Avaliação da susceptibilidade ao risco de uma área piloto ... · de modelos matemáticos...

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123 IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA Avaliação da susceptibilidade ao risco de uma área piloto de Salvador Jesus, A. C. Graduando em Engenharia Civil - UFBA, Salvador, Bahia, Brasil, [email protected] Dias, L. S. O. Mestrando Engenharia Ambiental Urbana - UFBA–Salvador,Bahia,Brasil, [email protected] Miranda, S. B. Graduando em Engenharia Civil - UFBA, Salvador, Bahia, Brasil, [email protected] Campos, L. E. P. UFBA, Salvador, Bahia, Brasil – [email protected] Resumo: Uma forma de priorizar as intervenções nas cidades com problema de deslizamento, onde o crescimento da ocupação das encostas tem uma dinâmica muito mais rápida que a atuação do poder público, é através do desenvolvimento de uma ferramenta para quantificar o risco da susceptibilidade de deslizamento. Este trabalho visa, a partir do uso de informações de geometria e propriedades geotécnicas do solo, contribuir para determinar zonas susceptíveis a deslizamento, de uma região de Salvador, através da modelagem matemática utilizando como ferramenta o Sistema de Informação Geográfica (SIG). Abstract: Salvador, as well as a large part of the Brazilian main cities, suffer with landslide problems where the population of areas of risk grow faster than the public services are able to follow such growth, besides lacking adequate instruments to avoid material damages and life losses. This paper seeks to contribute to define the boundaries of risk areas, menaced by slope instability, beginning with the identification of the geometry and geotechnical properties of the soils and followed by a mathematical modeling based on a Geographical Information System (GIS)

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Avaliação da susceptibilidade ao risco de uma áreapiloto de Salvador

Jesus, A. C.Graduando em Engenharia Civil - UFBA, Salvador, Bahia, Brasil, [email protected]

Dias, L. S. O.Mestrando Engenharia Ambiental Urbana - UFBA–Salvador,Bahia,Brasil, [email protected]

Miranda, S. B.Graduando em Engenharia Civil - UFBA, Salvador, Bahia, Brasil, [email protected]

Campos, L. E. P.UFBA, Salvador, Bahia, Brasil – [email protected]

Resumo: Uma forma de priorizar as intervenções nas cidades com problema de deslizamento,onde o crescimento da ocupação das encostas tem uma dinâmica muito mais rápida que a atuaçãodo poder público, é através do desenvolvimento de uma ferramenta para quantificar o risco dasusceptibilidade de deslizamento. Este trabalho visa, a partir do uso de informações de geometriae propriedades geotécnicas do solo, contribuir para determinar zonas susceptíveis a deslizamento,de uma região de Salvador, através da modelagem matemática utilizando como ferramenta o Sistemade Informação Geográfica (SIG).

Abstract: Salvador, as well as a large part of the Brazilian main cities, suffer with landslide problemswhere the population of areas of risk grow faster than the public services are able to follow suchgrowth, besides lacking adequate instruments to avoid material damages and life losses. Thispaper seeks to contribute to define the boundaries of risk areas, menaced by slope instability,beginning with the identification of the geometry and geotechnical properties of the soils andfollowed by a mathematical modeling based on a Geographical Information System (GIS)

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1 INTRODUÇÃO

Para avaliação da prioridade de intervenção emcidades onde ocorrem com freqüência proble-mas de deslizamento de terra, torna-se necessá-rio avaliar a susceptibilidade de deslizamento,permitindo ao poder público definir regiões paraintervenções e desenvolvimento de projetos es-pecíficos para redução do risco de deslizamentode terra.

Na análise da susceptibilidade não é possí-vel a realização de um estudo de estabilidademais criterioso, utilizando métodos tradicionaispara avaliação da estabilidade, como por exem-plo, Bishop, Fellenius, Spencer, Sarma,Morgenstern e Price, dentre outros.

Segundo Avelar et al (2001), citando CoelhoNeto (1983), a susceptibilidade da ocorrência dedeslizamento é função da escala espacial e dasestruturas funcionais entre as interações, fato-res geológicos, geomorfológicos, pedológicos,climáticos e cobertura vegetal. Logo, a análisedesses fatores em conjunto possibilita obter ummapa de maior validade e para tanto o Sistema deInformação Geográfica torna-se uma ferramentade grande valia, devido ao fator integralizadorde informações tão heterogêneas, permitindoanálise conjunta de todos esses dados e defi-nindo novos produtos.

Segundo Wu & Sidle (1995), Christofollett,(1999) citado por Gomes et al (2005) a utilizaçãode modelos matemáticos integrados a um siste-ma de informação geográfico torna-se essencial,pois possibilita tratar as variáveis especialmenteem diferentes escalas.

Assim, foi aplicada esta metodologia para umaárea piloto em Salvador, visando no futuro, es-tender para toda a cidade, após os ajustes quese façam necessários..2 ÁREA DE ESTUDO

A área de estudo está localizada na região dePituaçu nas proximidades da Companhia

Hidroelétrica do São Francisco (CHESF) e daavenida São Rafael, conforme se observa na fo-tografia área da região (Figura 1), localidade essaconhecida por Vila Nova de Pituaçu, cujo acessoé feito pela avenida Gal Costa. A área em estudoapresenta declividade acentuada do terreno na-tural, situação essa agravada com a intensa edesordenada ocupação habitacional existente.Essas ações antrópicas existentes nas encostasforam realizadas de forma totalmente aleatória eirregular, e em muitos dos casos, interferindo nosistema natural de drenagem pluvial.

Figura 1 – Fotografia aérea da região em estudo

3 INVESTIGAÇÕES GEOTÉCNICAS

Por ser uma área em estudo da Companhia deDesenvolvimento Urbano do Estado da Bahia(CONDER), já haviam sido realizadas algumasinvestigações geotécnicas na área, consistin-do de sondagens de simples reconhecimento ecoleta de amostras para ensaios laboratoriais.

3.1 Sondagens

As sete sondagens de simples reconhecimentodisponíveis foram realizadas ao longo do sopéda encosta, não trazendo informações conclu-sivas para o estudo de estabilidade.

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3.2 Ensaios de Laboratório

Devido a inexistência de sondagens de simplesreconhecimento nas encostas, a não ser àque-las realizadas ao longo do sopé, optou-se porcoletar duas amostras indeformadas. Nessasamostras foram realizados ensaios de caracteri-zação e de cisalhamento direto. Os resultadosdos ensaios de granulometria são apresenta-dos na Figura 2, contando com os percentuaisdas frações constituintes dos solos.

Figura 2 – Análise granulométrica das amostras

Em termos granulométricos constata-se queo solo identificado por 01 se manifesta com te-ores de areia e silte equivalentes, em torno de35%, contendo apenas 22% de argila. Já o solo02 apresenta teores de silte e de argila bem pró-ximos, da ordem de 35%, com 23% de areia. Sa-lienta-se que ambos possuem para fração pe-dregulhos teores inferiores a 10%. Pelo expos-to nota-se que o solo identificado por 02 sepronuncia mais fino em relação ao solo 01.

Quanto aos ensaios de limites de consis-tência os resultados são apresentados na Ta-bela 1, acompanhado dos valores da umidadenatural, índice de plasticidade e da atividadecoloidal proposta por Skempton (1953).

Tabela 1 – Resultados de ensaios para determi-nação dos limites de consistência

Observa-se que o solo 02 se apresenta maisplástico em comparação ao solo 01, corrobo-rando com os aspectos texturais anteriormentediscutido. Pela proposta de Skempton (1953) osolo 01 é caracterizado como inativo, enquantoo solo 02 como de atividade normal.

Foram obtidos a partir dos ensaios decisalhamento direto os valores médios dos ín-dices físicos que são ilustrados na Tabela 2.

Tabela 2 – Resultado dos índices físicos

Quanto aos ensaios de cisalhamento dire-to, foram realizados do tipo consolidado lento,em corpos de prova na umidade natural e previ-amente inundados (6 horas), com aplicação detensões normais inicias de 50, 100 e 200 kPa. Avelocidade do ensaio foi de 0,10 mm/min, sen-do utilizados corpos de prova com as dimen-sões de 10 x 10 x 2,4 cm. A Figura 3 ilustra osparâmetros de resistência dos dois solos anali-sados, enquanto a Tabela 3 apresenta os resul-tados obtidos dos ensaios.

Tabela 3 – Parâmetros de resistência

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Figura 3 - Envoltória de resistência

4 METODOLOGIA

A primeira fase do trabalho compreendeu a co-leta de informações da área de estudo, obten-do-se junto a CONDER, os dados relacionadoscom a “hipisiometria”, o qual foi produzidonuma escala de 1:2000. Com as informações dis-poníveis aliada a utilização de um Sistema deInformação Geográfica (SIG), iniciou-se a mo-delagem digital do terreno, empregando oaplicativo “topo to raster” do Arc View 9.0, bemcomo a determinação da declividade em cadaponto da superfície da encosta. A escolha sedeu diante da observação comentada por Gui-marães (2000) informando que o aplicativo utili-za o mesmo algorítmo do módulo do “topo grid”que, dentre as metodologias para a modelagemde terreno apresenta menor diferença quandocomparada com a topografia real.

O modelo digital do terreno (MDT) foi gera-do utilizando a ferramenta topogrid queinterpola as curvas de nível de maneira a pro-duzir uma malha com “grid raster” tendo 1x1metro, mantendo assim as característicasmorfológicas do relevo, representadas atravésdessa modelagem da superfície do terreno, con-forme pode ser visualizado na Figura 4:

Figura 4 – Modelo digital do terreno

A partir do MDT pode-se gerar um novo pro-duto que foi a carta de declividade, sendo defi-nidos cinco intervalos de declividades distin-tas, apresentado na Figura 5:

Figura 5 – Carta declividade da encosta

Através da análise do modelo digital do terrenoe da carta de declividade percebe-se que a en-

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costa apresenta um padrão convexo, comdeclividade média de vinte graus, mas em al-guns pontos chega a valores superiores a cin-qüenta graus. Essas regiões de maiordeclividade são apresentadas em tons mais es-curos na Figura 5.

Para avaliar a susceptibilidade, após a mo-delagem do terreno, torna-se necessário adotaruma formulação para avaliar a estabilidade daencosta. Observando os diversos tipos de rup-turas ocorridas na cidade, nota-se que sãodeslizamentos superficiais e estão relacionadoscom o processo de infiltração de água de chu-vas ou de esgotamento sanitário, uma vez queesses deslizamentos ocorrem com espessura daordem de 2 a 4 metros, enquanto que o nível deágua no terreno está localizado numa profundi-dade superior a 10 metros, na maioria dos casosobservados. Dessa forma, a adoção de um pro-cesso de verificação da estabilidade adotandoruptura planar não está muito diferente da for-ma de ruptura observada. Para cálculo do fatorde segurança foi adotada a seguinte formula-ção:

(1)

Para gerar a carta de susceptibilidade aodeslizamento, fui utilizado o módulo “RasterCalculator” do ArcView 9.0, que realiza opera-ções matemáticas através da álgebra matricialutilizando a equação (1), para cada célula gera-da pelo “topo to raster” que possui um valor dedeclividade (â), utilizando para isso os valoresdos parâmetros apresentados a seguir: coesãode 7,4 kPa; ângulo de atrito 33,8º, peso específi-co de 17,2 kN/m³ e profundidade (h) de 2 metros.

O resultado dessa análise é apresentado naFigura 6. Foi considerada como zona de suscep-tibilidade ao deslizamento os locais onde apre-sentaram fator de segurança menor que 1,5, sen-do ilustrado na figura pela tonalidade mais clara.

Figura 6 – Carta de susceptibilidade de risco dedeslizamentos

Percebe-se analisando a carta de suscepti-bilidade de risco de deslizamento apresentadaacima (Figura 6) a existência de vários pontossusceptíveis a deslizamento rasos, desde que osolo se encontre na condição saturada, sobre-tudo na região onde a declividade é mais acen-tuada.

5 VALIDAÇÃO DA CARTA

Para a validação desta carta de susceptibilida-de de risco de deslizamentos, comparou-se asáreas críticas obtidas na análise com as condi-ções de campo, obtendo-se uma boa correla-ção, uma vez que foi observado grande númerode deslizamento de terra nessas áreasidentificadas, através de novos deslizamentosou cicatrizes mais antigas.

Ficou evidente que os pontos estimadospela carta teve uma parcela considerável de acer-to, o que pode ser comprovado através das Fi-guras 7, 8, 9 e 10 apresentadas a seguir:

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Figura 7 - Deslizamento de terra

Figura 8 - Demolição de habitação

Figura 09 – Deslizamento no fundo da habitação

Figura 10 - Deslizamento de terra provocando a retira-da dos habitantes

6 CONCLUSÕES

Analisando o resultado obtido no procedimen-to adotado para geração das zonas de suscep-tibilidade ao escorregamento da área piloto,pode-se concluir que a modelagem realizadaapresentou boa correlação com o observadono campo, apesar de se ter utilizado formulaçãopara escorregamento planar.

Pode-se, também observar, que uma basecartográfica para avaliação da susceptibilidadede uma grande área, a escala dos dados de“hipisometria” consegue identificar áreas ondeos moradores fazem escavações para amplia-ção do terreno plano, sendo esses muitos dosfatores instabilizantes. Para esta situação, ne-cessita-se de um mapeamento com escala pró-xima de 1:100 e não a utilizada de 1:2000. Entre-tanto, os custos para se ter esses dados seriamelevados para grandes áreas, devendo essasanálises ser realizadas num segundo momento,após a identificação das áreas de risco.

Num futuro trabalho, pretende-se gerar ascartas de susceptibilidade ao deslizamento ten-do como base uma carta com os dados de zo-nas de iso-propriedades geotécnicas, permitin-do assim analisar de forma integrada com o es-tágio de desenvolvimento da cidade.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Avelar A.S; Fernandes, M.C.; Lacerda W.A eNetto A.L.C (2001).Análise de susceptibili-dade e movimentos de massa no maciço daTijuca utilizando SIG. III COBRAE - Rio deJaneiro.pág 133.

Gomes R.A.T; Guimarães R. F; Carvalho JuniorO.A; Fernandes N.F (2005).Análise de ummodelo de previsão de deslizamento(shalstab) em diferentes escalascartográficas.Solos e Rocha – São Paulo pág86.

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Guimarães, R. F. (2000) Utilização de um Mode-lo de Previsão de Áreas Susceptíveis àEscorregamentos Rasos com Controle To-pográfico: Adequação e Calibração em DuasBacias de Drenagem. Tese de Doutorado,IGEO/UFRJ, Rio de Janeiro, 156p

Jesus, A.P; Silva, E. A. J.; Amaral, R.F e SantosJr, O. F. (2001). Geração de Carta de Suscep-tibilidade a movimentos de massa, com base

nos critérios de declividade e de proprieda-des do solo. III COBRAE - Rio deJaneiro.pág 04.

Massad; F (2003). Obras de terra:Curso básicode geotecnia – Oficina de Texto. SãoPaulo.pág 57.

Skempton. A. W (1953). The colloidal activityof clays.III ICSMFE. Vol 1 pág 143-147 .

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