BERRY, David. Poder e desigualdade

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AS QUESTÕES CENTRAIS DA FILOSOFIA A. J. AYER A J. AYER, a quem BERTRAND RUSSELL se referiu como "o mais brilhante filósofo inglês da atualidade", é uma das princi- pais figuras remanescentes do influente movimento neopositivista sur-gido" em 1929 e que logo se consolidaria 'sob o nome de Círculo de Viena, onde pontificaram RUJX)LF CARNAP, OTTO NEURATH e REICHENBACH. Por influência de WITTEGENSTEIN, discípulo de RUSSELL e sucessor de MooRE em Cambridge, o neopositivismo passou à Inglaterra, constituindo uma importante escola - a do Positivismo Lógico - liderada por AYER, WISDOM e G. RYLE, o chamado "Grupo de Oxford". . O pensamento do autor baseia-se na doutrina estrita da ve- rificação e no exame dos dados dos sentidos como base do conhe- cimento empírico. Isto resultou numa concepção fenomista apoia- da na análise lógica mas eqüidistante do realismo e do idealismo No presente livro, foi tentado interessar não aqueles que estão familiarizados com as questões filosóficas que têm sido a temática constante da obra de A YER, mas também fornecer uma introdução ao público leitor em geral. Entre os temas abrangidos no livro destacam-se: a natureza da filosofia, as va- riedades de análise filosófica, a teoria do conhecimento, o status dos objetos físicos, as relações entre corpo e mente, o caráter da explicação científica, a teoria da probabilidade, os elementos da lógica e as reivindicações da teologia. Embora de âmbito mais vasto quanto às "questões centrais", este livro convida a uma comparação com Os Problemas da Filo- sofia, de BERTRAND RUSSELL, publicado em 1912 _ Foi escrito a partir de um ponto de vista filosófico semelhante mas também reflete, como não podia deixar de ser, os importantes progressos registrados em muitas áreas do pensamento filosófico nos vários decênios transcorridos entre as duas obras. Sir ALFRED JULlUS AYER nasceu em 1910 e foi educado em Eaton e Oxford. Lecionou Filosofia do Espírito na Universidade de Londres e, desde 1959, é Professor de Lógica da mesma uni- versidade _ Membro da Academia Britânica desde 195~. Doutor honoris causa da Universidade de Bruxelas, escreveu diversas obras de grande repercussão no panorama da Filosofia deste s~culo, entre as quais Language, Truth and Logic, The Founda- f.1ons.of Empiricat Knouiledçe, The Problem 01 Knouileâçe, Meta- phYS1CS and Common Sense e Probability and Evuience, ZAHAR , , D ~~ A cultura a se1Viço do progresso social EDITORES W"'lll _ ,.. ::os 1" b i b I i-o te c-a' d e c nc i as S oc i a·i S .w.

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BERRY, David. Poder e desigualdade Social. In: BERRY, David. Ideias Centrais em Sociologia. Zahar, Rio de Janeiro, 1976.

Transcript of BERRY, David. Poder e desigualdade

AS QUESTÕES CENTRAIS DA FILOSOFIAA. J. AYER

A J. AYER, a quem BERTRAND RUSSELL se referiu como "omais brilhante filósofo inglês da atualidade", é uma das princi-pais figuras remanescentes do influente movimento neopositivistasur-gido" em 1929 e que logo se consolidaria 'sob o nome de Círculode Viena, onde pontificaram RUJX)LF CARNAP, OTTO NEURATH eREICHENBACH. Por influência de WITTEGENSTEIN, discípulo deRUSSELL e sucessor de MooRE em Cambridge, o neopositivismopassou à Inglaterra, constituindo aí uma importante escola -a do Positivismo Lógico - liderada por AYER, WISDOM e G. RYLE,o chamado "Grupo de Oxford". .

O pensamento do autor baseia-se na doutrina estrita da ve-rificação e no exame dos dados dos sentidos como base do conhe-cimento empírico. Isto resultou numa concepção fenomista apoia-da na análise lógica mas eqüidistante do realismo e do idealismo

No presente livro, foi tentado interessar não só aqueles quejá estão familiarizados com as questões filosóficas que têm sidoa temática constante da obra de A YER, mas também forneceruma introdução ao público leitor em geral. Entre os temasabrangidos no livro destacam-se: a natureza da filosofia, as va-riedades de análise filosófica, a teoria do conhecimento, o statusdos objetos físicos, as relações entre corpo e mente, o caráterda explicação científica, a teoria da probabilidade, os elementosda lógica e as reivindicações da teologia.

Embora de âmbito mais vasto quanto às "questões centrais",este livro convida a uma comparação com Os Problemas da Filo-sofia, de BERTRAND RUSSELL, publicado em 1912 _ Foi escrito apartir de um ponto de vista filosófico semelhante mas tambémreflete, como não podia deixar de ser, os importantes progressosregistrados em muitas áreas do pensamento filosófico nos váriosdecênios transcorridos entre as duas obras.

Sir ALFRED JULlUS AYER nasceu em 1910 e foi educado emEaton e Oxford. Lecionou Filosofia do Espírito na Universidadede Londres e, desde 1959, é Professor de Lógica da mesma uni-versidade _ Membro da Academia Britânica desde 195~. Doutorhonoris causa da Universidade de Bruxelas, escreveu diversasobras de grande repercussão no panorama da Filosofia destes~culo, entre as quais Language, Truth and Logic, The Founda-f.1ons.of Empiricat Knouiledçe, The Problem 01 Knouileâçe, Meta-phYS1CS and Common Sense e Probability and Evuience,

ZAHAR, ,

D ~~A cultura a se1Viçodo progresso social

EDITORES

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b ib I i-o te c-a' d e c iê n c ias S o c i a·i S

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BIBLIOTECA DE CIÊNCIAS SOCIAIS

Sociologia

FUNDAMENTOS DA TEORIA SOCIOLÓGICA, T. AbelHIERARQUIAS EM CLASSES, N euma AguiarUMA INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA, W. Anderson e F. Parker (3.a ed.)INTRODUÇÃO À PESQUISA SOCIAL, H. M. BlalockAs CLASSES NA SOCIEDADE MODERNA, T. B. BottomoreCRÍTICOS DA SOCIEDADE, T. B. BottomoreAs ELITES E A SOCIEDADE, T. B. BottomoreINTRODUÇÃOÀ SOCIOLOGIA, T. B. Bottomore (6.a ed.)DEPENDÊNCIA E DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA LATINA, F. H. Car-

doso e Enzo FalettoPOLíTICA E DESENVOLVIMENTO EM SOCIEDADES DEPENDENTES, F. H.

CardosoINTRODUÇÃO CRÍTICA À SOCIOLOGIA, M. Coulson (3.a ed.)ENSAIOS DE TEORIA DA SOCIEDADE, Ralf DahrendorfCAPITALISMO DEPENDENTE E CLASSES SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA,

Florestan FernandesA REVOLUÇÃO BURGUESA NO BRASIL, Florestan FernandesSOCIEDADEDE CLASSES E SUBDESENVOLVIMENTO,F. Fernandes (3.a ed.)REBELDES PRIMITIVOS, E. J. HobsbawnTEORIA DA CULTURA, David A. Kaplan e R. MannersELEMENTOS DE SOCIOLOGIA. Samuel Koenig (4.a ed.)ANTROPOLOGIA SOCIAL, Godfrey Lienhardt (2.a ed.)INTRODUÇÃO À ANTROPOLOGIA SOCIAL, L. Mair (2.a ed.)UMA TEORIA CIENTÍFICA DA CULTURA, B. Malinowsky (3.a ed.)MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO SOCIOV'>GICA,P. Mann (3.a ed.)DIAGNÓSTICO DE Nosso TEMPO, Karl Mannheim (3.a ed.)IDEOLOGIA E UTOPIA, Karl Mannheim (2.a ed.)PRINCÍPIOS DE SOCIOLOGIA, Henri Mendras (4.a ed.)INICIAÇÃO AO ESTUDO DA ANTROPOLOGIA, P. J. Pelto (3.a ed.)As CLASSES SOCIAIS NO CAPITALISMO DE HOJE, N. PoulantzasA ESTRUTURA DE CLASSES NAS SOCIEDADES AVANÇADAS, A. GiddensPROBLEMAS FUNDAMENTAIS DA TEORIA SOCIOLÓGICA, J ohn RexMANUAL DE SOCIOLOGIA, J. Rumney e J. Maier (s.a ed.)TEORIA SOCIOLÓGICA, T. Timasheff (4.a ed.)ENSAIOS DE SOCIOLOGIA, Max Weber (3.a ed.)A hrAGINAçÃO SOCIOLÓGICA, C. Wright Mills (4.a ed.)A NOVA C~ASSE MÉDIA, C. Wright MillsA ELITE DO PODER, C. Wright Mills (2.a ed.)

DA v r o BERR Yda Universidade de Cardiff

Idéias•

11S

OCioloaaUma Introdução

~(i)L V \l,\)\'O ~~Tradução de

ALBA ZALUAR GUIMARÃES

ZAHAR EDITORES

RIO DE JANEIRO

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6. Poder e Desigualdade Social

A distribuição df'~ a disseminação da(clesigualdadé social emqualquer socieda~~streítamente relacio~e si. O des-vendar dessa relação vai implicar a discussão das noções âe."ª-.utori-

j:d~~~~~ e classes sociais na sociedade, junto ao exame do~. ia. Os quatro capítulos anteriores focalizaram em larga

medida conceitos que se relacionavam ao indivíduo em sociedade.Aqui a intenção é colocar a discussão no contexto dos elementos deestrutura mais ampla da sociedade. É comum, portanto, que o do-mínio da Microssociologia e o da Macrossociologia, voltados parao contexto social das atividades individuais e para as relações entreos principais grupos sociais respectivamente, pareçam ser virtual-mente separados e independentes um do outro. Assim, por exemplo,a atividade política de massa e o funcionamento das principais ins-tituições políticas talvez pareçam ser domínios bem separados domundo social. O desempenho de papéis na vida cotidiana e a es-trutura de classes sociais talvez pareçam, também, ser distintos eseparados. Porém, tal como foi indicado no capítulo 1 (p. 28) >

o estudo das atividades rotineiras da vida cotidiana, a áreadaMi-crossociologia, é importante porque é nelas que se baseia a es-truturação da sociedade mais ampla, a estrutura de poder e a es-trutura de classes. Este capítulo tem por objetivo tornar explícitaessa relação. O ponto de partida será a análise do conceito básicode poder. A discussão prosseguirá examinando a relação entre podere autoridade, o que, por sua vez, levará ao exame do papel daideologia na manutenção do poder. Isso nos trará ao tópico centraldo capítulo, a relação entre poder, classes sociais e elites na so-ciedade. O capítulo vai concluir com a discussão de democracia eigualdade.

o Conceito de Poder

o poder, como disse uma vez Mao Tse-tung, cresce do cano de umfuzil. O poder é, portanto, algumas vezes considerado a base física..

gSlCO ~u. matenal de~T~-~~n~~~~fas ~~eJ~~

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PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 137

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138 IDÉIAS CENTRAIS EM SOCIOLOGIA

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iSSãO ,do indivíduo ou grupo social ao poder daqueles que con-trolam tais mercadorias e serviços." Essa troca pode ser ilustradatanto ao nível interpessoal quanto grupal. Numa relação sexuaiesigual, em que.s-por exemplo, o rapaz se sinta mais fortemente

~traído pela moça do que ela por ele, a relação pode apenas sermantida caso o rapaz fique muito submisso à moça, fazendo tudo-o que ela quer. As atrações que cada um sente pelo outro nãose equilibram mutuamente, permitindo assim que uma parte na.relação adquira poder sobre a outra no desenvolvimento dessa re-lação. Na sociedade feudal, o servo recebia segurança e proteção,do senhor feudal em troca de servidão, e na Inglaterra vitoriana,o trabalhador assalariado talvez recebesse apenas sua subsistênciae um casebre para morar em troca de doze horas de trabalho diárias.Essas são relações de troca, porque o servo e o operário, pelo menos-ern teoria, podem escolher entre submeter-se e evadir-se, ou re-nunciar ao salário, ou tomar parte numa revolta ou num quebra-quebra de máquinas. Blau tem o cuidado de acentuar que a con--ceituação de relações de poder como forma de troca não deveriaser tomada como justificativa para o poder. A troca pode ser muito-desigual, como acontece na esfera econômica convencional na qualum indivíduo, que tenha monopólio sobre a distribuição de umamercadoria essencial, pode inflacionar flagrante seu preço.

~ Às vezes, os soció distin uem od otencial de re u-~ ~ tações de j)õaere-a exerClClO er a eiro esse po er. ssim, nos

2'\5 U estu os e comum a po er esco nu-se que, embora fossem~\::7 J considerados muito poderosos numa comunidade, certos indivíduos I'

)Ç não tomariam parte de fato nem mesmo tentariam influir no pro- ••~ ~ '\ \) cesso decisório dessa comunidade," Arnold Rose sugeriu que os es-

\. '\J tudos de comunidade, que baseiam seus métodos em indagar quem~ -é poderoso (quem manda nesta comunidade?), fabricam provas,

:?,~ W não da estrutura real de poder, mas de ima~ens de p0c.!:.r.5~-

~\ ",,"O' tanto, imagens de poder e o exercício rea de poder não odemQ'3'"'rea men e s era os enomenos lstmtos. n uanto tela ão

~"' 'sõêiã1, o ex o o o er e en e e seu l'econ ecimento elosque a e e se su metem. Algumas vezes, e ato, po e parecer queas pessoas sejam poderosas porque acredita-se que elas o sejam cpor mais nenhuma outra razão. Assim, na comunidade local, o fatode se ter uma reputação de poderoso pode resultar no exercícioreal do poder se, por causa dessa reputação, o indivíduo for con-sultado e indagado sobre suas opiniões e sugestões. Inversamente,o exercício do .poder por pessoas que têm controle sobre recursosescassos será severamente limitado se esse poder não for reconhe-cido. Um industrial não conseguirá influenciar as políticas do Go-verno local em sua comunidade, ameaçando transferir sua fábrica

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parti outro local, a menos que se acredite que ele quer e é real,mente capaz de cumprir sua ameaça. É verdade que, se sua ameaçafor desprezada ou não for levada a sério, o industrial pode mostraraos políticos locais que eles estavam errados cumprindo a ameaça,mas estaria, ao agir assim, abandonando a comunidade local. Poderna comunidade, nesse caso, não pode 'ser exercido a não ser que sejareconhecido.

_-->--.u.LJil.lui-sedaí que é um erro considerar o poder um fator'ob'etivo" relações SOCla1S,em comparação com os mais "sub-Jetlvos", tais como papéis, grupos de referência e definições dasituação.

Da proposição básica de que o poder representa uma relaçãosocial, derivam três pro osi õ tivas sobre a natureza dopoder, cada qua representando importantes enfoques t 6I.:i.cos... ao~ poder na sociedade. O primeiro deles encara exercício

d~, a existência da dominação e sujeição como caractensticainerente à Õrganização SOCl1, do mesmo modo'que se poderiam cou-SI erar normas sociais como característica inerente às organizaçõessociais~ afirmações mais claras a esse respeito é feita porRalKí>ahrendorf: ,-----...

· .. autoridade é um tipo de relação social presente em qual-quer organização social concebível ...· .. autoridade é um elemento universal de estrutura social ...· .. a existência da dominação e sujeição é um traço comumde todos os tipos de autoridade possíveis e, de fato, de todosos tipos de associação e organização, 6

,__ _ rendorf está discutindo um tipo específico de poder -autoridade que vem a ser o poder considerado legítimo, e do, convém dizer mais a respeito posteriormente. A afirmativa

~~ais geral a ser concluída disso é que, nessa Iorrnulação.jj; poder~lCé um traço inerente às relações sociais e não uma derivante de

I 'i~ \ algum outro traço das relaçoes sociais. Conclui-se, dessa concepçãoÇ>vde poder, que o confhto tambem rum traço inerente às relações

\~ \ sociais:-POrque ãs relações SOCIaISsao caracterIzadas pela dominação~OêSiijeição, sempre há resistência ao exercício de poder: os grupos.v poderosos na sociedade conseguem impor seus interesses aos dos \ l

.~' grupos sem poder, os quais, no entanto, procurarão desafiar o exer- QAAD

~

'SfJ '\ .dc~o ?e .tal poder. Par~ pahrendorf, é o exercício d~ ,o~er, e a t L.-'I 'resIstenCla a esse exerCIClO,que repres o namlCO un-

amenta a SOClea e na pro ução e u an socia. A con-.cêpção o po er como um traço inerente as re ações sociais,é, assim, associada ao que se considera comumente a "teoria de

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de "consenso" do poder admite que o poder seja usurpado, e sejaexercido por a gUl1S os ara supnmir outros, mas ' . 1C10de o e caractenstico instabilidadedo sistema ssGÍaL O exercício de poder desse modo pode não serum traço incomum das sociedades, mas, como tal, é um traço in-trinsecamente instável e não uma característica central da ordemsocial. Na visão de "consenso", é o poder, en uanto recurso araa coor enação de atividades e a '- as aos ob' etivos sociaisque caracteriza essencialmente a ordem social sa es 'i epoder que denva da or em normativa...!-O debate entre teoria de"confhto" e de "consenso" nao é, portanto, uma questão de saberse as sociedades são ou não são caracterizadas por conflito ou con-senso, conflito entre grupos de interesse ou o compartilhar de nor-mas sociais, Todos os sociólogos reconhecem um e outro como·características gerais de relações sociais, O debate não é sobre des-crições alternativas de sociedades, mas sobre a seleção de princípiosorganizatórios na construção de uma teoria da ordem social. Na

'" " _ _ ~ _ \ visão de "consenso", a or?em normativa é, o princípio organizató,rioe a, teoria do consenso, correspo~dendo à-perspectiva d~ \~entral e o,poder, ~a medida ~rr:que c2ntnb~.ur"para a orde;n social,

~ representam as du~s alternativas para a análise socioló~ ~ bt- e, ~ma den~ant,e, d1SS0. Na visao de conflito., o poder e o. pnn-e provavelmente verdadeiro que, em alguns casos, eles são diame- '\ b b C1plOorgamzatono central, e a ordem normatrva e uma denvantetralmente opostos. N . -o de" lito" na ual o oder é um f\}da estrutura de p~der. !:s ~ua~ :oncepções são opostas em muitostra rela ões SOCIa1S, t-' aspectos, embora 1SS0nao signifique que englobem todo o debatecomo uma derivante do exercicio _" '\~S .I sociológico no que diz respeito à natureza do poder em sociedade.esta eleci as e man 1 as na me ue servem aos interesses <\eVJ-"" Ct\~ A concepção marxista de poder, como já foi dito acima, tratados poderosos. Na visão de' nsenso" entretanto, é a ordem ~rv"Yo poder como uma derivante das atividades produtivas. Uma ex-nor~ativa 9,ue const!tJJj a base das re a!;Õesi96iaia-e o p~a tl p~s~çã? co?~isa desse pont? de ~i.sta pod-: ser encontrada no Pre-der~vante disso. FOl um tema central do capítulo 2 que a ordem DO [âcio a Critica da Economia Politica de Marx:social é uma. ordem ~oral, que a sociedade se ordena de acordo e; .co~n ~s preceitos morais. Usado desse modo, poder é considerado, . C;{)pnm~lramente, como um recurso na obtenção de objetivos sociais, r-r...1Cj6~exercido de acordo com o consenso social, -a ordem normativa. Pode t~ ~parecer que tal concepção de poder é obviamente insatisfatória, já ~que não é difícil encontrar casos em que o poder é exercido poralguns grupos à custa de outros, e em que o exercício do podergera assim o conflito: os regimes políticos da Grécia e da Africado Sul, para selecionar duas das muitas possibilidades, não sãocla~aI?ente C~S?Sem que o poder é conferido ao regime para alcançarobjetivos SOCialSaltamente partilhados. São, ao contrário, casos emque o exercício d~ poder suprime os interesses de grupos sociais:"amplos, mas .relatIvamente sem poder, e gera conflitos. Pode pa-~ecer .qu~ tais casos indiquem a superioridade da concepção deconflito do poder sobre a de "consenso", Isso seria entretanto

uma conclusão muito ingênua e, afinal, inteiramente faisa. A visã~

140 IDÉIAS CENTRAIS EM SOCIOLOGIA

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PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 141

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Na rooução . I de sua existência, os homens estabelecemrelações éterminadas, necessanas.independentes da sua von-tade, relações de produi;ão que correspondern a um determi-nãõo grau de desenvolvimento dãsfOl"çrsprodutoras materiais.O conjunto dessas relações de produção constitui a estruturae~ômica da sociedade, a base Concreta sobre a qual seeleva uma_ superestrutura jurídica~ e à qual corres-pondem oeterminadas formRs--tle consciência social. Q. modode produção da vida' ri1àteiiarcorrdiciuna õ aesenvolvimentodãirttia saciar, pmítica e intelectual em geral. 9

Para Marx, as relações de produção são as características básicas daorganização de relações sociais, e dessas relações de produção de-riva a estrutura de poder e a ordem normativa. Essa visão é,por vezes, encarada como uma forma de determinismo econômico,por meio do qual a vida social, cultural e política é tratada como

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142 PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 143

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IDÉIAS CENTRAIS EM SOCIOLOGiA

uma espécie de quantidade fixa, sendo a posse de poder semprecorrespondida pela sujeição ao poder. No entanto, na visão de "con-senso" do poder, quando esse é encarado como um recurso para sealcançar objetivos sociais, não se trata de uma quantidade fixa, masde algo que pode ser gerado ou desgastado. Isso porque o exer-cício de poder, por aqueles a quem se confere poder, não implica.uma falta de poder correspondente naqueles que o conferiram.Assim, pode-se argumentar que um Governo democrático, quemantém a confiança de sua população, pode ser poderoso nosentidode que é capaz de cumprir seu programa, ao passo que, ao perdera confiança de seu povo, será fraco e ineficiente. Peter Blau su-gere que, se o exercício do poder é considerado injusto, vários pro-cessos tenderão a desgastá-Io: as pessoas a ele sujeitas podem sentirque têm pouco a perder opondo-se a ele e, além disso, podemdesenvolver, no decorrer de sua oposição, uma ideologia de oposiçãoque lhes dará mais força em seu desafio. Por outro lado, in-divíduos ou grupos em posições de poder podem obter vários be-nefícios pela coordenação das atividades dos que estão sujeitos aoseu poder e, passando adiante alguns desses benefícios, seu poderpode ser aumentado.V Conseqüentemente, se l,lm Governo localaumenta sua eficiência fornecendo serviços locais, sua popularidade·e, portanto, poder podem aumentar. No final, entretanto, poderiaargumentar-se que incrementos de poder podem ocorrer apenas pormeio da redução na força da oposição ao poder: mesmo se a con-fiança popular aparentasse aumentar o poder de um Governo de-mocrático sem privar outros grupos de poder, tal aumento de poderde fato significaria um aumento na capacidade de sobrepujar a opo-sição. Se o poder é concebido como uma relação social, ao invésde uma "força" impessoal, ou talvez um tanto mística, do sistemasocial, pareceria que a noção de poder, enquanto um recurso, pre-cisa ser rejeitada. Enquanto relação social, o poder necessariamenteimplica poder de alguns indivíduos ou grupos sobre outros. Umoutro problema da concepção de poder enquanto recurso é a sua

'Ç)'O tendência em confundir poder com autoridade.

~os marxistas, então, poder é uma derivante das r~s ft~SOCIaiS e ..produção. - \~ Autoridade e Ideologia. Tendo as três teorias da natureza do poder em sociedade de- N~~ ~ ~ _ " -

Iineada podemos voltar a atencão para o tra di ti - ef \ ~ -I\~utondade, de acordo com Max Weber, e geralmente definida pelos'd .,. U, IS incao r" erente ,,\,\0 ;"T1J• '1 der Iezi dA' d ..a ratureza o ooder na sociedade. Tanto l1a c ' - .: I\71JV .sv SoCIOogos como po er egrtima o. SSIm, o po er torna-se auton-'- oncepcao marxista \ ~v ,.,., •

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qua na que denominamõScõriCepção de "conflít ,; ,. _ . GV dade quando o seu exerctcio e considerado legítimo, certo e apro-'n d d 1 ru o, acrescimos #\ .d I - bmetid 1 S li . 1

(

o po er e a guns setores da sociedade sempre s re: m 1 d 1 d pna o pe os que sao su meti os a e e. e um po tela assegura acom d ,.' u ge a o a a o b di . - '1 1ecrescrmos em outros. O poder sernnre e' e ercid 1 o e iencia porque tem na mao um cassetete ou um revo ver, e egrup detri '- x o por ~s , d d b di .os em etnmento de outros O poder ap r t '- esta apenas exercen o po er, mas se assegura a o e iencia porque__ • . a ece, por anto como d '1_ 'as pessoas concor am que, em certos assuntos, e certo que e as

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uma derivante da base econômica da sociedade da qual depende.Marx certamente considerava a vida social, cultural e política dasociedade capitalista dominada pelo modo de produção capitalista.Este não é o lugar para uma discussão das interpretações conílitan-tes da obra de Marx, mas é possível afirmar-se aqui que encararo poder, e outros aspectos da estrutura da sociedade, como derivan ..tes das relações dos homens nas atividades produtivas é muito di-ferente da idéia de que as relações sociais são determinadas pelofuncionamento de um sistema econômico.' Antes de mais nada, as,relações produtivas são elas próprias relações sociais. A noção demodo de produção capitalista descreve o relacionamento entre ooperário e seu patrão, suas ferramentas, seus companheiros de tra-balho e suas atividades. O trabalho e as atividades produtivas, comojá foi dito anteriormente na discussão sobre alienação, não se re-ferem apenas à produção de mercadorias para a troca econômica,mas às atividades produtivas e criativas do homem em geral. Assim,são as relações sociais entre os homens, nas suas atividades pro-dutivas e criativas em geral, que representam o fundamento básicodos aspectos culturais e políticos da vida social.' Nessa concepção, adesigualdade social e a distribuição desigual de poder na sociedaderesultam das divisões em atividades produtivas, ou da divisão de tra-balbo. Ê a divisão de trabalho que ocasiona a distribuição desigualdo trabalho e de seus produtos e, conseqüentemente, a posse depropriedades.t? Na sociedade capitalista, o traço peculiar da divisão-de trabalho é a divisão entre trabalho e capital, entre trabalhadoresassalariados e os donos de propriedade. A propriedade, que é umdos aspectos da divisão de trabalho, é a base das relações de poder.Marx considera, assim, que o Estado, as instituições de poder po ..lítico na sociedade, representam e refletem os interesses da classedominante nas relações de produção.

o executivo do Estado moderno não é senão um comitê paraadministrar os negócios comuns de toda a burguesia. 11

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144 IDÉIAS CENTRAIS EM SOCIOLOGIA

devam obedecer às instruções dos policiais, ele está exercendo au-toridade. Pode-se pensar que autoridade é o exercício do poder deacordo com a ordem norrnativa, mas, embora assim seja com fre-qüência, nem sempre é assim, visto que aquilo que está de acordocom a ordem normativa nem sempre é aquilo que as pessoas aceitampor serem certas ou legítimas. Como já foi dito neste livro (p. 80),normas não são equivalentes a opiniões.» Portanto, as pessoas podemachar que é certo obedecer ao profeta religioso; mesmo que suasinstruções sejam. contrárias às normas sociais. Alternativamente, opoder que é exercido de acordo com normas sociais. nem sempreé considerado direito; Assim, os manifestantes numa passeata cujocaminho é bloqueado pela policia podem muito bem vir a ser im-pedidos de continuar apenas pela força: O policial pode estar exer-cendo seu poder de acordo com normas sociais, mas como esse podernão é aceito como certo, como autoridade, pelos manifestantes,apenas pela força pode ser mantido. v Max Weber construiu umatipologia que classifica autoridade de acordo com sua base de Ie-gítimidade. Weber distingue três tipos básicos de autoridade, quaissejam, autoridade tradicional, autoridade legal-racional e lllitoridadecarismáÍ:ica.13 A autoridade tractlClOnal consiste em exercício depoder que é legítimo porque está de acordo com as tradições. Umtipo de autoridade tradicional é o patrimonialismo, forma de admi-nistração na qual o Estado se torna a extensão da casa pessoal dogovernante:

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... o faraó, que organizava exercícios de escravos ou co-lonos, colocava seus clientes no comando deles E os alimen-tava, vestia e equipava com seus estoques armazenados, estavaagindo como um chefe patrimonial em controle pessoal com.pleto dos meios de administração. 14

PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 145

baseia apenas no caris ma pessoal, o magnetismo pessoal e as qua-lidades pessoais excepcionais do líder. .Corno tal, pode desprezartanto as regras quanto as tradições. O líder carismático consegueobediência da parte de seus seguidores por meio da crença em seucansma pessoal. Em seu sentido original, teológico, carisma retere-se à atribuição espiritual de graça ao indivíduo. Em seu sentidosociológico, tal como foi usado por \YJeber, refere-se ao reconheci-mento pelos. outros das qualidades excepcionais de um indivíduo de , "7 •••••••modo que elewigam seu comando. O carisma do líder perdura en- bt" •••••••quanto for ~pelos seus seguidores e, se eles o deserta- (J/il-Orem, seu carisma acaba. A concepção sociológica de carisma nã~ ~~se refere a qualidades inerentes, espirituais ou quaisquer outras, mas ~apenas a cre~ sob~tais.J1ualidaçks. Não deve ser equiparado.tampouco, com o crescente uso popularizado do termo, mais fre-qüente na América do que na Grã-Bretanha, no qual caris ma torna-se um termo para personalidade atraente. Em seu sentido socioló-gico, o portador de carisma é o profeta religioso, o líder de ummovimento social, o general heróico cujos soldados o seguem aqualquer parte, mas não o artista de televisão charmoso ou o cantorpopular.

Os tipos de autoridade de Weber são o que ele denomina"tipos ideais", abstrações ou tipos puros que, na prática, aparecemsempre combinados no exercício da autoridade. Assim, na empresapaternalista de família, a autoridade do chefe da empresa pode seruma mistura de autoridade racional legal com autoridade tradicional,parcialmente baseada nas obrigações contratuais legais de seus em-pregados e parcialmente baseada em sua lealdade pessoal ao chefe, I

da empresa. ~.~utori~ad~ dy líder político pode ser ~arcialmenteJ l \ té. (Lbaseada na autotJdaderaClona legal de seu osto ente em .seu cansma pessoa tam em, em ora, no caso .dos líderes olíticos c)9l,,~t;(JJ. ,constrtuciona mente e e se a multo raro. í.

autoridade pode ser agora examinada em re ação a diferentesconcepções da natureza do poder. Se o exercício de poder é en-carado fundamentalmente como uma derivante da ordem norrnativa,como um recurso, seu exercício, na medida em que estiver de acordocom valores consensuais, será considerado direito, sendo, conse-qüentemente, autoridade. Se, por outro lado, o poder é encaradoou como um traço básico de relações sociais, ou como uma derivantede relações de produção, a autoridade pode ser considerada umproduto de tentativas, de parte dos que exercem poder, para con-vencer os que a eles se submetem de que seu poder é correto ejusto. Com efeito, comumente as pessoas ue exercem oder ro-duzem teorIas que o Justl lcam, VIsto ser i ici manter-se osições

e E2 er guan o as pessoas nao as aceitam como egrnmas. a es-

146 IDÉIAS CENTRAIS EM SOCIOLOGIA '\~.

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mas é claramente uma ideologia de domina ão de elit. Final-nen e, existe a 1 eo ogia a !te ClentI° que reivindica a su-perioridade através da posse de quahticâçôes científicas. A autori-dade do "perito", cuja opinião deveria ser aceita não porque seusargumentos sejam convincentes, mas porque ele é reconhecido comoo "perito", está baseada nessa ideologia de elite. A predominânciadesse tipo de ideologia é evidente quando os "peritos" científicos.estabelecem sua autoridade por meio do uso de uma linguagem"científica" esotérica e, portanto, altamente incompreensível para oleigo. Para os teóricos da elite, assim, a autoridade das elites deveser vista em termos da disseminação das ideologias de elite.

Na concepção marxista de poder, a autoridade também deveser vista como um produto da disseminação da ideologia. Mas en-quanto que, na teoria das elites, a capacidade de manter umaideologia pode vir a ser uma das bases de poder, na concepçãomarxista tanto o exercício de oder uanto o controle de ideolog;áapóia-se no processo pro utivo.

As idéias da classe dominante são, em cada época, as idéiasdominantes: a classe, que é força dominante material dasociedade, é ao mesmo tempo sua força intelectual domi-nante. A classe que tem os meios de produção material àsua disposição tem, ao mesmo tempo, controle sobre osmeios de produção mental, de tal modo que, em geral, asidéias daqueles que não têm os meios de produção mentalsão a ela sujeitos. As idéias dominantes nada mais são doque a expressão ideal das relações materiais dominantes, asrelações materiais dominantes compreendidas como idéias. 19

Nessa concepção as ideologias de classe dominante não são apenasjustificativas do domínio de classe, mas abrangem uma esfera depensamento muito mais ampla, embora tais. ideologias devam sempreser consideradas reflexos de interesses da classe dominante. Assim,a predominância de crimes contra a propriedade no Direito Cri-minal pode ser o considerada um reflexo dos interesses das classesproprietárias. O ensino religioso também pode ser contaminadopor ideologias de classe dominante, como no caso do pobre serensinado que deve ser humilde, obediente e satisfeito, que suasrecompensas virão no próximo mundo e que a divisão do mundosocial em pobres e ricos é ordenada divinamente. No controle dosmeios mentais de produção, a classe dominante consegue exercercontrole sobre instituições tais como os meios de comunicação demassa e a educação. Na visão marxista, portanto, a autoridade e,de fato, a própria ordem normativa devem ser vistas em termosdas ideologias de classe dominante.

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Classes Sociais e Elites

Da discussão anterior sobre poder e autoridade, torna-se evidenteque, na visão marxista, o exercício de poder na sociedade é umaspecto das relações entre classes sociais. É a divisão de trabalhonas atividades produtivas, as relações sociais de produção, queproduz tanto as classes sociais quanto a desigualdade de poder. Asclasses sociais são definidas em termos de relações com os meiosde produção, sendo a classe que controla os meios de produção aclasse dominante. Portanto, na sociedade capitalista, as duas classessociais principais são a dos capitalistas, os donos de propriedadeque assim controlam os meios de produção, e o proletariado, ostrabalhadores sem propriedade. As relações de classe são relaçõesde conflito e é o conflito entre as duas classes princip~,is na sQÇie-dade que fomê motor na produção de mudança social. Conse-qu emente, a estrutura a socie a e e a or em normativa deverãoser vistas em termos do fenômeno primário da estrutura de classes.

Embora muitos sociólogos não aceitem esse arcabouço para aanálise de classe social em sua totalidade, a maioria, entretanto,considera a ordenação da sociedade em classes sociais um traçobásico da estrutura da sociedade. Às vezes, embora a distribuiçãode poder seja considerada coincidente com a divisão da sociedadeem classes sociais, as classes podem ser consideradas, não comomeros reflexos de divisões econômicas na sociedade, mas como divi-sões políticas que podem estar ou não baseadas em divisões eco-nômicas. Assim, Dahrendorf, em crítica a Marx, argumenta que apropriedade é apenas um caso especial de divisões de classe e derelações de poder. Para Dahrendorf, as relações de classe são rela..ções de poder institucionalizado ou autoridade. 20

Com maior freqüência, os sociólogos concebem o poder e aclasse social como dimensões separadas da desigualdade e, via deregra, distinguem os elementos de classe econômica e de statussocial na estratificação social. Nessa visão, que seguep pensamentode Max Weber, poder, classe e status tornam-se dimensões s ar·ra as e eSIgua a e. ntretanto, consi erar c asse apenas uma'das muitas dimensões de desigualdade é negar a visão marxista deque as relações de classe - as relações produtivas na sociedade --são a base da ordem social. Na perspectiva marxista, tratar classe'social como forma de relação econômica distinta das relações sociais-de status e poder é descrever classe como um aspecto da esfera'"econômica" da sociedade, definida de modo bastante estreito e con-vencional. Existem, porém, muitas coisas a favor de se considerarclasse, poder e status dimensões distintas de desigualdade, contantoque não sejam consideradas independentes. As relações entre essas.

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três dimensões podem revelar-se muito complexas, ao invés de umadimensão simplesmente determinar as outras.

Se poder e classe, baseados nas relações produtivas, são tra-tados como dimensões separadas, a questão da medida em que oexercício do poder político reflete os interesses de uma classe socialparticular torna-se um problema empírico a ser investigado ernpi-ricamente no mundo real} e não Um problema a ser respondidopor teorização a priori. A visão marxista é, às vezes, erroneamenteinterpretada como implicando que o poder político é um reflexomecânico de interesses particulares de classe. É verdade que Marxconsiderava o Estado, as instituições de poder político fundamen-talmente como instrumentos do domínio de classe, visão esta repe-tida por Lênin.F' Domhoff, em análise marxista contemporânea daestrutura de poder dos Estados Unidos, conclui que o poder políticoestá primordialmente nas mãos de uma elite do poder, que repre-senta os interesses da classe alta americana. 22 Miliband, em estudocomparável na Grã-Bretanha, conclui que a elite do Estado serveaos interesses de uma classe dominante.F' No entanto, o próprioMarx indica em uma passagem que o Estado, as instituições dopoder político, pode tornar-se uma espécie de conjunto parasitáriode instituições.

em sua forma institucionai, tornar-se divorciado e, conseqüente-mente, independe de quaisquer interesses particulares de classe.A fim de ilustrar essa afirmativa, podemos nos referir a um estudohistórico e comparativo de partidos políticos na Europa e EstadosUnidos, feito por S. M. Lipset e S. Rokkan, que se propõe aexaminar os fatores por meio dos quais as clivagens sociais passama ser traduzidas em divisões políticas. 25 Entre suas conclusões, osautores sugerem que as divisões de partido político dos anos 60devem ser vistos como produtos, não de divisões sociais contem-porâneas, mas das divisões dos anos 20. Os partidos são conside-rados ossificados, excluindo novas alternativas em política, e nãorepresentando interesses contemporâneos emergentes. Os movimen-tos estudantis de protesto e as organizações de ação comunitáriapodem ser considerados formas de organização de interesses queos partidos políticos estabelecidos falham em satisfazer. Esse tipode análise indica que, embora o poder institucional se possa desen ..volver com base nas divisões de classe social, uma vez institucio-nalizado, o seu exercício pode ser mantido em grande parte porcausa de sua institucionalização: as instituições de poder político,o Estado, tornam-se eles próprios a base do poder político. Umexemplo extremo, embora não incomum, dessa situação é a tomadade poder por meio de um golpe militar. Os militares, desenvol-vidos como instrumento do Estado, tornam-se os senhores doEstado e, não importa que outros objetivos tenham os regimes mili-tares, seu objetivo primordial é a supremacia dos militares. Opoder do Estado é, assim, exercido primordialmente para o bene-fício de um ramo executivo do Estado. Os regimes militares,entretanto, podem ainda representar os interesses de uma classesocial particular. Um exemplo menos extremo é quando os par-tidos políticos estabelecidos continuam a exercer poder em grandeparte porque estão estabelecidos, mesmo quando já perderam o tipode apoio com base no qual subiram ao poder. É possível, portanto,ver as noções do domínio das elites governantes como Estado, deum lado, baseadas em interesses de classe social e, por outro lado,independentes dos interesses de classe, baseando-se ao contrário emtécnicas de manutenção de poder até certo ponto complementares.

Para Marx, as duas principais classes na sociedade capitalistasão os capitalistas, os donos dos meios de produção, e o proleta-riado, os trabalhadores assalariados sem propriedade. Na modernaGrã-Bretanha, a maioria dos sociólogos consideraria uma divisãobem diferente, a divisão entre o operariado e a classe média, cor-respondendo grosso modo às famílias dos trabalhadores manuaise não-manuais respectivamente, a principal divisão de classe. Arenda média de trabalhadores não-manuais é substancialmente maior

Este poder executivo, com sua enorme organização buro-crática e militar, com sua engenhosa maquinaria estatal.abrangendo amplos estratos, com uma quantidade de funcio-nários que chega a meio milhão, além de um exército deoutro meio milhão, esse corpo parasítico aterrador que ema-ranha o corpo da sociedade francesa como uma rede esufoca todos os seus poros, surgiu nos dias da monarquiaabsoluta ...No tempo da Restauração, de Luís Filipe, da república par-lamentar, era o instrumento da classe dominante por maisque lutasse pelo seu próprio poder.Somente no tempo do segundo Bonaparte, o Estado pareceter-se tornado completamente independente. Contrariamenteà sociedade civil, o aparelho do Estado consolidou sua po-• - 24slçao ...

Deve-se admitir que Marx, seguindo esta análise, prossegue suge-rindo que o Estado bonapartista representa os camponeses enquantoclasse na sociedade francesa. im ortante a assinalar aqui é uea tradução de interesses sociais de classe em po er po iticoser VIsta como um processo de açao social. -1\.SSlm, pode ser queos interesses de uma classe nao consigam ser organizados politica-mente e que, portanto, tais interesses nunca sejam traduzidos empoder político. Inversamente, o exercício de poder político pode,

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do que a dos trabalhadores manuais. As condições de trabalho sãomuito melhores e a segurança de emprego muito mais alta paraos trabalhadores não-manuais, em comparação com os trabalhadoresmanuais. Maiqr proporção de trabalhadores não-manuais do que demanuais participa em esquemas de pensões ocupacionais e os pri-rneiros são muito melhor pagos durante doenças. Fora da esferaocupacional imediata, as famílias de classe média estão relativamenteimunes a processos criminais. As oportunidades educacionais paracrianças de classe média são muito superiores às de crianças declasse operária, em parte porque famílias de classe média moramem áreas de classe média que gozam de um fornecimento educa-cional superior, em parte por causa da ênfase dos valores de classemédia em escolas e universidades. Em parte por causa de suasrendas mais elevadas, mas também por causa da maior segurançaem emprego e do crédito em instituições financeiras, as pessoasde classe média estão muito mais aptas a pagar por melhores casas,gozando de seu ambiente melhor, e a conquistar generosos des-contos no imposto de renda devidos a juros na dívida feita noprocesso. Os partidos políticos e as instituições políticas, assimcomo as instituições educacionais, legais e outras instituições sociais,são dominados pela classe média.

A divisão entre a classe operária e a classe média com baseno fato das ocupações serem manuais ou não-manuais é muitogrosseira e não leva em consideração as complexidades da estruturade classe contemporânea. Talvez seja duvidoso considerar os tra-balhadores não-manmis de rotina, tais como os pequenos empre-gados de escritório, membros da classe média. Não apenas suasrecompensas econômicas não são maiores do que as de operáriosespecializados, entre eles também se encontra uma proporção subs-tancial dos trabalhadores mais mal pagos da Grã-Bretanha.

Tomando-se a ocupação como a base da estrutura de classes, asocupações podem ser classificadas de acordo com uma hierarquiade recompensas e, onde isso é feito, via de regra se reconhecemcinco ou seis classes. De acordo com Parkin.F" as seguintes cate-gorias ocupacionais podem ser classificadas hierarquicamente paraindicar a distribuição aproximada das recompensas na sociedadeindustrial:,

t(1- ..• Profissional, gerencial e administrativa

Semiprofissional e postos administrativos inferioresNão-manual de rotinaManual especializadoManual não-especializado

Estas categorias se aproximam das classificações usadas no RegistroGeral da Grã-Bretanha para o Censo e outras estatísticas oficiais,bem como nas organizações de pesquisa de mercado. São cornu-mente úteis para classificar a população sem a finalidade de sefazer pesquisa empírica. Pode, por exemplo, ser útil comparar aincidência de crianças que recebem educação universitária, ou talveza incidência de crianças que aparecem diante dos tribunais de jus-tiça, com base na classificação de ocupação de seus pais. O conhe-cimento ganho com tais estudos fornece a base da compreensãodo funcionamento da estrutura de classes na sociedade, mas seriaum erro encarar as classes sociais como classificações inventadaspelos sociólogos e pesquisadores de levantamentos sociais a fim deajudá-Ios a interpretar seus dados. As classes sociais, em últimaanálise, existem apenas na medida em que se reconhece que elas.existem. A ordem social depende da definição, feita pelas pessoas,de ordem social. A discriminação de pessoas de classe social baixaocorre porque se reconhece que elas são de classes sociais maisbaixas. A distinção que às vezes é feita entre classes "objetivas",tal como são definidas pelos sociólogos, e classes "subjetivas", talcomo são reconhecidas pelas pessoas na sociedade, é portanto errô-nea. É verdade que as teorias de sociólogos sobre classes sociaissão consideravelmente mais complexas e elaboradas do que as con-cepções cotidianas de classe, mas essas teorias precisam ser baseadasem distinções que são socialmente reconhecidas, e as concepçõescotidianas de classe social se baseiam no reconhecimento das classesna estrutura da sociedade.

As classes sociais, portanto, não são meras categorias sociais,camadas descritivas de uma hierarquia de desigualdade, mas sãogrupos sociais reconhecidos, que possuem interesses distintos e queadotam conjuntos distintos de valores e de ideologias. Assim, odesenvolvimento de estradas de rodagem urbanas serve aos inte-resses de pessoas que vivem em bairros fora da cidade e que vãousar as estradas nas suas viagens diárias para a cidade nos seuscarros, em outras palavras, pessoas predominantemente de classemédia. Por outro lado, essas estradas prejudicam os interesses depessoas cujas casas são deslocadas ou adjacentes a elas e que nãopossuem carros, pessoas predominantemente da classe operária. Asestradas de rodagem urbanas tendem fi ser construídas através debairros de classe operária e não de bairros de classe média, vistoque o preço de terrenos a serem comprados através de ordem com-pulsória é menor nos bairros de classe operária. Os valores declasse média enfatizam o sucesso, as aspirações de carreira e aambição, a energia, a independência, as boas maneiras e a polidez.Os valores da classe operária enfatízam a solidariedade, o coletí-

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vismo, a domesticidade acolhedora, as boas relações com os vizinhos,a sociabilidade e "não se encher de vento". Em qualquer sociedade, aideologia da classe dominante tende a ser predominante. "A rainhae o campo" e "a livr.e empresa" estão encravados na ideologia daclasse média na Grã-Bretanha de hoje. .

Na análise da estratificação social, os sociólogos, seguindo MaxWeber, fazem freqüentemente a distinção entre classe social e statussocial. Nessa distinção, classe se refere às oportunidades individuaispor recompensas econômicas, enquanto status se refere à sua esti-mação social em termos de honra e prestígio. Max Weber consi-derava o status social independente da classe social, não sendo·difícil encontrar exemplos de pessoas na sociedade moderna cujaclasse e posições de status pareceriam ser incongruentes. O bicheiro.bern sucedido pode ter status social baixo, embora tenha recom-pensas econômicas altas. O pároco talvez goze de status social.alto, mesmo que não tão alto quanto há um século, mas classifica-sebem baixo em termos das recompensas econômicas. No entanto,-embora seja possível pensar em muitos exemplos similares, é muitomais comum que o status social e o prestígio tendam a coincidir.com recompensas materiais e econômicas. Em geral, as ocupaçõesmais mal pagas na sociedade gozam do status social e do prestígiomais baixos, enquanto que as melhor pagas gozam do status e doprestígio mais altos. Existe uma teoria sociológica que argumenta.ser necessário que as posições funcionalmente mais importantesrecebam as recompensas econômicas, o prestígio e o status socialmais altos a fim de garantir que essas posições sejam ocupadas.pelas pessoas melhor qualificadas e a fim de garantir que as pessoasficarão suficientemente motivadas para agüentar os longos períodosde treinamento requeridos em tais ocupações.ê" Existem muitas.objeções a tal teoria que não podem ser tratadas aqui, mas pode-seperguntar por que as recompensas materiais e as simbólicas de statustêm de coincidir. Se a estratificação social é necessária para ga-rantir que as melhores pessoas preencham as posições mais impor-tantes, por que não seria suficiente fornecer recompensas econômicasaltas ou status social alto, ao invés de ambos juntos? Para umaexplicação da relação próxima entre classe e status social, é útilvoltar à visão marxista das relações produtivas como base da estru-tura de classes. A classe dominante no sistema produtivo estátambém em posição dominante em termos de sua influência sobrevalores de honra social e prestígio. As posições dominantes na.sociedade tendem, portanto, a trazer consigo o mais alto statussocial e prestígio porque aqueles que mantêm essas posições exer-'cem uma influência dominante sobre os valores de status e de pres-

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tígio. A hierarquia de staius social de uma sociedade pode, assim,representar um aspecto da ideologia da classe dominante e pode,na realidade, ser desafiada por classes subordinadas. Dessa forma,o sotaque adquirido nas escolas aristocráticas da Inglaterra indica,em círculos de classe média, que seu portador é "bem-falante" e lheconfere alto status social, ao passo que, em círculos de classe ope-rária, pode ser visto como pedantismo e assunto para ridícula-rização. Voltando à noção de que as mais importantes posiçõesna sociedade recebem os mais altos retornos materiais e simbólicos,não é muito fácil realmente perceber quais são as posições maisimportantes. Aparentemente, os garis da limpeza pública e os lixei-ros seriam mais importantes funcionalmente do que os contadorese os advogados, embora os últimos sejam considerados pessoas maisimportantes. Assim como a classe dominante tem meios para influirnos valores de honra social e prestígio, ela é também capaz deinfluir nas concepções socialmente estabelecidas a respeito de queocupações são as mais importantes. Assim, as mais importantesposições na sociedade são, via de regra, aquelas mantidas pelosmembros da classe social dominante. "Importância" é, na verdade,uma faceta do status e do prestígio social.

Se consideramos o status social uma derivante de classe socialfundamentalmente, pode parecer muito supérfluo distinguir entreclasse e status. Antes de mais nada, dizer que o status social éfundamentalmente uma derivante da classe social não quer dizerque o status social seja um reflexo mecânico da classe social, assimcomo a visão ele que o poder é uma derivante das relações produ-tivas não implica que o exercício do poder político seja um reflexomecânico da estrutura de classes. As avaliações de status social cde prestígio desenvolvem-se através de processos de relações sociaisde classe de tal modo que é bem provável que haja discrepânciasentre a posição de classe e de status das pessoas. As avaliaçõesde status talvez mudem menos rapidamente do que as recompensaseconômicas de posições particulares. Assim, o status social de clé-rigos declinou relativamente pouco em comparação cem o declíniomais nítido de sua posição econômica relativa. Novas formas deobter recompensas econômicas lucrativas podem ser consideradasmenos honoríficas do que formas tradicionais. Assim, na Inglaterrado século XIX, a renda da terra era mais honorífica do que oslucros da manufatura. Certas qualificações de status social alto nãopodem ser adquiridas apenas por meios econômicos. Conseqüen-temente, o homem de negócios bem sucedido não pode adquirirpara si uma educação de escola aristocrática, embora possa adquiri-Ia para seus filhos. Se for o self-made man genuíno, até mesmo

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operária, mas expressavam apenas visões um tanto gerais do Par-tido Conservador:a riqueza pode ser insuficiente para adquirir vagas numa das' rnais

famosas escolas aristocráticas para seus filhos. Assim, a escolaHarrow exi~ que todos os candidatos a vagas sejam patrocinadospor um antigo aluno da escola. A riqueza tende a tornar-se maishonorífica à proporção que seu portador está mais afastado, pelageração, de sua acumulação original.

A segunda mais importante qualidade da distinção entre classesocial e status é que ela serve para esclarecer algumas das comple.xidades da estrutura de classes. Um dos problemas de distinguira classe operária da classe média é que essa distinção por vezesvem a ser de status e não de classe. Assim, o empregado de escri-tório pode ser distinguido do trabalhador manual, não com basenas recompensas econômicas, mas com base na sua afirmação destatus de classe média, adoção de valores de classe média e a ten-tativa de adotar um estilo de vida de classe média. Algumas dasdistinções mais sutis de classe social podem também vir a ser dis-tinções de status. Assim, a distinção, dentro da classe média, entreclasse média alta e média baixa, e, dentro da classe operária, entre"grossos" e "respeitáveis" podem vir a ser distinções, não tantoem termos de diferenciais em recompensas econômicas e materiais,e sim distinções baseadas em estilos de vida, padrões de compor-tamento e de consumo. Portanto, em bairros operários, os respei-táveis são as pessoas que ficam no seu canto e que se preocupamem manter as aparências, enquanto os "grossos" são mais abertos.em seus padrões de comportamento e tendem a ter relações mais.próximas com vizinhos.

A consciência de classe é muitas vezes considerada relativa-mente distinta de divisões básicas de classe, o elemento subjetivode classe oposto à mensuração objetiva de classe. As falhas detal distinção já foram observadas anteriormente (p. 153). Classeacarreta necessariamente o reconhecimento social de classes e acar-reta, portanto, alguma forma de consciência de classe. Em termosmarxistas, a consciência de classe plenamente desenvolvida envolvenão somente o reconhecimento de divisões de classe, mas tambémum conhecimento dos interesses de classe e de como estes confli-tam com os interesses de outras classes sociais, Butler e Stokes,num recente estudo minucioso do comportamento eleitoral na Grã-Bretanha, fazem uma distinção entre aqueles que encaram a políticaem termos da simples representação de diferentes classes e aquelesque encaram a política em termos de conflito de classes. As pes-soas que encaravam a política em termos da simples representaçãode classes consideravam o Partido Trabalhista o partido da classe

"Não eu lhe digo que não estou interessado neles.""Eles prometem todo tipo de coisas mas não as cumprem.""Eles parecem voltar atrás no que dizem por vezes."28

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As pessoas que encaravam a política em termos de conflito declasses não apenas viam o Partido Trabalhista como o representanteda classe operária, mas também consideravam o Partido Conservadoro representante de interesses de classe opostos. Entre os comentá-rios sobre o Partido Conservador estavam os seguintes:

"Não gosto deles; eles são mais a favor das pessoas de di-nheiro do que da classe operária.""Bem, acho que, quando eles estão no poder e há qualquerorçamento, usualmente são as pessoas de melhor classe quesaem ganhando; como os descontos no imposto de renda.""Eles não são bons com os operários. Eles o arrastariamse pudessem, fariam você trabalhar por nada se pudessem." 29

Butler e Stokes descobriam que os eleitores de classe média sãomuito menos propensos a encarar a política em termos de classesocial, sendo bem comum que menor consciência de classe sejaencontrada entre pessoas de classe média do que pessoas de classeoperária. A principal razão para isso pareceria ser que as pessoasde classe média freqüentemente não percebem as desigualdades dosistema de classes, visto que raramente sofrem da discriminação eda privação que este acarreta. Excluindo-se as desigualdades so-.ciais, as pessoas de classe média são, via de regra, tratadas commaior respeito por funcionários públicos e por outros em posiçãode poder do que as pessoas de classe operária. Existe, por exemplo,uma diferença considerável entre o tratamento recebido pelo ope-rário não-qualificado desempregado, cujo abono está sujeito a inter-rupção se ele não encontra outro emprego em quatro semanas, e orecebido pela pessoa de classe média desempregada que é colocadano registro profissional. As pessoas de classe operária podem mesmo,ocasionalmente, ser recusadas em hotéis caros devido ao seu sotaquee suas roupas.

É verdade que um número significativo de intelectuais socia-listas foram recrutados das fileiras da classe média, inclusive várioslíderes notórios. Na Grã-Bretanha, cerca de um quinto dos eleitoresde classe média são eleitores do Partido Trabalhista, mas, emborapor vezes se suponha que esse quinto VoTOse baseie no idealismo,e em crenças na igualdade social, não há prova verdadeira de que

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seja assim. Se muitos conservadores da classe operária achamque estariam melhor com um Governo conservador, talvez algunseleitores de classe média do Partido Trabalhista acreditem que esta-riam melhor com um Governo trabalhista. Uma carta para o jornalThe Guardian, teclamando das altas taxas de juro sobre as hipo-tecas de casas, fornece uma ilus tração:

Um problema básico no emprego da noção de falsa consciênciaé a implicação de que o sociólogo tem a capacidade de perceberos interesses objetivos de classe das pessoas e contrastá-Ias com avisão subjetiva que elas têm de seus interesses, visão esta que podeser falsa. Como já se disse acima, é um erro fazer uma distinçãonítida entre noções "objetivas" e "subjetivas" de classe social. Arealidade social depende das definições que fazem as pessoas darealidade social. Se aceitamos essa visão, como pode o sociólogo,rotular de falsos certos conjuntos de crenças a respeito dos inte-resses das pessoas? Primeiramente, como argumentei no capítulo 3,deve-se admitir que as pessoas podem estar enganadas em suas defi-nições da situação, devido à falta de informação pertinente ou àaceitação da informação falsa. Os interesses de classe podem serrepresentados pelas ideologias, e a classe dominante - ao exercerinfluência dominante sobre os meios de comunicação e persuasão- pode ser capaz de convencer membros de outras classes a aceitarsua ideologia, originando assim a falsa consciência. Portanto, pessoasda classe operária podem aceitar o processo de decisão político comoalgo que "não é para gente como nós", e sim uma prerrogativa dosmembros da elite.

Um outro problema que se enfrenta ao utilizar a noção deconsciência falsa é o de definir os interesses das pessoas, vistoque não é realmente possível distinguir os interesses "objetivos"dos valores e crenças que as pessoas adotam. Poderia dizer-se queé do interesse do operário maximizar a proporção dos rendimentosde seu patrão devotada aos salários, mas isso envolve a priori-dade do valor de maximizar as recompensas econômicas e a subor-dinação de outros valores - inclusive, talvez, o de rnaximizar ainfluência do operário no processo de tomada de decisão na orga-nização em que está empregado. A eficiência, medida pela pro-porção bruta da receita em relação às despesas, pode não sercompatível com os valores da organização democrática. Se os inte-resses não são de todo separáveis dos valores e crenças das pessoas.torna-se difícil afirmar que um conjunto particular de valores ecrenças é contrário aos interesses de alguém, sendo, portanto, umaindicação de consciência falsa. Um modo de abordar o problemaé considerar como interesses objetivos de uma pessoa aqueles queela tem em virtude de seu papel social. Assim, Dahrendorf argu-menta que, do mesmo modo que as expectativas de papel derivamda estrutura da sociedade e confrontam o indivíduo enquanto tal,os interesses de papel podem também ser considerados derivantesda estrutura da sociedade. 31 Essa é uma nocão útil na medidaem que vincula a definição dos interesses das pessoas às suas rela-ções sociais, mas que implica tratar os papéis, de maneira deter-

Não tenho outros compromissos fora a minha hipoteca, masestou me aproximando rapidamente do status de um falidode classe média. Lutarei pelo Partido Trabalhista na próximaeleição com uma motivação nascida do desespero. 30

Infelizmente, embora muita pesquisa tenha sido feita sobre o COI1-

servadorismo na classe operária, os sociólogos deram pouca atençãoao eleitor do Partido Trabalhista de classe média.

A distinção entre classe e status serve para esclarecer algunsaspectos da consciência de classe ao nos permitir distinguir entreconsciência de classe e percepção de status. Pode-se assim dizer queas pessoas preocupadas em fazer distinções sutis entre seus infe-riores sociais e seus superiores sociais, como os moradores deuma rua que se consideram superiores definitivamente aos mora-dores de outra, embora não exatamente equivalentes CiOS moradoresde ainda outra rua, ou como os "respeitáveis" se distinguem dos"grossos", caracterizam-se por percepção de status e não por cons-ciência de classes. A percepção de status implica percepção da ordemde status social, bem como do lugar de cada um e dos outros dentredela, mas não envolve necessariamente nenhuma concepção da exis-tência de diferentes interesses de classe.

Seguindo a tradição marxista, a noção de consciência de classepode ser contrastada à de falsa consciência. Um indivíduo temconsciência de classe quando está ciente de seus interesses declasse, mas adquire consciência falsa quando tem uma visão errôneade seu interesse de classe. O exemplo óbvio é o eleitor do PartidoConservador pertencente à classe operária, embora este exemploseja problemático, visto poder-se argumentar que, na Inglaterra dehoje, os membros da classe operária estão igualmente equivocadosse acreditam que o Partido Trabalhista representa genuinamente osinteresses da classe operária. Exemplo menos ambíguo seria o doempregado de escritório relativamente mal pago que, porque usa aentrada dos funcionários e não a dos trabalhadores de sua firmae por outras razões similares, identifica-se com os interesses dagerência e não com os interesses dos trabalhadores da firma, en-quanto se poderia dizer que suas relações produtivas com a firmasão basicamente as mesmas que tem o operário assalariado.

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minística, como algo externo aos indivíduos e já preparados paraeles pela sociedade. As limitações de tal concepção de papel foramdiscutidas no capítulo 5, onde se argumentou que tal concepção pre-cisa ser contrabalançada com a noção de criatividade no desempe-nho de papéis.

A falsa consciência pode ser relacionada à alienação, na medidaem que a alienação pode ser considerada a causa da falsa consciên-cia. Se um indivíduo, em seus papéis, está alienado de suas ati-vidades, de seu verdadeiro sel], pode-se dizer que ele é incapaz deperceber seus verdadeiros "interesses objetivos", e que se caracte-riza, portanto, pela falsa consciência. Por exemplo, o estudante queencara seus cursos de formação apenas como meio de adquirirdiplomas pode ser considerado alienado. Pode acreditar que é doseu interesse limitar-se ao mínimo exigido para garantir os certifi-cados dados, mas poderia dizer-se que seu interesse "objetivo",enquanto estudante, é maximizar seu conhecimento e desenvolvi-mento pessoal através de seus estudos. No entanto, neste exem-plo, é difícil separar interesses na educação dos valores educacionais.Como já foi dito (cap. 5, p. 112), a própria alienação é um con-cei to de valor, e a sua associação com a falsa consciência indica'que a afirmação de que um indivíduo não consegue perceber seusinteresses "objetivos" pode ser um julgamento de valor. A falsa'consciência tende a implicar que a consciência que um indivíduotem de sua posição deveria ser diferente da que é.

Para finalizar a discussão sobre a falsa consciência, os pro-blemas que impõe são de tal ordem que essa noção deveria serusada pelos sociólogos com cuidado, o que não significa que deveriaser descartada.' Assim como as pessoas podem ser desinformadas,manipuladas e desorientadas de tal modo que chegam a uma falsadefinição da situação, podem também ter uma falsa definição desua situação de classe e interesses de classe. Alguns dos problemaslevantados pela noção de falsa consciência serão considerados nova-mente no capítulo final.

Na discussão acima, os conceitos de papel e de classe foramligados. B através do conceito de papel que a análise da estruturade classes pode ser ligada à Sociologia da vida cotidiana. Em certo'sentido, a classe social de um indivíduo node ser considerada comoum de seus papéis e como um aspecto "de sua própria identidade.Ele pode perceber que os outros têm expectativas a seu respeitoenquanto membro de uma classe social específica, e classes sociaisespecíficas podem constituir outros zeneralizados ou grupos de refe-

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rencia, para os quais ele orienta seu comportamento. Algumas desuas normas podem ser por ele derivadas de sua classe ou grupode status enquanto grupo de referência, como a dona-de-casa da

classe média que segue a norma de "manter as aparências" e amulher da classe operária que segue a norma do bom relaciona-mento com os vizinhos. Alternativamente, pode-se considerar queos papéis de classe e de status social intervêm em outros papéisque o indivíduo representa. A interação entre os indivíduos nosrespectivos papéis de beneficiário do sistema de previdência sociale de funcionário desse sistema é, portanto, influenciada pelas posi-ções de classe normalmente diferentes dos que desempenham ospapéis. Conclui-se da discussão neste capítulo sobre a base daclasse social (p. 152) que os papéis ocupacionais e de classe estãoestreitamente relacionados.

Argumentou-se neste capítulo que a distribuição de poder nasociedade, a base da autoridade na sociedade e a estrutura declasses da sociedade deveriam ser consideradas estreitamente rela-cionadas entre si. Ao mesmo tempo, a concepção marxista vulgardo exercício de poder e da base de autoridade, que as concebe comoreflexos mais ou menos mecânicos da estrutura de classes, foirejeitada. O desenvolvimento das instituições voltadas primordial-mente para o exercício do poder, as instituições do Estado, podemresultar em sua relativa independência para com interesses de classeespecíficos. Ao mesmo tempo, os interesses de classe dominantenem sempre conseguem difundir-se pelas instituições de poder polí-tico. A ordem normativa, igualmente, talvez adquira um grau deindependência tal que as idéias comumente adoradas sobre o que écerto e qual a base legítima para o exercício do poder nem semprereflitam interesses de classe dominante. É importante considerar oexercício do poder e autoridade e a estrutura de classes da socie-dade relativamente independentes entre si, visto que a relação entreeles não depende da operação impessoal de um sistema social, sejaele capitalista ou qualquer outro, e sim da ação social de indivíduose de grupos na sociedade. ~Se queremos saber se os interesses dosmotoristas, das empresas de fabricação de veículos, das firmas deconstrução de estradas e das associações de transporte por estradasde rodagem interferem ou não no desenvolvimento do planejamentodo transporte urbano, é relevante notar que os interesses do auto-mobilismo coincidem mais ou menos com os interesses economica-mente dominantes na sociedade. No entanto, o processo de tomara decisão de desenvolver vias expressas urbanas e edifícios-garagemou, alternativamente, de desenvolver sistemas de transporte público,não é uma decorrência automática da dominância de interesses declasse particulares, mas uma decorrência, em grande parte, das açõesde indivíduos e grupos por meio dos quais os interesses de gruposão organizados e articulados. Um projeto de vias expressas urbana~pode ser evitado através de uma oposição determinada e bem orga-

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nizada. É verdade que, em tais processos de tornadn de decisão,os grupos de classe média via de regra conseguem organizar-semais efetivamente do que os grupos de operários, e que, de modogeral, as cartas estão muito marcadas contra os interesses de gruposda classe operjria. Os próprios influentes "técnicos" em plane-jamento e administração, membros da classe média, associando-secom pessoas da classe média e partilhando de seus valores e suasatitudes, estão propensos a favorecer interesses de classe média. Aseguinte passagem de um livro-texto de planejamento escrito porum alto técnico em planejamento britânico defende explicitamentevalores de classe.

Numa grande cidade, é observação bastante comum que osmoradores de uma área de slum constituem quase que umaraça de pessoas, com valores, aspirações e modos de vidadiferentes. .. um dos resultados da extirpação de slums éque se efetua um considerável movimento de pessoas emdireção a áreas distantes, o que acarreta efeitos devastadoressobre os agrupamentos sociais construídos ao longo de muitosanos de convivência. Mas, pode-se argumentar, isso é bomquando lidamos com orgulho cívico. A tarefa certamente éromper tais agrupamentos mesmo se as pessoas parecem satis-feitas com seu ambiente m.iserável e parecem gostar de umavida social extrovertida em sua própria localidade. 32

Porém, em última análise, é a ação social, as atividades organizada,de indivíduos, c não a estrutura social, que determina diretamenteo curso tomado pelos acontecimentos.

Igualdade Social e Democracia

As teorias que pretendem explicar divisões de classe em sociedadecomo traços fundamentais ou exigências da organização social podemser usadas pelos que procuram justificativas ideológicas para adesigualdade social existente. Se a divisão da sociedade em classesé uma característica inevitável ou, como no caso da teoria funcio-nalista, necessária para a sociedade, pode-se dizer que seria inútil,ou mesmo socialmente prejudicial, tentar remover ou alterar asdivisões de classe existentes. As teorias que proclamam a inevitabiIidade da dominação de elite na sociedade, que as revoluçõesapenas conseguem substituir uma elite por outra, podem servir dejustificativas do poder de uma elite. Além disso, se tais teoriastambém proclamam, como a de Vilfredo Pareto, que a manutençãodo domínio de classe depende do exercício da manipulação e daforça, elas podem ser usadas para justificar o exercício do poderbaseado na manipulação ou na força. O Estado fascista de Mus-

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PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 163

solini teve seus enfeites intelectuais inspirados na obra de Pareto.Não estou sugerindo que as justificativas morais da desigualdadesocial e o exercício do poder derivam logicamente das teoriassociológicas empregadas para apoiá-Ias. Ao invés disso, quando teo-rias sociológicas proclamam que características particulares da orga-nização da sociedade são universais, essas características tendemconseqüentemente a ser consideradas boas, ou, ao menos, um malnecessário. De fato, a lógica de tais afirmativas sobre as caracte-rísticas universais da organização social são, via de regra, incom-pletas, baseadas que estão na premissa de que, porque certas coisassempre foram assim no passado, conseqüentemente continuarão aser assim no futuro. A pretensão dos teóricos de elite a respeitoda inevitabilidade do domínio de elite baseia-se na evidência his-tórica de que todas as sociedades foram governadas por elites,associada a suposições dúbias acerca da "natureza humana". 33

Se a distribuição de poder político na sociedade relaciona-seestreitamente à estrutura de classes e à desigualdade social, con-clui-se que a busca do ideal de democracia, a distribuição iguali-tária de poder na sociedade, também envolve a busca do ideal deigualdade social. Quaisquer que sejam os arranjos formais inven-tados para garantir a democracia política, tais como o sufrágiouniversal e a representação parlamentar, as divisões de classe ten-derão a garantir a concentração do poder político e o seu exercícioa favor das classes dominantes. Por meio de seu controle sobrerecursos, comq também por meio da ocupação das posições-chavede poder na sociedade efetuada pejos seus membros, as classessocial e economicamente dominantes são capazes de exercer umainfluência dominante sobre a tomada de decisões políticas. Hoje,freqüentemente se expressa preocupação, na imprensa, com os pro-blemas das comunidades empobrecidas e carentes das cidades in-glesas . Fazem-se sugestões sobre como as autoridades locais, asagências de previdência social (toeliare agencies) e outros orga-nismos governamentais, podem enfrentar os problemas dessas áreas.Menos atenção é devotada à falta de poder de tais comunidadesempobrecidas e carentes, à sua incapacidade de influir nas açõesdas autoridades políticas. Se os grupos economicamente prejudicadosfossem capazes de ganhar poder político através de processos demo-cráticos de eleições e representação parlamentar, esse poder ganhocertamente seria usado para retificar as desvantagens e para criarmaior igualdade social e econômica, por meio de medidas taiscomo a redistribuição da renda através dos impostos e dos bene-fícios da previdência social. Na Grã-Bretanha, os Governos doPartido Trabalhista fracassam constantemente na redução da desi-gualdade social." Alguns comentaristas sugerem que isso se deve

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ao fato de que eles não tentaram, mas têm colocado outras prio-ridades antes. Alternativamente, pode-se argumentar que o fra-casso de Governos ostensivamente socialistas em apagar as desigual-dades sociais -indica que o poder efetivo durante Governos parla-mentares socialistas permanece nas mãos das classes social e eco-nomicamente privilegiadas. 35

Existem teóricos da democracia, no entanto, que não apenasseparam os problemas da democracia política e da igualdade social,mas também argumentam que as divisões de classe na sociedadena verdade apóiam a democracia.P" Essencialmente, o argumento éque a democracia depende da competição entre partidos políticose que a melhor base para tal competição é a existência das divisõesde partido baseadas em divisões de classe. De acordo com umargumento, os partidos de classe são integradores e unificadores,enquanto partidos baseados em divisões religiosas ou regionaispodem ser mais divididores. 37 Talvez seja assim: uma comparaçãodas divisões de partido na Irlanda do Norte e na Inglaterra apoia-ria esta conclusão. Poder-se-ia também argumentar que o PartidoTrabalhista britânico já fez muito para integrar a classe operáriano sistema político. Porém, o argumento de que as divisões departido baseadas em divisões de classe apóiam a democracia é, naverdade, o argumento de que tais divisões garantem a estabilidadeda democracia parlamentar e a preservação do status quo, A demo-cracia é igualada ao sistema político existente e a questão da igual-dade política, salvo em termos formais, é negligenciada. Se a baseclassista das divisões políticas parece estar sob o perigo da erosão,o problema não é, nessa visão, que certas classes sociais não sejamrepresentadas, mas que grupos "extremistas" possam surgir e amea-çar as instituições da democracia parlamentar. De qualquer modo,raramente se coloca a questão de saber se os partidos representamou não, de fato, os interesses das classes que os apóiam, visto quese supõe geralmente que, quando um partido consegue o apoiode uma classe social específica, ele automaticamente representa osinteresses desta classe. É, contudo, ao menos duvidoso que o Par-tido Trabalhista no poder tenha constantemente representado osinteresses da classe operária.

A democracia parlamentar, baseada na competição entre par-tidos que conseguem seu apoio de diferentes classes sociais é umsistema político de competição entre elites, sendo que os valoresdemocráticos que tal sistema mantém podem vir a ser os valoresdessas elites, que são defendidos contra os valores das massas. Oargumento de que tal sistema de competição evita o domínio deuma só elite é defensável, mas, por outro lado, é possível afir-mar-se que tal competição é mais aparente que real e que, de fato.

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PODER E DESIGUALDADE SOCIAL 165

as elites em competição compreendem as faces diversas de umaúnica elite mais ou menos unificada. Poder-se-ia dizer que os par-lamentares ingleses mais antigos dos Partidos Trabalhista e Con-servador têm interesses comuns que superam suas diferenças departido, podendo-se dizer o mesmo dos políticos nos Governos

locais.Para aqueles que acreditam em apelos à generosidade das

elites para solucionar os problemas das comunidades empobrecidase carentes, uma das tristes lições da Sociologia é que as elitestendem a servir aos seus próprios interesses. Isso pode parecerexcessivamente céptico, e não se quer sugerir que membros da elitenão possam agir por motivos altruístas e humanitários. Contudo,eles irão conceituar os problemas sociais em termos de suas pró-prias definições da situação, em termos de sua própria visão domundo social, e, se eles são originários de uma classe social espe-cífica, sua visão do mundo social será a visão dessa classe socialespecífica.