Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte · o conceito de espaço, em seu sentido...

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  • Arte, Arquitetura e Religiosidade

    em Belo Horizonte

  • Lenidas Jos de Oliveira

    Organizador

    Arte, Arquitetura e Religiosidade

    em Belo Horizonte

    Belo Horizonte

    Fundao Municipal de Cultura

    Museu Histrico Ablio Barreto

    2013

  • Prefeitura Municipal de Belo HorizonteMarcio Araujo de Lacerda

    Fundao Municipal de CulturaLenidas Jos de Oliveira

    Diretoria de Polticas MuseolgicasLuciana Rocha Fres

    Museu Histrico Ablio BarretoClia Regina Araujo Alves

    Sociedade Civil Esprito SantoDom Walmor Oliveira de Azevedo

    Memorial da Arquidiocese de Belo HorizontePe. Jos Janurio Moreira

    Inventrio do Patrimnio Cultural da Arquidiocese de Belo HorizonteMnica Eustquio Fonseca

    Associao dos Amigos do Museu Histrico Ablio Barretongela de Alvarenga Batista Barros

    TextosMnica Eustquio Fonseca

    ColaboradorasDanielle Bacelete de SouzaLuciane Machado Freire GangussMaria Christina da Silva

    Curadoria das exposiesMnica Eustquio Fonseca

    Projeto GrficoRicardo Costa

    Reviso de textosMarise Muniz

    Ficha CatalogrficaMaria Clia Pessoa Ayres Dias

    Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte /Organizador, Lenidas Jos

    de Oliveira; Textos, Mnica Eustquio Fonseca.___ Belo Horizonte: Fundao Municipal de Cultura, Museu Histrico Ablio Barreto, 2013.

    84 p. Il Catlogo das exposies ocorridas no Museu Histrico Ablio Barreto, no

    perodo de 2010 a 2013: Do Vale Montanha: cidade e religiosidade, os espaos do sagrado em Belo Horizonte Eixo Sul; Vozes do Silncio: memria cultural a materializao do intangvel na cultura religiosa de Belo Horizonte; A Mitra e a Coroa: espao e sociedade a formao do Arraial do Curral del Rei.

    ISBN: 978-85-60029-09-9

    1. Religio - Belo Horizonte (MG)- Histria. 2. Exposies Museu Histrico Ablio Barreto. I. Oliveira, Lenidas Jos de. II. Fonseca, Mnica Eustquio.

    CDD 200

  • Toda exposio se assimila a um direito democrtico que implica no prin-cpio de identidades culturais, preocupando-se em estabelecer ressonncias atravs da apresentao de objetos ou obras que do testemunho de referncias compartilhadas.

    Este foi o propsito que nos moveu ao traarmos a trajetria do ciclo de trs exposies que teve incio no ano de 2010 quando foi firmado o Convnio Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte, que colocava lado a lado, para essa operao cultural, a Fundao Municipal de Cultura de Belo Horizon-te e a Arquidiocese Metropolitana de Belo Horizonte. Este ciclo de exposies ficaria abrigado no Museu Histrico Ablio Barreto, o Museu da Cidade, e sua curadoria estaria a cargo do Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte.

    O projeto visava promover indagaes que levassem compreenso dos processos de construo das identidades culturais religiosas no mbito da cida-de de Belo Horizonte, partindo de uma premissa que era a tentativa de discutir o conceito de espao, em seu sentido fsico e simblico, em construo perma-nente, que abriga, s expensas dos projetos oficiais que os conforma, uma lgica prpria, que nada mais do que a histria em se fazendo.

    Assim, em 2010, dando incio a essa trajetria, foi inaugurada a primeira dessas mostras, que trazia como seu eixo conceitual as transformaes fsicas e simblicas operadas com o desaparecimento do Arraial do Curral del Rei e a construo da Nova Capital, a partir da ltima dcada do sculo XIX.

    Fruto de um projeto de ocupao territorial inteiramente novo, a constru-o da Nova Capital trazia em seu interior a ideia da eliminao do antigo e a introduo das mais modernas concepes urbansticas existentes poca, pro-cessos de reordenamento dos espaos pblicos com alargamento, iluminao e arborizao das vias, implementao de saneamento pblico, com implantao de redes de esgoto e uma completa remodelao arquitetnica. Embora resul-tassem em melhoria da infraestrutura urbana, tais reformas revelaram, sob a capa de racionalidade, as violentas marcas da imposio e da excluso, alteran-do no s a fisionomia da cidade no seu aspecto exterior, mas transformando profundamente a vida da populao ali ento residente.

    Apresentao

  • Essa cidade planejada, moderna, limpa e racional, cujos limites estavam esta-belecidos pelo grande anel da Avenida do Contorno, em cujo interior entrecorta-vam-se ruas e avenidas numa ordem traada a esquadro, assistiu ao surgimento lento e constante de outra lgica, pela qual se revelavam desejos no inteiramen-te reprimidos, necessidades mltiplas que sedimentavam a presena dos homens nos lugares. Na cidade nascente, valores e crenas espelhavam a pluralidade dos atores sociais que a povoavam, obrigando sua conformao fsica e simblica, fazendo-se presentes no espao urbano e na histria, exercitando, s vezes con-trariamente vontade poltica, seu direito de legitimidade.

    Foi galgando os passos dessa construo que subimos Do Vale Montanha, descobrindo nessa caminhada que a crescente laicizao da vida deslocava a for-te centralidade que a religiosidade imprimira at ento no espao e na prpria vida, introduzindo em seu lugar, no ponto mais alto da trama urbana, o ncleo do poder executivo. Da mesma forma, lanava para fora dos seus limites, no alto da cruz, o projeto para uma nova igreja a ser construda, que viria substi-tuir aquela que organizava e nucleava o antigo arraial. No entanto, a vida reser-vava outro desfecho para essa histria e a antiga matriz, se no logrou sobreviver por completo, o fez atravs da manuteno do espao que ocupara, ressurgindo outra e a mesma.

    Ao longo do grandioso eixo que escolhemos para sondar os redutos dessa resistncia a Avenida Afonso Pena foram surgindo histrias, algumas ainda existentes em seus lugares de origem, como o Cenculo Esprita Thiago Maior, que, desde a dcada de 1930, permanece em toda sua integridade e simplicidade na Praa Milton Campos. Outras se evadiram, dividindo-se ou se multiplicando, como foi o caso da Igreja Metodista e do Colgio Izabela Hendrix, que original-mente faceando a Avenida Afonso Pena, de frente Igreja So Jos, foram buscar outros stios dali no to distantes.

    Nessa caminhada, descortinamos margens da histria, silenciadas, mas no em silncio, pulsando na trama do tecido cultural da cidade. Os contributos que nos traziam desde o fundo dos tempos enriqueceram e auxiliaram na molda-gem de nossa tolerncia. As Vozes do Silncio, o segundo momento de nossa reflexo, exposio inaugurada em novembro de 2011 pretendeu ser o tmido locus para uma sua revelao. Sua montagem, assim como as prprias existncias culturais que buscava expressar, extravasava o recinto fechado, derramando-se pelos jardins do Museu, em busca de amplitude, necessria prpria existncia. Ali, em meio ao burburinho da cidade, os paus dos espritos, erguidos e monu-mentais, invocavam uma memria que se faz cada vez mais tnue.

  • No interior, aprisionados nas vitrines, fazendo-se presentes atravs de obje-tos e de imagens silenciosas, o batuque cadenciado e surdo dos tambores, que marcam a religiosidade popular, quedava inerte. Lembrava-nos que sua existn-cia, confinada em guetos exticos, ainda teima em se manter altiva e, ainda que ali silenciada, repercutia em nossas lembranas, desencadeando as emoes.

    Naquelas salas e jardins, procurou-se servir a ceia cultural, ouvir o chamado do muezim, reviver o programa antropofgico, restaurar a memria das origens como primeiro passo para a construo de uma sociedade renovada.

    Passados trs anos que demos nossos primeiros passos para a construo desse ambicioso projeto, no dia 28 de maio de 2013, entregamos nossa ltima exposio ao pblico da cidade de Belo Horizonte e a todos aqueles que a visi-tam. A Mitra e a Coroa, finalmente aberta ao pblico, fez-se como o resgate de um entendimento histrico que revelava a vontade poltica de estabelecer e po-tencializar a convivncia entre o pblico e o privado em diferentes modalidades do fazer, fosse ele a ambio de um Reino, a converso e a salvao, o poder e a glria ou a reflexo crtica sobre essas aes.

    Lado a lado, conduzindo o processo de ocupao e remodelao do espao, o plano terreno e o plano divino buscaram reordenar o mundo nos moldes de uma ordem rgida e inabalvel, que pressupunha a eliminao de tudo o que a ela resistisse. A vida, no entanto, imprimiu sua prpria dinmica e, atravs dos desafios que se interpuseram, desenhou-se a fisionomia desse novo mundo, da nova cidade e de sua sociedade.

    A Nova Capital no reservara lugares para os seus trabalhadores, aqueles que a erguiam com as prprias mos; no lhes fora reservado o espao de habitar. Con-quistaram-no nas glebas distantes, nelas estabelecendo-se, nelas se recriando. Sur-gem pouco a pouco os lugares do povo, marcados no s pela sua presena fsica, mas tambm pelo seu gosto peculiar, por valores e crenas que com eles traziam.

    A presena da Igreja Catlica acompanhou essa expanso e, atravs dela, num ritmo regular e constante, materializou-se nesse processo: o So Sebastio do Barro Preto; a Nossa Senhora da Conceio da Lagoinha; o So Francisco da Pompeia; a Nossa Senhora das Dores da Floresta; a Santa Teresa, que d nome ao bairro; o Calafate, e tantos outros

    Se esse fazer no inverteu por completo a lgica civilizadora, pelo contrrio, muitas vezes dela se fez aliado, no entanto deixou emergirem foras potenciais que a desequilibravam, obrigando adaptaes, projetando os mltiplos campos

  • das existncias culturais. Originadas na Minas colonial, decorrncia dos proble-mas polticos que naquele momento marcaram as relaes entre o Estado Portu-gus e a Igreja, obrigando-a a se ausentar do processo colonizador, imprimiu na populao o seu sentido de poder e pertencimento. Na cidade moderna volta-ram a se revelar, nutridas pelos novos processos de excluso.

    Assim, atravs de um percurso motivado por indagaes, procuramos cons-truir trajetrias possveis no territrio da cidade, s vezes comprimindo seu espao, confinando-o a uma avenida, s vezes alargando-o desmesuradamen-te, indo at os confins do Estado buscar aqueles que neles se viram confinados. Finalmente, delineando as fronteiras progressivas que marcaram os processos internos de expanso, promovendo a configurao do territrio do Estado de Minas e, dentro dele, os lugares de pertencimento.

    Os resultados que foram apresentados aos habitantes da Cidade s se tornaram possveis porque houve consentimento entre as partes a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, por meio de sua Fundao Municipal de Cultura e a Cria Me-tropolitana, que, imbuda da necessidade de conhecer, valorizar e promover o seu patrimnio cultural, disps-se a receber e incentivar a proposta que lhe apresent-vamos. Mostrando-se abertas acolhida, ambas permitiram que se estabelecessem interlocues amplssimas que nos permitiram descobrir no horizonte cultural da cidade, alm daquilo que faz parte de nosso cotidiano, o que nos foge, o que nos escapa, mas que est presente, constante, slido como rocha. No mbito da cidade contempornea, estabeleceu-se, assim, o dilogo franco e respeitoso entre diferen-tes universos culturais religiosos, expressando o seu desejo de entendimento.

    Agradecemos ao Museu Histrico Ablio Barreto o Museu da Cidade a generosidade de abrir suas portas para que nele pudssemos pensar nossa hist-ria; agradecemos ao Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte, que acolheu indistintamente a proposta; agradecemos a todos os que nesses ltimos trs anos caminharam conosco para que as exposies pudessem acontecer: aqueles que nos ajudaram a melhor compreender as ntimas dimenses das crenas e de suas prticas, aqueles que generosamente nos disponibilizaram seu tempo e seus va-liosos acervos, aqueles que nos ajudaram a buscar as informaes e os dados que tornaram possvel construir os sentidos, inclusive todos os que no menciona-mos, mas que sabem o quanto foram imprescindveis.

    Mnica Eustquio Fonseca

    Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte

  • Sumrio

    INTROduo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

    Do Vale Montanha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21Tristes Horizontes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .23

    A Igreja Catlica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .25

    O Catolicismo em Belo Horizonte Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem . . . .27

    O Catolicismo em Belo Horizonte A Capela Curial de Nossa Senhora do Rosrio . .28

    O Catolicismo em Belo Horizonte Igreja Matriz de So Jos . . . . . . . . . . . .29

    Catolicismo Igreja do Sagrado Corao de Jesus Siracos Catlicos . . . . . . . .30

    Catolicismo Nicho-oratrio de Nossa Senhora da Boa Viagem, Estao Rodoviria . .31

    Catolicismo Praa do Papa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .32

    O Espiritismo em Belo Horizonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33

    O Islam em Belo Horizonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .34

    O Judasmo em Belo Horizonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

    A Igreja Metodista em Belo Horizonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37

    A Igreja Presbiteriana em Belo Horizonte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .38

    Vozes do Silncio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49A cidade e sua ocupao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .51

    O Sagrado: sentimento e revelao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .52

    Xamanismo Ymy: o canto e a pessoa Maxakali . . . . . . . . . . . . . . . . .54

    O Santssimo Sacramento: irmandade e rito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .56

    Os cultos afro: os Orixs . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .58

    O Congado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .60

    A Pscoa judaica: Celebrao da Libertao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .62

    O rito oriental Catlico Igreja Catlica de Antioquia Siraca e Maronita . . . . . .63

    O Adhan ou Azan . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .65

    A Mitra e A Coroa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73Apresentao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .75

    O papel da Coroa e da Igreja na colonizao do Brasil . . . . . . . . . . . . . . .77

    Imaginria devocional mineira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .79

  • 13Introduo

    () Qu bien s yo la fuenteque mana y corre:

    aunque es de noche!Su claridad nunca es oscurecida

    y s que toda luz de ella es venida,aunque es de noche ()

    Qu bien s yo la fuente que mana y corre Aunque es de noche!

    Aquella eterna fuente est escondida. Qu bien s yo do tiene su manida.

    Aunque es de noche!Su origen no lo s, pues no lo tiene.

    Mas s que todo origen de ella vieneAunque es de noche

    S que no puede haber cosa tan bellaY que cielos y tierras beben en ella.

    Aunque es de noche.

    So Joo da Cruz1

    Foi no Romnico, no sculo XI, que se deu a unificao entre liturgia e Ar-quitetura, e em parte direcionada ao mundo de Bizncio2, do qual extrai parte de seus imaginrios. Na liturgia, destacou-se o esprito individualista; na Arte e em seus reflexos nas portas das catedrais, o aspecto humano de Cristo, sua paixo e morte, mais que sua ressurreio. Mais tarde, no Gtico, a Catedral era a grande Casa de Deus, o Habitaculum Dei in spiritu3, era tambm a casa dos homens e 1 So Joo da Cruz e Santa Tereza de vila foram grandes pensadores da transio ocorrida no sculo XV na Teologia da Igreja (passagem do Gtico para o Medieval). So Joo, imbudo pela tradio escolstica, embalado pelos pressupostos bblicos e pela experincia mstica, formou um sistema claro, sinttico e pessoal. Sua caracterstica mais importante a de tomar imagens para interpretar diferentes tipos da mesma realidade espiritual. Neste poema, deixa claro a dialtica entre o dia e a noite, metaforicamente vivida pela Igreja naquele momento, expressa na Arquitetura atravs do axioma de forma x doutrina homem x igreja e suas contradies que ofereciam ao olhar o espetculo do efeito claro x escuro, incertezas do pensamento do contexto do Conclio de Trento. Ver: Teresa de Jess, Santa; Juan de la Cruz, Santo. Lira Mstica. Madrid: Editorial de Espiritualidade, 1993. p. 35.2 Em Bizncio, tambm a abbada celeste representou o universo religioso, abaixo do qual se situava o cenrio eclesistico com significao poltica onde o patriarca, o imperador e seu squito participavam da celebrao litrgica, como Santa Sofia de Constantinopla.3 Os fieis e as igrejas se fundamentam nos cimentos dos apstolos e dos profetas, uns e outros so Habitaculum Dei in spiritu e, portanto, significavam a mesma coisa. Ver: Efsios, 2,19. A construo de igrejas como casa de Deus pode tambm ser interpretado como smbolo da Civitas Dei, de Regnun Dei. (Civilizao de Deus, Reino de Deus). nesse sentido que so percebidos lugares luminosos, ou

    Introduo

  • 14 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    em ambos o reflexo da prosperidade econmica, da glria e do poder das emer-gentes cidades europeias e da apurada liturgia que se desenvolvia no perodo. Essa nova arte sacra, por sua vez, mostrava-se diferente do mundo Bizantino, ou mesmo do Romnico, na medida em que instaurava nova ideia de represen-tao cosmolgica, centrada no modelo de representao de Jerusalm celestial, encarnado nas pedras das Catedrais4. Desse modo, o patrimnio cultural religio-so do mundo ocidental tornou-se o resultado de uma srie de finalidades gera-das pelos modelos teolgicos e aes litrgicas, que se desenvolvem nos templos, muitas vezes reflexos das ruas e de sua diversidade cultural, modelos mutantes que a Histria foi delineando atravs dos tempos5.

    Sculos mais tarde, j na Amrica, em nosso longo perodo colonial, a viso de mundo unitrio da herana medieval, embora ainda influente, j no mais representava a vida cotidiana. Aqui, no Brasil, o que imperou foi a Igreja da Con-tra-Reforma e sua arte que no se traduzia somente nas talhas douradas, nas pinturas e nos ornamentos eruditos das igrejas e dos palcios, mas tambm nas representaes de uma Igreja catequtica6. Tal viso mostrava-se tambm nos sermes, na Literatura, no vesturio e nos estandartes. Tomaram feio brasileira nas manifestaes artsticas de extrao popular, dos artfices mulatos, negros e ndios a servio das instituies poderosas, ou do povo mestio, na produo de suas festas, seus cantos e danas, mesclando influncias tnicas e construindo o sincretismo religioso7. Srgio Buarque de Holanda8 inicia o clssico livro Razes do Brasil sublinhando as razes ibricas, donde se origina a forma atual da nossa cultura. Desta matriz fundamental, que na origem tambm mestia pois a Pennsula Ibrica um dos territrios-ponte pelos quais a Europa se comunica com os outros mundos, veio juntar-se ao ndio e ao negro africano:

    Hbrida desde o incio, a sociedade brasileira de todas da Amrica a que

    seja, que possuem algo de transcendncia. Ver: FRANKL, Paul. Arquitectura gtica. Madrid: Ctedra, 2002. p. 411. (Manuales de Arte Ctedra). Ttulo original: Gothic Architecture.4 Apocalipse de So Joo, captulo 21. Tambm no Antigo Testamento, o profeta Ezequiel foi transportado, durante uma viso, a uma montanha e lhe mostrou as caractersticas precisas do templo de Salomo em Jerusalm. No Novo Testamento, a ideia de Jerusalm est desenvolvida para representar um conceito de perfeio. Para complementar ver: HUMPHREY, Caroline; VITEBSKY, Piers. Arquitectura sagrada. Madrid: Debate; Barcelona: Crculo de Lectores, 19975 FRANKL, Paul, Op.cit. p. 405-411.6 Essa ideia de uma igreja catequtica conduzir o culto e a Arte a um modelo de convencimento. Ver: CAMPELLO, Glauco de Oliveira. O brilho da simplicidade: dois estudos sobre a Arquitetura religiosa no Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2002; Ver Tambm: CARVALHO, Anna Maria Fausto Monteiro et. al. A forma e a imagem: arte e Arquitetura jesutica no Rio de Janeiro colonial. Rio de Janeiro: PUC/RIO, 1994. p. 15-24.7 Sobre o tema ver: BAYON, Damian. Sociedad y Arquitectura Colonial Sudamericana. Barcelona: Gustavo Gilli, 1974. p. 27.8 HOLANDA, Srgio Buarque. Razes do Brasil. So Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 4-42.

  • 15Introduo

    se constituiu mais harmoniosamente quanto s relaes de raa: dentro de um ambiente de quase reciprocidade cultural que resultou no mximo apro-veitamento dos valores e experincias dos povos atrasados pelo adiantado; a miscigenao fruto da escassez de mulheres brancas [que] criou zonas de confraternizao entre vencedores e vencidos, entre senhores e escravos9.

    Assim que assistimos no patrimnio religioso contemporneo, nas palavras de Neto10 Uma diferenciao de suas precedentes pela multiplicao de discursos sem que haja necessariamente a obrigao de que um presida a validade dos de-mais. Esse ambiente partido, no , de nenhum modo, gerado pelo acaso, mas sim, originrio de uma cultura de mltiplas tendncias e que parece ser identi-ficada pela pluralidade, a qual revela um templo e desvela um homem fraturado em suas essncias culturais e inserido em um contexto de mltiplas realidades alegricas; porm, capaz de sintetizar essa nova identidade, seja ela na variedade ou na tentativa de unir formas dispersas. Vale lembrar novamente que tal situa-o se processa, como vimos anteriormente, desde o perodo colonial.

    Esses contextos e textos constituram a base para as exposies realizadas no Museu Histrico Ablio Barreto: estudos do sincretismo contemporneo e da tradio e, finalmente, do intangvel, a face sensorial que se espelha na liturgia sacra.

    Na exposio Do Vale Montanha: cidade e religiosidade, os espaos do sagra-do em Belo Horizonte Eixo Sul, inaugurada em 2010, os templos foram mos-trados por meio de objetos da memria religiosa de uma parcela da cidade, mas que nos forneceram elementos substanciais para o entendimento da convivncia e de particularidades de religies universais, vividas e sentidas por todos, como componentes da vida e do respeito diversidade.

    o ecumenismo presente na coletividade que acomoda e faz ecoar as diver-sas vozes do silncio da f do nosso patrimnio religioso intangvel. Foi a ideia de sincretismo que nos apresentou a exposio Vozes do Silncio: memria cultu-ral a materializao do intangvel na cultura religiosa de Belo Horizonte, aberta ao pblico em 2011, uma oferenda nossa cidade, com a inteno leve da paz. A proposta foi perceber e mostrar a complexidade da cultura religiosa que carac-teriza o territrio da cidade, que multitnico e hbrido, lugar no qual tradio e modernidade coexistem, redefinindo-se e reproduzindo-se a cada momento.

    9 Ver: FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formao da famlia brasileira sob o regime da economia patriarcal. So Paulo: Global, 2003.10 COELHO NETO, Jos Teixeira. Moderno ps-moderno. Porto Alegre: L&PM, 1990. p. 72

  • 16 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Por fim, a exposio A Mitra e a Coroa: espao e sociedade a formao do Arraial do Curral del Rei, inaugurada em 2013, narrou os primrdios de Belo Horizonte, ainda arraial. Destrudo para a construo da capital de Minas Ge-rais, permaneceu de forma emblemtica por meio do acervo recolhido pelo Mu-seu Histrico Ablio Barreto. Desta forma, o Museu abrigou, nesta exposio, fragmentos daquele povoado que apontavam para algumas permanncias da histria e da memria, cujo passar do tempo no apagou.

    Bossi11, no captulo 1, do livro Cultura Brasileira, mostra-nos interessante contedo intitulado Plural, mas no catico. Todavia, sirva de segundo termo de referncia reflexo do antroplogo Octvio Ianni, que se refere a esse momento de estilhaos como resultado da existncia de uma cultura heterognica no pas, teoria partilhada por grande parte dos antroplogos brasileiros: 12

    O Brasil se revela numa vasta desarticulao.O todo parece uma expresso diversa, estranha, alheia s partes.E estas aparecem fragmentadas, dissociadas, reiterando-se aqui e l.Ontem ou hoje, como que extraviadas, em busca de seu lugar ().

    Martin-Barbero13 chama a ateno para outro contexto, que a tentativa de fabricao do presente contra a fragmentao da Histria, o que implica, tam-bm, numa profunda ausncia de futuro, catalisando a sensao de estar de vol-ta grande utopia. Deste modo, os meios constituram num dispositivo funda-mental de instalao em presente contnuo, numa sequncia de acontecimentos que, em lugar de trabalhar os fatos como algo que acontece num tempo largo ou pelo menos mediano, os meios se apresentam sem nenhuma relao entre eles, numa sucesso de acontecimentos, em que cada episdio acaba apagando o an-terior, dissolvendo e impedindo, por tanto que se estabelea verdadeira relao entre eles. De acordo com Lyotard14, esse momento de fragmentao, prprio da ps-modernidade, caracteriza-se ainda pela ausncia de meta-relato capaz de homologar os diversos outros discursos produzidos em nossa cultura, como os da cincia, da moral e os da arte sacra. A morte do saber absoluto e a ausncia de 11 BOSSI, Alfredo. Cultura Brasileira. So Paulo: tica, 1987. p. 8-15.12 OCTVIO, Ianni. Uma Nao em busca de conceito. So Paulo: EDUSP. p. 177.13 MARTIM-BARBERO, Jess. Mdios, olvidos y desmemorias. Disponvel em: . Acesso em: 01 fev. 2003.14 Lyotard um dos grandes pensadores da ideia da fragmentao na arquitetura contempornea. Quando, em 1985, em Beauborg, inaugura a exposio intitulada como Les Immateriaux busca apresentar uma espcie de anti-mostra, anunciava uma dramaturgia Ps-Moderna, anunciando uma vez mais a exausto das certezas que balizaram a modernidade. Ver: LYOTARD, J.F. La Condicin Postmoderna. Madrid: Ctedra, Teorema, 1984. p. 54. Tambm Otilia Arantes na pgina 76 de seu livro anlisa os escritos e ideias de Lyotard, ver: ARANTES, Otilia Beatriz Fiori. O lugar da arquitetura depois dos modernos. So Paulo: EDUSP, 1993. p. 76.

  • 17Introduo

    uma verdade ltima funcionaria como o ponto do qual se poderia encontrar um modo de ao que permitiria proliferar as vrias verdades, os discursos, confor-me o ponto de vista, o campo do saber e da cultura em que so produzidos. As-sim, tornou-se necessrio o conhecimento de trs discursos que so chaves para a compreenso da arte sacra contempornea brasileira, que a ideia de fragmen-tao, ps-modernismo e periferia.

    Foi tambm nesse entendimento que a Fundao Municipal de Cultura, por meio do Museu Histrico Ablio Barreto e do Memorial da Arquidiocese de Belo Horizonte, props os trs estudos que originaram as exposies. Primeiro, tra-tando da questo ecumnica no territrio de Belo Horizonte, depois, de seu pa-trimnio imaterial e, por ltimo, as formaes do povoado do Curral del Rei e sua consequente transformao em capital positivista de Minas Gerais.

    Este catlogo representa tais momentos mostrados nas exposies. Integra, desse modo, a poltica cultural dos museus da Fundao Municipal de Cultu-ra, da busca de temas com profundo rigor terico aliado a temticas do coti-diano das gentes. A inteno perceber e mostrar a complexidade cultural que caracteriza o territrio da cidade de Belo Horizonte, que multitnico, hbrido, lugar onde tradio e modernidade coexistem, redefinindo-se, reproduzindo-se a cada momento. Da a enorme importncia da mostra e da benfazeja parceria do Museu, da Fundao Municipal de Cultura e da Arquidiocese de Belo Hori-zonte, com seu Inventrio, que compreende a f catlica na sua profundidade e percebe, para alm dos seus portes, a f do povo brasileiro em suas diversas formas. Do catolicismo e do protestantismo mais tradicionais aos estilos de cul-tos cristos, calcados na indstria cultural do simulacro televisivo; das tradies religiosas afro-brasileiras mais ortodoxas, como o candombl, o xang, o batu-que e o tambor de mina, s variantes mais sincrticas, hbridas ou imaginativas, como a umbanda, jurema, a umbanda esotrica, dos grupos religiosos tnicos altamente fechados, como os de muitas naes indgenas, aos novos movimentos internacionais ou cosmopolitas, tais como os da Nova Era; de discursos teol-gicos extremamente inovadores e radicais, como os da Teologia da Libertao a vrias formas conservadoras e mesmo fundamentalistas de valores cristos, tan-to catlicos quanto protestantes; somando-se a tudo isso, ricas tradies orais e mticas, como os frequentes surtos messinicos e as prticas xamansticas que se expandem para alm do seu contexto indgena original. Apesar de toda essa pluralidade lembrar primeiramente descentramento, superficialidade e inconsistn-cia. H, entretanto, uma dimenso religiosa centrada na multiculturalizao e numa tendncia ecumnica de sentido popular nos sistemas sincrticos, cada vez mais es-piralados, sempre mutantes, mais caleidoscpicos, que se apoiam numa cultura reli-

  • 18 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    giosa em constante ampliao, vozes do silncio que ecoam na busca, todos, de uma terra sem males, como no mito indgena do mais profundo da nossa terra.

    () Guiraypoty entoou ento o nheengara, o canto solene guarani. Quando iam ser tragados pela gua, a casa se moveu, girou, flutuou, subiu subiu at chegar porta do cu, onde ficaram morando. Esse lugar para onde foram chama-se Yvy mar ei (a terra sem males). A as plantas nascem por si prprias, a mandioca j vem transformada em farinha e a caa chega morta aos ps dos caadores. As pessoas nesse lugar no envelhecem e nem morrem: a no h sofrimento! 15

    Lenidas Jos de Oliveira

    Presidente da Fundao Municipal de Cultura

    15 TERRA sem males. CNBB, 2002, p. 17-18.

  • 6 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • Do Vale Montanha

    Cidade e religiosidade, os espaos do sagrado em Belo Horizonte Eixo Sul

  • 8 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • 9Do Vale Montanha

    Por que no vais a Belo Horizonte? A saudade ciciae continua, branda: volta l.

    Esquecer, quero esquecer a brutal Belo Horizonte

    que se empavona sobre o corpo crucificado da primeira. Quero no saber da traio dos seus santos

    Sossega minha saudade. No me cicies outra vez

    o imprprio convite. No quero mais, no quero ver-te

    Meu Triste Horizonte e destroado amor.

    Carlos Drummond de Andrade

    Sob a Histria, com H maisculo, existem as histrias; sob as venturas ou desventuras, existem narrativas individuais

    Como ler uma cidade?

    Essa leitura ser sempre o resultado de uma representao advinda da ex-perincia pessoal ou coletiva, imagem de um fenmeno material que a ns se revela pela roupagem dessa experincia.

    Nosso olhar perscruta as ruas, como se fossem pginas escritas: a cidade diz tudo em que se deve pensar. Como realmente a cidade sob o seu envoltrio de smbolos? O que contm e o que esconde? Perguntas de difcil resposta, pois que so muitas. Para tentar respond-las, servimo-nos de trs alegorias propostas por talo Calvino:

    A Cidade e a MemriaA cidade se embebe como uma esponja da onda que reflui das recordaes e se dilata. A cidade no conta o seu passado, ela o contm como as linhas da mo, escrito nos ngulos das ruas, nas grades das janelasA Cidade e o DesejoA cidade aparece como um todo no qual nenhum desejo desperdiado e do qual voc faz parte; uma vez que aqui se goza tudo o que no se goza em outros lugares, no resta nada alm de residir nesse desejo e se satisfazer

    Tristes Horizontes

  • 10 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    A Cidade e os SmbolosOs olhos no vm coisas, mas figuras de coisas que significam outras coi-sas

    O orgulho urbano feito da conjuno entre a cidade real e a cidade imagi-nada, sonhada por seus habitantes e por aqueles que a trazem luz detentores de poder e artistas. Traada coletivamente, no mbito material ou simblico, a cidade preenche-se de multiplicidades, que nem sempre levam as pessoas a inte-ragir; pelo contrrio, muitas vezes sedimentam o silncio dos cidados.

    Belo Horizonte nasceu da vontade de corrigir um percurso considerado tor-tuoso e por demais ingnuo, inadequado aos novos tempos de domnio racional. Assim, o plano da cidade concebeu a traa urbana terrenos, quarteires, ruas e avenidas, como unidades abstratas destinadas compra e venda, desconsideran-do os usos histricos, as condies topogrficas ou as necessidades sociais. Por isso, foi possvel sobrepor paisagem natural, ao casario serpenteante, o desenho a rgua e esquadro, fazendo surgir a polissemia dos lugares, abortando a convi-vncia unvoca no Largo da Boa Viagem.

    Teoricamente, a ausncia de um ponto central e os limites indefinidos possi-bilitam mltiplos locais de encontro. A flexibilidade espacial, aparentemente, faz eco ao esprito pr-diversidade, mas tambm a falta de direcionamentos prev maior facilidade para que se possam demolir todos os obstculos, inclusive os de barro, madeira ou pedra erigidos no passado.

    Resultante desse processo, a cidade se fez sobre escombros paisagem, edi-fcios e homens foram aparelhados e moldados, condicionando um eterno de-vir, insatisfao insanvel, revelando, quem sabe, a nsia da conciliao entre os valores da civilizao cientfica e a memria histrica de antigas culturas. Vale lembrar Arguedas: Ao imenso povo dos senhores chegamos; e o estamos remo-vendo.

    Esse eterno deslocamento essa polissemia e flexibilidade de lugares e gen-tes conduziu realizao do ideal iluminista do corpo em movimento, cuja trajetria condicionada pelo grandioso traado do eixo que liga o vale mon-tanha.

  • 11Do Vale Montanha

    A palavra igreja vem do latim ecclsia, forma latinizada do grego ekklesa, que significa convocao, assembleia, ou tambm congregao, comunidade. No Novo Testamento, designa as pequenas comunidades locais e seu conjunto.

    A palavra catlico tambm vem do grego katholiks, que significa univer-sal. No Novo Testamento (Atos 4,18), encontra-se o advrbio kathlou, que sig-nifica inteiramente, completamente, absolutamente. Pelo ano 110, Santo Incio de Antioquia, na Carta aos cristos de Esmirna, usa a expresso a Igreja Ca-tlica para falar da Igreja universal, ou toda a Igreja, sem sentido confessional. Posteriormente, vrios autores usaram o termo, mas nem sempre fica claro se em sentido genrico ou especfico, confessional. Muito citado em sentido confessio-nal o texto, em latim, de So Paciano, bispo de Barcelona (ca. 370): Meu nome cristo, meu sobrenome catlico.

    Do ponto de vista jurdico, o Cdigo de Direito Cannico, promulgado em 1983, prescreve:

    Cn. 204 1. Fiis so os que, incorporados a Cristo pelo batismo, foram constitudos como povo de Deus e, assim, feitos participantes, a seu modo, do mnus sacerdotal, proftico e rgio de Cristo, so chamados a exercer, segun-do a condio prpria de cada um, a misso que Deus confiou Igreja para que a cumpra no mundo. 2. Essa Igreja, constituda e organizada neste mundo como sociedade, sub-siste na Igreja Catlica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunho com ele.

    O Conclio Vaticano II (1962-1965) evitou, intencionalmente, a simples identificao de Igreja com Igreja Catlica: no disse que essa Igreja a catlica, mas que subsiste nela. Vale dizer: a catlica tem conscincia de que nela est plenamente presente a verdadeira Igreja de Cristo; mas no afirma que a catlica engloba, necessariamente, pelo menos quantitativamente, todos os elementos le-gitimamente cristos. Admitem-se valores cristos fora das fronteiras visveis da Igreja Catlica, elementos esses que impelem unidade em Cristo.

    Do ponto de vista da f, quando se fala de Igreja, incluem-se os seguintes fundamentos teolgicos:

    A Igreja Catlica

  • 12 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    O plano divino de salvao de todos os seres humanos.

    A misso salvfica que Jesus Cristo recebeu e cumpriu: anunciar a todos o Reinado de Deus j em ato no mundo, embora ainda incompleto.

    Os seguidores que Jesus escolheu e chamou a serem discpulos e enviados, no s individualmente, mas como grupo reunido pelo Esprito Santo e, graas a Ele, vivenciam a presena de Jesus onde houver dois ou trs reunidos em seu nome. Foi com esse entendimento que os discpulos formaram, por toda parte, comunidades fraternas, que davam testemunho de Jesus e do Reinado de Deus no mundo, fazendo com que se vivenciasse sua presena por meio de uma vida pessoal, interpessoal e sociopoltica nova e renovadora.

    Esse projeto, j em execuo, alimentado pela liturgia e pela acolhida da palavra de Deus na Bblia, pela tradio e orientao do Magistrio Eclesistico, pela vida dos santos.

    De maneira sinttica, os catlicos afirmam que a Igreja una, santa, catlica e apostlica. una porque unida, em comunho. Sem sufocar tenses e ten-dncias diferentes, no essencial esto unidos. Rezam o mesmo credo, professam a mesma f. santa, apesar de falhas e pecados de pessoas e instituies, pois comunho de pessoas que buscam testemunhar a santidade de Deus e abrir-se ao Esprito de Santidade. catlica porque oferece sua proposta a todos os povos; professa a totalidade qualitativa da f crist; est aberta ao dilogo com outras igrejas, entidades eclesisticas, religies; quer provocar globalizao hu-manizadora, libertadora. apostlica pela mensagem que professa e anuncia, substancialmente a mesma dos tempos apostlicos; por assumir a mesma tarefa missionria que Jesus confiou aos primeiros discpulos, ao fazer deles enviados a todos os povos (apstolo, em grego, significa enviado); por sua estrutura epis-copal, desde o incio, a sucesso apostlica de que fala a teologia, entendida como servio aos fiis e, por meio deles, ao mundo.

  • 13Do Vale Montanha

    O Catolicismo em Belo Horizonte

    Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem

    A edificao da primeira capela dedicada a Nossa Senhora da Boa Viagem ocorreu no incio do sculo XVIII, simultaneamente consolidao do Arraial do Curral del Rei. A parquia foi criada em 1748, por proviso episcopal, e a construo da nova matriz se deu entre os anos de 1788 e 1793, no lugar da an-tiga capela, insuficiente e precria, inadequada para abrigar o nmero de fiis.

    A primeira Constituio de Minas Gerais, de 1891, previa a mudana da ca-pital do Estado, escolhendo-se a regio do Arraial do Curral del Rei para sua implantao. A construo da nova capital, totalmente planejada, ficou a cargo da Comisso Construtora, chefiada pelo engenheiro Aaro Reis. Em seus estu-dos, a Comisso constatou a necessidade de demolir completamente as antigas edificaes, consideradas desajustadas aos projetos urbano e arquitetnico da nova sede do governo, pautados em concepes modernas. Dessa forma, em 15 de dezembro de 1894, o presidente do Estado de Minas Gerais, Chrispin Jacques Bias Fortes, solicitou ao Bispo de Mariana, Dom Silvrio Gomes Pimenta, per-misso para a demolio da matriz. Autorizada, a demolio ficou condicionada, no entanto, construo de nova igreja, para que os fiis no fiquem privados de sua casa de orao. A Comisso Construtora assumiu o compromisso de edi-ficar uma capela provisria, a Capela de Nossa Senhora do Rosrio, enquanto se procederia demolio da matriz.

    A criao da Diocese de Belo Horizonte, em 11 de fevereiro de 1921 Bula Pastoralis Sollicitudo , do Papa Bento XV, separando-a da Diocese de Mariana, qual pertencia, elevou a Matriz de Nossa Senhora da Boa Viagem condio de Catedral. Simultaneamente, em 1 de fevereiro de 1924, Belo Horizonte foi elevada categoria de Arquidiocese e Sede Metropolitana Bula Amunus Nobis ab Aeterno Pastorum Principe do Papa Pio XI. Em 1937, a Catedral passou a se-diar o Santurio de Adorao Perptua ao Santssimo Sacramento, fato assinalado com a realizao da procisso do Triunfo Eucarstico.

  • 14 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    No antigo Arraial do Curral del Rei, no Largo do Rosrio, junto rua de mesmo nome, existia uma capela bem rstica dedicada a Nossa Senhora do Ro-srio, demolida em 1894, com o incio da construo de Belo Horizonte, para a abertura da Rua da Bahia, em seu cruzamento com a Avenida lvares Cabral. Firmou-se acordo entre o Governo do Estado, a Diocese de Mariana e a Co-misso Construtora da Nova Capital, assumindo esta ltima o compromisso de construir nova capela, em outro local, com o mesmo orago.

    Assim, em 1896, iniciou-se a construo dessa capela, em terreno de esquina, situado entre as ruas So Paulo e Tamios e Avenida Amazonas, com projeto ela-borado pelo Escritrio Tcnico da Comisso Construtora, executado pelo em-preiteiro Alfredo Massini. Sua inaugurao ocorreu em 26 de setembro de 1897. Trata-se, portanto, da mais antiga igreja da capital Belo Horizonte, em concep-o singela e despojada, nica edificada pela Comisso Construtora.

    Poucos anos depois, em 1911, Dom Silvrio Gomes Pimenta, Bispo de Ma-riana, autorizou a construo do Orfanato Santo Antnio, anexo capela, inau-gurado em 1913, o que fez com que ficasse conhecida como Capela de Santo Antnio. Entretanto, o orago nunca foi alterado e a capela sempre esteve ligada diretamente Cria Metropolitana como Capela Especial, no tendo pertencido ao Orfanato. Este, por sua vez, foi demolido no incio da dcada de 1960.

    O Catolicismo em Belo Horizonte A

    Capela Curial de Nossa Senhora do Rosrio

  • 15Do Vale Montanha

    O Catolicismo em Belo Horizonte Igreja Matriz de So Jos

    A Parquia de So Jos foi criada em 27 de janeiro de 1900, por ato do Bispo de Mariana, Dom Silvrio Gomes Pimenta. O projeto arquitetnico para a cons-truo da igreja, de autoria de Edgard Nascentes Coelho, foi aprovado em 1901. Sua pedra fundamental foi lanada em 20 de abril de 1902 e, em 19 de maro de 1904, dia do padroeiro, inaugurou-se parte da obra ento concluda, certamente o presbitrio, onde j se realizavam os ofcios religiosos. As obras no se deram de forma contnua: aps algumas interrupes, foi iniciada, em 1910, a cons-truo da escadaria e, entre 1911 e 1912, realizou-se a ornamentao pictrica interna, pelo artista alemo Wilhelm Schumacher.

    A Igreja Matriz de So Jos tem abrigado, ao longo de sua histria, na pr-pria igreja e em seu salo paroquial, eventos oficiais e culturais que muito contri-buram para transform-la em importante referencial da cidade. Seu adro e sua imponente escadaria constituram locais propcios para manifestaes da religio-sidade popular, festas do calendrio litrgico e procisses; para a realizao de so-lenidades litrgicas oficiais, como Missas Solenes e Te Deum e, notadamente, para manifestaes polticas diversas: comcios, como o dos anos 1980, em favor das Diretas J, passeatas de reivindicaes e protestos, fazendo desse espao, conside-rado o pulmo espiritual da cidade, como muitos o denominam, um dos palcos privilegiados para o exerccio da cidadania do povo de Belo Horizonte.

  • 16 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Catolicismo Igreja do Sagrado Corao de Jesus

    Siracos Catlicos

    Construda por iniciativa de Anna de Aquino Sales, esposa do presidente do Estado, Francisco Sales, a Igreja do Sagrado Corao de Jesus foi a segunda a ser edificada em Belo Horizonte. Construda em terreno cedido por seu pro-prietrio, Aaro Reis, chefe da Comisso Construtora da Nova Capital, teve sua pedra fundamental lanada em 27 de janeiro de 1900, iniciando-se os trabalhos para sua construo em 1903. Confiadas as obras aos padres redentoristas, tam-bm responsveis pela construo da Igreja de So Jos, foi concebida segundo projeto do arquiteto Edgard Nascentes Coelho, estendendo-se sua edificao at 1920. Em 1925, iniciou-se nela o Rito Siraco Catlico, com a nomeao de seu primeiro padre, vindo da Sria, George Elian. Conserva caractersticas dos tem-pos apostlicos e de costumes prprios das comunidades crists da Sria, tendo como idioma oficial o rabe, embora as oraes sejam realizadas em aramaico.

    A origem do rito que ali se celebra remonta aos primeiros tempos do Cristia-nismo, quando, aps a descida do Esprito Santo sobre os apstolos, eles deram incio a seu ministrio. Os catlicos do Rito Siraco uniram-se a Roma a partir do sculo XVII, conservando, no entanto, a prpria lngua, o rito e a legislao eclesistica, obedientes autoridade do patriarca.

    Implantada em praa de formato triangular, alteada em relao ao plano das ruas contguas, a Igreja do Sagrado Corao de Jesus tem planta em cruz latina e torre central nica. Internamente, recebeu tratamento ornamental simples, mas de apurado gosto, destacando-se as pinturas do forro da nave e da capela-mor, este ltimo executado pelo artista italiano Francisco Tamietti.

  • 17Do Vale Montanha

    Catolicismo Nicho-oratrio de Nossa

    Senhora da Boa Viagem, Estao Rodoviria

    A devoo de Nossa Senhora da Boa Viagem surgiu entre os portugueses, invocada como protetora daqueles que, em busca da fortuna, se arriscaram pelos oceanos. Trazida para o Brasil, juntamente com outros oragos do gosto portu-gus, firmou-se na terra de Minas, no pequeno Arraial do Curral del Rei, tornan-do-se, para sempre, sua padroeira, entronizada na catedral da cidade, a de Nossa Senhora da Boa Viagem.

    No final dos anos 1970, por iniciativa da Legio do Tero, foi-lhe conferido pequeno oratrio na Estao Rodoviria de Belo Horizonte, de onde lana seu olhar amoroso aos viajantes. A imagem que ali a representa foi mandada confec-cionar em cedro, executada pelo artista mineiro Walcides Arvelo, da cidade de Rezende Costa. Seu nicho, projetado por Pedro Miranda, foi doado pelo ento Secretrio de Obras, Carlos Eli. Partindo do saguo da Prefeitura de Belo Ho-rizonte, a imagem foi levada para seu nicho na Estao Rodoviria, em veculo do Corpo de Bombeiros, e ali abenoada e entronizada. Dali preside aqueles que chegam, introduzindo-os na grande cidade.

  • 18 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Catolicismo Praa do Papa

    Inaugurada com o nome de Praa Governador Israel Pinheiro, tornou-se co-nhecida, a partir de 1980, como Praa do Papa, quando foi palco de uma grande missa campal celebrada pelo Papa Joo Paulo II, que mobilizou multido de fiis catlicos, em importante festa.

    Inicialmente, dois outros locais foram cogitados para essa missa campal: o Aeroporto Carlos Prates e a Praa Raul Soares, que fora palco do II Congresso Eucarstico Nacional, em 1936. Ambos, porm, mostravam-se inadequados para o volume de pessoas que para l seria atrado. A deciso recaiu, finalmente, sobre a Praa Israel Pinheiro, escolhida em razo da bela vista da cidade de Belo Hori-zonte: situada a cerca de 1.100m, no sop da Serra do Curral, propiciava que Sua Santidade dali abenoasse toda a cidade, alm de dispor de boa estrutura urbana para a realizao do evento.

    Assim, a missa campal ocorreu, tal como havia sido previsto, no dia 1 de julho de 1980, com grande participao popular, reunindo fiis e sacerdotes de toda a Regio Metropolitana de Belo Horizonte e de diversos outros locais do Estado de Minas Gerais e do pas.

    Desde ento, a praa tornou-se ponto de referncia da prtica religiosa na cidade, abrigando uma diversidade de celebraes.

  • 19Do Vale Montanha

    As primeiras sesses espritas realizadas em Belo Horizonte ocorreram em 1902, na residncia do Dr. Teixeira de Magalhes, Avenida Caranda. Em 1 de outubro de 1904, a partir da iniciativa de Joaquim Menezes, o grupo ento reunido decidiu formar uma associao esprita na capital, com o ttulo de Unio Esprita de Belo Horizonte, englobada, em 1908, pela recm-criada Federao Esprita Mineira. No mesmo ano, a nova entidade mudou seu nome para Unio Esprita Mineira (UEM), com o objetivo de congregar as diversas associaes espritas existentes no Estado de Minas Gerais.

    O Cenculo Esprita Thiago Maior, localizado na Praa Milton Campos, n 127, foi inaugurado no dia 1 de novembro de 1938, em cerimnia que contou com a presena do mdium Chico Xavier, realizando comunicaes psicogra-fadas. O nome adotado cenculo provm do lugar onde Cristo realizou a ltima ceia com seus discpulos.

    A doutrina esprita constitui-se de um conjunto de princpios e leis revela-dos pelos Espritos Superiores por meio de diversos procedimentos particular-mente, a intermediao de algumas pessoas denominadas mdiuns que visam estabelecer uma comunicao entre os espritos e os homens. Como as demais doutrinas crists, o Espiritismo prega o amor ao prximo, a caridade e o respeito, acreditando em um nico Deus, entendido como a inteligncia suprema, causa primeira de todas as coisas.

    O impulso inicial para o surgimento da doutrina ocorreu no sculo XIX, posteriormente sistematizado e codificado por Hippolyte Lon Denizard Rivail, que assumiu o nome de Allan Kardec. Ele deixou cinco obras que constituem a base da doutrina esprita: O Livro dos Espritos, O Livro dos Mdiuns, O Evange-lho Segundo o Espiritismo, O Cu e o Inferno e A Gnese.

    O Espiritismo em Belo Horizonte

  • 20 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    A vinda dos primeiros muulmanos para Belo Horizonte obrigou muitos deles a abandonarem seus costumes, seu idioma, sua alimentao e at mes-mo sua religio. Contudo, a mensagem que Allah (SWT) conferiu ao profeta Mohammad (SAAS) no foi esquecida por esses imigrantes, sendo retomada, quando foi possvel, por um grupo dos que aqui viviam. A motivao para essa revivescncia surgiu na dcada de 1960, com a chegada de Cid Slaibe, que aqui encontrou diversas famlias que mantinham sua f, porm sem proclam-la: Ab-dallah, Mansour Ba, Alayli, Abbas e Kaddoura.

    Formou-se, ento, a Sociedade Beneficente Muulmana de Minas Gerais, responsvel por congregar aquelas famlias que professavam sua f isoladamente. No incio, as reunies ocorriam na residncia de Slaibe, no bairro Santo Agosti-nho; com o crescimento do nmero de professos, transferiu-se para um conjunto de salas na Rua So Paulo. Finalmente, em 27 de agosto de 1989, foi lanada a pedra fundamental do Centro Islmico de Belo Horizonte, no bairro Mangabei-ras.

    O Islam uma religio universal, cuja mensagem se dirige a todos, envolven-do no apenas os povos rabes. No constitui uma seita de seguidores de Mao-m, mas sim uma religio fundada na revelao que o prprio Deus (ou Allah) deu ao profeta Mohammad, contida no Coro, que a base da doutrina islmica. O islamismo se apia em cinco pilares: f, orao, caridade, jejum e peregrinao a Meca, centro onde foi instituda a f islmica.

    O muulmano profundamente reverente em relao sua religiosidade, as-sim se expressando em relao a Deus Allah (SWT) e ao profeta Mohammad (SAAS). Essas formas de tratamento significam: SWT Subhana wa ta (Lou-vado seja), usada apenas quando se referem a Deus; e SAAS ou SAWS Salla Allahu alaihi wa salam (Que a paz e a bno de Allah estejam sobre ele), sempre que se referem aos profetas Abrao, Jesus e Mohammad.

    O Islam comemora apenas duas datas festivas: a Festa da Bno, que marca o final do jejum no ms do Ramad, e a Festa do Sacrifcio, que marca o perodo da peregrinao.

    O Islam em Belo Horizonte

  • 21Do Vale Montanha

    Enquanto religio, o Judasmo desenvolveu-se a partir do sinal recebido por Abrao para que abandonasse o politesmo. Seguindo o chamado divino, seus descendentes migraram para Cana, a Terra Prometida do DUs para o povo que escolhesse seguir suas leis. A Terra de Israel nome pelo qual passou a ser co-nhecido Jac, neto de Abrao foi dividida em doze tribos, lideradas por seus doze filhos.

    A Moiss coube a tarefa de receber e repassar a seu povo as Leis Divinas e reconduzi-lo Terra Prometida, aps longo cativeiro no Egito. Os cinco livros recebidos por Moiss no Monte Sinai Gnesis, xodo, Levtico, Nmeros e Deu-teronmio formam a Tor ou Pentateuco, que constitui a base da vida judaica, tanto do ponto de vista religioso como do profano.

    A histria do Judasmo profundamente marcada pela disperso, seja ela re-presentada por migraes voluntrias, exlios, xodos ou disporas. Os judeus continuam espalhados pelo mundo, imersos em um duplo processo de assimi-lao da cultura local em que se inserem e de reafirmao de sua prpria cultura, atravs da formao de laos comunitrios entre os imigrantes e da recriao de suas instituies bsicas, como sinagogas e escolas.

    A presena judaica em Belo Horizonte assinalada a partir de 1894, com a inaugurao da loja de materiais de construo de Arthur Haas. Com o passar do tempo, houve sensvel crescimento do nmero de imigrantes. Em 1 de agos-to de 1922, a partir de uma necessidade religiosa, foi fundada a Unio Israelita de Belo Horizonte (UIBH), com o objetivo de manter uma sinagoga, uma biblioteca em idiche e hebraico e promover a socializao entre a comunidade judaica.

    A primeira sede prpria da Unio Israelita, fundada em 1928, localizava-se na Avenida Afonso Pena, ao lado do Conservatrio de Msica. Logo a seguir, foram criadas a Escola Israelita Brasileira, em 1929, e o Cemitrio Israelita de Belo Horizonte, em 1937. Em dezembro de 1960, foi inaugurado o novo prdio da Unio Israelita de Belo Horizonte, localizado na Rua Pernambuco, n 326, que abrigou, at 2007, a Escola Israelita, rebatizada como Albert Einstein. Atualmen-te, l funciona o Instituto Histrico Israelita Mineiro (IHIM), criado em 1984.

    O Judasmo em Belo Horizonte

  • 22 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Com o objetivo de registrar, preservar e difundir a memria e os traos culturais de imigrantes e de seus descendentes, o Instituto mantm rico acervo, composto de documentos, objetos, livros impressos, manuscritos, depoimentos orais, LPs com canes e partituras em idiche, em sua maioria doaes da prpria comu-nidade.

  • 23Do Vale Montanha

    Vindos de Juiz de Fora, os pregadores metodistas chegaram ao Arraial do Curral del Rei ainda em 1892. Com o projeto de construo da nova capital de Minas, solicitaram ao ento prefeito Bernardo Monteiro, em 1895, concesso de terreno na rea central para a edificao de igreja e colgio. Para esse fim, foi-lhes concedido o quarteiro formado pela Avenida Afonso Pena e ruas Esprito Santo, Tamoios e Bahia.

    Em 31 de dezembro de 1904, foi lanada a pedra fundamental da igreja, cuja inaugurao se deu no ano seguinte. A seu lado, ainda em 1904, teve incio a construo do Colgio Izabella Hendrix, assim cumprindo a misso por eles as-sumida: Ir e pregar, ir e ensinar.

    Com o crescimento da comunidade de fiis e da demanda por matrculas no colgio, foi necessrio pensar a construo de novos templos e a transferncia do colgio para local mais apropriado, capaz de acolher maior nmero de alu-nos. Dessa forma, foi construdo novo templo Rua Tupis, entre Avenida Afonso Pena e Rua Esprito Santo, transferindo-se o colgio para a Rua da Bahia, entre Esprito Santo e Avenida Bias Fortes, ao lado da Praa da Liberdade.

    Herdeiro da Reforma Protestante empreendida por Martinho Lutero, o Me-todismo surgiu na Inglaterra, em 1738, no seio da Igreja Anglicana, fundamen-tado por John Wesley. Sua pregao dirigiu-se, originalmente, para a populao operria da Inglaterra, sobretudo os mineiros, profundamente sacrificados pelas condies de trabalho enfrentadas e pouco assistidos pela Igreja Anglicana.

    Adotou como mtodo a pregao ao ar livre, prximo s residncias e aos locais de trabalho dos operrios, por entender sua dificuldade e at mesmo resistncia em ir s igrejas. Imbudo de grande conscincia social, atuou no s no campo estritamente religioso, mas em defesa de direitos e contra sistemas de opresso, como a escravido, conduzindo sua misso nesse sentido social.

    A Igreja Metodista em Belo Horizonte

  • 24 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Os primeiros missionrios presbiterianos vieram ao Brasil provenientes dos Estados Unidos, em 1859, iniciando-se, pouco depois, o trabalho missionrio em Minas Gerais, com a criao, em Borda da Mata, da primeira Igreja Presbi-teriana.

    Em Belo Horizonte, o trabalho teve incio em 1912, com a vinda do Reve-rendo Amrico Cardoso de Menezes, que instalou a primeira Congregao Pres-biteriana da capital, sob a responsabilidade do Sr. Francisco Deslandes e de sua esposa, primeiro casal presbiteriano residente na cidade.

    At 1922, a Congregao no possua um templo prprio, reunindo-se em um salo alugado na Rua So Paulo, esquina com Avenida Amazonas, no centro da cidade. A partir da doao de terreno pela Prefeitura Municipal (lotes 1 e 2, localizados no quarteiro 2 da 6a seo urbana, hoje Praa Benjamin Guima-res), teve incio a construo do templo. A pedra fundamental do edifcio, cujo projeto fora concebido pelo arquiteto italiano Antnio Januzzi, foi lanada em 24 de dezembro de 1919, porm as obras se iniciaram apenas em 1921, tendo sido contratados os servios do tambm italiano Primo Caroli. Em 1961, encontran-do-se o edifcio em condies precrias, decidiu-se por sua demolio e constru-o de outro, inaugurado em 1963.

    A construo desses templos atesta os esforos dos missionrios para a di-vulgao da doutrina em Belo Horizonte e sua consolidao, com a implantao de diversos outros pontos de pregao, mais tarde novas igrejas, organizadas e atuantes.

    Influenciado pelo movimento luterano, Ulrich Zwinglio props-se a apro-fundar, na Sua, as reformas introduzidas na Alemanha por Martinho Lutero. Teve Calvino (John Calvin) como continuador de seu trabalho, cujos princpios teolgicos se disseminaram na Frana, Alemanha, Holanda e Inglaterra, de onde partiram para a Amrica. A estrutura administrativa fundada por Calvino in-troduzia um princpio democrtico na escolha do governo da Igreja, segundo o qual os presbteros seriam escolhidos pela prpria congregao, contrariando o processo centralizador adotado, particularmente, pelo anglicanismo.

    A Igreja Presbiteriana em Belo Horizonte

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Natrcia Pons

  • foto: Victor Louvisi

    foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

  • 34 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • Vozes do Silncio

    Memria cultural a materializao do intangvel

    na cultura religiosa de Belo Horizonte

  • 36 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • 37Vozes do Silncio

    A forma como o territrio ocupado revela o carter da sociedade que ele abriga. A cidade planejada de Belo Horizonte, fruto de um pensamento racional, assentado na ideia de organizao lgica do espao, previa, em sua concepo original, basicamente trs grandes reas ou zonas territoriais, que foram deno-minadas respectivamente: zona urbana, zona suburbana e rea de stios e chca-ras. A primeira abrigava bairros residenciais, destinados principalmente queles que vieram para o trabalho administrativo no governo do Estado e demais re-parties pblicas, os equipamentos de poder palcio do governo, secretarias etc. Dispunha de uma organizao que contemplava diversas praas e jardins, alm de equipamentos culturais e de lazer, circunscritos por um cordo urbano, uma grande avenida a Avenida do Contorno, que segmentava, fsica e simbo-licamente, a rea central, definindo hierarquicamente o espao. A ela se seguia a rea suburbana, ocupada por trabalhadores, grupos de imigrantes, principal-mente estrangeiros que vieram trabalhar nas obras da nova capital, e antigos mo-radores do Arraial, destitudos de seus lugares. Finalmente, nas fronteiras, alm do urbano e do suburbano, a rea rural, constituda de chcaras que visavam o abastecimento da capital.

    A fisionomia desses lugares se diferia com muita clareza. Enquanto na rea urbana o loteamento era padronizado, obedecendo a uma disposio retilnea, monumentalizada pelas grandes artrias e valorizada por praas localizadas em suas confluncias, a ocupao da rea suburbana respondeu a aes mais espon-tneas, gerando um traado irregular, com ruas estreitas e lotes profundos, com quintais generosos.

    A esse zoneamento correspondeu, como no poderia deixar de ser, uma ocu-pao cultural tambm diversa, expresso dos modos de vida regulares e se-gregados, condio que, ampliada sobremaneira, subsiste ainda hoje, lanando para as margens do territrio prticas culturais que provm de estratos sociais marginalizados, fato observvel tambm no aspecto cultural-religioso.

    A cidade e sua ocupao

  • 38 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    As coisas sagradas so aquelas que as proibies protegem e separam; as coisas profanas so aquelas das quais as proibies devem manter distncia as sagradas.

    A ambivalncia entre sagrado e profano a essncia do fato religioso.

    Durkheim

    O sagrado uma noo que permite a uma sociedade humana crer na sepa-rao ou na oposio axiolgica entre os diferentes elementos que a compem, definem ou representam seu mundo: objetos, atos, lugares, partes dos corpos, valores etc. Designa, assim, aquilo que est alm das coisas ordinrias e banais, opondo-se, essencialmente, ao profano e ao utilitrio.

    O sagrado origina-se sempre de tradies tnicas, mitolgicas, religiosas, ou mesmo ideolgicas, designando o que inacessvel, indisponvel, alm do normal, objeto de devoo ou de temor.

    Resposta a um conjunto de experincias prprias a todas as culturas, arcai-cas ou no, o sagrado um aspecto constitutivo da condio humana, isto , uma categoria universal de toda conscincia humana diante de sua finitude e de sua condio mortal. Pode ser interpretado, assim, como aquilo que, dentro das culturas humanas, compe sua experincia do numinoso palavra de origem latina que expressa a experincia do divino, quer no sentido pessoal, quer no sentido geral, ou seja, a experincia no racional do mistrio, cujo objeto principal se acha alm do visvel. O numinoso , portanto, aquilo que toma o indivduo, auxiliando-o a construir o sentimento de ser, traduzindo sua experincia emocional. Apresenta-se, dessa forma, como essncia, como identidade, aspecto ontolgico que traduz seu profundo enraizamento dentro de todas as culturas.

    Os elementos do sagrado so, geralmente, considerados intocveis: sua manipulao, mesmo abstrata, deve obedecer a certos ritos bem definidos. Desrespeit-los, agir contra eles, , geralmente, considerado como pecado ou crime, real ou simbolicamente. De sorte que, ao manifestar o sagrado, um ob-jeto qualquer se torna outra coisa, sem deixar de ser ele mesmo porque ele continua a participar de um lugar no cosmos circundante. No entanto, por ser

    O Sagrado: sentimento e revelao

  • 39Vozes do Silncio

    o que se revela sagrado, tem sua realidade imediata transformada em realidade sobrenatural.

    No existem mais do que duas atitudes em face do sagrado: o respeito ao proibido ou sua transgresso.

  • 40 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Os Maxakali denominam-se tikmn, que significa pessoa humana. Aps a morte, a alma dos humanos se transforma em ymy, esprito cantor que mora no alm, mas que volta aldeia dos vivos para cantar e danar para os humanos. Esses espritos esto relacionados tanto s almas dos prprios mortos quanto natureza, aos animais, em especial aos pssaros.

    Todo o conhecimento pertence aos espritos, que o trazem aos humanos. Consideram que, antigamente, em um tempo mtico, homens e espritos viviam juntos na Terra. Mas, aps a partida dos espritos para o alm, se fez necessria a realizao dos rituais para renovar essa comunicao. Assim, so condicionados por ciclos rituais que configuram os acontecimentos do grupo: conflitos, doen-as, plantio, somente realizados pelos homens.

    Os ymy esto intimamente relacionados prpria constituio da pessoa Maxakali: ao longo de suas vidas, precisam possuir cantos e ymy para se for-mar como pessoa, para tornarem-se tikmn. Assim, os ancios do a seus fi-lhos seus cantos e ymy, porque no precisam mais deles, j se transformaram em pessoas completas. Os jovens, ao contrrio, necessitam de, no mnimo, um par de ymy que cante no kuxex Casa dos Cantos para que possam se ca-sar, sendo respeitados como membros adultos dentro da aldeia.

    Os cantos, transmitidos de pais para filhos, fazem parte do repertrio que no se perde. A posse de um canto e de um ymy correspondente s pode ser efetivada atravs do conhecimento, que parte de um longo aprendizado ini-ciado na infncia e que se prolonga por toda a vida. Mais tarde, os rapazes, caso tenham inclinao para a vida cerimonial, recebero formao especial para se tornare xams, donos de um grande conhecimento.

    Todos os homens so xams, ou seja, todos possuem a capacidade de chamar os ymy e de controlar seu trnsito. Assim, caso recebam a preparao, tornam-se especialistas na realizao dos rituais e no conhecimento dos espritos.

    Xamanismo Ymy: o canto

    e a pessoa Maxakali

  • 41Vozes do Silncio

    Ymy: o esprito, o canto, a pessoa

    Os ymy, nome genrico dado aos espritos, esto relacionados aos elemen-tos da natureza o sol, a lua, as estrelas, a cachoeira e s espcies vegetais e ani-mais, particularmente os pssaros. Portanto, os ymy so vrios. Multiplicam-se em inmeras espcies, cada qual possuindo uma paramentao e uma pintura corporal especfica. Os ymy tambm so cantos. Cada esprito corresponde a um canto especfico. Os espritos moram no alm, mas voltam ao mundo dos vivos para danar e cantar para os humanos, compartilhando com eles todo o conhecimento cultural, conhecimento este que pertence ao mundo dos espritos. Para os Maxakali, a alma humana a palavra. Ela eterna e seu destino tornar-se canto. Assim, tambm, a pessoa humana precisa possuir ymy para tornar-se completa.

    Ao longo da vida, um Maxakali receber vrios ymy para realizar o seu pro-cesso de amadurecimento como ser humano. Os ymy so transmitidos atravs das geraes. So a herana que os pais do a seus filhos e o dote que as moas devem levar para seu casamento. No entanto, apenas os homens possuem o co-nhecimento e a capacidade para realizar os ciclos rituais. Somente os homens podem controlar a viagem dos espritos entre este mundo e o alm. Todavia, os rituais so realizados para as mulheres. Nestes, elas ocupam o lugar dos vivos, enquanto os homens ficam no Kuxex Casa dos Cantos e cantam e danam no ptio central da aldeia. Durante a realizao dos rituais, h uma grande distri-buio de alimentos entre os humanos e os espritos.

    So vrios os ciclos rituais que se alternam durante todo o ano. Cada ciclo tem de um a trs meses de durao. Relacionam-se s diversas dimenses da vida Maxakali a caa, o plantio, as guerras, a doena, a sociabilidade, a inicia-o das crianas. Sua realizao significa um perodo de paz e alegria. Os Maxa-kali dizem que os ymy, seres cantores, sempre existiram e sempre existiro, por isso os Maxakali nunca se acabaro.

  • 42 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Embora a Irmandade de Nossa Senhora do Rosrio seja a primeira de que se tem registro documental em Minas Gerais, as mais numerosas eram as do Santssimo Sacramento, favorecidas pela legislao cannica, que incentivava sua fundao, propagando o culto do Santssimo Sacramento e as procisses do Corpo de Deus Corpus Christi. Isso significa que, enquanto os grupos ligados devoo do Santssimo Sacramento reservavam o altar-mor para o seu culto, os outros segmentos, tambm chamados a participar do esforo coletivo para a construo dos templos, homenageavam seus protetores nos altares laterais.

    O mais antigo compromisso de Irmandade do Santssimo Sacramento identi-ficado em Minas de Mariana, datado de 1713. No Curral del Rei, compromisso semelhante datado de 1837. No entanto, a elaborao de um compromisso no corresponde, necessariamente, ao ato fundador de uma Irmandade, no indican-do, via de regra, a data de sua fundao.

    A devoo ao Santssimo Sacramento foi incentivada por Santa Juliana e ins-tituda pelo Papa Urbano IV, por intermdio da Bula Transiturus, de 8 de setem-bro de 1264. O Papa encarregou um ofcio, designando So Boaventura e So Toms de Aquino para comporem o hino oficial dedicado ao Santssimo Sacra-mento, resultando no Tantum Ergo Sacramentum, entoado at os dias atuais. A festa, proclamada desde o sculo XIII, era acompanhada de procisso, que se tornou obrigatria a partir de 1317, mediante decreto do Papa Joo XXII, na qual a Eucaristia deveria ser transportada pelas vias pblicas. A procisso lembra a caminhada do povo de Deus, peregrino em busca da Terra Prometida. Assim como na travessia para a Terra Santa o povo foi alimentado com o man no de-serto, hoje ele alimentado com o prprio Corpo de Cristo.

    Essa forma de celebrao tornou-se tradio, chegando ao Brasil pela in-fluncia portuguesa e pelos costumes por eles trazidos, que consistiam, entre outras prticas, em enfeitar as ruas com tapetes coloridos com smbolos cristos.

    O Santssimo Sacramento: irmandade e rito

  • 43Vozes do Silncio

    A adorao do Santssimo Sacramento em Belo Horizonte

    Em 1936, Dom Antnio dos Santos Cabral, primeiro Arcebispo Metropoli-tano de Belo Horizonte, realizou na capital mineira o II Congresso Eucarstico Nacional, para o qual foi inaugurada, em setembro de 1936, a Praa Raul Soares. Para a procisso do Triunfo Eucarstico, foi mandado confeccionar monumental tabernculo em prata dourada, para abrigar o ostensrio com o Santssimo Sa-cramento.

    No ano seguinte, em 31 de outubro de 1937, Festa de Cristo Rei, foi instalada na Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem, solenemente, a Obra da Adorao Perptua do Povo Mineiro ao Santssimo Sacramento. O Santssimo ficou expos-to adorao dos fiis na Capela de Nossa Senhora do Rosrio, sendo conduzido em carruagem (a mesma utilizada no II Congresso Eucarstico no ano anterior) pelo Arcebispo Dom Antnio Cabral, seguido do cortejo eucarstico at a Cate-dral de Nossa Senhora da Boa Viagem, onde foi entronizado no altar-mor.

    O Laus Perennis (Adorao Perptua) no surgiu, todavia, em Minas Ge-rais apenas nessa ocasio. No Convento de Macabas, j havia essa adorao desde 1750, realizada pelas freiras da Imaculada Conceio. Com a criao do Bispado de Belo Horizonte, Dom Cabral declarou o Laus Perennis de toda a Dio-cese, sendo um dia em cada parquia. Pretendia, no entanto, que a Adorao Eucarstica se fizesse contnua pelo prprio povo, conforme idealizado por So Pedro Julio Eymard, objetivo alcanado em 1937, confiando-a Congregao dos Sacramentinos.

    Dessa forma, a Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem, transformada em Santurio da Adorao Perptua, pde tornar-se lugar simblico de reatualiza-o permanente da f, significando, alm dos princpios religiosos, a adorao de uma atitude vigilante na sua salvaguarda.

  • 44 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Candombl o termo adotado no Brasil para designar as cerimnias religio-sas de origem africana, constitudas a partir de diversas razes, vinculando-se, em geral, s suas origens geogrficas ou tribais no territrio africano.

    Os negros trazidos da frica para as Amricas pertenciam a diferentes na-es: Nag, Angola, Dahom, Axant, Auss, Congo, Moambique, com sua ln-gua e tradies, suas divindades. No Brasil, enraizou-se mais o acervo espiritual Yorubas, ou Nags.

    O culto das divindades Nags, os Orixs, se faz em templos chamados Ter-reiros, geralmente situados nos arredores das cidades. O Terreiro compreende o Pegi, onde se encontram os altares das divindades, e o Barraco, grande sala onde tm lugar as cerimnias pblicas. Ademais, h quartos e pequenas casas para hospedar a gente da seita, durante a poca das obrigaes anuais, e a Cama-rinha, lugar onde se recolhem as Ias durante a iniciao. H, tambm, Pegis na parte exterior, sob rvores sagradas ou em pequenas casas.

    A responsabilidade espiritual do culto recai sobre o Babalorix e a Yalorix ou Pai e Me de Santo, assistidos por Mes ou Pais Pequenos, Filhos e Filhas de Santos, Ekdes, Alabs tocadores de atabaque, Axogns encarregados dos sacrif-cios e dos Ogans, protetores do Terreiro e dos Orixs.

    O nome de um santo catlico aparece, geralmente, como padroeiro dessa so-ciedade. , geralmente, o santo que, por sincretismo, corresponde ao Orix ao qual o terreiro consagrado. Esse estratagema surgiu porque no existia a liber-dade de cultos e isso permitiu aos negros louvar e cultuar seus orixs, dizendo que, a seu modo, estavam cultuando Nosso Senhor do Bonfim, Nossa Senhora da Conceio, So Jorge e outros membros da corte celestial. Nas novas geraes, essa distino no to rigorosa e as devoes se dirigem, indistintamente, ao santo catlico e ao orix.

    Os cultos afro: os Orixs

  • 45Vozes do Silncio

    O que so os Orixs

    Para os Yorubas, a maioria dos Orixs era, em sua origem, seres humanos privilegiados, que possuam poderes sobre as foras da natureza e que, em vez de morrer, se transformavam em pedras, rios, rvores ou lagoas. O Orix, portanto, tem descendentes diretos, que continuam o culto a seus antecessores diviniza-dos, servindo de intermedirios entre eles e as foras da natureza que controla-vam.

    Trata-se de animismo, pois so as aventuras, as paixes, as guerras e os feitos desses antepassados longnquos que se comemoram e celebram, sendo as ceri-mnias feitas em seu louvor um meio para obter sua interferncia perante as foras superiores. Os Yorubas acreditam em um ser supremo, Olorium, porm este est to alto, to longe das atribulaes dos mortais, que s possvel chegar at ele mediante a interveno benvola dos Orixs.

    Os Orixs so imateriais, so foras que s podem se manifestar e expressar atravs de certos seres de sua escolha. Esses seres so os Las, ou Filhos de Santo. E, uma vez escolhidos pela divindade, devem nascer para uma nova vida, sub-metendo-se a um perodo de recluso e de iniciao. Eles passam dezessete dias na Camarinha, em estado de transe, ao fim dos quais, com os cabelos raspados, aparecem em pblico para revelar o nome de seu Orix. So, desde esse dia, fi-lhos espirituais do Babalorix ou da Yalorix e esposos msticos do Orix. Par-ticipam regularmente das cerimnias e, por um ano, devem morar no terreiro para aperfeioar sua nova educao.

  • 46 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Em todo o Estado de Minas Gerais, existe forte expresso dos Congados, tambm denominados Reinados e Irmandades de Nossa Senhora do Rosrio (s vezes, Nossa Senhora do Rosrio dos Homens Pretos). Seus santos de devoo so, em geral, santos negros, como So Benedito e Santa Efignia, ou santos po-pulares, como Santo Antnio, Santana, So Jorge, Nossa Senhora das Mercs.

    A devoo negra a Nossa Senhora do Rosrio uma manifestao do cato-licismo popular qual se mesclam, de maneira e em graus diversos, contedos herdados de expresses da religiosidade africana, vinculadas principalmente cultura do grupo Banto, revelando uma longa histria de reelaboraes culturais decorrentes dos contatos e confrontos entre europeus e africanos, iniciada no sculo XV, na frica.

    Os pretos do Rosrio louvam as divindades catlicas, ao mesmo tempo em que prestam honras e obrigaes a seus ancestrais, revestidas de profunda dor e respei-to. Os atos rituais se estruturam a partir de uma fundamentao mtica: a apario de uma imagem de Nossa Senhora no mar e seu resgate por negros escravos. O mito reala a importncia da ancestralidade na vivncia do catolicismo congadeiro.

    Diversos rituais integram o Reinado:

    A Corte Real, em que se destacam os Reis Congos, autoridades detentoras do poder maior na hierarquia, representando Nossa Senhora do Rosrio e a memria africana. So protegidos e homenageados pelas Guardas.

    O ritual do Candombe, em que so reverenciados os tambores e os ante-passados.

    A Guarda de Moambique que conduz reis e rainhas nos cortejos. Suas cores so o azul e o branco. A Guarda de Congo que segue frente nos cortejos e tem como funo abrir e limpar os caminhos para que o Mo-ambique e o reino coroado possam passar serve como escudo e prote-o. Suas cores so o rosa e o branco.

    Desde o perodo colonial, cerimnias de coroao de reis e rainhas eram co-muns entre os negros escravos. Em 1674, h registro de cerimnia de coroao

    O Congado

  • 47Vozes do Silncio

    de Reis Congos na Igreja de Nossa Senhora do Rosrio, no Recife. Em Minas, festividades dos negros devotos de Nossa Senhora do Rosrio e de So Benedito ocorrem desde o incio do sculo XVIII. Irmandades de Nossa Senhora do Ros-rio j existiam por volta de 1704, no Arraial do Serro Frio (atual Serro) e em Vila Rica (atual Ouro Preto).

    As cerimnias do Reinado de Nossa Senhora acontecem em outubro e duram trs dias. Porm, os ritos de abertura ocorrem desde muito antes, com as prepa-raes pessoais e a organizao geral do espao para acolher o ritual. A msica o meio expressivo pelo qual se celebram todas as etapas rituais do Reinado de Nossa Senhora, estabelecendo o fluxo de energias espirituais entre o plano dos vivos e o dos santos e antepassados.

    A abertura da festa feita com o Candombe (os tambores sagrados) e com o levantamento dos mastros pelas Guardas de Moambique e Congo, levando para o alto as bandeiras com as estampas dos santos de devoo. Como parte desse ciclo festivo, ocorrem as celebraes na capela a Missa Conga e a de en-cerramento , o almoo de confraternizao, a procisso dos andores dos santos homenageados, a descoroao dos reis festeiros. Fechando o rosrio da festa, as Guardas descem os mastros.

    A simbologia do Rosrio

    O louvor ao rosrio conduzido pela ingoma (tambor africano). O rosrio auxilia na ordenao das oraes e estabelece um elo nas interaes dos fiis com Nossa Senhora. Os tambores tambm so pontos de contato entre os dois mun-dos, so instrumentos sagrados que s podem ser utilizados nos dias de festa a Nossa Senhora. Assim, o rosrio e a ingoma constituem os dois principais meios para a comunicao individual e coletiva com Nossa Senhora, outros santos de devoo e os antepassados.

    A forma fechada do rosrio indica as fronteiras que delimitam o interno e o externo. Por essa correspondncia, nas vrias dimenses de espao e de tempo, o que foi aberto tem que ser fechado, para garantir a unio, a fora, a firmeza e, consequentemente, a proteo, uma vez que as brechas podem permitir a entra-da de algo que comprometa a integridade dos grupos ou do ritual.

    No mbito musical, os cnticos tm que ser firmados para garantir a prote-o. Isso significa que os cantos que cumprem funes mais solenes e espiritual-mente profundas tm que ser cantados no mnimo trs vezes, completando-se os trs conjuntos de mistrios do rosrio tradicional.

  • 48 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Pscoa palavra que tem sua origem no hebraico Pessach () e significa passagem. No sentido simblico, comumente empregado, representa a passagem do cativeiro no Egito para a liberdade na Terra Prometida; no sentido primordial pago, assinala a passagem do inverno para a primavera.

    No Pentateuco (composto pelos cinco primeiros livros que compem a Bblia e que constituem a Tor), no Livro do xodo (em hebraico Shemot), captulo 12, est o relato da instituio da Pscoa, quando Deus lanou 10 pragas sobre o Egito, com o propsito de livrar o povo de Israel do cativeiro, que j durava 450 anos, ins-truindo-os sobre como poderiam se manter inclumes catastrofe que se abateria e orientando-os para que empreendessem o xodo. Assim se manifesta o Senhor, no versculo 14:

    Conservareis a memria daquele dia, celebrando-o como uma festa em honra de Adonai: fareis isto de gerao em gerao, pois uma instituio perptua.

    A Pscoa judaica: Celebrao da Libertao

  • 49Vozes do Silncio

    O Sacramento do matrimnio

    O matrimnio visto pela Igreja como um dos sacramentos que reafirmam a aliana e o compromisso com Deus. Na Igreja Oriental Catlica (Siraca, Ma-ronita, Melquita), ele composto de uma sequncia ritual que tem incio pela promessa entre os noivos (o noivado), que antecipa o casamento, na qual se d a oferta da aliana. Este ato, realizado perante o sacerdote, acompanhado pela recitao da orao do noivado, na qual se reala Cristo como esposo verdadeiro, enamorado da Igreja Santa. Em alguns casos, realizado o Ofcio (Tesmesto) da Me de Deus, no qual a Virgem apresentada como a esposa perfeita, pura e in-tocada, escolhida por Deus para Me de seu Filho nico.

    A promessa diante da Igreja a celebrao do casamento , segundo mo-mento do ritual de compromisso, concebida como a manifestao pblica do desejo dos noivos cristos, que revelam, por meio de sinais e palavras, que se sujeitam Lei Crist e Constituio Eclesistica. O sacerdote receber em suas mos essa promessa, exortando-os a respeito do compromisso assumido. Segue-se a Bno dos Anis e das Coroas.

    A Bno dos Anis:Este o anel cuja verdade enriqueceu os justos. com o anel no dedo que Jos foi conduzido sobre o carro; por sua fora, Daniel foi exaltado, triunfou e recebeu honrarias diante do rei e seus grandes. Que agora, Senhor, este anel que remetido a nosso filho e a nossa filha seja como o anel mstico com o qual se tornou esposa a Filha das Naes, que recebeu o Corpo e o San-gue, para o perdo das faltas e a remisso dos pecados. Quantos mistrios so ocultos e contidos no esplendor do anel!

    O rito oriental Catlico

    Igreja Catlica de Antioquia

    Siraca e Maronita

  • 50 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    A Bno das Coroas:quele que era, que e que ser at os sculos dos sculos; no Verbo eterno que seus anjos adoram; no grande e muito-alto que, em seu amor imenso, teve piedade de ns todos e, em sua misericrdia, tornou nossa natureza, que se separara dele, digna de se aproximar dele; quele que envia as coroas de alegria aos esposos e s esposas; Glria sua grandeza, agora, a qualquer mo-mento, a qualquer instante, em qualquer tempo, e em todos os dias de nossa vida, at o sculo dos sculos.Estende tua mo direita e abenoa estas coroas gloriosas, que resplandecem na honra e na glria: coroas que ornam a infncia como de uma longa vida or-nada das obras de virtude; coroas plenas de uma beleza incorruptvel, coroas assinadas com o selo da cruz vivificadora, que espalha tuas bnos espirituais nas almas de seus servidores, em cujas cabeas essas coroas so colocadas, de modo que, ornados da Coroa da Vitria, eles estejam, sem cessar, sob teu olhar; d-lhes o favor de coroar tambm os filhos, na alegria e na justia.

    Esses recitativos cerimoniais vinculam-se ao Antigo Testamento, estabele-cendo a aliana do Cristianismo com a tradio que o antecede, na qual a Igreja se insere. A cerimnia de impostao das coroas acompanhada de um recita-tivo cantado que rememora esses fundamentos, invocando a bno de Deus. Nele revelam-se os atos fundadores da Igreja: os Pais e Patriarcas, Jos do Egito, Aaro, David, os justos e os santos, que implicam a continuidade entre o Antigo e o Novo. A coroa do noivo semelhante coroa do filho de Jess; a coroa da noiva semelhante coroa das Virgens.

    A cerimnia de coroao realizada mediante as seguintes oraes:

    A coroao do noivo:Que o Senhor te coroe com a coroa de justia, que te orne como um ornato incorruptvel, que ele te envolva com uma armadura invisvel diante da po-tncia inimiga.

    A coroao da noiva:Que o Senhor te coroe com a coroa da justia, que te orne como um ornato magnfico e incorruptvel; que tu sejas feliz todos os dias da tua vida, renden-do glria ao Pai, ao Filho e ao Esprito Santo, agora, em qualquer tempo e at o sculo dos sculos.

  • 51Vozes do Silncio

    O Adhan o chamamento que anuncia a hora de iniciar as oraes. Ele fei-to de maneira especial e consiste em convidar a comunidade muulmana a fazer parte da orao. A Khutba um culto que antecede a orao e um dos prin-cipais ritos do Islam. Esse rito foi estabelecido no primeiro ano da Hgira (622 DC, representando o ano primeiro no mundo islmico), quando os muulmanos quiseram adotar um meio pelo qual pudessem se agrupar na hora apropriada para determinadas oraes.

    Certa vez, Abdullah, que era um dos companheiros do Profeta Mohammad (SAAS), sonhou com um lindo emaranhado de frases, cujo significado seria um convite para o paraso. Ento, Abdullah contou seu maravilhoso sonho ao Profeta (SAAS), que o descreveu para os muulmanos, tornando-se o chamado, adotado em todos os lugares.

    Durante toda sua vida, o Profeta (SAAS) nunca deixou de atender ao cha-mado, em quaisquer circunstncias. Depois que o Profeta (SAAS) faleceu, seus companheiros continuaram a respeitar o Adhan, porque esse chamamento se tornou uma obrigao, pois foi o Profeta (SAAS) que o ordenou.

    O Adhan uma Sunnah, ou seja, uma tradio do Profeta (SAAS). Ele tem um significado to grandioso, que nos comove. Por isso, ainda hoje, ns nos emocionamos ao ouvir, de todos os continentes, esse lindo chamado para a ora-o.

    A pessoa que entoa o Adhan o Muzin. Ele deve se levantar e ficar em di-reo quibla, ou seja, em direo a Maaka (ou Meca) e recitar o seguinte cha-mado:

    O Adhan ou Azan

  • 52 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

    Allahu akbar, Allahu akbarAllahu akbar, Allahu akbar

    [Deus o maior, Deus o maiorDeus o maior, Deus o maior]

    Achadu anla ilaha illallahAchadu anla ilaha illallah

    [Testemunho que no h outra divindade alm de Deus

    Testemunho que no h outra divindade alm de Deus]

    Achadu anna Muhammadan raulullahAchadu anna Muhammadan ruulullah

    [Testemunho que Muhammad mensageiro de Deus

    Testemunho que Muhammad mensageiro de Deus]

    Haiya alas salatHaiya alas salat

    [Venha para a oraoVenha para a orao]

    Haiya alal falahHaiya alal falah

    [Venha para a vitriaVenha para a vitria]

    Allahu akbarAllahu akbar

    [Deus o maiorDeus o maior]

    La illaha ilallah

    [No h outra divindade alm de Deus]

  • foto: Midian Taiza

    foto: FMC-PBH

  • foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

  • foto: Victor Louvisi

  • 58 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • A Mitra e A Coroa

    Espao e sociedade a formao do Arraial

    do Curral del Rei

  • 60 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • 61A Mitra e A Coroa

    A Mitra e a Coroa: espao e sociedade a formao do Arraial do Curral Del Rei aborda a construo histrica e simblica do territrio das Minas, com foco espacial no Arraial do Curral Del Rey e na Nova Capital Belo Horizonte, desde as primeiras entradas pelos sertes da Bahia at aproximadamente 1950. Nessa construo a Igreja, a Coroa Portuguesa e tambm o Estado Republicano, tiveram um papel importante e complementar, que se revela atravs do enqua-dramento territorial, ainda sensvel; da cultura material produzida desde ento; e da inveno sociocultural das Minas Gerais, cujas prticas e representaes simblicas decorrem dessa interseo de interesses polticos, jurdicos, tradies culturais e prticas ordinrias que se iro constituir.

    A descoberta do ouro e dos metais preciosos teve papel fundamental no processo de povoamento e colonizao desse espao, mas, da mesma forma, im-porta realar o povoamento e o desenvolvimento econmico em diversas reas, assegurados pelas fazendas produtoras de alimentos e de criao de gado, dos quais a Fazenda do Cercado, de Joo Leite da Silva Ortiz, origem do Arraial do Curral Del Rey, exemplo impar.

    A exposio busca demonstrar como essa ntima correlao entre o pblico e o privado, representados pela Coroa Portuguesa, o Estado Republicano e a Igreja asseguraram atravs de variados processos e agentes sociais a construo e a pro-pagao de um modus singular. Nessa abordagem demonstrativa e representativa os vestgios dessas presenas e pertencimentos, presentes no cotidiano da cidade, falam atravs dos relatos materiais e simblicos.

    Apresentao

  • 62 Arte, Arquitetura e Religiosidade em Belo Horizonte

  • 63A Mitra e A Coroa

    A descoberta do ouro na regio de Minas Gerais, a partir da segunda me-tade do sculo XVII, possibilitou Coroa Portuguesa, alm da ocupao do es-pao fsico ainda pouco explorado, a ocupao do espao poltico, assinalando a definitiva imposio do Esta