Artigo Dispensa Em Massa Luciane

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Dispensa em massa e sua possibilidade no ordenamento jurídico brasileiro . Autora: Luciane Borges da Costa Marcelino* Em conjunturas econômicas de crise é recorrente a conduta das empresas no sentido da dispensa em massa, sob a justificativa de ser uma das únicas formas, senão a única, de manutenção do empreendimento econômico e, por consequência, dos demais empregos não afetados pela resilição contratual coletiva. Tal fato foi constante em 2008 e 2009 em virtude da crise financeira desencadeada pelos Estados Unidos, sendo tais demissões alvo de questionamento na justiça do trabalho, havendo julgado inclusive no TST. No campo individual, a corrente majoritária segue no sentido de que o artigo 7º, I da CF/88 possui eficácia limitada, sendo que a falta de lei que regule o que seja despedida arbitrária ou que confira qualquer outra garantia de emprego fora a multa de 40 % do FGTS, leva à conclusão que não existe óbice para a dispensa, ressalvadas as estabilidades, assim como não há necessidade de motivação. O fato de a Convenção 158 da OIT não estar incorporada ao nosso ordenamento, corrobora o agora posto. De outro giro, não existe lei que regule, em nosso país, a dispensa coletiva, mesmo que isto seja impactante para o trabalhador dispensado e para toda sociedade, ainda mais naqueles casos onde uma cidade gira sua existência em torno de determinada empresa. Cabe destacar que a dispensa coletiva pode ser definida como aquela que, em um mesmo momento, ocorre com base em uma única causa, e de certa forma, abstrata, no sentido de não vincular este ou aquele trabalhador a um determinado fato concreto e isolado. Um bom exemplo de dispensa em massa foi aquela efetuada pela EMBRAER, cuja justificativa foi a situação econômica.

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Dispensa em massa e sua possibilidade no ordenamento jurídico brasileiro.

Autora: Luciane Borges da Costa Marcelino*

Em conjunturas econômicas de crise é recorrente a conduta das empresas

no sentido da dispensa em massa, sob a justificativa de ser uma das únicas formas,

senão a única, de manutenção do empreendimento econômico e, por consequência, dos

demais empregos não afetados pela resilição contratual coletiva. Tal fato foi constante

em 2008 e 2009 em virtude da crise financeira desencadeada pelos Estados Unidos,

sendo tais demissões alvo de questionamento na justiça do trabalho, havendo julgado

inclusive no TST.

No campo individual, a corrente majoritária segue no sentido de que o

artigo 7º, I da CF/88 possui eficácia limitada, sendo que a falta de lei que regule o que

seja despedida arbitrária ou que confira qualquer outra garantia de emprego fora a

multa de 40 % do FGTS, leva à conclusão que não existe óbice para a dispensa,

ressalvadas as estabilidades, assim como não há necessidade de motivação. O fato de a

Convenção 158 da OIT não estar incorporada ao nosso ordenamento, corrobora o agora

posto.

De outro giro, não existe lei que regule, em nosso país, a dispensa

coletiva, mesmo que isto seja impactante para o trabalhador dispensado e para toda

sociedade, ainda mais naqueles casos onde uma cidade gira sua existência em torno de

determinada empresa.

Cabe destacar que a dispensa coletiva pode ser definida como aquela que,

em um mesmo momento, ocorre com base em uma única causa, e de certa forma,

abstrata, no sentido de não vincular este ou aquele trabalhador a um determinado fato

concreto e isolado. Um bom exemplo de dispensa em massa foi aquela efetuada pela

EMBRAER, cuja justificativa foi a situação econômica.

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Percebe-se que a dispensa individual e a plúrima estão na esfera do

Direito individual, enquanto que a dispensa coletiva relaciona-se com o direito coletivo,

que se apresenta silente sobre a hipótese, momento em que, por força do artigo 8º da

CLT, a lacuna deve ser preenchida por princípios, costumes e direito comparado, sem

abster-se da aplicação subsidiária do direito comum.

Nesta toada, pode-se afirmar que o direito de resilição em massa não se

apresenta como direito potestativo de igual intensidade do verificado nas dispensas

individuais, dado o impacto de tais dispensas na sociedade, sem falar que a legislação

proporciona meios alternativos para evitar ou mitigar tal fato social, como é o caso de

férias coletivas (art. 139 CLT), suspensão contratual (art. 476-A CLT), contrato a tempo

parcial (art. 442-A CLT) e, até mesmo a redução salarial (art. 7º, VI da CF/88).

Esta visão limitativa do poder de dispensar respalda-se em princípios

caros ao nosso ordenamento, como o são o da dignidade humana, valor social do

trabalho e função social da empresa (arts. 1º e 170 da CF). Ainda, dado o caráter

contratual da relação de trabalho, imperiosos que se aplique a boa-fé objetiva, inclusive

quanto ao dever de informar sobre possíveis dispensas de maior repercussão social (art.

422 CC).

Dado o agora posto, cabe a assertiva de que o empregador encontra

limites ao poder de resilir em massa os contratos, no ordenamento jurídico, uma vez

que não pode praticar tal ato com afronta aos princípios-normas da dignidade da pessoa

humana, valor social do trabalho, função social da empresa e boa-fé objetiva,

encontrados na CF/88 e no Código Civil.

Complementando o agora posto, muito embora não exista previsão

expressa, a jurisprudência tem entendido que por ser um ato coletivo, a dispensa em

massa exige a presença do sindicato, até para que se esgotem todas as negociações

possíveis para preservar os postos de trabalho.

Inclusive, em recente decisão o TST posicionou-se no sentido de criar tal

premissa, qual seja, a imprescindibilidade da negociação coletiva para o caso de

dispensa em massa. A premissa baseou-se não apenas nos princípios-normas citados

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acima, como também no Direito Internacional, que em sua maioria, exige a presença do

sindicato e de negociação coletiva para que se evite ou se proceda uma dispensa

coletiva.

Assim, nos moldes acima, é necessária a participação sindical nos casos

em que a empresa pretende dispensar em massa.

Quanto ao MPT, certo que a LC 75/93 determinou competência ao órgão

para propor ação civil pública para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados

direitos sociais constitucionalmente garantidos; além de poder instaurar inquérito civil

nos mesmos casos (art. 85). Assim, observadas as máculas acima apontadas, deve o

MPT atuar resguardar os direitos sociais dos empregados, mesmo que de forma

coletiva.

* Advogada e Professora nas Faculdades da Rede Unianhanguera (Graduação e Pós-

Graduação, Curso de Direito). Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela

PUCCampinas.