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AS FÁBULAS COMO ESTÍMULO À FORMAÇÃO DE LEITORES

Autora: Elizeth Morais do Amaral1

Orientadora: Mirian Schröder2

Resumo

Este artigo tem como objetivo relatar as ações e experiências da implementação da Unidade Didática sob o título “As Fábulas como estímulo à formação de leitores”, que contemplou alunos do 6° ano do Ensino Fundamental da rede pública estadual. O trabalho foi desenvolvido com a intenção de contribuir para a formação do leitor crítico, voltado aos estudos de aspectos discursivos, bem como aos elementos composicionais, temáticos e estilísticos das Fábulas, para tanto foi empregada a fundamentação teórica pautada em Bakhtin (1988); Kleiman (2000); Koch e Elias (2010); Koch (2003); Marcurschi (2006) e Solé (1998). A partir desta base teórica, os gêneros textuais foram tomados como objeto de ensino de Língua Portuguesa, uma vez que refletem a interação dialógica da comunicação humana. Nessa interação, a opção pelo gênero textual Fábula é relevante, por possibilitar o trabalho com o imaginário dos alunos, promover discussões e questionamentos a respeito, sobretudo, dos valores de amizade, companheirismo e respeito às diferenças. O presente trabalho oportunizou aos alunos envolvidos o desenvolvimento de habilidades de leitura, a utilização de estratégias de leitura; a produção de inferências (com o uso de seu conhecimento prévio sobre o assunto); a leitura com objetivo; o conhecimento dos elementos que compõem a estrutura da Fábula (composição, estilo e conteúdo temático); bem como o reconhecimento da Fábula dentre outros gêneros.

Palavras chave: Leitura; Gênero Textual; Fábula; Ensino.

1 Introdução

1 Professora do Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE – 2010/2011, com atuação no Colégio Estadual "Vinícius de Moraes" – Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante. Tupãssi, PR. Graduação em Letras – Português. Pós-Graduação Lato Sensu O Processo Ensino-Aprendizagem: Uma Fundamentação Filosófico-Antropológica e Técnico-pedagógica; Especialização em Administração, Supervisão e Orientação Educacional. 2 Dra. em Letras (UFPR), professora orientadora vinculada à Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Campus de Marechal Cândido Rondon.

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O presente artigo é o resultado de pesquisas e estudos realizados no

Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), criado pelo Governo do Estado

do Paraná em parceria com as Instituições de Ensino Superior (no caso, UNIOESTE

– Universidade Estadual do Oeste do Paraná). A temática escolhida para o estudo e

o desenvolvimento do projeto foi a leitura, sendo o objetivo central incentivar a

formação de leitores a partir do gênero Fábula.

A problemática geradora desse trabalho surge do número excessivo de

alunos com dificuldade em compreensão, interpretação e pouca prática de leitura,

bem como pela hipótese de que a leitura possa contribuir para a superação desses

problemas.

Segundo Solé (1998), o processo da leitura deve garantir que o leitor

compreenda o texto e seja capaz de construir uma ideia sobre o seu conteúdo,

tirando dele o que é essencial e interessante. A Fábula, por ser uma narrativa

simples e direta, permite o avanço e o retrocesso textual, possibilitando ao leitor

parar, pensar, relacionar a informação com o conhecimento prévio e decidir o que é

mais importante. Sendo esse um processo que deve ser ensinado na escola.

Soares (2000) comenta que as práticas de leitura na escola seguem uma

rotina descontextualizada, na qual os procedimentos transformam-se num processo

mecânico que contribui para o desinteresse dos alunos. A prática com a leitura deixa

de ter valor em si, para transformar-se num pretexto para o trabalho com a

gramática, impedindo que o leitor-aluno se manifeste no contato com o texto. O

gênero Fábula permite que o professor trabalhe com a leitura na escola de maneira

interessante, apresentando aos alunos o mundo prazeroso da leitura. Isso faz

pensar em uma prática contextualizada que contribua para a formação do leitor.

Sendo assim, para trabalhar a leitura de maneira contextualizada na escola,

o professor precisa compreender que a prática da mesma não se “reduz à somatória

dos significados individuais dos símbolos (letras, palavras, etc.), mas obriga o leitor a

enquadrar todos esses elementos no universo cultural, social e histórico em que o

escritor se baseou para escrever.” (CAGLIARI, 2003, p.105). Por isso, a leitura não

se constitui em uma atividade mecânica, necessitando ir além da simples

decodificação de palavras. É um processo de assimilação e reflexão dentro do

contexto de interação social.

A proposta didática em questão contemplou alunos do 6° ano do Ensino

Fundamental do Colégio Estadual Vinícius de Moraes - E.F.M.P, no município de

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Tupãssi – PR. Com a intenção de contribuir para a formação do leitor crítico,

mediante atividades didáticas de leitura geradoras de novas experiências para os

alunos, foi selecionado o gênero textual Fábula por ser tratar de uma tipologia

presente na vida dos alunos e capaz de contribuir para o estímulo à leitura. Esse

gênero textual constitui-se de narrativa curta e agradável, com acontecimentos

fictícios, de fácil compreensão e cuja finalidade é entreter e instruir.

A opção pelo gênero textual Fábula é relevante por possibilitar o trabalho

com o imaginário dos alunos, promover discussões e questionamentos a respeito de

diferentes temas do cotidiano, sobretudo, dos valores de amizade, companheirismo

e respeito às diferenças. Tais discussões propiciam reflexões certamente

promotoras de transformações de ideias, comportamento e até mesmo de conceitos.

O presente trabalho oportunizou ao aluno desenvolver habilidades de leitura,

utilizar-se de estratégias leitoras que permitam levá-lo à análise dos textos; fazer

inferências (usando seu conhecimento prévio sobre o assunto); ler com objetivo;

conhecer os elementos que compõem a estrutura da Fábula (composição, estilo e

conteúdo temático); reconhecer as características do(s) personagem(s) e reconhecer

a Fábula frente a outros gêneros.

Foi constatado que para atingir os objetivos almejados, o professor deve

promover uma prática constante de leitura organizada em torno de uma diversidade

de gêneros, com objetivos e estratégias definidas. E principalmente proporcionar aos

alunos um convívio estimulante com a leitura, sem o caráter de obrigatoriedade.

Este artigo está organizado em três partes: na primeira, apresentam-se as

teorias e os conceitos dos autores nas quais a pesquisa está ancorada, na segunda,

apresenta-se o desenvolvimento da Unidade Didática e, por fim, os resultados

alcançados na implementação do trabalho desenvolvido.

2 Fundamentos teórico-metodológicos do trabalho

2.1 Leitura

A leitura é um dos mais importantes meios para se chegar ao conhecimento.

Por isso, torna-se necessário gostar e aprender a ler, dando sentido às palavras. O

bom leitor é aquele que faz uma análise do texto, aprofundando-se na compreensão

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dos detalhes a fim de poder construir o seu próprio entendimento, fazendo

inferências com os conhecimentos já adquiridos.

Segundo Lajolo (1997, p.106), “cada leitor na sua individualidade, vai

entrelaçando o significado pessoal de suas leituras com vários significados que, ao

longo da história de um texto, este foi acumulando.”

No entendimento de Koch e Elias (2010, p. 37), a leitura “[...] é uma atividade

de construção de sentido que pressupõe a interação autor-texto-leitor, é preciso

considerar que nessa atividade, além das pistas e sinalizações que o texto oferece,

entram em jogo os conhecimentos do leitor.”

Sendo assim, é importante praticar a leitura em diferentes contextos para

conhecer as intenções e os interlocutores do discurso. É nessa dimensão dialógica

discursiva, como preconiza Bakhtin (1988), que a leitura deve ser trabalhada,

reconhecendo as vozes sociais e as ideologias presentes no discurso que ajudam

na construção de sentido de um texto e compreensão das relações de poder a ele

inerentes. O autor citado afirma que o discurso é feito de sentidos entre

interlocutores, ou seja, se constrói no processo de interação entre sujeitos.

Os discursos não existem por si mesmo, mas se relacionam com outros

sentidos e nas condições em que são produzidos. É, portanto, no espaço discursivo

criado na relação entre sujeitos que estes se constituem socialmente, pois o

discurso parte de um lugar determinado por condições sócio-históricas de produção.

Assim sendo, a língua é um fenômeno cultural, histórico, social e cognitivo que sofre

mudanças ao longo do tempo e de acordo com os usuários, por isso funciona numa

relação dialógica (BAKHTIN, 1988). Portanto, com a língua pode-se construir

sentido, expressar sentimentos, ideias e desejos. Ela se manifesta nos processos

discursivos e se concretiza nos usos dos mais variados gêneros.

Segundo Koch (2003), o sujeito entendido como entidade psicossocial,

representa o indivíduo ativo, que apresenta habilidade para interagir na sociedade,

sendo capaz de se relacionar. Por isso mesmo, é social, histórico e se constitui na

interação com o outro.

A língua é viva e só tem sentido se estiver interligada ao contexto em que é

utilizada. Nessa concepção interacional (dialógica) da língua, os sujeitos são

construtores sociais e o texto é considerado o lugar da interação. Nesse sentido, os

interlocutores dialogam ativamente para construir o sentido do texto. De modo que,

para a compreensão das informações explícitas e implícitas do texto, faz-se

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necessário ativar o contexto sociocognitivo dos agentes da interação (BAKHTIN,

1988).

Sendo assim a compreensão deixa de ser “captação’’ de informação e passa

a ser algo mais completo. Koch (2003, p. 17, grifos da autora) lembra que a leitura

se constitui em:

Uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza, evidentemente, com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas que requer a mobilização de um vasto conjunto de saberes (enciclopédia), e sua reconstrução no interior do evento comunicativo. O sentido do texto é, portanto, construído na interação texto-sujeitos (ou texto-co-enunciadores) e não algo que preexista a essa interação.

A interação entre autor-texto-leitor é necessária para ativar os

conhecimentos prévios dos alunos. Os elementos presentes no texto, quando

aliados aos elementos do contexto sociocognitivo, ajudam na interlocução e na

consequente construção de sentido do texto.

Segundo Koch e Elias (2010), os conhecimentos armazenados para um bom

desempenho no processamento (compreensão) textual estão relacionados ao

conhecimento linguístico, ao conhecimento enciclopédico ou conhecimento de

mundo e ao conhecimento interacional (sociointeracional).

O conhecimento linguístico é o conhecimento gramatical e lexical

responsável pela articulação entre som e sentido (organização do material linguístico

na superfície textual; o uso dos meios coesivos; a seleção lexical adequada ao

tema). O conhecimento enciclopédico ou de mundo é o conhecimento alusivo a

vivências pessoais e se encontra armazenado na memória, permitindo a produção

de sentidos. O conhecimento interacional (sociointeracional) compreende formas de

interação por meio da linguagem. Esse tipo de conhecimento engloba o

conhecimento ilocucional relacionado ao reconhecimento de objetivos/intenção do

produtor do texto; o conhecimento comunicacional ligado à informação necessária

para reconstruir a variante linguística adequada e a adequação textual do gênero à

situação comunicativa; o conhecimento metacomunicativo que permite ao locutor

assegurar a compreensão do texto, sanando dúvidas e conflitos ocorridos, desta

forma permite conseguir a aceitação pelo parceiro dos objetivos com que é

produzido; e o conhecimento superestrutural ou conhecimento sobre os gêneros

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textuais que viabiliza o reconhecimento dos gêneros, os tipos de textos bem como a

relação entre objetivos e estruturas textuais (KOCH; ELIAS, 2010).

Em relação à compreensão do texto, Koch e Elias (2010) consideram que o

contexto é indispensável para o entendimento e a construção da coerência textual,

uma vez que o contexto cognitivo reúne os conhecimentos linguísticos e os

enciclopédicos, sobre gêneros e tipos textuais, estilístico (variedades da língua) e o

conhecimento de outros textos que permeia a cultura (intertextualidade). Estes

elementos ficam armazenados na memória dos leitores e são relevantes para que o

interlocutor possa utilizá-los na interpretação de um texto.

Fazendo uso desses conhecimentos, o aluno tem a capacidade de descobrir

a intenção do texto e a sua lógica, compreendendo e fazendo uma interpretação

adequada de seu significado. Portanto, “[...] o papel central da leitura não é ler para

aprender a ler, mas ler por um claro interesse em saber o que diz o texto.”

(KLEIMAN, 2000, p. 35).

De acordo com Koch e Elias (2010), os objetivos do leitor orientam a sua

forma de leitura, com mais ou menos atenção, em conformidade com a sua

finalidade. A leitura, literária ou não, vai se constituindo diferentemente dependendo

do leitor: seu lugar social, seus conhecimentos, seus valores e suas vivências.

Esses conhecimentos são diferentes de um leitor para outro, por isso a pluralidade

de leituras. Um mesmo texto pode ser interpretado a partir de visões diferentes,

dependendo do conhecimento cognitivo de cada um.

No conjunto dos conhecimentos essenciais para o contexto da leitura, Koch

e Elias fazem menção à intertextualidade. As autoras consideram que este elemento

é constitutivo do processo, compreendendo as diferentes formas “[...] pelas quais a

produção/recepção de um dado texto depende de conhecimentos de outros textos

por parte dos interlocutores, ou seja, dos diversos tipos de relações que um texto

mantém com outros textos.” (2010, p. 86). A intertextualidade contribui para a

compreensão da leitura, pois é um processo construtivo que leva o leitor a buscar

conhecimentos de outros textos para concretizar a recepção do conteúdo.

Koch e Elias (2010) também destacam que há vários fatores que podem

comprometer a compreensão textual: os aspectos materiais (o tamanho e a clareza

das letras; o comprimento das linhas; a construção de parágrafos muito longos;

excesso de abreviações, etc.), assim como fatores linguísticos (o léxico; ausência de

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sinais de pontuação ou inadequação no uso desses sinais; estruturas sintáticas

complexas, etc.).

A leitura se efetiva no ato da recepção, dando forma ao caráter individual

que ela possui, pois “[...] depende de fatores linguísticos e não-linguísticos: o texto é

uma potencialidade significativa, mas necessita da mobilização do universo de

conhecimento do outro - o leitor - para ser atualizado.” (PERFEITO, 2005, p. 54-55).

Esse processo implica uma resposta do leitor ao que lê. No ato da leitura, um texto

leva a outro, fazendo com que o leitor participe da elaboração dos significados,

confrontando o texto com o próprio saber e sua experiência de vida. É a leitura que

abre o espaço pessoal de formação e compreensão de si próprio e do meio que o

cerca.

Para Silva (2005, p. 24):

[...] a prática da leitura é um princípio de cidadania, ou seja, o leitor cidadão, pelas diferentes práticas de leitura, pode ficar sabendo quais são suas obrigações e também pode defender os seus direitos, além de ficar aberto às conquistas de outros direitos necessários para uma sociedade justa, democrática e feliz.

Frente a esta realidade, a escola precisa oportunizar uma prática de leitura

em diferentes contextos para que os alunos tenham conhecimentos das esferas

discursivas em que os textos são apresentados, levando-os a reconhecer as

intenções e os interlocutores do discurso.

A experiência como leitor(a) tem um peso muito importante para a

compreensão do texto, de modo que surge a necessidade de proporcionar

momentos de interação com obras literárias para o exercício continuado de leitura,

alcançando resultados cada vez mais eficientes. Conforme afirmam Evangelista,

Brandão e Machado (2006, p. 247),

[...] quanto mais o indivíduo estiver exposto aos estímulos da cultura livresca, melhor leitor ele será e, consequentemente, um ser humano mais rico, por somar os conhecimentos que traz da experiência oral empírica àqueles que a escrita pode lhe oferecer.

O objetivo do professor deve estar atrelado à necessidade de atuar com uma

prática de leitura na escola que contribua para a formação de leitores críticos,

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capazes de interagir com o texto nas diversas dimensões de natureza social e

institucional, para ampliar essa capacidade leitora em todas as situações da vida

cotidiana.

Assim sendo, as estratégias de leitura são fundamentais para realizar a

compreensão na prática com qualquer gênero textual. Segundo Menegassi (2005),

es estratégias de leitura implicam na seleção, antecipação, inferência e verificação.

A seleção consiste em ações que possibilitam ao leitor ficar atento somente

ao que lhe é útil para a compreensão do texto, desprezando itens considerados

irrelevantes. A seleção é um recurso muito importante para a opção de textos,

assim como para suas ideias relevantes. Desta forma, ao ler um texto, o leitor não se

apropria de todas as informações ali presentes, pois ele opta por aquilo que é mais

necessário em razão do seu objetivo de leitura.

Por isso que o ensino que se efetiva em sala de aula sobre as estratégias de leitura deve ser consciente de seu processo, para não causar danos na leitura do aluno, a partir da internalização de procedimentos inadequados ou, até mesmo, a falta deles. (MENEGASSI, 2005, p. 80).

Marcuschi (1999, p.104) ressalta que

[...] a leitura é um processo de seleção que se dá como um jogo com avanço de predições, recuos para correções, não se faz linearmente, progride em pequenos blocos ou fatias e não produz compreensões definitivas. Trata-se de um ato de interação comunicativa que se desenvolve entre o leitor e o autor, com base no texto, não se podendo prever com segurança os resultados. Mesmo os textos mais simples podem oferecer as “compreensões” mais inesperadas.

Já a antecipação refere-se às predições que o leitor estabelece a respeito de

um determinado texto que está lendo, propiciando-lhe a antecipação do conteúdo,

mantendo a atenção no material determinado inicialmente. De acordo com

Menegassi (2005, p. 80), durante a leitura do texto, o leitor “[...] cria hipóteses e

previsões sobre os significados a partir das informações explícitas e implícitas

constantes no texto. Essas antecipações podem ser comprovadas ou não.”

Caso as hipóteses sejam comprovadas, o leitor passa a ter mais confiança

nas estratégias escolhidas, dando, assim, continuidade ao procedimento inicial, pois

entende que está no caminho certo. Entretanto, caso tenha suas predições não

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comprovadas, será necessário rever seu procedimento, reavaliando o uso das

estratégias, readequando-as, fazendo opção por uma estratégia que viabilize uma

antecipação mais eficiente.

As inferências consistem em ações que integram o conhecimento que não

está explícito no texto. Contudo, no entendimento de Menegassi (2005, p. 81), é

“[...] possível de ser captado, com o conhecimento que o leitor tem sobre o assunto.

Na verdade, é uma ponte de sentido que o leitor cria com o texto lido, construindo

uma nova informação, que não existia antes no texto, nem no leitor.”

Ao propor a leitura como processo inferencial, conforme Marcuschi (1999, p.

95), o educador estará “[...] isolando apenas um aspecto no conjunto de uma série

de atividades cognitivas realizadas durante a leitura. A leitura adulta é uma atividade

que envolve elaborações semânticas, pragmáticas, lógicas e culturais, entre outras.”

Para o autor, depende de uma série de fatores linguísticos e extralinguísticos, sendo

algo muito mais complexo que a decifração de um suposto “sentido literal”.

Mediante o ensino de abordagens baseadas na inferência, estaremos ensinando ao aluno a conviver com a vagueza que caracteriza o nosso conhecimento de grande número de palavras. Ao trabalharmos a inferência lexical, ensinamos principalmente uma atitude, isto é, que a convivência com a vagueza é possível, e mais, é comum, faz parte do cotidiano. Quanto à língua ensinamos também como analisar o contexto lingüístico em que um vocábulo desconhecido se insere enquanto fornecedor de pistas para inferir o significado do desconhecido (KLEIMAN, 2000, p. 73).

A autora citada considera importante definir claramente a tarefa para o

aluno, isto é, conscientizá-lo sobre as diversas maneiras de aprender a importância

do vocabulário amplo e diversificado para a leitura, bem como a possibilidade de

conviver com significados parciais e inexatos. As experiências e as crenças

individuais influenciam na organização das inferências durante a leitura.

Como lembra Marcuschi (2006, p. 248), os conhecimentos individuais afetam

decisivamente a compreensão, de modo que o sentido não reside no texto, “[...] o

sentido não está nem no texto nem no leitor nem no autor, e sim numa complexa

relação interativa entre os três e surge como efeito de uma negociação.”

Assim, embora o texto permaneça como o ponto de partida para a sua

compreensão, ele só se tornará uma unidade de sentido na interação com o leitor.

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Ao ler um texto, o leitor aciona os conhecimentos prévios que tem arma-zenado em sua memória sobre o tema. Nesse momento, o leitor complementa o texto a partir de atribuições baseadas nas pistas textuais oferecidas pelo autor que produziu o texto, considerando-se, é claro, os conhecimentos do leitor que são evocados durante a leitura. Assim, a imagem da ponte de sentido se constrói, pois ela une o texto e os seus significados implícitos, com o leitor, que explicita esses significados (MENEGASSI, 2005, p. 81).

As inferências construídas são resultantes da integração dos conhecimentos

prévios do leitor, relativos ao assunto do texto, com as informações que o texto

apresenta. Durante a leitura, o leitor observa as possibilidades elencadas através

das inferências que vai construindo na antecipação da leitura, comprovando-as ou

descartando-as.

A verificação/confirmação ou não das antecipações e das inferências

realizadas se constrói no processamento da leitura do texto. Para Menegassi (2005),

a estratégia de verificação controla a eficácia das estratégias escolhidas pelo leitor.

O leitor sente mais segurança a cada confirmação das predições levantadas e das

inferências realizadas. Tal fato lhe possibilita uma melhor edificação de sentido para

o texto trabalhado. Caso a verificação desvende que as hipóteses de significado

estão inadequadas, caberá ao leitor modificá-las, visando uma opção mais acertada

do texto trabalhado.

As estratégias são relevantes e devem ser ensinadas para auxiliar na

formação do aluno-leitor, pois o leitor as utiliza para a compreensão e a lembrança

do que lê. A cada experiência, o leitor adquire novos conhecimentos e interage com

o texto, estabelece relações entre o que lê e os conhecimentos prévios

armazenados, questiona o conhecimento adquirido, consegue fazer relação com o

que já tinha na memória, permitindo sua utilização em outros contextos sociais

diferentes do âmbito escolar. Além de servir para detectar os possíveis erros ou

falhas de compreensão. É preciso ressaltar que “todos os leitores experientes

utilizam as estratégias de forma inconsciente” (SOLÉ, 1998, p.71).

De acordo com Costa (2007, p. 23), a leitura vinculada à literatura traz

conhecimento e, consequentemente, crescimento intelectual, portanto cabe ao

professor, por meio da leitura literária, oportunizar aos alunos comentar, questionar e

contar a história.

Segundo Kleinschmidt (2002, p. 230), “a viagem através da leitura literária

faz com que o aluno tenha a capacidade de fazer inferências e estabelecer relações

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do que leu com outras leituras e experiências.” É também na exploração da fantasia

e da imaginação que se instiga a criatividade e se fortalece a interação entre texto e

leitor.

Conforme Candido et al (1976, p. 27):

Em termos lógicos e ontológicos, a ficção define-se nitidamente como tal, independentemente das personagens. Todavia, o critério revelador mais óbvio é o epistemológico, através da personagem, mercê da qual se patenteia – às vezes mesmo por meio de um discurso especificamente fictício – a estrutura peculiar da literatura imaginária. Razões mais intimamente “poetológicas” mostram que a personagem realmente constitui a ficção.

Na visão dos autores supracitados, a descrição de uma paisagem, de um

animal ou de objetos quaisquer pode resultar em excelente “prosa de arte”. Mas esta

pode resultar em ficção apenas quando a paisagem ou o animal se “animam” e se

humanizam através da imaginação pessoal.

Se por um lado, a escolarização da literatura rouba-lhe o caráter contestador

e libertário, próprio da literatura, por outro, a escola é entendida como espaço

adequado para o desenvolvimento de competências de leitura literária, que vão

desde o texto mais simples, “cartilhesco”, até o mais complexo, o literário e o

científico (VILLARDI, 1999). A literatura deve fazer parte do cotidiano da escola, por

seu caráter educativo e formador. A literatura é mais que um simples divertimento,

constituindo-se em um relevante instrumento de formação humana.

A presença da literatura entre as tarefas da escola produz um contínuo

questionamento a respeito de estratégias adequadas para levar os alunos aos

textos, sobre técnicas de leitura, diversidade dos textos escritos e desenvolvimento

de estreitas relações de curiosidade, desempenho e satisfação, no que se refere à

literatura (BARZOTTO, 1999).

Ao trabalhar com a leitura literária, o professor precisa considerar a relação

de prazer que deve ser estabelecida entre texto e leitor. Para Kleiman (2000, p. 35)

é necessário compreender que:

[...] a leitura que não surge de uma necessidade para chegar a um propósito não é propriamente leitura; quando lemos porque outra pessoa nos manda ler, como acontece frequentemente na escola, estamos apenas exercendo atividades mecânicas que pouco têm a ver com significado e sentido. Aliás, essa leitura desmotivada não conduz à aprendizagem.

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Por isso, ao trabalhar a leitura literária na escola, o professor precisa fazer

uso de estratégias diferenciadas e significativas para os alunos. De acordo com

Kleiman (2004), as estratégias são procedimentos textuais conscientes (cognitivas)

ou inconscientes (metacognitivas), utilizados pelo leitor para decodificar,

compreender, interpretar o texto e resolver os problemas que encontra durante a

leitura. Essas devem ser ensinadas aos alunos, para que a compreensão textual

seja mais adequada, tornando o trabalho do professor e do aluno mais propício.

Cada texto requer uma estratégica de leitura, em função de seu conteúdo, de sua

forma e sua especificidade.

2.2 Gênero textual Fábula

O trabalho com literatura requer diferenciadas estratégias de leitura, tendo

em vista que apresenta uma diversidade de gêneros textuais com padrões

sociocomunicativos caracterizados pela sua composição funcional, pelos objetivos

enunciativos e estilos realizados na integração dos elementos literários. Por maior

que seja a liberdade criativa e a variedade expressiva usada pelos contadores de

história, ao reproduzi-las, há um respeito pelas características que identificam o

gênero textual e individualizam essas histórias. Qualquer narrador sabe que existe

uma estrutura mínima que deve ser conservada (MACHADO, 1994).

A exemplo do conto popular e do conto maravilhoso, as fábulas são histórias

que conservam uma estrutura de enredo e de composição que sobrevive a toda

forma de modificação. São narrativas curtas que têm animais como personagens.

No mundo das fábulas, os animais pensam, falam e agem como se fossem seres

humanos, são personificados.

De acordo com Nelly Novaes Coelho (1993, p.146-147), Fábula “é a

narrativa (de natureza simbólica) de uma situação vivida por animais que alude a

uma situação humana e tem por objetivo transmitir certa moralidade.” Ainda para a

autora, a palavra Fábula, de origem latina, significa “contar algo”, “narrar”, o que faz

com que se confirme a ideia de que esse gênero se originou na tradição oral,

permitindo à história registrar a Fábula como a primeira narrativa a aparecer.

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A tradição oral, comum nos tempos antigos, constituía a literatura de muitos

povos. Essa literatura era transmitida, a princípio, de boca em boca, nos locais

públicos, como praças ou festas populares da época, e só bem depois passou a ser

registrada por escrito. Também a Fábula foi usada para transmitir aos adultos

ensinamentos, virtudes e defeitos do caráter humano representados pelo

comportamento dos animais (PORTELA, 1992).

Tradicionalmente, a Fábula apresenta um diálogo entre bichos e é encerrada

com uma mensagem moral (ditado popular) que é colocada em destaque no final do

texto. A moralidade, como tradição esópica, encontra-se enfatizada em Smolka

(1994, p. 34):

É interessante salientar que a importância que se dava à lição de moral das fábulas era tamanha, que os copistas da Idade Média costumavam escrevê-las com letras vermelhas ou douradas, enquanto o texto era em preto. Algumas vezes, entretanto, o copista deixava em branco o espaço destinado à lição de moral, começando um novo texto em preto para, depois, usar a tinta vermelha ou dourada de uma só vez.

Essa linha moral revela a filiação da tradição oral das Fábulas,

principalmente porque conserva uma característica marcante dessa tradição – o

anonimato. A moral contida no gênero textual Fábula é uma mensagem animada e

colorida. Machado (1994) afirma que uma estória contém moral quando contribui

para despertar valor positivo no homem.

Ainda segundo Machado (1994), a Fábula é um gênero textual originário do

Oriente e reinventado no Ocidente pelo escravo grego Esopo que objetivava criar

histórias de animais para mostrar às pessoas como agir com sabedoria. Mais tarde,

muitas de suas Fábulas foram recontadas por autores igualmente famosos, como La

Fontaine, no século XVII.

Nos anos 30, no Brasil, Monteiro Lobato, uma das maiores expressões da

literatura, também escreveu fábulas e usou-as para criticar e denunciar as injustiças.

Este autor preocupava-se em preparar as crianças para a vida em sociedade, e,

assim, no “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, por intermédio de seus personagens, reconta

muitas fábulas nas palavras das personagens de Tia Nastácia ou Dona Benta, como

mostra o seu livro “Fábulas”.

Na década de 60, outro brasileiro passa a divertir o público com suas

“Fábulas Fabulosas”: o escritor Millôr Fernandes. Este adiciona ao gênero o tema

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“política” com humor sarcástico, numa crítica às figuras da sociedade brasileira. Por

meio de fábulas parodiadas, o escritor atribui um tom atual à antiga forma das

fábulas com o objetivo de prender a atenção do leitor a uma situação vivida pelos

personagens, possibilitando dela tirar a moral da história, que pode ser criticar,

intencionar um conselho ou estar voltada à sátira (PORTELA, 1992). Para isso, o

autor utiliza a estrutura tradicional: um discurso figurativo (narrativa) e um discurso

temático (moral), apresentando novos temas e figurativizações para textos já

existentes, explicitando a intertextualidade com os textos clássicos e atribuindo a

eles novas mensagens (SANTOS, 2002).

Na literatura infantil, a Fábula é considerada um texto específico pertencente

ao domínio da literatura tradicional, a par de outros, como o mito ou a lenda

(MACHADO, 1994). É um gênero textual que, embora muito antigo, continua a

revelar-se com grande importância na literatura infantil contemporânea. Abramovich

(1991, p.162) comenta que "[...] ouvir ou ler estórias é uma possibilidade que a

criança encontra para descobrir o mundo imenso dos conflitos, dos impasses e as

soluções que todos os seres humanos vivem e atravessam ao longo da vida.” Assim,

por meio das estórias contidas no gênero Fábula, é possível auxiliar os alunos a

descobrirem outros lugares, outros tempos, outros modos de agir, de pensar e de

ser. A estória, ao ser imposta à criança com a finalidade puramente intuitiva, não

permite que o interesse pela mensagem seja despertado.

As características e a sua aceitação permitem um produtivo uso das fábulas

nas salas de aula como texto didático. A temática é apresentada de forma variada: a

vitória da bondade sobre a astúcia e da inteligência sobre a força, a derrota dos

presunçosos, dos orgulhosos, etc. Assim, os ouvintes ou leitores são atraídos para a

análise do comportamento do homem. Em A cigarra e a formiga, por exemplo, a

mesquinhez da formiga causa indignação ao se constatar que a cigarra morre de

fome sem a ajuda da outra, porém, também possibilita a reflexão sobre a

necessidade do ser humano de se precaver para o dia de amanhã (PORTELA,

1992).

As fábulas possibilitam um trabalho prazeroso com a leitura, pois despertam

a imaginação e a sensibilidade da criança. Desta forma, a estória fabulosa torna-se

um recurso adequado, pois diverte, educa e instrui o leitor naturalmente,

despertando alegria e emoção, prendendo a atenção e realizando suas finalidades

educativas (MACHADO, 1994).

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3 Desenvolvimento das atividades da Unidade Didática

Considerando relevantes os aspectos mencionados anteriormente, é

possível destacar a afirmação feita inicialmente a respeito da leitura como mola

propulsora para o conhecimento. Desta forma, elaborou-se um trabalho priorizando-

a, para o qual foram planejadas atividades que priorizavam estratégias adequadas à

compreensão, interpretação, conhecimento/reconhecimento do gênero Fábula e,

principalmente, dando ênfase ao estímulo à leitura.

Sendo assim, há necessidade de ressaltar que as estratégias são relevantes

e devem ser ensinadas para auxiliar na formação do aluno-leitor, pois o leitor as

utiliza para a compreensão e a lembrança do que lê. A cada experiência, o leitor

adquire novos conhecimentos e interage com o texto; estabelece relações entre o

que lê e os conhecimentos prévios armazenados, questiona o conhecimento

adquirido, consegue fazer relação com o que já tinha na memória, permitindo sua

utilização em outros contextos sociais diferentes do âmbito escolar, além de servir

para detectar os possíveis erros ou falhas de compreensão.

A leitura propicia ao ser humano encontrar-se com o mundo e adquirir

muitos conhecimentos, uma vez que o ato de ler não consiste apenas em interpretar

os símbolos gráficos, mas vivenciar o mundo ao redor. No ato da leitura, associam-

se todas as informações lidas com o conhecimento adquirido anteriormente

(SOARES, 2000).

Cagliari (2003, p. 173) afirma que:

A leitura não pode ser uma atividade secundária na sala de aula ou na vida, uma atividade para a qual a professora e a escola não dedicam mais que uns míseros minutos, na ânsia de retornar aos problemas da escrita, julgados mais importantes. Há um descaso pela leitura, pelos textos, pela programação dessa atividade na escola; no entanto, a leitura deveria ser a maior herança legada pela escola aos alunos, pois ela, e não a escrita, será a fonte perene de educação, com ou sem escola.

Para que o aluno/leitor faça parte do processo e significação da leitura do

texto, o docente precisa assumir o papel de mediador entre leitor e livro. A leitura

necessita ser realizada como forma de entretenimento e lazer, sem ter o caráter de

obrigação, pois “[...] o critério de suficiência somente poderá ser atendido quando e

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se os professores se assumirem como sujeitos [...] o desafio de ensinar a ler e a

gostar de ler.” (ZILBERMAN; SILVA, 1995, p.111).

Frente a esse desafio e ancorada na base teórica exposta, foi iniciada, no

período de 26 de agosto a 23 de novembro de 2011, a implementação da Unidade

Didática com os alunos do 6º ano, turma A, do Colégio Estadual Vinícius de Moraes

E.F.M.P. Na cidade de Tupãssi - Pr.

A Unidade Didática (doravante UD), elaborada no período de fevereiro a

junho de 2011, está dividida em 3 ações que visam: ao conhecimento do contexto

histórico e da construção composicional – (composição, estilo e conteúdo temático)

da Fábula; à análise das diferentes versões (tradicionais e contemporâneas); à

compreensão e interpretação dos textos utilizando de estratégias de leitura; ao

reconhecimento da Fábula frente a outros gêneros, como poema e história em

quadrinhos; à ampliação de vocabulário e de conhecimentos linguísticos.

Na ação 1, é abordada a questão da leitura por meio de oito perguntas

reflexivas. A maioria dos alunos participou do diálogo respondendo as questões com

entusiasmo e inseridos no assunto, porém três alunos demonstraram falta de

interesse. Frente a esta realidade, a professora conversou individualmente com os

alunos desinteressados, chamou atenção para a importância do assunto,

incentivando-os à participação e, no final, os três já estavam inseridos no diálogo.

Com o objetivo de avaliar a relação dos alunos (30) com a leitura, foram efetuadas 3

questões acerca do gosto pela leitura, de sua prática e da posse de livros em casa.

Sendo alcançados seguintes resultados: 12 alunos gostam de ler e destes apenas 5

praticam a leitura; 18 não gostam de ler e, quanto à posse, 16 têm livros em casa e

14 não têm. Grande parte dos alunos não recebe incentivo da família e não costuma

frequentar a biblioteca do Colégio nem a pública, tampouco tem o hábito de ir à

livraria para olhar ou comprar livros.

Ao introduzir o gênero textual Fábula, percebeu-se que os alunos não tinham

muito conhecimento a respeito do assunto e confundiram os gêneros Fábula e Conto

de fadas. Diante de tal fato, a professora foi dialogando com os alunos de modo a

verificar o conhecimento prévio em relação ao gênero em estudo. Em seguida, foi

proposta uma pesquisa na biblioteca ou na internet sobre o gênero Fábula, tendo

como termos de busca: conceito, origem, características e estrutura.

Na aula seguinte, os alunos apresentaram para a turma o trabalho que

fizeram. O que mais surpreendeu foi o fato de dois alunos terem trazido

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espontaneamente para a sala de aula livros que continham fábulas. Os demais

alunos começaram a pedir os livros emprestados para lerem também. Por estas

atitudes espontâneas, foi diagnosticado o interesse dos alunos pelo gênero em

estudo e observado que um dos objetivos propostos na UD começava a ser atingido,

tendo em vista que os alunos começaram a se interessar pela leitura.

A escola é o espaço adequado para o desenvolvimento da competência de

leitura literária, por isso deve fazer parte do cotidiano escolar, por seu caráter

educativo e formativo. Ao trabalhar com a leitura literária, o docente precisa mostrar

ao aluno o prazer que a mesma proporciona com essa relação entre o texto e o

leitor.

Costa (2007, p. 23) afirma que a leitura vinculada à literatura pressupõe

conhecimento e, consequentemente, crescimento intelectual, pois:

[...] a literatura tem por natureza uma profunda característica social. A linguagem pressupõe sempre o contato e a interação entre o criador e produtor do texto e os receptores. Além dessa natureza linguística, a literatura trata de assuntos e temas humanos isto é, que tem relação com a vida humana (sentimentos, afetos, vivências) mesmo que apresente personagens sob forma de animais ou objetos, pois elas representam sempre a compreensão do ser humano sobre a realidade.

Cabe ao professor, por meio da leitura literária, oportunizar aos alunos

comentar, questionar e até mesmo contar a história que leu, pois a arte de contar

histórias cria um contexto favorável para a construção do conhecimento. É uma

prática que tem o poder de despertar na criança, ou no adulto, o gosto pela leitura

(KLEINSCHMIDT, 2002).

Num outro momento, a professora motivou os alunos para que os mesmos

lessem mais algumas fábulas. Os educandos participaram lendo, ouvindo os textos

e identificando os trechos do texto que pertencem ao gênero. Nesta atividade, a

maioria participou, apenas 20% dos alunos exigiram maior atenção e dedicação da

professora que, por meio de conversas particulares, motivou-os a participarem.

Na sequência, foram lidas as fábulas: O pavão e a garça e O sapo e o boi. A

professora leu para os alunos, depois oportunizou a leitura discente. A docente foi

dialogando com a turma, chamando atenção para alguns aspectos composicionais e

para as características estruturais do gênero, bem como sobre personagens, ação e

contextualização moral, visando à compreensão. A professora deu ênfase ao

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fabulista Esopo, mostrando a primeira ilustração do livro e falando da sua

importância para o contexto.

Em seguida, foram realizadas atividades que destacam os personagens

animais com características próprias do ser humano com o objetivo de transmitir

uma lição de vida. Estas atividades foram desenvolvidas de acordo com a

consideração de Monteiro Lobato acerca das fábulas como importantes para a

formação intelectual e moral da criança, como ele próprio destaca na primeira edição

do seu livro “Fábulas”:

As fábulas constituem um alimento espiritual correspondente ao leite na primeira infância. Por intermédio delas a moral, que não é outra coisa mais que a própria sabedoria da vida acumulada na consciência da humanidade, penetra na alma infante, conduzida pela loquacidade inventiva da imaginação. Esta boa fada mobiliza a natureza, dá fala aos animais, às árvores, às águas e tece com esses elementos pequeninas tragédias donde ressurte “moralidade”, isto é, a lição da vida [...]. (LOBATO, 1958, p.171).

A turma realizou as atividades e participou expondo o seu entendimento em

relação ao assunto. Constatou-se que muitos alunos necessitavam de auxílio para a

realização da proposta, pois apresentavam déficit de aprendizagem e,

consequentemente, se depararam com dificuldades de leitura e compreensão

textual. Estes alunos não compreendiam os enunciados das atividades propostas,

dificultando, assim, o trabalho da professora e, por conseguinte, o rendimento

escolar. Além dos problemas de aprendizagem, a pesquisa foi aplicada a uma sala

de aula numerosa, com alunos agitados, outros com falta de interesse na

participação e dificuldades de concentração.

Num outro momento, a professora incentivou os alunos lendo a Fábula O

corvo e o pavão e levou-os à biblioteca do Colégio, incentivando-os a escolher um

livro para leitura. O fato que mais chamou atenção foi a fala da aluna B “Eu não

gosto de ler, não vou pegar livro”. A docente conversou com a estudante

individualmente e conseguiu que a mesma escolhesse uma obra. Outro ponto

interessante foi o fato de os alunos não terem o costume de visitar a biblioteca, eles

frequentaram-na apenas uma vez durante o ano.

O objetivo do professor é atuar com uma prática que contribua para a

formação de leitores críticos, capazes de interagir com o texto nas diversas

dimensões de natureza social. Para isso, o estudante precisa ter experiência como

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leitor para ir construindo o conhecimento cognitivo necessário para uma melhor

compreensão dos textos, sendo assim, percebeu-se que é fundamental que o

docente promova momentos de interação com obras literárias.

Na sequência, a educadora sugeriu uma pesquisa sobre o contexto histórico

da Fábula, tendo como itens de pesquisa: o surgimento, a função, o primeiro

fabulista, fabulistas brasileiros, a temática envolvida e como eram/são transmitidas

as fábulas.

Como resultado da pesquisa, os alunos, em grupo, apresentaram oralmente

um texto aos colegas e à professora, falando do contexto histórico pesquisado. Após

a apresentação, a docente encaminhou mais uma atividade sobre o assunto

pesquisado para que os alunos, em dupla, respondessem algumas questões.

A pesquisa é muito importante para conhecer e ampliar ainda mais o

conhecimento em relação ao gênero, pois os conhecimentos individuais afetam a

compreensão e, para que haja um bom entendimento na leitura, há necessidade de

adquiri-lo, pode-se dizer que a compreensão não está somente no texto, mas sim,

na relação interativa (texto - autor - leitor).

Desta forma, em seguida, propôs-se à turma outra pesquisa para ampliar o

conhecimento em relação a autores fabulistas. Esta atividade ampliou o

conhecimento de mundo dos alunos, como foi o caso de um estudante que, ao ter

lido sobre a Ruth Rocha, foi à biblioteca pública pesquisar obras desta autora e

trouxe para a sala de aula 6 livros e mostrou-os à professora e aos colegas, os quais

apresentaram-se interessados em dialogar, expor sua pesquisa e ouvir os trabalhos.

Havia um grande interesse por parte dos alunos em pesquisar sobre o

assunto e trazer para a sala o material colhido. A partir desta coletânea de trabalhos,

percebeu-se a necessidade de fazer um mural contendo todos os dados

pesquisados sobre o gênero textual Fábula, autores fabulistas e textos. Esse mural

foi atração para os demais alunos do colégio que fizeram visitas, leituras e tiraram

fotos. Esta atividade encerrou a ação 1 realizada em 11 aulas .

Na ação 2, foram introduzidas Fábulas em versões diferentes (tanto

tradicionais quanto contemporâneas), com destaque às semelhanças e diferenças

entre elas, com relação a aspectos como: estrutura, características das

personagens, moral e recursos de linguagem (estilo, vocabulário, etc.).

Iniciou-se a aula falando das versões que a Fábula pode apresentar, que

elas são adaptadas de acordo com os fatores históricos da época em que foram

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escritas e conforme a intenção e moral que se quer transmitir. Alguns alunos leram a

Fábula A cigarra e a formiga do autor Esopo. A professora também a leu fazendo

levantamentos de aspectos importantes para a compreensão.

Em seguida, outros alunos leram a Fábula A formiga boa do autor Monteiro

Lobato. A professora fez nova leitura, destacando alguns pontos relevantes,

comentou sobre os autores Esopo e Monteiro Lobato, fomentou a discussão em

relação aos dois textos, levando os educandos a reconhecer as intenções e os

interlocutores do discurso. Segundo as DCE (2008, p.57), “é nessa dimensão

dialógica, discursiva que a leitura deve ser experienciada, desde a alfabetização. O

reconhecimento das vozes sociais e das ideologias presentes no discurso”, ou seja,

a discussão e a compreensão do texto ajudam na construção de sentido de um texto

e na relação entre um texto o outro. Nesta concepção, permite-se perceber quais

são as semelhanças e diferenças entre si, ou seja, como esses textos dialogam

entre si.

Para a realização dessas atividades, a professora sentiu a necessidade de

interagir constantemente com os alunos, relendo, explicando, conduzindo-os à

interpretação dos enunciados, intertextualizando, contextualizando, anotando

respostas, corrigindo ortografia, vocabulário, etc., pois os alunos neste ano/faixa

etária ainda não estão totalmente alfabetizados e não conseguem responder as

questões, apresentando muita dificuldade de compreensão e defasagem de

conteúdo/conhecimento.

Num outro momento, a educadora utilizou-se de uma dinâmica

(dramatização) para explorar a oralidade, leu com os alunos a Fábula A cigarra e a

formiga e sugeriu aos alunos que localizassem o narrador e os personagens. Os

alunos demonstraram dificuldade em identificá-los e a professora os auxiliou para

que fossem entendo o processo.

Verificou-se que aproximadamente 60% dos alunos não conseguiam

diferenciar narrador e personagem. Foi um desafio construir este conhecimento.

Posteriormente, os alunos tentaram realizar a mesma atividade com outro texto, mas

foi impossível sem a ajuda da professora, pois surgiram muitas dúvidas, 30% dos

alunos não tinham autonomia nas atividades e precisaram da intervenção da

professora para concluí-las. A docente apresentou-se surpresa pela dificuldade que

os alunos encontraram ao realizar a proposta escrita, entretanto, na realização de

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atividades de dramaturgia, ficou evidente que os mesmos assimilaram a mensagem

que o texto transmitia.

Mesmo com toda a dificuldade apresentada, percebeu-se que a metodologia

trabalhada é fundamental para cativar o educando. Quando se trata de uma

dinâmica que difere das demais do cotidiano, pode-se, certamente, motivar o

desempenho dos aprendizes.

Num outro momento, a professora trabalhou as fábulas: A galinha e os ovos

de ouro (Esopo) e A galinha dos ovos de ouro (Millôr Fernandes). A docente solicitou

a leitura dos alunos e orientou-os para que realizassem as atividades propostas de

interpretação, explorando a temática, o estilo e a composição do gênero.

Diagnosticou-se que 35% dos alunos ainda continuaram apresentando

dificuldades em responder as questões, desta forma, tem-se conhecimento de que o

desafio é grande frente ao nível de dificuldades de aprendizagem dos mesmos. Por

isso, para alcançar o resultado, são necessários maior tempo, dedicação e paciência

por parte do educador. Entretanto, a maioria (65%) já apresentava um avanço no

seu desenvolvimento cognitivo, conseguindo entender, interpretar o texto, explicar a

moral e contextualizar o assunto.

Na sequência, a professora retomou a análise de mais duas Fábulas: O rato

do campo e o rato da cidade (Esopo) e O rato da cidade e o rato do campo

(Monteiro Lobato), os alunos fizeram um comparativo entre os textos e identificaram

as diferenças apresentadas. Alguns alunos, aproximadamente 26%, ainda

apresentaram dificuldades para executar os exercícios sem a intervenção da

professora. Entretanto, a grande maioria (74%) já conseguia entender, interpretar o

texto, explicar a moral, contextualizar o assunto e realizar as atividades propostas

com êxito.

É relevante destacar a forma como foram realizadas as atividades

anteriores, pois, referindo-se a alunos de 6°ano, tem-se conhecimento da dificuldade

que os mesmos encontram ao realizarem quaisquer exercícios. As atividades foram

propositalmente organizadas em três passos na tentativa de superação de

dificuldades. À medida que os alunos iam realizando as atividades, iam adquirindo

conhecimento, autonomia e segurança para realizá-las sozinhos.

Espera-se que no ambiente escolar sejam promovidos momentos de leitura

atrativa, que estimulem as crianças a ouvirem e a se interessarem pelas histórias, “o

professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a realizarem leituras

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significativas. Assim, o professor deve dar condições para que o aluno atribua

sentidos a sua leitura, visando a um sujeito crítico e atuante nas práticas de

letramento da sociedade” (PARANÁ, 2008, p.71). Sendo assim, a professora levou à

sala de aula um livro de Monteiro Lobato e iniciou a aula lendo a Fábula A coruja e a

águia aos alunos e, por meio da entonação, buscou dar vida ao texto. A educadora

oportunizou o diálogo/discussão sobre o texto, os alunos fizeram relação com outros

textos, contextualizaram a moral e analisaram a estrutura do gênero. Por meio desta

atividade, o aluno passa a construir o seu conhecimento que o leva a uma melhor

compreensão de suas leituras, conforme as DCE “[...] o aluno terá condições de se

posicionar diante do que lê. É importante ponderar a pluralidade de leituras que

alguns textos permitem, o que é diferente de afirmar que qualquer leitura é aceitável.

Deve-se considerar o contexto de produção sócio-histórico, a finalidade do texto, o

interlocutor, o gênero.” (PARANÁ, 2008, p.71-72).

Na aula seguinte, vários alunos vieram empolgados à aula e trouxeram livros

de Fábulas da biblioteca, pedindo para fazerem leitura aos colegas. A professora

ficou surpresa com a iniciativa dos estudantes, deixou-os lerem para a turma e

aproveitou para promover a discussão sobre tópicos importantes, comentando sobre

as características das Fábulas e localizando-as no texto. Ao discutir os conflitos e

refletir sobre o contexto e a moral que o gênero Fábula apresenta, pode-se levar os

alunos à liberdade da imaginação e, portanto, pode-se estimular o pensar, que é

uma característica almejada dos seres humanos. Abramovich (1991) comenta que a

criança, ao ouvir ou ler estórias, pode descobrir um mundo de conflitos, problemas,

mas também pode descobrir as soluções através do modo de agir, pensar e de ser.

Ao trazerem tais livros para a sala, os educandos tiveram a oportunidade de

ler, ouvir e dialogar com a professora e colegas. Foi visível a mudança

comportamental gerada pela aprendizagem dado ao envolvimento dos estudantes

com os textos lidos. A leitura pode proporcionar essa maturidade. O fato de estarem

aprendendo estimulava os alunos a lerem, pois estavam conseguindo entender e até

mesmo emitir opiniões a respeito. Notou-se que, à medida que havia entendimento,

a compreensão acontecia, e os estudantes, cada vez mais, passavam a gostar da

leitura. Constatou-se que muitos estudantes não leem pelo fato não conseguir extrair

a essência da obra. De acordo com Evangelista, Brandão e Machado (2006), quanto

mais o indivíduo estiver exposto à prática da leitura, melhor leitor ele será, e

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consequentemente, um ser humano rico em conhecimento, por somar a experiência

oral e escrita que a leitura pode lhe proporcionar.

Assim, pode-se afirmar que a experiência como leitor(a) é fundamental para

a compreensão do texto, deixa de ser “captação” de informação e torna-se algo mais

completo. Ressalta-se que a leitura é uma atividade de interação autor-texto-leitor,

na qual entram em jogo os conhecimentos do leitor. Essa interação com obras

literárias para o exercício de leitura leva a resultados cada vez mais eficientes

(KOCH, 2003).

No desenvolvimento da UD, novamente a leitura ocupou o espaço

privilegiado na aula, a professora organizou os alunos em círculo, incentivou-os a

fazer leitura de Fábulas, para tanto foram utilizados os textos da coletânea

organizada pela docente. A maioria dos alunos leu com atenção, apenas três alunos

não conseguiram se concentrar na atividade proposta. O trabalho com leitura não é

fácil, e se torna ainda mais difícil quando se trata de uma turma agitada, numerosa e

que não tem o hábito de “parar” para ler. Deste modo, esses estudantes

necessitavam de motivação e estratégias para que o prazer da leitura os

envolvesse. Frente a essas dificuldades, o maior desafio foi fazê-los se concentrar

na leitura, percebeu-se que esta prática não era comum, causava-lhes inquietação.

Entretanto, aos poucos, foram apresentados avanços quanto ao estímulo à leitura,

como foi o caso do aluno C que disse: “Professora, me dá mais uma fábula, eu

gostei de ler”. Portanto, pode-se afirmar que a literatura, por ser de caráter formativo

e educativo, deve fazer parte do cotidiano escolar. Deve-se proporcionar ao

educando momentos de leitura agradável, com estratégias adequadas e

significativas, com diversidade de gênero e promover o desempenho e satisfação do

leitor. (BARZOTTO, 1999)

Frente ao desenvolvimento das atividades, constata-se que o gosto pela

leitura se dá a partir de como esta é trabalhada, a oportunidade que é oferecida aos

alunos em estarem envolvidos com os textos, as estratégias que são utilizadas, do

convívio estimulante com a leitura, além de o professor mostrar-se leitor. Quanto

mais o educando ler e conseguir fazer a reflexão sobre o que leu, maior será o seu

referencial para realizar uma produção escrita e oral, assim ele não será um mero

reprodutor de ideias. Segundo as DCE (2008, p. 73-74), “para o encaminhamento da

prática de leitura, é relevante que o professor realize atividades que proporcionam a

reflexão e discussão”. Portanto, cabe ao educador conduzir o trabalho em relação ao

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texto lido, explorando conteúdo temático, finalidade, possíveis interlocutores,

ideologias presentes, argumentos elaborados, intertextualidade. Sendo assim, a

escola/professor tem o papel de contribuir para a formação de pessoas críticas e

consequentemente da formação de uma sociedade democrática.

Fechando a ação 2, a professora levou os alunos à biblioteca pública, fez

leitura de fábulas e os alunos também tiveram tempo para ler. Eles demonstraram

interesse em ouvir e ler as histórias, participaram atentos e, ao final deste trabalho,

os alunos escolheram um livro para levar para casa. Foi interessante a frequência

dos alunos, pois, mesmo sendo em horário extra ao turno escolar e por apenas

terem sido convidados a participarem, compareceram 90%. Com esta atividade,

encerramos as 22 aulas referentes à ação 2.

Na ação 3, foram apresentados outros gêneros textuais, como: o poema e a

história em quadrinhos em virtude de sua relação temática com as fábulas. As DCE

(2008) apontam que a prática de leitura precisa estar articulada à prática social dos

alunos. Assim sendo, os professores precisam trazer para o ambiente da sala de

aula os diferentes gêneros textuais, pois o discurso articula uma variação do

dialogismo exposto no texto literário, sobretudo, em razão da presença de textos de

diferentes níveis de linguagem com vários temas convivendo de forma coesa na

estrutura textual.

Sendo assim, educadora apresentou apenas o título do poema Sem Barra

do autor José Paulo Paes, levantando algumas indagações a respeito do título.

Posteriormente, objetivando oportunizar o aluno a pensar, fazer inferência,

relacionar o contexto com o conhecimento já adquirido (estilo, estrutura, temática,

etc.), foi entregue à turma o poema na íntegra. Os alunos fizeram a leitura silenciosa

do texto e responderam as questões com relação ao suporte, intenção do autor,

estrutura textual, temática, vocabulário e análise linguística.

Por meio desse processo, destacou a importância do conhecimento de

outros gêneros textuais para ampliar mais o conhecimento do educando. Assim,

oportunizou aos alunos a exploração da história em quadrinhos (HQ) de Maurício de

Sousa. Apresentou o exemplar do gênero HQ e os alunos dialogaram a respeito

deste assunto, conheceram a estrutura, estilo e a temática presentes no texto. Os

alunos foram levados ao laboratório de informática para fazerem a leitura da HQ -

Chico Bento – A cigarra e a formiga. Esta atividade foi realizada no contraturno e a

participação dos alunos foi excelente (dos 30 alunos envolvidos, compareceram 29).

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Mediante o exposto, acredita-se que o ensino da leitura pressupõe o

trabalho com gêneros textuais, tendo em vista a apropriação dos saberes

necessários ao seu uso em diferentes situações de interação social. As DCE (2008)

propõem um trabalho com a leitura empregando os mais diferentes gêneros textuais.

Conforme Moço (2009), os gêneros são alternativas metodológicas significativas a

serem utilizadas pelo professor em seu trabalho com a leitura. Nessa perspectiva, é

necessário pensar em ações que oportunizem ao educando acesso às diferentes

formas de linguagem presentes nos variados gêneros textuais. Sendo assim, foi

trabalhada a leitura com o gênero Fábula e após o conhecimento deste, passou-se

para os gêneros poema e história em quadrinhos.

Para finalizar os trabalhos, tendo em vista a empolgação dos estudantes, a

professora os convidou para fazerem teatro e dramatização com fantoches a partir

das leituras de fábulas lidas por eles. A maioria se disponibilizou e quis fazer parte

da apresentação, entretanto, por se tratar de uma turma numerosa, a professora

selecionou para esta atividade alguns alunos que tinham mais disponibilidade para

os ensaios. No entanto, todos ajudaram de uma forma ou de outra (seja

apresentando, seja preparando o ambiente/ cenário). Os estudantes participaram e

fizeram a apresentação aos colegas da turma e também aos demais alunos do 6ºB,

7°A, 7°B e sala de apoio. Foram excepcionais o desempenho, a participação dos

alunos e a atenção da plateia. Entretanto, não se pode deixar de destacar que o

estímulo à leitura é infinito, deve ser contínuo e ao mesmo tempo planejado, para

que seja possível levar os alunos a um envolvimento prazeroso e responsável com a

leitura.

4 Resultados alcançados

Com a implementação da UD, ficou evidente a importância do professor

como mediador desse processo de ensino, aprendizagem e estímulo à leitura, tendo

em vista que ele é o agente que ensina estratégias diferenciadas que poderão

contribuir para o sucesso do educando como leitor.

Por meio do acompanhamento dos trabalhos realizados, verificou-se que os

alunos alcançaram resultados satisfatórios, tornaram-se mais atentos e

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interessados, organizados, mais concentrados, houve melhor compreensão leitora e,

principalmente, maior interesse pelos livros.

Esses avanços na aprendizagem repercutiram nos resultados obtidos nas

avaliações de Língua Portuguesa, 76% alunos atingiram notas acima da média (60),

sendo que os 24% abaixo da média conseguiram 50% de acertos na avaliação.

Percebeu-se também que a maioria dos alunos apresentou melhoras significativas

na aprendizagem, em todas as disciplinas.

Mediante uma conversa com professores da turma, verificou-se que os

alunos apresentaram um bom resultado frente ao trabalho realizado. A professora de

matemática relatou o avanço em sua disciplina:

“Diante do desenvolvimento do Projeto da professora, percebi o

desempenho de vários alunos frente à compreensão e interpretação das situações –

problemas. O interesse da participação foi mais frequente com perguntas e

questionamentos de muitos alunos que antes eram considerados passivos e sem

argumentos no decorrer das aulas. Num desses casos, cito o aluno F que, a cada

aula, começou a fazer colocações frente aos conteúdos expostos, a desenvolver

todas as atividades propostas e chegou a tirar nota máxima numa das avaliações

aplicadas, surpreendendo até os seus colegas de sala, com estas atitudes.” (Gleice

Marin, professora de matemática desta turma).

O levantamento nos registros da biblioteca, bem como o depoimento da

bibliotecária, revela que vários alunos passaram a frequentar a biblioteca e a retirar

livros para a leitura e pesquisas. Segundo a bibliotecária, antes do projeto essa ação

era insignificante.

Após a apresentação (dramatização) no colégio, alguns alunos foram

entrevistados sobre o trabalho de implementação da Unidade Didática do PDE e

deram alguns depoimentos: “Eu achei legal, nós estamos aprendendo muito sobre

as coisas” (aluno A); “A professora Elizeth me ajudou a ler melhor, as fábulas dela é

interesse das crianças do 6º ano” (aluno B); “Foi legal, nós saímos, fomos à

biblioteca pública, teve aula a mais, lemos livros, a professora deu livros para nós,

fizemos teatro, mural, foi muito legal, eu achei” (aluno C).

Ao finalizar o trabalho, a professora fez um levantamento dos resultados

alcançados por meio de questionário respondido pelos alunos e obtiveram-se os

seguintes dados:

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Gráfico 1 – Resultados alcançados com a UD

Fonte: Dados da pesquisa

Vários são os fatores que comprovaram um resultado positivo frente às

dificuldades apresentadas pelos alunos, desde a melhora na compreensão dos

textos, até mesmo ações que confirmam que os mesmos foram estimulados à

leitura. Como é o caso da aluna B, mencionada anteriormente, que não gostava de

ler e que surpreendeu à professora e aos colegas quando passou a participar da

leitura na sala de aula e fora dela, assim como a questionar, opinar e a se fazer

presente em todas as atividades propostas, inclusive na dramatização. E, no

decorrer da implementação da UD, relatou à professora “Eu gostei de ler, é legal”.

5 Considerações finais

Considerando-se que a leitura é um dos mais importantes meios para se

chegar ao conhecimento, torna-se necessário gostar e aprender a ler. Sendo que o

bom leitor é aquele que faz uma análise do texto, aprofundando-se na compreensão

dos detalhes a fim de poder construir o seu próprio entendimento, fazendo

inferências com os conhecimentos já adquiridos.

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Com a intenção de contribuir para a formação do leitor crítico, voltado aos

estudos de aspectos discursivos, bem como aos elementos composicionais,

temáticos e estilísticos do gênero, foi organizada a proposta com o gênero textual

Fábula por se tratar de uma tipologia presente na vida dos alunos e capaz de

contribuir para o estímulo à leitura, com o intuito de reforçar a importância do

trabalho com gêneros textuais em sala de aula.

Portanto, ao se pensar em promover a leitura em sala de aula, precisa-se

selecionar e ofertar ao educando os gêneros textuais mais apropriados à faixa etária

do mesmo, oferecendo-lhe uma gama de textos variados, oportunizando-o a

desfrutar de metodologias atrativas, dinâmicas em grupo, entre outros. Cabe ao

educador utilizar os mais variados recursos midiáticos e estratégias diferenciadas e

significativas, permitindo ao aluno o prazer que a leitura pode lhe proporcionar.

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