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Economia Pública

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V – Tributação

2 – Impostos sobre os bens e serviços;

Efeitos sobre o bem-estar;

Tributação indirecta óptima.

Bibliografia : Cullis & Jones (1998) : Cap 7 (7.1;7.2) e Cap 15 (15.1;15.2)

Pontos a abordar :

1 – Noção de carga excedentária;

2 – Identificação de carga excedentária ; medida da carga excedentária;

4 – Carga excendentária com custos marginais crescentes;

5 – Tributação óptima : princípio;

6 – Regra de Ramsey.

1 – Noção de carga excedentária;

Carga excedentária de um imposto (deadweight loss) é a quantidade que é perdida

em excesso ao que o governo colecta. Trata-se da perda de benefício que ambos os

agentes sofrem devido ao imposto.

2 – Identificação da carga excedentária

Para calcular a carga excedentária temos que utilizar a curva de procura

compensada.

Vejamos em primeiro lugar porque é necessária a curva de procura compensada.

Quando se pretende medir o valor de uma política pública utilizando a teoria da

utilidade, utiliza-se o conceito de “vontade de pagar” (willingness to pay, ou (WTP))

que o consumidor tem pela política em questão. O Conceito de willingness to pay é um

conceito da curva de procura compensada.

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Considere-se um exemplo : Qual a vontade de pagar pela política de prevenção do

crime que a Câmara Municipal implementará através da política municipal ?

Intensidade da política WTP do Sr. J Utilidade marginal

0 polícias 0 0

1 polícia 50 euros 50

2 polícias 95 euros 45

3 polícias 135 euros 40

4 polícias 170 euros 35

5 polícias 200 euros 30

6 polícias 228 euros 28

7 polícias 254 euros 26

8 polícias 278 euros 24

9 polícias 301 euros 23

10 polícias 323 euros 22

Em termos gráficos este problema representa-se por :

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Podemos utilizar o WTP para construir uma curva de procura compensada. A

curva a construir é compensada porque o Sr. J disse quanto é que estava disposto a

pagar (WTP) por cada polícia adicional por forma a manter-se sobre a mesma curva de

indiferença, a que corresponde a utilidade constante.

- A Curva de Procura Compensada

As curvas de procura compensadas reflectem apenas o efeito-substituição. São

curvas que dão origem à procura do bem em função dos preços (WTP, neste caso). O

rendimento é retirado ao indivíduo ou é lhe dado por forma a ele manter a utilidade que

teria se os preços não tivessem variado. Por esta razão as curvas de procura

compensadas não possuem o efeito rendimento, mas apenas efeito compensação

associado à variação do preço.

procé mado qde com

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A curva deura ordináriais horizontalue a curva

procurapensada.

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- O Excedente do Consumidor

A diferença entre o que o indivíduo quer pagar e o que o indivíduo paga é o

excedente do consumidor. Na definição de WTP vimos que o sr. J queria pagar 50

Euros por um polícia e 45 Euros por dois polícias. Se o preço de mercado for 30 Euros o

Sr. J obtém uma utilidade superior ao preço pago.

Essa utilidade mede-se por :

1 polícia : 50 - 30 = 20 Euros;

2 polícias : 45 - 30 = 15 Euros;

3 polícias : 40 - 30 = 15 Euros;

4 polícias : 35 - 30 = 5 Euros;

5 polícias : 30 - 30 = 0 Euros

∑ = 50 Euros

O excedente do consumidor é, neste exemplo, 50 Euros. Em termos gráficos o

excedente do consumidor é a área da curva da procura acima do preço de mercado.

Num contexto de um projecto concreto adicionar-se-iam as curvas de procura

individual, agregando-se os benefícios recebidos pelos indivíduos inquiridos. A

diferença entre o benefício agregado e o custo do projecto é o benefício económico do

projecto.

3 – A carga excedentária

A carga excedentária é a medida da ineficiência de um imposto. Como a vontade

de pagar por um imposto constitui um conceito da curva de procura compensada,

utilizaremos esta curva para obter a carga excedentária.

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Considere-se um imposto sobre cigarros. O custo de produzir o cigarro é C0 e o

imposto é ‘t’, por forma que o custo mais o imposto seja C0 + t.

Em termos gráficos ter-se-ia :

A área ABC mede a carga excedentária resultante do lançamento do imposto

sobre os cigarros. O triângulo ABC é conhecido por triângulo de Harberger. Por que

razão o triângulo de Harberger constitui uma medida de ineficiência ? Porque o imposto

obtido é a área 00 )( BACtC + mas a diminuição do produto devido ao imposto é ))( 10 BCqtC +

e, portanto, o triângulo é um puro desperdício de recursos que o imposto induz.

Carga excedentária

Se a curva da procura for linear, a área do triangulo ABC é dada por:

(basexaltura/2). Quando a curva não é linear a area é calculada como um integral. O

valor do integral é dado por:

A medida do triângulo ABC é dada por : Legenda :

ed = elasticidade da procura; t= imposto; P= preço sem imposto; Q= quantidade sem imposto. QPtde

PQPtde

PtCE

..2.21

......2

1

=

=

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Carga excedentária e variação equivalente

O conceito de variação equivalente foi uma medida proposta por Hicks para

contornar a dificuldade de calcular o excedente do consumidor. Esta dificuldade decorre

do facto de ser impossível calcular o integral do excedente do consumidor no caso geral,

quando os preços variam, já que o integral depende da ordem de integração.

A variação equivalente é um conceito associado à medida de willingness to pay,

assim como a variação compensadora está ligada à willingness to accept.

Definição de variação equivalente – variação equivalente é o rendimento mínimo

que o consumidor está disposto a pagar de forma a manter-se no mesmo nível de

utilidade face a uma variação nos preços de P0 para P1. A variação equivalente mede-se

pelo willingness to pay. Se se quiser manter o consumidor no mesmo nível de utilidade

ter-se-á de retirar rendimento, para compensar da subida do preço. Este valor, na

ausência de imposto, deixa a utilidade individual exactamente no ponto em que estaria

se o imposto fosse lançado. A variação equivalente servirá para medir a variação na

utilidade devido a um imposto. Comparando a variação na utilidade com o imposto

identifica-se a carga excedentária.

Vejamos graficamente a questão:

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Considere-se uma situação inicial dada por 12. dada a variação nos preços de P0

para P(1+t) a restrição orçamental desloca-se para 14. Como queremos calcular a

variação equivalente, vamos traçar uma restrição orçamental paralela à inicial 67.

Traçar esta restrição orçamental significa anular a variação nos preços relativos

A variação equivalente obtém-se deslocando a restrição orçamental para ela ser

paralela à restrição orçamental inicial e tangente à nova curva de indiferença ( recta

67 ). A diferença 16 é o rendimento que se retira ao indivíduo devido à variação (isto é,

devido ao imposto), para o deixar com o bem-estar inicial que teria sem o imposto. Isto

é, 16 é a perda de utilidade do indivíduo associada ao imposto.

Conclusão : O lançamento do imposto faz a quantidade passar de 4 para 11

unidades de X. A quantidade 11 ( quantidade apôs o lançamento do imposto) custaria

antes do imposto 13−1 unidades de Y e após o imposto, apenas 121− . Se tivéssemos

retirado 16 de quantidade Y ao indivíduo, o que é igual a 9.10 , ele manteria a utilidade

equivalente já que apôs o imposto continuamos a consumir X e Y nas proporções

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iniciais. O imposto retirado é 5.10 . Conclui-se que o imposto retirado 5.10 é inferior à

perda de utilidade 9.10 . A diferença 9.5 é a carga excedentária.

A carga excedentária mede-se no gráfico abaixo e corresponde ao triângulo 123 .

A medida do triângulo 123 é :

CE = ½.t.P.(ed.t.P.Q)/P

= ½ ed.t2.P.Q

No equilíbrio inicial sem imposto temos a restrição orçamental 12 e a curva de

indiferença I3. No ponto de tangência 30 o indivíduo iguala a inclinação da curva de

indiferença ( isto é, a TMS ∂UX/∂UY) à inclinação da restrição orçamental ( -PX/PY).

Condição de equilíbrio em “3” Y

X

Y

X

PP

UU

−=∂∂

Lançando o imposto sobre o bem X, à taxa t, o preço relativo de X cresce e a

restrição orçamental altera a sua inclinação para 14 . No novo ponto de tangência 5

verifica-se a tangência entre a nova restrição orçamental e a curva de indiferença I1.

Condição de equilíbrio em “5” Y

X

Y

X

PtP

UU )1( +

−=∂∂

Variação equivalente e variação compensadora

O conceito de variação compensadora foi apresentado por Hicks simultaneamente

ao de variação equivalente. A variação compensadora está ligada ao willingness to

accept. A variação compensadora define-se como o valor que tem de vir de fora do

sistema para compensar o indivíduo da distorção nos preços induzida pelo imposto,

utilizando o rendimento real após o lançamento do imposto. Em termos gráficos ter-se-

ia :

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Variação compensadora = PtP 34)1( + ;

Variação equivalente = PtP 12)1( +

Verifica-se que a variação compensadora para uma descida nos preços é a

variação equivalente de um aumento nos preços. A variação equivalente de uma descida

de preços é a variação compensadora de um aumento dos preços.

Conclusão : Pode-se utilizar quer a variação compensadora quer a variação

equivalente na estimação da variação do bem-estar do lançamento do imposto.

Até este momento admitimos que a curva de oferta era horizontal e correspondia a

custos marginais constantes, consideremos agora a situação com custos marginais

crescentes.

4 – Carga excedentária com custos marginais crescentes

Considere-se a situação de custos marginais crescentes, situação em que a curva

da oferta terá inclinação crescente.

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Considere-se um imposto sobre o bem X. Antes do imposto o preço é P0 e com o

imposto a curva da oferta desloca-se para ST. O produtor tem de aumentar o preço por

forma a pagar o imposto. O preço a que o consumidor procura a quantidade fornecida

após o lançamento do imposto é Pd e o preço a que o produtor oferece é PS. A diferença

vem : T = Pd – PS.

Como o preço pago pelo comprador varia dPd e o preço recebido pelo produtor

varia dPS, o imposto é suportado pelos consumidores e pelos produtores em função das

respectivas elasticidades procura/preço e oferta/preço.

As elasticidades da procura e da oferta vêm :

)0//()0/( pdPqqde ∂∂∂∂=

)0//()0/( psPqqse ∂∂∂∂=

Estas elasticidades podem ser reescritas da seguinte forma :

−∂∂=

0

0.0/PdP

Pqqde

−∂∂=

0

0.0/PSP

Pqqse

O preço do consumidor e do produtor pode assim ser definido por :

)0(00.pdeq

pqdP

+∂

=

)0(00.pseq

pqsP

+∂

=

Como se tem:

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−∂=

−=

desedese

qpq

sPdPT

.00.0

Reescrevendo, temos :

desedese

Pq

Tq .).00(

−=∂

O custo do bem-estar do imposto unitário é :

−=

desedese

Pq

TW .).00(2

21

O custo do bem-estar do imposto ad valorem, com T=t.p vem:

−=dese

deepqTW s.).0.0(2

21

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5 – Tributação óptima com lazer tributável e imposto sobre bens

Continuaremos a analisar a carga excedentária, desta vez recorrendo à tributação

óptima.

A tributação óptima é um corpo normativo da tributação que se preocupa com os

impostos que minimizem a perda de eficiência. Considere-se que o governo pretende

aumentar o seu rendimento através de um imposto sobre bens. Como se pode fixar um

imposto sem carga excedentária ? Existem 3 maneiras de fixar um imposto sem carga

excedentária: (i) lançar um imposto lump-sum; (ii) lançar um imposto sobre o lazer; (iii)

aplicar a regra de Ramsey.

Em princípio um imposto lump sum não possui carga excedentária. Acontece que

o lump sum é um conceito teórico quase nunca utilizado por ser altamente regressivo.

Temos assim que obter um imposto óptimo.

Considere-se a escolha entre lazer (L) e unidades do bem X.

O lançamento de um imposto neste contexto faz aumentar os preços dos bens (P1 e

PX devem estar situados acima dos respectivos custos marginais iniciais, cmg1 e cmgX).

A restrição orçamental vem : I = cmg1.L + CmgX.X, com I= rendimento total.

O imposto é lançado de forma a que os rácios de preços se mantenham constantes.

Considere-se que o governo aumenta os preços acima do custo marginal na taxa equi-

proporcional : P/cmg = I/(I-R). Nesta situação não existe carga excedentária porque não

se alteram as condições marginais, independentemente do sítio onde a curva de

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indiferença for tangente à restrição orçamental. Se o lazer fosse tributável era possível

fixar impostos óptimos para a economia. O problema é que o lazer não é tributável.

6 – Tributação óptima com lazer não tributável : Preços de Ramsey

Quando o lazer não é tributável aplica-se a regra de Ramsey para obter impostos

óptimos.

Regra de Ramsey : Um aumento em todos os impostos na mesma proporção

induzirá uma diminuição proporcional na procura de todos os bens, desde que o

consumidor seja compensado de modo a que se mantenha na mesma curva de

indiferença.

Este resutado pode ser obtido quando as taxas de imposto são fixadas de forma

proporcionalmente inversa à elasticidade-preço da procura.

Considerem-se dois bens, X e Y. Para determinar estas taxas óptimas elas devem

ser fixadas de forma inversamente proporcional à elasticidade do preço. Considere-se

igualmente a carga excedentária de um imposto específico no bem X :

EBX = ½ .eX.PX.X.T2X

A carga excedentária do impos

EBY = ½ .eY.PY.Y.T2Y

Considerando que o Estado pr

é igual ao imposto lançado sobre o

bem Y : PY.Y.TY. Desta forma ob

imposto que se venha a obter pre

.eY.PY.Y.T2Y.

Legenda :

eX = elasticidade preço da procura compensada do bem X; PX = preço do bem X; X = quantidade consumida do bemX; TX = taxa de imposto do bem X.

to no bem Y é :

etende arrecadar o rendimento R que, por definição,

bem X : PX.X.TX ; mais o imposto lançado sobre o

tém-se : R = PX.X.TX - PY.Y.TY. Para qualquer

tende-se minimizar a soma ½ .eX.PX.X.T2X + ½

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O problema vem:

Min (½ .eX.PX.X.T2X + ½ .eY.PY.Y.T2

Y);

sa : R = PX.X.TX - PY.Y.TY

Construindo a Lagrangeana temos :

L = ½ .eX.PX.X.T2X + ½ .eY.PY.Y.T2

Y + λ ( R = PX.X.TX - PY.Y.TY)

Calculando as condições de primeira ordem temos :

∂L/∂TX = eX.PX.X.TX - λ PX.X = 0;

∂L/∂TY = eY.PY.Y.TY - λ .PY.Y = 0;

Resolvendo o sistema obtém-se :

TX/TY = eY/eX

Esta expressão é designada regra da elasticidade inversa ou regra de Ramsey.

Esta regra diz que para minimizar a carga excedentária as taxa de imposto devem

ser fixadas de forma inversamente proporcional às elasticidades-preço dos bens. Nestas

condições a regra satisfaz a Regra de Ramsey.

Para minimizar a carga excedentária é preciso ter presente que esta é consequência

de distorções nas quantidades. Portanto, a redução proporcional de X deve ser igual à

redução proporcional de Y.

TX.eX = TY.eY

TX.[(∂q/qX)/TX] = TY.[(∂qY/qY)/TY]

Por isso é necessário que ∂qX/qX = ∂qY/qY

Vejamos uma situação em que se fixa o mesmo imposto para bens com diferentes

elasticidades.

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Em termos gráficos tem-se para duas procuras compensadas de X e Y o mesmo

imposto, o que é um erro.

Verifica-se que os impostos sobre os bens aumentam com o aumento das elasticidades-

preço da procura. Assim, um impacto sobre X é óptimo se assegurar uma redução

proporcional da procura de X igual à redução proporcional da procura de Y.

Assim, no gráfico acima como as elasticidades são distintas e o imposto é o

mesmo, conclui-se que o rendimento podia ser obtido lançando um imposto sobre X

inferior, com vantagens em termos de carga excedentária. Como X tem menor

elasticidade deveria pagar um imposto superior ao Y com maior elasticidade.

Conclusão: è um erro lançar o mesmo imposto quando as elasticidades são distintas. A

taxa de imposto que minimiza a carga excedentária é fixada de forma inversamente

proporcional à elasticidade-preço.