

escândalos corporativos. A tradição da teoria do gerenciamento em atribuir aos Gerentes, em especial ao top management, a

maior parcela de responsabilidade pela construção das competências centrais da firma deve-se ao fato de o Gerente personificar, dentro da empresa, a sociedade ampliada, de vê-lo como um indivíduo iluminado no sentido de ser o que melhor conhece a firma e seus ambientes (o mercado, o setor, os

consumidores). Prahalad e Hamel (1990) atribuem ao Gerente o papel de criar condições para que as informações da sociedade fluam para dentro da firma e que, para ela, sejam devolvidas através da compreensão compartilhada por técnicos, engenheiros, pessoal de marketing, vendedores etc., das

necessidades dos consumidores e das oportunidades tecnológicas. Garantindo isso, os gerentes seniores estimulam a participação e a criatividade nos empregados e gerentes de todos níveis,

levando-os a procurar respostas às expectativas e às necessidades da sociedade. 6 Como salientou Schmidheiny (1996), a crença de que maximizar retornos aos acionistas impõe ao executivo a adoção de estratégias pontuais e imediatistas, negligenciando investimentos de

maturação longa, não é de todo verdadeira, uma vez que os acionistas procuram obter retorno futuro de seus investimentos na mesma proporção em que anseiam por rendimentos no presente.

1.4. Do berço-ao-túmulo... começa a fase prática

A maneira linear, geralmente empregada para conceber o ciclo de vida de um produto – produção, utilização e descarte – é entendida como “do berço ao túmulo” (cradle to grave) já que, ao final, o produto e seus componentes e materiais não terão serventia. Um grande problema causado por esse

tipo de ciclo de vida é que os produtos, em geral, apresentam componentes de difícil decomposição ou altamente tóxicos sem que se dê solução adequada para degradá-los quando descartados. O

conceito do “berço ao berço” – cradle to cradle – busca resgatar o princípio cíclico da natureza, em que dejetos servem de alimento: assim, um produto deveria ser criado para, ao final de seu uso, ter condições de ser reutilizado com suas propriedades inalteradas no metabolismo tecnológico, ou de

voltar à natureza não como poluente, mas, como nutriente. Nesse contexto, a mudança de paradigma traz importantes consequências e avanços no

desenvolvimento de produtos, pois, em relação às questões ambientais, geralmente se pensa em ser

6 PRAHALAD, C.K., HAMEL, G. "The core competence of the corporation". Harvard Business Review, Harvard, v. 68, n. 3, May-June 1990. p. 81

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menos poluente, menos prejudicial, ou em atingir aos índices estipulados pela legislação reguladora. Seguindo o pensamento “berço ao berço”, a orientação é pensar em como um produto possa ser

melhor, agregar mais valor ao meio ambiente ao longo do uso e em seu posterior descarte. Além disso, a discussão sobre o uso responsável de recursos contraria a excessiva substituição de produtos e ciclos de vida cada vez mais curtos, muitas vezes incentivados na sociedade de consumo e tomados

como estratégia empresarial. Parte-se então, para a implementação do consumo sustentável, o qual envolve considerar o meio ambiente como fator decisivo desde a aquisição, ao longo do uso e no descarte de produtos (CARISIO DE PAULA, 2007).

Mudanças na forma de desenvolver e de produzir produtos podem ser influenciadas por restrições

impostas por legislações ou certificações como a ISO 14000, porém a aplicação de um novo paradigma, como no caso do conceito “berço ao berço”, é uma transformação bem mais profunda. McDonough & Braungart, a partir da sua experiência no trabalho com empresas, relatam no livro

Cradle to Cradle (2002) cinco estágios pelos quais passam as organizações que procuram atuar com responsabilidade ambiental, a saber:

I. primeiro estágio: é a busca por um produto livre de substâncias reconhecidas pelo grande público como perigosas ou mesmo práticas mal vistas;

II. segundo estágio: quando a empresa pode e faz questão de deixar claro aos clientes as propriedades e os processos envolvidos na produção de seus produtos;

III. terceiro estágio: é trabalhar na criação de uma lista das substâncias saudáveis a serem adotadas, tomando uma posição realmente pró-ativa e realizando assim uma lista positiva. As análises realizadas neste estágio podem envolver conceitos abordados pelo Sistema de Gerenciamento

Ambiental (SGA), estabelecido na norma britânica BS 7750 e pela Avaliação de Desempenho Ambiental (ADA). Partir da análise desses critérios, para guiar etapas de projeto e produção, preconiza-se uma transformação real;

IV. quarto estágio: buscar ciclos tecnológico e biológico mais salutares, pondo em prática a lista

positiva. Faz parte dessa busca um maior contato com grupos de pesquisa e, para tanto, faz-se necessária uma aproximação de pesquisadores e profissionais que atuem no desenvolvimento de produtos. A partir desse estágio, podem-se relacionar práticas de ecodesign de projeto verde, no qual

o processo de projeto trata atributos ambientais como objetivos e não restrições, buscando incorporar esses objetivos com o menor custo ao desempenho do produto, sua vida útil ou sua funcionalidade;

V. quinto estágio: prevê reinventar conceitos, fazer produtos que, além de não serem prejudiciais ao meio ambiente, contribuam para a sua melhoria durante e após sua vida útil, que limpem o ar ou fertilizem o solo, tudo associado à reflexão sobre a infraestrutura necessária ao uso do produto. 7

7 CARÍSIO DE PAULA. A Gestão e Sustentabilidade no Processo de Desenvolvimento de Produtos. IX ENGEMA, Curitiba. Nov. 2007

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Capitalismo Natural (visão do The Natural Step)

Ao longo da década de 1990, uma série de outras abordagens surgiu para tratar de vários níveis de

planejamento dentro do contexto de mudança em direção à sustentabilidade. De forma notável, o

trabalho recente sobre “capitalismo natural” amplia a ideia de ecoeficiência e ecologia industrial,

apresentando estratégias específicas para “reduzir o dano ambiental, criar crescimento econômico e

aumentar o emprego significativo” (LOVINS et al. 2000). Mais especificamente, o Capitalismo natural

requer quatro mudanças iterativas nas empresas e organizações da sociedade.

A primeira estratégia, promover um “aumento radical na produtividade de recursos”, está totalmente

alinhada com os objetivos da ecoeficiência. Dessa forma, dentro do contexto da teoria do Capitalismo

natural, um trabalho fortemente focado no aumento da ecoeficiência, pode ser compreendido como

um passo inicial no sentido de mudanças de alcance muito maior.

A segunda estratégia, explorar as possibilidades do biomimetismo, repercute em pesquisas e

trabalhos sobre ecologia industrial, com o objetivo de “redesenhar os sistemas industriais sobre linhas

biológicas” para possibilitar a “reutilização constante de materiais em ciclos fechados contínuos e

frequentemente a eliminação de toxicidade” (LOVINS et al. 2000).

A terceira estratégia é estabelecer uma economia de serviço e fluxo através da criação de sistemas

que assegurem que os bens circulem em vez de serem usados e descartados.

Finalmente, a quarta estratégia se refere ao reinvestimento em sistemas ecológicos de forma a

assegurar que a sociedade “sustente, restaure e expanda os estoques de capital natural” (Hawken et

al. 1999: 10-11). Juntas, essas estratégias oferecem um caminho a ser trilhado em direção à

sustentabilidade.

Uma outra contribuição conceitual à área foi o desenvolvimento do termo “triple bottom line”

(Elkington 1997). Fundamentalmente, o termo questiona o resultado final único (financeiro).

Argumenta-se a importância de se considerarem os custos e o retorno ambiental e social, juntamente

com a contabilidade financeira padrão, para se determinar o resultado final.

Na realidade, todos esses fatores sempre afetaram as empresas, ou seja, todas as empresas

produzem e são afetadas por impactos financeiros, ambientais e sociais em suas operações. Por

exemplo, a relevância dos conceitos de sustentabilidade para os negócios é evidente nos relatórios de

grandes empresas consideradas responsáveis por milhões de dólares em custos para a limpeza de

locais usados por fabricantes contratados que entraram com pedidos de falência (GEMI 2001). Além

disso, esses impactos ficam evidentes no dano à reputação que as empresas sofrem após violações de

direitos humanos ou quando questões ambientais vêm à tona. Portanto, o resultado final único irá

cada vez mais refletir retornos ecológicos e sociais.

Fonte: WAAGE, Sissel. Uma reavaliação dos negócios a partir de uma perspectiva sistêmica. A mudança para

empresas e serviços financeiros pautados na sustentabilidade. SP, Instituto Ethos, Julho de 2004.

1.5. Contribuição da ciência

Os últimos cinco anos foram pródigos em produzir recomendações e soluções de natureza adaptativa, visando enfrentar os efeitos irreversíveis das mudanças climáticas, mas sua efetividade depende do

conhecimento acumulado e da existência de modelos estatísticos confiáveis e historicamente abrangentes de maneira a permitir uma atuação direta sobre seus efeitos. Na maior parte dos países desenvolvidos, esse conhecimento existe e está disponível, porém, em países pobres e em

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desenvolvimento, a produção de informações e de dados sobre indicadores ambientais ou não existem ou são escassos e imprecisos.

No caso brasileiro, apesar de haver instituições de informação estatística reconhecidas internacionalmente, como o IBGE e o IPEA, alguns fatores dificultam a produção confiável desses

dados. Um deles foi ter-se iniciado, tardiamente, a pesquisa básica associada a esses indicadores; outro problema recorrente é o de as instituições brasileiras sofrerem interferência política que resulta em descontinuidade do trabalho de pesquisa. Finalmente, o tamanho e a diversidade biológica do País

impedem uma replicação eficiente de modelos, recursos humanos e investimento em ciência e tecnologia.

Mesmo a Amazônia, que, por sua magnitude e visibilidade internacional, se encontra melhor mapeada, carece de informações básicas sobre seu clima. Não se sabe, por exemplo, o quanto as

chuvas poderão aumentar ou diminuir, porque as modelagens climáticas acompanham apenas a variação da temperatura, mas não a precipitação. Segundo Paulo Moutinho, do IPAM, “o País ainda está mais focado nos mecanismos de mitigação 8, que são fundamentais, mas não sabe como vai lidar

com os impactos de mudanças que são inevitáveis”. Cita, como exemplo, as trágicas consequências da seca de 2005 na Amazônia, que matou cerca de 100 toneladas de peixe no Lago do Rei, próximo a Manaus, e deixou 250 mil famílias sem água para beber (O Estado de São Paulo de 05/12/08,

Suplemento especial Clima em Mudança). Nesse quesito, alguns países europeus, como a França e a Inglaterra, que monitoram o

comportamento do clima há centenas de anos (na Idade Média, o clima era o principal indicador ambiental e orientava todas as etapas do ciclo agrícola) ostentam uma margem de vantagem expressiva para o sucesso de modelos adaptativos.

Enquanto esperam, ou ajudam, aperfeiçoar os modelos estatísticos, investindo pesadamente em pesquisa, para a maior parte das indústrias, é chegada a hora de mostrar concretamente os

resultados da propalada eco-eficiência. Se levar em conta apenas a propaganda, ver-se-á que a maior parte das indústrias está direcionando seu foco para o estágio inicial da trajetória da sustentabilidade:

a implementação dos 3R (reduzir, reutilizar, reciclar).

Inovação

A inovação pode ser classificada em dois tipos: incremental e radical. Inovação incremental é

entendida como a melhoria ou a modernização de um produto, serviço ou processo existente. Já

inovação radical é a invenção (criação) de alguma coisa nova no mundo, rompendo com os métodos e

com as tecnologias já existentes. Por isso, utiliza-se o termo disruptive technology, que enfatiza o

potencial que uma inovação radical tem de transformar um modelo de negócio existente de uma

organização, ou mesmo de um mercado inteiro; uma inovação radical tem o poder de mudar as bases

da competição de um determinado mercado, favorecendo o inovador. Ela pode trazer uma melhor

performance para empresa inovadora com uma sensível redução de custos em médio prazo, dado

que, no curto prazo, as necessidades de investimento são muito altas. Além disso, tem o poder de

alterar profundamente a cadeia de suprimentos ou de valor agregado.

Fonte: CHRISTENSEN, C. M. Innovation Handbook: A road map to disruptive growth, Strategy and Innovation

Collection, Harvard, 2005.

8 Formas de intervenção destinadas a reduzir ou remediar um determinado impacto ambiental.

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Logística Reversa – uma inovação incremental do tipo “berço ao berço” 9

Logística Reversa é um termo bastante geral. No sentido mais amplo, Logística Reversa significa o conjunto das operações relacionadas ao reuso de produtos e materiais. A gestão dessas operações pode ser chamada de “Gestão de Recuperação de Produtos” (Product Recovery Management – PRM).

PRM lida com o cuidado dispensado aos produtos e aos materiais depois do seu uso. Algumas dessas atividades são, até certo ponto, similares às que ocorrem no caso de devoluções internas de itens defeituosos gerados por processos produtivos. No entanto, a Logística Reversa se refere a todas as

atividades logísticas de recolher, desmontar e processar produtos usados, partes de produtos e/ou materiais para garantir uma recuperação sustentável (e benéfica ao meio ambiente).

A Logística Reversa lida com 05 questões básicas: 1. Quais as alternativas que estão disponíveis para recuperar produtos, partes de produtos e

materiais? 2. Quem deve realizar as diversas atividades de recuperação? 3. Como essas atividades devem ser realizadas?

4. É possível integrar as atividades típicas da logística reversa com sistemas de distribuição e de produção clássicos? 5. Quais são os custos e benefícios da logística reversa, do ponto de vista econômico e ambiental?

Tradicionalmente, as empresas de manufatura não se sentiam responsáveis por seus produtos depois do uso pelos clientes. A maior parte dos produtos usados eram jogados fora com consideráveis danos

ao ambiente. Hoje em dia, consumidores e autoridades esperam que os fabricantes reduzam o lixo gerado por seus produtos. Isso aumentou a atenção com o gerenciamento de resíduos. Recentemente, devido a novas leis de gerenciamento de resíduos, a ênfase se voltou à recuperação,

devido aos altos custos e aos impactos ambientais do descarte. As principais razões para aderir à logística reversa são as seguintes:

1. Leis locais que forçam as empresas a receber de volta seus produtos e cuidar de seu tratamento; 2. Benefícios econômicos de usar produtos devolvidos no processo produtivo, em vez de descartá-los;

3. A crescente consciência ambiental dos consumidores.

Instituto Nacional de Processamento de Embalagens

O Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV) é uma entidade sem fins lucrativos criada para gerir a destinação final de embalagens vazias de agrotóxicos. O instituto foi fundado em 14 de dezembro de 2001, entrou em funcionamento em março de 2002; representa a

indústria fabricante de produtos fitossanitários em sua responsabilidade de conferir a correta destinação final às embalagens vazias desses produtos utilizados na agricultura brasileira. O Instituto foi criado após a instauração da Lei 9.974/00 que disciplina o recolhimento e a destinação final das

embalagens dos produtos fitossanitários. A Lei divide responsabilidades a todos os agentes atuantes na produção agrícola do Brasil, ou seja, agricultores, canais de distribuição, indústria e poder público. O inpEV possui, em seu rol de associados, 99% das empresas fabricantes de defensivos agrícolas do

Brasil e as 7 principais entidades de classe do setor. As empresas fabricantes são associadas como Sócios contribuintes, ou seja, pagam contribuição ao Instituto, possuem direito a voto, participação em cargos eletivos e nas Assembléias Gerais. As entidades de classe são Sócios colaboradores, não

pagam contribuição ao Instituto, mas participam das Assembléias Gerais sem direito a voto. O InpEV adota a Logística Reversa que consiste em disponibilizar o caminhão que leva os agrotóxicos (embalagens cheias) para os distribuidores e para as cooperativas do setor e que voltaria vazio, para

trazer as embalagens vazias (a granel ou compactadas) armazenadas nas unidades de recebimento. Obs: integra o Ranking Benchmarking Ambiental de 2008

9 Fonte: www.fbk.eur.nl/OZ/REVLOG/Introduction.htm

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1.6. Principais Diretrizes, Padrões e Certificações

A normatização é um processo característico de grandes empresas, porque envolve grande investimento financeiro, organizacional e humano, impossíveis de serem reunidos por pequenas

empresas. Ocorre geralmente por pressão da concorrência e das empresas líderes, compradoras ou contratantes de serviços. Muitas vezes, precede a escolha das ferramentas de gestão e das rotinas e procedimentos operacionais, porque, durante o seu processo, conduzem a empresa a exercitar a

análise mais aprofundada sobre seus recursos e objetivos. O primeiro passo do processo de normatização é a realização de um diagnóstico interno, o mais

amplo e abrangente possível. Enquanto esse diagnóstico está sendo elaborado, a empresa, seus dirigentes e seu corpo funcional se engajam num processo reflexivo de autoconhecimento, cujo

resultado pode levar a uma alteração profunda da missão e das estratégias da empresa. Por essa razão, pode-se dizer que as certificações ambientais se inserem na linha evolutiva dos processos de gestão da qualidade total, que se caracterizou por ter elevado as normas a um patamar superior da

boa administração e são, também, parte da estratégia das organizações. Existem dois tipos de normas: aquelas que são publicadas por mecanismos oficiais de normatização,

entre as quais se destacam a ISO 14000 (meio ambiente), a ISO 9000 (qualidade), CEEMAS (ambiental), a BS 8800 (condições dignas de trabalho) e a BS 8855 (ambiental), e as geradas por pressão dos mercados. Citam-se, ainda, a gestão em áreas como segurança e condição do trabalho,

com destaque para a SA 8000 (direitos sociais); a OHSAS 18001 (riscos/acidentes) e a AA 1000 (prestações de contas).

Devido à disseminação da convenção da sustentabilidade, praticamente todas as normas surgidas na última década tratavam do sistema gestão ambiental, em especial as mais recentes, especificadamente a da Responsabilidade Social Empresarial. Antes disso, as empresas passaram pela

fase de publicação do Balanço Social (BS). A primeira versão de um BS surgiu na França, em 1972, quando a empresa Singer divulgou, ao lado do tradicional balanço financeiro, o das suas atividades na

área social. Em 12 de julho de 1977, foi aprovada a Lei 77.769, que tornava obrigatória a realização de Balanços Sociais periódicos para todas as empresas com mais de 700 funcionários.

No Brasil, o Balanço Social foi um marco. Lançado por Betinho, através do Ibase, ONG fundada por ele, em 1997, o BS se propôs a fornecer um selo para as empresas que o publicassem. Além disso, o País foi pioneiro no lançamento de normas técnicas de Responsabilidade Social. As primeiras foram a

da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a NBR 16001, lançada em dezembro de 2004, e a norma ISO 26.000, cuja redação concluiu-se em 2008, embora ainda não esteja oficialmente implementada.

Contudo, o poder dessas normas em conduzir a empresa a um patamar elevado de conversão à sustentabilidade é questionável, já que ambas são voluntárias e não mandatórias. A NBR 16001 é

bem realista em relação a sua influência, advertindo, logo no inicio do texto, que “o atendimento aos requisitos da Norma não significa que a organização é socialmente responsável, mas que possui um sistema da gestão de responsabilidade social.” De fato, trata-se mais de um sistema de gestão

convencional e, até certo ponto, tímido se comparado com a ISO 14000, por exemplo, voltada à gestão ambiental.

Mais desafiante foi a elaboração da norma ISO 26000. Destinada a contemplar todos os aspectos associados à responsabilidade social, o processo gerou muita polêmica e pouco consenso. Estando a

um passo de ser, finalmente, lançada, após quatro anos de trabalho intenso, envolvendo cerca de 300 pessoas e 77 organizações, liderada pela mais importante organização de padronização internacional – a International Organization for Standardization (ISO) –, decidiu-se que a ISO 26000, ao contrário

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da 9000 e da 14000, não seria uma norma de certificação, mas um conjunto de diretrizes e recomendações, à semelhança de tantos outros.

Outra crítica muito frequente no meio empresarial é a de que a maior parte dos selos e certificações na área social e ambiental no Brasil não tem prazo de validade, nem sistema de verificação. Assim,

uma vez conquistados, podem ser usados para sempre pelas empresas, sem que seja necessário se submeter a um processo de avaliação externa para sua renovação. Existem, inclusive, empresas que, mesmo tendo sido vendidas e alterado seu sistema de gestão, não perderam o selo.

O Brasil está entre os quatro países com mais certificações na norma SA 8000 no mundo, após Itália e

China, e alterna o terceiro lugar com Índia; além do mais, tem o maior número de empresas signatárias do Pacto Global, da ONU.10 No caso da SA 8000, a parceria com organizações da sociedade civil é pré-condição para conquistar o selo.

Desde setembro de 2008, dobrou o número de empresas brasileiras citadas no Dow Jones Sustainability Index (DJSI)11, passando de 4 para 8. São elas: Votorantin Papel e Celulose, Usiminas,

Itaú, Bradesco, Petrobras, Itaúsa, Aracruz e Cemig, mantidas na nona revisão anual do índice. Dos países do chamado BRICS12, o Brasil é o único que tem empresa listada no DJSI.

Integrar o DJSI só traz vantagens para a empresa. De acordo com pesquisa da instituição, o segmento de investidores que inclui responsabilidade social entre os itens considerados na hora de investir aumentou em torno de 180%, entre 2003-2005. Fundos que gerenciam mais de quatro

trilhões de dólares também são signatários dos Princípios de Investimentos Responsáveis13 da ONU. O ingresso no DJSI tende a facilitar o acesso da Companhia a esses investidores.

A prática da auto-regulação: o modelo GRI de performance ambiental Entre as mudanças mais significativas assumidas pelas grandes corporações, destacam-se os

relatórios de sustentabilidade e a produção de indicadores e sistemas de avaliação. Entre os indicadores disponíveis, destaca-se o Global Reporting Initiative (GRI), atualmente, o mais adotado

por empresas de todo o mundo. Criado para estabelecer uma base comum para os relatórios voluntários sobre o desempenho

ambiental, econômico e social das empresas, o GRI busca elevar o nível dos relatórios sobre o desenvolvimento sustentável realizados por empresas ao mesmo patamar de credibilidade, comparabilidade e consistência. É a mais bem sucedida dentre essas iniciativas voluntárias auto-

aplicáveis, cujo modelo de relatório de sustentabilidade ganhou tamanha visibilidade e credibilidade que sua eficácia está acima das normas certificáveis e dos padrões gerados no âmbito da competitividade inter-firmas. Tendo por objetivo equiparar os relatórios de sustentabilidade aos

financeiros, a metodologia adotada no acompanhamento das diretrizes e dos indicadores permite comparabilidade, credibilidade, periodicidade e legitimidade da informação. Atualmente, mais de 1000 empresas, sendo 60 delas brasileiras, produzem seus relatórios com base no modelo GRI, que está na

terceira geração (ver BOX 05).

10 Sobre o Pacto Global, ver páginas 43 e 44 desta Apostila. 11 Lançado em 1999, o Dow Jones Sustainability Index é um índice que monitora o desempenho financeiro de empresas consideradas líderes em sustentabilidade. 12 É uma sigla que se refere a Brasil, Rússia, Índia e China, que destacaram-se no cenário mundial pelo rápido crescimento das suas economias em desenvolvimento. 13 Principles for Responsible Investments – iniciativa da ONU que estabelece princípios que norteiam a incorporação de critérios sociais e ambientais nas decisões de investimento.

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BOX 05: GRI – GLOBAL REPORTING INITIATIVE

O que é É a iniciativa que marca a primeira vontade em escala mundial de chegar a um consenso a respeito de uma série de diretrizes de comunicação sobre a responsabilidade social e ambiental das empresas.

Seu objetivo é elevar a qualidade dos relatórios a um nível passível de comparação, consistência e utilidade.

Origem Ferramenta criada pela Global Reporting Initiative (GRI), organização internacional com sede em

Amsterdã, na Holanda, cuja missão é desenvolver e disseminar globalmente diretrizes para a elaboração de relatórios de sustentabilidade. A ideia de estabelecer um padrão global para relatórios não exclusivamente financeiros surgiu em 1997, a partir de uma parceria entre a Coalition for Environmentally Responsible Economy (CERES), instituição não governamental americana composta por organizações ambientais, de trabalhadores, religiosos, profissionais de investimento socialmente responsável e investidores institucionais, e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

(PNUMA). A primeira versão das Diretrizes para Relatórios de Sustentabilidade data de 2000 e foi construída dentro de um processo de engajamento voluntário de diversas partes interessadas: representantes do setor empresarial, ONGs, organizações trabalhistas, investidores institucionais,

ativistas de direitos humanos, firmas de auditoria e consultoria, agências da ONU, entre outras, tornando-se um processo internacional, cuja principal proposta é desenvolver e disseminar globalmente diretrizes e incorporar numerosos indicadores de sustentabilidade para a elaboração de

relatórios de sustentabilidade (Sustainability Reporting Guidelines). As diretrizes se encontram, hoje, na terceira versão, a G3, lançada em outubro de 2006 e já traduzida para o português.

Objetivo A GRI busca estabelecer um padrão internacional de relatório econômico, social e ambiental. O

modelo proposto pela organização determina princípios e estrutura um modelo para relatar, permitindo às organizações a apresentação geral de seu desempenho econômico, social e ambiental. Propicia a comparação com o mercado, já que estabelece padrões (indicadores) e ainda serve como

uma plataforma para facilitar o diálogo e o engajamento de stakeholders. Além das diretrizes globais, a GRI desenvolve diretrizes setoriais (Financeiro, Metais e Mineração, Operadoras de Turismo, Agências Públicas, Automotivas, Telecomunicações, entre outras) e, no futuro, lançará diretrizes

nacionais. A GRI encoraja as empresas a:

• reportar o processo de implementação dos princípios;

• estabelecer metas; • identificar as melhorias alcançadas nos diversos aspectos; • reportar se os objetivos foram ou não atingidos;

• avaliar internamente a consistência entre a política de sustentabilidade corporativa e sua efetiva realização.

Conteúdo A estrutura e o conteúdo são constantemente revisados e atualizados por meio de um processo

participativo envolvendo diferentes setores da sociedade mundial. O documento divide-se em cinco partes: Introdução: tendências que motivam os relatórios de sustentabilidade e os benefícios gerados.

Parte A – utilizando as Diretrizes: instruções gerais sobre o uso das Diretrizes; Parte B – princípios para a Elaboração de Relatórios – princípios e procedimentos que promovem o rigor dos relatórios e que norteiam o uso das Diretrizes;

Parte C – conteúdo do relatório: conteúdo e compilação de um relatório; Parte D – glossário e anexos: orientações e recursos adicionais para usar as Diretrizes.

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A GRI propõe um conjunto de indicadores organizados nas dimensões econômica, ambiental e social,

subdivididos em categorias, aspectos, e em indicadores quantitativos ou qualitativos. A escolha dos indicadores depende das características e prioridades de cada organização e de suas partes

interessadas. Os princípios para a Elaboração de Relatórios de Sustentabilidade são os que seguem: materialidade, inclusão dos stakeholders, contexto da sustentabilidade, abrangência, equilíbrio, comparabilidade,

precisão, periodicidade, clareza, confiabilidade. Há uma versão para pequenas e médias empresas. Entendendo os Princípios

Materialidade - As informações do relatório precisam cobrir temas e indicadores que reflitam os impactos econômicos, sociais e ambientais mais significativos para do setor. Inclusão dos stakeholders - O relatório precisa identificar os principais stakeholders e explicar

como a empresa procedeu frente às suas expectativas e interesses. Contexto da sustentabilidade - O relatório precisa apresentar a performance da empresa frente ao contexto de sustentabilidade.

Abrangência - As questões materiais e indicadores devem refletir os impactos econômicos, sociais e ambientais mais significativos do período de cobertura do relatório. Equilíbrio - O relatório precisa trazer aspectos positivos e negativos da performance da organização

de forma balanceada. Comparabilidade - As informações apresentadas no relatório precisam ser comparáveis para

permitir que os stakeholders avaliem as mudanças ocorridas ao longo do tempo e comparativamente à outras organizações. Precisão - As informações do relatório precisam ser precisas e suficientemente detalhadas para que

os stakeholders possam devidamente avaliar a performance da empresa. Periodicidade - A publicação do relatório deve ocorrer com regularidade e de forma que permita a avaliação dos stakeholders para tomadas de decisão.

Clareza - As informações apresentadas no relatório precisam ser claras e compreensíveis por todos os stakeholders. Confiabilidade - As informações apresentadas no relatório precisam ser rastreáveis e relevantes

frente às questões materiais. Passo-a-passo

As organizações podem utilizar as Diretrizes como referência informal, de maneira progressiva ou, ainda, serem consideradas em três níveis de adesão ao modelo GRI (A, A+, B, B+, C, C+). Cada uma dessas categorias possui uma série de requisitos a serem atendidos.

A classificação em cada um dos Níveis de Aplicação é feita por autoavaliação. O sinal “+” indica que o relatório passou por um processo de verificação externa.

Para cada um dos níveis, a GRI criou um ícone a ser inserido no relatório, além daquele que informa que o relatório foi examinado pela própria GRI. Essa análise da GRI se atém apenas aos itens de divulgação, e não ao conteúdo do relatório, não tendo fins de verificação.

A GRI entende que a elaboração de um quadro de referência, para prestação de contas econômico, social e ambiental constitui um trabalho de longo prazo, qualquer que seja o seu nível de experiência na matéria.

Pontos fracos dos relatórios de sustentabilidade

A pesquisa realizada pela SustainAbility, Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) e PNUMA, ordenou dez relatórios de sustentabilidade de empresas brasileiras, utilizando uma metodologia de pontuação padronizada. A pontuação dos relatórios na pesquisa variou desde a

máxima de 54% (Natura) até a mínima de 35% (Banco Itaú), com média de 47%. Tais resultados podem ser comparados aos da pesquisa global de 2006, na qual a pontuação máxima foi de 80% (British Telecom) e a mínima de 39% (Telus), ficando a média em 57%. Os 10 relatórios brasileiros

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que estão na liderança são por ordem decrescente: Natura, Suzano Petroquímica, Ampla, Coelce, Banco Real, Energias do Brasil, Sabesp, Bunge, Celulose Irani e Banco Itaú.

Os documentos analisados na pesquisa Rumo à Credibilidade indicam a necessidade de aprofundar o valor estratégico dos relatórios, demonstrando como a sustentabilidade permeia os negócios. Entre as

falhas encontradas, cabe destacar a ausência de: governança - liderança do Conselho de Administração e estruturas de governança para cumprir as

metas da sustentabilidade;

materialidade - métodos utilizados para identificar e priorizar questões materiais, de modo a auxiliar a focar os relatórios nos assuntos prioritários;

metas - metas específicas, mensuráveis e comparáveis (no lugar de declarações de intenções apenas);

conteúdo equilibrado - abordagem de desafios e falhas, expondo as notícias ruins ou problemáticas em conjunto com as boas;

engajamento das partes interessadas (stakeholders) - a manifestação das partes interessadas, tais como especialistas, comunidades e ONGs;

utilização dos websites - utilização da mídia on-line ou demais ferramentas de comunicação para aperfeiçoar e aprofundar o conteúdo dos relatórios impressos.14

Revisão do conteúdo A Unidade 1 tratou principalmente do contexto histórico que articula os dois fenômenos; dos fatores impulsionadores deste movimento no mundo e no Brasil, em particular; e ofereceu elementos para você avaliar o estágio em que se encontra sua organização neste processo. Entre as principais

conclusões, podemos afirmar que o surgimento de novas convenções (desenvolvimento sustentável e responsabilidade social empresarial) muda o padrão de concorrência, obrigando as empresas a se adaptarem, definindo novas estratégias comerciais e buscando adquirir competência na gestão

socioambiental. As parcerias, a transparência nas informações, e a adoção de novas atitudes impactam diretamente a cultura corporativa. Com isso, a visão da sociedade sobre o papel e as responsabilidades do empresariado também muda, abrindo caminho para o diálogo entre

stakeholders. Questões para refletir/responder:

O que caracteriza o desenvolvimento sustentável?

O que é eco-eficiência? Quais as vantagens da certificação?

Atividades: Selecione uma empresa que possui política de responsabilidade socioambiental e avalie se suas

práticas estão de acordo com os princípios da eco-eficiência e da responsabilidade social, e com os passos recomendados pelo GRI (Global Reporting Initiative).

14 SustainAbility, FBDS, PNUMA Rumo à Credibilidade. Global Reporters, 2008

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Unidade 2 A Responsabilidade Social Empresarial (RSE) Emerge

Objetivos Nesta Unidade, trataremos do contexto que gerou o movimento da RSE, explicando sua relação com o

desenvolvimento sustentável, no Brasil e no mundo; apresentaremos as instituições que nasceram com o objetivo de orientar as empresas a adotarem uma atitude mais responsável perante a sociedade, indicando como fazer, com destaque para o Instituto Ethos de Responsabilidade Social e o

Protocolo de Quioto. Ao final da leitura, você conhecerá as principais instituições e suas idéias, e estará apto a definir conceitos, como Governança Corporativa, e entender as vantagens para a

empresa quando adota práticas responsáveis. No Brasil, o movimento de valorização da Responsabilidade Social Empresarial (RSE) ganhou forte

impulso na década de 90, por meio da ação de entidades não governamentais, institutos de pesquisa e empresas sensibilizadas com a questão. O trabalho do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) na promoção do Balanço Social (BS) constituiu-se em uma de suas expressões e

alcançou grande repercussão. O modelo de BS do IBASE foi o mais utilizado pelas empresas até recentemente, tendo sido cancelado pela própria entidade, em 2010, sob o argumento de que seu uso já está suficientemente disseminado.15

A obtenção de certificados de padrão de qualidade e de adequação ambiental, como as normas ISO, por centenas de empresas brasileiras, também é outro símbolo dos avanços que têm sido obtidos em

alguns aspectos importantes da responsabilidade social empresarial. As enormes carências e desigualdades sociais existentes no País dão à responsabilidade social

empresarial relevância ainda maior. A sociedade brasileira espera que as empresas cumpram um novo papel no processo de desenvolvimento: sejam agentes de uma nova cultura, sejam atores de

mudança social, sejam construtores de uma sociedade melhor.

2.1. Campo institucional da RSE: O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social

Numérica e qualitativamente, o campo institucional no qual se movimenta o setor privado cresceu e tornou-se enormemente complexo ao incorporar a visão da Responsabilidade Social Empresarial. Ao lado do espantoso crescimento das parcerias entre empresas e ONGs, proliferaram as fundações, os

institutos criados e geridos pelas grandes empresas e as entidades que representavam interesses setoriais voltadas, exclusivamente, a intermediar a relação entre o empresariado e os demais grupos sociais.

Criado em 1998, o Instituto Ethos de Responsabilidade Social foi um ótimo sinalizador dessa

tendência por seu pioneirismo e pela legitimidade conquistada ao longo de uma década de atuação. Segundo esse Instituto, o termo "responsabilidade social" pressupõe uma forma de conduzir os

15

Em mensagem disponibilizada no site, o IBASE anuncia o fim do modelo de Balanço Social: “A partir de 2010 o Ibase não

mais atualizará seu modelo de Balanço Social. Após 13 anos buscando a transparência das empresas por meio do balanço social, entendemos que esta ferramenta e esta metodologia já se encontram amplamente difundidas entre empresas, consultorias e institutos que promovem a responsabilidade social corporativa no Brasil. Praticamente todas as empresas

brasileiras já realizam algum tipo de balanço ou relatório social anualmente. Neste sentido, avaliamos que a nossa missão foi cumprida – e com êxito. Cabe agora às empresas aprofundarem suas experiências nessa área e melhorarem, continuamente, seus indicadores”. Fonte:www.balancosocial.org.br. Acessado em 23-08-2010.

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negócios da empresa em parceira, compartilhando responsabilidades com todos os segmentos sociais. Sendo uma instituição sem fins lucrativos, o Ethos visa mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a

gerirem seus negócios de forma socialmente responsável, de maneira a contribuir para a construção de uma sociedade ambientalmente mais sustentável e economicamente justa.

Na concepção do Ethos, RSE é “a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos

ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais” e a empresa socialmente responsável será aquela que “possui a

capacidade de ouvir os interesses de representantes das diferentes partes (acionistas, funcionários, prestadores de serviço, fornecedores, consumidores, comunidade, governo e meio ambiente) e consegue incorporá-los no planejamento de suas atividades, buscando atender às demandas de todos

e não apenas dos acionistas ou proprietários.” (site Ethos, 2010) A atual geração de executivos deve estar capacitada a lidar com todo tipo de stakeholder,16 e

familiarizada com conceitos, até recentemente restritos ao mundo das entidades do chamado Terceiro Setor. Para apoiar essas novas atribuições, são criadas metodologias e ferramentas de gestão social. No relatório de 2005, o Ethos reconhece a existência de diversas novas organizações e ferramentas

correlatas, tais como o GRI, a SA 8000, da ONG Accountability, além de declarar sua adesão a diretrizes do Pacto Global, lançado pela ONU, e aos Objetivos do Milênio.

BOX 06: Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social

O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social é uma organização não governamental

criada com a missão de mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerirem seus negócios de forma socialmente responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade sustentável e justa. Seus 1124 associados – empresas de diferentes setores e portes – têm faturamento anual

correspondente a cerca de 30% do PIB brasileiro e empregam perto de 01 milhão de pessoas, tendo como característica principal o interesse em estabelecer padrões éticos de relacionamento com funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, acionistas, poder público e com o meio ambiente.

Idealizado por empresários e executivos oriundos do setor privado, o Instituto Ethos é um pólo de organização de conhecimento, troca de experiências e desenvolvimento de ferramentas que auxiliam as empresas a analisar suas práticas de gestão e aprofundar seus compromissos com a

responsabilidade corporativa. É hoje uma referência internacional no assunto e desenvolve projetos em parceria com diversas entidades no mundo todo.

O Instituto atua em cinco áreas: 1. de ampliação do movimento de Responsabilidade Social Empresarial (RSE);

2. de aprofundamento de práticas em RSE; 3. de influência sobre mercados e seus atores mais importantes no sentido de criar um ambiente favorável à prática da RSE;

4. de articulação do movimento de RSE com políticas públicas;

16

Um stakeholder é qualquer pessoa que tenha interesse no que a companhia faz, independentemente de estar diretamente

vinculado a ela; stakeholder é também qualquer pessoa que influencie, direta ou indiretamente, a Companhia, ou que possa vir a afetar suas operações. Na concepção moderna, considera-se como potenciais stakeholders todas as pessoas que habitam, trabalham, atuam institucionalmente, ou tenham propriedades, na área de influência do empreendimento, embora seja possível

diferenciar os chamados stakeholders primários (mais influentes) dos secundários. Quanto maior a presença geográfica e econômica da empresa, maior o número de pessoas que podem, legitimamente, reivindicar a posição de stakeholder, estendendo-se, por conseguinte, a responsabilidade da empresa a eles.

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5. de produção de informação sobre RSE.

Os Indicadores Ethos - compõem um instrumento de diagnóstico sobre a situação específica da

empresa, indicando o grau de efetivação da responsabilidade social em suas atividades. Trata-se, portanto, de uma ferramenta de gestão e de planejamento que indica prospectivamente – a partir da situação da empresa – políticas e ações voltadas para o aprofundamento de seus compromissos

sociais. Os indicadores referem-se aos seguintes temas: Valores e Transparência; Comunidade Interna; Meio Ambiente; Fornecedores; Consumidores; Comunidade; Governo e Sociedade. Fonte: Instituto Ethos. Sítio na Internet. Acessado em 02.08.2010

2.2. O relacionamento com o Terceiro Setor Na Holanda e no Canadá, países com os índices mundialmente mais baixos de poluição ambiental, pesquisas realizadas no início da década de 90 apontavam que os principais agentes impulsionadores

da adoção da gestão ambiental foram, em primeiro lugar, as regulações governamentais e, secundariamente, a vontade dos consumidores. As organizações ambientalistas não exerciam, ainda, influência decisiva como fonte de pressão.

As mesmas pesquisas levantaram as percepções dos agentes para a segunda metade da década. Concluíram, então, que as tendências apontavam para a generalização e o aprofundamento da gestão

ambiental, mas indicavam, também, a progressiva pressão que as ONGs viriam a exercer. Ao apontar uma gama diferenciada de potenciais riscos ambientais, essas organizações contribuiriam para tornar complexo o Plano de Gestão Ambiental e forçar medidas mais avançadas por parte das empresas.

No Brasil, sua influência não tem sido menor. Em recente pesquisa realizada pelo Instituto Ethos com mais de mil consumidores, o apoio a projetos comunitários e a entidades sem fins lucrativos foi

apontado como um importante requisito na avaliação da empresa: 59% dos entrevistados acreditavam que essas práticas são referência de comportamento empresarial ético.

Esses resultados demonstraram que o bom desempenho da política de comunicação social da empresa seria um fator essencial na manutenção de posição competitiva. Atender às expectativas da

sociedade não era considerado parte da responsabilidade da empresa até o momento em que as ONGs começaram a pressionar por mudanças mais profundas.

Hoje, esse relacionamento está mais maduro: as ONGs são encaradas pelo setor produtivo com mais seriedade, sua função social é respeitada e suas habilidades específicas são reconhecidas. Por conseguinte, observa-se uma tendência cada vez mais acentuada de flexibilização de um discurso

anticorporativo por parte das organizações do Terceiro Setor. As empresas respondem definindo metas para a redução de emissões, criando departamentos especialmente voltados ao meio ambiente e as relações corporativas, apoiando diretamente as ONGs, e até criando suas próprias organizações

sem fins lucrativos e fundações, destinadas a gerenciar seus investimentos em projetos sociais. Os primeiros embates travados com as ONGs dirigiram-se às multinacionais que operavam em regiões

economicamente pobres mas ricas em fontes energéticas e em biodiversidade. A poderosa organização não governamental Greenpeace foi uma das pioneiras. Fundada em 1971, no Canadá, a entidade notabilizou-se por organizar duras campanhas contra as multinacionais responsáveis por

danos ambientais. Seu estatuto proíbe receber doação de empresas ou Governos, e sua arma é a denúncia pública e a mobilização popular através da panfletagem, realizada por um exército de 3

milhões de voluntários, espalhados por 29 países.

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O Greenpeace instalou-se no Brasil por ocasião da Conferência do Rio, em 1992, e seu primeiro ato foi fincar 800 cruzes brancas em frente à Usina de Angra I. A entidade atua, principalmente, em

defesa da Floresta Amazônica e na campanha contra o programa nuclear brasileiro. A experiência adquirida ao longo da última década levou a entidade a propor, em 2002, o que

chamou de Princípios de Bhopal sobre Responsabilidade Corporativa. Trata-se de um conjunto de dez princípios sugerindo medidas que leve as empresas a agirem com mais responsabilidade, segundo os acordos firmados durante a Conferência realizada no Rio de Janeiro.

Na visão do Greenpeace, as iniciativas voluntárias das empresas no que respeita ao desenvolvimento

sustentável, como a Global Reporting Initiative (GRI),* entidade sem fins lucrativos que reúne sugestões para aperfeiçoar os relatórios de sustentabilidade ambiental das empresas, as diretrizes da Organization for Economic Co-operation and Development (OECD) e o Global Compact – iniciativa do

Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, visando à adesão voluntária das empresas a nove princípios relacionados aos direitos humanos e ao meio ambiente –, demonstraram ser insuficientes e ineficazes.

A entidade defende a criação de instrumentos legais de controle de âmbito internacional, definindo direitos e deveres das corporações, e os respectivos monitoramento e verificação dos

comportamentos corporativos (ver Box 07). Caberia às empresas arcar com todos os custos de compensação por danos e disponibilizar todas as informações aos interessados.

BOX 07: Greenpeace – Princípios de Bophal e Responsabilidade Social Corporativa.

Princípio n. 2: ampliar a responsabilidade corporativa. As corporações devem ser responsabilizadas independente de culpa por todo e qualquer dano advindo

de quaisquer de suas atividades que causem danos ao meio-ambiente, a propriedades ou pessoas, incluindo remediação do local atingido. As matrizes, bem como as subsidiárias e empresas locais afiliadas, devem ser responsáveis pela compensação e pela restituição. A responsabilidade das

corporações por seus produtos deve se estender por todo o ciclo de vida do produto, desde a produção até a disposição final. Os Estados devem responsabilizar diretores e representantes das corporações, enquanto pessoa física, pelas ações ou omissões das empresas que representam,

incluindo as ocorridas nas subsidiárias. (Greenpeace, 2003)

2.3. Ambientalismo Empresarial: podem as corporações administrar o mundo?

Com esse título provocativo, David Korten escreveu um dos mais contundentes manifestos contra o crescente poder das multinacionais, no qual questiona se “Podem as grandes corporações liderar a mudança no padrão de desenvolvimento econômico hegemônico em direção ao desenvolvimento

sustentável? Podem intervir no rumo das políticas de sustentabilidade ambiental em escala nacional e internacional?”

Ao longo do processo de consolidação da gestão ambiental, cresceu e ganhou projeção internacional uma vertente do pensamento empresarial preocupada em compreender a relação entre Meio Ambiente e Desenvolvimento, vertente a que se denominou de ambientalismo empresarial. Segundo seus adeptos, essa relação deve desenvolver-se de forma lenta e gradual, viabilizada através

de instrumentos econômicos e políticos convencionais de maneira a não perturbar, abruptamente, o funcionamento do mercado. A Economia Ambiental, de base neoclássica, se insere nessa perspectiva.

Apesar de as origens do ambientalismo empresarial ocidental remontarem há mais de duas décadas e de suas concepções básicas terem sido construídas a partir da Conferência de Estocolmo, de 1972, o

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seu marco histórico ocorreu durante a preparação da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Eco-92), realizada no Rio de Janeiro, em junho de 1992.

Essa conferência representou a culminância de um processo de discussão, registrando incontáveis manifestações a favor da sustentabilidade ambiental, partindo das mais diversas áreas de

conhecimento, seja na forma de publicações acadêmicas, seja em material de cunho mais panfletário e político. A partir daí, soaram mais fortemente os alarmes anunciando o estado terminal de um modelo de desenvolvimento que cresceu em choque com a dinâmica da natureza.

A rápida disseminação dos resultados da Eco-92 gerou uma inquietação generalizada ao redor do

mundo, forçando o setor produtivo a dar uma resposta consistente ao problema, em grande medida, por ele criado. Resultou desse processo a internacionalização do Business Council for Sustainable Development (BCSD), ao qual foi acrescentado o adjetivo World (“mundial”). Desde então, o WBCSD

destacou-se como a mais representativa entidade empresarial dedicada à causa do desenvolvimento sustentável baseado na eco-eficiência. Atualmente, a organização é uma coalizão de 165 empresas de presença internacional, distribuídas entre vinte setores econômicos e está presente em mais de 30

países, além de uma rede formada por 43 conselhos nacionais ou regionais, espalhados por 39 países. No Brasil, a adesão do empresariado nacional à eco-eficiência começou alguns anos mais tarde, tendo

sido impulsionada pela criação, em 1997, do Conselho Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentával (CEBDS), representação brasileira do WBCSD. A entidade representa 60 grandes grupos empresariais, que respondem por mais de 30% do PIB nacional e que representam aproximadamente

450 unidades produtivas das mais variadas atividades produtivas. À época, as ideias do BCSD e de seu fundador, Stephan Schmidheiny, foram apresentadas no livro

sugestivamente intitulado, Mudando o Rumo (Changing Course). Essa publicação foi considerada um marco na história empresarial, pois representou a primeira resposta consistente e unificada da comunidade de negócios à causa ambiental. Nele, o autor apresentou um projeto de transformação

econômica global no qual as empresas são os protagonistas e o mercado, o seu sinalizador. Apontou as competências que o setor privado possuía para gerenciar essa mudança, mas, praticamente,

colocou em polos opostos empresa e Governo, o que contrariava interpretações que defendiam enfaticamente relações sinérgicas entre esses atores.

Quatro anos depois, em 1996, Schmidheiny lançou um novo livro – Financing Changei/. – em parceria com Frederico Zorraquin. Dirigido a um outro momento, a meta, então, era atrair a comunidade financeira para o modelo de desenvolvimento sustentável, sob o argumento de que, até o momento,

apenas as grandes corporações industriais teriam atingindo a maturidade no tocante à questão ambiental, enquanto as pequenas e as médias empresas e, principalmente, os bancos, estariam no estágio inicial de debate da questão.

Protocolo de Quioto

Um dos problemas ambientais mais preocupantes deste século é o aquecimento global. Sendo causado pela intensificação do efeito estufa, provoca o derretimento das geleiras, aumenta o nível do mar e a desertificação, alterando o suprimento de água doce e agravando os eventos climáticos

extremos. Essa intensificação, por sua vez, ocorre pelo aumento da concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, tais como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O),

oriundos, principalmente, da queima de combustíveis fósseis (petróleo e carvão mineral), lixões, aterros sanitários, processos industriais e atividades agropastoris.

Na busca de soluções para a questão climática, foi criada, na Rio-92, a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), com o objetivo principal de estabelecer ações que

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levassem à estabilização da concentração de GEE na atmosfera, em níveis adequados para o clima do Planeta.

Durante a conferência do Rio, ficou estabelecido que os países signatários da CQNUMC se reuniriam anualmente em busca de soluções para a questão climática. Esses encontros foram denominados

Conferências das Partes (COP). Dos encontros já realizados, convém destacar a COP 03, ocorrida em Quioto, Japão, em 1997, quando

foi lançado o Protocolo de Quioto, que estabeleceu metas de redução de emissão de GEE para os países que, historicamente, contribuíram de forma mais intensa para o aumento da concentração

atmosférica de GEE, em função do seu nível de industrialização (denominados, no Protocolo, como Partes Anexo I) 17. Essas metas deveriam ser atingidas entre 2008 e 2012, produzindo uma redução, em média, de 5,2% nas emissões em relação aos níveis verificados no ano de 1990. Contudo, a 15ª

edição, realizada em Copenhagen, entre 07 e 18 de dezembro de 2009, não registrou nenhum avanço em direção às metas estabelecidas em Quioto, entre outros motivos porque o principal poluidor, os EUA, não ratificaram o Protocolo.

O Protocolo de Quioto estabelecera que as metas deveriam ser cumpridas por meio de políticas públicas e regulamentações que limitassem diretamente as emissões. Além das ações de caráter

nacional, os países afetados pelo Protocolo poderiam utilizar algumas alternativas para auxiliá-los no cumprimento de suas metas, chamadas de mecanismos de flexibilização, a saber: Comércio de Emissões; Implementação Conjunta; e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Entre os

mecanismos de flexibilização, o mais importante para o Brasil é o MDL, que viabiliza projetos que reduzam emissões de GEE. Esses projetos geram Reduções Certificadas de Emissões (RCE), denominadas “créditos de carbono”, que podem ser adquiridos por países do Anexo 1 como forma de

cumprir parte de suas metas. Governança Corporativa

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) define Governança Corporativa como “as

práticas e os relacionamentos entre os Acionistas/Cotistas, Conselho de Administração, Diretoria, Auditoria Independente e Conselho Fiscal, com a finalidade de otimizar o desempenho da empresa e facilitar o acesso ao capital.”

A existência de um sistema de Governança Corporativa permite aos acionistas ou cotistas o governo de sua empresa e o efetivo monitoramento da direção executiva. Além disso, exige o respeito aos

direitos legais e morais dos acionistas minoritários por parte dos Diretores e dos acionistas controladores das empresas, a fim de maximizar o valor da empresa para todos.

A Governança Corporativa engloba todas as relações econômicas entre sócios de uma mesma empresa, todas as relações econômicas entre esses sócios e suas empresas e a forma como esses sócios administram as suas empresas; três princípios a norteiam: transparência, equidade e

responsabilidade ou prestação de contas (accountability). Para a prática de uma boa governança corporativa, faz-se necessária a existência de um código de

ética a ser seguido pelos Conselheiros de administração, Diretores executivos, funcionários e, quando

17

O chamado Anexo 1 do Protocolo de Kyoto é composto pelos países ricos que são obrigados a reduzir suas emissões. Países

em desenvolvimento, como Brasil, China e Índia, embora grandes poluidores, participam do acordo, mas não são obrigados a reduzir emissões. O conceito básico acertado para Kyoto é o da ''responsabilidade comum, porém diferenciada'' - o que significa

que todos os países têm responsabilidade no combate ao aquecimento global, porém aqueles que mais contribuíram historicamente para o acúmulo de gases na atmosfera (ou seja, os países industrializados), devem comprometer-se a reduzir suas emissões.

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houver, Conselheiros fiscais. Os agentes da governança corporativa são os acionistas, o conselho de administração, a diretoria, o auditor independente e, quando houver, o conselho fiscal.

Nas empresas privadas e familiares, os acionistas geralmente são os gestores, confundindo em sua pessoa a propriedade e a gestão. Com a profissionalização da gestão imposta pela globalização, as

famílias foram afastadas da administração direta das empresas, e o Conselho de administração colocado entre a propriedade e a gestão com uma ação ativa e independente. Vantagens da Sustentabilidade Corporativa Imagem como Vantagem Competitiva Como decorrência dos fenômenos da globalização, da revolução tecnológica e da informação, os produtos ganharam em qualidade, e os preços são cada vez mais competitivos, ou seja, bom preço e

qualidade já não são diferenciais, mas obrigação. As empresas viram-se compelidas a mudar suas estratégias de negócios, incorporando padrões socioambientais, como forma de desenvolver vantagem competitiva. Dados de pesquisas desenvolvidas no exterior e no Brasil demonstraram que o

consumidor passou a se preocupar mais e mais com a imagem da empresa que está por trás dos produtos que ele compra. Expansão de Mercados Ainda dentro dessa linha de pensamento, o consumidor exige cada vez mais produtos diferenciados. Os produtos sustentáveis ou ambientalmente amigáveis são diferentes e têm um charme adicional por

representarem uma opção saudável e politicamente correta. O culto ao corpo e a preocupação com uma vida mais saudável estiveram presentes na ideologia dos anos 90.

Algumas pesquisas também têm detectado nas pessoas uma grande vontade de cooperar de alguma forma para a melhoria das condições de vida dos seus semelhantes. O consumo consciente de produtos que direta ou indiretamente trazem benefícios socioambientais para as comunidades é uma

maneira de suprir essa demanda. Resumindo, se qualidade e preço são praticamente iguais, “vou comprar um produto que me faça bem ou à comunidade que me cerca”. Surge, então, a oportunidade

de exploração de novos mercados: atividades que aliam lucratividade e benefícios para o meio-ambiente, como a agricultura e a pecuária orgânicas, tecnologias limpas, energia renovável, negócios florestais.

Aumento de produtividade Uma ação socioambientalmente correta pode ser uma poderosa ferramenta de gestão. As empresas

que mudaram a sua gestão tradicional para uma baseada em valores socialmente responsáveis adotando políticas internas, como: incentivo ao trabalho voluntário, política de participação nos lucros, programas de treinamento e capacitação registraram ganhos significativos em produtividade

proporcionados pela motivação das equipes em todos os níveis da empresa. As práticas de responsabilidade social e desenvolvimento sustentável conseguiram criar um senso de união em torno de um mesmo ideal, fazendo com que funcionários de níveis diferentes trabalhassem por uma mesma

causa: o bem da humanidade. Parcerias Valiosas

Ao adotar uma política de responsabilidade social, a empresa passa a se preocupar não somente com os interesses dos seus acionistas, mas também com os dos seus stakeholders – os diversos grupos

que podem ter algum interesse direto ou indireto nos seus negócios, isto é, escolas, ONGs, Governo, associações, funcionários, consumidores, fornecedores etc. É importante que eles passem não só a ser consultados, mas também a serem vistos como parceiros potenciais. O bom relacionamento com

os stakeholders permite a identificação e a antecipação de oportunidades além de garantir a reputação e a boa imagem para a empresa, gerando valor.

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Esse diálogo também permite a identificação e a prevenção de conflitos antes mesmo que eles ocorram e a mitigação de riscos, evitando acidentes, boicotes, indenizações e gerando uma economia

que pode chegar a bilhões de dólares. Uma outra vantagem é as empresas socialmente responsáveis costumarem a atrair talentos, que representam capital intelectual. Redução de custos Um conceito muito em voga atualmente e já mencionado no capítulo 1, é o de capitalismo natural (LOVINS & HAWKEN, 2000), que defende a ideia de que uma estratégia de negócios construída com

base no uso mais produtivo dos recursos naturais pode resolver muitos dos problemas ambientais e maximizar os lucros. Esse conceito está baseado em quatro mudanças nas práticas dos negócios

atuais: - Aumentar radicalmente a produtividade dos recursos naturais através do redesign dos

processos e do desenvolvimento de novas tecnologias. Essas duas práticas conseguem aumentar a produtividade em 5, 10 e até 100 vezes, diminuindo a quantidade de matéria-prima utilizada e, consequentemente, gastando menos.

- Mudar para modelos de produção “biologically inspired”. Isso significa reduzir a zero o desperdício. Em um modelo de produção em closed-loop, tudo o que sair deve ou retornar ao

ecossistema em forma de nutriente ou servir como matéria-prima para produção de um outro produto. - Mudar para um modelo de negócios baseado em soluções. Os modelos tradicionais têm como fim a venda dos produtos. Nesse novo modelo, a empresa vende serviços – iluminação em vez de lâmpadas, por exemplo. O valor passa a não estar mais no produto em si, mas na capacidade de a

empresa satisfazer as necessidades do cliente garantindo qualidade, utilidade e performance. - Reinvestir em capital natural. Restaurar. Consiste em sustentar e expandir os ecossistemas para

que eles possam produzir os serviços vitais para a sobrevivência da comunidade (é importante ressaltar que não se conhecem substitutos a nenhum preço e não se pode viver sem eles). As

pressões, nesse sentido, aumentam na medida em que crescem as necessidades do homem, majoram-se os custos para quem destrói os ecossistemas, e os consumidores têm cada vez mais consciência ambiental.

2.4. A Nova fase da RSE e a visão estratégica da sustentabilidade O ano de 2010 ficará marcado pela sucessão de catástrofes naturais associadas aos efeitos das mudanças climáticas. Como já era anunciada pelos mais renomados cientistas, a década se inicia

tendo à frente um novo desafio: buscar formas de adaptação às mudanças provocadas pelos eventos climáticos, sobretudo as que agravarão ainda mais o já elevado nível de pobreza e de degradação ambiental. Nesse contexto, a RSE, tal qual vem sendo praticada, parece modesta diante dos desafios

que se apresentam.

O objetivo desta seção é refletir sobre o novo papel da RSE no dia a dia das empresas, o que reforça o caráter não estático dessa estratégia, que precisa mudar para se adaptar às novas demandas e desafios. Um dos idealizadores da versão que vem sendo denominada Responsabilidade Social

Empresarial 2.0 chama-se Wayne Visser, Professor da Universidade de Cambridge, CEO, e fundador da entidade “CSR International”, ONG inglesa criada em março 2009 para difundir práticas e criar uma rede dos interessados no tema.18

18

www.csrinternational.org

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Para Visser, embora o movimento da RSE tenha evoluído bastante, falhou em seus principais objetivos. Do ponto de vista dos impactos dos negócios na sociedade e no planeta, a RS fracassou no

sentido de evitar suas consequências negativas ou, pelo menos, moderar a extensão e magnitude dos impactos. Ele elencou três causas19: 1) visão de RSE como um incremento e não como uma questão central e estratégica para os negócios; 2) falta de compromisso com as práticas em RSE (mesmo nas

empresas que adotam sistematicamente ações em RSE, o foco principal continua sendo a satisfação dos acionistas e a obsessão pelo retorno financeiro de curto prazo); 3) falta de evidência de que a RSE é “bom para o negócio”. Em outras palavras, a dificuldade de mensurar o retorno financeiro do

investimento em RSE faz com que as empresas não se comprometam com as ações de longo prazo.

Ao fazer uma analogia com a revolução nos meios de comunicação trazida pela internet, fenômeno conhecido como Web 2.0, Visser percebe que a maneira de se olhar e praticar a RSE também passa por essa revolução, em especial pelo aumento no “poder” dos stakeholders (em especial, os

consumidores) fortalecidos pela facilidade de acesso às informações. Hoje, a percepção da sociedade acerca do negócio de uma empresa é fortemente influenciada pelas ferramentas da Internet, entre elas, Blogs, Orkut, Facebook, Twitter. As organizações que se adaptaram a essa forma de comunicação ofereceram uma plataforma de discussão com seus stakeholders, seja um blog, seja uma wiki (para tratar de assuntos específicos), e

procuram participar ativamente das redes de relacionamentos. Através do diálogo rápido e intenso proporcionado pela Web, tornou-se mais visível a importância de engajar os stakeholders nas questões internas de RSE. Sem tal envolvimento, as empresas não chegariam a soluções que

atendessem as suas demandas.20 Importantes características diferenciam a nova fase da RSE. Visser destaca, então, os cinco princípios 21: Conectedness (C) – Conectividade, Scalability (S) – Atingir escala, Responsiveness (R) – Receptividade, Duality (2) – Dualidade e Circularity (0) – Circularidade.

Conectividade: para que a organização tenha sucesso nas práticas socialmente responsáveis, ela deve “quebrar a hegemonia” dos acionistas. A fim de não se prender apenas a esse grupo, é dever da

empresa institucionalizar o relacionamento multistakeholder. O envolvimento de todas as partes interessadas passa a ser de extrema importância para a sobrevivência e reputação de uma organização na conjuntura atual.

Atingir escala: os bons exemplos de RSE raramente possuem um efeito multiplicador das suas práticas. Eles se tornam apenas projetos de sucesso, mas pouco se discute sobre como podem ser

reproduzidos em maior escala. Como os problemas de sustentabilidade, sejam eles relacionados ou ao clima ou à pobreza, manifestam-se em escala global e exigem urgente equacionamento, a solução que não pode ser replicável ou reproduzida tem pouca utilidade. Um bom exemplo é o Grammen

Bank, criado por Muhammad Yunus, após um longo período de fome em Bangladesh. Através de empréstimos e microcréditos oferecidos às mulheres, foi possível transformar um negócio de $74, em 1974, para $2.5 bilhões, em valores atuais, e atender a milhões de famílias, em mais de 50 países.

Receptividade: a RSE requer que a organização se questione sobre sua performance social, isto é, se o seu modelo de negócio é parte da solução ou parte dos problemas que se enfrenta. Esse princípio

também significa dar maior transparência aos negócios, não apenas através de relatórios financeiros, mas, principalmente, pela troca de conhecimento com os seus stakeholders. Dualidade: parte do debate em RSE está focado na polarização do “ser ou não ser”: ou a empresa é socialmente responsável ou não é. Visser argumenta que essa forma de análise falha ao reconhecer

19 Visser,W.(2010). 20 Fawkes, P. (2007) 21 Tradução livre do autor.

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que as questões relacionadas a RSE se manifestam como dilemas e não como simples escolhas de “sim ou não”. Em um mundo complexo e interconectado, as empresas (e os seus críticos) terão de se

tornar mais eficientes na compreensão dos contextos locais e na busca das soluções mais adequadas, aceitando os dois lados de uma determinada visão e não os contrapondo.

Circularidade: outra razão pela qual Visser mostra a deficiência da antiga visão de RSE reside no contexto em que ela se aplica: um sistema econômico global caracterizado por falhas e alto desperdício. Na atual concepção de RSE, as questões de uso e consumo devem ser pensadas de

forma circular, ou seja, os “desperdícios” podem ser reutilizados. É um princípio aplicável à construção de prédios, por exemplo, os quais, assim como árvores, podem produzir mais energia do que

consomem e reutilizarem a água desperdiçada; produtos em decomposição que se transformam no seu oposto, em nutrientes; materiais que, uma vez descartados, são úteis em outros ciclos industriais como matérias primas. A circularidade não se aplica somente ao meio ambiente. As organizações

também devem reciclar suas ações e seu capital humano não apenas através da educação e treinamento.

Em suma, a responsabilidade social não poderá mais ser apresentada como um produto ou serviço de luxo, mas, sim, como uma solução disponível a todos que buscam melhorias na qualidade de vida e nas condições de trabalho. Os indicadores de RSE devem incorporar as várias dimensões da

performance corporativa: social, ética, ambiental e econômica; e construir um ranking mais preciso, similar ao que é feito nas agências de classificação de risco, de maneira a subsidiar a decisão de investimento. O que se busca é mudar a concepção do objetivo-fim de uma organização. O propósito

desta não é ser lucrativa nem servir aos interesses apenas dos acionistas. O seu verdadeiro propósito é servir à sociedade através da provisão de segurança, produtos e serviços de alta qualidade que aumentem o bem-estar social, mas sem destruir os recursos ambientais necessários para o

fornecimento desses bens.

Revisão de conteúdo

A Unidade 2 abordou, entre outros temas, da origem, fundamentos e principais conceitos de RSE, das vantagens para a empresa em adotar as diretrizes da Governança Corporativa, apresentou as características da atual fase da RSE, e conheceu seus principais resultados, mas, também, alguns

pontos críticos do movimento da RSE. Questões para refletir/responder:

1- Quais os principais acontecimentos do movimento da RSE? 2- Quais os objetivos do Instituto Ethos e que ferramentas ele usa?

3- Selecione e explique duas vantagens da Governança Corporativa. 4- Aponte as críticas de Visser e a forma como a RSE vem sendo adotada.

Atividade: Aplique os princípios de Governança Corporativa e as ferramentas do Instituto Ethos para elaborar um

Código de Ética de uma determinada empresa ou um setor.

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Unidade 3 Evolução dos Conceitos e das Práticas da Responsabilidade

Social Empresarial

Objetivos

Os objetivos desta Unidade são: apresentar o panorama contemporâneo, a evolução e as tendências do movimento da Responsabilidade Social Empresarial no Brasil, com ênfase na análise da ferramenta de gestão denominada Diálogo com Stakeholders. Você saberá o que é o Pacto Global; conhecerá os

resultados das pesquisas, e saberá por que os stakeholders (partes interessadas) adquiriram tamanha importância no dia-a-dia das empresas, e como incorporá-los nas suas práticas de gestão.

O tema responsabilidade social das empresas vem sendo amplamente discutido e divulgado pela mídia nos últimos anos. Entre os fatores que explicam a repentina valorização desse assunto está o fato de que, ao assumirem uma responsabilidade mais ampla sobre o conjunto da sociedade, as

empresas suprem necessidades comunitárias que não estavam satisfatoriamente atendidas. O que todos esperam das empresas é uma posição cada vez mais comprometida com o desenvolvimento sustentável do País, envolvendo-se com a proteção do meio ambiente, a redução da pobreza e o

aumento da expectativa de vida da população. Nesse sentido, pode-se afirmar que as ações de responsabilidade social das empresas representam uma das formas de a iniciativa privada atuar com finalidade pública.

3.1. Por que RS tem várias definições? Inicialmente, faz-se pertinente discutir sobre os prós e os contras de se utilizar um conceito único de

RSE. O que se espera de uma organização (não somente uma empresa, mas outras instituições, com ou sem fins lucrativos) é uma posição de comprometimento com o desenvolvimento sustentável, aliada à redução da pobreza e consequentemente, à melhoria da qualidade de vida da população na

sua totalidade, e não apenas de alguns segmentos com os quais a empresa se relaciona. O que se observa é uma variedade de interpretações distintas sobre o termo, embora alguns

equívocos sejam mais notáveis: o primeiro deles é confundir uma ação socialmente responsável com uma prática tipicamente filantrópica; o segundo é hierarquizar os tipos de impactos e seus efeitos distintos sobre as “partes interessadas” (os stakeholders) com as quais a atividade da empresa possui

algum tipo de vínculo.

A futura norma de responsabilidade social espera alcançar uma mudança na cultura (missão e valores) das organizações de forma a internalizar as práticas de RSE nas suas rotinas. Com esse processo de internalização, pressupõe-se a participação de todos os stakeholders e a mudança de

valores que influenciarão a sociedade como um todo. Considerando que se vive num mesmo planeta e em uma sociedade globalizada, os desafios

ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e, juntos, podem forjar soluções inclusivas e replicáveis em grande escala, visando à construção de um mundo mais justo. Superar essa importante etapa é atingir um dos desafios futuros que a Carta da Terra (2000)

apresenta à humanidade nos próximos anos (BOX 08).

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___________________________________________________________________________________

BOX 08: Carta da Terra

“É uma declaração de princípios fundamentais para a construção de uma sociedade global no século XXI, que seja justa, sustentável e pacífica. O documento procura inspirar em todos os povos um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade compartilhada pelo bem-estar da família

humana e do mundo em geral. É uma expressão de esperança e um chamado a contribuir para a criação de uma sociedade global num contexto crítico da História. A visão ética inclusiva do documento reconhece que a proteção ambiental, os direitos humanos, o desenvolvimento humano

equitativo e a paz são interdependentes e inseparáveis. Isso fornece uma nova base de pensamento sobre esses temas e a forma de abordá-los. O resultado é um conceito novo e mais amplo sobre o que constitui uma comunidade sustentável e o próprio desenvolvimento sustentável”.

(ver Anexo 03 – texto completo Carta da Terra). Fonte: http://www.reviverde.org.br/CARTAdaTERRA.pdf. Acessado em 10-05-2010

Uma das definições de RSE mais utilizadas no Brasil é a formulada pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social Empresarial, a saber:

Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento

de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. (Ethos, 2000). Embora o conceito de RSE tenha sido “firmado” no século XX, exemplos de instituições que lutaram pelos interesses dos trabalhadores, da comunidade ou do meio ambiente já ocorriam nos séculos

anteriores. Segundo o relatório da ISO22, no fim do século XVIII, consumidores ingleses deixaram de consumir o açúcar produzido no Caribe, porque provinha de trabalho escravo; em contrapartida, a Companhia das Índias Ocidentais mudou para um fornecedor “não escravocrata” em Bengal.

As maiores evidências da ascensão de práticas socialmente responsáveis ocorrem desde o período

pós-2ª Guerra Mundial. As Nações Unidas, por exemplo, tiveram grande participação na criação de novos princípios de Direitos Humanos. Em 1948, a entidade adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que sustenta que “todo indivíduo tem a responsabilidade de se esforçar pela

promoção do respeito aos direitos individuais e à liberdade” 23. São instrumentos que, embora busquem garantir cidadania universal, funcionam como complementares às leis sociais vigentes de cada país.

O que já se percebia eram interpretações distintas sobre qual o papel da empresa na sociedade e qual a sua responsabilidade com o meio ambiente e com os seus próprios trabalhadores, entre outros

stakeholders. Alguns já defendiam que cabia aos empresários “implementar as políticas, tomar as decisões ou seguir as linhas de ação que sejam desejáveis em torno dos objetivos e dos valores da sociedade”24.

Muito embora essa visão ultrapasse a noção corrente de filantropia baseada apenas na caridade, a visão dominante, pregada pelo economista neoclássico Milton Friedman (1970), era da empresa

essencialmente lucrativa, já que, dessa forma, seria capaz de gerar empregos e pagar salários, além

22 April30, 2004 - ISO Advisory Group on Social Responsibility. Working Report on Social Responsibility. 23 Tradução livre do Relatório April30, 2004 - ISO Advisory Group on Social Responsibility Working Report on Social Responsibility 24 Lourenço e Schröder (2003)

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dos impostos que aumentam o “bem-estar” público. Caso contrário, a empresa estaria lesando seus acionistas, pois estaria transferindo recursos a outros fins que não o de geração de lucro e auto

tributando-se. Atitudes sociais, como o trabalho voluntário, por exemplo, poderiam ser feitas, segundo Friedman, por qualquer pessoa pertencente à organização, desde que não usasse recurso da mesma.

Entre as décadas de 70 e 80, novas questões sobre as obrigações das empresas no âmbito social foram levantadas. Lourenço e Schröder (2003) afirmaram que foi naquela época que a ética empresarial se consolidou como campo de estudo. Foi o período do Governo Nixon nos EUA, do

escândalo Watergate, mas, também, da criação de importantes organizações ambientalistas, entre elas, a World Wildlife Fund (WWF), Amigos da Terra (Friends of the Earth) e o Greenpeace.

O crescimento do número de atores preocupados com a questão da responsabilidade social no mundo já era bem significativo no fim da década de 90, o que contribuiu para a disseminação das questões

éticas e morais nas empresas. Além disso, também se discutia a busca pelo real papel das organizações no sistema capitalista, visto que, paralelo a esse debate, havia também a pressão social por mudanças.

Em janeiro de 1999, ao discursar no Fórum Econômico Mundial (evento anual que ocorre em Davos, na Suíça), o ex-Secretário geral da ONU, Kofi Annan, propôs a ideia de uma parceria entre as Nações

Unidas, ONGs e empresas, denominada Pacto Global (Global Compact). Essa proposta surge no imediato contexto das manifestações antiglobalização que ocorrem em Seattle (EUA), durante encontro da Organização Mundial do Comércio (OMC). Trata-se de um chamado para que as

organizações (não somente as empresariais) adotem e apoiem, em suas respectivas esferas de atuação e de influência, um conjunto de valores relativos aos Direitos Humanos, Condições Trabalhistas, Corrupção e Meio Ambiente. Os dez princípios do Pacto Global constituem-se em25

Direitos Humanos

Princípio 1: Respeitar e proteger os direitos humanos. Princípio 2: Impedir violações de direitos humanos.

Direitos Trabalhistas

Princípio 3: Apoiar a liberdade de associação no trabalho. Princípio 4: Abolir o trabalho forçado. Princípio 5: Abolir o trabalho infantil.

Princípio 6: Eliminar a discriminação no ambiente de trabalho. Proteção ao Meio Ambiente

Princípio 7: Apoiar uma abordagem preventiva aos desafios ambientais. Princípio 8: Promover a responsabilidade ambiental.

Princípio 9: Encorajar tecnologias que não agridam o meio ambiente. Combate à Corrupção

Princípio 10: Lutar contra toda forma de corrupção.

O processo de adesão ao Pacto Global envolve uma série de requisitos que podem ser adotados por empresas, sindicatos, universidades, agências governamentais e entidades da sociedade civil.

25 Adaptado de “Boletim Brasileiro do Pacto Global” (2004)

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Na década seguinte, outras iniciativas também marcaram presença. Em junho de 2000, os Ministros representantes dos países da Organização para Cooperação e Econômica e Desenvolvimento (OCDE)

aprovaram uma nova versão das Diretrizes das Empresas Multinacionais. Essas diretrizes recomendam princípios voluntários e padrões de conduta para a empresa que se pretende responsável, e que esteja de acordo com as leis adotadas em cada país. Em julho de 2001, a

comunidade europeia lançava, em Bruxelas na Bélgica, um “Livro Verde” sobre RSE, com o título Promover um quadro europeu para a responsabilidade social nas empresas. Era um lançamento que visava ampliar o debate sobre formas de implantação de RSE nas empresas, tanto no âmbito europeu

quanto no internacional.

Vale à pena destacar ainda um evento importante, organizado como resposta da sociedade aos efeitos da globalização: o Fórum Social Mundial – que completa dez anos de atuação em 2010 – reúne pessoas de todas as partes do mundo para promover um ambiente democrático de ideias, troca

de experiências e articulação de movimentos entre diversos setores da sociedade. Discutem os direitos humanos, proteção ao meio ambiente, acesso à saúde e à educação, entre outros temas, buscando a “construção de alternativas às políticas neoliberais” 26. Se o número de empresas que

buscam aprimorar suas práticas de responsabilidade social aumenta significativamente, ainda são poucas as que se articulam com outros agentes do mercado e com órgãos do Governo ou organizações da sociedade civil, na busca de parcerias que criem soluções em prol do interesse

coletivo. Em resposta à pressão social por mais transparência, as empresas começaram a publicar os

chamados balanços sociais, demanda antiga do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), liderada por Herbert José de Sousa, o Betinho. Ao divulgar os resultados financeiros realizados na área social, a empresa melhoraria a sua reputação frente à opinião pública e,

provavelmente, a sua rentabilidade, uma vez que os investidores passariam a ter maior segurança com relação ao retorno futuro dos investimentos feitos na empresa.

O Balanço Social foi o primeiro passo para a criação de padrões de relatórios de sustentabilidade, aceitos em nível internacional. Atualmente, o que reúne maior adesão das organizações é o Global Reporting Initiative (GRI), adotado por mais de 400 companhias em cerca de 40 países. A visão contemporânea de RSE caracteriza-se pela implementação de iniciativas que não são impostas

por lei, mas, sim, adotadas voluntariamente pelas organizações como forma de demonstrar seu compromisso com a sociedade. Elas migram de uma posição passiva para uma atitude pró-ativa, buscando comunicar-se com as partes interessadas (stakeholders) e, com isso, abrir novas

oportunidades de negócios. Finalmente, destacam-se alguns fatores que foram chave para a disseminação do conceito atual de RSE:

- o crescente número de organismos internacionais (como a ONU, OIT, por exemplo) que articulam a nível global normas de conduta da sociedade;

- os avanços da globalização, nas áreas de comunicação e tecnologia, que fortaleceram a interação continental, o acompanhamento mais próximo das atividades corporativas e a rápida disseminação das informações a que concerniam tais atividades;

- a crescente presença e participação das multinacionais no comércio de bens e serviços e, portanto,

o seu maior peso por práticas socialmente responsáveis. Tais empresas trabalham em ambientes de costumes, cultura, sociedade, leis (entre outras características nacionais) de diferentes países, e as suas ações precisam se adaptar a esses aspectos também;

26 www.forumsocial.org.br

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- a percepção de valores intangíveis como essenciais aos negócios, em especial a questão da reputação da organização como chave para sua sobrevivência.

Vale à pena destacar esta última característica relativa aos valores intangíveis. Os dados do Gráfico 01 indicam a crescente importância dos ativos intangíveis no ambiente de mercado e permitem constatar

que os componentes intangíveis – tais como conhecimento, informação, criatividade, capacidade de gestão e inovação, imagem da marca e reputação, motivação dos colaboradores etc. – aumentaram, em quase 1.400%, a sua contribuição na avaliação do preço de mercado das empresas, valor que,

sem dúvida, é superior, hoje, ao se terem passados quinze anos do período analisado.

Fonte: Instituto Ethos (julho 2001)

O Brasil é o país da América do Sul que ingressou pioneiramente no movimento da RSE. Segundo

pesquisa recente do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), 96% das companhias com mais de 500 empregados declararam ter política de responsabilidade social e financiar ações sociais. A pesquisa detectou, também, que mais de 70% das firmas dedicam parte de seu tempo e dinheiro a

atividades sociais, independentemente da localização regional. Atualmente, regiões ricas e pobres praticamente equiparam-se no grau de engajamento social das empresas. O Nordeste, por exemplo, cresceu 35% em quatro anos, passando de 55%, em 1999, para 74% em 2003. No Sudeste, esse

incremento foi mais discreto (06%), passando de 67% para 71% no mesmo período. Em Minas Gerais, o índice chegou a 81%.

Segundo o IPEA, as empresas investem R$ 4,7 bilhões por ano em ações comunitárias. À primeira vista, o montante impressiona, mas, na realidade, equivale tão somente a 0,43% do Produto Interno Bruto (PIB) –, a soma de todas as riquezas produzidas no País –, menos do que a verba consumida

pelo maior programa social do Governo, o Bolsa-Família, em 2004 (R$ 5,9 bilhões). A pergunta que se impõe é se essa nova visão de RSE será capaz de gerar soluções para os

problemas globais na velocidade com que eles ocorrem, levando-se em conta que a sustentabilidade pressupõe o equilíbrio entre os três pilares: econômico, social e ambiental, conhecido como Triple Bottom Line27.

27 A expressão Triple Bottom Line foi usada, pela primeira vez, por John Elkington, fundador e presidente do Conselho da organização SustainAbility.

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3.2. Diálogo com Stakeholders

O Diálogo com Stakeholder (ou Partes Interessadas) é uma metodologia de consulta participativa, que identifica e caracteriza o perfil de cada um dos stakeholders da empresa (seja ele individual, seja coletivo), captando a sua percepção e as suas expectativas sobre a empresa, em particular, e sobre a

atividade de exploração, em geral. Essa metodologia é radicalmente distinta da tradicionalmente utilizada pelas empresas de consultoria, em geral, acrítica e ineficaz para identificar pontos sensíveis e focos potenciais de conflito (nesse caso, o termo usado é “partes interessadas”).

No Diálogo, aplicam-se técnicas variadas, entre elas, as utilizadas na metodologia Diagnóstico Rápido

Participativo (DRP), na qual os dados são coletados através de depoimentos orais e jogos dinâmicos, sendo a execução confiada a uma equipe multidisciplinar, orientada para obter, no menor tempo possível, novas informações e hipóteses sobre a comunidade estudada.

Essa metodologia foi desenvolvida na Alemanha, na década de 70, para ser uma alternativa às tradicionais análises sobre a situação social nos países em desenvolvimento, que envolviam coleta

exaustiva de dados e um grande número de pesquisadores, acarretando um aumento substancial dos custos, e do tempo, da pesquisa. Além disso, ao incorporar a consulta direta a indivíduos representativos e técnicas de dinâmica de grupo, fez-se emergir uma série de demandas, expectativas

e problemas não captados através dos canais fixos e formais de comunicação. Durante as dinâmicas coletivas, criam-se oportunidades para a população local colaborar ativamente

não só no levantamento dos dados, mas, também, na construção da análise, aportando, a esta particularidades do sistema e “insights” pessoais suscitados pela dinâmica coletiva.

O programa de consulta sistemática aos stakeholders fornece, assim, um quadro das tendências comportamentais e das possíveis estratégias a serem adotadas pelos diferentes grupos de interesse

face a uma determinada situação. Nesse sentido, constitui-se num instrumento apropriado para captar a dimensão de subjetividade existente em todo e qualquer processo de escolhas e de decisão estratégicas dos atores sociais.

Aplicado em todas as fases do empreendimento, o processo de consulta ocupa-se da identificação dos temas sociais sensíveis associados ao empreendimento e ao desenvolvimento de soluções viáveis,

envolvendo, primeiramente, as comunidades locais e suas lideranças, além das ONGs ambientalistas e dos órgãos governamentais ligados à área ambiental. São os chamados "stakeholders primários". Em seguida, outros segmentos indiretamente afetados, ou interessados, são incorporados, tais como a

comunidade acadêmica (em geral, integram-se como assessores dos grupos mais combativos e de vanguarda), líderes de instituições religiosas, a mídia, e formadores de opinião estrangeiros, particularmente as grandes ONGs ambientalistas, sendo as mais conhecidas, o Greenpeace e a World Wildlife Fund (WWF). O diálogo realiza-se através de comunicação individual direta entre o(s) representante(s) da empresa

e o(s) representante(s) desses grupos, mas, também, pode acontecer em encontros e workshops mediados por facilitadores, além de fóruns informais sugeridos pelos próprios envolvidos. Sendo um

processo que pressupõe a disposição em informar e a comunicação sistemática, é uma forma excelente de interlocutores assimétricos que utilizam os mesmos recursos, apesar de não os compartilharem, adquirirem conhecimento e trocarem informações, pois cada grupo coloca-se ao lado

do outro para ouvir e, se possível, interagir. Para que o diálogo seja eficaz, é necessário que ambos os interlocutores se comprometam com a transparência, transmitindo as informações básicas para se conhecerem e se manterem bem informados sobre o que cada um quer, faz e como pretende agir,

assim como acerca dos resultados que pretendem alcançar no processo de comunicação.

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Diante dessas vantagens, as técnicas de Diálogo com Stakeholders costumam ser adotadas não apenas na comunicação externa da empresa, como, também, na formulação da estratégia

corporativa, que, hoje, passa, necessariamente, por expressar o compromisso da empresa com a sociedade.

Na fase exploratória, pretende-se, com a aplicação dessa ferramenta,

Manter os stakeholders da área de influência permanentemente informados a respeito das operações em curso;

Criar um canal de comunicação permanente entre a empresa e seus stakeholders, construindo um ambiente de confiança entre eles;

Identificar os focos potenciais de conflito para apoiar uma ação estratégica futura;

Buscar o consenso em torno de questões polêmicas surgidas ao longo do processo de diálogo.

Os pressupostos dessa metodologia estão diretamente relacionados aos compromissos assumidos pela empresa em adotar práticas corporativas de responsabilidade social e ambiental. São eles os

seguintes:

O compromisso da empresa em empregar os mais elevados padrões de qualidade técnica e

ambiental, e a prática de diálogo sistemático com os seus stakeholders;

Os stakeholders são considerados informantes privilegiados no processo de monitoramento e avaliação do Plano de Comunicação;

As comunidades locais devem ser encaradas como stakeholders primários28 assim como os órgãos reguladores, fornecedores e contratados, devendo assim ocupar o mesmo patamar de

importância e atenção atribuída a eles;

Ênfase especial deve ser dada ao setor pesqueiro por ser o segmento mais sensível às

atividades de exploração em águas profundas.

Contribuição do diálogo com stakeholders ao gerenciamento do projeto

“O stakeholder approach trata de públicos e indivíduos que podem afetar, direta ou

indiretamente, a organização, e do comportamento gerencial adotado para responder a eles”. (Edward Freeman. Strategic Management: a stakeholder approach, 1984)

Ao servir para identificar e antecipar potenciais crises antes de eclodirem e mapear os temas polêmicos aplicando técnicas de resolução de conflito, essa modalidade de comunicação contribui, decisivamente, para o encaminhamento de soluções negociadas entre as partes. Essa é uma das

razões pelas quais quanto mais cedo tem início o processo de consulta, mais útil ele será para detectar "sinais de perigo" ou algum fator-surpresa capaz de comprometer o empreendimento (por

exemplo, a existência de uma campanha para sabotar um projeto) ou uma situação de "vazio de opinião", gerada pelo desconhecimento a respeito de um empreendimento em virtude da assimetria institucional e cultural existente entre a empresa e os grupos de interesses.

O diálogo com os stakeholders deve ser encarado sob três prismas:

28 O que distingue um stakeholder primário de um secundário é o grau de impacto que ele pode sofrer do empreendimento em questão, ou seja, ele estará, assim, mais propenso a se comportar negativamente, podendo criar conflitos a serem administrados pela empresa.

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1) O da Responsabilidade social. Indica que a empresa reconhece o potencial de impacto do

empreendimento, buscando estabelecer um entendimento com a sociedade antes de iniciar as operações e, dessa forma, obter “licença social para operar”;

2) O da Ferramenta de negócio. Constitui-se num investimento destinado a prevenir potenciais conflitos e reduzir riscos, consequentemente, evitando custos futuros com processos judiciais, sabotagem, e mitigação de danos ambientais e sociais;

3) O da Redução de incerteza. Atua como fonte privilegiada de obtenção de informação e, portanto,

de redução de incerteza e formação de expectativas que possam vir a afetar os negócios da empresa e a sua posição competitiva no mercado.

Por não se tratar de uma panacéia, o diálogo com os stakeholders não é indicado nos casos em que não existe compromisso da empresa com a continuidade do projeto, uma vez que o custo de interromper um processo lento, caro e complexo é alto, sobretudo no quesito reputação e imagem

institucional, quando as decisões já foram tomadas sem considerar a opinião dos stakeholders. Finalmente, é importante salientar que essa ferramenta é substancialmente distinta, de certa forma antagônica às metodologias empregadas em situações de crise instalada, quando o confronto ocupa o

lugar do diálogo. Na visão moderna, se a empresa falhar na estratégia de gerenciamento ambiental e de comunicação

com os stakeholders, não usufruirá dos seus benefícios. Dependendo da natureza e da intensidade do conflito, pode ter suas operações suspensas judicialmente e ser obrigada a pagar multas elevadas, circunstâncias em que, além de comprometerem a viabilidade do empreendimento, afetam a sua

reputação, resultando em perda de credibilidade junto a fornecedores, compradores e consumidores. A história de relacionamento pretérito entre a firma e seus stakeholders e a habilidade em administrar

os arranjos institucionais pesa tanto, ou mais, quanto decisões de investimento exclusivamente orientadas por situações de mercado. Quando determinada empresa é questionada pela comunidade

em virtude da incompatibilidade programática com seus sócios, ou enfrenta conflitos sociais decorrentes da escolha equivocada de terceirizadas, significa que aqueles arranjos institucionais não foram equacionados.

Stakeholder: conceito central da responsabilidade social

A ideia de que as empresas não devem somente satisfação aos seus acionistas é um importante aspecto relacionado à RSE. A responsabilidade social empresarial também é definida pela sua forma de gerir um negócio baseado na identificação e consideração dos impactos de suas atividades a todos

os agentes envolvidos, sejam eles “concretos” (trabalhadores, consumidores, fornecedores, sociedade) ou abstratos (meio ambiente, comunicação, o futuro etc.).

Uma das tarefas das organizações é identificar esses agentes e trazê-los para o dia a dia dos negócios, além de buscar maneiras de determinar, mensurar e divulgar os impactos das suas atividades sobre tais agentes. Como é impossível identificar e se comprometer com todos os

stakeholders, as empresas buscam parcerias com organizações não governamentais (ONGs) que, geralmente, representam alguns destes grupos, de forma a compartilhar.

O stakeholder é, portanto, todo aquele que é impactado de alguma forma pelas operações de um empreendimento ou negócio. Além dos agentes já mencionados, podem-se citar ainda os Governos,

as comunidades locais (respeitando seus costumes e cultura), além, é claro, dos acionistas (que deixam de ser o único público-foco das empresas).

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3.3. Articulando Responsabilidade Social Empresarial e Desenvolvimento

Sustentável A recente associação do princípio de Responsabilidade Social Empresarial aos preceitos do

Desenvolvimento Sustentável conferiu uma dimensão mais humana à ecoeficiência, e ampliou a compreensão do conceito ao estender a ação preventiva de impactos ao conjunto da sociedade. Pelo

menos no plano da retórica, um grande contingente de empresas em todo o mundo abraçou a causa da responsabilidade social.

Conceito de múltiplos significados, a responsabilidade social empresarial (ou corporativa) teve o mérito de resgatar valores morais que a sociedade, em geral, não associava às empresas. Além de considerar um compromisso permanente dos empresários com a integridade do meio ambiente e com

os direitos humanos, pressupõe uma ação ética nos negócios e a transparência na comunicação com a sociedade.

Até o conservador Banco Mundial incorporou os princípios do Desenvolvimento Sustentável focados no envolvimento dos stakeholders. Desde 1997, no tópico reservado às “recomendações” dirigido aos gestores dos recursos, uma nova abordagem é incluída nos documentos oficiais da instituição,

recomendando às empresas a prática do diálogo com todos os grupos de interesse – e não apenas com autoridades governamentais –, previamente à implementação do empreendimento.

A chamada “licença social para operar”, adverte o Banco, deve ser obtida de todos, mas, particularmente, do segmento mais exposto às operações: as comunidades que habitam e/ou

trabalham na área de abrangência dos empreendimentos. Outras exigências ganharam espaço nos critérios neoliberais do Banco Mundial, que passou a induzir e a premiar as empresas que publicam Balanço Social e possuem certificações ambiental e social.

Pesquisas recentes em gerenciamento estratégico observaram que os temas ambientais vêm adquirindo crescente influência na definição das estratégias comerciais e no desenho técnico do

empreendimento. Mudanças nas expectativas dos consumidores quanto a produtos com mais qualidade ambiental e implementação de standards tecnológicos superiores às exigências legais tornaram-se decisões tão determinantes quanto as relativas à escala de produção, por exemplo.

Como já foi dito, no Brasil, um dos países onde mais cresce esse movimento, o principal responsável pela rápida disseminação do conceito foi o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social,

criado em 1998, por um grupo de empresários liderado por Oded Grajew, ex-Diretor-Executivo da Fundação Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq) e ex-assessor do extinto Programa Fome Zero do Governo Lula; a entidade possui, hoje, mais de 700 empresas associadas.

O Instituto Ethos se apresenta como uma associação de empresas, sem fins lucrativos, que tem como missão mobilizar, sensibilizar e apoiar as empresas para que incorporem políticas e práticas de

responsabilidade social na gestão de seus negócios. A entidade faz questão de frisar que não desenvolve atividade de consultoria, não cobra pelo serviço de orientação e não fornece "selo" ou

certificado, nem autoriza as empresas membros a usarem a associação ao Ethos como tal. Um dos seus méritos foi o de popularizar a publicação do Balanço Social. Trata-se de um relatório

anual no qual a empresa pública ou privada declara publicamente os projetos sociais e os investimentos financeiros que realizou em prol do bem-estar das comunidades e do meio ambiente. Esse relatório foi criado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), ONG

fundada pelo renomado sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, com o intuito de tornar mais transparente a Governos e grupos de interesse a maneira pela qual a empresa encara sua responsabilidade pública.

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Segundo o Instituto Ethos, para conquistar o atributo de uma empresa socialmente responsável, é necessário manter um diálogo constante com seus stakeholders (funcionários, fornecedores, clientes,

comunidades), prestar contas à sociedade e procurar sempre ir além da legislação e das normas internacionais, a exemplo dos direitos trabalhistas definidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), melhor dizendo, a empresa deve ser pró-ativa e investir no desenvolvimento pessoal

e profissional de seus empregados e na melhoria das condições de trabalho. O Ethos conceitua RSC como a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da

empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos

ambientais e culturais para gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais.

Considerando esse amplo espectro de atuação, a política de RSC da empresa deve contemplar as três dimensões da responsabilidade, conforme proposto por Ferrel et al. (2001):

Responsabilidade Econômica – consiste em produzir bens e serviços de que a sociedade necessita, e quer, a um preço que lhe possa garantir a continuação das atividades da

empresa e a satisfação das suas obrigações com os investidores;

Responsabilidade Legal – está consignada nas leis que ela é obrigada a cumprir;

Responsabilidade Ética – é definida como comportamentos ou atividades que a sociedade

espera das empresas, porém não estão codificados em leis.

Dependendo da natureza do negócio (o que produz e onde se localiza), em geral as empresas escolhem focar nos segmentos internos (empregados e seus familiares) ou nos externos (a comunidade e as ONGs), mas existem empresas que adotam a premissa de que “todo stakeholder importa”, baseada na crença de que os recursos naturais são bens públicos e coletivos. Essa escolha orientará a política de investimento social da empresa. Observe-se a “matriz de avaliação do nível de responsabilidade social” proposta por Neto e Fróes (1999, p.80):

Quadro 1 – Matriz de avaliação de uma empresa socialmente responsável

Vetores Crenças Valores

Desenvolvimento da Comunidade

- A empresa também tem a sua parcela de responsabilidade pelo

bem-estar da sociedade na qual está inserida.

- Projetos Sociais ligados à comunidade.

Preservação do Meio Ambiente

- A importância do meio ambiente

para a sobrevivência futura. - A responsabilidade de devolver à natureza o que dela retirar ou nela

impactar.

- Respeito ao meio ambiente

em todas as suas atividades. - Apoio a projetos ambientais.

Bem-estar dos Funcionários

- A produtividade do trabalho está

atrelada à satisfação e ao bem-estar dos funcionários.

- Criação de um ambiente

agradável. - Preocupação com a saúde e qualidade de vida dos

funcionários.

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Responsabilidade Socioambiental Unidade 3

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Comunicação Transparente

- Os stakeholders devem ser bem informados visando amortecer os impactos de fatores exógenos que

podem influenciar negativamente a empresa.

- Transparência na comunicação a todos os atores envolvidos.

Retorno aos Acionistas

- A sustentabilidade da empresa

depende da confiança do seu acionista em aplicar seus recursos nela.

- Política de remuneração e

atuação empresarial conforme as expectativas.

Sinergia com os Parceiros

- As parcerias otimizam custos

operacionais a partir do compartilhamento de recursos pelas empresas.

- Ética e um bom

relacionamento com os atuais e potenciais parceiros.

Satisfação dos Clientes - O sucesso da empresa depende

da satisfação do cliente.

- Bom relacionamento baseado

em respeito ao cliente.

Fonte: Adriana Malamut. Responsabilidade social em incubadora de empresas de base cultural. Prêmio Ethos. Fev 2004

Tais valores e crenças direcionam as ações que as empresas socialmente responsáveis devem

desempenhar proporcionando um maior envolvimento com todos os atores envolvidos em seus processos. A fim de se adotar uma atitude socialmente responsável, faz-se necessário que cada empresa determine claramente qual é o seu papel, sua visão e seus valores como organização para

que, em seguida, integre suas preocupações com o lado social em sua estratégia de negócios. É o que Stephen Kanitz, Diretor da Kanitz & Associados e colunista da Revista Veja, chama de "filantropia

estratégica". Para ele, a empresa deve primeiramente conhecer o enorme leque de necessidades sociais que carecem de apoio governamental e, depois, optar por aquelas que correspondem às suas competências e interesses de seus funcionários. Para tanto, a empresa deve (i) focar prioritariamente

no indivíduo; (ii) possuir ética corporativa; (iii) conhecer a comunidade em que está inserida e sua cultura; (iv) garantir a transparência; (v) formar parcerias inteligentes; (vi) avaliar os resultados e prestar contas; (vii) divulgar relatórios externos.

3.4. A RSE no Brasil No final dos anos 80 e início dos 90, concomitante à intensificação do progresso tecnológico e à rápida disseminação de novas soluções em Tecnologia da Informação, impôs-se a visão neoliberal dos

mercados, consolidando a globalização e, por conseguinte, ampliando as fronteiras dos Estados nacionais. Em face desse novo cenário, a economia brasileira ingressou num processo de internacionalização e de abertura comercial. Crescem em presença e importância as multinacionais no

País, levando as organizações brasileiras a aderirem às novas diretrizes que passam a reger a competitividade no mundo capitalista.

Os episódios do impeachment do Collor e a campanha do sociólogo Herbert de Souza (o Betinho) contra a fome e a miséria são alguns exemplos de movimentos que buscaram fortalecer as causas

sociais num contexto de crescente globalização do País. Vários segmentos da sociedade participaram da campanha, inclusive um segmento mais progressista de empresários, que viria a criar o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, em 1998. 29

29 O sociólogo Betinho e sua instituição, o IBASE foram responsáveis pela criação, em 1997, do Balanço Social, o primeiro indicador destinado a contabilizar a contribuição das empresas para a sociedade.

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Durante a década de 90, outros episódios indicavam a crescente participação do setor privado em questões públicas. O antigo Banco do Estado de São Paulo (Banespa) publicou, em 1992, um relatório

completo com o resultado de todas as suas ações sociais. No ano seguinte, empresas de outros setores seguiram seu exemplo.

Surgem, nessa década, as entidades empresariais, preocupadas em demonstrar que a adoção de práticas responsáveis aumenta as condições de competitividade da empresa, com destaque para o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e o Instituto Ethos de Empresas e

Responsabilidade Social, criados em 1995 e 1998, respectivamente.

Nos primeiros anos do novo milênio, a RSE começava a chamar a atenção dos principais meios de comunicação e da mídia nacional, enquanto crescia o número de publicações especializadas e de eventos e prêmios especialmente dedicados ao tema. No âmbito empresarial, proliferavam as

iniciativas de cidadania empresarial. Inicialmente, entretanto, as ações sociais empresariais tinham um caráter filantrópico, sobretudo porque o empresário brasileiro não percebia o vínculo entre a função econômica e as práticas sociais da sua organização, colocando as últimas sempre em segundo plano.

Segundo Queiroz (2000), há dez anos, as ações sociais promovidas pelas empresas brasileiras ainda eram, majoritariamente, de natureza assistencialista. Não havia, portanto, motivação de conduzir

práticas socialmente responsáveis visando ao fortalecimento de seus negócios. O aumento de empresas interessadas nos projetos sociais se devia à “conscientização dos empresários de que precisavam agir rápido e fazer algo pelo País, preenchendo a lacuna deixada pela falência do Estado

em prover o bem- estar social, pois, caso contrário, num futuro próximo, veriam seus mercados minguarem” 30.

Segundo FISCHER & FALCONER (1999), que citaram uma pesquisa realizada no mesmo ano pelo Centro de Estudos em Administração do Terceiro Setor da Universidade de São Paulo (CEATS – USP), com 273 companhias privadas e estatais provenientes de nove Estados e do Distrito Federal, os

ganhos com as práticas dentro do ambiente organizacional geraram os seguintes resultados:

Os investimentos em ações sociais melhoraram em 79% a imagem institucional da empresa e ampliaram em 74% suas relações com a comunidade;

Registro de um crescimento de 34% na motivação e produtividade dos funcionários. Para muitos colaboradores, era um orgulho saber que a organização da qual faziam parte também

trabalhava para o desenvolvimento de sua comunidade;

Crescimento em 40% no envolvimento, do funcionário com a empresa, como consequência

da nova prática;

Contribuição em 52% para o desenvolvimento de conhecimentos, técnicas, e habilidades dos funcionários decorrente dessa nova forma de interação.

Essa é mais uma comprovação da crescente importância dos ativos intangíveis, demonstrando que grande parte dos ganhos de uma organização está relacionada ao capital humano (além dos próprios

colaboradores, a comunidade na qual faz parte), e que ele é constituído de aspectos subjetivos (motivação, conhecimento, habilidades) difíceis de serem construídos e mensurados, impossíveis de

serem imitados. Na segunda edição da pesquisa “Ação Social das Empresas”, realizada pelo Instituto de Pesquisas

Econômicas Aplicadas (IPEA) entre 2000 e 2004, percebeu-se um expressivo aumento no número de

30 Responsabilidade Social Empresarial nas Organizações de Varejo.

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Responsabilidade Socioambiental Unidade 3

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empresas privadas brasileiras que realizaram ações sociais visando beneficiar as comunidades nas quais atuavam. Em 2004, cerca de 600 mil empresas atuaram de forma voluntária e investiram um

montante de aproximadamente R$ 4,7 bilhões, o que correspondia a 0,27% do PIB do País naquele mesmo ano31.

Há outras conclusões interessantes nesta pesquisa: foram poucas as empresas que se utilizaram de benefícios tributários para investir no social, seja porque não compensava, seja porque não tinham conhecimento desse procedimento. As regiões Sul e Nordeste foram as mais beneficiadas no

montante final dos investimentos, oriundos, majoritariamente, das grandes empresas (94% do total).

Por fim, a pesquisa também avaliou a percepção dos empresários sobre o seu papel social. A maioria (78%) ainda atribuiu ao Estado a obrigação de prover as necessidades sociais, portanto o entendimento corrente era de que a atuação privada não substituía o poder público, tendo um

caráter complementar às ações dos Governos. Uma publicação recente confirmou essa tendência identificada pelo IPEA no início da década. Na

pesquisa realizada em 2008, o Instituto Ethos, em parceria com o Instituto Akatu, avaliou a implantação de um conjunto de 56 práticas de responsabilidade social, envolvendo desde questões relacionadas às relações com funcionários e fornecedores, passando desde as ambientais até as de

natureza ética e de governança corporativa, incluindo diálogo com os diferentes stakeholders. Entre as principais conclusões, a pesquisa revelou que 50% das empresas já praticavam ao menos 22 das 56 ações de RS listadas. Comparado a pesquisas anteriores, houve um aumento considerável no

número de práticas implantadas: em 2004, um estudo análogo mostrava que 50% das empresas só registraram 11 de um total de 55; portanto, um aumento de quase 100%32.

Revisão de conteúdo Esta Unidade apresenta uma nova ferramenta de gestão – o diálogo com stakeholders – que ganhou

importância no movimento da RSE. Você conheceu seus princípios e métodos, e entendeu como ela pode influenciar, positiva ou negativamente, a posição competitiva da empresa.

Questões para refletir/responder:

Por que o movimento da RSE dá tanta importância ao relacionamento com os stakeholders? Quais os resultados apontados pelas pesquisas sobre o movimento da RSE no Brasil? Como a empresa deve lidar com seus stakeholders?

Atividade: Selecione uma empresa e desenvolva uma política de relacionamento com seus stakeholders.

31 Fonte: www.ipea.gov.br/acaosocial 32 INSTITUTO ETHOS, INSTITUTO AKATU (2008).

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Responsabilidade Socioambiental Unidade 4

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Unidade 4 A RSE no Setor Financeiro e a Norma ISO 26000

Objetivos Esta Unidade apresenta os principais acontecimentos e características do movimento da RSE no setor financeiro; indica os principais riscos ambientais, e detalha uma importante ferramenta de gestão que

será implementada em dezembro de 2010, chamada Norma ISO 26000. Você conhecerá e entenderá o Protocolo Verde, o Dow Jones Sustainability, e os Princípios do Equador, entre outras importantes mudanças institucionais. Finalmente, conhecerá as modalidades de Investimentos Socialmente

Responsáveis e os que existem no Brasil hoje.

Ao longo dos últimos dez anos, surgiu uma série de iniciativas visando à incorporação da sustentabilidade nos negócios do setor financeiro, motivada pela crescente conscientização do papel de indutor na disseminação de boas práticas socioambientais na cadeia produtiva, mas, também, no

seu papel coercitivo, impondo restrições e sanções às empresas que não agirem de acordo com aquela condução, tais como, não conceder crédito, cancelar empréstimos etc.

Os riscos ambientais entram definitivamente nos custos dos empreendimentos, tornando-se cada vez mais determinantes nas decisões de negócios. A gestão inadequada dessas questões pode causar perdas financeiras irreparáveis para a empresa e, em decorrência, para os bancos também. A

preocupação das instituições financeiras com as questões ambientais ocorreu, inicialmente, como forma de evitar a responsabilização legal por danos ambientais produzidos por bens que eram recebidos como garantia de empréstimos. Os bancos, por sua vez, estão sujeitos a três tipos de riscos

ambientais:

Risco direto: aqueles aos quais os bancos respondem diretamente como poluidores, riscos

associados às suas próprias instalações, uso de papéis, equipamentos, energia etc. Nessa modalidade, aplicar-se-ia diretamente o Princípio do Poluidor Pagador, ou seja, o banco

deveria internalizar nos seus custos os gastos com controle de poluição;

Risco indireto: o risco ambiental afetaria a empresa com a qual o banco tiver

relacionamento como intermediário financeiro, via operações de crédito ou como detentor de ativos financeiros (ações ou títulos de dívida);

Risco de reputação: os bancos vêm sofrendo pressão do público em geral e dos

organismos não governamentais (ONGs) para adotar uma política de financiamento e investimento ambientalmente correta, sob pena de terem sua reputação prejudicada diante da sociedade. A imagem dos bancos na sociedade é importante para o sucesso conjunto de

suas atividades e é considerada como parte de seu patrimônio. (SOLER, 2005) O Banco Mundial foi um dos grandes protagonistas nessa questão, pois desempenhou importante

papel em direcionar recursos para o desenvolvimento sustentável. Seu compromisso com a sustentabilidade influenciou estratégias do setor bancário comercial e de investimento em todo o

mundo. A partir daí, gradativamente os banqueiros começaram a acreditar que “o que é bom para o meio ambiente poderia também ser bom para os bancos”.

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Responsabilidade Socioambiental Unidade 4

50

4.1. Principais inovações institucionais no setor financeiro

Protocolo Verde (1995)

A primeira iniciativa resultante de acordo entre bancos brasileiros foi o Protocolo Verde. Trata-se de uma carta de princípios para o desenvolvimento sustentável firmada por bancos oficiais (Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Banco da Amazônia, BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco Central do

Brasil), na qual os signatários se propõem a empreender políticas e práticas que estejam sempre e cada vez mais em harmonia com o objetivo de promover um desenvolvimento que não comprometa as necessidades das gerações futuras.

Compromissos dos Signatários:

Oferecer linhas de financiamento e programas que fomentem a qualidade de vida da população e o uso sustentável do meio ambiente;

Considerar os impactos e custos socioambientais na gestão de seus ativos e nas análises de

risco de projetos, tendo por base a Política Nacional de Meio Ambiente;

Promover o consumo consciente de recursos naturais e de materiais deles derivados nos

processos internos;

Informar, sensibilizar e engajar continuamente as partes interessadas nas políticas e nas práticas de sustentabilidade da instituição;

Promover a cooperação e a integração de esforços entre as organizações signatárias deste

Protocolo. Em 2008, procedeu-se à revisão do Protocolo, e em 2009, o Banco Central de a Federação Brasileira

de Bancos (Febraban) aderiram a ele. Em 1999, o grupo Dow Jones lançou o Dow Jones Sustainability Index, Índice Dow Jones de

Sustentabilidade (DJSI), o primeiro índice global que considera a performance ambiental das empresas. No Fórum Econômico Mundial, em Davos, em 31 de janeiro de 1999, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, desafiou os líderes empresariais mundiais a apoiar e a adotar o Pacto

Global (Global Compact), tanto em suas práticas corporativas individuais, quanto no apoio a políticas públicas apropriadas.

O Pacto Global é uma iniciativa que tem como objetivo mobilizar a comunidade empresarial internacional para a promoção de valores fundamentais nas áreas de direitos humanos, trabalho e meio ambiente, ajudando as organizações a redefinirem suas estratégias e ações, a fim de que todas

as pessoas possam compartilhar dos benefícios da globalização, evitando que estes sejam aproveitados por poucos. O Banco do Brasil é um dos bancos brasileiros que aderiram imediatamente ao Pacto Global em novembro de 2003. A partir de então, outros bancos passaram a expressar

publicamente sua preocupação com a variável ambiental nos negócios. Naquele mesmo ano, o Instituto Ethos, em parceria com a Febraban, lançou os indicadores de RSE para o setor financeiro.

Os Princípios do Equador representaram um divisor de águas nesse processo. Embora não seja um selo certificável, adquiriu rapidamente status de standard no setor financeiro, arregimentando, no

curto espaço de cinco anos, 60 bancos. Criado em 2003 por iniciativa de dez instituições financeiras

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Responsabilidade Socioambiental Unidade 4

51

(ABN Amro, Barclays, Citigroup, Crédit Lyonnais, Crédit Suisse, HypoVereinsbank, Rabobank, Royal Bank of Scotland, WestLB e Westpac), seu objetivo original era verificar se os projetos que requeriam

financiamento cumpriam as exigências de sustentabilidade, de acordo com critérios estabelecidos pelo International Finance Corporation (IFC) , braço financeiro do Banco Mundial. Esses critérios preveem especificações para cada categoria de projetos no que se refere aos cuidados com as populações

atingidas pelos empreendimentos; à observação das condições de trabalho, aos níveis de poluição e das emissões de gases de efeito estufa; à realização de consultas públicas para verificação da viabilidade do projeto, entre outros. A partir da análise, os projetos são classificados de acordo com o

risco social e ambiental que apresentem: A - alto risco, B - médio risco e C - baixo risco. Para as categorias A e B, os bancos elaboram um relatório sugerindo mudanças no projeto, de maneira a

adequá-los às exigências internacionais. Sua performance no Brasil é singular. Não apenas pela velocidade na adesão, mas, principalmente,

pela efetividade na aplicação de várias diretrizes, sendo que o Banco do Brasil foi o primeiro Banco oficial a integrar o grupo de instituições financeiras brasileiras a aderir à medida. Além disso, o Brasil continua sendo o único representante dos países emergentes no conselho da entidade, com a adesão

de cinco bancos de capital nacional (Bradesco, Banco do Brasil, Santander, Caixa Econômica Federal, Itaú Unibanco S/A). Desde 2006, passou a ser obrigatório, para empresas que pleiteiam a partir de US$ 10 milhões, apresentar avaliação ambiental do projeto e provar que adotam critérios sociais.

Nesse mesmo ano, a Corporação Financeira Internacional (IFC) passou a exigir que os Bancos afiliados também se fossem signatários do processo designado Princípios do Equador.

A significativa adesão do segmento produtivo brasileiro à ecoeficiência conduziu a uma revisão nos critérios de financiamento dos Bancos. Um dos fatores que condicionam a liberação de financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por exemplo, é o alcance dos

impactos ambientais do projeto, além da divulgação do Balanço Social da empresa. Naturalmente, os fundos de investimento adaptaram-se rapidamente à nova realidade. Para atender ao investidor ambientalmente ético, foram criados os chamados fundos éticos, em que os critérios sociais,

ambientais e de governança corporativa são aplicados no processo de seleção dos melhores papéis.

Em agosto de 2001, a Comissão Técnica de Balanço Social da Associação Brasileira de Mercado de Capitais (Abamec), São Paulo, realizou uma pesquisa junto à comunidade de analistas e investidores com o objetivo de diagnosticar a posição dos agentes do mercado em relação às informações de

natureza social utilizada para análise das companhias, e chegou a resultados aparentemente animadores: a) 41% dos analistas levam em consideração as informações de natureza social em todas as suas análises, e 84% levam-nas em consideração pelo menos em metade de suas análises; b) a

Educação e Meio Ambiente são considerados muito importantes por 62% e 47% dos entrevistados, respectivamente; e c) 85% consideram que as ações sociais internas são levadas em conta em suas análises, devendo ser reportadas ao mercado.

Entretanto, nem toda boa intenção se traduz em prática. A III Pesquisa de Responsabilidade Social da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB), realizada no mesmo ano, revelou

uma profunda contradição: 97% das empresas entrevistadas afirmaram que a responsabilidade social faz parte da visão estratégica nas suas decisões, mas 77% não publicam nem mesmo o Balanço Social, considerado um modelo de prestação de contas essencial. A Financial Institutions Initiative

(FII), fundada em 1992 e ligada ao Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP), lançou uma Declaração Internacional sobre o compromisso com o desenvolvimento sustentável que contava,

em 1998, com mais de 100 adesões por parte de instituições financeiras, chegando, em março de 2001, a 171 instituições de 46 países. Segundo pesquisa realizada pelo Finance Institute for Global Sustainability (FIGS), apesar de três quartos dos fundos que favoreceram empresas social e

ambientalmente responsáveis terem tido um desempenho superior à média, no ano de 2000, ainda não existia uma série histórica que comprovasse definitivamente a correlação entre ética e lucro.

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O SERASA, uma das maiores empresas do mundo em análise de crédito, lançou recentemente o Relatório de Responsabilidade Ambiental (RRA), que permite a avaliação das empresas segundo

quatro critérios: política e gestão ambiental; forma de uso dos recursos naturais; medidas adotadas para evitar, diminuir ou remediar impactos; e cumprimento das disposições legais. O atendimento aos parâmetros resultou numa nota, enquanto o não atendimento dos mesmos pontua negativamente.

Nesse cenário, o Banco Real, atual Santander, se destaca por ter sido o primeiro no País a aplicar critérios de RRA em toda sua cadeia produtiva. Além disso, conta com uma política própria de

concessão de financiamentos sob a avaliação de aspectos socioambientais. A política inclui também projetos de médio porte abaixo do limite estabelecido pelos Princípios do Equador. Alguns setores

produtivos estão excluídos da carteira de clientes do Banco: os que utilizam o trabalho infantil ou incentivam direta ou indiretamente a prostituição; os que extraem madeira nativa não certificada e operam com a indústria do amianto. O Real também incentiva entre os clientes o acesso ao crédito

para a correção de problemas ambientais já existentes, para que o passivo não se mantenha, e a empresa não venha a falir, causando mais desemprego.

No que diz respeito à negação de crédito para empresas que desrespeitam o meio ambiente, o Conselho Monetário Nacional (CMN) criou um sistema nacional com informações sobre a situação ambiental e fundiária da propriedade privada e aprovou a Resolução 3.545, em 28 de fevereiro de

2008, a qual estabelece a exigência de documentação comprobatória de regularidade ambiental e outras condicionantes para a concessão de financiamentos agropecuários no Bioma Amazônia, por parte de bancos públicos e privados. Os Bancos deverão checar, nessa rede de informações, se o

proprietário solicitante de crédito tem algum passivo ambiental ou fundiário. Por ser a criação bovina é a principal responsável pelo aumento dos índices de desmatamento na região Norte, a resolução ainda tenta induzir o crédito a atividades menos devastadoras, incentivando o aumento da produção

por hectare e o incentivo à utilização de técnicas de manejo florestal. Além disso, a Lei Federal 9605, que trata dos Crimes Ambientais, corresponsabiliza as instituições financeiras por danos causados ao meio ambiente, de uma maneira geral.

Outro componente desse cenário é o II Acordo de Capitais de Basiléia, adotado a partir do final de

2007 pela maioria dos países e não apenas pelos países-membro. Esse ideário deverá mudar a atuação das instituições financeiras bancárias em relação às questões ambientais. O novo acordo considera outros riscos enfrentados pelos bancos para efeito de cálculo de capital regulamentar e

exige modelos de gerenciamento de risco mais precisos, agregando novos riscos, como, por exemplo, o ambiental.

4.2. Investimentos Socialmente Responsáveis (ISR) – Histórico e Evolução

Investimentos socialmente responsáveis são aqueles que integram ganhos financeiros, ambientais e sociais. Um número crescente de investidores passou a optar por investir em empresas que demonstram, de alguma forma, uma preocupação com os impactos de suas operações no meio

ambiente e na sociedade, ou por serem altruístas ou por perceberam, nessas empresas, uma opção mais lucrativa. Questões como bem-estar dos funcionários, problemas ambientais e o impacto social

de alguns produtos, como armas, tabaco e álcool, figuram no hall de preocupações dos investidores. Durante muito tempo, vigiu a ideia de que investimentos socialmente responsáveis comprometem o

retorno financeiro. Hoje, sabe-se que investir levando em conta valores éticos pode aumentar consideravelmente os ganhos financeiros. As empresas que incluem as questões socioambientais em sua estratégia estão criando valor, a longo prazo, para a sua empresa – conceito conhecido como

“sustentabilidade corporativa.”

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Há muitos séculos há registros de pessoas que levam em conta seus valores éticos ao realizarem investimentos. Nos tempos bíblicos, os judeus tinham leis que orientavam investimentos segundo

princípios éticos. Nos Estados Unidos, os Quakers, no século XVI, praticavam atividades socialmente responsáveis, baseados em suas crenças de igualdade e não violência. Mais recentemente, o clima social dos anos 60 acendeu a discussão em torno de questões sobre direitos civis e o meio ambiente,

influenciando os investidores. O fato mais significativo que marcou a entrada dos investimentos socialmente responsáveis na agenda internacional foi a campanha contra a discriminação racial institucionalizada, conhecida como Apartheid, na África do Sul.

Atualmente, num cenário em que figuram a globalização, a revolução tecnológica e da informação, a

integração dos mercados e a queda das barreiras comerciais elevaram os níveis de competição a uma escala planetária. Como resultado direto desses fenômenos, observaram-se consumidores mais conscientes e exigentes e empresas cada vez mais preocupadas em investir na qualidade de seus

produtos, processos e relações. A sustentabilidade corporativa passou a ser vista como vantagem competitiva e fundamental para a sobrevivência das empresas a longo prazo.

As preocupações crescentes com questões ambientais como lixo tóxico, aquecimento global e desastres ambientais, assim como direitos humanos, produtos socialmente destrutivos como álcool e cigarros, estão na ordem do dia, aumentando o interesse e as opções de investidores socialmente

responsáveis. Não é possível afirmar se essa modalidade de investimento terá sempre um desempenho superior. O

que se tem de fato é, nos últimos dez anos, os investimentos socialmente responsáveis virem crescendo no mercado financeiro norte-americano, embora existam desde década de 60, devido ao recente boom da responsabilidade social empresarial. De 1995 a 2007, o montante de investimento

envolvido nessa modalidade aumentou mais de 320%. Ao final de 2007, dos US$ 25,1 trilhões aplicados na indústria de fundos, US$ 2,7 trilhões (10,76%) estavam aplicados em fundos ISR.33

Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE/BOVESPA

A carteira do ISE, indicador composto de ações emitidas por empresas, que apresentam alto grau de comprometimento com a sustentabilidade e com a responsabilidade social, foi lançada em 2005 pela Bolsa de Valores de São Paulo, Bovespa, em parceria com várias instituições; tem por objetivo refletir

o retorno de uma carteira composta por ações de empresas com reconhecido comprometimento com a responsabilidade social e com a sustentabilidade empresarial, além de atuar como promotor das boas práticas no meio empresarial brasileiro.

Além da BM&F Bovespa, o Conselho do ISE é composto pelas seguintes entidades: Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), Associação dos Analistas e

Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec), Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, International Finance Corporation

(IFC), Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e Ministério do Meio Ambiente. A quinta e mais recente carteira do ISE registrou um aumento de 28 para 34 Companhias, e de 36

ações para 43, representando 15 setores, sendo que os três mais recentes concernem à construção civil, a seguros e a máquinas e equipamentos. Quanto ao valor de mercado das ações, este cresceu

de R$ 372 bilhões, em dezembro de 2008, para R$ 730 bilhões, em novembro de 2009. Contribuíram para esse desempenho algumas medidas introduzidas no questionário nos últimos

quatro anos. Na versão de 2006, por exemplo, foram incluídas questões sobre o desempenho da

33 Site do Social Invest. www.socialinvest.org, 2007. Acessado em 10-05-2009

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empresa em relação à corrupção e anúncio do lançamento de procedimentos de verificação, entre eles a exigência de apresentarem documentos que comprovem a veracidade das informações

prestadas nos questionários. Uma das novidades introduzidas nas regras do ISE, em 2009, foi a mudança na metodologia de formação da carteira que, agora, fica limitada a uma participação de 15% por setor econômico, enquanto, na fórmula de cálculo anterior, era de 25% por empresa. Outra

inovação recente foi a inclusão de perguntas sobre as iniciativas da empresa face às mudanças climáticas.

Fonte: www.bovespa.com.br. Acessado em 26.11.2009

Atualmente, 34 empresas estão listadas no ISE, e o atual índice, que vigorará até 30 de novembro de

2010, está constituído pelas seguintes companhias: AES Tiete, Cemig, Dasa, Energias Br, Indústrias Romi, Redecard, Tim Participações S/A, Bradesco, Cesp, Duratex, Even, Itausa, Sabesp, Tractebel,

Brasil, Coelce, Eletrobras, Fibria, ItaúUnibanco, Sul America, Usiminas, Braskem, Copel, Eletropaulo, Gerdau, Light S/A, Suzano Papel, Vivo, BRF Foods, CPFL Energia, Embraer, Gerdau Met, Natura e Telemar.

Investimentos em Empresas de Capital Aberto

A forma mais popular de investimentos socialmente responsáveis, atualmente, é a realizada em empresas de capital aberto, normalmente através de Fundos de Investimento, que utilizam critérios socioambientais de seleção. Esse tipo de investimento apresenta pontos positivos e negativos quanto

a sua aplicação. Entre os positivos, tem-se a ajuda em promover e em conferir credibilidade ao tema da sustentabilidade entre os investidores tradicionais – na última década, houve um aumento dos investimentos em Private Equity e Venture Capital, que se estabilizaram como uma classe de

investimentos. Ao longo desse tempo, o interesse de investidores por ações socialmente responsáveis também cresceu muito. Prova disso foram os mais de 03 trilhões de dólares aplicados em fundos que utilizam critérios sociais, ambientais e éticos para selecionar ações.

Esses dados sugerem que os investidores socialmente responsáveis deverão acompanhar a tendência

atual do mercado tradicional e também procurar oportunidades de investimentos em Venture Capital/Private Equity. Atualmente, há registros de 42 fundos de Venture Capital ligados a atividades

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sustentáveis no mundo. As principais categorias e suas respectivas taxas de retorno esperadas estão relacionadas na tabela a seguir: 34

Categorias Rentabilidade

Exploração Sustentável de Florestas 8-15%

Agricultura Orgânica 5-35%

Fair Trade 10-15%

Inner-City VC Funds 15-35%

Tecnologias Sustentáveis 20-50%

Brown Fields 15-25%

4.3. Por que uma norma em responsabilidade social? A Norma ISO 26000

Voltando à norma internacional em RSE, além da existência de distintas interpretações de RSE, conforme se comentou, há o problema da padronização de um conceito tão amplo. O fenômeno da globalização impõe a criação de parâmetros de comportamento que possam ser compartilhados por

todas os stakeholders. O que se espera é que uma norma internacional facilite a implementação de ações concretas que

respondam à crescente preocupação e pressão da sociedade em relação aos direitos humanos em seu sentido mais amplo, englobando os direitos trabalhistas e políticos, a par do direito dos consumidores, além da preservação ambiental.

A norma pressupõe maior transparência das organizações na comunicação de suas ações a todos os

públicos interessados em seu processo produtivo. São empresas, Governos, associações, entidades da sociedade civil e ONGs (o “Terceiro Setor”) dos mais variados perfis que, ao incorporarem (ou melhor, internalizarem) em seus modelos de gestão princípios de RSE, poderão contribuir para a utilização

mais consciente e sustentável de nossos recursos naturais e humanos em escala global e um futuro digno às próximas gerações.

Ademais, a existência de um padrão pode vir a ser muito útil para eliminar a confusão que é feita entre RSE e filantropia. Ações filantrópicas são atitudes que causam impacto momentâneo, como, por exemplo, doações de comida e roupas aos necessitados. Embora bem vistas pela sociedade, são

ações pontuais e temporárias, realizadas, que não resultam em benefício de longo prazo, funcionando principalmente como conforto pessoal e moral de quem a pratica. 35 Já a Responsabilidade Social visa ao envolvimento e ao desenvolvimento contínuo da sociedade com a qual se trabalha. É uma ação

bem mais abrangente, voltada para o futuro, tal como a educação e a capacitação em projetos de geração de renda. Trata-se de uma atitude coletiva. Para as instituições e organizações – sejam as públicas, sejam as privadas –, agir de forma responsável significa investimentos necessários no “hoje”

que visam diminuir o impacto de suas ações em troca de um retorno social (e também nos negócios) no “amanhã”.

Não se pretende discutir qual das duas atitudes (filantropia ou RSE) é a melhor para a empresa, mas sim esclarecer o que cada uma delas significa, e quando devem ser implementadas: enquanto as

ações filantrópicas garantem a sobrevivência no dia de hoje, as ações de RSE oferecem oportunidades no futuro. A questão mais importante a destacar é a de que, ao fazer a distinção entre as duas práticas, as empresas que exercitam a filantropia não podem se autodenominar empresas socialmente

34 Fonte: Consultoria Tony Lent, Managing Director EA Capital 35 Corrêa e Medeiros (2003)

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responsáveis. O Instituto Ethos classifica uma empresa como socialmente responsável quando ela vai “além da obrigação de respeitar as leis, pagar impostos e observar as condições adequadas de

segurança e saúde para os trabalhadores” 36. O prefixo da língua grega ”iso-”, que significa “igual”, compõe a denominação da organização

responsável pela criação dessa norma bem como de outras anteriores. A International Organization for Standardization (ISO) é uma organização não governamental criada em 1946, com sede em Genebra, na Suíça, formada por representantes de mais de 155 países, funcionando como uma rede

integrada internacional de órgãos de normalização em todo o mundo. Uma de suas finalidades é definir um padrão mundial para implementação de normas e diretrizes direcionadas à

responsabilidade socioambiental nas organizações. A ISO criou normas técnicas para quase todas as atividades econômicas, exceto para o campo da

eletroeletrônica, que é de responsabilidade da International Eletrotechnical Commission (IEC). Por intermédio de cooperações no âmbito científico, tecnológico e intelectual, a organização acredita que a padronização dos processos em nível internacional facilita o intercâmbio de produtos e serviços, a

disseminação do conhecimento e das boas práticas em gestão, além dos avanços na área tecnológica. A criação de uma nova norma decorre de consenso por parte dos membros que participam de sua

elaboração. Nessa fase, os representantes dos setores sobre os quais a norma terá algum impacto reúnem-se, periodicamente, para trocar experiências e identificar as melhores práticas de gestão com o objetivo chegarem a um acordo sobre cada aspecto da norma. Por fim, quando uma norma

internacional da ISO é publicada, todos os países membros da organização podem traduzi-la e adotá-la como norma nacional. Atualmente, a ISO possui um portfólio de mais de 15.000 normas que recomendam as melhores práticas aos mais variados ramos de negócios.

As normas ISO 9000 e ISO 14000 estão entre as mais conhecidas certificações no mundo: a primeira está relacionada à Gestão da Qualidade e a segunda à Gestão do Meio Ambiente. São séries que

beneficiam empresários na busca por soluções de problemas de produção e melhoria de produtividade, além de tornar o negócio mais transparente, eficiente e gerar mínimo impacto na

natureza.

4.4. O processo de criação da ISO 26000 Os debates para a construção da futura norma de RSE já estavam ocorrendo desde o ano de 2000,

embora as primeiras discussões tenham começado, oficialmente, em maio de 2002. A ISO 26000 é considerada a “terceira geração de normas”, isso porque o desenvolvimento de uma

norma em Responsabilidade Social se dá após a consolidação das normas que a precederam: a ISO 9001, de Gestão da Qualidade e a ISO 14001, de Meio Ambiente.

Conforme mencionado anteriormente, os primeiros passos para o desenvolvimento de uma norma se dão através da formalização de um grupo de membros, associados a ISO. Esse grupo, conhecido

como Grupo Consultivo Estratégico (SAG) 37, foi o responsável pelas primeiras discussões, pesquisas e sugestões sobre qual seria o escopo e a abrangência da norma nos futuros debates. O objetivo inicial era recomendar à ISO se tal tinha condições, ou não, de prosseguir com o desenvolvimento de uma

norma de Responsabilidade Social. A seguir, destacam-se as principais questões debatidas durante este período pelo SAG:

36 www.ethos.org.br 37 Strategic Advisory Group, do ingles.

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1) Discussão sobre quais seriam as referências necessárias para um conceito – aceito por todos – de RSE;

2) Tópicos para a criação de uma norma em RS que incluíssem aspectos de custo e benefício,

nível de abrangência, integração dos instrumentos legais e a análise de iniciativas já

existentes neste campo; e

3) O nível de competência da ISO para desenvolver uma norma em RS.

O SAG terminou o seu trabalho em abril de 2004. O seu relatório demonstrava, dentre outras

questões, qual era o “nível” de entendimento de RSE no mundo e quais eram os pontos a serem considerados pela ISO para que se pudesse criar um conceito universal nessa área. Segundo Ursini & Sekiguchi (2005), apesar de a Responsabilidade Social ser um tema complexo e de difícil definição, –

fato reconhecido pelos próprios membros do SAG –, a recomendação do SAG para o desenvolvimento de uma norma só deveria prosseguir se se considerassem algumas premissas, entre elas:

Reconhecer que a RS envolve um número de temas qualitativamente diferentes dos já trabalhados pela ISO; são questões de natureza social, muitas vezes subjetivas e de difícil

mensuração (se comparado ao cumprimento de qualidade de um produto), como os Direitos Humanos. Poder-se-á citar ainda a necessidade e a importância do envolvimento de todos os stakeholders no processo produtivo como um tema que exige um grande debate;

Reconhecer que a ISO não possui autoridade ou legitimidade para criar obrigações sociais e

políticas que são definidas pelos Governos locais e organizações intergovernamentais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, Organização Internacional do Trabalho (OIT), além de outras convenções da ONU; o que se deve esperar da ISO 26000 é um instrumento

que vise à complementação ao cumprimento das diretrizes e leis estabelecidas pelos Governos e/ou as entidades internacionais acima citadas;

Limitar o escopo do tema de maneira que sejam evitados assuntos que só possam ser tratados no campo político: ou seja, mais uma restrição à interferência da norma em questões

legais e padrões já estabelecidos sobre os temas abordados;

Reconhecer que a OIT tem um mandato único como a organização que define, em uma base

tripartite, normas internacionais com respeito à questões trabalhistas. Em outras palavras, as diretrizes da ISO 26000 devem ser complementares aos padrões já estabelecidos pela OIT

nesta área;

Reconhecer que, pela complexidade e evolução rápida do tema, não será fácil harmonizar

todos os compromissos substantivos de Responsabilidade Social; é a partir da compreensão dessa importante premissa que a ISO 26000 buscou uma dinâmica multistakeholder (ou seja,

de participação de todas as ”partes envolvidas”) para garantir maior legitimidade no documento final;

Revisar seus produtos e, quando necessário, fazer ajustes para garantir uma participação significativa das partes interessadas.

Com relação ao escopo do trabalho, o SAG recomendou que a futura norma:

Fosse desenvolvida como uma diretriz e não como uma norma de requisitos (portanto, sem envolver certificação) que servisse de base para verificações de conformidade ou para apoiar

as certificações existentes;

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Não fosse apenas para uso por parte das empresas privadas e grandes corporações

(multinacionais), mas, também, voltada às demais organizações e a todos os setores (como Governos e ONGs), aplicável a todos os portes;

Enfatizasse resultados de melhoria e desempenho;

Adotasse uma terminologia comum para o tema de responsabilidade social;

Contribuísse para que as organizações pudessem, efetivamente, abordar o tema de Responsabilidade Social em diferentes culturas, sociedades e ambientes;

Pudesse complementar outros instrumentos e metodologias relevantes;

Não tivesse a intenção de reduzir a autoridade governamental no que tange à Responsabilidade Social das organizações;

Pudesse introduzir guias práticos sobre métodos e opções de operacionalização da RS,

identificação e engajamento das partes interessadas (stakeholders), além do aumento da credibilidade da empresa;

Fosse escrita em linguagem clara e inteligível.

Também com relação ao processo de construção, o SAG destacou, entre outras recomendações, os seguintes aspectos:

A ISO busque trabalhar a fundo, para permitir uma participação significativa dos países em

desenvolvimento;

A necessidade de se criar um comitê próprio para a Responsabilidade Social dentro da

entidade (não utilizando nenhum comitê da ISO já existente, devido à complexidade do tema);

O novo comitê fosse composto por diversas partes interessadas e trabalhasse de forma

coordenada com os comitês já existentes. Foi através deste relatório do SAG que se realizou, em junho de 2004, a Conferência Internacional da

ISO sobre Responsabilidade Social, ocorrida em Estocolmo, na Suécia. O objetivo do evento foi discutir os pontos levantados pelo SAG e aprofundar o debate com todos os membros e países envolvidos na ISO para a construção de um consenso sobre o assunto. Entre os primeiros acordos

obtidos está a confirmação das recomendações do SAG sobre a necessidade de uma norma que apresentasse diretrizes, escrita em linguagem de fácil entendimento, sem ser um documento de requisitos (isto é, sem certificação).

Outro importante avanço resultante dessa conferência foi a decisão de desenvolver a norma através

de uma parceria entre um país desenvolvido e um em desenvolvimento. Das candidaturas submetidas, a parceria entre Brasil/Suécia foi a vencedora, em setembro de 2004, com os brasileiros na presidência e os suecos na secretaria do Grupo de Trabalho (GT) de Responsabilidade Social da

ISO, responsável pela criação da norma. Ocupando a presidência está o brasileiro Jorge Emanuel Cajazeira, engenheiro, gerente-executivo da Companhia Suzano Papel e Celulose; a vice-presidência coube ao sueco Staffan Söderberg, representante da World Wildlife Fund (WWF).

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A entidade que representa a ISO em âmbito mundial e tem papel decisivo na elaboração da norma, é a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Compondo a chapa, a representação sueca ficou

a cargo do Instituto Sueco de Normatização (Swedish Standards Institute – SIS). Ambos comandaram todos os encontros seguintes à Conferência de Estocolmo.

4.5. Características da ISO 26000 Apesar das expectativas em torno da nova norma de Responsabilidade Social, muito já se pode

apresentar e discutir a respeito de seus principais aspectos. A norma, em si, tem como objetivo, trazer as orientações necessárias para o processo de incorporação da responsabilidade social e ambiental às

atividades de uma organização, além de indicações sobre os principais instrumentos, sistemas e entidades que, atualmente, tratam do tema, visando orientar as organizações de todos os tipos e tamanhos sobre os cuidados e princípios que devem seguidos por quem, um dia, deseja se tornar

socialmente responsável.38 Em vista do reconhecimento prévio da complexidade no tratamento do assunto de RS, a ISO 26000

busca estabelecer um entendimento comum (aceito internacionalmente) sobre o que de fato significa responsabilidade social, a fim de que as iniciativas duvidosas sobre o assunto possam ser claramente resolvidas.

A ISO 26000 será, como foi dito, uma norma de diretrizes e não de especificações. Normas de diretrizes, diferente das de especificação, não são passíveis de auditoria ou certificação. Elas tendem

ainda a ser mais abrangentes, servindo como um guia para a implementação do sistema de gestão mais adequado às necessidades de cada organização.

Conforme foi decidido na 3ª Reunião Plenária, os temas centrais que regem o desenvolvimento na nova norma são os seguintes39:

Direitos Humanos: visa garantir os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais,

direitos fundamentais do trabalhador, resolução de conflitos, evitar a cumplicidade e a

discriminação e cuidar dos grupos vulneráveis;

Práticas trabalhistas: tratará do emprego e das relações de trabalho, condições e proteção social, diálogo social, saúde e segurança do trabalho, desenvolvimento humano dos trabalhadores. A abrangência do “trabalho” refere-se tanto ao emprego direto quanto ao

terceirizado e ao trabalhador autônomo;

Meio ambiente: uso sustentável dos recursos, combate e adaptação às mudanças climáticas (confirmando que as alterações no clima já impactam a vida das sociedades), proteção e restauração do ambiente natural, prevenção da poluição e os princípios da precaução, do ciclo

de vida, da responsabilidade ambiental e do “poluidor-pagador” (ou ainda, chamado de usuário-pagador, tratando-se do agente que origina uma externalidade – não apenas a

poluição como também o uso indiscriminado dos recursos, por exemplo – que deve assumir os custos impostos aos outros agentes, produtores e/ou consumidores que sentirão os efeitos de sua ação);

Práticas operacionais justas: compreende o combate à corrupção; envolvimento político

responsável; concorrência e negociação justas; respeito aos direitos de propriedade; e promoção da RS na esfera de influência da organização;

38 CREDIDIO, F. (2007) 39 Adaptado de “Brasil e a futura Norma Internacional 26000”

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Questão dos consumidores: visam às práticas justas de negócios, marketing e comunicação

(com o máximo de transparência na divulgação de seu produto/serviço ao comprador); proteção, saúde e segurança do consumidor; consumo sustentável; serviço e suporte pós-fornecimento; privacidade e proteção de dados; educação e conscientização;

Desenvolvimento e participação da comunidade: trata do envolvimento com a comunidade na

busca de seu desenvolvimento e atuação conjunta nos negócios; investimento social (saúde, educação, moradias, dentre outras necessidades locais); desenvolvimento tecnológico; criação de empregos e geração de riqueza e renda;

Governança organizacional: engloba aqui os processos e estruturas de tomada de decisão,

delegação de poder e controle. Trata-se ainda das mudanças na cultura e nos valores da organização, quando se fazem necessários para a internalização dos princípios de RS, no dia a dia da instituição.

As diretrizes da ISO 26000 têm como objetivo buscar a amplitude na participação das diferentes entidades representantes da sociedade civil (empresas privadas, governo, terceiro setor,

consumidores...), na esperança de que o discurso corporativo socialmente responsável e as verdadeiras práticas e políticas empresariais se tornem cada vez mais próximas e esclarecedoras.

Deve-se destacar ainda que, em todo o processo de construção da norma, a ISO criou um Grupo de Trabalho composto de representantes de todas as “partes interessadas”, e especialistas indicados por órgãos nacionais de normalização, que tinham direito de voz e voto nas plenárias semestrais. No

Brasil, a responsabilidade pela indicação dos especialistas ficou a cargo da ABNT. A entidade convidou o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) para indicar um

especialista que representasse a parte interessada “trabalhadores”. Representando as outras cinco categorias, têm-se: Consumidores – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC); Empresas – Furnas, que substituiu a Natura; Governo – Ministério da Ciência e Tecnologia; Outros (academia) –

Fundação Vanzolini, da Universidade de São Paulo e ONGs – Instituto Akatu, substituto do Instituto Ecofuturo.

É por contar com o trabalho e com a troca de experiências de diferentes especialistas que a nova norma também possui a característica de ser multistakeholder. O objetivo é, através da padronização das diretrizes, todas as partes poderem ser ouvidas e incluídas no processo.

A ISO 26000, por fim, define responsabilidade social como a responsabilidade de uma organização pelos impactos de suas decisões e atividades na sociedade e no meio ambiente, por meio de um

comportamento ético e transparente que contribua para o desenvolvimento sustentável, inclusive a saúde e bem-estar da sociedade; leve em consideração as expectativas dos stakeholders; esteja em conformidade com a legislação aplicável e seja consistente com as normas internacionais de

comportamento; esteja integrada em toda a organização e seja praticada em seus relacionamentos.

4.6. Análise crítica: os prós e contras da ISO 26000

Até aqui, discutiu-se a evolução da RSE, bem como o processo de desenvolvimento da “futura norma”, até a sua publicação final, que se encontra bem próxima. Vai-se proceder, a seguir, a uma análise crítica, apresentando os pontos positivos, mas, também, mostrando suas limitações. São

visões que partem tanto da visão autoral, quanto de uma revisão das opiniões expressas por diferentes especialistas no assunto.

Começa-se observando o caráter básico da ISO 26000, o processo de construção da norma e a criação de uma definição “global” de Responsabilidade social, que, como já disse, é um grande

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desafio ao requerer o consenso entre os mais de 155 países-membros da ISO. Isso significa trabalhar visões distintas de RSE, vindas de países com cultura, história, costumes, política e sociedade total ou

parcialmente divergentes. Logo, se se almeja criar uma norma de aceitação global, todos os países devem ser ouvidos. Por outro lado, a busca por uma definição internacional de Responsabilidade Social pode facilitar a troca de experiências e práticas entre os participantes. Além do mais, a

definição expressa contribuirá para diminuir o excesso de normas, padrões, metodologias e referências distintas que estão hoje no mercado a respeito de RSE, que mais confundem do que geram eficácia quando da sua aplicação. Assim, “um padrão internacional da ISO pode tornar-se um

referencial único e integrador mundial das principais ferramentas de Responsabilidade Social”, conforme defendem Ursini & Sekiguchi (2005).

Limitações da Norma

No que tange aos custos de adequação a uma norma, não se pode deixar de apontar suas limitações. Dependendo da análise custo-benefício, em especial das pequenas e médias empresas (PMEs) e ONGs, a adesão à ISO 26000 pode ser responsável por um aumento tão significativo nos custos que,

ao final do processo, obrigue essas organizações a transferirem esses repasses ao consumidor final. Caberá, portanto, uma análise individual por parte de cada organização no momento de avaliar a viabilidade, economicamente falando, de adotar as práticas de RS.

Mesmo contrariando os princípios da ISO 26000, a adesão à norma também pode estar motivada por razões puramente comerciais. Pressionadas pela crescente cobrança da sociedade civil e temendo

perder seus clientes e consumidores, algumas empresas podem vir a adotar a nova norma com o fim único de manter uma boa imagem perante o público. Deixarão de lado, portanto, a oportunidade de criar um ambiente de reflexão sobre seus valores, comportamentos e modelos de gestão.

Uma questão levantada por Ursini & Sekiguchi (2005) diz respeito ao caráter empresarial das certificações ISO e a sua força de mercado. Uma norma internacional de RS pode vir a reduzir a

influência da aplicação de outros protocolos (como a OIT, o Pacto Global), e iniciativas já consolidadas, como o Global Reporting Initiative (GRI), abrindo espaço para as grandes empresas de

auditoria atuarem. Ainda segundo esses autores, caso essa norma se torne certificável, haverá muita dificuldade em criar um padrão de auditoria, pois trata-se de questões não mensuráveis e/ou intangíveis.

Um último aspecto que se caracteriza como limitante é a possível dificuldade de comprovar a adesão à norma. Como se trata de diretrizes apenas, de que forma as organizações comprovarão que suas

atividades estão de acordo com as especificações recomendadas? Se não existe um formato de auditabilidade, espera-se que, com a publicação da norma, esse aspecto esteja bem claro para os interessados; caso contrário, essa barreira poderá gerar um desinteresse por parte das organizações

em adotar a ISO 26000. Aspectos positivos da ISO 26000

Uma característica que merece destaque é o fato de ter sido decidido que esta seria uma norma de diretrizes, e não de certificação. Independentemente de seu conteúdo, a adoção de uma norma

implica o aumento de custos. Por se tratar de uma norma de diretrizes, o custo é bem menor, facilitando a adesão das pequenas e médias empresas (PMEs), e das organizações do Terceiro Setor.

Para os países pobres ou de poucos recursos, a adoção de um padrão internacional de RSE pode ajudar a quebrar a visão preconcebida da comunidade internacional sobre os seus desafios internos

(tais como, trabalho infantil, péssimas condições sanitárias, alto índice de pobreza, entre outros), que resultam em embargos e boicotes comerciais. Ao colocar em prática as ações de RSE aceitas no

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mundo todo, esses países poderão ganhar maior presença e visibilidade, além de melhor acesso ao comércio internacional.

Convém destacar ainda o esforço do grupo gestor em garantir a participação equilibrada entre os países, além da representação de todos os grupos de stakeholders envolvidos, e a participação de

organismos multilaterais, que agregam credibilidade à norma: Organização das Nações Unidas (ONU), Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), e a parceria da ISO com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), com a ressalva de que a ISO 26000 será complementar

aos padrões internacionais da OIT. Finaliza-se este tópico comparando a ISO 26000 com a já estabelecida norma brasileira de RS.

ISO 26000 e NBR 16001: uma breve comparação

A reflexão apresentada a seguir consistirá em uma breve análise comparativa entre as características da ISO 26000 e a NBR 16001 – a norma brasileira de responsabilidade social. Esse esboço tem como objetivo indicar os pontos convergentes e divergentes entre as duas práticas.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas, diante de importantes acontecimentos ocorridos na década de 90, decidiu criar, em 2002, um Grupo Tarefa sobre Responsabilidade Social Corporativa

(ABNT/GTRSC) que, posteriormente, passou a se chamar de Grupo Tarefa de Responsabilidade Organizacional (ABNT/GTRO), responsável pela disseminação de conceitos de Gestão da RS e suas ferramentas de apoio no Brasil. Não por acaso, esse foi o grupo que representou o Brasil na

elaboração da ISO 26000. Em paralelo ao processo de desenvolvimento da 26000, a elaboração da norma brasileira de requisitos mínimos para um sistema de gestão da Responsabilidade Social (ABNT/NBR 16001) foi concluída em setembro de 2004.

A ABNT define a RS como a “relação ética e transparente da organização com todas as suas partes interessadas, visando ao desenvolvimento sustentável”. A partir dessa definição, pode-se concluir que

o foco da norma brasileira é a busca da transparência com os stakeholders, diferentemente da ISO 26000, que contempla esse aspecto, mas é bem mais abrangente, buscando influenciar uma mudança

na cultura organizacional. Diferentemente da ISO 26000, a NBR 16001 é uma norma de especificidades e, portanto, exige

certificação. A norma brasileira se baseia no mesmo sistema de gestão das ISOs 9001 e 14001 – o modelo PDCA (plan, do, check, act). Ela possui os requisitos necessários para que a organização saiba trabalhar com o seu público interno (funcionários e colaboradores), além da busca pela relação ética

com outros públicos, como Governos, ONGs, sindicatos, comunidades e imprensa. Apesar de seu caráter inovador, a norma ainda possui um perfil empresarial e é limitada na sua capacidade de atrair um público potencial que poderia adotar suas especificações.

Atender aos requisitos da norma brasileira não significa que a organização seja socialmente responsável, mas, sim, que ela possui um sistema de gestão de Responsabilidade Social. Já a ISO

26000 dirige-se às organizações que encaram a responsabilidade social como uma filosofia corporativa, muito mais do que apenas um sistema inovador de gestão (CHELEGON, 2008).

4.7. Considerações finais A norma ISO 26000 pretende ser a grande referência sobre responsabilidade social em todo o mundo. É o primeiro documento sobre o assunto que apresenta um conteúdo amplo e foi construído com base

no consenso entre diferentes representantes do mundo inteiro. Não se pode negar que a criação de uma norma em RS – com aceitação mundial, devido à credibilidade da ISO – poderá facilitar a troca de experiência e o melhor entendimento da temática. Ademais, eliminará (no sentido positivo)

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procedimentos e interpretações diferenciadas de acordo com cada país. Por outro lado, o que não pode acontecer é que tal definição ponha um ponto final no assunto. Em outras palavras,

Responsabilidade Social é um conceito relacionado ao comportamento da sociedade e, como tal, é dinâmico, e assim deve se manter.

Com a padronização desse conceito, espera-se ainda diferenciar de vez a ação filantrópica da ação socialmente responsável. O Brasil, apesar das suas ações isoladas e mais focadas na filantropia, deu um grande passo no sentido da modernização, para o qual pesou o fato de liderar o processo de

construção da nova norma. Mesmo próximo de seu lançamento, algumas questões críticas levantadas anteriormente (por exemplo, se a norma gerará um certificado, como suas antecessoras, as séries

9000 e 14000) ainda são válidas e espera-se também que continuem em debate após a publicação da ISO 26000.

A transparência nas ações imposta por lei ou por pressão passará a ser fomentada pelas empresas, uma vez que estas percebem as vantagens de ouvir os seus stakeholders que, por sua vez, sentem-se mais seguros e importantes quanto ao seu papel na sociedade ao interagirem e fazerem parte do

negócio da organização. A privacidade das empresas também sai fortalecida quando ela está preparada para enfrentar qualquer tipo de pressão, interna ou externa.

Finalmente, espera-se ter deixado claro que a responsabilidade social deve estar internalizada na cultura organizacional de tal forma que prepare a empresa para enfrentar os enormes desafios que envolvem o desenvolvimento sustentável e que a organização que pretenda seguir os princípios de

RSE deve começar a fazê-lo a partir da sua própria mobilização interna: é essa transformação que se pode esperar nas próximas décadas.

A sinergia Estado/Sociedade Impulsionado pelo imperativo da preservação ambiental, novas formas de articulação de interesses

estão sendo introduzidas pelas empresas, procurando despertar o empreendedorismo das comunidades através da construção de capacitação institucional de suas organizações.

Ao se revisarem a noção de sustentabilidade (a manutenção do estoque de recursos e da qualidade ambiental para a satisfação das necessidades básicas das gerações atuais e futuras), constata-se que

a sustentabilidade do desenvolvimento requer justamente um mercado regulado e um horizonte de longo prazo para as decisões públicas. Embora variáveis, como longo prazo e gerações futuras, tenham sido historicamente ignoradas pelo mercado, presencia-se uma relação mais equilibrada entre

sociedade e mercado, sobretudo porque a auto regulação ambiental e social transformou-se em estratégia competitiva. A pergunta que ainda não foi respondida é como financiar essa forma de desenvolvimento que demanda investimentos de longo prazo, sem o concurso da comunidade

financeira. Contudo, mais desafiante do que conquistar o mercado financeiro será convencer a sociedade de que a empresa privada – e não o Estado –, deve ser o condutor dessa transição em direção a uma economia sustentável.

A última pesquisa sobre a percepção do consumidor brasileiro, patrocinada pelo Instituto Ethos, revelou que, no quesito “Atribuição de Responsabilidade”, 37% dos mais de mil entrevistados pensam

que cabe ao Governo o papel de fiscalizar para que as empresas não poluam o meio ambiente. O espaço para a chamada auto regulação, portanto, ainda não inspira confiança e o Estado ainda é visto

como o principal regulador dessa prática. Face ao exposto, conclui-se que um projeto de sociedade sustentável será construído com base na

inter-relação, democraticamente estruturada, entre todos os atores sociais, estando a questão da coordenação condicionada às condições existentes, e aos mecanismos disponíveis, em cada contexto

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no qual esse relacionamento se expressa. De concreto, é preciso superar a dicotomia "menos ou mais Estado" e buscar a eficácia relativa das diferentes estruturas sociais.

Revisão de Conteúdo

Nesta Unidade, você conheceu como aconteceu o movimento da RSE no setor financeiro, o ambiente institucional no qual a empresa atua; identificou seus interlocutores qualificados para formação de

parcerias e alianças, com destaque para os Princípios do Equador, e os ISRs, com destaque para a Norma ISO 26000.

Questões para refletir/responder: 1- Como aconteceu o movimento no RSE no setor financeiro? 2- Quais os principais marcos institucionais?

3- O que são os ISRs? 4- O que é a Norma ISO 26000 e quais suas principais características?

Atividade: O dilema em estar assumindo funções do poder público é vivenciado pela maioria das empresas. Explique as razões deste impasse e dê sugestões de como a empresa deve agir para evitá-lo, sem

negligenciar sua responsabilidade social.

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Responsabilidade Socioambiental

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Responsabilidade Socioambiental

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ANEXO 01: CRONOLOGIA DA RESPONSABILIDADE SOCIAL NO SETOR FINANCEIRO

2008

Serasa lança o produto Relatório de Responsabilidade Social que incorpora questões sociais

na avaliação de risco de crédito. Unibanco Asset Management (UAM) e Banco Real Asset Management aderem ao Principles for

Responsible Investment (PRI). Banco Real lança o CDB Sustentável, título de renda fixa com foco socioambiental. Banco do Brasil, Banco da Amazônia, Banco do Nordeste do Brasil, Caixa Econômica Federal e

BNDES reeditam o Protocolo Verde. Banco HSBC lança linhas de crédito com foco socioambiental. Banco Unibanco obtém linha de crédito inédita da IFC para financiamento de projetos nas

áreas de energia renovável, eficiência energética e construção sustentável. BNDES cria o Fundo Brasil Sustentabilidade, primeiro fundo de investimento do país voltado

para o desenvolvimento de projetos ambientais.

Banco Itaú lança política de crédito com classificação do risco socioambiental dos clientes corporativos.

2007

Banco Rabobank lança programa de créditos de carbono para incentivar o reflorestamento de áreas desmatadas ilegalmente na Amazônia.

Banco Bradesco anuncia o lançamento de produtos com foco socioambiental que irão gerar

recursos financeiros para a Fundação Amazônia Sustentável. Banco Bradesco lança o Banco do Planeta, área dedicada a centralizar e ampliar todos os seus

projetos e iniciativas socioambientais. Bolsa de Mercadorias & Futuros – BM&F realiza primeiro leilão público de créditos do carbono

do mundo.

Unibanco, em convênio com o Japan Bank for International Cooperation – JBIC –, cria linha de financiamento para projetos de comercialização de créditos de carbono.

Serasa lança o produto Relatório de Responsabilidade Ambiental, que incorpora questões

ambientais na avaliação de risco de crédito. IFC e Centro de Estudos em Sustentabilidade – FGV/SP – lançam o Fórum Latino-Americano

sobre Finanças Sustentáveis – LASFF.

Cerca de 50 instituições financeiras globais são signatárias dos Princípios do Equador, representando cerca de 90% do mercado de project finance no mundo.

Caixa Econômica Federal e Banco Banif lançam fundo Caixa Ambiental, primeiro fundo com

foco em projetos do setor de saneamento básico e meio ambiente. Banco Unibanco e Caixa Econômica Federal lançam fundos atrelados ao ISE.

2006 Banco Bradesco é incluído no Dow Jones Sustainability Index. IFC aprova suas novas políticas socioambientais.

Bancos privados lançam nova versão dos Princípios do Equador, com ratificação dos bancos brasileiros.

Rabobank lança política socioambiental com critérios para o setor rural. Banco Bradesco inicia diálogo com seus fornecedores sobre responsabilidade socioambiental. Bancos Itaú, Bradesco e ABN Amro Real lançam produtos com foco socioambiental.

Banco Bradesco cria área de responsabilidade socioambiental.. Bancos HSBC, Bradesco e Safra lançam fundos atrelados ao ISE. Rede BankTrack lança manual "O que Fazer e o que Não Fazer em um Banco Sustentável".

Banco HSBC lança política específica para o setor de energia.

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Banco ABN Amro Real lança fundo de investimento em infraestrutura com sistema de gestão

ambiental - Fundo InfraBrasil.

Ocorre o lançamento do Principles for Responsible Investment (PRI), com adesão pioneira do fundo de pensão Previ.

Rede BankTrack lança campanhas específicas para monitorar bancos de países emergentes e

os direitos humanos em instituições financeiras.

2005

Banco Bradesco cria comitê e política socioambiental corporativa. Banco do Brasil adere aos Princípios do Equador e adota critérios socioambientais no

financiamento de projetos não enquadrados nos Princípios do Equador. Banco Itaú aprimora suas políticas socioambientais, cria Comissão de Responsabilidade

Socioambiental e adota critérios socioambientais no financiamento de projetos não

enquadrados nos Princípios do Equador. Banco HSBC lança políticas específicas para os setores de infraestrutura de água doce e

químico.

Banco ABN Amro inicia o lançamento de políticas específicas para setores mais sensíveis a impactos socioambientais.

Banco ABN Amro Real amplia sua linha de produtos com foco socioambiental.

Banco ABN Amro Real inicia negócios com créditos de carbono. Banco do Brasil lança fundo atrelado ao ISE. Bovespa lança o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE).

Organizações da sociedade civil começam a monitorar o envolvimento dos bancos nos projetos da IIRSA1.

Fundo de pensão Petros adota critérios socioambientais para seleção da carteira de ações.

Banco Itaú lança produtos com foco socioambiental. CEBDS2 cria a Câmara Técnica de Finanças Sustentáveis, cujos membros são os bancos do

Brasil, ABN Amro Real, Itaú, Bradesco, Caixa Econômica Federal e a Bolsa de Mercadorias &

Futuros – BM&F. Banco ABN Amro lança política para o setor de jogos e política ética e social de países.

2004

Rede BankTrack é formalmente constituída.

Bancos Unibanco, Itaú e Bradesco aderem aos Princípios do Equador. Seguradora Unibanco AIG lança seguro ambiental. Banco Itaú lança fundo Excelência Social. Banco HSBC lança política para o setor florestal. Acontece a primeira reunião entre a Rede BankTrack e os bancos signatários dos Princípios do

Equador.

Banco ABN Amro Real lança produtos com foco socioambiental. Banco ABN Amro lança política para o setor de mineração e metalurgia.

2003 Dez bancos internacionais lançam os Princípios do Equador. Organizações da sociedade civil lançam a Declaração de Collevecchio: 1ª declaração das

ONGs sobre o papel do setor financeiro e a sustentabilidade. Banco ABN Amro lança políticas para os setores de defesa e de petróleo e gás.

Banco do Brasil lança a estratégia de Desenvolvimento Regional Sustentável, que visa apoiar práticas de apoio a atividades produtivas de forma sustentável.

2002 Banco ABN Amro Real adota política de riscos socioambientais.

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2001

Banco ABN Amro Real lança fundo Ethical.

Banco ABN Amro Real inicia diálogo com seus fornecedores sobre responsabilidade social. ABN Amro lança política para o setor de florestas e reflorestamento.

2000 Amigos da Terra – Amazônia Brasileira dá início ao projeto Eco-Finanças. Campanhas internacionais da sociedade civil sobre projetos financiados por bancos privados

ganham maior visibilidade.

1999 Banco Itaú é incluído no DJSI. Bolsa de Nova York lança o Dow Jones Sustainability Index (DJSI).

(1) Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana: iniciativa dos 12 Governos sul-americanos para implantação de projetos de infra-estrutura www.iirsa.org. (2) Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.

FONTE: site Finanças Sustentáveis (www.financassustentaveis.com.br). Acesso em 10-05-2010.

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ANEXO 02 - O Banco do Brasil e a responsabilidade socioambiental Com o objetivo de aderir aos princípios da Agenda 21 e sustentando suas metas de comprometimento com o desenvolvimento sustentável de seus negócios, o Banco do Brasil criou sua Agenda 21 Empresarial. O Banco assumiu com essa iniciativa, o papel orientador e catalisador no processo de

criação das agendas 21 empresariais em nível nacional, estimulando outras empresas a se engajarem na questão. O Banco assina, ainda, protocolo com o MMA no sentido de disseminar a Agenda 21 nos

projetos de Desenvolvimento Regional Sustentável. O tema da responsabilidade socioambiental passou a ser pauta das decisões estratégicas e

operacionais do Banco do Brasil com a criação da Unidade Relações com Funcionários e Responsabilidade Socioambiental (RSA). A definição de um conceito e de uma carta de princípios de responsabilidade socioambiental para o Banco do Brasil se fez importante para fundamentar e

direcionar as ações e movimentos voltados à internalização da cultura de responsabilidade socioambiental no Conglomerado.

Com a definição do Conceito e da Carta de Princípios, evidenciou-se a intenção estratégica do Banco do Brasil em conciliar o atendimento aos interesses dos seus acionistas com o desenvolvimento de negócios social e ambientalmente sustentáveis, mediante a incorporação daqueles princípios a seus

produtos, serviços, negócios e rotinas administrativas. Além disso, explicitou-se o interesse em contribuir para o desenvolvimento de um novo sistema de valores para a sociedade que tenha como referencial maior o respeito à vida humana e ao meio ambiente, condição indispensável à

sustentabilidade da própria humanidade. Dessa forma, o Banco do Brasil cuida para que seus negócios gerem resultados econômicos, sob a forma de lucros e participação no mercado, ao mesmo

tempo em que busca resultados sociais e ambientais, sob a forma de inclusão social, geração de trabalho e renda e respeito ao meio ambiente.

Dimensões estratégicas e pragmáticas da Agenda 21 do BB e seus Objetivos 1. DIMENSÃO NEGÓCIOS COM FOCO NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

1.1 Implementar ações de apoio ao desenvolvimento sustentável. 1.2 Financiar atividades de geração de trabalho e renda e de inclusão social. 1.3 Financiar atividades e tecnologias ambientalmente adequadas.

2. DIMENSÃO PRÁTICAS ADMINISTRATIVAS E NEGOCIAIS COM RSA 2.1 Disseminar os princípios e fortalecer a cultura de RSA na Comunidade BB.

2.2 Manter processos administrativos coerentes com os Princípios de RSA. 2.3 Manter processos negociais coerentes com os Princípios de RSA. 2.4 Fortalecer a interação com os públicos de relacionamento.

2.5 Influenciar a incorporação dos princípios de RSA no País.

3. DIMENSÃO INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO 3.1 Contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população brasileira. 3.2 Apoiar programas relacionados à consciência e preservação ambiental.

3.3 Apoiar programas relacionados à defesa e à promoção dos direitos humanos. 3.4 Captar recursos para apoiar ações vinculadas ao desenvolvimento social. 3.5 Incentivar a atuação dos funcionários em trabalhos voluntários e ações sociais.

Diante desses novos objetivos, o Banco do Brasil criou o Painel do Desenvolvimento Sustentável, uma ferramenta que está em desenvolvimento e que permitirá acompanhar e avaliar as ações do Banco

com relação ao desenvolvimento sustentável e, em especial, à contribuição do Banco do Brasil para o desenvolvimento sustentável do País. O painel propicia também, a partir da comparação com outras

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iniciativas na indústria financeira, a indicação de áreas ou setores nos quais o Banco pode construir vantagem competitiva ou diferenciação em termos de RSA. Para tornar operacional o Painel, elaborou-se um ensaio de indicadores inspirados em iniciativas que são referências em relatos de sustentabilidade em nível nacional (Ethos, Ibase, Febraban) e internacional (Global Reporting Initiative) para cada conjunto de objetivos definidos no painel. Entre 2003 e 2006, a implementação da Agenda 21 do BB resultou no desenvolvimento de várias ações, envolvendo diversas áreas do BB. Essas iniciativas permitiram que o Banco obtivesse

desempenho superior em cinco das sete dimensões avaliadas a partir dos Indicadores Ethos, quando comparado o resultado de 2004 com o do ano anterior, com especial destaque para a dimensão

“relação com fornecedores”.

Responsabilidade socioambiental na prática Além de aderir ao Pacto Global da ONU em 2003, o Banco do Brasil também participou da elaboração do relatório Who Care Wins – Connecting Financial Markets to a Changing World - de iniciativa

também da ONU, com recomendações para a indústria financeira melhor integrar questões ambientais, sociais e de governança nas suas análises de financiamento, gestão de ativos e seguridade.

Diante da preocupação com o impacto socioambiental de grandes projetos financiados com recursos creditícios, o Banco do Brasil decidiu aderir aos Princípios do Equador, sendo o primeiro banco a

integrar oficialmente o grupo de instituições financeiras que aderiu aos Princípios. Alem disso, o Banco do Brasil também vem promovendo intensos debates sobre o assunto, workshops e eventos (como o prêmio Ethos), com o objetivo de colaborar sempre com o movimento de estimulo ao engajamento

das empresas em relação à Responsabilidade socioambiental.

Responsabilidade socioambiental para o Banco do Brasil é “ter a ética como compromisso e o

respeito como atitude nas relações com funcionários, colaboradores, fornecedores, parceiros, clientes, credores, acionistas, concorrentes, comunidade, Governo e meio ambiente”.

Carta de Princípios de Responsabilidade Socioambiental - Banco do Brasil. Diretoria Relações com Funcionários e Responsabilidade Socioambiental - Dire BB se compromete a: 1. Atuar em consonância com Valores Universais, tais como: Direitos Humanos, Princípios e Direitos

Fundamentais do Trabalho, Princípios sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento; 2. Reconhecer que todos os seres são interligados, e toda forma de vida é importante; 3. Repelir preconceitos e discriminações de gênero, orientação sexual, etnia, raça, credo ou de

qualquer espécie; 4. Fortalecer a visão da Responsabilidade Socioambiental como investimento permanente e necessário para o futuro da humanidade;

5. Perceber e valer-se da posição estratégica da corporação BB, nas relações com o Governo, o Mercado e a Sociedade Civil, para adotar modelo próprio de gestão da Responsabilidade Socioambiental à altura da corporação e dos desafios do Brasil contemporâneo;

6. Ter a transparência, a ética e o respeito ao meio ambiente como balizadores das práticas administrativas e negociais da Empresa;

7. Pautar relacionamentos com terceiros a partir de critérios que observem os princípios de responsabilidade socioambiental e promovam o desenvolvimento econômico e social; 8. Estimular, difundir e implementar práticas de desenvolvimento sustentável;

9. Enxergar clientes e potenciais clientes, antes de tudo, como cidadãos;

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10. Estabelecer e difundir boas práticas de governança corporativa, preservando os compromissos com acionistas e investidores;

11. Contribuir para que o potencial intelectual, profissional, artístico, ético e espiritual dos funcionários e colaboradores possa ser aproveitado, em sua plenitude, pela sociedade; 12. Fundamentar o relacionamento com os funcionários e colaboradores na ética e no respeito.

13. Contribuir para a universalização dos direitos sociais e da cidadania; 14. Contribuir para a inclusão de pessoas com deficiência.

Alguns exemplos de RSA realizados pelo Banco do Brasil

O Banco do Brasil caracteriza-se como um Banco de múltiplas funções, agindo como banco comercial (crédito geral), banco setorial (crédito rural) e banco de desenvolvimento (gestor do Fundo Constitucional para a Região Centro-Oeste). Em consonância com sua diversidade de atuação, a

variável ambiental é tratada em diversas normas e recomendações. Em financiamentos industriais, o licenciamento ambiental é exigido e, para o financiamento da

comercialização da pesca, madeira, borracha e outros produtos extrativos, as normas internas se tornam ainda mais rigorosas. Por exemplo, o Banco não financia serrarias que utilizam madeiras oriundas de floresta nativa. Com relação ao crédito rural, o Banco do Brasil possui convênios com

empresas de assistência técnica, que se comprometem a recomendar tecnologias de produção exequíveis, dotadas de práticas conservacionistas adequadas à defesa do solo e do meio ambiente, consoante a legislação ambiental vigente.

Com relação aos recursos do Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO), principal fonte de recursos internos para operações incentivadas de longo prazo geridas pelo Banco do Brasil é exigido, na

apresentação dos projetos, o cumprimento da legislação ambiental, especialmente naqueles relativos ao controle e preservação do meio ambiente e equilíbrio ecológico. Em projetos de reforma agrária, é

incluída a cláusula contratual de comprometimento do devedor em conservar o meio ambiente obedecendo a critérios técnicos e legais de preservação das matas ciliares, encostas e topos de morro, de conservação do solo e água, da utilização do manejo integrado de pragas, de proteção dos

mananciais, de proteção da fauna e da flora e outras considerações de conservação ambiental indicadas na Constituição Federal e nas Constituições Estaduais. Isso também é válido para o Programa Especial de Crédito para a Reforma Agrária (Procera).

Em janeiro de 2005, foi instalado pelo Ministério da Fazenda um Grupo de Trabalho Interministerial, que contou com a participação do BB, denominado Crédito para o Desenvolvimento Sustentável. Entre

as diretrizes estabelecidas, ficou acordado, de forma consensual, que a reestruturação do Protocolo Verde conferiria condições institucionais para a transformação dos créditos oficiais e privados em instrumentos de indução efetiva do desenvolvimento das atividades produtivas, utilizando critérios

ambientais.

Índice de sustentabilidade empresarial da Bovespa O Banco do Brasil também faz parte do grupo de empresas selecionadas para compor o Índice de

Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bolsa de Valores de São Paulo, criado em 2005. O índice, utilizado como referência para o fundo de investimento BB Ações Índice de Sustentabilidade Empresarial, reúne empresas que se pautam pelo respeito ao meio ambiente, responsabilidade social

e indicadores financeiros saudáveis. A avaliação da sustentabilidade segue o critério internacional do triple bottom line, que avalia, de forma integrada, dimensões econômico-financeiras, sociais e ambientais das empresas. A participação do Banco do Brasil no índice representa um significativo

reconhecimento de mercado quanto ao BB ser uma empresa que gera valor para os seus acionistas de uma forma social e ambientalmente responsável. Essa prática torna, também, a ação do BB mais

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atrativa, uma vez que os investidores estão associando as ações de sustentabilidade social e ambiental das empresas com a perspectiva de menores riscos e de lucros.

Protocolo Verde

O denominado Protocolo Verde teve sua origem em um Grupo de Trabalho instituído pelo Governo Federal por meio de decreto, em 29 de maio de 1995. Seu objetivo era elaborar uma proposta contendo diretrizes, estratégias e mecanismos operacionais para a incorporação de dimensões

ambientais no processo de gestão, concessão de crédito oficial e benefícios fiscais às atividades produtivas. A intenção era implementar mecanismos financeiros que complementassem e, ao mesmo

tempo, criassem sinergias com a legislação ambiental existente, com a institucionalidade pública que estava sendo implantada, com os dispositivos de comando e controle e com outros instrumentos econômicos na área ambiental, objetivando a consolidação de políticas públicas coerentes e

consistentes. Acompanhando uma tendência que então começava a despontar no cenário financeiro internacional, e

em uma perspectiva pioneira na região latino-americana, o Governo brasileiro buscou definir linhas de ação com compromissos ambientais para o sistema de bancos públicos federais. A incorporação da dimensão ambiental pelos bancos viria a ter efeitos potencializadores, por meio de todo o sistema de

crédito público, sobre as práticas ambientais vigentes no conjunto das atividades produtivas desenvolvidas por multiplicidade de agentes econômicos no conjunto do território brasileiro. Essa difusão e incorporação de práticas de proteção ambiental teriam como consequência, a mudança de

comportamentos dos tomadores de decisões e, em última instância, viria a dar origem a uma nova cultura ambiental.

O Protocolo Verde, por sua vez, consiste de uma carta de princípios para o desenvolvimento sustentável firmada por bancos em 1995 (Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Banco da Amazônia,

BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco Central do Brasil), na qual se propõem a empreender políticas e práticas que estejam sempre e cada vez mais em harmonia com o objetivo de promover um desenvolvimento que não comprometa as necessidades das gerações futuras.

Em função dos objetivos do Protocolo, as instituições financeiras federais assinaram a denominada Carta de Princípios para o Desenvolvimento Sustentável, um documento que possui, sem dúvida, um

caráter pioneiro no marco latino-americano como compromisso de um sistema financeiro público com princípios de implementação de políticas ambientais.

Banco do Brasil face ao mercado de créditos de carbono e Protocolo de Quioto Um dos problemas ambientais mais preocupantes deste século é o aquecimento global – sendo

causado pela intensificação do efeito estufa, vem provocando o derretimento das geleiras, aumento do nível do mar, desertificação, alteração no suprimento de água doce e eventos climáticos extremos. Essa intensificação, por sua vez, ocorre pelo aumento da concentração de gases de efeito estufa

(GEE) na atmosfera, tais como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), oriundos, principalmente, da queima de combustíveis fósseis (petróleo e carvão mineral), lixões,

aterros sanitários, processos industriais e atividades agropastoris. Na busca de soluções para a questão climática, foi criada a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC) na Rio-92, com o objetivo principal de estabelecer ações que levassem à estabilização da

concentração de GEE na atmosfera, em níveis adequados para o clima do planeta. Durante a Rio-92, foi estabelecido que os países signatários da CQNUMC se reuniriam anualmente em busca de soluções para a questão climática. Os encontros foram denominados Conferências das

Partes (COP). Dentre as Conferências realizadas até 2005, é de se destacar a COP 3, em Quioto, Japão, ocorrida em 1997, na qual foi elaborado o Protocolo de Quioto. Este, por sua vez, estabelece

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metas de redução de emissão de GEE para os países que historicamente foram os que contribuíram de forma mais intensa para o aumento da concentração atmosférica de GEE, em função do seu nível

de industrialização (denominados no Protocolo como Partes Anexo I). Essas metas deverão ser atingidas entre 2008 e 2012, produzindo uma redução em média de 5,2% nas emissões em relação aos níveis verificados no ano de 1990.

O Protocolo estabelece que as metas deverão ser cumpridas por meio de políticas públicas e regulamentações que limitem diretamente as emissões. Além das ações de caráter nacional, os países

afetados pelo protocolo poderão utilizar algumas alternativas para auxiliá-los no cumprimento de suas metas, chamadas de mecanismos de flexibilização, a saber: Comércio de Emissões; Implementação

Conjunta; e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Dentre os mecanismos de flexibilização, o mais importante para o Brasil é o MDL, que viabiliza projetos que reduzam emissões de GEE. Esses projetos geram Reduções Certificadas de Emissões (RCE), denominadas “créditos de carbono”, que

podem ser adquiridos por países do Anexo 1 como forma de cumprir parte de suas metas. O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) nasceu de uma proposta brasileira à CQNUMC para

tratar do comércio de créditos de carbono baseado em projetos de sequestro ou mitigação. O MDL é um instrumento de flexibilização que permite a participação no mercado dos países em desenvolvimento, ou nações sem compromissos de redução, como o Brasil. Os países que não

conseguirem atingir suas metas terão a liberdade para investir em projetos MDL de países em desenvolvimento. Por meio desse mecanismo, países desenvolvidos comprariam créditos de carbono, equivalentes em tonelada de CO2, de países em desenvolvimento responsáveis por tais projetos.

O Brasil deve se beneficiar desse cenário como vendedor de créditos de carbono e também como alvo de investimentos em projetos engajados com a redução da emissão de gases poluentes. Sendo assim,

O MDL visa ao alcance do desenvolvimento sustentável em países em desenvolvimento (país anfitrião), a partir da implantação de tecnologias mais limpas nessas nações, e a contribuição para que os países do Anexo I cumpram suas reduções de emissão.

O primeiro projeto de MDL, aprovado pela ONU no mundo foi o do aterro sanitário de Nova Iguaçu,

no Estado do Rio de Janeiro, Brasil, que utiliza tecnologias bem precisas de engenharia sanitária, tendo os créditos de carbono sido negociados diretamente com os Países Baixos.

O Banco do Brasil decidiu ter uma atuação efetiva no sentido de se posicionar como referência no mercado por meio do desenvolvimento de políticas, diretrizes e soluções específicas para o mercado de créditos de carbono: no curto prazo, com ações que não requerem a criação de novos produtos e

serviços e não envolvem mudanças de estrutura do mercado; no médio e longo prazos, com a avaliação da necessidade de ações que requerem o desenvolvimento de produtos e serviços específicos.

Em março de 2005, Banco do Brasil, Brasilprev e Previ, juntamente com os principais investidores institucionais no mundo, manifestaram formalmente apoio ao pedido de abertura de informações

sobre a emissão de gases de efeito estufa, enviado as 500 maiores empresas do mundo. Além de coerente com a postura de responsabilidade socioambiental do Banco do Brasil, que prevê ponderações acerca dos impactos sociais e ambientais das práticas administrativas e negociais –

considerados aí os investimentos realizados –, o apoio à iniciativa vem ao encontro dos interesses em causa.

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ANEXO 03 - CARTA DA TERRA

Preâmbulo

Vive-se de um momento crítico na História da Terra, numa época em que a humanidade deve

escolher o seu futuro. Na medida em que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro reserva, ao mesmo tempo, grande perigo e grande esperança. Para seguir adiante, deve-se reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, há uma família

humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Deve-se juntar todos para gerar uma sociedade sustentável global fundada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a esse propósito, é imperativo os povos da

Terra, declarem a sua responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade de vida e com as futuras gerações.

Terra, nosso lar

A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, lar de todos, é viva como uma comunidade de vida incomparável. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de

recuperação da comunidade de vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação

comum de todos os povos. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado.

A Situação Global

Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e uma massiva extinção de espécies comunidades estão sendo arruinadas. Os benefícios

do desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e a diferença entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causas de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os

sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não inevitáveis.

Desafios Futuros

A escolha é da sociedade: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscar a sua destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais em nossos valores, instituições e modos de vida. Deve-se entender que, quando as necessidades básicas forem

supridas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais e não a ter mais. Tem-se o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir os impactos no meio

ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Os desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos podem-se forjar soluções inclusivas.

Responsabilidade Universal

Para realizar essas aspirações, deve-se decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificado com a comunidade terrestre como um todo, bem como com as comunidades locais. Ao

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mesmo tempo, existem cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um compartilha responsabilidade pelo presente e pelo futuro bem-estar da

família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando se vive com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida e com humildade em relação ao lugar que o ser humano ocupa na

natureza.

Necessita-se, com urgência, de uma visão compartilhada de valores básicos para proporcionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na esperança, afirmam-se os

princípios a seguir discriminados, interdependentes, visando a um modo de vida sustentável como padrão comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas,

Governos e instituições transnacionais será dirigida e avaliada.

Princípios Carta da Terra

I. Respeitar e Cuidar da Comunidade de Vida 1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.

a. Reconhecer que todos os seres são interdependentes e cada forma de vida tem valor, independentemente de sua utilidade para os seres humanos;

b. Afirmar a fé na dignidade inerente a todos os seres humanos e no potencial intelectual,

artístico, ético e espiritual da humanidade.

2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.

a. Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais, vem o dever de prevenir os danos ao meio ambiente e de proteger os direitos das pessoas;

b. Assumir que, com o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder, vem a

maior responsabilidade de promover o bem comum.

3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.

a. Assegurar que as comunidades, em todos os níveis, garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais e proporcionem a cada pessoa a oportunidade de realizar seu pleno potencial;

b. Promover a justiça econômica e social, propiciando a todos a obtenção de uma condição de vida significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.

4. Assegurar a generosidade e a beleza da Terra para as atuais e às futuras gerações.

a. Reconhecer que a liberdade de ação de cada geração é condicionada pelas necessidades das

gerações futuras; b. Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apoiem a prosperidade das

comunidades humanas e ecológicas da Terra a longo prazo.

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II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA

5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com especial atenção à diversidade biológica e aos processos naturais que sustentam

a vida.

a. Adotar, em todos os níveis, planos e regulamentações de desenvolvimento sustentável que façam com que a conservação e a reabilitação ambiental sejam parte integral de todas as

iniciativas de desenvolvimento; b. Estabelecer e proteger reservas naturais e da biosfera viáveis, incluindo terras selvagens e

áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, manter a

biodiversidade e preservar a herança natural da humanidade; c. Promover a recuperação de espécies e ecossistemas ameaçados; d. Controlar e erradicar organismos não nativos ou modificados geneticamente que

causem dano às espécies nativas e ao meio ambiente e impedir a introdução desses organismos prejudiciais;

e. Administrar o uso de recursos renováveis como água, solo, produtos florestais e vida marinha

de forma que não excedam às taxas de regeneração e que protejam a saúde dos ecossistemas;

f. Administrar a extração e o uso de recursos não renováveis, como minerais e combustíveis

fósseis de forma que minimizem o esgotamento e não causem dano ambiental grave.

6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e,

quando o conhecimento for limitado, assumir uma atitude de precaução.

a. Agir para evitar a possibilidade de danos ambientais sérios ou irreversíveis, mesmo quando o conhecimento científico for incompleto ou não conclusivo;

b. Impor o ônus da prova naqueles que afirmarem que a atividade proposta não causará dano significativo e fazer com que as partes interessadas sejam responsabilizadas pelo dano ambiental;

c. Assegurar que as tomadas de decisão considerem as consequências cumulativas, a longo prazo, indiretas, de longo alcance e globais das atividades humanas;

d. Impedir a poluição de qualquer parte do meio ambiente e não permitir o aumento de

substâncias radioativas, tóxicas ou outras substâncias perigosas; e. Evitar atividades militares que causem dano ao meio ambiente.

7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as

capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário.

a. Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos;

b. Atuar com moderação e eficiência no uso de energia e contar cada vez mais com fontes

energéticas renováveis, como a energia solar e do vento; c. Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência equitativa de tecnologias

ambientais seguras;

d. Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço de venda e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam às mais altas normas sociais e ambientais;

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e. Garantir acesso universal à assistência de saúde que fomente a saúde reprodutiva e a

reprodução responsável;

f. Adotar estilos de vida que acentuem a qualidade de vida e subsistência material num mundo finito.

8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover o intercâmbio

aberto e aplicação ampla do conhecimento adquirido.

a. Apoiar a cooperação científica e técnica internacional relacionada à sustentabilidade, com

especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento; b. Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual em todas as

culturas que contribuem para a proteção ambiental e o bem-estar humano;

c. Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para a proteção ambiental, incluindo informação genética, permaneçam disponíveis ao domínio público

III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÔMICA

9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.

a. Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, alocando os recursos nacionais e

internacionais demandados; b. Prover cada ser humano de educação e recursos para assegurar uma condição de vida

sustentável e proporcionar seguro social e segurança coletiva aos que não são capazes de se

manter por conta própria; c. Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir àqueles que sofrem e habilitá-los a

desenvolverem suas capacidades e alcançarem suas aspirações.

10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma equitativa e sustentável.

a. Promover a distribuição equitativa da riqueza dentro das e entre as nações; b. Incrementar os recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações em

desenvolvimento e liberá-las de dívidas internacionais onerosas;

c. Assegurar que todas as transações comerciais apoiem o uso de recursos sustentáveis, a proteção ambiental e normas trabalhistas progressistas;

d. Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionais

atuem com transparência em benefício do bem comum e responsabilizá-las pelas consequências de suas atividades.

11. Afirmar a igualdade e a equidade dos gêneros como pré-requisitos para o

desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, assistência de saúde e às oportunidades econômicas.

a. Assegurar os direitos humanos das mulheres e das meninas e acabar com toda violência contra elas;

b. Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida econômica, política,

civil, social e cultural como parceiras plenas e paritárias, tomadoras de decisão, líderes e beneficiárias;

c. Fortalecer as famílias e garantir a segurança e o carinho de todos os membros da

família.

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12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente

natural e social capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar espiritual, com especial atenção aos direitos dos povos indígenas e

minorias.

a. Eliminar a discriminação em todas as suas formas, como as baseadas em raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social;

ATENÇÃO: O CONCEITO DE “RAÇA” É INDESEJADO.

b. Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, conhecimentos, terras e recursos, assim como às suas práticas relacionadas com condições de vida sustentáveis;

c. Honrar e apoiar os jovens das comunidades, habilitando-os a cumprir seu papel essencial na criação de sociedades sustentáveis;

d. Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.

IV. DEMOCRACIA, NÃO VIOLÊNCIA E PAZ 13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e prover

transparência e responsabilização no exercício do Governo, participação inclusiva na tomada de decisões e acesso à justiça.

a. Defender o direito de todas as pessoas receberem informação clara e oportuna sobre assuntos ambientais e todos os planos de desenvolvimento e atividades que possam afetá-las ou nos quais tenham interesse;

b. Apoiar sociedades civis locais, regionais e globais e promover a participação significativa de todos os indivíduos e organizações interessadas na tomada de decisões;

c. Proteger os direitos à liberdade de opinião, de expressão, de reunião pacífica, de associação e

de oposição; d. Instituir o acesso efetivo e eficiente a procedimentos judiciais administrativos e

independentes, incluindo retificação e compensação por danos ambientais e pela ameaça de

tais danos; e. Eliminar a corrupção em todas as instituições públicas e privadas;

f. Fortalecer as comunidades locais, habilitando-as a cuidar dos seus próprios ambientes, e atribuir responsabilidades ambientais aos níveis governamentais em que possam ser cumpridas mais efetivamente.

14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável.

a. Prover a todos, especialmente a crianças e jovens, oportunidades educativas que lhes permitam contribuir ativamente para o desenvolvimento sustentável;

b. Promover a contribuição das artes e das humanidades, assim como das ciências, na educação

para sustentabilidade; c. Intensificar o papel dos meios de comunicação de massa no aumento da conscientização

sobre os desafios ecológicos e sociais;

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d. Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma condição de vida

sustentável.

15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração.

a. Impedir crueldades aos animais mantidos em sociedades humanas e protegê-los de sofrimento;

b. Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca que causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável;

c. Evitar ou eliminar ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.

16. Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz.

a. Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações;

b. Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a colaboração na

resolução de problemas para administrar e resolver conflitos ambientais e outras disputa; c. Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até o nível de uma ação defensiva não

provocativa e converter os recursos militares para propósitos pacíficos, incluindo restauração

ecológica; d. Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em

massa;

e. Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico ajude a proteção ambiental e a paz; f. Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, com outras

pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade maior da qual se faz

parte.

O Caminho Adiante Como nunca antes na História, o destino comum conclama a sociedade a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa dos princípios da Carta da Terra. Para cumprir essa promessa, a humanidade

tem-se de comprometer a adotar e a promover os valores e objetivos da Carta. Isso requer uma mudança na mente e no coração dos homens. Requer um novo sentido de

interdependência global e de responsabilidade universal. Deve-se desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável nos níveis local, nacional, regional e global. A diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas encontrarão suas próprias e

distintas formas de realizar essa visão. Deve-se aprofundar e expandir o diálogo global que gerou a Carta da Terra, porque se tem muito a aprender a partir da busca conjunta em andamento por verdade e sabedoria.

A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes, o que pode significar escolhas difíceis. Entretanto, necessita-se encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o

exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade tem um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências,

as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não governamentais e os Governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre Governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva.

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Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos

internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra com um instrumento internacionalmente legalizado e contratual sobre o ambiente e o desenvolvimento.

Que o tempo presente seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação dos esforços pela justiça e pela paz e a alegre celebração da vida.

Fonte: http://www.cartadaterrabrasil.org/prt/text.html