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6664 AS AÇÕES COLETIVAS COMO VIA INSTITUCIONAL DISPONÍVEL PARA EXPANSÃO DA PARTICIPAÇÃO E INFLUÊNCIA DOS CIDADÃOS NO PROCESSO POLÍTICO DEMOCRÁTICO CLASS ACTIONS: AN INSTITUTIONAL WAY AVAILABLE FOR ENHANCING CITIZEN’S PARTICIPATION IN DEMOCRATIC RULEMAKING PROCESS Vitor Burgo RESUMO Na busca por justificativas para a legitimidade ativa do indivíduo nas ações coletivas, descobrimos estar em curso uma verdadeira revolução processual provocada pela ascensão e maturação dos instrumentos coletivos de tutela jurídica. Ao tentar desvendar as razões do êxito de referidas ferramentas, descobriu-se que esse sucesso advém de uma característica que é peculiar ao plano social das democracias periféricas (em especial, a brasileira): a institucionalização do regime democrático por meios não- políticos. O direito apresenta-se, nestes casos, como o ingrediente principal da liga democrática, razão suficiente para torná-lo aberto às demandas e exigências sociais, permitindo-se a participação popular em sua constante reformulação. PALAVRAS-CHAVES: DEMOCRACIA; CIDADANIA; LEGITIMIDADE ATIVA ABSTRACT Trying to justify the individual standing to sue inside the class actions, we got surprised by a real processual revolution provoked by the raise and maturation of the collective instruments of judicial protection. When we try to learn the reason of the social success of those actions, we indentify a particular reality of the periferic democracies ( the Brazilian one in special): the institution of democracy by ways that do not involve the government. Law, in those cases, is the main component of the democratic leage, which represents enough reason to make it open to the social demands, allowing the popular involvement in its constant updates. KEYWORDS: DEMOCRACY; CITIZENSHIP; INDIVIDUAL STANDING TO SUE 1. INTRODUÇÃO

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AS AÇÕES COLETIVAS COMO VIA INSTITUCIONAL DISPONÍVEL PARA EXPANSÃO DA PARTICIPAÇÃO E INFLUÊNCIA DOS CIDADÃOS NO

PROCESSO POLÍTICO DEMOCRÁTICO

CLASS ACTIONS: AN INSTITUTIONAL WAY AVAILABLE FOR ENHANCING CITIZEN’S PARTICIPATION IN DEMOCRATIC

RULEMAKING PROCESS

Vitor Burgo

RESUMO

Na busca por justificativas para a legitimidade ativa do indivíduo nas ações coletivas, descobrimos estar em curso uma verdadeira revolução processual provocada pela ascensão e maturação dos instrumentos coletivos de tutela jurídica. Ao tentar desvendar as razões do êxito de referidas ferramentas, descobriu-se que esse sucesso advém de uma característica que é peculiar ao plano social das democracias periféricas (em especial, a brasileira): a institucionalização do regime democrático por meios não-políticos. O direito apresenta-se, nestes casos, como o ingrediente principal da liga democrática, razão suficiente para torná-lo aberto às demandas e exigências sociais, permitindo-se a participação popular em sua constante reformulação.

PALAVRAS-CHAVES: DEMOCRACIA; CIDADANIA; LEGITIMIDADE ATIVA

ABSTRACT

Trying to justify the individual standing to sue inside the class actions, we got surprised by a real processual revolution provoked by the raise and maturation of the collective instruments of judicial protection. When we try to learn the reason of the social success of those actions, we indentify a particular reality of the periferic democracies ( the Brazilian one in special): the institution of democracy by ways that do not involve the government. Law, in those cases, is the main component of the democratic leage, which represents enough reason to make it open to the social demands, allowing the popular involvement in its constant updates.

KEYWORDS: DEMOCRACY; CITIZENSHIP; INDIVIDUAL STANDING TO SUE

1. INTRODUÇÃO

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O Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos contemplava em seu art. 20, I, a legitimidade concorrente de qualquer pessoa física para propositura de ação coletiva para defesa dos interesses ou direitos coletivos, difusos ou individuais homogêneos, desde que o juiz reconhecesse adequada a representatividade desta pessoa, demonstrada por dados como credibilidade, capacidade e experiência, histórico na proteção judicial ou extrajudicial dos interesses e direitos difusos ou coletivos e conduta em eventuais processos coletivos em que tivesse atuado. No entanto, não foram poucas as vozes que se levantaram contra referida opção legislativa.

Alguns argumentos contrários à legitimação da pessoa física para propositura de ações populares já foram oportunamente identificados por Eurico Ferraresi[1], tais como o caráter de instrumento político da ação popular, a própria existência da ação popular que já prevê a legitimação da pessoa física, a possibilidade de banalização das ações coletivas pelo seu mau-uso e a inadequação da prática à nossa tradição jurídico-social. Pretende-se neste artigo não apenas apresentar novas respostas a estes argumentos[2], mas também a outros já surgidos neste ínterim.

Todas as críticas já formuladas em detrimento à legitimidade ativa da pessoa física foram muito bem construídas, com embasamento jurídico bastante sólido, apesar da deficiência estrutural de seu pensamento sócio-político. No entanto, nenhuma destas conseguiu errar tanto o alvo quanto a que caracterizou o Anteprojeto, por sua proposta de legitimação ativa, como "intelectualmente desonesto e um engodo populista [ao] dizer que os membros do grupo podem ser legitimados a propor demandas coletivas"[3]. Ainda que impertinentes, estes raciocínios conseguiram encontrar eco na nova lei que disciplina o sistema único de ações coletivas brasileiras e que deverá substituir na íntegra a Lei 7347/85.

Conforme dispõe o art. 6º da nova lei, permanecem legitimados o Ministério Público, a Defensoria Pública, as pessoas de direito público interno, suas autarquias, fundações e órgãos despersonalizados e as associações civis e fundações de direito privado. A novidade fica por conta da menção expressa à OAB, suas secções e subsecções, às entidades sindicais e de fiscalização do exercício de profissões e aos partidos políticos com representação na Casa respectiva ao âmbito do objeto da demanda. Para mostrar o absoluto descompasso desta nova opção legislativa com a construção do processo democrático (em especial o brasileiro) é que este estudo pretende resgatar os princípios básicos da democracia e, em especial, uma figura bastante conhecida da representação institucional, que pode vir-a-ser perniciosa ao futuro democrático brasileiro.

Para alcançar este intento, precisaremos responder às seguintes questões: i) o que significa o verbete populismo?; ii) existe autorização democrática para legitimação da pessoa física para propositura de ações coletivas, ou esta opção fugiria às nossas tradições?; iii) seria o uso político das ações populares propriamente ruim?; e, iv) quais são os custos sociais das opções feitas pelo Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos e da nova Lei que disciplina o sistema único de ações coletivas brasileiras?

2. BREVES COMENTÁRIOS ACERCA DA DEMOCRACIA.

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2.1. Populismo.

Levando-se em conta que a legitimação da pessoa física para propositura de ações coletivas já foi chamada até mesmo de engodo populista, qualquer tentativa de seu estudo sem o delineamento teórico do que venha a ser o populismo seria minimamente incompleta. Pois bem. A história analítica do termo populismo no âmbito das ciências sociais foi permeada por conceituações de cunho social, ideológico ou institucional[4], razão pela qual o termo encerra uma turbulenta indefinição semântica. Aliado a este fato, Jorge Ferreira[5] explicita que a literatura frequentemente aponta como antecedentes históricos do populismo latino-americano os fenômenos ocorridos na Rússia czarista e nos Estados Unidos durante o século XIX, apesar de todas as diferenças existentes entre seus contextos econômico, político, social, agrário, cultural, ideológico e religioso.[6]

Fato é que, no Brasil, o termo começa a ser empregado após a publicação de Brazil under Vargas[7], em 1942; porém, durante o período compreendido entre esta data e o ano de 1964 muito pouco se falou sobre populismo, com a grande diferença que, até então, seu significado era consideravelmente diferente deste arquétipo sensocomunizado utilizado hoje como crítica virulenta a idéias e governos. Jorge Ferreira[8] aponta, após pesquisar diversos documentos da época, que não havia intenção ofensiva na utilização do termo populista tanto para definição de Getúlio Vargas quanto para João Goulart. O populista estava ligado ao povo, atendendo a seus anseios[9], mas sem ser demagógico, manipulador ou mentiroso, o que faz da palavra populismo iniciar sua vida no Brasil com um sentido absolutamente oposto ao que hoje lhe é conferido[10].

Acontece que, após findo o risco da greve geral, as lideranças carismáticas sucedem aos comunistas na diuturna ameaça aos interesses políticos e econômicos das mais tradicionais elites do país, cenário oportuno para a satanização[11] dos populistas e de todas as práticas que remetam a eles, invertendo-se quase que irremediavelmente a visão política e social acerca do populismo. A partir de então, populista passa a ser toda idéia ou forma de governo destituída de conteúdo e de seriedade, baseada tão somente em técnicas, subterfúgios demagógicos, tornando o povo inapto a diferenciar propostas consistentes, sérias, daquelas baseadas apenas nestes engodos desprovidos de substância[12]. Daqui partem as tradicionais chaves para compreensão dos fenômenos populares no Brasil, sempre calcadas sobre a completa ou relativa insipiência do povo em seu exercício de sufrágio[13], e motivadoras de práticas supressoras deste mesmo sufrágio em nome de uma política séria e comprometida.

Fica visivelmente exposto no embate político que a atribuição da qualidade de populista a uma idéia ou pessoa pretende tolher uma maior participação política tanto daqueles sujeitos que visam a alteração no catastrófico quadro social brasileiro marcado por uma abissal desigualdade na distribuição da renda[14] quanto daqueles que apenas não seguem os preceitos clássicos da política nacional. Este fato irá explicar porque pessoas com idéias políticas completamente diversas são unificadas sob o manto do populismo[15].

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O mais importante de se observar é como o sentido de populismo, na forma como utilizado contra a idéia do Anteprojeto, se identifica plenamente com a proposta de seus críticos. É que Francisco Weffort[16] pontua como elementos básicos para sedimentação do populismo a massificação de boa parte dos estratos de uma sociedade, tornando-a eminentemente uma só massa, onde os indivíduos estão relacionados entre si por uma sociabilidade periférica e mecânica; a diminuição da reflexividade da representação; e, o surgimento de um líder carismático. Esta definição, montada com elementos retirados do Estado Novo, diz respeito ao fenômeno de incorporação burocrática das massas ao governo por meio de um movimento corporativista, que faz surgir no Brasil a figura da representação institucional, hoje bem caracterizada pelo Ministério Público. Por tudo sobre o que foi dito sobre essa inversão ideológica[17] do termo populismo, devemos concordar com a afirmação de que "o populista, portanto, é o adversário, o concorrente, o desafeto. O populista é o Outro. [...] Populista é sempre o Outro, nunca o Mesmo."[18].

À luz do debate trazido por Jorge Ferreira[19] acerca das gerações do populismo brasileiro, parece que a crítica dirigida ao Anteprojeto se enquadra, ainda, nos moldes do pensamento da primeira geração. Esta afirmação se faz com base na utilização, pelos críticos, do sintagma substantivo "engodo" acompanhado pelo adjetivo "populista", que denota claramente a vertente assistencialista ou satisfativa de uma proposta qualquer. Pois bem, conforme se pode extrair ainda do referencial montado pelo autor citado[20], a segunda geração do populismo prescinde teoricamente do viés da satisfação, tendo focado suas atenções nas variáveis repressão e manipulação (ou persuasão, para melhor seguir a proposta gramsciana), enquanto a terceira caracteriza-se pela "personalização e autonomia do poder executivo, conciliação de classes e ideal da Nação"[21]. Ainda assim, em que pese a delimitação ora formulada indicar certo envelhecimento do referencial teórico adotado pelos críticos da legitimação da pessoa física para promoção de ações coletivas, é preferível a ingenuidade da opção pela primeira geração à ignorância da utilização de um termo explicado teoricamente pelo senso comum.

Portanto, ao fim da análise empreendida em torno do conceito de populismo, podemos até mesmo dizer sem receio que, dependendo da ótica do leitor, a proposta da legitimação da pessoa física pode sim ser encarada como populista, desde que se entenda que a intenção primordial dos elaboradores de seu texto foi justamente ampliar os campos de atuação política para os mais diversos sujeitos, com o fim primordial de inverter a estagnação social brasileira, ou de chacoalhar as bases da estabilidade improdutiva [22]. No entanto, em virtude de toda a problemática e indefinição que referido verbete encerra, requer-se qualificação que seja, no mínimo, teoricamente mais precisa.

2.2. A evolução da idéia democrática: a necessidade se ir além.

Da idéia de isegoria às noções de democracia de libertação[23], democracia estendida[24] ou democracia radical[25] muito se discutiu acerca da propriedade e da conveniência da adoção um regime democrático de governo. Este debate foi realmente intensificado há cerca de dois séculos, com o advento das duas revoluções

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desencadeadas nos EUA e na França do século XVII. A partir daí a democracia passará a ser, como destacado por Alain Touraine[26], caracterizada de duas diferentes maneiras, seja por seu conteúdo ou por seu procedimento. Tratar de conteúdo é trazer à tona a temática relativa à soberania popular; o procedimento democrático, contudo, dá conta de estabelecer uma liberdade de ação política com as devidas garantias protetivas da manifestação legítima da vontade popular.

Em verdade, se fosse possível identificar neste percurso evolutivo do conceito a sua forma primordial, poderíamos considerá-la como sendo aquela de nuança unidimensional, ou seja, uma democracia pensada como mecanismo de canalização da vontade majoritária. Pensada assim, a democracia fica confinada ao limitado âmbito das eleições ordinárias como se estas fossem suficientemente capazes de dar vazão à questão da representação popular[27]. O grande problema daí advindo foi justamente a total desvinculação representante/representado promovida pelos princípios básicos do mandato representativo[28], que importaram numa violenta quebra de confiança nestes representantes, ocasionando o colapso do esquema representativo. É nesta "falta dessa relação de confiança", diz Jacques Chevalier[29], que "toda a economia das transações políticas que desmorona.".

Devido a esse descompasso, a esse déficit de legitimidade do sistema puramente representativo, os estudiosos do direito e da filosofia política têm reclamado há mais de meio século a criação de novos foros, de novas arenas públicas que possibilitem aos cidadãos uma participação mais próxima no processo de tomada de decisão, sendo que referida pretensão encontra, hoje, espaço na esfera pública[30]. Temos, então, um amadurecimento do conceito de democracia e de sua experimentação na sociedade, motivo pelo qual começamos a investigar não apenas a gênese desta vontade que representa uma maioria, mas igualmente os procedimentos pelos quais se expõe e se faz valer em concomitância à responsabilização de todos os cidadãos pela ordem social[31]. Estes procedimentos em verdade visam a conferir ao jogo político caráter de transparência além de "impedir o arbitrário e o segredo, responder às demandas da maioria, garantir a participação do maior número de pessoas na vida pública."[32]

Mas isso não tem sido suficiente. Os fins a que se prestam os procedimentos democráticos já conhecidos não têm sido atingidos, motivo pelo qual devemos querer mais e nos lançar na busca por uma idéia libertadora de democracia, que possa liberar os indivíduos e as coletividades das amarras do poder, de explodir os horizontes já fechados da concepção tradicional acerca da democracia. Logo, a atividade democrática deve ser desejada e planejada como sendo capaz de liberar estes atores sociais supramencionados, pois apenas assim ela será vigorosa[33]. Surge a dificuldade então de conjugar democracia e república[34] ou democracia procedural e participativa[35].

Rodolfo Viana Pereira[36] chama atenção para o que ele chama de interação produtiva entre os princípios representativo e participativo. De acordo com esta concepção, a democracia passaria a comportar tanto os mecanismos populares de participação nos processos decisórios quanto os tradicionais locus representativos. Segundo o autor, o estabelecimento deste momento democrático na prática é de alta complexidade, exigindo rigorosa delimitação das atribuições de cada um destes vetores da democracia, o que leva à dificuldade de os críticos do modelo tradicional de democracia representativa forjarem ou pensarem novos espaços e maneiras de interação entre esta combinação de formas democráticas. Por sua vez, Luiz Alberto Rocha[37]

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proporá em contraponto ao unidimensionalismo inicial do modelo representativo, um sistema multidimensional, onde caiba uma melhor teoria acerca da representação popular, que não a limite ao espaço inicial dos registros eleitorais intermitentes.

Esta tensão havida entre diversos modelos democráticos na busca por novos espaços políticos capazes de promover a vazão de anseios políticos reprimidos e que comporte a mudança do formato de atuação dos atores sociais[38] será enxergada neste estudo como o deslocamento de parte da vida política, dos clamores e reclamos sociais, para a esfera de atuação do Judiciário[39]. E será justamente no encontro deste Poder com a democracia que poderemos afirmar, ante a formatação social brasileira, a necessidade de se legitimar a pessoa física para propositura de ações coletivas, sob pena de autorizarmos a subtração de poderes legítimos aos seus verdadeiros detentores.

2.3. Comentários sobre a formação democrática brasileira: a sombra da figura da representação funcional

Tomada por base a institucionalização da democracia no Brasil, descobrimos que este movimento se não se deu por meio do uso da política, mas sim do direito. Descobrimos que o afastamento imposto pela impessoalidade das normas e provimentos jurídicos se fez de suma importância para a transposição de um patriarcado a uma nação. O insulamento burocrático, tão criticado principalmente no período da ditadura militar (1964-1985), foi em verdade o grande responsável pelo início da democratização brasileira.

Hoje, no entanto, essa construção diferenciada da democracia impõe-nos um verdadeiro déficit democrático, o que explica a falta de aplicabilidade dos programas sociais constitucionalmente previstos. Em outras palavras, e por mais paradoxal do que possa parecer, a construção de uma democracia sobre os pilares do direito acabou por tornar inefetivas as garantias constitucionais previstas na Constituição de 1988, devido à falta de tradição e apoio das instituições políticas tradicionais combinada com a sombra da representação funcional que nos acompanha desde a primeira República. Com o assalto das vias políticas pelo Poder Executivo, pelo uso incessante de Medidas Provisórias e governos de coalizão, a tomada de decisões relativas aos rumos do Brasil como democracia tem sido suprimida não apenas da sociedade civil, mas igualmente do âmbito parlamentar[40].

Visando a suprir esta carência de cidadania cívica que nos conduz ao propalado déficit democrático, a cidadania jurídica baseada na tradição do direito e nas suas novas instituições[41] busca um locus propício à sua realização e é neste contexto que vislumbramos a legitimação do indivíduo para propositura das ações coletivas como a ferramenta ideal de sua participação e influência no processo político. Longe de demonstrar, competentemente, as nuanças mais ricas desta construção entremeada de avanços e retrocessos, gostaríamos de destacar a peculiaridade da participação do direito como protagonista deste processo social. Para nos aproximarmos desta idéia que já se faz repetida em tão curto espaço de texto, trazemos Oliveira Vianna para falar, de 1949, um pouco sobre o que representava a democracia naquele momento. De acordo com

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suas observações, a democracia brasileira não será completamente realizada pelo sufrágio universal, mas sim em garantias ao "homem do povo-massa" para conter o arbítrio das autoridades eleitas de forma direta ou nomeadas por investidura carismática[42]. Novamente: estávamos já em 1949, três anos após o início de nosso segundo período de democratização liberal. Oliveira Vianna nos dá as pistas, então, de que ainda naquele tempo o direito, pelo Poder Judiciário, deveria funcionar como verdadeira salvaguarda da democracia brasileira, na medida em que efetivaria a contenção do arbítrio dos eleitos, o que considerava o ponto vital da democracia.

Indo adiante com suas análises, entendeu necessário ponderar que faltava a nossos reformadores constitucionais e às demais figuras liberais a compreensão de que a garantia do sufrágio direto de nada serviria à democracia sem a instituição de um Poder Judiciário forte, ativo e que ao alcance de todos os cidadãos[43]. Foram estas pistas que nos abriram os olhos para a peculiar construção democrática do Estado brasileiro, que desde seu começo precisou da figura forte das garantias liberais trazidas pelos instrumentos normativos do direito. Desde a Constituição de 1891, em verdade, o direito assume importante papel civilizatório, frente à inefetividade das instituições e formas representativas de democracia que haviam sido importadas dos Estados Unidos[44]. Este sentimento de colonização das esferas políticas pelas oligarquias e patronatos possibilitou análises como de Oliveira Vianna, que buscava a dispersão pelo Judiciário das garantias de segurança e acessibilidade ao poder soberano até aos mais "jecas".

O grande fiat provocado pelo direito, na verdade, ainda estava por vir com a Revolução de 30, quando "ao instituir o Ministério do Trabalho como o 'ministério da Revolução', fez do direito do trabalho e da sua legislação social o principal instrumento de ampliação da República, incorporando a ela importantes setores sociais até então excluídos [...][45]". É a assunção das massas na conformação do rearranjo político. É claro que, o entendimento deste período da forma como propomos apenas será possível se esquecermos a tradicional descrição do Estado Novo como sendo a implantação de um regime autoritário no Brasil. É de suma importância que entendamos tratar-se de uma democracia plebiscitária de tendência antiliberal. A diferença prática resultará no entendimento de que o regime estabelecido durante o Estado Novo tinha ciência da necessidade de comunicação interativa com as massas de forma a viabilizar sua integração no seio da organização estatal por meio de uma política de massas corporativista, sob a qual se fundiam práticas plebiscitárias e a concentração de poder nas mãos do Presidente, tudo realizado em absoluta consonância com a aceitação popular[46].

Esse programa corporativista para aceitação e adesão social se fez pela gramática do peleguismo[47], no momento em que os sindicatos são incluídos na agenda do Estado, criando verdadeiras escolas de civismo onde os trabalhadores aprenderiam a tornar seus interesses, interesses comuns[48]. Veja-se que o direito passa a operar de maneira diversa da exigida por Oliveira Vianna após o fim do Estado Novo. Não se trata aqui de conferir aos indivíduos as garantias liberais necessárias ao combate dos muitos arbítrios existentes nas autoridades públicas. O discurso agora passa pela cooptação do peso político das massas por fórmulas antiliberais, pela integração burocrática corporativista, numa espécie de cidadania regulada. Essa formatação corporativista estende-se até 1964, e neste interregno acaba por encontrar-se com

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instituições de representação política e desaguar numa simbiose conhecida por representação generalizada[49].

A representação generalizada passa a dar o tom e a forma da democracia brasileira, mesmo durante o período de suspensão autoritária provocado pela ditadura militar, chegando a ser recepcionada pela atual Constituição de 1988. Se formos até o art. 129 da Constituição de 88, veremos que o órgão destinado a zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia (II), a promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (III), a defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas (V) é justamente o Ministério Público, instituição de caráter representativo eminentemente funcional.

É desta maneira que a figura da representação funcional atravessa gerações e persiste como artifício conformador da cidadania no contexto social brasileiro, ora tornando-a regulada[50] ora conduzindo à cidadania da Constituição de 1988. Essa ciclicidade da representação funcional, "tem resultado, como um dado singular à nossa formação, uma parceria institucional entre as duas formas de representação, do que é exemplo a freqüência com que os partidos políticos recorrem à iniciativa do Ministério Público[51]". E por esta dupla forma de representação abrimos caminho à construção de uma cidadania diversificada, complexa, que entrecruza elementos funcionais e políticos para viabilização e realização da massa enquanto povo legitimamente afirmado e reconhecido, tendo à sua disposição ferramentas como o sufrágio universal, as ações judiciais para controle de constitucionalidade das leis e as ações para proteção dos direitos coletivos lato sensu.

2.3.1. O trânsito dos atores democráticos: a judicialização da política.

Do que foi dito até agora, podemos identificar que a cidadania cívica ou política fica no Brasil limitada "a políticas compensatórias e dos eventuais benefícios provenientes das máquinas que manipulam clientelas"[52]. O viés funcionalista presente na construção de nossa democracia sempre impôs um recuo às investidas da política na tentativa de ganhar uma maior fatia do espaço público. Com a crise atual - que se estende por todos os países do globo, e não apenas aos da periferia - da democracia representativa, esta situação se agrava, uma vez que nosso único instrumento legítimo de participação política acaba por sucumbir ao avanço do controle normativo pelo Poder Judiciário, conforme observa Gisele Cittadino[53].

Muitos são os estudiosos que observarão este deslocamento das manifestações democráticas para o âmbito do Judiciário, como Catalina Slumovitz e Daniela Urribarri que pontuam este aumento do na judicialização dos conflitos. De acordo com seus estudos, este acontecimento é, em verdade, multifacetado, compreendendo a intervenção cada vez maior dos juízes e das Cortes judiciais nas políticas públicas instituídas pelos Poderes Executivo e Legislativo, a utilização do Judiciário pelos atores

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políticos na busca por uma solução de conflitos sociais e a crescente utilização política de um discurso afeto ao direito[54].

O que é mais interessante de se notar é que, ao desmembrar direito da política e alertar para o perigo de se confundir um com o outro, Gisele Cittadino[55] nos deixa muito claro que a força que o direito adquire nas últimas décadas provém da afirmação da autonomia individual dos sujeitos. Autonomia esta não mais entendida como aquela esfera privada impenetrável, "mas sim como a capacidade que temos de dar a nós mesmos o nosso próprio direito". Ao permitirmos que os indivíduos possam dar a si mesmos seus próprios direitos, sem, contudo, cogitarmos do fim da democracia representativa, talvez estejamos viabilizando o tão esperado encontro dos instrumentos de democracia participativa com os da representativa.

Começamos, então, a nos aproximar cada vez mais do objeto principal de nossa pesquisa, qual seja, a utilização do direito e de seus instrumentos processuais para superação do déficit democrático que tanto ameaça a sobrevivência do Brasil enquanto espaço público de discussão e convergência dos interesses de seu povo na busca de sua tradução em direitos. É exatamente o que propõe Luiz Werneck Vianna[56], ou seja, a utilização das garantias processuais em favor de indivíduos e da coletividade em face dos entes estatais ou financeiros a fim de reduzir este tão acintoso déficit. Com o advento das ações coletivas, tais como as ações civis públicas e ações populares, abre-se um novo campo para vazão daquelas demandas sociais que ficam retidas pelos instrumentos clássicos de representação.

Nesse movimento de abertura destes novos espaços, é curioso notar como os próprios agentes do sistema representativo acabam valendo-se deles, numa relação clara de complementaridade entre os diversos campos democráticos. Longe de haver qualquer excesso praticado pelo Judiciário, é de se notar que o próprio Legislativo vem não apenas dotando a sociedade de novos instrumentais democráticos como fazendo uso destes. Como podemos notar, as figuras de representação atingiram um estágio tal de imbricação que na medida em que o Poder Legislativo concede à população novos instrumentos de defesa e aquisição de direitos pelas vias funcionais, tem seus próprios integrantes (vereadores, deputados e senadores) utilizando-se destes expedientes. É o caso da ação popular. Pelo que restou demonstrado dos dados levantados por Luiz Werneck Vianna em sua pesquisa sobre as ações populares e as ações civis públicas, de fato "aproximadamente um terço do total das ações consultadas foi de iniciativa direta de parlamentares - 27 ações propostas por deputados estaduais, 8 por vereadores e três por deputados federais."[57].

Estes dados, porém, não podem ser dissociados da conclusão a que chegaram os autores da pesquisa. Quero dizer que, longe de entenderem que a ação popular tenha sofrido algum desvirtuamento por sua utilização por representantes políticos, os pesquisadores afirmam que esta prática nada mais representa do que uma salutar complementaridade entre as duas formas de representação coexistentes na democracia brasileira, que abre mais uma arena para a democracia brasileira. É, portanto, curioso observar como, ao contrário das análises tradicionalmente feitas, que dão conta de uma perniciosa judicialização da política[58], parte do próprio Legislativo o aparelhamento da cidadania social com estes novos instrumentos de revolução processual, capazes de dotar o cidadão de uma valiosa ferramenta para realização dos direitos reconhecidos pela via da cidadania política. Logo, a conclusão a que se chega é diametralmente

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oposta à leitura tacanha e preconceituosa realizada por juristas que costumam tirar conclusões precipitadas sobre o assunto.

Paradoxalmente, na medida em que a cidadania vai se tornando complexa, a sobrecarga de exigências éticas do cidadão vai se dissipando em virtude de uma melhor (ao menos quantitativamente) distribuição do ônus democrático. A edificação de uma cidadania complexa que conjuga instrumentos legitimamente democráticos com aqueles novos de caráter funcional/procedimental, longe de exigir do cidadão uma postura insuportavelmente participativa, traz à tona novos atores sociais que se encarregam de distribuir este custo da construção democrática da nação. O Judiciário, como visto, passa a atuar como verdadeiro guardião do princípio da composição social, interagindo intimamente não apenas com o indivíduos mas com os corpos intermediários da coletividade e com o Ministério Público, força motriz de proteção e criação dos direitos inerentes à sociedade de massas.

Esta talvez seja a melhor fórmula de estímulo e desenvolvimento social de um país periférico, cuja modernização se deu em plena vigência de períodos autoritários, sem o envolvimento e participação de seu povo, tendo deixado como legado um impressionante déficit democrático que se tenta agora reparar por vias colaterais. Devemos, contudo, proceder à constante avaliação da retro-mencionada distribuição do ônus democrático. Ao trabalhar o acesso à justiça e o processo como efetivação dos direitos fundamentais, por exemplo, Cattoni se vale da doutrina de Dinamarco para colocar uma carga ética quase insuportável sobre os juízes, ao pretender que estes, em sua atividade judicante, atuem de forma reparadora, suprindo "a falta de virtudes da legislação (envelhecida ou mal feita), através do apelo aos compromissos éticos do juiz, às finalidades políticas do processo e a um uso alternativo do direito."[59]. Esta sobrecarga acaba se dando por transferência, na medida em que a retiramos do cidadão comum.

Ora, não adianta apenas transferirmos a carga; é necessário que procedamos a uma melhor equalização deste peso. Equalização que, no Estado Democrático de Direito apenas se dará em um locus apropriado a uma construção dialogada. Pois bem, já existem elementos suficientes para identificar que a formatação tradicional do processo não será este lugar privilegiado. É neste momento que a revolução processual provocada pelas ações coletivas indicará o melhor caminho para uma democracia progressiva, de libertação ou estendida.

3. A POSSIBILIDADE DE DOTAR A SOCIEDADE DE PROCEDIMENTOS QUE CONDUZAM À REALIZAÇÃO DE IDEAIS DE JUSTIÇA.

A revolução processual que se comenta, obviamente, não se fez desacompanhada de uma outra, no seio dos direitos entendidos por fundamentais; tampouco a precedeu de forma a impulsionar toda a alteração do quadro esquemático desses direitos tão delicados e peculiares. O fato é que todas as mudanças experimentadas no cenário dos direitos fundamentais pelo mundo afora acabaram por refletir na ciência processual, exigindo desta novas respostas aos anseios latentes na

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sociedade. Acontece que, não apenas no Brasil, o Poder Executivo, responsável por efetivar os direitos fundamentais conferidos aos cidadãos, através da materialização, da concretização daquelas normas elaboradas durante o fenômeno constituinte, tem deixado de cumprir sua finalidade a contento. Aqueles direitos de solidariedade encontrados, principalmente, na chamada terceira geração passaram, portanto, ao limite de seu reconhecimento, não conseguindo alcançar satisfatividade.

Mas não bastava reconhecer os direitos de solidariedade. Era preciso que o sistema jurídico os tutelasse adequadamente, assegurando sua efetiva fruição. Da declaração dos novos direitos era necessário passar à tutela efetiva, a fim de se assegurarem concretamente as novas conquistas da cidadania. E como cabe ao direito processual atuar praticamente os direitos ameaçados ou violados, a renovação fez-se sobretudo no plano do processo. De um modelo processual individualista a um modelo social, de esquemas abstratos a esquemas concretos, do plano estático ao plano dinâmico, o processo transformou-se de individual em coletivo, ora inspirando-se no sistema das class actions da common Law, ora estruturando novas técnicas, mais aderentes à realidade social e política subjacente. E nesse campo o Brasil tem algo a dizer.[60]

Podemos observar o deslocamento feito por Ada Pellegrini Grinover (coautora deste estudo), ao lançar para o plano do processo a atuação prática sobre os direitos ameaçados ou violados - ou ainda não cumpridos -, permitindo afirmar a nova posição do Judiciário como guardião do princípio da composição social. Não é à toa, portanto, a afirmação de que o Brasil tem algo a dizer sobre novas técnicas processuais mais aderentes à realidade social e política subjacente. Nossa experiência com a cidadania complexa, forjada pela imbricação de dois diferentes modelos de representação, trouxe-nos vivência na lida da construção democrática pela via normativa.

Os elementos sociais que nos são tão caros ao entendimento de nós, brasileiros enquanto povo - afinal, que outra nação tem seu plano social entremeado por carnavais, malandros e heróis? -, devem ter o poder de influenciar nas escolhas políticas que nossos representantes farão no momento do repensarem estes novos espaços que precisam ser abertos. Afinal, com estas novas características do Judiciário, que expõe suas entranhas às demandas sociais, as ações coletivas se apresentam como terreno fértil para consolidação de novos campos democráticos aptos ao exercício de conflitos coletivos. Insisto no termo exercício e não resolução, pois, "tais arenas, a par de realizarem movimentos defensivos da sociedade em face de abusos do poder do Estado e do mercado, têm servido como lugar de afirmação de novos direitos e de participação na construção da agenda pública"[61].

Esta observação das ações coletivas como ferramentas de afirmação de novos direitos e de participação na construção da agenda pública não pode prescindir, porém, de breve análise retrospectiva da experiência brasileira no manejo deste tipo de ferramenta processual. Começaremos, portanto, pela Ação Popular, hoje prevista pela Constituição de 1988 e regulada pela Lei 4717/65, mas que surge no ordenamento jurídico positivo brasileiro por ocasião da promulgação da Constituição de 1934,

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embora desde o Império, já se admitisse doutrinariamente "que qualquer pessoa do povo propusesse a ação em defesa das coisas públicas"[62].

Em seu art. 113, inc. XXXVIII, a Constituição de 34 dispunha que "qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados e dos Municípios.". Até 1937, porém, quando a Constituição de Francisco Campos expurgou-a do ordenamento jurídico, a ação popular não passou incólume às mais diversas críticas. O Constituinte de 46, por sua vez, ao redigir o parágrafo 32 do artigo 141, não apenas tornou a prever a possibilidade de ajuizamento de ação popular, como alargou seu escopo para introduzir, como legitimados passivo, os entes da administração indireta, "instâncias de poder importantes desde a ampla modernização do aparato estatal realizada durante os quinze anos anteriores."[63]. Daí, teremos sua regulamentação em 1965 pela Lei 4717, passando incólume às alterações constitucionais de 67 e 69. Em 1988, por fim, vemos a ação popular adquirir maior fôlego normativo, enquadrando-se como garantia fundamental prevista no art. 5o, inciso LXXIII, que dispõe que:

Art. 5o [...]

LXXIII - Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

Fato curioso é a constante confusão promovida pelos processualistas brasileiros ao rechaçar a legitimidade ativa dos indivíduos para propositura de ações coletivas com base nos dados relativos à propositura da ação popular em todo seu histórico de existência. É comum encontrarmos textos dizendo, por exemplo, não ser "preciso ir tão longe para buscar a experiência com a legitimidade coletiva de indivíduos, pois temos a nossa própria experiência com as ações populares."[64]. Sim, temos nossa própria experiência com as ações populares e esta nos diz duas coisas bem interessantes: a primeira, repetindo conclusão já feita neste trabalho, que a utilização das ações populares por políticos ou outras autoridades apenas faz reforçar a complementaridade entre as duas formas de representação coexistentes na democracia brasileira, que abre mais uma arena para a democracia brasileira. A outra, não menos importante, que os interesses em jogo são completamente diferentes daqueles envolvidos em demandas coletivas para proteção de interesses coletivos lato sensu que afetam, diretamente, a esfera social (e principalmente financeira) dos indivíduos. Ademais, estudos promovidos por especialistas autorizados indicam que "quanto mais um ação popular se parece com uma ação civil pública, mais o Judiciário se mostra sensível a ela"[65].

Feita da experiência com a ação popular um verdadeiro teste no manuseio de instrumentos de tutela dos interesses difusos e coletivos, veremos, enfim, explodir os horizontes do processo individual com a promulgação, em 24 de julho de 1985, da Lei 7347/85, que dotou o ordenamento jurídico brasileiro de uma ação verdadeiramente protetiva de interesses difusos e coletivos, a Ação Civil Pública.

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Na verdade, como lembram Luiz Werneck Vianna e Marcelo Burgos, é "com a lei ambiental e a lei orgânica do Ministério Público [que] amplia-se no país o debate em torno da questão da tutela dos direitos difusos"[66]. Mais importante do que entender a disputa travada naquele momento entre o Projeto Bierrenbach e o Projeto do MP é identificar de que forma a atuação do Ministério Público ganha uma aura de protetor incondicional dos direitos afetos à sociedade. Neste ponto retoma-se a importância da representação funcional na formação contínua da cidadania regulada. Ora, como já dito anteriormente, esta forma de representação que adquire tônus democrático durante o Estado Novo e chega em plena forma à Constituição de 1988, praticamente se personifica na instituição do Ministério Público, assim que este consegue sua alforria pelos artigos 128 e seguintes do pacto constituinte de 88. É o Parquet, portanto, que se porta verdadeiramente como o defensor do interesse público, como previsto pelos arts. 127 e 129 da Constituição. Pode-se creditar o sucesso, no Brasil, do debate em torno das ações coletivas ao expressivo papel desenvolvido pelo Ministério Público em sua utilização. Não é por defender a legitimidade do indivíduo para propositura de ações coletivas que pretendemos retirar a importância do Ministério Público para o desenvolvimento dessas ações. Não há como compartilhar o entendimento de que "ao se retirar da legitimidade coletiva das entidades, públicas e privadas, conferindo-a também a indivíduos, dilui-se o poder das associações e do Ministério Público sem dar, em contrapartida, um poder substancial aos membros do grupo"[67].

O Ministério Público deve fomentar na sociedade a vontade de criar e proteger seus próprios direitos, de se emancipar. O que se espera do manejo do direito e seus procedimentos enquanto nova arena de participação, longe de ser a pacificação de todos os conflitos, é justamente o seu acirramento, gerando uma tensão emancipatória tanto em nível individual quanto coletivo[68].

Não se diga que esses percursos da democracia têm sido invisíveis. A sociedade já os identificou enquanto chave de maior participação na vida pública do Brasil. Porém, para que o movimento seja seguramente executado, faz-se necessária a compreensão por parte dos atores democráticos de que esses instrumentos diversificados devem encontrar seu ponto de convergência, para que assim possam ser utilizados como complementares[69]. Ou seja, não basta que a sociedade entenda e assimile as novas instituições como possibilidades de participação na vida pública; é preciso que as autoridades públicas compreendam as possibilidades de dotar a sociedade de procedimentos que conduzam à realização de ideais de justiça, dentro do molde brasileiro de representação generalizada, frente ao déficit democrático que tende a se agravar.

4. LEGITIMAÇÃO PARA AGIR NAS CLASS ACTIONS. TENTATIVA DE DEMOCRATIZAÇÃO OU DESONESTIDADE INTELECTUAL?

O levantamento acerca da construção democrática brasileira e da formação da cidadania de seu povo não foi feito em vão, buscando, antes de tudo, embasar uma conclusão socialmente preocupada que aponta para a legitimidade ativa dos indivíduos à propositura de ações coletivas. Correta, portanto, a opção do Anteprojeto de Código

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Brasileiro de Processos Coletivos, no sentido de que deve ser atribuída legitimidade ativa aos indivíduos (pessoas físicas) na exata medida em que essa opção se afigura validamente democrática, pelo simples motivo de que na literatura especializada, não existe voz contrária à instituição de formas reguladas de participação popular[70], que possibilitem aos sujeitos democráticos formular e pleitear seus próprios direitos. É a possibilidade de autonomia do povo brasileiro, a ser promovida por uma nova arena pública de debates e embates, onde não se pretenda apaziguar conflitos, mas pelo contrário, acirrá-los provocando a emancipação deste povo, aguçando-lhe os sentidos de uma cidadania complexa que permite a criação de novos direitos na medida em que exige deste a abertura às demandas sociais[71].

Deve-se estar cientes de que o Brasil como democracia periférica teve seu "tempo de 'ocidentalização' superpos[to] [a]os processos de conquista da democracia e de implosão identitária dos sujeitos (partidos, classes)."[72]. Portanto, a participação individual na conformação de uma ação coletiva (entendida como via institucional disponível para expansão da participação e influência dos cidadãos no processo político) garante ao homem-massa a idéia de pertencimento, fazendo com que sua atividade política não se esgote na satisfação, mas que o conduza na busca por mais satisfação dentro de uma incessante luta politizada[73]. E a abertura de um novo espaço para realização desta atividade que busca mais satisfação se faz necessária na medida em que:

O ambiente de interação política, o espaço onde se opera a conversão da "satisfação" em impulso garantidor de "mais satisfação", o lugar que mantém a liberdade como um horizonte aberto e como energia descontrolada de um poder (ainda) sem forma - esse espaço público, enfim, não se estende aos "indignos", isto é, aos seres que se reproduzem à margem das dinâmicas propiciadoras de reconhecimento social.[74]

São, no entanto, compreensivas as preocupações acerca do monopólio do debate promovido no interior das ações coletivas pelos advogados constituídos por particulares, porém, o problema, como dito por Ferraresi, "não está na legitimidade atribuída ao indivíduo; talvez o que mereça destaque é o controle dessa legitimidade"[75].

4.1. A contenção da banalização pelo controle da representatividade adequada

As críticas acerca da possibilidade de banalização do uso das demandas coletivas são perfeitamente refutáveis pela construção de um sistema seguro de controle da representatividade daquele que leva uma demanda coletiva à apreciação do Judiciário. Com um sistema eficiente, capaz de promover uma verdadeira filtragem nas demandas aventureiras, conseguir-se-á abrir o espaço democrático das ações coletivas a todos, a um custo zero de fracasso[76]. Pois o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos conseguiu estabelecer esse sistema de forma bastante rígida e segura, ao

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conferir ao juiz da causa o controle da representatividade adequada, tendo em vista os seguintes requisitos:

Art. 20. omissis

I - omissis

a) Credibilidade, capacidade e experiência do legitimado;

b) Seu histórico na proteção judicial e extrajudicial dos interesses ou direitos difusos e coletivos;

c) Sua conduta em eventuais processos coletivos em que tenha atuado;

II - o membro do grupo, categoria ou classe, para a defesa dos interesses ou direitos coletivos, e individuais homogêneos, desde que o juiz reconheça sua representatividade adequada, nos termos do inciso I deste artigo;

§ 2°. No caso dos incisos I e II deste artigo, o juiz poderá voltar a analisar a existência do requisito da representatividade adequada em qualquer tempo e grau de jurisdição, aplicando, se for o caso, o disposto no parágrafo seguinte.

Conforme anota Kazuo Watanabe[77], poucos países da civil Law adotam o controle da representatividade adequada pelo juiz, dentre os quais estaria o Brasil caso fosse adotada a proposta de legitimação das pessoas físicas formulada no Anteprojeto, tendo em vista que sobre estes atores recairia tão funcional e rigoroso controle, que de acordo com sua tradição pode ser feito diretamente pelo juiz ou a critério do legislador, segundo ditames estabelecidos em lei. A opção do Anteprojeto quanto ao controle da representatividade segue o que Kazuo Watanabe[78] denominou de "escrutínio" judicial dos pré-requisitos estipulados pelo legislador. A opção do Anteprojeto pode ser entendida, então, como rígida e segura pois funciona como dupla garantia, uma vez que a coisa julgada forma-se apenas secundum eventum litis e in utilibus (art. 103, CDC), o que já restringe os riscos advindos de uma possível demanda temerária.

As pessoas físicas legitimadas deverão apresentar em juízo as credenciais que as habilitem enquanto representantes adequados de todos aqueles que serão substituídos na ação manejada. Mas não basta forjar uma situação legitimante no momento de propositura da ação; conforme previsto no parágrafo 2° do art. 20, do Anteprojeto, o Judiciário poderá a todo tempo, durante todo o curso da ação, em qualquer grau de jurisdição, aferir essas condições legitimadoras[79], de maneira que não se vislumbram no Anteprojeto falhas que possam acarretar uma banalização do instituto das ações coletivas, ainda que se legitimem as pessoas físicas.

4.2. A legitimação concorrente como mecanismo de salvaguarda.

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Não se diga que ao se atribuir legitimidade aos indivíduos se estaria colocando sobre eles aquela mesma sobrecarga ética a que aludimos anteriormente. A possibilidade de utilização do instrumento processual, como espaço público privilegiado para o exercício da autonomia, apenas ficará prejudicado acaso se tornem altos os custos do fracasso. Acreditamos, entretanto, que os arts. 7º caput e parágrafo 2º; 11 e seus parágrafos; 13 e seus parágrafos; 17 e seus parágrafos; 20, parágrafos 3º e 6º a 9°; 27 e seus parágrafos, todos do Anteprojeto Brasileiro de Código de Processos Coletivos, sejam aptos a fulminar ou, pelo menos, a reduzir ao máximo esse risco. A legitimação, quer no Anteprojeto Brasileiro de Código de Processos Coletivos, quer no novo Anteprojeto, é concorrente, servindo como mecanismo de salvaguarda das ações coletivas.

Consoante bem destacou Eurico Ferraresi[80], "a opção brasileira pela legitimidade concorrente é a mais adequada, uma vez que vários são os entes aptos à propositura de demandas coletivas". A intenção é distribuir o ônus da construção democrática, sem a imposição de uma sobrecarga ética sobre quaisquer dos atores sociais. Por isto, a legitimidade deve ser concorrente, permitindo que todos os legitimados possam se ajudar, se complementar, numa busca pela realização de direitos que insistem em ser descumpridos e pela recriação de direitos que se entendam necessários O Anteprojeto Brasileiro de Código de Processos Coletivos prevê medidas como a notificação dos demais legitimados para assumirem a titularidade de ação proposta por quem não detenha representatividade adequada, por quem não tenha legitimação ou por quem desista ou abandone a demanda em curso, além do litisconsórcio entre legitimados.

Art. 20. omissis

[...]

§ 3°. Em caso de inexistência do requisito da representatividade adequada (incisos I e II deste artigo), o juiz notificará o Ministério Público e, na medida do possível, outros legitimados, a fim de que assumam, querendo, a titularidade da ação.

[...]

§ 6°. Será admitido o litisconsórcio facultativo entre os legitimados, inclusive entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados.

Estando o Ministério Público obrigado a atuar por força dos art. 127 da Constituição e dos dois Anteprojetos, não haverá demanda relevante que não seja levada, forçosamente, a seu conhecimento, podendo exercer, assim como o faz nos dias de hoje, seus poderes institucionais de defesa e proteção da sociedade, seja ajudando no manejo e condução das ações coletivas, seja requerendo ao juiz competente que negue a condição de representante adequado àquele que assim se apresente. Trata-se, portanto,

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do estabelecimento de uma relação responsiva a ser estabelecida entre os atores sociais e o Poder Judiciário, como guardião do princípio da composição social, numa mobilização de criação de novas arenas de conflitos coletivos no âmbito das ações coletivas, onde indivíduos, Ministério Público e associações poderão participar da construção da agenda pública ao se confrontarem com Estado ou mesmo com empresas[81].

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo buscado observar de perto as particularidades da institucionalização da democracia no Brasil, foi possível compreender as razões pelas quais a livre cidadania pregada pela Constituição de 1988 ainda não foi plenamente alcançada. A figura de representação institucional hoje verificada no Ministério Público confere à cidadania o mesmo antigo caráter limitador, regulador, que não permite sua emancipação. Em virtude disso, buscamos a abertura de mais de um locus propício ao eterno devir dos conflitos sociais.

Entender a complexa imbricação existente no Brasil entre duas formas de representação nos fez, por um lado, concluir que, na medida em que houver entre elas concordância quanto à facilitação procedimental legítima à construção democrática, aumentam as possibilidades de participação, pela sociedade, na vida pública e no processo de aquisição de direitos, de forma autônoma. É nesse sentido que o uso político das ações populares não pode ser entendido como fracasso deste instrumento mas, pelo contrário, como sucesso enquanto ferramenta mista de democratização.

Por isso devemos levar em conta que as formas representativas são apenas o pórtico de acesso aos espaços privilegiados de diálogo e conflito onde efetivamente se exerce a democracia. Portanto, entender que as figuras de representação, seja ela funcional ou pública, sejam de per si suficientes para promover a emancipação dos indivíduos enquanto tais e não como membros de uma coletividade, é equivocar-se quanto à forma de atuação dos agentes sociais. O indivíduo precisa se emancipar de forma a saber encontrar as formas de satisfatividade de seus interesses e essa emancipação apenas advirá na medida em que a pessoa física for incluída de forma direta nas relações responsivas mantidas com o poder institucionalizado. Atingir esse ponto de maturação social seria, enfim, implementar as condições contempladas pela Constituição de 1988.

A revolução processual provocada pelos instrumentos de tutela coletiva nos fez descobrir um novo espaço democrático, espaço que, até agora, se encontrava fechado, congestionado, dominado por forças descomprometidas com o desenvolvimento social do país.. Nesse contexto é que se percebe que nossa tradição jurídico-democrática não apenas autoriza como exige a legitimação da pessoa física às ações coletivas, na tentativa de buscar a livre cidadania.

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6. REFERÊNCIAS

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[1] FERRARESI, Eurico. A pessoa física como legitimada ativa à ação coletiva. In: Direito Processual Coletivo e o anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos. GRINOVER, Ada Pellegrini et al. [org]. São Paulo: RT. 2007. pp. 136/143.

[2] Chamamos de novas respostas porque os argumentos já foram brilhantemente refutados por FERRARESI. ob. cit.

[3] GIDI, Antônio. Rumo a um Código de Processo Civil Coletivo... Rio de Janeiro: Forense. 2008. p.229.

[4] CERVI, Emerson Urizzi. As sete vidas do populismo. Rev. Sociol. Polit., Curitiba, n. 17, Nov. 2001. Disponível em: . Acesso em: 16 Feb. 2009. doi: 10.1590/S0104-44782001000200012.

[5] FERREIRA, Jorge. O nome e a coisa: o populismo na política brasileira. In: FERREIRA, Jorge [org]. O populismo e sua história. Debate e crítica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2001. p. 79.

[6] FERREIRA. ibidem.

[7] LOEWENSTEIN, Karl. Brazil under Vargas. Nova York: The Macmillan Company. 1942. 382p.

[8] FERREIRA. ob. cit. p. 115

[9] CERVI. idem.

[10] FERREIRA. ob. cit. p. 116.

[11] CERVI. idem.

[12]. Ibidem.

[13] FERREIRA. ob. cit. p. 21. É o populismo, afinal, que demonstra como "o povo não sabe votar" ou, em versão mais otimista, " ainda não aprendeu a votar".

[14] BORGES, Vavy Pacheco. O populismo e sua história: debate e crítica. Rev. bras. Hist., São Paulo, v. 22, n. 43,2002.Disponível em :. Acesso em: 16 Feb. 2009. doi: 10.1590/S0102-01882002000100013.

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[15] FERREIRA. ob cit. pp. 76-7.

[16] WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. Rio de Janeiro: Paz e Terra.2003.

[17] Acerca do sentido aqui empregado para ideologia, ver: ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de Estado. 2. ed. Trad. de Valter José Evangelista e Maria Laura Viveiros de Castro. Rio de Janeiro: Graal, 1985.; ZIZEK, Slavoj. Bem-vindo ao deserto do real! São Paulo: Boitempo. 2003. 191p.

[18] FERREIRA. ob cit. p. 124

[19] Idem.

[20] Idem. p. 84

[21] Idem. p. 122

[22] SANTOS, Wanderley Guilherme. Horizonte de desejo... Rio de Janeiro:FGV. 2006. 200p.

[23] TOURAINE, Alain. O que é a democracia? 2. ed. trad. Guilherme João de Freitas Teixeira. Rio de Janeiro: Vozes. 1996. pp. 21 e ss.

[24] ROCHA, Luiz Alberto S. Estado, democracia e globalização. Rio de Janeiro: Forense. 2008. pp. 190 e ss.

[25] MOUFFE, Chantal. O regresso do político. Trad. Ana Cecília Simões. Gradiva: Lisboa. 1996.

[26] TOURAINE, Alain. ob. cit. pp. 21 e ss.

[27] ROCHA. ob. cit. p. 183-4.

[28] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A democracia no limiar do Século XXI. São Paulo: Saraiva. 2001. p. 25.

[29] CHEVALIER, Jacques. L'État post-moderne. Paris: LGDJ. 2003. P. 146

[30] PEREIRA, Rodolfo Viana. Tutela Coletiva no Direito Eleitoral... Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008. p. 135

[31] TOURAINE. ob. cit. p. 20

[32] Ibidem.

[33] A democracia só é vigorosa na medida em que é alimentada por um desejo de libertação que, de forma permanente, apresenta novas fronteiras, ao mesmo tempo longínquas e próximas, porque se volta contra as formas de autoridade e repressão que atingem a experiência mais pessoal. Idem. p. 23

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[34] RIBEIRO, Renato Janine. Democracia versus República. A questão do desejo nas lutas sociais. In: Pensar a república. BIGNOTTO, Newton [org]. Belo Horizonte:UFMG. 2000.

[35] A ação democrática situa-se entre a democracia procedural, que carece de paixão, e a democracia participativa, que carece de sabedoria. TOURAINE. ob. cit. p. 23.

[36] PEREIRA. ob. cit. pp. 136-7

[37] ROCHA. ob. cit. p. 184

[38] La debilidad de los actores colectivos precipita la búsqueda de salidas individuales a problemas sociales. Actualmente esta democratización comienza y muchas veces termina en los individuos -en sus expectativas y en sus nuevas capacidades de acción. [...] En realidad, ahí donde el antiguo vínculo social dual -jerarquía e igualdad, pero con predominio de la primera- asignaba a cada actor un claro lugar en el espacio social, dictándole sus conductas y restringiendo el abanico de sus transgresiones interactivas, en el nuevo marco de una sociabilidad más horizontal y exigente en términos igualitarios, las relaciones con los extraños son globalmente percibidas como menos estructuradas. Incluso a través de mecanismos pervertidos, la horizontalidad del vínculo social se impone. SORJ, Bernardo; MARTUCCELLI, Danilo. Brasil: ¿qué políticas para qué cohesión social? Disponível em www.bernardosorj.com. Acesso em 19 de fevereiro de 2009.

[39] Sobre este tema, o qual retomaremos adiante, vide: GARAPON, Antoine. O juiz e a democracia...trad. Maria Luiza de Carvalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan. 2001; VIANNA, Luiz Werneck [org] A democracia e os três poderes. Belo Horizonte:UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ. 2002; SORJ, Bernardo; MARTUCCELLI. O desafio latino-americano: coesão social e democracia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2008; SMULOVITZ, Catalina; URRIBARRI, Daniela. Poderes Judiciales en America Latina...In: Cohesión social en América Latina: bases para una nueva agenda democrática. Disponível em: www.plataformademocratica.org. Acesso em: 10 de fevereiro de 2009.

[40] WERNECK VIANNA, Luiz. A Democracia e os Três Poderes no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002 p.8.

[41] CARVALHO, Maria Alice Rezende de. Cultura política, capital social e a questão do déficit democrático no Brasil. In: WERNECK VIANNA, L. (org). A Democracia e os Três Poderes no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.322.

[42] VIANNA, Oliveira. Instituições Políticas Brasileiras. vol. 2. Belo Horizonte: Itatiaia. 1987:160.

[43] VIANNA. idem. 159-160.

[44] WERNECK VIANNA, Luiz; BURGOS, Marcelo. Revolução Processual do Direito e Democracia Progressiva. In: WERNECK VIANNA, L. (org). A Democracia e os Três Poderes no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.383.

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[45] Idem. 384.

[46] SANTOS. Rogério Dultra dos. O constitucionalismo antiliberal no Brasil: cesarismo, positivismo e corporativismo na formação do Estado Novo. Rio de Janeiro: IUPERJ. Tese de doutorado. 2006. p.6

[47] Para melhor compreensão do tema ver FERREIRA, Jorge. ob. cit.

[48] Ver capítulo 3 de: WERNECK VIANNA, Luiz. Liberalismo e sindicato no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.

[49] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. p.384. A representação generalizada não é nada mais que a soma das figuras da tradicional representação política com a representação institucional.

[50] SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Cidadania e justiça. A política social na ordem brasileira. Rio de Janeiro, Editora Campus LTDA, 1979.

[51] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit.:385.

[52] WERNECK VIANNA. ob. cit. p. 11.

[53] CITTADINO, Gisele. Judicialização da política, constitucionalismo democrático e separação de poderes. In: WERNECK VIANNA, L. (org). A Democracia e os Três Poderes no Brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.

[54] SMULOVITZ, Catalina; URRIBARRI, Daniela. Poderes Judiciales en America Latina...In: Cohesión social en América Latina: bases para una nueva agenda democrática. Disponível em: www.plataformademocratica.org. Acesso em: 10 de fevereiro de 2009. Neste mesmo sentido, Bernardo Sorj disse em palestra proferida na III Câmara Técnica dos Balcões de Direito: A grande linguagem contemporânea para reivindicação passou a ser a linguagem dos direitos. [...] Ou seja, hoje aquele que fala em Direito não está pensando no Direito, está usando uma linguagem política. A linguagem política contemporânea deixou de ser a política, passou a ser a linguagem dos direitos. Transcrição disponível em: www.bernardosorj.com. Acesso em: 28 de fevereiro de 2009.

[55] CITTADINO. Idem. p.19

[56] WERNECK VIANNA. ob. cit. p.12.

[57] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. 415.

[58] Sobre os mais diversos significados do termo, ver: MACIEL, Débora Alves; KOERNER, Andrei. Sentidos da Judicialização da Política: duas análises. In: Revista Lua Nova. N. 57. 2002.

[59] OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. Processo e jurisdição na Constituição da República Federativa do Brasil: contribuições para uma construção no marco da teoria

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discursiva do direito de Jürgen Habermas. In: Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica. vol. 1. n.6. 2008. p. 349.

[60] GRINOVER. Ada Pellegrini. Significado social, político e jurídico da tutela dos interesses difusos. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. A marcha do processo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p.18.

[61] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. p.484.

[62] MANCUSO. Rodolfo Camargo. Ação Popular. 3. ed. São Paulo: RT. 1996 .p. 49-50.

[63] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. p. 396.

[64] GIDI. ob. cit. p.229.

[65] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. p.431.

[66] Idem. p. 400.

[67] GIDI.ob. cit. p.231.

[68] SOUSA JR. José Geraldo. Por uma concepção alargada de Acesso à Justiça. In: Revista Jurídica. Brasília, v. 10, n. 90. Ed. Esp., p. 01-14. abr./maio, 2008. Disponível em: www.planalto.gov.br/revistajuridica. Acesso em: 15 de junho de 2008.p.3

[69] WERNECK VIANNA; BURGOS. ob. cit. p.484.

[70] SOUSA JR. Idem. p.8.

[71] WERNECK VIANNA. 2002; SOUSA JR. ob. cit.

[72] CARVALHO. ob. cit. p. 318.

[73] Ibidem.

[74] Idem. p. 321.

[75] FERRARESI. ob. cit. p.137.

[76] É o que diz Kazuo Watanabe, para quem "Por meio dele [controle da representatividade] não somente se controlam os possíveis abusos no ajuizamento de ações coletivas, como também se afere, em alguns países, a efetividade da coisa julgada. (WATANABE, Kazuo. Novas tendências em matéria de legitimação e coisa julgada nas ações coletivas. In: Direito Processual Comparado, XIII World Congresso of Procedural Law, Salvador, 16-22 set. 2007; Rio de Janeiro:Forense, 2007, p. 302). Também Ada Pellegrini Grinover pontua que "a chamada 'representatividade adequada' (adequacy of representation) contitui outro instrumento de controle para evitar os possíveis abusos cometidos no ajuizamento de processos coletivos. (GRINOVER, Ada Pellegrini. Relatório Geral. In: In: Direito Processual Comparado, XIII World

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Congresso of Procedural Law, Salvador, 16-22 set. 2007; Rio de Janeiro:Forense, 2007, p. 238).

[77] WATANABE. ob. cit. p. 303.

[78] Ibidem.

[79] Para Kazuo WATANABE (ob. cit. p. 302), o instituto da representatividade adequada está "intimamente ligado à legitimação para agir".

[80] FERRARESI, Eurico. Ação popular, ação civil pública e mandado de segurança coletivo. Instrumentos processuais coletivos. Rio de Janeiro: Forense. 2009. p.115.

[81] Idem. p. 484.