BIOGENÉTICA Flores: alta tecnologia na produção e...

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B I O G E N É T I C A por Bárbara Bortolin Flores: alta tecnologia na produção e diversificação Avanços tecnológicos têm sido os principais responsáveis pela diversifi- cação e melhora na qualidade da produ- ção de flores no Brasil. A partir da intro- dução de novas tecnologias e práticas de manejo, foi possível aumentar o núme- ro de espécies cultivadas e modificar as que já eram produzidas no país. No caso das rosas, as mais recentes variedades produzidas permitiram um aumento de 25% nas vendas para o mercado nacio- nal e, também, a ampliação das exporta- ções, principalmente para a Holanda e Portugal. As novas variedades são maio- res, mais resistentes e duráveis. Entre as tecnologias usadas para o cultivo das rosas, estão as desenvolvi- das pela Flora Reijers. Especializada na produção de rosas híbridas de chá (com flores ou botões grandes), a empresa possui campos de produção no sul de Minas Gerais (nas cidades de Andradas e Itapeva), no Ceará (em São Benedito e Ubajara) e em São Paulo (em Holambra). Segundo Gustavo Vieira, engenhei- ro agrônomo da empresa, uma das novi- dades é o sistema de reuso da água com a solução nutritiva, no qual as rosas, semi-hidropônicas, são cultivadas em fibras de coco, utilizadas como substra- to, que são colocadas dentro de potes ou canaletas de plástico. Embaixo desses potes ou canaletas, uma calha plástica recolhe o excesso da solução nutritiva que saiu da flor, reutilizando-a na pró- xima irrigação. A irrigação por gotejamento é total- mente controlada por um computador, o que implica em economia para a empresa, devido ao uso racional de água e adubo. A Reijers também investiu na cli- matização dentro das estufas, monta- das com plásticos que disponibilizam para as rosas luz em quantidade sufi- ciente para aumentar a fotossíntese e com uma uniformidade que permite que não haja diferença de coloração entre as rosas. Produzidas em estufa e com o sistema de gotejamento, essas flores ganham padrão de qualidade internacional. Internamente, essas flo- res são comercializadas para arranjos, devido ao seu maior tamanho. Para produzir as rosas comuns, no campo ou em estufas menos estrutu- radas, a Reijers faz uso de estações meteorológicas, que monitoram via satélite, as condições climáticas, permi- tindo o conhecimento prévio sobre pres- são atmosférica, temperatura do ar, umidade relativa do ar, velocidade e direção do vento, precipitação pluvio- métrica, radiação solar, temperatura e umidade do solo em três níveis de pro- fundidade. Isso possibilita que, em caso de chuva, as flores possam ser pulveri- zadas preventivamente, medida mais barata que a curativa. Em Holambra, que possui uma das maiores produções de rosas do país, está sendo usado um sistema de iluminação artificial para garantir flores do mes- mo tamanho e com a mesma qualidade o ano todo. A técnica é utilizada para determinar o tamanho das flores e o dia da colheita. O sistema consiste em interromper o processo ou a aceleração da floração de determinadas flores por meio do con- trole da luz que elas recebem. Para isso, as estufas são equipadas com lâmpa- das convencionais e com pesadas lonas que podem fazer o dia virar noite e a noi- te virar dia. O crisântemo, por exemplo, precisa de pelo menos 13 horas consecutivas de MELHORAMENTO GENÉTICO, SISTEMAS DE IRRIGAÇÃO E DE CLIMATIZAÇÃO AJUDAM NA ADAPTAÇÃO DE ESPÉCIES JÁ EXISTENTES E NO DESENVOLVIMENTO DE NOVAS VARIEDADES Divulgação/Terra Viva Plantação de tango: sistema de iluminação artificial para padronizar qualidade das flores

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por Bárbara Bortolin

Flores: alta tecnologia na produção e diversificação

Avanços tecnológicos têm sido osprincipais responsáveis pela diversifi-cação e melhora na qualidade da produ-ção de flores no Brasil. A partir da intro-dução de novas tecnologias e práticasde manejo, foi possível aumentar o núme-ro de espécies cultivadas e modificar asque já eram produzidas no país. No casodas rosas, as mais recentes variedadesproduzidas permitiram um aumento de25% nas vendas para o mercado nacio-nal e, também, a ampliação das exporta-ções, principalmente para a Holanda ePortugal. As novas variedades são maio-res, mais resistentes e duráveis.

Entre as tecnologias usadas para ocultivo das rosas, estão as desenvolvi-das pela Flora Reijers. Especializada naprodução de rosas híbridas de chá (comflores ou botões grandes), a empresapossui campos de produção no sul deMinas Gerais (nas cidades de Andradase Itapeva), no Ceará (em São Beneditoe Ubajara) e em São Paulo (emHolambra).

Segundo Gustavo Vieira, engenhei-ro agrônomo da empresa, uma das novi-dades é o sistema de reuso da água coma solução nutritiva, no qual as rosas,semi-hidropônicas, são cultivadas emfibras de coco, utilizadas como substra-to, que são colocadas dentro de potes oucanaletas de plástico. Embaixo desses

potes ou canaletas, uma calha plásticarecolhe o excesso da solução nutritivaque saiu da flor, reutilizando-a na pró-xima irrigação.

A irrigação por gotejamento é total-mente controlada por um computador,o que implica em economia para aempresa, devido ao uso racional de águae adubo.

A Reijers também investiu na cli-matização dentro das estufas, monta-das com plásticos que disponibilizampara as rosas luz em quantidade sufi-ciente para aumentar a fotossíntese ecom uma uniformidade que permiteque não haja diferença de coloraçãoentre as rosas. Produzidas em estufa ecom o sistema de gotejamento, essasflores ganham padrão de qualidadeinternacional. Internamente, essas flo-res são comercializadas para arranjos,devido ao seu maior tamanho.

Para produzir as rosas comuns, nocampo ou em estufas menos estrutu-radas, a Reijers faz uso de estaçõesmeteorológicas, que monitoram viasatélite, as condições climáticas, permi-tindo o conhecimento prévio sobre pres-são atmosférica, temperatura do ar,umidade relativa do ar, velocidade edireção do vento, precipitação pluvio-métrica, radiação solar, temperatura eumidade do solo em três níveis de pro-fundidade. Isso possibilita que, em casode chuva, as flores possam ser pulveri-zadas preventivamente, medida maisbarata que a curativa.

Em Holambra, que possui uma dasmaiores produções de rosas do país, estásendo usado um sistema de iluminaçãoartificial para garantir flores do mes-mo tamanho e com a mesma qualidadeo ano todo. A técnica é utilizada paradeterminar o tamanho das flores e o diada colheita.

O sistema consiste em interrompero processo ou a aceleração da floraçãode determinadas flores por meio do con-trole da luz que elas recebem. Para isso,as estufas são equipadas com lâmpa-das convencionais e com pesadas lonasque podem fazer o dia virar noite e a noi-te virar dia.

O crisântemo, por exemplo, precisade pelo menos 13 horas consecutivas de

MELHORAMENTO GENÉTICO,SISTEMAS DE IRRIGAÇÃO E DE

CLIMATIZAÇÃO AJUDAM NA ADAPTAÇÃO DE ESPÉCIES

JÁ EXISTENTES E NODESENVOLVIMENTO DE

NOVAS VARIEDADES

Divulgação/Terra VivaPlantação de tango: sistema de iluminação artificial para padronizar qualidade das flores

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qualquer região do país, sem a necessi-dade de estufas.

"Os principais problemas foramadaptação, conhecimento do mercadointerno e transformação de uma plan-ta oleaginosa em flor, já que o girassolsujava a toalha da mesa porque o pólencaía do centro, além de ser muito gran-de para ficar em um vaso comum", expli-ca Marcelo Fernandes de Oliveira, pes-quisador da Embrapa Soja e responsá-vel pela pesquisa inicial.

O primeiro passo para a criação dogirassol ornamental foi o melhoramen-to genético para a obtenção de novascores. Depois, começou o trabalho, tam-bém genético, para diminuir o tamanhodas flores e atender os mercados de cor-te (com uma flor por caule) e jardina-gem (com 5 a 20 flores, dependendo dacor). O girassol normal tem 20 cm dediâmetro. Os dois tipos desenvolvidospossuem de 5 a 7 cm de diâmetro. As flo-res podem durar até 10 dias em vasocom água, e até 25 dias no jardim.

A partir do início de 2006, sementesde três tonalidades de girassol ornamen-

tal estarão sendo comercializadas: omesclado (para corte), ferrugem escuroe vinho (as duas para cultivo em jardim).Segundo Ana Cláudia Barneche deOliveira, pesquisadora da Embrapa Sojae melhorista do girassol ornamental,continuam as pesquisas para criação denovas tonalidades e sementes. "Nós con-tinuamos a trabalhar no desenvolvimen-to das outras sementes para comercia-lização e na criação de novas tonalida-de do girassol ornamental, como o pre-to e o branco", informa a pesquisadora.

Outro trabalho realizado pelaEmbrapa, na unidade AgoindústriaTropical, no Ceará, é o melhoramentogenético de flores tropicais. Segundo opesquisador Levi de Moura Barros, aunidade trabalha com flores, principal-mente helicônias, há seis anos. "Nesteperíodo conseguimos a introdução de160 acessos de diferentes genótipos deflores tropicais; estudos para caracte-rização morfológica e molecular de heli-cônias e antúrios; uso de material depropagação vegetativa para experimen-tação e fornecimento de mudas paraprodutores; formação de uma coleçãode cactos nativos da região Nordesteatravés de coletas botânicas autoriza-das; e estudos para o desenvolvimentode protocolos mais eficientes de propa-gação in vitro das espécies da coleção",explica.

De acordo com Barros, o programade melhoramento de helicônias noBrasil, ainda em estágio inicial, temcomo objetivo a organização da diversi-dade de espécies existentes nas insti-tuições públicas e na iniciativa priva-da, além da busca por novas combina-ções híbridas. Além disto, estudos têmsido conduzidos para entendimento dosmecanismos de cruzamentos artificiais,uma vez que são poucas as informaçõessobre o assunto.

As helicônias são muito apreciadas,em função da grande durabilidade, bele-

escuro para terminar de florescer. Senão houver a interferência no seu cres-cimento, a espécie vai florescer rapida-mente e atingir, no máximo, cerca de20 centímetros. Quando a luz é acesa,os produtores "enganam" a flor, pois ela"pensa" que é dia e pára de crescer. Como controle da floração, os produtoresconseguem fazer com que essas floresatinjam um tamanho maior, com has-tes de até um metro de altura. O objeti-vo da técnica não é aumentar a produ-tividade, mas a beleza, qualidade e a pro-dução constante das flores.

Outra flor que requer a utilizaçãodessa técnica é o tango, que floresce emnoites longas de até 11 horas de escuri-dão. Nesse período, a flor acumula o hor-mônio do crescimento até a concentra-ção que resulta na floração. Quando asluzes são acesas, o tango, assim comoo crisântemo, precisa começar o proces-so novamente. Dessa forma é possívelretardar o florescimento e garantir aprodução durante todo ano. Apesar doprocesso parecer simples, a luz tem queser desligada no momento certo — nor-malmente quando a flor atinge 50 cen-tímetros de altura, para que ela cresçamais 20 ou 30 cm.

A mesma técnica pode ser utilizadanas produções no campo, ao ar livre,cobrindo os canteiros com lonas. Algu-mas variedades, como o crisântemo,necessitam das estufas para que o sis-tema de iluminação artificial funcione.Outras, como tango e aster, apresentambons resultados no cultivo ao ar livre.

GIRASSOLNo caso do girassol ornamental, a

inovação tecnológica e o melhoramen-to genético foram os responsáveis pelacriação de nove tonalidades diferentesda planta. Desenvolvido a partir de 1996,pela Embrapa Soja, foram criadas varie-dades que se adequam às exigênciasbrasileiras, podendo ser cultivadas em

Simone Pallone

HELICÔNIAS O programa de melhoramento dessas plantas noBrasil, ainda em estágio inicial, tem como objetivoa organização da diversidade de espécies existentesnas instituições públicas e na iniciativa privada, alémda busca por novas combinações híbridas, surgidasnas áreas experimentais e nas áreas de produção.

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za e exuberância das inflorescências,no mercado de flores de corte e plantaspara paisagismo em todo o mundo. Amaioria das espécies do gênero helicô-nia são neotropicais e capazes de flo-rescer durante o ano inteiro, em condi-ções favoráveis.

Para o pesquisador, é fundamentala existência de variabilidade genéticapara o comércio de flores. "Trata-se deum mercado tipicamente de novidades,sendo que a demanda por novas varie-dades para manutenção do interesse

dos consumidores é muito maior do queem qualquer outra atividade agrícola".

Quem concorda com a opinião dopesquisador é Renato Optiz, presiden-te da Câmara Setorial Federal de Florese Plantas Ornamentais, que começou afuncionar em 2003, com o objetivo delevar ao governo, de uma forma organi-zada e pré-discutida, sugestões da cadeiada floricultura. Para ele, a inovação tec-nológica é fundamental. "O Brasil teminvestido muito pouco em inovação nosúltimos anos. No caso da floricultura, são

poucas as instituições que trabalhamcom o desenvolvimento de novas varie-dades", diz.

Segundo Optiz, a previsão de expor-tação de flores do Brasil para este ano éUS$ 30 milhões — principalmente rosas,que são exportadas em buquês prontos."Mais de 90% da produção nacional éconsumida pelo mercado interno. Apenas10% são exportados. Há possibilidade,com o melhoramento genético e os novosprocessos de produção, de aumentar estevalor nos próximos anos".

Para o presidente do InstitutoBrasileiro de Floricultura (Ibraflor), KessSchoenmaker, o Brasil tem um merca-do interno gigantesco que, muitas vezes,é esquecido pelos produtores. "A con-corrência no exterior é muito grande eainda há um grande potencial no nos-so mercado interno. Para se ter umaidéia, o gasto médio do brasileiro comflores e plantas é de US$ 4,70 por ano.Na Bélgica o consumo médio per capi-ta é de US$ 69,00, na Holanda US$ 80,00e na Suécia US$ 89,00. Além disso, nóstemos um dos melhores climas do mun-do para produção de bulbos. Precisamosinvestir em máquinas, equipamentos,colheita, pós-colheita e tratamento".

Para se chegar a um novo tipo de flor, mes-mo que seja somente a produção, sem contara comercialização, são necessários em médiaoito anos. Somente o trabalho dos melhoris-tas, que envolve a seleção do material genéti-co e sua reprodução em laboratório, e depoisos testes de adaptação da planta ao campo ouestufa, leva aproximadamente cinco anos.

Outros três anos são dispendidos nodesenvolvimento das novas variedades já comvistas à produção e comercialização. São fei-tos testes de adaptação às diferentes regiões,e também de aceitação do produto pelo mer-cado.

MELHORAMENTO GENÉTICO

- Em Holambra (SP), um dos maiores pólos de rosas do país, são produzidas 160 milhões de hastes -o que corresponde a 60% das rosas vendidas no mercado brasileiro; 80% das rosas produzidas emestufas no Brasil, se concentram no município.

- A produção de rosas em estufa da Reijers equivale a 100 estádios do Maracanã.

- Holambra gera 12 mil empregos (diretos e indiretos) na produção de flores.

- Exportação de rosas prevista para 2005: 1,215 milhão de hastes, o que representa 27% do total deflores e plantas ornamentais vendidas ao exterior.

- A excelência da Holambra na produção de flores é apresentada anualmente na Expoflora, exposi-ção que, em 2005, movimentou perto de R$ 15 milhões num raio de 80 km, gerou 4.500 empregosdiretos e indiretos, recebeu 290 mil turistas nos 17 dias de evento e comercializou 500 mil unidadesde flores e plantas no Garden Center.

HOLAMBRA: PÓLO PRODUTOR DE FLORES

Campo de reprodução de mudas em Holambra

Divulgação

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