AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a...

12
AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES BRASILEIROS SUBMETIDOS À COMBUSTÃO ENRIQUECIDA COM OXIGÊNIO Amir Roberto De Toni Junior, Cristiano Frandalozo Maidana, Leonardo Zimmer, Marina Fonseca Seelig & Paulo Smith Schneider Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul Rua Sarmento Leite 425, 90050-170, Porto Alegre, RS E-mail: [email protected] RESUMO Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de poluentes gerados pela queima de carvão mineral. O controle da poluição do ar na geração termelétrica a carvão é fundamental para a plena aceitação e incentivo desse combustível, cujo apelo ambiental é fraco. Uma câmara de combustão operando com pouca corrente de oxidante resulta em uma combustão incompleta, com consequente desperdício de geração energética e alta formação de poluentes. Já o excesso de corrente garante combustão completa, mas também representa desperdício, pois parte do calor gerado é gasto no aquecimento do ar. O ideal é a dosagem do oxigênio, operação em proporções estequiométricas ou próximas disso. A combustão enriquecida com oxigênio, respeitando a estequiometria da combustão, melhora o processo, pois o nitrogênio é retirado da corrente de oxidante, reduzindo a perda de calor no seu aquecimento e a formação de óxidos de nitrogênio, resultando em um efluente menos poluente. Simulações da proporção oxigênio/corrente de oxidante são feitas para diferentes carvões brasileiros. PALAVRAS-CHAVE: geração termelétrica a carvão; combustão enriquecida com oxigênio; oxicombustão; análise termodinâmica de equilíbrio; controle da poluição do ar. 1. INTRODUÇÃO A geração termelétrica a carvão é a maior percentagem da produção mundial de eletricidade (World Coal Association, 2011a). No Brasil, esse valor cai dos 41% para 1,5%, apesar de o país ser a décima reserva do mineral (Agência Nacional de Energia Elétrica ANEEL, 2008). O Plano Decenal de Expansão de Energia (Empresa de Pesquisa Energética, Ministério de Minas e Energia, 2010) prevê entre 2010 e 2019 uma taxa média de crescimento do consumo nacional de energia de 5% ao ano, e prioriza as usinas hidrelétricas e as fontes alternativas no horizonte de planejamento. Os projetos termelétricos, preferencialmente os movidos a gás natural, são alternativa de atendimento à demanda no caso de atraso dos projetos planejados. O teto previsto para a geração a carvão é de 3.205 MW instalados em dezembro de 2012. Em dezembro de 2010 a capacidade instalada estimada era de 1.765 MW, 55% do previsto. O Rio Grande do Sul detém 88% da reserva nacional de carvão mineral, e aproximadamente um quarto de sua matriz energética é de fontes térmicas (Secretaria de Planejamento, Gestão e Participação Cidadã, 2011). São três as usinas a carvão: Presidente Médici, em Candiota, com 796 MW instalados (446 MW Candiota II, 350 MW Candiota III), São Jerônimo, em São Jerônimo, com 20 MW instalados, e Charqueadas, em Charqueadas, com 72 MW instalados. As duas primeiras são administradas pela Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (Eletrobras CGTEE), e a terceira é administrada pela Tractebel Energia (Eletrobras CGTEE, 2011; Tractebel Energia, 2011). O carvão é o principal bem mineral estadual. Desfavoravelmente, em grande parte das jazidas atualmente exploradas, seu teor médio de cinzas é maior que seu teor médio de carbono fixo, o que impõe desafios tecnológicos à sua utilização em termoeletricidade. A jazida de Candiota, por exemplo, tem teor médio de cinzas de 52,7% e 26,1% de carbono fixo, e a jazida do Leão tem teor

Transcript of AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a...

Page 1: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES BRASILEIROS

SUBMETIDOS À COMBUSTÃO ENRIQUECIDA COM OXIGÊNIO

Amir Roberto De Toni Junior, Cristiano Frandalozo Maidana, Leonardo Zimmer,

Marina Fonseca Seelig & Paulo Smith Schneider Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Rua Sarmento Leite 425, 90050-170, Porto Alegre, RS

E-mail: [email protected]

RESUMO

Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de poluentes gerados pela

queima de carvão mineral. O controle da poluição do ar na geração termelétrica a carvão é fundamental para a plena

aceitação e incentivo desse combustível, cujo apelo ambiental é fraco. Uma câmara de combustão operando com pouca

corrente de oxidante resulta em uma combustão incompleta, com consequente desperdício de geração energética e alta

formação de poluentes. Já o excesso de corrente garante combustão completa, mas também representa desperdício, pois

parte do calor gerado é gasto no aquecimento do ar. O ideal é a dosagem do oxigênio, operação em proporções

estequiométricas ou próximas disso. A combustão enriquecida com oxigênio, respeitando a estequiometria da combustão,

melhora o processo, pois o nitrogênio é retirado da corrente de oxidante, reduzindo a perda de calor no seu aquecimento e

a formação de óxidos de nitrogênio, resultando em um efluente menos poluente. Simulações da proporção

oxigênio/corrente de oxidante são feitas para diferentes carvões brasileiros.

PALAVRAS-CHAVE: geração termelétrica a carvão; combustão enriquecida com oxigênio; oxicombustão; análise

termodinâmica de equilíbrio; controle da poluição do ar.

1. INTRODUÇÃO

A geração termelétrica a carvão é a maior percentagem da produção mundial de eletricidade

(World Coal Association, 2011a). No Brasil, esse valor cai dos 41% para 1,5%, apesar de o país ser a

décima reserva do mineral (Agência Nacional de Energia Elétrica — ANEEL, 2008). O Plano

Decenal de Expansão de Energia (Empresa de Pesquisa Energética, Ministério de Minas e Energia,

2010) prevê entre 2010 e 2019 uma taxa média de crescimento do consumo nacional de energia de

5% ao ano, e prioriza as usinas hidrelétricas e as fontes alternativas no horizonte de planejamento. Os

projetos termelétricos, preferencialmente os movidos a gás natural, são alternativa de atendimento à

demanda no caso de atraso dos projetos planejados. O teto previsto para a geração a carvão é de

3.205 MW instalados em dezembro de 2012. Em dezembro de 2010 a capacidade instalada estimada

era de 1.765 MW, 55% do previsto.

O Rio Grande do Sul detém 88% da reserva nacional de carvão mineral, e aproximadamente

um quarto de sua matriz energética é de fontes térmicas (Secretaria de Planejamento, Gestão e

Participação Cidadã, 2011). São três as usinas a carvão: Presidente Médici, em Candiota, com 796

MW instalados (446 MW Candiota II, 350 MW Candiota III), São Jerônimo, em São Jerônimo, com

20 MW instalados, e Charqueadas, em Charqueadas, com 72 MW instalados. As duas primeiras são

administradas pela Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (Eletrobras CGTEE), e a

terceira é administrada pela Tractebel Energia (Eletrobras CGTEE, 2011; Tractebel Energia, 2011).

O carvão é o principal bem mineral estadual. Desfavoravelmente, em grande parte das jazidas

atualmente exploradas, seu teor médio de cinzas é maior que seu teor médio de carbono fixo, o que

impõe desafios tecnológicos à sua utilização em termoeletricidade. A jazida de Candiota, por

exemplo, tem teor médio de cinzas de 52,7% e 26,1% de carbono fixo, e a jazida do Leão tem teor

Page 2: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

médio de cinzas de 45,6% e 30,2% de carbono fixo (Companhia Riograndense de Mineração, 2011).

Somado ao baixo rendimento energético, o fraco apelo ambiental do processo de produção e de

consumo, principalmente na parte de poluição do ar, explica o pouco interesse do governo federal

nessa fonte de energia.

No entanto, há tecnologias para sustentar uma energia a carvão limpa. Além de tratamentos de

fim de tubo para redução de emissões de partículas, óxidos de enxofre, óxidos de nitrogênio e

mercúrio, há desenvolvimentos de otimização do processo térmico, como as tecnologias de leito

fluidizado e gaseificação (US National Energy Technology Laboratory, 2011). Além, dos processos

de captura de dióxido de carbono, há a oxicombustão, onde a combustão se dá em oxigênio puro, e

não em ar atmosférico (World Coal Association, 2011b). Uma alternativa ao alto custo do oxigênio é

a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio, já consolidada em algumas áreas da indústria,

porém não utilizada, em escala comercial, no setor de geração de eletricidade. Este artigo avalia, por

meio de modelagem matemática, essa tecnologia na redução da formação de poluentes gerados pela

queima de carvão mineral.

2. O PROCESSO DE COMBUSTÃO ENRIQUECIDA COM OXIGÊNIO

Na oxicombustão, o combustível é queimado em uma atmosfera formada por produtos de

combustão recirculados misturados a uma corrente de oxigênio com cerca de 95% de pureza (Wall e

outros, 2009). Os produtos de combustão gerados na oxicombustão são compostos principalmente

por vapor da água e CO2 em concentração adequada para captura. O gás recirculado substitui

volumetricamente o N2 atmosférico, assegurando um escoamento adequado à transferência

convectiva de calor no interior da câmara de combustão. Um fluxograma desse processo é apresenta

na Figura 1.

Figura 1 – Fluxograma do processo de oxicombustão para geração de energia e captura de gás

carbônico (adaptado de Wall e outros, 2009)

A substituição do meio oxidante de O2/N2 por proporções semelhantes de O2/CO2 é realizada

para não afetar radicalmente certas características da combustão, como a temperatura de chama

adiabática e a transferência radiante de calor. Entretanto, devido às diferenças de massa específica,

calor específico e difusividade térmica do gás carbônico em relação ao nitrogênio, ocorrem grandes

alterações nas características de ignição e combustão do carvão pulverizado, propagação de chama,

queima do resíduo carbonoso, entre outras (Bejarano e Levendis, 2008). Essas considerações

Ar

Combustível

Unidade de separação

de ar

Gerador de vaporou

Turbina a Gás

Remoção de cinzas Dessulfurização Troca de calor

Gás rico

em CO2

N2

O2

Recirculação

Turbina a Vapor

Vapor

CO2

concentrado

Purificação Compressão

Energia elétrica

Chaminé

CO2

capturado

Page 3: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

levantam uma importante discussão sobre a possibilidade de adaptação das plantas convencionais em

operação a essa tecnologia.

Uma alternativa à oxicombustão é o processo de combustão enriquecida com oxigênio

(conhecido também como processo OEC). Essa tecnologia contribui para um aumento de eficiência

da planta termelétrica sem maiores penalizações energéticas, muito embora dificulte a captura e

sequestro do carbono. Segundo Baukal (1998) as atuais plantas termelétricas podem operar em

combustão enriquecida até 28% de oxigênio sem necessidade de modificação de equipamentos. Esse

nível de enriquecimento do oxidante poderia ser obtido por meio de membranas de separação ou

outras tecnologias emergentes, sem necessidade de utilização do oxigênio obtido criogenicamente,

cuja produção é cara e energeticamente intensiva. Segundo Wall e outros (2009), a implantação de

uma unidade de separação criogênica de ar para fornecer oxigênio a uma termelétrica de

oxicombustão reduziria a eficiência térmica da planta em cerca de 10% em comparação a uma planta

equivalente em operação convencional.

3. EQUILÍBRIO QUÍMICO

3.1 Combustão

A combustão é uma reação química rápida e exotérmica caracterizada pela conversão de

reagentes (combustível e oxidante) em produtos, acompanhada de liberação de calor (Chomiak,

1990). Em muitos processos de combustão a altas temperaturas, a consideração de equilíbrio químico

entre os produtos é uma boa aproximação para a modelagem do processo. Isso se verifica geralmente

em reações de queima onde o combustível é um gás que se mistura facilmente com o oxidante. Essa

condição pode ocorrer também em situações onde o combustível é um sólido na forma pulverizada,

como na queima e na gaseificação de carvão, onde quase não há restrições cinéticas para a reação

(Furimsky, 2000).

Comparativamente, a cinética química trata das taxas de reação em função das concentrações,

estado físico dos reagentes, temperatura e presença de catalisadores. O equilíbrio químico é o estado

de uma mistura de reagentes e produtos cujas concentrações não variam mais ao longo do tempo. No

caso da combustão, o equilíbrio químico ocorre entre os produtos, tendo em vista que a reação

química não é reversível. Em reações que ocorrem a pressão constante, o equilíbrio químico ocorre

quando a energia livre de Gibbs do sistema é minimizada, ou seja, a soma do potencial químico dos

produtos é igual a soma do potencial químico dos reagentes. Para o caso a volume constante, o

equilíbrio ocorre quando a energia livre de Helmholtz é mínima (Gordon e McBride, 1994).

Sharma (2008) apresenta um comparativo entre os valores de concentração dos produtos

gasosos obtidos por equilíbrio químico, cinética química e os dados experimentais do consumo de

resíduo carbonoso (char) na modelagem de um gaseificador de biomassa. A Figura 2 mostra essa

comparação. Os resultados apresentam boa concordância entre os valores calculados por equilíbrio

químico e os obtidos experimentalmente.

Page 4: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

Figura 2: Comparação das concentrações obtidas pelos modelos de equilíbrio químico e cinética

química com dados experimentais (adaptado de Sharma, 2008)

3.2 Minimização da Energia de Gibbs

Partindo da definição da energia de Gibbs (Turns, 2000).

1

onde H é entalpia, T a temperatura e S a entropia do sistema,

∑ 2

onde µj é o potencial químico da espécie j

(

)

3

Da aplicação da 1ª e da 2ª Lei da Termodinâmica e da condição de equilíbrio, que

corresponde à configuração que maximiza a entropia mantendo T e V constantes:

4

Então:

∑ 5

Admitindo comportamento de gás ideal:

∑ 6

Escrevendo de forma genérica a mistura:

7

O balanço de massa da mistura fica, conforme (Gordon e McBride, 1994):

Page 5: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

∑ 8

Sendo o coeficiente estequiométrico do elemento i nas espécies j, tendo valor positivo quando

referenciado para produtos e valor negativo para reagentes. O índice l é o número de elementos

químicos. Assim a condição de equilíbrio, eq. 4, torna-se:

∑ ( ∑ ) ∑ (∑

)

9

Onde são os multiplicadores Lagrangeanos.

Segundo (Turns, 2000) é possível definir uma constante Kp, chamada de constante de

equilíbrio, para cada reação do sistema em equilíbrio, que para gases perfeitos, é dada pela seguinte

equação:

(

)

10

xi é a fração molar do elemento i. Os índices a e b se referem aos reagentes e os índices r e s aos

produtos. Os expoentes A, B, C e D correspondem aos coeficientes estequiométricos (sendo números

inteiros) de cada reação de dissociação. A constante Kp é geralmente tabelada em função da

temperatura para cada reação no equilíbrio, tendo normalmente como referência a temperatura de

298,15 K e pressão de 1 bar. A correção para outras pressões é realizada através da relação de

pressões apresentada na Equação 10.

4. DESCRIÇÃO DO PROBLEMA E METODOLOGIA

4.1 Descrição do Problema

As simulações da combustão de carvão em atmosferas enriquecidas com oxigênio foram efetuadas

pelo software CEA, que utiliza a formulação de equilíbrio químico descrita anteriormente. Os dados

de entrada das simulações basearem-se nas análises imediata e elementar de carvões brasileiros

realizadas na Universidade Técnica de Brandemburgo, em Cottbus, Alemanha. As amostras de

carvão utilizadas são denominadas de: Leão II, B3 e Bonito. Os dados utilizados para a

caracterização desses carvões no CEA são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Análise elementar dos carvões analisados, em porcentagens de fração mássica, utilizada

como dado de entrada no software CEA.

Elemento Químico Leão II B3 Bonito

Carbono 31,23 46,35 26,14

Hidrogênio 3,68 5,10 2,00

Oxigênio 37,62 33,55 30,59

Nitrogênio 0,55 0,76 0,45

Enxofre 2,28 0,84 3,80

Alumínio 6,20 3,28 6,63

Cálcio 0,56 0,55 0,40

Ferro 2,08 0,27 2,85

Potássio 0,53 0,30 2,10

Silício 10,36 5,46 15,42

Titânio 0,31 0,20 0,31

Soma dos Traços 4,61 3,34 9,32

Page 6: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

Dadas as limitações do software em relação ao número de elementos químicos introduzidos como

reagentes, os elementos cujas frações mássicas são da ordem de 0,1% foram considerados traços. A

metodologia aplicada para análise de emissões é análoga à utilizada por Zheng e Furimsky (2003).

Seguindo uma formulação de combustão de carvão apresentada por Carvalho Jr (2007),

considerou-se uma amostra de 100 kg de carvão, a partir da qual foram determinadas as frações

molares e o número de moles de cada elemento químico. Cada amostra de carvão foi simulada, em

pressão atmosférica e reação estequiométrica, para cinco diferentes concentrações de oxigênio no

oxidante (21%, 25%, 50%, 75% e 100%) e duas temperaturas dos produtos de combustão (1400 K e

1800 K). Salienta-se que nenhum dos casos simulados refere-se a oxicombustão mas a combustão

enriquecida, de modo que a corrente de oxidante é apenas enriquecida com oxigênio, não havendo

recirculação de produtos de combustão. Assim sendo, para um caso com atmosfera 100% oxigênio, o

nitrogênio presente na reação provém apenas do carvão.

4.2 Metodologia de Solução

O software utilizado nas simulações foi o CEA (Chemical Equilibrium with Applications),

desenvolvido pela NASA a partir da década de 1940 (http://www.grc.nasa.gov/ WWW/CEAWeb).

Este programa determina as características de produtos de combustão em equilíbrio, como

concentração e propriedades termodinâmicas e de transporte, para uma variedade de reagentes.

Para simplificar a formulação do programa foram assumidas algumas hipóteses simplificativas, a

saber: fase gasosa constituída por gases perfeitos; lei de Dalton das pressões parciais para a fase

gasosa e fases líquida e sólida são consideradas com volume desprezível.

Para o problema analisado, a solução é obtida através da minimização da função de Gibbs com o

uso de multiplicadores de Lagrange. Por padrão, os resultados englobam as principais propriedades

termofísicas dos produtos de combustão (viscosidade, massa específica, condutividade, velocidade do

som, entalpia, temperatura e entropia específica) e as frações molares das espécies cujos valores

sejam maiores que 1x10-5

.

5. RESULTADOS

A seguir são apresentados os resultados mais significativos obtidos nas simulações realizadas. As

emissões são apresentadas em unidades de kilograma de poluente por megajoule (em escala

logarítmica) de energia liberada na combustão, baseando-se no poder calorífico inferior de cada

carvão. Essa escolha foi motivada pela dificuldade de se estabelecer o número de moles de carvão na

amostra, tendo em vista que a composição dos traços, que contém elementos de alto peso molecular

como chumbo e mercúrio, não está definida.

A Figura 3 apresenta um comparativo entre as emissões de dióxido de enxofre obtidas para as

duas temperaturas de equilíbrio:

Page 7: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

Figura 3 – Emissão de SO2 nos gases de combustão em função da concentração de oxigênio no

oxidante para as três amostras de carvão investigadas

PCI: Leão II – 11,44 MJ/kg | B3 – 17,32 MJ/kg | Bonito – 8,79 MJ/kg

Nota-se que com os gases de combustão à 1400K, ocorre uma pequena redução na emissão de SO2

para as amostras de carvão Leão II e B3 à medida que é aumentada a concentração de O2 no oxidante.

Já para a amostra Bonito, na mesma temperatura, o que ocorre é um pequeno aumento na emissão de

dióxido de enxofre. Para o caso em que os gases estão a 1800 K, a emissão de dióxido de enxofre

permanece praticamente constante para as três amostras estudadas.

A Figura 4 ilustra um comparativo de emissões de SO3 análogo ao anterior.

Figura 4 – Emissão de SO3 nos gases de combustão em função da concentração de oxigênio no

oxidante para as três amostras de carvão investigadas

PCI: Leão II – 11,44 MJ/kg | B3 – 17,32 MJ/kg | Bonito – 8,79 MJ/kg

0,01

0,10

1,00

20 30 40 50 60 70 80 90 100

SO2

[kg

/ M

J]

O2 [%]

Leão II (T = 1400K) Leão II (T = 1800K) B3 (T = 1400K)

B3 (T = 1800K) Bonito (T = 1400K) Bonito (T = 1800K)

1,00E-07

1,00E-06

1,00E-05

1,00E-04

1,00E-03

1,00E-02

20 30 40 50 60 70 80 90 100

SO3

[kg

/ M

J]

O2 [%]

Leão II (T = 1400K) Leão II (T = 1800K) B3 (T = 1400K)

B3 (T = 1800K) Bonito (T = 1400K) Bonito (T = 1800K)

Page 8: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

A Figura 4 exibe comportamentos bastante distintos para cada carvão com o processo de

enriquecimento da combustão. Para a amostra Leão II, o aumento do oxigênio a 1400 K reduz a

formação de SO3 enquanto que a 1800 K essa formação é favorecida pelo aumento de concentração

de oxigênio. Para o carvão B3, a formação de trióxido de enxofre é mínima para os casos de

combustão com 21 e 25% de O2. A amostra Bonito não mostra mudança na formação de SO3 com a

temperatura, apesar de apresentar um pequeno aumento com o nível de oxigênio.

A Figura 5 apresenta os resultados para formação de monóxido de carbono.

Figura 5 – Emissão de CO nos gases de combustão em função da concentração de oxigênio no

oxidante para as três amostras de carvão investigadas

PCI: Leão II – 11,44 MJ/kg; B3 – 17,32 MJ/kg; Bonito – 8,79 MJ/kg

De maneira geral, nota-se que as três amostras geram quantidades muito próximas de monóxido

de carbono para o equilíbrio a 1800 K. Para os casos a 1400 K verifica-se que o carvão Leão II é

sensível ao aumento da concentração de oxigênio, enquanto que a emissão de CO do carvão Bonito

não se altera com o enriquecimento de oxidante.

As emissões de CO2, para as temperaturas de 1400 K e 1800 K, são mostradas na Figura 6.

1,0E-06

1,0E-05

1,0E-04

1,0E-03

1,0E-02

1,0E-01

20 30 40 50 60 70 80 90 100

CO [

kg /

M J

]

O2 [%]

Leão II (T = 1400K) Leão II (T = 1800K) B3 (T = 1400K)

B3 (T = 1800K) Bonito (T = 1400K) Bonito (T = 1800K)

Page 9: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

Figura 6 – Emissão de CO2 nos gases de combustão em função da concentração de oxigênio no

oxidante para as três amostras de carvão investigadas

PCI: Leão II – 11,44 MJ/kg | B3 – 17,32 MJ/kg | Bonito – 8,79 MJ/kg

Os resultados demonstram que, para as três amostras de carvão, a formação de dióxido de

carbono aumenta, a uma taxa praticamente linear, com o aumento da concentração de oxigênio e que

a sua formação para a temperatura de equilíbrio de 1800 K é um pouco menor que na de 1400 K.

A Figura 7 exibe as emissões de monóxido de nitrogênio.

Figura 7 – Emissão de NO nos gases de combustão em função da concentração de oxigênio no

oxidante para as três amostras de carvão investigadas

PCI: Leão II – 11,44 MJ/kg | B3 – 17,32 MJ/kg | Bonito – 8,79 MJ/kg

De forma esperada, a redução da concentração de N2 com o aumento de enriquecimento da

combustão, promove uma redução nas emissões de NO em todas as amostras estudadas. Como a

1,0

1,5

2,0

2,5

3,0

3,5

4,0

4,5

5,0

5,5

20 30 40 50 60 70 80 90 100

CO2

[kg

/ M

J]

O2 [%]

Leão II (T = 1400K) Leão II (T = 1800K) B3 (T = 1400K)

B3 (T = 1800K) Bonito (T = 1400K) Bonito (T = 1800K)

1,0E-07

1,0E-06

1,0E-05

1,0E-04

1,0E-03

1,0E-02

1,0E-01

1,0E+00

20 30 40 50 60 70 80 90 100

NO

[kg

/ M

J]

O2 [%]

Leão II (T = 1400K) Leão II (T = 1800K) B3 (T = 1400K)

B3 (T = 1800K) Bonito (T = 1400K) Bonito (T = 1800K)

Page 10: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

formação de monóxido de nitrogênio cresce com a temperatura, a emissão de NO a 1800K é maior

do que a 1400K.

6. CONCLUSÕES

Os resultados apresentados mostram que o processo OEC é uma tecnologia a princípio promissora

para a redução das emissões de NOx poluentes. Foram obtidas em algumas das emissões dos

principais poluentes. Os melhores resultados foram obtidos com a amostra B3, com o qual foi obtida

redução em algumas das principais emissões, principalmente na de NO, cujo decréscimo foi de até

98,3% em relação ao caso padrão (oxidante com volume de 21% de O2). Já com a amostra Bonito

foram obtidos os resultados mais desfavoráveis, tendo apresentado os maiores índices de emissões,

mesmo para concentrações de 21% de O2 no oxidante. Para todos os casos e situações estudadas

houve um aumento nas emissões de CO2, onde os maiores incrementos foram obtidos para a amostra

Bonito (31,8% em relação ao caso padrão), o que a princípio poderia favorecer os processos de

captura de dióxido de carbono pós-combustão.

A análise da combustão de carvões brasileiros em atmosferas enriquecidas com oxigênio mediante

ferramentas de equilíbrio químico mostrou-se bastante útil para avaliar o comportamento qualitativo

das emissões e do calor liberado. Dentro dos limites da metodologia aplicada, é possível estabelecer o

comportamento esperado na formação de alguns poluentes, como os óxidos de enxofre, que são de

grande interesse para a geração termelétrica a carvão. Os resultados obtidos possibilitam uma

abordagem mais direcionada de eventuais experimentos envolvendo a queima de carvão em

processos de combustão enriquecida com oxigênio e oxicombustão.

Entre as sugestões para trabalhos futuros, salienta-se a necessidade de um estudo detalhado dos

mecanismos de formação dos óxidos de enxofre e monóxido de carbono e das restrições de cinética

química que decorrem das condições de queima pulverizada ou em leito fluidizado.

7. AGRADECIMENTOS

O primeiro e terceiro autores agradecem à CAPES, o segundo autor agradece ao CNPq (bolsa nº

142476/2011-6), a quarta autora agradece à CAPES (Projeto PNPD 02784/09-2) e o último autor

agradece ao CNPq (Bolsa de pesquisa 308756/2009-6). Os autores também agradecem ao Lehrstuhl

Kraftwerkstechnik - BTU Cottbus pelas informações disponibilizadas.

8. REFERÊNCIAS

ANEEL — Agência Nacional de Energia Elétrica. Atlas de energia elétrica do Brasil. 3. ed. Brasília,

2008.

Baukal, C.E. Oxygen enhanced combustion. CRC Press, Boca Raton, 1998.

Bejarano, P.A., Levendis, Y.A. Single-coal-particle combustion in O2/N2 and O2/CO2 environments.

Combustion and Flame, v. 153, p. 270–287, 2008.

Carvalho Jr., J.A., McQuay, M.Q. Princípios de combustão aplicada. Editora da UFSC, Florianópolis,

176 p., 2007.

Chomiak, J. Combustion: a study in theory, fact and application. Gordon and Breach Science

Publishers, London, 1990.

Page 11: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

Companhia Riograndense de Mineração. Um estado rico em reservas de carvão mineral. 2011.

Disponível em: <http://www.crm.rs.gov.br/hypervisual/carvao/index.php?secao=carvao>. Acesso

em: 15 maio 2011.

Eletrobras CGTEE. Unidades. 2011. Disponível em: <http://www.cgtee.gov.br/sitenovo/

index.php?secao=16>. Acesso em: 15 maio 2011.

Empresa de Pesquisa Energética, Ministério de Minas e Energia. Plano Decenal de Expansão de

Energia 2019. Brasília, 2010.

Furimsky, E. Characterization of trace element emissions from coal combustion by equilibrium

calculations. Fuel Processing Technology, v. 63, p. 29-44, 2000.

Gordon S., McBride B. J. Computer Program for Calculation of Complex Chemical Equilibrium

Compositions and Applications. NASA RP-1311, National Aeronautics and Space Administration,

58 p., 1994.

Lehrstuhl Kraftwerkstechnik - BTU Cottbus. Bericht nº 10.041. Cottbus 2011.

Lehrstuhl Kraftwerkstechnik - BTU Cottbus. Bericht nº 10.043. Cottbus 2011.

Lehrstuhl Kraftwerkstechnik - BTU Cottbus. Bericht nº 10.044. Cottbus 2011.

Maidana, C.F. Avaliação dos efeitos da utilização da combustão enriquecida com oxigênio em

turbinas a gás industriais de um eixo. Dissertação de Mestrado. Departamento de Engenharia

Mecânica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 106 p., 2011.

Secretaria de Planejamento, Gestão e Participação Cidadã. Atlas socioeconômico Rio Grande do Sul.

2011. Disponível em: <http://www.seplag.rs.gov.br/atlas>. Acesso em: 15 maio 2011.

Sharma, A. K., 2008. ―Equilibrium and Kinetic Modeling of Char Reduction Reactions in a

Downdraft Biomass Gasifier: A Comparison‖, Solar Energy 82, p. 918-928, 2008.

Tractebel Energia. UTE Charqueadas. 2011. Disponível em: <http://www2.

tractebelenergia.com.br/modules/system/viewPage.asp?P=831&VID=default&SID=1253051944237

02&S=1&C=3593>. Acesso em: 15 maio 2011.

Turns, S. R. An Introduction of Combustion: Concepts and Applications, McGrall-Hill, Singapore,

704 p., 2000.

US National Energy Technology Laboratory. Coal becomes a ―future fuel‖. 2011. Disponível em:

<http://www.netl.doe.gov/KeyIssues/future_fuel.html>. Acesso em: 15 maio 2011.

Wall, T., Liu, Y., Spero, C., Elliot, L., Khare, S., Rathman, R., Zeenathal, F., Moghtaderi, B., Buhre,

B., Sheng, C., Gupta, R., Yamada, T., Makino, K. & Yu, J. An overview on oxyfuel coal

combustion—state of the art research and technology development. Chemical Engineering Research

and Design, v. 87:8, p. 1003–1016, 2009.

World Coal Association. Coal & electricity. 2011a. Disponível em: <http://www.worldcoal.org/

coal/uses-of-coal/coal-electricity>. Acesso em: 15 maio 2011.

Page 12: AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO DE CARVÕES …µes_A4_A5_A6/A5_ARTIGO_03.pdf · Este artigo avalia a tecnologia de combustão enriquecida com oxigênio na redução da formação de

World Coal Association. Carbon capture & storage technologies. 2011b. Disponível em:

<http://www.worldcoal.org/carbon-capture-storage/ccs-technologies>. Acesso em: 15 maio 2011.

Zheng L., Furimsky E. Assessment of coal combustion in O2/CO2 by equilibrium calculations. Fuel

Processing Technology, v. 81, p. 23–34, 2003.