Artigo Científico: Direitos Fundamentais x Acessibilidade

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UM ESTUDO RELACIONANDO O DIREITO FUNTAMENTAL À IGUALDADE E A PRATICA DA ACESSIBILIDADE

A STUDY LINKING THE FUNDAMENTAL RIGHT OF EQUALITY WITH THE PRACTICE OF ACCESSIBILITY

Georgia Mendes da Agostin1

Karine Souza Alfredo2

RESUMO

Este artigo estuda o direito a igualdade de todos previsto na Constituição Federal Brasileira em relação às pessoas com restrições, sejam estas físicas ou mentais, que muitas vezes as impossibilitam de ter acesso a essa igualdade. Essa impossibilidade afasta-os de uma maior participação na sociedade, seja contribuindo para o desenvolvimento desta como um todo ou simplesmente obtendo o seu lazer, como qualquer outra pessoa tida como “normal”. Aborda, sobretudo, a prática, como por exemplo, lugares que devido ao seu físico não permitem acesso às pessoas com algum tipo de deficiência e a cultura preconceituosa inerente na sociedade, que felizmente mudou um pouco ao decorrer do tempo, mas ainda é real e presente, aliadas a teoria. Palavras-Chave: Direitos Fundamentais. Acessibilidade. Constituição Federal. Inclusão Social.

Abstract

This article studies the right of equality according to the Brazilian Federal Constitution in relation to people with restrictions, whether physical or mental, which often prevent them from having access to that equality. This impossibility thrust it from greater participation into society, either contributing to this development at large or just getting your recreation, like any other person. Mainly, it addresses the practice, such as places that because of their structure don’t allow access to people with a disability, and the inherent prejudiced culture in society, which fortunately has changed slightly over time, but it is still real, all of this allied with the theory. Key Words: Fundamental Rights. Accessibility. Federal Constitution. Social Inclusion. ________________ 1Estagiária no escritório de advocacia Cristine Dagostin. Acadêmica do curso de Direito pela

Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC. 2Estagiária no escritório de advocacia Góes & Nicoladelli. Técnica em Secretariado com Ênfase em

Gestão pela SATC. Acadêmica do curso de Direito pela Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC.

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Introdução

É notável que no Brasil, apesar de ser um Estado Democrático de Direito, cuja

uma das funções é tratar igualitariamente a todos, ainda exista certo preconceito

sobre alguns grupos de pessoas, um destes são os portadores de necessidades

especiais, foco do presente trabalho.

Ao pensar nos portadores de necessidades especiais, é comum o

desencadeamento de um sentimento de compaixão, porém, visto pelo seu lado

negativo, isso pode levar a uma inferiorização dessas pessoas, que muitas vezes se

deixam levar e desacreditam em poder participar da vida ativa da comunidade e

realizar suas tarefas diárias, bem como obter o seu lazer.

Mas além do preconceito, a falta de infraestrutura em países

subdesenvolvidos como o Brasil também é um fator relevante nessa exclusão. A

acessibilidade é regulamentada pela Lei nº 10.098, de 19 de Dezembro de 2000, que

dispõe dos meios que facilitam a inclusão de pessoas portadoras de alguma

deficiência, porém será que isso realmente acontece na prática? Este artigo visa

discutir e responder essas questões.

A igualdade perante a lei está prevista no artigo 5º da Constituição Federal de

1988, quando cita que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza (...)”, este artigo, além disso, proclama todos os direitos fundamentais da

pessoa humana, que foi objeto de estudo pelos acadêmicos durante a disciplina de

Direito Constitucional I, portanto, a escolha do presente tema.

1. O papel dos direitos fundamentais na constituição brasileira

Muito se fala a respeito dos direitos humanos, reconhecidos pelo Brasil como

direitos fundamentais e se constituem em garantias tidas como essenciais a

dignidade e vivência da pessoa humana que estão presentes no Art. 5º da

CRFB/1988, mas pouco se preocupa, a saber, sua real função e defender sua

aplicação na prática, principalmente pelas pessoas leigas ou que seguem outra área

a não ser o direito.

Segundo Marcos Sampaio (2011, pag. 01),

Indiscutivelmente a ordem jurídica neoconstitucionalista confere aos direitos fundamentais uma posição privilegiada em razão do seu forte significado

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político e da sua funcionalidade social que conforma a convivência política e social mantendo em constante tensão dialética o direito e o poder.

Segundo Canotilho (2000) a diferença entre direitos humanos e direitos

fundamentais, é que os direitos humanos são de dimensão jusnaturalista-

universalista, ou seja, válido para a todos e em todos os tempos, já os direitos

fundamentais são jurídico-institucionalizadamente garantidos, como se fosse uma

positivação dos direitos humanos.

Silva (2006) aborda que os direitos fundamentais possuem algumas

características, sendo estas: historicidade; universalidade; limitabilidade;

concorrência e irrenunciabilidade, dentre outros, como pode observar-se no Título

II da Constituição de 1988 e também em outros dispositivos nela dispersos.

2. O Princípio da igualdade relacionado aos portadores de necessidades

especiais

O princípio da igualdade é um dos princípios constitucionais mais importantes

no âmbito jurídico, no entanto, o que é um princípio?

Bandeira de Mello (2005, p. 72) explica que:

Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo.

Com esta base, pode-se afirmar que o principio da igualdade, é basicamente

o que mostra o Art. 5º, caput, da CRFB/1988:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Aristóteles conceituou o princípio de igualdade juntamente com o de justiça,

já que seu funcionamento só acontece se a justiça é feita, ou seja, se todos são

tratados da mesma forma, todos estão sendo justos consigo mesmos. Pensando de

acordo com Aristóteles, podemos então afirmar que a sociedade é justa? Não. É

fato que a Constituição pretende alcançar a todos neste princípio, mas às vezes

alguns grupos de pessoas encontram-se totalmente esquecidos, por exemplo, o

foco principal deste artigo: os portadores de necessidades especiais, que apesar de

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serem notados pela sociedade, são geralmente excluídos devido ao preconceito e

as dificuldades que sofrem no dia-a-dia.

Segundo Guia Inclusivo (2011), mesmo com a possibilidade de viver uma

vida comum, os deficientes possuem restrições em seu cotidiano, como por

exemplo, a dificuldade de locomoção, mas, além disso, pode-se perceber que outro

grande problema é a desigualdade, já que, se eles fossem aceitos como qualquer

outro a própria sociedade buscaria integrá-los e eles se aceitariam.

Para melhor compreender esta desigualdade, basta pensar em uma situação:

se uma mãe descobre que seu filho, ainda em seu ventre, irá nascer com algum tipo

de deficiência, logo, os pais imaginam como será cuidar de seu filho, o porquê de

terem sido escolhidos para isso, de quem é a culpa do ocorrido, e como será o

futuro da criança. Tudo isso decorre de uma cultura preconceituosa, pois se fosse

nascer um filho sem nenhum tipo de restrição, seria inicialmente mais aceito e estes

questionamentos talvez não existissem.

3. Aplicabilidade da acessibilidade

A acessibilidade é regulamentada pela Lei nº 10.098, de 19 de Dezembro de

2000, que em seu Art. 1º fala exatamente que:

Esta Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.

As medidas exatas da infraestrutura de edificações, mobiliário, espaços e

equipamentos urbanos regulamentadas para garantir a acessibilidade fica por conta

da Associação Brasileira de Normas Técnicas, que em 2004 lançou a segunda

edição da ABNT NBR 9050.

Porém, ainda são muitos os obstáculos enfrentados, infelizmente não são

todas as construções que permitem o fácil acesso.

Lima (2009, p.1) faz uma ótima observação quando diz que:

Somente escadas como forma de acesso aos prédios sem elevador. Portas de circulação estreitas. Elevadores pequenos e sem sinalização em Braille. Inexistência de banheiros adaptados. Balcões altos para atendimento de pessoas em cadeira de rodas. Calçadas estreitas, com pavimento deteriorado e com obstáculos difíceis de serem detectados por pessoas com deficiência visual. Inexistência de vagas de estacionamento. O espaço insuficiente de uma vaga pode dificultar a entrada e a saída do carro de usuários de cadeira de rodas e muletas. O transporte é o campeão de

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queixas das pessoas com deficiências por ser o ambiente onde elas se sentem mais desrespeitadas, segundo pesquisa realizada em Salvador pela ONG Vida Brasil e pela Comissão Civil de Acessibilidade de Salvador (Cocas), em 2003/04.

Serão apresentadas a seguir as outras formas que facilitam a exclusão

contribuindo para a desigualdade.

3.1 Mercado de trabalho

Apesar de a ABNT possuir muitas normas quanto à superfície de trabalho, ou

seja, no âmbito físico de uma empresa, a aplicação dessas dimensões muitas

vezes não é respeitada, como por exemplo, o alcance lateral de pessoa em cadeira

de rodas, ângulos para execução de forças de tração e compressão, tanto no plano

horizontal quanto lateral, entre muitos.

A exclusão é decorrente também não só da parte física, quanto na hora da

contratação por conta da globalização dos mercados, já que muitas empresas

querem ter um alto crescimento de produtividade com baixos custos e em menor

tempo e em virtude disso Lima (2009, p.1) complementa:

Não é difícil concluir que a inserção dos jovens advindos de famílias de baixa renda no mercado de trabalho é ainda limitado. Imaginemos então a situação de um portador de necessidades especiais. Quais suas chances concretas? Antes de tudo, é fundamental esclarecer o seguinte: um ser humano com alguma deficiência, não deixa de ser uma pessoa igual a todas nós, no entanto com algumas peculiaridades, ou seja, características e limitações próprias, como todos nós temos, em graus e natureza variados.

Ou seja, mesmo com a inserção de várias leis para melhor atender as

diferenças dos deficientes, não são todas as empresas que adquirem este método,

na maioria das vezes, não aceitam essas pessoas, por preconceito ou por não

terem acessibilidade adequada.

3.2 Lazer

Segundo Sá (2002, p. 38):

O lazer é muito importante na vida das pessoas. Sem lazer, a rotina torna-se insuportável, a vida fica monótona, tediosa e tensa. Necessitamos aliviar as tensões por meio de atividades descontraidas e fora do quotidiano. Nem sempre, porém, o lazer é concebido e assimilado como algo desejável e necessário à boa saúde.

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Como todas as pessoas tem direito ao lazer e isso é previsto no artigo 6º da

CRFB/1988, que diz que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o

trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à

maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, [...]” não teria como ser

diferente para os deficientes físicos ou mentais, mas isso, geralmente não acontece.

Como diz Brunh (1997, p. 37): Os limites estendem-se aos portadores de deficiências, cujas oportunidades de lazer são bastante escassas e, igualmente, carregadas de preconceitos e estereótipos, quando são observadas propostas de integração muitas vezes baseadas na exclusão e não na inclusão no desenvolvimento de atividades específicas para esse grupo.

A falta de lazer por portadores de necessidades especiais foi mostrada

também no Anexo A, no qual trata-se de uma jurisprudência referente a um aluno

que foi excluído de um passeio escolar por conta das suas restrições físicas aliada a

falta de recursos do parque aquático.

Portanto, a pessoa com deficiência necessita de uma vida normal como

qualquer outra, saudável e acessível. E o lazer contribui, e muito, para que essa

necessidade seja realmente concretizada.

Considerações finais

Pode-se concluir, por meio do presente trabalho, que a acessibilidade aos

portadores de necessidades é realmente um ponto negativo do Brasil, já que as leis

determinadas pela Constituição não são seguidas. Muitas vezes isso acontece pelo

esquecimento dessas pessoas, mas também, pelo fato de o país não ter recursos

suficientes para realizar a concretização das estruturas.

Os princípios constitucionais dizem muito a respeito da igualdade, que todos

são iguais perante a lei e que devem ser tratados de forma igual, no entanto, o que

acontece no Brasil é totalmente o contrário, e, como se pode perceber, a realidade

está totalmente desligada da teoria.

As estruturas estão fora do alcance de qualquer pessoa portadora de

necessidades, elas possuem muitas dificuldades de viverem normalmente na

sociedade, tanto que não vivem.

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Muito se fala a respeito deste assunto e é sempre muito espantoso cada

situação conhecida e quando acontece algum fato, como o acontecido presente no

nosso anexo. No entanto, a sociedade esforça-se pouco a mudar essa situação.

Referências

ARALDI. João Irineu Júnior. ________________Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8420&revista_caderno=9> Acesso em: 10 jun. 2014. ASSOCIAÇÃO VIDA BRASIL.Pintando direitos: uma cartilha sobre deficiência e participação. Disponível em: <http://elo.com.br/portal/colunistas/ver/221317/deficientes-diferentes-sim-desiguais-nao-.html>. Acesso em: 10 jun. 2014. BRUHNS, Heloisa Turini. Introdução aos Estudos do Lazer (org.). Campinas. São Paulo: Unicamp, 1997. CANOTILHO. José Jaoquim Gomes. Direito constitucional . 7ª ed. CIDADE EDITORA. 2000. GUIMARÃES, Marcelo Pinto. A eliminação de barreiras possibilita aos portadores de deficiência agirem na sociedade. Bh - Minas Gerais: Rede Saci, 2002. Disponível em: <www.saci.org.br>. Acesso em: 20 jun. 2014. SAMPAIO, Marcos. A função social dos direitos fundamentais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 86, mar 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9142>. Acesso em: 18 jun 2014. SÁ, Elizabet Dias de. Considerações sobre a inclusão social dos portadores de deficiência. Belo Horizonte: Rede Saci, 2002. Disponível em: <www.saci.org.br>. Acesso em: 20 jun. 2014. ______________Disponível em: ,<http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8414>. Acesso em: 18 jun. 2014. ___________. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7039>. Acesso em: 10 jun. 2014. ___________. Disponível em: <http://www.guiainclusivo.com.br/2011/06/deficiencia-desigualdade-social/>. Acesso em: 18 jun. 2014.

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________. Disponível em: <http://www.cve.saude.sp.gov.br/agencia/bepa57_deficiencia.htm>. Acesso em: 15 jun. 2014. _______. Disponível em: <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/sites/default/files/arquivos/%5Bfield_generico_imagens-filefield-description%5D_24.pdf>. Acesso em: 15 jun. 2014.

ANEXO A – Jurisprudência relacionada ao tema

Agravo de Instrumento n. 2010.083291-0, de Balneário Camboriú Relator: Des. Subst. Stanley da Silva Braga

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO. ALUNO PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. EXCURSÃO ESCOLAR A PARQUE TEMÁTICO. PASSEIO PREJUDICADO DIANTE DA AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES DE ACESSIBILIDADE AOS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA NO LOCAL. RELAÇÃO DE CONSUMO EVIDENCIADA. PRESENTES OS REQUISITOS DE VEROSSIMILHANÇA E HIPOSSUFICIÊNCIA. CABÍVEL A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Consumidor é "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final" (art. 2º do Código de Defesa do Consumidor).

Demonstradas a hipossuficiência da parte consumidora e a verossimilhança das suas alegações deve ser autorizada a inversão do ônus da prova.

[...] É possível ao juiz inverter o ônus da prova ao despachar a petição inicial, não sendo necessário aguardar a apresentação da contestação, pois verificada a relação de consumo e preenchidos os requisitos do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, tem-se o conhecimento da parte mais vulnerável da relação de consumo – consumidor e assegura-se ao fornecedor a ciência prévia quanto ao ônus da prova, resguardando assim, a ampla defesa e o contraditório para as partes (Agravo de Instrumento n. 2007.051654-2, de Dionísio Cerqueira, Rel. Des. Carlos Prudêncio, j. 1-7-2008).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2010.083291-0, da comarca de Balneário Camboriú (2ª Vara Cível), em que é agravante Bontur S/ A Bondinhos Aéreos, e agravado A. W. H.:

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ACORDAM, em Sexta Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por Bontur S.A.

Bondinhos Aéreos contra decisão proferida na ação de indenização por danos

morais n. 005.110.014564-1, que tramita na 2ª Vara Cível da Comarca de Balneário

Camboriú, em que figuram como autor A.W.H devidamente representado por sua

genitora Alessandra Pinheiro e réu, a ora agravante.

Insurge-se a recorrente contra a decisão monocrática que considerou a

relação existente entra as partes como de consumo e aplicou ao caso presente as

normas constantes no Código de Defesa do Consumidor, autorizando, por

conseguinte a inversão do ônus da prova (fl. 39).

Inicialmente alega que a relação existente entre as partes não pode ser

considerada de consumo, pois o contrato foi pactuado entre a agravante e a Escola

Municipal Professor Edgar M. Castanheira, além disso, em momento algum foi

informado que um dos alunos era portador de necessidades especiais (fls. 2-11).

Aduz, também que a ausência de acessibilidade de portador de

necessidades especiais em estabelecimento privado não configura defeito do

produto ou serviço, mas sim vício do produto ou serviço e não é aplicável o disposto

no art. 17 do Código de Defesa do Consumidor à espécie.

Sustenta, ainda, que a inversão do ônus probandi foi deferida antes da

apresentação da contestação, por tal razão infringe a regra disposta no art. 333 do

Código de Processo Civil e a finalidade do art. 6º, inc. III, do Código de Defesa do

Consumidor.

Ao final, assevera a decisão foi fundamentada no fato de existir entre

as partes relação de consumo, quando deveria levar em consideração os requisitos

de verossimilhança e hipossuficiência.

Juntou documentos de fls. 13-64.

O efeito suspensivo foi deferido às fls. 68-69.

Contrarrazões às fls. 72-76.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr.

Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira.

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VOTO

Da admissibilidade:

O recurso é tempestivo, foi instruído com os documentos

indispensáveis relacionados no art. 525, inc. I, do Código de Processo Civil e

recolhido o respectivo preparo, preenchendo, assim, os pressupostos de

admissibilidade.

Do julgamento:

Cinge-se a controvérsia na decisão proferida nos autos da ação de

indenização por danos morais n. 005.10.014564-1, a qual autorizou a inversão do

ônus da prova, nos termos do caput do artigo 14 do Código de Defesa do

Consumidor.

Da relação entre as partes e da inversão do ônus da prova:

A agravante alega que a relação existente entre as partes não pode ser

considerada de consumo, pois o contrato de prestação de serviços foi pactuado a

Escola Municipal Professor Edgar M. Castanheira;, além disso, em momento algum

foi informado que um dos alunos era portador de necessidades especiais (fls. 2-11).

Sustenta, ainda, que a ausência de acessibilidade de portador de

necessidades especiais em estabelecimento privado não configura defeito do

produto ou serviço, mas sim vício do produto ou serviço e não é aplicável o disposto

no art. 17 do Código de Defesa do Consumidor à espécie.

O Código de Defesa do Consumidor em seu art. 2º classifica como

consumidor "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço

como destinatário final".

Visando melhor elucidar o conceito de consumidor colacionam-se os

ensinamentos de João Batista de Almeida:

Pela definição legal, portanto, consumidor há de ser: a) pessoa física ou jurídica, não importando os aspectos de renda e

capacidade financeira. Em princípio, toda e qualquer pessoa física ou jurídica pode ser havida por consumidora. Por equiparação é incluída também a coletividade, grupos de pessoas, por exemplo, a família (determináveis). Cumpre observar, no particular, que há quem entenda que consumidor só pode ser a pessoa física, ou seja, individual [...];

b) que adquire (compra diretamente) ou que, mesmo não tendo adquirido, utiliza-se (usa, em proveito próprio ou de outrem) produto ou serviço, entendendo-se por produto "qualquer bem, móvel ou imóvel, material pu imaterial" (CDC, art. 3º, §1º) e por serviço qualquer atividade fornecida a terceiros, mediante remuneração, desde que não seja de natureza trabalhista (CDC, art. 3º, §2º).

c) como destinatário final, ou seja, para uso próprio, privado, individual, familiar ou doméstico, e até para terceiros, desde que o repasse não se dê por

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revenda. Não se incluiu na definição legal, portanto o intermediário, e aquele que compra com o objetivo de revender após montagem, beneficiamento ou industrialização. A operação de consumo deve encerrar-se no consumidor, que utiliza ou permite que seja utilizado o bem ou serviço adquirido, sem revenda.

Ocorrida esta, consumidor será o adquirente da fase seguinte, já que o consumo não teve, até então, destinação final. Existe a possibilidade de concentrarem-se numa mesma pessoa ambas as figuras, quando há em parte consumo intermediário e consumo final. É o caso das montadoras de automóveis, que adquirem produtos para montagem e revenda (autopeças) ao mesmo tempo que adquirem produtos ou serviços para consumo final (material de escritório , alimentação). O destino final é, pois, a nota tipificadora do consumidor (A proteção jurídica do consumidor. 6 ed., São Paulo:Saraiva,, 2008, pgs. 40-41).

Rizzato Nunes, por sua vez, leciona:

[...] Comecemos, então, a tratar do caput do art. 2º. A mera interpretação gramatical dos termos da cabeça do artigo não é capaz

de resolver os problemas que surgem. Todavia, devemos lançar mão dela, porquanto permitirá a explicitação da maior parte das questões.

Diga-se, de início, p qie decorre da obviedade da leitura. Consumidor é a pessoa física, a pessoa natural e também a pessoa jurídica. Quando a esta última, como a norma não faz distinção, trata-se de toda e qualquer pessoa jurídica, que seja uma microempresa, quer seja uma multinacional, pessoa jurídica civil ou comercial, associação, fundação etc.

A lei emprega o verbo "adquirir", que tem de ser interpretado em sentido mais lato, de obter, seja a título oneroso ou gratuito.

Porém, como se percebe, não se trata apenas de adquiri, mas também de utilizar o produto ou o serviço, ainda quando quem o utiliza não o tenha adquirido. Isto é, a norma define como consumidor tanto que efetivamente adquire (obtém) o produto ou serviço como aquele que, não o tendo adquirido, utiliza-o ou o consome.

Assim, por exemplo, se uma pessoa compra cerveja para oferecer aos amigos numa festa, todos aqueles que a tomarem serão considerados consumidores.

A norma fala em "destinatário final". O uso deste termo facilitará, de uma lado, a identificação da figura do consumidor, mas, por outro, trará um problema que tentaremos resolver.

Evidentemente, se alguém adquire produto não como destinatário final, mas como intermediário do ciclo de produção, não será considerado consumidor. Assim, por exemplo, se uma pessoa – física ou jurídica – adquire calças para revendê-las, a relação jurídica dessa transação não estará sob a égide da Lei n. 8.078/90 [...] (Curso de Direito do Consumidor. 4 ed., São Paulo:Saraiva, 2009, pgs. 72-73).

In casu, após análise minudente dos conceitos transcritos e

compulsando-se os autos infere-se (fl. 37) que, ao contrário do que afirma a

agravante, a relação existente entre as partes é de consumo, porquanto a escola

onde estuda o recorrido apenas organizou o passeio.

Assevera-se, também, que o agravado pagou o ingresso para entrar ao

parque e usufruir dos benefícios que este oferece (fls. 37-38), enquadrando-se no

conceito de destinatário final; por conseguinte pode ser aplicada ao caso a inversão

do ônus da prova.

Neste sentido foi o parecer ministerial:

[...] A questão é muito simples e não merece maiores delongas.

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A Agravante alega que a relação/vínculo de consumo se deu tão-somente entre a Agravante e a Escola na qual estuda o Agravado, bem como de que o Agravado não se encaixa no conceito de destinatário final.

Pois bem, infundadas são as alegações de que o contrato foi realizado pela Escola e que por esse motivo não haveria relação de consumo entre agravante e agravado que justificasse legalmente a inversão do ônus probatório.

O documento juntado à fl. 60 se trata de mera comunicação de que a escola visitaria o parque. O pagamento realizado pelos alunos por intermédio da escola não implica em ruptura dessa relação de consumo, visto que a Escola tão somente organizou o evento. Além do que, o vínculo de consumo se estabelece com o destinatário final do serviço, que no caso é o aluno, consoante art. 2º do CDC:

"consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

Desse modo, perfeitamente cabível a aplicação do art. 6º, VIII do CDC, para ver invertido o ônus da prova (fl. 82).

Ante o exposto afasta-se o argumento empossado pelo Agravante.

Dos requisitos da verossimilhança e hipossuficiência:

Aduz a agravante que a inversão do ônus probandi foi deferida sob o

fundamento de existir entre as partes relação de consumo, quando deveria levar em

consideração os requisitos de verossimilhança e hipossufiência.

A inversão do ônus da prova, como direito à facilitação da defesa que

é, não decorre apenas do fato de submeter-se a relação jurídica à égide do Código

de Defesa do Consumidor. Produzida prova pelos consumidores e valorada ela, não

havendo dúvidas do julgador, não há lugar para essa inversão. Ainda mais quando

não se estabelecem como verossímeis as alegações dos requeridos.

Observa José Geraldo Britto Filomeno:

[...] A inversão do ônus da prova é direito de facilitação da defesa e não pode ser determinada senão após o oferecimento e valoração da prova, se e quando o julgador estiver em dúvida. É dispensável caso forme sua convicção, nada impedindo que o juiz alerte, na decisão saneadora que, uma vez em dúvida, se utilizará das regras de experiência a favor do consumidor. Cada parte deverá nortear sua atividade probatória de acordo com o interesse em oferecer as provas que embasam seu direito. Se não agir assim, assumirá o risco de sofrer a desvantagem de sua própria inércia, com a incidência das regras de experiência a favor do consumidor" (Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto/ Ada Pellegrini Grinover... [et al]. 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense universitária, 1999, pp. 129 e 130).

Para a inversão do ônus da prova o juiz deve verificar, com base nas

regras de experiência, se a afirmação é verossímil, ou seja, se, dentro de um critério

de plausibilidade, a asserções lançadas pelo consumidor revestem-se com

aparência de verdade.

Inexistente verossimilhança, deve o juiz analisar a existência de

hipossuficiência, quer em decorrência da dificuldade de provar à luz da falta de

informações e de conhecimentos específicos acerca da produção, como em

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decorrência da dificuldade econômica da prova.

Sobre esses aspectos, extrai-se do escólio de Nelson Nery Júnior e

Rosa Maria De Andrade Nery:

Alegação verossímil ou hipossuficiência do consumidor. A inversão pode ocorrer em duas situações distintas: a) quando o consumidor for hipossuficiente; b) quando for verossímil sua alegação. As hipóteses são alternativas, como claramente indica a conjunção ou expressa na norma ora comentada (Nery, DC 1/218; Watanabe, CDC Coment., 497/498). A hipossuficiência respeita tanto à dificuldade econômica quanto à técnica do consumidor em poder desincumbir-se do ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil extravagante em vigor, 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 1354).

Mais adiante:

Máximas de experiência. Para aferir a hipossuficiência do consumidor e a verossimilhança de suas alegações, deve o juiz servir-se das máximas ou regras de experiência, que são o conjunto de juízos fundados sobre a observação do que de ordinário acontece, podendo formular-se em abstrato por todo aquele de nível mental médio. Servem de critério e guia para a solução da questão relativa à prova, não sendo necessário que o juiz sobre elas se pronuncie expressamente na sentença ou decisão.

De modo idêntico, averba Humberto Theodor Júnior:

A verossimilhança é juízo de probabilidade extraída de material probatório de feitio indiciário, do qual se consegue formar a opinião de ser provavelmente verdadeira a versão do consumidor. Diz o Código de Defesa do Consumidor que esse juízo de verossimilhança haverá de ser feito "segundo regras ordinárias da experiência (art. 6º, VIII).

Quanto à hipossuficiência, trata-se de impotência do consumidor, seja de origem econômica seja de outra natureza, para apurar e demonstrar a causa do dano cuja responsabilidade é imputada ao fornecer (Direito do Consumidor: a busca de um ponto de equilíbrio entre as garantias do CDC e os princípios gerais do direito civil e do direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 143).

Assim sendo, devem ser demonstradas a hipossuficiência da parte

consumidora e a verossimilhança das suas alegações para que seja determinada a

inversão do ônus da prova.

No caso presente, o agravado logrou êxito em demonstrar a

verossimilhança de suas alegações, pois, ao intentar a ação indenizatória que deu

origem à presente demanda, acostou ao caderno processual o recibo do pagamento

da entrada no parque, o informativo da escola, no qual foram descritas as atividade

que seriam oferecidas, fotos da estrutura física do estabelecimento do recorrente e

relatório médico (fls. 30-38).

No tocante ao pré-requisito da hipossuficência técnica e financeira do

recorrido, denota-se que também está presente na demanda, afinal, de um lado

encontra-se a empresa BONTUR S.A. BONDINHOS AÉREOS pessoa jurídica de

direito privado, que detém uma equipe de funcionários para auxiliá-la e do outro, um

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garoto de 8 (oito) anos, representado por sua genitora e beneficiário de assistência

judiciária gratuita.

Portanto, presentes os requisitos da verossimilhança das alegações do

autor da demanda e sendo ele hipossuficiente em relação à recorrente nega-se

provimento ao recurso neste tocante e mantém-se a decisão que inverteu o ônus da

prova.

Do momento da inversão do ônus da prova:

E, por fim, insurge-se a recorrente quanto ao momento da inversão do

ônus da prova, pautando seu pedido na afirmação de que tal medida infringe as

regras dispostas nos artigos 333, do Código de Processo Civil e 6º, inc. VIII do

Código de Defesa do Consumidor.

Ao contrário do que afirma a insurgente, a inversão do ônus da prova

pode ocorrer após o recebimento da inicial desde que restem verificados a condição

de hiposuficiência da parte autora e a verossimilhança de suas alegações.

Nesse sentido colacionam-se julgados proferidos pelo Superior Tribunal

de Justiça:

[...] Inversão do ônus da prova. Art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Momento processual. 1. É possível ao Magistrado deferir a inversão do ônus da prova no momento

da dilação probatória, não sendo necessário aguardar o oferecimento da prova e sua valoração, uma vez presentes os requisitos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, que depende de circunstâncias concretas apuradas pelo Juiz no contexto da facilitação da defesa dos direitos do consumidor

2. Recurso especial conhecido e provido (Resp. n. 598,620 - MG, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 7-12-2004).

Também:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MOMENTO. SENTENÇA. POSSIBILIDADE. REGRA DE JULGAMENTO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. INEXISTÊNCIA.

1. A jurisprudência do STJ não se pacificou quanto à possibilidade de o juízo inverter o ônus da prova no momento de proferir a sentença numa ação que discuta relação de consumo.

2. O Processo Civil moderno enfatiza, como função primordial das normas de distribuição de ônus da prova, a sua atribuição de regular a atividade do juiz ao sentenciar o processo (ônus objetivo da prova). Por conduzirem a um julgamento por presunção, essas regras devem ser aplicadas apenas de maneira excepcional.

3. As partes, no Processo Civil, têm o dever de colaborar com a atividade judicial, evitando-se um julgamento por presunção. Os poderes instrutórios do juiz lhe autorizam se portar de maneira ativa para a solução da controvérsia. As provas não pertencem à parte que as produziu, mas ao processo a que se destinam.

4. O processo não pode consubstanciar um jogo mediante o qual seja possível às partes manejar as provas, de modo a conduzir o julgamento a um resultado favorável apartado da justiça substancial. A ênfase no ônus subjetivo da prova implica privilegiar uma visão individualista, que não é compatível com a teoria

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moderna do processo civil. 5. Inexiste surpresa na inversão do ônus da prova apenas no julgamento da

ação consumerista. Essa possibilidade está presente desde o ajuizamento da ação e nenhuma das partes pode alegar desconhecimento quanto à sua existência.

6. A exigência de uma postura ativa de cada uma das partes na instrução do processo não implica obrigá-las a produzir prova contra si mesmas. Cada parte deve produzir todas as provas favorável de que dispõe, mas não se pode alegar que há violação de direito algum na hipótese em que, não demonstrado o direito, decida o juiz pela inversão do ônus da prova na sentença.

7. Recurso especial conhecido e improvido (Resp. n. 1.125.621 MG, Rela. Mina. Nancy Andrighi, j. 19-8-2010).

E, desta Corte de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. COOPERATIVA DE CRÉDITO RURAL. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA PELO JUIZ AO DESPACHAR A INICIAL. POSSIBILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.

[...] É possível ao juiz inverter o ônus da prova ao despachar a petição inicial, não sendo necessário aguardar a apresentação da contestação, pois verificada a relação de consumo e preenchidos os requisitos do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, tem-se o conhecimento da parte mais vulnerável da relação de consumo – consumidor e assegura-se ao fornecedor a ciência prévia quanto ao ônus da prova, resguardando assim, a ampla defesa e o contraditório para as partes.

"Caso o juiz, antes da sentença, profira decisão invertendo o ônus da prova (v.g., CDC 6º VIII), não estará, só por isso, prejudicando a causa. A inversão, por obra do juiz, ao despachar a petição inicial ou na audiência preliminar (CPC 331), por ocasião do saneamento do processo (CPC 331, § 3º), não configura por si só motivo de suspeição do juiz. Contudo, a parte que teve contra si invertido o ônus da prova, quer nas circunstâncias aqui mencionadas, quer na sentença, momento adequado para o juiz assim proceder, não poderá alegar cerceamento de defesa porque, desde o início da demanda de consumo, já sabia quais eram as regras do jogo e que, havendo o non liquet quanto à prova, poderia ter contra ele invertido o ônus da prova. Em suma, o fornecedor (CDC 3º) já sabe, de antemão, que tem de provar tudo o que estiver a seu alcance e for de seu interesse nas lides de consumo. Não é pego de surpresa com a inversão na sentença." (Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery in Código de Processo Civil comentado, 9ª ed. - São Paulo: RT, p. 531) (Agravo de Instrumento n. 2007.051654-2, de Dionísio Cerqueira, Rel. Des. Carlos Prudêncio, j. 1-7-2008).

Conforme analisado anteriormente, o agravado é hipossuficiente, além

disso a verossimilhança de suas alegações foi constatada mediante a documentação

apresentada quando da apresentação da inicial (fls. 14-38), razão pela qual infere-se

que o magistrado a quo não infringiu o disposto no art. 333 do Código de Processo

Civil ao determinar a inversão do ônus da prova antes da apresentação da

contestação.

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, esta Sexta Câmara de Direito Civil, à

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unanimidade, resolveu conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr.

Desembargador Jaime Luiz Vicari, com voto, e dele participou o Exmo. Sr.

Desembargador Ronei Danielli. Funcionou como Representante do Ministério

Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira.

Florianópolis, 18 de agosto de 2011.

Stanley da Silva Braga RELATOR