Artigo: Dos Nordestes ao nordeste

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    N

    ANO 17 N 4 AGOSTO/2009

    TIRAGEM: 23 000 EXEMPLARES

    E mais...

    Editorial Quando o poderreprimia manifestantes em

    Teer, Lula apressou-se emconceder seu apoio ao regimedos aiatols. As suas frases re-produziram os discursos tpi-cos das ditaduras acossadas.

    Pg. 3

    H 40 anos, em julho, o astro-nauta Neil Armstrong pisou emsolo lunar. De l para c, com ofim da Guerra Fria, a Lua se dis-tanciou de novo de ns.

    Pg. 3

    O Meio e o Homem A ba-cia do rio Colorado a reser-va da gua escassa que, no su-doeste dos Estados Unidos,abastece cidades no deserto ecampos agrcolas irrigados.

    Pg. 9

    A Lei de Anistia, h trs dca-das, configurou o pacto da tran-sio de poder dos militares para

    os civis no Brasil. Mas ela noassegurou a punio dos crimescometidos pela ditadura nem odireito verdade histrica.

    Pg. 10

    Sob a tica dos Estados Uni-dos, o Mxico era visto comoa fonte de fluxos incontrol-veis de imigrantes pobres e ile-gais. Hoje, converteu-se numEstado em desordem, conta-

    minado pelo narcotrfico eapresentado como ameaa segurana nacional americana.

    Pg. 11

    Numa eleio marcada porndices recordistas de absten-o, os europeus votaram nomedo. Eles deram a vitria aospartidos de centro-direita maspropiciaram o crescimento daextrema-direita ultranaciona-

    lista e xenfoba. Pg. 12

    o imaginrio brasileiro, o Nordeste caracteriza-se pelas extensas

    plantaes verdejantes de cana-de-acar da faixa litornea e, tambm,pelo cinza da caatinga seca, pontilhado pelas tragdias recorrentes dosanos de estiagem. Essas imagens, construdas ao longo de mais de umsculo, correspondiam a uma operao de regionalizao que distin-guiu a Zona da Mata, o Agreste, o Serto e o Meio-Norte.

    O Nordeste arcaico no desapareceu, mas se combina, de formascomplexas, com inmeras atividades dinmicas geradas pela indus-trializao e pela insero regional nos fluxos da globalizao. A re-gio, que se moderniza e se diferencia internamente, representa umdesafio para a Geografia. Como represent-la nesse incio de sculo

    XXI? Um novo mapa de sub-regies, elaborado com base em estu-

    dos do IBGE e do IPEA, oferece uma resposta questo.Pgs. 4 e 5

    No governo de George W. Bush, com a inva-so americana do Iraque, o Ir foi qualificado

    como um dos trs integrantes do eixo do mal.Os grandiosos planos dos neoconservadores, dereformar o Grande Oriente Mdio, previama converso do Iraque num semiprotetoradoamericano e, em seguida, a mudana de regi-me no Ir. A justificativa de todo o projeto eraespalhar a liberdade no mundo rabe-muul-mano, exportando os valores e as idias doOcidente. Entre as evidncias do fracasso deBush conta-se, no s, a crnica instabilidade

    no Iraque, como tambm a consolidao dogoverno autoritrio e antiamericano deMahmoud Ahmadinejad no Ir.

    As multides que tomaram as ruas de Tee-r em junho, protestando contra a provvelfraude eleitoral que deu um segundo mandato a Ahmadi-nejad representam uma prova da falncia ideolgica dosneoconservadores. As idias de liberdade e democracia nochegaram ao Ir de fora, na ponta das baionetas de umexrcito conquistador. Elas emanam do interior da pr-

    pria Revoluo Iraniana, que conhece um novo captulo.Os iranianos que apoiaram a candidatura oposicionistade Hossein Mousavi no querem renunciar ao Isl para setornarem ocidentais. Eles no veem nenhuma contradi-o entre a sua cultura e a liberdade. O que pedem o

    Um novo mapa para o Nordeste

    fim do sufocamento teocrtico da Repblica criada em 1979.O Ir desempenha um papel decisivo na geopoltica do

    Grande Oriente Mdio. Os Estados Unidos de Barack Oba-ma procuram caminhos para cooperar com a potncia regionalislmica, a fim de estabilizar o Iraque e recuperar a iniciativa

    militar perdida no Afeganisto. Washington desistiu de promo-ver a mudana de regime no Ir e conversar com o governode Teer, qualquer que seja ele. A democracia e a liberdade naantiga Prsia dependem, exclusivamente, dos iranianos.

    Vejas as matrias s pgs. 6 a 8

    EDION100

    O IREMREVOLUO

    An

    nimo:EuclidesdaCunha.s.d.AcervodaCasaEuclidiana.SoJosdoRioPardo

    Behrouzmehri/AFP

    100ANOSDEEUCLIDESDACUNHA

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    MUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEA 2

    2009 AGOSTO

    L

    PANGEA - Edio e Comercializao deMaterial Didtico LTDA.

    Redao: Demtrio Magnoli, Jos Arbex Jr.,Nelson Bacic Olic (Cartografia).

    Jornalista Responsvel:Jos Arbex Jr. (MTb 14.779)Reviso:Maria Eugnia LemosPesquisa Iconogrfica: Odete E. Pereira e Etoile ShawProjeto e editorao eletrnica:Wladimir Senise

    Endereo:Rua Romeu Ferro, 501, So Paulo - SP.CEP 05591-000. Fones: (0XX11) 3726.4069 / 3726.2564Fax: (0XX11) 3726.4069 E-mail:[email protected]

    Assinaturas:Por razes tcnicas, no oferecemosassinaturas individuais. Exemplares avulsos podem serobtidos no seguinte endereo, em So Paulo: Banca de jornais Paulista 900, Av. Paulista, 900

    Fone: (0XX11) 3283.0340.

    www.clubemundo.com.br

    E X P E D I E N T E

    contextualizando os principais eventos geopolticos, his-tricos, econmicos e culturais de um mundo em rpidamutao. Inicialmente, a publicao voltou-se para aten-der principalmente as necessidades dos vestibulandos.Com o tempo, sem perder de vista os vestibulares, am-pliamos nosso foco, que o de ajudar os estudantes aentender o mundo em que vivem. No foi por acaso que,em 2005, criamos o encarte Histria & Cultura,vocacionado para contribuir com os professores de His-tria e Redao.

    Pangea mudou pouco de 1993 para c. Continua sen-do uma pequena empresa, com apenas trs editores e doisfuncionrios. Mas h um segredo: ela conta com mais de

    no alto da capa est escrito: Ano 17, n 4. S que,dessa vez, fizemos questo de acrescentar: Edio n 100. Faaas contas: seis edies por ano, durante 16 anos, mais quatroedies neste 2009. Cem, um belo nmero redondo.

    A Editora Pangea, que publica Mundo, foi criada nofinal de 1992, quando do lanamento do nmero zerode nossa publicao, um prottipo do que seria o jor-nal que passaramos a editar no ano seguinte. So cemvezes que dialogamos com os estudantes e professores dascentenas de escolas de todo o pas, que nos honram comsua parceria pedaggica.

    Mundonasceu da constatao de que as escolas ne-cessitavam um material que fosse alm do livro didtico,

    MUNDO, 100!

    "Infelizmente no foi possvel localizar os autoresde todas as imagens utilizadas nesta edio.

    Teremos prazer em creditar os fotgrafos,caso se manifestem"

    140CONCURSONACIONALDEREDAOMUNDOEH&C - 2009

    A peneira final

    500 colaboradores entre intelectuais, professores, jor-nalistas, estudantes e personalidades que contriburamdecisivamente, ao longo de todo esse tempo, para a qua-lidade de nossa publicao.

    Mundopromoveu, com sucesso, uma srie de ativi-dades para professores e estudantes das escolas assinan-tes. Entre elas, merece um destaque especial o grandedebate na Faculdade de Direito do Largo de So Francis-co, em 1999, que discutiu e celebrou os dez anos da que-da do Muro de Berlim.

    Outra atividade de grande importncia tem sido oConcurso Nacional de Redaes, hoje em sua 14 edi-o. Alm disso, os editores de Mundoproferiram maisde 500 palestras para escolas assinantes de Mundoe, to-mados em conjunto, so autores de mais de uma centenade livros voltados a estudantes e ao pblico em geral.

    Neste momento especial, no qual voltamos os olhospara trs e revemos uma extensa trajetria, queremos re-conhecer o apoio e suporte recebido das editoras Moder-

    na, Scipione, Ediouro e Saraiva. Cada uma delas, em al-gum momento de nossa histria, nos honrou com seupatrocnio. Agradecemos, sobretudo, a um grupo deamigos e colaboradores mais prximos que trabalharamou ainda trabalham com Pangea: Newton Carlos, Kika,

    Jayme Brener, Gilson Schwartz, Paulo Csar de Carva-lho, Jorge de Almeida, Wladimir Senise, J. B. Natali,Cludio Camargo, Jos Arnaldo Favaretto.

    Erguemos um brinde especial. para os professores,coordenadores e diretores das escolas que nos honram emdiversos casos desde 1993! com seu apoio e confiana.

    nosso privilgio t-los nesta parceria pedaggica.

    H 14 anos, Mundopromoveu seu primeiro Concurso Nacional de Redao. O sucesso de tantos anosrepete-se agora, quando registramos o recebimento de trabalhos de 70 escolas de todo o pas, um nmeroprovavelmente maior, se levarmos em conta a participao de instituies de ensino com unidades em diferen-tes cidades. Muitas das escolas participantes realizaram concursos internos para a seleo dos melhores traba-lhos precisamente os que chegaram at ns. Por isso, no h exagero nenhum em dizer que os textos querecebemos j so finalistas, representando o melhor de um universo bem mais amplo.

    Esse sucesso no s nosso, nem principalmente nosso. Ele , antes de tudo, fruto do rduo trabalhorealizado pelos professores de Comunicao e Expresso e do estmulo oferecido pelos coordenadores e dire-tores das escolas. Agradecemos a todos eles pela confiana e pelo privilgio da parceria pedaggica.

    Relembramos que, na edio de outubro, Mundopublicar a redao vencedora, com os comentrios da

    banca examinadora. Em novembro, todas as escolas assinantes de Mundorecebero os Cadernos de Pangea,contendo as dez redaes melhor classificadas, todas elas comentadas.A banca examinadora ser coordenada pela professora Flora Christina Bender Garcia,

    professora de Lngua e Literatura e Doutora em Lngua Comparada pela USP. Ela autora de livros de crtica de cinema e literatura e trabalha em projetos de atualizao deprofessores da rede pblica estadual.

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    AGOSTO 2009

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    NOHCERTEZADEQUE PRODUZIU-SEUMAFRAUDE MONUMENTAL NA ELEIO PRESIDENCIAL

    IRANIANA DEJUNH O. MAS EXISTEM INDCIOS DI-VERSOSDEQUE ALGO ASSI MPOSSATEROCORRIDO(VEJAAMATRIAPG . 6). LOGO APS ADIVUL-GAODOS RESULTADOS, OCANDIDATOOPOSICIO-NISTAHOSSEINMOUSAVIGRITOU FOGO! EEXI-GI UAAN UL A O DO PLEITO. O AI ATO L ALIKHAMENEI , L D ER SU P R E M O DO REGI METEOCRTICO IRANIANO E PATROCINADOR OCULTODOEMPREENDIMENTODEREELEIODEMAHMOUDAHMADINEJAD DETERMINOU UM A RECONTAGEMPARCIALDEVOTOS, PARASALVARAFACEDOREGI-

    ME. SIMULTANEAMENTE, BEMLONGEDOIR, OPRE-SIDENTELULAESEU MINISTRO DOEXTER IORCEL-SOAMORIMDECLARARAMQUE ASRECLAMAESDEMOUSAVI NO PASSAVAM DE UM ESPERNEIO DOSDERROTADOS.

    E D I T O R I A L

    O AMIGOBRASILEIRO

    meiro satlite fabricado pelo homem, paraobter dados geofsicos sobre a Terra. Maso Sputnik-1 foi lanado antes. Parecia aprova de que os comunistas eram capazesde derrotar o capitalismo.

    E as coisas no pararam por a. Umms depois, em novembro de 1957, ossoviticos lanaram o Sputnik-2, um sa-tlite de meia tonelada, capaz de trans-portar a cachorrinha Laika, que suposta-

    mente permaneceu viva dez dias no espa-o, acoplada a instrumentos para medirsua presso arterial, batimento cardaco eoutras reaes neurofisiolgicas. A men-sagem era clara: os comunistas haviamconseguido tomar a dianteira dos EstadosUnidos na corrida espacial.

    Para compreender, hoje, o tremendoimpacto psicossocial causado pelas proe-zas soviticas na poca, refletido nas man-chetes dos grandes jornais, basta pensar

    que a conquista do espao (e o eventualencontro com ETs) faz parte do imagin-

    rio humano desde sempre, como atestamo mito de caro e, no perodo moderno, afico de Jlio Verne e H. G. Wells. Ou,ainda mais recentemente, a famosa trans-misso ficcional de rdio feita pelo cine-asta Orson Welles, que causou pnico nosEstados Unidos, em 1938, ao denunciar ainvaso da Terra por marcianos, enredo dolivroA guerra dos mundos, de H.G. Wells.Para alm dos significados cientfico e

    militar, a corrida espacial era um com-ponente central da disputa ideolgica nombito da Guerra Fria.

    claro que os Estados Unidos nopoderiam tolerar a desmoralizao inici-al. Eles tinham que reagir logo, e fizeramisso. Em dezembro de 1957, tentaram oseu primeiro lanamento. Menos de umsegundo depois de decolar, o sistema com-posto pelo foguete e satlite caiu e explo-diu. Em janeiro de 1958, os americanos

    finalmente conseguiram colocar em rbi-ta o satlite Explorer. Pesava meros 13,6

    quilos e levava instrumentos para medir

    raios csmicos, temperatura e colises demicrometeoritos.Mas em abril de 1961, de novo a Unio

    Sovitica pregaria um grande susto nos Es-tados Unidos, colocando em rbita ocosmonauta Iri Gagarin. A Casa Brancareagiu com fora: em maio, o presidente

    John Kennedy prometeu que, no prazomximo de uma dcada, um astronautaamericano pisaria na Lua. O pouso de

    Armstrong foi o resultado dessa promessa.Os soviticos seguiram outro caminho. Pre-feriram evitar o confronto direto, envian-do apenas robs e mquinas em suas mis-ses lunares. Assim, em 1966, o fogueteLuna-9 pousou na superfcie da Lua. Atra-vs de veculos monitorados a partir da Ter-ra, os soviticos colheram vrias amostrasdo satlite.

    Se a corrida espacial refletiu o augedas tenses entre as superpotncias, tam-bm serviu para fazer propaganda dadistenso. Em julho de 1975, astronau-

    tas e cosmonautas, americanos e soviti-cos, acoplaram suas naves e se encontra-ram em pleno espao, num ponto situadosobre o Atlntico, a mil quilmetros dacosta de Portugal. Durante dois dias, astripulaes das duas naves realizaram cin-co experimentos cientficos e se visitarammutuamente. A experincia foi um abso-luto sucesso.

    Novamente, aquilo que na aparnciaera pura cincia, no mundo real servia aos

    propsitos do jogo da Guerra Fria.

    O CUOLIMITE

    LULA E AMORIM REPETEM INCANSAVELMENTE,QUANDOINDAGADOSSOBREDITADORESEVIOLAESDE

    DIREITOSHUMANOS, QUE RESPEITAMAAUTONOMIA DOSPASES ESTRANGEIROS E NO INTERFEREMEM PROCESSOSPOLTICOS INTERNOS. NO CASO IRANIANO, PREFERIRAMIMISCUIR-SENAPOLMICAELEITORALINTERNA, NOPARAPEDIRRESPEITODEMOCRACIAOUAOSDIREITOSDAOPO-SIO, MAS PARA RESPALDAR UMRESULTADOALTAMENTESUSPEITO. NESSECASO, FORAMMAISFUNDAMENTALISTASQUEOPRPRIOAIATOL, QUEAOMENOSFINGIADAROU-VIDOSOPOSIO.

    AHMADINEJAD, EMVIAGEMAOEXTERIORNAHORAEMQUECOMEARAMOSPROTESTOS, COMPAROU-OSACON-

    FLITOSENTRETORCIDASDEFUTEBOL. HORASMAISTARDE,COMOSEFOSSEUMBONECODEVENTRLOQUODOIRANIA-NO, LULADESCREVEUOSEVENTOSDETEERCOMOUMACOISA ENTRE FLAMENGUISTAS E VASCANOS. ESTPIDO EIMORAL, OCOMENTRIOVEICULAVAUMAPOIOINCONDICI-

    ONALAOPODERQUEREPRIMIAOSPROTESTOS, PRENDIAOPOSITORESECENSURAVAMEIOSDECOMUNICAO.

    AOLONGODOSDIAS, ENQUANTOAREPRESSOFAZIASEUSERVIONOIR, OLDERSUPREMOEOPRE-SIDENTEAHMADINEJAD ELABORAVAMA TESE DE QUETUDONOPASSAVADEUMCOMPLARMADOENTREAOPOSIOINTERNAEASPOTNCIASESTRANGEIRAS. DOBRASIL, PELABOCADELULA, SURGIUAFRASE: VOCTEMUMAELEIOEMQUEOCIDADOTEM62% DOSVOTOS. A OPOSIONOSECONFORMA(...), MASOPOVO NO PODECONTINUAR SENDOVITIMADOPELAIRRESPONSABILIDADEDOSAGENTESPOLTICOS. O RA-CIOCNIOSINUOSOTEM,APESARDETUDO, UMSIGNIFI-

    CADO: OPRESIDENTEBRASILEIROESTAVAATRIBUINDOAUMAOPOSIOIRRESPONSVELARESPONSABILIDADEPELASVIOLNCIASCOMETIDASCONTRAOSMANIFESTAN-TES. ODIAGNSTICOTPICODASDITADURAS, SEMPREQUESEVEEMCONFRONTADASCOMASRUAS.

    NASAkennedySpaceCenter(NASA-KSC)

    NASAHeadquarters(NASA-HQ-GRIN)

    um pequeno passo para um homem,

    mas um salto gigantesco para a humani-dade, proclamou Neil Armstrong, co-mandante da nave espacial Apolo-11,h 40 anos, no 20 de julho de 1969, dian-te dos olhos de centenas de milhes detelespectadores que assistiram, ao vivo, aoprimeiro pouso do ser humano na Lua. Afamosa frase de Armstrong era a expres-so perfeita da Guerra Fria que, durantequase cinco dcadas, ops os blocos geo-polticos liderados pelos Estados Unidose Unio Sovitica. Na aparncia, o feitoera celebrado como uma conquista dahumanidade; no mundo real, era umaprova da superioridade cientfica e militardo bloco capitalista.

    A explorao do espao defin idacomo a investigao do universo alm doslimites da atmosfera da Terra, mediante ouso de satlites, foguetes, robs e estaesorbitais teve incio em outubro de 1957,quando a Unio Sovitica lanou o pri-meiro satlite em rbita da Terra, o

    Sputnik-1. Era um aparelho rudimentar,uma esfera de alumnio de 58 centme-tros de dimetro, que pesava 84 quilos eportava apenas um termmetro e umtransmissor de rdio.

    Aquele pequeno instrumento colocouo bloco capitalista em polvorosa. Ataquela data, a propaganda americana des-crevia o mundo comunista como atrasa-do no campo cientfico. Em tom de su-perioridade, o presidente Dwight Eisenho-

    wer havia anunciado, em junho de 1955,que os Estados Unidos lanariam o pri-

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    2009 AGOSTO

    A

    DOSNORDESTES AONORDESTE

    Sergipe do espao nordestino. Os dois estados seriamincludos no Nordeste apenas na diviso regional de 1969(veja o Mapa).

    A concentrao da atividade industrial no Sudeste,marca crucial das dinmicas espaciais do Brasil no sculo

    XX, agravou a dependncia econmica do Nordeste eacentuou os fluxos migratrios interregionais. A Supe-rintendncia do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene),uma agncia federal, foi criada em 1960 com a meta deamenizar esse desequilbrio.

    A estratgia principal da Sudene dava nfase indus-trializao do Nordeste, com base em recursos obtidosatravs de incentivos fiscais e financeiros e tambm porinvestimentos estatais destinados a ampliar a infraestru-

    tura viria e energtica da regio. No setor agropecurio,a Sudene objetivava promover reformas que levassem ampliao da produo, atravs da utilizao de tcnicasmodernas, especialmente de irrigao no semirido e daintroduo de mudanas na estrutura fundiria da Zonada Mata. Acreditava-se que essas medidas contribuiriampara mudar o perfil social da regio.

    Extinta em 2001 e recriada em 2007, a Sudene pro-moveu a diversificao da estrutura industrial, com nfa-se no setor de bens intermedirios, em detrimento dosbens de consumo no durveis, anteriormente o princi-

    pal setor industrial. Quanto agropecuria, algumas re-as apresentaram significativa modernizao, sobretudo

    noo espacial do que chamamos hoje de Nordeste recente, datando do sculo XX. Desde o perodo coloni-al existiram vrios nordestes, reas com caractersticasgeoeconmicas bastante diferenciadas e que mantinhamescassas relaes entre elas.

    O primeiro destes nordestes teve como base a cul-tura canavieira, atividade que se espalhou pela faixa lito-

    rnea dos atuais estados de Pernambuco, Paraba, RioGrande do Norte e Alagoas e tinha em Recife seu prin-cipal polo urbano. Com o tempo, foram se organizandooutras regies com caractersticas econmicas e sociaisdiversas. Na Bahia, constituiu-se um espao regional po-larizado por Salvador, que era sede do Governo Geral.No Cear e Piau, predominavam atividades ligadas pe-curia rudimentar e ao extrativismo, enquanto oMaranho estava vinculado aos processos de expansodo povoamento da Amaznia. No fim do sculo XVII, onordeste aucareiro entrou numa longa e contnua de-

    cadncia. Quase ao mesmo tempo, emergiu no Sertosemirido uma regio econmica baseada na cultura doalgodo e na pecuria extensiva.

    Na segunda metade do sculo XIX, com o desenvol-vimento da pequena agricultura comercial e o crescimentode cidades na regio do Agreste, diferenciaram-se aindamais as estruturas geoeconmicas e sociais. No incio dosculo XX, estruturou-se no sul da Bahia o nordeste ca-caueiro, polarizado pelas cidades de Itabuna e Ilhus.

    Ao longo de quatro sculos, essas evolues econ-micas deixaram como herana enormes desigualdadessociais, uma estrutura fundiria marcada pelo predom-nio do latifndio, especialmente nas regies canavieiras eno Serto, e o enraizamento do poder de oligarquias re-gionais. As oligarquias nordestinas preservaram seus in-teresses mesmo aps a abolio da escravido, ingressan-do no perodo republicano como elites regionais secun-drias. O Nordeste configurou a principal rea repulsorade populao do pas. Nos sculos XIX e XX, milhes denordestinos migraram e no s das reas atingidas pe-las secas rumo a outras regies, buscando escapar damisria e erguer um futuro diferente para seus filhos.

    No sculo XX, a regio tornou-se uma pea-chave nas

    polticas de planejamento regional postas em prtica peloEstado brasileiro. Num primeiro momento, quando se acre-ditava que a pobreza endmica da regio devia ser explicadaexclusivamente pelas secas, fornecer gua para as popula-es do semirido figurou como objetivo principal. A oli-garquia sertaneja apropriou-se da poltica hidrulica, ba-seada na construo de audes e canais com recursos fede-rais, o que deu origem chamada indstria da seca.

    O Nordeste passou a ser encarado, efetivamente, comouma unidade regional apenas a partir da dcada de 1930,quando a marcha da industrializao estimulou as polti-

    cas de integrao nacional. Mesmo assim, a primeira re-gionalizao oficial do Brasil, de 1946, exclua a Bahia e

    aquelas em que se desenvolveram as tcnicas de irrigaoe de valorizao das reas de cerrado. Mas a reforma agrriana Zona da Mata no ocorreu. O setor servios, especial-mente nas capitais estaduais, passou a ter maior impor-tncia e o turismo cresceu muito.

    Na dcada de 1990, com a abertura da economia bra-sileira, novas formas de interveno na regio foram de-senvolvidas. As condies econmicas, num mundo cadavez mais globalizado, fizeram com que os investimentosindustriais fossem destinados ao setor de bens no dur-veis (tecidos, vesturio, calados), na tentativa de apro-veitar as vantagens comparativas decorrentes dos baixoscustos da mo de obra regional. No setor agrcola, as aten-es se voltaram para os novos centros produtores de frutas

    da regio do semirido. No setor de servios, o turismorecebeu prioridade, atravs do apoio a empreendimentoshoteleiros, principalmente na faixa litornea.

    Hoje, existem focos de dinamismo econmico ao ladode reas onde sobrevivem as arcaicas estruturas tradicio-nais. Nestas, o processo de modernizao, quando ocor-reu, foi espacialmente seletivo e restrito, permitindo queas oligarquias criassem sucessivos mecanismos de preser-vao. Nesses espaos resistentes s mudanas, persistemos velhos esquemas da dominao oligrquica, que sefundamentam na injusta estrutura fundiria e no con-

    trole do acesso gua.

    Industrializao e planejamento regional unificaram os antigos nordestes numa regio cuja dinmica dependedos investimentos do Centro-Sul e da globalizao

    BRASIL

    Estados daRegio Nordeste

    Estados doNordeste atual eque fizeram parteda extinta regioleste at 1969

    OCEANOATLNTICO

    BAHIA

    MINAS GERAIS

    ES

    GOIS

    TOCANTINSSERGIPE

    ALAGOAS

    PERNAMBUCO

    PARABA

    RIO GRANDEDO NORTE

    CEAR

    PIAU

    MARANHO

    PAR

    A Regio Nordeste em dois tempos

    A cultura do cacau, celebradaem romances de Jorge Amado,

    um dos cones do Nordesteagrrio tradicional

    Coleoparticular-cercad

    e1820

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    PANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDO

    AGOSTO 2009

    5

    Na tradio da Geografia regional do Brasil, o Nordes-te possui quatro unidades subregionais: Zona da Mata,Agreste, Serto e Meio-Norte (Transio para a Amaz-nia). Os nomes indicam que o critrio utilizado na ope-rao de regionalizao sofreu forte influncia da anlisedas caractersticas naturais, em especial as climato-bot-nicas, e das atividades econmicas histricas (veja a ma-tria pg. 4). Entretanto, nas ltimas dcadas, o Nor-deste sofre os impactos do processo de globalizao e co-nhece profundas transformaes econmicas. Tais mu-

    danas solicitam uma nova diviso sub-regional, capazde captar o dinamismo recente e o carter mais comple-xo e diferenciado de todo o espao regional.

    Diante do anacronismo da diviso tradicional, com baseem dados e estudos do Instituto Brasileiro de Geografia eEstatstica (IBGE) e do Instituto de Pesquisa Econmica Apli-cada (IPEA), rgos do governo federal elaboraram uma novadiviso sub-regional. A proposta no deixou de levar em con-ta os critrios climato-botnicos, expressos pela permannciaparcial dos nomes Mata, Agreste e Serto. Mas ela acrescen-tou outros, como a subregio do Cerrado, e articulou tam-

    bm o fator hidrogrfico, ressaltando o papel dos rios SoFrancisco e Parnaba, que funcionam como elementos de iden-tificao de espaos sub-regionais. O resultado so nove regi-es geoeconmicas: Litoral-Mata, Pr-Amaznia, Parnaba,Serto Setentrional, Serto Meridional, So Francisco, Agres-te Oriental, Agreste Meridional e Cerrado (veja o Mapa).

    O Litoral-Mata abrange reas de todos os estados,numa faixa que engloba a antiga Zona da Mata mais olitoral setentrional do Nordeste. Ela compreende quasemetade da populao regional, a mais importante dassub-regies e gera quase dois teros do PIB nordestino(veja a Tabela). Nesta rea localizam-se todas as capitaisnordestinas, com exceo de Teresina, e tambm as mai-ores concentraes urbano-industriais inclusive Salva-dor, Recife e Fortaleza, as trs maiores regies metropoli-tanas. O turismo a atividade responsvel pela atraode um nmero cada vez maior de pessoas e figura, aolado de expressivos investimentos externos, como fontedo dinamismo econmico. A poro baiana do Litoral-Mata, onde esto o Plo Petroqumico de Camaari e oDistrito Industrial de Aratu, abriga quase 13% da popu-lao e gera mais de 20% do PIB regional.

    A Pr-Amaznia se estende pela poro oeste do

    Maranho e corresponde em grande parte ao antigoMeio-Norte. Ela abriga cerca de 6% da populao e pro-duz pouco mais de 3% do PIB regional. A baixa densida-de econmica da rea poder ser dinamizada atravs daagricultura diversificada de gros, fruticultura tropical(caju) e da recuperao e manuteno de pastagens. Htambm possibilidades relacionadas implantao deindstria florestal moderna e sustentvel. A sub-regioParnaba abrange reas do Maranho e o Piau. umadas menores sub-regies, concentra 4,6% dos nordesti-nos e seu PIB equivale a pouco mais de 3% do total. O

    principal ncleo da rea Teresina, principal aglomera-o urbano-industrial do interior nordestino.

    O Serto Setentrional a mais extensa das sub-regi-es, estendendo-se por reas de todos os estados, exce-o do Maranho, Bahia e Sergipe. a segunda sub-re-gio mais populosa e gera o segundo maior PIB regional(8,3%). Existe na rea uma clara dist ino entre os no-vos e velhos Sertes. Os primeiros esto representa-dos, por exemplo, pelas cidades cearenses de Sobral eCrato, onde se localizam modernas indstrias de cala-dos. Os segundos, pela agricultura e pecuria extensiva,atividades tradicionais do semirido.

    O Serto Meridional compreende apenas reas da Bahiae Sergipe. A sub-regio concentra pouco menos de 6% dapopulao e seu PIB no chega a 3% do total do Nordeste.

    A sub-regio do So Franciscoabrange reas da Bahia, Pernam-buco, Sergipe e Alagoas. Abriga 4%da populao e seu PIB equivale a3,6% do total regional. Economi-camente, uma das sub-regiescom maior crescimento recente. Afruticultura irrigada de alto nveltecnolgico tem nas cidades g-meas de Juazeiro (BA) e, princi-

    palmente, Petrolina (PE) seus n-cleos mais importantes. Pernambu-co se tornou o segundo maior pro-dutor de vinho do pas.

    O Agreste Oriental a me-nor das sub-regies, projetando-se por reas do Rio Grande doNorte, Paraba, Pernambuco e

    Alagoas. a terceira mais popu-losa e responsvel por mais de 5%do PIB nordestino. Campina

    Grande (PB) e Caruaru (PE), ascapitais do Agreste, com suasindstrias txteis e de calados ecentros avanados de pesquisas,destacam-se como os mais im-portantes ncleos urbanos. J o

    Agreste Meridional se estende porparte dos estados de Sergipe eBahia. Na sub-regio se encon-

    tra quase 8% da populao e seu PIB equivale a 5,7% dototal regional. Nesta rea, destacam-se as cidades baianasde Feira de Santana e Vitria da Conquista.

    A sub-regio do Cerrado abrange reas da Bahia,Maranho e Piau. a segunda maior em extenso, a menospopulosa, e a que possui menor participao no PIB (2,8%).Paradoxalmente, apresenta os maiores ritmos de crescimen-to nos ltimos anos. A expanso da cultura mecanizada degros, especialmente soja e milho, acompanhada pela cria-o de bovinos, decorre da ao de empresrios rurais trans-feridos do Sul e do Sudeste. As cidades de Barreiras e LuizEduardo Magalhes, na Bahia, Elizeu Martins, no Piau, eBalsas, no Maranho, so os plos dessa rea.

    REVISITANDOONORDESTEBRASIL

    O Nordeste tradicional desaparece aos poucos, dando lugar a uma regio mais complexa e dinmica.Um novo mapa tenta captar os sentidos da mudana

    INDICADORES DAS SUB-REGIES GEOECONMICAS DO NORDESTESub-regio rea (%) Populao (%)*1 PIB (%)*2 Cresc. PIB (%)*3Litoral-Mata 13,7 46,9 64,9 4,5Pr-Amaznia 10,2 5,7 3,3 4,1Parnaba 6,4 4,6 3,3 5,1Serto Setentrional 21,9 15,1 8,3 3,8

    Agreste Oriental 3,3 8,3 5,2 3,3So Francisco 9,8 4,0 3,6 5,6

    Agreste Meridional 6,0 7,7 5,7 3,6Serto Meridional 11,7 5,7 2,9 3,2Cerrado 16,9 2,1 2,8 7,1

    *1 dados de 2007 *2 dados de 2005 *3 mdia anual entre 1970 e 2005Fonte: IBGE, IPEA, citado em Albuquerque, Roberto C., - Na crise global como ser o melhor dos BRICs, Elsevier, So Paulo, 2009

    Regies Geoeconmicas do Nordeste

    Litoral-mata

    Pr-amaznia

    Parnaba

    Sero setentrional

    Agreste oriental

    So Francisco

    Agreste meridional

    Serto meridional

    Cerrado

    OCEANOATLNTICO

    BAHIA

    MINAS GERAIS

    ES

    GOIS

    TOCANTINS SERGIPE

    ALAGOAS

    PERNAMBUCO

    PARABA

    RIOGRANDEDONORTE

    CEAR

    PIAU

    MARANHO

    PARSo Luis

    Teresina

    Fortaleza

    Natal

    J.Pessoa

    Recife

    Macei

    Aracaj

    Salvador

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    MUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEA 6

    2009 AGOSTO

    Q

    COMEOUASEGUNDA

    margem similar de votos. Mehdi Karroubi,um terceiro candidato, tambm oposicio-nista, teria conseguido meros 330 mil vo-tos, contra mais de 5 milhes quando con-correu em 2005. Os partidrios deMousavi viram cortados os servios de te-lefonia e mensagens de texto com os quaisacompanhariam as apuraes.

    Logo, a revolta popular adquiriu di-nmica prpria, escapando ao controle daslideranas polticas e ameaando a ordem

    autoritria dos clrigos. Os distrbios es-palharam-se como um rastilho de plvo-ra, para alm dos limites da capital. Mas apolcia e a Guarda Revolucionria reagi-ram violentamente, obedecendo ao co-mando de Khamenei. Ouvi disparos re-petidamente enquanto as pessoas entoa-vamAllahu Akbar(Deus grande) na re-gio de Niavaran, testemunhou um ha-bitante de Teer no 15 de junho, enquan-to helicpteros da polcia sobrevoavam acapital, milicianos alvejavam manifestan-tes e jornalistas enganavam a censura trans-mitindo fotos via Twitter. A imprensa es -trangeira foi proibida de cobrir os protes-tos, altas lideranas oposicionistas recebe-ram ordens de priso e, dias depois, as ma-nifestaes perderam intensidade. Contu-do, nada ser como antes.

    O Ir almejou ser Ocidente entre 1925e 1979, durante a dinastia Pahlevi. Numponto intermedirio dessa trajetria, em1953, um compl tramado nos Estados

    Unidos derrubou o primeiro-ministro na-cionalista Mohammed Mossadegh, quecontestava o controle ocidental sobre asreservas petrolferas do pas. Ento, o x(imperador) Reza Pahlevi alinhou-se com

    Washington e consolidou um regime au-tocrtico apoiado no servio secreto. A Re-voluo Iraniana de 1979 no foi unica-mente, como diz a lenda, um movimentode reao contra o Ocidente e ocosmopolitismo moderno. O levante po-

    pular que derrubou o x e destruiu a mo-narquia teve um componente desse tipo,

    (...) OISL, COMOTODASASGRANDESRELIGIESPIEDOSAS, TEMOPOTENCIALDERESPONDERAOSDILEMASEPERPLEXIDADESDOSSERESHUMANOS, EMDIFERENTESCIRCUNSTNCIASEPOCAS. MASATRAGDIAEMERGEONDEUMA

    INTERPRETAOHUMANADARELIGIOAPRESENTA-SECOMOATOTALIDADEDARELIGIOEQUANDO, INDIFERENTESMUDANASQUEOCORREMNAVIDA, ASVELHASVESTIMENTASMUITOESTREITASPARAOCORPODASALMASEVIDASDAS

    PESSOASSOIMPOSTASAELASCOMOUMEDITOSAGRADO. (...) SONUMEROSOSOSEXEMPLOSAOLONGODAHISTRIADOCONFRONTOENTREOQUESEASSUMESERARELIGIOEOPENSAMENTO, QUETEMUMANATURALINCLINAOPARAA

    LIBERDADEECRESCENUMAMBIENTELIVRE.

    (MOHAMMADKHATAMI, CONFERNCIAPERANTEASOCIEDADEISLMICADAAMRICADONORTE, CHICAGO, 2 DESETEMBRODE2006)

    uando mais de um milho de manifes-tantes tomaram as ruas de Teer, a 15 de

    junho, trs dcadas depois da RevoluoIraniana de 1979, ficou claro que uma po-ca se encerrava e uma outra se iniciava. ARepblica Islmica instalada no antigoImprio Persa pode no desabar nos prxi-mos meses, ou at anos, mas os compo-nentes republicano e teocrtico do Estadoiraniano separaram-se irreversivelmente e a harmonia no ser restaurada.

    Tudo comeou com um processo eleito-ral pouco inspirador. Sob a persuasiva influ-ncia do Lder Supremo, o aiatol AliKhamenei, o ex-presidente reformistaMohammad Khatami desistiu de concorrer,dando lugar ao pragmtico e apagadoHossein Mousavi. Nada indicava que o can-didato oposicionista seria capaz de desafiarseriamente a prevista reeleio de Mahmoud

    Ahmadinejad, o radical populista patroci-nado discretamente por Khamenei.

    Mas, aos poucos, os comcios deMousavi encheram-se de jovens e mulhe-res, no s na capital como nas cidades dointerior, e se converteram em focos cadavez maiores de contestao do autoritaris-mo do regime e dos abusos da GuardaRevolucionria e da polcia de costumes.O oposicionista ganhou o suporte deKhatami e dos assessores do antigo presi-dente, bem como de um outro ex-presi-dente, Hashemi Rafsanjani, que chefia a

    Assemblia de Especialistas, o rgo en-carregado de escolher o Lder Supremo.Nas ruas e nas instituies de Estado, umaciso irreparvel se desenhava.

    Na hora da apurao, todos esperavamum resultado dividido mas, com veloci-dade surpreendente, um comit eleitoralcontrolado por partidrios de Ahmadine-

    jad anunciou a reeleio do presidente porlarga margem. Segundo os resultados ofi-ciais, ele teria conquistado 24 milhes devotos, contra 13 milhes de Mousavi. O

    oposicionista denunciou, de imediato,uma fraude eleitoral de propores quaseinconcebveis. De fato, uma fraude nor-mal no poderia inverter a direo demais de 15% dos votos.

    A acusao do oposicionista de queo regime promoveu uma mgica. Nolugar da totalizao dos votos, o comitsimplesmente teria lanado resultados fi-nais arbitrrios. Uma srie de indciosinconclusivos sustentam a acusao.

    Mousavi teria perdido em todos os luga-res, inclusive em sua regio natal, por

    personificado pela liderana carismtica doaiatol Ruhollah Khomeini. Mas teve umoutro componente, nacionalista e demo-crtico, que reivindicava a restaurao daConstituio de 1906, expresso do pro-

    jeto histrico de conciliao entre o Isl eas liberdades polticas numa Prsia embusca do seu lugar na modernidade (veja

    a matria pg. 7).Repblica Islmica os dois termos

    do nome do Estado instaurado em 1979exprimiam o equilbrio entre os compo-nentes republicano e teocrtico da Revo-luo. Mas, na cena poltica iraniana, oequilbrio durou apenas pouco mais de umano, at a deposio parlamentar de BaniSadr, o primeiro presidente do novo Ir.Depois, o componente teocrtico tornou-

    se hegemnico, sufocando os anseios de-mocrticos originais.

    IR

    Em 10 defevereiro de1979, oaiatolRuhollahKhomeinifoi aladoao poderpelarevoluo

    quederrubou oditadorRezaPahlevi, emnome deum regimequeprometia arestauraoda

    constituiode 1906,expressodo projetohistrico deconciliaoentre o isle asliberdadespolticas

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    PANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDO

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    O ISLEALIBERDADE

    REVOLUOIRANIANA

    Contudo, nada simples no Ir. As instituies po-lticas do pas continuam a refletir, de modo enviesado,a aliana que fez a Revoluo. O poder de Estado, de-rivado da vontade divina, concentra-se no Lder Su-premo, que assessorado pelo Conselho de Guardies.Uma Assemblia de Especialistas, constituda por ju-ristas islmicos eleitos a partir de uma lista elaboradapelo Conselho de Guardies, tem a prerrogativa de es-colher o Lder Supremo. Por outro lado, o poder degoverno, derivado da vontade popular, concentra-seno presidente e no parlamento. A soberania do povo,porm, limitada pela prerrogativa do Conselho de

    Guardies de vetar candidaturas.A segunda Revoluo Iraniana, deflagrada no 15 de

    junho, uma revoluo na revoluo. Uma larga parcelada populao urbana reivindica a soberania popular inte-gral. A fora do movimento escava um golfo entre a elitereligiosa, separando os conservadores dos reformistas. Arepresso violenta ameaa esmagar o componente republi-cano do Estado, destruindo a harmonia instvel que per-durou por trs dcadas. O Ir est diante de uma encruzi-lhada: no pode seguir sendo uma repblica e uma teocracia.

    A crise aberta na eleio presidencial tende a se prolongar.

    Mas no se fechar sem um desenlace decisivo.

    O governo da elite religiosa instalado pela Revo-luo Iraniana, h trs dcadas, s na aparncia re-presentava uma restaurao da tradio islmica. Nopassado, durante sculos, os ulems(sbios cornicos)imaginaram que deviam exercer uma influncia so-bre os dirigentes polticos, mas no pretenderam subs-titu-los no poder de Estado. Como explica AlbertHourani, era perigoso ligar os interesses eternos do

    Isl ao destino de um governante transitrio do mun-do. Mas isso exatamente o que acontece hoje, numIr dilacerado pela aliana entre o Lder Supremo eum presidente demagogo e autoritrio.

    O ex-presidente reformista Mohammad Khatamialertou muitas vezes para o risco de sufocamento daliberdade pelo fundamentalismo religioso. O contro-le do parlamento e da prpria presidncia pelas insti-tuies do poder teocrtico envenena as relaes po-lticas em toda a sociedade iraniana. As violncias daGuarda Revolucionria e da polcia de costumes

    contra jovens, mulheres e dissidentes em geral expri-mem o apodrecimento de um sistema de poder queresiste modernidade. Mas a reao popular a essesistema no representa uma ruptura com o Isl.

    As manifestaes oposicionistas que acompanharamo processo eleitoral iraniano evidenciam uma clara cons-cincia do direito de resistir a um mau governo. A idiade liberdade no um monoplio do Ocidente.

    As idias polticas ocidentais sobre o Isl forammoldadas, em grande parte, pelo historiador britni-co Bernard Lewis. O prncipe dos orientalistas de-finiu seu ponto de vista h mais de meio sculo, estu-dando os arquivos do Imprio Otomano. Desse mer-gulho no Isl medieval e moderno, emergiu a convic-o de que h algo de fundamentalmente errado nacultura muulmana um pecado original irremovvel,

    uma resistncia essencial mudana que condenouos muulmanos excluso da modernidade.

    Em 1990, fiel sua interpretao original, Lewisescreveu um ensaio no qual cunhou a expresso cho-que de civilizaes, que seria apropriada por SamuelHuntington e convertida em credo poltico dos neo-conservadores americanos. No por acaso, nos Esta-dos Unidos, a chamada Doutrina Bush foi batizada,no ambiente acadmico, como Doutrina Lewis.

    O historiador opera com categorias fixas, que desa-fiam a histria. Na sua viso, Isl e Ocidente colidem

    desde o sculo VII, quando foi erguido um ImprioIslmico, sobre a base das conquistas de Maom e dosquatro primeiros califas. Na sua perspectiva, Isl e Oci-dente configuram entidades definidas pela cultura e asalvao do primeiro residiria na negao da sua es-sncia, pela adoo dos valores do segundo. O Oci-dente, sob os impactos da Reforma Protestante e doIluminismo, adotou o individualismo e aprendeu o sig-

    nificado da liberdade. O Isl, isolado dessas revoluesmentais, seria uma relquia, incapaz de se desprenderda vida comunitria tradicional e do domnio da reli-gio sobre as esferas da poltica e do direito.

    A doutrina ocidental do direito de resistir a ummau governo estranha ao pensamento islmico afrmula de Lewis distorce a compreenso tanto doOcidente quanto do Isl. A doutrina do direito de

    resistir no emanou magicamente do Iluminismo, poisj estava contida no Cristianismo original. O Isl ori-ginal tambm expressou a legitimidade da revolta, quese dirigia contra os senhores da guerra da pennsulaarbica. No Coro, est escrito que obrigao dofiel combater pela causa daqueles que, por serem fra-cos, so homens, mulheres e crianas maltratados (eoprimidos), e clamam a Nosso Deus que os resgatemdessa cidade dos opressores.

    O Isl de Lewis uma caricatura despida de his-tria e tenso. O orientalista ignora, propositalmen-

    te, os reformadores que, ao longo de sculos, contes-taram os dogmas emanados de uma adeso literal aostextos religiosos. Na Prsia, em 1906, uma revoluoconstitucionalista implantou um regime poltico ba-seado na liberdade, que foi destrudo precisamentepela dinastia ocidentalizante dos Pahlevi. essa tra-dio que inspira uma corrente de reformistas no Irreinventado pela revoluo de 1979.

    Em 13 de junho de 2009, o anncio da vitria do presidente Mahmud Ahmadinejad, candidato

    reeleio, sobre o seu principal oponente, Hossein Mousavi, por 65% a 32,6% dos votos, permitiu aecloso das tenses na sociedade iraniana

    GabrielDuval/AFP

    AttaKenare/AFP

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    B

    IREMERGECOMONCLEOGEOPOLTICO

    DEUMAREGIOESTRATGICA

    ero da civilizao persa, o Ir umadas sociedades mais complexas do mun-do. No entanto, sob a forte impresso daRevoluo Islmica de 1979, a maioria dos

    ocidentais ainda v o pas atravs das len-tes embaadas da Guerra Fria: umateocracia obscurantista e incendiria, ob-cecada em desestabilizar seus vizinhos e,assim como outro integrante do eixo domal, a Coria do Norte, determinada aestender seus tentculos na regio atravsda construo de um arsenal nuclear. Arepresso aos protestos que abalaram aRepblica Islmica depois da fraude quegarantiu a reeleio do presidente

    Mahmoud Ahmadinejad, em junho, s fezreforar uma percepo de que o regimedos aiatols irreformvel por meios pa-cficos e que somente a sua derrubadamanu militaripoder trazer estabilidade regio, como defendiam os neoconserva-dores de George W. Bush.

    Mas quem, despojando-se de viseirasideolgicas, dispuser-se a debruar-se so-bre um mapa do Sudoeste Asitico, ima-ginando-se um iraniano, poder entenderque o comportamento agressivo de Teer

    ditado por uma sensao de inseguranageopoltica. O Ir est cercado por inimi-gos por todos os lados de suas fronteiras:do lado ocidental, o Iraque, ocupado des-de 2003 por tropas americanas; do ladooposto, o Afeganisto, parcialmente ocu-pado por foras da OTAN e o Paquisto,aliado do Ocidente, detentor da bombaatmica sunita e de onde partem vriasoperaes encobertas para subverter mi-norias tnicas iranianas. Por fim, se for

    perspicaz, o observador no deixar denotar que os domnios do Ir esto no raiode ao das cerca de 200 ogivas nuclearesde Israel fato conhecido, mas pouco lem-brado quando se fala no perigo de proli-ferao nuclear no Grande Oriente M-dio (veja o Mapa).

    Depois de Israel, o Paquisto o vizi-nho que mais assusta o Ir. Aliados du-rante a Guerra Fria, Teer e Islamabad sedistanciaram com a derrubada do x Reza

    Pahlevi em 1979, a guerra civil no Afega-nisto nos anos 1980 e a consolidao do

    demonstrando um senso de realismo pol-tico incomum. No foi toa que HenryKissinger, o arquiteto da aproximao dosEstados Unidos com a China comunistanos anos 70, elogiou a iniciativa. Mas, comotoda opo realista, esta contm riscos. Emsua aposta diplomtica (...), Obama faloudiretamente aos governantes iranianos, afas-

    tando-se do hbito de Bush de falar ao povoiraniano, passando por cima de seus lde-res, escreveu Robert Kagan, um dosidelogos neoconservadores. Mas essa es-tratgia, diz Kagan, coloca Obama objeti-vamente ao lado dos esforos do governopara um retorno normalidade, aps afraude eleitoral.

    As relaes internacionais sempre fo-ram pautadas pela tica realista de ThomasHobbes (a guerra de todos contra todos),

    no pelo idealismo de Immanuel Kant (apaz perptua). Se o realismo de Obamaconseguir engajar a liderana iraniana emnegociaes que levem o Ir a ter um pa-pel no equilbrio de poder do OrienteMdio, a teocracia se fortalecer mas esseser o preo a pagar pela estabilidade regi-onal. E a democratizao do pas vai de-pender, fundamentalmente, da vontade dopovo iraniano.

    GRANDE ORIENTE MDIO

    poder nuclear paquistans. Com 20% dasua populao sendo xiita, o Paquistosunita ficou alarmado quando o aiatolRuhollah Khomeini ameaou incendiar omundo islmico com sua retrica revolu-cionria. Ainda nos anos 80, o Paquistose aproximou da Arbia Saudita, inimiga

    jurada da teocracia xiita, a pretexto de aju-

    dar os mujahedins (guerrilheiros islmicos)afegos contra os invasores soviticos.

    Depois do 11 de setembro de 2001,pressionado pelos Estados Unidos, oPaquisto deu apoio logstico invaso do

    Afeganisto por tropas da OTAN. Cale-jados, os iranianos adotaram na poca umapostura realista, concitando seus aliadosafegos a apoiar o novo governo pr-oci-dental instalado em Cabul. Em 2002,quando Bush incluiu o Ir no eixo do

    mal ao lado da Coria do Norte e doIraque , os aiatols comearam a se sen-tir aguilhoados por um crculo de ferroamericano. Mas ainda acreditavam quehavia espao de manobra.

    Com a invaso do Iraque pelos america-nos em 2003, o ento presidente do Ir,Mohammad Khatami, jogou a carta da con-ciliao. De acordo com Nicholas Kristoff,editorialista do New York Times, os irania-nos se comprometeram a no desenvolver

    armas nucleares, ofereceram apoio ativopara a estabilizao do Iraque onde 60%

    da populao xiita e, para surpresa demuitos, tambm se comprometeram a cor-tar o apoio material a organizaes terroris-tas palestinas. Isso significava pressionar oHamas palestino a acabar com as aes vio-lentas contra civis em Israel embora noem Gaza e na Cisjordnia e a apoiar a tran-sio do partido xiita libans Hezbollah, en-

    volvido em aes de terror, para uma meraorganizao poltica nacional. Alm disso,Teer garantiria apoio iniciativa da ArbiaSaudita para a criao de um Estado palesti-no ao lado de Israel. Em troca, Teer pedia ofim das sanes econmicas, acesso tecno-logia nuclear para fins pacficos e uma de-clarao de que o Ir no pertencia ao eixodo mal. Como registra Kristoff, a propostafoi rechaada pela soberba de Bush e suaequipe, o que minou o poder dos pragmti-

    cos iranianos e abriu caminho para a vitriado demagogo radical Mahmoud Ahmadi-nejad, em 2005.

    Ao deslocar o eixo da poltica externaamericana no Grande Oriente Mdio doIraque para o cenrio do Afeganisto ePaquisto (Af-Pak, no termo em voga en-tre os militares americanos), o presidenteBarack Obama aposta no Ir como um dosfatores de estabilizao da regio. Reconhe-cendo a interferncia americana no pas

    durante a Guerra Fria, Obama acenou comconversaes com Teer sem precondies,

    Cercado de inimigos por todos os lados, Teer alterna retrica incendiria com pragmatismo.A nova realpolitik de Obama pode fazer do Ir um fator de estabilizao regional

    Cludio CamargoEspecial para Mundo

    Cludio Camargo jornalista e socilogo

    Repblica Xiita

    Potncias regionaisnucleares

    Sob ocupao dasforas dos EUA/OTAN

    Importantes reasde explorao dehidrocarbonetos(petrleo e gs)

    reas de conflitose tensesgeopolticas

    Territrios queescapam ao controledo poder central

    Cenrio estratgico do Grande Oriente Mdio

    TURQUIA

    SRIALBANO

    CHIPRE

    ARMNIA AZERB.

    TURCOMENISTOTAJIQUISTO

    AFEGANISTOI R IRAQUE

    PAQUISTO

    NDIA

    OMEM.AR.UNIDOS

    ISRAEL

    JORDNIA

    ARBIA SAUDITA

    KOWEIT

    0 250 km

    MARCSPIO

    MARVERME

    LHO

    GOLFO

    PRSICO

    OCEANO NDICO

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    cujo contingente demogrfico multipli-cou-se quase cinco vezes no decorrer dosltimos 60 anos (veja a Tabela). A popu-lao que vive na rea da bacia, somadaquelas que so abastecidas pelas guas dorio atravs de canais e aquedutos, comoocorre com as cidades de Los Angeles eSan Diego, estimada em mais de 30 mi-lhes, ou cerca de 10% do total do pas.

    A questo do uso e explorao da guado Colorado suscitou, ao longo do tem-po, dois tipos de situaes hidroconfliti-vas: a primeira, de carter interno, entreos estados americanos drenados pelos riosda bacia; a segunda, entre os EstadosUnidos e o Mxico. No plano interno,presses ligadas a interesses em usufruir

    os recursos hdricos por parte dos vrios

    estados levaram, em 1922, a um plano departilha das guas do rio que, em 1944,envolveu tambm o Mxico (veja o Gr-fico). As demandas de gua provocaram aconstruo de barragens e canais ao longodo curso do rio, que contriburam paragerar riquezas, mas tambm, uma utiliza-o predatria dos recursos hdricos, tor-nando-os cada vez mais escassos.

    O Projeto Big Thomson, no estado doColorado, consistiu na construo de umcanal subterrneo, na cota de 3 mil metrosde altitude, destinado a irrigar as terras daregio de Denver. No estado vizinho do

    Arizona, a barragem Glen Canyoncriou oLago Powell, um reservatrio cujo volu-me de gua representa dois anos do dbi-

    to mdio do rio (veja o Mapa 2).

    Nelson Bacic OlicDa Redao de Mundo

    ASAGA

    DO

    RIO

    COLORADO

    Por conta do processo histrico de

    ocupao humana e valorizao econ-mica do seu territrio, que incluiu aqui-sio, conquista e anexao de terras de

    potncias europias, dos habitantes ori-ginais e do Mxico, os Estados Unidosse tornaram o quarto pas do mundo emextenso. Entre as vantagens naturaisadvindas desse vasto territrio inclui-seum expressivo estoque de recursoshdricos.

    Com cerca de 9,5 milhes de km2,no territrio americano so encontradasalgumas bacias hidrogrficas, como as doMississipi-Missouri e a do So Louren-

    o, que esto entre as mais extensas domundo. Se a bacia do Mississipi inte-gralmente americana, outras so parti-lhadas com os pases vizinhos como o caso das do So Loureno e Colmbia,com o Canad, e da dos rios Grande eColorado, com o Mxico.

    Situada no sudoeste do pas, a baciado Colorado abrange uma rea de632.000 km2, superfcie pouco maior quea da Regio Sul do Brasil. As guas dos

    rios da bacia drenam reas de sete estadosamericanos: Califrnia, Nevada,Colorado Utah, Novo Mxico, Wyominge Arizona. Nos ltimos 80 quilmetrosde seu curso, o Colorado atravessa terrasdo Mxico (veja o Mapa 1). Denomina-do Nilo americano, o Colorado temsuas nascentes nas Montanhas Rochosas,no estado que lhe d o nome, apresentadireo geral nordeste-sudoeste e desguano Golfo da Califrnia, aps percorrercerca de 2,3 mil quilmetros. Seu regime plvionival e a maior parte da rea dabacia apresenta a dominncia de climasridos e semiridos, com chuvas escassase irregulares, fato que no impediu a re-gio de se tornar uma das mais ricas e di-nmicas do planeta.

    Nas ltimas dcadas, os estados dosudoeste dos Estados Unidos, todos elespossuindo parte de seus territrios no in-terior da bacia, viram sua populao cres-cer exponencialmente, como foi o caso

    da Califrnia, o mais populoso do pas,

    Ainda no Arizona, a barragem Hoo-vergerou o Lago Mead, que alimenta odelrio aqutico dos hotis e das pisci-nas particulares da cidade-cassino de LasVegas. O Projeto Arizona Central, umaqueduto de 536 quilmetros, foi cons-trudo para irrigar o osis da regio dePhoenix e fornecer gua potvel para acidade. J o Aqueduto do Rio Colorado,com 387 quilmetros, serve as cidades

    de Palm Springs, Los Angeles e SanDiego, alm de irrigar 200 mil hectaresde terras agrcolas. Por fim, os canaisAll

    American e Coachella foram edificadospara alimentar o Vale Imperial, a maiorsuperfcie irrigada do pas, onde se cul-tivam frutas, legumes, arroz e algodo.

    A sedenta Califrnia no s conso-me as guas que foram destinadas a elapelos acordos de uso como tambm com-pra volumes crescentes de estados vizi-

    nhos que no usam integralmente suascotas. Alm disso, anseia por projetos detransposio de guas vindas de regiese estados exteriores bacia.

    Por muito tempo os Estados Unidosusaram das guas do Colorado tendo emconta exclusivamente uma perspectivanacional e fingindo ignorar que a partefinal do Colorado drena terras mexica-nas. S em 1944 que o governo ameri-cano atendeu s constantes demandas do

    Mxico, que recebia quantidades cadavez menores de gua do rio. O acordoassegurou 1,8 milho de km3de gua porano, mas no tocou no aspecto crucialda qualidade da gua que, ano aps ano,ficava mais salgada e saturada de produ-tos qumicos txicos decorrentes do in-tenso uso de fertilizantes e defensivosagrcolas a montante.

    Em 1973, depois de anos de protestos,os Estados Unidos se responsabilizarampela garantia da qualidade da gua quechegava ao Mxico, construindo uma usi-na de dessalinizao na cidade de Yuma,

    junto fronteira entre os dois pases. Maisrecentemente, um novo problema que afe-ta os vizinhos foi detectado: em virtudeprovavelmente de efeitos do aquecimentoglobal, parte dos glaciares que alimentamo Colorado tm se reduzido bastante.Como o consumo e o desperdcio conti-nuam a crescer, no difcil prever temposdifceis para a regio.

    Srie Geopoltica da gua

    JasonNelson/Stock.xcng

    Wyoming

    Colorado

    NovoMxico

    Nevada Utah

    CalifrniaArizona

    MXICO

    RioCo

    lorado

    RioColorado

    A bacia do Colorado

    CANAD

    EUA

    MX.

    23

    41

    As guas do Colorado

    ColoradoUtah

    Nevada

    Califrnia

    ArizonaNovo

    Mxico

    MXICO

    DenverSalt Lake City

    Sacramento

    So Francisco

    LasVegas

    Phoenix

    Tucson

    Los Angeles

    San Diego

    Yuma

    Golfodo

    Mxico

    OCEANOPACFICO

    BarragemCanal ou aquedutoGrande zona irrigadaTransferncia efetiva de guaTranferncia possvel

    Aqueduto do ColoradoCanal CoachellaCanal All Amrica

    Projeto Centraldo Arizona

    1

    2

    3

    4

    6,0

    5,0

    4,0

    3,0

    2,0

    1,0

    0

    Bilhes

    demetroscbicos

    CALIFRN

    IA

    COLORADO

    ARIZONA

    UTAH

    MXICO

    WYOMING

    NOVO

    MXICO

    NEVADA

    FONTE: Les Hommes Occpent et Amnagent la Terre- Collection R. Knafou

    4,8 3,4 2,1 1,9 1,3 1,05,4 0,5

    A partilha das guas do Colorado (1922)(1944 para o Mxico)

    RioCo

    lorad

    o

    RioGrande

    Texas

    Evoluo da populao dos estados do sudoeste dos EUA(em milhes)

    Estados do sudoeste 1940 1970 2000Califrnia 7,00 20,00 34,00Nevada 0,10 0,49 1,80Colorado 0,22 0,33 4,30Utah 0,56 1,00 2,00

    Novo Mxico 0,55 1,30 1,74Arizona 0,49 1,70 4,70

    Fonte: recenseamentos dos Estados Unidos

    Flickr

  • 7/23/2019 Artigo: Dos Nordestes ao nordeste

    10/12

    MUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEA 10

    2009 AGOSTO

    H

    30 ANOSDALEIDAANISTIA:

    HMOTIVOSPARACOMEMORAR? trs dcadas, no 28 de agosto, en-

    trou em vigor a Lei 6.683, a Lei da Anis-tia. Encaminhada ao Congresso Nacionalpelo general Joo Baptista Figueiredo, oltimo presidente do ciclo militar inau-

    gurado em 1964. A legislao inseria-seem um conjunto de estratagemas arma-dos pelo general Golbery do Couto e Sil-va, o arquiteto da abertura poltica, para,entre outras coisas, acabar com obipartidarismo.

    A anistia comeou a ser reivindicadano pas a partir das primeiras puniesarbitrrias, logo aps o golpe de Estado,em 1964, e ganhou fora e as ruas nosltimos dois anos da dcada de 1970. Jun-to com ela, os movimentos da sociedadecivil exigiam a apurao dos crimes come-tidos pelos agentes das foras de seguran-a, a revelao da verdade, a volta do Es-tado de Direito e da democracia, o respei-to aos direitos humanos.

    A lei representou um marco no pro-cesso de abertura do pas. Mas no aten-deu s principais reivindicaes de perse-guidos polticos e familiares das vtimas.

    A anistia foi promulgada nos termos defi-nidos pela ditadura, com o objetivo prin-

    cipal de garantir impunidade aosvioladores de direitos humanos aindaque a tortura e outros graves crimes noconstem do texto da lei. No foi ampla,geral e irrestrita como exigiam, por exem-plo, presos polticos que fizeram greve defome, mostrou-se mais eficaz para inte-grantes do aparato de represso do quepara os perseguidos polticos e revelou-seincapaz de encerrar a escalada de atroci-dades iniciada com o golpe. A anistia sig-

    nificou uma tentativa de restabelecimentodas relaes entre militares e opositores doregime, que haviam sido cassados, bani-dos, exilados ou estavam encarcerados. Alegislao, que continha a idia de apazi-guamento, permitiu que certo impassefosse superado e, dessa forma, acabou poradquirir um significado de conciliaopragmtica.

    Embora a lei previsse a hiptese de re-torno ou reverso ao servio ativo de ser-

    vidores civis e militares afastados pelo ar-btrio, na prtica no foi exatamente o que

    so de acerto de contas iniciado com tallegislao segue em desenvolvimento. Damesma forma, muita coisa mudou desdeento, inclusive com a expanso das fron-teiras legais da anistia. Mas at agora no

    foram ultrapassados dois limites impostosem 1979: o que tem impossibilitado quese avance na revelao da verdade, sequerenunciado na primeira lei, mas parte in-tegrante do acordo que envolveu a transi-o nacional; e o que trata dos chamadoscrimes conexos e desde a ditadura vemsendo usado como uma espcie de mantrada impunidade, ao garantir a interpreta-o da lei nos termos pensados pelos mili-tares.

    Entretanto, pela primeira vez, em trsdcadas, existe uma possibilidade real deisso mudar. Ainda neste semestre, o Su-premo Tribunal Federal (STF) deve apre-ciar uma ao de arguio de descumpri-mento de preceito fundamental, referen-te anistia, proposta pela Ordem dos

    Advogados do Brasil (OAB). Isso signifi-ca que caber ao STF decidir se a lei doperdo e do esquecimento se aplica mes-mo aos crimes cometidos pelos agentes darepresso. No Direito Internacional j est

    bem estabelecido que um Estado podeconceder anistia para indivduos que vio-laram suas leis, mas nunca quando estesindivduos agiram em nome do prprioEstado. A Organizao dos Estados Ame-ricanos (OEA), que reconhece a validadede leis de anistia promulgadas por insti-tuies eleitas democraticamente, no ad-mite como legtimas as chamadas auto-anistias sancionadas por regimes autorit-rios, como foi o caso do Brasil. Segundo

    essa interpretao, agentes da repressoque torturaram, mataram e desapareceramcom os corpos de suas vtimas estariamexcludos de leis de anistia e deveriam res-ponder criminalmente pela violncia co-metida.

    BRASIL

    aconteceu. A essa pendncia, de cartermais trabalhista, permaneceram relaciona-das vrias outras reivindicaes de perse-guidos polticos e de familiares de mortose desaparecidos. Olhando-se retrospecti-

    vamente, tem-se claro, hoje, que no Bra-sil a anistia singularmente iniciou um pro-cesso de acerto de contas do Estado comas vtimas daquele perodo. Desde ento,e norteado por legislao federal, tal pro-cesso vem se desenvolvendo de maneiraassimtrica, ao privilegiar somente umadas quatro obrigaes que os Estados tmao lidar com graves violaes em massade direitos humanos, na passagem para ademocracia: o dever de pagar reparaes.

    O segundo momento desse processopode ser localizado em 1995, com a en-trada em vigor da Lei 9.140 (Lei dos De-saparecidos), quando o Estado reconhe-ceu sua responsabilidade pelas mais gra-ves violaes de direitos humanos come-tidas no perodo e, em alguma medida,procedeu ao resgate moral de vtimas doarbtrio. Sem abandonar o carter de con-ciliao atribudo legislao de anistia,avanou na busca por justia, explicitada

    no pagamento de indenizaes, ainda quede valores simblicos, aos familiares de

    mortos e desaparecidos polticos. O mes-mo carter de harmonizao foi mantidocom a sano da Lei 10.559 e a instalaoda Comisso da Anistia, em 2001, queampliou a dimenso da anistia com a pos-

    sibilidade de o Estado proceder repara-o econmica de ex-perseguidos polti-cos que a Lei da Anistia no conseguiureabilitar.

    Permanecem ainda no cumpridos osdeveres de justia (como se sabe, nenhumtorturador jamais foi processado e conde-nado, no pas) e de reforma das institui-es, sobretudo o sistema de segurana,que no apenas mantm em seus quadrosagentes ligados represso como h anos

    assiste disseminao de prticas violen-tas. O dever da verdade tem sido parcial-mente contemplado, com a abertura dealguns arquivos, a recente instalao deespaos de memria e a publicao ofici-al, em 2007, do livro Direito memria e verdade, sobre as vtimas fatais da dita-dura militar. Continua desconhecido, noentanto, o contedo dos arquivos das For-as Armadas. E segue ignorado o paradei-ro de desaparecidos polticos.

    Passados 30 anos da aprovao da Leida Anistia, parece evidente que o proces-

    Lei da Anistia promoveu a conciliao poltica na transio do encerramento da ditadura militar,mas no puniu torturadores e no assegurou o direito verdade

    Glenda MezarobbaEspecial para Mundo

    Glenda Mezarobba cientista poltica,ps-doutoranda no IFCH/Unicamp e

    autora do livro Um acerto de contascom o futuro: a anistia e suas

    consequncias (Humanitas/Fapesp,2006)

    A partir de 1977, setores crescentes da sociedade civil brasileira foram sruas, em manifestaes pelo fim da ditadura e pela anistia s vtimas do

    regime; esse processo ainda no foi concludo

    JorgeArajo/FolhaImagem

  • 7/23/2019 Artigo: Dos Nordestes ao nordeste

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    PANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDO

    AGOSTO 2009

    11

    O

    NARCOTRFICOCORRIAESTABILIDADE

    DOESTADOMEXICANO

    ESTADOS UNIDOS - MXICO

    presidente Barack Obama e HillaryClinton, a secretria de Estado dos Esta-dos Unidos, tiveram de enfrentar umadesagradvel surpresa em suas viagens aoMxico. O jornal mexicano El Universal,

    um dos mais importantes do pas, reveloualgo at ento mantido sob sombras: hum item no oramento do Pentgono de2009 consignando verba para ajudar aevitar que o Mxico se torne territrioingovernvel. So US$ 13 milhes desti-nados a fortalecer as foras armadas mexi-canas. Outro dado importante foi a omis-so de ambos diante do argumento doMxico, de que a violncia que coloca emrisco as instituies nacionais, com a in-sero do narcotrfico no poder poltico,resulta da demanda por drogas por partedo mercado consumidor americano.

    Com o dinheiro ganho nos EstadosUnidos, narcotraficantes mexicanos com-pram armas pesadas rifles de assalto, porexemplo. As imagens do que se passa noMxico so de uma guerra civil subterr-nea. O presidente Felipe Caldern colo-cou o Exrcito na linha de frente do com-bate s drogas, reforando a idia de guer-ra. Com a aproximao das eleies par-

    lamentares de julho, a oposio acusou ogoverno de usar eleitoralmente a guerraao narcotrfico, com prises de vrios dosseus chefes em posies de destaque.

    Combate ao trfico ou combate seleies?, indagou um dirigente do Par-tido Revolucionrio Institucional (PRI),que esteve decnios no poder e foi desalo-

    jad o pel o Par tid o de Ao Naci ona l(PAN), de Caldern, que tem o apoio dosEstados Unidos, inseguros em suas fron-

    teiras. No fim, o PRI venceu as eleies,enfraquecendo um governo j fragilizadopelas amplas repercusses da recesso ame-ricana, que tem efeitos desastrosos sobreas exportaes mexicanas.

    H o lado policial, ou de guerra, comos Estados Unidos construindo muros efortalecendo a represso em suas linhas de

    juno com o territrio mexicano. E h olado poltico e econmico: o da imigra-o. Um homem mexicano de 35 anos,

    com nove de instruo, pode ganhar 132%a mais trabalhando nos Estados Unidos.

    Como conter os fluxos migratrios? Ao

    mesmo tempo, como concluiu GeorgeBojas, um professor de Harvard estudio-so do assunto, o volume de imigraomexicana dos ltimos 15 anos contribuiupara reduzir em 3% os salrios america-nos. Alguma coisa tem de ser feita, aconcluso geral em Washington, da CasaBranca, Congresso, partidos e sindicatos,com a quase impossibilidade de um con-senso com a amplitude exigida pela gravi-dade da situao.

    No momento prevalecem questespontuais. Barack e Hillary deram garanti-as a Caldern sobre dois temas cruciais.O Nafta, tratado de livre comrcio entreEstado Unidos, Canad e Mxico, no serenterrado. Tampouco ser criada umaUnio da Amrica do Norte, integrada porEstados Unidos e Canad. Essa idia sur-giu como contraponto formao de en-tidades regionais no sul do continente,como a Unio das Naes da Amrica do

    Sul (Unasul). Mais de trs quartos das ex-portaes mexicanas destinam-se aos Es-

    tados Unidos. As indstrias maquiladoras,

    fundamento da economia da faixa seten-trional do Mxico, j atingidas pela con-corrncia chinesa, dependem essencial-mente das regras de livre comrcio doNafta. As garantias da Casa Branca so omnimo que Caldern poderia esperar.

    Mas o Mxico ter de conformar-secom a reduo da sua estatura de aliadopreferencial dos Estados Unidos nas Am-ricas. Bye, bye Mxico, o Brasil emergecomo o lder da Amrica Latina. Isto foi

    escrito por Andrs Oppenheimer,colunista do Miami Herald, ntimo dacomunidade hispnica e do setor do De-partamento de Estado que cuida de ques-tes latino-americanas. Vale ainda lembrarque, ano passado, morreram mais pessoasno Mxico, vtimas da violncia relacio-nada com o narcotrfico, do que no Iraqueem guerra. Segundo um cientista polticoamericano, pode vir a ser um equvocopensar que os maiores desafios em polti-

    ca externa, enfrentados pelos Estados Uni-dos estejam no Paquisto, Ir ou Oriente

    Mdio. A hiperpotncia estariaobrigada a concentrar-se noproblema de segurana nacio-nal ligado sua fronteira meri-dional.

    Talvez os maiores desafios sesituem, na realidade, em vizi-nhana imediata, num pas fron-teirio onde o Estado pode estarde fato a caminho da falncia,abrindo campo violnciaindiscriminada. O diagnsticoum tanto assustador foi ofereci-do ao Congresso americano pelogeneral Victor Renuart, chefe doComando Sul dos Estados Uni-dos, em cuja rea esto as fron-teiras com o Mxico. Talvez setorne necessrio um deslocamen-to de carter militar ao longo des-sas fronteiras, concluiu.

    H informaes de queObama teria pensado nisso. A gravida-de da situao pode ser avaliada pelo fatode que Obama achou por bem ir ao M-xico a 17 de abril, antes da Cpula das

    Amricas na qual enfrentaria o venezue-lano Hugo Chvez. A situao pode

    complicar-se com a deciso do governomexicano de refazer as relaes comCuba e Venezuela. A direita americanaficou furiosa e se desdobra em adver-tncias de que esse fato pode dar alento atuao, no pas vizinho, de forashostis aos Estados Unidos. Mais umcomplicador.

    Algo meio esquecido que existemguerrilhas no Mxico. Uma delas, o Exr-cito Popular Revolucionrio, executou

    uma campanha de atentados a bomba pro-curando conseguir uma anistia para todosos presos polticos. Tambm eles existemno Mxico. Dado significativo foi a posi-o assumida pela Confederao das C-maras Industriais. Ela se declarou favor-vel anistia. O empresariado mexicanoquer a pacificao poltica como forma demelhor combater os cartis das drogas, ummonstro que se agiganta a olhos vistos eabala as relaes com o poderoso vizinho

    do norte.

    Newton CarlosDa Equipe de Colaboradores Barack Obama volta suas atenes para o vizinho meridional e interpreta o tema da fronteira como

    um problema de segurana nacional. Na equao mexicana, combinam-se economia, imigrao enarcotrfico

    O muro da vergonha que separa fisicamente o Mxico dos EstadosUnidos (na foto, entre as cidades de Tijuna e San Diego), com o objetivo

    de conter o narcotrfico e o fluxo de imigrantes ilegais, reflete o fracasso doNafta, criado em 1994 com a promessa de uma nova era de prosperidade,

    por meio da integrao econmica entre os dois pases e o Canad

    LuisAcosta/AFP

  • 7/23/2019 Artigo: Dos Nordestes ao nordeste

    12/12

    MUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEAMUNDOPANGEA 12

    2009 AGOSTO

    so real na composio poltica do Parlamento Europeu.Foram os casos, por exemplo, de Portugal, onde o Blocode Esquerda conquistou 10,7% dos votos (trs deputa-dos), do Syriza na Grcia, com 4,7% (um deputado), edo NPA (movimento anticapitalista) na Frana, com 5%(insuficientes, porm, para eleger um deputado).

    Trata-se de um quadro geral bastante complexo, que,dadas as dimenses da crise, tende a provocar antagonis-mos e radicalizaes. Se o mal estar dentro da UE j foi

    evidenciado pela impossibilidade de aprovao da CartaEuropia (rechaada por vrios plebiscitos nacionais, omais importante dos quais na Frana, em 2005), a ofen-siva conservadora ganhou um importante momento em

    junho do ano passado, quando o Parlamento Europeuaprovou leis que facilitam a deteno, investigao e ex-pulso de estrangeiros e imigrantes. As reaes foramimediatas, dentro e fora da Europa. Representantes de44 governos da Amrica Latina e da frica enviaram car-tas Comisso Europia e ao Alto Representante da UE,

    Javier Solana, condenando as novas leis.

    Nos meses seguintes, o cerco aos imigrantes foi in-tensificado. Um claro sintoma disso foi a condenao,

    ELEIESEUROPIASSINALIZAM

    TEMPOSSOMBRIOSAs eleies s 736 cadeiras do Parlamento Europeu,realizadas no incio de junho, foram marcadas por umelevado ndice de absteno: cerca de 60% dos 388 mi-lhes de eleitores dos 27 pases que integram a UnioEuropia (UE) no compareceram s urnas. Em temposnormais, de estabilidade ou de crescimento econmi-co, a absteno poderia indicar despreocupao ou ataprovao das polticas governamentais. Mas o fantasma

    da depresso ronda as economias mais slidas da UE,incluindo Alemanha, Frana e Gr-Bretanha, ao passoque o desemprego atinge nveis sem precedentes no ps-guerra na Espanha. Nos pases mais perifricos da UE,especialmente os que faziam parte do antigo bloco soci-alista (como Polnia, Hungria e Bulgria), o desempre-go ameaa produzir uma catstrofe social. Nesse cenrio,a elevada absteno eleitoral parece indicar que boa parteda populao no confia nas instituies europias comoum instrumento para resolver a crise.

    Mas as eleies revelaram outro dado, talvez aindamais esclarecedor, sobre a atual atmosfera poltica euro-pia: entre os cerca de 40% que votaram, os partidos decentro-direita e de extrema-direita foram os grandes vi-toriosos (veja o Grfico). Com um dado novo: eles ga-nharam mesmo nos pases em que so governo (Alema-nha, Frana, Itlia, Blgica, Holanda, Polnia, ustria,Hungria, Bulgria, Litunia, Letnia, Eslovnia e Chipre).Isso contradiz uma tendncia histrica: em geral, as e lei-es ao Parlamento Europeu tendiam a favorecer os par-tidos de oposio.

    A extrema-direita, marcada por um discurso xenfobo,anti-islmico e contrrio existncia da prpria UE (por,

    supostamente, ameaar a soberania nacional dos pases as-sociados) obteve um avano importante na Holanda:16,4% dos votos, o que lhe assegurou quatro deputados.Na Gr-Bretanha, o Partido Nacional elegeu dois deputa-dos (6,7% dos votos). Na Grcia, palco recente de agita-es estudantis e de trabalhadores, a extrema-direita sal-tou de uma posio insignificante para conquistar 7,2%dos votos. Avanos semelhantes, embora no to espeta-culares, foram verificados na ustria, Finlndia e Hungria.

    Como contrapartida, as foras tradicionais de esquer-da (socialistas, social-democratas e trabalhistas) foram der-

    rotados nos pases que governam (Gr-Bretanha, Espanhae Portugal), tiveram um dos piores resultados de sua hist-ria na Alemanha (21% dos votos) e na Frana (16%). Nosoutros pases, obtiveram resultados igualmente pfios. NaItlia, o Partido da Refundao Comunista, herdeiro dooutrora poderoso Partido Comunista Italiano, obteve ape-nas 3,2% dos votos, sem conquistar qualquer cadeira.

    O recuo da esquerda tradicional abriu espao paraum certo crescimento de grupos e organizaes novos oualternativos, como os movimentos ecologistas que, so-mados, obtiveram 60 cadeiras. Em alguns pases, parti-

    dos radicais de esquerda chegaram a experimentar umcrescimento relativamente importante, mas sem expres-

    em junho, do uso da burka(o vu muulmano) pelo pre-sidente francs Nicolas Sarkozy. Alegando que o vu re-baixa as mulheres e agride a condio feminina, o presi-dente pediu ao parlamento leis proibindo o seu uso emquaisquer locais pblicos na Frana. Outro sintoma, bemconhecido no Brasil, a multiplicao de episdios emque brasileiros so simplesmente impedidos de entrar empases europeus, ou so tratados de forma rude pela pol-cia alfandegria, sem razes para tanto.

    No quadro da crise atual, o crescimento da extrema-direita, que expressa uma tendncia ao dilaceramento daUE, tende a colocar mais lenha no explosivo caldeirosocial europeu. Sob o influxo da virada conservadora, acentro-direita tradicional reproduz parte do programaanti-imigrantes da extrema direita, a fim de no perderespao eleitoral. Ao mesmo tempo, o descrdito devota-do ao Parlamento Europeu por cerca de 60% dos eleito-res, associado derrota da esquerda historicamente mo-derada, cria um perigoso vazio de representao dos se-tores que se sentem atacados, marginalizados e segrega-

    dos. Tempos sombrios se avizinham.

    RACISMO EM ALTA

    Partidos de centro-esquerda esperavam que a crise econmica os impulsionasse nacampanha do Parlamento Europeu. Mas a vitria ficou com a centro-direita e a

    extrema-direita ultranacionalista

    Resultados eleitorais: o novo Parlamento

    EPP : Grupo do Partido Popular Europeu (Democratas-Cristos)

    S&D : Grupo da aliana progressista dos socialistas e democratas no Parlamento Europeu

    ALDE : Grupo da aliana dos Democratas e Liberais pela Europa

    GREENS/EFA : Grupo dos Verdes/ Aliana Livre Europia

    ECR : Conservadores e Reformistas Europeus

    GUE/NGL : Grupo Confederal da Esquerda Unitria Europia/ Esquerda Nrdica Verde

    EFD : Europa da Liberdade e da Democracia

    NA : No-inscritos

    GUE/NGL : 35

    S&D : 184

    GREENS/EFA : 55

    ALDE : 84

    EPP : 265

    ECR : 55

    EFD : 32

    NA : 26

    736

    EPP S&D ALDE GREENSEFA

    ECR GUENGL

    EFD NA

    36

    25

    11.4

    7.5 7.54.8 4.3 3.5

    40

    30

    20

    10

    0

    Porcentagens%

    A partir de julho de 2009, todos os grupospolticos devem incluir deputados de, pelomenos, 7 Estados-Membros. O nmero

    mnimo definido de deputados necessriospara estabelecer um grupo poltico de 25

    FONTE: Parlamento Europeu