Aspectos Técnicos, Táticos e Regulamentares

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Aspectos técnicos, táticos e regulamentares do futsal sob a ótica de treinadores experts 1. Introdução O futsal é um desporto de criação Nacional, nascido da fusão do futebol de salão e do futebol de cinco. Ocupa um lugar de destaque no cenário brasileiro e mundial, e é homologado oficialmente pela FIFA (FERREIRA, 2002). Como a maior parte desta pesquisa se concentra na questão relacionada à formação tática das equipes, é de grande valia que tenhamos em mente o conceito de tática. Segundo Mutti (2003), tática “é uma forma racional e planejada de aplicar um sistema e seus vários esquemas, a fim de combinar o jogo de ataque e defesa, tirando proveito de todas as circunstâncias favoráveis da partida, com o objetivo de dominar o adversário e conseguir a vitória” (p. 177). Dentre os principais fatores que devem ser considerados e influenciam a tática de jogo de uma equipe destaca-se a atenção com o adversário (fator preponderante para a preparação esportiva), a condição técnica e características pessoais dos jogadores, o condicionamento físico dos atletas, além de outras variáveis psicológicas tais como a motivação, a confiança e a tranqüilidade que são igualmente essências à performance esportiva. A capacidade de observação dos treinadores no decorrer das partidas contribui para a possibilidade de gerar mudanças táticas do contexto de jogo. Finalmente, as regras e regulamentos enformam a elaboração da tática de qualquer equipe. A tática de uma equipe se caracteriza a partir dos sistemas e padrões de jogo, bem como das variações de esquemas previamente definidos no processo de preparação esportiva.

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Aspectos tcnicos, tticos e regulamentaresdo futsal sob a tica de treinadores experts

1. Introduo O futsal um desporto de criao Nacional, nascido da fuso do futebol de salo e do futebol de cinco. Ocupa um lugar de destaque no cenrio brasileiro e mundial, e homologado oficialmente pela FIFA (FERREIRA, 2002). Como a maior parte desta pesquisa se concentra na questo relacionada formao ttica das equipes, de grande valia que tenhamos em mente o conceito de ttica. Segundo Mutti (2003), ttica uma forma racional e planejada de aplicar um sistema e seus vrios esquemas, a fim de combinar o jogo de ataque e defesa, tirando proveito de todas as circunstncias favorveis da partida, com o objetivo de dominar o adversrio e conseguir a vitria (p. 177). Dentre os principais fatores que devem ser considerados e influenciam a ttica de jogo de uma equipe destaca-se a ateno com o adversrio (fator preponderante para a preparao esportiva), a condio tcnica e caractersticas pessoais dos jogadores, o condicionamento fsico dos atletas, alm de outras variveis psicolgicas tais como a motivao, a confiana e a tranqilidade que so igualmente essncias performance esportiva. A capacidade de observao dos treinadores no decorrer das partidas contribui para a possibilidade de gerar mudanas tticas do contexto de jogo. Finalmente, as regras e regulamentos enformam a elaborao da ttica de qualquer equipe. A ttica de uma equipe se caracteriza a partir dos sistemas e padres de jogo, bem como das variaes de esquemas previamente definidos no processo de preparao esportiva. Os sistemas de jogo se configuram atravs da disposio dos atletas em quadra de modo que suas aes e manobras neutralizem o ataque adversrio e iluda a defesa adversria (APOLO, 2004). Os sistemas mais recorrentemente citados na literatura so o 2X2 (com ou sem variao), o 2X1X1, 3X1, 1X3, 4X0, 0X4 e os sistemas em rodzio. O sistema de jogo representa a base de formao da equipe e funciona de modo interdependente com os esquemas e padres de jogo. Segundo Mutti (2003), o padro de jogo se configura em diversas formas de movimentao dos atletas, situao em que ocorre a troca de posies de modo planejado e organizado, no intuito de confundir a marcao adversria e provocar erros em seu sistema defensivo, visando a infiltrao na defesa contrria em busca de melhores condies para a finalizao em gol. Existem vrios padres de jogo em funo dos sistemas empregados pelas equipes. Os padres envolvem movimentos de circulao laterais ou diagonais, contando ou no com a participao do goleiro (MUTTI, 2003). Quando se conta com o goleiro linha, este se posiciona como base, sendo o ltimo jogador da defesa. So exemplos de padres de jogo: (a) o padro roda; (b) o padro em oito; (c) o padro oito por trs; (d) o padro pelo meio; (e) Padro invertido; (f) padro cruzado; (g) padro em X; (h) padro em elstico; (i) padro com goleiro linha (Para aprofundamento vide MUTTI, 2003). Os esquemas se concretizam em manobras estratgicas definidas a partir dos sistemas e padres de jogo adotados por uma equipe (APOLO, 2003). Funcionam como combinaes inerentes formao adotada pela equipe e se desenvolve mediante a sincronizao de movimentos e passes preconcebidos, visando criar oportunidades de jogo sem abrir mo do equilbrio defensivo. Na seqncia descrevemos a formao e as caractersticas dos principais sistemas de jogo utilizados no futsal.1.1. Sistemas de Jogo no Futsal

Figura 1. Sistemas de jogo 2X2, 2X1X1, 3X1 e 1X3 O sistema 2x2 o mais simples entre todos os sistemas, utiliza dois jogadores na defesa e dois jogadores no ataque (Figura 1). Por ser de fcil assimilao utilizado nas categorias de iniciantes e equipes tecnicamente inferiores. Este sistema pode ser considerado como precursor de outros sistemas tais como: 3x1, 1x3. Em termos dinmicos, quando um atacante recua para ajudar na defesa se transforma em 3x1, e quando um defensor avana para ajudar no ataque passa a 1x3 (MUTTI, 2003). O sistema 2x1x1, relativamente simples e de fcil aprendizagem, constitudo de dois jogadores na defesa, sendo um de cada lado da quadra denominados de alas, um jogador no meio da quadra e um quarto jogador denominado piv, que se localiza avanado perto da rea adversria. Este sistema bastante utilizado pelas equipes nas sadas de bola no tiro de meta. O sistema 3x1, como pode ser visualizado na Figura 1, se caracteriza com um jogador fixo na frente de sua rea defensiva, dois jogadores abertos pelas alas que tanto auxiliam na defesa quanto no ataque; e um piv que joga sempre um pouco mais adiantado. Este sistema pode ser mais facilmente observado pelos expectadores quando uma equipe comea a fazer manobras em sua rea defensiva visando uma ao ofensiva. No sistema 1X3, considerado excessivamente ofensivo, a formao da equipe apresenta um jogador fixo na defesa e trs jogadores posicionados no ataque. Este um sistema considerado suicida por Apolo (2004), mas Mutti (2003) admite ser vivel em equipes de elevado nvel tcnico. O sistema 4x0 caracterizado pela colocao dos quatro jogadores na parte defensiva da quadra de jogo (Figura 2), uma formao considerada moderna, pois faz com que as equipes tenham uma grande movimentao, alternando o posicionamento de seus jogadores constantemente. Isso dificulta a marcao das equipes adversrias. A utilizao deste sistema pela sua complexidade fica mais restrita a times de alto nvel.

Figura 2. Sistemas 4X0, 0X4, rodzio de 3 e rodzio de 4 pelo meio O sistema 0x4 uma opo de formao ttica na qual os quatro jogadores se colocam no ataque. Este sistema pode ser utilizado como opo quando nos momentos finais do jogo a equipe encontrar-se em desvantagem no placa. Outra situao em que se admite a sua utilizao quando a equipe dispe de um goleiro que tenha um bom controle da bola com os ps. Como pode ser observado na Figura 2, o sistema rodzio de trs se configura com trs jogadores colocados em sua parte defensiva da quadra e um jogador no ataque. Este sistema se caracteriza pela movimentao dos trs jogadores de defesa, fazendo uma sucessiva troca de posies entre o fixo e os alas e esperando uma melhor oportunidade para realizar a ligao com o ataque. A ltima ilustrao da Figura 2 caracteriza o sistema rodzio de quatro. Esta situao ttica exige uma grande movimentao dos jogadores. A dinmica empregada neste sistema exige ateno, concentrao e sincronia dos jogadores. O rodzio pode ser realizado tanto pelo meio da quadra quanto pelas alas. No rodzio pelo meio dois jogadores se localizam na ala direita, sendo um no ataque e outro na defesa (jogadores 1 e 3), enquanto os outros dois jogadores se colocam na ala esquerda distribudos da mesma forma, ou seja, um no ataque e outro na defesa (2 e 4). O rodzio se inicia com um jogador de defesa (jogador 1), estando em posse da bola, passa ao companheiro que esta ao seu lado na meia quadra defensiva (jogador 2) e corre pelo meio da quadra visando ocupar a posio do atacante na ala correspondente a que se encontrava na defesa (posio do jogador 3). Na seqncia, o jogador de ataque do mesmo lado (jogador 3) retorna defesa pela lateral ocupando a posio defensiva deixada pelo jogador 1, onde ter a oportunidade de realizar posteriormente a mesma movimentao de seu companheiro (jogador 1). Esta dinmica ocorrer da mesma forma pela ala esquerda envolvendo os jogadores 2 e 4. Cabe referir que tambm existe o rodzio de quatro realizado pelas alas. A dinmica de sua realizao abrange deslocamentos de trs jogadores entre a meia quadra defensiva e ofensiva pela lateral da quadra de jogo, enquanto um jogador fica restrito rea defensiva suportando de forma cclica o rodzio realizado pelos companheiros (para aprofundamento vide APOLO, 2004).1.2. Tipos de marcao Os esquemas defensivos se configuram atravs do tipo de marcao adotada pelo treinador. Entre as mais referenciadas na literatura destacam-se a marcao Individual (ou Homem a Homem), que pode ser realizada em situao de marcao presso e meia presso, e marcao por Zona, que pode ser configurada em forma de losango e quadrado. A marcao individual ou homem-a-homem se caracteriza pela responsabilidade de cada defensor sobre um jogador adversrio (o seu atacante) previamente determinado. Neste caso o defensor deve acompanhar o adversrio sob sua responsabilidade em todo o espao da quadra de jogo. Este sistema admite a possibilidade de realizao sob presso ou meia presso (MORATO, 2004). A marcao presso exige a constante ao do defensor sobre o atacante em qualquer local da quadra em que este se encontre. do defensor uma ao sobre o adversrio (MUTTI, 1994). A marcao meia presso se difere da anterior pelo fato de se direcionar a marcao individual exclusivamente sobre o adversrio que possui o domnio da bola. Quando o oponente no tem a posse de bola, o defensor deve marc-lo a distncia, tendo ainda a possibilidade de dar cobertura a outro companheiro que esteja efetivamente pressionando o seu atacante direto. A marcao por zona ou setores se caracteriza pela responsabilidade que cada defensor tem sobre uma determinada regio do campo de jogo e, assim, pelo atacante direto que a ocupa (MUTTI, 2003). Diferentemente da marcao individual, em que a marcao fixa num adversrio previamente determinado, na marcao por zona a prioridade assumida pelo defensor a marcao de um setor definido. Neste tipo de marcao o posicionamento dos defensores ocorre em funo do deslocamento da bola (BAYER, 1994), e por isso so comuns as constantes trocas de marcao. Na marcao por zona em forma de losango os alas direito e esquerdo cobrem as reas 1 e 2 em suas respectivas posies realizando um balano em funo da posio da bola, isto , o ala do lado em que se encontra a bola estar avanado, enquanto o ala contrrio recuar para cobertura, e vice-versa, quando a bola mudar de uma ala para a outra. O fixo e o piv repartem a responsabilidade pela marcao das reas centrais 1 e 2 (Figura 3).

Figura 3. Marcao por zona em losango em funo da posio da bola (Fonte: MORATO, 2004) A marcao por zona em forma de quadrado tem como base os sistemas 2X2 ou 4X0. Nesta formao dois jogadores ocupam as reas 1 e 2 pela esquerda, enquanto outros dois procedem da mesma forma no lado direito, configurando um quadrado imaginrio (MORATO, 2004). Da mesma forma como ocorre na marcao em losango, os jogadores avanados realizam o movimento de balano em funo da posio do adversrio de posse da bola (Figura 4).

Figura 4. Marcao por zona quadrado em funo da posio da bola (Fonte: MORATO, 2004) Tendo em vista que este estudo se desenvolveu sob a perspectiva da expertise, na seo seguinte nos ocupamos em conceitualizar esta teoria, no intuito de esclarecer os parmetros determinantes da expertise e a mais valia que as pesquisas sob esta perspectiva podem acrescentar ao conhecimento sobre a preparao esportiva em contextos competitivos e de alta performance relativamente ao desenvolvimento do futsal.1.3. Caractersticas e desenvolvimento da expertise Os estudos sob a perspectiva da expertise tm origem na obra do psiclogo alemo Anton DeGroot, publicada em 1965 abordando os pensamentos e aes de jogadores de xadrez (thought and choice in chess) (BERLINER, 1994). Esta obra foi fundamental para a sistematizao do modelo de pesquisa nos moldes contemporneos, chegando a assumir o status de paradigma de investigao. O termo expert denomina indivduos altamente experientes em seu ramo de trabalho, os quais conseguem alcanar com distino nveis de proficincia face ao ampliado perodo de prtica reflexiva numa rea de atuao. Em geral, no mbito da educao fsica e esportes, o estudo da expertise se prope a analisar os pensamentos de aes de professores e treinadores considerados experts, isto , indivduos que demonstram possuir um alto nvel de domnio e conhecimento relacionado ao ensino de contedos escolares e ao treino de modalidades esportivas, respectivamente. O modo atravs do qual indivduos se tornam experts em sua rea de atuao foi objeto de conceitualizao por autores como Berliner (1994) e Bell (1997). Ambos os autores propem que o desenvolvimento da expertise ocorre atravs de distintas etapas. Berliner (1994) identifica cinco estgios de desenvolvimento (ou nveis de expertise), a saber: principiante, principiante avanado, competente, proficiente e expert (perito ou experto), enquanto Bell (1997), baseado no mesmo modelo, exclui o estgio de principiante sob a alegao de que o indivduo carrega um conjunto de vivncias que reduzem o impacto da ao no campo de atuao profissional. Ou seja, as vivncias pregressas do treinador, quer como atleta quer durante a formao acadmica, possibilita um conjunto de experincias que permitem a iniciao profissional com algum nvel de instrumentalizao. A expertise do treinador se desenvolve com base no conjunto de fatores tais quais os conhecimentos adquiridos, motivao, metas pessoais e a extensiva experincia num contexto especfico e em uma rea de atuao. O tempo de experincia altamente valorizado na literatura, embora se reconhea a necessidade de interao com as demais variveis (SIEDENTOP; ELDAR, 1989; SCHEMPP, 2003). O domnio do contedo de ensino/treino, juntamente com a experincia exercida num contexto especfico, constitui um dos sustentculos da expertise (HENRIQUE, 2004). Assim, a ampla vivncia num determinado ambiente e com o objeto de treino, por si s, no conduz ao desenvolvimento da percia, mas se constitui numa das condies necessrias para viabilizar a experincia e, conseqentemente, tornar a sua prtica eficaz. Certamente, todos os professores experts apresentam uma extensiva experincia no campo de atuao profissional (BELL, 1997). A experincia est intimamente relacionada com o contexto especfico em que se desenvolve o exerccio profissional e com o conhecimento sobre o objeto de ensino/treino. Um professor/treinador expert em futebol de campo no manter, obrigatoriamente, a expertise no mbito do futsal, e vice-versa. Baker; Horton; Robertson-Wilson; Wall (2003), destacam que o expert possui um destacado conhecimento especfico na rea de atuao, acumula e acessa o conhecimento de forma mais efetiva, detectam e reconhecem padres de jogo e tomam decises com destacada rapidez e propriedade. O treinador expert dispe de um conjunto de rotinas armazenadas em vista de suas vivncias pregressas, que lhe permitem atuar automaticamente diante de novas situaes. A construo do conhecimento do expert dinmica e evolui desde a sua formao profissional. As primeiras vivncias durante a formao profissional so profcuas para o desenvolvimento da expertise, quando o indivduo conta com a cooperao de orientadores com quem possa discutir a prpria prtica. Segundo Siedentop & Eldar (1989), esta interao fundamental para o desenvolvimento da expertise no meio esportivo porque proporciona um feedback sobre a performance na atividade. A partir do incio da prtica profissional a troca de informaes com outros indivduos mais experientes na rea de atuao continua a implicar para a aquisio/aprofundamento de conhecimentos, bem como para o desenvolvimento de competncias prticas. O estudo de Schempp (2003) ratifica a importncia da troca informal de conhecimentos no mbito profissional. Na pesquisa conduzida pelo autor, as fontes de conhecimento consideradas mais teis pelos treinadores experts, embora no exclussem a busca de literatura concernente, foram os contatos com outros treinadores e a prpria atividade prtica. Enquanto as trocas com outros profissionais da rea lhes proporcionaram novos e diferentes subsdios, as vivncias no treino permitiram mais tempo de prtica, observao de situaes diversificadas implicando em aprofundamento de conhecimentos, e interaes com os atletas, sendo esta importante para a avaliao de suas prticas. Do momento em que recebe um estmulo at o momento de soluo do problema, o treinador recorre a uma rede de informaes estruturadas e acumuladas na memria de longo prazo. Ao perceber, interpretar e representar o problema, o treinador pe em ao um complexo mecanismo que promove o estabelecimento de associaes entre blocos de informaes estruturadas a partir de seu vasto conhecimento, as quais alimentam o processo decisrio permitindo ao treinador solucionar de forma rpida e precisa um determinado problema (HENRIQUE, 2004; ERICSSON & STASZEWSKI, 1989; ENNIS, 1994). Portanto, a ao de treinadores experts dispensa o processamento cognitivo de informaes no nvel analtico e deliberativo que, para Siedentop & Eldar (1989), fomentam a capacidade para discriminar as informaes com antecedncia e apresentar respostas rpidas e precisas.2. Objetivo Caracterizar o conhecimento de treinadores experts sobre os aspectos tcnicos, tticos e regulamentares do jogo de futsal, no sentido de compreender as bases cognitivas que orientam a sua ao no contexto esportivo de alta performance.3. Metodologia3.1. Tipo de Pesquisa O modelo de pesquisa se caracteriza como descritivo de carter qualitativo, na medida em que visa descrever as cognies de treinadores experts na modalidade futsal, a partir da interpretao e anlise de respostas a um questionrio aberto. Segundo Gil (2002), a pesquisa descritiva visa descrever as caractersticas de determinada populao ou fenmeno, sendo uma de suas caractersticas mais significativas a utilizao de tcnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionrio, entre outros.3.2. Amostra A amostra neste estudo composta por 4 treinadores de grandes clubes que disputaram o Campeonato Estadual de Futsal do Rio de Janeiro Brasil, no ano de 2007, na categoria adulto masculino. A expertise dos treinadores foi garantida pelo tempo de experincia na rea de atuao, considerando que os indivduos apresentam em mdia 10,7 ( 2,2) anos de experincia na condio de treinadores, 20,0 ( 7,9) anos como atletas da modalidade e 15,0 ( 4,9) anos de experincia na rea de atuao em funes de assistncia tcnica e arbitragem.3.3. Instrumento Foi utilizado um questionrio aberto com registro de respostas pelos prprios indivduos da amostra. Segundo Hill & Hill (2000), apesar das exigncias interpretativas e do tempo de aplicao, este instrumento permite a coleta de informaes mais ricas e detalhadas. O questionrio composto de 10 perguntas abertas, atravs do qual os treinadores foram solicitados a expressarem seus conhecimentos sobre as questes tticas do jogo (formao ttica ofensiva e defensiva de uma equipe e relaes entre a preparao fsica e ttica), bem como as suas apreciaes sobre as freqentes mudanas ocorridas no futsal e em relao ao desenvolvimento do futsal no Rio de Janeiro em relao aos demais Estados brasileiros. Em vista pouca disponibilidade de tempo dos treinadores, os questionrios foram lhes foram entregues e recolhidos quando os pesquisadores foram informados que os mesmos haviam sido completamente respondidos.3.4. Anlise dos dados Aps a recolha dos questionrios as respostas foram interpretadas e analisadas mediante a tcnica de anlise de contedo. A codificao das unidades de anlise respeitou exclusivamente os temas de interesse da pesquisa enunciados anteriormente. O processo de interpretao e codificao das respostas dos treinadores foi realizado por dois pesquisadores, visando preservar a validade das anlises (HILL & HILL, 2000).4. Apresentao dos resultados Em relao opo por tipos de marcao, todos os treinadores informaram que o sistema defensivo deve ser definido considerando fatores tais como as caractersticas de seus atletas, as caractersticas do adversrio, o tempo de que dispunham para os treinamentos, bem como para o conhecimento do grupo de atletas a sua disposio. Apesar dessa unanimidade, um treinador demonstrou atitude mais positiva pelo sistema defensivo individual, mas no deixou de destacar que isso s seria possvel se contasse com atletas que possussem caractersticas especficas para este tipo de jogo. Outro treinador declarou que os sistemas baseados na marcao por zona demandam mais tempo para o aperfeioamento. Quanto ao sistema defensivo, alm de levar em considerao as caractersticas da prpria equipe e da forma de jogar do adversrio, o Treinador 2 destacou que quando confronta equipes com goleiros chutadores prefere o recurso ao sistema de marcao em losango, ao passo que quando se defronta com equipes em que o goleiro atua mais como passador, opta pelo sistema em quadrado. Em alguns casos (goleiro chutador) losango, em alguns casos (passador) quadrado. Se for em termos de marcao zona, sempre losango. (TREINADOR 2) Para o Treinador 1 a utilizao destes sistemas depende de fatores tais como as caractersticas dos atletas, as dimenses da quadra e o momento do jogo. Como todos os sistemas, ambos devem obedecer a algumas condies: quem vai executar, dimenses da quadra, momento do jogo e etc. (TREINADOR 1) Quando os treinadores foram questionados sobre como administravam a individualidade dos atletas e a formao ttica da equipe, mais uma vez a ttica aparece na dependncia das caractersticas individuais dos atletas. Um treinador argumentou que o atleta deve usar a individualidade com responsabilidade e sempre a favor da equipe. A interao individualidade/coletividade valorizada quando facilita a compreenso mtua das aes entre os atletas. Em geral, para estes treinadores, a individualidade deve somar para a coletividade da equipe, sendo potencializada no sistema ttico implementado, como fica claro na seguinte assertiva: A individualidade a marca do bem sucedido, desde que colocada servio do coletivo. A ttica deve ser utilizada, para que a individualidade possa aflorar com maior segurana. (TREINADOR 1) Relativamente ao nvel de prioridade conferida ttica e s possibilidades de criatividade do atleta, todos os treinadores revelaram que a fluncia da criatividade dos atletas deve ser valorizada, mas dentro do padro ttico da equipe, denotando implicitamente o alto valor que conferem disciplina ttica. O atleta sempre tem a oportunidade de criar, desde que no fuja do padro ttico definido. O aumento das quadras, de uma forma geral, ao mesmo tempo em que modificou a forma de jogar, criou mais espaos para a criatividade. (TREINADOR 2) Sim, [a ttica] foi mais trabalhada, mais as quadras com dimenses maiores deram aos atletas a oportunidade ou a liberdade de criar mais (no momento certo) seguindo a parte ttica. (TREINADOR 3) Ainda que valorizando o trabalho ttico, o Treinador 4 declara seu ceticismo com relao atual valorizao do jogo-fora baseado na supremacia do trabalho ttico e fsico em prejuzo da criatividade e qualidade individual dos atletas. Eu diria que a parte ttica foi trabalhada em demasia, os espaos passaram a existir, mas a qualidade do jogador caiu muito. Foi dada muita nfase ao binmio ttico-fsico, e com isso a qualidade individual foi deixada de lado.[...] A ttica foi (excessivamente) aprimorada, melhorou a condio fsica, mas deixamos a arte bastante abandonada. (TREINADOR 4) Apenas o Treinador 4 demonstra uma preconcepo de que o relevo exarcebado conferido aos aspectos fsicos e tticos limita a manifestao das qualidades individuais e ao criativa do atleta. Os demais treinadores consideram que a preparao fsica fundamental para a evoluo em outras dimenses da preparao de uma equipe. Como seria de esperar, a opo dos treinadores pelos distintos esquemas de jogo varia em funo de fatores como o tamanho do terreno de jogo, as caractersticas dos atletas de sua equipe, bem como da formao e caractersticas das equipes e atletas rivais. A opo pelo esquema 4X0 aparece associada s dimenses do campo de jogo, isto , as quadras de maiores dimenses permitem atrair o adversrio para o prprio campo, com isso, permitindo maiores espaos ofensivos. J no terreno de jogo com dimenses menores que a medida oficial, parece ser unnime que o esquema 3X1 possibilita maior equilbrio equipe. Para o Treinador 1, o esquema 4X0 permite maior ofensividade, enquanto o esquema 3X1 permite maior equilbrio, com a possibilidade de variar para o esquema 2X1X1. A utilizao do rodzio depende das caractersticas dos atletas e do tempo disponvel para a preparao da equipe, como fica evidente no relato do Treinador 2, alegando que naquele ano recorreu ao piv fixo, por no dispor de condies de trabalhar os quatro rodando. Finalmente, os treinadores foram questionados quanto s conseqncias das modificaes das regras ocorridas nos ltimos anos para o jogo de futsal. Todos os treinadores informaram que no houve dificuldade para a adaptao s novas regras. No entanto, identificaram aspectos positivos e negativos para o desenvolvimento da modalidade. Os Treinadores 2 e 4 avaliaram que as mudanas das regras tm influenciado de forma significativa o desenvolvimento ttico na modalidade, implicando na necessidade de constante adaptao do jogo das equipes. Trs dos quatro treinadores aprovaram a inteno de universalizao das regras do esporte, mas consideram que a quantidade de alteraes ocorreram num perodo muito curto de tempo. Dentre os aspectos positivos, foi quase unanimidade (a) a liberdade conferida ao goleiro dando-lhe a possibilidade de atuar ofensivamente; (b) o tiro de 10 metros (tiro livre sem barreira); (c) a dinmica nas substituies; e (d) a alterao das dimenses do terreno de jogo, muito embora em relao a esta ltima, o Treinador 4 considerou a ampliao exagerada opinando que deveria ser de no mximo 36 metros. Dentre os aspectos negativos destaca-se (a) a possibilidade da bola lanada pelo goleiro na cobrana do arremesso de meta; (b) o fato de nem todas as faltas serem computadas de forma cumulativa (tiro livre indireto) a qual, para o Treinador 3, representa um grande retrocesso; e a possibilidade do goleiro lanar a bola diretamente para o meio campo adversrio. Em geral, todos os treinadores reclamaram do fato de no haver o jogo adaptado para jovens iniciantes, pois acreditam que esta medida, a exemplo do que ocorre em outras modalidades (mini-basquete, mini-handebol, etc), possibilitaria uma formao de base mais adequada s capacidades infantis. O maior erro do futsal no atentar para uma adequao das regras nas categorias de base. Um goleiro de 08 anos de idade,defende em traves com as mesmas dimenses para um adulto. (TREINADOR 1)5. Concluses A pesquisa envolvendo experts visa a anlise de indivduos que demonstram diferenciada performance numa rea de atuao, no intuito de gerar conhecimento que contribua para o desempenho profissional e/ou promova a reflexo de indivduos menos experientes de modo a tambm lhes permitir o alcance da expertise. Quando pensamos em indivduos experts no meio esportivo, recordamos de sua experincia, de suas vitrias e ttulos conquistados. A expertise se ope ao amadorismo e por isso a pesquisa com estes profissionais ajuda a elucidar a sua forma fluida de conceber solues quando se confrontam com problemas em sua rea de atuao. Esta abordagem se torna ainda mais significativa numa rea em que prevalece a construo da teoria a partir do conhecimento prtico adquirido no trabalho de campo. Esta pesquisa se prope a analisar as cognies que orientam as aes de treinadores de futsal face s decises/opes tticas caractersticas desta modalidade esportiva. Consonante com a literatura revisada, as aes dos treinadores experts esto subordinadas anlise de um complexo conjunto de variveis que envolvem tanto as caractersticas de sua equipe e atletas, quanto quelas do adversrio. Assim, as decises sobre os sistemas, esquemas e padres tticos refletem um exame sistemtico e metdico de inmeras variveis tais quais as caractersticas psicolgicas, fsicas e tcnicas dos atletas; o tempo disponvel para a preparao esportiva; a natureza das competies e dos adversrios; os espaos onde se realizam os jogos; e, principalmente no futsal jogado nos ltimos anos, a adaptao ttica s regras do jogo que denotam grande quantidade de modificaes num curto espao de tempo. As opes pela adoo de sistemas defensivos se apresentam dependentes das caractersticas individuais dos atletas e/ou do tempo disponvel para a preparao visando aprimorar o entrosamento dos atletas. O jogo da equipe adversria influencia as decises do treinador, tendo sido referido a adequao de sistemas defensivos com o jogo de equipes adversrias que atuam com goleiro linha. Em situaes de menor ofensividade do goleiro (passador) a maior parte dos treinadores recorrem marcao em losango, enquanto quando confrontam as equipes com goleiros chutadores prevalece a opo por sistema em quadrado. Constata-se, ento, como as novas regras e, com isso, a promoo de possibilidades ofensivas aos goleiros, influenciaram a dinmica do jogo de futsal e conseqentemente a reflexo e adaptao dos treinadores a uma nova realidade do jogo. Os tipos de marcaes so encarados como opes que devem se adequar situao do jogo, sendo relevadas as caractersticas tcnicas dos jogadores para a implementao de defesas individuais e o tempo de preparao para a implementao de defesas por zona para que funcionem de maneira eficaz. Embora no deixem de levar em considerao os fatores j citados anteriormente, a varivel mais referenciada pelos treinadores experts ao se referirem adoo de sistemas de jogo foi a dimenso da quadra. Nas quadras maiores adotam sistemas dinmicos, mais modernos e ofensivos, enquanto nas quadras com dimenses mnimas optam por sistemas de jogo mais equilibrados. As variaes de um sistema para outro e o recurso aos sistemas em rodzio so valorizadas em funo do tempo disponvel para a preparao das equipes e de como se apresenta o contexto de jogo. Os treinadores experts valorizam a habilidade individual e criatividade dos atletas, mas percebem-na como elementos que, obrigatoriamente, devem se integrar dimenso ttica da equipe de futsal, percepo que revela serem extremamente exigentes quanto disciplina ttica dos jogadores. Para eles a criatividade e habilidades individuais devem ser utilizadas com responsabilidade pelo atleta e em sintonia com o binmio individualidade/coletividade e padro de jogo da equipe. Observa-se a importncia conferida ao plano do treinamento nas suas distintas dimenses (Tcnica, fsica, ttica e psicolgica), mas a preocupao destes treinadores extrapola o contexto de seu atual trabalho, na medida em que reclamam adaptaes na formao de base, a exemplo do que ocorre em outras modalidades esportivas, visando a qualificar a preparao jovens atletas de futsal. Alis, apesar de concordarem que as constantes mudanas de regras nos ltimos anos trouxeram benefcios ao jogo, citam como prejuzo a inexistncia de adaptaes na iniciao esportiva. Como afirma Oliveira, Voser & Hernandez (2004), o treinador comumente exerce funes que vo alm de suas responsabilidades, muitas vezes atuando, mesmo, como dirigente, psiclogo, educador, conselheiro, etc. Suas aes influenciam a performance dos atletas e, conseqentemente, o desempenho da equipe. A expertise no deve apenas se basear na experincia de campo. A funo do treinador, complexa como se apresenta, demanda que os indivduos recorram constantemente ao estudo e pesquisa no sentido de habilit-lo a interagir de forma positiva com seus atletas, bem como no meio no meio profissional, pois as conseqncias de seu comportamento refletem na satisfao, desempenho e coeso do grupo social em que intervm. Finalizamos com uma referncia de Guilherme (1975), citada por Oliveira, Voser & Hernandez (2004), a qual entendemos refletir o papel do Professor/Treinador: o treinador deve-se conduzir de tal modo que sirva aos praticantes de ontem como uma recordao agradvel de sua juventude; aos praticantes de hoje, como um exemplo de sacrifcio, de dedicao e de dignidade, e aos praticantes de amanh, como uma esperana a mais em seu futuro.