As sereias do ensino eletrônico

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GRUPO 7.3 MÓDULO 15

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MÓDULO 15

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Índice

1. As sereias do ensino eletrônico.........................................3

2. Educação, ensino ou aprendizagem a distância?...............5

3. Aprendizagem Aberta e a Distância (AAD)........................7

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1. AS SEREIAS DO ENSINO ELETRÔNICO

Tomemos emprestada a metáfora das sereias utilizada por Paulo Blikstein e Marcelo Knörich Zuffo no texto de mesmo título inscrevendo um capítulo do livro Educação online (2003), para iniciarmos nossa discussão a respeito de educação a distância enquanto realidade vivenciada na atualidade.

Durante toda a existência da humanidade e desde quando se tem conhecimento desta existência, homens e mulheres se encantam com o diferente ou com o novo, tentando conhecê-lo ou tateá-lo. As sereias que Ulisses, na Odisséia de Homero, buscou ouvir (mesmo precavendo-se ao pedir que o amarrassem no mastro de seu navio para não ser encantado ou devorado por elas) demonstram isso. Demonstram a curiosidade e o desejo de novas “aventuras”. Assim tem sido para profissionais de diferentes áreas a sedução pelas novas tecnologias da comunicação e da informação.

No entanto, como as sereias da Odisséia, as novas tecnologias da comunicação e da informação nos “engoliram”. Em princípio no que se refere às diversas áreas em que os ouvidos se abriram escancaradamente para os seus “cantos”. Houve um deslumbramento diante das inúmeras possibilidades de se “dominar o mundo” por intermédio da tecnologia. Porém, hoje já se verifica que o novo não exclui totalmente vivências anteriores. Combinam-se numa utilização que possibilita aproveitar o canto da sereia sem abandonar o navio.

E com a educação? As novas tecnologias da comunicação e da informação estão, como nunca, presentes no processo de ensino-aprendizagem e, não poucas vezes, num ensino e numa aprendizagem que só são possíveis por causa delas. Porém, homens e mulheres, professores e alunos têm buscado a audição prazerosa dos seus cantos, a audição que comunga o ouvir e o falar, o escrever e o ler, o ensinar e o aprender.

É claro que ainda especulamos possibilidades, bem como lidamos com preconceitos, mas o caminho da educação a distância está sendo desbravado e cabe a nós pavimentá-lo.

Cada vez mais, o valor da educação destaca e defende a interação entre professor e aluno. Este valor foca a pedagogia de projetos, a educação por toda a vida e o aluno como seu centro. Os que defendem as novas tecnologias, não raro, vêem

no seu uso a solução para todos os problemas da educação, ou a “fórmula mágica” para que as bandeiras defendidas teoricamente sejam levadas às vias de fato. “Portanto, não basta introduzir tecnologias – é fundamental pensar em como elas são disponibilizadas, como seu uso pode efetivamente desafiar as estruturas existentes em vez de reforçá-las” (Blikstein; Zuffo, 2003, p. 25).

É importante pensarmos – e agirmos – de forma a transformar a educação burocrática em uma educação criativa. Isso, no que se refere às tecnologias ou aos equipamentos tecnológicos, expõe a necessidade de conhecermos as possibilidades de seus usos não como reprodução de uma escola na qual receitas são seguidas passo a passo, mas como possibilidades de empreendimento de projetos pelos quais há interesse e paixão.

Esta discussão do que ocorre na escola pode e deve ser transposta para a educação a distância se tomarmos esta como reprodução daquela. Não é

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raro encontrar, mesmo que num ambiente totalmente inovador (o ambiente online), ambientes escolares tal qual o “fantasma” da escola tradicional.

Faz-se necessário compactuarmo-nos com projetos para uma educação e para uma sociedade de “visionários”, como, por exemplo, Paulo Freire e John Dewey, que pensaram e fizeram além de apenas escolas ou educação a distância confinadas à entidade estática dos conteúdos. Alunos também as pensam e as fazem e, portanto, nós educadores precisamos, de fato, acreditar e fazer valer nossa crença numa revolução educacional a partir também do aluno.

Blikstein e Zuffo (2003), também como Alarcão (2005) e Morin (2005), defendem que a informação necessita de reflexão para ser transformada em conhecimento. A grande quantidade de informação e somente o acesso a ela não permitem uma vida melhor, pelo contrário, apenas trazem a abundância de escolhas como causa do mal-estar e da ansiedade crônica do homem moderno, ou pós-moderno. “... a disponibilidade oceânica de informação não é garantia de aprendizado ou de construção de conhecimento” (Nero apud Blikstein; Zuffo, 2003, p. 28).

Até mesmo os discursos sociais têm preconizado a educação como “salvadora da pátria”. Também o mercado de trabalho parece buscar uma educação para toda a vida, o uso de computadores ou a familiaridade com a tecnologia. Sabemos, no entanto, que a gênese dos problemas econômicos não se resume a colocar nas mãos da educação a responsabilidade pela resolução destes problemas. É preciso enxergar com clareza que neste contexto não se propõe um “despertar para a sabedoria”, mas uma necessidade de mão de obra advinda da formação de trabalhadores ambiciosos e multifuncionais, o que é bastante diferente de trabalhadores autômatos e repetitivos formados pela escola tradicional.

O que se vê, então, é uma crescente necessidade de se aprender por toda a vida com o intuito de se manter empregado. Trata-se de colocar nas mãos do trabalhador toda a responsabilidade pela sua atualização profissional, na expectativa de que ele não seja “despreparado” ou “preguiçoso” diante das necessidades do mercado.

Diante disso, nada mais adequado do que fazer cursos sem sair de casa, no seu próprio ritmo, sem tanto esforço e por preços baixos. Mantém-se, assim, a ideia (e a prática) da educação técnica e superficial. Não é demanda do mercado inventar ou ser criativo, mas inovar por um preço viável. Desta forma, torna-se essencial que a educação não “caia nessas armadilhas”, senão manterá a mesmice de reproduzir num ambiente online a escola de ambiente tradicional.

Temos presenciado ofertas sedutoras de aprendizagem personalizada, que fomentam nosso imaginário sobre a educação própria das novas tecnologias, ou seja, “entregue” ao gosto do freguês, quase sem nenhum custo e no conforto do lar, mas o que efetivamente muda?

É preciso analisar e refletir sobre a promessa de ampliação do sistema de educação superior. Ter acesso a este nível de educação é, supostamente, um dos caminhos clássicos de mobilidade social. Porém, a superficialidade que expressa a relação “quantidade maior do que qualidade” tem explicitado que a herança de diferentes culturas estratificam o desempenho acadêmico e a colocação profissional. Entre nós é comum ouvir a seguinte expressão: “é fácil entrar na faculdade, o difícil é sair”. Isso reflete que estamos apenas transferindo para o meio universitário as diferenças culturais tão presentes e discutidas na educação básica.

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Ao contrário do que se esperava com a escolarização universal, ou seja, atenuar a dicotomia entre alta cultura e cultura de massas, verificou-se o deslocamento dessa expectativa para dentro do sistema universitário e, consequentemente, para a colocação no mercado de trabalho. Isso porque não basta a presença de “novas tecnologias”, é preciso saber usá-las, assim como não basta o acesso a uma grande quantidade de informações, é preciso transformá-las em conhecimentos. E, infelizmente, isso nem sempre é possível com mudanças isoladas ou massificadas de recursos, mas sim com mudanças estruturais de análise e reflexão dos problemas que são realmente importantes para as pessoas; ou de mudanças que enfrentem o desafio de transformar efetivamente a aprendizagem.

Talvez pudéssemos entender aqui que não se trata de verificar o bom ou o mau funcionamento da educação por meios eletrônicos, e sim o bom ou mau funcionamento da educação em si. Não se pode discutir uma sem refletir sobre a outra. A questão é a forma como se “faz o aprender” em qualquer tipo de interação educativa. Ou seja, a educação a distância não resolverá milagrosamente os problemas da aprendizagem se não os considerar seu principal ponto de trabalho, ou se usar um mau modelo presencial aplicando-o a distância.

“De qualquer forma, a educação a distância não é propriamente uma novidade. O uso de novas tecnologias para educação também não o é. [...] Há um claro conflito de culturas de uso: de um lado, a lógica da Internet, fugaz, rápida fria (no sentido de McLuhan). De outro, a lógica educacional, onde são necessárias a persistência, a fidelidade e a informação quente” (Blikstein; Zuffo, 2003, p. 36).

É preciso que a educação tenha na sua “parceria” com a Internet não uma mídia de transmissão de informações, mas a matéria-prima de construção. Como no “primeiro passo” de um caminho que visa o acesso ao que milhões de pessoas acessam. Contudo, é preciso seguir este caminho construindo e re(construindo) novas formas de criação, construção, produção, responsabilidade cidadã, inauguração, personalização, expressão, colaboração, inclusão e empreendimento de projetos partindo do aprendiz. Sem o que não há transformação e sem a qual, por sua vez, não há educação.

2. EDUCAÇÃO, ENSINO OU APRENDIZAGEM A DISTÂNCIA?

Neste momento discutiremos mais especificamente questões relevantes para a formação em pedagogia no que se refere à educação a distância. Para tal, buscamos informações e reflexões junto a Maria Luiza Belloni, que foi professora e pesquisadora da Universidade Federal da Bahia, da Universidade de Brasília e da Universidade Federal de Santa Catarina, onde coordenou, nos anos 1990, a criação e os primeiros anos de funcionamento do Laboratório de Novas Tecnologias (LANTEC), no Centro de Ciências da Educação. Atualmente aposentada, continua atuando junto ao grupo de pesquisa COMUNIC, ligado ao LANTEC, em pesquisas sobre mídia-educação, infância, aprendizagem e tecnologias da informação, e comunicação e educação a distância.

A pesquisadora destaca definições de autores diversos sobre Educação a Distância (EaD), das quais podemos extrair parâmetros necessários para definir esta modalidade de ensino. É necessário entendê-la numa possibilidade de “separação” professor-aluno (no tempo e no espaço), incluindo o uso dos meios de comunicação tecnicamente disponíveis, a maior segmentação do ensino em duas áreas (preparação e desempenho em sala) e a possibilidade maior de escolha do aluno.

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Como primeira correlação entre essas definições técnicas, podemos concluir que a EaD implica a divisão do trabalho de ensinar, com a mecanização e automação da metodologia de ensino, e a dependência da efetividade do processo de ensino com relação às tarefas prévias de planejamento de organização dos sistemas.

Vamos primeiramente entender cada uma dessas implicações:

A divisão do trabalho de ensinar demanda uma “abstinência” do controle total sobre aulas, concepções dessas e das próprias situações de aprendizagem. O professor envolvido com o trabalho em EaD vivencia sua profissão num modo de inter-relação constante com grupos.

A mecanização e/ou automação da metodologia de ensino também “cria” um novo professor. Falamos de professor aqui porque é ele quem, geralmente, ensina. A metodologia ou estratégias de trabalho estão relacionadas, na EaD, às disponibilidades técnicas e às ofertas específicas para cada diferente momento. É óbvio que em muitos casos esta disponibilidade é condicionante do “ensino”, mas também pode (e deve) “abrir” os espaços para as infindáveis possibilidades tecnológicas. É preciso descobri-las, e desconstruí-las para depois reconstruí-las.

Quanto ao processo de ensino, é necessário entendê-lo como efetivo no que se refere ao planejamento e organização de todo um sistema. Sem sua efetividade não é possível a execução propriamente dita do trabalho em EaD. Porém, entende-se nesse contexto, uma dependência do ensino a todo um sistema organizacional. Mas isso é novidade na educação presencial? Talvez esta característica, a de lidar com as adversidades, seja, antes de mais nada, uma característica da educação do que especialmente da sua modalidade a distância.

Podemos, então, discutir que as relações professor/ estudante são controladas por regras técnicas mais do que por normas sociais ou, acrescentando, por relações e características afetivas. É certo e ainda impossível que os conhecimentos das necessidades do outro (no caso do aprendente) não se dê distância de tempo (simultaneidade) e de espaço (contiguidade). Nenhuma técnica substitui o olhar e o escutar numa comum-ação ou comunicação presencial. Porém, muitas outras ainda não descobertas possibilidades existem num espaço e tempo entre seres. Não se trata de defesa desta modalidade de ensino, trata-se mais de encará-la não como única, mas como uma diferente modalidade de educação.

Buscar a eficiência na consecução de objetivos substitui a relação presencial entre aluno e professor? Claro que não, mas pode ser outra forma de tornar efetivo o processo básico, e ao mesmo tempo complexo, de ensino-aprendizagem. Entender que essa relação ocorre apenas porque de ambos os lados o interesse, a motivação e a mediação entre ambos é o conhecimento pode ajudar-nos nesta discussão.

3. APRENDIZAGEM ABERTA E A DISTÂNCIA (AAD)

Entender o que é AAD pode contribuir para um entendimento mais amplo ou “aberto” dessa nossa reflexão. A aprendizagem aberta a distância caracteriza-se pela flexibilidade dos sistemas e pela maior autonomia dos estudantes. Talvez pudéssemos, neste momento, simplificar este entendimento por intermédio de uma mudança de foco: de educação ou de ensino para aprendizagem.

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Este outro viés do olhar para a questão, ajuda-nos a entender que a prioridade na EaD é a produção de materiais e a organização industrial, como ressalta Belloni (2008), ou a separação professor-aluno e o uso de meios técnicos para compensar esta separação, enquanto seus parâmetros definidores. Na AAD, estes elementos podem estar presentes, mas não são considerados essenciais. O que define AAD são, fundamentalmente, os critérios de abertura relacionados a acesso, lugar, ritmo e estudo. Obviamente os critérios advindos do foco na aprendizagem.

Isso não quer dizer que AAD se opõe a EaD. Pelo contrário, é no campo da EaD que este modelo de educação, aberto e flexível, encontra terreno mais fértil para se desenvolver. Mais precisamente, podemos dizer que os dois conceitos referem-se a dois aspectos diferentes do mesmo fenômeno. EaD diz respeito mais a uma modalidade de educação e a seus aspectos institucionais e operacionais, referindo-se principalmente aos sistemas “ensinantes”, enquanto AAD relaciona-se mais com modos de acesso e com metodologias e estratégias de ensino e aprendizagem, ou seja, enfoca as relações entre sistemas de ensino e os aprendentes. Observe que neste destaque, o enfoque está numa relação diferente (ou noutra relação) num processo ensino-aprendizagem: entre sistemas de ensino e aprendentes.

Vamos agora ressaltar ou trazer à pauta um exemplo de EaD: o francês. Neste país essa modalidade de educação já possui uma história de ela própria propagar-se como “processo” e como um processo contínuo que se estende por toda a vida, um conjunto amplo de transmissão do conhecimento de forma cumulativa.

Esse sistema já começa a apresentar efeitos benéficos, conforme mostram estudos sobre os anos 1990, tornando os sistemas educacionais mais adaptativos. Com a unificação dos mercados mundiais, o sistema europeu vem encorajando o desenvolvimento da formação a distância, criando programas de iniciativas de aproximação entre indústria e universidade e estimulando o desenvolvimento financeiro. Assim:

(...) podemos identificar algumas fortes tendências para o futuro da EaD no campo educacional, considerando uma perspectiva de educação ao longo da vida: em primeiro lugar, haverá uma grande expansão de experiências diversificadas de ensino a distância que virão a complementar ou substituir os sistemas convencionais no atendimento a certas demandas emergentes de formação inicial e/ou contínua; em segundo lugar, surgirão cada vez mais formas híbridas de educação e formação, combinando atividades presenciais e a distância e tendendo a promover cooperação, intercâmbio e integração dos dois tipos de sistemas; e, por último, estas inovações educacionais tenderão a utilizar de modo mais intenso e integrado todas as potencialidades pedagógicas das NTIC (Carmo, 1997; Perrault, 1996; Blandin, 1990 apud Belloni, 2008, p. 3 7-38).

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