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  • Rubem Silvrio de Oliveira Jr.

    Jamil Constantin

    Miriam Hiroko Inoue

    (Editores)

    Biologia e Manejo

    de Plantas Daninhas

    2011

  • Copyright

    c2011 Omnipax Editora LtdaCaixa Postal: 16532 - 81520-980 Curitiba, PR

    A editora disponibiliza por acesso livre a verso eletr-

    nica deste livro no site: http://www.omnipax.com.br,

    sob uma licena Creative Commons Attribution 3.0.

    Capa:

    Srgio Alexandre Prokoev

    Foto da capa:

    Eng. Agrnomo Luiz Henrique Morais Franchini

    Plntula de Conyza sumatrensis (buva)

    Projeto grco e editorao:

    Omnipax Editora Ltda

    Impresso:

    Pix Bureau Grca e Editora

    Ficha catalogrca:

    Adriano Lopes (CRB9/1429)

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    B615 Biologia e Manejo de Plantas Daninhas / editores:

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr., Jamil Constantin e

    Miriam Hiroko Inoue. Curitiba, PR: Omnipax, 2011

    348 p.

    Vrios autores

    Inclui biograas

    ISBN: 978-85-64619-02-9

    eISBN: 978-85-64619-05-0

    1. Ervas daninhas Controle biolgico. 2. Plantas

    Efeitos dos herbicidas. 3. Herbicidas. 4. Fitopatolo-

    gia. I. Oliveira Jr., Rubem Silvrio ed. II. Constantin,

    Jamil. III. Inoue, Miriam Hiroko. IV. Ttulo.

    CDD (22. ed.)632.96

  • Apoio

  • .

  • ColaboradoresAlessandro de Lucca e Braccini: Doutor em Fitotecnia (UFV,

    1996), Professor Associado do Departamento de Agronomia

    da Universidade Estadual de Maring, PR.

    Alessandro Magno Brighenti: Doutor em Fitotecnia (UFV,

    1995), Pesquisador da EMBRAPA Centro Nacional de Pes-

    quisa de Gado de Leite, Juiz de Fora, MG.

    Dauri Jos Tessman: Doutor em Fitopatologia (University of Flo-

    rida, 1999), Professor Associado do Departamento de Agrono-

    mia da Universidade Estadual de Maring, PR.

    Jamil Constantin: Doutor em Agricultura (UNESP Botucatu,

    1996), Professor Associado do Departamento de Agronomia

    da Universidade Estadual de Maring, PR.

    Marcos Antonio Bacarin: Doutor em Fisiologia Vegetal (UFV,

    1995), Professor Associado do Departamento de Botnica, Ins-

    tituto de Biologia, Universidade Federal de Pelotas, RS.

    Maurlio Fernandes de Oliveira: Doutor em Produo Vegetal

    (UENF, 1999), Pesquisador da EMBRAPA Centro Nacional

    de Pesquisa de Milho e Sorgo, Sete Lagoas, MG.

    Miriam Hiroko Inoue: Doutora em Agronomia (UEM, 2006),

    Professora do Departamento de Agronomia da Universidade

    do Estado de Mato Grosso, Tangar da Serra, MT.

    Ndja de Moura Pires de Oliveira: Doutora em Fitotecnia

    (UFV, 1998), Braslia, DF.

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr.: Doutor em Fitotecnia (UFV,

    1998), Professor Associado do Departamento de Agronomia

    da Universidade Estadual de Maring, PR.

    Valter Rodrigues Oliveira: Doutor em Gentica e Melhoramento

    (UFV, 1997), Pesquisador da EMBRAPA Centro Nacional

    de Pesquisa de Hortalias, Braslia, DF.

  • Dedicatria

    Este livro dedicado ao Prof. Dr. Jos Francisco da Silva, pro-

    fessor aposentado do Departamento de Fitotecnia da Universidade

    Federal de Viosa, em reconhecimento ao seu pioneirismo na rea

    da Cincia das Plantas Daninhas no Brasil e ao treinamento de um

    incontvel nmero de ex-alunos e orientados, os quais hoje esto es-

    palhados pelo Brasil como uma continuao viva de seu trabalho.

  • .

  • Prefcio

    Biologia e Manejo de Plantas Daninhas uma obra des-

    tinada aos acadmicos de graduao em Agronomia e dos diversos

    programas de ps-graduao relacionados Agronomia. O objetivo

    do livro oferecer subsdios para a discusso aprofundada dos princi-

    pais aspectos da rea de Cincia das Plantas Daninhas. Inicialmente

    so abordados aspectos importantes relacionados aos conceitos bsi-

    cos ligados multiplicao, ao estabelecimento, classicao e s

    principais caractersticas das plantas daninhas, assim como aos efeitos

    destas sobre as espcies de interesse econmico. A seguir, so discuti-

    dos os principais mtodos de manejo e tambm estratgias alternati-

    vas relacionadas ao controle biolgico e alelopatia. Na sequncia so

    introduzidos os conceitos bsicos relacionados ao controle qumico das

    plantas daninhas e so discutidas as principais formas de classicao

    dos herbicidas, com nfase nos mecanismos de ao. Posteriormente

    a temtica relacionada os herbicidas aprofundada, discutindo-se

    como estes so absorvidos, translocados e como controlam as plantas

    daninhas de forma seletiva. Finalmente, so discutidos temas rela-

    cionados ao desenvolvimento e diagnstico da resistncia de plantas

    daninhas aos herbicidas e ao destino destas molculas no solo e no

    ambiente. Tendo em vista a atualidade do tema relacionado ao cul-

    tivo de espcies resistentes ao glyphosate, tambm so discutidas as

    misturas de herbicidas contendo glyphosate.

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr. UEM

    Jamil Constantin UEM

    Miriam Hiroko Inoue UNEMAT

  • .

  • Sumrio

    1 Biologia de plantas daninhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

    Alexandre Magno Brighenti e Maurlio Fernandes de Oliveira

    2 Bancos de sementes e mecanismos de dormncia em

    sementes de plantas daninhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

    Alessandro de Lucca e Braccini

    3 Mtodos de manejo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67

    Jamil Constantin

    4 Controle biolgico: aplicaes na rea de Cincia

    das Plantas Daninhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79

    Dauri Jos Tessmann

    5 Alelopatia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

    Ndja de Moura Pires e Valter Rodrigues de Oliveira

    6 Introduo ao controle qumico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr.

    7 Mecanismos de ao de herbicidas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr.

    8 Resistncia de plantas daninhas a herbicidas . . . . . . . . . . . . . . 193

    Miriam Hiroko Inoue e Rubem Silvrio de Oliveira Jr.

    9 Absoro e translocao de herbicidas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr. e Marcos Antonio Bacarin

    10 Seletividade de herbicidas para culturas e plantas daninhas 243

    Rubem Silvrio de Oliveira Jr. e Miriam Hiroko Inoue

    11 Comportamento de herbicidas no ambiente. . . . . . . . . . . . . . . . 263

    Maurlio Fernandes de Oliveira e Alexandre Magno Brighenti

    12 Misturas de herbicidas contendo glyphosate:

    situao atual, perspectivas e possibilidades . . . . . . . . . . . . . . . 305

    Jamil Constantin e Rubem Silvrio de Oliveira Jr.

  • .

  • Captulo 1

    Biologia de Plantas Daninhas

    Alexandre Magno BrighentiMaurlio Fernandes Oliveira

    1. Introduo

    Os termos plantas invasoras, plantas daninhas e ervas daninhas tm

    sido empregados indistintamente na literatura brasileira. Essas plantas

    so tambm designadas como plantas ruderais, plantas silvestres, mato

    ou ino. Entretanto, todos estes conceitos baseiam-se na sua indesejabi-

    lidade em relao a uma atitude humana. Um conceito amplo de planta

    daninha a enquadra como toda e qualquer planta que ocorre onde no

    desejada. Com relao ao termo erva daninha, bastante utilizado, deveria

    ser evitado como termo geral, uma vez que implica em consider-las como

    plantas herbceas, o que no totalmente verdadeiro. Pelo menos 20%

    das espcies daninhas no so herbceas, sendo arbustivas ou at arbreas,

    como a maioria das plantas daninhas de pastagens (Lorenzi, 1991). Em-

    bora no se possa dizer, a priori, se uma planta ou no daninha, devido

    ao prprio conceito estabelecido levando em conta as atitudes humanas,

    algumas tm sido ditas plantas daninhas comuns e outras plantas da-

    ninhas verdadeiras. As plantas daninhas comuns so aquelas que no

    possuem habilidade de sobreviver em condies adversas. o que ocorre,

    por exemplo, num sistema de semeadura direta com o binmio milho/soja,

    quando, na poca da semeadura da leguminosa, ocorre a emergncia de

    plantas de milho provenientes das sementes que no foram colhidas na sa-

    fra anterior. Essas plantas so chamadas de voluntrias ou, popularmente,

    denominadas de tiguera ou plantas guachas. Por outro lado, as plantas

    daninhas verdadeiras apresentam determinadas caractersticas que permi-

    tem x-las como infestantes ou daninhas (Marinis, 1972). So plantas no

    melhoradas geneticamente, que apresentam capacidade de crescer em con-

    dies adversas, tais como ambientes desrticos ou alagados, em ambientes

    com temperaturas baixas ou altas e solos salinos. Apresentam rusticidade,

    resistncia a pragas e doenas, habilidade de produzir grande nmero de

    sementes viveis com adaptaes que auxiliam na disperso da espcie e

    formas variadas de multiplicao (tubrculos, estoles, rizomas e bulbos).

    R.S. Oliveira Jr. et al. (Eds.), Biologia e Manejo de Plantas Daninhas (2011) ISBN 978-85-64619-02-9

  • 2 Brighenti & Oliveira

    2. Origem e Evoluo das Plantas Daninhas

    A existncia das plantas daninhas remonta da Antiguidade, quando as

    nossas plantas cultivadas viviam no estado silvestre. A domesticao das

    plantas teis foi muito lenta e inicialmente a sua explorao era extra-

    tiva. Nem mesmo a eliminao das plantas daninhas que cresciam junto

    cultura era realizada, pois, uma vez que possuam agressividade, eram

    capazes de sobreviver nestas condies, sem sofrerem prejuzos decorrentes

    da concorrncia.

    O homem, com o passar do tempo, veio melhorando as espcies teis,

    retirando-lhes gradativamente a agressividade necessria para viverem sozi-

    nhas. A natureza, por sua vez, agiu sobre as plantas silvestres imprimindo-

    lhes uma seleo no sentido de torn-las cada vez mais ecientes quanto

    sobrevivncia.

    Acredita-se, tambm, que as plantas daninhas originaram-se, inicial-

    mente, com distrbios naturais tais como glaciaes, desmoronamentos de

    montanhas e a ao de rios e mares (Muzik, 1970).

    Na realidade, as plantas daninhas surgiram quando o homem ini-

    ciou suas atividades agrcolas, separando as bencas (plantas cultivadas)

    das malcas (plantas daninhas). De maneira que as plantas daninhas

    encontram-se onde est o homem, porque ele que cria o ambiente favo-

    rvel a elas. O homem , provavelmente, o responsvel pela evoluo das

    plantas daninhas, bem como das plantas cultivadas.

    Baker (1974) descreveu a inuncia do homem na evoluo das plantas

    daninhas propondo trs teorias: (i) espcies selvagens foram se adaptando

    e sendo selecionadas pelo contnuo distrbio do habitat; (ii) hibridaes

    entre espcies selvagens e raas cultivadas de espcies domesticadas e (iii)

    espcies que foram abandonadas no processo de domesticao.

    Dentre as formas de coevoluo das plantas daninhas com as plantas

    cultivadas destacam-se a mimetizao das plantas daninhas com as cultu-

    ras, a mudana da ora em funo da presso de seleo causada pelos

    mtodos de controle e a resistncia de plantas daninhas a herbicidas.

    A mimetizao das plantas daninhas e plantas cultivadas caracteri-

    zada pela semelhana entre estas espcies. Quanto maior a semelhana,

    maior ser a diculdade de controle. Um exemplo tpico ocorre com a cul-

    tura do arroz e o capim-arroz (Echnochloa spp.). Nesta mesma situao,

    encontram-se o arroz vermelho e o arroz cultivado, ambos Oryza sativa

    (Barret, 1983).

    medida que as prticas culturais mudam, as espcies de plantas dani-

    nhas menos adaptadas a estas prticas tendem a diminuir ou desaparecer,

    ao passo que as mais adaptadas que, normalmente, estavam em menor

    frequncia no incio, passam a dominar a rea (Radosevich et al., 1997).

    Um exemplo caracterstico o que vem acontecendo com as culturas gene-

    ticamente modicadas, como a soja transgnica resistente ao glyphosate.

  • Biologia de Plantas Daninhas 3

    Mesmo sendo um herbicida que controla um grande nmero de espcies

    daninhas, existem outras com alto grau de tolerncia ao glyphosate como

    a trapoeraba (Commelina benghalensis), a corda-de-viola (Ipomoea spp.),

    a erva-de-touro (Tridax procumbens), o agriozinho (Synedrellopsis grise-

    backii) e outras.

    Repetidas aplicaes de um mesmo herbicida ou herbicidas de mesmo

    mecanismo de ao podem causar uma presso de seleo em indivduos

    resistentes, que ocorrem em baixa frequncia. O favorecimento do aumento

    da populao de bitipos de espcies daninhas resistentes por meio da pres-

    so tende a tornar tais bitipos dominantes na populao (Christooleti

    et al., 2008).

    3. Aspectos Positivos e Negativos das Plantas Daninhas

    3.1 Aspectos positivosAs plantas daninhas no devem ser vistas sempre como inimigas ou indese-

    jveis. Muitas vezes, devem ser encaradas como aliadas. As caractersticas

    bencas encontradas nas espcies podem ser muitas, sendo a descoberta

    destas utilidades o objetivo de muitos estudos cientcos.

    A proteo do solo contra a eroso um dos aspectos mais signica-

    tivos das plantas daninhas. Tambm, a cobertura do solo importante

    no sistema de semeadura direta, utilizando-se, neste caso, plantas como o

    milheto (Pennisetum americanum) (Ruedell, 1995). Outro ponto favor-

    vel a ser considerado que quando se controlam as plantas daninhas por

    mtodos manuais, mecnicos ou qumicos, a cobertura morta sobre o solo

    reduz o aquecimento da superfcie pela radiao solar e auxilia a reteno

    de umidade. Essa cobertura morta, quando em decomposio, incrementa

    os teores de matria orgnica e nutrientes do solo. Pode, ainda, reduzir a

    geminao de novas plantas daninhas, tanto pelo efeito fsico de sombre-

    amento do solo quanto pela liberao de substncias qumicas com efeito

    aleloptico.

    Espcies de leguminosas como Desmodium spp., Crotalaria spp. e Sty-

    losanthes spp. xam nitrognio atravs de bactrias em simbiose, elevando

    os teores disponveis deste nutriente para as plantas. Alm disto, espcies

    como o feijo-de-porco (Canavalia ensiformis) e a crotalria podem ser

    utilizadas como adubao verde.

    As algas, por exemplo, so organismos aquticos que surgiram muito

    antes das plantas terrestres. No Brasil, podem ser encontradas algas dos

    gneros Chlorella e Pithophora em diversos ambientes aquticos. Servem

    de alimento a vrios organismos pois fazem parte do plncton vegetal.

    So ricas em vitaminas e sais minerais, tendo cerca de 65% de protenas,

    com praticamente todos os aminocidos. Preparados desidratados de algas

    podem ser acrescidos s farinhas e alimentos. Tambm a azola apresenta

    aspectos positivos. Esta vive em simbiose com a bactria Anabaena azolla,

  • 4 Brighenti & Oliveira

    que xa N2 da atmosfera, sendo utilizada na alimentao de animais e

    enriquecimento do solo.

    Muitas plantas so apreciadas na ornamentao de aqurios e lagos.

    Em colees de gua, espcies como o pinheirinho d'gua (Myriophyllum

    aquaticum) e a alface d'gua (Pistia stratiotes) oferecem proteo para

    os peixes, alm de servirem de alimento para animais aquticos. Essa

    espcie tem sido utilizada como alimento no connamento do peixe-boi da

    Amaznia (Kissmann, 1997).

    Outras espcies de plantas fornecem leos essenciais utilizados em per-

    fumaria como o patchouli (Pogostemon patchouli) e a lavanda (Lavandula

    spp). Tambm, certos medicamentos so produzidos a partir de espcies

    vegetais. Xaropes contra ataques de asma so processados a partir do ru-

    bim (Leonurus sibiricus). Maceraes e infuses feitas a partir do cordo-

    de-frade (Leonotis nepetaefolia) tm sido usadas em banhos para cura de

    doenas. Extratos e chs de certas espcies relaxam a musculatura. A

    malva (Malva parviora) muito utilizada na farmacopia popular devido

    a sua propriedade antiinamatria. Extratos de razes de lngua-de-vaca

    (Rumex obtusifolia) so utilizados como laxativos. Chs de carqueja (Bac-

    charis trimera) estimulam o aparelho digestivo. Alm disto, esta espcie

    possui uma substncia denominada lactona que tem ao contra cerc-

    rias de Schistosoma mansoni. As lactonas tambm tm ao letal sobre

    Biomphalaria glabrata, hospedeiro do S. mansoni. Tambm inibem o cres-

    cimento do Tripanosoma cruzi, protozorio causador da Doena de Chagas.

    As plantas daninhas so fontes opcionais de vitaminas, sais minerais

    e amido. Muitas delas podem ser includas em nossa mesa e so apreci-

    adas desde longa data como a beldroega (Portulaca oleracea), a serralha

    (Sonchus oleraceus) e o caruru (Amaranthus retroexus). Doces, gelias

    e tortas podem ser feitos por meio dos frutos da amora-brava e jo-de-

    capote, plantas daninhas tpicas de pastagens. Dos rizomas da taboa so

    feitas farinhas utilizadas como alimento humano em pocas de escassez de

    alimentos. Sementes do fedegoso so utilizadas na produo de uma bebida

    que pode substituir o caf em algumas regies do Brasil (Brando et al.,

    1985a). A tiririca (Cyperus esculentus), considerada uma das plantas da-

    ninhas mais indesejveis, apresenta algumas utilidades. Seus tubrculos

    so comestveis e deles so produzidos refrescos em pases como a Espa-

    nha. Diversas espcies de cactos so aproveitadas para produo de frutos,

    os chamados gos da ndia. E em regies secas do nordeste brasileiro,

    as palmas-forrageiras so bastante utilizadas na alimentao animal e, at

    mesmo, humana, durante a escassez de chuvas e falta de alimentos. Outras

    fornecem temperos para alimentao humana como a menta (Mentha spp.)

    e a slvia (Salvia ocinalis).

    Vrias espcies possuem caractersticas apcolas, podendo fornecer nc-

    tar (plantas nectarferas) e plen (plantas polinferas) (Brando et al.,

  • Biologia de Plantas Daninhas 5

    1985a). Algumas acumulam as duas funes sendo nctar-polinferas. De-

    vido a grande adaptabilidade das plantas daninhas s condies edafocli-

    mticas, podem ser cultivadas em diversas regies objetivando a produo

    de nctar e plen em perodos de escassez daquelas plantas tradicional-

    mente consideradas apcolas. Espcies, como a orelha-de-urso (Stachys

    arvensis), a trapoeraba (Commelina benghalensis), o assa-peixe (Vernonia

    polyanthes), a guanxuma (Sida rhombifolia), a poaia-branca (Richardia

    brasiliensis) e a nabia (Raphanus raphanistrum) apresentam potencial

    melfero.

    Algumas espcies so cultivadas por curiosidade e tambm por mo-

    tivo de estudos cientcos em funo da capacidade de aprisionar e digerir

    pequenas formas de vida animal, como o murur (Utricularia reniformis)

    (Kissmann, 1995).

    A guanxuma (Sida rhombifolia), a malvinha (Sida acuata) e o

    carrapicho-da-calada (Triumfetta semitriloba) apresentam aspectos positi-

    vos, devido existncia de bras resistentes, semelhantes juta, utilizadas

    para cordoaria.

    As cordas-de-viola (Ipomoea spp.), o balozinho (Cardiospermum ha-

    licacabum) e a maria-gorda (Talinum paniculatum) so utilizadas como

    espcies ornamentais. Tambm os cactos so plantas de belo aspecto, pos-

    suindo valor ornamental.

    Folhas secas e modas de chumbinho (Lantana camara), distribudas

    sobre batata armazenada, so utilizadas no controle de traas.

    O sap (Imperata brasiliensis) serve como cobertura de casas e abrigos

    rsticos devido decomposio lenta e o formato regular de suas folhas.

    Plantas de capim-rabo-de-burro (Andropogon bicornis) so muito usadas

    em coberturas de construes rurais e enchimento de cangalhas e camas de

    animais (Kissmann, 1991). Painas com bras sedosas de frutos do ocial-

    de-sala (Asclepias curassavica) so, tambm, muito utilizadas para enchi-

    mento de almofadas.

    Algumas espcies de gramneas so tidas como excelentes forrageiras.

    O capim-braquiria (Brachiaria decumbens e B. brizantha) e o capim-

    colonio (Panicum maximum) possuem alto valor nutricional quando uti-

    lizados como alimento para o gado, alm de suportar o pisoteio dos ani-

    mais. Na Amaznia, esta forrageira utilizada na alimentao do peixe-

    boi, quando em cativeiro. O mentrasto (Ageratum conyzoides) abriga uma

    espcie de caro (Amblyseius newsami) predadora do caro vermelho dos

    citros (Panonychus citri), ocorrendo menor incidncia destes insetos nos

    pomares ctricos, quando na presena desta espcie vegetal, podendo ser

    utilizado em programas de manejo integrado de pragas.

    As plantas daninhas representam, tambm, um imenso banco de ger-

    moplasma que pode ser explorado para ns de melhoramento gentico.

  • 6 Brighenti & Oliveira

    3.2 Aspectos negativosApesar de se constatar inmeras utilidades em algumas espcies daninhas,

    outras interferem na sade do homem e nas suas atividades, causando s-

    rios prejuzos. Diretamente, elas podem afetar a sade humana por causa-

    rem intoxicaes alimentares como a or-das-almas (Senecio brasiliensis)

    e comigo-ningum-pode (Dieenbachia maculata). A mamona (Ricinus

    communis) apresenta nas suas sementes uma substncia chamada ricina

    que, quando ingerida por crianas e adultos em quantidades elevadas, pode

    levar morte. A ocorrncia de alergias comum na presena de plen da

    grama-seda (Cynodon dactylon), capim-massambar (Sorghum halepense),

    losna-branca (Parthenium hysterophorus) e capim-gordura (Melinis minu-

    tiora). So tambm frequentes as dermatites e irritaes da pele causadas

    por urtiga (Jatropha urens).

    As espcies infestantes causam problemas em rodovias e ferrovias, re-

    duzindo a visibilidade. Pessoas inescrupulosas podem atear fogo s plantas

    secas que margeiam as estradas, principalmente durante a poca mais seca

    do ano, no raro provocando srios acidentes. Em logradouros pblicos,

    impedem a recreao infantil, alm de servir como habitat para animais

    peonhentos. Tiram a beleza de parques e jardins e podem reduzir o valor

    da terra em funo da presena de espcies de difcil controle. O carrapi-

    cho beio-de-boi ou pega-pega (Desmodium spp.) comum em gramados,

    prejudicando sua esttica e nalidade.

    Terras infestadas com plantas daninhas de difcil controle, principal-

    mente espcies perenes como a grama-seda (Cynodon dactylon), tem seu

    valor reduzido. Outras espcies perenes podem inviabilizar a explorao

    agrcola ou obrigar o agricultor a mudar de rea, como no caso da tiririca

    (Cyperus rotundus) interferindo em reas destinadas ao cultivo de olerco-

    las.

    Espcies como o aguap (Eichhornia crassipes) e a alface d'gua (Pistia

    stratiotes) impedem a navegao e a recreao em mananciais aquticos.

    Essas duas espcies so utuantes livres, comuns em ambientes aquti-

    cos. Devido a grande capacidade reprodutiva, podem causar efeitos in-

    desejveis caso no sejam manejadas adequadamente (Gelmini, 1996). A

    presena da taboa (Typha angustifolia) indesejvel em represas e lagos

    pois esta espcie invade toda a rea, reduzindo as dimenses do espelho

    d'gua, impossibilitando o seu uso para lazer e pescaria. H casos em

    que a presena de algas, em grande nmero, causa problemas na utilizao

    da gua, conferindo-lhe sabor desagradvel e tornando-a imprpria para o

    consumo humano e animal. As plantas aquticas tambm so responsveis

    pela proliferao do hospedeiro do agente causal da esquistossomose. Algu-

    mas plantas que acumulam gua na sua base, como as espcies da famlia

    Bromeliaceae, podem hospedar insetos que transmitem doenas.

    Em pastagens, as plantas daninhas interferem com as plantas forra-

    geiras reduzindo a capacidade de lotao dos pastos. Espcies espinhosas

  • Biologia de Plantas Daninhas 7

    como o jo (Solanum aculeatissimum) e o arranha-gato (Acacia plumosa)

    podem ferir os animais; outras podem conferir sabor desagradvel ao leite

    se ingeridas por animais em lactao. Plantas como o mio-mio (Baccharis

    coridifolia), a erva-de-rato (Palicourea marcgravii), o ocial-de-sala (As-

    clepias curassavica) e a samambaia (Pteridium aquilinum) podem causar

    morte de bovinos quando pastejadas por animais recm chegados de reas

    isentas destas plantas ou mesmo em pocas de escassez de alimentos.

    Contudo, mesmo na agricultura que as plantas daninhas causam os

    maiores danos econmicos. Em termos mdios, 30% a 40% de reduo da

    produo agrcola mundial atribuda interferncia das plantas daninhas

    (Lorenzi, 1991). Alm destes prejuzos diretos, a presena das plantas

    daninhas reduz a ecincia agrcola, aumentando os custos de produo.

    Causam danos s plantas cultivadas muito maiores que pragas e doenas

    e constituem-se na maior barreira produo de alimentos, em muitas

    regies do mundo (Muzik, 1970).

    Infestaes severas de corda-de-viola (Ipomoea spp.) e balozinho (Car-

    diospermum halicacabum) dicultam ou, at mesmo, impedem a operao

    de colheita. Os efeitos sobre a qualidade do produto obtido tambm so

    bastante importantes. A qualidade dos gros diminui quando se colhe o

    produto juntamente com as plantas daninhas, pois ocorre elevao da umi-

    dade e reduo da qualidade e da capacidade de armazenamento. Em

    estudos realizados por Campo et al. (1983), vericam-se os efeitos prejudi-

    ciais da infestao de amendoim-bravo em relao ao aumento da umidade

    de gros de soja. A umidade dos gros aumentou de 9,62% para 21,10%,

    quando o nvel de infestao de amendoim-bravo passou de zero para 48

    plantas m

    2, respectivamente (Tabela 1).

    Tabela 1. Teor de umidade e rendimento da soja em funo da densidade

    de infestao de plantas de amendoim-bravo (E. heterophylla) (plantas

    m

    2). Fonte: Campo et al. (1983).

    Nveis de

    Infestao

    Nmero de

    plantas de

    amendoim-

    bravo

    Umidade

    dos gros de

    soja (%)

    Rendimento

    da cultura

    (kg ha

    1)

    0 0 9,62 2555

    I 6 15,87 2390

    II 17 16,10 2447

    III 48 21,10 1678

    Alm disto, as sementes de plantas daninhas constituem-se em impu-

    rezas, devido s misturas mecnicas, reduzindo o valor cultural.

    As plantas daninhas so demasiadamente agressivas e vrias so as

    caractersticas que expressam essa agressividade. Possuem elevada ca-

  • 8 Brighenti & Oliveira

    pacidade de produo de sementes viveis e adaptaes especiais para

    dissemin-las, facilitando a disperso. So plantas que possuem elevada

    capacidade de competio e atributos especcos que asseguram a perpe-

    tuao, tais como dormncia e germinao desuniforme. Algumas espcies

    perenes multiplicam-se, ainda, por diversas maneiras, como no caso da

    tiririca (Cyperus rotundus).

    A competio a forma mais conhecida de interferncia das plantas

    daninhas sobre as culturas. Os recursos que mais frequentemente esto

    sujeitos competio so nutrientes minerais essenciais, gua, luz e espao.

    Certas espcies interferem alelopaticamente sobre as plantas cultivadas,

    causando srios prejuzos ao seu crescimento, seu desenvolvimento e sua

    produtividade.

    Em soja, algumas espcies se destacam pelo dano que causam cultura.

    Uma delas o amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla). Essa planta da-

    ninha uma das mais temidas pelos produtores de soja devido diculdade

    de controle. bastante frequente em todo o Brasil e sua semente germina

    durante quase todo ano, havendo perodos de maior intensidade em pocas

    quentes. Emergem a profundidades de at 12 cm, possuindo extraordinria

    capacidade de multiplicao. Crescem com rapidez, sombreando culturas

    anuais de crescimento mais lento. Competem intensivamente na absor-

    o de nutrientes e, sendo rica em ltex, na colheita de culturas infestadas,

    ocorre contaminao que permite a xao de impurezas. A presena desta

    espcie na cultura da soja causou decrscimo na produtividade da cultura

    que variou de 2310 a 1376 kg ha

    1para as densidades de 0-10 e 61-70

    plantas de amendoim-bravo m

    2, respectivamente (Gazziero et al., 1998).

    Outra espcie que recentemente vem se espalhando em diversas regies

    produtoras de soja o balozinho (Cardiospermum halicacabum). Assume

    grande importncia econmica nas lavouras de soja do Sul do Brasil (Voll

    et al., 1998a). uma espcie que se instala, preferencialmente, em locais

    menos perturbados pela ao do homem como linhas de cerca, pomares,

    terrenos baldios e lavouras perenes. Entretanto, com a expanso da semea-

    dura direta, esta espcie vem preocupando os agricultores pela diculdade

    de controle. Alm disto, so plantas trepadeiras, possuindo estruturas

    denominadas gavinhas, que se xam s plantas de soja, dicultando o pro-

    cesso de colheita.

    Tambm o carrapicho beio-de-boi ou desmdio (Desmodium tortuo-

    sum) uma espcie de introduo recente nas diversas regies produtoras

    de soja do Paran e assume importncia econmica quando se observa a

    cultura instalada no centro-oeste do Brasil (Voll et al., 1998b). Devido

    existncia de poucos herbicidas, registrados para a cultura da soja, que

    apresentam controle satisfatrio do desmdio, a sua infestao vem au-

    mentando consideravelmente nos ltimos anos com sria ameaa a esta

    cultura.

  • Biologia de Plantas Daninhas 9

    O capim-marmelada (Brachiaria plantaginea) e o capim-carrapicho

    (Cenchrus echinatus) so espcies daninhas gramneas muito frequentes

    em culturas anuais e perenes no Brasil. So muito competitivas quando

    presentes em culturas anuais. Na cultura do algodo, as fruticaes do

    capim-carrapicho se prendem s bras, nos capulhos, havendo desvalori-

    zao do produto. Tambm podem provocar ferimentos em trabalhadores

    que colhem lavouras infestadas por esta espcie. O capim-amargoso (Digi-

    taria insularis), quando desenvolvido, evitado pelo gado por apresentar

    substncias amargas, diminuindo o valor das pastagens. O capim-arroz

    (Echinochloa crusgalli) uma espcie muito disseminada na cultura do ar-

    roz inundado e de vrzea. , tambm, hospedeira alternativa de Piricularia

    oryzeae, agente causal da brusone do arroz, e hospedeira para diversas es-

    pcies de vrus causadores de doenas desta cultura, como o mosaico. Suas

    sementes so tidas como nocivas toleradas pela legislao brasileira e sua

    presena em lotes de sementes, acima de um determinado limite, impede

    a comercializao (Kissmann, 1991). O azevm (Lolium multiorum)

    muito competitivo quando infestante de lavouras de trigo. A trapoeraba

    (Commelina benghalensis) hospedeira de nematides como Meloydogyne

    incognita, Pratylenchus pratensis e do fungo Piricularia grisea, bem como

    hospedeira do vrus da roseta do amendoim e do mosaico do pepino (Bran-

    do et al., 1985b).

    4. Caractersticas das Plantas Daninhas

    Em comunidades estabelecidas, as plantas daninhas possuem baixa capa-

    cidade em competir por recursos (nutrientes, gua, luz e espao), sendo

    encontradas, principalmente, em reas onde a vegetao natural foi reti-

    rada. Essas espcies desenvolveram, ao longo do tempo, caractersticas

    que proporcionam a sobrevivncia em ambientes sujeitos aos mais variados

    tipos e intensidades de limitaes ao crescimento e ao desenvolvimento das

    plantas. Essas caractersticas tornam-se um impedimento obteno de

    um controle eciente de plantas daninhas, sendo chamadas de caracters-

    ticas de agressividade. As mais relevantes so as seguintes:

    4.1 Habilidade competitivaAs plantas daninhas possuem maior habilidade que as plantas cultivadas

    no recrutamento de recursos do ambiente como nutrientes, luz, gua e CO2.

    Os teores de nitrognio e potssio encontrados em amendoim-bravo e em

    beldroega, respectivamente, so superiores aos encontrados em plantas cul-

    tivadas. Desta maneira, vale ressaltar a prtica de distribuio dos fertili-

    zantes prximos ao sulco de semeadura, facilitando o acesso e a utilizao

    dos nutrientes por parte da cultura. Na competio pela luz, as plantas

    daninhas apresentam desvantagem inicial, pois apresentam sementes pe-

    quenas e plntulas de porte baixo. Neste perodo, as plantas cultivadas

  • 10 Brighenti & Oliveira

    so mais altas e interceptam a luz com maior facilidade. Entretanto, as

    espcies daninhas apresentam grande capacidade de estiolamento quando

    sombreadas, fazendo com que rapidamente passem de uma situao de

    desvantagem para uma nova situao em que posicionam as suas folhas

    no mesmo nvel ou acima das folhas da cultura, interceptando a radia-

    o solar. A competio pela gua importante em situaes em que a

    disponibilidade hdrica limitada.

    4.2 Capacidade de produo de propgulosVrios so os propgulos pelos quais as plantas podem perpetuar-se, tanto

    por via seminfera (sementes), quanto por via vegetativa (bulbos, estoles,

    rizomas). As espcies daninhas produzem, de modo geral, grande quanti-

    dade de dissemnulos, porm a produo pode variar amplamente entre as

    espcies.

    O sucesso destas espcies depende principalmente do nmero e da via-

    bilidade dos propgulos produzidos pelo indivduo. Uma planta de capim-

    massambar ou sorgo-de-alepo (Sorghum halepense) pode produzir de 3 a

    80 mil sementes, dependendo da considerao de uma planta como sendo

    um colmo ou todos os colmos emergidos a partir de um sistema de rizo-

    mas interligados. Num hectare totalmente infestado podem ser produzidos

    220 kg de sementes de sorgo-de-alepo, ou seja, 55 milhes de sementes,

    numa temporada (Kissmann, 1997). Plantas de capim-barbicha-de-alemo

    (Chloris polydactyla), crescendo isoladamente, podem produzir cerca de 95

    mil sementes por planta (Brighenti et al., 2007). Espcies como o caruru

    (Amaranthus retroexus) podem chegar a produzir at 117 mil sementes

    por planta, enquanto Artemisia biennis pode produzir mais de 1 milho

    de sementes por planta.

    Com relao tiririca, em um hectare altamente infestado, podem

    ser retiradas quatro toneladas de rizomas e tubrculos numa profundidade

    de 15-20 cm do solo (Brando et al., 1985b). A Tabela 2 apresenta a

    quantidade de sementes produzidas por algumas espcies, crescendo isola-

    damente, e o nmero de sementes por quilograma. Pode-se observar que

    espcies que possuem sementes muito midas como o caruru, o quenopdio

    e a beldroega so, geralmente, mais prolcas.

    4.3 Desuniformidade do processo germinativoSe a germinao das plantas daninhas fosse concentrada em um mesmo

    perodo, o controle seria facilitado. Porm, isto geralmente no acontece,

    pois estas espcies se valem de artifcios que lhes conferem desuniformidade

    no processo germinativo capaz de garantir a perpetuao. Dois aspectos

    podem ser salientados. O primeiro est relacionado aos mecanismos de

    dormncia dos propgulos e o outro quele relativo distribuio deles

    no perl do solo. Em funo desta distribuio, cam sujeitos a diferentes

  • Biologia de Plantas Daninhas 11

    Tabela 2. Nmero de sementes produzidas por planta e nmero de

    sementes por quilograma de algumas espcies de plantas daninhas. Fonte:

    Adaptado de Zimdahl (1999).

    Nome Comum Nome Cientco

    n

    o

    sementes

    planta

    1

    n

    o

    sementes

    kg

    1Capim-arroz Echnochloa crusgalli 7.160 1.070.143

    Maria-pretinha Solanum americanum 8.460 592.173

    Quenopdio Chenopodium album 72.450 1.945.710

    Caruru Amaranthus retroexus 117.400 3.584.211

    Beldroega Portulaca oleracea 53.300 10.476.924

    Aveia-brava Avena sterilis 250 77.739

    Capim-carrapicho Cenchrus echinatus 1.100 201.777

    Guanxuma Sida spp. 510 426.900

    intensidades de estmulos necessrios quebra dos mecanismos de dormn-

    cia.

    O tempo pelo qual os propgulos das plantas daninhas mantm sua

    viabilidade no solo fruto da coexistncia de inmeros mecanismos de

    dormncia. Se estas sementes no possussem grande longevidade, as me-

    didas de controle representariam grande impacto sobre suas densidades

    populacionais e a erradicao das plantas seria relativamente fcil. Assim,

    a dormncia evoluiu como um mecanismo de sobrevivncia das espcies

    para determinadas condies climticas. Em regies de clima temperado,

    a maior ameaa sobrevivncia o inverno. As sementes amadurecem

    na primavera, vero e outono. E se elas germinassem imediatamente, o

    inverno as surpreenderia em um estdio vulnervel de plntula e a espcie

    seria extinta.

    A dormncia pode ser denida como um processo pelo qual as sementes

    de determinadas espcies, mesmo sendo viveis e tendo todas as condies

    ambientais para germinar, deixam de faz-lo. Este estado de dormncia

    no pode ser confundido com quiescncia, que um estado de repouso

    em que, estando vivel a semente, ele supervel com o fornecimento das

    condies ambientais necessrias (Carvalho & Nakagawa, 1988).

    Vrias so as categorias em que se enquadram as sementes em fun-

    o de sua incapacidade germinativa. Uma delas o caso da ocorrncia

    de embries imaturos ou rudimentares, onde a semente j se desprendeu

    da planta me e o embrio no se encontra completamente desenvolvido.

    Este tipo de dormncia observado em carrapicho-de-carneiro (Acanthos-

    permum hispidum). O embrio tambm pode estar dormente. As sementes

    enquadradas neste tipo so as que apresentam exigncias especiais quanto

    luz e ao resfriamento para superar a dormncia. As sementes cuja germi-

    nao afetada pela luz podem ter sua germinao promovida ou inibida

  • 12 Brighenti & Oliveira

    pela mesma. No primeiro caso, so chamadas fotoblsticas positivas e, no

    segundo, fotoblsticas negativas. Como exemplo de fotoblsticas negativas

    h o caruru (Amaranthus caudatus), cujas sementes submetidas a pequenas

    quantidades de radiao tem a germinao inibida em at 30% (Gutternan

    et al., 1992).

    Tambm pode ocorrer impermeabilidade gua. Neste processo, o te-

    gumento impede a absoro de gua. Um exemplo tpico deste fenmeno

    foi observado em fedegoso (Pitelli, 1988) e em algumas espcies das fam-

    lias Malvaceae, Chenopodiaceae, Convolvulaceae, Liliaceae e Solanaceae

    (Rolston, 1978).

    Outro tipo de dormncia aquela onde estruturas como o pericarpo, o

    tegumento e as paredes celulares restringem as trocas gasosas. Essa causa

    de dormncia muito encontrada em espcies da famlia Poaceae. Este

    tipo de dormncia tambm ocorre em espcies de Xanthium spp., onde o

    tegumento seminal no permite a passagem do oxignio, podendo levar um

    longo perodo de tempo at que o tegumento seja afetado.

    Podem ocorrer, ainda, restries mecnicas oferecidas pelo tegumento

    das sementes, impedindo o crescimento do embrio. Este tipo de dormncia

    comum em espcies daninhas do gnero Amaranthus (caruru), Lepidium

    (mentruz) e Brassica (mostarda).

    Devido a estes mecanismos, as sementes de plantas daninhas conseguem

    manter a capacidade de germinao mesmo quando enterradas durante

    vrios anos no solo (Tabela 3). As sementes de gueira-do-inferno (Datura

    stramonium) apresentaram 90% de germinao aps 17 anos de enterradas

    (Burnside et al., 1996).

    Tabela 3. Porcentagem de germinao de sementes de algumas espcies de

    plantas daninhas enterradas a 20 cm de profundidade, durante 17 anos.

    Fonte: Adaptado de Burnside et al. (1996).

    Anos aps serem enterradas

    Espcies 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 12 17

    % de germinao

    Echinocloa crusgalli 17 3 58 39 42 31 9 14 4 4 2 0

    Setaria verticillata 74 73 33 34 38 22 22 26 33 6 10 0

    Digitaria sanguinalis 12 79 45 42 43 12 1 12 2 0 0 0

    Xanthium strumarium 10 60 59 51 65 33 37 41 15 21 0 0

    Datura stramonium 93 93 93 94 96 89 88 82 92 78 95 90

    Amaranthus retroexus 66 69 38 40 40 37 9 2 6 5 7 1

    Rumex crispus 76 92 93 85 70 74 94 84 91 22 73 61

    Taraxacum ocinale 2 12 5 10 1 1 2 4 0 0 0 0

  • Biologia de Plantas Daninhas 13

    4.4 Capacidade de germinar e emergir a grandes profundidadesAlgumas espcies desenvolveram a capacidade de germinar e emergir a

    partir de grandes profundidades no perl do solo. Tubrculos de tiririca

    (Cyperus rotundus), plantados em tubos de PVC a diferentes profundi-

    dades, emergiram, at mesmo quando colocados a um metro abaixo da

    superfcie (Brighenti et al., 1997).

    Sementes de aveia silvestre (Avena fatua) conseguem germinar at 17,5

    cm de profundidade e amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla) emergem

    acima de 12 cm. As sementes de trapoeraba (Commelina benghalensis),

    formadas a partir dos rizomas, so capazes de germinar desde uma profun-

    didade de 12 cm, enquanto que sementes produzidas na parte area no

    germinam em profundidades maiores que 2 cm (Kissmann, 1997).

    4.5 Viabilidade dos propgulos em condies desfavorveisPara sobreviver, as plantas daninhas desenvolveram caractersticas que

    mantm suas estruturas de propagao vivas, mesmo em ambientes, ou

    pocas do ano, com determinadas limitaes de recursos como luz, gua,

    temperatura. Sementes de campainha (Convolvulus arvensis) conseguem

    manter-se vivas mesmo aps 54 meses de imerso em gua. Algumas se-

    mentes tambm conseguem manter-se viveis aps passar pelo trato intes-

    tinal de bovinos e de sunos, equinos e ovinos, mas perdem a viabilidade

    aps passar pelo trato intestinal de galinhas. Entretanto, sementes de Abu-

    tilon theophrasti conseguem manter alguma viabilidade aps passar pelo

    trato intestinal de galinhas.

    Sementes de Euphorbia esula passaram pelo trato digestivo de ovelhas

    e cabras. Foram recuperados 18% das sementes no material fecal, com

    ainda 2% de germinao nas que passaram pelo trato digestivo de ovelhas

    e 16% nas que passaram pelas cabras (Tabela 4).

    Tabela 4. Percentagem de germinao e viabilidade de sementes de

    Euphorbia esula aps passar pelo trato digestivo de ovelhas e cabras.

    Fonte: Lacey et al. (1992).

    Tratamentos Recuperao Germinao Viabilidade

    (%) (%) (%)

    Controle - 72 90

    Ovelhas 18 02 14

    Cabras 18 16 31

    4.6 Mecanismos alternativos de reproduoA capacidade reprodutiva das plantas daninhas uma de suas principais

    caractersticas de agressividade. As plantas daninhas perenes podem se

    reproduzir tanto por sementes quanto vegetativamente. Existem vrios

  • 14 Brighenti & Oliveira

    tipos de estruturas de propagao vegetativa nas plantas daninhas tais

    como:

    Estolo ou estolho: um caule que se desenvolve formando razes ad-ventcias e parte area na regio dos ns. Um exemplo caracterstico

    a grama-bermuda (Cynodon dactylon).

    Rizoma: um caule subterrneo que produz razes adventceas eparte area. Como exemplo pode-se mencionar o capim-massambar

    (Sorghum halepense), a samambaia (Pteridium aquilinum), a losna-

    brava (Artemisia verlotorum) e outras.

    Tubrculo: a poro terminal de um rizoma. Possui uma grandequantidade de reservas e gemas. A tiririca (Cyperus rotundus) uma

    espcie daninha que apresenta propagao por tubrculos.

    Bulbos: so gemas subterrneas modicadas, consistindo de caule efolhas. As reservas esto contidas nas folhas. Um exemplo de plantas

    daninhas que se multiplicam por meio de bulbos destaca-se o trevo

    (Oxalis latifolia) e o alho-bravo (Nothoscordum inodorum).

    Caules: algumas espcies daninhas possuem a capacidade de rebro-tar, a partir de caules. As guanxumas, quando cortadas, por exem-

    plo, com uso de roadeiras, podem rebrotar.

    Plantas como a tiririca (Cyperus rotundus), alm da reproduo semi-

    nfera (sementes), apresentam reproduo vegetativa por meio dos rizomas,

    tubrculos e bulbos basais (Figura 1).

    Figura 1. Estruturas de propagao da tiririca (Cyperus rotundus):

    seminfera (esquerda) e vegetativa (direita).

    A trapoeraba (Commelina benghalensis) apresenta uma caracterstica

    peculiar com reproduo por sementes subterrneas formadas nos rizomas.

  • Biologia de Plantas Daninhas 15

    Flores modicadas ocorrem em rizantgenos (rizomas subterrneos), for-

    mando frutos e sementes verdadeiras por partenocarpia, sendo estas maio-

    res que aquelas formadas a partir de ores na parte area da planta. Tam-

    bm pode ocorrer enraizamento a partir de ns dos ramos de trapoeraba em

    contato com o solo (Kissmann, 1989). A grama-seda (Cynodon dactylon)

    se reproduz por meio de estoles. O capim-mo-de-sapo (Dactyloctenium

    aegyptium) possui reproduo por sementes e estoles. Capim-capivara

    (Hymenachne amplexicaulis) se propaga tanto por sementes como por pe-

    daos de caules enraizados (Lorenzi, 1991). Tambm a losna (Artemisia

    verlotorum) uma espcie de difcil controle, pois alm das sementes, pos-

    sui caule subterrneo (rizoma) que garante a sua perpetuao. Aps o

    corte da parte area, ocorre uma rpida rebrota dos rizomas povoando a

    rea. Em regies onde se utiliza agricultura mecanizada ocorre dissemina-

    o destes rizomas movimentados pelos implementos agrcolas (Brighenti

    et al., 1993). As plantas de losna originadas de sementes so muito peque-

    nas e frgeis no incio de sua formao, entretanto, aquelas provenientes dos

    rizomas emergem com muito vigor e agressividade. Este aspecto diculta

    o controle, principalmente, no caso de se optar pelo controle qumico. Na

    Figura 2 observa-se rea altamente infestada com losna-brava (Artemisia

    verlotorum) e sua principal estrutura de propagao que so os rizomas.

    Figura 2. rea infestada (esquerda) e rizoma (direita) da losna-brava

    (Artemisia verlotorum).

    4.7 Facilidade de disseminao dos propgulosOs propgulos, uma vez produzidos, apresentam diferentes mtodos de

    disperso no espao. Caso os dissemnulos das plantas daninhas cassem

    prximos planta produtora, apenas pela ao da gravidade, e no se mo-

    vessem a grandes distncias, seria mais fcil o controle das espcies infes-

  • 16 Brighenti & Oliveira

    tantes. Porm, os propgulos, uma vez produzidos, apresentam diferentes

    mtodos de disperso no espao.

    As estruturas de propagao das plantas daninhas so, sem dvida,

    um dos mais importantes fatores de agressividade destas espcies, podendo

    ocorrer por meios prprios (autocoria) ou com auxlio de agentes externos

    (alocoria).

    No primeiro caso, os frutos caem no solo ou se abrem liberando suas

    sementes. o caso de espcies de gramneas com sementes grandes como o

    capim-arroz (Echinochloa spp.) e o arroz-vermelho (Oryza sativa). Outras

    espcies lanam suas sementes a distncias relativamente grandes como a

    mamona (Ricinus communis), o quebra-pedra (Phyllanthus tenellus) e o

    amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla). No caso desta ltima, as se-

    mentes podem ser lanadas a distncias que variam de dois a cinco metros.

    No segundo caso, a disperso auxiliada por meios externos, podendo

    ser classicada segundo o agente de disperso:

    Disseminao hidrcora: aquela que ocorre por meio da gua de chu-

    vas, crregos, rios, inundaes, abrangendo todos os casos de disseminaes

    pela gua. Wilson (1980) encontrou sementes de 77 espcies daninhas em

    um canal principal de irrigao, quando analisou duas sees do canal, co-

    letando um total de 30.346 sementes. Havia 26 vezes mais sementes no nal

    do canal de irrigao do que no incio. A maioria destas sementes utuava,

    sendo o caruru (Amaranthus retroexus) aquela de maior frequncia, re-

    presentando 40% do total de sementes. Este mesmo autor estimou que um

    milho e duzentas mil sementes por hectare eram introduzidas nas reas

    de irrigao a cada ano. Deste modo, a execuo correta de um manejo

    de plantas daninhas nos reservatrios de gua, bem como nos canais de

    irrigao, fator primordial para se evitar a introduo de sementes de

    espcies daninhas em reas irrigadas.

    Disseminao anemcora: aquela onde os propgulos so carreados

    pelo vento, podendo apresentar adaptaes como as da couvinha (Po-

    rophyllum ruderale) que possuem aqunios com papilhos pilosos, facilmente

    transportados pelo vento. Outras espcies que possuem sementes dissemi-

    nadas pelo vento so a erva-de-touro (Tridax procumbens) e o ocial-de-sala

    (Asclepias curassavica). Suas sementes apresentam tufos de pelos sedosos,

    que facilitam a disperso pelo vento (Kissmann, 1992). Sementes leves e

    pequenas como as do caruru (Amaranthus spp.) e da beldroega (Portu-

    laca oleracea) tm sua disseminao aumentada pela ao da fora elica,

    sendo distribudas a longas distncias. Em geral, espcies daninhas da

    famlia Asteraceae apresentam estruturas de adaptao das sementes que

    confere dispersibilidade pelo vento.

    Disseminao zocora: o transporte de propgulos pelos animais.

    Quando o propgulo transportado externamente ao corpo do animal

    chamada epizica, como a que ocorre comumente, por exemplo, com capim-

    carrapicho (Cenchrus echinatus), carrapicho-de-carneiro (Acanthospermum

  • Biologia de Plantas Daninhas 17

    hispidum), pico-preto (Bidens pilosa) e tambm o carrapicho (Xanthium

    strumarium). Zimdahl (1999) menciona que o velcro foi inventado por Ge-

    orge Mestral em 1941, a partir de uma observao feita em suas caadas

    nas montanhas suas. Vericou que os frutos do carrapicho cavam ade-

    ridos em suas roupas, bem como nos pelos do seu cachorro. A partir de

    uma minuciosa visualizao da morfologia dos espinhos contidos no fruto,

    desenvolveu o velcro.

    Quando o propgulo ingerido e transportado dentro do corpo do ani-

    mal, sendo expelido pelas fezes, a disseminao denominada endozica.

    Um exemplo ocorre com a grama-batatais (Paspalum notatum) quando

    suas sementes so ingeridas por bovinos. Tambm os pssaros ingerem

    sementes de plantas daninhas transportando-as a grandes distncias.

    Entretanto, o homem o principal disseminador de plantas daninhas

    entre diferentes regies e pases. Essa forma de disseminao denominada

    de antropcora. Muitas espcies foram introduzidas voluntariamente pelas

    pessoas com nalidades econmicas ou ornamentais. Temos como exem-

    plo o capim-braquiria (Brachiaria decumbens) trazido da frica para o

    Brasil para servir como forrageira. Tambm o capim-marmelada (Brachi-

    aria plantaginea) foi introduzido no Brasil trazido em navios negreiros.

    As folhas desta espcie serviam de camas para os escravos. Os navios ao

    chegarem ao Brasil, eram limpos e as sementes contidas no meio da pa-

    lha iniciaram a disseminao da espcie no territrio brasileiro (Kissmann,

    1997). O capim-arroz (Echinochloa spp.) um dos exemplos mais impor-

    tantes de disseminao ocorrida em funo de sua estrutura de propagao

    estar misturada s sementes do arroz cultivado.

    Apesar dos avanos na rea agrcola no que diz respeito s mquinas uti-

    lizadas em todo o processo, ainda hoje estes equipamentos so responsveis

    pela disperso de sementes de plantas daninhas. As colhedoras utilizadas

    em reas destinadas produo de sementes devem ser limpas com critrio

    para evitar a contaminao de novas reas de cultivo e tambm de lotes de

    sementes. Embora se recomende a utilizao de sementes certicadas, fato

    que garante um reduzido nmero de lotes de sementes cultivadas contami-

    nadas com sementes de espcies daninhas, este problema ainda persiste.

    importante lembrar que um programa adequado de manejo de espcies

    infestantes comea com a aquisio de sementes das culturas isentas das

    sementes de plantas daninhas.

    4.8 Crescimento e desenvolvimento inicialA ocupao rpida e efetiva do ecossistema agrcola outro atributo muito

    importante no ciclo de vida das plantas daninhas. Assim, aquela espcie

    que ocupar primeiro o espao, pode vencer no processo competitivo. Certas

    espcies que possuem o metabolismo fotossinttico C4tm maior habilidade

    em retirar do meio os fatores necessrios aos seus crescimento e desenvol-

    vimento quando comparadas a plantas de metabolismo C3. As espcies

  • 18 Brighenti & Oliveira

    que possuem metabolismo C4 so mais ecientes na utilizao do CO2 at-

    mosfrico, conferindo-lhes, por conseguinte, maior taxa de crescimento por

    unidade de tempo, maior ecincia em produzir biomassa seca com utiliza-

    o de menores quantidades de gua e melhor aproveitamento da energia

    luminosa. Como exemplo de plantas daninhas com metabolismo fotossin-

    ttico C4, h a tiririca, o amendoim-bravo, o caruru, o capim-amargoso, o

    capim-mo-de-sapo, o capim-marmelada e a grama-seda.

    5. Classificaes das Plantas Daninhas

    A sistemtica ou taxonomia a parte da cincia que trata da classicao

    dos seres vivos. No caso das plantas daninhas, a classicao fundamental

    para a cincia e controle das mesmas. Utilizam-se chaves classicatrias

    que levam em considerao caractersticas da planta adulta e, principal-

    mente, detalhes orais. No que se refere cincia das plantas daninhas,

    torna-se importante o conhecimento das espcies, na fase inicial de cresci-

    mento, para que haja xito no controle. Assim, fundamental o reconheci-

    mento de espcies daninhas no estdio de plntulas, quando estas emitem

    as primeiras folhas. Vrios livros apresentam as espcies, fotografadas em

    diversas fases do seu crescimento e seu desenvolvimento, com o intuito de

    auxiliar na identicao. Algumas plantas daninhas pertencem s mesmas

    classes, ordens, famlias, gneros e, em certos casos, at a mesma espcie

    que algumas plantas cultivadas (exemplo: arroz vermelho e arroz cultivado,

    ambos Oryza sativa).

    O sistema de classicao adotado pelo botnico Cronquist apresenta

    diferenas em relao aos sistemas utilizados tradicionalmente (Deuber,

    1992). Alguns nomes importantes, com relao famlia das plantas, foram

    modicados e as trs sub-famlias da famlia Leguminosae passaram a se

    constituir famlias como mostrado na Tabela 5:

    Tabela 5. Classicao das famlias segundo os sistemas Engler-Wettstein

    e Cronquist.

    Sistema Engler-Wettstein Sistema Cronquist

    Famlia Compositae Famlia Asteraceae

    Famlia Cruciferae Famlia Brassicaceae

    Famlia Gramineae Famlia Poaceae

    Famlia Leguminosae

    Sub-famlia Caesalpinoideae Famlia Caesalpinaceae

    Sub-famlia Mimosoideae Famlia Mimosaceae

    Sub-famlia Papilionoideae Famlia Papilionaceae

    A nomenclatura das plantas assunto bastante controvertido. Deste

    modo, o mais importante na cincia das plantas daninhas saber reconhe-

  • Biologia de Plantas Daninhas 19

    cer os gneros e as espcies para decidir sobre o melhor mtodo de controle

    a ser adotado.

    Outra classicao das plantas daninhas surgiu com o aparecimento dos

    primeiros herbicidas orgnicos, derivados dos cidos alifticos e fenoxiac-

    ticos, separando-as em dois grandes grupos, as plantas daninhas de folhas

    largas e as de folhas estreitas, devido ao fato destes produtos possurem

    ao eciente sobre gramneas e dicotiledneas, respectivamente (Schultz,

    1968). As folhas largas so tidas como plantas de limbo foliar largo, ner-

    vao dos tipos palminrvia, peltinrvia e peninrvia; o segundo grupo, as

    plantas daninhas de folhas estreitas, inclui aquelas de nervao dos tipos

    uninrvia e paralelinrvia e, raramente, curvinrvia. Neste agrupamento,

    esto, especialmente, gramneas e ciperceas. Entretanto, este conceito

    no muito adequado, pois poucos herbicidas podem ser considerados es-

    peccos ou seletivos dentro de distintos nveis classicatrios do ponto de

    vista botnico.

    Outro critrio de classicao das plantas daninhas consiste em separ-

    las em terrestres e aquticas. As plantas daninhas terrestres so classica-

    das, principalmente, de acordo com o local de ocorrncia, de acordo com o

    ciclo de desenvolvimento e hbito vegetativo.

    Quanto ao local de ocorrncia podem ser classicadas como arvenses,

    ruderais e virias. As arvenses so plantas que infestam culturas agrcolas

    e pastagens. As ruderais ocupam locais de atividade humana, porm reas

    no agrcolas, tais como terrenos baldios, reas industriais e linhas de rede

    eltrica. As virias so aquelas que ocorrem ao longo dos caminhos.

    Quanto ao ciclo de desenvolvimento, as plantas daninhas podem ser

    classicadas em plantas monocrpicas ou policrpicas. As monocrpicas

    orescem e fruticam encerrando seu ciclo de vida e permanecendo no solo

    na forma de propgulos. Dividem-se em anuais e bianuais. As anuais o-

    rescem e fruticam em perodos inferiores a um ano. Constituem a grande

    maioria e as mais importantes das espcies daninhas do Brasil e tm ciclo

    de vida que varia de 40 a 160 dias. Podem ser divididas ainda em anuais

    de vero e anuais de inverno. As anuais de vero germinam normalmente

    na primavera e vegetam durante todo o vero, produzindo suas sementes

    durante o outono e terminando seu ciclo de vida antes da entrada do in-

    verno. Com exemplo, pode-se destacar o caruru (Amaranthus retroexus),

    o capim-marmelada (Brachiaria plantaginea) e o capim-colcho (Digitaria

    horizontalis). evidente que a infestao destas espcies no ca restrita

    poca caracterizada pelas anuais de vero, podendo encontr-las em outras

    pocas do ano, porm em baixas intensidades de infestao. As anuais de

    inverno, geralmente germinam durante o outono/inverno, desenvolvem-se

    durante a primavera e produzem sementes durante o vero. Temos como

    exemplo a nabia (Raphanus raphanistrum) e o mentruz (Lepidium virgi-

    nicum).

  • 20 Brighenti & Oliveira

    As bianuais completam seu ciclo de vida em um perodo superior a um

    ano e inferior a dois anos. Geralmente, desenvolvem-se vegetativamente

    no primeiro ano, orescendo e fruticando no segundo ano. Normalmente,

    germinam durante a primavera/vero e desenvolvem vegetativamente du-

    rante todo o outono/inverno, orescendo apenas aps a primavera/vero

    do ano seguinte. So poucas as espcies bianuais existentes no Brasil, sendo

    mais comuns em pases de clima temperado. Podem ser, ainda, bianuais

    ou anuais (Leonurus sibiricus) e bianuais ou perenes (Boerhavia diusa),

    dependendo das condies climticas e poca de germinao.

    As plantas policrpicas vivem durante vrios anos, produzindo prop-

    gulos em vrias estaes (plantas perenes). Podem ser divididas em plantas

    perenes simples e complexas. As perenes simples propagam-se exclusiva-

    mente por meio de sementes e as complexas por meio de sementes e rgos

    de propagao vegetativa.

    Quanto ao habitat as plantas daninhas podem ser classicadas como

    terrestres, parasistas e aquticas. As terrestres podem ser subdivididas em

    plantas daninhas de reas agrcolas, reas de pastagens e orestas e ainda

    classicadas como herbceas, sub-arbustivas, arbustivas, arbreas, trepa-

    deiras, eptas e hemieptas. As herbceas so plantas de porte pequeno,

    com altura ou dimetro de copa inferior a 1,0 m, para plantas eretas ou

    prostradas, respectivamente. So plantas, em geral, com caules no ligni-

    cados. Mentrasto (Ageratum conyzoides) e esprgula (Spergula arvensis)

    so exemplos de espcies herbceas. As sub-arbustivas apresentam porte

    variando de 0,80 a 1,50 m de altura, possuindo caules lenhosos e hbito

    ereto. Exemplos de sub-arbustivas so cheirosa (Hyptis suaveolens) e fede-

    goso (Senna obtusifolia). As arbustivas apresentam caule de hbito ereto,

    so lenhosas e porte variando de 1,50 a 2,50 m como a fruta-de-lobo (So-

    lanum lycocarpum). As arbreas possuem as mesmas caractersticas, mas

    com porte acima de 2,5 m, como a embaba (Cecropia peltata). As espcies

    daninhas trepadeiras so plantas que utilizam outras como suporte e se di-

    videm em volveis e cirrferas. As volveis sobem por enrolamento como a

    corda-de-viola (Ipomoea hederifolia) e o cip-de-viado (Polygonum convol-

    vulus). As cirrferas prendem-se ao suporte por meio de gavinhas como o

    balozinho (Cardiospermum halicacabum) e o melo-de-so-caetano (Mo-

    mordica charantia). As plantas eptas so aquelas que vivem sobre ou-

    tras plantas, afastadas do solo, mas no so parasitas, como as bromlias,

    orqudeas e samambaias. Plantas hemieptas so aquelas que, no incio do

    crescimento, utilizam outras como suporte e, posteriormente, suas razes

    alcanam o solo como, por exemplo, o mata-pau (Caussopa schotii).

    Com relao s plantas parasitas, elas podem ser divididas em parasitas

    da parte area e parasitas do sistema radical.

    As parasitas da parte area podem ser classicadas como holoparasi-

    tas e hemiparasitas. As primeiras no contm clorola e dependem para

  • Biologia de Plantas Daninhas 21

    sobrevivncia de nutrientes obtidos por parasitismo, ou seja, vivem exclu-

    sivamente custa do hospedeiro, como, por exemplo, o cip-chumbo (Cus-

    cuta racemosa). No Brasil, esta espcie infesta, principalmente culturas

    de cebola e alfafa, alm de espcies ornamentais como a coroa-de-Cristo.

    As hemiparasitas so cloroladas e capazes de realizar fotossntese como

    a erva-de-passarinho (Struthanthus spp.), bastante prejudicial em cultivos

    de citros e rvores ornamentais. Suas sementes so disseminadas por meio

    de aves que apreciam seus frutos. Porm, as sementes no so digeridas

    pelas aves, sendo expelidas nas fezes, e germinam em outras plantas. Os

    frutos, por apresentarem certa viscosidade, aderem-se s penas das aves,

    facilitando a propagao para outras rvores.

    As parasitas do sistema radicular, at o momento, no foram registra-

    das no Brasil. Dentre elas, destaca-se as do gnero Striga (erva-de-bruxa)

    e o orobanque (Orobanche).

    No caso das plantas daninhas aquticas, estas podem ser divididas em

    trs grandes grupos (algas, submersas e macrtas).

    As algas podem ser unicelulares (microscpicas) ou pluricelulares (la-

    mentosas). Pequenas infestaes em corpos de gua podem ser bencas,

    servindo de alimento para peixes. No entanto, grandes infestaes, chama-

    das de gua podre, dicultam o uso da gua.

    As plantas aquticas submersas aproveitam a luz difusa (exemplo: Elo-

    dea canadensis).

    As macrtas podem ser divididas em trs grupos principais, as utu-

    antes livres, as utuantes ancoradas e as emergentes.

    Pitelli (1988) menciona vrias espcies aquticas, em funo do contato

    delas com o solo, a gua ou o ar (Figura 3):

    Hidrtas utuantes: estas plantas permanecem na superfcie dagua, movimentando-se livremente, deriva do uxo de gua, com

    suas razes submersas na gua. O contato ocorre apenas entre a

    gua e o ar. Exemplos: alface-d'gua (Pistia stratiotes), aguap

    (Eichhornia crassipes) e salvnia (Salvinia auriculata) (Figura 3a).

    O aguap e a alface-d'gua podem inviabilizar o uso de represas para

    lazer, ou, at mesmo, dicultar a utilizao da gua em hidreltricas.

    Hidrtas suspensas: o contato apenas com a gua, no h razes.Exemplo: utriculria (Utricularia foliosa) (Figura 3b).

    Hidrtas submersas ancoradas: em contato com a gua e o solo(Figura 3c).

    Hidrtas anfbias emergentes: ocorrem em guas rasas de, no m-ximo, 30 a 50 cm de profundidade, com sistema radicular xo e

    enterrado no solo, porm, as folhas emergem fora da superfcie da

    gua; possuem a parte inferior do caule e, s vezes, as folhas inferi-

    ores submersas, e as demais emergentes na or-d'gua (Figura 3d).

  • 22 Brighenti & Oliveira

    A taboa (Typha angustifolia) um exemplo desta classe de plan-

    tas aquticas. As plantas de taboa podem dicultar o escoamento

    de uxos d'gua em canais e podem tomar conta de grandes reas

    alagadas.

    Hidrtas ancoradas com folhas utuantes: tm suas razes ancora-das no leito do manancial, em contato com o solo, a gua e o ar;

    utilizam a tenso supercial e a densidade da gua como suporte

    areo de suas folhas. Exemplos: lrio-aqutico (Nymphaea ampla) e

    vitria-rgia (Figura 3e).

    Hidrtas de terra molhada: sobrevivem em solos constantementeencharcados. Exemplo: erva-de-bicho (Polygonum persicaria) (Fi-

    gura 3f).

    6. Efeitos das Plantas Daninhas Sobre as Culturas

    6.1 Interferncias diretasOs prejuzos observados nas plantas cultivadas em funo da presena das

    plantas daninhas no podem ser atribudos apenas competio. Existe

    um conjunto de presses ambientais que podem ser diretas (competio,

    alelopatia) ou indiretas (hospedeiras de pragas e doenas). O efeito inte-

    grado destes fatores chamado interferncia, ou seja, o conjunto de aes

    Figura 3. Representao esquemtica dos vrios tipos de plantas daninhas

    aquticas.

  • Biologia de Plantas Daninhas 23

    que recebe uma determinada cultura em decorrncia da presena da co-

    munidade infestante num determinado local (Pitelli, 1985). Com relao

    s interferncias diretas, as mais importantes so competio e alelopatia.

    No caso da competio, os recursos mais comumente sujeitos ao recruta-

    mento pelas espcies so nutrientes, luz e gua. Vrias so as denies

    para o termo competio. Alguns autores denem como sendo os efeitos

    detrimentais de duas ou mais plantas da mesma espcie ou de espcies

    diferentes que ocorrem num mesmo perodo de tempo e espaos denidos

    (Silva & Silva, 1991).

    A competio pode ser intraespecca, quando ocorre entre indivduos

    de uma mesma espcie, e interespecca quando envolve indivduos de es-

    pcies diferentes (Deuber, 1992).

    Dois conceitos do termo competio foram utilizados por (Pitelli, 1985).

    O primeiro diz respeito competio que ocorre quando duas ou mais plan-

    tas esto convivendo no mesmo ambiente, disputando os recursos do solo

    e do ar. Algumas caractersticas determinam o grau de competitividade

    como germinao fcil em condies ecolgicas variveis, crescimento e de-

    senvolvimento rpidos de grande superfcie fotossinttica, grande nmero

    de estmatos por unidade de rea foliar, porte e arquitetura, extenso e

    profundidade das razes, tolerncia a adversidades climticas (geadas, se-

    cas, excesso de chuvas) e liberao de substncias alelopticas.

    O segundo se relaciona com a competio pela sobrevivncia, que a

    capacidade de uma determinada populao em se estabelecer e perpetuar

    num local determinado. Em comunidades compostas por espcies de ciclo

    vegetativo longo e em locais no perturbados, o primeiro caso mencionado

    fundamental para a sobrevivncia da espcie. Porm, em populaes de

    plantas daninhas presentes nos agroecossistemas constantemente perturba-

    dos pelo homem, a competio pela sobrevivncia assume maior relevncia.

    Neste contexto, as plantas daninhas desenvolveram caractersticas que ga-

    rantem o surgimento de novas geraes (discutidas no incio do captulo).

    Outro aspecto da interferncia direta a alelopatia. Este termo foi

    denido como o efeito prejudicial de uma planta sobre outra atravs da

    produo de compostos qumicos liberados ao ambiente, denominados ale-

    loqumicos (Rice, 1974). O que difere alelopatia de competio o fato

    da competio remover do meio fatores de crescimento necessrios a am-

    bas as plantas (gua, nutrientes, gs carbnico), enquanto, para alelopatia,

    ocorre adio de substncias ao meio. De maneira geral, todas as partes

    das plantas tm mostrado conter aleloqumicos, como folhas, caules, razes,

    rizomas, ores, frutos e sementes. Tambm no processo de decomposio

    da palha, h liberao de substncias alelopticas.

    Certas espcies interferem alelopaticamente sobre a planta cultivada

    causando srios prejuzos aos seus crescimento, desenvolvimento e produti-

    vidade. Exsudados radiculares de Sorghum bicolor reduzem o crescimento

    da alface, em funo da presena de um composto secundrio liberado pelo

  • 24 Brighenti & Oliveira

    sorgo denominado quinona sorgoleona (Barbosa et al., 1998). Compostos

    aleloqumicos, como cidos fenlicos, so liberados no solo, na decomposi-

    o da aveia, podendo prejudicar plantas que esto se estabelecendo (Jacobi

    & Fleck, 1998). O captulo 5 aborda tais aspectos com maior abrangncia

    e maiores detalhes.

    As plantas daninhas podem ainda interferir diretamente, reduzindo a

    qualidade do produto colhido, no caso da depreciao da qualidade de bras

    vegetais e animais, em funo da presena de propgulos de plantas dani-

    nhas como acontece quando sementes de carrapicho-de-carneiro (Acanthos-

    permum hispidum) e capim-carrapicho (Cenchrus echinatus) prendem-se s

    bras de algodo. Pode ocorrer, tambm, a condenao de lotes de semen-

    tes de culturas agrcolas, em funo da presena de sementes de plantas

    daninhas consideradas nocivas proibidas.

    Tambm a atividade pecuria pode ser afetada em funo da presena

    de plantas txicas nas pastagens, capazes de matar o gado, como o ca-

    fezinho (Palicourea marcgravii) e o ocial-de-sala (Asclepias curassavica).

    Animais tratados com feno contendo sementes de capim-carrapicho (Cen-

    chrus echinatus) podem rejeitar o alimento.

    Outra forma importante de interferncia direta o parasitismo. Como

    exemplo, possvel mencionar o cip-chumbo (Cuscuta racemosa), espcie

    parasita que causa srios prejuzos cultura da alfafa (Dawson, 1990).

    Nos Estados Unidos e na frica, a erva-de-bruxa (Striga spp.) con-

    siderada como parasita de gramneas cultivadas como o milho, o sorgo e

    o milheto (Weeb & Smith, 1996). parasita obrigatrio de razes, re-

    querendo os exsudados radiculares do hospedeiro para estimular a germi-

    nao de suas sementes. Durante os primeiros estdios de crescimento,

    totalmente dependente do hospedeiro. Posteriormente, passa a realizar

    fotossntese e retirar do solo parte dos nutrientes e gua de que necessita

    (semi-parasitismo). Produz grande quantidade de sementes que podem

    sobreviver por mais de 14 anos no solo (Bebawi et al., 1984).

    Tratos culturais e colheita so prejudicados em reas infestadas por

    determinadas espcies de plantas daninhas. Provocam embuchamento nas

    colhedoras, podendo provocar quebra do implemento. reas contendo ele-

    vada infestao de balozinho (Cardiospermum halicacabum) e corda-de-

    viola (Ipomoea spp.) podem dicultar a colheita (Figura 4).

    6.2 Interferncias indiretasCom relao interferncia indireta, as plantas daninhas assumem impor-

    tncia quando atuam como hospedeiras alternativas de pragas, molstias,

    nematides e plantas parasitas. O mosaico-dourado uma doena virtica

    que ocorre em espcies de guanxumas. As plantas desta espcie so tole-

    rantes ao vrus que transmitido pela mosca-branca a lavouras de feijo,

    soja e algodo. O amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla) e a guaxuma

    (Sida rhombifolia) so tambm hospedeiros do vrus do mosaico-ano e do

  • Biologia de Plantas Daninhas 25

    Figura 4. Cultura de cana-de-acar (esquerda) e de girassol (direita)

    infestadas com balozinho (Cardiospermum halicacabum) e corda-de-viola

    (Ipomoea spp.), respectivamente.

    mosaico-crespo, respectivamente. No caso de nematides, foram identica-

    das 57 espcies de plantas daninhas no Brasil que atuam como hospedeiras

    alternativas de Meloidogyne javanica. Formas juvenis do nematide do

    cisto da soja (Heterodera glycines) conseguem penetrar em razes de men-

    trasto (Ageratum conyzoides), desmdio (Desmodium tortuosum) e feijo-

    bravo (Cassia spp.) (Dias et al., 1995).

    Determinadas espcies de plantas daninhas liberam gros de plen ca-

    pazes de irritar a pele e as narinas de trabalhadores rurais.

    A existncia de plantas daninhas em lagos, represas e canais de irrigao

    resulta em elevada perda de gua via transpirao. Essa perda de gua

    pelas plantas aquticas chega a ser muito maior do que aquela que ocorre

    por evaporao. Alm disto, a velocidade da gua nos canais reduzida,

    aumentando a sedimentao de partculas e encarecendo a manuteno.

    6.3 Fatores que afetam o grau de interfernciaDenomina-se grau de interferncia a reduo percentual do crescimento

    ou produtividade de uma cultura provocada pela interferncia das plantas

    daninhas.

    6.3.1 Fatores ligados culturaA capacidade de competir com plantas daninhas varia entre espcies de

    plantas e, at mesmo, entre cultivares de uma mesma espcie (Burnside,

    1979). Algumas suprimem as plantas daninhas, reduzindo sua biomassa e

    a produo de propgulos. Outras conseguem suportar altos nveis de in-

    festao e, mesmo assim, alcanar bons rendimentos. Cultivares de rpido

  • 26 Brighenti & Oliveira

    crescimento, recrutamento de recursos do meio e alto poder de intercep-

    tao da luz solar dicultam o acesso e a utilizao destes recursos pela

    comunidade infestante. Pesquisas, em nvel mundial, demonstraram que

    determinadas cultivares de soja tm maior habilidade competitiva quando

    na presena de plantas daninhas (Monks & Oliver, 1988).

    Brighenti et al. (2002) avaliaram a capacidade competitiva de trs cul-

    tivares de soja (BRS 183, BRS 156 e BRS 133) na presena de quatro densi-

    dades de leiteiro (Euphorbia heterophylla). A cultivar BRS 183 apresentou

    maior rea foliar e tomassa seca que a demais cultivares (Figura 5). As

    caractersticas desta cultivar reetiram em maior supresso do amendoim-

    bravo que alcanou menor tomassa seca na presena da BRS 183 (Fi-

    gura 6).

    0

    200

    400

    600

    0 30 60 90

    Densidades de amendoim-bravo (pl/m 2)

    rea

    folia

    r (cm

    2 /pla

    nta)

    BRS 183BRS 156BRS 133

    012

    3

    45

    6

    0 30 60 90

    Densidades de amendoim-bravo (pl/m 2)

    Fito

    mas

    sa s

    eca

    parte

    aer

    ea

    (g/pl

    anta)

    BRS 183BRS 156BRS 133

    Figura 5. rea foliar de plantas de soja (esquerda) e tomassa seca da

    parte area (direita), em funo da densidade de plantas de

    amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla).

    O espaamento das entrelinhas da cultura outro fator importante

    na determinao da capacidade competitiva da cultura, pois determina a

    intensidade e a precocidade de sombreamento do solo. Os espaamentos

    utilizados para cultura da soja, 45 e 50 cm, permitem a entrada de grande

    quantidade de luz entre as leiras da cultura e, nos dois meses que sucedem

    a semeadura, ocorre a emergncia de plantas daninhas, durante o perodo

    crtico de preveno da interferncia (Pitelli & Durigan, 1984). A diminui-

    o dos espaamentos entre linhas favorece o sombreamento mais rpido

    do solo, prejudicando a emergncia das plantas daninhas e favorecendo a

    cultura na competio pelos fatores limitantes do meio (Shaw et al., 1991;

    Braz & Durigan, 1993). Quando a soja foi semeada em trs espaamen-

    tos diferentes nas entrelinhas (23, 46 e 91 cm), houve maior interceptao

    da radiao fotossinteticamente ativa pela cultura no menor espaamento

    (Figura 7). Neste caso, menor quantidade de luz consegue atingir o solo,

    resultando em menor nmero de sementes de plantas daninhas germinadas

    (Yelverton & Coble, 1991).

  • Biologia de Plantas Daninhas 27

    0

    5

    10

    15

    0 30 60 90

    Densidade plantas leiteiro (pl/m2)

    Fitomassa seca de plantas

    leiteiro (g/0,25m2)

    BRS 183

    BRS 156

    BRS 133

    Figura 6. Fitomassa seca de plantas de amendoim-bravo (Euphorbia

    heterophylla) em diferentes densidades (plantas m

    2) na presena de trs

    cultivares de soja.

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    4 6 8 10Semanas Aps Emergncia

    % R

    adia

    o

    23 cm46 cm91 cm

    Semanas aps emergncia

    %

    R

    ad

    ia

    o

    Figura 7. Porcentagem de radiao fotossinteticamente ativa interceptada

    pela cultura da soja semeada em trs espaamentos entre linhas. Fonte:

    Yelverton & Coble (1991).

  • 28 Brighenti & Oliveira

    Outro aspecto relacionado ao espaamento pode ser observado nos tra-

    balhos de Brighenti et al. (2003) que aplicaram 100% e 50% da dose re-

    comendada da mistura formulada de uazifop-p-butil+fomesafen para o

    controle de plantas daninhas na cultura da soja. A cultivar utilizada foi

    a BRS 156, semeada nos espaamentos de 20, 40 e 60 cm, mantendo 400

    mil plantas por hectare. Vericou-se que, em espaamentos reduzidos,

    a produtividade da soja, em funo da aplicao da metade da dose re-

    comendada foi similar a produtividade alcanada na dose recomendada

    (Figura 8). Alm disto, quando se analisa unicamente a testemunha sem

    capina, possvel perceber o reexo positivo do controle cultural sobre a

    produtividade da soja, somente pela reduo dos espaamentos entrelinhas

    de 60 cm para 20 cm.

    0

    1000

    2000

    3000

    4000

    20 40 60

    Espaamentos (cm)

    Produtividade (kg/ha)

    Dose recomendada

    Meia dose

    Testemunha Capinada

    Testemunha sem capina

    A AB A B A A A B A A A B

    Figura 8. Produtividade da cultura da soja implantada em trs

    espaamentos entre linhas e submetida a diferentes manejos de espcies

    daninhas.

    Os estudos de densidade tambm so importantes para incrementar o

    potencial competitivo de plantas de interesse agronmico e no permitir

    a competio intraespecca na cultura (Marwat & Nafziger, 1990). Um

    exemplo o arroz irrigado cultivado em trs densidades de semeadura

    convivendo com o arroz vermelho. O nmero de perlhos por planta, a

    biomassa seca da espcie daninha, o nmero de panculas por rea e o

    rendimento de gros do arroz vermelho foi menor na maior densidade de

    semeadura do arroz irrigado (Tabela 6) (Menezes & Silva, 1996).

    Assim, a combinao de espaamentos reduzidos e densidades adequa-

    das de plantas na linha condio imprescindvel para que a cultura som-

  • Biologia de Plantas Daninhas 29

    Tabela 6. Nmero de perlhos, biomassa seca por planta, nmero de

    panculas por m

    2e rendimento de gros do arroz vermelho, em funo de

    trs densidades de semeadura de arroz irrigado. Fonte: Menezes & Silva

    (1996).

    Arroz vermelho

    Densidade

    de

    semeadura

    (kg ha

    1)

    Perlhos

    planta

    1Biomassa

    seca (g

    planta

    1)

    Panculas

    m

    2Rendimento

    de gros

    (kg ha

    1)

    75 2,3 5,2 111 885

    150 1,9 4,8 82 717

    225 1,6 4,4 74 589

    breie mais rpido o solo e seja mais agressiva no controle das plantas da-

    ninhas.

    6.3.2 Fatores ligados comunidade infestanteQuanto mais prximas so as espcies no que se refere a caracteres morfol-

    gicos e siolgicos, mais similares so as exigncias em relao aos fatores

    de crescimento, sendo mais intensa a competio entre elas. Tambm,

    quanto maior a densidade da comunidade infestante, maior ser a quanti-

    dade de indivduos que disputam os mesmos recursos e mais intensa ser a

    competio sofrida pela cultura. Outro fator relevante a distribuio das

    plantas daninhas na rea cultivada. A proximidade de determinadas plan-

    tas infestantes em relao s linhas de semeadura aumenta a interferncia

    da populao daninha sobre a cultura.

    6.3.3 Fatores ligados ao ambienteAs respostas de diferentes espcies de plantas daninhas s condies eda-

    foclimticas de diferentes regies causam mudanas no equilbrio da comu-

    nidade e da cultura, inuenciando o balano competitivo. Por exemplo,

    a adubao do solo no s favorece a cultura como tambm a planta da-

    ninha. Algumas tm maior ecincia no aproveitamento dos fertilizantes

    e, crescendo mais, aumentam a presso competitiva sobre a cultura. A

    prtica de distribuio do adubo prximo ao sulco facilita a sua utilizao

    pela cultura. Os tratamentos tossanitrios, irrigaes e correes de solo

    visam favorecer as plantas cultivadas em detrimento das plantas daninhas.

    Os efeitos negativos da presena das plantas daninhas sero sempre

    mais acentuados em condies de falta de um ou mais insumos necessrios

    produo. Neste caso, as espcies mais ecientes e adaptadas que

    dominaro a competio. De modo geral, as plantas daninhas mostram-se

    mais ecientes nestas condies.

  • 30 Brighenti & Oliveira

    Desta maneira, quanto maior o perodo de tempo em que as plantas

    daninhas e a cultura conviverem num mesmo lugar, maior ser o grau de in-

    terferncia, tornando-se importante os estudos sobre os chamados perodos

    de controle.

    6.3.3.1 Perodo de controle ou de convivnciaA poca e a durao do perodo em que a cultura e a comunidade infestante

    convivem inuenciam, consideravelmente, a intensidade de interferncia. O

    primeiro tipo aquele, a partir da semeadura, emergncia ou transplantio

    em que a cultura deve crescer livre da presena de plantas daninhas, a m

    de que sua produtividade no seja alterada signicativamente. As espcies

    daninhas que se instalarem aps este perodo no interferiro de maneira a

    reduzir a produtividade da planta cultivada. Aps o trmino deste perodo

    a cultura apresenta capacidade de controlar as plantas daninhas em funo

    da cobertura do solo, abafando estas espcies. Este perodo denominado

    de perodo total de preveno da interferncia (PTPI) e sua extenso de-

    pende de inmeros fatores que afetam o balano cultura - planta daninha.

    Este perodo corresponde durao mnima desejvel do efeito residual

    de herbicidas aplicados em condies de pr-emergncia ou pr-plantio-

    incorporado.

    Vrios so os estudos destes perodos no Brasil em diversas culturas.

    Contudo, nem sempre os autores chegam aos mesmos resultados. Isso

    aceitvel, pois as condies em que so desenvolvidos os experimentos so

    diferentes, bem como as cultivares e a composio das espcies infestan-

    tes que variam de uma regio para outra. Culturas bem implantadas, com

    densidade de semeadura adequada, adubao e espaamentos corretos e va-

    riedades bem adaptadas s condies edafoclimticas tendem a apresentar

    redues nos valores de PTPI. Estudos recentes revelam valores mais baixos

    deste perodo em funo do desenvolvimento de novas cultivares, de novas

    tecnologias e evoluo das prticas culturais adotadas, fazendo com que

    as culturas se tornem cada vez mais vigorosas em termos de crescimento,

    sendo cada vez menos exigentes em termos de durao do perodo em que

    h necessidade de adoo de prticas de controle de plantas daninhas.

    Entretanto, no incio do ciclo de desenvolvimento a cultura e a comu-

    nidade infestante podem conviver por um determinado perodo sem que

    ocorram efeitos danosos sobre a produtividade da cultura. Durante esta

    fase, o meio capaz de fornecer as quantidades de fatores de crescimento

    necessrias para o crescimento da cultura e das espcies daninhas. Essa

    fase denominada de perodo anterior a interferncia (PAI) ou fase de

    pr-interferncia (FPI) (Velini, 1992). Durante este perodo no h neces-

    sidade de adoo de prticas de controle de plantas daninhas. Em termos

    tericos, o nal desta fase corresponderia melhor poca para o incio da

    adoo de prticas de controle de espcies infestantes. Entretanto, em ter-

    mos prticos, a seleo da melhor poca de controle das plantas daninhas

  • Biologia de Plantas Daninhas 31

    denida primordialmente pelo nvel de eccia da mesma e pelo nvel de

    seletividade cultura.

    Quando os dois perodos so considerados em conjunto, podem existir

    trs possibilidades:

    1. O PTPI maior que o PAI, neste caso ocorre um terceiro perodo

    que denominamos de perodo crtico de preveno de interferncias

    (PCPI). Este perodo corresponde fase em que as prticas de con-

    trole deveriam ser efetivamente adotadas. Neste caso, as possibili-

    dades de controle so aplicaes de herbicidas em condies de pr-

    emergncia ou em pr-plantio-incorporado com efeito residual igual

    ou maior que o PTPI; a aplicao de um herbicida que apresente ao

    pr-emergente ou um ps-emergente antes do nal do PAI, onde o

    efeito deve manter-se tambm at o nal do PTPI. Outra opo

    a adoo de prticas manuais ou mecnicas de controle que deve-

    ro iniciar-se antes do trmino do PAI e repetir-se at o trmino

    do PTPI. Neste caso, invivel a utilizao de herbicidas exclusi-

    vamente ps-emergentes ou uma nica utilizao de qualquer outro

    tipo de prtica instantnea de controle desprovida de efeito residual.

    2. O PTPI menor que o PAI. Neste caso, ocorre um perodo deli-

    mitado pelos limites superiores do PTPI e do PAI, no qual basta

    remover as plantas daninhas por uma nica vez para que a cultura

    manifeste plenamente o seu potencial produtivo. Neste caso, alm de

    serem vlidas todas as possibilidades de controle mencionadas para

    o caso anterior, passa a ser vivel a utilizao de herbicidas exclusi-

    vamente ps-emergentes, desde que a aplicao seja feita durante o

    perodo compreendido entre o nal do PTPI e o nal do PAI.

    3. O PTPI e o PAI apresentam a mesma durao. Trata-se de uma

    situao bastante incomum, mas possvel. Neste caso, so vlidas

    tambm todas as possibilidades de controle. Mas, para que se tenha

    pleno sucesso, a aplicao de herbicidas exclusivamente em condies

    de ps-emergncia ou a adoo de outras prticas instantneas de

    controle deve ser realizada exatamente quando do trmino do PAI e

    do PTPI.

    Brighenti et al. (2004) realizaram estudos desta natureza para a cultura

    do girassol. Vericaram que a convivncia do girassol com as plantas da-

    ninhas at 21 dias aps a emergncia (DAE) do girassol no causou efeito

    sobre a produtividade da cultura, correspondendo ao perodo anterior a in-

    terferncia (PAI) (Figura 9). O perodo total de preveno interferncia

    (PTPI) foi de aproximadamente 30 DAE (Figura 10) e o perodo crtico de

    preveno interferncia (PCPI) entre 21 e 30 DAE da cultura do girassol.

  • 32 Brighenti & Oliveira

    2400

    2600

    2800

    3000

    3200

    3400

    7 21 35 49 63 77 91 105 119

    Dias aps a emergncia

    Pro

    du

    tivid

    ad

    e (

    kg

    /ha)

    Y = 3159,40-2,55* (DIAS-20,99+ IDIAS-20,99I)

    R2= 0,81

    Figura 9. Produtividade da cultura do girassol, em funo de perodos de

    interferncia na presena de plantas daninhas.

    2200

    2400

    2600

    2800

    3000

    3200

    7 21 35 49 63 77 91 105 119

    Dias aps a emergncia

    Produtividade (kg ha-1)

    Y = 3044,49+ 14,38* (DIAS-29,50+ IDIAS-29,50I)

    R2= 0,92

    Figura 10. Produtividade da cultura do girassol, em funo de perodos de

    interferncia na ausncia de plantas daninhas.

  • Biologia de Plantas Daninhas 33

    Referncias

    Baker, H.C., The evolution of weeds. Annual Rev Ecol Syst, 5:124, 1974.

    Barbosa, T.M.L.; Ferreira, F.A.; Souza, I.F.; Bar