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APRENDIZAGEM E FORMAÇÃO: aprofundamentos e conexões contemporâneas Roberto Sidnei Macedo * RESUMO O presente artigo apresenta como sua argumentação central, a perspectiva da aprendizagem imbricada ao fenômeno irredutível e complexo da formação. Argumenta sobre os pressupostos que norteiam essa imbricação, bem como realça como a formação é perspectivada como uma irredutibilidade experiencial. Projeta-se na caracterização do que seja uma aprendizagem formativa, contribuindo para que esse fenômeno humano amplamente sistematizada nas organizações educacionais e seus curricula seja melhor compreendido, e suas mediações se qualificam em função das expectativas que a sociedades contemporâneas vêm colocando diante de uma educação eivada de desconfianças técnicas, éticas, políticas, estéticas, culturais e formacionais. Conclui com a ideia de que para ser qualificada a aprendizagem deverá entrar no mérito do que seja formativo, valor a ser (in)tensamente discutido pela pluralidade dos interesses socioculturais. PALAVRAS-CHAVE: aprendizagem, formação, currículo. Poderíamos nos autorizar a acreditar que ao aprender estamos formados e que formação é apenas aprender algo? Que toda aprendizagem é formativa? Que os modelos a nós ensinados pelas ciências da educação, lideradas em grande parte pela psicologia e pela pedagogia modernas são pertinentes para compreendermos e mediarmos a aprendizagem como experiência significativa? Este texto caminha tentando elucidar desde o seu início, o argumento de que a aprendizagem é um dos fatores fundamentais da formação, mas a formação não se reduz ao processo de aprendizagem simplesmente. * FORMACCE FACED-UFBA. Possui graduação em Psicologia Clínica e Educacional pelo Centro Ensino Unificado de Brasília (1975), Mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1988), Doutorado em Ciências da Educação - Universidade de Paris VIII (1995), Pós-doutorado em Currículo e Formação pela Universidade de Fribourg na Suíça (2007).

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APRENDIZAGEM E FORMAÇÃO:

aprofundamentos e conexões contemporâneas

Roberto Sidnei Macedo*

RESUMO

O presente artigo apresenta como sua argumentação central, a perspectiva da

aprendizagem imbricada ao fenômeno irredutível e complexo da formação.

Argumenta sobre os pressupostos que norteiam essa imbricação, bem como realça

como a formação é perspectivada como uma irredutibilidade experiencial. Projeta-se

na caracterização do que seja uma aprendizagem formativa, contribuindo para que

esse fenômeno humano amplamente sistematizada nas organizações educacionais

e seus curricula seja melhor compreendido, e suas mediações se qualificam em

função das expectativas que a sociedades contemporâneas vêm colocando diante

de uma educação eivada de desconfianças técnicas, éticas, políticas, estéticas,

culturais e formacionais. Conclui com a ideia de que para ser qualificada a

aprendizagem deverá entrar no mérito do que seja formativo, valor a ser

(in)tensamente discutido pela pluralidade dos interesses socioculturais.

PALAVRAS-CHAVE: aprendizagem, formação, currículo.

Poderíamos nos autorizar a acreditar que ao aprender estamos formados

e que formação é apenas aprender algo? Que toda aprendizagem é formativa? Que

os modelos a nós ensinados pelas ciências da educação, lideradas em grande parte

pela psicologia e pela pedagogia modernas são pertinentes para compreendermos e

mediarmos a aprendizagem como experiência significativa?

Este texto caminha tentando elucidar desde o seu início, o argumento de

que a aprendizagem é um dos fatores fundamentais da formação, mas a formação

não se reduz ao processo de aprendizagem simplesmente.

* FORMACCE FACED-UFBA. Possui graduação em Psicologia Clínica e Educacional pelo Centro Ensino Unificado de Brasília (1975), Mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1988), Doutorado em Ciências da Educação - Universidade de Paris VIII (1995), Pós-doutorado em Currículo e Formação pela Universidade de Fribourg na Suíça (2007).

Nestes termos, a formação puxa a aprendizagem para uma dimensão que

não se reduz à memória, ao perceptivo ou ao intelectual, aos caprichos do desejo,

como é comum encontrarmos nos cenários educacionais. É aqui que imaginamos

uma existência cidadã em aprendizagem, até porque, se a aprendizagem é, de

algum modo, uma invariante humana, como a psicologia do desenvolvimento já

cansou de demonstrar (somos programados para aprender e condenados a

aprender), seu aparecimento é sempre humanamente plural e, com isso, essa

condição a torna uma pauta e uma opção biopsicológica, social, cultural e política.

Portanto, fenômeno que varia entre nós humanos (se estamos programados para

aprender, estamos, por consequência, condenados a aprender de fora biológica,

psicológica, social, cultural e política). Essa condição acaba por demandar uma

atenção refinada sobre o que seria uma aprendizagem que forma.

Como uma atividade humana extremamente complexa, a aprendizagem

se caracteriza por um processo em que o sujeito busca, e é desafiado a buscar,

compreender a realidade em que vive e a si, através da sua capacidade percepto-

cognitiva e de interação estruturantes, (nem sempre conscientes), mediadas por

suas intenções, interesses, desejos e escolhas, modificando, portanto, seu meio e a

si próprio (toda aprendizagem envolve mudanças, deslocamentos, retomadas,

ressignificações e possibilidade de rupturas), onde a resultante desse processo (o

aprendizado), se configura na aquisição de saberes e fazeres, em níveis intelectuais,

cognitivos, psicomotores, psicossociais, culturais, como dimensões relativamente

integradas, implicando aí um inacabamento infinito, até porque, em face de

existirmos nos colocando constantes problemas para compreendermos e

solucionarmos, estaremos sempre condenados a aprender. Tal processo acontece e

se realiza, em meio a uma cultura e a uma realidade social e histórica, implicando

relações estruturantes, onde atividades e conteúdos a seremaprendidas configuram

escolhas socialmente referenciadas.

Faz-se necessário acrescentar, ademais, que aprender num cenário

curricular, por exemplo, é aprender em meio a uma cultura densa, estruturante e

opcionada; é aprender num contexto social e cultural onde um determinado tipo de

conhecimento e de atividade se apresenta e se organiza como relevante em termos

de aprendizado e formação. Ou seja, é aprender em espaços onde seelege um

conhecimento relativamente sistematizado como formativo. Quem elege e para quê?

Essa é uma pergunta crucial no campo das reflexões e explicitações

sociocurriculares e formativas, porque envolve intenção, interesse e construção de

poder. Daí a importância de se exercitar nos processos formativos e no processo de

configuração dos atos de currículo por consequência, uma certa metaformação, ou

seja, reflexões formativas a respeito da própria formação em processo e reflexões

curriculares a respeito dos atos de currículo em construção.

Podemos ainda acrescentar a esse conjunto de reflexões que

fundamentam parte deste texto, a seguinte provocação: a educação desconhece em

grande parte o que é aprendercomo experiência formativa.

Vale ressaltar que a aprendizagem curricular se tornou depois dos

estudos de Ausubel, Bruner e Gagné e suas “teorias instrucionais” da segunda

metade do século XX, um fenômeno pouco aprofundado nas teorias

contemporâneas do currículo e da formação; foi esquecida após esse momento

histórico. Tomando esse contexto de produção e reflexão, a aprendizagem se tornou

nos meios educacionais, em grande parte, de forma reduzida, objeto privado das

psicologias, das neuropsicologias e da psicopedagogia.

Vale dizer que o fenômeno da aprendizagem não pode ser visto apenas

por uma perspectiva psicológica, biopsicológica ou psicopedagógica, até porque,

aprender num processo formativo implica a mediação pedagógica, social, cultural,

política, estética, e econômica.

Inspirado em Clyde Kluckhohn, em termos contemporâneos, Jerome

Brunernos fala, em suas obras recentes, que os seres humanos não terminam em

suas próprias peles, eles são expressões de uma cultura. Pautado em Geertz, este

autor afirma que não existe coisa tal como uma natureza humana independente da

cultura. Desta perspectiva, em virtude da participação na cultura, o significado

aprendido é tornado público e compartilhado (BRUNER, 1997). Compreendemos,

assim, que as realidades resultam de processos prolongados e intrincados de

construção e negociação, profundamente imbricados na cultura. Mas também, que a

cultura é constitutiva do psíquico; assim, o significado atinge uma forma que é

pública e comunal, em vez de privada e autista.

Por consequência, é a cultura que talha a vida e a mente humana, que dá

significado à ação, situando seus estados intencionais subjacentes em um sistema

interpretativo e experiencial de aprendizagem.

Aprender não é apenas aprender isso ou aquilo; é descobrir novos meios de pensar e de fazer diferente; é partir à procura do que poderá ser este “diferente”. É por isso que me arriscaria a dizer que o acto de aprender transformado em “acto de investigação” poderia permitir aos aprendentes desenvolver a sua criatividade, as suas habilidades, a sua capacidade de avaliação (auto-avaliação e co-avaliação, valor extraído e atribuído a...), a sua capacidade de comunicação e de negociação [...] (JOSSO, 2002, p. 184).

Vale dizer ainda, que aprender solidariamente e por uma ética da

mutualidade, como querem as abordagens ético-culturais, não significa ausentar-se

do conflito de interpretações e de soluções, é bom que se frise. É antes de tudo um

exercício que experimenta o fato de que não aprendemos de forma igual e nem

chegamos às soluções dos problemas apenas de forma reprodutivista, e que em

muitos momentos lutamos por significados, ou seja, por aquilo que acreditamos ter

sentido; tem a ver com o poder significativo da crença, que muitas vezes, por

exemplo, faz um professor escolher como trabalhar.

Chamamos a atenção para o pensamento de Bernard Charlot (2000), ao

nos dizer que qualquer que seja a figura do aprender, o espaço do aprendizado é,

portanto, um espaçotempo partilhado com as outras pessoas. Nesse sentido, não

está em jogo apenas o didático e a nossa relação com o conhecimento eleito como

formativo por alguém. Há um processo identitário em fluxo na relação com o saber.

Desta forma, aprender significa, também, entrar numa dinâmica relacional, apropriar-

se de uma forma intersubjetiva, construir de forma auto-reflexiva, uma imagem de si.

É partindo também desta perspectiva que Humberto Maturana (1995) dissemina a

ideia de que aprender não é a aquisição de algo que está lá. É, por outro lado, uma

transformação em coexistência com alguém.

Ao refletir a realidade curricular pautada predominantemente no currículo

prescritivo, herança histórica da imposição disciplinar imposta pelo poder que se

produz nas estruturas simbólicas e materiais das classes dominantes, Goodson,

(1992; 2000; 2007) aponta suas atuais lentes analíticas em termos sócio-curriculares

para o que chama de “identidades narrativas”.

O que esse autor deseja é perspectivar um futuro social ajudado pelas

políticas e práticas curriculares onde as aprendizagens se configurem

predominantemente como “aprendizagens narrativas”, desenvolvidas no seio de um

“currículo como narrativa”.

O que se percebe nesta perspectiva é uma crítica ao mesmo tempo

pedagógica e política aos modelos e suas lógicas de validade e aplicação, através

de um olhar extremamente atento às consequências político-pedagógicas advindas

daí.

Por outro lado, para Goodson, essa lógica prescritiva já tem os seus dias

contados em face de um mundo portador de uma dinâmica que em nada se ajusta a

essa rígida e iníqua maneira de pensar o curricular.

Se o currículo prescritivo está acabando, a nova era do currículo no novo

futuro social ainda está, temos de admitir, longe de ser bem definida. Acredito que os

esboços sobre a aprendizagem narrativa e o capital narrativo fornecidos aqui são o

início de uma nova especificação para o currículo. Estamos apenas no começo. É

um início que traz a esperança de que possamos, finalmente, corrigir a “mentira

fundamental” que se situa no âmago do currículo prescritivo. No novo futuro social,

devemos esperar que o currículo se comprometa com as missões, paixões e

propósitos que as pessoas articulam em suas vidas...Isso seria, verdadeiramente um

currículo para empoderamento (GOODSON, 2007, p. 251).

Neste sentido, foi que elaboramos perspectivas de aprendizagem que

apontam para uma abordagem à aprendizagem vinculada ao contexto curricular e

formativo visando ademais, ecologizar a aprendizagem, fazê-la comunicante no

sentido de aprender aprofundando, distinguindo, relacionando, globalizando,

problematizando, num ambiente educacional de intenção e elucidação formativas:

Trabalhar intensamente a produção de sentidos no aprender, visto que toda e

qualquer via de possibilidade para se realizar o fenômeno da aprendizagem

apresenta-se como estruturada e estruturante, mesmo a partir das

elementaresexperiências sensíveis;

Ouvir sensivelmente as aprendizagens e acolher os seus processos honestos

de errância e de ambivalência.

Compreender os etnométodos dos processos de aprendizagem – métodos,

maneiras práticas, construídos na cultura específica de qualquer ator social

aprendente, para todos os fins práticos - para não fazer das ações da

formação uma barbárie de culto à univocidade cultural e pedagógica, pois

ninguém aprende de forma igual;

Compreender que aprender significa transformação co-construída, seja nos

âmbitos intelectual, cognitivo e afetivo;

Tensionar via as histórias e os contextos de produção, os materiais e

situações a serem aprendidos;

Colocar em diálogo o tradicional e o novo, evitando a lógica simplista do

descarte e da substituição do conhecimento durante o processo de

aprendizagem;

Distinguir e relacionar conhecimento e competência qualificada, pois, nos

cenários de aprendizagem, o conhecimento por si não garante a qualificação

que implica conhecer com autonomia para uma prática técnica e

politicamente reflexiva;

Desconstruir a hierarquização das aprendizagens em termos socioculturais,

mesmo no necessário reconhecimento de que existem aprendizagens

prioritárias em determinados campos e tempos, visando a humanização e a

historização do aprender;

Nutrir a curiosidade, que é a mais viva das características da ação de

aprender;

Instituir a aprendizagem solidariamente transgressiva, divergente,

questionante;

Relativizar os modos de aprender, porque a diferença faz parte do ser em

aprendizagem e suas inteligibilidades, como formas de compreender e agir no

mundo;

Garantir a aprendizagem para a vida, implicando o exercício profissional,

político, estético e da cidadania democraticamente enraizada;

Reconhecer que se aprende pelos sentimentos e que os sentimentos

aprendem, compreendendo que o fenômeno da aprendizagem é também do

âmbito do estético e do desejo;

Instaurar vigorosamente uma aprendizagem pela inteligência e para a

inteligência, aquela que ao lidar com as especificidades, as especializações, é

também capaz de produzir conhecimento relacional e globalizado.

Acolher as diversas inteligibilidades e experiências de aprendizagem, que não

se reduzem ao uno, ao cálculo e suas políticas de controle, que não se

plasmam no normativo, no simplesmente esperado, como forma de

reconhecimento da heterogeneidade da aprendizagem (MACEDO, 2000, p.

78). Nestes termos, faz-se necessário acolher a originalidade que aponta para

experiências aprendentes autônomas e autorizantes.

Neste contexto de argumentos sobre a aprendizagem e sua relação com

a problemática da formação, vale a pena reforçar nosso diálogo com as palavras de

Marie Christine Josso.

A questão do sentido do processo de aprendizagem não reenvia apenas para o trabalho de articulação com o universo das referências do pensamento e da acção dos aprendentes em termos de significação e de projecto. Ela reenvia também para a questão das finalidades do processo e para o que está em jogo na aprendizagem para pessoa... A compreensão pelo próprio aprendente das dinâmicas que constituem o seu processo de formação dá aos processos de aprendizagem e de conhecimento uma “consistência”, uma “coluna vertebral” que reforça a energia psíquica e afectiva do aprendente, o seu sentimento de coerência e a sua disponibilidade para a aprendizagem propriamente dita... Para o aprendente, compreender o que está em jogo da sua identidade em devir numa aprendizagem é colocar-se em posição de determinar melhor as inevitáveis desaprendizagens, os pontos de resistência à mudança, os recursos à disposição, as experiências a questionar, as escolhas já feitas a considerar... Finalmente, é colocar os processos de aprendizagem e de conhecimento simultaneamente em relação com as aquisições do passado e com as mudanças que preparam um futuro mais ou menos próximo (JOSSO, 2002, p. 186).

Além disso, há uma afirmação tão simples quanto extremamente

importante em termos contemporâneos: no seio do direito à aprendizagem, do direito

à formação, é preciso aprender a se formar. Esse direito e essa experiência são, em

geral, negligenciados, fica nos níveis do impensado, transformado na resultante de

uma concessão da autoridade pedagógica, com consequências éticas e políticas

significativas para quem está implicado num processo institucional de formação e

para o próprio exercício da cidadania.

Aprender a formar-se é parte importante na construção da autonomia

cidadã.

Como recomenda Dominicé (2007, p. 124), inspirado em J. Mezirow, “a

aprendizagem formadora deve vir junta com uma mudança de ponto de vista, uma

transformação de perspectiva”.

Podemos acrescentar a essas contribuições sobre a aprendizagem de

uma perspectiva formativa, os argumentos de Christine Délory-Monberger (2008, p.

138), quando nos diz que aprender e apropriar-se dos saberes, seja qual for a sua

natureza, é, em graus diversos, retocar, revisar, modificar, e transformar um modo

de ser no mundo, um conjunto de relações com os outros e consigo mesmo; é lançar

novos olhares sobre seu passado e sobre suas origens, projetar ou sonhar, de outro

modo, seu futuro, “biografar-se de outro modo”. Acrescentamos, é pensar também

de forma problematizadora na construção de um projeto histórico mais digno para

uma sociedade em que a educação ainda se constitui num certo privilégio.

REFERÊNCIAS

ARDOINO, J. L’approche multirréférentielle (plurielle) des situatios éducatives et formatives. Pratique de Formation (Analyses), Université de Paris 8, n. 25-26,1993, p. 15-34. BRUNER, J. Atos de significação. Tradução de Sandra Costa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. CHARLOT, B. Da relação com o saber. Tradução de Bruno Magne. Porto Alegre: ARTMED, 2000. DELORY-MONBERGER, C. Biografia e Educação: figuras do indivíduo-projeto. São Paulo/Natal, Paulus/EDUFRN, 2008. GOODSON, I. A crise da mudança curricular: algumas advertências sobre iniciativas de reestruturação. In: Silva, H. (Org.) Século XXI. Qual conhecimento? Qual currículo? Petrópolis: Vozes, 2000, p. 109-147 _____________. Dar voz ao professor: as histórias de vida dos professores e seu desenvolvimento profissional. In: Nóvoa, A. (Org.) Vida de Professores. Porto: Porto Editora, 1992, p. 69-90. _____________. “Currículo, narrativa e futuro social”. Revista Brasileira de Educação, ANPED, V. 12, n. 35, maio/agosto, 2007, p. 241-252. _____________. As políticas de currículo e de escolarização. Tradução de Vera Joscelyne Petrópolis: Vozes, 2008. JOSSO, M.-C. Experiências de vida e formação. Tradução de José Cláudio e Júlia Ferreira. Lisboa: EDUCA, 2002. MACEDO, R. S. Currículo: campo, conceito e pesquisa. Petrópolis: Vozes, 2008.

_____________. Compreender e mediar a formação: o fundante da educação. Brasília: Liber Livro, 2010. _____________. Atos de Currículo, formação em ato? Ilhéus: Editora da Universidade de Santa Cruz, 2011 (no prelo). MATURANA, H. VARELA, F. A árvore do conhecimento. São Paulo: PSY, 1995.

ELOGIOS QUE CURAM E CRÍTICAS QUE ADOECEM

Quantas ideias fantásticas, sonhos não realizados, projetos sequer iniciados,

impedidos de nascer ou nascidos natimortos, simplesmente pelo temor de uma

observação maldosa, de um cerceamento, de uma crítica gratuita?

Domingos Pascoal*

RESUMO

O estrago que uma crítica ácida pode fazer com a autoestima de uma pessoa é

incalculável. No entanto, olhando pelo mesmo viés, o bem que uma validação

sincera poderá operar na autoestima dessa mesma pessoa é, também, inumerável.

A escolha é sempre daquele que, tendo o poder, age de forma sensata,

influenciando positivamente, construindo com seu “mel”, sua boa vontade e sua

compreensão; ou violentamente destruindo com o seu fel — com a sua

“autossuficiência” destrutiva — a intenção, o sonho ou os propósitos de outro.

Quantas ideias fantásticas, sonhos não realizados, projetos sequer iniciados,

impedidos de nascer ou nascidos natimortos, simplesmente pelo temor de uma

observação maldosa, de um cerceamento, de uma crítica gratuita! E, às vezes, há

quem diga que existe uma crítica imune a esta depreciação que ora falo. Afirmam

tratar-se, em alguns casos, de “crítica construtiva”.

PALAVRAS-CHAVE: Críticas. Elogios.

O estrago que uma critica ácida pode fazer com a autoestima de uma

pessoa é incalculável. No entanto, olhando pelo mesmo viés, o bem que uma

validação sincera poderá operar na autoestima dessa mesma pessoa é, também,

inumerável.

A escolha é sempre daquele que, tendo o poder, age de forma sensata,

influenciando positivamente, construindo com seu “mel”, sua boa vontade e sua

* Advogado, jornalista, membro da Academia Sergipana de Letras, articulista da Revista Perfil e do Portal Infonet, membro do Conselho de Ética da OAB/SE. Formado em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É também formado em Filosofia e pós-graduado em Gestão de Pessoas.

compreensão; ou violentamente destruindo com o seu fel — com a sua

“autossuficiência” destrutiva — a intenção, o sonho ou os propósitos de outro.

Quantas ideias fantásticas, sonhos não realizados, projetos sequer

iniciados, impedidos de nascer ou nascidos natimortos, simplesmente pelo temor de

uma observação maldosa, de um cerceamento, de uma crítica gratuita! E, às vezes,

há quem diga que existe uma crítica imune a esta depreciação que ora falo. Afirmam

tratar-se, em alguns casos, de “crítica construtiva”.

Pense bem, para não fazer um juízo equivocado: você já viu uma crítica

que não magoasse? Ela só será construtiva se houver muita boa vontade do

criticado em assim entender, isto, convenhamos, é muito difícil. Crítica ou “crítica

construtiva”, ou como queiram chamar, é uma apreciação desfavorável. É apontar

falhas, censurar, avaliar pelo lado contrário, é julgar, é estar em crise. Logo, não é

agradável. Ninguém gosta de ser contestado, em suas ações, por isso, logo surge a

defesa.

O resultado, às vezes, é logo percebido. Noutras oportunidades e,

dependendo da situação, são destruidoras de sementes plantadas que só medrarão

num futuro. Porém, em ambos os casos, é sempre decisivo para o sucesso ou o

fracasso, para o bem ou para o mal, para a pobreza ou para a riqueza, para a fé ou

para a desilusão, para cima ou para baixo.

Mas atenção! Como é prejudicial a crítica desmesurada, assim também, o

elogio irresponsável, em excesso, não constrói. Pesquisas revelam que pessoas que

vivem sob o império da crítica, do cerceio e da sujeição tendem a desenvolver

padrões de comportamentos de incapacidade para decidir, de dependência dos

outros para realizar, de submissão por medo de errar. Normalmente são pessoas

frágeis, preocupadas em demasia e carentes.

Por outro lado, os superelogiados, via de regra, desenvolvem uma

irresponsável autossuficiência, são prepotentes, arrogantes e têm muita dificuldade

nos relacionamentos, pois não gostam de obedecer às normas e à ética dos

relacionamentos, tornando-se pessoas de difícil trato.

O ideal seria que tudo obedecesse sempre a um equilíbrio, apontando, no

entanto, para a transcendência na busca do sonho, do novo, do bom, do belo e do

útil para todos. Ou seja, a busca da construção, e nunca da destruição; do elogio

responsável, mas nunca da crítica destrutiva; do enaltecimento, todavia nunca da

recriminação; da valorização, porém nunca da depreciação.

Com toda a isenção, sobretudo, de autocrítica, pensem comigo: existe a

censura construtiva?

Aquela que edifica, transforma para melhor, para maior, para cima? Será

que a crítica, mesmo a considerada “crítica construtiva”, constrói?

Antes de dar a sua opinião, faça uma avaliação criteriosa, isenta, sem

unilateralismo. Avalie com calma, não responda por responder. O que realmente

constrói: crítica ácida ou elogio sincero?

Para não correr o risco do elogio irresponsável nem da crítica destrutiva,

seria ideal pensar bem na hora de fazer certas observações e procurar ver mais o

lado bom daquilo ou daquele que, naquele instante, está a carecer de nossas

observações, extraindo, em primeiro lugar, o que há de melhor, elevando as virtudes

e, se possível, minimizando, dentro da ordem de prioridades, os defeitos. Pois,

muitas vezes, tais distorções em nada contribuem ou interferem no todo.

Portanto, para que se importar com as críticas? Por que e para que

criticar inconsequentemente as pessoas?

A lei de ouro do comportamento é o equilíbrio.

No entanto, se não tiver jeito e você achar que é necessário criticar, pois

assim agindo estará colaborando para o engrandecimento do outro, seja caridoso e

pratique outra regra de ouro: elogie em público e critique em particular. Não se

esqueça: críticas adoecem, elogios curam.

1

A LIDERANÇA EMPRESARIAL CONTEXTUAL

Feliciano de Mira1

RESUMO

A emergência das economias de heterogeneidade estrutural tem diversificado os

mercados da globalização obrigando os empresários a recorrer a performances cada vez

mais contextualizadas e inovadoras para realização dos seus objectivos. A coexistência

diversificada de mercados, dentro dum mesmo sistema económico mundial, obriga os

agentes económicos a seguir uma liderança cruzada, envolvendo elementos

estruturantes diversificados, gerando uma hibridez funcional. Ao efectuar a revisitação

aos autores ocidentais mais significativos do pensamento clássico sobre empresários e

empresas, destacamos os elementos estruturantes da liderança empresarial, verificando a

persistência das regularidades do seu pensamento na actualidade contemporânea.

PALAVRAS-CHAVE: empresários; empresas; liderança; saberes empresariais;

cruzamentos empreendedores.

1 INTRODUÇÃO

As variáveis contextuais são estruturantes dos saberes aplicados pelos

agentes empresariais na sua performance, tornando-se os pilares epistemológicos da

actividade empresarial. Porém, a recente crise internacional demonstrou, que apesar dos

contextos, as conexões entre as elites e os poderes transnacionais dos diferentes países,

reproduz traços aproximativos nas suas formas de liderança empresarial. Mas a

impossibilidade de homogeneizar ou de reduzir ao mesmo corpo as unidades múltiplas,

obriga a atravessar os territórios das incertezas e das contradições. A complexidade dos

fenómenos empresariais contemporâneos assenta em premissas cada vez mais

1 Doutror em Socieconomie du Developpement pela EHESS-Paris; Doutor em Sociologia Económica e

das Organizações e Mestre em Sistemas Sócio-Organizacionais das Atividades Económicas pelo ISEG-

UTL-Lisboa. Pós-Doutorado em Estudos Culturais Comparados pelo CES da Universidade de Coimbra.

Docente do Programa de Pós-Graduação em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental da UNEB-BA,

Campus VIII. Coordena o Grupode Pesquisa em Socioeconomia do Desenvolvimento Sustentável da

UNEB.

2

sofisticadas, que se acumulam de forma sistematizada ou por transferência dos acervos

familiares e pessoais, da memória e da experiência compartilhada. Não obstante esta

transição ser resultante de factores temporais, contextuais e relações de poder, a

revistação aos clássicos do campo empresarial suscita um nova releitura da sua

fundamentação substantiva e facilita a interpretação dos processos de mudança

empresarial pós-moderna.

2 A FIGURA SOCIAL DA LIDERANÇA EMPRESARIAL

A importância e influência dos valores ligados à religião protestante

calvinista sobre as inclinações empreendedoras é o centro do clássico estuda de Max

Weber, “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” para quem a dedicação ao

trabalho e ao estudo, no ascetismo e na reprovação da auto-indulgência e exibicionismo,

formaram pessoas que se realizam em função de um padrão de excelência internamente

estruturado. Assim o exercício de cada profissão exprime uma indicação vocacional

indicativa da presença de Deus, tornando as concepções religiosas uma determinante

dos comportamentos económicos. Esta dimensão subjectiva do pensamento económico

faz salientar a importância de diferentes factores não especificamente económicos na

origem da organização da actividade económica. A actividade religiosa e as empresas

cruzam-se fazendo emergir factores psicológicos e sociológicos no desencadear das

forças que produzem a criação e organização da empresa.

A relação entre os valores religiosos e a acção empreendedora é responsável

pelo desencadear das forças que produzem a criação e organização da empresa e estão

na origem do crescimento do capitalismo moderno. Max Weber atribui o crescimento

do capitalismo moderno à acção empreendedora e à especificidade de certos valores

religiosos mantidos pela religião protestante calvinista. Neste contexto o capitalismo

define-se pela existência de empresas caracterizadas pela separação entre a família e os

factores de produção, dirigidas por empresários cujo fim é realizarem o máximo lucro,

através da organização racional do trabalho e da produção. Como ponto de partida

podemos afirmar que uma empresa é uma organização, onde um grupo de pessoas está

consciente de si próprias e desenvolve um conjunto de tarefas com o objectivo de atingir

determinados metas, dentro de um sistema estruturado de funções distribuídas entre

pessoas e tecnologias, de limites identificáveis e sob a orientação de uma estrutura de

liderança. Mas a organização é mais do que isso, pertence a uma sociedade maior, cada

3

organização apresenta um configuração hipercomplexa, resultado de um conjunto de

motivações económicas e sociais. As organizações são sistemas abertos influenciados

por uma multidão de forças e mudanças ambientais ligadas com particular destaque para

a religião, a família e etnicidade, mesmo em sociedades complexas da actual fase de

pós-modernidade. A análise da cultura e da sua influência na formação dos empresários,

apresenta uma forte variável explicativa para interpretar o funcionamento dos mercados,

pelo que a personalidade do líder representa a sua cultura numa situação específica.

Então a empresa é uma unidade de meios humanos, materiais e financeiros que

actuando segundo imperativos decorrentes das regras do mercado, através da produção

de bens ou serviços, visa satisfazer as necessidades, quer da comunidade quer dos que

nela participam com capital, direcção e trabalho. Desta maneira, tanto a actividade

profana como a profissional, foram colocadas no centro de interesse dos crentes através

do protestantismo ascético, onde o empresário é visto como uma categoria

socioprofissional que decorre de um acto de predestinação divina. Assim é entendida "a

profissão concreta do indivíduo, como uma ordem especial de Deus no sentido de ele

ocupar o lugar concreto para que está predestinado" (WEBER, 1982:56). É na

conjugação destes aspectos que segundo Max Weber deve ser interpretado o espírito do

capitalismo, devendo o empresário ao mesmo tempo que segue uma disciplina racional

e manter um intenso desejo de lucro. "A ordem económica capitalista tem necessidade

desta devoção à vocação de ganhar dinheiro" (id., ibid.:46). Os empresários realizam-

na, não apenas no mero interesse de acumulação, mas na perspectiva do reinvestimento

e criação de nova riqueza. A sua actividade deve apresentar um tipo-ideal de

organização formal e mecanismos que põe em movimento essa organização formal, a

que chamamos burocracia que “apresenta diferentes níveis de autoridade; a acção está

sujeita a regras bem definidas e impessoais; cada tarefa tem as suas regras a aplicar;

os funcionários são escolhidos conforme a competência. (id.,1944:85) A burocracia

representa ainda a forma mais perfeita de organização e funcionamento das empresas e

é dentro deste espaço que o empresário tem de agir e recriar as suas capacidades de

liderança. O indivíduo é o fundamento do sistema social, o qual actua com base no

entendimento que tem da situação social. Por outro lado a sua acção baseia-se na

sociedade e suas instituições, mais do que em forças sociais misteriosas ou abstracções,

o que o obriga a exercitar as características empreendedoras, é sua função inovar “fazer

novas combinações denominadas empresas” (SHUMPETER, 1961:130) O seu papel

funcional é essencial no processo produtivo, a evolução económica está associada à

4

ideia de capacidade empreendedora, que implica a ruptura com as situações de

equilíbrio estabelecidas pelo mercado. O empresário é o agente que dinamiza o

processo denominado "destruição criativa", entendido o conceito de destruição por

contraste ao acto de criar. A "introdução bem sucedida de uma nova mercadoria ou

produto traz o germen da destruição", (id., 1951:163) de outras mercadorias ou

produtos que alimentavam o circuito económico. Embora esta acção inovadora

mantenha em comum a racionalidade dos processos anteriores, ela visa e é realizada em

ordem a um novo tipo de produtos, reproduzindo novas empresas e dinamizando os

mercados. O "processo de destruição criativa constitui um dado fundamental do

capitalismo a que a empresa capitalista tem de se adaptar" (id., ibid.:164) para se

manter no mercado. A actividade do empresário é relevante em todo este processo

porque são os "empresários as pessoas que tomam as decisões de direcção" (id.,

ibid:165). No desempenho desta função é essencial o sentido da decisão mais do que a

decisão em si, pois é o sentido da decisão que conduz a novas combinações que levam

ao êxito. "Os ganhos empresariais não são rendimentos permanentes, emergem sempre

que uma decisão empresarial que em condições de incerteza alcança sucesso" (id.,

1964:179). O valor da decisão está centrado na orientação que ela segue aferida pelos

resultados, os ganhos que obtém independentemente da quantidade de capital aplicado.

A família é um dos factores mais decisivos na formação dos indivíduos,

funciona como meio de controlo e equilíbrio social, forma de integração e transmissão

de valores e saberes ancestrais, através dos seus membros, assim como mecanismo

regulador de condutas e apaziguamento social. A família molda atitudes e conceitos,

condicionando e potenciando horizontes. O tipo de organização familiar não só reflecte

as crenças e os valores tradicionais existentes no espaço geográfico residencial, como

influência a organização das próprias actividades económicas. O ambiente educacional

da família molda atitudes e visões, condiciona ou potencializa horizontes através de

"efeitos persistentes" sobre os indíviduos e as suas inclinações empreendedoras. "As

variações familiares significam diferentes coisas em culturas diferentes"

(MACCLLELAND, 1972:123). Os valores culturais diferentes ou as variações nas

estruturas familiares alteram os padrões motivacionais. Nos estudos pioneiros sobre a

motivação empresarial David MacClleland (1987) identifica o empresário como o

homem que organiza a empresa, a unidade de negócio, e/ou que aumenta a sua

capacidade produtiva. No mesmo estudo constacta que as religiões de misticismo

positivo muito forte, (o Zen no Japão, ou os Vaishnavas da Índia), estimulam a

5

eficiência individual e a responsabilidade pessoal, desenvolvendo o ambiente

educacional que motiva as inclinações empreendedoras. Segundo estas suposições o

indivíduo empreendedor tem uma estrutura motivacional diferenciada que apresenta a

necessidade de realização, como uma necessidade específica marcante. A necessidade

de realização é a força motriz da iniciativa empreendedora que identificada e descrita

por MacClelland recebeu a denominação de "n achievement", o que significa

"conquistar algo com esforço próprio" (id.,ibid.:230). Segundo a sua "Teoria das

Necessidades Socialmente Adquiridas", as pessoas desenvolvem três necessidades:

realização, poder e afiliação. A realização é a necessidade que o indíviduo tem de ser

bem sucedido, marca o seu temperamento enérgico e inconformista e o gosto por

papéis que representam risco. Nesta teoria, o poder representa a necessidade de

conquistar um certo grau de influência sobre outras pessoas, enquanto a afiliação

encerra as motivações associadas ao desempenho de actividades sociais e comunitárias

como forma de obter segurança pessoal. Segundo o autor, cada um de nós será

influenciado por cada uma destas necessidades, dependendo da situação que está a

vivenciar na sua vida. As experiências pessoais estruturam os interesses e orientam cada

uma das três necessidades descritas de forma dominante. Nesta fundamentação, o

empresário é um produto motivacional que orienta a sua actividade no plano funcional e

no plano comportamental, tendo por base os valores, crenças e estímulos sociais e

culturalmente adquiridos.

As funções empresariais numa perspectiva histórica ou transcultural, vista

em diferentes épocas e lugares, podem ser consideradas de diferentes maneiras, ainda

que todas tendam para um reforço de prestígio na hieraquia social. Então o papel

empresarial caracteriza-se pela : a)Aceitação moderada de riscos como função da

capacidade de decisão; b)Actividade instrumental vigorosa e/ou original;

c)Responsabilidade; d)Conhecimento dos resultados das decisões; (O dinheiro como

medida dos resultados) e)Previsão de possibilidades futuras; f)Aptidões de

organização. (id., 1972:256)

Então a necessidade de realização sintetiza todas estas características e leva

o empresário a comportar de maneira particular segundo padrões de liderança

correspondentes ao seu papel, o que leva a distinguir o comportamento dos empresários

do comportamento empresarial separando o status do papel que desempenha. Nesta

perspectiva teórica todas as necessidades poderão ser aprendidas independentemente da

idade das pessoas, através da formação comportamental, a qual poderá transformar

6

indivíduos em empresários geradores de empresas , criação de emprego, riqueza e bem

estar social, o que não promove a necessidade de se implementarem escolas de

empreendedorismo e inovação, como liga as actividades empresariais aos processos de

desenvolvimento socioeconómico e introduz a componente de responsabilidade social

das empresas. Estas orientações apresentam grande relevância quer para as sociedades

mais tradicionais como outras de grande complexidade étnica. No caso contemporâneo

das potências emergentes dos BRIC’S e dos países da sua esfera de influência, estes

pressupostos podem participar na compreenção das origens sociais e psicológicas das

forças econômicas chaves chamadas a intervir no processo de crescimento e

desenvolvimento da sociedade. As relações empresariais e económicas estão

intimamente vinculadas a outras relações que envolvem estruturas políticas e sociais

religiosas e de parentesco.

Nos estudos que Geert Hofsted (1984) efectuou sobre as relações de

interdependência entre personalidade, cultura e sistema social, mostrou as

consequências das culturas nacionais sobre o funcionamento das organizações,

apontando quatro dimensões básicas para a configuração do modelo organizacional:

- A distância do poder foi apresentada distância psicológica entre pessoas

dentro da organização imposta pelo poder hierárquico;

- O domínio sobre a incerteza ou fuga à incerteza representa o grau em que a

ambiguidade é vista como algo de ameaçador ou gerador de ansiedade. A maneira como

os valores de individualismo/colectivismo são vistos e adoptados entre pessoas ou

grupos, assim como são aplicados para a actividades de trabalho e a solução de

problemas;

- As relações masculinidade/feminilidade, entendidas como o grau em que

os valores e comportamentos que parecem corresponder aos traços do estereotipo de

masculino são valorizados comparativamente aos mesmos traços no feminino dentro da

sociedade.

Se empresário representa a sua cultura numa situação específica como foi

atrás enunciado, as tendências reveladas por estas quatro dimensões vão determinar a

dinâmica do processo de desenvolvimento. Mas paradoxalmente, foi destes

pressupostos que surgiu a ideia de universalização dos comportamentos empresariais,

que tomou forma através da aplicação do princípio da transferibilidade gerencial nos

programas de cooperação económico internacional, fazendo doutrina no pensamento

hegemónico da globalização das relações internacionais. As chancelarias, apesar de

7

equivocadas, não tem prescindindo de manter na agenda da sua diplomacia económica a

transferência de teorias gerais de liderança e administração independentemente do

espaço cultural onde decorrem na procura de uma integração económica global.

Uma característica da actividade empresarial é a independência de acção do

empresário e a dificuldade de enquadrar o seu comportamento nas categorias

tradicionais das organizações (HENRY MINTZBERG, 1995). Num contexto

empresarial, o empresário é um líder, mas as suas tarefas são mais do que liderança,

porque planeia, organiza, dirige, controla e coordena as diversas funções que exerce. As

actividades dos empresários estão voltadas para o desempenho de um conjunto de

papéis relacionados, que embora possam ser descritos individualmente compreendem a

três tipologias:

- Os papéis interpessoais de relacionamentos do empresário com outros

membros da organização e do seu meio ambiente, enquanto líder, define as relações de

subordinação e de intermediação, é o elemento de ligação entre as pessoas da

organização e o exterior, pelo que devemos destacar este carácter de representante

simbólico e de identidade da organização;

- O líder empresarial é o porta-voz da organização, compartilha

informações com grupos do meio ambiente da organização e distribui o que acha

adequado aos seus subordinados, mas tambémtroca informações, procura e sistematiza

informações no meio externo;

- Os papéis decisórios do líder empresarial compreendem as decisões

voluntárias, inovadoras ou reactivas face a uma crise, tendo de assumir-se

empreendedor, responsável pela mudança e a iniciativa, face a situações involuntárias

tem de procurar as soluções adequadas; distribuidor de recursos, decidindo "quem é que

fica com o quê" e representar a organização em negociações de rotina ou de grande

importância.

Segundo a configuração estrutural das empresas, Mintzberg (1995) salienta

na sua classificação cinco tipos de organizações: As Organizações de Estrutura Simples

onde o principal mecanismo de coordenação é a supervisão directa, a parte chave da

organização é o vértice estratégico com uma centralização horizontal e vertical. As

organizações com uma Burocracia Mecanicista que apresentam a standardização dos

processos de trabalho, sendo a chave de organização a tecnoestrutura, aplicando-se uma

descentralização horizontal limitada. As organizações de Burocracia Profissional onde

principal mecanismo da coordenação reside na estandardização dos resultados, a parte

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chave da organização está no centro operacional e o tipo de descentralização pode ser

horizontal ou vertical. Já nas organizações de Estrutura Divisionalizada a coordenação é

feita pela standardização dos resultados, a chave da organização está na linha

hierárquica e a descentralização é vertical. Por fim, nas organizações de tipo

Adhocracia, onde a coordenação é feita por ajustamento directo, a parte chave da

organização está nas funções logísticas e o tipo de descentralização é selectivo.

A articulação dos papéis gerenciais de Mintzberg com a tipologia das

organizações oferecem uma leitura diversificada e representativa das realidades

empresarias do mundo empresarial da globalização económica nesta fase da pós-

modernidade emergente onde os valores do neo-liberalismo assumiram uma posição de

dominação hegemónica perante a tolerância dos governos dos BRIC´S de quem se

esperava uma maior resistência e desconstrução da arquitectura de acumulação mundial.

Esta atitude deve-se em parte ao facto destes países serem herdeiros de um mercado

centralizado retraiu o espirito empreendedor, e o empresário privado era considerado

ideologicamente um arrivista. Apostavam em empreendimentos de grande escala e

capital intensivo que aumentaram a dívida externa e geraram crises inflacionárias. As

políticas económicas travavam o crescimento do sector moderno e bloquearam o

tradicional associado à atracção do urbano sobre o rural.

3 CRUZAMENTOS EMPREENDEDORES

Apesar dos estrangulamentos formalistas, temos vindo a observar que em

espaços geográficos diferentes, existem formas de organização e funcionamento das

empresas e dos mercados, que saem dos parâmetros da economia institucionalizada. Os

mecanismos e os processos das suas actividades resultam da simbiose de variáveis

culturais e económicas, formais e informais, que introduzem acentuadas dispersões e

rompem com as concepções unívocas. O seu resultado é uma tipologia diversificada de

unidades económicas que interagem sem dependência entre si, configurando um

segmento crescente, autónomo e coexistente, ou um novo mercado, que obriga a formas

imaginativas de direcção e gestão empresarial.

Estão nesta situação as empresas africanas, pois apresentam uma

configuração híbrida onde nem o modelo ocidental nem o local são dominantes, mas

ambos participam no crescimento económico nacional e asseguram lucros para os

empresários. Nas economias de heterogeneidade estrutural, encontramos elementos que

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permitem fundamentar a existência de uma “crioulidade económica”2 que se erigiu

durante a modernidade, e que reproduziram em novas formas de acção e tomada de

decisões. O traço dominante destas racionalidades económicas africanas é a sua

articulação com as exigências sociais (HENRY, 1995; MIRA, 1996) e a isso chamam

"empresas de mestiçagem" (HENRY, 1995:180). Na versão do chileno Manfred Max-

Neff, trata-se da aplicação de saberes de subsistência ancestrais, próprios da cultura

específica de um determinado povo, em simbiose com as acessibilidades de

requalificação propiciado pela globalização. O novo herói africano é o empresário

africano, mas sai dos parâmetros de classificação ocidental de Max Weber, nas suas

funções enquanto líder apresenta uma maneira de gerir o negócio na fronteira da

actividade informal, com forte centralização pessoal e profundo vínculo a redes de

solidariedade comunitárias (MIRA, 1995) Porém o diálogo étnico entre o campo político

e económico, uma das peculiaridades do tecido empresarial das economias de

heterogeneidade estrutural, tem degenerado na etnização politica e empresarial. Como

resultado, tem transformando as bases de sobrevivência da família alargada africana,

num padrão de acumulação de recursos gerador de profundas desigualdades sociais

(MIRA 2012). A actual realidade do tecido empresarial sub-saharaniano aponta para o

empresário, com um homem de negócios múltiplos que se sustenta e sustenta os

regimes políticos. A maioria dos políticos-militares nacionalistas e patrióticos tornou-se

político-empresário (MIRA, 2005), a sua gestão está colada ao neo-patrimonialismo

governamental. Na dobragem do séc XX estas elites perderam as capacidades de

investimento do capital doméstico por esgotamento das apropriações indevidas da ajuda

internacional, todavia, tiveram a felicidade da descoberta de grandes jazidas de

hidrocarbonetos, o que intensificou o investimento externo e veio trazer um fôlego de

longa duração através dos mega-projectos de exploração. Neste contexto, a liderança

empresarial passou a estar configurada por volumosos movimentos financeiros e

operações transnacionais alavancadas pelo mercado da globalização. Nesta fase os

politico-empresários de grande dimensão, tem aberto a possibilidade de outros membros

das suas etnias com menor capacidade financeira participar nos empreendimentos

atrvaés de alianças e combinações de interesse mútuo. Este modelo não configura

2 O conceito de crioulidade tem aparecido normalmente como uma categoria da literatura e da

sociolinguística, ou então da antropologia e da biologia genética por via da mestiçagem, de maneira que

alguns autores atribuem a estes dois conceitos a mesma significação, não obstante existirem diferenças

assinaláveis.

10

nenhum trust, deve ser entendido no quadro semântico das representações económicas e

financeiras dos negócios e apresentam especificidades.

Os estudos comparados realizados em empresas de França, Japão, Canadá,

Togo Benim e Burkina Faso realizadas pelo Instituto de Estudos Políticos da EHESS

dizem-nos que a par da racionalidade universal de obtenção do lucro na gestão

empresarial, a cada momento e em cada função da empresa surgem respostas locais. A

mesma opinião demonstra Fariba Adelkhah quando trata do imaginário económico no

Irão islâmico, cuja racionalidade económica interliga religião, política e negócios num

sistema de vida colectivo (BAYART, 1994).

Também os princípios empresariais da “comunidade de negócios globais”

aplicada pelas diásporas ismaelitas apresentam aspectos funcionais inovadores para a

performance empresarial. Os seus membros tem um forte vínculo com as orientações

islâmicas e do seu guia espiritual Aga Khan IV. Aplicam as novas tecnologias através

da comunicação em rede para realizar a grande parte dos negócios, a sua língua de

comunicação é em inglês, ou o gujarati da Índia cujo passado comum compartilham. As

suas operações estão caucionadas pela confiança familiar e as utilizações creditícias

garantidas por bens patrimoniais. Os lucros podem ser convertidos em activos

imobiliários, mercadorias ou capitais, fugindo às taxas de transferência de valores e

impostos sobre mais-valias e pautas aduaneiras, tendencialmente saem do sistema

formal (MIRA, 2014).

A singularidade etno-cultural substitui a classificação nacional e mundial tal

como reconhece Jeffrey Sachs, quando aborda a coerência interna das economias

nacionais e as reformas neoliberais.

As políticas económicas propostas pelo Fundo Monetário Internacional e

pelo Banco Mundial tem tentado formatar as práticas empresariais em todos as escalas

da actividade económica através da concessão de benefícios ao investimento como no

caso do “tripé da sustentabilidade” na lógica do desenvolvimento sustentável. Se por

uma lado procura concretizar a equidade entre o capital humano, o capital natural e o

lucro trazem a tendência de homogeneização comportamental foi contornada pelo

engenho dos empresários, e as preocupações ambientais não resolveram a questão

ecológica central: o padrão de acumulação e a fórmula da distribuição da riqueza. Como

afirma Amartya Sen não traz mudança significativa no entendimento dos determinantes

do progresso, da prosperidade ou do desenvolvimento. A estabilidade entre o

crescimento económico, protecção do meio ambiente e decisão empresarial, só poderá

11

realizar-se sob a arbitragem dos poderes instituídos e concretizar-se através de política

de equidade social sustentável, vinculada à imaginação, criatividade e investimento.

4 CONCLUSÕES

Um céu de interrogações paira sobre este movimento que se inscreve na

reinvenção do espírito do capitalismo, enquanto as economias de heterogeneidade

estrutural proliferam e reagem às contingências do mercado e a acção dos empresários

varia do lugar que ocupa na escala do mercado onde actua e dos seus determinantes

formativos. A fusão reprodutiva de valores e comportamentos em tempo útil é visível

nos espaços onde o imaginário das famílias e das empresas efectuou essas novas

combinações. Historicamente as suas raízes remontam às primeiras trocas entre povos "

nada pode melhor do que o comércio para iniciar a conversa" dizia o filósofo

Agostinho da Silva. As economias estão a ficar cada vez mais integradas, exigindo a

coexistência contraditória e a aceitação intercultural, enquanto os agentes económicos

concretizam a “destruição-criativa” shumpeteriana carregados de elementos

motivacionais empreendedores. As fronteiras institucionais são assim quebradas para

"construir o país do qual, ciência e magia, por abandono e vontade, por cepticismo

(que significa procura) e por fé (de fidelidade irmã) fazem surgir realidades utópicas”

(Agostinho da Silva). A invenção da comunhão da forma de estar no processo

produtivo é diferente da sua acessão no campo das artes e letras, mas "parece o real

obedecer uma e outra vez ao que os homens futurem desde que os impregne o saber,

persista o persistir e seja puro o alvo" (iden). Ao empresário contemporâneo exige-se

um conhecimento transcultural, que deve ser entendido como um valor acrescentado

pré-negocial assim como aos estudiosos destas matérias para interpretar a acção

empresarial.

REFERÊNCIAS

BAYART, Jean François. La reinvention du capitalism. Karthale, Paris, 1994.

HOFSTED, Geert. Culture's Consequences: International Differences in Work.

Related Values. Beverly Hills, Califórnia, 1984.

12

MACCLELLAND, David. A Sociedade Competitiva. Editora Expressão e Cultura.

Rio de Janeiro, 1972.

______________. Human Motivation. Cambridge University Press. Cambridge, 1987.

MIRA, Feliciano de. Les élites et les entreprises du Mozambique: Globalisation,

systèmes de pouvoir et reclassements sociales. École des Hautes Études en Sciences

Sociales de Paris. 2005

______________. Modelos Organizacionais das PMEs de Maputo - Moçambique.

ISEG/UTL, Lisboa. 1996

______________. Une famille d’entrepreneurs ismailis dans le Mozambique

indépendant, négoce et relations avec les élites. In: Ismailis du Mozambique: mémoire

et histoire. Org. Nicole Khouri e Joana Pereira Leite. L´Harmattan, Paris, 2014

SCHUMPETER, Joseph. Capitalisme, Socialisme et Democratie. Payot, Paris, 1951.

______________. História de Análise Económica. Fundo da Cultura. Rio de Janeiro,

1964.

______________. Teoria do Desenvolvimento Económico. Fundo de Cultura, Rio de

Janeiro, 1961.

SILVA, Agostinho. Ir à India sem Abandonar Portugal. Assirio & Alvim, Lisboa,

1994.

WEBER, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Editorial Presença.

Lisboa, 1982.

O DESENVOLVIMENTO HUMANO E GRUPAL PROMOVE AS

TRANSFORMAÇÕES NA CULTURA ORGANIZACIONAL

Dulce Moreira Sampaio*

RESUMO

O trabalho é o caminho para realização humana. Através da ação e do bem estar, o

homem busca o desenvolvimento individual e coletivo. A partir de uma abordagem

multirreferencial e sistêmica do desenvolvimento humano e organizacional, esta

pesquisa tem por objetivo levantar aspectos que sustentam essa contribuição para o

fortalecimento das organizações e instituições e apresentar importantes

contribuições das teorias e metodologias para as transformações da cultura

organizacional contemporânea e sua responsabilidade social: Grupo

Multirreferencial, Regis (2006); Grupo Operativo, Rivière (1994); Terapia

Organizacional, Chiorlim (1988); Constelação Organizacional, Hellinger (2002),

Weber, Gross e Blumenstein; Liderança Sistêmica, Regis e Chiorlin ( 2007);

Educação Emocional e Qualidade Humana. Koziner (2001). A cultura e o clima

organizacional foram evidenciados nessa pesquisa, com base no entendimento de

que essa dimensão determina as possibilidades de desenvolvimento de todos os

envolvidos, o modo de ser e fazer da organização, sua filosofia e seus valores. Esse

artigo contempla uma revisão de literatura e uma pesquisa de campo através da

análise quantitativa e qualitativa do resultado de um questionário realizado na

Instituição “X” e aplicado a oito funcionários do seu quadro. Dessa forma, o presente

artigo emergiu da experiência da autora com essas teorias e metodologias, dos

resultados alcançados pela sua aplicação nas instituições, e a sua relevância, nesse

momento, para o contexto globalizado.

PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento humano e grupal. Desempenho

organizacional. Cultura e clima organizacional.

*Pedagoga e Supervisora Educacional (UFBA), Mestra em Desenvolvimento Humano e Responsabilidade Social FVC (Fundação Visconde de Cairu), Especialista do Ensino Superior, Consultora de Desenvolvimento Humano.

INTRODUÇÃO

A humanidade está dando um salto quântico na compreensão da

existência humana e do universo que a rodeia. O planeta esta mudando numa

velocidade além da capacidade da maioria de nós. Simplesmente não podemos

aplicar muitas das soluções tradicionais para a complexidade dos problemas que

surgem com as mudanças. As fórmulas e técnicas para a transformação

organizacional aparecem e desaparecem como modismos, buscando produtividade

e satisfação que rompem paradigmas considerados inviolados até recentemente.

As instituições que atuam dentro de um clima organizacional marcado por

uma gestão participativa, são as que se constituem, em uma verdadeira comunidade

de aprendizagem e realiza com qualidade suas metas e objetivos. Isto só será

possível sensibilizando todos para participação e tomada de consciência da

responsabilidade social de cada um para com o indivíduo, para com a sociedade e

com o planeta.

Esse artigo busca levantar aspectos que sustentam a contribuição do

trabalho de desenvolvimento humano, grupal e organizacional para o fortalecimento

institucional, a partir de uma abordagem multirreferencial e sistêmica. e apresenta

importantes contribuições das teorias e metodologias para as transformações da

cultura organizacional contemporânea e sua responsabilidade social.

A cultura e o clima organizacional foram evidenciados nessa pesquisa,

com base no entendimento de que essa dimensão determina as possibilidades de

desenvolvimento de todos os envolvidos, o modo de ser e fazer da organização, sua

filosofia e seus valores. A cultura, portanto, faz-se presente em todo e qualquer

agrupamento humano e, especialmente, nas organizações, nos dias atuais, que

cada vez mais se convive com culturas distintas em um mesmo ambiente de

trabalho. LUCK (2001).

Outro aspecto a considerar na escolha do tema é a sua relevância pela

busca incessante dos ser humano em encontrar meios para satisfazer-se e obter

autorrealização no seu ambiente de trabalho. Por isso, para alcançar a qualidade no

trabalho, é preciso investir no desenvolvimento humano e grupal, harmonizar antes

cada um consigo mesmo, depois com o outro e, a partir daí, conseguir um nível de

harmonia e produtividade grupal.

Esse artigo contempla uma revisão de literatura e uma pesquisa de

campo através da análise qualitativa do resultado de um questionário realizado na

Instituição “X” e aplicado a oito funcionários do seu quadro. Emergiu da experiência

da autora com essas teorias e metodologias, dos resultados alcançados pela sua

aplicação nas instituições e a sua relevância, nesse momento, para o contexto

globalizado.

1 O DESENVOLVIMENTO HUMANO E GRUPAL PROMOVE O

FORTALECIMENTO ORGANIZACIONAL

A Revolução Científica destacando a razão como valor fundamental e

desvinculando a ciência da religião, da tradição, da filosofia, da ética, da arte, trouxe-

nos imensos benefícios através da conquista da terra e dos seus recursos, do

progresso científico e tecnológico segundo WEIL (1993). Mas só agora, quando

iniciamos um novo milênio é que pudemos ver o que aconteceu. Ao nos voltarmos

apenas para a racionalidade e objetividade, perdemos a visão global da vida e das

relações. Desenvolvemos uma unilateralidade de visão, a “especialização”, que

gerou a alienação e a fragmentação do conhecimento, conduzindo à perda da

dimensão valorativa do sentimento, da emoção, da espiritualidade e da qualidade de

vida.

Essa forma ilusória de ver o mundo em partes isoladas e fragmentadas

tem separado os homens uns dos outros e levado a uma visão desconexa para um

cruel sistema competitivo. Todos os fragmentos estão hoje em oposição. O ser

humano luta contra outro ser humano, contra a natureza; uma empresa luta contra

outra empresa; um partido político contra outro partido político; uma nação luta

contra outra nação. Tem levado também a teorias fechadas, em que cada visão

diferente se sente ameaçada pela outra, impedindo a expansividade do pensamento,

dos sentimentos e das relações, apesar do fenômeno da globalização, da ampliação

e da universalização dos meios de comunicação humana. DULCE (2010).

As ideologias que dominam o planeta estão voltadas para as questões

econômicas, de domínio e competição sem levar em consideração o respeito pela

vida, pela dignidade do ser humano, à sua autorrealização. Com isso, não se

privilegia o bem estar humano, o que pode possibilitar o desenvolvimento

harmonioso da sociedade, mas apenas os interesses do capital e de uma minoria

que detém o poder.

De acordo com Koziner (2001) as empresas ou instituições que trabalham

de forma dissociada e desintegrada, onde as lideranças são autoritárias; as metas e

as ações podem até ser cumpridas, porém as queixas não aparecem, as

insatisfações ficam abafadas ou proliferam as fofocas. Não há espaço para a

espontaneidade e crescimento. O clima é de desconfiança. Ninguém relaxa,

indicando a presença da competição, inveja, medo, raiva e vingança.

O mundo das organizações caminha rapidamente, para o reconhecimento

dessas questões e está investindo no trabalho de desenvolvimento humano. Cito

alguns princípios básicos que regem o novo Modelo Organizacional:

A empresa é um ser vivo dotado de funções vitais onde cada um,

dentro da importância de suas funções, se conecta com o todo organizacional e a

representa.

A empresa são pessoas e, por isso, ela precisa ser humanizada no

nível dos valores, dos sentimentos, das expectativas, da segurança e do

pertencimento.

As dificuldades fazem parte do crescimento. Precisamos ter prazer em

superar as dificuldades na medida em que elas aparecem. Todos devem estar

atentos aos problemas e soluções.

É importante criar parcerias e espírito de equipe. As pessoas precisam

ser valorizadas e sentirem-se importantes.

As organizações precisam transformar as suas relações hierárquicas

verticais em horizontais, para que os chefes se tornem líderes e possam promover a

sinergia grupal.

Os princípios e fundamentos que norteiam o trabalho de desenvolvimento

humano e grupal disparam um processo dinâmico e efetivo das relações de todos os

envolvidos na organização. Um processo que rompe barreiras dissolve resistências,

através da liberação e aproveitamento mais adequado do potencial adormecido

existente em cada um. O próprio grupo vai descobrindo o seu modelo, assumindo o

seu papel de responsabilidade social. CHIORLIN (1988).

O trabalho profissional, aquele que escolhemos por inclinação, interesse

ou por qualquer circunstância, representa uma escolha nossa e faz parte integrante

da nossa vida. Representa ainda os mecanismos, sem que tenhamos consciência,

de desenvolvimento de atividades, comportamentos e responsabilidades sociais e

afetivas que exercem influência sobre nós mesmos e sobre todas as pessoas que

nos cercam. É nessa interação que se processa a própria evolução do ser humano e

da sociedade.

A física quântica nos ensina que tudo que está a nossa volta é constituído

de energia. Somos todos, partes de um grande campo energético. A energia vibra

com frequências diferentes, apresenta-se em diversas formas, desde as mais

rarefeitas até as mais densas. O pensamento é uma forma de energia relativamente

leve e delicada e pode mover-se com rapidez e facilidade, e gera ondas vibracionais

que influenciam pessoas e situações.

Por isso, nós somos construtores da nossa realidade. Somos o que

pensamos. E para que as mudanças ocorram faz-se necessário serem descobertas

as crenças que nos limitam, as atitudes básicas diante da vida e o que tem impedido

o nosso próprio potencial de se realizar plenamente. Assim que as atitudes tiverem

sido detectadas, as crenças fortalecedoras surgem, outro caminho se descortina,

nos autorizando a explorar um mundo de possibilidades que humaniza o ser humano

e transforma as organizações.

2 CONCEPÇÕES EPISTEMOLÓGICAS QUE SUSTENTAM AS

TRANSFORMAÇÕES INDIVIDUAIS, GRUPAIS E ORGANIZACIONAIS

As abordagens multirreferenciais e sistêmicas sistematizam em suas

bases epistemológicas, filosóficas e metodológicas as questões fundamentais do

contexto atual, indicando caminhos que promovam o desenvolvimento humano,

grupal e organizacional e, consequentemente, a sociedade. São as seguintes as

abordagens pesquisadas:

2.1 O Grupo Multirreferencial

Criado por Leda Regis é uma abordagem que potencializa as

transformações pessoais, grupais e consequentemente o sistema organizacional,

ajuda as pessoas nos grupos a tomarem consciência de sua força e sabedoria, a se

expressarem e transformarem crenças, sentimentos e comportamentos.

Regis (2006, p.19):

[...] pois no grupo cada integrante é um espelho para os demais e, assim, as pessoas já são estimuladas a olharem para muitas questões e de diversas formas. Essa diversidade viabiliza a formação de um campo de transformação. Nele as soluções surgem sabiamente e, solidariamente, vão se concretizando.

O Grupo Multirreferencial se fundamenta e, ao mesmo tempo, integra

quatro abordagens:

2.1.1 O grupo operativo

Criado por Pichon Riviére contribui para compreender como um grupo se

organiza, vincula, operacionaliza suas tarefas e se desenvolve. Nessa perspectiva o

grupo operativo aborda o sujeito das múltiplas formas e circunstâncias de sua vida

cotidiana e dos vínculos que estabelece; sua vida psíquica, as relações, as

instituições e a estrutura familiar.

Para Pichon uma das leis básicas de um grupo operativo é a seguinte:

Quanto mais heterogeneidade dos membros, mais homogeneidade na tarefa, maior

produtividade. No grupo podem expressar quem são como interagem no tempo e no

espaço, articulados com a sua representação interna, que se propõe de forma

explícita ou implícita realizar uma tarefa.

Os instrumentos usados pelo grupo operativo são chamados de E.C.R.O

(Esquema Conceitual, Referencial Operativo). É um modelo ou instrumento que nos

permite a compreensão e aprendizagem de um setor da realidade.

Os instrumentos usados pelo grupo operativo são chamados de E.C.R.O

(Esquema Conceitual, Referencial Operativo). É um modelo ou instrumento que nos

permite a compreensão e aprendizagem de um setor da realidade. São sete

referências para compreendermos a dinâmica grupal, segundo Regis (2000):

1. Atitude frente à mudança

2. Processo de aprendizagem

3. Indicadores da interação grupal

4. O encontro da verticalidade da pessoa coma horizontalidade do grupo

5. Movimentos do grupo

6. Fenômenos universais

7. Processos de desenvolvimento

Um grupo para se constituir é necessário que os integrantes possam

interagir entre si, criando vínculos para realização da sua tarefa.

2.1.2 Terapia organizacional (TO)

Criada por Vilma Chiorlin possui um caráter holístico, integrador,

destinando-se a todos os tipos de organizações. É um método processual, que

trabalha com os “temas” de cada organização, e se vale de abordagens que

complementam a ajuda à organização e aos seus integrantes. Propicia o alcance

dos objetivos da organização e facilita a resolução de inúmeros tipos de temas ou

problemas. Atua sobre os componentes atitudinais, a dinâmica dos papéis sociais e

as relações interpessoais para possibilitar o fortalecimento do sentimento de equipe.

É um método flexível, dinâmico, situacional de coordenação de processos

grupais, que articula abordagens específicas para remover obstáculos relacionais

existentes entre os participantes, visando ajudá-los a enfrentar e resolver problemas

e desafios organizacionais.

Objetiva lidar com as atitudes reproduzidas nas organizações que, dentre

outros, normalmente são traduzidos por conflitos relacionais, angústias diante de

indecisões, expectativas discrepantes, antagonismo destrutivos, divergências

interfaciais, autoritarismo inconsequente, desgastes energéticos e feudos

defensivos. Visa ajudar o participante de diversas formas e utiliza uma atuação

metodológica específica para alcançar esse objetivo.

A Terapia organizacional não só facilita o processo de aprendizagem,

mas também promove a liderança participativa e cooperativa. Busca resgatar o que

existe de saudável no participante sem enfatizar o patológico, embora nunca fique

desatento a possíveis comportamentos inadequados que devam ser trabalhados e

elaborados. Os principais temas trabalhados pelo TO:

Expectativas pessoais e profissionais; o processo de aprendizagem e

crescimento;

Integração e desenvolvimento de equipes;

Níveis de percepção;

Relações interpessoais;

Harmonia no trabalho;

Componentes da atitude;

Papéis sociais.

É um método que visa ajudar os integrantes de uma organização a

perceberem que a solução definitiva está na ajuda mútua, na participação e na

corresponsabilidade, ajudando na busca de uma efetiva integração. É fundamentada

na Bionergética, Psicodrama, Biossíntese e a Biodança. Ela traz o olhar terapêutico

para as organizações.

2.1.3 A constelação organizacional

Foi inspirada nas experiências de Bert Hellinger criador do método de

Constelações Familiares. É baseado na teoria sistêmica e fenomenológica. Refere-

se ao recurso de se utilizar pessoas do grupo e objetos para representar a imagem

interna do tema que se quer trabalhar na organização. Eles atuam como

representantes simbólicos das pessoas ou das questões a serem pesquisadas,

tornando visíveis as dinâmicas inconscientes que podem estar afetando a situação

trabalhada.

Esses recursos funcionam com um mapa orientado para encontrar e

testar hipóteses e caminhos de solução. Essas informações também são adquiridas

acessando o campo mórfico do sistema, no qual a questão está inserida. São os

seguintes princípios fundamentais da Constelação Organizacional:

1. Direito de pertencer

2. Equilíbrio entre dar e receber

3. Direito de antiguidade

4. A diretoria tem prioridade

5. O desempenho precisa ser reconhecido

6. Sai ou fica na empresa

7. Organizações são sistemas voltados para tarefa

8. Fortalecimento ou enfraquecimento

9. O novo e o velho

De acordo com Hellinger (2002) em todo sistema existem regras e ordem

naturais que precisam ser encontradas, aceitas e reconhecidas. Esse é o caminho,

que nos ajudará na compreensão dos desequilíbrios e dificuldades organizacionais e

na busca de soluções.

2.2 Liderança Sistêmica

Um caminho para a transliderança é uma abordagem construída por

Regis e Chiorlin.

[...] como conhecemos um líder? Quando estamos diante de uma pessoa que assume a sua própria vida, tem coragem e a força para vivê-la em si e nas pessoas. Esta confiança lhe dá força para viver e aceitar a vida como ela é, os problemas como desafios, e as frustrações como oportunidades de aprendizado e crescimento (REGIS e CHIORLIN, 2007, p.18).

Na liderança sistêmica, segundo Regis e Chiorlin (2007) a simbologia do

“gestor” representa o arquétipo feminino de gestar, acolher, cuidar e acompanhar as

transições, como também, estabelece limite, regras e condições que vem do

arquétipo masculino.

Como só podemos dar o que possuímos, para gerir pessoas é preciso

gerir a própria vida. Assim, se pode olhar para a equipe e ser estímulos e exemplos

a serem seguidos.

Já trazemos nas nossas células as nossas matrizes de liderança que

precisam ser reconhecidas, ressignificadas e, muitas vezes, transformadas.

As teorias que embasam a transliderança convidam a olhar o mundo e os

fenômenos biopsicossociais de forma holística, holográfica e sistêmica: são as

seguintes ferramentas utilizadas:

1. Multidimensionalidade e a integralidade da organização - O ser humano

abriga as quatro dimensões: corpo, emoção, mente e espírito que atuam

conjuntamente expressando-se dentro do nosso corpo.

2. Multidimensionalidade e a integralidade da organização - As

organizações possuem as mesmas dimensões que os indivíduos e necessita alinhá-

las para que a organização se desenvolva e cumpra a sua finalidade.

3. Os nossos EUS (Eu superior, inferior e máscara) precisam ser

trabalhados para a autenticidade e integridade humana.

4. Nossas estruturas de personalidade - São expressões da nossa

humanidade que se constituem em estratégias de defesa: o comunicador, o

inspirador, o organizador, o realizador. Cada uma delas tem as suas competências e

desafios.

2.3 Educação Emocional e Qualidade Humana

Programa desenvolvido por Mario Koziner que tem como objetivo

desenvolver competências emocionais e valores humanos nos indivíduos e nas

organizações. Evidencia um amplo desenvolvimento pessoal, alinhamento de

equipe, condução de emoções produtivas, clima organizacional favorável às

relações humanas e atitudes inovadoras nas lideranças. Integra as abordagens da

Psicologia Humanista e Transpessoal, da Psicologia Social e Grupos Operativos e

da Programação Neurolinguística.

A Educação Emocional expande a consciência quando desbloqueia e

integra os níveis do ser (o pensar, sentir e agir), através dos exercícios de

autopercepção, do contato com os valores, qualidades e potencialidades existentes

em si mesmas, dos exercícios de relaxamento, meditação que acessam a conexão

com a luz e sabedoria interior.

Ao elevarmos o nível de consciência e aplicarmos de modo intuitivo a

inteligência emocional, tornarmos, com efeito, alquimistas. “Descobrimos maneiras

de sentir, ajustar e alinhar as frequências emocionais que sentimos em nós mesmos

e nos outros, em vez de repelirmos ou resistirmos a elas automaticamente.”

(KOZINER, 2001).

Lidar com as emoções, as próprias e as dos outros, é uma arte. Precisa

ser cultivada e desenvolvida. É fundamental que haja discernimento nas dinâmicas

reais de conflitos, o que implica o cultivo das relações interpessoais, educação da

afetividade e o aprender a conviver.

O otimismo, a esperança, os sonhos, os ideais são o combustível do

mundo. Quanto mais desenvolvida a autoestima, mais preparados estaremos para

vencer os desafios, administrar conflitos, mantermos relações equilibradas e

saudáveis, sermos criativos e obtermos êxito no que realizamos. Quanto menos a

tenhamos desenvolvido mais a insegurança, o medo e a falta de confiança em si

impedem a nossa capacidade de se expressar.

Administrar as emoções e os impulsos é dar poder a si próprio para dirigir

a sua vida na busca do equilíbrio, da satisfação pessoal e das boas relações

humanas no trabalho que promovem a transformação na cultura organizacional.

3 O CAMINHO METODOLÓGICO

3.1 Objeto de Estudo e Instrumento Adotado

A revisão de literatura, primeiro instrumento de coleta de dados utilizados

nesta pesquisa, tornou possível configurar informações relevantes dos referencias

epistemológicos e metodológicos voltados para uma visão mais humanista e

sistêmica das organizações, conforme foi registrado nos capítulos teóricos.

Para detectar a cultura e o clima organizacional das instituições que se

utilizam dessas ferramentas, a pesquisa foi realizada numa Instituição “X” de grande

porte com várias unidades na Bahia e no Brasil. Foi desenvolvida em duas unidades

de trabalho, através de uma amostra de oito participantes.

A fim de captar depoimentos e impressões sobre o modo de ser e fazer

da instituição foi realizado um questionário aberto contendo quinze perguntas,

envolvendo sete categorias de avaliação: Desenvolvimento humano, relacionamento

interpessoal, motivação, comunicação, estilo de gestão, desenvolvimento

organizacional e feedback.

Os envolvidos na pesquisa vivenciam e influenciam a cultura

organizacional por ocuparem cargos de liderança (coordenação e gerência) dos

seus departamentos.

Os depoimentos serviram de base para analisar os resultados obtidos

pelas instituições que investem nos referenciais apresentados. É importante

considerar que o objeto da pesquisa é eminentemente subjetivo.

3.2 Análise e Apresentação dos Dados Coletados

A pesquisa foi realizada considerando os resultados qualitativos na

verificação das respostas do questionário abrangendo as sete categorias de análise;

Descreveu-se a natureza de uma tendência organizacional tal como ocorre e não a

representação de uma empresa idealizada ou desejada.

O processo de análise dos dados envolve os seguintes procedimentos:

organização dos dados devidamente coletados e analisados; Apresentação dos

dados mediante o registro dos depoimentos das categorias.

Ao final foi feita uma análise interpretativa da convergência entre os

depoimentos obtidos no questionário e as propostas apresentadas na revisão de

literatura.

3.3 Os Resultados da Pesquisa

Inicialmente são apresentados os resultados da pesquisa qualitativa,

através da apuração dos oito questionários que tem como principal finalidade

demonstrar os resultados do investimento no desenvolvimento humano e

organizacional da Instituição trabalhada nas sete categorias:

Desenvolvimento humano

Foi a alternativa em que todos afirmaram necessária ao desenvolvimento

do trabalho institucional e melhoria dos indicadores de desempenho, conforme

depoimentos:

- Pois cada dia é necessário nos permitir descobrir nossos limites,

possibilidades e potencialidades que são inerentes à natureza humana.

- Ao longo dos anos tenho buscado este aprimoramento, pois hoje

considero o autoconhecimento essencial para o desenvolvimento humano e

profissional.

- No início ele tinha sido o ponto de partida para que eu percebesse a

necessidade de sair do casulo para alçar voo. Hoje o trabalho de desenvolvimento

humano amplia a minha visão de mundo e da minha responsabilidade como ser no

mundo.

- O trabalho de desenvolvimento humano tem me propiciado uma reflexão

constante que impacta em minha vida pessoal e profissional.

3.3.1 Relacionamento Interpessoal

Essa categoria é bem trabalhada pelo o investimento que a Instituição faz

no desenvolvimento da sua equipe, que tem permitido um relacionamento

interpessoal mais efetivo.

- Fortalecimento do trabalho de equipe, apoio pessoal para avançar em

questões que precisam ser superadas.

- O respeito e aceitação pelo outro, o tratamento entre os colegas, a

existência da tolerância e do cuidado uns com os outros.

- A integração da equipe, consciência e definição de seus propósitos.

3.3.2 Motivação

Houve uma concordância nessa categoria de que os funcionários se

sentem confortados com os critérios motivacionais da Instituição.

- A organização é movida a resultados e a cumprimento de metas.

- aperfeiçoamento dos profissionais de forma contínua, avaliação por

bimestre para avaliação de desempenho, trabalho de integração.

- Considero a valorização profissional através dos processos de seleção

interna.

3.3.3 Comunicação

Foram unânimes em afirmar que a comunicação tem melhorado na

Instituição, porém pelas demandas de trabalho o grupo ainda tem dificuldade de

relacionamento entre os setores.

- Os setores se reconhecem como núcleos de apoio e entendem que é

preciso contribuir sempre para o melhor desempenho do outro na busca do melhor

resultado na entrega final

- Cada Setor tem compreendido que as pessoas que o compõem formam

um todo que precisa interagir sempre para o sucesso do trabalho da empresa.

- Há os que afirmaram que ainda não existe a integração entro os setores

pelas inúmeras demandas da Instituição:

- Existe integração, porém poderia ser melhor. Destaco que as demandas

do dia a dia contribuem para diminuir a integração.

- Ainda não. A organização, pela sua característica de grande diversidade

de negócios, ainda não está integrada. Entretanto, no meu setor, tem havido um

grande esforço, a partir dos trabalhos realizados, na busca da integração com os

demais setores.

3.3.4 Estilo de Gestão

O estilo de gestão foi o grande diferencial, conforme os depoimentos. A

gestão participativa tem sido cada vez mais desenvolvida, promovendo um maior

desempenho e motivação de todos os envolvidos. Revelaram um elevado

comprometimento dos dirigentes com os resultados do desempenho da empresa.

- Um gestor possuidor de uma capacidade de liderança permite o

desenvolvimento de sua equipe é um fomentador do crescimento do grupo e de

suas competências consequentemente, as pessoas da equipe se fortalecem e o

setor também.

- O gestor funciona como o grande motivador da equipe. O desempenho

do grupo pode ser medido pelo nível de integração entre ele e o grupo.

- Líderes que se movem em busca da mudança são exemplos que

estimulam o crescimento da sua equipe. O estilo de liderança, os valores e as

crenças do líder constroem o “pano de fundo” no qual a equipe vai se formar.

3.3.5 Desenvolvimento Organizacional

Outra marca bastante forte que emerge dos depoimentos é a percepção

de que empresa tem se transformado com o investimento no desenvolvimento

humano:

- Os gestores estimulam e permitem que os profissionais se desenvolvam

e participem dos cursos internos e externos.

- Embora o processo de transformação seja gradual, é possível identificar

modificações para melhor na gestão da equipe. O líder imediato passou a assumir

posturas mais assertivas na sua relação coma equipe, seus pares (outros líderes) e

com o seu líder (seu superior hierárquico).

- Claro que sim, é visível a mudança, nas relações interpessoais e

consequentemente nas atividades profissionais.

- Desenvolvimento de equipe de Apoio com Facilitador Interno. Sala de

atendimento para coaching. Núcleo de Gestão de Pessoas com trabalho de

acompanhamento e desenvolvimento de pessoas.

3.3.7 Feedback

Prática sistemática na Instituição em que todos participam, muito embora,

cada área e setor possuam a sua forma de avaliar o desempenho. Ficou evidente

que o feedback e a comunicação ainda poderiam ser mais trabalhados.

- É diferenciada, depende da área e setor.

- Retorno diário para os profissionais, seguidas de momentos de dar e

receber feedback. A avaliação pode também ocorrer no grupo ou por grupo.

Os valores mais evidenciados observados que a Instituição carrega na

sua cultura:

- Necessidade de controle, de competição.

- Respeito, ética e tolerância e valorização do homem.

Reforça o entendimento de que a cultura praticada na empresa é por si

só, uma escola, em vista de ser permanentemente monitorada e avaliada.

Os aspectos ainda não internalizados expressos pelos participantes da

pesquisa é a falta de visão ainda integrada da instituição como um todo,

necessitando trabalhar a confiança e a transparência.

É a importante ressaltar que não houve discordância nas respostas das

categorias de análise, apenas a que se referiu à comunicação.

O resultado sugere um clima organizacional positivo, dando prioridade no

investimento da sua equipe de trabalho e a existência do respeito, da ética e do

cuidado uns com os outros.

Os envolvidos na pesquisa acharam de extrema relevância o tema da

pesquisa, pois consideram que a sustentação das grandes empresas está pautada

na política de desenvolvimento da sua força de trabalho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo procurou analisar os referenciais teóricos que sustentam uma

empresa que pratica a responsabilidade social com o seu público interno e externo.

Ao mesmo tempo, apresentou a análise dos depoimentos da pesquisa de

campo que mostra a importância do desenvolvimento humano e grupal para a

instituição. Esse é o diferencial que determina o modelo de uma cultura

organizacional.

Viver é um movimento de relação interior e exterior. É relacionar-se com

aquilo que está ao nosso redor e dentro de nós. A vida está contida no movimento

de relação e nós precisamos aprender como nos mover através dela, mantendo

nossa própria liberdade, iniciativa e equilíbrio.

O mundo mudou e continua mudando todos os dias, exigindo uma nova

mentalidade na qual o crescimento de um esteja combinado com o crescimento do

outro. As atitudes que foram soluções no passado hoje não têm razão de ser. Os

paradigmas do “salve-se quem puder”, do “levar vantagem em tudo”, do “manda

quem pode e obedece quem tem juízo” não podem mais funcionar..

Na consciência das relações a mentalidade é de que é possível criar

mais, dar mais, onde todos possam vencer, criando uma relação de parceria na qual

se pode aproveitar o melhor de todos, oferecendo oportunidades e motivação para o

desenvolvimento de potencialidades.

Estamos hoje nos dando conta de que, para alcançarmos nossos

propósitos, não precisamos perder nossos valores morais e éticos. Ao contrário,

para sermos vitoriosos, devemos cultivar relações profundas de cooperação e

solidariedade. Aprender a fazer empatia, se colocar no lugar do outro, desenvolver a

compaixão e os vínculos afetivos são os desafios do novo tempo, rumo à

transformação dos padrões do individualismo e competição.

Concluímos que toda organização deve praticar a cidadania através do

exercício pleno da responsabilidade social. Deve buscar a integração entre todos e

que somando qualificações, possam se juntar para realizar uma ação que contribua

para a humanidade e o planeta.

REFERÊNCIAS

GOLEMAN, D. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva: 1995. HELLINGER, Bert. A fonte não precisa perguntar pelo caminho. São Paulo: Atman, 2002. LUCK, Heloisa. A melhoria do desempenho da empresa pela mudança de sua cultura. Ver. FAE, Curitiba, v.4,n.1,p.1-16,jan./abr-2001

KOZINER, Mario. Educação emocional e qualidade humana. Módulos do curso de formação. Salvador, 2001. PICHON-RIVIÉRE. Henrique. O Processo Grupal. São Paulo: Martins fontes, 1994. REGIS, Leda. Grupo Multireferencial: Teoria e prática de facilitação de grupos. Salvador: Elvécia, 2006. REGIS, Leda; CHIORLIN, Maria Vilma. Liderança sistêmica. Um caminho para a transliderança. Salvador: Helvécia, 2007. SAMPAIO, Dulce. Educação e reconexão do ser: um caminho para transformação humana e planetária. Rio de Janeiro: Vozes, 2010. VELLOSO, G. e VELLOSO, M. V. A Terapia organizacional. São Paulo: T&D, 2001. WEIL, Pierre. Organizações e Tecnologias para o Terceiro Milênio. Rio de Janeiro: rosados Tempo, 1993.

NOSSA LÍNGUA TÃO PORTUGUESA

Rusel Barroso*

RESUMO

Para os admiradores da língua, há sempre um grande entusiasmo ao tratar do

assunto. Quando o adepto é lagartense, esse contentamento é ainda maior,

pois aí nasceu Laudelino de Oliveira Freire, um dos maiores lexicógrafos do

mundo, responsável pela elaboração e supervisão do primeiro dicionário de

português do Brasil: Grande e Novíssimo Dicionário da Língua Portuguesa. É

importante reconhecer que suas obras não se perderam no tempo, continuam

indeléveis e como fonte de apoio às grandes pesquisas de estudiosos e

eruditos.

PALAVRAS-CHAVE: Língua Portuguesa. Dicionário. Novo Aurélio. Houaiss.

Verbetes. Definições.

Recentemente, Brasil e Portugal, mais uma vez se renderam à

importância dos escritos de três lagartenses: Laudelino Freire, Sílvio Romero e

Aníbal Freire, através de duas obras monumentais – o DICIONÁRIO HOUAISS

DA LÍNGUA PORTUGUESA e o NOVO AURÉLIO SÉCULO XXI: O

DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Este, portador de 435.000

verbetes, definições e locuções, 110.000 etimologias, com a origem e formação

das palavras, 54.000 exemplos e abonações de mais de 1.400 autores, bem

como ortografia, usos e significados das palavras nos países de língua

portuguesa; aquele, com mais de 228.000 verbetes e mais de 380.000

definições.

O Aurélio Século XXI, referendado pela Academia Brasileira de

Letras, Academia Brasileira de Filologia, Academia de Ciências de Lisboa e

pela Hispanic Society of America, menciona Aníbal Freire e Sílvio Romero em

*Escritor e pesquisador, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e da Associação Sergipana de Imprensa, integrante do Comitê Gestor e do Conselho de Ética da Faculdade AGES.

sua Bibliografia e faz alusão a Laudelino Freire em sua Nota Editorial, nas

primeiras páginas do dicionário.

[...] obra inteiramente revista e ampliada com base no português

contemporâneo, mas que concilia palavras e significados do presente com

aqueles utilizados na literatura do passado. Verdadeiro código da língua falada

e escrita no Brasil e mesmo nos demais países de língua portuguesa, o

Dicionário Aurélio é, às vésperas do século XXI e do terceiro milênio, o

principal herdeiro e atualizador da linhagem lexicográfica representada por

Morais Silva, Caldas Aulete, Laudelino Freire, Cândido de Figueiredo e tantos

outros que se preocuparam em fazer um inventário abrangente dos termos da

nossa língua, seus significados e empregos.

Para se ter uma ideia da atenção dispensada à obra de Aurélio

Buarque de Holanda Ferreira, a lexicógrafa Marina Baird Ferreira, viúva do

escritor, trabalha com sua equipe no Novo Dicionário Aurélio da Língua

Portuguesa desde 1966.

Segundo os Editores, o Dicionário Aurélio Século XXI chega ao

público reafirmando o compromisso de não poupar esforços na pesquisa do

melhor produto. Acrescentam, ainda, que o dicionário ficou mais legível, mais

fácil de pesquisar.

Lamenta-se que os melhores dicionários brasileiros não estejam

disponíveis em Portugal, a exemplo do Aurélio, uma obra também lançada em

CD, e que traz todas as variações do português lusitano e do português

tropical.

O Dicionário Houaiss, concebido por um filólogo brasileiro, dada a

sua qualidade e abrangência extraordinárias, conquistou o apoio e a chancela

do Instituto Camões e do Instituto do Livro e das Bibliotecas (órgãos do

Governo de Portugal), da Academia das Ciências de Lisboa, da Fundação

Calouste Gulbenkian, assim como de empresas privadas portuguesas para a

elaboração da sua versão, a ser publicada em Portugal. Este dicionário, cuja

magnitude não se pode mensurar, é portador de informações preciosas

extraídas da obra Gallicismos, de Laudelino Freire.

O Houaiss é, sem dúvida, o dicionário mais bem cuidado da língua

portuguesa na atualidade. Entre os pontos que o diferenciam dos demais,

podemos citar: pronúncia correta, data em que o vocábulo entrou no português,

fonte dessa datação, plural com sentido próprio, variantes e afins, localização

regional, ortografias históricas, vozes de animais, origem da palavra e outras

informações indispensáveis para o uso da língua.

Concebido como um dicionário lusofônico, está impregnado de

palavras usadas nos Açores, Ilha da Madeira, regionalismos brasileiros e

portugueses e palavras específicas do universo vocabular de São Tomé e

Príncipe, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Índia, Macau e

Timor Leste.

Para o lançamento desta obra, linguistas, filólogos e redatores

brasileiros e portugueses também contaram com a participação de

colaboradores de países e regiões citados acima.

O padrão de qualidade do conjunto de pesquisa que compõe o

dicionário nos permite compará-lo aos mais eficientes do mundo. O rigor das

informações o torna um divisor de águas que nos apresenta um novo

paradigma de conhecimento na língua portuguesa.

Antônio Houaiss era muito dedicado à arte de escrever e costumava

dizer que “quanto maior a desinformação do usuário, maior o desamor por

aquilo que é o meio mais eficaz de comunicação entre os falantes de qualquer

nação, a sua própria língua”.

Dos primórdios à contemporaneidade, os ecos somam-se às letras,

mas jamais as sobrepõem. Como nada é perfeito há dois pontos para serem

levados em consideração na hora da compra: O Novo Aurélio Século XXI,

apesar de bem encadernado e legível, traz uma capa simples e frágil, que

deixa de conferir a autoridade que a obra merece; o Dicionário Houaiss, cujo

cuidado de ilustração, capa e encadernação são primorosos, também

apresenta um senão logo percebido pelo leitor – as fontes utilizadas para

impressão das palavras são de tamanho muito reduzido, o que dificulta

sobremodo a leitura, especialmente à noite.

Que fique claro para o leitor, que as observações aludidas neste

artigo têm um único objetivo, o de mostrar que estamos diante de duas obras

de valor extraordinário e que merecem recomendação.

REFERÊNCIAS

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o

dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2001.

A PEDAGOGIA DO AMOR DE PESTALOZZI

Rivaldo Sávio de Jesus Lima*

Poderíamos destacar que o século XIX foi marcado pelo evolucionismo e

cientificismo, além de uma crescente revolta contra a religião, e tudo isso de fato

começou antes da Revolução Francesa, e tem o seu declínio depois da 1ª Guerra

Mundial. Assim, a civilização europeia viveu uma efervecência de ideais, teorias e

práticas progressistas. Do evolucionismo de Darwin (que bate forte no criacionismo

da Igreja) à teoria revolucionária de Marx, herdeira direta da Revolução Francesa; da

transformação da pedagogia idealizada por Rousseau e efetivamente praticada por

Pestalozzi até o movimento da escola laica, obrigatória e universal, observamos que

o processo civilizatório iria rapidamente alcançar o seu auge (INCONTRI, 2004). É

claro que encontramos também o tédio do romantismo e a reação do catolicismo

(pelo menos em parte) que se opõe ao evolucionismo.

De certo que todo esse processo de transformação escondia em suas

entranhas a exploração social e econômica da classe trabalhadora submetida à

Revolução Industrial, a hipócrita ética sexual burguesa, o ódio marcante entre

gerações e classes sociais, dentre tantos outros aspectos sócioculturais dessa era.

Dessa forma, foi nos primórdios de toda essa ebolição cultural, científica e

religiosa que Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827) nasceu em Zurique, Suíça. De

família pobre, as dificuldades para sobreviver fortaleceram sua alma ainda na

infância. Conheceu de perto o preconceito social e teve de lutar muito para se tornar

conhecido numa sociedade dividida entre ricos e pobres. Recebeu orientação

religiosa protestante, mas considerava-se sempre um cristão, sem defender

qualquer religião (ARCE, 2001).

Após a leitura do Emílio de Rousseau, Pestalozzi acabou influenciado

pelo movimento naturalista e tornou-se um revolucionário, criticando a situação

política do seu país. Assim, tornou-se herdeiro da filosofia humanista de Jean-

Jacques Rousseau (1712-1778).

Por algum tempo, fez de sua casa, na fazenda, uma escola. Escreveu, em

1781, sua obra-prima: Leonardo e Gertrudes, um conto em que narra a reforma

* Professor, doutor em Psicologia da Educação pela Universidade do Minho (Portugal) e Coordenador de Assistência Estudantil da Universidade Federal de Sergipe. Contato: [email protected]

gradual feita, primeiro, numa casa, depois, numa aldeia, frutos dos esforços de uma

mulher boa e dedicada. A obra foi um sucesso na Alemanha e Pestalozzi saiu do

anonimato (ARCE, 2001).

A invasão da França na Suíça, em 1798, revelou seu caráter heroico.

Durante a guerra, muitas crianças vagavam no Cantão de Unterwalden, às margens

do Lago de Lucerna, órfãos e desabrigados. Pestalozzi reuniu muitos deles num

convento abandonado, e começou a educá-los. No inverno, cuidava delas

pessoalmente com extremada devoção, mas, em 1799, o prédio onde acolhia as

crianças foi requisitado pelo invasor francês para instalar ali um hospital, e seus

esforços foram perdidos. Porém, obteve permissão do exército francês para manter

uma escola em Burgdorf, onde permaneceu trabalhando até 1804.

Em 1801, Pestalozzi concentrou suas ideias sobre educação no seu livro

intitulado "Como Gertrudes ensina suas crianças". Ali expõe seu método

pedagógico, em que parte do mais fácil e simples, para o mais difícil e complexo.

Em1802, foi a Paris na condição de deputado, e fez de tudo para que Napoleão se

interessasse em criar um sistema nacional de educação básica, mas o conquistador

disse-lhe que não podia perder tempo com o alfabeto (ARCE, 2001).

Segundo Wantuil & Thiesen (2004), Pestalozzi acreditava que o

aprendizado na escola levava “as crianças e os jovens, na vivência escolar, a lição

da fraternidade, da igualdade e da liberdade” proposta por Rousseau (p. 29). Sua

máxima apontava que o saber e a bondade deveriam ser regidos pelo bom-senso, e

que “o amor é o eterno fundamento da educação” (p. 30).

Com essas expectativas, Pestalozzi criou, em 1805, na Suíça, o Instituto

de Yverdon (que ficava no Castelo de Zahringenem), onde pode desenvolver e

práticar todas as suas criativas ideias educacionais (para a instrução primária e

secundária), tornando-se a escola modelo da Europa. Lá, Pestalozzi conseguiu

reunir conceituados professores, sendo que alguns deles tinham sido anteriormente

seus alunos. Támbém reuniu em sua instituição de ensino filhos das maiores casas

monárquicas da Europa, e que ficavam internados em Yverdon pagando uma

pensão anual. No entanto, Pestalozzi também aceitou muitos alunos de famílias que

não tinham condições financeiras de permanecer na sua instituição, o que, mais

adiante, acabou gerando problemas financeiros ao Instituto.

Em Yverdon, os alunos gozavam de muita liberdade. Podia-se sair e

voltar a qualquer hora da escola, apesar de as crianças quase não se valerem disso.

Estudavam dez horas de aulas por dia (das seis da manhã às oito da noite), mas

cada aula tinha a duração de uma hora e era seguida de pequeno intervalo.

Algumas dessas aulas eram de ginástica, jardinagem, atividades artísticas e trabalho

livre, incluindo ai aulas de dança, esgrima, natação e patinação durante o inverno

(WANTUIL & THIESEN, 2004).

Dessa forma, além de seus alunos receberem excelente formação física,

intelectual e moral, eram também educados para a vida em sociedade. Dentro desse

processo educacional, Pestalozzi não desenvolvia em sua prática pedagógica a

utilização de castigos, como também não dava recompensas aos seus alunos.

Porém, cobrava disciplina e doava amor. Vale ressaltar, que sua escola contrastava

com as escolas tradicionais, quase sempre com base religiosa, que disciplinavam

brutalmente seus alunos através da violência, do medo e da falta de participação do

aluno, já que o magistrocentrismo era a égide.

Também como prática pedagógica, Pestalozzi utilizava o ensino

heurístico, ou seja, a “arte de descobrir”, que remonta ao século IV a.C. A maiêutica

socrática é o primeiro exemplo de que temos registro sobre o uso da heurística na

educação. Dessa forma, não ensinava dogmas científicos e educacionais

ultrapassados, como no ensino mais tradicional, onde o aluno não participa, não

questiona e não reflete. Com isso, Pestalozzi focou seu processo educacional nas

suas crianças (WANTUIL & THIESEN, 2004).

Outro aspecto interessante da sua metodologia, e que ocorria no Instituto,

era que seu curso completo (primário e secundário) não tinha duração fixa,

estendendo-se dos nove ou dez anos de idade até os dezesseis. Em seguida, um

terceiro e último grau (educação normal ou especial), era destinado à formação de

professores.

Com as repercussões positivas na Europa do Instituto de Pestalozzi,

novos alunos se matricularam na instituição, dentre eles o menino Hippolyte Léon

Denizard Rivail que em dezembro de 1815 adentra o famoso colégio do emérito

educador. Sua vontade em aprender e o seus talentos intelectuais precoces, fizeram

com que sua família colocasse o jovem Rivail na instituição Suíça. Este, logo de

início cativou a simpatia e admiração de Pestalozzi, e acabou tornando-se, anos

mais tarde, um dos mais eficientes colaboradores do velho mestre. Acreditam alguns

estudiosos (BIGHETO, 2006; INCONTRI, 2004; PIRES, 2004; WANTUIL &

THIESEN, 2004) que a forte influência de Pestalozzi, especialmente com o seu

pensamento religioso liberal, sem dogmatismo e a sua visão pedagógica de

valorização do ser humano, tenha sido o ponto de partida para que Rivail

(posteriormente, conhecido com Allan Kardec) pudesse desenvolver, tanto em sua

prática educativa, de valorização do aprendiz, como em seus estudos científicos

com base iluminista, uma visão holística do homem, facilitando, assim, na sua

posterior codificação da doutrina espírita e no desenvolvimento de uma pedagogia

espírita, aplicada em escolas brasileiras, e que teve início com Eurípedes

Barsanulfo, em Minas Gerais, em 31 de janeiro de 1907, quando criou o primeiro

educandário brasileiro com orientação espírita, o Colégio Allan Kardec, onde os

alunos recebiam aulas sobre o evangelho e moral cristã, e, ainda, instituiu um curso

de astronomia que, hoje, conta inclusive com laboratórios. Além de exercer a direção

do colégio, ele próprio ministrava aulas de matemática, geometria, aritmética,

trigonometria, ciências naturais, botânica, zoologia, geologia, paleontologia,

português, francês, inglês e espanhol. Percebe-se, então, que toda uma tradição

Pestalozziana de atenção e valorização do estudante se alastra pela Europa e,

posteriormente, pelo Brasil.

Dentre as concepções de Pestalozzi, está a sua crença fervorosa no amor

de Deus. Acreditava também numa vida após a morte. Na sua linha libertária,

apontava o cristianismo como proposta facilitadora da realização plena do indivíduo

(INCONTRI, 2004, p. 143).

Apresenta, também, em sua obra uma noção evolutiva na história da

humanidade, pois acreditava que isso acontece devido à liberdade humana.

Segundo Dora Incontri (2004), essa noção está presente em sua obra-prima “Minhas

indagações sobre a marcha da natureza no desenvolvimento da espécie humana”.

Nessa obra, Pestalozzi apresenta a Teoria dos três estados, que resumidamente

são: 1) Estado natural – O homem é puro instinto, é o que o conduz simples e

inocentemente para todos os gozos dos sentidos; 2) Estado social - O homem entra

na sociedade e no estado de cidadania para tornar sua vida mais alegre e para

gozar tudo o que seu ser animal e sensorial tem que gozar e assim, seus dias sobre

a terra transcorram de forma satisfatória e tranquila. Dessa forma, o direito social

não é assim um direito moral, mas apenas uma modificação do direito animal. A

simples satisfação é a cota do estado natural. A esperança é a cota do estado

social; 3) Estado moral - O direito social não satisfaz o homem, o estado social

também não o realiza, não o deixa tranquilo, como também não pode o homem

permanecer no mero prazer sensual e animal. Como obra de si mesmo, o homem

sente-se livre do egoísmo da sua natureza animal e das suas relações sociais.

Assim, o homem constrói a sua obra canalizando e sublimando os seus instintos e o

estado social e, dessa forma, se santifica pele ação moral espontânea e livre.

(INCONTRI, 1996).

Com isso, percebe-se na teoria de Pestalozzi uma compreensão ampla

das três etapas de desenvolvimento, isto é, da espécie, do indivíduo e da criança.

No entanto, percebe-se, ainda, que tais etapas possam ser encaradas como

instâncias psíquicas e existências, presentes em todos os seres humanos.

Segundo Wantuil & Thiesen (2004), Pestalozzi, que teve forte influência

na formação intelectual e moral de Rivail, apresentou em seu livro “Como Gertrudes

ensina seus filho”, de 1801, os seus princípios pedagógicos, aqui resumidos:

I- A intuição é o fundamento da instrução.

II- A linguagem deve estar ligada a intuição.

III- A época de ensinar não é a de julgar e criticar.

IV- Em cada matéria, o ensino deve começar pelos elementos mais

simples, e daí continuar, gradualmente, de acordo com o desenvolvimento da

criança, isto é, por séries psicologicamente encadeadas.

V- Deve-se insistir bastante tempo em cada ponto da lição, a fim de que a

criança adquira sobre ela o completo domínio e a livre disposição.

VI- O ensino deve seguir a via do desenvolvimento e jamais a da

exposição dogmática.

VII- A individualidade do aluno deve ser sagrada para o educador.

VIII- O principal fim do ensino elementar não é sobrecarregar a criança de

conhecimentos e talentos, mas desenvolver e intensificar as forças de sua

inteligência.

IX- Ao saber é preciso aliar a ação; aos conhecimentos, o savoir-faire.

X- As relações entre mestre e aluno, sobretudo no que concerne à

disciplina, deve ser fundada no amor e por ele governadas.

XI- A instrução deve constituir o escopo superior da educação (WANTUIL

& THIESEN, 2004, pp. 105-106).

Assim, podemos crer que seus princípios educacionais visam à formação

da consciência do educando, seu desenvolvimento cognitivo e a sua transformação

afetiva e espiritual.

Em sua obra, segundo Incontri (2004), não se observa uma queda

essencial do homem. “Há apenas um processo dialético de desenvolvimento na

história humana e na história de cada um. O mal é apenas o ser ainda não

atualizado, sufocado entre as exigências do instinto e as ilusões sociais”. Dessa

forma, Pestalozzi retoma a ideia socrática de que o mal é a ignorância de si mesmo,

alienando-se da natureza moral e consequentemente não podendo alcançar a

felicidade. Assim, acredita que o desafio da educação é o de despertar esse ser

moral na criança e no jovem.

Pestalozzi também entende que o homem tem uma alma que busca seu

desenvolvimento. Dessa forma, não caberia ao educador impor-se a esse ser,

dirigindo-o ou moldando-o integralmente em seu crescimento, mas sim fortificando o

que há de espiritual e moral na sua natureza humana. Seu método, segundo Incontri

(2004) busca:

[...] ativar e fazer a criança conceber a si mesma não é limitar a partir do exterior, mas fazer crescer a partir do interior. O método não tende a um impedimento negativo do mal, mas a uma vivificação positiva do bem. Ele trabalha contra a fraqueza, pelo acréscimo da força realmente existente; contra o erro, pelo desenvolvimento dos germes inatos da verdade; contra a sensualidade, nutrindo e fortificando o espírito [...] (PESTALOZZI, 1927 apud INCONTRI, 2004).

Porém, fica a dúvida de como o educador deve relacionar de forma

harmônica a vontade moral do indivíduo, desde a sua tenra idade, para que esse se

realize como um homem integral. Respondendo essa questão, Pestalozzi afirma que

o melhor caminho para tocar a divindade presente na alma humana é através do

amor, que ele denomina de “força elementar da moralidade”. Aponta Dora Incontri

(2004), que uma vez ativado esse aspecto, ele passa a reger de forma espontânea o

desenvolvimento da criança, tocando o seu interior de forma natural e não

impositiva. Dessa forma, Pestalozzi acredita que a tarefa do educador voltasse a um

processo de integração total, sem violência, amando profundamente a alma da

criança.

Comparativamente, outro grande educador, Comenius (1529-1670),

também aponta que é através do sentimento que se pode tocar o educando. Já

Rousseau, nesse tocante, buscou um equilíbrio entre a razão e o sentimento,

apontando a sensibilidade como fator de progresso moral do homem. No entanto,

somente Pestalozzi foi enfático quanto à importância do amor dentro da educação,

apesar de não descartar uma racionalidade que ele também abraça. Seu amor

pedagógico enxerga o ser humano como um ser potencial e herdeiro da divindade.

Dentro dessa perspectiva, Rivail (Kardec) acaba sendo seu principal herdeiro, pois

segue na íntegra sua filosofia e pedagogia, tanto nas suas escolas na França, como

frente a uma pedagogia espírita.

CONCLUSÃO

Dessa forma, Pestalozzi, na sua proposta educacional, comunga o

universalismo de uma escola popular e a individualização através do

autoconhecimento do ser. Desenvolve, também, uma perspectiva de autonomia e

liberdade do aluno, com uma importante participação afetiva e democrática do

professor, sem esquecer o desenvolvimento cognitivo da criança. No entanto,

infelizmente, apesar de muitas teorias e práticas terem surgido nas últimas décadas,

ainda hoje, encontramos uma educação tradicionalista distanciada da criança e do

jovem, em que o magistrocentrismo ainda é fortemente presente e uma metodologia

dogmática e distante da realidade dos estudantes. Dessa forma, a escola se torna

chata, sem atrativos, sem criatividade e sem participação ativa dos jovens.

Acredito que um resgate das práticas pestalozzianas na formação do

nosso professorado, enriqueceria sobremaneira a forma como nossos educadores

analisam o mundo. Uma atitude mais afetiva, mais próxima do estudante, mais

voltada aos seus interesses, facilitaria o entendimento dos nossos mestres sobre a

dinâmica das vidas de seus alunos, tanto frente aos aspectos mais individuais

(psicológicos), como aos aspectos de cunho familiar e social.

De certo que a Pedagogia, assim como a Psicologia da Educação vem

buscando referências semelhantes ao experimentado por Pestalozzi no século XIX,

em que dentro de uma perspectiva humanista e social, vem desenvolvendo teorias e

práticas que busquem uma reflexão profunda do estudante sobre aquilo que

aprende na escola, ou seja, se de fato tais conhecimentos aprendidos/trabalhados

têm validade para a sua vida e para a sua comunidade, se engrandecem seu ser e

seu espírito. Com isto, não podemos descartar uma pedagogia que valoriza e

repensa a moral, as crenças e os valores humanos e espirituais dos indivíduos,

saindo de uma perspectiva meramente material e mercadológica, mas que também

reflexiona o essencial, o imaterial e os valores superiores dos seres humanos.

REFERÊNCIAS

ARCE, Alessandra. A Pedagogia na "Era das Revoluções". Uma análise do pensamento de Pestalozzi e Frobel. São Paulo: Autores Associados, 2001. BIGHETO, Alessandro Cesar. Eurípedes Barsanulfo, um educador espírita na Primeira República. Dissertação de Mestrado. Campinas, Unicamp, 2006. INCONTRI, Dora. Pestalozzi: educação e ética. Pensamento e Ação no Magistério. São Paulo: Scipione, 1996. _____________. Pedagogia Espírita: um projeto brasileiro e suas raízes. Tese de Doutorado defendida na USP em 2001. Bragança Paulista: Editora Comenius, 2004. PIRES, Herculano. Pedagogia Espírita. 10ª ed. São Paulo: Editora Paidéia, 2004. VANTUIL, Zeus; THIESEN, Francisco. Allan Kardec, o Educador e o Codificador. Vol. I. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2004.

VOCÊ E A MUDANÇA CLIMÁTICA

Genebaldo Freire Dias1

A sociedade humana vem apresentando comportamentos, decisões, hábitos, atitudes

e tendências que contrariam a lógica de sobrevivência de qualquer espécie.

Já detém o conhecimento de sua total dependência dos recursos ambientais: ar puro,

água potável, solo produtivo, clima ameno e biodiversidade. Sem tais elementos os

seus sistemas sociais, econômicos, políticos e outros, não se sustentam.

Entretanto, no seu cotidiano adotou práticas de produção, consumo e descartes

absolutamente insustentáveis, Desperdício, poluição do ar, solo, água e

eletromagnética (e estética), destruição das florestas, erosão, eliminação da

biodiversidade, queimadas e incêndios florestais, desperdícios e quitais, desmoronam

e anarquizam os sistemas que asseguram a possibilidade de expressão e manutenção

da vida humana na Terra.

Se já sabemos das consequências de nossos atos de degradação ambiental, por que

continuamos nessa trajetória insana, suicida?

Por que insistimos nessa saga de destruição de tudo em nome de um progresso que

nunca chega? Em nome da criação de empregos que nunca atende a todos? A quem

interessa essa maluquice toda?

Obviamente vivemos uma falha de percepção. Tal falha foi alimentada por uma

educação centrada em conteúdos, voltada para o nada, desconectada das realidades

e carências locais e afastada dos valores humanos.

Resultou em uma danosa inversão de valores. O elemento econômico se tornou o

absoluto, maior do que qualquer outro, criando um princípio segundo o qual tudo tem

preço e nada tem valor.

Tal contexto é eficientemente catalisado pela mídia comprometida com as corporações

que ditam as tendências de consumo. Alicerçaram-se assim as bases do

analfabetismo ambiental.

Podem-se citar dois grandes exemplos dessa falha de percepção.

O primeiro se refere ao nada inteligente crescimento contínuo da população humana

no mundo. São 78 milhões de novas bocas que são acrescentadas à plebe ignara a

cada ano. Cada pessoa acrescentada ao planeta - já submetida à intensa degradação

generalizada -, significa mais pressão sobre os recursos naturais, i.e., maior demanda

de água, energia elétrica, combustíveis, alimentos, urbanização, matérias-primas etc.

1 Mestre (M.Sc.) e Doutor (Ph.D) em Ecologia (UnB). Analista Ambiental do Ibama (1989-2014), Professor, pesquisador e diretor do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão Ambiental da Universidade Católica de Brasília (1985-2013). Autor de 20 livros sobre a temática ambiental. 40 anos de ativismo ambiental. Site: www.genebaldo.com.br

Para atender tais necessidades mais florestas são devastadas, produzem-se mais

resíduos (industriais, domésticos, agropecuários), emitem-se mais gases-estufa e por

aí segue.

Para completar a cegueira coletiva, a temática “crescimento populacional” está fora de

pauta desde a Rio-922. Tem sido evitada sistematicamente em todos os grandes

encontros internacionais sobre o meio ambiente. Assim o foi na Rio + 10, Rio + 20 e

nos eventos patrocinados pela ONU – PNUMA3 – OMM4 sobre a mudança climática

em todas as suas versões5.

Parece óbvio que para um planeta com recursos limitados uma espécie precisa se

ajustar à sua capacidade de suporte. Mas não é assim que está ocorrendo. Os seres

humanos querem que o planeta se adapte e eles! Assim, aumentam continuamente a

exploração dos recursos naturais para atender ao aumento do consumo pressionado

também pelo crescimento da população. O ciclo se fecha e implode em desequilíbrios

sistêmicos generalizados.

O segundo se refere à inércia dos governos e dos setores privados quanto aos

cenários e desafios da mudança climática. Isso acontece nos níveis global, regional,

nacional e local. Parece que as imagens de sofrimentos causados por secas,

inundações, deslizamentos de terra, incêndios florestais gigantescos e outras que são

despejadas diariamente nos lares do mundo pelos noticiários são apenas ficção, ou

estão acontecendo apenas com os outros e nunca chegarão perto.

A mídia dificilmente associa a mudança climática ao aumento dos preços dos

alimentos dado as perdas contínuas de safras devido ao crescimento das pragas;

raramente considera as perdas na agricultura (cana de açúcar, beterraba e milho /

etanol, por exemplo) e suas consequências para o aumento da inflação no mundo, às

intemperanças do clima que ocorrem por reajustes do meio ambiente.

Quando se noticia o boletim meteorológico raramente se comenta sobre as causas

daquelas aberrações climáticas, mas apenas sobre os seus efeitos. E assim se

perpetua a desconexão e se consolida o analfabetismo ambiental como norma útil de

entorpecimento coletivo.

O recente relatório do IPCC (2013/4) em suas 2.500 páginas de texto baseado em

9.200 publicações científicas de mais de 2.000 cientistas de instituições renomadas,

não apenas corrobora o que já havia sido dito em 2007, mas enfatiza que a situação é

mais grave do que se imaginava.

Ignorar tudo isso, além de uma grande imprudência, já poderia significar falta de

inteligência, apercepção total dos cenários e desafios à sustentabilidade da sociedade

humana nos moldes de estado de direito como a concebemos na atualidade (pelo

menos em tese).

2 Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Humano e Meio Ambiente, Rio de Janeiro, 1992; 3 Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente; 4 Organização Mundial de Meteorologia; 5 COPs (Conferência das Partes) e Relatórios do Painel Internacional sobre Mudança do Clima – IPCC.

No livro “Mudança climática e você” DIAS, (2014) se examinam as sínteses dos

principais relatórios produzidos pelas grandes agências internacionais nos últimos dez

anos, sobre essa situação e se focalizam as questões de governança e

desgovernanças. Aborda-se a impossibilidade do desenvolvimento sustentável e se

escancara o cinismo, o descaso, o despreparo, o analfabetismo ambiental e os riscos

que a sociedade humana corre por conta das indecisões e má gestão no

enfrentamento desses desafios, agravados por burocracia, ignorância, ganância,

egoísmo e corrupção.

Por conta desse contexto várias regiões no Brasil já sentem na sua economia e na sua

qualidade de vida, as consequências dessa inação, A crise de abastecimento de água

no Sudeste, as inundações e secas no Sul, e o mau humor do clima no Norte e

Nordeste corroboram os cenários já descritos pela comunidade científica internacional

desde o primeiro relatório do IPCC em 1992.

Cita-se que no Nordeste6 haverá uma drástica redução na disponibilidade de água

com danos à segurança alimentar (IPCC, 2007; corroborado por 2013/14):

- As áreas afetadas por secas aumentarão.

- ...projeta-se um decréscimo na produtividade de grãos até mesmo para

um aumento pequeno de temperatura local (1 a 2o C) o que pode

aumentar o risco de fome (p. 8).

- ...o aumento na frequência de secas e inundações afetará

negativamente a produtividade local, especialmente nos setores de

subsistência (p. 8).

- Nas áreas mais secas espera-se que ocorram salinização e

desertificação de terras agrícolas, bem como queda na produtividade de

grãos e da pecuária, com consequente risco de segurança alimentar.

- Mudanças nos padrões de precipitação afetarão a disponibilidade de

água para o consumo humano, para a agricultura e para a geração de

energia.

Algo assim acontecendo em áreas onde a escassez de água, a má distribuição de

renda, o “voto de cabresto” e a ingenuidade de um povo - em sua maioria sem acesso

à educação de qualidade - já é um problema secular, pode significar quadros graves

de escassez de alimentos, crises econômicas, sociais e políticas, fome e migração em

massa que fará a seca dos três setes (1777) perder a referência, caso não sejam

implantadas as medidas de mitigação e adaptação já conhecidas.7

Assim, conclama-se a sociedade como um todo – governo, setor privado,

universidades, representações comunitárias e outros - para se comprometerem com

as medidas que se farão necessárias. A adaptação é a saída mais viável, no momento

6 O semiárido brasileiro é um dos poucos habitados, no mundo. 7 Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei 12.187) sancionada desde 2009.

para não continuarmos acumulando mais problemas. A mitigação, a essa altura,

apenas evitará o pior.

Ainda assim será preciso acelerar a pesquisa, estimular a inovação, o

desenvolvimento tecnológico e suas transferências, e informar e sensibilizar as

pessoas.

Os países ricos já estão acordaram para isso. Japão, Holanda e o estado da Califórnia

estão na vanguarda das adaptações e das inúmeras oportunidades de negócios com a

mudança do clima global. Combinam, de forma eficiente, o conhecimento científico-

tecnológico, os recursos financeiros e a boa governança.

Já não se perde mais tempo discutindo algo tão óbvio. Os céticos, diante das

possibilidades de serem responsabilizados criminalmente pela posição lesa

humanidade já eclipsaram seus argumentos financiados pelos milhões de dólares dos

donos do petróleo, do carvão e da indústria automobilística conservadora do mundo.

Às pessoas do semiárido brasileiro cabe a tarefa de reagir à inação. Fazer valer seus

direitos constitucionais de informação, conhecimento e participação, e assim,

amalgamar as iniciativas de mitigação e adaptação que urgem.

As gerações que se seguem jamais perdoarão o legado de devastação que podemos

deixar se falharmos na tarefa de se enfrentar com determinação e competência os

problemas ambientais que a nossa sociedade mesmo criou.

Há tecnologia, informação e recursos econômicos para tanto. Não somos uma nação

pobre. Temos um grande capital intelectual instalado e uma rede respeitável de

pesquisa e inovação.

O desafio foi lançado para todos. Não há lugar para espectadores nem para atitudes e

decisões que não contemplem o refinamento ético e estético necessários à evolução

humana em sua escalada.

REFERÊNCIAS

Dias, Genebaldo Freire. Mudança climática e você. Gaia/Global, São Paulo, 2014, 267 p. ____Pegada ecológica e sustentabilidade humana. 2ª.edição, Gaia, SP, 2006, 263 p. ____ Fogo na Vida. Ministério do Meio Ambiente, IBAMA, Prevfogo – Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, 2ª. Edição, Brasília, 2010, 80 p. e 3ª edição revista e ampliada, 2013 Doria, Pedro É hora de uma governança global? In: O Estado de São Paulo, 3 nov 2008, p.L3

IPCC, 2011: Summary for Policymakers. In: Intergovernamental Panel on Climate Change Special Report on Managing the Risks os Extreme Events and Disasters to Advanced Climate Change Adaptation. Field, C.B. et al. (eds). Cambridge University Press, Cambridge, United Kingdom and New York, NY, USA, 18 nov 2001, 29 p. ____ Climate Change 2013:The Physical Science Basis. Summary for Policymakers. Setembro, 2013, 36 p. WMO / UNEP / IPCC. Climate Change 2007: The Physical Science Basis. Summary for Policymakers. Paris, 2007. 21 p. ____ Climate Change 2007: Climate Change Impacts, Adaptation and Vulnerability. Summary for Policymakers. Bélgica, 2007. 23 p. ____ Climate Change 2007: Mitigation of Climate Change. Summary for Policymakers. Tailândia, 2007. 36 p.

UMA APRECIAÇÃO CRÍTICA ACERCA DO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO NA GRADUAÇÃO

Nadja Maria Lima Maciel*

RESUMO

Este trabalho científico apresenta alguns pré-requisitos de habilidades e

competências que são exigidas como condição mínima para a produção de um

Trabalho de Conclusão de Curso na graduação. A pesquisa é compreendida como

um campo do conhecimento que conduz à concretização das ideias e dos estudos,

reconceptualizando a capacidade de ler e escrever textos dissertativos, de modo a

organizar, selecionar e sintetizar informações – habilidades estas que praticamente

qualquer indivíduo, com formação acadêmica ou não, exerce na vida cotidiana.

Exige-se um determinado conhecimento da área científica em que se insere o

trabalho em questão. A competência fundamental, indispensável para a aquisição

de qualquer conhecimento científico, é a capacidade linguístico-comunicativa, que

permite atribuir significados e interpretações ao mundo da percepção empírica, com

base em métodos e procedimentos de reflexão e análise utilizados para articular

teoria e a dimensão contextualizada no contexto histórico-social da investigação, a

partir das conexões entre estes elementos.

PALAVRAS-CHAVE: Graduação. Pesquisa. Trabalho de Conclusão de Curso.

INTRODUÇÃO

A partir de vivências pessoais e do levantamento de algumas situações

sobre o componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), em cursos

de graduação, nas Universidades Estaduais da Bahia, emergiu o meu interesse por

investigar os motivos que ampliam as dificuldades que discentes da área de

* Docente da Universidade Estadual de Feira de Santana; ministra os componentes curriculares Metodologia e Estágio da Língua Portuguesa; Mestrado em Mídia e Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina; Doutoranda em Ciências da Educação-Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro-Portugal. [email protected]

Educação apresentam sobre o aprendizado do mencionado componente,

principalmente quanto à inaptidão destes sujeitos para a produção de textos

científicos.

Produzir textos tornou-se uma problemática que acompanha o indivíduo

ao longo do seu processo educativo e, não menos frequente, no campo acadêmico.

Sabe-se que é uma ação comunicativa posterior à oralidade, mas que, para ser

inteligível e funcional, deve ter precisão e clareza; portanto, requer uma leitura

aprofundada como elemento imprescindível para escritura do texto. Significa dizer

que à medida que o sujeito mergulha na leitura ele absorve a temática, suas normas

e formas, bem como os elementos textuais com adequação da linguagem e

ordenação de ideias.No TCC, o texto dissertativo pressupõe a síntese das principais

competências de um sujeito letrado.

Na visão de Xavier (2010, p.14), o texto dissertativo permite interpretar,

analisar, relacionar fatos, informações e conceitos gerais, a fim de construir

argumentos em favor de uma determinada tese.

Após uma análise científica com determinados graduandos, verificou-se

que a maior dificuldade no ato de pesquisa gira em torno da delimitação do objeto de

estudo; para uns, selecionar a bibliografia constitui-se o aspecto mais complexo;

ainda outros dizem que entendem formatação do texto científico como uma mera

organização textual eletrônica. Além disso, o TCC requer a contribuição dos

princípios de textualidade imprescindíveis em um trabalho acadêmico, quais sejam:

intencionalidade que evidencia o objetivo central da produção; aceitabilidade que

aponta os fatos de forma inquestionável; situacionalidade a qual se refere à

pertinência contextual do texto; informatividade em que se apresentam as

informações clássicas e inovadoras e intertextualidade para garantir a consistência

teórica do ponto de vista do produtor.

Propõe-se, então, realizar um levantamento detalhado em relação às

questões sobre investigação científica tão comuns nos centros acadêmicos, com

ênfase na comunidade dos cursos de graduação. Com isso, pretende-se aclarar um

dos fatores que interferem na pesquisa, a saber: a importância dos docentes no

processo de ensino e aprendizagem do referido componente. Estudos no tocante ao

tema em epígrafe afirmam que os profissionais com experiência em pesquisas

científicas nos cursos de mestrado ou doutorado,e conhecimentos sobre as normas

oficiais de trabalhos científicos estão preparados para atuar na supracitada área.

Entretanto, apesar de possuírem tais títulos, uma grande parte desses docentes

pode não apresentar uma competência desejável para exercer tal ofício.

Pedro Demo (2001) chama a atenção para pesquisa, revelando que não

existe prática de ensino ou aprendizagem efetiva sem a prática da pesquisa. Sem

ela, é impossível a produção do conhecimento, pois tanto docentes quanto discentes

precisam da prática da pesquisa para construir o saber. Segundo o autor, a pesquisa

precisa ser desmistificada, para que os estudantes tenham domínio sobre

investigação no momento da escrita do TCC.

Este trabalho tem como premissa básica abordar a pertinência acadêmica

do TCC, com base nos aspectos apontados por Nascimento (2012, p. 35):

originalidade – uma abordagem que consiste em descobertas com relação ao objeto

de estudo e potencial para surpreender o escritor; criatividade – uma abordagem

diferenciada e nova em relação ao objeto de estudo, demonstrando capacidade de

serem encontradas soluções diferentes das já utilizadas por outros pesquisadores;

relevância – uma abordagem em que se destaca a importância do estudo ou da

pesquisa em relação ao objeto de estudo, em razão de se proporcionar uma

contribuição significativa; viabilidade – uma abordagem na qual se tem a consciência

da presença (ou não) de condições materiais, humanas e financeiras para

desenvolver a pesquisa em relação ao objeto de estudo.

É importante ressaltar que o conhecimento científico não exclui as outras

formas de se conhecer a realidade. O que diferencia a atitude científica do senso

comum é o fato de a ciência sempre desconfiar a veracidade das certezas

existentes. Há sempre a curiosidade de se verificar os conhecimentos, com

objetividade e critérios. Nessa perspectiva, o TCC não pode ser visto apenas como

um trabalho de final de curso, mas sim como um olhar que retrate a dimensão

defendida por Gil (1996, p. 20): “Etimologicamente, ciência significa conhecimento”.

A ciência, como forma de conhecimento, pois atribuir o termo “científico” a alguma

afirmação, imediatamente acrescenta mérito e confiabilidade ao que foi dito ou

proposto.

Para Demo (1987), a metodologia responde a questão instrumental do

fazer ciência, não sendo, portanto, ciência em si própria. Dessa forma, é um erro

supervalorizar a questão dos meios de se fazer ciência, sendo a proposta final o

mais importante. Muitos teóricos compartilham da mesma ideia que o autor citado

acima. Entender a importância da investigação, colocando-a em sua devida posição,

representa um importante passo para o fazer ciência de forma criativa e consciente,

potencializando o trabalho desenvolvido. Baseado em Giroux (1997, p.77), os

graduandos aprendem metodologia que parecem negar a própria necessidade de

pensamento crítico, em vez de aprenderem a refletir sobre os princípios

estruturantes.

Diante disso, pode-se afirmar que o TCC nos cursos de graduação tem se

tornado um instrumento amplamente utilizado e reconhecido como meio de se

investigar a realidade em instituições acadêmicas.

DESENVOLVIMENTO

Cervo (1996) afirma que a metodologia científica foi introduzida nos

currículos dos cursos de graduação no início da década de 70 e que a abordagem

apresentada não era acessível ao nível de conhecimentos e interesses dos

estudantes.

Supõe-se que o componente curricular Metodologia Científica sugere a

inserção do estudante nas orientações de técnicas e métodos que serão alicerces

para seus trabalhos acadêmicos e, posteriormente, profissionais. No âmbito da

investigação, pode-se estabelecer uma analogia entre a afirmativa de Cervo e a

realidade vigente, e verificar que a visão do autor é atual. De fato, é um componente

imprescindível à produção científica, mas que ainda não conseguiu alcançar, talvez,

a linguagem do discente para promover uma aprendizagem significativa.

Para o interesse desse estudo, essas duas assertivas se completam,

tendo em vista que produzir texto científico requer a apreciação da obra, ou obras –

objeto de pesquisa – para a fomentação de constatações particulares, através de

ferramentas que atentam para as normas acadêmicas vigentes.

Minayo (1999, p. 42-43) afirma que metodologia é “mais que uma

descrição formal dos métodos e técnicas a serem utilizadas, indica as opções e a

leitura operacional que o pesquisador fez do quadro teórico”. Sobre essa afirmação,

pode-se apontar que muitas lacunas são detectadas no decorrer e ao término dos

estudos no componente em questão, uma vez que o foco central apresentado pelos

professores é a exposição de normas e técnicas.

Consoante Pádua (1999, p.30), quando se fala em pesquisa na

universidade, muitas vezes, esta atividade tem sido entendida como o domínio de

um conjunto de procedimentos, técnicas, sob a denominação de metodologia; nesta

perspectiva, a questão do método é reduzida a uma simples aplicação de técnicas

[...]. Talvez seja essa proposta de ensino, apresentada nas universidades, o grande

motivo de intolerância por parte dos alunos.

Sobre a transposição didática aplicada pelos docentes de Metodologia do

Trabalho Científico, nos cursos de graduação, Targino (2006, p.2) menciona que

“salvo honrosas exceções, qualquer docente, independente de sua área de atuação,

é designado para ministrá-la”. Os resultados revelam exatamente o contrário. Se o

docente não tiver a competência necessária, não terá fundamentação pedagógica

para despertar no estudante o verdadeiro sentido social da fomentação da pesquisa

científica. Sendo assim, é conveniente que o docente, ao invés de meramente

apresentar normas que podem ser manuais acessíveis no mercado, orientem o

discente a desenvolver uma postura crítica de leitura, produção e análise de textos.

No TCC, a aplicabilidade das normas é uma condição sine qua non;

todavia, como o discente irá adequar normas sem a aquisição de segurança para

produzir o objeto de apropriação dessas normas que é o texto nas suas mais

variadas representações? Sabe-se que, para apresentar um texto científico, no

Brasil, faz-se necessária a observância dos padrões exigidos pela Associação

Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT). Entretanto, isso não constitui relevante

aprendizagem se o ensino dessas normas for mecânico e se o estudante não

desenvolver o mínimo de senso crítico, visto que uma das vertentes do ensino

superior é a pesquisa.

Observa-se que muitos cursos ainda não apresentam aos estudantes de

graduação a experiência de produção de monografia, uma oportunidade significativa

de expor o sujeito à produção de textos de elevada qualidade científica, e, quando

positivo, a prática só acontece nos dois últimos semestres, apenas como

cumprimento de uma etapa avaliativa de final de curso.

Convém concordar com Targino (2006, p. 2), ao salientar que sem a

pretensão de macular o ensino produtivo da graduação, presente em algumas

universidades e faculdades, afirma-se que muitos dos problemas envolvidos na

execução dos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) estão vinculados à pouca

ênfase que é concedida ao ensino da metodologia científica, aliada a questões

outras, como: desarticulação entre a matriz curricular, relegando a contextualização,

incorporada, em nível teórico, nos fóruns de debate acerca do ensino em graduação;

discussões evasivas sobre a relevância dos trabalhos monográficos; ausência de

debates sobre ciência e conhecimento.

Freitas (2006, p.1) aponta que “Ler e escrever ainda é o melhor exercício

para quem pretende se expressar com um mínimo de competência e eficácia [...]

que competência textual resulta da prática”. Ou seja, o sujeito precisa lançar mão de

requisitos imprescindíveis a passar suas impressões e, por conseguinte, atingir o

seu público.

Com isso, faz-se mister o TCC ultrapasse os limites das normas, a fim de

permitir ao discente desenvolver e/ou amadurecer a competência da comunicação e

organização do pensamento, pois estando o método aliado a arte, inventividade, e

estratégias certamente serão alcançados os objetivos mais relevantes para o

discente, a constituição do saber científico estruturado a serviço do social e não

apenas o ensino para atender requisitos de componentes curriculares acadêmicos.

Penteado (1974, p.243) afirma que “a leitura é a base da arte de

escrever”. Pode-se acrescentar, então, que não há escrita coesa sem a anterior

organização e sistematização de ideias. O trabalho científico exercitado nas

universidades pode ser oral, mediante palestras, comunicações, intervenções em

seminários, ou escrito através de resenhas, resenhas comentadas, ensaios, papers,

artigos, monografias, dissertação de mestrado ou tese de doutorado, ou relatórios de

pesquisa. As normas de elaboração e apresentação de qualquer desses tipos de

trabalho são, basicamente, as mesmas.

Em qualquer destes tipos e seja qual for seu alcance, ocorre sempre um

processo similar de produção de conhecimento, que tem características diferentes

nos diversos campos científicos. Adquirir conhecimentos novos exige, como pré-

requisito, certas habilidades e competências, que são processuais.

Segundo o teórico Demo (1987), cabe à pesquisa a atividade básica da

ciência, sendo esta o fenômeno fundamental da geração do conhecimento. O autor

considera que a atividade de transmitir conhecimento (docência) e a de absorvê-la

(discência) é subsequente à pesquisa. Sendo assim, “Pesquisa é a atividade

científica pela qual descobrimos a realidade” (DEMO: 1987, p. 23) A ciência

pressupõe que sempre existe algo mais a se descobrir na realidade. Dessa forma, a

investigação pode ser considerada como um processo interminável, nunca uma

situação definida, da qual não haveria mais o que descobrir.

Existem diversas formas de classificar a pesquisa conforme Demo (1987):

a) Pesquisa Teórica: esquematiza e analisa quadros teóricos de

referência. É fundamental que o pesquisador tenha domínio dos clássicos de

determinado componente curricular; domine a bibliografia fundamental, conhecendo

a produção existente; detenha espírito crítico, para não ser apenas um “colecionador

de citações”, tendo capacidade de produzir com personalidade.

b) Pesquisa Metodológica: refere-se aos instrumentos de captação e

manipulação da realidade. Diz respeito à questão metodológica a atitude de dúvida,

de indagação, de crítica à pesquisa. Discutir os caminhos (as metodologias)

percorridos por outros pesquisadores, como forma de verificar se o que foi

construído poderia o ser de outra forma; questionar se os caminhos foram os

melhores, e o porquê de terem sido escolhidos.

c) Pesquisa Empírica: está relacionada principalmente à questão

experimental e observável dos fenômenos. Tende a ser quantitativa, e por conta

dela, muitas técnicas de coleta e mensuração de dados foram aprimoradas e

relacionadas a realidade concreta.

d) Pesquisa Prática: testa possíveis ideias ou posições teóricas; pesquisa

se teorias são especulações ou realidade e busca o posicionamento da teoria diante

a realidade.

A partir destas competências básicas, acontece a expansão e o

aprofundamento do conhecimento em uma área particular e, no decorrer do

processo, através da comparação e confrontação de diferentes informações,

desenvolve-se a capacidade de exercer um julgamento crítico sobre as informações

colhidas, de acrescentar e combinar informações, de refletir e tirar conclusões e,

finalmente, de reorganizar o processo em uma linguagem acessível aos receptores e

interlocutores potenciais.

O primeiro momento do processo de trabalho, do qual irão depender, em

grande parte, todo o processo e mesmo os resultados finais, é a definição e

delimitação do objeto de estudo e investigação. Para tanto, o estudante de

graduação adotará um manual de pesquisa que norteará sua produção.

Uma indagação prévia, que deve ser esclarecida, é se existe alguma

hierarquia entre temas possíveis, e se estes são mais adequados ao trabalho

científico, ou mais legítimos. Todo e qualquer tema relativo ao mundo natural, social

ou humano pode ser um objeto legítimo de estudo. O que define a legitimidade de

um trabalho científico não é seu tema, mas o tratamento que se dá a ele e a

exploração de seu potencial de produzir novos conhecimentos.

Sendo assim, deve-se sublinhar que todo processo de pesquisa começa

com a busca e subsequente delimitação da área de interesse a ser pesquisada. As

condições básicas a serem preenchidas para esta finalidade são duas: em primeiro

lugar, o objeto de estudo deve situar-se dentro do campo científico onde ocorre a

formação e atuação do pesquisador; em segundo, deve preencher outras exigências

específicas colocadas pela instituição onde o trabalho será produzido e avaliado, ou

pelo fórum onde será apresentado.

Uma introdução deve delimitar de forma simples, mas inequívoca, o

objeto de estudo e o enfoque adotado, ao mesmo tempo em que apresenta

brevemente a estrutura e os componentes do trabalho e a metodologia. Uma

introdução com lacunas e uma delimitação do objeto com deficiência podem

prejudicar a compreensão de todo o trabalho, além de dificultar a produção pelo

discente.

Para garantir o maior grau possível de veracidade e confiabilidade, existe

uma série de técnicas simples de avaliação, aferimento e autenticação. Estas

técnicas, obviamente, não podem ser as mesmas das Ciências Naturais – de

experimentação e observação controlada – já que a natureza das Ciências Humanas

e Sociais é diferente, mas, ainda assim, as fontes de informação da área

humanística e sociológica podem e devem ser verificadas com rigor.

Uma observação relevante é que qualquer documento – público ou

particular – qualquer depoimento oral ou escrito, qualquer imagem, texto literário,

narrativa, objeto – artístico, de uso cotidiano, ou outro – qualquer vestígio

arqueológico, pode ser fonte de pesquisa, dependendo do enfoque e dos interesses

de pesquisa. Um objeto, real ou simbólico, da realidade humana e social se torna

fonte de investigação científica quando o pesquisador volta seu interesse crítico para

ele e o utiliza para obter dados sobre uma determinada problemática a ser

investigada, segundo critérios e procedimentos científicos.

As técnicas de investigação desenvolvidas pelas ciências históricas – a

chamada crítica de fontes – e utilizadas pelos historiadores para estabelecer a

autenticidade e veracidade de suas fontes, são úteis para toda e qualquer pesquisa

científica. A prática da crítica de fontes aguça o senso crítico e desenvolve a

capacidade de estabelecer fatos prováveis em qualquer campo.

Em um momento posterior, é necessário que o conhecimento prévio do

pesquisador se efetive por meio de uma busca avançada em bibliotecas, arquivos,

museus, sites, grupos de debate real ou virtual, seleção suplementar de material

bibliográfico e, no caso de trabalho de campo e material empírico, através da

primeira fase de coleta de fatos. Quanto mais conhecimento o pesquisador adquirir

acerca do trabalho de seus antecessores na área de interesse e estudo, mais

qualificadas serão as escolhas teóricas, o método e material empírico, mais bem

argumentadas serão suas análises, mais originais serão as interpretações, mais

sólidas e convincentes as conclusões.

Para chegar a estes resultados, torna-se decisiva a seleção do enfoque a

ser aplicado, do ângulo a partir do qual o objeto de estudo será observado. Com

esta escolha, haverá um recorte da realidade que constituirá o objeto; é ele que

confrontará os problemas ainda não solucionados e questões ainda não

respondidas.

Estas perguntas podem ser formuladas sob a forma de hipóteses – isto é,

de afirmações condicionais sobre os resultados possíveis. A articulação de

hipóteses facilita os momentos posteriores do trabalho, já que aponta para

determinadas orientações teóricas, para ângulos precisos de análise e permite

elaborar uma disposição inicial do trabalho, que ajuda a estruturar o processo de

produção.

A definição do enfoque teórico e de metodologia e os modelos de análise

estão sempre ligados um ao outro: a metodologia deve adequar-se à linha teórica, e

estas duas escolhas devem ser simultâneas. Se isto não acontecer, torna-se difícil

implementar qualquer análise e a conclusão ficará confusa, posto que as teorias são

hipóteses elaboradas, complexas e coerentes sobre conexões entre diferentes

componentes do universo empírico, sejam estes fenômenos, relações ou

representações e significados.

A conformação de uma teoria depende, portanto, daquilo que se imagina

que seja relevante para afirmar que talvez existam conexões. Esta primeira condição

abre um amplo espectro de possibilidades, pois as teorias relevantes são aquelas

que podem ser justificadas cientificamente, e é na ciência que se encontram os

critérios de relevância imaginativa.

Em segundo lugar, as teorias são construídas pela visão de ciência em

questão, isto é, pela representação filosófica do que é ciência, de como se

implementa uma análise científica e de como se adquire conhecimento científico,

formulada a partir do conjunto de princípios, noções e critérios de qualidade

científica vigentes na época, ou seja, o que é chamado de paradigma.

Os paradigmas científicos e a própria definição de ciência dependem do

contexto sociocultural e político, e variam consideravelmente com este. Portanto,

que tipos de teorias são aceitas e legítimas em determinado momento depende de

três fatores: a) os critérios que definem o conhecimento relevante, b) a visão

filosófica de ciência e c) a tradição específica (metodológica e técnica) de pesquisa e

produção de conhecimento em determinado campo.

Estas condições para o trabalho teórico têm, para o pesquisador, um

duplo resultado. Por um lado, delimitam com certo rigor o território dentro do qual

pode mover-se, na busca de explicações coerentes sobre seu objeto, limites estes

que, em princípio, não podem ser cruzados, sob o risco de afastar-se do campo da

ciência.

Por outro lado, as referidas condições abrem um espaço considerável

para qualquer investigação, permitindo a formulação e aplicação de uma ampla

gama de hipótese, suposições e combinações, desde que contidas dentro do

paradigma vigente. A aceitação de uma determinada abordagem teórica, baseada

talvez em teorias já existentes, mas modificadas, reformuladas, suplementadas e

revistas pelo pesquisador, depende apenas da precisão analítica e coerência

argumentativa do pesquisador, bem como de seu domínio dos paradigmas e de sua

capacidade de operar dentro de seus limites, ou, no caso de pesquisadores

avançados, pioneiros e visionários, a capacidade de desafiar, transcender e

modificar o paradigma do componente curricular.

Nesse cenário, faz-se necessário tratar a questão do método.

Examinando-se os diversos instrumentos do processo científico, pode-se afirmar que

a teoria tem a intenção de articular conexões internas entre os componentes do

objeto de estudo e entre este e seu(s) contexto(s); o método é o instrumento que

permite analisar concretamente estes componentes e relações; portanto, o método

articula teoria e objeto.

Desta constatação se segue que, sem um método adequado, torna-se

inapropriada a reflexão teórica. Teoria sem método é estéril e inútil. Mas, já que o

método é um elo entre teoria e objeto de estudo, pode-se afirmar que é irrelevante

buscar uma definição substancial e essencial de método. Existe uma multiplicidade

de métodos adequados (ou não) a objetos de estudo determinados, que defende a

possibilidade de promover a interação do conhecimento científico, a partir das

formas de repensar os saberes constitutivos do TCC, já que este perpassa pela

reflexão que implica a imersão consciente do homem no mundo carregado de

conotações, valores, intercâmbios simbólicos, interesses sociais e cenários políticos.

Os diversos procedimentos metodológicos estruturam as problemáticas

particulares de cada campo científico. Por exemplo, no campo da história, o método

deve articular e estruturar três problemas, ou indagações: o tempo, o material

empírico e a avaliação do alcance da análise, ou seja, da representatividade. Na

literatura, o método deve articular e estruturar duas ordens de problemáticas

específicas: a da produção do texto e a da interpretação/recepção. Dentro de cada

uma delas, tem-se subcategorias de problemáticas, todas relacionadas entre si: o

texto em si; o autor; o leitor; o contexto; a representação simbólica e metafórica da

linguagem.

Nem teoria nem método são dados óbvios e indiscutíveis: teoria e método

sempre são resultado de um processo de escolha, exclusão e priorização dos

aspectos que se querem destacar e ressaltar. Quando, no processo de trabalho,

tomam-se decisões sobre os instrumentos teóricos e metodológicos que é preciso

aplicar, faz-se necessário desenvolver uma argumentação em favor destas

escolhas, já que qualquer objeto de estudo pode ser analisado a partir de muitos

pontos de vista teóricos e por via da utilização de vários métodos. E, em muitos

casos, é igualmente necessário assinalar também as possibilidades que, por

determinadas razões, se excluíram de uma análise específica.

A elaboração de uma estrutura provisória e guia de trabalho científico se

modifica no decorrer do processo de estudo, pesquisa e escrita. No entanto, deve-

se sempre, em um momento do processo de investigação, definir e articular uma

estrutura provisória. Esta, apesar de ser modificada durante a elaboração do texto

final, serve como um instrumento útil de direcionamento e organização. O índice

provisório é um guia de trabalho, que preenche diversas funções:

orientar e ordenar os diversos procedimentos (leitura, pesquisa

bibliográfica, coleta de dados, leituras teóricas, elaboração de rascunhos e esboços

de análise, dentre outros);

organizar os vários processos de trabalho parciais;

ajudar a manter um cronograma de trabalho;

guiar a aplicação de teorias e interpretações à medida que se coleta

mais dados;

sintetizar os resultados parciais que se alcança no percurso;

manter a conexão permanente entre hipóteses e análises parciais;

preparar o esqueleto das conclusões;

organizar o texto final, de modo a priorizar quantitativamente as partes

mais importantes;

servir como lista de verificação dos itens necessários ao texto final, de

modo a permitir complementações e/ou supressões pertinentes.

A escolha de técnicas de pesquisa e coleta de dados deve ser sempre

uma consequência do método e da orientação teórica. Qualquer técnica pode ser

utilizada em qualquer tipo de trabalho, no estudo de quase qualquer tema. No

entanto, algumas técnicas são mais adequadas a determinados fins e objetos de

estudo. É preciso ter claro que não existem técnicas melhores ou piores, apenas

técnicas mais adequadas em alguns contextos, e o uso da técnica mais eficiente

permite alcançar com maior precisão os objetivos do estudo.

Em algumas situações de pesquisa, devem-se combinar diferentes

técnicas e métodos quantitativos e qualitativos, ou diferentes enfoques: estatística e

análise textual; enfoque biográfico e textual; estatísticas sociais e análise de

discurso; questionários fechados, questionários abertos e entrevistas. O importante

é saber o motivo de se utilizar uma técnica e para que e como serão usados os

dados obtidos.

Após esse momento, surge a análise que é o processo em que se

começa a unir material empírico e teoria, através da aplicação de um método e em

que se começa a verificar a coerência e relevância das hipóteses de trabalho para

revisá-las, reunir fragmentos de percepção e entendimento, complementar

abordagens, identificar contradições internas no texto, não necessariamente para

eliminá-las, mas para refletir sobre elas, e, como resultado final destas operações,

fazer emergir o significado de todo o processo.

Nesta fase da pesquisa, percebe-se, com clareza, a importância de uma

estrutura organizada, sistemática e direcionada de desenvolvimento do texto, da

qual depende, em grande parte, o encadeamento lógico e progressivo da análise e

sua coerência argumentativa. Qualquer análise deve ser lógica e bem argumentada,

fundada em referências precisas e concretas ao material que constitui o objeto de

estudo. Além disso, deve ser diversificada e abrangente, de forma a incluir os

aspectos mais essenciais do tema. Para alcançar estes resultados, torna-se

imprescendível que os objetivos estejam claros.

Há, também, um aspecto das conclusões cuja inclusão, se não é

indispensável, é sempre aconselhável: algumas observações sobre a continuidade

das pesquisas e dos estudos sobre o tema. Nenhum tema é jamais esgotado e é da

natureza da ciência abrir espaço e apontar para novas indagações, a partir de

respostas e conclusões em que fragmentos de novos conhecimentos se articulam e

consolidam. Mais conhecimento gera indagações mais qualificadas e aprofundadas

e, na sua forma mais avançada, aponta sempre para novos caminhos de pesquisa e

estudo.

CONCLUSÃO

Durante todo o processo de elaboração deste trabalho científico buscou-

se o repensar da aquisição de novos conhecimentos, a fim de saber articular as

indagações corretas como elemento mais importante do que chegar a respostas

definitivas e categóricas. O avanço e expansão do conhecimento científico se

nutrem de indagações, problemas e dúvidas, e não de respostas, soluções e

certezas.

Foi proposto com esse trabalho científico analisar o processo de

aprendizagem por parte dos estudantes universitários, bem como apontar e refletir

sobre problemas relacionados ao componente curricular Metodologia do Trabalho

Científico, mostrando que um grande número de cursos superiores, principalmente

aqueles que formam educadores, os cursos de graduação, não oferecem aos

discentes a oportunidade da realizar um trabalho científico, uma vez que suas

grades curriculares, na sua maioria, a referida componente curricular e ministrada

em apenas um semestre letivo, preferencialmente em um dos três primeiros,

focando sua oferta nas normas estabelecidas pela ABNT – Associação Brasileira de

Normas e Técnicas – NBR, sendo que nesses semestres pouco se produz de fato

textos científicos.

A pesquisa elege os graduados tendo em vista as contribuições que a

Metodologia Científica poderia fornecer ao futuro profissional de educação, no

sentido de preparar o estudante para a pesquisa e elaboração do pensamento

crítico.

Saber concluir um trabalho com a consciência de suas deficiências e

omissões e com uma clara percepção de como se poderá, no futuro, ampliar e

aprofundar o conhecimento sobre o tema é, talvez, uma prova de domínio do tema

em particular e dos procedimentos científicos em geral. Além disso, apontar para

novos potenciais de pesquisa é reafirmar tanto o caráter coletivo da produção de

conhecimento científico quanto a inserção de qualquer contribuição específica e

concreta de um pesquisador no contexto da comunidade acadêmica e de seu

acervo comum de saber.

Nenhum texto é fechado e completo, definitivamente; nenhum resultado

de pesquisa, por mais cuidadoso, brilhante e original que seja, é final, indisputável e

indiscutível. Um trabalho científico é um instrumento de comunicação e debate,

primariamente no âmbito da comunidade acadêmica, e em segundo plano no âmbito

da sociedade.

Para que a comunicação entre seres humanos – inclusive pesquisadores

e cientistas – ocorra, os participantes do processo comunicativo devem falar a

mesma língua e serem capazes de transmitir e receber informações inequívocas.

Isto só é possível se a expressão de seus conhecimentos, ideias e resultados

ocorram em linguagem clara, precisa, coerente e lógica.

Todo trabalho científico contem uma dinâmica dialética constante entre

rotinas de aquisição, revisão e organização de conhecimentos e momentos de

produção de novas percepções e entendimentos.

As considerações sobre o TCC aqui apresentadas são as mais correntes

e mais básicas, embora a ordem da exposição possa sofrer pequenas variações.

Existem, sem dúvida, inúmeras outras possibilidades de variações e estruturas

alternativas, que dependem do tema, da personalidade do(a) autor(a), do fórum a

que se destina o trabalho, mas sua adequação e oportunidade devem ser

ponderadas com muito cuidado. Pesquisadores em um estágio mais avançado de

sua formação podem tomar liberdades maiores com este modelo de estrutura, ou

mesmo permitir-se o uso de diversos procedimentos textuais menos convencionais,

destinados a criar efeitos inesperados e menos rotineiros e a despertar o interesse

do leitor.

Face ao exposto, faz-se necessário mencionar que a estrutura e a

disposição do trabalho científico devem ser adequadas ao tema e ao método. A

discussão deve refletir claramente a metodologia de análise e a transição entre os

temas dos diversos capítulos deve ser feita com coerência lógica e textual, tornando

o texto bem encadeado e contínuo.

O tema central precisa servir de orientador tanto na escolha da teoria e

do método quanto na organização do texto – ser o eixo em torno do qual todas as

demais seções e subtemas se organizam. O aparato teórico, os instrumentos de

análise, as ferramentas metodológicas e técnicas devem sempre ser apresentadas

após a apresentação inicial do objeto de estudo, sempre em relação a este e nunca

como temas equivalentes e equiparados.

Portanto, na perspectiva de retomar a definição de teoria, pode-se

precisar a definição: teorias científicas são hipóteses elaboradas, complexas e

coerentes sobre conexões entre diferentes componentes do universo empírico,

sejam estes fenômenos, relações ou representações e significados, construídas a

partir de um paradigma de ciência.

A reflexão teórica, em um sentido amplo, acontece em todos os

momentos e em todos os níveis do trabalho científico, mas a aplicação intencional e

sistemática de determinadas hipóteses, organizadas em um conjunto coerente de

pressupostos considerados relevantes para iluminar as conexões entre diferentes

elementos da realidade a ser investigada acontecem em um momento específico do

processo de pesquisa científica e se distingue da reflexão mais geral e difusa pelo

significado com o qual se insere no paradigma científico vigente nesse campo

determinado.

Tanto os conceitos, as interpretações e os instrumentos teóricos quanto

os procedimentos metodológicos utilizados devem ser apresentados e explicitados,

tornando claras as diretivas e orientações teóricas e analíticas que inspiraram o

autor do trabalho científico.

Enfim, para formular e produzir uma conclusão, ou um conjunto de

considerações finais sobre o tema, um estudo requer que todo o processo de

pesquisa seja bem organizado e estruturado, e que as hipóteses de trabalho

estejam claras e bem focadas. Na conclusão, o que se deve fazer é retomar, de

forma resumida, tanto as diversas linhas de análise desenvolvidas quanto à(s)

hipótese(s) inicial(is), alcançando um patamar superior de compreensão mais

precisa das características e especificidades do objeto de estudo. A conclusão é um

derivado lógico direto da investigação: não se apresenta dado novo na conclusão, e

todos os elementos da análise devem ser considerados e incorporados e se forem

irrelevantes no contexto devem ser excluídos do texto final.

O Trabalho de Conclusão de Curso na graduação elege a pesquisa como

eixo organizador das atividades de ensino e exige côo pressupostos questões em

processo de investigação que articulam as dúvidas com a possibilidade de

perspectivas de respostas, tendo em vista a construção da autonomia do sujeito que

produz.

A CRITICAL ASSESSMENT ABOUT FINAL PAPER

ABSTRACT

This scientific work presents some prerequisite of skills and competencies that are

required as a minimum for the production of the Final Paper requirement. The

research is understood as a field of knowledge that leads to realization of ideas and

studies, re-conceptualizing the ability to read and write dissertation texts, in order to

organize, select and synthesize information - these skills that almost any individual

with academic training or not exercised in everyday life. It requires a certain

knowledge of the scientific field in which it appears the work in question. The

fundamental skill necessary for the acquisition of any scientific knowledge is a

linguistic-communicative ability, which allows you to assign meanings and

interpretations to the world of empirical perception, based on methods and

procedures of reflection and analysis used to articulate theory and contextual

dimension of the social-historical context of research, from the connections between

these elements.

KEYWORDS: Graduation. Search. Final Paper.

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