AS RELAÇÕES DE CONSUMO NA SOCIEDADE ... Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009 6 espaço,...

17
Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009 1 AS RELAÇÕES DE CONSUMO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E A MEDIAÇÃO DO PROFESSOR NO PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA INDIVIDUALIDADE DE CRIANÇAS ENTRE 4 E 5 ANOS OLIVEIRA, Marta Regina Furlan de (UEM) GASPARIN, João Luiz (Orientador/UEM) 1. INTRODUÇÃO Esta proposta de pesquisa evidencia a necessidade de um aprofundamento sobre a infância na atualidade, já iniciado a partir dos estudos realizados durante o mestrado em educação, e que tem sido motivada pela experiência, enquanto docente no Curso de Pedagogia. Este projeto busca compreender a infância, a educação e as relações de consumo constituídas na sociedade contemporânea. Como organização do pensamento e da apresentação sistemática desse projeto de pesquisa, a proposta apresenta os objetivos, bem como a justificativa do projeto, traçando, ao mesmo tempo, a metodologia de trabalho e a fundamentação teórica em que o mesmo se respalda. Quanto aos objetivos, tem-se como proposta central analisar as relações de consumo na contemporaneidade 1 e o processo de mediação do professor de educação infantil na constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos. Esse propósito geral da pesquisa é expressão do questionamento que se faz a partir do contexto social contemporâneo: Como se configuram as relações de consumo na sociedade contemporânea e como a mediação do professor em sala de aula expressa essa lógica no processo de constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos? 1 É interessante pontuar que o termo contemporaneidade e modernidade apresentam o mesmo significado, como: “aquilo que é moderno ou ao gosto moderno, dos tempos atuais ou mais próximos de nós”. Diante disso, opta-se por descrever contemporaneidade; embora não despreze totalmente o termo modernidade.

Transcript of AS RELAÇÕES DE CONSUMO NA SOCIEDADE ... Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009 6 espaço,...

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

1

AS RELAÇÕES DE CONSUMO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA E A

MEDIAÇÃO DO PROFESSOR NO PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DA

INDIVIDUALIDADE DE CRIANÇAS ENTRE 4 E 5 ANOS

OLIVEIRA, Marta Regina Furlan de (UEM)

GASPARIN, João Luiz (Orientador/UEM)

1. INTRODUÇÃO

Esta proposta de pesquisa evidencia a necessidade de um aprofundamento sobre a

infância na atualidade, já iniciado a partir dos estudos realizados durante o mestrado em

educação, e que tem sido motivada pela experiência, enquanto docente no Curso de

Pedagogia. Este projeto busca compreender a infância, a educação e as relações de

consumo constituídas na sociedade contemporânea.

Como organização do pensamento e da apresentação sistemática desse projeto de

pesquisa, a proposta apresenta os objetivos, bem como a justificativa do projeto,

traçando, ao mesmo tempo, a metodologia de trabalho e a fundamentação teórica em

que o mesmo se respalda.

Quanto aos objetivos, tem-se como proposta central analisar as relações de consumo na

contemporaneidade1 e o processo de mediação do professor de educação infantil na

constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos.

Esse propósito geral da pesquisa é expressão do questionamento que se faz a partir do

contexto social contemporâneo: Como se configuram as relações de consumo na

sociedade contemporânea e como a mediação do professor em sala de aula expressa

essa lógica no processo de constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos?

1 É interessante pontuar que o termo contemporaneidade e modernidade apresentam o mesmo significado, como: “aquilo que é moderno ou ao gosto moderno, dos tempos atuais ou mais próximos de nós”. Diante disso, opta-se por descrever contemporaneidade; embora não despreze totalmente o termo modernidade.

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

2

Parte-se do pressuposto de que na sociedade contemporânea (século XX e XXI) os

sujeitos que dela participam convivem com um conjunto de conhecimentos e

informações a serviço da produção e do consumo. Essa sociedade apela

incansavelmente para o consumo, criando no indivíduo a necessidade de consumir

mercadorias: roupas de marcas, enlatados, imóveis, automóveis; além de veicular a

lógica da padronização, da sedução e do fetiche.

Parafraseando Marcuse (1997), entende-se que essa sociedade contemporânea é a que

mais enaltece o indivíduo; usa de todos os meios para que este usufrua da mercadoria

para seu próprio conforto; entretanto, é a que menos permite que o indivíduo aja como

sujeito singular que tem vontades, sentimentos, sensações e idéias próprias e,

principalmente criatividade, uma vez que a submissão ao consumo gera produtos

prontos e acabados, não possibilitando às pessoas a criação do objeto e a própria

formação da individualidade.

Entretanto, o objetivo desse estudo não se limita a pensar numa individualidade

coordenada pela natureza do indivíduo isolado, mas é a singularização de alguém

primordialmente social, porque produto do trabalho coletivo. Assim sendo, segundo

Palangana (2002 p.7) a “individualidade é, inseparavelmente, social e individual,

objetiva e subjetiva, fundada no modo como a sociedade se organiza, produz, se

relaciona e na espécie de poder instituído. Esta é a chave para se adentrar nas estruturas

individuais”.

Complementa a autora, com visível propriedade teórica:

O indivíduo se forma e se transforma no trabalho e nas relações sociais de trabalho. Somente na história de vida prática dos homens cabe pensar a individualidade, que constitui o indivíduo, que o singulariza que o distingue, mas, ao mesmo tempo, não se encerra nele. Os traços, os caracteres físicos e psíquicos são deste ou daquele indivíduo, porque são sociais, ou seja, porque pertencem aos homens de uma determinada época e lugar (PALANGANA, 2002 p.7) (grifo nosso).

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

3

Destarte, pensando nessas novas formas de organização do trabalho e produção na

sociedade capitalista, verifica-se que estas relações têm provocado maneiras

diferenciadas sobre como os sujeitos são percebidos, categorizados e diferenciados.

Essas mudanças sociais e econômicas aparecem implícitas em atitudes, comportamentos

e nas mais diferentes teorias e práticas educativas.

A partir da inquietação acima, o presente projeto traz o seguinte questionamento: Como

se configuram as relações de consumo na sociedade contemporânea e como a prática de

mediação do professor de educação infantil tem expressado essa lógica no processo de

constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos?

Justifica-se, então, a escolha do tema pela necessidade de um aprofundamento a respeito

da lógica do consumo na sociedade contemporânea e como a escola, especificamente a

prática do professor de educação infantil, lida com essa discussão no processo de

aprendizagem e desenvolvimento infantil em favor da constituição da individualidade

de sujeitos crianças.

Sabe-se que na contemporaneidade tem se construído uma imagem de infância que se

aproxima da imagem do adulto e vice-versa, seja nos seus estilos, preferências,

comportamentos, e o que mais tem sido preocupante, as reações infantis que se

manifestam frente ao conceito de ter, comprar, tomar posse, tão focado no mercado.

Nesse olhar, as características mais presentes são: fetichização da tecnologia e da

produção, a incapacidade de amar e de estabelecer relações sociais, a busca incansável

pelo consumo, a valorização do ter em detrimento do ser, a padronização de

comportamentos, pensamentos, preferências, o individualismo, a ausência de relações

sociais humanas, entre outros.

Caminhando por essa perspectiva, é visível, muitas vezes, essa leitura do mundo social

contemporâneo que reflete no processo educativo, especificamente na prática mediadora

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

4

do professor que trabalha com crianças, no caso entre 4 e 5 anos. A escolha por essa

faixa etária é no sentido de centralizar as atenções já que se constituiu uma fase

cronológica e social significativa que inicia e marca a passagem da educação infantil

para os anos iniciais do ensino fundamental, sendo esse período influenciador de

conceitos e valores sociais.

Pensando no cotidiano da escola da infância, verifica-se que nesse propósito de

preparação para os anos iniciais (1º ao 5º ano do ensino fundamental), há um acúmulo

de trabalhos, tanto para as crianças quanto para os educadores, que se vêem em

desespero e aflição, frente à chamada produção, ou seja, “têm que mostrar serviço”. E,

nessa produção sem fim, ousar refletir, ser criativo, ser imaginativo não dá, até porque

“tempo é dinheiro”. Precisa-se de objetividade, permeando assim, a padronização de

atividades; a adoção do sistema de apostilamento; a unificação das produções discentes

(todos devem pintar a flor de vermelho e a folha verde) com o mesmo estilo de

apresentação; o trabalho que reflete o individualismo e não a individuação, a

competição, a exclusão (o aluno que não acompanha); o enquadramento intelectual,

entre outros. Além disso, a imagem deve ser preservada sempre, buscando o trabalho

criativo terceirizado, em substituição às criações infantis (leva-se tempo e não tem a

perfeição da imagem, do belo, do bem apresentado). Pode-se ousar em exemplificar, os

presentes terceirizados para os dias: da Mãe, do Pai, das Crianças, do Professor.

Nessas relações de consumo, pode-se verificar a presença do lúdico pelo brinquedo que,

nesse cenário do consumo, é caracterizado como algo a ser investido financeiramente,

ou seja, tem que comprar para brincar. E o cavalo de pau, tão enfatizado por Vygotsky

em sua obra A formação social da mente? O que fizeram com ele? Ainda continua nas

prateleiras das pequenas e grandes lojas, mas com um toque especial da modernidade,

com imagem, com fetiche, em que a criança pode escolher o cavalo de diferentes

estilos, marcas e cores. Além disso, a criança pode escolher bichinhos, bonecas, heróis,

casinhas, videogames, e outros. O próprio mercado trabalha para a criança (alvo de seu

lucro), e assim revitaliza a especificidade da mesma, resgatando e trabalhando o mundo

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

5

infantil, através do marketing ‘criança-brinquedo’, ‘criança-lúdico’, ‘criança-moda’,

‘criança-consumidora’.

Percebe-se, então, que esses questionamentos são desafios para o encaminhamento da

investigação sobre a constituição da individualidade da criança, no intuito de esclarecer

o significado social da infância na atualidade frente ao consumo, buscando uma

proposta diferenciada sobre o pensar infantil a partir dos fundamentos do materialismo

histórico. Nessa perspectiva, a criança não é meramente um consumidor necessário, mas

um sujeito histórico que constrói e reconstrói a história e que participa ativamente dessa

conjuntura social e econômica.

É nesta perspectiva que entendemos deva ser orientado o trabalho pedagógico da

educação infantil, superando a lógica do mercado, da padronização, propondo

estratégias lúdicas e diferenciadas em favor da individualidade infantil, da criatividade,

da experiência, da descoberta, da ampliação do conhecimento (do empírico para o

conhecimento científico).

2. OBJETIVOS

Em se tratando dos objetivos gerais, tem-se como propósito analisar as relações de

consumo na contemporaneidade e o processo de mediação do professor de educação

infantil na constituição da individualidade de crianças entre 4 e 5 anos.

Quanto aos objetivos específicos, a intenção é caracterizar a sociedade capitalista

contemporânea a partir da segunda metade do século XX (3ª Revolução Industrial),

analisando os conceitos de: relação, consumo, formação, processo, individualidade,

contemporaneidade, infância.

Pensa-se, ainda, em analisar a atual sociedade, tendo como referência a lógica do

mercado e do consumo, com algumas categorias: fetichização, sedução, padronização,

enquadramento social e individual, indústria cultural, novas experiências do tempo e

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

6

espaço, relação entre necessário e supérfluo, avanço da tecnologia. O exercício teórico-

epistemológico se faz na compreensão de como se configuram as relações entre o

consumo e o trabalho pedagógico do professor mediador da aprendizagem de crianças

entre 4 e 5 anos.

O intuito também é visível na observação da prática pedagógica, através do estudo de

caso, tendo como categoria de análise o discurso do professor, a prática de mediação, o

uso de materiais didáticos e atividades planejadas; bem como a relação entre o discurso

e a prática docente. Ainda, observar o contexto da sala de aula e a relação professor-

aluno e, ainda, analisar o comportamento da criança durante essa relação em sala de

aula.

3. BREVE REVISÃO DE LITERATURA E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Escravo e não rei de tudo o que me rodeia, comprimido em um ponto envolvido pela imensidão, começo procurando a mim mesmo.

Fraçois M. A. de Voltaire.

Este estudo tem como foco principal investigar o conceito de infância, as relações de

consumo e a constituição da individualidade, a partir da mediação do professor que

trabalha com crianças entre 4 e 5 anos na escola da infância. Para tanto, busca-se

analisar como as práticas pedagógicas têm expressado seus conceitos sobre sociedade,

educação e indivíduo na sociedade contemporânea. Se considerarmos que a educação

infantil é expressão e reprodução da sociedade de consumo, fica distante a concepção de

educação e sujeito ressaltada por Adorno (apud PUCCI, 1995 p.61-62), quando escreve:

[...] concebo como sendo educação [...] não a assim chamada moldagem dos seres humanos, porque não temos o direito algum de moldar pessoas a partir do exterior; mas também não a mera transmissão do saber, cuja característica de coisa morta, reificada já explicitada, e sim a produção de uma consciência verdadeira [...].

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

7

Nesse propósito, é relevante pensar como vem sendo construída a concepção de infância

na contemporaneidade, a partir da lógica do consumo e padronização humana. Por sua

condição de fraqueza e de promessas, a criança configura forças no seio da sociedade,

seja atraindo as atenções de empresas como público consumidor ou como forma de

trabalho, seja prefigurando uma imagem de gestação. Frases como estas são ouvidas

diariamente: “as crianças precisam ser educadas para competir no mercado global do

futuro”.

Os sujeitos, sejam adultos ou crianças, sentem cada vez mais a necessidade de consumir

mercadorias que dão satisfação e conforto. Entretanto, muitas vezes, essas necessidades

não são as fundamentais, ou seja, as vitais (roupa, alimento, moradia), mas as supérfluas

que se tornam fundamentais na lógica do consumo.

O desejo pelo consumo encerra na obediência a uma ordem anunciada pelos meios de

comunicação. Cada um quer ser igual aos outros no ato de consumir, de ser feliz, ser

livre, pois essa é a ordem a que inconscientemente todos obedecem; correndo o perigo

de se sentirem infelizes se forem diferentes, se não consumirem. Perde-se, com isso a

subjetividade humana em favor de uma padronização, seja nos gostos, hábitos ou

valores e sensações (MARCUSE, 1973). Nesse sentido, o diferente é considerado um

delito.

Palangana (1998 p.153) complementa essa afirmação, ao considerar que tanto os

adultos, quanto as crianças vivem e convivem diariamente com a possibilidade da

obtenção do prazer, que para a autora é um “[...] prazer pervertido, cujo fundamento é

deslocado para o consumo [...]”. Afirma, ainda que a “[...] identidade particular se perde

na universal. Sob o domínio dos monopólios todas as culturas são massificadas,

identificando-se”. Contudo, é necessário pensar que há o padrão da moda, do momento

histórico, mesmo que a moda modifique. Isso não significa despadronização, mas uma

nova padronização.

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

8

Nesse sentido, verifica-se que, segundo Marcuse (1997 p.29) “as criaturas se

reconhecem em suas mercadorias, encontram sua alma em seu automóvel, casa em

patamares, utensílio de cozinha”.

Em meio a tanta mudança na esfera econômica e social e a tanta novidade, questiona-se:

Em que lugar as crianças estão? O que fazem? Quem são elas? Como estão? De que

formas reagem a tantas mudanças? Como constituem sua individuação nesse mundo

social? Que certezas e incertezas vêm trazendo para o mundo atual? Que experiências

têm vivenciado frente ao consumo exacerbado? Que tipo de experiências constroem nos

espaços educativos em que participam diariamente?

É partindo desses questionamentos que se fundamenta essa pesquisa a fim de entender,

na história das transformações da sociedade capitalista e nas relações de consumo – em

suas rupturas e continuidades – a constituição da individualidade infantil a partir da

mediação do professor que atua diretamente com crianças entre 4 e 5 anos na escola da

infância.

Em relação a esses questionamentos, verifica-se que na educação voltada à infância,

muitas vezes, têm-se reforçado e alimentado à lógica do consumo, da padronização e

enquadramento intelectual. Nesse sentido, é freqüente o uso de apostilas, que tem

anulado a própria prática da descoberta, da pesquisa, da inovação e construção do

conhecimento pelo educando que pode ser experienciado pela didática do trabalho com

projetos, temas de interesse ou tema gerador.

Assim, a partir das concepções filosóficas que fundamentam a teoria histórico-cultural,

percebe-se a possibilidade de uma nova escola que se estrutura pela construção ativa e

coletiva entre os profissionais envolvidos; com ações em prol da pedagogia da escuta,

ou seja, a capacidade do educador intelectual ouvir e interpretar as necessidades e

motivos das crianças, capaz ele próprio de formular intencionalmente caminhos e

práticas que venham contribuir para a superação dos “métodos pré-fabricados, de

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

9

soluções organizativas e didáticas pré-confeccionadas, a superação de preconceitos que

já fazem parte do senso comum pedagógico”. (MELLO, 2007 p.05).

Nesse sentido, vale destacar a necessidade de se atribuir um novo significado às

atividades propostas às crianças na educação infantil. Mello (2007 p.7) reforça com a

seguinte contribuição:

O brincar, o jogo de faz-de-conta e a experimentação infantil passam a ser vistos como elementos essenciais para o conhecimento do mundo, para a apropriação de valores, para o desenvolvimento de funções tipicamente humanas, como o pensamento, a percepção, a memória, a atenção. Respeitada em seu direito à infância, a criança passa a ter tempo livre na escola para experimentar, conhecer e conhecer-se [...]. Reestruturam-se os conteúdos que passam a valorizar os desejos de conhecimento das crianças – que são muitos – como estratégias na ampliação do conhecimento do mundo e de criação de novos desejos de conhecimento [...].

Por tudo isso, entende-se que a apropriação de uma teoria que permita uma leitura para

além da utilidade e padronização humana, devolve efetivamente aos espaços de

educação infantil e, especificamente, ao educador o exercício de sua atividade

intelectual ao viabilizar uma nova atitude como educador, pautada nos pressupostos de

valorização do ser infantil, oportunizando para cada criança o desenvolvimento de suas

possibilidades humanas e sociais, principalmente a formação da subjetividade infantil.

4. DESCRIÇÃO E FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA

A opção pela pesquisa de natureza qualitativa descritiva consiste numa expansão do

estudo teórico sobre o tema que trata das Relações de Consumo na Sociedade

Capitalista e a Mediação do Professor na Constituição da Individualidade de crianças

entre 4 e 5 anos.

Deste modo, a pesquisa orienta-se para um estudo teórico e prático, com o propósito de

refletir, analisar e buscar encaminhamentos que permitam compreender o significado

social da infância e individualidade para além da lógica de padronização e de consumo,

tão destacado pelo mercado produtivo.

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

10

Para tanto, o estudo teórico consiste em uma pesquisa bibliográfica com leituras de

obras de autores que discutem essa temática a partir de uma análise crítica da realidade,

tendo como referência básica, as obras de Karl Marx, Leontiev, Vygotsky. Ainda, para

uma análise mais crítica e precisa da sociedade do consumo, são válidas as indicações

para o estudo do século XX, as notáveis referências sobre o assunto que são: Marcuse,

Adorno e Horkheimer da Escola de Frankfurt.

Para esse estudo têm-se como categoria de análise a compreensão das relações de

consumo e a constituição da individualidade na criança a partir das referências teóricas

afirmadas anteriormente. Para tanto, o entendimento sobre o conceito de indivíduo,

individual, individualidade, individualizar se faz urgente e necessário.

Buscando um primeiro olhar conceitual a partir do dicionário da Língua Portuguesa,

encontram-se as seguintes definições:

Indivíduo. 1. Exemplar de um ser em relação à sua espécie. 2. A pessoa humana. 3. Uma pessoa qualquer, sujeito [...]. Individual. 1. Próprio do indivíduo. 2. Que pertence a uma só pessoa. 3. Singular pessoal [...]; Individualidade. 1. O todo do indivíduo ou do ser. 2. Conjunto das qualidades que caracterizam o indivíduo. 3. Personalidade. 4. Originalidade; Individualizar. 1. Tornar individual. Caracterizar, distinguir, especializa-se. 2. Distinguir-se (KURY, 2001 p. 424)

A pesquisa será realizada a partir do referencial teórico-metodológico do materialismo

histórico-dialético. Destarte, a investigação funda-se na concepção de que o pensamento, as

idéias são “reflexos” 2, que se constituem:

[...] no plano da organização nervosa superior, das realidades e leis dos processos que se passam no mundo exterior, os quais não dependem do pensamento, têm suas leis específicas, as únicas reais, de modo que só compete à reflexão racional apoderar-se das determinações existentes entre as próprias coisas e dar-lhes expressão

2 Segundo Schaff, (1964 apud FAZENDA, 1994 p.75) o reflexo designa a “relação cognitiva específica que se estabelece entre os conteúdos de certos atos psíquicos e os seus correlativos sobre a forma de elementos definidos no mundo material”.

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

11

abstrata, universalizada, que corresponde ao que se chamará então de “idéias” e “proposições” (PINTO, 1979 apud FAZENDA, 1994 p.75).

Ainda, em continuidade, toma-se o conceito de reflexo sob sua dimensão “genética,

sociológica ou gnosiológica” (FAZENDA, 1994 p.75), sendo que em qualquer destas

acepções está implícita a admissão da existência da realidade objetiva, isto é, uma

realidade que existe “independentemente das idéias e do pensamento”. Diante disso, é

necessário compreender que o reflexo não consiste em expressar toda a realidade, mas

constitui-se na apreensão subjetiva da realidade objetiva, ou seja, implica a

subjetividade. (FAZENDA, 1994).

Nesse sentido, a dialética situa-se, então, no plano da realidade, no plano histórico, sob

a forma de trama das relações contraditórias, conflitantes, de leis de construção,

desenvolvimento e transformação dos fatos. Portanto, o desafio do pensamento – cujo

campo próprio de mover-se é o plano abstrato, teórico – é trazer para o plano do

conhecimento essa dialética do real.

Amparada por uma leitura em Marx, como fundador do materialismo histórico,

explicita-se nessa pesquisa a preocupação em desenvolver uma postura dialética

materialista de investigação, com o movimento de superação e de transformação da

realidade e do pensamento. Assim, Fazenda (1994 p.79) anuncia um pequeno fragmento

escrito por Marx no posfácio à 2ª edição de O Capital em que fala de seu método de

forma sucinta, através de um de seus críticos:

Para Marx, só importa uma coisa: descobrir a lei do fenômeno de cuja investigação ele se ocupa. E para ele é importante não só a lei que se rege, a medida que eles têm forma definida e estão numa relação que pode ser observada em determinado período de tempo. Para ele o mais importante é a lei de sua modificação, de seu desenvolvimento, isto é, transição de uma forma para outra, de uma ordem de relações para outra. Uma vez descoberta essa lei, ele examina detalhadamente as conseqüências por meio das quais ela se manifesta na vida social (...). Por isso Marx só se preocupa com uma coisa: provar mediante escrupulosa pesquisa científica a necessidade de determinados ordenamentos de relações sociais e, tanto quanto possível, constatar de modo irrepreensível os fatos que lhe servem de ponto de partida e de apoio. (FAZENDA, 1994 p.79).

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

12

Assim, a intenção é desenvolver a pesquisa a partir de um estudo teórico bibliográfico

e um estudo de caso, com a finalidade de desenvolver reflexões e, ainda, analisar como

vem sendo constituída a individualidade de crianças (4 e 5 anos) a partir da leitura que o

professor mediador faz da sociedade contemporânea e, principalmente, das relações de

consumo.

Na situação específica vivida nos dias atuais pela educação infantil, a contribuição dos

fundamentos teórico-metodológicos do materialismo histórico permite um repensar dos

papéis vividos por educadores e crianças nos processos de ensino, orientando “o agir de

adultos e crianças na escola infantil e para a instalação de práticas que possibilitem o

máximo desenvolvimento humano a todas as crianças”. (MELLO, 2007 p. 3).

A opção pelo estudo de caso se faz por acreditar para este momento de investigação,

que é o mais relevante para esse tipo de análise, uma vez que os resultados são válidos

só para o caso que se estuda, sem intenção de generalizar tais informações. Ainda, o

estudo de caso fornece o conhecimento aprofundado de uma realidade delimitada.

Esse estudo de caso será desenvolvido sob a forma de pesquisa de natureza qualitativa

descritiva que intenta captar não só a aparência do fenômeno (fato) como também sua

essência (subjetivo). Contudo, a pesquisa preocupa-se com a causa desse fenômeno,

procurando explicar sua origem, suas relações, suas mudanças e se esforça por intuir as

conseqüências que haverá para a vida em sociedade.

Para tanto, como melhor compreensão desse estudo, descreve-se na seqüência das idéias

desse texto, o processo de seleção e caracterização dos elementos para a pesquisa

qualitativa. Por isso, opta-se pelo estudo com sujeitos, sendo um (a) professor (a) com

pelo menos cinco anos de experiência no magistério com docência em dois Centros de

Educação Infantil no Município em Londrina e, aproximadamente vinte e cinco

crianças entre a idade de 4 e 5 anos de cada espaço de educação infantil. Além disso,

conta-se com análise do material didático utilizado pelo professor mediador em sala de

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

13

aula e, ainda, com as atividades planejadas e aplicadas com as crianças. Os dois Centros

de Educação Infantil terão como critério de seleção, o contexto social e econômico dos

mesmos, sendo, portanto um espaço público e ou filantrópico e outro particular.

O tempo de levantamento de dados se projeta em no máximo 03 meses, sendo que a

participação da pesquisadora far-se-á duas vezes por semana em horário pré-

estabelecido juntamente o professor e coordenação geral da escola, a fim de delimitar o

estudo com o tempo planejado pelo professor para a atividade realizada em sala

(conteúdo e áreas do conhecimento). 3

Para o estudo de caso opta-se pela observação não-participante, também conhecida

como observação passiva, a fim de apenas levantar elementos necessários para a análise

da realidade. A observação deter-se-á na análise do discurso do professor mediador em

sala de aula antes, durante e depois das atividades previamente elaboradas por ele (a).

Assim, a observação far-se-á com a finalidade de compreender: a mediação do professor

no processo de ensino e aprendizagem a partir do trabalho articulado com as áreas do

conhecimento4; a relação professor-aluno; material didático (confeccionados e

adquiridos via consumo); discurso narrativo e prática do professor; atividades

planejadas.

Além das observações tem-se como proposta analisar o discurso do professor via

entrevista semi-estruturada com apresentação de um roteiro básico de questões

abertas e fechadas, uma vez que esse roteiro não tem a intenção de ser aplicado

rigidamente, mas enquanto encaminhamento necessário para atingir os objetivos e

propósitos da pesquisa, permitindo assim, que se façam as adaptações que julgarem

necessárias. Conta-se com recursos técnicos que complementam as leituras e

3 Considera-se relevante informar que esse projeto de pesquisa com seres humanos, foi apresentado ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual de Maringá, e aprovado por esse comitê. 4 É sabido que o trabalho na educação infantil envolve ações interdisciplinares que se articulam e se completam a partir das áreas do conhecimento: linguagem oral e escrita; pensamento matemático; ciências naturais e sociais; ética, estética e sensibilidade artística; música, corpo e movimento; educação física, entre outras. Mais informações encontra-se no Referencial Curricular para a Educação Infantil (BRASIL. 1998).

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

14

observações no campo de pesquisa, sendo tais instrumentos: gravador, diário de campo,

roteiro de questões abertas e fechadas, máquina fotográfica.

O uso dos recursos possibilita ao pesquisador adicionar uma quantidade crescente de

dados à pesquisa, cabendo ao pesquisador elencar seus propósitos da forma mais clara e

evidente, a fim de que os recursos sejam complementados às leituras e observações do

estudo de caso.

5. CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO

A N O : 2 0 0 8

Etapas Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

Leituras orientadas

Disciplinas Obrigatórias e Eletivas

Estágios de Docência

Reformulação do Projeto

Escolha do campo de pesquisa

Levantamento Bibliográfico

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

15

A N O : 2 0 0 9

Etapas Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

Leituras orientadas

Projeto - Comitê de Ética

Pesquisa de Campo

Redação Inicial – Diário de Campo

Levantamento Bibliográfico

Redação Inicial – Análise e Discussão dos Dados

A N O : 2 0 1 0

Etapas Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

Leituras orientadas

Redação da Tese

Qualificação

Eventuais alterações

A N O : 2 0 1 1

Etapas Jan. Fev. Mar. Abr. Mai. Jun. Jul. Ago. Set. Out. Nov. Dez.

Defesa Pública

Entrega Final da Tese

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As leituras e reflexões que aqui se propõe fazem na tentativa de caracterizar esse novo

tempo social, marcado por diversas alterações, seja na relação com o tempo, espaço,

produção, bem como a constituição da individualidade a partir da condição social.

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

16

Em se tratando do que se propõe estudar nessa pesquisa, verifica-se, nesse cenário

contemporâneo uma ênfase sem medida nas relações de consumo e produção e, com

isso, é tranquilamente visível perceber sua interferência no mundo social e econômico,

principalmente no mundo das relações humanas; alterando, contudo, propósitos, idéias,

comportamentos, grupos de relações, preferências, narrativas, imagens, entre outras

características.

Inquietada por essa leitura contemporânea, é que se faz este estudo. Para tanto, os

pontos de discussão enveredam-se para a temática sobre experiência do tempo-espaço

contemporâneo; as relações de consumo e a estética da mercadoria; indústria cultural e a

teoria crítica; tecnologia, sistema de controle e cultura midiática; a crise dos sentidos e

os sentidos de nossa crise.

Em acordo com as contribuições teóricas de Duarte (2003) verifica-se que a Idade

Contemporânea surge sob a égide de uma potencial igualdade completa entre os

homens: não há mais nada que, substancialmente, determine o fato de que alguns devam

apenas trabalhar e outros possam também (ou somente) se deleitar.

Entretanto, de início, a intenção é deixar clara a idéia de que não há interesse em criticar

sob uma representação particular, embora acredite que não seria difícil mostrar uma

percepção subjetiva enquanto pesquisadora a partir das leituras desse contexto atual. Em

contrapartida a pretensão está em concentrar-se no propósito de analisar como essa

interpretação do novo tempo-espaço social contemporâneo pode ser afirmado e

reafirmado com tanta confiança além de ser tão bem recebido pelo ser humano a partir

do social e do individual.

Diante de tal afirmativa acima, vale considerar a necessidade de uma provocação teórica

que possibilite o repensar da temática em que se propõe nessa pesquisa. A idéia não se

restringe ao fechamento em respostas; mas ao contrário uma abertura de pensamento e

leituras que venham subsidiar a compreensão dessa totalidade social e econômica

Universidade Estadual de Maringá 08 e 09 de Junho de 2009

17

contemporânea que tem seduzido diariamente pessoas de todas as idades, de relações

econômicas divergentes, ou seja, grupos diferentes para a lógica do consumo e da

mercadoria.

REFERÊNCIAS

DUARTE, Rodrigo. Teoria Crítica da indústria cultural. Belo Horizonte, UFMG, 2003. FAZENDA, Ivani (org). Metodologia da Pesquisa Educacional. 3ª edição. São Paulo: Cortez, 1994. (Biblioteca da Educação, Série I, Escola; v.11).

FURLAN, Marta Regina. A Construção do ser criança na sociedade capitalista. UEM, Maringá, 2003 (dissertação de Mestrado).

KURY, Adriano da Gama. Minidicionário da Língua Portuguesa. Organização Ubiratan Rosa. São Paulo: FTD, 2001.

MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial. Rio de Janeiro: Zahar, 1973.

MARCUSE, Herbert. Algumas implicações sociais da tecnologia moderna. Praga – Revista de Estudos Marxistas, São Paulo, n. 1, p. 113-140, 1997.

MARCUSE, Herbert. Eros e civilização: uma interpretação filosófica do pensamento de Freud. Zahar: Rio de Janeiro, 1972.

MÉSZAROS, István. A educação para além do capital. Tradução de Isa Tavares, SP:Boitempo, 2005. MELLO, Sueli Amaral. Conceito de Homem, Infância e Educação: novas perspectivas para a educação infantil a partir dos fundamentos filosóficos marxianos. Artigo apresentado no I Simpósio Internacional em Educação e Filosofia, Marília: Unesp, 2006. File: //D: \textos\texto_12.htm. PUCCI, Bruno (org). Teoria Crítica da Educação: a questão da formação cultural na escola de Frankfurt. Petrópolis: Vozes, 1999.

PALANGANA, Isilda C. Individualidade: afirmação e negação na sociedade capitalista. São Paulo: Plexus/EDUC, 1998.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989.