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Avaliação do tratamento domiciliar de águas negras por um Tanque de Evapotranspiração (TEvap) Julho 2014 ISSN 2179-5568 Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 7ª Edição nº 007 Vol.01/2014 Julho/2014 Avaliação do tratamento domiciliar de águas negras por um Tanque de Evapotranspiração (TEvap) Fernando Silva Bernardes [email protected] MBA em Perícia, Auditoria e Gestão Ambiental Campo Grande, MS, 13 de setembro de 2013 Resumo Uma nova tendência para o saneamento é o conceito de saneamento ecológico que tem como enfoque a proteção dos recursos hídricos pelo não lançamento de esgoto nos cursos d’água, além de reutilizar de forma racional todos os nutrientes presentes nas excretas. Considerado uma alternativa ecológica de tratamento, o tanque de evapotranspiração (TEvap) é uma técnica desenvolvida com potencial para aplicação no tratamento domiciliar de águas negras que visa descarga zero. Neste preceito, o objetivo deste estudo foi avaliar o funcionamento e operação de um TEvap tratando águas negras de uma residência com dois habitantes.O sistema foi monitorado em dois períodos, sendo o último de 32 dias mais relevante para os resultados levantados. O lodo da câmara de digestão apresentou uma atividade metanogênica específica (AME) que suportaria uma carga biológica de 0,047 kgDQO/kgSSV.d o que refletiria em uma vazão de entrada de 740 L/dia, no entanto o sistema tem capacidade volumétrica apenas para operar com uma vazão de 48 L/dia, comportando 4 usuários. Em casos de extravasamento, quando exposto a uma vazão atípica, o sistema se apresentou com uma eficiência de 76%, levando em consideração o parâmetro Demanda Química de Oxigênio (DQO). Palavras-chave: Saneamento Ecológico. Segregação na Fonte. Águas negras. Atividade Metanogênica Específica (AME). 1. Introdução A grande deficiência de saneamento básico em várias regiões brasileiras, em especial de esgotamento sanitário, impõe grande número de pessoas a riscos inaceitáveis de exposição direta ou indireta a esgotos sanitários. O volume de esgoto sanitário lançado no solo ou em corpos d’água, em estado bruto ou insuficientemente tratado, constitui expressiva carga de organismo patogênico excretados por indivíduos infectados no meio ambiente. Esse quadro de deficiência da barreira sanitária tem forte influência nos indicadores de saúde, muito abaixo dos padrões mínimos da dignidade humana em várias regiões brasileiras (PROSAB, 2006).

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Julho 2014

ISSN 2179-5568 – Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - 7ª Edição nº 007 Vol.01/2014 Julho/2014

Avaliação do tratamento domiciliar de águas negras por um Tanque de

Evapotranspiração (TEvap)

Fernando Silva Bernardes – [email protected]

MBA em Perícia, Auditoria e Gestão Ambiental

Campo Grande, MS, 13 de setembro de 2013

Resumo

Uma nova tendência para o saneamento é o conceito de saneamento ecológico que tem como

enfoque a proteção dos recursos hídricos pelo não lançamento de esgoto nos cursos d’água,

além de reutilizar de forma racional todos os nutrientes presentes nas excretas. Considerado

uma alternativa ecológica de tratamento, o tanque de evapotranspiração (TEvap) é uma técnica

desenvolvida com potencial para aplicação no tratamento domiciliar de águas negras que visa

descarga zero. Neste preceito, o objetivo deste estudo foi avaliar o funcionamento e operação de

um TEvap tratando águas negras de uma residência com dois habitantes.O sistema foi

monitorado em dois períodos, sendo o último de 32 dias mais relevante para os resultados

levantados. O lodo da câmara de digestão apresentou uma atividade metanogênica específica

(AME) que suportaria uma carga biológica de 0,047 kgDQO/kgSSV.d o que refletiria em uma

vazão de entrada de 740 L/dia, no entanto o sistema tem capacidade volumétrica apenas para

operar com uma vazão de 48 L/dia, comportando 4 usuários. Em casos de extravasamento,

quando exposto a uma vazão atípica, o sistema se apresentou com uma eficiência de 76%,

levando em consideração o parâmetro Demanda Química de Oxigênio (DQO).

Palavras-chave: Saneamento Ecológico. Segregação na Fonte. Águas negras. Atividade

Metanogênica Específica (AME).

1. Introdução

A grande deficiência de saneamento básico em várias regiões brasileiras, em especial de

esgotamento sanitário, impõe grande número de pessoas a riscos inaceitáveis de exposição direta

ou indireta a esgotos sanitários. O volume de esgoto sanitário lançado no solo ou em corpos

d’água, em estado bruto ou insuficientemente tratado, constitui expressiva carga de organismo

patogênico excretados por indivíduos infectados no meio ambiente. Esse quadro de deficiência da

barreira sanitária tem forte influência nos indicadores de saúde, muito abaixo dos padrões

mínimos da dignidade humana em várias regiões brasileiras (PROSAB, 2006).

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Segundo o IBGE, através da Pesquisa Nacional de Saneamento - PNSB 2008, pouco mais da

metade dos municípios brasileiros (55,2%) tem serviço de esgotamento sanitário por rede

coletora, marca pouco superior à observada na pesquisa anterior, realizada em 2000, que

registrava 52,2%. No estado de Mato Grosso do Sul menos da metade (44,9%) dos municípios

são atendidos pela rede de coleta, sendo que, 43,6% deles, apresentam o devido tratamento. De

2008 para 2011 esse quadro ainda não se modificou muito, pois conforme o diagnóstico de água e

esgoto apresentado pelo Sistema Nacional de Informação sobre o Saneamento – SNIS observa-se

que apenas 55,5% dos municípios brasileiros apresentam coleta de esgoto e que apenas 37,5%

desse esgoto recebe o devido tratamento.

De acordo com a Lei Nacional de Saneamento Básico (n.° 11.445), sancionada em 05 de janeiro

de 2007 e regulamentada pelo Decreto n.º 7.217 de 21 de junho de 2010, todas as edificações

permanentes urbanas devem ser conectadas às redes públicas de abastecimento de água e de

esgotamento disponível, porém, na ausência de redes públicas de saneamento básico, serão

admitidas soluções individuais de abastecimento de água e de afastamento e destinação final dos

esgotos sanitários.

Dentro deste contexto, sabe-se que a maioria das residências apresenta sistemas de fossas sépticas

seguidas de sumidouro, no entanto, estes sistemas quando mal dimensionados e/ou dispostos em

áreas de lençol freático alto, também são potenciais poluidores das águas subterrâneas pela

infiltração de poluentes e patógenos. De cada dez pessoas no mundo, quatro não têm acesso

nem mesmo a uma latrina e apenas duas a cada dez tem acesso a água potável. Essa crise

silenciosa mata em torno de 3900 crianças a cada ano e rouba dos mais pobres, particularmente,

mulheres e crianças, sua saúde, tempo e dignidade (UN MILLENNIUM PROJECT TASK

FORCE, 2005).

Uma nova tendência para o saneamento é o conceito de saneamento ecológico, que tem como

enfoque principal o aumento da disponibilidade hídrica pela economia de água, a proteção dos

recursos hídricos pelo não lançamento de esgoto (tratado ou não) nos cursos d’água, evitando

todas as consequências causadas pelas tecnologias não sustentáveis, além de reutilizar de forma

racional todos os nutrientes presentes nas excretas. Este conceito se baseia no reaproveitamento

local dos nutrientes e da água contidos no esgoto doméstico, através da separação na fonte e do

tratamento e reuso descentralizados (WINBLAD & SIMPSON-HÉBERT, 2004).

Em uma residência, as águas residuárias podem ser segregadas em águas-cinza (lavatório,

chuveiro, lavandeira e cozinha) e águas-negras (vaso sanitário). De acordo com Otterpohl (2001),

águas negras são as águas residuárias provenientes dos vasos sanitários, contendo basicamente

fezes, urina e papel higiênico ou proveniente de dispositivos separadores de fezes e urina, tendo

em sua composição grandes quantidades de matéria fecal e papel higiênico. As águas negras

ainda podem ser segregadas em águas-marron e águas amarelas quando existe segregação de

urina na bacia sanitária, sendo aquelas água contendo apenas fezes e estas águas contendo apenas

urina.

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Considerado uma alternativa ecológica de tratamento, o tanque de evapotranspiração (TEvap) é

uma técnica desenvolvida e difundida por permacultores de diversas nacionalidades, com

potencial para aplicação no tratamento domiciliar de águas negras em zonas urbanas e

periurbanas (PAMPLONA & VENTURI, 2004).

Segundo Gabialti (2008), o funcionamento do sistema de evapotranspiração pode ser descrito da

seguinte forma: o efluente entra pela parte inferior do compartimento, composto por um túnel

(anel de concreto ou tubo de PVC perfurado, ou ainda pneus), cercado por uma camada de

entulho cerâmico ou brita. Na câmara formada ocorre a sedimentação e digestão anaeróbia do

efluente, que escorre pelos espaços entre os pneus/perfurações no anel. Saindo desse espaço, o

efluente passa pela camada de material cerâmico permeável, naturalmente colonizado por

bactérias que complementam a digestão. Na medida em que o efluente preenche todo o

compartimento, passando pelas camadas de brita e areia, em direção à superfície, o TEvap

funciona como um filtro anaeróbio. Durante esse trajeto, o efluente é mineralizado e filtrado, com

possível eliminação de patógenos. As raízes das plantas localizadas nas camadas superiores se

desenvolvem em busca de água e dos nutrientes disponibilizados pela decomposição da matéria

orgânica. O TEvap é um sistema impermeável ou seja, não há infiltração do efluente no solo,

assim através da evapotranspiração das plantas a água é eliminada do sistema, enquanto os

nutrientes presentes são removidos através da sua incorporação na biomassa das plantas, que são

podadas ou colhidas periodicamente.

Em recente publicação, Paulo et al (2012) descreveu um Tanque de Evapotranspiração (TEvap)

para tratamento de águas negras, sendo considerado um sistema natural que visa a descarga zero.

Desta forma, é de conhecimento científico que o tanque de evapotranspiração, trabalha em sua

maior parte na ausência de oxigênio. Amparado por Chernicharo (1997), sabe-se que a digestão

anaeróbia representa um sistema ecológico delicadamente balanceado onde cada microrganismo

tem uma função essencial. As arquéias metanogênicas desempenham duas funções primordiais:

produzem um gás (metano), possibilitando a remoção do carbono orgânico do ambiente

anaeróbio, além de utilizarem o hidrogênio, favorecendo o ambiente para que as bactérias

acidogênicas fermentem compostos orgânicos com a produção de ácido acético, o qual é

convertido em metano.

Os processos anaeróbios dependem da manutenção, dentro dos reatores, de uma biomassa

adaptada com elevada atividade microbiana e resistente a choques, o que torna importante os

testes de atividade metanogênica e biodegradabilidade (CHERNICHARO,1997). O

conhecimento da Atividade Metenogênica Esecifica (AME) do lodo de determinado reator

permite estabelecer, em última análise, a capacidade máxima de remoção de DQO da fase

líquida, e por isso permite estimar a carga orgânica máxima que pode ser aplicada com mi-

nimização do risco de desbalanceamento do processo anaeróbio (Aquino,2007).

Por ser uma tecnologia ainda muito recente, não existem trabalhos disponíveis na literatura sobre

operação e eficiência de sistemas de evapotranspiração. Portanto, o objetivo deste estudo foi

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avaliar o funcionamento e operação de um tanque de evapotranspiração, operando sob diferentes

condições ao longo de 1.448 dias.

2. Metodologia

O Tanque de Evapotranspiração (TEvap) foi construído em um abrigo no município de Campo

Grande – MS, sendo dimensionado para a utilização de dois moradores, recebendo os efluentes

do vaso sanitário, basicamente sem a presença de papel higiênico – (água, fezes e urina).

O tanque foi montado em ferro-cimento, sobre uma trincheira feita no solo, com fundo nivelado,

nas dimensões de 1 metro de profundidade, 2 metros de largura e 2 metros de comprimento. A

borda do tanque se estendeu a cerca de 10 cm acima da superfície do solo, de modo a evitar o

escoamento superficial de água da chuva para dentro do sistema. Uma câmara formada pelo

alinhamento de pneus usados foi posicionada longitudinalmente ao fundo do tanque, sem nenhum

tipo de rejunte, de forma que o efluente pudesse sair da câmara, passando por entre os pneus. A

tubulação de entrada de esgoto foi posicionada para dentro dessa câmara. Ao redor da mesma, foi

colocada uma camada de aproximadamente 45 cm de entulho cerâmico, cobrindo todo o fundo do

tanque. Acima, foram colocadas camadas com as seguintes espessuras: brita, 10 cm, areia, 10 cm

e solo, 35 cm. Na saída do tanque foi colocado um tubo de drenagem de 50 mm de diâmetro, 18

cm abaixo da superfície do solo, para o caso de eventuais extravasamentos do tanque. Foi

instalado um piezômetro (tubo de visita), feito com tubo de PVC de 100 mm de diâmetro, com

acesso ao túnel de pneus e também caixas de inspeção de alvenaria, na entrada e na saída do

tanque, para manutenção e para a coleta de amostras do efluente final, quando presente. A caixa

de saída foi conectada a uma vala de infiltração, para disposição final do efluente extravasado. A

Figura 1 mostra o desenho esquemático da composição das camadas e estrutura do tanque. Na

superfície, foram plantadas três mudas de bananeiras (Musa cavendishii), distribuídas

longitudinalmente ao centro do tanque; taiobas (Xanthosoma sagittifolium), em metade da área

do tanque e beri (diversas espécies do gênero Canna), na outra metade. Depois do plantio, o

tanque foi cheio completamente com água, para acomodação dos substratos e verificação da

capacidade líquida do tanque. O volume de água introduzido inicialmente no tanque foi medido

por meio de um hidrômetro e a relação volume de água por centímetro em cada camada do

substrato foi medido relacionando-se o volume de entrada no sistema pela medição do nível de

água, sendo realizada através do tubo de visita, com o auxílio de uma trena.

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Figura 1: Tanque de Evapotranspiração (TEvap) e suas diferentes camadas (substratos)

Fonte: Paulo et al (2012)

2.1 Experimento Contínuo

Amostras do efluente foram coletadas em dois pontos distintos – no interior (próximo da entrada)

e na saída do tanque, em dois períodos diferentes, sendo que no primeiro período, que teve

duração de 1006 dias (12/11/2007 a 14/08/2010), a periocidade da coleta foi quinzenal. O

segundo período, que teve duração de 32 dias (28/09/2011 a 30/10/2011) as coletas foram

realizadas semanalmente nas primeiras 04 semanas e diariamente na última semana.

Os parâmetros analisados foram: pH, turbidez e demanda química de oxigênio (DQO). As

análises foram feitas de acordo com o Standard Methods for the Examination of Water and

Wastewater (APHA, 2005).

A vazão da água negra produzida foi calculada através da leitura de um hidrômetros de 1,5 m3.h

-1

(multijato Actaris®) instalado na tubulação que alimenta o vaso sanitário do banheiro da

residência onde se localiza o sistema. A partir da vazão calculou-se o tempo de detenção

hidráulica (TDH) do TEvap durante as diferentes fases de operação do sistema.

2.2 Experimento em Batelada

Após 1.421 dias de operação do sistema, foi realizada a coleta do lodo na câmara de digestão

anaeróbia (câmara de pneus) por meio do piezômetro, sendo levado posteriormente para análise

do teste de Atividade Metanogênica Específica (AME) em laboratório.

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O teste AME foi realizado para classificar o potencial da biomassa na conversão de substratos

solúveis em metano (CHERNICHARO, 2007). Para elaboração deste teste foi utilizado um

frascos de vidro, com volume total de 3.250mL, o qual foi preenchido com 2.600mL de fase

liquida devido aos 20% de headspace considerado.

A fase liquida era composta por 3,7gSVT/L de biomassa (155 mL de lodo úmido) e 2.445 mL de

substrato (acetato) com uma concentração de 0,7gDQO/L e 0,6g de NaHCO3/L como tampão.

Foram realizadas duas alimentações com acetato de sódio, sendo a primeira com 0,7gDQO/L e a

segunda com 2,17gDQO/L.

Posteriormente a adição do lodo, do substrato e do tampão, os frascos foram fechados com

tampas de borracha dotadas de um ducto para a saída do gás produzido e outro para a retirada de

amostras líquidas, sendo fixadas com auxílio de silicone e parafilme (Pechinery Plastic

Packaging, USA). Depois de lacrados foi realizada a purga do oxigênio presente no headspace

utilizando N2/CO2 (70/30) (White Martins, Campo Grande-MS). Nos dias de análise de produção

de biogás, o ducto de saída do biogás era conectado ao sistema de medição de metano, composto

por solução com concentração de 16% de hidróxido de sódio (NaOH), nos demais dias o ducto

permanecia fechado. A produção de metano foi determinada, utilizando a metodologia de

deslocamento de líquido descrita em Aquino et al (2007).

O ducto de coleta de amostras líquidas permaneceu fechado, sendo aberto apenas para a coleta da

amostra com auxílio de uma seringa de 20 mL. Os frascos foram mantidos em uma temperatura

de 27 ± 3 °C, os quais eram agitados manualmente duas vezes por dia. A Figura 2 apresenta um

esquema do método utilizado na realização do teste.

Figura 2 – Teste AME

Legenda: 1- Frasco utilizado; 2- seringa para coleta de amostras; 3- vazão do biogás; 4- Mariotte com NaOH; 5-

volume deslocado de NaOH; 6- volume contabilizado

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

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2.3 Funcionamento do Sistema

Para melhor compreensão do funcionamento do tanque de evapotranspiração e avaliação de sua

operação e eficiência, o sistema foi dividido em duas unidades, sendo: 1 câmara de digestão

(câmara de pneus) e 2 filtro anaeróbio (camadas de materiais), conforme ilustrado na Figura 3.

Figura 3 - Vista frontal do TEvap e vista lateral da câmara de digestão

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

Conhecendo-se o volume total do sistema, e o diâmetro da câmara de digestão, bem como seu

comprimento pôde-se calcular separadamente o volume da câmara de digestão e do filtro

anaeróbio.

No período 29/09/2011 à 30/10/2011 juntamente com as coletas de efluentes, foram também

medidos o nível de águas residuárias dentro do tanque e o nível de lodo dentro da câmara de

digestão (câmara de pneus).

O nível de efluente dentro do sistema foi medido por meio do tubo de visita com o auxílio de

uma trena. Através também do tubo de visita o nível de lodo na câmara foi medido com a

inserção de uma haste com um pano branco amarrado na ponta. Este aparato foi mergulhado no

TEvap até tocar o fundo, depois de ficar por alguns segundos pressionado contra o fundo, o

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mesmo era retirado, ficando desta forma marcado o nível de lodo no pano, que era medido

também com uma trena.

Assim realizando-se a média, chamada de (H) na Figura 4, das medidas do nível do lodo de todos

os dias de coleta foi possível determinar o volume de lodo presente na câmara de digestão,

através de relações trigonométricas.

A B Figura 4– A: Área da sessão de lodo; B: Volume da sessão de Lodo

Legenda 2 – X – altura do triângulo retângulo; α – ângulo do setor; L – comprimento da câmara de digestão

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

Como o raio e a média dos níveis de lodo eram conhecidos, pode-se calcular a altura do triângulo

retângulo, chamada na figura 5 de X. Conhecendo-se X, foi calculado o ângulo alfa (α) e

posteriormente a área do setor. Subtraindo da área do setor a área dos dois triângulos retângulos,

obtivemos o valor da área de sessão de lodo, logo sabendo o comprimento (L) do tanque e

considerando que a altura de lodo não se modificara ao longo do compartimento de digestão

(Figura 4B), calculou-se o volume de lodo presente na câmara.

Posteriormente, com os dados da densidade e concentração de Sólidos Voláteis Totais (SVT) do

lodo, da vazão de entrada do sistema e da demanda química de oxigênio (DQO) de entrada por

metro cúbico (m³), calculou-se a Carga Biológica das águas negras da residência utilizando a

Fórmula (1), de acordo com Chernicharo (1997):

CB = (Q . S ) / M, onde: (1)

CB = Carga Biológica (KgDQO/KgSVT.d)

Q = Vazão (m3/d)

S = DQO (kg/ m3)

M = Massa de Microrganismos (Kg SVT)

3. Resultados e Discussões

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3.1 Experimento Contínuo

Baseado nos resultados das análises laboratoriais para as águas negras contidas no interior e saída

do TEvap, foram calculadas as médias aritméticas e os desvios padrões, obtendo-se assim, a

características das mesmas. Embora o TEvap não seja propriamente um sistema de tratamento de

esgoto para o qual se possa aplicar o conceito de eficiência, pois se operando dentro do projetado

não deve produzir efluente, procurou-se avaliar a eficiência do tanque para as coletas onde houve

extravasamento.

As tabelas 1 e 2, demonstram as médias, os desvios padrões e as taxas de remoções absolutas e

em porcentagem dos parâmetros analisados durante o 1º e 2º período de coleta.

12/11/2007 a

14/08/2010

Interior do Tanque Saída do Tanque Remoção

Parâmetro Média DP** Média DP Abs.*** %

DQO (mg/L) 682,2 (18)* 483,5 268,7 (15) 248,8 444,3 41,3

Turbidez (UNT) 425 (20) 9 42,4 (19) 0,9 307 86

pH 7,03 (20) 0,3 7,75 (19) 0,2 - -

Tabela 1 – Resultados do 1º Período de Coleta

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

28/09/2011 a

30/10/2011

Interior do Tanque Saída do Tanque Remoção

Parâmetro Média DP** Média DP Abs.*** %

DQO (mg/L) 326,09 (9)* 173,47 65,50 (5) 54,28 212,63 76,86

Turbidez

(UNT)

115,23 (12) 45,62 29,24 (5) 21,84 77,61 74,10

pH 7,18 (12) 0,25 7,37 (5) 0,26 - -

Tabela 2 – Resultados do 2º Período de Coleta

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

* Número de Amostras coletadas

** Desvio Padrão

*** Remoção Absoluta, em mg/L (DQO) e em UNT (Turbidez)

No 1º período verificamos um expressivo desvio padrão nas amostras de DQO, tanto no interior

como na saída do tanque. Observando os valores mais altos e mais baixos do TEvap, é possível

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notar que o valor máximo no interior do tanque foi de 1791,37mg/L e a mínima foi de

122,5mg/L, apresentando uma média abaixo do encontrado (6695mg/L) por Rebouças et al

(2007) utilizando amostras de água negra bruta, cada uma composta por 6 L de água, papel

higiênico, fezes e 250 mL de urina e acima do encontrado (421,2mg/L) por Rebêlo (2011) para

amostras de águas provenientes dos vasos sanitários e da pia de cozinha. Já na saída do sistema

foi encontrada uma máxima de 869,68 mg/L e mínima de 60,0 mg/L com valor médio acima do

encontrado (161,3mg/L) por Rebêlo (2011) utilizando como forma de tratamento reatores

anaeróbios com chicana, com meio suporte de casca de coco.

Essas altas divergências podem ser explicadas seguindo alguns fatores relevantes para este

primeiro período de coleta, como: condições climáticas, datas e realização de coleta e freqüência

do uso do banheiro ligado ao sistema. Como o sistema se encontra alocado em um abrigo

municipal, a freqüência do uso do banheiro varia de uma forma totalmente inconstante, visto que

cada época do ano, certo número de pessoas utilizam o sanitário, além do que o período em

análise compreende quase 3 anos de monitoramento feitos sem rotina regular, logo passou por

períodos de maiores e menores incidências solares levando a altas e baixas taxas de

evapotranspiração, bem como períodos chuvosos e de estiagem que refletem diretamente no

funcionamento do tanque.

Em relação à eficiência de remoção da DQO, a média absoluta encontrada no período foi de

444,3mg/L e em termos de porcentagem encontrou-se a eficiência média de 41,3%, para uma

vazão média e tempo de detenção hidráulica (TDH) médio de 148,29L/dia e 24,50dias

respectivamente, considerando que o sistema foi dimensionado para receber uma vazão diária de

64 L/dia e para um TDH infinito (sem extravasamento), percebe-se que para este período o

sistema estava trabalhando com o triplo da vazão dimensionada.

Tendo em vista o longo período de operação do sistema e uma variância considerável nas análises

estudadas, realizou-se um monitoramento com coleta mais intensiva, bem como

acompanhamento da leitura do hidrômetro pelo período de 01 mês. O estudo nesse período foi

focado na DQO para posterior avaliação da eficiência da câmara de digestão. Como no 2º

período, o monitoramento foi realizado em um intervalo de tempo menor, foi possível um melhor

acompanhamento dos fatores climáticos e da freqüência de uso do banheiro, podendo-se observar

e melhor explicar variações no sistema. O interior do tanque apresentou valor máximo de DQO

de 663,41mg/L e valor mínimo de 143,65mg/L, já na saída do sistema foi observado um valor

máximo de DQO de 160,33mg/L e valor mínimo de 31,90mg/L, com média de valores abaixo da

média do primeiro período. Este fato pode ser explicado devido ao sistema nesse período ter sido

utilizado apenas por dois moradores, o que levou o sistema a receber uma concentração de DQO

menor, refletindo assim em apenas uma vazão de 62,44L/dia, quase 1/3 da do 1º período.

Verificou-se ainda que os valores mínimos encontrado no interior e na saída do tanque ocorreram

em dias de alto índice pluvial, o que pode ter diluído a amostra.

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Das 9 datas de coleta de amostras durante o segundo período de monitoramento, em 7 ocasiões o

sistema não havia apresentado extravasamento, indicando que estava operando com uma vazão

dentro do que havia sido dimensionado, que conseqüentemente leva à um tempo de detenção

hidráulica alto,no dia de menor vazão (13,7 L/dia) o TDH chegou a 90 dias, porém o valor médio

encontrado foi de 50,70 dias.

No restante das coletas que apresentaram saída (02 coletas), realizou-se a análise de remoção

absoluta e em porcentagem, sendo 212,63mgDQO/L e 76,86% respectivamente. Apesar da

remoção absoluta ser menor do que a do primeiro período a eficiência do sistema no segundo

período foi mais representativa, devido a apresentar uma maior regularidade em seu

funcionamento (menor desvio padrão). No segundo período, o sistema já estava em operação por

1.421 dias, o que nos leva a considerar que o lodo já estava totalmente adaptado ao efluente.

Verificou-se também que neste período o tempo de detenção hidráulico médio (50,70 dias) foi o

dobro do primeiro período (24,50 dias), com isso o efluente ficava em contato com os

microrganismos por mais tempo, além do que no segundo período, as camadas de entulho

cerâmico e brita provavelmente já apresentavam uma maior camada de biofilme, tendo em vista

que a percolação dos esgotos sobre o meio suporte faz com que haja um crescimento bacteriano

na superfície da pedra ou do material de enchimento, na forma de uma fina película fixa

denominada biofilme (GONÇALVEZ., 2001)

Esta constatação fica mais evidente, quando observamos a taxa de remoção da turbidez do

primeiro e segundo período. No 1º período a taxa de remoção em termos de porcentagem são de

86% e no 2º são de 74,10% respectivamente. Sabendo-se que a turbidez é caracterizada por

partículas em suspensão no efluente, acredita-se que no primeiro período de monitoramento as

partículas foram em boa parte filtradas pelo meio suporte e aderidas a estes, formando biofilmes,

que por sua vez, auxiliaram na remoção da DQO do segundo período de monitoramento.

O pH não sofreu divergências expressivas ficando próximo a neutralidade, apresentando para o

primeiro período a média de 7,03 (interior) e 7,75 (saída) e no segundo período 7,18 (interior) e

7,37 (saída). Esses resultados são importantes, pois segundo Van Haandel e Lettinga (1999) a

atividade dos microrganismos anaeróbios metanogênicos é bastante sensível ao valor do pH, uma

taxa elevada de metanogênese desenvolve-se apenas quando 95 % do pH se mantém em uma

faixa estreita, próxima do valor neutro. Se o pH tiver valor menor que 6,3 ou superior a 7,8, a

taxa de metanogênese diminui rapidamente.

3.2 Experimento em Batelada

O sistema foi realimentado após consumo de 80% da primeira alimentação, considerando-se

DQO inicial de 2,17g/L, com um tempo de duração de teste de 11 dias.

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Na Figura 5, observa-se que o pH se manteve estável na faixa de 7, mostrando assim que por todo

o experimento conseguiu-se uma neutralidade dentro do garrafão. Observa-se também que os

ácidos graxos voláteis (AGV) foram totalmente convertidos (99,6%), sendo que a DQO,

representada principalmente pelos AGVs na solução, apresentou uma remoção de 75%

(1639mg/L).

Desta forma a AME do lodo do tanque de evapotranpiração teve um resultado de 0,047

gDQOCH4/gSSV.d, se apresentando próximo aos valores encontrados por Lopes (1994) apud

Mendonça (0,044 gDQOCH4/gSSV.d) para AME de lodos de esgotos sanitários, sob o efeito

tóxico do nitrogênio amoniacal (208mg/L) e por Bertolino (2008), que encontrou para AME de

lodos anaeróbios tratando esgoto do campus da UFOP, o valor de 0,057gDQOCH4/gSSV.d. O

resultado da atividade metanogênica específica do TEvap também se situou dentro da faixa de

valores encontrado por Silva et al (2000) de 0,037 a 0,127 gDQOCH4/gSSV.d em estudos

realizados para avaliar a AME da biomassa do reator UASB que recebe lodo aeróbio de lavagem

de biofiltros aeróbios.

A

B

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Figura 5 – Parâmetros monitorados ao longo da 2ª alimentação do teste de atividade metanogênica específica. A:

Consumo de DQO e produção de metano B: Consumo deácidos graxos voláteis (AGV) e valores de pH ao longo do

tempo.

Fonte: dados produzidos pelo autor (2013)

3.3 Operação do Sistema

O sistema em estudo foi construído com 4m² de área superficial, para atender a uma residência

com dois habitantes. De acordo com os resultados, seu volume total útil é de 1233L, sendo 1195L

(21,3L/cm) no conjunto câmara de pneus, camada de entulho cerâmico e brita, e 38L (1,41 L/cm)

no conjunto camada de areia e de solo. Com o volume total útil calculou-se o volume da câmara

de digestão (442L) e do filtro anaeróbio (791L), bem como observou-se para o segundo período

de monitoramento o tempo de detenção hidráulica médio em cada um dos compartimentos sendo

18,2 dias para a câmara e 32,5 dias para o filtro, consequentemente levando a um TDH total de

50,70 dias.

Como já demonstrado nos resultados do experimento em batelada, a AME do lodo

(0,047216kgDQO/KgSVT.dia) se apresentou 11,85 vezes maior que a carga biológica

(0,00398KgDQO/KgSVT.dia) submetida ao sistema. Desta forma a câmara de digestão teria

capacidade para digerir uma vazão de 740L/dia, valor este superior a quase 12 vezes a vazão

média (62,44L/d) de entrada do tanque.

No entanto, quando analisada a eficiência do TEvap, verificou-se uma taxa de remoção de DQO

de 76%, o que é abaixo da capacidade do sistema. Uma das causas pode ter sido a vazão atípica

(454 L/dia) recebida na semana dos dias 11/10/2011 a 18/10/2011. Esta vazão pode ter sido

provocada pela utilização do sanitário por mais de duas pessoas, tendo em vista que essa semana

foi à semana do “saco cheio”, a qual é marcada pela chegada de visitantes no abrigo, além do que

os próprios moradores passam maior tempo em casa. Nesses dias o sistema operou com um TDH

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total de 2,71 dias, sendo 0,97 dias para câmara de digestão e 1,78 dias no filtro anaeróbio. Desta

forma quando o sistema recebe uma vazão deste porte ele se inunda por inteiro até o seu total

extravasamento, ficando nestes casos, o efluente por mais tempo na parte considerada como filtro

anaeróbio, que se torna o principal responsável pela remoção da DQO. De acordo com Pinto

(1995) citado por Chernicharo (1997) trabalhos de pesquisa em escala piloto utilizando-se filtros

anaeróbios como unidades isoladas de tratamento de esgoto doméstico, operando com vazões

constantes e tempos de detenção hidráulica variando de 6 a 8 horas, precedidos apenas de

dispositivos de tratamento preliminar, indicaram eficiência de remoção de DBO e DQO variando

entre 68% e 79%.

Para analisar o comportamento da capacidade do tanque nos demais 25 dias de monitoramento,

foi desconsiderada a semana atípica de comportamento da residência, tendo em vista o seu

baixíssimo tempo de detenção hidráulica (2,71 dias) em relação ao TDH médio (50,70 dias) e

ainda levando em consideração que nas observações posteriores o sistema voltou a se comportar

normalmente sem extravasamento e com o nível de efluente (29 cm) dentro do TEvap próximo ao

nível médio (33cm).

Para verificar o volume de efluente no sistema nesses 25 dias (28/09/2011-11/10/2011 e

19/10/2011-30/10/2011), foram considerados os seguintes parâmetros e valores: precipitação

total (145 mm) para o período, fornecida pelo banco de dados da estação meteorológica de

Campo Grande no site do INMET, volume total de entrada (607,4 L) de efluentes para os 25 dias

e o valor de evapotranspiração (4,36 mm/dia) do sistema para esses dias, calculado por Galbiati

(2007). O cálculo do volume foi realizado através da seguinte fórmula (2):

Vt = (P + Vent) – Evt , onde: (2)

Vt = volume de efluente no tanque (L)

P = precipitação total (L)

Vent = volume de entrada de efluente no tanque (L)

Evt = taxa de evapotranspiração (L)

Desta forma, considerando a infiltração de chuva no sistema entre uma faixa de 80 a 100%,

chegou-se aos valores de 629 a 743L, dividindo-se estes valores pela relação volume por

centímetro (21,7 L/cm) do conjunto câmara de pneus, entulho cerâmico e brita, obtém-se o nível

de águas negras no TEvap, que foi calculado na faixa de 29 - 34 cm. Comparando esta estimativa

com o valor médio (33cm) do nível de efluente medido do sistema nesses 25 dias, nota-se que o

valor medido se encaixa na faixa de valores calculada, tornando os cálculos realizados

satisfatório.

Portanto verifica-se que o TEvap está operando com praticamente metade de sua capacidade

volumétrica, podendo ainda, receber adicionalmente a vazão já recebida diariamente (62,44

L/dia), mais 24,16 L/dia, assim teria capacidade para receber uma vazão diária de 86,6 L. Com

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isso constata-se que mesmo a atividade metanogênica do sistema tendo capacidade para receber

uma vazão de 740 L/dia , o tanque não suportaria este volume de entrada, o que implicaria em

extravasamentos, neste caso o tanque de evapotranspiração deveria ser acompanhado de sistemas

de infiltração subsuperficial no solo, como as valas de infiltração (Santos & Athayde Junior,

2008).

4. Conclusões

Quando o sistema é exposto a uma vazão atípica, nota-se que ele opera com uma

eficiência de 76%.

A atividade metanogênica específica do lodo da câmara de digestão demonstrou que o

TEvap tem capacidade para remover a DQO presente em uma vazão 11 vezes maior que é

exposta ao sistema, porém o tanque não tem capacidade volumétrica para suportar esta vazão.

O tanque de evapotranspiração estudado tem capacidade para suportar uma vazão de 86,6

L/d, o que significa que ele pode ser utilizado para tratar as águas negras de 4 pessoas que tenham

os mesmos hábitos dos habitantes atuais, sem que haja nenhum extravasamento.

O sistema quando exposto a vazões normais, apresentou um funcionamento ideal para um

tanque de evapotranspiração, tendo em vista que não foi verificado extravasamento.

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