Atraso de Crescimento Intra Uterino

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ATRASO DE CRESCIMENTO INTRA-UTERINO Tema de aula da cadeira de Obstetrícia – 6º ano da Faculdade de Medicina 2004 sumário Conceito Patogênese Classificação Factores de risco Rastreamento e diagnóstico Tratamento e conduta Prognostico Dr. Sibone Mocumbi – Departamento de Ginecologia e Obstetrícia, HCM

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ATRASO DE CRESCIMENTO INTRA-UTERINO

Tema de aula da cadeira de Obstetrícia – 6º ano da Faculdade de Medicina 2004

sumário

ConceitoPatogêneseClassificaçãoFactores de riscoRastreamento e diagnóstico Tratamento e condutaPrognostico

Dr. Sibone Mocumbi – Departamento de Ginecologia e Obstetrícia, HCM

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Conceito

Os recém nascidos de baixo peso, com menos de 2500 g ao nascer, dividem-se em duas populações distintas:

uma está relacionada com o tempo de vida intra-uterina e é representada pelos recém-nascidos pré-termo, com peso inferior a 2500g por terem nascido antes do tempo.

outra representada pelos recém-nascidos com menos de 2500g, que não conseguiram ganhar peso adequadamente devido a baixa qualidade de vida intra-uterina, havendo um processo fisiopatólogico que resulta em restrição do crescimento fetal.

Maior parte dos RN pesando menos de 2500 g (portanto, com BPN) são pré termo. Cerca de 16 % dos RN com BPN são de termo tendo sofrido crescimento intra uterino anormal. Estima-se que 3 a 10% dos lactentes apresentam restrição do crescimento (Divon e Hsu, 1992).

As definições de atraso de crescimento intra-uterino (ACIU), actualmente referido como restrição de crescimento fetal diferem segundo a literatura. Estão baseadas na hipótese de distribuição de peso e idade fetal comparadas a curvas-padrão da população. Considera-se que um feto apresenta ACIU quando é estimado um peso inferior ao que corresponderia a sua idade gestacional, tendo portanto, um peso ao nascimento abaixo do limite inferior da curva de peso neonatal segundo a IG.

Lactentes pequenos para a idade gestacional (PIG), segundo Battaglia e Lubchenco (1967), são aqueles cujos pesos estão abaixo do 10º percentil para a sua idade gestacional. Estes lactentes mostraram estar sob maior risco de morte neonatal (p. ex taxa de mortalidade dum lactente PIG com 38 semanas de 1% em comparação com 0,2% naqueles com peso ao nascimento apropriado.)

Seeds (1984), propôs uma definição baseada no peso ao nascer abaixo do 5º percentil.

Usher e McLean (1969) propuseram que os padrões de crescimento fetal devem ser baseados em valores médios com limites normais definidos por ± 2 desvios padrão, porque esta definição limitaria lactentes PIG a 3% dos nascimentos em comparação com o 10º percentil. Alem disso nem todos os lactentes com pesos ao nascimento abaixo do 10º percentil apresentam restrição patológica do crescimento; alguns são pequenos simplesmente devido a factores constitucionais. Este é o critério aceite pela OMS, definindo portanto feto com ACIU, aquele com peso abaixo de dois desvios-padrão (2DP), o que corresponde aproximadamente ao percentil 3.

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Peso normal ao nascimento: é avaliado utilizando-se curvas de crescimento fetal.

Morbilidade e mortalidade: a restrição do crescimento fetal (RCF) está associada a significativa morbilidade e mortalidade perinatal. A morte fetal, asfixia ao nascimento, aspiração de mecônio, hipoglicemia neonatal e hipotermia estão todas aumentadas, assim como a prevalência de desenvolvimento neurológico anormal.

Muitos casos de RCF são resultantes de agressões virais precoces, ou de anormalidades do desenvolvimento genético, estando nestes casos o prognostico a longo prazo relacionado a natureza e a intensidade do problema subjacente. Noutros casos a RCF é devida a insuficiência placentar num feto normal sob outros aspectos e o diagnostico oportuno e o tratamento obstétrico e neonatal apropriados podem reduzir os riscos de evolução adversa.

Restrição do crescimento fetal simétrica versus assimétrica

O crescimento fetal pode ser dividido em 3 fases (Pollack e Divon, 1992; Winick, 1971): 1ª fase, desde a concepção até o inicio do 2º trimestre, envolve a hiperplasia celular – um aumento do numero de células de todos órgãos. A 2ª fase, de hiperplasia e hipertrofia continua, envolve a multiplicação celular e crescimento do órgão. Na 3ª fase, após 32 semanas, a hipertrofia celular é o aspecto dominante de crescimento.

Restrição do crescimento simétrica: redução proporcional do tamanho da cabeça e do corpo. Fenómeno observado em agressões iniciais devidas a exposição química, infecção viral ou anomalia de desenvolvimento celular inerente causada por aneuploidia, que levam a diminuição do número e do tamanho das células. Restrição do crescimento assimétrica: tamanho da cabeça aumentado em relação ao abdómen. Pode resultar de agressão no final da gravidez, por exemplo, insuficiência placentária associada a hipertensão, afectando basicamente o tamanho das células. A insuficiência placentária pode resultar em diminuição da transferência e do armazenamento hepático de glicose e consequente diminuição da circunferência abdominal fetal. O desvio preferencial de oxigénio e nutrientes para o cérebro permite o normal crescimento do cérebro e da cabeça. A razão entre o peso do cérebro e o peso do fígado (geralmente de 3 para 1) é aumentada de 5 para 1 ou mais nos lactentes com restrição de crescimento grave.

No entanto, outros factores devem estar envolvidos pois encontram-se fetos aneuploidicos com padrão assimétrico e fetos de mães pré-eclâmpticas com padrão simétrico.

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Patogênese

O ACIU está associado aos factores que reduzem o potencial de crescimento intrínseco e o suporte de vida intra-uterina. Poder-se ia assim dividir os factores associados a restrição do crescimento intra-uterino em intrínsecos (endógenos) e extrínsecos (exógenos). Prefere-se no entanto, considerar factores fetais, placentários e maternos.

Os mecanismos patológicos da restrição do crescimento intra-uterino são:

redução do potencial de crescimento intrínseco insuficiência vascular uteroplacentária transtornos da nutrição materna

Redução do potencial de crescimento intrínseco

O potencial primário de crescimento fetal é determinado geneticamente. Este potencial de crescimento pode ser inibido, alterado ou desviado devido a um conjunto de factores que actuam sobre o metabolismo fetal e o processo organogenético, produzindo uma diminuição na taxa de utilização de nutrientes por unidade de peso e uma diminuição permanente do numero de células. Isto ocorre nas seguintes circunstancias:

alterações genéticas ou cromossómicas infecções embriogenéticas acções tóxicas ou radioactivas

Insuficiência vascular uteroplacentária

A insuficiência vascular uteroplacentária pode reduzir o fluxo e induzir ACIU pela diminuição da pressão de perfusão, pelo aumento da resistência vascular placentária ou pela diminuição da superfície vascular de trocas.

Transtornos da nutrição materna

A desnutrição materna é causa de ACIU ao ocorrer de forma aguda. Se a desnutrição for crónica, previa a gestação, a incidência de recém-nascido de baixo peso será de 40%, seja por prematuridade ou por ACIU.

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Factores patogénicos de ACIU

Factores feto-placentares

alterações genéticas ou cromossómicas (10-15% dos ACIU)- autossómicas: trissomia 13, 18 e 21; cromossomas em anel, deleções- cromossomas sexuais: Turner, cromossomas múltiplos (XXX, XXY)- defeitos do tubo neural: anencefalia, espinha bifida- síndromes dismorficos: acondroplasia, osteogenese imperfeita- defeitos da parede abdominal: gastrosquisis- anomalias renais- outros síndromes raros

infecções congénitas (5-10% dos ACIU)- virais: cytomegalovirus, rubéola, herpes, varicela zoster, influenza, polio- protozoários: toxoplasmose, malária- bacterianas: listeriose

anomalias placentárias: placenta previa, vilite coriónica, descolamento parcial crónico, malformações (placenta circunvalada, hemangioma placentar, síndrome de transfusão fetal, inserção anormal do cordão)

gravidez múltipla sexo: os RN de sexo masculino pesam 140 a 150 g mais do que os RN de sexo

feminino

Factores maternos

gerais:- idade: grávidas com mais de 35 anos tem maior numero de distúrbios

metabólicos (hipertensão e diabete mellitus), de implantação anormal da placenta e insuficiência uteroplacentária. O RR para anomalias cromossómicas é maior em grávidas com mais de 35 anos.

- pequena estatura- antecedente de RN ACIU (1, aumenta 2x; 2 aumenta 4x o risco)

doenças maternas- hipertensão- anemia- doença renal crônica- hiperinsulinemia- malnutrição (doença inflamatória intestinal, parasitoses, pancreatite,

malabsorção)- doença pulmonar crônica

hábitos: - cigarro- abuso de álcool- uso de drogas ilícitas

medicamentos:- anticonvulsivantes : fenitoína, trimetadiona - antagonistas do acido fólico: MTX- varfarina

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Classificação

Várias tentativas de classificação já foram utilizadas. A classificação integrada utiliza vários critérios antropométricos, e divide em três tipos (I, II e III). Alguns autores incluem o tipo III no grupo II.

Tipo I ou simétrico

ACIU intrínseco, simétrico, harmónico, e precoce. Ocorre desde o inicio da gestação, estando comprometidos o peso, o comprimento e o perímetro cefálico fetais. Tem como características:

recém-nascido com corpo proporcional e sem aspecto distrófico ausência de hipoxia fetal, estudo Doppler sem alterações insuficiência metabólica pouco intensa diâmetros cranianos correspondem ao peso ao nascer, mas não a IG cerca de metade dos RN apresenta graves alterações ou malformações

congénitas que dificultam a vida menor numero de células nos diversos órgãos prognostico cerebral ruim placenta pequena, histologicamente normal ou com alterações infecciosas em 50% dos casos, antecedente de aborto ou ACIU

causas: genéticas ou cromossómicas, infecciosas, tóxicas ou radiação ionizante, disrupção intrínseca de diferentes órgãos.

Tipo II ou assimétrico

ACIU extrínseco, assimétrico, desarmónico, tardio, desproporcionado e placentário. Os factores desencadeantes actuam no ultimo trimestre e influem predominantemente sobre o peso fetal, pouco ou nada interferindo sobre o comprimento fetal e o perímetro cefálico, tendo como características:

recém-nascido com aspecto distrófico desenvolvimento desproporcional usualmente hipoxia fetal diâmetros cranianos e comprimento fetal correspondem melhor a IG do que ao

peso numero de células dos órgãos é normal, apesar da massa celular ser reduzida frequentemente hipoglicemia pós-natal alta percentagem de distúrbios neurológicos frequente aspiração de mecônio peso da placenta menor que o normal

causa: insuficiência ou disfunção placentária, défice na perfusão uterina ou área de superfície vascular.

O tipo III é misto. É causado essencialmente por malnutrição materna.

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No entanto, embora esta classificação seja útil para diagnóstico diferencial não é suficientemente precisa para servir como base para decisões quanto a intervenção ou viabilidade fetal. Estudos biométricos em RN PIG associados a defeitos congénitos, mostram que a maioria tem ACIU assimétrico e não simétrico. A premissa de que ACIU de tipo I não tem hipoxia nem sempre é valida.

Em resumo:

RN com ACIU simétricos têm maior probabilidade de ter defeito endógeno que exclui desenvolvimento normal.

RN com ACIU assimétricos têm maior probabilidade de serem normais, mas pequenos em tamanho devido a privação intra-uterina.

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Factores de risco

Mães constitucionalmente pequenasGanho ponderal e nutrição materna inadequadosEstilo de vidaInfecções fetaisMalformações congénitasAnomalias cromossómicasTrissomia do 16Distúrbios primários da cartilagem do ossoTeratógeno químicosDoença vascularDoença renal crónicaHipoxia crónicaAnemia maternaAnomalias placentárias e do cordãoFetos múltiplosSíndrome do anticorpo antifosfolipidoGravidez extra-uterina

Mães constitucionalmente pequenas. Mulheres pequenas têm tipicamente bebes menores. O risco duma mulher começando a gravidez com menos de 45 kg, de ter um lactente PIG é, no mínimo, duas vezes maior (Simpson e col., 1975).

Ganho ponderal e nutrição materna inadequados. Na mulher de peso médio ou baixo, a ausência de ganho ponderal durante a gravidez pode estar associada a restrição do crescimento fetal (Simpson e col., 1975). A ausência de ganho ponderal no 2º trimestre esta particularmente bem correlacionada à diminuição de peso ao nascimento (Abrams e Selvin,1995).

Estilo de vida. O tabagismo e o consumo de álcool e drogas esta associado a restrição do crescimento fetal. O tabagismo é a causa mais prevenível de ACIU. Mulheres fumadoras têm risco 3 a 4 vezes maior do que não fumadoras em ter gravidez com ACIU. O peso ao nascer esta reduzido em cerca de 200g nos RN de mães fumadoras, estando o grau de restrição de crescimento associado ao numero de cigarros fumado por dia: as mulheres que param de fumar ao 7º mes têm RN com peso médio à nascença maior do que o das mulheres que fumam durante toda a gravidez e aquelas que param de fumar antes das 16 semanas não têm risco aumentado de ter um bebe com ACIU. A associação do consumo de álcool ao ACIU é sabidamente conhecida. Quase todos os RN com síndrome fetal alcoólico mostram sinais de restrição de crescimento.

Infecções fetais. Infecções virais, bacterianas, por protozoários e por espiroquetas foram implicadas em até 10% dos casos de restrição do crescimento fetal. Dentre estas, as mais conhecidas são as infecções causadas por rubéola e cytomegalovirus. O CMV esta associado a citolise directa e perda das células funcionais. Na rubéola, a infecção causa insuficiência vascular por lesão do endotélio dos pequenos vasos. As hepatites A e B estão associadas a parto pré-termo mas também podem afectar adversamente o crescimento fetal. Foi descrito que a listeriose, a tuberculose e a sífilis causam restrição do crescimento fetal. A toxoplasmose é a infecção por protozoários mais

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frequentemente associada ao compromisso do crescimento fetal, mas a malária também pode produzir o mesmo resultado.

Malformações congénitas. Quanto mais grave é a anomalia estrutural, maior é a probabilidade de que o feto tenha um ACIU. Isto é particularmente evidente em fetos com anomalias cromossómicas ou naqueles com malformações cardiovasculares serias.

Anomalias cromossómicas. Embora o atraso de crescimento pós-natal seja proeminente em crianças com trissomia do 21, o ACIU geralmente é leve. O peso ao nascimento médio destes lactentes é de 2900 g. Ao contrario, fetos com trissomia do 18 são quase sempre afectados de forma significativa (peso < 2500 g). Também há algum grau de restrição do crescimento em fetos com trissomia do 13, mas geralmente não é tão grave quanto na trissomia do 18.

Não se observa restrição significativa do crescimento fetal com síndrome de Turner (45,X ou disgenesia gonadal) ou síndrome de Klinefelter (47,XXY).

Trissomia do 16. é a trissomia mais comum em abortos espontâneos e é geralmente letal para o feto no estado não mosaico. Foi descoberto que pontos de trissomia 16 na placenta levam a insuficiência placentária que pode ser responsável por casos de ACIU.

Teratógenos químicos. Qualquer agente que cause uma lesão teratogênica é capaz de afectar adversamente o crescimento fetal: anticonvulsivantes (fenitoína, trimetadiona), tabaco (causa bem documentada de hipoxia fetal e isquemia), narcóticos e drogas relacionadas (diminuem a ingestão materna de alimentos e o numero de células fetais) e o álcool. O álcool é um teratógeno potente que actua de forma linear relacionada com a dose: incidência de 10% do síndrome alcoólico fetal em fetos cujas mães bebem moderadamente (2 a 3 copos por dia), e uma incidência até 30% em fetos cujas mães bebem muito (5 ou mais copos por dia).

Doença vascular. Doença vascular crónica, principalmente quando complicada com pré-eclâmpsia superposta, causa comummente ACIU. A própria pré-eclâmpsia pode causar atraso de crescimento fetal.

Doença renal crónica. A insuficiência renal pode ser acompanhada por restrição do crescimento fetal.

Hipoxia crónica. Quando expostos a um ambiente de hipoxia crónica, alguns fetos apresentam redução significativa do peso ao nascimento: fetos de mulheres residentes em altitude elevada, fetos de mulheres com cardiopatia cianótica.

Anemia materna. Geralmente não causa ACIU, excepto naqueles com doença falciforme ou com outras anemias hereditárias associadas a doença materna grave.

Anomalias da placenta e do cordão. A separação placentária parcial crónica, enfarto extenso ou coriangioma tendem a causar ACIU. Uma placenta circunvalada ou uma placenta previa podem comprometer o crescimento. A inserção marginal do cordão, sobretudo a inserção vilamentosa é mais propensa a ser acompanhada por feto com ACIU.

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Fetos múltiplos. A gravidez com dois ou mais fetos é mais propensa a ser complicada por crescimento anormal de um ou ambos fetos em comparação com fetos únicos normais. Foi descrita restrição do crescimento fetal em 10 a 50% dos gémeos.

Síndrome do anticorpo antifosfolipido. Duas classes de anticorpos antifosfolipidos foram associadas a restrição do crescimento fetal: anticorpos anticardiolipina e anticoagulante lúpico. A evolução da gravidez em mulheres com estes anticorpos é frequentemente inadequada.

Gravidez extra-uterina.

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Rastreamento e diagnóstico do ACIU

Risco para ACIUA identificação de factores de risco, incluindo um feto anterior com ACIU (factor mais importante de risco), deve levantar a possibilidade de restrição de crescimento durante a gravidez actual. Em mulheres com factores de risco significativos, deve-se considerar a ultra-sonografia seriada para detectar crescimento fetal anormal.

Suspeita de ACIUEm mulheres sem factores de risco a identificação de casos de ACIU poderá ser feita na maioria dos casos através de:

Estabelecimento precoce da idade gestacional Atenção ao ganho ponderal materno Determinações cuidadosas da altura uterina durante toda a gravidez

A suspeita de ACIU, alem da historia de factores de risco, inicia-se quando ocorre discrepância entre a IG e a medida da altura uterina.

ACIU provávelO primeiro passo para o diagnóstico de ACIU envolve o calculo da IG e da massa fetal. O exame complementar de maior acurácia para determinar ACIU é a ultra-sonografia.

Altura do fundo uterino. Medidas seriadas cuidadosas da AFU durante toda a gestação são um método de rastreamento simples, seguro, de baixo custo e razoavelmente preciso que pode ser usado para detectar muitos fetos pequenos para a idade gestacional. O principal problema é de imprecisão (identificação correcta de apenas 40% dos casos). Entre 18 e 30 semanas a AFU em cm coincide com as semanas de gestação.

Medidas por ultra-sonografia. O rastreamento de rotina consiste em uma eco as 16-20 semanas, para estabelecer a IG e excluir anomalias visíveis, e, depois, estudo por imagens de acompanhamento com 32 a 34 semanas para avaliar o crescimento do feto.

As medidas da circunferência abdominal foram aceites por ultrassonografistas experientes como o índice mais fidedigno do tamanho fetal (Manning, 1995; Snidjers e Nicolaides, 1994).

Velocimetria Doppler no ACIU. Com o uso de ultra-sonografia em tempo real e análise Doppler simultânea do fluxo sanguíneo no cordão umbilical, é possível medir o fluxo sanguíneo pulsátil através da artéria umbilical. Em condições associadas a aumento da resistência vascular placentária, o fluxo de baixa pressão durante a diástole cardíaca fetal, é ainda mais reduzido, originando uma maior razão entre fluxo sanguíneo sistólico e diastólico.

Vários estudos definiram uma associação entre razão S/D elevada na artéria umbilical, restrição do crescimento fetal e evolução perinatal adversa (Berkowitz, 1988; Dempster, 1989; Gaziano, 1994; Sijmons, 1989; e seus associados).

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Tratamento

Manejo anteparto

Uma vez detectado ACIU impõe-se necessidade de manejo num centro terciário tendo em vista os sérios problemas que podem ocorrer com o feto ou com o recém-nascido: deve estar numa unidade sanitária que possa prestar cuidados obstétricos, anestésicos e neonatais apropriados.

O plano de assistência deve ser feito em função da etiologia e da evolução do quadro com monitorização do bem estar fetal, perfil bioquímico, avaliação ultrassonografica e o estudo por Doppler.

Quanto a etiologia, deve-se fazer modificações nos factores de risco possíveis de controle:

- parar de fumar ou ingerir álcool ou uso de drogas- repouso na cama em decúbito lateral esquerdo para melhorar a circulação

uteroplacentária, pode ser útil em ACIU assimétricos.- aspirina em baixas doses: diminui síntese de tromboxano A2, resultando na

predominância de prostaciclina, um vasodilatador potente.- nutrição materna adequada: assegurar 2100 a 2300 cal/dia.

Nas mulheres com risco de parto pré-termo, deve-se administrar glicocorticoides antes das 34 semanas, para assegurar a maturação pulmonar fetal

É consenso entre os perinatologistas, que o momento adequado do parto, seja, no mínimo com 37 a 38 semanas, desde que haja um índice L/E >2.

Deve-se interromper a gravidez, mesmo com índice L/E < 2 em casos de: oligohidrâmnio sinais de sofrimento fetal (CTG não reactivo e perfil biofísico < 4)

Manejo intraparto

O tipo de parto depende de cada caso individual. A cesariana é indicada em casos de sofrimento fetal, apresentações viciosas ou situações em que se antecipa que o parto vaginal possa ser traumático.

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Prognostico

A gravidez com ACIU não é por si uma condição de risco para a mãe. Ela pode estar no entanto com risco de morbilidade ou mesmo mortalidade significativa se tiver uma condição subjacente que predispõe para ter um feto com ACIU (por exemplo, hipertensão ou doença renal).

RN com baixo peso ao nascer têm morbilidade e mortalidade relativamente elevada: a taxa de morte neonatal, Apgar 5º minuto < 3, pH da artéria umbilical < 7, convulsões durante o primeiro dia de vida e incidência de incubação , estão significativamente aumentados se o peso ao nascer estiver igual ou abaixo do percentil 3 para a IG.

O prognóstico a longo prazo é menos benigno para lactentes com ACIU. Têm tendência a se manterem fisicamente pequenos, particularmente os lactentes simétricos. Têm por outro lado maiores deficiências neurológicas e intelectuais que os pares adequados para a idade gestacional. Observa-se que têm QI inferiores e maior incidência dificuldades de aprendizagem e problemas de comportamento. Handicaps neurológicos severos como atraso mental, paralisia cerebral e convulsões são mais comuns em ACIU. A incidência do síndrome de morte súbita do lactente é maior em RN ACIU (30% de todos os casos de SMSL). Todos estes problemas são mais frequentes e mais severos em RN com cabeças com circunferência cerebral pequena: Os ACIU simétricos tem pior prognostico que os assimétricos.

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