Arquitetura e Sustentabilidade - O Conceito de Energia Incorporada - Silvio Colin

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Arquitetura e SustentabilidadePublicado em 29/09/2012

As grandes crises do petrleo, acontecidas nos anos 1970, que afetaram a geopoltica mundial desde ento, foram provocadas por uma constatao, por parte dos pases produtores de petrleo, OPEP, de que produziam um bem precioso e esgotvel, e que no era certo que fosse queimado nas cmaras de combusto interna dos vorazes motores dos carros americanos.

Edifcios no Lake Shore Drive. Chicago, 1949-51. Arquiteto Mies van der Rohe O arranha-cu de ao e vidro, a realizao de um sonho acalentado desde o incio do sculo por poetas e arquitetos alemes, foi condenado por ser um grande consumidor de energia.

Mas essas crises tiveram tambm grande influncia na arquitetura ao levantarem a questo da energia consumida pelos edifcios das

grande metrpoles. O arranha-cu de ao e vidro, a realizao de um sonho acalentado desde o incio do sculo por poetas e arquitetos alemes[1], foi condenado em primeira instncia por ser um grande consumidor de energia. Em seu lugar, arquitetos como Louis I. Kahn, Robert Venturi, Aldo Rossi, Michael Graves, James Stirling, propunham a volta da velha e confivel parede de tijolos, recortada por janelas. Mas isso no ficou assim. As indstrias afluentes do ao, do alumnio e do vidro voltaram carga e conseguiram um Habeas Corpus, daquele tipo que ns brasileiros conhecemos, em que as situaes vo se perpetuando at o definitivo esquecimento. Veio o Brundtland Report,[2] a Agenda 21,[3] a Agenda Habitat[4] e plus a change[5] Apesar disso, os edifcios de ao, alumnio e vidro voltaram duplicados, triplicados, mais caros, mais coloridos, exercendo em alguns o antigo fascnio que seduziu Paul Scheerbart e os arquitetos da Bauhaus, propalando maior eficincia energtica etc.

Humana Building. Louisville, Kentucky, 1982-5. Arquiteto Michael Greaves.Os arquitetos propuseram a volta da velha e confivel parede de tijolos, recortada por janelas

a que entra o conceito de Energia Incorporada EI, uma conquista recente, para avaliar o impacto dos materiais nas construes e estabelecer um critrio para sua escolha. A EI refere-

se quantidade de energia utilizada para produzir um objeto. Podemos falar da EI de um tijolo, de uma janela ou de uma casa inteira. Estes materiais que compem o arranha-cu de ao, alumnio e vidro so os viles da histria, os materiais que mais incorporam energia. Ao contrrio, os materiais tradicionais, a madeira, o barro e o tijolo, so os mocinhos vingadores. Segundo o critrio da EI, um edifcio ser mais integrado aos critrios de arquitetura sustentvel quanto menos energia tiver incorporada. Para a avaliao do quantum de energia que cada matria incorpora, so considerados a energia necessria para produzir o material, as emisses de CO2 resultantes da sua fabricao, o impacto ambiental resultante da extrao do material, transporte etc.

Torre Almirante. Rio de Janeiro. 2005. Pontual Arquitetura e Robert Stern Architects Os edifcios de ao, alumnio e vidro voltaram, duplicados, triplicados, mais caros, mais coloridos, exercendo em alguns o antigo fascnio.

Para se calcular com preciso a energia incorporada de um material, todos os estgios nos quais se utiliza energia devem ser

considerados. Um valor preciso ser obtido se considerarmos a energia usada para a extrao de materiais brutos, transporte, processamento, fabricao, transporte ao stio e a energia usada in loco para instalar o produto. O processo de produo de um material tem influncia decisiva na quantidade de EI. Materiais metlicos consomem muita energia desde sua extrao da natureza at sua reduo e fabricao da forma final de uso, alm de causarem poluio e danos atmosfera. Veja-se o exemplo dos perfis de ao, desde a extrao do minrio at o trabalho final de laminao. Isto vale tambm para componentes e equipamentos, como aquecedores e climatizadores, e outros elementos como as esquadrias. Uma janela de madeira tem menos EI que uma de ao ou alumnio. Tintas orgnicas ou a base de gua, com pigmentos naturais, tem menos energia que as tintas sintticas.

Pavilho de Barcelona. 1929. Mies van der Rohe. Travertino importado, nix importado, metal polido, ao e vidro. Um dos maiores canones do Movimento Moderno tambm campeo em energia incorporada.

Tambm o transporte incorpora energia ao material. Muitas vezes prefere-se um acabamento com um travertino importado a uma forra de pedra local. Certamente isto significa mais energia. necessrio que o projetista tenha conscincia da procedncia dos materiais, no somente pelo aspecto tcnico, obvio, mas tambm para fazer este delicado equilbrio entre durabilidade e EI A anlise da durao de uma edificao deve tambm ser avaliada quando do clculo da EI. Quanto mais tempo durar uma edificao, mais baixo ser o impacto de energia e poluio resultantes da fabricao dos seus materiais. a que temos um critrio bastante solido para anlise, e podemos avaliar o quo distantes estamos

dos padres mnimos de sustentabilidade. Pensemos nas nossas metrpoles. Em alguns trechos, temos edifcios de segunda ou terceira gerao. No Rio de Janeiro, este o caso da Avenida Rio Branco e das avenidas Atlntica e Nossa Senhora de Copacabana. nesse tpico que a produo sustentvel encontra o maior obstculo, no somente na arquitetura, mas em todas as indstrias. que toda a produo industrial do mundo globalizado baseia-se na obsolescncia programada, isto , na produo de bens de curta durao de vida. Obviamente, que se trata de uma estratgia poltica e econmica para manter e criar novos postos de trabalho para uma populao crescente. No caso da arquitetura, ligada naturalmente construo civil, o problema est sempre presente, pois neste mercado de trabalho que se obtm respostas mais fceis e rpidas para as escassez de oferta de postos de trabalho.

no mercado de trabalho da construo civil que se obtm respostas mais fceis e rpidas para as escassez de oferta de postos de trabalho.

Ainda se discutem os critrios mais rigorosos para medir a EI dos materiais, uma vez que alguns dados para a medio no esto amplamente disponveis . Mesmo no sendo conclusiva, a anlise da tabela mostra a relao entre os materiais e as consequncias esperadas do seu uso. Um conceito paralelo ao de EI o de emisses incorporadas, e se referem s emisses atmosfricas associadas produo de um material, como as emisses de CO2 ligadas ao uso da eletricidade em um produto, ou a emisso de toxinas, resultante de tratamentos qumicos. Alm disso, muitos processos requerem uso de combustveis. O conceito de EI deve ser aplicado de maneira equilibrada. A EI determinada por unidade de peso ou de volume, para cada

material. Assim sendo, quando usados com parcimnia, certos materiais de alta EI, como os plsticos e o ao, podem ser teis ao resultado final da construo.

Teto de placas translucidas de Policarbonato. Os plsticos tm EI muito elevada, liberam VOC e so de difcil descarte

A EI dos plsticos muito alta. A utilizao de plsticos na construo deve, portanto, ser evitada. Alm de ajudar a sustentar a indstria responsvel por grandes quantidades de emisses de CO2, os plsticos ainda liberam gases na atmosfera chamados de compostos orgnicos volteis (VOCs), encontrados em compostos sintticos como fibras, carpetes e tintas modernas, especialmente aquelas base de leo. Os VOCs podem ser prejudiciais se inalados. Alm disso, os plsticos de difcil de descarte de maneira ecologicamente segura.

Fundio do ao

A fundio do ao requer grande consumo de energia e gera altas emisses txicas devido a seus resduos.

No que se refere a metais, apesar de ser quase inevitvel a sua utilizao,so materiais com uma alta EI, cujo processo de fabricao causa degradao ambiental. A fundio requer grande consumo de energia e gera altas emisses txicas devido a seus resduos. prudente, pois, serem especificados somente em pequenas quantidades ou com propsitos determinados, como, por exemplo, para a juno e fixao de materiais. Como so muito caros, a maioria dos metais descartados reciclada, embora este processo no seja livre de seu prprio custo de degradao ambiental. Estamos falando do ao e alumnio, mas existem metais, como o chumbo, que devem ser definitivamente evitados devido a sua natureza txica.

Edificao rural no Estado de Maharashtra, na ndia.

A madeira um material que possui excelentes credenciais ambientais. renovvel, reduz a quantidade de CO2 na atmosfera e fcil de trabalhar. H possveis desvantagens, sobretudo relacionadas com a necessidade de transporte de longas distncias. Outro problema comum a procedncia ilegal, da a importncia da certificao. Um cuidado adicional refere-se ao tratamento a que a

madeira deve ser submetido para evitar apodrecimento e ataque de micro organismos; este tipo de tratamento costuma ser altamente txico. Porisso, importante uma correta especificao que determine a densidade, qualidade, procedncia etc. relacionados estritamente ao uso.

Em resumo, com base nos critrios advindos do conceito de energia incorporada, que acabam de ser discutidos, determina-se que o projeto deve privilegiar materiais especficos, dos quais falamos, assim como sistemas sempre que possvel auto suficientes em termos de energia, como aquecimento solar de gua e sistemas fotovoltaicos para eletricidade, uso de energia elica ou hidrulica, recomendvel para gerar energia in situ. Devem ser especificados materiais que requerem o mnimo de processamento e evitados aqueles altamente processados. aconselhvel substituir materiais quimicamente tratados por produtos no txicos. Materiais procedentes de localidades mais distantes so menos indicados que aqueles materiais locais. A durabilidade dos materiais tambm muito significativa e afeta a vida til de uma edificao. A possibilidade de reciclagem e o potencial de ocupao flexvel construo favorecer a extenso da vida til da edificao.

NOTAS

[1] Ver artigo neste Blog A corrente de Cristalhttp://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2011/05/15/a-corrente-de-cristal/

[2] O Brundtland Report, principal produto da Comisso Brundtland, criada em 1983 pelas Naes Unidas, mas independente desta, foi publicado em 1987 pela Oxford University Press. Seu mais importante texto, Our Common Future define pela primeira vez os conceitos de desenvolvimento sustentvel, tentando traar um esquema que equilibre proteo ambiental, crescimento econmico, igualdade social, [3] Um dos principais resultados da conferncia Eco 92 ou Rio 92, o documento busca traar normas para equacionar consumo, luta contra a pobreza, dinmica demogrfica, sustentabilidade, gesto de recursos naturais, proteo dos ecossistemas, etc. [4] A Agenda Habitat foi o principal documento poltico produzido pela Conferncia Habitat II, em Istambul, Turquia, acontecido entre 3 e 14 de junho 1996. Adotada por 171 pases, contm mais de 100 compromissos e 600 recomendaes sobre questes relativas a assentamentos humanos, versando sobre habitao para todas as populaes, proteo de grupos vulnerveis, sustentabilidade, transporte e comunicao, planejamento metropolitano, transferncia de tecnologia, e pacto social entre autoridades e sociedade civil [5] Plus a change, plus cest la mme chose. Quanto mais se muda, mais as coisas permanecem as mesmas.

BIBLIOGRAFIAROAF, Sue, FUENTES, Manuel, THOMAS Stephanie. Ecohouse. A casa ambientalmente sustentvel. Porto Alegre: Bookman, 2009.