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Paredes divisórias: Passado, presente e futuro, P.B. Lourenço et al. (eds.) 1
ASPETOS CONSTRUTIVOS E FUNCIONAIS DAS PAREDES DIVISÓRIAS NA CONSTRUÇÃO
TRADICIONAL
Fernando F. S. PINHO
Professor Auxiliar
Universidade Nova de Lisboa
SUMÁRIO
Na presente comunicação referem-se os principais aspetos construtivos e funcionais das
paredes divisórias na construção tradicional, que vão muito além da simples divisão dos
espaços. Por esta razão, faz-se previamente uma breve caracterização dos edifícios antigos,
como forma de enquadrar estas paredes na estrutura global dos edifícios; em seguida, indicam-
se as anomalias mais relevantes que podem ocorrer e, por fim, apresentam-se algumas
conclusões globais relativas a esta temática.
1. INTRODUÇÃO
De um modo geral, pode dizer-se que o número de edifícios construídos no nosso País segundo
as regras da construção tradicional (quase um milhão) era, no final do Século XX, da mesma
ordem de grandeza do número de edifícios com estrutura em betão armado, representando
cerca de 30% dos edifícios existentes. Entre estas duas tipologias construtivas distintas, situam-
se os edifícios com paredes resistentes em alvenaria de pedra, com pavimentos em betão
armado, correspondendo aos cerca de 40% restantes.
A construção tradicional perdurou até ao final do primeiro quartel do Século XX. Os edifícios
com estrutura em betão armado, tiveram o grande impulso após os anos 1935/40,
transformando-se na solução construtiva predominante a partir de 1955, sobretudo nos grandes
centros urbanos [1].
Em face do grande número de edifícios antigos existentes, torna-se muito importante que as
propostas de reabilitação arquitetónica e/ou estrutural dos edifícios antigos – estes últimas cada
vez mais necessárias – sejam desenvolvidas sem comprometer, no futuro, a sua segurança
global. Com efeito, o princípio de funcionamento estrutural dos edifícios antigos não permite
dispensar paredes divisórias, para interligação de espaços, sem que essa ação seja devidamente
ponderada ou, nalguns casos, questionada. Isto porque estas paredes desempenham, em geral,
uma função estrutural de grande importância, contribuindo, em muitos casos, para evitar o
colapso do edifício durante a ocorrência de uma ação sísmica, fruto da sua importante função
de contraventamento global.
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 2
2. BREVE CARACTERIZAÇÃO DA CONSTRUÇÃO TRADICIONAL
Com o objetivo de enquadrar e referenciar as paredes divisórias como elementos de repartição
do espaço interior dos edifícios e, em simultâneo, potenciais elementos resistentes tanto a ações
gravíticas como a ações horizontais, independentemente das suas características geométricas
(esbelteza) e da sua constituição, faz-se em seguida uma caracterização construtiva breve da
construção tradicional no nosso país. De uma forma geral, estes edifícios são classificados
como “edifícios antigos”, porquanto foram construídos até ao primeiro quartel do Século XX,
ou seja, antes das construções com estrutura em betão armado.
2.1. Fundações
As características das fundações (ou alicerces) dos edifícios antigos dependiam, sobretudo, dos
seguintes fatores: valores das cargas transmitidas às fundações e destas ao solo de fundação,
tipo e capacidade resistente do solo e profundidade a que o mesmo se encontrava.
Quando as condições existentes permitiam a solução de fundações superficiais (diretas), estas
eram constituídas por sapatas isoladas, para pilares, ou contínuas, para paredes. Neste último
caso, as fundações diferiam das paredes resistentes por apresentarem em relação a elas uma
sobrelargura, devida ao facto da fundação fazer a transição entre a parede e o solo de fundação
e das fundações corresponderem a uma fase da construção suscetível a alguns “erros” de
implantação.
Em muitos casos, o alargamento das fundações excedia cerca de 0,10 a 0,15m a largura da
parede, variando a sua altura entre 0,50 e 0,80m, em “terreno médio”. Em solos muito
resistentes (rochas) aquela sobrelargura praticamente não existe, confundindo-se, as
características das paredes com as das fundações, uma vez que o terreno podia até ser mais
resistente que a alvenaria das paredes.
A ligação entre paredes e fundações devia ser efetuada de forma a garantir uma boa resistência
a forças de deslizamento, resultantes da ação sísmica, o que podia ser conseguido com base
num endentamento, preferencialmente contínuo, nas zonas de transição/ligação.
Quando a solução de fundações superficiais não era viável, podia recorrer-se a outras soluções,
em princípio também “próprias” de edifícios já com algum porte (dois ou mais pisos) [2]:
1 – prevendo-se a existência de cave, se o pavimento inferior se situava a uma cota que
permitia a realização de “fundações diretas”, adotava-se a solução descrita acima, naturalmente
a partir da cota da plataforma aberta para a construção da cave. Uma dificuldade adicional
desta situação residia na contenção dos taludes durante a fase construtiva;
2 – abertura de poços, posteriormente preenchidos com alvenaria de pedra de boa qualidade,
com um afastamento médio da ordem dos 3m, até atingir as camadas resistentes do solo de
fundação. Sobre estes poços descarregavam então arcos de tijolo maciço, pedra ou mistos, que
por sua vez recebiam as paredes estruturais. Esta solução proporcionava maior economia da
obra, uma vez que o volume de escavação era menor em relação à solução anterior, requeria
técnicas mais simples e não oferecia as referidas dificuldades de contenção das terras;
3 – cravação de estacas de madeira, de aplicação muito limitada devido às elevadas exigências
postas à natureza das diversas camadas do solo (brandas e regulares), que possibilitassem a
cravação, porque a existência de estratos rijos ou blocos de pedras destruíam a cabeça da
estaca, devido à acção do martelo do bate-estacas. Esta solução foi empregue em parte da
Baixa Pombalina, em Lisboa, após o terramoto de 1755 com êxito, devido ao facto do nível
freático se ter mantido mais ou menos constante ao longo do tempo.
2.2. Paredes
Na construção tradicional consideram-se dois tipos de paredes diferentes: paredes resistentes
ou paredes mestras e paredes divisórias ou de compartimentação.
F.F.S Pinho 3
Assim, entende-se por paredes resistentes, aquelas que, pelas “suas características geométricas
e mecânicas, contribuem de forma decisiva para a estabilidade do edifício, quer quando sujeito
à ação das forças verticais (designadamente as de natureza gravítica), quer quando sujeito à
atuação das forças horizontais de natureza aleatória (vento e sismos)” [2], Figura 1.
Figura 1 : Paredes resistentes exteriores (à direita em trabalhos de reabilitação estrutural)
Como características particulares, estas paredes apresentam, de uma forma geral, uma
espessura considerável e são constituídas por materiais heterogéneos, originando elementos
rígidos e pesados, com boa capacidade de resistência à compressão, menor resistência ao corte
e uma muito pequena resistência à flexão e à tração, excetuando, neste último caso, as paredes
exteriores de edifícios com andar de ressalto.
No nosso país, as paredes resistentes de edifícios antigos são em geral construídas em terra –
taipa e adobes, geralmente em edifícios de pequeno porte, com um piso, térreo, raramente dois
pisos – e em alvenaria de pedra irregular (alvenaria ordinária), alvenaria de tijolo, cantaria e
paredes mistas.
Estas paredes resistentes são, no caso da construção tradicional, as paredes exteriores dos
edifícios. Mas, podem também existir paredes resistentes interiores, sendo neste caso
maioritariamente em alvenaria de pedra irregular, simples, ou, nalguns casos, armada com
elementos de madeira, como se verá mais adiante.
As paredes divisórias distinguem-se das paredes resistentes por apresentarem espessuras muito
menores (por exemplo na proporção de 1, para 6 a 8), o que tem uma influência direta nos
aspetos funcionais e de comportamento mecânico. As paredes divisórias tinham como principal
função, originalmente, dividir os espaços delimitados pelas paredes resistentes, podendo ser em
alvenaria de pedra, alvenaria de tijolo ou em tabiques.
Não obstante esta “separação” entre paredes resistentes e paredes divisórias, pode-se afirmar,
contudo, que, nos edifícios antigos, a grande maioria das paredes divisórias desempenha ou
pode vir a desempenhar, com maior ou menor importância, funções estruturais de resistência
tanto a ações gravíticas – transmitidas pelos pavimentos de madeira –, como a ações
horizontais, resultantes das ações sísmicas.
2.3. Pavimentos, coberturas e escadas
De uma forma geral, a solução construtiva dos pavimentos dos edifícios antigos varia
consoante se trate do pavimento térreo ou dos pavimentos elevados. Os pavimentos térreos são
constituídos por enrocamento de pedra arrumada à mão, sobre o qual é colocada a camada de
revestimento e desgaste, em lajedo de pedra, ladrilhos, tijoleira cerâmica ou sobrados de
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 4
madeira; em situações mais modestas, podem ser apenas de “terra batida”. Noutros casos, o
pavimento térreo é estruturalmente semelhante aos pavimentos elevados, sendo constituído por
uma estrutura de vigas de madeira sobre as quais se pregavam as tábuas de solho. Para evitar o
apodrecimento das vigas, estas não deviam ficar em contacto com o solo, deixando-se para o
efeito um espaço livre entre o solo e o vigamento (caixa-de-ar), cuja ventilação era efetuada
através de furos abertos nas paredes exteriores (designados por ventiladores ou respiradouros).
Em relação aos pavimentos elevados, predomina a madeira como elemento estrutural: os
pavimentos são suportados por vigamentos principais, com afastamento entre vigas da ordem
de 0,20 a 0,40m. Nalguns casos, as vigas são substituídas por perfis redondos, de troncos
apenas descascados. Em grandes vãos, existem vigas principais de madeira de grande altura,
sobre as quais apoiam as vigas do pavimento. Nalgumas construções do Séc. XIX, estas vigas
principais são perfis metálicos, com secção em I, e com altura menor comparativamente às
vigas de madeira, para iguais vãos. Para que os pavimentos de madeira pudessem desempenhar
funções de travamento geral da estrutura do edifício, a ligação parede/pavimento devia ser
melhorada através de peças metálicas pregadas às vigas e embebidas nas paredes. A utilização
dos tarugos (de madeira), colocados perpendicularmente às vigas, evitava a sua rotação e a
instabilidade lateral. Existem ainda outras situações em que os elementos estruturais são arcos
e abóbodas de alvenaria, mais duráveis que a madeira, sobre as quais se aplicavam os
revestimentos. Na Baixa Pombalina, esta solução foi aplicada também no pavimento térreo [3].
A estrutura da cobertura, não obstante os problemas de durabilidade associados à presença da
água, é geralmente em madeira, através duma estrutura, cujo elemento principal é a asna,
facilmente adaptável a geometrias variáveis. A estrutura secundária de apoio da cobertura é
formada, sucessivamente, por madres, varas e ripas, suportando estas últimas as telhas.
No que se refere às escadas, tal como os pavimentos e coberturas na construção tradicional, são
geralmente em madeira, ou de pedra em casos mais raros. Muitas vezes as escadas são
elementos de forte presença arquitetónica e distintiva do valor patrimonial do edifício.
Nos edifícios correntes mais antigos, as escadas têm geralmente um único lanço entre pisos,
apresentam uma largura reduzida e uma inclinação acentuada, e são designadas por escadas de
tiro. De um modo geral, estas escadas são desconfortáveis e difíceis de subir, podendo ter
espelhos com 0,20m de altura. No Século XVII o espaço ocupado pela escada passa a ser maior
e, a partir do Século XVIII, as escadas passaram a ter dois lanços e patamares intermédios.
A localização das escadas também se foi deslocando das paredes laterais (empenas) para o
centro dos edifícios. Do ponto de vista estrutural, esta evolução no sentido da obtenção de
simetria estrutural fez com que as escadas possam resistir com eficácia à ação dos sismos [3].
3. CARACTERIZAÇÃO DAS PAREDES DIVISÓRIAS NA CONSTRUÇÃO TRADICIONAL
Como referido, as paredes divisórias podem ser distinguidas entre aquelas que, à partida,
apenas tinham função de compartimentação do espaço interior dos edifícios e as que, para além
dessa função, também desempenham funções estruturais, justificadas pelas dimensões em
planta do edifício. Neste último caso, as paredes podem apresentar espessuras da ordem de
grandeza das paredes exteriores, mas, naturalmente, localizam-se no interior dos edifícios.
No que se segue, apresentam-se os principais aspetos construtivos e funcionais das paredes
divisórias na construção tradicional [2 - 4].
3.1. Paredes divisórias, mas com funções resistentes à partida (paredes resistentes interiores)
Na construção corrente, as paredes com capacidade resistente que definem as grandes divisões
ou divisões principais, são maioritariamente em alvenaria de pedra.
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Na construção Pombalina, as paredes resistentes de alvenaria (interiores e exteriores) são
armadas com uma “armação” de madeira constituída por um elevado número de peças
verticais, horizontais e inclinadas – prumos, travessas ou travessanhos e diagonais de madeira –
devidamente ligadas entre si, formando as cruzes de Santo André, constituindo um sistema
sólido e com grande estabilidade. Nas paredes interiores esta armação designa-se por frontal
[5], mas este termo pode também ser aplicado à própria parede. Estas paredes são dispostas
perpendicularmente às paredes principais exteriores de alvenaria (armadas com a gaiola de
madeira).
Os vãos são reforçados por elementos resistentes adicionais (vergas e pendurais), sendo as duas
faces de cada frontal geralmente revestidas com reboco e estuque.
Os frontais fazem, portanto, parte integrante da gaiola (ou esqueleto) de madeira, globalmente
formada por um sistema tridimensional de travamento – constituído na horizontal pelas
estruturas de madeira dos pavimentos e asnas da cobertura e, na vertical, pelas paredes
exteriores e interiores (frontais) em gaiola – que proporciona uma interligação/solidarização
dos diferentes elementos estruturais em presença, conferindo ao conjunto uma ductilidade
“comparável” às atuais soluções obtidas com betão armado [2], Figura 2.
(a) (b) (c)
Figura 2 : Construção Pombalina; (a) Edifício na Baixa de Lisboa; (b) Modelo (escala 1:10)
existente na Escola dos Sapadores Bombeiros de Lisboa, em Chelas [4]; (c) Parede de frontal
A ideia da “construção antissísmica” baseada numa estrutura de madeira revestida (preenchida)
exteriormente por alvenaria de pedra está intimamente relacionada com a experiência então
existente na construção naval – na época exclusivamente de madeira –, cujo principal estaleiro
de Lisboa se localizava na Ribeira das Naus: tendo por base o excelente desempenho dos
navios expostos às ações dinâmicas transmitidas pelo mar, os engenheiros militares
intervenientes no processo de reconstrução da Baixa estabeleceram uma “analogia” entre o
comportamento mecânico das embarcações no mar e o comportamento dos edifícios, durante a
ocorrência de um sismo. Essa analogia traduzia-se no facto de ambas as estruturas, barcos e
edifícios, estarem sujeitas a ações em “meios agitados”, absorvendo parte das ações e dos
deslocamentos. Em relação ao comportamento dos barcos, não havia dúvida que tal resultava
da sua estrutura tridimensional de madeira, constituída por peças deformáveis e resistentes à
tração e à compressão, e à forma como eram executadas as ligações entre os vários elementos,
permitindo que funcionassem como um todo articulado entre si. Por outro lado, e devido à sua
fragilidade, as alvenarias simples tinham apresentado grande dificuldade em dissipar a energia
transmitida pelo terramoto, apresentando em simultâneo reduzidas capacidades de resistência à
tração e à flexão, para além de as ligações entre as paredes interiores e exteriores ser deficiente
e prejudicada pelas diferentes espessuras envolvidas. Porém, as alvenarias simples tinham tido
um bom desempenho face à ação do fogo.
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 6
Assim, sendo estes dois materiais – a madeira e a pedra – os mais representativos da época, e
de certa forma “complementares”, como se conclui das propriedades referidas, a sua associação
foi inevitável, concebendo-se então as paredes resistentes mistas, formadas por alvenaria
armada com “bielas” de madeira, retirando-se do efeito conjunto os proveitos que os materiais
individualmente não tinham conseguido apresentar [6]: uma boa capacidade de resistência a
esforços de tração e flexão, auxiliada por adequadas ligações entre as peças de madeira); uma
boa capacidade de resistência à compressão; e uma boa resistência ao fogo.
Para além da alvenaria armada, característica da construção Pombalina, outros edifícios foram
construídos ao longo do país com paredes resistentes exteriores e interiores em alvenaria
simples de pedra calcária, xisto ou basalto. Noutras situações, encontram-se paredes resistentes
exteriores de alvenaria mista, por exemplo de xisto entre vãos (nembos) e de elementos
graníticos de maiores dimensões nos cunhais, vergas, etc.
3.2. Paredes divisórias, sem funções resistentes à partida
Como referido, apesar de, no início, estas paredes poderem não desempenhar funções
estruturais, tal situação vai-se alterando ao longo da vida dos edifícios.
De facto, as paredes de compartimentação estão sujeitas a um acréscimo de solicitações ao
longo do tempo, uma vez que, durante a vida do edifício, se vão alterando as condições de
equilíbrio estático em resultado do envelhecimento e fluência dos materiais (nomeadamente a
madeira dos pavimentos), movimentos diferenciais das fundações, ação dos sismos ou
aumentos de sobrecargas. Estas solicitações provocam reajustamentos e reordenamentos que,
na maioria das vezes, podem ser observados diretamente, como sucede, por exemplo, com uma
parede divisória localizada sob o meio vão de um pavimento de madeira que no início se
encontra estruturalmente separado da parede, não havendo por isso transferência de cargas
entre eles: ao fim de um certo tempo, a ação das cargas aplicadas juntamente com o efeito de
fluência do material (madeira), eventualmente agravada pela existência de defeitos (nós,
empenos, etc.), redução das secções devidas a ataques de fungos e insetos, ou deficiente
dimensionamento, dão origem à deformação vertical do pavimento de tal forma que este
começa por entrar em contacto com a parede, transmitindo-lhe em seguida parte das cargas que
suporta. A partir daí, a deformação do pavimento passa a ser condicionada pelas “novas
condições de apoio” que se formaram, e a parede divisória passa a ter funções resistentes. Em
casos mais extremos, em que as paredes mestras se encontram num grau adiantado de
degradação [2], as paredes divisórias passam a “substituí-las” nas suas funções resistentes.
Outra situação, frequente, relaciona-se com as manifestações de humidade, nomeadamente os
fenómenos de eflorescências e criptoflorescências, que ocorrem tanto nos paramentos
interiores das paredes exteriores, como nas paredes interiores com fundações próprias, e
portanto um meio de ligação direta ao solo de fundação, a partir do qual a água ascende por
capilaridade.
Estes exemplos mostram como as paredes divisórias desempenham funções estruturais na
maioria dos casos, mesmo que não recebam diretamente cargas verticais, fruto da sua
interligação com pavimentos e coberturas, contribuindo significativamente para o travamento
das estruturas em ambas as direções e, por essa via, colaborando na dissipação da energia
sísmica. Além disso, estas paredes podem também influenciar as condições de habitabilidade e
durabilidade geral dos edifícios.
Tal como no caso das paredes resistentes, também as paredes divisórias podem apresentar
várias soluções construtivas, geralmente função da localização geográfica dos edifícios e,
assim, associadas à disponibilidade ou não de determinados materiais.
Neste sentido, é possível encontrar soluções com poucas variações, que podem classificar-se de
âmbito nacional, como os tabiques de madeira (rebocados e estucados – “tabiques
ordinários”);e soluções de carácter mais local, de paredes divisórias construídas em tijolo
maciço ou com blocos de argila cozida ao sol (adobes), estes últimos, características de zonas
ricas em barro e de construções de pequeno porte.
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Os tabiques destinavam-se a criar as divisões mais pequenas dos edifícios, como se referiu
anteriormente, razão pela qual apresentavam uma espessura reduzida (para não ocuparem
muito espaço interior). O tabique mais simples e ligeiro era constituído por uma fiada de tábuas
costaneiras “não limpas” (toscas), com um comprimento entre 2,60 e 3,50m (pé-direito) e uma
secção de 18cmx(4,1 ou 5,5cm) pregadas ao alto com um intervalo mínimo de 1cm, a duas
réguas com 10 a 12cm de largura, fixas uma no sobrado e outra no teto.
Fasquias horizontais de secção trapezoidal, dispostas paralelamente e com intervalos de 3 a
5cm, eram então pregadas sobre as costaneiras de modo a que a face mais larga ficasse para
fora, para poder reter nesses intervalos a argamassa aplicada no revestimento. Estes tabiques
eram construídos depois do solho (pavimento) ser assente.
Por fim, o conjunto era revestido com reboco de argamassa de cal e areia (“saibro”), em ambas
as faces, e posteriormente esboçado e estucado, originando paredes esbeltas, com espessura
média de 0,10m, Figura 3.
(a) (b)
(1) fasquiado de madeira; (2) prancha (costaneira) de madeira; (3) camada de argamassa
Figura 3 : Estrutura do tabique “ordinário”; (a) caso em Lisboa;
(b) representação esquemática (adaptado de [3])
Estas paredes apresentam uma notável elasticidade e uma boa resistência às ações verticais;
além disso, quando colocadas ortogonalmente, de forma a cruzarem-se entre si, melhoram
bastante o comportamento estrutural do edifício às acções horizontais.
Esta mesma designação (tabique) é por vezes atribuída às divisórias interiores de tijolo com
espessura de meia vez ou de tijolo ao alto (ou de cutelo). A estes tabiques também se dá o
nome de pano de tijolo, que de resto é uma designação comum a todas as paredes de tijolo,
com espessura igual ou inferior a um tijolo. A estabilidade destes tabiques era melhorada com a
incorporação de prumos de madeira ou de ferro, afastados entre si cerca de 2,0m: os tijolos
justapostos ficavam encastrados (em vez de simplesmente encostados), abrindo-se para tal
ranhuras ao longo dos prumos de madeira, ou, no caso das vigas de ferro, utilizando perfis em I
ou em duplo T. Os paramentos deste pano de tijolo por vezes não eram rebocados.
A parede de meia vez, utilizada em tabiques, panos de apanhar de chaminés ou nos panos de
peito (nas janelas de peito), era construída por tijolos assentes ao baixo, de forma que a
espessura da parede no tosco correspondesse à largura do tijolo. Um pano de meia vez
apresentava uma estabilidade superior ao de um pano de tijolo ao alto, não necessitando por
isso de ser reforçado com prumos de madeira.
Havia ainda um outro tipo de tabique, de construção semelhante à dos frontais, constituído por
prumos e travessanhos ou escoras, sobre os quais se pregavam as costaneiras e o fasquiado,
sendo o espaço entre o fasquiado de ambas as faces preenchido por aparas de madeira.
(1) (1)
(2)
(3)
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 8
Pela sua grande divulgação, os tabiques constituem um caso muito importante de paredes
divisórias, que integram e referenciam a construção Pombalina, mas generalizaram-se um
pouco por todo o País. Contudo, devido à escassez e consequente encarecimento de mão-de-
obra especializada, esta solução foi dando lugar sucessivamente a paredes mais simples, como
é o caso das divisórias de alvenaria de tijolo maciço a princípio, que mais tarde deram lugar ao
tijolo furado, mais leve.
Os tabiques com estrutura de madeira requeriam uma fundação adequada (no caso dos pisos
térreos) ou um solho resistente (pavimentos elevados), para suportar o seu peso próprio e as
cargas que pudessem receber. Quando este requisito não podia ser satisfeito, construíam-se os
tabiques suspensos ou aliviados, Figura 4, em simultâneo com a gaiola, e muitas vezes antes do
pavimento. O tabique suspenso designava-se por “enforcado” quando era construído sobre um
grande compartimento que não podia ser dividido.
Figura 4 : Representação esquemática de um tabique suspenso ou aliviado (adaptado de [5])
3.3. Variação da espessura das paredes divisórias com a altura do edifício
De um modo geral, a espessura das paredes era definida em função do número de pisos e dos
vãos dos pavimentos, relacionados com as dimensões das divisões interiores.
Em muitos casos, a espessura das paredes é variável ao longo da altura, diminuindo de baixo
para cima, à medida que as cargas gravíticas se reduzem. No caso das paredes exteriores, esta
redução de espessura é obtida através de ressaltos no paramento interior ao nível dos pisos
(pavimentos), com dimensões médias de 0,10 a 0,12m. Nas paredes divisórias a diminuição de
espessura em altura dá-se normalmente, também, através do sistema de ressaltos ao nível dos
andares, em paramentos alternados.
Quando as paredes limitam a caixa da escada, os ressaltos localizam-se no lado oposto às
escadas, ficando a parede plana nessa zona. As paredes divisórias com chaminés incorporadas
deviam ter pelo menos 0,40 a 0,45m de espessura, podendo, em certos casos, atingir 0,55 a
0,60m. No caso das paredes divisórias de alvenaria de tijolo maciço, quando as divisões eram
pequenas, mantinha-se a mesma espessura em dois ou três pisos consecutivos, tendo nos pisos
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superiores uma espessura de meia vez [9]. A parede menos espessa era obtida com o tijolo de
cutelo ou ao alto como referido.
No que se segue transcrevem-se algumas referências regulamentares relativas à espessura das
paredes dos edifícios, nomeadamente paredes divisórias, que enquadram alguns dos valores
referidos anteriormente. O cimento começou a ser utilizado pelo meio técnico nacional a partir
do primeiro quartel do Século XX; por este motivo, na descrição apresentada, os “blocos de
cimento” surgem como material de construção a considerar.
Assim, a Secção II do Capítulo V, do Regulamento Geral da Construção Urbana para a Cidade
de Lisboa, de 1945 [7], refere:
“Art. 32.º - Nos prédios vulgares destinados a habitação, as espessuras mínimas das paredes e
divisórias, excluindo rebocos e guarnecimentos, serão as seguintes:
4º - Frontais suportando cargas de vigamentos e divisórias das escadas:
a) - Alvenaria de tijolo - Meia vez nos dois últimos andares, uma vez nos quatro andares
seguintes, aumentando nos andares inferiores a estes, meia vez em cada piso.
b) - Blocos de cimento - 0m,10 nos dois últimos andares, 0m,15 nos quatro andares inferiores,
aumentando nos andares inferiores a estes 0m,05 em cada piso.
5º - Tabiques
a) - Alvenaria de tijolo - Meia vez nos quatro últimos andares, aumentando nos andares
inferiores meia vez de dois em dois pisos.
b) - Blocos de cimento - 0m,10 nos quatro últimos andares, aumentando nos andares inferiores
0m,05 de dois em dois pisos.
§1º - O tijolo a que se referem as disposições deste artigo é o tijolo furado tipo normal, com as
dimensões de 0m,23x0m,11x0m,075 (...).
§2º - As divisórias que sejam cortadas transversalmente com roços de grande extensão para a
instalação de encanamentos, não poderão ter espessura inferior a uma vez de tijolo. Esses roços
ou caixas não deverão afetar a divisória em mais do que um terço da sua espessura.
Art. 33.º - Quando o pé direito dos andares for superior a 4m as espessuras exigidas no artigo
anterior poderão ser reforçadas, segundo parecer da 4.ª Repartição, por forma que as paredes e
divisórias satisfaçam às condições de resistência e segurança necessárias.
Art. 34.º - Nos edifícios com habitações distintas, as paredes divisórias entre essas habitações
terão a espessura de uma vez de tijolo, no mínimo, e serão elevadas até à altura da cobertura.
Art. 35.º - Os frontais e os tabiques, tecidos ou construídos com madeira, apenas são
permitidos em divisórias de sótãos, andares recolhidos ou mansardas, ou quando as
circunstâncias não permitam o emprego de material mais resistente e de maior duração.
Art. 36.º - As subdivisões de compartimentos, construídas em madeira só serão permitidas em
estabelecimentos comerciais ou industriais e desde que não seja exigida a impermeabilização
dos seus paramentos. Estas subdivisões não deverão, rem regra, atingir o teto, ficando afastadas
deste 1m, pelo menos.
§ único - Na construção destas divisórias não será permitida a colocação de forro, constituindo
um falso teto, sobre os compartimentos por elas divididos.
O Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) – Decreto-Lei nº 38382, de 7 de
Agosto de 1951 [8], que revogou o referido anteriormente, contém, entre outras, as seguintes
disposições:
“Art. 25.º Para as paredes das edificações correntes destinadas a habitação, quando construídas
de alvenaria de pedra ou tijolo cerâmico maciço de 1ª qualidade, com dimensões de
0,23mx0,11mx0,07m, poderá considerar-se assegurada, sem outra justificação, a sua
resistência, sempre que se adotem as espessuras mínimas fixadas” na Tabela 1.
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 10
Tabela 1 – Espessura das paredes de alvenaria (sem rebocos e guarnecimentos)
(Tabela a que se refere o artigo 25.º do REGEU [8], relativamente aos grupos C, D e E)
Ordem
do andar
(a partir
de cima)
Grupo C 1)
Grupo D 2)
Grupo E 3)
Pedra Tijolo Pedra Tijolo Pedra Tijolo
Talhada
[cm]
Irregular
[cm] [vezes]
Talhada
[cm]
Irregular
[cm] [vezes]
Talhada
[cm]
Irregular
[cm] [vezes]
1 22 -- 1 -- -- 1/2 -- -- 1/2
2 22 -- 1 -- -- 1/2 -- -- 1/2
3 22 -- 1 -- -- 1 -- -- 1/2
4 22 -- 1 -- -- 1 -- -- 1/2
5 28 40 11/2
-- -- 1 -- -- 1
6 28 40 11/2
-- -- 1 -- -- 1
7 32 50 2 28 40 11/2
28 40 11/2
1) Paredes de separação entre habitações, paredes de caixa da escada e paredes interiores carregadas, em
geral 2) Paredes interiores de pequena extensão livre, servindo de apoio a pavimentos de reduzido vão (máximo
de 3m2 de pavimento por metro linear)
3) Paredes interiores não recebendo cargas
4. PRINCIPAIS ANOMALIAS EM PAREDES NA CONSTRUÇÃO TRADICIONAL
Tendo em conta a tecnologia construtiva, os materiais de construção utilizados e a organização
arquitetónica dos espaços, muitas das ações que atuam sobre os edifícios antigos são
suportadas tanto pelas paredes resistentes (exteriores e interiores), como pelas paredes
divisórias sem funções estruturais “à partida”, como referido. Esta situação acarreta um vasto
conjunto de anomalias a que as paredes podem estar sujeitas, como se verá em seguida.
4.1. Anomalias em paredes resistentes (exteriores e interiores)
As paredes resistentes dos edifícios antigos são, naturalmente, fundamentais para a garantia da
sua segurança estrutural. Muitas causas podem concorrer para danificar estes elementos, de
uma forma mais ou menos severa, tendo como limite o colapso das construções, como sucede
na maioria das vezes face às ações sísmicas mais intensas. Não sendo estas paredes, no entanto,
o objeto principal da comunicação, as anomalias e respetivas causas que potencialmente podem
ocorrer são apresentadas de forma sucinta [2, 4, 9].
Assim, em termos estruturais, as principais anomalias nestas paredes são a desagregação,
geralmente resultante, entre outros, da progressão e/ou agravamento de fendilhação anterior,
ação da água (chuva; capilaridade; condensação); o esmagamento, correspondendo a um
fenómeno localizado e pouco frequente, principalmente devido a cargas concentradas
excessivas (apoios de vigas), etc. e a fendilhação, frequente junto a aberturas ou na ligação de
paredes ortogonais, resultante da ação dos sismos (fendas a 45º) e assentamentos diferenciais,
alguns erros de construção, abatimento de arcos de descarga, etc. Outras anomalias prendem-se
com a ação da água e de agentes biológicos (mais grave em paredes resistentes, exteriores, com
elementos de madeira); oxidação de elementos metálicos e degradação geral por ausência de
ações de conservação e manutenção.
4.2. Anomalias em paredes divisórias
As paredes divisórias dos edifícios antigos, embora, em diversos casos, desempenhem funções
estruturais “semelhantes” às paredes exteriores (paredes mestras), tinham à partida como
F.F.S Pinho 11
principal função a compartimentação dos espaços, razão pela qual a sua constituição difere das
paredes resistentes. Deste modo, existe um conjunto de anomalias relacionadas com a sua
“função estrutural”, relativas à importante função de travamento geral da estrutura por um lado
e, por outro, às modificações do equilíbrio estrutural verificadas ao longo da vida do edifício.
As anomalias registadas estão também relacionadas com as características construtivas e
funcionais.
Como também se referiu anteriormente, os assentamentos diferenciais das fundações e a ação
dos sismos, causadoras de fendilhação nas paredes resistentes, juntamente com a grande
deformação dos pavimentos de madeira, são fatores que podem obrigar à mobilização da
capacidade resistentes destas paredes “secundárias”, muito para além do previsto inicialmente.
De facto, o acréscimo das cargas em paredes que apresentam grandes limitações de resistência
a esforços de compressão, conduz a um conjunto de anomalias próprias de paredes estruturais
esbeltas e deformáveis, como por exemplo os abaulamentos, associados à instabilidade por
encurvadura, comuns em tabiques de madeira, e esmagamentos fáceis de detetar pela
ocorrência de fendas características da compressão excessiva [2]. Estas anomalias podem ainda
acontecer após algumas intervenções menos cuidadas nos edifícios, como aquelas em que se
carregam paredes divisórias com lajes de betão armado.
Pior ainda, é quando estas paredes apresentam descontinuidades ao longo da altura do edifício,
resultantes de demolições de paredes em diversos pisos, por vezes de forma alternada, para
ampliação/interligação de divisões ou compartimentos – uma parede é demolida no piso
inferior mas a parede no piso superior, na mesma prumada, mantém-se – “substituindo-as” por
vigas metálicas, muitas vezes com apoios “fictícios”. Nestes casos, o carregamento contínuo,
desde os pisos superiores até ao mais baixo, impõe grandes sobrecargas ao pavimento
subjacente (abaixo do qual foi removida a parede) que, ao deformar-se, provoca uma situação
patológica em cadeia [2], comprometendo de forma irreversível, e perigosa, a capacidade de
atenuação dos efeitos da ação sísmica, nomeadamente em edifícios de vários pisos.
Um tipo particular de anomalias estruturais que podem ocorrer nestas paredes “não-resistentes
à partida” é a fendilhação devida a movimentos diferenciais de origem térmica da envolvente
face às paredes interiores ou resultantes do assentamento de fundações, ações dinâmicas a que
o conjunto do edifício ou os seus vários elementos constituintes possam ser submetidos ou pela
atuação de cargas concentradas ou de valor muito desequilibrado.
Anomalias também comuns têm a ver com o seu desajustamento em relação a determinadas
exigências funcionais, que pode resultar da deterioração das características da própria parede,
ou dever-se à evolução dos níveis de algumas daquelas exigências, como por exemplo: o
isolamento térmico, pouco eficiente na maioria das situações; o isolamento acústico,
principalmente a ruídos de condução aérea, fortemente prejudicado pela sua leveza; e a
resistência ao fogo, muito reduzida no caso da utilização de peças de madeira de pequena
espessura, dado tratar-se de um material combustível.
Outras anomalias têm a ver com o envelhecimento dos materiais constituintes e com os efeitos
da presença da água, apesar de pouco habituais, dada a localização privilegiada destas paredes
(no interior do edifício), excetuando-se as zonas de ligação com as paredes exteriores e zonas
que delimitam áreas húmidas dos compartimentos ou atravessadas por tubagens de águas e
esgotos. As paredes de compartimentação tornam-se muito sensíveis à presença da água,
porque as reduzidas secções dos elementos que as constituem contribui para acelerar o
processo de degradação.
Na Tabela 2 resumem-se as principais anomalias que podem ocorrer em paredes divisórias de
edifícios antigos, bem como as respetivas causas e características.
Diretamente relacionadas com as anomalias das paredes estão as anomalias que ocorrem nos
revestimentos e acabamentos. Nas Tabelas 3 e 4 resumem-se as principais anomalias ocorridas
em revestimentos e acabamentos de paredes de edifícios antigos, respetivamente, bem como as
suas respetivas causas e características.
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 12
Tabela 2 – Principais anomalias em paredes divisórias de edifícios antigos [2, 4, 9]
Anomalia Causas/características
Relacionadas com
funções estruturais
- modificações das condições de equilíbrio estrutural
- ação de sismos
Abaulamentos e
esmagamentos
- acréscimo de cargas
- assentamentos diferenciais;
- redistribuição de cargas e/ou ocorrência de fendilhações nas
paredes resistentes
- apoio de lajes de betão armado
Fendilhação
- movimentos diferenciais (relativos) da estrutura
- assentamentos diferenciais das fundações; ação sísmica
- retração dos panos de parede
- flexão excessiva dos pavimentos
Acção da água - encontro com paredes resistentes exteriores
- anomalias em redes de águas e esgotos
Desajustamento face a
determinadas
exigências funcionais
- deterioração das características das paredes
- evolução dos níveis de exigências [isolamento térmico e
acústico, resistência ao fogo (madeira)]
Envelhecimento dos
materiais
- ausência de conservação e manutenção
- agravamento generalizado das restantes anomalias
Tabela 3 – Principais anomalias em revestimentos de paredes de edifícios antigos [2, 4, 9]
Anomalia Causas/ características
Desagregação
- a presença de humidade facilita a deposição e cristalização de sais
- a cristalização dos sais provoca o entumecimento dos rebocos
originando a sua fendilhação e a desagregação da parede
- comum nas situações de rebocos fracos (à base de cal e areia), com
baixa resistência mecânica e/ou nos casos de pinturas pouco
permeáveis ao vapor de água
Esmagamento
- esmagamento dos rebocos (devido ao esmagamento das paredes)
- fraca resistência mecânica do reboco (argamassas de cal)
- desprendimento de azulejos, também devidos a:
a) retração da argamassa, provocando tensões tangenciais, capazes
de partir os azulejos (se forem mais fortes que a ligação)
b) os desprendimentos podem ainda resultar de movimentos
diferenciais em paredes com argamassas de módulos de
elasticidade superior ao dos azulejos
- diminuição da aderência entre a argamassa e as paredes com
elementos de madeira
- empolamento devido a corrosão em elementos metálicos
Fendilhação
- retração das argamassas (rebocos fortes, de cimento)
- fendilhação do suporte (em paredes rebocadas)
- as paredes antigas, quando rebocadas com argamassas fortes
(elevados
teores de cimento) levam à formação de eflorescências, com a
consequente desagregação da parede (elemento mais fraco)
Agentes
climáticos
- ação abrasiva do vento (poeiras e areias)
- variações de temperatura
- ação da humidade
F.F.S Pinho 13
Tabela 4 – Principais anomalias em acabamentos de paredes de edifícios antigos [2, 4, 9]
Anomalia Causas e características
Deterioração da caiação pelo efeito
da água da chuva, em paredes
exteriores
- ausência de produtos fixantes
- falta de repetição da caiação 1 ou 2 vezes por ano
- existência de sais solúveis na cal
- fraca resistência ao desgaste
Alteração do aspeto das pinturas
- sujidade acumulada nas superfícies (poeiras
transportadas pelo vento, poluição industrial e
atmosférica, ...)
- ação dos raios solares (ultra-violetas)
5. CONCLUSÕES
Na presente comunicação referiram-se diversos aspetos construtivos e funcionais das paredes
divisórias, no contexto da construção tradicional, ou seja nos edifícios antigos em geral –
considerando como tal os edifícios construídos até ao primeiro quartel do Século XX.
Como conclusões finais, salienta-se as solicitações/contributos, crescentes com a idade dos
edifícios, que estas paredes têm, na resistência às ações gravíticas resultantes entre outros
aspetos, dos fenómenos de fluência das vigas de madeira que suportam os pavimentos e de
sobrecargas superiores às inicialmente previstas (normalmente associadas a alterações
funcionais de compartimentos ou dos próprios edifícios). Isto, mesmo nos casos em que em
que, à partida, as paredes tinham apenas como função compartimentar os espaços entre paredes
resistentes exteriores e interiores – refletindo-se tal situação nas reduzidas espessuras destes
elementos, como sucede com os tabiques, muitas vezes insuficientes para tais solicitações,
resultando daí diversas anomalias estruturais. Por outro lado, as paredes divisórias, mesmo a
mais esbeltas, têm uma influência decisiva na dissipação da energia sísmica, desde exista uma
boa interligação entre paredes, pavimentos, escadas e coberturas, como acontece em muitos
casos.
Do ponto de vista construtivo, o princípio geral corresponde ao predomínio dos tabiques como
paredes divisórias, registando-se depois outras soluções como os adobes e o tijolo, algumas
vezes com incorporação de elementos de reforço (prumos de madeira ou metálicos), em função
da distribuição geográfica dos edifícios e da disponibilidade de materiais no local.
6. REFERÊNCIAS
[1] Instituto Nacional de Estatística (INE) – “Recenseamento Geral da População e da
Habitação: Censos 2001”. Lisboa, 2003.
[2] Appleton, João – “Edifícios Antigos - Contribuição para o estudo do seu
comportamento e das ações de reabilitação a empreender”. Programa de investigação
apresentado a concurso para provimento na categoria de investigador-coordenador.
Lisboa, LNEC, 1991.
[3] Appleton, João – “Reabilitação de Edifícios Antigos – Patologias e Tecnologias de
Intervenção”. Edições Orion. Lisboa, Setembro de 2003.
[4] Pinho, F. – “Paredes de Edifícios Antigos em Portugal”. Coleção Edifícios. Nº 8. LNEC,
Lisboa. 2ª Edição, 2008.
[5] Leitão, L. A. – “Curso Elementar de Construções”. Lisboa, Escola Central da Arma de
Engenharia. Estado Maior do Exército, 1896.
[6] Farinha, J. – “Cadernos do Metropolitano - Caderno Nº 6”. Metropolitano de Lisboa,
Lisboa, Novembro de 1997.
Aspetos construtivos e funcionais das paredes divisórias na construção tradicional 14
[7] Câmara Municipal de Lisboa (CML) – “Regulamento Geral da Construção Urbana para
a Cidade de Lisboa”. 6ª Edição, Lisboa, CML, Direcção dos Serviços de Urbanização e
Obras, 1945.
[8] /P/ - Leis, decretos, etc. - Decreto-Lei nº 38382, de 7 de Agosto de 1951 - Regulamento
Geral das Edificações Urbanas (RGEU).
[9] Pontes, J.; Manso, A. – “Anomalias mais Frequentes em Edifícios Antigos em Lisboa”.
2º Encontro Sobre Conservação e Reabilitação de Edifícios, LNEC, Lisboa, 1994.