Artigo - Tributação de Notários e Tabeliões. a Possibilidade Da Tributação Do ISS Sobre Valor...

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Artigo - Tributação de notários e tabeliões - Por Marcelo Carlos e Lilian Ana Martins Tributação de notários e tabeliões. A possibilidade da tributação do ISS sobre valor fixo na forma do §1º, do artigo 9º, do Decreto-Lei nº 406/68 Por Marcelo Carlos Zampieri: Mestre em Direito. Professor de Direito Tribuário e Empresarial da Universidade Federal de Santa Maria. Advogado. Lilian Ana Martins dos Santos: Acadêmica de Direito e Ciências Contábeis da Universidade Federal de Santa Maria. 1. DA TRIBUTAÇÃO DO PROFISSIONAL PESSOA FÍSICA - IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS 1.1. Recentemente o STF ao julgar improcedente a ação direta de inconstitucionalidade ADIn 3089, proposta pela ANOREG, reconheceu a constitucionalidade da exigência do ISS sobre os serviços notariais e registrais conforme previsto na Lei Complementar 116/03. 1.2. O julgamento do STF, por força do artigo 102, parágrafo 2º, da Constituição Federal de 1988, possui eficácia erga omnes, vinculando as demais instâncias do Poder Judiciário. 1.3. Todavia, muito embora o STF tenha sepultado a pretensão dos notários e tabeliães a ver afastada a incidência do ISS sobre os serviços por eles prestados, mesmo assim, não se pode admitir, como pretendem alguns municípios, que o valor do imposto seja calculado com base no preço dos serviços. 1.4. Com efeito, o Imposto Sobre Serviços, de competência dos Municípios, é atualmente regulado pela Lei Complementar 116/2003. Esta lei revogou diversos dispositivos referentes à legislação tributária do ISS, mantendo, no entanto, a vigência do §1º, do artigo 9º, do Decreto-Lei 406/68. 1.5. O §1º, do artigo 9º, do Decreto-Lei 406/68, possibilita que os profissionais liberais e autônomos recolham o ISS a partir de um valor fixo quando prestem serviços sob a forma de trabalho pessoal, sem ajuda de empregado com a mesma qualificação, não fazendo restrição quanto ao tipo de serviço. In verbis: art. 9º (..) § 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o impôsto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

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Direito Tributário e Empresarial

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  • Artigo - Tributao de notrios e tabelies - Por Marcelo Carlos e Lilian Ana Martins

    Tributao de notrios e tabelies.

    A possibilidade da tributao do ISS sobre valor fixo na forma do 1, do artigo 9, do Decreto-Lei n 406/68

    Por Marcelo Carlos Zampieri: Mestre em Direito. Professor de Direito Triburio e Empresarial da Universidade Federal de Santa Maria. Advogado.

    Lilian Ana Martins dos Santos: Acadmica de Direito e Cincias Contbeis da Universidade Federal de Santa Maria.

    1. DA TRIBUTAO DO PROFISSIONAL PESSOA FSICA - IMPOSTO SOBRE SERVIOS

    1.1. Recentemente o STF ao julgar improcedente a ao direta de inconstitucionalidade ADIn 3089, proposta pela ANOREG, reconheceu a constitucionalidade da exigncia do ISS sobre os servios notariais e registrais conforme previsto na Lei Complementar 116/03.

    1.2. O julgamento do STF, por fora do artigo 102, pargrafo 2, da Constituio Federal de 1988, possui eficcia erga omnes, vinculando as demais instncias do Poder Judicirio.

    1.3. Todavia, muito embora o STF tenha sepultado a pretenso dos notrios e tabelies a ver afastada a incidncia do ISS sobre os servios por eles prestados, mesmo assim, no se pode admitir, como pretendem alguns municpios, que o valor do imposto seja calculado com base no preo dos servios.

    1.4. Com efeito, o Imposto Sobre Servios, de competncia dos Municpios, atualmente regulado pela Lei Complementar 116/2003. Esta lei revogou diversos dispositivos referentes legislao tributria do ISS, mantendo, no entanto, a vigncia do 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68.

    1.5. O 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68, possibilita que os profissionais liberais e autnomos recolham o ISS a partir de um valor fixo quando prestem servios sob a forma de trabalho pessoal, sem ajuda de empregado com a mesma qualificao, no fazendo restrio quanto ao tipo de servio. In verbis:

    art. 9 (..)

    1 Quando se tratar de prestao de servios sob a forma de trabalho pessoal do prprio contribuinte, o impsto ser calculado, por meio de alquotas fixas ou variveis, em funo da natureza do servio ou de outros fatores pertinentes, nestes no compreendida a importncia paga a ttulo de remunerao do prprio trabalho.

  • 1.6. O dispositivo legal acima transcrito traz verdadeira exceo a regra geral, que define a base de clculo do ISS como sendo o preo do servio. Assim, quando a prestao dos servios for realizada de forma pessoal, pelo prprio contribuinte, que assume a responsabilidade pessoal pela atividade fim, o valor do imposto (ISS) fixo, no sendo possvel utilizar o preo do servio como base de calculo. Esto submetidos ao regime de recolhimento do imposto sobre valor fixo os profissionais liberais (advogados, mdicos etc), autnomos, entre outros.

    1.7. No se pode deixar de considerar que a Lei Complementar 116/2003 tratou da regra geral que define o valor do ISS a partir do preo do servio, no estabelecendo qualquer disciplinamento em relao s excees, entre as quais esto includos aqueles que prestam servios forma pessoal, assumindo responsabilidade pela atividade fim.

    1.8. Em verdade, o artigo 10 da Lei Complementar 116/2003 revogou expressamente os dispositivos legais nele previsto. Com isso, fica evidente a inteno do legislador em manter as normas no mencionadas expressamente na clusula de revogao.

    1.9. O artigo 9 da Lei Complementar 95/1998, com a redao determinada pela Lei Complementar 107/2001, que dispe sobre as regras de vigncia e revogao de normas jurdicas assim dispe:

    art. 9 A clusula de revogao dever enumerar, expressamente, as leis ou disposies legais revogadas.

    1.10. Dessa forma, a revogao dever expressamente enumerar as leis ou disposies legais revogadas. Nesse aspecto, em momento algum o artigo 10 da Lei Complementar 116/03 revogou expressamente os dispositivos legais que permitiam a tributao dos profissionais que exercem a atividade pessoalmente na forma do 1 do artigo 9 do Decreto-lei 406/68, seno vejamos:

    Art. 10. Ficam revogados os arts. 8. 10. 11 e 12 do Decreto-Lei n 406. de 31 de dezembro de 1968; os incisos III, IV, V e VII do art. 3 do Decreto-Lei n 834. de 8 de setembro de 1969; a Lei Complementar n 22, de 9 de dezembro de 1974; a Lei n 7.192, de 5 de junho de 1984; a Lei Complementar n 56. de 15 de dezembro de 1987; e a Lei Complementar n 100, de 22 de dezembro de 1999.

    1.11. importante ressaltar que na redao do Projeto da Lei Complementar 116/2003 constava, expressamente, o art. 9, do Decreto Lei n 406/68 como norma a ser revogada. No entanto, O Senado Federal retirou a expresso "9" do art. 10, da referida Lei Complementar que estava para ser aprovada, demonstrando manifesta vontade de permanncia da tributao privilegiada.

    1.12. pertinente trazer colao a advertncia de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS e MARILENE TALARICO MARTINS RODRIGUES [01]:

    "embora tenha constado do substitutivo aprovado pela Cmara Federal, a revogao do art. 9 do DL 406/2003 [sic], conforme art. 10 daquele substitutivo, ou seja, o regime jurdico de tributao dos profissionais liberais no mais seria aplicado. O Senado Federal, porm, entendendo que o art. 9 e pargrafos daquele diploma legal no eram incompatveis com o art. 7 e pargrafos da nova disciplina do ISS, manteve o art. 9, revogando os demais artigos do DL 406/68, referentes ao imposto municipal"

  • 1.13. Um outro aspecto a considerar que no h possibilidade jurdica de se admitir revogao por outras formas tendo vista que (i) a lei nova no incompatvel com a anterior (ii) nem regula toda a matria nela tratada. Portanto, no h que se falar em revogao, nem sob o argumento de que mesmo no tendo sido expressa, essa era a inteno do legislador. No se pode utilizar esse tipo de interpretao, ainda mais, tratando-se de Lei Complementar, conforme os ensinamentos de Alberto Xavier e Roberto Duque Estrada [02]:

    "Assim, pela prpria essncia de sua funo parcial e fragmentria, nunca uma lei complementar em matria tributria pode ter o alcance de desencadear o fenmeno revogatrio amplo e global a que se refere o art. 2, 1, in fine, da Lei de Introduo ao Cdigo Civil".

    1.14. Portanto, outra no pode ser a concluso seno a de que subsiste com plena eficcia e vigncia o 1 do artigo 9 do Decreto-Lei 406/68, que norma especial em relao Lei Complementar 116/2003.

    1.15. Como corolrio dessa assertiva, deve ser mantida a tributao dos profissionais liberais e autnomos na forma disciplinada pela lei especial, in casu o 1 do artigo 9 do Decreto-Lei 406/68, permitindo que o ISS seja recolhido a partir de um valor fixo, desconsiderando outros critrios de clculo do imposto.

    2. DA NATUREZA JURDICA DOS SERVIOS DE REGISTROS PBLICOS, CARTORRIOS E NOTARIAIS

    2.1. Superada a questo da vigncia da tributao privilegiada do Imposto Sobre Servios dos profissionais autnomos, impe-se uma anlise da natureza jurdica dos servios de registros pblicos, cartorrios e notariais, para que se possa auferir qual a forma de tributao incidente.

    2.2. A Constituio Federal de 1988 delega particulares a execuo dos servios notariais e de registros, que sero exercidos em carter privado, mediante a realizao de concurso pblico, conforme determina seu artigo 236:

    Art. 236. Os servios notariais e de registro so exercidos em carter privado, por delegao do Poder Pblico.

    1 - Lei regular as atividades, disciplinar a responsabilidade civil e criminal dos notrios, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definir a fiscalizao de seus atos pelo Poder Judicirio.

    2 - Lei federal estabelecer normas gerais para fixao de emolumentos relativos aos atos praticados pelos servios notariais e de registro.

    3 - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso pblico de provas e ttulos, no se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoo, por mais de seis meses.

    2.3. A partir dessa norma, pode-se perceber que a atividade notarial e de registro delegada, de forma permanente e em carter pessoal, podendo somente recair sobre pessoa natural, habilitada em concurso pblico de provas e ttulos, no sendo outorgada a empresas. Alm disso, aparece a responsabilidade objetiva dos

  • notrios e registradores, pessoas fsicas responsveis pela prestao de servios pblicos auxiliares do Poder Judicirio, sendo por este fiscalizados.

    2.4. Em atendimento ao artigo 236 da Constituio Federal, a Lei 8.935, de 11 de novembro de 1994, regulamenta as atividades de registros pblicos, notariais e cartorrias, estabelecendo as regras para a prestao desses servios. Para poder exerc-los, os notrios e oficiais de registro devem cumprir os requisitos do artigo 14 [03] da referida lei, tais como, possuir habilitao em concurso de provas e ttulos e diploma de bacharel em direito, caracterizando, assim, a exigncia de uma habilitao especfica.

    2.5. Esta mesma lei ainda traz a responsabilidade pessoal do titular da serventia relativamente administrao dos servios, em seu art. 21, e, tambm, na esfera civil e penal, quanto aos danos causados a terceiros, em seu art. 22:

    Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos servios notariais e de registro da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito s despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condies e obrigaes relativas atribuio de funes e de remunerao de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestao dos servios.

    Art. 22. Os notrios e oficiais de registro respondero pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prtica de atos prprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.

    2.6. Mesmo que a outorga seja conferida a uma pessoa fsica, para a prestao de um servio eficiente e organizado, os notrios, tabelies e registradores podem contratar escreventes e auxiliares, como permite o caput do art. 20 da Lei 8935/94 [04]. Em razo disso, devem possuir inscrio no Cadastro Nacional de Pessoas Jurdicas, para possibilitar a contratao de empregados que auxiliam na prestao de servios, o que no confere personalidade jurdica aos cartrios de registros e tabelionatos, permanecendo a responsabilidade pessoal do titular da serventia.

    2.7. A prpria Secretaria da Receita Federal, na SOLUO DE CONSULTA 194, de 24 de maio de 2004 afastou qualquer dvida a respeito da natureza jurdica dos servios prestados por NOTRIOS e TABELIES, de modo que no podem ser considerados como pessoa jurdica pelo simples fato de possuir CNPJ:

    TABELIES, NOTRIOS E OFICIAIS PBLICOS - DISPENSA DE RETENO. No esto obrigadas a efetuar a reteno a que se refere o art. 30 da Lei n. 10.833, de 29.12.2003 os serventurios da justia, como tabelies, notrios e oficiais pblicos, que embora tenham inscrio no CNPJ, no so equiparados a empresas individuais, para os efeitos do imposto de renda.

    2.8. Destarte, pelas caractersticas dos servios prestados, alm da responsabilidade pessoal assumida, se mostra juridicamente possvel o enquadramento na modalidade do ISS fixo na forma estabelecida pelo 1 do artigo 9 do Decreto-Lei 406/68.

    2.9. No se pode deixar de considerar que o 1 do artigo 9 do Decreto-Lei 406/68 no especifica ou mesmo identifica quais os servios ou mesmo profissionais que cujas atividades possam ser enquadradas no sistema de tributao fixa.

  • 2.10. Por outro lado, os notrios e tabelies executam suas atividades com responsabilidade pessoal, a partir de delegao intuito personae de parte do Poder Pblico, o que lhes habilita a requerer junto a Municipalidade o seu enquadramento como pessoa fsica, recolhendo o ISS sobre valor fixo na forma do 1 do artigo 9 do Decreto-Lei 406/68.

    3. DO IMPOSTO SOBRE SERVIOS POR PROFISSIONAL NOS SERVIOS DE REGISTROS PBLICOS, CARTORRIOS E NOTARIAIS

    3.1. Ainda, preciso esclarecer alguns aspectos referentes tributao do ISS e o enquadramento dos servios de registros pblicos, cartorrios e notariais.

    3.2. O 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68, exige que a prestao de servios ocorra na forma de trabalho pessoal, devendo haver a responsabilidade pessoal do contribuinte e a exigncia de habilitao profissional.

    3.3. Salienta-se que os notrios, tabelies e oficiais de registros, alm da habilitao em concurso pblico de provas e ttulos, devem ser bacharis em Direito, e, segundo o artigo 3 da Lei 8.935/94, so considerados profissionais do Direito [05].

    3.4. Dessa forma, os auxiliares contratados no possuem a mesma qualificao do titular da serventia, pois somente ele detm a habilitao especfica exigida. Por conseguinte, como so os nicos aptos prestao desses servios, so responsveis pessoalmente, inclusive pelos atos de seus prepostos.

    3.5. Alm disso, pelo Imposto de Renda os notrios, tabelies e oficiais de registro recebem tratamento de pessoa fsica, sendo tributados como profissionais liberais ou autnomos. Portanto, os emolumentos cobrados pelos servios so equiparados remunerao de pessoas fsicas pela legislao do Imposto de Renda, conforme dispe a Lei 7.713, de 1988, no seu artigo 11:

    art. 11. Os titulares dos servios notariais e de registro a que se refere o art. 236 da Constituio da Repblica, desde que mantenham escriturao das receitas e das despesas, podero deduzir dos emolumentos recebidos, para efeito da incidncia do imposto:

    I - a remunerao paga a terceiros, desde que com vnculo empregatcio, inclusive encargos trabalhistas e previdencirios;

    II - os emolumentos pagos a terceiros;

    III - as despesas de custeio necessrias manuteno dos servios notariais e de registro.

    (Obs. Vide Artigo 75 do Decreto 3000/99 - Regulamento do Imposto de Renda).

    3.6. Vale lembrar que um dos fundamentos da tributao privilegiada do ISS para profissionais liberais e autnomos o fato de sua remunerao j ser tributada pelo Imposto de Renda. Portanto, incidindo o ISS sobre o preo do servio, haveria dupla tributao, pois se partiria da mesma base de clculo, qual seja, a remunerao do trabalho.

  • 3.7. Os titulares das serventias tambm so considerados autnomos pela legislao previdenciria [06]. Assim, o titular deve se inscrever no INSS na condio de autnomo, como pessoa fsica, e na condio de equiparado a empresrio no que diz respeito aos direitos sociais e trabalhistas de seus empregados.

    3.8. No entanto, no se pode permitir que os notrios e tabelies sejam equiparados ao empresrio no que diz respeito a legislao do ISS. Nem poderia ser diferente, pois na tica de HELENO TORRES "os contedos dos enunciados no sero preenchidos segundo uma posio arbitrria do intrprete (...)" [07]. No se mostra crvel admitir interpretaes discricionrias em matria tributria, cuja atividade essencialmente vinculada (artigo 142, pargrafo nico do Cdigo Tributrio Nacional) de modo a justificar uma equiparao no permitida em lei. Em outras palavras no pode a autoridade administrativa municipal, a margem da lei, pretender equiparar os notrios e tabelies aos empresrios cuja tributao definida a partir do preo do servio. Admitir essa possibilidade franquear a autoridade administrativa o poder de alterar institutos e formas de direito privado, pretendendo uma equiparao injustificvel dos notrios e tabelies aos empresrios. Destarte, somente a "lei tributria (e no a autoridade administrativa) poder alterar a definio, o contedo e o alcance de institutos, conceitos e formas do direito privado (...) (grifei) [08]". Vale lembrar a advertncia do Ministro Otvio Galloti, em voto proferido no Recurso Extraordinrio 71.758: "se a lei pudesse chamar de compra e venda o que no compra, de exportao o que no exportao, de renda o que no renda, ruiria todo o sistema tributrio inscrito na constituio".

    3.9. de se notar tambm que os servios notariais, de registro e cartorrios exigem grau intelectual especfico e so diferenciados daqueles baseados no capital, os empresariais, pois dependem do trabalho pessoal do contribuinte e de sua qualificao.

    3.10. Portanto, os servios notariais, de registro e cartorrios so servios pblicos cuja execuo delegada a uma pessoa natural, preenchendo todos os requisitos para o recolhimento fixo do ISS, conforme o 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68.

    4. DOS PROCEDIMENTOS A SEREM ADOTADOS

    4.1. Em virtude do julgamento do STF da ao proposta pela ANOREG, provavelmente os Municpios incrementaro suas atividades fiscalizadoras em relao aos notrios e tabelies, inclusive com a exigncia retroativa, respeitados os prazos decadenciais e prescricionais.

    4.2. O mais grave, porm, que alguns Municpios pretendem que a exigncia do ISS se d sobre o preo do servio, gerando uma carga tributria sobremaneira elevada.

    4.3. Diante desse quadro, restam aos notrios e tabelies a possibilidade de impugnar administrativamente a pretenso do Municpio, defendendo que o recolhimento do imposto seja feito sobre valor fixo na forma prevista no 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68, cuja vigncia e eficcia foi mantida mesmo com a entrada em vigor da Lei Complementar 116/03.

    4.4. Podero ainda os notrios e tabelies defender judicialmente a possibilidade do recolhimento do ISS em valor fixo, utilizando do Mandado de Segurana preventivo,

  • sem prejuzo da possibilidade do depsito judicial como forma de suspender a exigibilidade do crdito tributrio (Smula 112 do STJ).

    CONCLUSES

    a)A Lei Complementar 116/2003. Esta lei revogou diversos dispositivos referentes legislao tributria do ISS, mantendo, no entanto, a vigncia do 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68;

    b)O 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68, possibilita que os profissionais liberais e autnomos recolham o ISS a partir de um valor fixo quando prestem servios sob a forma de trabalho pessoal, sem ajuda de empregado com a mesma qualificao, no fazendo restrio quanto ao tipo de servio ou profissional.

    c)A atividade notarial e de registro delegada, de forma permanente, em carter pessoal, podendo somente recair sobre pessoa natural, habilitada em concurso pblico de provas e ttulos, no sendo outorgada a empresas, assumindo o notrio e tabelio responsabilidade pessoal pela atividade.

    d)A prpria Secretaria da Receita Federal, na SOLUO DE CONSULTA 194, de 24 de maio de 2004 afastou qualquer dvida a respeito da natureza jurdica dos servios prestados por NOTRIOS e TABELIES, de modo que no podem ser considerados como pessoa jurdica pelo simples fato de possuir CNPJ.

    e)No pode a autoridade administrativa municipal, a margem da lei, pretender equiparar os notrios e tabelies aos empresrios cuja tributao definida a partir do preo do servio. Admitir essa possibilidade franquear a autoridade administrativa o poder de alterar institutos e formas de direito privado, pretendendo uma equiparao injustificvel dos notrios e tabelies aos empresrios.

    f)Os servios notariais, de registro e cartorrios so servios pblicos cuja execuo delegada a uma pessoa natural, preenchendo todos os requisitos para o recolhimento fixo do ISS, conforme o 1, do artigo 9, do Decreto-Lei 406/68.

    Notas

    1. Ives Gandra da Silva Martins e Marilene Talarico Martins Rodrigues, ``O ISS e a Lei Complementar n 116/2003 - Aspecto Relevantes``, O ISS e a LC 116, coordenador Valdir de Oliveira Rocha, Dialtica, 2003, p. 202

    2. XAVIER, Alberto, e ESTRADA, Roberto Duque. O ISS das Sociedades de Servios Profissionais e a Lei Complementar n 116/03. O ISS E A LC 116 / coordenador Valdir de Oliveira Rocha. So Paulo: Dialtica, 2003. Pg. 17.

    3. Art. 14. A delegao para o exerccio da atividade notarial e de registro depende dos seguintes requisitos:

    I - habilitao em concurso pblico de provas e ttulos;

    II - nacionalidade brasileira;

    III - capacidade civil;

  • IV - quitao com as obrigaes eleitorais e militares;

    V - diploma de bacharel em direito;

    VI - verificao de conduta condigna para o exerccio da profisso.

    4. Art. 20. Os notrios e os oficiais de registro podero, para o desempenho de suas funes, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remunerao livremente ajustada e sob o regime da legislao do trabalho.

    5. Art. 3 Notrio, ou tabelio, e oficial de registro, ou registrador, so profissionais do direito, dotados de f pblica, a quem delegado o exerccio da atividade notarial e de registro.

    6. Decreto n 2173 de 05.03.97, parte I, ttulo III, cap. I, Art. 10, inciso IV, letra C. So trabalhadores autnomos o notrio ou tabelio e Oficial de Registro ou Registrador, titular de cartrio que detm a delegao do exerccio da atividade notarial e de registro, no remunerados pelos cofres pblicos, admitidos partir de 21.11.1994.

    7. TORRES. Heleno. Direito Privado e Direito Tributrio. Revista dos Tribunais, 2004, p.81.

    8. TORRES. Heleno. Ob. Cit. p. 83

    Fonte: Jus Navigandi