Autogestado Do Capital
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A autogesto do Capital*1
Pablo Ortellado2
A ltima etapa do desenvolvimento do capitalismo assistiu ao aparecimento de um novo e
estranho fenmeno: a ascenso da economia social ou como ela tambm gosta de ser chamada,
economia solidria ou, ainda, extravagncia dos trpicos, autogesto3. Fenmeno aparentemente
estranho porque faz reaparecer sob a roupagem daquilo que foi a ltima sria contestao do
capitalismo, algo que pode receber apoio concomitante dos sindicatos, de entidades civis no
governamentais e de agncias governamentais de fomento pesquisa e ao desenvolvimento social.
Como se deu essa curiosa ascenso?
A economia social, como conhecida na Europa, um conceito que se refere a toda uma
gama de atividades econmicas, no necessariamente integradas, onde a propriedade jurdica dos
meios de produo parcial ou totalmente dos trabalhadores. Ela se refere, portanto, a uma srie de
fenmenos aparentados, mas diferentes, como as ESOPs americanas, as ECOPs inglesas, os fundos
acionrios sindicais suecos e as cooperativas, que esto em toda partem mas com maior fora na
Itlia e na Espanha.
As cooperativas so muito antigas, tm como marco histrico 1844, data da formao da
cooperativa dos Pioneiros de Rochdale, inspirada por Robert Owen, socialista utpico, como
gostam os marxistas e capitalista prspero4. Desde ento, o cooperativismo foi uma parte integrante
do movimento dos trabalhadores, embora tenha sido obliterado, desde o final dos anos 1870 pelo
socialismo revolucionrio marxista e anarquista e, finalmente, a partir de 1917, pela verso leninista * (Nota do Redator: Texto transcrito da revista dos estudantes de histria da USP, Temporaes. So Paulo, Humanitas,
1999, pp. 147-157)1 Uma verso preliminar desse texto foi apresentada como dissertao ao curso de ps-graduao de Lucia Bruno, na
Faculdade de Educao da Universidade de So Paulo, Educao frente as transformaes ma dinmica do capitalismo.
2 Pablo Ortellado mestrando no departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da Universidade de So Paulo.
3 Antonio Manchado Lozano, presidente da Confederao Espanhola de Economia Social muito consciente das implicaes dos termos. Ele diz: esta terminologia [empresas autogeridas] no a usamos em Espanha, faz j alguns anos. Aqui, caberia uma reflexo sobre o porque eliminamos o termo autogesto em nosso discurso [], em minha opinio, tem sido, entre outras razes, porque encerra alguns matizes polticos que, em toda Europa, tm sido identificados com uma ideologia situada entre o socialismo utpico e o comunismo, o que, em determinado momento, pareceu ruim para competir nos mercados das economias livres. (Perspectivas das empresas autogeridas In: C. G. Vieitez (org.) A empresa sem patro. Marlia, UNESP, 1997, p. 128)
4 de se notar que o marco histrico das cooperativas seja Rochdale (1844) e no New Harmony (1825). Isso demonstra no apenas a preponderncia do modelo das cooperativas de consumo sobre as cooperativas de produo, como tambm o fato da autogesto estar ofuscada pela mstica da propriedade coletiva numa cooperativa de produo, muito alm da questo da propriedade, se coloca cotidianamente a questo da gesto democrtica.
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do socialismo de estado. Ele foi mais ou menos resgatado e comeou a cresce nos anos 60 deste
sculo e abrange hoje porcentagens relevantes da economia de muitos pases (um exemplo:
Espanha, 3% do PIB e 6% do emprego5.
No exatamente uma coincidncia que o crescimento do setor da economia social tenha
comeado junto com os movimentos autonomistas dos trabalhadores nos anos 60 e tenha acelerado
imediatamente depois (final dos anos 70/ incio dos anos 80) mesmo perodo da expanso do novo
modelo produtivo capitalista: a assimilao ocidental dos ensinamentos do toyotismos japons
como lean management6.
Nos anos 60 e 70, uma srie de movimentos de trabalhadores conhecidos como
movimentos autonomistas passou a colocar em xeque, em todo mundo, alguns princpios ento
essenciais ao capitalismo. Esses movimentos caracterizaram-se fundamentalmente pela luta contra
os interesses patronais por meios heterodoxos (isto , fora dos sindicatos): num momento inicial,
roubos e sabotagens, em seguida, greves selvagens, organizao atravs de comisses e ocupaes e
tomadas de fbricas. Nessas tomadas de fbricas, os trabalhadores punham em prtica alguns
princpios de organizao coletiva de produo: rotatividade das tarefas, diminuio ou extino
dos nveis hierrquicos, diminuio da distino entre concepo e execuo atravs da deliberao
coletiva e igualdade entre os cargos (em geral poltica isto , na assemblia, cada homem um voto
mas, em muitos casos, tambm econmica ou seja, nivelando os salrios)
Essas tomadas e a aplicao desses princpios reforou a resistncias anti-tayloristas que
nunca haviam desaparecido e colocou em primeiro plano nas reivindicaes trabalhistas a
modificao da organizao produtiva na vertente revolucionria, para a nova sociedade
comunista, na vertente reformista, para a humanizao das relaes de trabalho. Do ponto de vista
do capital, essas reivindicaes tiveram uma recepo a princpio resistente. Elas pareciam
improdutivas e s foram aceitas e parcialmente incorporadas, na medida em que se mostravam
como a nica sada razovel contra uma possvel e provvel exploso revolucionria7.
Foram precisos os estudos pioneiros das novas teorias da administrao para que se
comeasse a ver que havia efetivamente uma elevao da produtividade com as tcnicas gerenciais
participativas, com o trabalho em equipe, com a rotatividade das tarefas e com a diminuio dos
5 Ibid., p. 197.6 Para uma panormica destes princpios, veja Heinz Metzen e Dirk Bsenberg, Lean management. S. l. CETOP,
1993.7 Para uma exposio terica detalhada dessa tese, veja Joo Bernardo, Economia dos conflitos sociais. So Paulo,
Cortez, 1991.
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nveis hierrquicos. Mas foi, sem dvida o exemplo da indstria automobilstica japonesa o
argumento decisivo em favor de uma mudana fundamental, de uma profunda reestruturao
produtiva.
Os japoneses que, ironicamente, haviam aprendido com a sociologia do trabalho americana
dos anos 40, mostravam agora para os ocidentais as virtudes de seu modelo produtivo: grosso
modo, trabalho em equipe, reduo do desperdcio dos estoques e descentralizao das decises no
fundamentais. Receita essa a que os ocidentais deram seu tempero: em oposio estabilidade e ao
compromisso de trabalho para toda vida das empresas japonesas (receita do temporrio
apaziguamento do conflito de classes), estabeleceu-se uma precarizao das relaes de trabalho,
com aumento do trabalho de meio perodo, do trabalho temporrio e a reduo dos benefcios
trabalhistas.
Tudo isso, casado com o enxugamento dos quadros causado pela reestruturao produtiva
gerou um enorme desemprego. E foi no rastro desse novo desemprego que a economia social
encontrou seu empuxe. Retomada agora, no como alternativa socialista, mas, pelo menos
declaradamente, como uma alternativa capitalista ao problema do desemprego, a economia social
encontra apoio em sindicatos, organizaes no governamentais e agncias estatais de fomento
(embora, por outro lado, ainda sofra enormes resistncias: em alguns sindicatos e na justia do
trabalho que, no adaptados, temem tornar-se anacrnicos e numa parcela do empresariado que
teme que iniciativas bem sucedidas ameacem sua hegemonia).
Mas, apesar desse arranque recente, o desenvolvimento das cooperativas, mesmo no Brasil,
dos anos 608. Ele fazia parte, inicialmente, do movimento contestador dos anos 60 e 70 e se
apresentava frequentemente como uma alternativa em germe forma de organizao capitalista.
Imediatamente em seguida, o movimento cooperativista soube se adaptar ao refluxo dos
movimentos sociais e implantao de novas formas de organizao do trabalho para se lanar
como um alternativa humana onde se casavam gesto democrtica e reduzida perda dos postos de
trabalho.
Tudo isso, claro, desvinculado de pretenses polticas e discursos ideolgicos explcitos.
Vale lembrar que a legislao brasileira sobre cooperativas (que regulamenta e d incetivos) de
1971, do auge do regime militar e que um elemento importante do universo da economia social, as
ESOPs (plano de venda de aes para os trabalhadores), foram criadas tambm nos anos 70 por um
8 Organizao das Cooperativas Brasileiras. Autogesto ao alcance das cooperativas. S. l., s.d.
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senador conservador americano para contrabalanar as exigncias radicais da esquerda e constituir
uma alternativa controlada de democratizao da propriedade.
importante notar que as cooperativas tem tido, nos ltimos tempos, relativo apoio dos
governos e tem se mostrado um parte importante e inofensiva dos programas sociais que visam
diminuir o impacto social do capitalismo globalizado9. A favor delas, os estudos mostram que
empresas cooperativas demitem menos nas pocas de crise, do maior estabilidade e salrios um
pouco melhores do que empresas convencionais10. Por outro lado, essas cooperativas s conseguem
se manter na medida em que esto na periferia da concorrncia capitalista global, em setores onde
no h muita competio e onde no so necessrios grandes investimentos. Mesmo na Espanha,
onde h um relevante setor cooperativos, as mdias (menos de 50 trabalhadores) e principalmente
as pequenas empresas (menos de 10 trabalhadores), constituem 98% das cooperativas11. E no ser
surpreendente que, tambm na Espanha, se encontre o perfil das cooperativas que Cndido Vieitez
v no Brasil: 1) frequentemente cooperativas esto afeitas a atividades rurais ou suburbanas; 2) as
cooperativas de consumo tm constitudo um plo relativamente expressivo; 3) o artesanato uma
das atividades que tem propiciado a formao de pequenas cooperativas; 4) uma das formas mais
correntes de organizao cooperativa resulta da associao de pequenos produtores independentes;
5) h agora formao de cooperativas a partir de estabelecimentos capitalistas em processo de
falimentar e que so assumidos pelos trabalhadores.12
Podemos, levando essas observaes adiante, generalizar um pouco e afirmar que as
cooperativas autogeridas (que devem ser distinguidas das cooperativa com gesto tradicional) s
subsistem na medida em que esto menos expostas competio global, em que no necessitam de
grandes investimentos e em que a atividade em baixa produtividade mdia13. Talvez mesmo o
contra-exemplo que normalmente se aponta, Mondragn, s tinha podido substituir na medida em
que abandonou definitivamente os traos autogestionrios que apresentou em algum momento por
exemplo, quando expandiu os procedimentos representativos e ampliou a diferenciao salarial.
Mas porque as cooperativas autogeridas s conseguem se manter na medida em que esto na
9 Para alguns dados importantes tanto para o Brasil, quanto para o mundo sobre a reduo do emprego nessa nova fase do capitalismo, veja o artigo de Gilberto Dupas, A lgica da economia global e a excluso social Estudos Avanados 34 (1998). Para as polticas sociais que tentam minimizar o impacto da excluso (que aparecem estar se expandindo), do mesmo autor: A lgica econmica global e a reviso do Welfare State Estudos Avanados 33 (1998): 171-183.
10 Lozano, Op. Cit., passim, mas sobretudo, p. 133.11 Ibid., p. 132.12 Temas da autogesto dos trabalhadores In: Vieitez (org.) Op. Cit., pp. 9-24.13 Dois desses traos foram utilizados por Hans Jrgen Rsner na confeco de um grfico que visava analisar a
estabilidade dos empregos. Veja, Concorrncia global: consequncias para a poltica de negociao capitalista In: O trabalhado em extino? So Paulo, Centro de estudos da Fundao Konrad Adenauer Stiftung, 1996, p. 30.
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periferia do capitalismo? Talvez porque seu princpio esteja em contradio fundamental com o
princpio capitalista. Quanto mais democrtica uma empresa, quanto mais discute coletivamente
os problemas, quanto mais cria mecanismos de apropriao autnoma do trabalho, menos ela
eficiente do ponto de vista capitalista, porque atravanca a produo com assembleias, porque tem
baixa produtividade e porque no consegue se adequar s exigncias do mercado capitalista:
cumprir prazos heternomos, fornecer representantes com autonomia decisria, etc.
Porque vemos hoje ento, mais uma vez, a ascenso no Brasil de empresas autogeridas? O
que representa hoje a ANTEAG (Associao Nacional dos Trabalhadores de Empresas
Autogeridas), a ATC (Associao Trabalho-Capital) e as Incubadoras de Cooperativas das
universidades?
Em primeiro lugar, preciso lembrar que o que levou criao da ANTEAG e depois da
ATC foram as falncias generalizadas das indstrias no Brasil causadas pela brusca abertura
concorrncia internacional levada a cabo desde o governo Collor. Algumas dessas empresas, logo
aps ou um pouco antes de falirem, foram assumidas pelos trabalhadores que tinham assim a
possibilidade de manter a empresa e seus empregos, ainda que, que em geral, a muito custo:
menores salrios e instabilidade, seja pela situao da empresa no mercado, seja pelo prprio
despreparo administrativo dos envolvidos. Foi no cenrio dos primeiros repasses de empresas aos
trabalhadores que algumas pessoas ligadas aos sindicatos e suas agncias de pesquisa resolveram
sistematizar uma metodologia que pudesse facilitar a adaptao ao novo regime e fazer a empresa
prosperar. Foi assim que se criou a ANTEAG e depois a ATC com seus assessores e diretores
tcnicos.
Mais ou menos no mesmo perodo, antigos militantes da Campanha contra a fome ligados
a UFRJ comearam a desenvolver um projeto que visava gerar emprego para a populao de baixa
renda atravs da formao de cooperativas populares de servio. Nasci assim a Incubadora
Tecnolgica de Cooperativas Populares, cujo modelo inspirou outras semelhantes em diversas
universidades do pas (treze, at o momento14).
Mas quais so as caractersticas e perspectivas dessas cooperativas e qual o alcance da sua
autogesto? Elas so antes de tudo, cooperativas criadas naquela periferia do capitalismo: empresas
de produo falidas que no resistiram competio internacional e pequenas empresas populares
de servio (empresas de limpeza, artesanato, etc.) Elas possuem portante aquelas condies de
14 Sobre as Incubadoras, veja o artigo de Henrique Parra, neste volume. (Uma experincia no fio da navalha. [N.R])
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desenvolverem os mecanismos democrticos. Mas at que ponto eles podem faz-lo e at que ponto
os gestores encarregados de implant-los pretendem faz-lo?
Comecemos pela segunda questo. Qual o programa dessas organizaes que pretendem
promover as cooperativas autogeridas: as Associaes de empresas, as Incubadoras, os sindicatos,
as organizaes da Igreja? Todas essas organizaes tm suas diferenas, mas talvez no seria
despropositado dizer que nenhuma delas tem um programa poltico explcito. Externamente, para o
pblico geral e para as agncias governamentais, elas alegam buscar apenas resolver o problema do
desemprego criar novos empregos ou evitar que os empregos de empresas falidas se percam. Mas,
extra-oficialmente, elas alimentam discretamente o sonho de ver as cooperativas prosperarem e se
multiplicarem at abrangerem empresas de alta tecnologia e competitividade e constiturem uma
poro significativa do PIB.
H ainda, nos casos de maior politizao, uma retomada do programa owenista de
transformao social pela difuso de empreendimentos cooperativos. claro que tudo isso agora
pincelado com conceitos marxistas, de forma a se conseguir uma sntese do rigor cientfico do
materialismo histrico e o perfume renovado do socialismo utpico. Alm disso, so incorporados:
incentivos fiscais s cooperativas, crdito privilegiado, etc. Mas at onde poderamos mesmo pensar
que um tal cenrio levaria a uma efetiva transformao social?
Se queremos casar crescimento econmico com democracia na gesto do trabalho e
atenuao das diferenas sociais, ento podemos pensar numa retomada j em si complicada do
Welfare State com uma poltica de promoo de cooperativas autogeridas. Mas, tudo isso se apia
em alguns pressupostos: na crena de que lgica atual da concorrncia capitalista global permite
polticas sociais crescente, na crena de que as empresas autogeridas possam abranger setores
competitivos, de alta tecnologia e produtividade sem se descaracterizar e, finalmente, que o que se
entende por autogesto efetivamente o avesso socialista do capitalismo.
E se nenhum desse pressupostos parece receber confirmao definitiva da experincia,
podemos fazer as seguintes observaes. Do ponto de vista da militncia: ser que a burocracia
encarregada de fomentar a autogesto (os assessores, os tcnicos, os diretores, etc.) se encarregar
de promover a capacitao administrativa do coletivo dos trabalhadores, buscando sua autonomia, e
no far apenas a formao de lideranas, que cria gestores na empresa que, por sua vez, dependem
de gestores nas instituies que os formam? Do ponto de vista terico: se essa concepo da
autogesto no leva em conta o papel dos gestores (ou da burocracia, como preferir), ela parece
confirmar a confuso que se v na teoria entre o carter coletivo da propriedade e o carter coletivo
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das relaes de produo15. No porque a propriedade da empresa igualmente dividida que a sua
gesto democrtica mesmo se os diretores so eleitos.
Alm disso, devemos apenas constatar que, para alguns desses entusiastas das cooperativas,
duas caractersticas essenciais do capitalismo so consideradas compatveis com um regime de
autogesto: a desigualdade salarial e a manuteno da lgica capitalista de ampliao crescente da
produo (e, antes de tudo do Capital). Esses dois traos esto evidentemente lugados; faz parte
essencial da lgica capitalista a promessa de ganhos diferenciados (ou seja, ganhos maiores
relativos) para os bem-sucedidos e mesmo ganhos absolutamente maiores para o mal-sucedidos.
tambm por isso que a igualdade salarial faz parte de qualquer reivindicao autogestionria:
porque alm de ser incompatvel (mais do que isso, contrria) com uma gesto hierrquica do
trabalho, ela rompe com a lgica capitalista do crescimento da produo desigualmente distribudo
pois se no h distino salarial no h motivao heternoma para o aumento da produo e do
consumo16.
Se no rompemos com a lgica que forma gestores, ento temos apenas novas
diferenciaes mascaradas pelo carter coletivo da propriedade a repetio ligeiramente
modificada do equvoco que levou a considerar a Unio Sovitica um regime socialista. Ainda que
se supere esse problema e se crie instituies que visem no formar gestores vindos do cho da
fbrica, mas fomentar a autonomia administrativa do coletivo dos trabalhadores, resta enfrentar o
problema da desigualdade salarial e do carter capitalista da produo. Claro que isso no pode ser
resolvido no capitalismo: no se pode nivelar salrios, nem diminuir o ritmo da produo, porque o
empreendimento se inviabiliza economicamente. Mas preciso colocar essas questes como
problemas, como desafios a serem superados e no como dados pressupostos da economia. Do
contrrio, se tudo for bem-sucedido, no melhor dos casos, teremos apenas um pouco mais de
democracia no capitalismo, levaremos apenas as tendncias participacionistas do toyotismos ao seu
limite capitalista, teremos apenas a autogesto do capital.
15 A esse respeito, veja o texto de Joo Bernardo, nesse volume (Autogesto e socialismo [N.R.]) e tambm Castoriadis, Les rapports de production em Russie In: La Socit bureaucratique, tome 1. Paris, Union Gnrale d'ditions, 1973.
16 Quanto a esse ponto complicado e polmico, posso aqui apenas remeter a Castoriadis. Veja as pginas finais de Valor, igualdade, justia, poltica In: As encruzilhadas do labirinto. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987, pp. 264-335 e tambm, A hierarquia dos salrios e dos rendimentos In: A experincia do movimento operrio. So Paulo, Brasiliense, 1985, pp. 247-258.
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