Aprender a Viver Completo

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  • Tn: BusQuETs, M. o. et ai. Temas transversais em educao. So Paulo: tica, 1997.

    MORENO, M. et ai. Conhecimento e mudana: os modelos organizadores na construo do conhecimento. So Paulo: Moderna; Campinas: Editora da Unicamp, 1999a.

    Falemos de sentimentos: a afetividade como um tema transversal na escola. So Paulo: Moderna; Campinas: Editora da Unicamp, 1999b.

    MORIN, E. Introduccin ai pensamiento complejo. Barcelona: Gedisa, 1997.

    O mtodo 1: a natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, Aprender a viver 2002. __ . O mtodo 5: a humanidade da humanidade. Porto Alegre: Josep Maria Pug

    Sulina, 2003. PENAFORTE,]. "John Dewey e as razes filosficas da aprendiza

    gem baseada em problemas". In: MAMEDE, S. E PENAFORTE,]. (orgs.). Aprendizagem baseada em problemas: anatomia de uma nova abordagem educacional. Fortaleza: Hucitec, 2001.

    ]. Les relatons entre IJqffectvit et l'ntellgence dans le ~ve Introduo loppement mental de l'etifnt. Paris: Sorbonne, 1954. __ . O estruturalismo. Rio de Janeiro: Difel, 1979. A inteno deste captulo apresentar uma perspectiva sobre a PUIG,]. M. A construo da personalidade moral. So Paulo: tica, 1998. educao em valores. Para isso, pareceu-nos adequado desenvol

    Democracia e participao escolar. So Paulo: Moderna, 2000. ver quatro temticas encadeadas que consideramos fundamentais RU,]. O que ensinar e por qu: elaborao e desenvolvimento de proje- e que, espero, dem uma viso abrangente sobre esta questo. Na

    tos de formao. So Paulo: Moderna, 2003. primeira parte, "Origem da moralidade", so apresentadas as SASTRE, G.; MORENO, M. Resoluo de conflitos e aprendizagem emo grandes finalidades da educao em valores ou, dito de outro mo

    cional: gnero e transversalidade. So Paulo: Moderna, 2002. do, as aprendizagens ticas fundamentais que hoje deveramos as0.; LITTLEJOHN, S. (orgs.). Novos paradigmas em me segurar. Na segunda parte, "Compartilhamos alguma qualidade

    Porto Alegre: Artmed, 1999. moral?", tentaremos estabelecer os dinamismos morais que, alm

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  • 10R(;.VAIF:
  • Enc< /\O F Vt\LOnFS: PO~TOS E CONTRf\PONTOS

    cao que inclua os principais mbitos da experincia humana e a aprendizagem tica que cada um deles pressupe: aprender a ser, aprender a conviver, aprender a participar e aprender a habitar o mundoS.

    Quatro ticas para aprender a viver

    --I Aprender a

    ser Aprender a conviver

    Aprender a participar

    Aprender a habitar o mundo

    AUTo-trlCA ALTER-trICA SOCIOICA EcomCA

    Aprender a ser Neste ponto nos referimos ao trabalho formativo que cada indivduo realiza consigo mesmo para liberar-se de certas limitaes, para construir uma maneira de ser desejada e para conseguir o maior grau possvel de autonomia e de responsabilidade. No fato de aprender a ser h uma dupla tarefa: fazer-se como cada um deseja e utilizar a prpria maneira de ser como ferramenta para tratar das questes que a vida apresenta.

    5. Citar todas as obras relevantes para cobrir estes quatro de aprendizagem tica seria uma tarefa interminvel. Portanto, vamos nos limitar resenha de

    poucas obras significativas para justificar a apresentao que propomos: Delors, 1996;]onas, 1995; Morin, 2004.

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    ViUj'H.IA AMoluM ARANTES (ORCi,)

    Quando se enfraquecem as certezas sobre o que correto e o que no , quando a pluralidade moral torna mais dificil orientar a prpria conduta, quando em muitas reas impem-se a superficialidade e a aparncia em detrimento da vida interior e do sentido daquilo que se faz, mais necessrio que nunca construir uma tica pessoal que reforce a individualidade como instrumento de valorao e conduo, Aprender a ser construir uma tica de si mesmo: a auto-tica. Uma tica que no deve ser entendida como forma de egosmo ou de individualismo, mas como produto de condies histricas que permitem maiores graus de individualizao em oposio presso uniformizadora das ticas tradicionais de carter heternomo.

    O que se quer com aprender a ser edificar uma tica pessoal que inclua, pelo menos, os seguintes aspectos: primeiro, a formao de um pensamento autnomo e crtico que permita constituir um critrio prprio e seja capaz de determinar por si mesmo o que se deve fazer nas diferentes situaes vitais, edificar a autonomia e a responsabilidade; segundo, desenvolver a sensibilidade moral que predispe a indignar-se diante daquelas situaes consideradas inaceitveis e gerar reservas de motivao para provocar o compromisso, colocar disposio os sensores e os motores morais; terceiro, construir as capacidades que regulam a prpria conduta ou disponibilizam as foras que nos ajudaro a orientar a conduta de acordo com os prprios critrios, reforar a vontade e a auto-regulao; quarto, exercitar as capacidades de auto-observao que incrementam a transparncia e a coerncia, assim como potencializar o trabalho sobre si mesmo para edificar uma maneira de ser que permita um alto nvel de amorprprio, modelar o carter; e quinto, incrementar a conscincia

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  • EDCC/\O F VALORFS: Pt)l" f OS I"" COi"
  • EDUCAO E VALlIHES: por, TOS E CON I RAI'ONTOS

    Aprender a participar A terceira tarefa de aprender a viver est centrada na aprendizagem da vida em comum. Um processo que consiste em fazer parte de uma coletividade alcanando um bom nvel de civismo, ou respeito pelas normas e hbitos pblicos, e convrtendo-se num cidado ativo. Isto , ser uma pessoa capaz de exigir os direitos que lhe correspondem e ao mesmo tempo sentir a obrigao de cumprir os deveres e manifestar as virtudes cvicas necessrias que contribuam para a organizao democrtica da convivncia. Portanto, a aprendizagem da vida em comum o esforo para ser um membro cvico e um cidado ativo numa sociedade democrtica e participativa.

    Quando o controle das decises sobre como se deve viver se afasta cada vez mais e se torna mais inacessvel; quando uma sociedade altamente diversa se fragmenta e se separa; quando o multiculturalismo e a globalizao abalam as formas estabelecidas de integrao social e de formao da identidade; ou quando o saber da tecnocincia contribui para desfazer a opinio pblica e tirar dos cidados o controle sobre as decises significativas, torna-se absolutamente imprescindvel edificar uma tica cvica que perllta a construo de um espao comum, no qual seja possvel participar da formao de uma opinio pblica bem informada e da deciso e realizao de projetos cvicos. Aprender a participar trabalhar por uma tica cvica que nos torne cidados: uma sociotica - a arte sem receitas que vale a pena praticar, conscientes de que os outros podem estar com a razo.

    Para que seja possvel a plena participao cvica, so necessrias algumas condies que no dependem inteiramente da educao, mas que sem ela se tornam impossveis. Em primeiro lugar,

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    VALfIuA AMOIU,\1 ARANTES (lIRG.)

    a participao contrape-se dependncia e incapacidade. Participar pressupe ser livre num duplo sentido: no estar submetido a nenhuma forma de dOllnao e ser capaz de utilizar os recursos necessrios para intervir na vida pblica. Em segundo lugar, a participao no se esgota nas votaes, mas se expressa de forma plena na deliberao que procura conjuntamente as melhores opes, avalizadas por boas razes e sustentadas pela anuncia dos implicados no assunto que est sendo debatido. Em terceiro lugar, a participao pressupe uma democratizao real do conhecimento; o saber no uma propriedade privada dos especialistas nem um produto acadllco inerte que transmitido aos jovens. O saber um elemento ativo que deve nos perlltir formar uma opinio o mais fundamentada possvel sobre as questes que nos afetam. O saber tem de servir para entender melhor o mundo e ser um elemento a mais na valorao e na deciso das questes que nos afetam. Finalmente, em quarto lugar, participar pressupe certas virtudes: no possvel que a participao democrtica esteja viva sem a fora exercida pelas virtudes dos cidados ativos. Sem o comprollsso com os interesses do conjunto da sociedade no possvel participar corretamente, mas tambm so necessrias outras virtudes, como a solidariedade, a responsabilidade, a tolerncia e o profissionalismo.

    No podemos encerrar esta parte sobre a aprendizagem da convivncia sem falar de duas questes que hoje so fundamentais: a convivncia multi cultural e a convivncia planetria. A primeira questo pede um duplo esforo: detectar valores comuns s diferentes culturas e favorecer a criao de novas formas de convivncia. Quanto segunda questo, a convivncia planetria, ela nos coloca um dilema bem conhecido: somos a favor de uma

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  • EDC(/\Ao E VALOHFS: POl'ro:" E CO""TI{ N/O

    cidadania local ou de uma cidadania cosmopolita? Ensinamos o enraizamento ou defendemos que a primeira lealdade tem de ser para com a humanidade? Muito provavelmente no convm optar, mas advogar por um cosmopolitismo arraigado: pensar no conjunto da humanidade sem perder, no entanto,.,os vnculos de pertinncia ao espao local.

    Aprender a habitar o mundo Nesta quarta e ltima parte propomos um trabalho educativo que v um passo alm do que j dissemos anteriormente e estabelea reflexivamente em cada jovem uma tica universal da responsabilidade pelo presente e pelo futuro do homem e do planeta, Uma tica da preocupao e do cuidado com a humanidade e com a natureza, totalmente imprescindvel num momento em que a globalizao abraa todos os mbitos da vida e a crise ecolgica tambm se generalizou de maneira implacvel por todos os cantos do planeta.

    Falamos de uma tica que no queira definir uma forma precisa de viver que todo mundo deveria adotar, mas de um conjunto de princpios mnimos e de critrios de reflexo que ajude a aproximar posies e entrar em acordo quanto a posturas. Tratase de uma tica com vontade de universalidade, mas entendendoa como a busca concreta de pontos de vista aceitveis que nos ajudem a pensar numa forma de vida que seja justa e sustentvel para o conjunto da humanidade. medida que forem rompidos os vnculos dos humanos com a natureza, imprescindvel recuper-los de maneira reflexiva e voluntria, ou seja, torn-los um tema tico. Hoje, aprender a viver tambm aprender a refazer a relao com a natureza, a fim de salv-la e salvar a ns mesmos.

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    Encc'l.cJ\o E VALOHI,S: PONTOS ONTIL\PONTOS

    Quando a promessa de felicidade e de progresso sem fim que nos propunham a cincia e a tcnica se converteu numa ameaa para a natureza e para ns mesmos, quando a viso antropocntrica e dominadora dos seres humanos submeteu a natureza a uma explorao sem piedade, quando no exagerado anunciar a ameaa de uma sucesso de catstrofres ecolgicas por todo o planeta, torna-se necessrio pensar numa tica da responsabilidade que ajude a reconstruir a harmonia e o equilbrio do mundo natural. Aprender a habitar no mundo adotar uma tica global e ecolgica: uma ecotca.

    A tica da responsabilidade pressupe implantar a preocupao com as condies futuras da vida humana. De modo mais exato, a tica da responsabilidade implica ensinar aos jovens que preciso pensar nas conseqncias previsveis de nossos atos em relao natureza, a fim de assegurar o futuro. S legtimo atuar de maneira que os efeitos sobre a natureza sejam compatveis com a permanncia de uma vida humana autntica sobre a Terra. Essa uma tica preocupada com o futuro, com as geraes que ainda no chegaram, com as condies de vida que legaremos a elas e com a prpria natureza. preciso inocular responsabilidade por ns mesmos, pelos que esto por vir e pelo conjunto do planeta Terra.

    Aprender a habitar o mundo significa modificar muitos hbitos da vida cotidiana que no cabe aqui detalhar, mas vamos nos centrar em algumas recomendaes gerais das quais todos devem estar conscientes: primeiro, todos fazemos parte da humanidade e estamos atados a um destino comum; segundo, a humanidade precisa colocar limites sua expanso material e buscar um progresso psquico, moral e espiritual; terceiro, formamos uma unidade

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  • E VALORES: PO"'TO~ E CONTRAPONTOS

    com a natureza e estamos ligados sua sobrevivncia; quarto, temos de controlar reflexivamente o futuro, mas no podemos conlima-lU totalmente, nem devemos tentar fazer isso; e, por fim, temos de nos responsabilizar por nossos atos para assegurar a vida das geraes futuras. Aprender a viver reaprender uma maneira sustentvel de habitar o mundo.

    Compartilhamos alguma qualidade moral?

    Aprender a viver num mundo plural, multicultural e global Hoje, a situao a partir da qual temos de responder pergunta sobre a maneira de viver pode ser caracterizada por um fato fundamental: a ampliao da diversidade moral. Com relao a este fato, a ampliao da diversidade moral, somos da opinio de que se produziu um passo que vai alm do pluralismo moral ao qual estvamos acostumados na maioria das sociedades abertas e democrticas. Nessas sociedades havamos passado de um cdigo moral nico, encarnado habitualmente pela religio, para um pluralismo moral que reconhecia a diversidade de pontos de vista morais que podiam conviver numa mesma comunidade. Este fenmeno de secularizao e pluralidade representa um primeiro passo suficientemente conhecido de diversificao moral. Mais recentemente, no entanto, estalllOS vivendo um novo aumento da diversidade moral.

    Referimo-nos ao fenmeno do multculturalsmo, que tem propiciado o incremento dos pontos de vista morais e das posi

    culturais num mesmo espao geopoltico, e ao fenmeno da

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    VALFlHA AMORIM ARANTES (ORG.)

    globalizao, que de fato converteu todas as posturas culturais e morais da humanidade em vozes implicadas na definio de uma maneira comum de viver6 Dito com a maior simplicidade, consideramos que, hoje, o desafio moral aprender a viver aprender a ser, conviver, participar e habitar no mundo numa situao de extrema diversidade moral.

    O convvio entre pessoas com diferentes crenas morais apresenta sempre pelo menos duas interrogaes: a primeira, necessrio que elas compartilhem alguns critrios morais que lhes cilitem a vida em comum, ou ser que a convivncia pode ser assegurada de outras formas?; e a segunda, caso parea conveniente compartilhar algo, de fato possvel estabelecer critrio reconhecido por todos ou isso se torna impossvel quando se parte de pontos de vista morais e processos de ;:,UI.""'.U"'........u diferentes?

    conveniente e possvel uma educao em valores para todo mundo? Agora, a questo que se coloca a seguinte: que estratgia queremos e podemos seguir para nos conduzir em situaes de alta diversidade moral? conveniente ter critrios morais comuns? possvel chegar a t-los, e por meio de que procedimento podemos consegmr ..ISSO.?

    Em relao convenincia de ter ou no critrios morais comuns, a alternativa dara: se no contarmos com critrios comuns que regulem a convivncia de maneira desejada - seja

    6. Entre as muitas obras que abordam estes assuntos, gostaramos de assinalar algumas: Cortina, 1998; Bilbeny, 2004; Serrano, 2004; Kng, 1990.

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  • EIH1CA?;'O I'VALORES: PONTOS E CONTR,\I'ONrOS

    no mbito da famlia, da escola, da sociedade ou do conjunto do planeta -, parece que no nos resta outro caminho a no ser a ao poltica estratgica e, ao final, a fora. E no parece recomendvel limitar os procedimentos de regulao. da convivncia estratgia e fora. No desejvel faz-lo em nenhuma instncia da vida humana.

    Se admitimos que seria conveniente contar com alguns critrios morais comuns, temos de ver se possvel determin-los e por meio de que procedimentos se pode conseguir isso. Alguns, no entanto, acham totalmente impossvel e sequer aceitam a convenincia de tentar (e se o fazem para acabar reconhecendo que se trata de uma iluso impossvel): os valores so uma coisa relativa, prpria de cada sujeito e quase impossveis de harmonizar - o paradigma da clarificao de valores iria nessa direo; ou, ento, as culturas e seus critrios morais seriam incomensurveis, de forma que impossvel pensar em algum tipo de entendimento intercultural ou critrio moral universal. Portanto, melhor reforar tanto quanto seja possvel a prpria cultura e moralidade?

    No entanto, outros no pensam do mesmo modo e acreditam ser possvel alcanar algum tipo de ponto de vista moral compartilhado. Os procedimentos habituais para tanto so de dois tipos: um tentar determinar o que compartilhado pelos indivduos ou pelas culturas, apesar das diferenas, ou seja, os valores mnimos aparecem de maneira reiterativa~; outra postura, que obvia

    7. Huntington, 1997. 8. Walzer, 1994.

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    VAI'lHA A,\10RIM ARANTbS (ORG.)

    mente tambm reconhece e aceita as diferenas entre indivduos e culturas, postula a possibilidade de se chegar a algum tipo de acordo sobre alguns princpios morais muito gerais ou sobre os procedimentos para tratar de problemas morais. O acordo deveria se fundamentar em uma realidade comum a todos os seres humanos da qual derivasse um tipo de produo moral que pudssemos compartilhar9

    Em sntese, acredito que podemos aceitar a diversidade como fato e como valor, mas tambm temos de reconhecer que existem momentos de dificil entendimento e aparente incomensurabilidade cultural, embora esses momentos no expressem o que mais prprio dos seres humanos e das culturas. Portanto, parece-nos possvel detectar coincidncias nos valores e, principalmente, nos comprometermos a trabalhar a fim de construir pontos de vista comuns a partir de dinamismos morais compartilhados.

    No que se refere educao moral e cvica, que deveria ser oferecida pela escola, se a nossa posio estiver correta, devemos pensar que, em situaes de alta diversidade, ensinar a ser e a conviver pede trabalho para que a educao: 1) permanea aberta diversidade de pontos de vista morais e s perspectivas culturais dos alunos; 2) reconhea a coincidncia de alguns valores recorrentes e de um amplo acordo que estabelea uma base educativa mnima; 3) forme as disposies morais comuns de maneira a convert-las em procedimentos morais para enfrentar os desafios do presente.

    9. Apel, 1991; Habcrmas, 1998a c b; Boff, 2001; Rawls, 2001.

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  • EDUCAl\O E VALORES: 1'0!'.T05 E CO"lTRAPON'roS

    Compartilhamentos mnimos: enraizamento e abertura para o outro Se defendemos uma educao em valores que tenha um ncleo comum para todo mundo, ser necessrio estabelecer-uma realidade compartilhada sobre a qual possamos fundamentar a proposta. Portanto, a questo bsica deste captulo pode ser formulada dizendo que estamos procurando alguma realidade que seja comum a todos os seres humanos, independentemente das circunstncias histricas e socioculturais. Uma realidade humana universal que permita detectar dinamismos morais compartilhados que ajudem a conduzir a vida moral individual e harmonizar a convivncia coletiva.

    Partindo de uma perspectiva educativa, pensamos que "o que compartilhado" nos dar base suficiente para construir uma proposta de educao em valores para todo mundo, o que no significa uma educao uniforme, mas unicamente uma educao com um fundo comum.

    O que compartilhamos se no compartilharmos religio, metafisica ou projeto poltico? O que compartilhamos se num mundo multicultural e global a adeso a uma sociedade - que tampouco homognea - no nos d nenhuma segurana moral universalizvel? O que compartilhamos se a confiana em um eu originrio e fonte de certeza moral tornou-se tambm to discutvel? Temos alguma coisa em comum que nos permita construir um projeto moral para todos, ou teremos de nos conformar com a universalidade do proveito econmico e do relativismo moral e cultural?

    No entanto, parece que ns, humanos, partimos de uma experincia inicial que universalmente compartilhada que pode

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    VAI.F.RIA AMORIM ARANl'ES (OIU;.)

    ria ser qualificada de imerso ou de vinculao com o mundo natural e sociocultural. Uma experincia que pode nos servir de fundamento moral mnimo, mas suficiente para construir uma proposta educativa para todo mundo. Essa primeira experincia de vinculao pode ser concretizada em duas abordagens complementares: o enraizamento a uma forma de vida particular e a abertura para o outro.

    Em primeiro lugar, ns, seres humanos, partimos de uma primeira realidade comum: estamos arraigados a uma forma de vida particular. Ningum escapa fuso em um mundo vital, embora seja evidente que existe urna multiplicidade de mundos vitais. Portanto, universal a imerso em uma maneira de viver e universal a diferena no contedo material da socializao. Ou seja, compartilhamos a necessidade de pertencer a uma maneira particular de entender o mundo. No h possibilidade de romper a socializao num ethos moral singular, e no nada recomendvel tentar fazer isso1".

    Este primeiro aspecto, o enraizamento universal a diferentes contedos de socializao, nos abre para obrigaes morais bem claras e para tarefas educativas considerveis. Pede-nos o reconhecimento e o respeito s diferentes formas de vida e a pontos de vista morais; pede-nos tambm um esforo de compreenso das diferentes posturas; e, finalmente, pede-nos uma vontade de crtica e de autocrtica que torne possvel a aprendizagem moral interpessoal e intercultural. Portanto, trata-se de valorizar o uso moral da pluralidade e as diferenas,

    10. Garcia Gmez-Heras,2000,

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  • f, VALOR['S: PONTOS TI CONTRAPONTOSEnuc

    Em segundo lugar, ns, seres humanos, partimos de outra realidade comum: estamos abertos criao de laos com os demais. De fato, desde o primeiro olhar da me para o seu beb, para chegar a ser e para ajudar a ser imprescindvel viver uma variedade de relaes intersubjetivas. Ns, humanos, no nos fazemos na solido, mas junto com os demais. Sair de si mesmo a fim de estabelecer uma relao correta com os outros , ao mesmo tempo, uma necessidade imprescindvel e uma exigncia moral. Portanto, podemos partir de uma intuio sufIcientemente clara: a princpio no temos um eu originrio, isolado e todo-poderoso, mas estamos em relao com os demais e dependemos dos vnculos que estabelecemos1 1

    Este novo aspecto comum, a abertura universal para o outro, nos leva ainda a deveres morais e a tarefas educativas. Permitenos extrair, da idia de abertura para o outro, o ncleo da moralidade. Reconhecemos no outro uma obrigao moral; de fato, descobrimos na relao com o outro a estrutura da moralidade. Uma estrutura que se expressa na necessidade de reconhecer o outro, de colocar-se no lugar dele, de inclu-lo em nossa reflexo e ao moral, de agir de maneira aceitvel para os demais. Em suma, reconhecemos que a moralidade algo intersubjetivo. A incluso e a concordncia dos demais na deliberao e na ao moral se convertem, portanto, no critrio moral e no horizonte de crtica social.

    At aqui temos dois elementos compartilhados que permitem defInir um ponto de vista moral: a universalidade do enraizamento a realidades diferentes e a universalidade da abertura para o outro.

    11.TodoTOV, 1999.

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    VALf'JUA AMORIM ARANTES (ORG.)

    Dinamismo da intersubjetividade Se olharmos mais detidamente o segundo elemento compartilhado da moralidade a universalidade da abertura para os demais -, poderemos ver que ele no se apresenta como uma totalidade homognea: a intersubjetividade se manifesta por intermdio de figuras bem diferenciadas que a concretizam. Estamos nos referindo a formas como o encontro interpessoal ou a relao afetiva, o dilogo ou a relao comunicativa, e a participao em projetos ou a relao de cooperao no trabalho. So trs dinamismos da intersubjetividade que apontam para diferentes direes de valor. Duas palavras sobre cada um deles.

    A primeira forma de abertura para os demais se d pelo encontro cara a cara. Neste espao interpessoal de relao aparecem os sentimentos que nos vinculam aos demais e nos ajudam a enfrentar as difIculdades vitais. O afeto, a amizade e o amor tornamse verdadeiros mecanismos sociais ou procedimentos morais compartilhados que apontam uma direo de valor capaz de atuar como um horizonte normativo compartilhado12

    A segunda forma de abertura para os demais se produz por meio do dilogo. Neste espao interpessoal de relao entra em jogo um conjunto de mecanismos comunicacionais que nos permitem manter intercmbios construtivos com os demais sobre os assuntos que afetam os interlocutores.

    medida que os processos de dilogo esto orientados para obter compreenso entre os participantes e ambos procedem de modo a alcanar um certo nvel de acordo, o dilogo se transfor

    12. Aristteles, 1982, pp. 451-476; Hume, 1988; Buber, 1974 e 1949; Levinas, 2000; Bello, 1997.

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  • E VAl.ORES: PO]';TOS E CONTRAPONTOSEDU

    ma em um poderoso instrumento moral e em uma pauta de valor que compartilhada por qualquer sujeito capaz de falar!3.

    A terceira forma de abertura para os demais se produz pela participao em projetos de interveno no mundo natural ou social. Neste espao de relao h uma srie de procedin:entos conjuntos que nos permitem propor intervenes sobre a realidade com o intuito de otimiz-Ia. medida que a realizao de projetos conjuntos se d por mecamsmos de cooperao entre todos os participantes e orientada para uma transformao otimizadora da realidade, o trabalho em projetos compartilhados se converte tambm num forte dinamismo moral e num espao compartilhado de valores para qualquer ser humano14

    Repito que esses dinamismos da intersubjetividade, alm de estabelecerem modalidades concretas de relao, permitem definir procedimentos de ao moral, fixar objetivos desejveis e estabelecer elementos de crtica e de transformao da realidade. O afeto, o dilogo e a cooperao so procedimentos ou ferramentas que nos ajudam a lidar com as dificuldades sociomorais que a vida pode nos apresentar. Alm disso, esses trs procedimentos morais trazem implcita uma finalidade moral, um telos. Cada um deles aponta para certos horizontes de perfeio: amizade e amor quanto ao afeto, compreenso e acordo no que se refere ao dilogo e cooperao e transformao no trabalho com projetos. Conseqentemente, todos tm a capacidade de se converter num

    13. A obra de Jfugen Habermas em seu conjunto fundamentou amplamente os aspectos que temos enunciado. No entanto, vale a pena destacar os seguintes volumes: Haberma.s, 1987 e 1998a e b.

    14. Dworkin, 1996.

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    VAI.oRIA AMORIM ARANTES

    elemento de crtica e de transformao da realidade. Em suma, transformar-se em valores compartilhados por todos medida que esto relacionados com a abertura para os demais, uma das vertentes que todos os seres humanos tm em comum.

    Como educar em valores?

    Vias educativas do enraizamento e da abertura para os demais A fora moral do enraizamento e da abertura para os demais se traduz em prticas educativas que perntem deixar manifestos os valores de todos os dinansmos morais.As prticas educativas, portanto, nos ajudam a adquirir os valores que expressam o enraizamento e a abertura para os demais. Resta-nos saber quais so os espaos onde sero implantadas as diferentes prticas formativas. Trata-se, portanto, de pensar os mbitos que devem ser considerados na hora de prever um plano completo de educao em valores. Veremos que as aes realizadas no nvel nterpessoal tero de ser combinadas com outras que tenham um carter curricular; e, finalmente, h um ltimo conjunto de intervenes que incidir na vida do grupo-classe e do centro educacional. O jogo complementar e coordenado do trabalho nesses trs mbitos produzir uma educao em valores completa.

    Via interpessoal O primeiro nvel do modelo de formao em valores que propomos focaliza a ateno nos vnculos interpessoais que se estabelecem entre os educadores e seus alunos. No entanto, as rela

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  • VAIJRL\. Aj\;IORI1\t j\RANTES ( G.)Enuc .. c;\o E VALORES: 1'01'.:TOS CONTRAPUNTOS

    bvio que a educao pressupe interao entre educadores tidas que possam ser delimitadas em outros momentos com sees interpessoais no constituem um espao com fronteiras n

    e educandos. A questo ver se essa interao apenas um mero melhante relevncia formativa. Muito ao contrrio, elas apare contato entre sujeitos-objetivados realizando um intercmbio que cem e fazem parte de qualquer momento educativo. As rela,es no vai alm do previsto para o papel que desempenham, ou se, ao interpessoais no so uma atividade entre tantas outras, mas sur contrrio, a interao um verdadeiro encontro entre indivduos gem no interior de qualquer situao educativa e tm de singulares15 Ou seja, uma relao cara a cara entre dois sujeitos que transversal e onipresente. A reside precisamente parte de sua por meio das expresses faciais, dos gestos e da palavra criam um complexidade e importncia: no costumam ser programadas re vnculo mtuo e se envolvem numa situao no totalmente proflexivamente, devido ao fato de se apresentarem geralmente na gramada de participao conjunta numa tarefa formativa, tarefa forma de episdios breves os encontros -, embora apare que pressuponha pelo menos uma operao que conjugue conheam e se desenvolvam ao longo de todas as demais experincias cimento e afeto. educativas e acabem caracterizando um vnculo educativo com Por outro lado, se o encontro tem um inevitvel lado rotineiplexo. Por ltimo, e alm de seus modos de se manifestar, o es ro, tem, acima de tudo, tambm um lado imprevisvel, clido e pao das relaes interpessoais tem um efeito insubstituvel na aberto ao outro16 Todo encontro tem uma realidade fsica na formao da moralidade. qual os sujeitos se fazem mutuamente presentes, se vinculam

    Apesar do que dissemos, falar de relaes interpessoais hoje tivamente e se dispem a ficar pessoalmente envolvidos numa re algo muito impreciso. s vezes a educao converte as relaes lao que vai do instrumental. Da podemos concluir a iminterpessoais num exerccio de saber voltado para objetivar os portncia de gerar uma atitude educativa voltada para evitar os educandos e num exerccio de poder para disciplin-los. A au meros contatos superficiais e favorecer encontros autnticos, tntica relao educativa no est concebida para objetivar e dis criando situaes e prticas formativas que facilitem a multipliciplinar, mas para converter o sujeito com o qual se comparti cao dos encontros pessoais. S assim possvel fazer com que lha uma situao formativa em "algum reconhecido", algum uma sucesso de encontros seja seguida por uma relao intercom quem se criam laos morais de mo dupla: a responsabili pessoal realmente educativa. dade do adulto em relao ao jovem e o respeito do jovem em relao ao adulto. 15. Destacamos aqui dois autores relevantes que, embora no sejam os nicos,

    Mas vejamos cada um os elementos que compem uma rela propuseram o tema do encontro como chave de seu pensamento. Um deles, o educativa autntica: 1) um encontro; 2) um encontro de aco Goffillan, fez isso apoiado em posies sociolgicas, e o outro, Bubcr, baseanlhida e reconhecimento; e 3) um encontro que gera qualidades do-se em posturas filosficas. 1970, 1961 e 1979; Buber, 1949 e 1974.

    16. Gijon, 2003. morais de responsabilidade e respeito.

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  • ElH;C:\.O fi VALORES: PO:-';TOS E CONTIU\PONTOS

    Mas para que se produza uma relao educativa autntica no basta uma sucesso de encontros. Apesar de importante, necessrio que o encontro encerre uma clara iniciativa do educador para acolher, reconhecer e aceitar o educando17. No st'; trata de encontrar-se para escrutar ou dominar, mas para demonstrar que o educando estava sendo esperado, para se poder manifestar que temos confiana em suas possibilidades, para cuidar dele e ajud-lo em tudo que for possvel, para ouvi-lo por uma escuta sem filtros e, finalmente, para aceit-lo tal como ele . Essa abertura para o outro no deve ser confundida com uma atitude passiva ou dominada pelo destino, mas sim como uma abertura combativa, disposta a entregar-se na ajuda, que v alm dos contatos tingidos pela indiferena ou pelo legalismo. Quando se consegue uma relao de acolhida e reconhecimento, so lanadas as bases para a entrada no mundo social. A socializao depende de algum que esteja disposto a acolher e reconhecer, que esteja disposto a vincular-se afetivamente.

    N este ponto, chegamos ao limiar dos dois movimentos morais que se produzem em toda relao humana constituda. Estamos nos referindo responsabilidade pelo outro e ao respeito que gera obrigao. No primeiro movimento aludimos responsabilidade incondicional do educador para com o educando'8 A relao educativa pressupe uma responsabilidade tica do adulto para com o jovem, responsabilidade que no se limita a nenhuma condio que possa eximi-la. O outro, atravs de sua corporeidade - as expresses faciais -, mas indo alm dela, mos

    17.I>uch, 1997,pp. 15-37. 18. Levinas, 2000.

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    EDCCAO li VALOH ES: PONTOS E CONTRAPONTOS

    tra a sua contingncia, a sua necessidade, a sua fragilidade, e reclama ajuda incondicional e sem oferecer nada em troca. Nesta exigncia muda do aluno e no dever de satisfaz-la de forma responsvel por parte do educador reside o primeiro movimento moral da relao educativa.

    Por sua vez, quando um jovem se sente apreciado pelo adulto - recebe afeto, cuidado, compartilha tempo com ele, ouve elogios por seus esforos e valorizado de modo incondicional -, acaba tambm tendo apreo por ele. Uma vez criado o vnculo de afeto recproco, mais fcil para o educador indicar valores e condutas aos jovens, e maior a probabilidade de que os adotem pelo afeto recebido '9. gerado nos jovens um sentimento de obrigao de certo modo paralelo, embora diferente, da responsabilidade que antes impulsionava o educador para eles. Estamos diante de uma dupla obrigao moral que no pode ser eterna nem explica todos os dinamismos e as tarefas da educao em valores, mas imprescindvel como um de seus espaos e momentos.

    Via curricular O segundo nvel do modelo de formao em valores que estamos desenvolvendo aborda o que vamos chamar de "tarefas curriculares", ou seja, o conjunto de afazeres realizados pelo grupo-classe com a inteno manifesta - embora talvez no exclusiva - de trabalhar valores, e que se inscreve no tempo destinado s diferentes disciplinas e ocupaes do currculo. Essas tarefas orientadas para a formao em valores podem ser distri

    19. Piaget, 1999, pp. 27-61; Rawls, 1979, pp. 511-536.

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  • b:DLJC!\CAo E VAL(H~ PONTOS E NTRl,PONTOS

    budas de maneira transversal ao longo das disciplinas escolares, como ocorre quando so abordados assuntos moralmente relevantes s diferentes reas escolares. Ou, ento, condensar o tempo destinado a tratar de assuntos relacionados com o valor em certos espaos escolares, como poderia acontecer durante o tempo destinado aula de orientao ou reflexo tica, ou tambm no espao temporal que pode ser ocupado por alguma disciplina de livre escolha.

    Em sntese, este nvel de modelo de formao em valores se refere s tarefas de aula destinadas a trabalhar valores, embora sua localizao temporal no currculo possa variar.

    As tarefas curriculares colocam em jogo trs grandes blocos de contedo: as questes pessoais ou socialmente relevantes, as disposies que constituem a inteligncia moral e, por ltimo, alguns elementos bsicos da cultura moral de uma sociedade. Estes blocos de contedo apontam tambm algumas finalidades da formao cvico-moral: aprender a considerar reflexiva e criticamente questes controvertidas da vida social e pessoal; desenvolver as diferentes capacidades da inteligncia moral e predispor os alunos a us-las corretamente em situaes de deliberao moral; e, finalmente, conhecer, apreciar e usar um conjunto de conceitos e elementos essenciais de uma cultura moral que podem ajudar a compreender e valorar certos fatos e controvrsias submetidos considera020 Vejamos mais detidamente estes trs momentos do trabalho curricular sobre valores.

    As tarefas curriculares destinadas a trabalhar valores devem ser realizadas num espao em que seja possvel falar tudo que

    20. Pug, 1995 e 1996.

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    VALRli\ A'VIORIM ARANIES (ORG.'

    preocupa o grupo. Os alunos deveriam perceber essas sesses como uma oportunidade para tratar assuntos de interesse comum e discutir e abordar situaes que os inquietam. Em alguns casos sero tratadas questes estreitamente vinculadas vida deles, aqueles problemas que eles percebem nos seus diferentes mbitos de relaes. Em outras ocasies, o contedo pode referir-se a assuntos de relevncia social que talvez escapem experincia imediata dos alunos, mas aos quais eles no devem permanecer indiferentes.

    Ao contrrio do que ocorre em outros momentos escolares, esse contedo no se refere a saberes acabados nem a informaes que devam ser retidas e memorizadas. So espaos destinados a falar de assuntos que permitem opinies diversas, assuntos que despertam o interesse dos alunos. E, acima de tudo, so espaos em que cada membro do grupo constri opinies prprias com base no debate com os iguais e com os professores. A diversidade de enfoques ao abordar um assunto propicia a cada aluno uma elaborao mais complexa e completa dos prprios pontos de vista.

    Se a inteligncia nos permite conduzir um processo de adaptao timo ao meio fisico e cultural, a inteligncia moral nos torna possvel adaptar e ao mesmo tempo otimizar nossa relao com o entorno sociaL As diferentes capacidades que configuram a inteligncia moral ajudam a nos relacionar com os outros, a respeitar as normas sociais, a enfrentar as experincias vitais e, principalmente, a considerar os conflitos de valor. Ao falar de inteligncia moral nos referimos a um conjunto de capacidades psicomorais - por exemplo, o autoconhecimento, a empatia, o juzo moral, o dilogo e a auto-regulao - que tornam possveis

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  • EDUCA.,\O E VALORES: PONTOS I: CONTRAPONTOS

    a deliberao e a direo moral. Diante de experincias de conflito moral, ns, humanos, colocamos em ao uma srie de capacidades que nos permitem exercer atividades como valorar, questionar, compreender, comparar, tomar decises e lev-las a cabo. A inteligncia moral tem uma natureza funcionar e seu uso correto permte a cada um lidar adequadamente com as questes morais que se apresentam no dia-a-dia.

    Enfrentar experincias moralmente controvertidas e resolver os dilemas morais do cotidiano requer mais que o uso correto da inteligncia moral. Assim, na tentativa de procurar solues para os conflitos individuais e coletivos, as pessoas colocam em jogo no s suas capacidades individuais, mas tambm usam guias de valor que lhes permtem orientar a resoluo dos conflitos. A cultura moral , juntamente com a inteligncia moral, um instrumento de primeira ordem para regular a convivncia e melhorar nosso modo de vida. A cultura moral constituda por elementos de natureza diferente, que cada sociedade em particular e tambm a espcie humana em seu conjunto elaboraram ao longo do tempo.

    Na cultura moral cristalizam-se idias, modelos, normas, prticas, instituies sociais e outros elementos que servem de guia de valores para uma comunidade. Trata-se de recursos e propostas que cada coletividade reconhece como moralmente vlidos e eficazes.

    Considerar assuntos relevantes, desenvolver a inteligncia moral e adquirir elementos essenciais da cultura moral so trs objetivos da formao moral que so trabalhados ao mesmo tempo nas aulas. possvel dar maior relevncia a um deles, mas totalmente inadequado pretender isolar qualquer um dos trs

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    V.J\LUA AMOR1M ARANTES (ORG.)

    momentos. Por outro lado, os espaos escolares destinados a trabalhar aspectos relacionados com os valores no podem se converter em aulas que caiam na inculcao de valores nem na mera trasmisso de conhecimento. quase impossvel e totalmente indesejvel que as aulas sejam dessa natureza. Pelo contrrio, elas devem ser convertidas em fruns de considerao e dilogo, em momentos que propiciem o autoconhecimento e a reflexo. Em ambos os casos - sejam sesses de deliberao ou de reflexo -, a aula deve ser uma espcie de oficina onde alunos e professor trabalhem conjuntamente as questes significativas. Os primeiros refletindo, cooperando, debatendo, ajudando-se mutuamente na considerao da temtica proposta de alguma maneira todos esto ensinando os colegas -, e o professor conduzindo a atividade, ajudando quando necessrio, sempre de modo discreto, para no tirar o protagonismo de seus aprendizes, mas realizando intervenes que os ajudam a melhorar. Em suma, trata-se de conseguir que as tarefas curriculares destinadas formao em valores mostrem que o assunto abordado to importante quanto o modo de trat-lo.

    Via institucional O terceiro nvel do nosso modelo de formao em valores volta o olhar para o formato que dado s instituies escolares, e para a maneira pela qual esse formato institucional cria um clima ou cultura moral. Costumamos aceitar que a relao pessoal entre educador e aluno uma fonte de influncia educativa de primeira magnitude, e no h dvida de que o desenvolvimento das tarefas curriculares constitui uma experincia educativa essencial. N o entanto, nem sempre reconhecemos que o ambiente de uma

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  • ED1JCA(:C\O E VALORhS: I'O:-';TOS E CONTRAPO TOS

    instituio educacional exerce enorme presso formativa em seus alunos. No exagero afirmar que as instituies em si so profundamente educativas. Elas tm forma moral e educam moralmente21 Se tais afirmaes esto corretas, preciso pensar me lhor no desenho das prticas pedaggicas realizadas nos J;entros educacionais, assim como na construo de um sistema de prticas que converta esses centros em comunidades democrticas. Em outras palavras, preciso construir uma cultura moral que exera uma poderosa ao educativa. A cultura moral no pode ficar nas mos do acaso; ao contrrio, deve ser objeto de uma preparao consciente e minuciosa.

    Em que espao formativo atua a cultura moral? Se os encontros se apresentavam como pontos disseminados entre todas as atividades educativas, at criar um vnculo interpessoal entre o educador e cada um dos alunos, e se as tarefas curriculares de educao em valores ocupavam um espao temporal previsto e delimitado, fosse transversalmente distribudo ou concentrado numa s matria, a cultura moral das instituies educativas ocupa todo o espao disponvel tudo faz parte da cultura de uma comunidade.

    Na realidade, a cultura moral deve ser entendida como a totalidade do meio que acolhe e cerca completamente os educandos, e o faz de modo que eles fiquem totalmente imersos e sejam inevitavelmente afetados. A cultura moral uma forma onipresente de educao em valores e, portanto, seu instrumento mais efetivo.

    21. Jackson et al., 2003; Kohlberg, 1992, pp. 265-270; Piaget, 1968, pp. 9-28; Powers et al., 1997; Puig, 2000.

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    V,\LRL\ A.\IOHIM ARANTES (ORG,)

    Em que dimenses do sujeito em formao a cultura moral influi? Embora seja impossvel estabelecer uma dimenso exclusiva para cada espao ou nvel at aqui considerado, vimos que os encontros e o vnculo interpessoal tinham um efeito motivador muito intenso na formao do modo de ser do educando; vimos tambm que as tarefas curriculares centravam-se principalmente na formao dos instrumentos cognitivos que permitam estabelecer um ponto de vista pessoal diante de situaes controvertidas; e, por ltimo, veremos como a cultura moral das instituies escolares incide sobre o comportamento dos sujeitos dando forma a seus hbitos e virtudes. A cultura exerce outras funes formativas, mas a que melhor a caracteriza tem a ver com a formao das disposies para agir de um modo determinado e manter esse modo de se conduzir no tempo.

    Neste ponto, voltemos um pouco atrs para rever a natureza de um meio educativo e sua cultura moral. A tese que defendemos que a construo da personalidade moral depende em parte do efeito causado pelo conjunto da instituio educacional. Afirmamos que a totalidade da instituio uma poderosa fora educativa que incide sem cessar na formao pessoal dos alunos. Essa afirmao pressupe vrias questes que vamos repassar brevemente.

    Em primeiro lugar, afirma-se algo que costumamos expressar de modo metafrico: a atmosfera do centro nos impregna como que por osmose quando mergulhamos em sua realidade. Ou seja, os valores expressos pela instituio educacional nos embebem e se tornam hbitos e atitudes pessoais conforme os colocamos em prtica. Em segundo lugar, esse processo de embeber-se em valores e convert-los em hbitos e atitudes depende da capaci

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  • EDlJCAAo F. VALOIU'S: PONTOS F. CONTRAPONTOS

    dade da instituio de vivenciar realmente os valores defendidos. medida que o centro prope atividades que convidam os alunos a praticar valores normalmente, estar sendo estimulado um processo real de implantao de hbitos e atitudes. Em terceiro lugar, em qualquer centro educacional fazemos ,com que nossos alunos vivam valores por intermdio das prticas e atividades que lhes propomos. Temos visto como as prticas de deliberao e autoconhecimento convidam com intensidade realizao de valores como, por exemplo, o reconhecimento do outro e a autenticidade. Mas em uma escola so oferecidas muitas outras prticas educativas que cristalizam valores e convidam seus alunos a viv-las.

    Voltando ao princpio, uma instituio um sistema de prticas educativas. No se trata de uma nica prtica isolada nem de uma multiplicidade de propostas incoerentes. Uma instituio um sistema, isto , um conjunto inter-relacionado e coerente de prticas que conseguem incrementar o efeito educativo justamente pela sinergia que se estabelece entre todas as propostas. Isso foi feito magistralmente por Freinet em suas aulas, e Dewey nos sugere, ao advertir que no se educa de modo direto, mas atravs do meio. Algo que hoje preferimos expressar com outras palavras: educa-se por intermdio do cultivo de prticas e da construo de meios.

    Vimos que a cultura moral depende do conjunto das prticas educativas que funcionam numa instituio e que, portanto, uma das tarefas dos educadores colocar em ao prticas educativas adequadas a cada circunstncia. Conseqentemente, resta ainda determinar as reas que devem ser cobertas por tais prticas em uma instituio escolar. A nosso ver, elas incidem em

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    V!\L.RIA A,\>tORIM ARANTES (ORG.)

    trs grandes campos: o trabalho escolar, a convivncia e a animao. As instituies escolares devem organizar o modo como transmitem conhecimento aos alunos por meio de mltiplas prticas de ensino e aprendizagem. A aula magistral, o trabalho cooperativo e os projetos so algumas das prticas clssicas desse mbito. Por outro lado, como as escolas so espaos de convivncia e de aprendizagem da convivncia, tambm devem instituir prticas pensadas expressamente para alcanar esses fins. As assemblias de classe e a resoluo de conflitos so algumas possibilidades prprias desse campo.

    Finalmente, a escola tambm deve ser um espao de vida e um espao conectado ao resto da sociedade, o que exige um esforo de animao social e cultural. Eles devem ser locais de cultura, de participao, de festa, de realizao de projetos que vo alm das aulas. Em suma, devem ser centros de cultura e de cidadania. A organizao de festas, de eventos culturais ou de atividades esportivas pode ser uma das possveis prticas estabelecidas nesse mbito.

    Agora sabemos melhor o que significa cultivar prticas e construir meios: pensar em propostas que atenderiam corretamente s necessidades formativas nos campos do trabalho escolar, da convivncia e da animao. Ambos os conceitos - projeto de prticas e construo de meios - apontam para um mesmo objetivo: a reconstruo do mundo da vida nas escolas; a criao de um espao que seja educativo por si mesmo. Para isso preciso imaginar formas de convivncia escolar, de animao e de trabalho que predisponham a viver e aprender de acordo com certos princpios e valores. Projetar prticas idealizar peas educativas, ou seja, idealizar processos que persigam objetivos especficos e, simulta

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  • EDlJCAAo E VALOR!'S: PONTOS E CONTRAPONTOS

    ceitos e as reflexes ticas que ajudam a entender a experincia pessoal e social. Incrementar, portanto, os contedos bsicos para um projeto de cidadania ativa.

    Educao laica e cultura religiosa Separar a educao religiosa confessional do currc~lo da educao formal mas, por outro lado, aderir proposta de que todos os alunos adquiram um conhecimento suficiente do fato religioso, entendido como fenmeno antropolgico, sociolgico, histrico e cultural.

    A escola tem de se comprometer a trabalhar os contedos que tocam os fatos religiosos em momentos do currculo que forem mais oportunos, com uma dedicao de tempo adequada e mantendo o mesmo esprito de respeito, de vontade de entender e de crtica que se manifesta igualmente em qualquer outra matria.

    Uma orientao com tempo suficiente para educar em valores Reforar a tarefa de orientao com um encargo preciso, uma ampliao horria e a correta compensao, de modo que a orientao seja considerada um espao fundamental da educao em valores. Entendemos que ela o seja, tanto no que se refere ao trabalho em aula com o grupo-classe como na acolhida, seguimento e ajuda individual de cada aluno, e tambm em relao regulao e dinamizao da vida coletiva. Concretamente, propomos uma dedicao de sete horas: trs de trabalho com o grupo-classe, trs de ateno aos alunos e suas famlias, e uma de preparao e coordenao.

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    E VALORES: PONTOS E CONTRAPONTOS

    Construir uma cultura moral de centro que impregne valores nos alunos Fazer com que os alunos vivenciem os centros educacionais como verdadeiras comunidades democrticas de aprendizagem, convivncia e animao. preciso explorar todas as conseqncias da convico de que educar no unicamente instruir, mas oferecer uma experincia significativa que prepare para a vida como cidado. Portanto, ns, educadores, precisamos nos ver como cristalizadores dos valores no meio; temos de fazer de cada escola um ambiente rico em prticas e atividades educativas que cumpram seus objetivos e ao mesmo tempo expressem e faam viver em valores; e propor como trabalho cooperativo os projetos de pesquisa, a mediao de conflitos, as assemblias de classe, os contratos pedaggicos, as festas e celebraes e muitas outras prticas educativas a serem imitadas ou inventadas. Precisamos, enfim, criar uma cultura escolar que realmente embeba de valores os nossos alunos. Isso significa dedicar esforo ao planejamento e realizao dessas atividades.

    A participao como a melhor escola de cidadania A cultura das instituies educacionais deveria reforar de maneira muito acentuada a participao dos alunos, para serem muito mais protagonistas do que so agora. Devem s-lo no Conselho Escolar e, sobretudo, em outros espaos no to formais onde possam ter um papel menos testemunhal e mais ativo. Devem participar das diferentes instncias das escolas, desde o nvel da classe, por meio das assemblias, at a escolha dos membros para formar um Conselho de Representantes, com atribuies e responsabilidades como incentivar a associao de alunos e a orga

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  • VAL,R1A t\,\10IUM ARANTES (ORG.)

    nizao de atividades. Esses so alguns dos processos que facilitam a participao; como no so os nicos, depender de cada escola implantar os mais adequados. Deve-se desenvolver, em suma, uma cultura da deliberao e da cooperao entre alunos, e entre alunos e professores.

    A formao cvico-moral pela aprendizagem-servio Implantar nos centros educativos e de acordo com a idade dos alunos programas de aprendizagem-servio na comunidade. Vale a pena faz-lo porque servir comunidade e, alm disso, estender esse trabalho s atividades de aprendizagem escolar um dos melhores dinamismos de formao pessoal e educao cvica. A fora manifestada por estas propostas para sensibilizar, responsabilizar, desenvolver habilidades, envolver na vida cidad e exercitar a crtica to grande que de nenhum modo a educao moral e cvica deve prescindir delas.

    As escolas como centros de cultura e civismo abertos comunidade Converter os centros educativos em ncleos culturais abertos aos alunos e comunidade e tambm coorden-los com outras instncias educativas, assistenciais ou culturais da populao. Aqui h um objetivo duplo. Primeiro, abrir o centro alm do horrio destinado ao cumprimento de suas obrigaes curriculares, a fim de torn-lo um espao cultural e formativo. Trata-se de estender a tarefa educativa do centro de modo diverso, com alguns usurios em parte diferentes, com alguns educadores tambm diferentes e com atividades que vo alm das propriamente curriculares. Segundo, as escolas devem se abrir e traba

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    EDU OLORES PO!'.;>[(JS E .ONTHAP,)N

    lhar em rede com outras instncias que atuem no mesmo territrio para otimizar as tarefas. Ambas as medidas no parecem, a princpio, vinculadas educao em valores, mas a realidade demonstrar exatamente o contrrio.

    Um novo perfil de educador para impulsionar a convivncia, a participao e o civismo Criar uma nova figura educativa que mescle o papel do pedagogo, do educador social e do animador sociocultural e se responsabilize por promover em cada escola todas aquelas atividades que em alguma medida transcendam o trabalho estrito das aulas. Atividades como coordenar parte das aes da escola vinculadas ao Plano de Ao de Orientao, ao Conselho de Representantes, Associao de Alunos e Alunas e de Pais e Mes, s festas e celebraes, mediao de conflitos, aprendizagem-servio, coordenao das atividades extracurriculares e outras que sejam estabelecidas.

    Formao, inovao e investigao para uma melhor educao civico-moral Desenvolver planos de formao inicial e permanente dos professores que dem uma viso dara do que e como tem de ser trabalhada a educao moral e cvica. Vincular a escola universidade e a projetos de inovao, investigao e formao que permitam cobrir diferentes objetivos num mesmo processo de colocar em andamento propostas de educao moral e cvica.

    Para concluir, podemos resumir tudo que dissemos numa idia fundamental e nas conseqncias mais que provveis que sua realizao implicaria. A tese bsica j foi expressa anterior

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  • VALRIA AMOHIJ'\1 ARANTES (ORG.)

    mente: conveniente ir alm das palavras e das boas intenes e dar educao em valores maior destaque escolar, um lugar que lhe permita abandonar o papel subalterno que agora ocupa. H necessidade de propostas que consubstanciem as idias em prticas, tempo e dedicao para realiz-las, e recursos para que seja de fato possvel realiz-las. "

    A educao em valores no algo que se alcance simplesmente porque se acredita ou se deseja; preciso encontrar meios para realizar de fato o que se imagina. No entanto, e com isso entramos no mbito das conseqncias provveis, o investimento que estamos propondo rentvel, porque atende a um imperativo: conseguir uma educao integral para todos. Mas rentvel tambm porque ajuda a criar um clima de convivncia cidad, gera o capital social necessrio para garantir o desenvolvimento, previne o fracasso escolar, ajuda a criar um clima de convivncia e bem-estar nas escolas e contribui para formar cidados ativos de uma sociedade democrtica.

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    PARTE 11 Pontuando e contrapondo

    Ulisses F. Arajo Josep Maria Puig

    Aprender a Viver.pdfAprender a Viver 2