Ass is Andrade Tan Ure 2010

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1 Homogeneização do Executivo Brasileiro: O Isomorfismo do Indivíduo nas Maiores Empresas Brasileiras Autoria: Lilian Bambirra de Assis, Juliana Oliveira Andrade, Antônio Carvalho Neto, Betânia Tanure Resumo Por meio deste trabalho, buscou-se retratar aspectos do isomorfismo do executivo, aqui entendido como uma convergência progressiva dos indivíduos a uma tendência, por meio da imitação, buscando a legitimação, nas principais empresas brasileiras. Apesar do discurso de que as pessoas são um grande diferencial competitivo e que a diversidade de perfis profissionais deve ser promovida nas empresas, o que se percebeu na pesquisa foi um perfil homogêneo dentre os ocupantes do mais alto escalão das grandes empresas brasileiras. Para tanto, foram visitados os conceitos teóricos do Institucionalismo. DiMaggio e Powell (1983) afirmam que as organizações tendem a utilizar linhas de ação já definidas na sociedade, que lhes permitam garantir sua sobrevivência e legitimidade, independente de sua eficiência, orientando-se pelo contexto, as regras e significados já institucionalizados nas estruturas. Compreende-se que a pesquisa retratada neste artigo é um complemento importante para os estudos organizacionais, ao possibilitar uma análise do isomorfismo a partir das pessoas no grupo e não das organizações, foco maior dos estudos realizados até então. Nesse sentido, a principal contribuição do trabalho foi iniciar a discussão sobre o isomorfismo de indivíduos, de classes, nesse caso dos executivos. Desta forma, verificou-se como o executivo legitima e perpetua as relações construídas socialmente, que acabam por pactuar com as desigualdades de gênero e de poder.A identificação desse isomorfismo foi realizada por meio da análise quantitativa em uma amostra de 965 executivos homens e mulheres, em relação ao tipo de personalidade recorrente A ou B, à idade, ao estado civil e ao número de filhos. A análise qualitativa, realizada com a utilização de elementos da Análise do Discurso contidos em entrevistas e grupos de foco realizados com 263 executivos, permitiu levantar os seguintes temas: ‘lazer’, ‘vida pessoal’, e ‘ambiente organizacional, todos relacionados às representações sociais do executivo. Em um contexto onde o discurso de valorização do indivíduo aparece, sendo comum ouvir frases que reverenciam as pessoas como sendo o grande diferencial das organizações, colocou-se em dúvida como essas pessoas podem apresentar esse diferencial, sendo isomórficas em tantos aspectos. Os discursos da alta administração foram apreendidos como definidores da realidade organizacional dos seus membros, por meio da manipulação e o uso de símbolos, metáforas e imagens, para criar significações e identidade homogêneas na organização. Verificou-se que, apesar do discurso que apregoa a diferenciação das pessoas como forma de inovação e obtenção de vantagem competitiva, o executivo brasileiro é bastante isomórfico em todos os níveis analisados.

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    Homogeneizao do Executivo Brasileiro: O Isomorfismo do Indivduo nas Maiores Empresas Brasileiras

    Autoria: Lilian Bambirra de Assis, Juliana Oliveira Andrade, Antnio Carvalho Neto, Betnia Tanure

    Resumo Por meio deste trabalho, buscou-se retratar aspectos do isomorfismo do executivo, aqui entendido como uma convergncia progressiva dos indivduos a uma tendncia, por meio da imitao, buscando a legitimao, nas principais empresas brasileiras. Apesar do discurso de que as pessoas so um grande diferencial competitivo e que a diversidade de perfis profissionais deve ser promovida nas empresas, o que se percebeu na pesquisa foi um perfil homogneo dentre os ocupantes do mais alto escalo das grandes empresas brasileiras. Para tanto, foram visitados os conceitos tericos do Institucionalismo. DiMaggio e Powell (1983) afirmam que as organizaes tendem a utilizar linhas de ao j definidas na sociedade, que lhes permitam garantir sua sobrevivncia e legitimidade, independente de sua eficincia, orientando-se pelo contexto, as regras e significados j institucionalizados nas estruturas. Compreende-se que a pesquisa retratada neste artigo um complemento importante para os estudos organizacionais, ao possibilitar uma anlise do isomorfismo a partir das pessoas no grupo e no das organizaes, foco maior dos estudos realizados at ento. Nesse sentido, a principal contribuio do trabalho foi iniciar a discusso sobre o isomorfismo de indivduos, de classes, nesse caso dos executivos. Desta forma, verificou-se como o executivo legitima e perpetua as relaes construdas socialmente, que acabam por pactuar com as desigualdades de gnero e de poder.A identificao desse isomorfismo foi realizada por meio da anlise quantitativa em uma amostra de 965 executivos homens e mulheres, em relao ao tipo de personalidade recorrente A ou B, idade, ao estado civil e ao nmero de filhos. A anlise qualitativa, realizada com a utilizao de elementos da Anlise do Discurso contidos em entrevistas e grupos de foco realizados com 263 executivos, permitiu levantar os seguintes temas: lazer, vida pessoal, e ambiente organizacional, todos relacionados s representaes sociais do executivo. Em um contexto onde o discurso de valorizao do indivduo aparece, sendo comum ouvir frases que reverenciam as pessoas como sendo o grande diferencial das organizaes, colocou-se em dvida como essas pessoas podem apresentar esse diferencial, sendo isomrficas em tantos aspectos. Os discursos da alta administrao foram apreendidos como definidores da realidade organizacional dos seus membros, por meio da manipulao e o uso de smbolos, metforas e imagens, para criar significaes e identidade homogneas na organizao. Verificou-se que, apesar do discurso que apregoa a diferenciao das pessoas como forma de inovao e obteno de vantagem competitiva, o executivo brasileiro bastante isomrfico em todos os nveis analisados.

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    1 Introduo O objetivo deste artigo avaliar se h homogeneizao entre os altos executivos brasileiros e, caso afirmativo, como ela se manifesta. Visitando-se os conceitos tericos do institucionalismo, buscou-se observar se h categorias isomrficas tanto em relao s caractersticas pessoais quanto em relao ao discurso e aos hbitos sociais do executivo brasileiro que atingiu o primeiro, segundo e terceiro escales das grandes empresas. A Administrao vem recorrendo a outras reas do conhecimento para integrar os estudos organizacionais, que tm se mostrado cada vez mais complexos e diversificados. Neste sentido, o institucionalismo tem contribudo especialmente para o entendimento do isomorfismo, o que possibilita uma reflexo e (re)leitura do ambiente organizacional. Mas, ainda que este tema seja relevante, no se tm estudos sobre o isomorfismo de competncias entre as pessoas, mais especificamente do executivo brasileiro. Apesar do discurso de valorizao do indivduo, como uma das fontes de vantagem competitiva para as empresas, ser que de fato esses executivos representam diferenciais ou ser que so isomrficos e, assim sendo, mais substituveis nas organizaes? DiMaggio e Powell (1983) afirmam que as organizaes tendem a utilizar linhas de ao j definidas na sociedade, que lhes permitam garantir sua sobrevivncia e legitimidade, independente de sua eficincia, orientando-se pelo contexto, as regras e significados j institucionalizados nas estruturas. Nesse contexto, o isomorfismo pode ser entendido como uma convergncia progressiva das organizaes a uma tendncia, por meio da imitao, buscando a legitimao. Ele pode ser Mimtico, quando uma organizao adota procedimentos e arranjos j implementados por outras de seu ambiente especfico; Normativo, quando se tem uma demarcao de condies, mtodos e prticas comuns ao exerccio de uma ocupao, definidas por meio de um compartilhamento de normas e conhecimentos com outros indivduos, gerando uma similaridade entre diferentes organizaes e Coercitivo, que ocorre por meio de aes impostas pelo Estado ou por crenas simplesmente impostas pelo esquema interpretativo operante no ambiente. Mas, ser que tambm os indivduos, no caso os executivos, tendem a ser isomrficos? Para possibilitar a investigao sobre o isomorfismo dos executivos nas organizaes, foram analisados os dados coletados em uma pesquisa realizada entre fevereiro de 2005 e maro de 2006, com executivos homens e mulheres. Para a concretizao dessa pesquisa realizada em 344 grandes empresas brasileiras, participaram da etapa quantitativa 965 executivos (as) que responderam a um questionrio e 263 executivos (as), entre entrevistas individuais e participao em grupos de foco. Na anlise dos dados quantitativos foram observados os seguintes tpicos, analisados em alguns casos separadamente por gnero, e em outros, no geral: Teoria de personalidade (Tipo A e Tipo B), Cargo ocupado, Idade, Estado Civil e Quantidade de Filhos. J para a anlise dos dados qualitativos foram observados os seguintes tpicos, devidamente descritos no referencial terico que se segue: Isomorfismo Coercitivo, Isomorfismo Mimtico e Isomorfismo Normativo. A anlise dos elementos dos isomorfismos acima utilizada foi a Anlise do Discurso, sendo identificados seus elementos, como os temas recorrentes nos discursos e a utilizao de trs

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    estratgias de persuaso descritas por Faria e Linhares (1993): seleo lexical, construo das personagens e relao entre explcitos e implcitos. A partir das estratgias de persuaso, foram categorizados os principais temas: Lazer, Vida Pessoal e Ambiente Organizacional, cujas exemplificaes foram feitas, na anlise dos dados, por meio de fragmentos das entrevistas. O texto est dividido em seis partes: A primeira foi a contextualizao do tema e problema de pesquisa. No prximo tpico, ser apresentado o referencial terico que norteou todo o trabalho. Em seguida, a estratgia metodolgica percorrida explicada. Nos dois captulos seguintes tm-se as anlises quantitativa, intitulada O Executivo Isomrfico: anlise quantitativa; e a qualitativa, denominada Caracterizao qualitativa do Executivo: O discurso Isomrfico. Termina-se o artigo com as consideraes finais e referncias bibliogrficas. 2 Referencial Terico Apesar de o termo instituio ser muito empregado na sociologia e nos estudos organizacionais, trata-se de um conceito muito controverso. Um dos primeiros autores a utilizar essa nomenclatura foi Everett Hughes, que buscou na antropologia sua definio. Para ele, instituio um empreendimento social implementado de maneira esperada e permanente. Esperada porque os seres humanos se comportam em resposta ao comportamento dos outros e permanente porque decorrem do fato de que as instituies satisfazem necessidades humanas (culturalmente definidas). Os primeiros estudos organizacionais adotam o conceito de instituio de um modo prescritivo, preocupados com as formas de uma organizao tornar-se uma instituio. Ou seja, como ganhar legitimidade perante a sociedade e tornar-se permanente, sobrevivendo ao ambiente, incluindo o de negcios. Desenvolve-se a a corrente de desenvolvimento institucional (PECI, 2005). Peci (2005) cita Selznick (1957), como sendo o precursor da abordagem institucional ao interpretar as organizaes como expresso estrutural da ao racional que ao longo do tempo, so sujeitas s presses do ambiente social e transformam-se em sistemas orgnicos, passando por um processo de institucionalizao atravs do qual os valores substituem os fatores tcnicos na determinao das tarefas organizativas. Segundo Selznick (1957), as organizaes so descartveis, podendo ser vendidas ou extintas, enquanto as instituies so valiosas e indispensveis. a partir desse entendimento que o autor define institucionalizao como sendo o processo pelo qual uma organizao torna-se uma instituio. Esse processo ocorre ao longo do tempo, quando uma organizao infundida com valores que vo alm dos requisitos bsicos necessrios a realizao das tarefas. Nesse sentido, uma importante tcnica de infuso de sentido seria a elaborao de mitos socialmente integradores. Isso significa que a institucionalizao um processo de formao do carter organizacional, sendo este entendido como a maneira repetitiva de resposta a presses externas e internas. Outro aspecto importante de ser enfatizado que a medida que a organizao ganha uma certa estabilidade, ela perde flexibilidade, devido aos hbitos que surgiram, tornando mudanas cada vez mais difceis (SELZNICK, 1957). Ainda para esse autor, os lderes assumem um papel essencial na institucionalizao, uma vez que so eles os responsveis pela definio da misso, organizao dos conflitos internos e defesa da integridade institucional, sendo esta entendida como a persistncia dos valores e papel de uma organizao.

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    Assim, a teoria institucional (DiMaggio e Powell, 1983; Meyer e Zucker, 1989; Scott, 1987; Selznick, 1957; Stinchcombe, 1965) discute os processos de institucionalizao que produzem estabilidade e permanncia, contribuindo positivamente, para a longevidade organizacional das burocracias weberianas. No longo prazo, no entanto, reconhece a teoria, que tais processos acabam produzindo rigidez e resistncia mudana, o que afetaria negativamente a sustentao da vantagem competitiva. Apesar das similaridades de conceito, preciso destacar que, segundo Scott (1987), a teoria institucional multifacetada. Apesar das diferentes perspectivas tratarem de instituies e seus processos de institucionalizao, os aspectos enfatizados variam. Um exemplo de tal pluralidade a notria diviso de duas importantes correntes: o velho e o novo institucionalismo. Enquanto o primeiro enfatiza processos tais como infuso de valores pelos lderes (Selznick, 1957) e o trabalho de pessoas que foram os indivduos e as prprias organizaes a se adaptar s circunstncias externas instituio, Stinchcombe (1965), representante do novo institucionalismo, investiga os aspectos da agncia humana nos processos de institucionalizao. Ao sintetizar a teoria institucional, Zucker (1987) afirma que tanto o velho (VI) como o novo institucionalismo (NI) propem uma noo ambgua: ao mesmo tempo em que os processos de institucionalizao aumentam as chances de sobrevivncia, eles reduzem a eficincia. No VI isso ocorre devido rigidez e resistncia mudana enquanto no NI, os campos institucionalizados produzem isomorfismo e conformidade s regras e prticas institucionalizadas. Entretanto, Machado-da-Silva, Fonseca e Crubellate (2005) questionam a viso dicotmica entre velho e novo institucionalismo. Para eles a institucionalizao um processo recorrente, onde agncia (VI), estrutura (NI) e interpretao so elementos fundamentais do processo, exercendo influncia recproca. Cochia e Machado-da-Silva (2003) afirmam que se, por um lado, as presses ambientais geram tendncias para homogeneizao das formas e das prticas organizacionais, por outro, a atuao dos mecanismos isomrficos no elimina o sistema de interpretao cognitiva do contexto ambiental, pois por meio dessa interpretao que a organizao se estrutura e define suas estratgias de ao, cujo objetivo atender aos seus interesses. Sobre os mecanismos isomrficos, Zucker (1987) afirma que as presses institucionais externas e internas levam as organizaes a terem comportamentos similares, sendo este o fator que leva ao isomorfismo, entendido como a similaridade de forma e estrutura com o ambiente institucional. Sobre esse tema, Machado-da-Silva e Fonseca (1993) argumentam que a teoria institucional indica que a sobrevivncia das organizaes depende da capacidade de atendimento a orientaes coletivamente compartilhadas. Diante do exposto, entende-se isomorfismo como uma convergncia progressiva das organizaes a uma tendncia, por meio da imitao, buscando a legitimao. Esse conceito foi usado pela primeira vez por Meyer e Rowan (1977), indicando que ele proporciona organizao uma cobertura por meio da qual ela ganha proteo contra possveis condutas reprovveis. assim, pois, que a legitimao da organizao ocorre, ou seja, por meio de uma proteo isomrfica.

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    nesse sentido que DiMaggio e Powell (1983) afirmam que as organizaes tendem a utilizar linhas de ao j definidas na sociedade, que lhes permitam garantir sua sobrevivncia e legitimidade, independente de sua eficincia, orientando-se pelo contexto, as regras e significados j institucionalizados nas estruturas. , pois, diante da incerteza ambiental, que a competio entre as organizaes volta-se no apenas para recursos e consumidores, mas tambm para a legitimidade institucional, tornando suas prticas cada vez mais homogneas dentro de um ambiente. A gesto das organizaes busca ento, adaptar suas estruturas e procedimentos s expectativas do contexto, por meio dos mecanismos de isomorfismo. DiMaggio e Powell (1983) definem trs mecanismos por meio dos quais ocorre a mudana isomrfica: 1. Isomorfismo Mimtico Ocorre quando a incerteza permeia o ambiente ou quando os objetivos organizacionais no esto bem claros. Neste caso, a organizao tende a se modelar em outra para se manter legitimada. Ou seja, seguir o lder, parece ser a estratgia que a organizao adota. Assim, fundamenta-se na adoo, por uma determinada organizao, de procedimentos e arranjos j implementados por outras de seu ambiente especfico. 2. Isomorfismo Normativo Acontece quando se tem uma demarcao de condies, mtodos e prticas comuns ao exerccio de uma ocupao, definidas por meio de um compartilhamento de normas e conhecimentos com outros indivduos, gerando uma similaridade entre diferentes organizaes. Neste caso, quanto mais similares forem as atividades entre as organizaes em um mesmo ambiente e maior for a interao entre profissionais da mesma atividade, mais isomorfismo normativo se ter. Uma forma freqente desse isomorfismo a profissionalizao, sendo o sistema de ensino, em especial as universidades, veculos privilegiados que estabelecem o conjunto de normas, regulamentos e prticas comuns a uma determinada profisso. 3. Isomorfismo Coercitivo Ocorre por meio de aes impostas pelo Estado ou por crenas simplesmente impostas pelo esquema interpretativo operante no ambiente; Resulta de presses formais e/ou informais exercidas por uma organizao sobre outra em condio de dependncia. Implica a adoo forada de formas por meio das quais os processos da organizao consolidam sua legitimidade institucional no ambiente. Um exemplo claro quando a subsidiria obrigada a adotar medidas que sejam adequadas s polticas da matriz. Apesar das crticas que o isomorfismo e sua legitimidade recebem (DEEPHOUSE, 1996), Machado-da-Silva et al. (2000) os defendem, afirmando que uma organizao, ao atuar sob normas compartilhadas em um campo, pode conseguir reconhecimento externo e, assim, assegurar o seu desenvolvimento, criando melhores oportunidades de expanso. Essa afirmativa mostra a necessidade de uma organizao se submeter s regras de um determinado campo, de forma que no haja afastamento da realidade institucional, assegurando, assim, seu papel legtimo. nesse sentido que Tolbert e Zucker (1998) advogam que a sobrevivncia das organizaes em um campo pode estar mais ligada observao das estruturas formais legitimadas do que aos seus resultados ou desempenho em si. Como conseqncia, Carvalho et al. (2004) afirmam que acaba assumindo a reproduo o lugar da transformao e isso tem ocorrido, como mostra a pesquisa, em termos do perfil do executivo que ocupa o mais alto escalo das empresas brasileiras, conforme ser abordado a seguir.

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    Em relao a esse perfil, na anlise quantitativa foi utilizada a teoria de personalidade do Tipo A e Tipo B. As pesquisas sobre essa classificao remetem aos estudos desenvolvidos pelos mdicos cardiologistas Friedman e Rosenman (1974) que, em um livro publicado sobre o assunto, partiram do pressuposto de que o comportamento humano reflete fatores que podem desencadear doenas cardiovasculares. Neste sentido, os pesquisadores descreveram os dois tipos de comportamento: mais (tipo A) ou menos (tipo B) propensos este tipo de doena. O tipo A aquele tpico indivduo que chega diante do elevador e o chama umas 5 vezes no intervalo de 5 segundos. Estando preso no trnsito com um compromisso agendado ele liga diversas vezes do celular, buzina, tenta cortar caminho... J o tipo B, na mesma situao, telefona para o trabalho avisando que est preso no trnsito, liga o rdio, uma msica e relaxa... Mathews (1982) enfatiza trs componentes do comportamento do padro A: luta competitiva, um senso de urgncia e impacincia e agressividade-hostilidade. Segundo o autor, tem sido observado que, o padro de comportamento do tipo A faz mais esforos para controlar uma situao do que o padro do tipo B, que por sua vez, compete tambm, mas com serenidade. Mais um ponto que merece ser destacado que, ainda segundo Mathews (1982), altos nveis de comportamento tipo A so inversamente proporcionais ao nvel de empatia, sugerindo que a competitividade, a impacincia e os sentimentos hostis a ele relacionados, podem desviar o indivduo da preocupao com o bem-estar dos outros. Esse dado serve de alerta aos executivos tipo A. Para analisar os dados a partir do referencial estudado, foi adotada a estratgia metodolgica descrita a seguir. 3 Estratgia Metodolgica Para possibilitar a investigao sobre as prticas de isomorfismo dos executivos nas empresas brasileiras, foram analisados os dados coletados em uma pesquisa realizada, entre fevereiro de 2005 e maro de 2006, com executivos homens e mulheres. No caso especfico deste artigo, a anlise mista, qualitativa e quantitativa. de carter descritivo, porquanto, segundo Bailey (1982), os estudos descritivos objetivam expor um fenmeno em detalhe, especialmente o que est ocorrendo. A amostra para selecionar as 344 grandes empresas participantes da parte quantitativa foi definida de forma aleatria, utilizando-se a base das 500 Maiores e Melhores empresas de 2005 relacionadas no anurio da Revista Exame. A Tabela 1 ilustra a distribuio dos 965 executivos (as) respondentes das 344 empresas, homens e mulheres, por setor de atividade.

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    Tabela 1 Representao das empresas da amostra quantitativa por setor de atividade

    Porcentagem de respondentes

    Nmero de respondentes

    Indstria 47,5 458 Telecomunicaes 17,5 169 Servios 13,1 117 Banco/ Servios Financeiros 12,1 126 Servios Pblicos 7,8 75 Comrcio 2,1 20 Total 100,0 965

    Fonte: Dados da Pesquisa O mtodo utilizado para a coleta dos dados quantitativos foi um questionrio fechado, aplicado em 965 homens e mulheres executivos (as), entre presidentes, vice-presidentes, diretores (as) e executivos (as) de terceiro nvel (imediatamente abaixo de presidentes, vice-presidentes e diretores). Dado o nmero de variveis e o tamanho significativo da amostra quantitativa, foram utilizadas as seguintes ferramentas estatsticas para proceder ao tratamento dos dados: a) Teste Qui-Quadrado; b) Coeficiente de Kendall; c) Anova; d) Anlise de Regresso Linear e e) Anlise Fatorial. Para a coleta dos dados qualitativos foram entrevistados, por meio de roteiros semi-estruturados, 263 executivos de 10 grandes empresas nas mesmas posies hierrquicas descritas acima, sendo 96 individualmente e 167 por grupos de foco. Os setores de atividade destas 10 empresas foram: indstria (de alimentos, automotiva e petroqumica), telecomunicaes (equipamentos e prestadora de servios de telefonia), bancos e outros servios. Para a anlise dos dados quantitativos foram observados os seguintes tpicos, analisados em alguns casos separadamente por gnero e, em outros, no geral: a) Teoria de personalidade: Tipo A e Tipo B (em que tipo os respondentes disseram se encaixar) b) Cargo ocupado c) Idade d) Relao afetiva considerada estvel e) Quantidade de Filhos Para a anlise dos dados qualitativos foram observados os tpicos listados abaixo, j apresentados e devidamente descritos no referencial bibliogrfico: a) Isomorfismo Coercitivo b) Isomorfismo Mimtico c) Isomorfismo Normativo

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    A tcnica qualitativa utilizada para a anlise dos elementos dos isomorfismos acima foi a Anlise do Discurso que, segundo Maingueneau (2000, p.13-14):

    [...] visa a articular sua enunciao sobre um certo lugar social. Ela est, portanto, em relao com os gneros de discurso trabalhados nos setores do espao social (um caf, uma escola, uma loja...) ou nos campos discursivos (poltico, cientifico...).

    Para se realizar essa anlise, foram identificados seus elementos, como os temas recorrentes nos discursos e a utilizao de trs estratgias de persuaso descritas por Faria e Linhares (1993): a. Seleo lexical: a escolha do vocabulrio usado no discurso no deve ser percebida como aleatria, pois relevante recurso argumentativo, delimitando a perspectiva adotada pelo narrador. b.Construo das personagens: as personagens no so criadas casualmente; encenam conflitos e do legitimidade e credibilidade s narrativas. c. Relao entre explcitos e implcitos: os implcitos no constituem o objeto ntido da enunciao, j que, por algum motivo, o narrador no desejou ou no pde explicit-los, mas aparecem a partir dos contedos explcitos. Com a estratgia metodolgica adotada, foram observados os seguintes temas: Lazer, Vida Pessoal e Ambiente Organizacional, cujas exemplificaes foram feitas, na anlise dos dados, por meio de fragmentos das entrevistas. 4 O Executivo Isomrfico: anlise quantitativa O primeiro dado analisado refere-se ao tipo de comportamento identificado no executivo: tipo A ou tipo B. Os dados de pesquisa mostraram que 62,9% dos entrevistados so do tipo A. O tipo B representou 37,1 % dos executivos pesquisados. Os dados parecem indicar que pessoas com a personalidade tipo A tem uma maior chance de se tornarem altos executivos. O interessante que alguns elementos identificados no discurso isomrfico dos entrevistados (esses dados so apresentados no prximo item) so compatveis com as principais caractersticas do tipo A. Quanto ao cargo ocupado, conforme pode ser observado no Grfico 1, as mulheres so minoria, ou seja, a maioria dos executivos masculina, representando 77% do total de entrevistados.

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    Grfico 1. Distribuio do cargo por sexo Fonte: Dados de pesquisa curioso observar que o percentual de mulheres executivas, que j bem menor que o de homens, torna-se comparativamente cada vez menor, quanto maior o cargo ocupado. Ou seja, o sexo feminino, que ocupa 25,1% dos cargos de gerncia, reduzido para apenas 5,6% na presidncia. Tabela 2 Distribuio do cargo e gnero por idade CARGO GNERO

    Presidncia Vice-presidncia/

    Diretoria Gerncia Feminino Masculino

    At 30 anos 2,8% 0,9% 8% 10,9% 4,7% 31 a 40 anos 22,2% 43% 47% 55,2% 42,1% 41 a 50 anos 52,8% 46,6% 37,2% 30,8% 42,7% Acima de 51 anos 22,2% 9,5% 7,8% 3,2% 10,4%

    Total 100% 100% 100% 100% 100% Fonte: Dados de pesquisa Ao analisar o dado da Tabela 2 e compar-lo com a distribuio do cargo por idade, percebe-se que h um percentual maior de mulheres (66,1% das mulheres contra 46,8% dos homens) com idade at 40 anos e que justamente at essa faixa etria que esto 55% dos gerentes de terceiro escalo. Ou seja, o percentual de mulheres maior entre os cargos de gerncia, pois h uma concentrao de mulheres executivas nessa faixa etria. Mas, a aparece outro questionamento: por que a medida em que a idade aumenta, o nmero de mulheres diminui? Talvez devido a questes pessoais que aparecem em seu caminho, tais como filhos, como afirmam Betiol e Tonelli (1991) e Chinchilla e Len (2005), poucas mulheres chegam ao topo da hierarquia empresarial, encontrando muitos obstculos neste caminho. Tanure, Carvalho Neto e Andrade (2006) coadunam com a idia de que uma das explicaes para a menor mobilidade da mulher pode ser explicada devido ao compromisso maior com a criao dos filhos, especialmente quanto educao destes. O fator da diferena de gerao tambm pode explicar: as mulheres que chegaram diretoria so mais velhas que as do terceiro escalo, so

    5,6%

    94,4%

    81% 74,9%

    19% 25,1%

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    de uma geraao em que a mulher ainda no estava to atuante no mercado de trabalho brasileiro.

    Cabe aqui uma ressalva: no parecem ser apenas os aspectos pessoais que impem obstculos s mulheres. Uma outra razo so os determinantes estruturais, apontados por Chnevert e Tremblay (2002), que lembram, por exemplo, da existncia de alguns trabalhos que so referidos como masculinos, onde a presena feminina no bem aceita, tais como a indstria. Com relao ao estado civil dos entrevistados, a pesquisa mostrou que 86,4% dos homens so casados ou tem uma unio estvel, enquanto apenas 13,6% so solteiros, separados, vivos ou divorciados. Quando se trata das mulheres, esse ltimo nmero sobe para 35,6%. Ou seja, apesar da maioria ser casada, independente do gnero, existe uma porcentagem maior de mulheres solteiras ou separadas do que os homens. Esse dado corrobora a pesquisa realizada por Hewlett (2002) nos EUA, com objetivo de explorar a vida profissional e privada de mulheres bem remuneradas, e com elevado nvel de instruo. A pesquisa demonstrou que, de modo geral, o homem bem sucedido tem maiores chances de se casar e ter filhos. O contrrio ocorre com as mulheres, especialmente para aquelas cujo salrio superior a 100.000 dlares por ano. Um fator que pressiona a mulher executiva a sobreposio de demandas profissionais e da maternidade. Os primeiros anos de ascenso da carreira profissional, que Evans e Bartolom (1980) classificam como jovem executiva, que vai dos 27 aos 34 anos, se sobrepem aos anos mais apropriados biologicamente para a maternidade. Dados cientficos comprovam que, aps os 35 anos, a fertilidade da mulher diminui drasticamente, atingindo menos de 3% ao ms aps os 42 anos (VIRTALA et al., 2006). Portanto, a mulher que ainda no teve filho e est entre os 35 e 40 anos, por exemplo, j tendo alcanado algum grau de sucesso na carreira, fica extremamente pressionada exatamente quando a demanda da empresa aumenta em relao sua dedicao ao trabalho. O relgio biolgico , portanto, mais severo com as mulheres do que com os homens (TANURE, CARVALHO NETO E ANDRADE, 2006) Essa deve ser a explicao para o fato de 59,5% das mulheres entrevistadas terem filhos, contra 80,7% dos homens. Diante de todo o exposto, percebe-se que os dados quantitativos apresentados at aqui, mostram um isomorfismo entre os executivos brasileiros. Em geral, ele do sexo masculino, tem entre 31 e 50 anos, casado, tem filhos e o seu tipo psicolgico o A. Entre as mulheres, tambm so percebidas caractersticas em comum, como foi demonstrado at agora. Mas, alm dos dados quantitativos, como ser o discurso do executivo? Ser ele isomrfico tambm? Ser que existem padres de comportamento, lazer, famlia e ambiente que permitem identificar um executivo tpico? O prximo tpico aborda essas questes. 5 Caracterizao qualitativa do (a) Executivo (a): O Discurso Isomrfico Ambiente Organizacional Um dos primeiros temas que surgiram nas entrevistas ambiente organizacional. Segundo Evans e Bartolom (1980) existe um desequilbrio no uso do tempo do executivo para viver e aproveitar as outras dimenses de sua vida fora do trabalho. Essa assertiva fica clara no

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    discurso do executivo, que afirma trabalhar em mdia de 12 a 14 horas por dia. Alguns chegam a falar de 17 horas de trabalho. Mas, apesar da valorizao aparente desse nmero de horas de trabalho (1), chega-se ao implcito por meio dos vocbulos sublinhados nos fragmentos (2) e (3), que mostram uma sensao de dvida muito intensa por parte desses executivos. Eles sempre se preocupam em entregar mais do que aquilo que tem feito. H uma sensao de que sempre existe algo a se fazer. Talvez uma de suas causas seja o fato da maioria dos entrevistados ser do Tipo A que, conforme descrito anteriormente tem uma insatisfao crnica com suas realizaes. E esta insatisfao crnica um motor muito bem explorado pelas empresas, que colocam metas quase inatingveis, para tirar ao mximo da capacidade do executivo. (1) pega bem ficar at mais tarde no trabalho. Sair s 18 horas, mesmo que seja possvel, no bem visto aqui na empresa. (2) tenho uma sensao de estar sempre em dvida, nunca consigo dizer: pronto, estou zerado em termos de trabalho a fazer. (3) so tantas demandas que humanamente impossvel atender a todas elas. Outro fator responsvel por essa sensao de dvida permanente, que no acaba nunca, so as mudanas organizacionais vividas pelos executivos. 55% da amostra vive mudanas radicais na organizao, o que aumenta a sensao de dvida. Afinal, tanta demanda que ele nunca acha que cumpriu o que deveria ter cumprido. No caso de executivos que trabalham em filiais de empresas multinacionais, essa sensao ainda maior. Uma das possveis razes implcitas o fato do brasileiro se sentir inferiorizado (4) e trabalhar mais que o estrangeiro nesse tipo de empresa, pois precisa provar para si mesmo que bom. Um dos executivos chegou a explicitar isso ao dizer que os brasileiros tm metas maiores. Os executivos estrangeiros (europeus e norte-americanos) entrevistados mostraram-se impressionados com o excesso de horas trabalhadas pelos pares brasileiros. (4) Trabalhamos muito mais do que os nossos superiores e pares l de fora. Temos sempre que provar que no existe cobra na Av. Paulista (risos). Um outro ponto interessante percebido nas entrevistas sobre a quantidade de trabalho, que os executivos explicitam que o que importa a qualidade do tempo passado com a famlia, e no a quantidade. Porm, a qualidade do tempo depende da quantidade de tempo. Eles tentam demonstrar que conseguem se dedicar a outras esferas de suas vidas (5). Entretanto, implicitamente, percebe-se que o trabalho , muitas vezes, sua maior fonte de prazer. (5) Tento conciliar meus papis, mas duro ver a minha filha atender ao telefone quando estava finalizando um relatrio do trabalho aqui em casa e falar para a minha me: V, a mame no mora aqui, mora na EMPRESA X, ligue para l!. Ainda existe mais um fator que diminui a quantidade de tempo disponvel e que explicitado de outra maneira: a tecnologia, que torna difcil a tnue diviso entre o que trabalho e o que no . Por exemplo: a maioria dos executivos afirmou que atende o celular fora do horrio comercial, fora os e-mails que so frequentemente acessados de qualquer lugar e em qualquer horrio (6). (6) Fiz uma viagem com a famlia para um resort mas fiquei l, de celular e laptop ligado na praia, foi at engraado!

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    Ainda sobre a quantidade de trabalho, observou-se que ela est associada construo de personagens, por meio do papel desempenhado na organizao. A imagem do workaholic implicitamente significa eficincia. Explicitamente, o executivo reclama da falta de tempo e do estresse associado vida que ele leva. Implicitamente, ele legitima sua imagem quando afirma estar cheio de trabalho, quando d o exemplo e fica at mais tarde. Trata-se do jogo de cena comum ao meio. o isomorfismo mimtico. (7) (7) Pega bem ser workaholic! (frase recorrente) Alguns entrevistados reconhecem esse jogo, mas sempre em relao ao outro, afirmando que existe gente que faz tipo, que usa excessivamente o celular ou o e-mail para representar, para demonstrar que muito requisitado. O que se observou em relao a esse jogo de cena, que o chefe quem dita, na maioria das vezes, qual o padro do teatro. Nesse caso, tem-se o isomorfismo normativo (8). (8) Eu tento dar o exemplo, sair daqui da empresa no mximo s 19:30, mas eu sei que no sou o padro de Presidente. Uma seleo lexical que sempre aparece e pode ser constatada nos relatos (9), (10) a sensao de orgulho que os executivos tm por terem chegado a ocupar seus cargos. A famlia no deixa de ser um fator significativo de presso sobre o executivo que construiu boa parte de suas relaes afetivas vinculadas ao papel de vencedor, de super-provedor (10). Em vrias ocasies, os executivos deixaram claro como os seus familiares do importncia ao seu carto de crdito. importante ressaltar tambm que existe uma quebra desse orgulho em algumas situaes, como, por exemplo, quando a imagem do produto que se vende no positiva ou quando a empresa no est apresentando os resultados esperados. (9) Sinto um orgulho imenso de ter chegado aonde cheguei. (10) Toda a minha famlia sente um grande orgulho de me ver tendo chegado at aqui. Lazer Outro tema recorrente nas entrevistas diz respeito ao lazer, que fica implcito estar vinculado ao papel que o executivo desempenha no apenas na empresa, mas na sociedade como um todo. Por exemplo, quando ele vai jantar ou vai a algum evento social (11). Nesse caso, o executivo no o Joo ou o Pedro, mas sim o Joo Presidente ou o Pedro Diretor de tal empresa. A pessoa fica vinculada ao cargo que ocupa, que lhe confere status e respeito, apesar dessas palavras serem silenciadas. O interessante que, apesar de alguns reclamarem dessa situao, quando a aluso ao cargo que ocupam no feita, h um estranhamento por parte do executivo. (11) "Saio para jantar em qualquer restaurante em So Paulo e continuou sendo tratado pelas pessoas que encontro como o X, presidente da empresa Y. Por isso que gosto de fugir para o interior no final de semana para me desligar um pouco do papel". Segundo Bramante (1998), existe uma linha tnue que demarca lazer e trabalho, sendo imperceptvel, s vezes, uma vez que os valores que reafirmam o trabalho podem estar presentes no lazer e vice-versa. Para esse autor, uma experincia de lazer pode, freqentemente, ser determinada por regras, horrios e responsabilidades para os indivduos que vivenciam as experincias, aproximando-os dos valores do trabalho.

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    De maneira similar, Gomes (2004) entende o lazer a partir de sua insero em um determinado contexto histrico e social, no qual ele construdo. Assim, o lazer, apesar de distinto do trabalho, est diretamente relacionado a ele, sendo utilizado para quebra de rotinas, compensao de frustraes no trabalho, entre outros. O que se observou que existe implicitamente uma associao entre alguns tipos de lazer e o cargo do executivo. Por exemplo: golf esporte de presidente de empresa. J os gerentes jogam tnis. O esporte praticado legitima a posio ocupada na empresa. Segundo Pacheco (1992, p.251) ...h dessa forma, uma certa invaso institucional sobre o seu cotidiano. Privado de meios de escolha em funo das coeres principalmente econmicas s lhes resta atender aos apelos da empresa. Assim, de certa forma, o que se observa no lazer do executivo, praticamente um isomorfismo coercitivo aliado ao mimtico, uma vez que o cargo que ocupa lhe impe determinados lugares a freqentar, esportes a praticar e lugares para onde viajar. O lazer acaba por legitimar a posio ocupada na empresa. Nesse sentido, cabe uma indagao: at que ponto os executivos tm lazer na prtica? Vida Pessoal Os executivos afirmam trabalhar de 12 a 14 horas em mdia, sem considerar deslocamentos, viagens e eventos como jantares a noite, que so razoavelmente comuns, dormem cerca de 6 a 7 horas por noite e ainda encontram tempo para praticar exerccios fsicos. Mas, e a vida pessoal? Os entrevistados so pessoas que geralmente simbolizam a representao de um determinado sucesso. Talvez por essa razo, palavras como fracasso so silenciadas, ainda que faam aluso vida pessoal (12). Conforme se observa nesse depoimento, difcil para o executivo admitir insucessos, seja ele na vida profissional ou pessoal. (12) Minha vida profissional est tima, a empresa vai bem. J minha vida pessoal depende do momento. Com meu filho tenho momentos de love story e de alta tenso. Tive problemas com ele, queria sair de casa, mandei para fora estudar. A gente d muita condio financeira para nossos filhos e eles ficam desestimulados para lutar pelos desafios da vida.... A maioria dos executivos casada. No caso das mulheres, muitos parceiros costumam ser colegas de profisso, capazes de entender o tempo que ela dedica ao trabalho. Porm, como a dominao masculina, como diz Bourdieu (2003), eles no entendem de fato, pois so as executivas, mesmo casadas com executivos, que ficam com a dupla jornada familiar. Nas entrevistas, a maioria dos executivos disse que no fuma e bebe apenas socialmente. interessante refletir como o envolvimento do executivo conduz a um mascaramento do conflito entre capital, trabalho e polticas delimitadas pelas empresas, que levam o sujeito a assumir como sendo seus, interesses que so, na verdade, da empresa. Vale lembrar que isso ocorre desde o tempo de Ford (1954), que administrava sua empresa e a vida de seus empregados. Beynon (1995) lembra que Ford impunha a seus empregados seu prprio modus vivendi. Ele no bebia, no fumava e acreditava nos benefcios de caminhadas ao ar livre. Acreditava nisso para ele e para seus empregados.

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    De certa forma, o que se observou que isso ocorre at hoje, uma vez que o executivo o exemplo a ser seguido, e suas atitudes servem de modelo. Interessante ressaltar o caso do presidente maratonista que fez com que praticamente toda a sua equipe passasse a correr tambm e introduziu na empresa grupos de corrida, para estimular a prtica deste esporte (13). Esta prtica, sem dvida saudvel, muitas vezes uma imposio, relacionado ao isomorfismo coercitivo. No foram poucos os relatos de executivos que odeiam tnis, ginstica, entre outros, mas ainda assim praticam em seu tempo de lazer.

    (13) Aqui na empresa temos vrios maratonistas e grupos de corrida. Sinceramente eu no tinha o menor interesse pelo esporte, mas o pessoal aqui me incentivou e agora j fao provas pequenas de 10Km.

    5 Consideraes Finais A noo de sucesso organizacional est implicitamente ligada s idias de vantagem competitiva. Mas, para conseguir essa vantagem competitiva, necessrio que se tenha um diferencial. Existe um discurso de que esse diferencial est nas pessoas. Mas, at que ponto elas no apresentam comportamentos homogneos? Pretendeu-se, por meio desse artigo, discutir o isomorfismo do executivo que alcanou posies de destaque nas grandes empresas do Brasil. Em um contexto onde o discurso de valorizao do indivduo aparece, sendo comum ouvir frases que reverenciam as pessoas como sendo o grande diferencial das organizaes, colocou-se em dvida como essas pessoas podem apresentar esse diferencial, sendo isomrficas em tantos aspectos. Os discursos da alta administrao foram apreendidos como definidores da realidade organizacional dos seus membros, por meio da manipulao e o uso de smbolos, metforas e imagens, para criar significaes e identidade homogneas na organizao. A anlise das entrevistas com os executivos possibilitou verificar que eles so isomrficos tanto com relao a caractersticas de personalidade, quanto em relao ao discurso e determinados comportamentos relacionados vida pessoal e organizacional, incluindo o lazer. Nesse sentido, foi constatada a utilizao de rituais, no caso desta pesquisa, rituais de lazer que permite que as emoes, os sentimentos, os medos, dios, amores e crenas dos homens se manifestem, sendo justamente neste momento que regras, normas, relaes de poder e valores sociais se materializam e se legitimam, refletindo a realidade do grupo, da empresa. Isso fica claro quando se observa que um executivo diretor que no gosta de golfe fica de fora da network dos colegas e do prprio presidente da empresa. Constatou-se que existe uma articulao entre os trs mecanismos de isomorfismo em direo homogeneizao das aes organizacionais pertencentes a um mesmo campo organizacional, apesar do peso de cada um depender do tema tratado. Tambm, observou-se que o comportamento seguido pelo executivo dissemina idias de como os funcionrios devem se comportar, pensar e viver socialmente. Cabe, entretanto, enfatizar que existem reprodues de representaes sociais, carregadas de preconceitos, que por sua vez, delimitam os papis sociais de funcionrios, reproduzindo os padres de comportamento preestabelecidos. Ficou comprovado na pesquisa, que as condutas reprovveis no mundo da alta gesto, no Olimpo empresarial dos executivos, so aquelas que admitem a falibilidade, a

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    intuio. Os fracos no tm voz neste mundo, mostrar que tem dvida conduta reprovvel. Ao mesmo tempo em que os processos de institucionalizao de pessoas produzem estabilidade e permanncia, eles tambm provocam rigidez e resistncia mudana. O fato que, para inovar, precisa-se de pessoas que sejam diferentes umas das outras. Mas se todos so iguais, como inovar? O formalismo homogeiniza e institucionaliza, uma vez que necessrio estar calcado em crenas e valores para que se consiga a legitimao. Esta pesquisa buscou trazer uma contribuio para os estudos organizacionais, j que permitiu investigao terica e prtica, a partir da reflexo de fenmenos que influenciam as interaes dos executivos na dinmica e nos resultados da organizao. Muitos estudos sobre o tema foram feitos, mas todos ligados aos mecanismos isomrficos das organizaes. Nesse sentido, a principal contribuio dessa pesquisa foi iniciar a discusso sobre o isomorfismo de indivduos, de classes, nesse caso dos executivos. Desta forma, verificou-se como o executivo legitima e perpetua as relaes construdas socialmente, que acabam por pactuar com as desigualdades de gnero e de poder. Mas, ficam duas indagaes suscitadas pela pesquisa: Se os executivos so isomrficos, eles so facilmente substituveis nas organizaes. Sendo assim, eles deveriam buscar a diferenciao para se manterem no espao de poder que to duramente conquistaram, como estratgia de sobrevivncia no mdio e longo prazos. Mas como se diferenciar e obter a legitimao necessria se o filtro para subir na hierarquia organizacional determinado por uma cultura que exclui quem no igual? Ou seja, como se diferenciar e ao mesmo tempo obter a legitimao necessria? Fica aqui uma reflexo: Ser que isso possvel? 6 Referncias Bibliogrficas Bailey, K. D. Methods of social research (2nd ed.). New York: The Free Press, 1982. Betiol, M. I. S; Tonelli, M.J. As mulheres executivas e suas relaes de trabalho. RAE Revista de Administrao de Empresas. So Paulo, v. 31, n. 4, p. 17-33, 1991. Beynon, H. Trabalhando para a FORD. So Paulo: Paz e Terra, 1995.

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