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MARIA ANTONIA MALAJOVICH BIOTECNOLOGIA Segunda Edição (2016) ISBN: 978-85-921077-0-3

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MARIA ANTONIA MALAJOVICH

BIOTECNOLOGIA

Segunda Edição (2016)

ISBN: 978-85-921077-0-3

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

MARIA ANTONIA MALAJOVICH

BIOTECNOLOGIA

2ª EDIÇÃO

Rio de Janeiro

Maria Antonia Muñoz de Malajovich

2016

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Copyright © 2016 Maria Antonia Muñoz de Malajovich

BIOTECNOLOGIA Maria Antonia Malajovich

ISBN: 978-85-921077-0-3

Figuras e fotos dos embriões de Kalanchoe (capa e contracapa) da autora. O meu agradecimento a Elisabeth Lissovsky pela revisão do português.

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SUMÁRIO Seguir o link para ir diretamente ao capítulo de interesse.

C A P Í T U L O 1. O QUE É BIOTECNOLOGIA.......................................................................................................... 1 A biotecnologia tradicional. A biotecnologia moderna. As definições de biotecnologia. O impacto da biotecnologia. Biotecnologia e desenvolvimento. A história da biotecnologia.

C A P Í T U L O 2. CÉLULAS E CROMOSSOMOS........................................................................................................9 A célula como unidade estrutural e funcional dos seres vivos. Técnicas laboratoriais. Toda célula deriva de outra preexistente. Os cromossomos e a teoria cromossômica da hereditariedade. As primeiras manipulações gênicas. Nature vs nurture. Células e cromossomos como agentes biológicos.

C A P Í T U L O 3. OS MICRORGANISMOS.............................................................................................................20 A diversidade microbiana (Eubactérias, algas, arqueas, fungos e vírus). As técnicas microbiológicas. Biossegurança e biosseguridade. Os microrganismos como agentes biológicos.

C A P Í T U L O 4. ENZIMAS E ANTICORPOS..........................................................................................................32 As proteínas. Estrutura. O proteoma. As bases de algumas técnicas laboratoriais. As enzimas. A catálise enzimática. Os anticorpos. A reação antígeno- anticorpo. A produção de anticorpos no organismo e no laboratório. A utilização dos anticorpos.

C A P Í T U L O 5. OS ÁCIDOS NUCLEICOS..............................................................................................................46 Os ácidos nucleicos. A dupla hélice. O código genético. A expressão gênica. O fluxo da informação genética em células procarióticas e eucarióticas. O complexo mundo dos RNAs. A diversidade existente. Interferência e silenciamento gênico. O genoma humano: mapeamento e avanços posteriores. O DNA e o RNA como agentes biológicos.

C A P Í T U L O 6. BIOPROCESSOS...........................................................................................................................58 Bioprocessos, processos fermentativos e indústria. Os microrganismos industriais. Noções sobre o metabolismo primário e secundário. As fases de crescimento da população microbiana. Meios de cultura e matéria-prima. A obtenção das linhagens. Os diferentes tipos de bioprocessos (tradicionais e submersos). Do laboratório à indústria (mudança de escala, condução do

processo e recuperação do produto. Bioprocessos na indústria: o ácido cítrico e os biofertilizantes.

C A P Í T U L O 7. O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS...........................................................................................71 A manipulação in vitro de células e tecidos vegetais: as primeiras tentativas, os meios de cultura, as etapas do processo, as diferentes modalidades, melhoramento e conservação da biodiversidade vegetal, a difusão da tecnologia. A manipulação in vitro das células animais: as primeiras tentativas, as diferentes modalidades, os meios de cultivo, as linhagens celulares, condições de cultivo, do laboratório à indústria.

C A P Í T U L O 8. A TECNOLOGIA DO DNA ...........................................................................................................83 As ferramentas disponíveis: as nucleases ou enzimas de restrição, a eletroforese do DNA, hibridização e sondas gênicas, o método de Southern, o Fingerprint, a síntese e amplificação de DNA, o sequenciamento do DNA. Os arrays.

C A P Í T U L O 9. A ENGENHARIA GENÉTICA.........................................................................................................95 O nascimento da biotecnologia moderna: as primeiras experiências, mitos e realidade. As bibliotecas de genes. A construção de um microrganismo recombinante: Encontrar o gene, inserir o gene e identificar os microrganismos recombinantes. A chegada da comunidade DIY. A construção de plantas transgênicas: o transgene, a transferência dos genes a células vegetais, do laboratório ao campo. Células e animais transgênicos: a transferência gênica a células animais, aplicações. As novas tecnologias de edição gênica baseadas no RNA interferente, nas nucleases sítio-dirigidas: ZFN’S E TALEN, na imunidade bacteriana: CRISPR-CAS9.Biossegurança e regulação.

C A P Í T U L O 10. BIOTECNOLOGÍA E INDÚSTRIA...............................................................................................114 O processo Weizmann. A indústria química: as vias química e biotecnológica. Os produtos biotecnológicos: metabólitos de interesse comercial, enzimas, biopolímeros e bioplásticos. Os biocombustíveis: etanol, biogás, biodiesel. Panorama atual. Biorrefinarias e novas bioindústrias: os casos Amyris e Solazyme (TerraVia).

C A P Í T U L O 11. BIOTECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE........................................................................................131 O desenvolvimento sustentável. As tecnologias limpas: substituição de processos industriais e de insumos agrícolas. A redução dos resíduos: degradação do lixo, tratamento das águas residuais, tratamento dos efluentes industriais, emissões de gases e efeito estufa. A recuperação de recursos naturais: o petróleo, a mineração. O diagnóstico de contaminação ambiental: indicadores biológicos, técnicas genéticas e imunológicas, biossensores. A biorremediação: os vazamentos de petróleo, a radiação. Organismos novos na natureza e biossegurança.

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C A P Í T U L O 12. BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE.......................................................................................149 A desaparição dos ecossistemas naturais. O homem e as plantas alimentícias, comerciais e medicinais. A biodiversidade ameaçada: erosão genética, expansão do agronegócio, transgênese. A proteção da biodiversidade: centros de diversificação, conservação da biodiversidade. O CGIAR o centro internacional da batata. O protocolo de Cartagena de biossegurança.

C A P Í T U L O 13. BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA...........................................................................................162 A evolução das práticas agrícolas. A obtenção de novas variedades: mutação gênica e seleção, alteração do número de cromossomos, engenharia genética. A biossegurança e o princípio de precaução. As PGMs de interesse agronômico: tolerância a herbicidas, resistência a insetos, resistência a vírus, coexistência entre plantas convencionais e PGMs. O cultivo de outros tipos de PGMs: interesse nutricional, produção de medicamentos. O agronegócio: As primeiras empresas produtoras de sementes, os gigantes gênicos, a cadeia produtiva da semente, patentes e inovação tecnológica. A adoção dos cultivos biotecnológicos no mundo: os Estados Unidos e a União Europeia, Israel, África subsaariana, China. A chegada das novas tecnologias.

C A P Í T U L O 14. BIOTECNOLOGIA E CRIAÇÃO DE ANIMAIS.................................................................................179 A nutrição dos animais a necessidade de rações, de Liebig à vaca louca, variações sobre a composição das rações, as rações transgênicas. O melhoramento genético do gado: o controle da reprodução, as novas tecnologias. A aquicultura. A saúde dos animais: os modificadores metabólicos, a resistência a doenças, prevenção e tratamento. Novas utilizações dos animais domésticos: modelos de estudo para doenças humanas, xenotransplantes, os animais como biorreatores, o marco conceitual dos três Rs. Os animais de estimação.

C A P Í T U L O 15. BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS............................................................................................... 194 O pão. O vinho: a vinificação, o cultivo da videira, o rol da levedura na vinificação. A cerveja. Os queijos e iogurtes: a produção de laticínios, o rol de microrganismos e enzimas. A proteína de célula única. Os aditivos: os diversos tipos, os adoçantes. Os alimentos biofortificados. Segurança alimentar

C A P Í T U L O 16. BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS...................................................................................206 A entrada dos transgênicos na cadeia alimentar: melhorando a conservação, as propriedades industriais e as características nutricionais. A favor ou contra? O que o consumidor precisa saber: a noção de segurança, a ingestão de DNA, os marcadores de resistência a antibióticos, a composição química, a produção de toxinas, a produção de alérgenos, o risco de câncer, a utilização de um promotor viral (CaMV), outros efeitos, perspectiva histórica. Como garantir a segurança alimentar? O princípio de equivalência substancial, a avaliação de riscos, a rotulagem dos alimentos, rótulo e informação, o rastreamento de um transgene.

C A P Í T U L O 17. BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS.......................................................................................216 As doenças infecciosas. A aquisição de imunidade. Os diferentes tipos de vacinas: as vacinas tradicionais ou de primeira geração. As novas vacinas ou de segunda geração, a última geração. A produção de vacinas: pesquisa e desenvolvimento, o marco ético, operações industriais, o mercado das vacinas, um setor estratégico para a sociedade. As vacinas e a erradicação da doença: a varíola, a poliomielite, a influenza, tuberculose, malária e HIV/AIDS. A ameaça das doenças emergentes. Bioterrorismo e biosseguridade.

C A P Í T U L O 18. BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / OS TESTES DIAGNÓSTICOS...........................................................233 As tendências atuais: dispositivos miniaturizados, o que é um bom teste, as técnicas com base bioquímica, base imunológica e base genética. O diagnóstico das doenças infecciosas. A tipificação de tecidos: sangue, outros tecidos e órgãos. O diagnóstico de doenças genéticas: as limitações dos testes, as estratégias seguidas, diagnóstico preventivo e preditivo. As patentes. O esporte. A prática forense.

C A P Í T U L O 19. BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / A INDÚSTRIA DE MEDICAMENTOS...............................................247 O desenvolvimento de um medicamento novo. Patentes, genéricos e biossimilares. Os princípios ativos das plantas: o caso da aspirina, os fitoterápicos, as tendências recentes, a importância de um marco legal. As substâncias antibióticas: o caso da penicilina, os limites ao uso de antibióticos, a necessidade de inovação. As primeiras moléculas terapêuticas: o caso da insulina, a substituição do produto natural. As proteínas recombinantes: as bases tecnológicas, os produtos e suas utilizações. Os medicamentos personalizados: a farmacogenômica, a farmacogenética, as doenças órfãs. O mercado dos biomedicamentos: a tendência geral, América Latina.

C A P Í T U L O 20. BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / OS NOVOS TRATAMENTOS....................................................... 264 A aprovação de um tratamento experimental. Os transplantes: os transplantes de órgãos, os xenotransplantes. A engenharia de tecidos: as terapias celulares, fraudes e desatinos. As imunoterapias: o progresso, os anticorpos monoclonais, o desafio da barreira hematoencefálica. O câncer: uma doença de origem genética, as terapias biológicas, os vírus oncolíticos, as vacinas terapêuticas. As terapias gênicas: terapia somática e germinal, os altos e baixos de uma tecnologia, os resultados alcançados, a FIV triparental. As promessas do RNA: as ribozimas, a tecnologia anti-sense, o RNA interferente, a edição gênica

C A P Í T U L O 21. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................................... 278

B I B L I O G R A F I A............................................................................................................................................ 280

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SUMÁRIO

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LISTA DE FIGURAS FIGURA 1.1. O campo da Biotecnologia FIGURA 2.1. Representações esquemáticas da estrutura celular FIGURA 2.2. As células-tronco embrionárias FIGURA 2.3: Os cromossomos FIGURA 2.4. Mitose e meiose FIGURA 3.1. Bactérias, clones e intercâmbio de material genético

A. A – Formação de clones B. B – Mecanismos de transferência lateral ou horizontal de material genético

FIGURA 3.2. Os vírus A. Estrutura fundamental B. Morfologia de diferentes vírus C. (Os adenovírus e o HIV parasitam células humanas; o bacteriófago, bactérias). D. A multiplicação de um bacteriófago

FIGURA 3.3. Logotipos utilizados como indicação de risco biológico FIGURA 4.1. A composição química de uma bactéria FIGURA 4.2. Aminoácidos e proteínas FIGURA 4.3. Cromatografia em coluna FIGURA 4.4. Eletroforese FIGURA 4.5. Difração de raios X FIGURA 4.6. O mecanismo da atividade enzimática

A. O modelo chave-fechadura

B. A enzima diminui a energia de ativação

FIGURA 4.7. A estrutura da molécula de anticorpo (IgG) FIGURA 4.8. Os anticorpos e o reconhecimento do antígeno FIGURA 4.9. O encontro do linfócito B e do antígeno, e a seleção clonal FIGURA 4.10. A produção de anticorpos no laboratório FIGURA 4.11. Os ensaios imunológicos

A. Associação dos anticorpos com moléculas fluorescentes B. Associação dos anticorpos com enzimas

FIGURA 5.1. Composição química dos ácidos nucleicos FIGURA 5.2. A molécula de DNA FIGURA 5.3. O fluxo da informação genética FIGURA 5.4. A organização e regulação dos genes nas células procarióticas FIGURA 5.5. A organização e regulação dos genes nas células eucarióticas FIGURA 5.6. As etapas da síntese de proteínas (Recapitulação) FIGURA 5.7. O silenciamento gênico FIGURA 6.1. O processo fermentativo genérico FIGURA 6.2. Respiração e fermentação FIGURA 6.3. As diversas fases do crescimento de uma população microbiana e a produção de metabólitos

A. As fases de crescimento de uma população

B. A produção de metabólitos primários e secundários FIGURA 6.4. A metodologia HTS para triagem e evolução dirigida de linhagens bacterianas FIGURA 6.5. Modelos de biorreatores utilizados em processos tradicionais

A. Biorreator para fermentações em fase sólida B. A produção de vinagre (Método de Orléans)

FIGURA 6.6. Modelo de biorreator utilizado em fermentações submersas FIGURA 6.7. Fermentações, agentes biológicos e biorreatores FIGURA 6.8. A mudança de escala, do laboratório à indústria FIGURA 6.9. A obtenção de ácido cítrico por fermentação FIGURA 7.1. As diversas partes de uma planta angiosperma FIGURA 7.2. O procedimento a seguir para se obter uma cultura asséptica no laboratório FIGURA 7.4. A cultura de meristemas FIGURA 7.5. As diferentes possibilidades dos cultivos de calos FIGURA 7.6. As possibilidades do cultivo de células vegetais FIGURA 7.7. As culturas de células de origem animal

A. Etapas da cultura de leucócitos para a análise do cariótipo B. Etapas da cultura de células a partir de um fragmento de tecido

FIGURA 8.1: As enzimas de restrição (EcoRI corta o DNA na sequência palindrômica GAATTC) FIGURA 8.2. A eletroforese do DNA FIGURA 8.3. Os polimorfismos FIGURA 8.4. Hibridização de uma sequência de DNA com uma sonda complementar marcada FIGURA 8.5. A técnica de Southern FIGURA 8.6. A síntese de oligonucleotídeos

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FIGURA 8.7. A síntese de cDNA por transcriptase reversa FIGURA 8.8. A reação em cadeia da polimerase FIGURA 8.9. O sequenciamento de um fragmento de DNA FIGURA 8.10. Fundamentos da tecnologia de arrays FIGURA 9.1. Cortar, colar, copiar: a experiência que deu origem à engenharia genética FIGURA 9.2. Sapobacter ou Bactosapo? FIGURA 9.3. A construção de bibliotecas de genes FIGURA 9.4. A produção de somatotropina por engenharia genética

FIGURA 9.5. Algumas estratégias possíveis de clonagem FIGURA 9.6. A estrutura de um vetor de expressão FIGURA 9.7. Semelhanças entre os Legos e os Biobricks (www.biochem.hku.hk/synbio/?_id=148)

A. Classificação hierárquica B. Construções intercambiando as partes

FIGURA 9.8. A construção de uma planta transgênica no laboratório FIGURA 9.9. As etapas da construção de uma planta transgênica FIGURA 9.10. Construção de animais transgênicos

A. Microinjeção. B. Transfecção de células-tronco embrionárias

FIGURA 9.11. A edição gênica com CRISPR-Cas9 FIGURA 10.1. As etapas necessárias para a produção de etanol a partir de diferentes matérias-primas FIGURA 10.2. A produção de etanol a partir da cana-de-açúcar FIGURA 10.3. A biodigestão em condições aeróbias e anaeróbias. FIGURA 10.4. As complexas etapas da produção de biogás dentro do biodigestor FIGURA 10.5. As utilizações do biogás FIGURA 10.6. A reação de transesterificação FIGURA 10.7. O caso Amyris

A. Do quinghaosu à artemisina

B. Produtos gerados na plataforma tecnológica baseada na engenharia metabólica da levedura (via dos isoprenoides ou terpenos)

FIGURA 10.8. O caso Solazyme

FIGURA 11.1. A indústria de papel e de celulose. FIGURA 11.2. Controle biológico do Aedes aegypti

A. Ciclo de vida do mosquito Aedes aegypti B. Controle por Wolbacchia C. Controle por irradiação D. Controle por engenharia genética

FIGURA 11.3. A compostagem FIGURA 11.4. O tratamento das águas residuais FIGURA 11.5. O funcionamento de um biossensor TABELA 11.2. Os principais contaminantes do meio ambiente FIGURA 11.6. As estratégias de biorremediação FIGURA 12.1. O transporte de plantas de um continente a outro FIGURA 12.2. Distribuição da produção agrícola na área habitável do planeta FIGURA 12.3. Os vegetais na alimentação humana FIGURA 13.1. O milho FIGURA 13.2. A produção de milho híbrido FIGURA 13.3. As etapas da construção de uma planta transgênica FIGURA 13.4. Os elos que integram a cadeia produtiva da semente FIGURA 14.1. O Controle da reprodução em bovinos FIGURA 14.2. Dolly, um clone obtido por transferência nuclear FIGURA 14.3. O salmão transgênico AquAdvantage (Aquabounty Technologies) TABELA 14.2. Significado e alcance dos três Rs (do inglês replacement, reduction, refinement) FIGURA 15.1. A panificação FIGURA 15.2. A vinificação FIGURA 15.4. A produção de laticínios

A. Iogurte tradicional e iogurte batido

B. Queijo. Os agentes biológicos intervêm nas etapas de coagulação e na maturação de alguns produto

FIGURA 15.5. A produção de xarope de frutose FIGURA 16.1. O que é um transgênico? FIGURA 16.2. A estrutura de um transgene FIGURA 16.3. O símbolo de transgênico adotado no Brasil. FIGURA 17.1. As respostas primária e secundária do organismo FIGURA 17.2. A memória imunológica FIGURA 17.3. A utilização da tecnologia do DNA-recombinante na vacina contra a hepatite B. FIGURA 17.4. Os diferentes tipos de vacinas FIGURA 18.1. Imagens comerciais de alguns dispositivos miniaturizados utilizados em testes diagnósticos

CHASIS

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SUMÁRIO

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FIGURA 18.2. Imagem comercial dos sistemas API de Biomérieux (http://www.tgw1916.net/Tests/api.html). FIGURA 18.3. O método direto e indireto de um teste positivo de ELISA. FIGURA 18.4: As técnicas com base genética FIGURA 18.5. O sistema HLA

A. A herança dos haplótipos. B. Reação mista ou “cross-matching”. Colocam-se em contato as células do doador com o soro do receptor, em presença de

complemento. Se as células do doador ficam intactas, há compatibilidade.

FIGURA 18.6. O uso de arrays no diagnóstico de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 FIGURA 19.1. As etapas do desenvolvimento de um medicamento FIGURA 19.2: A fórmula da aspirina FIGURA 19.3. A fórmula da penicilina FIGURA 19.4. A insulina humana

A. A molécula de insulina

B. A síntese da insulina. FIGURA 20.1. O princípio da clonagem terapêutica FIGURA 20.2. A transformação de uma célula normal em cancerosa por mutação (câncer de cólon). FIGURA 20.3. O tratamento com sipuleucel-T (Provenge®).

A. Extração das células dendríticas

B. Incubação das células com Provenge® C. Reinfusão das células modificadas no paciente (3 vezes com 2 semanas de intervalo)

FIGURA 20.4: O princípio da terapia gênica. FIGURA 20.5: As tecnologias de silenciamento gênico.

A. As ribozimas

B. O RNA anti-sense

C. O RNA interferente

LISTA DE TABELAS

TABELA 1.1. Produtos e serviços de origem biotecnológica, em diferentes setores TABELA 1.2. A linha do tempo TABELA 2.1. A função e a distribuição das estruturas celulares TABELA 2.2. As células como agentes biológicos TABELA 3.1. Os microrganismos dentro do marco da uma classificação biológica atual TABELA 3.2. As bactérias (Eubactérias e Arqueas) como agentes biológicos TABELA 3.3. As algas como agentes biológicos TABELA 3.4. Os fungos como agentes biológicos TABELA 4.1. As funções das proteínas no organismo TABELA 4.2. A classificação internacional das enzimas TABELA 4.3. As enzimas como agentes biológicos TABELA 4.4. Os anticorpos como agentes biológicos TABELA 5.1: O código genético TABELA 5.2. Os ácidos nucleicos (DNA e RNA) como agentes biológicos TABELA 7.1. Os componentes do meio de cultura para células vegetais TABELA 7.2. Os componentes de um meio de cultura básico para células animais TABELA 7.3. Origem e utilização de algumas linhagens celulares TABELA 10.1. Diversidade de produtos derivados de algumas matérias-primas renováveis TABELA 10.2. Metabólitos primários e secundários obtidos por fermentação e/ou bioconversão enzimática TABELA 10.3. O poder calorífico de vários combustíveis. TABELA 11.1. Alguns exemplos de utilização de agentes biológicos como pesticidas TABELA 11.2. Os principais contaminantes do meio ambiente TABELA 12.1. Os principais tipos de vegetais que entram em nossa alimentação TABELA 12.2. As plantas e a indústria TABELA 12.3. Os centros de diversificação e os cultivos originários TABELA 14.1. O risco de escapamento de um animal transgênico TABELA 14.2. Significado e alcance dos três Rs (do inglês replacement, reduction, refinement) TABELA 16.1. As plantas geneticamente modificadas no mundo (Dados do ISAAA, março de 2016) TABELA 17.1. A produção de vacinas no Brasil TABELA 18.1. As qualidades de um bom teste de diagnóstico. TABELA 18.2. Algumas das mais de 8.000 doenças genéticas descritas TABELA 19.1. A linha do tempo de entrada dos antibióticos e antibacterianos no mercado TABELA 19.2. Alguns biofármacos de interesse médico TABELA 19.3. Os medicamentos biológicos mais lucrativos em 2014 (Statista, Phrma)

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C A P Í T U L O 1

O QUE É BIOTECNOLOGIA

A BIOTECNOLOGIA TRADICIONAL

Cultivar vegetais, domesticar animais, transformar os alimentos ou aproveitar as propriedades

curativas de algumas plantas são atividades que remontam à alvorada da humanidade e se

desenvolveram com base no conhecimento empírico, ignorando a existência dos microrganismos ou

das leis da hereditariedade.

No início do século XIX, a demanda de mão de obra por uma indústria incipiente estimula a

migração da população do campo para a cidade. Em condições sanitárias cada vez mais degradadas,

as doenças e a fome acompanham o homem. Ao mesmo tempo, o progresso exige processos

industriais mais eficientes. A compreensão dos fenômenos naturais torna-se indispensável para

responder às necessidades da sociedade.

A partir de 1850 surgem novas áreas do conhecimento. Nasce a Microbiologia, a Imunologia, a

Bioquímica e a Genética. A Química Industrial desenvolve-se aceleradamente e aumenta, também, a

intervenção da Engenharia Agrícola e da Pecuária no gerenciamento do campo.

Em 1914, Karl Ereky, um engenheiro agrícola húngaro, desenvolve um gigantesco plano de criação

de suínos visando substituir as práticas tradicionais por uma indústria agrícola capitalista baseada no

conhecimento científico. Deve-se a Ereky (1919) a primeira definição de biotecnologia, como “a ciência

e os métodos que permitem a obtenção de produtos a partir de matéria-prima, mediante a

intervenção de organismos vivos”. Para ele, a era bioquímica substituiria a era da pedra e do ferro.

O século XX assiste a um desenvolvimento extraordinário da ciência e da tecnologia. Da

convergência entre ambas resultam logros extraordinários em vários setores produtivos, onde os seres

vivos constituem a base de itens tão diversos como a produção de variedades vegetais mais produtivas,

a fabricação de novos alimentos, o tratamento do lixo, a produção de enzimas e os antibióticos.

A BIOTECNOLOGIA MODERNA

A proposta de J. D. Watson e F. Crick (1953) de um modelo helicoidal para a molécula de DNA

representa, sem dúvida, um marco fundamental na história da Biologia Molecular. Mas a divisória

entre a Biotecnologia clássica e a Biotecnologia moderna é uma série de experiências realizadas por H.

Boyer e S. Cohen que culmina em 1973 com a transferência de um gene de sapo a uma bactéria. A

partir desse momento é possível mudar o programa genético de um organismo transferindo-lhe genes

de outra espécie.

A importância e os riscos inerentes à nova tecnologia não passaram despercebidos às pessoas

envolvidas. Fato inédito na história, em 1975, os cientistas reunidos em Asilomar (USA) estabeleceram

uma moratória em seus trabalhos até serem definidas as condições de segurança adequadas, o que

aconteceria pouco tempo mais tarde.

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Na passagem de uma biotecnologia de laboratório a uma biotecnologia industrial, a Engenharia

Genética ocupa um lugar de destaque como tecnologia inovadora do século XX. Em alguns casos, como

os da insulina e do hormônio do crescimento, a inovação consiste em substituir os métodos de

obtenção tradicionais. Em outros casos, como o dos anticorpos monoclonais ou do Golden Rice, um

arroz com vitamina A, trata-se de produtos inteiramente novos. As técnicas recentes de edição gênica

ampliam extraordinariamente as possibilidades de manipulação dos genes.

A Biotecnologia abrange uma área ampla do conhecimento que decorre da ciência básica (biologia

molecular, microbiologia, biologia celular, genética etc.), da ciência aplicada (técnicas imunológicas e

bioquímicas, assim como técnicas decorrentes da física e da eletrônica), e de outras tecnologias

(fermentações, separações, purificações, informática, robótica e controle de processos). Trata-se de

uma rede complexa de conhecimentos na qual ciência e tecnologia se entrelaçam e se complementam.

AS DEFINIÇÕES DE BIOTECNOLOGIA

O impacto causado pelas primeiras experiências em Engenharia Genética estimulou numerosas

tentativas de redefinição do campo da Biotecnologia. Mediante a substituição da expressão

“intervenção de organismos vivos” por “utilização de processos celulares e moleculares” tratou-se de

diferenciar a Biotecnologia clássica da moderna. Porém, devido à enorme difusão das técnicas de

manipulação gênica, elas acabam se superpondo, e, fora do contexto histórico, é difícil distinguir o

limite entre ambas.

Por outro lado, como a definição de um setor de atividades depende dos interesses dos grupos

envolvidos, muitas vezes reflete a visão dos setores profissionais predominantes. Por isso, se

revisitarmos os textos da década de 1980, anos em que a expressão “biotecnologia” se expande,

encontraremos mais de uma dúzia de definições diferentes do termo. Levantamos, entre as definições

encontradas com maior frequência, as seguintes:

o OECD - Organisation for Economic Co-Operation and Development: A aplicação dos princípios da

ciência e da engenharia no tratamento de matérias por agentes biológicos na produção de bens e

serviços (1982).

o OTA – Office of Technology Assessment: Biotecnologia, de uma forma abrangente, inclui qualquer

técnica que utiliza organismos vivos (ou partes deles) para obter ou modificar produtos, melhorar

plantas e animais, ou desenvolver microrganismos para usos específicos (1984).

o EFB - European Federation of Biotechnology: Uso integrado da bioquímica, da microbiologia e da

engenharia para conseguir aplicar as capacidades de microrganismos, células cultivadas animais ou

vegetais ou parte dos mesmos na indústria, na saúde e nos processos relativos ao meio ambiente

(1988).

o E.H. Houwink: o uso controlado da informação biológica (1989).

o BIO - Biotechnology Industry Organization: em sentido amplo, Biotecnologia é "bio" + "tecnologia",

isto é o uso de processos biológicos para resolver problemas ou fazer produtos úteis (2003).

Observa-se que, com o tempo, o conceito ganha uma expressão mais simples. As definições mais

recentes não fazem mais referência aos processos tecnológicos envolvidos; talvez porque, além de

complexos e diversos, estes evoluam muito rapidamente.

Neste texto consideraremos a biotecnologia de uma maneira ampla, definida como uma atividade

baseada em conhecimentos multidisciplinares, que utiliza agentes biológicos para fazer produtos úteis

ou resolver problemas. Esta definição é suficientemente abrangente para englobar atividades tão

variadas como as de engenheiros, químicos, agrônomos, veterinários, microbiologistas, biólogos,

médicos, advogados, empresários, economistas etc. (Figura 1.1).

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O QUE É BIOTECNOLOGIA?

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O IMPACTO DA BIOTECNOLOGIA

Nascida nos laboratórios de Universidades e Centros de Pesquisa, onde ainda permanece, a

Biotecnologia se desenvolve também em empresas públicas e privadas de diferente porte, gerando

um segmento novo de empresas especializadas em plataformas tecnológicas avançadas que

disponibilizam insumos para as outras empresas.

Já não se trata de promessas ou de perspectivas futuras; os produtos e processos biotecnológicos

fazem parte de nosso dia a dia, trazendo oportunidades de emprego e investimentos. Incluem-se na

bioeconomia plantas resistentes a doenças, plásticos biodegradáveis, detergentes mais eficientes,

biocombustíveis, e também processos industriais menos poluentes, menor necessidade de pesticidas,

biorremediação de poluentes, centenas de testes de diagnóstico e de medicamentos novos (Tabela

1.1).

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FIGURA 1.1. O campo da Biotecnologia

Conhecimentos Agentes biológicos

Ciência e tecnologia Organismos, células, organelas, moléculas

Fazer produtos úteis Resolver problemas

TABELA 1.1. Produtos e serviços de origem biotecnológica, em diferentes setores

SETORES TIPOS DE PRODUTOS OU SERVIÇOS

Energia Etanol, biogás e outros combustíveis (a partir de biomassa).

Indústria Butanol, acetona, glicerol, ácidos, vitaminas etc. Numerosas enzimas para outras indústrias (têxtil, de detergentes etc.).

Meio ambiente Recuperação de petróleo, biorremediação (tratamento de águas servidas e de lixo, eliminação de poluentes).

Agricultura Adubo, silagem, biopesticidas, biofertilizantes, mudas de plantas livres de doenças, mudas de árvores para reflorestamento. Plantas com características novas incorporadas (transgênicas): maior valor nutritivo, resistência a pragas e condições de cultivo adversas (seca, salinidade etc.).

Pecuária Embriões, animais com características novas (transgênicos), vacinas e medicamentos para uso veterinário.

Alimentação Panificação (pães e biscoitos), laticínios (queijos, iogurtes e outras bebidas lácteas), bebidas (cervejas, vinhos e bebidas destiladas) e aditivos diversos (shoyu, monoglutamato de sódio, adoçantes etc.); proteína de célula única (PUC) para rações, alimentos de origem transgênica com propriedades novas.

Saúde Antibióticos e medicamentos para diversas doenças, hormônios, vacinas, reagentes e testes para diagnóstico, tratamentos novos etc.

BIOTECNOLOGIA

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BIOTECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO

Por se tratar de uma coleção de tecnologias diversas, o uso das biotecnologias não se restringe

necessariamente aos países desenvolvidos. Existe um espaço que os países emergentes podem ocupar,

em função de suas riquezas naturais, desde que existam prioridades econômicas e políticas definidas

claramente. A condição fundamental é contar com instituições competentes que formem uma massa

crítica de pesquisadores e pessoal técnico treinado.

A China e a Índia contam hoje com uma indústria biotecnológica avançada e diversificada. Assim

como a América Latina, concentrada principalmente na Argentina, no Brasil, no Chile, na Colômbia, em

Cuba e no México. Países como Uruguai e Venezuela também têm atividade em algumas áreas, assim

como, em menor escala, Equador, Costa Rica, Paraguai, Peru e Bolívia. Na região, numerosas empresas

incidem em vários setores: meio ambiente e indústria, agroalimentos e pecuária, saúde animal e

humana.

No entanto, a Biotecnologia suscita ainda opiniões e sentimentos controversos. Enquanto alguns

setores a percebem como uma tecnologia baseada em um sólido conhecimento científico, para outros

se trata de uma atividade antinatural e perigosa. O enfrentamento de partidários e opositores ocorre

com menos frequência no terreno das razões que no das paixões, sejam elas políticas, religiosas ou

ideológicas. Ao discutir se a biotecnologia é progressista ou reacionária, boa ou ruim, se esquece que

o que caracteriza uma tecnologia é o uso que fazemos dela.

Produtos e processos inimagináveis cinquenta anos atrás entram em nosso cotidiano antes que os

alicerces científicos e tecnológicos correspondentes se insiram em nossa cultura, através de uma

divulgação ampla que atinja também o sistema educativo em todos os seus níveis. Não existe

possibilidade alguma de construir uma sociedade moderna se os seus integrantes ignorarem os

aspectos mais gerais de ciência e tecnologia. O desconhecimento aumenta o risco de rejeitar

tecnologias promissoras, capazes de abrir perspectivas novas, com vistas a um desenvolvimento

sustentável em áreas tão críticas como a saúde, a produção de alimentos, a energia e o meio ambiente.

A proposta deste livro é revisar os fundamentos das biotecnologias e mostrar como se aplicam em

diversos setores produtivos da sociedade, destacando como exemplos alguns empreendimentos

latino-americanos bem-sucedidos. Esperamos que ele seja de ajuda para todos os que nos

preocupamos com os alcances desta fascinante (r)evolução tecnológica.

A HISTÓRIA DA BIOTECNOLOGIA

A Tabela 1.2 reúne alguns dos mais importantes acontecimentos relacionados com a Biotecnologia.

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TABELA 1.2. A linha do tempo

DATA ACONTECIMENTOS FUNDAMENTAIS

ANTIGUIDADE

Preparação e conservação de alimentos e bebidas por fermentação (pão, queijo, cerveja, vinho e vinagre); cultivo de plantas (batata, milho, cevada, trigo etc.); domesticação de animais; tratamento de infecções (com produtos de origem vegetal tais como pó de crisântemo e derivados de soja com fungos).

IDADE MÉDIA

Século XII Destilação do álcool.

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IDADE MODERNA

Século XVI Cronistas registram a colheita de algas para alimentação, nos lagos do México, pelos astecas.

Século XVII Início da produção comercial de cerveja; extração de metais por ação microbiana na Espanha; cultivo de fungos na França; Hooke descobre a existência de células (1665).

Século XVIII Invento da máquina a vapor (1752). A partir de 1750, cresce o cultivo de leguminosas na Europa e se difunde a prática de rotação de cultivos, aumentando a produtividade e melhorando o uso da terra.

IDADE CONTEMPORÂNEA

1797 Jenner inocula uma criança com um vírus que o protege contra a varíola.

1809 Appert utiliza o calor para esterilizar e conservar comida, processo que será utilizado nas campanhas napoleônicas.

1835 a 1855 Schleiden, Schwann e Virchow enunciam a teoria celular.

1863 a 1886 Pasteur inventa um processo para conservar alimentos sem alterar suas propriedades organolépticas (Pasteurização, 1863), derruba a teoria da abiogênese (1864), investiga as doenças do bicho-da-seda (1865), identifica a levedura como o agente responsável pela fermentação alcoólica (1876), usa microrganismos atenuados para obter vacinas contra o antraz e a cólera (1881), faz os primeiros testes de uma vacina contra a raiva (1881). Paralelamente, Koch inicia o desenvolvimento de técnicas fundamentais para o estudo dos microrganismos (1876) e enuncia quatro postulados sobre os agentes infecciosos como causa de doenças. Em 1865 Mendel apresenta o seu trabalho “Experiências de hibridização em plantas”.

1887 Inauguração em Paris do Instituto Pasteur.

1892 Descoberta do vírus do mosaico do tabaco; introdução do trator na agricultura.

1897 Büchner mostra que enzimas extraídas da levedura podem transformar açúcar em álcool.

1899 Primeiro transplante de um órgão: o rim de um cachorro a outro cachorro.

1900 Redescobrimento das leis da hereditariedade, já enunciadas por Mendel em 1865, porém esquecidas.

1905 O primeiro transplante de córnea se realiza com sucesso; isto porque a córnea não tem antígenos.

1906 Ehrlich descobre o primeiro agente quimioterápico, chamado Salvarsan, que será utilizado contra sífilis.

1910 Em Manchester, na Inglaterra, começam a ser introduzidos os sistemas de purificação de esgoto baseados na atividade microbiana.

1912 a 1914 Rhöm obtém a patente de uma preparação enzimática para a lavagem de roupas; Weizmann consegue a produção de acetona e butanol por microrganismos.

1915 Morgan publica “Mechanism of Mendelian Heredity”.

1916 Imobilizam-se as enzimas, uma técnica que facilita sua utilização em processos industriais.

1918 Morrem de gripe espanhola mais de vinte milhões de pessoas, um número de vítimas superior ao da Primeira Guerra Mundial. Constroem-se biodigestores para a produção de metano (China e Índia).

1919 O engenheiro agrícola húngaro Ereky utiliza pela primeira vez a palavra biotecnologia.

1927 Muller descobre que os raios X causam mutações.

1928 F. Griffith descobre a transformação, isto é, a transferência de informação genética de uma linhagem bacteriana a outra.

1933 Comercialização do milho híbrido, isto é, de sementes de milho mais produtivas.

1936 Obtenção de ácido cítrico por fermentação.

1938 Na França, produção comercial de um biopesticida (Bacillus thuringiensis).

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1940 a 1950 Avanços na mecanização do trabalho agrícola.

1944 Produção em grande escala da penicilina (descoberta por Fleming em 1928, desenvolvida por Florey e Chain).

1951 Inseminação artificial de gado utilizando sêmen congelado. Descoberta da presença de genes saltatórios no milho por Bárbara Mc Clintock.

1953 J. D. Watson e F. Crick propõem o modelo (dupla hélice) da estrutura do DNA.

1958 L.Stevens reconhece a existência de células de camundongo pluripotentes.

1959 Reinart regenera plantas de cenoura a partir de uma cultura de células (calo).

1960 Aumento da produção de ácido láctico, ácido cítrico, acetona e butanol por via fermentativa.

1961 Descoberta do código genético. Desenvolvimento de uma protease alcalina para uso em sabões para a lavagem de roupas pela empresa dinamarquesa Novo. Inicia-se o cultivo in vitro de células-tronco embrionárias pluripotentes.

1962 Plantio de novas variedades de trigo mais produtivas, no México, dando início ao que será chamado de Revolução Verde.

1965 Hayflick observa que as células cultivadas se dividem um número finito de vezes antes de morrer.

1967 Primeiro transplante de coração, na África do Sul; o paciente sobrevive 18 dias.

1968 Produção industrial de aminoácidos utilizando enzimas imobilizadas.

1973 Havendo desenvolvido técnicas de corte e reunião do DNA, Cohen e Boyer transferem um gene a um organismo de outra espécie. Lançado no Brasil o programa de produção de álcool a partir de biomassa (Proálcool).

1975 G. J. F. Köhler e C. Milstein desenvolvem a tecnologia de hibridomas e obtêm anticorpos monoclonais. A empresa Novo produz xarope com alto conteúdo de frutose por via enzimática como adoçante alternativo à sacarose.

1975 A Conferência de Asilomar pede ao National Institute of Health (NIH) que sejam estabelecidas normas para a regulação dos experimentos com DNA-recombinante, o que acontecerá meses mais tarde.

1976 Utilização da técnica de hibridização molecular no diagnóstico pré-natal da alfa talassemia.

1977 F.Sanger e W.Gilbert elaboram o primeiro método de sequenciamento do DNA.

1978 Genentech, Inc., a primeira empresa biotecnológica, fundada um ano antes por Boyer e Swanson, obtém a proteína somatotropina (hormônio de crescimento) mediante a tecnologia do DNA-recombinante. Nasce na Inglaterra Louise Brown, o primeiro bebê de proveta.

1979 Produção do hormônio de crescimento humano, utilizando a tecnologia do DNA-recombinante.

1980 A Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos aprova o princípio de patentes para as formas de vida de origem recombinante. As primeiras patentes são de A. N. Chakrabarty, para um microrganismo para biorremediação de petróleo, e de H. Cohen e S.Boyer, pelo processo de 1973. Erradicação da varíola.

1982 A insulina humana de origem recombinante da Genentech, Inc. é comercializada. Uma licença será obtida mais tarde pela empresa Eli Lilly, que a venderá com o nome de Humulina®. A primeira vacina de DNA-recombinante para o gado é comercializada na Europa. S. Prusiner descobre os príons.

1983 Realizam-se as primeiras experiências de Engenharia Genética em plantas (petúnia). Syntex Corporation recebe a aprovação da Food and Drug Administration (FDA) de um teste para Chlamydia trachomatis baseado na utilização de anticorpos monoclonais. Isolado o vírus HIV no Instituto Pasteur (França) e no NIH (National Institute of Health, Estados Unidos). Anunciada a obtenção das primeiras plantas geneticamente modificadas por quatro grupos independentes da Universidade de Washington (St. Louis), a empresa Monsanto (Missouri), e a Universidade de Gent (Bélgica). K. Mullis aporta modificações fundamentais à técnica da Reação em Cadeia de Polimerase (PCR).

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1984 A. Jeffreys introduz a técnica do Fingerprint (impressões digitais), que, um ano depois, será utilizada pelos tribunais para a identificação de suspeitos. Clonagem e sequenciamento do genoma do HIV pela empresa Chiron Corp.

1986 A Environmental Protection Agency (EPA) dos Estados Unidos aprova a liberação de plantas de tabaco transgênicas. Um grupo de especialistas em segurança em Biotecnologia da Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OECD) declara que a previsibilidade das mudanças genéticas obtidas por Engenharia Genética é frequentemente maior que a correspondente às técnicas tradicionais, e que os riscos associados com organismos transgênicos podem ser avaliados do mesmo modo que os riscos associados aos outros organismos. Aprovada a primeira vacina biotecnológica para uso humano, trata-se de Recombivax-HB, contra a hepatite B. alfa interferon para tratamento de câncer (Biogen)

1987 Advanced Genetic Sciences libera em campo bactérias DNA-recombinante (Frostban) que inibem a formação de gelo nos cultivos de morango, na Califórnia; a FDA aprova o fator ativador de plasminogênio, obtido por engenharia genética, para o tratamento de ataques cardíacos.

1988 A Universidade de Harvard obtém a patente de um rato transgênico desenvolvido especialmente para o estudo do câncer; na mesma década, os europeus obterão a patente de outro rato transgênico, sensível a substâncias carcinogênicas. Genencor International Inc. obtém a patente de um processo que permite obter enzimas (proteases) resistentes a alvejantes (processo bleach) para a fabricação de sabões para a lavagem de roupa.

1989 Com a criação do National Center for Human Genome Research se inicia o mapeamento do genoma humano. Amgem libera o Epogen para tratamento de anemia.

1990 Primeira experiência de terapia gênica para uma doença rara (ADA) em uma menina de 4 anos. Pfizer comercializa Chy-Max TM, uma enzima de origem recombinante para a preparação de queijos. GenPharm International, Inc. consegue uma vaca transgênica que produz no leite proteínas humanas para alimentação infantil. A Universidade da Califórnia (UCSF) e a Universidade de Stanford contabilizam 100 patentes relativas ao DNA-recombinante. Aplicação da cultura de células na produção de agentes bioterapêuticos.

1991 Obtida por engenharia genética a enzima β-glucorcerebrosidase para a doença de Gaucher (Genzyme). Affymax lança os primeiros chips de DNA.

1992 Uma técnica, elaborada por cientistas americanos e britânicos, permite testar anormalidades como a fibrose cística e a hemofilia em embriões in vitro. A FDA declara que os alimentos de origem transgênica não demandam uma regulação especial. Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica (CDB).

1993 Aprovada a utilização do hormônio de crescimento bovino rBGH/rBST, produzido por Monsanto Co., para aumentar a produção de leite.

1994 Lançamento no mercado do tomate FlavSavr®, que, devido à inativação de um gene, amadurece na planta.

1995 Decifrado o primeiro genoma de uma bactéria, Haemophilus influenzae.

1996 Sequenciado o primeiro genoma de um organismo eucarionte, a levedura Saccharomyces cerevisiae. Desenvolve-se o primeiro GeneChip (Stanford, Affymetrix). Isolamento e cultivo das primeiras células-tronco extraídas de embriões humanos supernumerários originados por fecundação in vitro.

1997 No Reino Unido, nascem Dolly, uma ovelha clonada, e, meses mais tarde, uma segunda ovelha, Polly, clonada e geneticamente modificada. Os cultivos transgênicos são introduzidos em vários países.

1998 Contabilizam-se mais de 1.500 empresas de Biotecnologia nos Estados Unidos e mais de 3.000 no mundo. Células-tronco embrionárias são utilizadas para regenerar tecidos. Sequenciamento do primeiro genoma animal, o verme Caenorrabditis elegans. Isolada a primeira linhagem de células-tronco embrionárias humanas. A.Z. Fire e C. Mello descobrem o silenciamento gênico, a resposta antiviral a um RNA de filamento duplo.

1999 Sequenciamento do primeiro cromossomo humano. Pesquisadores descobrem que as células-tronco podem ser induzidas a se diferenciar em diversos tipos celulares.

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2000 O rascunho do sequenciamento do genoma humano é anunciado simultaneamente por Collins, do Consórcio do Genoma Humano, e Venter, da Celera Inc. Sequenciados também o genoma da mosca Drosophila melanogaster, o primeiro genoma de uma planta (Arabidopsis thaliana) e, no Brasil, o de uma bactéria que ataca os cítricos (Xylella fastidiosa). Protocolo de Cartagena. Moratória relativa ao uso da tecnologia Terminator, previamente patenteada por Delta&Pine.

2001 O rascunho do sequenciamento do Genoma Humano é publicado simultaneamente nas revistas Science e Nature. Sequenciamento do genoma de plantas de interesse agronômico para os países em desenvolvimento (arroz, banana). Sequenciamento do genoma de bactérias de importância agronômica. Obtenção de células sanguíneas a partir de células-tronco embrionárias.

2002 Completados o rascunho do proteoma funcional da levedura e o sequenciamento do genoma do agente e do vetor transmissor da malária. Identificam-se mais de 200 genes envolvidos na diferenciação das células-tronco. Descoberta da participação de moléculas de RNA na regulação de vários processos celulares. Em diversos países inicia-se a utilização de células-tronco adultas para o tratamento experimental de diversas doenças (leucemia, mal de Chagas, diabetes e anemia falciforme).

2003 Comercialização como mascote, do GloFish, um peixe transgênico que brilha na escuridão, originalmente criado para detectar poluentes. Clonagem de vários tipos de animais e de espécies ameaçadas de extinção. O Genoma Humano é completado. O Massachussets Institute of Technology (MIT) organiza a primeira iGEM (International Genetically Engineered Machine).

2004 Comercialização de novos medicamentos (Avastin® ou bevacizumab) e testes de diagnósticos. Comercialização do peixe GloFish.

2005 Publicação dos resultados do projeto HApMap com o mapa das variações do Genoma Humano.

2006 O grupo de pesquisadores liderado por S. Yamanaka consegue induzir a pluripotencialidade celular em células somáticas. Criada a Biobricks Foundation, um registro de Partes Biológicas Standard - Open Source. Mantida a moratória sobre a tecnologia Terminator (Curitiba).

2007 As autoridades europeias de segurança alimentar concluem que os genes marcadores de resistência aos antibióticos não apresentam riscos relevantes para a saúde humana ou animal nem para o meio ambiente. Vacina contra o papilomavírus humano: primeira vacina contra o câncer. Nova técnica mais eficiente de sequenciamento.

2008 Pesquisadores japoneses desenvolvem a primeira rosa azul, geneticamente modificada. Plataformas next generation diminuem os custos e aumentam a velocidade do sequenciamento. Uma equipe de pesquisadores de Harvard cria linhagens de células-tronco para 10 doenças genéticas.

2009 Um grupo internacional obtém as primeiras células-tronco iPS, sem utilizar virus. Comercialização de soja com alta concentração de ômega 3, o primeiro alimento biofortificado.

2010 Autorizada na União Europeia a comercialização da batata transgênica Amflora (Basf) para uso industrial. Pesquisadores do Instituto Craig Venter constroem a primeira célula sintética. Desvendado o genoma do Neanderthal. Primeiro teste clínico com células-tronco.

2012 Publicação dos resultados do Projeto ENCODE descrevendo as regiões ativas do genoma humano. J.Doudna e E. Charpentier descrevem a técnica CRISPR-Cas de edição de genomas.

2013 F.Zangh mostra que CRISPR/Cas9 também funciona em células de mamíferos, inclusive humanas.

2014 Publicado o primeiro rascunho do proteoma humano.

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C A P Í T U L O 2

CÉLULAS E CROMOSSOMOS

A CÉLULA COMO UNIDADE DOS SERES VIVOS

UNIDADE ESTRUTURAL

A célula é a unidade estrutural dos seres vivos. Trate-se de bactérias, amebas,

espermatozoides ou neurônios, todas as células são formadas por água, íons inorgânicos e

moléculas orgânicas (proteínas, carboidratos, lipídios e ácidos nucleicos). E todas elas

apresentam uma membrana plasmática que separa o citoplasma do meio externo e permite

o intercâmbio de moléculas entre ambos.

As células procarióticas se encontram exclusivamente no reino Monera. Pequenas (0,001 a

0,005 mm) e com requerimentos nutricionais simples, estas células se multiplicam

rapidamente. A informação genética se encontra em um cromossomo circular formado por

uma molécula de DNA e associado a uma invaginação da membrana plasmática (mesossomo).

Pequenas moléculas circulares adicionais (plasmídeos) podem também estar presentes.

Numerosos ribossomos asseguram a síntese proteica (Figura 2.1).

Bem mais complexa é a estrutura das células eucarióticas, presentes nos quatro reinos

restantes (Protista, Fungo, Planta e Animal). Com um tamanho variando entre 0,01 e 0,10 mm,

estas células são dez vezes maiores que as procarióticas. A presença de compartimentos

diferenciados, ou organelas, que cumprem atividades específicas, resulta em uma subdivisão

do trabalho que garante a eficiência do funcionamento celular (Figura 2.2).

O citoplasma é percorrido por um sistema de membranas, o retículo endoplasmático, que

está associado aos ribossomos e, por conseguinte, à síntese de proteínas. Processados no

aparelho de Golgi, os produtos celulares são secretados ou distribuídos em outras estruturas

(lisossomos, membrana celular).

O metabolismo energético está associado a organelas citoplasmáticas, complexas e

rodeadas de membranas (mitocôndrias, cloroplastos e peroxissomos). Um citoesqueleto,

formado por túbulos e filamentos proteicos, mantém a forma da célula, além de assegurar o

transporte interno das organelas e os movimentos celulares. A informação genética está

distribuída em cromossomos, cada um deles formado por uma molécula linear de DNA

associada a proteínas.

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FIGURA 2.1. Representações esquemáticas da estrutura celular

Célula procariótica (bacteriana)

Célula eucariótica (vegetal)

Célula eucariótica (animal)

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CÉLULAS E CROMOSSOMOS

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Os cromossomos e o nucléolo se encontram no núcleo, que funciona como um centro de controle

celular. A membrana nuclear, um envoltório com poros que separa o núcleo do citoplasma, permite o

intercâmbio de substâncias entre ambos.

Apesar de ter uma organização muito parecida, as células animais diferem das células vegetais em

alguns aspectos (Tabela 2.1). Nas células vegetais encontramos uma parede celular ao redor da

membrana plasmática; o citoplasma contém cloroplastos, onde ocorre a fotossíntese, e grandes

vacúolos, onde se armazenam substâncias e degradam macromoléculas. Nenhuma dessas estruturas

se observa nas células animais; estas têm um centríolo que falta nas células vegetais.

A célula também é a unidade funcional de um organismo. O citoplasma é uma solução viscosa onde

continuamente ocorrem reações de síntese e degradação de substâncias, consumindo ou liberando

energia. Estas reações constituem o que denominamos metabolismo.

----------------

TABELA 2.1. A função e a distribuição das estruturas celulares

Estrutura FUNÇÃO CÉLULA BACTERIANA CÉLULA

ANIMAL

CÉLULA

VEGETAL

Parede celular Manutenção da forma e

proteção da célula.

Presente ou ausente Ausente Presente

Membrana plasmática Manutenção da

estabilidade do meio

intracelular; controle das

trocas entre a célula e o

meio extracelular.

Presente

Carioteca ou

membrana nuclear

Controle do fluxo de

substâncias entre o

núcleo e o citoplasma.

Ausente

Presente

Cromossomo(s) Controle da estrutura e

do funcionamento celular.

Único e circular;

apenas DNA.

Múltiplos e lineares; DNA e

proteínas.

Nucléolo(s) Formação de ribossomos. Ausente(s) Presente(s)

Centríolos Formação de cílios e

flagelos; participação na

divisão celular.

Ausentes

Presentes

Ausentes

Ribossomos Síntese de proteínas. Presentes

Retículo endoplasmático rugoso Síntese de proteínas.

Ausentes

Presentes

Retículo endoplasmático liso Síntese de lipídios;

armazenamento e

inativação de substâncias.

Complexo de Golgi Secreção celular.

Mitocôndrias Respiração celular

aeróbia.

Vacúolo central Equilíbrio osmótico e

armazenamento.

Ausente Presente

Lisossomos Digestão intracelular.

Ausentes

Presentes Ausentes

Cloroplastos Fotossíntese. Ausentes Presentes

Citoesqueleto Manutenção da forma

celular; contração e

ancoragem de organelas.

Ausente

Presente

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UNIDADE FUNCIONAL

As reações metabólicas são facilitadas por proteínas com atividade catalítica, denominadas enzimas.

Assim como as proteínas estruturais, as enzimas se sintetizam nos ribossomos, que são pequenos

componentes citoplasmáticos, não membranosos. A estrutura das proteínas depende da informação

genética codificada no ácido desoxirribonucleico (DNA), transcrita no ácido ribonucleico (RNA) e

traduzida nos ribossomos.

As semelhanças de estrutura e funcionamento celulares decorrem de uma origem evolutiva

comum, aproximadamente 3,8 bilhões de anos atrás. Os dois tipos celulares que reconhecemos hoje,

as células procarióticas e as eucarióticas, apareceram entre um e um bilhão e meio de anos mais tarde.

TÉCNICAS LABORATORIAIS

O estudo das células se vê facilitado por um conjunto de técnicas laboratoriais, tais como:

o Técnicas microscópicas que permitem uma visualização detalhada da célula.

- Microscopia óptica, que se utiliza para observar os cortes de tecidos. Geralmente, estes são fixados

(álcool, ácido acético, formaldeído) e tingidos com corantes que reagem com as proteínas ou com os

ácidos nucleicos, aumentando o contraste da imagem.

- Microscopia de contraste de fase, que transforma as diferenças de espessura ou de densidade do

fragmento observado em diferenças de contraste.

- Microscopia fluorescente, que associa anticorpos específicos a um reagente como o PVF (proteína verde

fluorescente de medusa), de forma a marcar as moléculas e visualizar sua distribuição nas células.

- Microscopia confocal, que combina a microscopia fluorescente com a análise eletrônica da imagem,

fornecendo uma imagem tridimensional.

- Microscopia eletrônica, que permite a observação em um plano de cortes tingidos com sais de metais

pesados (microscopia de transmissão) e a observação tridimensional de células (microscopia de

varredura).

- Microscopia de tunelamento, com os diversos tipos de microscópios de varredura por sonda (SPM, do

inglês scanning probe microscope) que, além de fornecer uma imagem de moléculas e átomos,

permitem medições e a manipulação de moléculas e átomos.

- Nanoscopia, baseada na utilização de moléculas fluorescentes, permite a visualização de moléculas

individuais dentro da célula viva (STED, do inglês Stimulated emission depletion microscopy; SMM, do

inglês single-molecule microscopy).

o Técnicas físicas como a centrifugação diferencial (ultracentrifugação, centrifugação em gradiente)

para separar os componentes celulares para estudos bioquímicos posteriores.

o Técnicas instrumentais que possibilitam a contagem de células e a separação de populações

celulares (cell sorter) ou de cromossomos (flow sorter).

o Técnicas de cultura de células com objetivos diversos.

TODA CÉLULA DERIVA DE OUTRA PREEXISTENTE

Assim como uma planta se forma a partir de outra planta e um animal de outro animal, toda célula

deriva de outra preexistente. Este conceito, enunciado por R. Virchow em 1855, não foi plenamente

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CÉLULAS E CROMOSSOMOS

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aceito até dez anos mais tarde, quando L. Pasteur mostrou experimentalmente que a proliferação de

microrganismos em um meio orgânico estéril se deve à contaminação deste com os microrganismos

presentes no ar, que, ao encontrar um meio propício, se multiplicam rapidamente.

Todo organismo multicelular resulta da multiplicação de uma única célula-ovo ou zigoto. As células

embrionárias diferenciam-se, formando centenas de tipos celulares com funções específicas, cuja

integração assegura a unidade do organismo. Nos vegetais, a persistência de tecidos embrionários

totipotentes (meristemas) na planta adulta permite o crescimento e a regeneração durante a vida toda

do organismo. Em condições apropriadas, células especializadas podem reverter a um estado não

diferenciado com a capacidade de regenerar um organismo completo. Nessa propriedade se

fundamenta a propagação de plantas in vitro.

Nos animais superiores, a totipotência se restringe às células do embrião com menos de quatro

dias, que são as únicas capazes de regenerar um organismo inteiro. Contudo, uma vez passado esse

período, algumas células internas pluripotentes do blastócito (células-tronco embrionárias) conservam

a capacidade de originar todos os tecidos do organismo (Figura 2.2).

Algumas células-tronco permanecem nos tecidos adultos, onde se multiplicam durante longos

períodos de tempo sem que ocorra a diferenciação. Estas células têm sido encontradas em órgãos

como a medula óssea e o cordão umbilical, o sangue, a córnea e a retina, a polpa dentária, o fígado, a

pele, o trato digestivo e o pâncreas.

Em determinadas condições fisiológicas, as células-tronco adultas originam células especializadas

de vários tipos que asseguram a manutenção e o reparo do tecido onde se encontram. Um único tipo

de célula-tronco multipotente da medula óssea, por exemplo, gera todas as células sanguíneas

(hemácias, leucócitos e plaquetas). Na pele, células-tronco unipotentes se diferenciam unicamente na

linhagem celular dos queratinócitos.

As células-tronco adultas encontraram rapidamente aplicações terapêuticas promissoras, como o

transplante de células-tronco hematopoéticas em casos de leucemia aguda ou de linfoma. Não

aconteceu o mesmo com as células-tronco embrionárias, cuja utilização está limitada a pesquisas e

estudos laboratoriais.

As células-tronco embrionárias podem ser extraídas de um embrião obtido por transferência de um

núcleo a um ovócito anucleado, ou dos embriões supranumerários congelados nas clínicas de

fertilização assistida. Os dois métodos suscitaram grandes debates éticos em torno de quem forneceria

os ovócitos e do status do embrião.

----------------

FIGURA 2.2. As células-tronco embrionárias

As células-tronco embrionárias extraídas do blastócito (5 a 7 dias) e cultivadas in vitro diferenciam-se, em condições experimentais adequadas, nos diferentes tipos celulares.

Espermatozóides Massa interna de células Células de pâncreas Óvulo Células de medula óssea

Zigoto Cultura de Blastocisto (corte) células-tronco Células de 5 a 7 dias embrionárias músculo cardíaco

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A polêmica esmoreceu em 2006 com o desenvolvimento, por K. Takahashi e S. Yamanaka, da

tecnologia que permite, a partir de células somáticas, obter células iPS (do inglês, induced pluripotent

stem cells). Com algumas pequenas diferenças na expressão gênica, suas propriedades são

semelhantes às das células-tronco embrionárias. A indução de pluripotencialidade mediante a inserção

de alguns genes em células adultas é um passo importante, porque acaba com a necessidade de utilizar

embriões congelados.

Ainda no terreno laboratorial, a tecnologia de reprogramação celular se desenvolve rapidamente,

aumentando nosso conhecimento sobre o controle genético da diferenciação e abrindo uma nova

senda para a implementação de testes, medicamentos e tratamentos novos. Entender os mecanismos

que controlam o crescimento e a diferenciação celular é um dos maiores desafios atuais, porque as

células-tronco possibilitarão novos tratamentos de regeneração celular para doenças cardíacas,

diabetes e doença de Parkinson.

----------------

FIGURA 2.3: Os cromossomos

Os nucleossomos são pequenas unidades estruturais que se repetem ao longo do cromossomo, formando a cromatina. Sua condensação explica que 2 m de DNA estejam concentrados em um núcleo de 5 µm de diâmetro.

A – Morfologia do cromossomo B- Estrutura da cromatina

C. Representação dos cromossomos humanos

(Cariótipo)

O arranjo segue uma classificação convencional que leva

em conta o tamanho, a posição do centrômero

(tracejado no esquema) e o padrão das bandas de cada

cromossomo.

Fonte:

http://www.molecularstation.com/molecular-biology-

images/data/502/karyotype.png

DNA DNA enrolado sobre as histonas (nucleossomos)

Nucleossomos compactados (cromatina)

Genes

Centrômero Cromátides irmãs

Sem duplicar Duplicado

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CÉLULAS E CROMOSSOMOS

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OS CROMOSSOMOS

A observação microscópica dos cromossomos durante a divisão celular permite diferenciá-los pelo

tamanho e a posição do centrômero, uma constrição que os divide em dois braços. Cada cromossomo

está composto por um filamento de DNA enrolado a espaços regulares sobre várias proteínas

(histonas), formando pequenas estruturas denominadas nucleossomos. No resto do ciclo celular, os

cromossomos distendidos formam uma rede de filamentos finos, denominada cromatina, (Figura 2.3).

O número de cromossomos (n) é constante em todos os indivíduos de uma mesma espécie: n = 4

em Drosophila melanogaster e n = 23 no homem, por exemplo. Como nas células somáticas, os

cromossomos se encontram sempre em pares; na espécie humana, o número de cromossomos (2n) é

de 46, sendo que um par determina o sexo. Os cromossomos sexuais são idênticos na mulher (46, XX)

e diferentes no homem (46, XY). Em outras espécies, a determinação do sexo segue mecanismos

diversos.

Um pouco antes da divisão de uma célula, os cromossomos se duplicam, de modo que cada uma

das células filhas receba (2n) cromossomos. A mitose mantém constante o número de cromossomos

nas células somáticas dos indivíduos de uma mesma espécie.

Já nas células reprodutivas, a meiose reduz a (n) o número de cromossomos. Durante o processo,

o entrecruzamento dos cromossomos permite a permuta de material e a recombinação dos genes

(Figura 2.4). Na fecundação, a fusão dos gametas restaura o número (2n) característico da espécie.

Durante a formação dos gametas podem ocorrer erros na disjunção dos cromossomos, dando

origem a indivíduos com fórmulas cromossômicas alteradas. Na síndrome de Down, por exemplo, a

pessoa apresenta geralmente um cromossomo 21 supranumerário (mulheres 47, XX + 21; homens 47,

XY + 21).

Estima-se que a percentagem de recém-nascidos com alguma anomalia cromossômica estaria em

torno de 0,85%, dos quais só alguns apresentariam algum sintoma. Alterações cromossômicas também

podem ser relacionadas com alguns tipos de câncer. Na leucemia mieloide crônica, por exemplo,

observa-se a translocação recíproca de dois pedaços dos cromossomos 9 e 22. De um modo geral, é

frequente encontrar alterações no número de cromossomos das células cancerosas.

A TEORIA CROMOSSÔMICA DA HEREDITARIEDADE

Em 1865, Gregor Mendel apresentou seu trabalho “Experiências de hibridização em plantas”; este

reunia os resultados experimentais realizados com ervilhas (Pisum sativum), durante sete anos, no

jardim do monastério Agostino de Brno (Morávia).

Apesar de passar quase despercebido, o trabalho acabou sendo distribuído por várias bibliotecas

da Europa e América, graças a sua publicação, um ano mais tarde, nos Anais da Sociedade de História

Natural.

No texto figuram algumas generalizações. Conhecida como Primeira Lei de Mendel, Lei de

Segregação ou Monoibridismo, a primeira delas se refere à segregação dos fatores (alelos) de um par

(um gene) na formação de gametas. A segunda, que é conhecida como Segunda Lei de Mendel, Lei de

Segregação Independente ou Diibridismo, se refere à segregação dos fatores (alelos) de dois ou mais

pares (dois ou mais genes) independentes na formação de gametas.

Em 1900, depois de chegar de maneira independente a conclusões semelhantes, os pesquisadores

K. Correns, E. Von Tschermak e H.de Vries redescobriram nas bibliotecas o trabalho de Mendel. Nesse

intervalo de 35 anos tinha sido descrita a divisão celular (mitose, 1875; meiose, 1890); o próximo passo

correspondeu a Sutton e Boveri (1902), sugerindo que os fatores hereditários de Mendel estariam nos

cromossomos.

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MEIOSE MITOSEEIOSE

A confirmação desta hipótese decorreu dos trabalhos de T.H.Morgan e sua brilhante equipe na

Universidade de Columbia (Nova York), com a mosca da fruta, Drosophila melanogaster. Em 1910,

depois de uma série de cruzamentos e de análises estatísticas, Morgan mostrou que a herança da cor

branca do olho do mutante white está associada à transmissão do cromossomo X, que determina o

sexo.

Morgan e seus colaboradores identificaram numerosos outros mutantes de Drosophila

melanogaster com um padrão mendeliano de hereditariedade. Além de moscas com olhos brancos em

vez de vermelhos, encontraram outras com asas curtas em vez de longas, com corpo de cor marrom

ou preta em vez de amarela etc. Os genes correspondentes foram classificados em quatro grupos de

ligação, sendo que cada um deles está associado a um dos quatro pares de cromossomos da

Drosophila.

Como durante a meiose se produzem permutas entre segmentos cromossômicos, nos cruzamentos

aparecem indivíduos recombinantes, isto é, com outras combinações gênicas diferentes das previstas

pelas leis mendelianas (Figura 2.4). A partir dos dados obtidos em milhares de cruzamentos sobre a

recombinação dos genes de um mesmo grupo de ligação chega-se a estabelecer a distância genética

entre eles.

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FIGURA 2.4. Mitose e meiose

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CÉLULAS E CROMOSSOMOS

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Com a descoberta de células com cromossomos gigantes (politênicos) nas glândulas salivares das

larvas de drosófila, começaram os primeiros trabalhos de mapeamento. A observação microscópica

das bandas nos cromossomos mostrou, com enorme riqueza de detalhes, uma sucessão consistente

de bandas largas e estreitas. Da associação entre os métodos genéticos e os métodos citológicos

surgiram os primeiros mapas físicos, associando uma região cromossômica a cada gene.

Das descobertas de Morgan e sua equipe, nasce a Teoria Cromossômica da Hereditariedade ou

Teoria do Gene, segundo a qual:

o Os caracteres de um indivíduo correspondem a elementos pares, os genes.

o Os genes estão ligados uns aos outros nos cromossomos, formando um determinado número de

grupos de ligação.

o Os genes de cada par se separam durante a gametogênese, de acordo com a Primeira Lei de Mendel

e, em consequência, cada gameta fica contendo apenas um conjunto de genes.

o Os genes pertencentes a grupos de ligação diferentes segregam independentemente, de acordo

com a Segunda Lei de Mendel.

o Entre os elementos pertencentes a cada grupo de ligação, ocorre uma troca ordenada chamada

permuta ou crossing-over, que leva à recombinação dos genes (Figura 2.4). A frequência da

permuta fornece a prova da linearidade dos genes em cada grupo de ligação e permite determinar

sua posição relativa.

AS PRIMEIRAS MANIPULAÇÕES GÊNICAS

Na genética clássica, um caráter pode ser considerado hereditário quando duas variações fenotípicas

podem ser atribuídas a dois alelos de um mesmo gene. Os primeiros mutantes de Drosophila

apareceram por acaso e em uma frequência tão baixa que limitava os estudos de análise genética. Era

necessário encontrar um método que acelerasse a obtenção de mutantes para poder avançar. Já na

década de 1920, H. Muller, um dos integrantes do “grupo das moscas” liderado por Morgan, iniciou os

experimentos de exposição das drosófilas a diferentes tipos de radiação.

O tratamento gerou em poucas semanas mais de 100 mutantes, um número equivalente à metade

dos mutantes espontâneos encontrados nos 15 anos anteriores. A radiação podia causar pequenas

mutações de ponto, afetando um único gene e originando uma pequena variação fenotípica. Contudo,

os efeitos da radiação também podiam ser letais para a descendência e/ou produzir vários tipos de

alterações cromossômicas: translocações, inversões, deleções, duplicações.

Muller viu claramente a importância do tratamento com radiação para a obtenção de novas

variáveis vegetais e no melhoramento agrícola; datam dessa época as primeiras mutações em plantas

de milho. A radiação é utilizada como agente mutagênico até os dias de hoje, sendo uma prática

considerada aceitável pelos agricultores orgânicos.

Percebendo o risco que a manipulação indiscriminada da radiação representava para o ser humano,

Muller teve um rol preponderante na conscientização dos trabalhadores da indústria e da saúde sobre

medidas de proteção e participou ativamente nas campanhas antinucleares das décadas de 1940-

1950.

NATURE vs NURTURE

Assim como muitos outros posteriores, os estudos da equipe de Morgan mostraram a complexidade

dos padrões de hereditariedade, que incluem casos de:

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o Alelismo múltiplo, quando um gene admite múltiplos alelos; dominantes, recessivos ou

codominantes (Sistema ABO, por exemplo).

o Pleiotropia, quando um gene determina diversos caracteres (pelagem e sobrevivência em ratos,

por exemplo).

o Herança poligênica, quando um caráter está determinado por vários genes de efeito cumulativo

(altura, cor dos olhos).

o Interação gênica, quando uma característica depende da ação de muitos genes.

Contudo, a variação observada nos seres vivos não se deve exclusivamente à hereditariedade: o

desenvolvimento de um ser vivo resulta de uma delicada inter-relação entre os genes e o ambiente.

No século XX, duas interpretações extremas sobre sua importância relativa causaram grandes danos à

humanidade.

Uma delas é o determinismo genético, base ideológica do eugenismo, movimento que postula o

melhoramento genético do homem mediante a esterilização dos indivíduos considerados deficientes

físicos ou mentais, uma categoria que incluía também os desajustados sociais. Teve grande influência

nos Estados Unidos, na Inglaterra, nos países do Báltico, na Alemanha e no Japão.

No outro extremo, encontramos o determinismo ambiental, que, negando a influência dos genes,

se afirmou na União Soviética durante o período staliniano. Defendido por T. Lyssenko, esse preceito

foi uma das principais causas do fracasso da agricultura e da escassez de alimentos sofrida pela

população no período posterior à Segunda Guerra Mundial.

Em uma perspectiva histórica, os argumentos utilizados no debate atual sobre os organismos

geneticamente modificados conservariam algumas raízes nessa visão antagônica do século XX sobre

ciência burguesa reacionária vs ciência proletária progressista, ou ainda capitalismo-direita-

determinismo genético vs socialismo-esquerda-ambientalismo.

Para os geneticistas, o fenótipo de um indivíduo é o resultado da interação entre o genótipo e o

ambiente em que este se expressa. Os genes determinam o desenvolvimento dos seres vivos, mas

existem muitos traços que não são determinados exclusivamente pelos genes e dependem, em maior

ou menor grau, de influências ambientais.

CÉLULAS E CROMOSSOMOS COMO AGENTES BIOLÓGICOS

Um dos testes pioneiros de diagnóstico genético está baseado na observação microscópica dos

cromossomos de células somáticas durante a divisão celular (mitose). A identificação se vê facilitada

pela presença de regiões ou bandas reveladas mediante algumas técnicas de coloração. O número e a

estrutura dos cromossomos são analisados e apresentados em um arranjo (cariótipo) que segue uma

classificação convencional (Figura 2.3).

Os testes de diagnóstico genético envolvendo a análise de cariótipos estão amplamente difundidos

na prática médica, sendo facilitados atualmente pela utilização de corantes específicos para cada par

cromossômico.

Como agentes biológicos, as células encontram outras aplicações (Tabela 2.2). Células vegetais

cultivadas in vitro produzem substâncias de alto valor agregado, importantes para as indústrias

alimentar, cosmética e farmacêutica. Também são utilizadas para regenerar plantas. A multiplicação

de vírus em cultivos de células de insetos permite a comercialização de práticas de controle biológico.

A síntese de algumas substâncias importantes para a indústria farmacêutica, como o fator ativador

de plasminogênio, depende do cultivo in vitro de células animais. Estas também substituem os animais

nos testes toxicológicos e são utilizadas na multiplicação de vírus para a preparação de vacinas.

Também possibilitam a produção de anticorpos.

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CÉLULAS E CROMOSSOMOS

19

As células-tronco são ferramentas fundamentais na pesquisa básica sobre diferenciação celular. Sua

utilização tem permitido avanços notáveis nos testes de toxicidade, na triagem de medicamentos e na

modelagem de doenças.

Combinando as técnicas de cultivo celular com o desenvolvimento de materiais biológicos

semelhantes ao colágeno, uma área nova de engenharia de tecidos visa a reparação ou substituição

de tecidos lesionados. Os enxertos de pele artificial, cultivada in vitro, saram ferimentos e/ou

queimaduras em seres humanos.

----------------

TABELA 2.2. As células como agentes biológicos

CÉLULAS

Vegetais

Indústria alimentar e cosmética (adoçantes, corantes, flavorizantes e aromatizantes).

Indústria farmacêutica (alcaloides e esteroides).

Animais

e/ou

humanas

Estudos toxicológicos.

Diagnóstico clínico e aconselhamento genético (cariótipos).

Indústria farmacêutica (produção de anticorpos e vacinas, testes de toxicidade, triagem de medicamentos).

Medicina regenerativa (produção de tecidos de substituição).

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C A P Í T U L O 3

OS MICRORGANISMOS

A DIVERSIDADE MICROBIANA

O termo microrganismos se aplica a um grupo heterogêneo de seres que vivem como células

independentes ou como agregados celulares: bactérias, arqueas, protozoários, algas e fungos e,

também, vírus (Tabela 3.1). Salvo estes últimos, que estão na fronteira entre o vivo e o não vivo, os

encontramos dentro dos três domínios em que se classificam os seres vivos: Bacteria, Archaea e

Eukarya.

Os microrganismos mostram uma diversidade surpreendente de estrutura e modos de vida. Alguns

são procariontes, como as bactérias; outros eucariontes, como os protozoários, as algas e os fungos.

Os aeróbios crescem se houver oxigênio, os anaeróbios, se não o houver. Formas livres colonizam

todos os ambientes terrestres, desde o cume das montanhas até as profundidades dos oceanos. Mas

há também parasitas que crescem à custa de outros seres vivos, onde encontram abrigo e alimento, e

os que mostram diversos graus de dependência de outros seres vivos.

----------------

TABELA 3.1. Os microrganismos dentro do marco da uma classificação biológica atual

DOMÍNIO

BACTERIA ARCHAEA EUKARYA

REINO EUBACTERIA ARCHAEBACTERIA PROTOCTISTA FUNGI PLANTAE ANIMALIA

TIPO DE CÉLULA

Procariótica Procariótica Eucariótica Eucariótica Eucariótica Eucariótica

ESTRUTURA CELULAR

Parede celular com peptidoglicano.

Parede celular sem peptidoglicano.

Parede celular de celulose, em alguns.

Presença de cloroplastos, em alguns.

Parede celular de quitina.

Ausência de cloroplastos.

Parede celular de celulose.

Presença de cloroplastos.

Sem parede celular nem cloroplastos.

ORGANIZAÇÃO Unicelular Unicelular Uni ou pluricelular

Uni ou pluricelular

Pluricelular Pluricelular

NUTRIÇÃO (*) Autotrófica ou Heterotrófica

Autotrófica ou Heterotrófica

Autotrófica ou Heterotrófica

Heterotrófica (absorção)

Autotrófica Heterotrófica (ingestão)

EXEMPLOS Eubactérias Arqueas Protozoários e Algas

Leveduras, Mofos, Bolores e Cogumelos.

Briófitas (musgos), Pteridófitos (samambaias), Gimnospermas e Angiospermas.

Invertebrados e Cordados

* Nutrição

Autotrófica: o organismo produz seu próprio alimento a partir de substâncias inorgânicas e de uma fonte de energia. Os seres

autotróficos podem realizar fotossíntese (para a qual a fonte de energia é a luz solar) ou quimiossíntese (para a qual a fonte

de energia é uma reação química exotérmica).

Heterotrófica: o organismo se alimenta de moléculas orgânicas elaboradas por outros seres vivos por absorção (captação de nutrientes dissolvidos na água), ou ingestão (entrada de partículas de alimentos não dissolvidas).

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OS MICRORGANISMOS

21

Os autótrofos sintetizam seus alimentos a partir de dióxido de carbono; os fotossintéticos utilizam a

luz como fonte de energia; e os quimiossintéticos, algumas reações químicas inorgânicas. Os

heterótrofos dependem das moléculas orgânicas elaboradas pelos autótrofos, que absorvem ou

ingerem.

O fato de mantê-los agrupados sob a denominação de “microrganismos” talvez obedeça menos a

uma questão de semelhança que a razões práticas; já que os mesmos métodos básicos de estudo

(isolamento, cultura in vitro, identificação) podem ser aplicados, com pequenas variações, a esses

grupos.

Em condições favoráveis de umidade, acidez e temperatura, as bactérias se multiplicam

rapidamente por fissão celular, produzindo em poucas horas milhões de células ou clones, em uma

das acepções da palavra. Algumas espécies bacterianas também mantêm formas de reprodução

sexuada, possibilitando a recombinação do material genético de plasmídeos. A transferência

horizontal de genes entre bactérias e arqueas ocorre em consequência da infecção com bacteriófagos

ou simplesmente por entrada de um DNA “nu” (Figura 3.1).

AS EUBACTÉRIAS

As eubactérias ou bactérias são organismos unicelulares procarióticos em que uma parede celular

pode cumprir uma função protetora. Além do DNA cromossômico, podem apresentar moléculas

circulares extras de DNA denominadas plasmídeos.

As eubactérias formam um grupo com mais de 5 mil espécies conhecidas. Pequenas (0,0005-0,005

mm) e de formas diversas (esféricas, bastonetes, helicoidais), elas podem ser encontradas isoladas ou

em pares, cadeias ou agregados. Algumas se locomovem livremente, mediante um ou mais flagelos

distribuídos na superfície celular, outras aderem, mediante pelos ou fímbrias, a um organismo

hospedeiro. O grupo inclui as cianobactérias, que serão comentadas mais adiante, junto com as algas.

Em condições desfavoráveis, algumas bactérias formam esporos que resistem em forma latente até

que a situação mude, germinando e retomando sua atividade fisiológica. Um exemplo interessante, na

Europa do século XIX, é o da existência de campos malditos, onde as ovelhas não deviam transitar,

devido ao alto risco de contrair o carbúnculo ou antraz. De fato, os bacilos presentes nos animais

vitimados pela doença e enterrados nesses campos formavam esporos que, trazidos à superfície pelas

minhocas, contaminavam as pastagens.

Uma técnica laboratorial (coloração de Gram) permite diferenciar as bactérias pela estrutura da

parede celular. Entre as Gram-positivas, cuja parede celular é mais simples, encontramos gêneros

como Clostridium, Bacillus, Mycobacterium (com algumas espécies que causam a tuberculose e a lepra)

e os Actinomicetes, como Streptomyces, produtora de antibióticos como a estreptomicina.

Entre as Gram-negativas, encontramos os micoplasmas, Escherichia coli, uma colonizadora do trato

digestivo de muitos organismos; Salmonella, um agente de muitas intoxicações alimentares; as

cianobactérias fotossintéticas; as espiroquetas (Treponema pallidum e Borrelia burgdorferi, causantes

da sífilis e da doença de Lyme, respectivamente); e as clamídias (responsáveis por tracoma e uretrites).

Estima-se que as bactérias sejam responsáveis por aproximadamente metade das doenças

humanas, porém nem todas são patogênicas. As Gram-negativas são mais difíceis de tratar que as

Gram-positivas, devido a uma camada adicional na parede celular que as protege e dificulta a entrada

de antibióticos. Assim como o homem, os animais e as plantas também são afetados por patógenos

bacterianos. O dano decorre da invasão dos tecidos do hospedeiro ou da liberação de substâncias

tóxicas (exo e endotoxinas).

Pessoas diferentes, em lugares diferentes ou em um mesmo lugar, sejam sadias ou doentes, não

apresentam os mesmos microrganismos. Algumas comunidades microbianas desenvolvem-se na

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superfície e no interior de um organismo. Denominadas microbiomas, essas comunidades são

provavelmente necessárias para o hospedeiro. Técnicas avançadas de amplificação e sequenciamento

de DNA permitem identificar os microrganismos que se desenvolvem em diferentes localizações, seja

a pele ou o tubo gastrointestinal.

----------------

FIGURA 3.1. Bactérias, clones e intercâmbio de material genético

Por divisão binária, uma bactéria gera um clone de bactérias semelhantes. O intercâmbio de material genético

entre bactérias responde a três mecanismos, mediados por DNA livre (transformação), por plasmídeos

(conjugação) ou por bacteriófagos (transdução).

A – Formação de clones

B – Mecanismos de transferência lateral ou horizontal de material genético

Bactéria

Clones

Conjugação Transdução Transformação natural

Bactéria doadora Bactéria receptora

Bacteriófago Infecção Incorporação do DNA Bactéria infectada com um fragmento exógeno (Lisogenia) de DNA bacteriano

Lise celular Bactéria competente Bactéria transformada

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OS MICRORGANISMOS

23

Em relação ao meio ambiente, a participação bacteriana na reciclagem dos elementos é fundamental

do ponto de vista ecológico. Dela dependem o tratamento de resíduos e de águas servidas e, também,

a eliminação de compostos recalcitrantes (biorremediação) e a extração de minérios (biolixívia). A

fixação de nitrogênio e a produção de toxinas pesticidas por bactérias contribuem para melhorar as

práticas agrícolas.

Devido a suas propriedades metabólicas, muitas eubactérias são utilizadas na produção de

alimentos (laticínios, vinagre, picles e azeitonas) e de aditivos (vitaminas, aminoácidos, gomas

emulsificantes e estabilizantes), na indústria química (acetona, butanol e plásticos biodegradáveis) e

na indústria farmacêutica (vacinas, toxinas e antibióticos). Também são usadas na produção de

enzimas para uso industrial e médico (Tabela 3.2).

Nos últimos anos começaram a ser estudados os biofilmes, comunidades microbianas protegidas

em uma matriz extracelular aderente. Tanto se fixam nos dentes, onde formam a placa dentária, como

na cortina do chuveiro, na pia da cozinha, nos tubos metálicos, nos sistemas de ar condicionado, ou

nos cateteres médicos e equipamentos de hemodiálise. Os biofilmes são extremamente resistentes

aos ataques dos agentes antimicrobianos.

AS ARQUEAS

As arqueobactérias, ou arqueas, diferem das eubactérias pela estrutura da parede celular e, também,

por alguns aspectos metabólicos relacionados com a síntese de proteínas que as aproximam dos

eucariontes. Algumas vivem em habitats inóspitos, como as solfataras dos vulcões ou gêiseres, a

temperaturas superiores a 60-800C (Islândia, Costa Rica). Outras prosperam em lagos onde a

concentração salina é altíssima, como o Grande Lago Salgado (Estados Unidos) ou o Mar Morto (Israel).

Entre as arqueas existem também alguns gêneros com vias metabólicas peculiares que as tornam

dependentes de enxofre ou produtoras de metano. Devido a estas características, nos últimos anos

tem-se acelerado a prospecção de arqueas para serem utilizadas em processos industriais que exijam

condições ambientais extremas. Contudo, estudos recentes de ecologia molecular mostram que as

arqueas não se limitam a ambientes extremos e que sua diversidade é bem maior do que o imaginado

previamente.

OS PROTOCTISTAS

Os Protozoários se classificam no reino Protoctista, um grupo mal definido de seres eucarióticos

unicelulares ou pluricelulares, autótrofos ou heterótrofos, de reprodução sexuada ou assexuada.

Trata-se de organismos unicelulares heterotróficos, cujo tamanho varia entre 0,002 e 1mm.

Alguns vivem livres em ambientes marinhos, de água doce, ou simplesmente muito úmidos. Outros

parasitam outras espécies, nas quais causam doenças: Giárdia, Amoeba, Trichomonas, Plasmodium,

Toxoplasma, Leischmania etc. De importância fundamental para o ser humano, do ponto de vista

médico, sua caracterização molecular pode dar origem a testes diagnósticos e vacinas.

Classificadas junto com os protozoários no reino Protoctista, as algas são organismos uni ou

pluricelulares, autotróficos e aquáticos. Situadas na base das cadeias alimentícias aquáticas, as algas

cumprem um papel fundamental na biosfera por serem capazes de fixar gás carbônico e produzir

oxigênio. Algumas participam na formação de solos e na fixação de nitrogênio.

Apesar de não ter órgãos diferenciados, as macroalgas marinhas (algas pardas, algas vermelhas e

parte das algas verdes) formam filamentos e talos que podem chegar a medir mais de trinta metros.

São utilizadas como adubo e, também, na alimentação humana (Porphyra ou nori e Laminaria, como

o kombu, no Oriente; cochayuyo, no Chile). Devido a sua capacidade de formar géis e emulsões, os

ficocoloides extraídos dessas algas (ágar, carragenina, alginato) são empregados em análises clínicas

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(preparação de meios de cultivo para cultivo de bactérias e fungos) e em várias indústrias, tais como a

alimentícia (sorvetes, cremes, geleias etc.), a farmacêutica (laxantes, cápsulas de remédios) e a

cosmética (cremes, sabonetes, xampus, dentifrícios etc.).

----------------

TABELA 3.2. As bactérias (Eubactérias e Arqueas) como agentes biológicos

AGENTES BIOLÓGICOS APLICAÇÕES

Bactérias

Tratamento de resíduos e de águas servidas.

Produção de energia (metano).

Biorremediação, extração de minério.

Indústria química (acetona, butanol, ácido láctico, ácido acético).

Enzimas industriais.

Agricultura (rizóbios, biopesticidas).

Alimentos (laticínios, vinagres, picles, azeitonas, silagem).

Indústria de alimentos (vitaminas B12 e β-caroteno, aminoácidos lisina e ácido glutâmico; polissacarídeos xantana e dextrana*).

Indústria farmacêutica (enzimas de uso médico, antibióticos, vacinas e toxinas).

(*) A dextrana também tem usos médicos.

TABELA 3.3. As algas como agentes biológicos

AGENTES BIOLÓGICOS APLICAÇÕES

Algas

Biomassa

Tratamento de efluentes, biomonitoramento de poluição, obtenção de energia.

Agricultura (adubo).

Produção de alimentos (alimentação humana, ração para avicultura e aquicultura).

Moléculas

Indústria de alimentos (aditivos, complementos nutricionais, substitutos proteicos, espessantes e emulsionantes).

Indústria de cosméticos (ácidos graxos e outras substâncias tais como ficocoloides, pigmentos, glicerol, abrasivos finos etc.).

Indústria farmacêutica (compostos biologicamente ativos, tais como toxinas, antibióticos, antivirais e antitumorais).

TABELA 3.4. Os fungos como agentes biológicos

AGENTES BIOLÓGICOS APLICAÇÕES

Fungos

Agricultura (controle biológico de insetos e nematoides, micorrizos).

Produtos de fermentação (etanol, glicerol, ácido cítrico).

Enzimas industriais.

Biomassa (fermento de padaria, micoproteína).

Indústria de alimentos (panificação, queijaria).

Indústria de bebidas (cervejas e vinhos, destilados).

Produtos metabólicos (extrato de levedura, hormônios de crescimento vegetal).

Indústria farmacêutica (antibióticos, vitaminas, vacinas, esteroides).

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OS MICRORGANISMOS

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As microalgas representam um grupo extremamente diversificado de umas 25.000 espécies das quais

só um pequeno grupo está bem estudado. Este compreende aproximadamente cinquenta espécies de

microrganismos fotossintéticos, tanto eucariontes (diatomáceas, dinoflagelados, euglenoides e outras

algas verdes) como procariontes (cianobactérias, antigamente algas azul-esverdeadas).

A proliferação de microalgas como florações na natureza (marés vermelhas) ou em reservatórios,

geralmente devido à eutrofização das águas, causa a morte de outros organismos, sendo muito

perigosa se estiver acompanhada pela liberação de toxinas. Porém, em alguns sistemas de tratamento

de efluentes, as microalgas são incorporadas nos tanques para remover nutrientes inorgânicos e

adicionar oxigênio. Também são usadas como indicadores de poluição.

O metano é um gás combustível que resulta da degradação de biomassa de algas por

microrganismos anaeróbios. Por outro lado, a produção de hidrogênio por algas representa uma

alternativa energética promissora.

As microalgas são aproveitadas na alimentação animal como ração para a avicultura e a aquicultura.

Algumas das substâncias que elas sintetizam são incluídas na alimentação humana como

complementos nutricionais e substitutos proteicos; trata-se de aminoácidos, ácidos graxos e vitaminas

(B12, -caroteno ou provitamina A). Também são utilizadas na formulação de cosméticos e na indústria

farmacêutica (Tabela 3.3).

OS FUNGOS

O Reino Fungi comporta mais de 100.000 espécies. Os fungos são organismos eucarióticos, uni ou

pluricelulares, com uma parede celular formada por quitina. Todos eles são heterótrofos e podem se

reproduzir sexuada ou assexuadamente.

As leveduras são fungos unicelulares que se desenvolvem em lugares úmidos e se reproduzem por

brotamento. Pertence a esse grupo um dos microrganismos de maior importância econômica:

Saccharomyces cerevisiae, o popular levedo de cerveja (ou, simplesmente, levedura) utilizado

tradicionalmente na preparação de alimentos e de bebidas, assim como na produção de etanol,

vitaminas e outros metabólitos.

Transformada mediante técnicas de engenharia genética, esta levedura produz uma vacina contra

a hepatite B (Tabela 3.4). Entretanto, nem todas as leveduras são benéficas; Candida albicans, um

microrganismo oportunista da flora normal humana pode, em certas condições, proliferar de maneira

anormal, tornando-se patogênica.

Nos bolores e mofos, as células formam um emaranhado de filamentos ou hifas, denominado

micélio. Os mofos crescem rapidamente por fragmentação do micélio e se disseminam mediante

esporos; como Aspergillus niger, um produtor de ácido cítrico; ou como Rhizopus, o fungo preto do

pão, que se expande sobre a superfície deste apesar dos conservantes acrescentados; ou ainda como

Aspergillus flavus, um bolor que ataca as sementes de leguminosas (amendoim, feijão, soja) e produz

uma toxina poderosa, a aflatoxina, causando graves intoxicações.

Neste grupo também se encontra o Penicillium, um gênero que conta com diversas espécies, uma

das quais é utilizada na indústria farmacêutica, para a produção de penicilina, e outras na indústria de

alimentos, para a maturação de queijos como o Roquefort, o Gorgonzola e o Camembert.

Os cogumelos são os corpos reprodutivos de muitos fungos. Alguns são venenosos (Ammanita),

outros produzem substância alucinógena, tais como a psilobicina, utilizada por grupos nativos

mexicanos em rituais religiosos, ou a ergotamina, sintetizada quimicamente no século XX com o nome

de LSD (ácido lisérgico). Mas também os há comestíveis como o Agaricus ou champignon, o Shiitake e

o Pleurotus, que são cultivados e comercializados pelo homem.

Em termos ambientais, um quarto da colheita de frutas e vegetais é destruído pelos fungos; pragas

como a ferrugem do café, o esporão do centeio e a vassoura-de-bruxa afetam gravemente a

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agricultura. Na Irlanda no século XIX, o Phytophtora infestans atacou a batata, destruindo a fonte

básica de alimentação; a praga causou um milhão de mortes e a emigração forçada de boa parte da

população.

Os liquens resultam da simbiose entre um fungo e uma alga. Alguns são comestíveis, supondo-se

que a Lecanora esculenta seja o maná referido na Bíblia. O grupo não tem sido muito explorado

economicamente, apesar de ter encontrado aplicações como corantes (tintura de tornassol, um

indicador de pH), no tingimento de tecidos e como fixadores na indústria de perfumes. Também são

indicadores de poluição (biomonitoramento).

Em contrapartida, outra associação, desta vez entre um fungo filamentoso e as raízes das plantas

vasculares, os micorrizos, ocupam um lugar de destaque na agricultura em solos tropicais por

facilitarem a solubilização dos fosfatos.

OS VÍRUS, NA FRONTEIRA DO VIVO E DO NÃO VIVO

Os vírus são partículas sem nenhuma atividade metabólica; atravessam os filtros de porcelana e

cristalizam. O seu tamanho varia entre 20 e 300 nanômetros (1 nm = 10-4 mm). Sendo parasitas

obrigatórios de bactérias, plantas ou animais, ao infetar uma célula viva os vírus passam a utilizá-la

para sua própria reprodução.

Apesar de variar muito em complexidade, uma partícula viral típica compreende um ácido nucleico

(DNA ou RNA, como filamento simples ou duplo) dentro de uma capa proteica ou capsídeo e algumas

enzimas que serão liberadas dentro da célula hospedeira: DNA polimerase no caso dos poxvirus de

DNA duplo que se multiplicam no citoplasma: transcriptase reversa nos retrovírus; RNA replicase nos

vírus que se replicam sem passar por DNA. Alguns vírus que se integram no genoma da célula infectada

(bacteriófagos, retrovírus) têm sido utilizados na engenharia genética como vetores para introduzir

genes em uma célula hospedeira (Figura 3.2).

A entrada do vírus na célula depende do reconhecimento de um receptor na membrana celular do

hospedeiro, que seja específico para o vírus e essencial para a célula. A seguir, vários cenários são

possíveis: morte da célula infectada pelo sistema imune do hospedeiro; lise celular e dispersão de

partículas virais (vírus da influenza, poliovírus); brotação e saída envelopada; permanência latente

(herpesvírus); integração no hospedeiro e eventual transformação das células em cancerosas (tumores

devidos aos vírus da hepatite B e de Epstein-Barr).

Várias doenças humanas são causadas por vírus (poliovírus, HIV, coronavírus [responsável pela

síndrome aguda respiratória ou SAR] etc.). A destruição de habitats naturais pelo homem e as

mudanças climáticas alteram a dinâmica das populações naturais, em que a relação entre parasita e

hospedeiros está bem estabelecida. O contato dos vírus com outros hospedeiros possibilita a aparição

de algumas doenças emergentes como o Ebola, que assolou recentemente vários países da África

ocidental, e o Zika, introduzido recentemente no Brasil. A dispersão dos vírus se vê acelerada por

fatores culturais e sociais e pelo incremento do comércio e das viagens internacionais.

Na agricultura, o combate à lagarta da soja com o baculovírus evita a aplicação de 1,2 milhão de

litros de inseticidas por ano nas lavouras brasileiras. Em relação ao meio ambiente, pouco se sabe do

rol dos vírus, e dos microrganismos, nos oceanos. Uma questão relevante, considerando que 1 litro de

água de mar contém pelo menos 10 bilhões de micróbios e 100 bilhões de vírus, e que a maioria não

está caracterizada nem identificada. Estudos recentes destacam sua importância nos ciclos

biogeoquímicos e, particularmente, na reciclagem do carbono; a morte microbiana por infecção viral

libera, na cadeia alimentar, de 370 milhões a 630 milhões de toneladas de carbono por ano.

Os príons são pequenas proteínas que podem agir como agentes transmissíveis de algumas doenças

raras do sistema nervoso central. Possivelmente ativam mecanismos do hospedeiro para produzir

proteínas semelhantes que polimerizam, causando danos locais (Kuru, doença de Creutzfeldt-Jakob).

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OS MICRORGANISMOS

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Envelope (só nos vírus que se reproduzem por brotação)

Capsídeo (proteína)

Ácido nucleico (DNA ou RNA)

Enzimas virais (polimerases, transcriptase reversa)

FIGURA 3.2. Os vírus

A. Estrutura fundamental

B. Morfologia de diferentes vírus

(Os adenovírus e o HIV parasitam células humanas; o bacteriófago, bactérias).

C. A multiplicação de um bacteriófago A infecção da bactéria pelo bacteriófago destrói a célula (ciclo lítico). Em alguns casos, o DNA viral se integra no cromossomo,

sendo transmitido às células filhas; em determinadas condições, o vírus retoma sua atividade, reiniciando o ciclo lítico.

HIV Adenovírus Bacteriófago

Bacteriófago Bactéria Infecção DNA viral O DNA viral se integra no cromossomo bacteriano e se transmite às células-filhas Eventualmente Infecção Adesão do bacteriófago à parede celular e injeção e injeção do DNA viral CICLO LISOGÊNICO DNA viral

CICLO LÍTICO Podendo voltar a se ativar Lise da bactéria e liberação Multiplicação do DNA viral de novas partículas de vírus

Formação de novos vírus Síntese de proteínas virais e destruição do cromossomo bacteriano

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AS TÉCNICAS MICROBIOLÓGICAS

Diversos tipos de técnicas facilitam o trabalho laboratorial. A identificação de um microrganismo

demanda a observação microscópica e a utilização de alguns métodos específicos de coloração,

complementados por testes bioquímicos e eventualmente genéticos e imunológicos. Encontrar e

manter um microrganismo no laboratório demanda a aplicação de técnicas bacteriológicas aplicáveis

também, com algumas variações, a fungos e algas.

Cultivar microrganismos exige, além do desenho de um meio nutriente que satisfaça suas

necessidades metabólicas, um cuidado especial com as condições de temperatura e iluminação em

que este será incubado. Os meios nutrientes se empregam líquidos ou solidificados com ágar, uma

substância que lhes confere uma consistência gelatinosa. Os recipientes mais comuns são tubos de

ensaio e placas circulares de vidro com tampa (placas de Petri); e, para inocular os meios, se utilizam

alças de platina e pipetas de diferentes tipos.

A grande dificuldade do laboratório microbiológico está em conseguir a multiplicação do

microrganismo desejado evitando as contaminações, isto é a multiplicação de outros microrganismos.

Trabalha-se em condições assépticas, o que demanda a esterilização prévia do material de vidro,

dos meios nutrientes e dos instrumentos (alças, pipetas) que serão utilizados. E, na transferência do

material biológico, evita-se cuidadosamente toda contaminação com os microrganismos do ar.

Equipamentos especialmente desenhados para trabalhar sob um fluxo de ar esterilizado ajudam o

profissional. Também se evitam as contaminações na hora de eliminar o material utilizado, a fim de

não liberar microrganismos prejudiciais no ambiente.

Os microrganismos são isolados a partir de amostras de solo, água, ar ou fluidos corporais. As

linhagens obtidas se conservam como culturas puras. Microrganismos com características diferentes

são obtidos induzindo mutações e selecionando as linhagens mutantes. Cada laboratório mantém os

estoques microbianos necessários, que também podem ser solicitados a centros especializados

(Coleções de Cultura).

O número de microrganismos em uma amostra pode ser estimado por diversos métodos: contagem

microscópica, contagem eletrônica, contagem em placa, turvação do meio, massa seca, conteúdo de

nitrogênio ou medidas indiretas da atividade microbiológica.

Em geral, as técnicas clássicas são trabalhosas e muito demoradas para o diagnóstico clínico, por

isso estão sendo substituídas por técnicas miniaturizadas mais rápidas que identificam os

microrganismos com base em algumas reações bioquímicas em kits padronizados. A tendência geral é

de automatização do laboratório microbiológico e de utilização de técnicas moleculares.

A identificação de bactérias e arqueas pode ser realizada hoje por comparação do RNA ribossômico.

A centrifugação dos ribossomos em gradiente de cloreto de césio separa os componentes, RNA 5S e

RNA 23S na unidade maior e RNA 16S na menor. Modificações na estrutura primária desta última

fração não afetam sua função, de modo que, se uma pequena parte está altamente conservada, o

restante do rRNA de 16S varia entre as espécies, tendo se transformado em um elemento chave para

a classificação.

A Microbiologia Ambiental nos traz uma nova visão das populações microbianas presentes na

natureza. Nossa ignorância é ainda enorme: o número de espécies que conseguimos cultivar no

laboratório não representa mais do que 1 a 5 % da totalidade existente. Dependemos dos avanços na

área da genômica para ampliar nosso conhecimento das comunidades microbianas do ambiente e para

identificar genes de interesse para a indústria (metagenômica).

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OS MICRORGANISMOS

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BIOSSEGURANÇA E BIOSSEGURIDADE

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o termo biossegurança abrange os princípios,

técnicas e práticas necessárias para evitar a exposição acidental a patógenos e toxinas assim como sua

liberação acidental (Figura 3.3).

Os microrganismos são classificados segundo o risco de causarem danos aos profissionais que

trabalham com eles e à coletividade. Os critérios são: a patogenicidade para o homem, a virulência, o

modo de transmissão, a endemicidade e a existência ou não de uma terapêutica eficaz. Segundo a

Organização Mundial da Saúde, definem-se assim quatro grupos de risco:

o Grupo de Risco (nenhum ou baixo risco individual e coletivo). Um microrganismo que

provavelmente não pode causar doença no homem ou num animal. Exemplos: Bacillus cereus,

Bacillus subtilis, Escherichia coli (algumas linhagens), Lactobacillus sp.

o Grupo de Risco 2 (risco individual moderado, risco coletivo baixo). Um agente patogênico que pode

causar uma doença no homem ou no animal, mas que é improvável que constitua um perigo grave

para o pessoal dos laboratórios, a comunidade, o gado ou o ambiente. A exposição a agentes

infecciosos no laboratório pode causar uma infecção grave, mas existe um tratamento eficaz, além

de medidas de prevenção, com risco de propagação de infecção limitado. Exemplos: Salmonella,

Toxoplasma, Schistosoma mansoni, Streptococcus sp, vírus da rubéola, vírus do sarampo e vírus da

hepatite B.

o Grupo de Risco 3 (alto risco individual, baixo risco coletivo). Um agente patogênico que causa

geralmente uma doença grave no homem ou no animal, mas que não se propaga habitualmente

de uma pessoa a outra. Existe um tratamento eficaz, bem como medidas de prevenção. Exemplos:

Mycobacterium tuberculosis, Bacillus anthracis e vírus da imunodeficiência humana (HIV).

o Grupo de Risco 4 (alto risco individual e coletivo). Um agente patogênico que causa geralmente

uma doença grave no homem ou no animal e que se pode transmitir facilmente de uma pessoa

para outra, direta ou indiretamente. Nem sempre estão disponíveis um tratamento eficaz ou

medidas de prevenção. Exemplos: vírus Ebola, vírus Lassa e vírus Marburg.

A classificação anterior é válida exclusivamente para o trabalho laboratorial. A cada grupo de

microrganismos correspondem normas estritas de trabalho, que abrangem desde a arquitetura do

laboratório e as características dos equipamentos até as precauções que devem ser tomadas pelos

profissionais e a forma como o lixo será descartado.

O conceito de biossegurança se complementa com o de biosseguridade, isto é, o conjunto de

medidas de proteção de uma instituição e dos trabalhadores necessárias para evitar a perda, o roubo,

o uso incorreto ou a liberação intencional de patógenos e toxinas (bioterrorismo). Um exemplo é o

envio de carta com antraz depois do atentado das Torres Gêmeas em Nova York (2001), mas existem

outros relacionados com aspectos econômicos, tais como a disseminação de pragas agrícolas do café,

do cacau, da soja etc.

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FIGURA 3.3. Logotipos utilizados como indicação de risco biológico

Biossegurança Biosseguridade

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OS MICRORGANISMOS COMO AGENTES BIOLÓGICOS

A Tabela 3.5 apresenta uma lista dos principais agentes biológicos microbianos e suas utilizações.

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TABELA 3.5. Principais destaques entre os agentes biológicos microbianos

ARQUEOBACTÉRIAS UTILIZAÇÃO

Thermus aquaticus Isolada em uma poça do parque nacional de Yellowstone (Estados Unidos), esta bactéria produz uma enzima que copia o DNA a uma temperatura alta. Esta enzima permite obter milhões de cópias de um fragmento de DNA em um processo automatizado que revolucionou a Biotecnologia, chamado PCR (Polymerase Chain Reaction ou Reação em cadeia da polimerase).

Bactérias metanogênicas Vivem em lugares onde há ausência de oxigênio, seja no tubo digestivo de alguns animais (gado, cupins) ou nos pântanos. Estas bactérias transformam o acetato resultante da degradação de celulose por outras bactérias em metano, um gás combustível.

ALGAS UTILIZAÇÃO

Spirulina O seu alto teor proteico, que corresponde a 60% do peso seco, lhe confere um elevado valor nutritivo; as proteínas representam aproximadamente 2% do peso seco da batata e 6-10% do trigo. Quando da chegada dos espanhóis, os astecas já preparavam umas bolachas (tecuitlatl) com a Spirulina coletada no lago Texcoco. Na África, no lago Tchad, ainda hoje ela é coletada e consumida como alimento. Spirulina, assim como Chlorella, são vendidas em tabletes como complemento nutritivo.

Dunaliella Acumula glicerol em condições de alta salinidade, com o qual consegue evitar a desidratação. Pode crescer no Mar Morto, sendo também cultivada em tanques ou lagoas, perto do Mar Vermelho, para a extração de outros produtos metabólicos

(glicerol e -caroteno).

FUNGOS UTILIZAÇÃO

Saccharomy ces cerevisiae Conhecido como levedo de cerveja ou levedura, é utilizado na preparação de alimentos (pão, biscoitos, fermento de padaria) e de bebidas (cerveja, vinho e destilados), assim como na produção de outras substâncias de importância industrial (etanol, vitaminas e outros metabólitos). A levedura cresce facilmente em laboratório. Também pode ser manipulada geneticamente. Nos fermentadores ou biorreatores industriais, onde se multiplica rapidamente a partir de matérias-primas de baixo custo, ela permanece ativa durante períodos longos e, ao concluir o processo, pode ser separada por filtração ou centrifugação. Com 12.000.000 de pares de bases e 6.000 genes em 16 cromossomos, Saccharomyces cerevisiae foi, em 1997, o primeiro organismo eucariótico a ter o seu genoma sequenciado.

Aspergillus Algumas espécies alcançam grande importância industrial, como A.niger, utilizada para a produção de ácido cítrico ou de enzimas (em linhagens modificadas geneticamente).

Penicillium Algumas espécies são utilizadas na indústria farmacêutica (penicilina) ou indústria de alimentos (queijos azuis, como o Roquefort e o Gorgonzola; queijo Camembert).

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OS MICRORGANISMOS

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EUBACTÉRIAS UTILIZAÇÃO

Bactérias lácticas Os gêneros Lactobacillus e Streptococcus são responsáveis por vários processos, tais como a elaboração de queijos e de iogurtes, o envelhecimento dos vinhos, a conservação de alimentos (sauerkraut ou repolho fermentado, silagem para o gado); a produção de ácido láctico, um aditivo utilizado na indústria de alimentos como acidulante e estabilizante.

Bacillus thuringiensis Este microrganismo prolifera no solo e na superfície das plantas, sintetizando uma toxina fatal para as larvas de insetos. Esta é produzida comercialmente há mais de 40 anos, representando 90% das vendas de inseticidas biológicos e reduzindo a necessidade de aplicação de pesticidas químicos nas lavouras. Nos últimos anos, o gene codificador da toxina tem sido transferido a plantas (algodão, milho) para que estas sintetizem diretamente o inseticida.

Streptomyces Além do cheiro característico da terra removida, este gênero de bactérias do solo produz substâncias antibióticas (estreptomicina, tetraciclina, eritromicina), antifúngicas (nistatina), herbicidas, antitumorais e supressoras de rejeição a transplantes.

Pseudomonas Várias linhagens são utilizadas na eliminação de poluentes. Algumas quebram moléculas de hidrocarbonetos, como os existentes nos acidentes de derramamento de petróleo; outras podem remover o mercúrio aquático.

Agrobacterium tumefaciens Agente patogênico para as plantas dicotiledôneas que desenvolvem um tumor ou galha quando infectadas. Com a remoção de um gene, perde a capacidade de provocar tumores, conservando a capacidade infecciosa, utilizada na engenharia genética de vegetais.

Bactérias butíricas Na indústria têxtil, Clostridium butiricum libera as fibras vegetais durante a maceração do cânhamo e do linho. Clostridium acetobutyricum é utilizado na produção industrial de acetona e butanol. Clostridium botulinum produz uma toxina poderosíssima; calcula-se que um grama desta bastaria para matar um milhão de pessoas. A ingestão de conservas contaminadas e mal esterilizadas resulta quase sempre em um desfecho fatal. Devido a sua ação inibitória da contração muscular, a toxina botulínica é utilizada em concentrações muito pequenas, para reduzir as rugas e marcas de expressão durante certo tempo (efeito cosmético).

Escherichia coli Descoberta em 1855, esta bactéria Gram-negativa vive no trato digestivo do homem e de outros animais. Tem forma de bastonete (0,002 mm de comprimento, 0,0008 mm de diâmetro), 1 a 4 moléculas de DNA e 15.000 a 30.000 ribossomos. Flagelos e pelos permitem que se movimente rapidamente.

Algumas linhagens são patogênicas, podendo contaminar os alimentos (carne, leite, vegetais), que devem ser cozidos adequadamente. Os seus requerimentos nutricionais básicos são simples. Água, sais minerais, uma fonte de nitrogênio e uma fonte de energia. Em condições adequadas, se divide a cada 20-40 minutos; também pode se reproduzir de maneira sexuada (conjugação).

Devido à facilidade com que ela pode ser cultivada no laboratório, Escherichia coli tem se tornado uma ferramenta indispensável para estudos bioquímicos e genéticos, incluindo a Engenharia Genética. O seu genoma compreende 4,6 milhões de pares de bases que codificam em torno de 4.000 proteínas diferentes.

A introdução de transgenes em Escherichia coli K12, uma linhagem inofensiva de laboratório, possibilitou os primeiros processos de produção de insulina, de interferon e de hormônio de crescimento. Entretanto, por se tratar de uma célula procariótica, nem sempre é a melhor opção de "fábrica" para a síntese de produtos de origem animal ou vegetal, tendo sido aos poucos substituída por outras células eucarióticas, como a levedura.

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C A P Í T U L O 4

ENZIMAS E ANTICORPOS

AS PROTEÍNAS

Todos os organismos estão formados por água e moléculas de diversos tipos, inorgânicas e orgânicas

(Figura 4.1). Entre estas últimas, há um grupo de macromoléculas, as proteínas, que participam em

numerosas atividades, cumprindo um papel fundamental para os seres vivos (Tabela 4.1). Pertencem

a este grupo as enzimas, moléculas de ação catalítica, e os anticorpos, moléculas que participam na

defesa do organismo.

----------------

FIGURA 4.1. A composição química de uma bactéria

TABELA 4.1. As funções das proteínas no organismo

FUNÇÃO EXEMPLOS

Componentes estruturais Queratina do cabelo, colágeno da derme, actina e miosina das fibras musculares.

Substâncias de reserva Albumina do ovo, caseína do leite.

Ação catalítica Enzimas que controlam as reações químicas celulares.

Outras Transmissão de informação (hormônios proteicos), participação nos mecanismos de

defesa (anticorpos, citocinas), transporte e armazenamento de pequenas moléculas

(hemoglobina).

Outras moléculas (30%) Água (70%)

Íons, moléculas pequenas (4%) Fosfolipídios (2%) DNA (1%) RNA (6%) MACROMOLÉCULAS Proteínas (15%) Polissacarídeos(2%)

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ENZIMAS E ANTICORPOS

33

FIGURA 4.2. Aminoácidos e proteínas

----------------

ESTRUTURA

As proteínas são macromoléculas formadas por 20 aminoácidos diferentes, que se distinguem por ter,

unidos ao átomo de carbono, um grupo amino (básico), um grupo carboxila (ácido) e um radical

variável (Figura 4.2 A). A presença de um carbono assimétrico resulta em duas formas moleculares (L)

e (D) que diferem por suas propriedades ópticas.

Os aminoácidos que compõem as proteínas correspondem à forma (L). A reação de condensação

entre o grupo carboxila de um aminoácido e o grupo amina de outro cria uma ligação peptídica (Figura

4.2 B). A união de vários aminoácidos forma uma cadeia peptídica que se caracteriza não só pelo

número e tipo de aminoácidos que a compõem, como pela sequência em que estes se encontram,

denominada estrutura primária.

Ao se estabelecerem ligações entre os grupos que formam os enlaces peptídicos, a cadeia adota

uma estrutura regular ou estrutura secundária, geralmente em forma de hélice ou de folha. As

interações entre as cadeias laterais dos aminoácidos causam o dobramento da proteína, resultando

uma configuração espacial que é chamada de estrutura terciária. A forma final de uma proteína

dependerá ainda da associação entre vários polipeptídios, no que se denomina de estrutura

quaternária (Figura 4.2 C).

Quando sintetizada dentro da célula, uma proteína adotará espontaneamente a configuração

A. Fórmula dos aminoácidos AMINOÁCIDO 1 AMINOÁCIDO 2 Grupo carboxila Grupo carboxila

Grupo amino Grupo amino Cadeia lateral Cadeia lateral

B. Formação da união peptídica Aminoácido 1 Aminoácido 2 União peptídica

C. Estrutura de uma proteína Aminoácidos Folha pregueada Hélice (Conformação β) (Conformação α) α hélice

Folha pregueada ESTRUTURA PRIMÁRIA ESTRUTURA SECUNDÁRIA ESTRUTURA TERCIÁRIA ESTRUTURA QUATERNÁRIA

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espacial que decorre de sua estrutura primária. Fatores ambientais como o pH, a concentração salina

ou a temperatura podem causar alterações momentâneas ou definitivas na forma da molécula.

O PROTEOMA

Uma das grandes surpresas reveladas pelos estudos do genoma humano foi encontrar um número

baixo de genes codificadores de proteínas, inferior ao esperado quando considerada a diversidade de

proteínas necessárias para o funcionamento celular. Diferentes tipos de processamento no núcleo e

modificações das proteínas no citoplasma explicam como, a partir do pequeno número de genes

conhecido, se formam todas as proteínas necessárias.

Essas observações chamaram a atenção sobre o proteoma, definido como o conjunto de proteínas

que uma célula, um tecido ou um organismo expressam em um momento dado, sob determinadas

condições. Também deram origem a uma nova disciplina, a proteômica.

Diferente do genoma que permanece essencialmente constante no tempo e em todas as células do

organismo, o proteoma abrange uma infinidade de variantes proteicas, diferentes em cada célula e a

cada momento. Publicado em 2014, o primeiro rascunho do proteoma humano identificou os produtos

correspondentes a 84% dos genes codificadores de proteínas, que representam 1,5% do genoma.

As aplicações da proteômica abrangem desde os estudos estruturais para elaborar modelos

tridimensionais até a identificação das proteínas associadas a uma organela, descobrindo sua função

e sua relação com outras proteínas. Também compreendem estudos da expressão quali e quantitativa

das proteínas em duas condições, uma normal e a outra alterada por stress ou doença.

Na área de saúde, as modificações do proteoma em células normais e cancerosas possibilitam a

identificação de biomarcadores para diagnóstico e monitoramento dos tratamentos. Em agronomia, a

proteômica pode esclarecer a inter-relação patógeno-hospedeiro nas infecções microbianas ou na

resposta das plantas aos animais herbívoros. Na área de microbiologia possibilita o controle de

qualidade nas diferentes etapas de produção de alimentos, com ênfase em aspectos de biossegurança.

AS BASES DE ALGUMAS TÉCNICAS LABORATORIAIS

O estudo das proteínas depende do objetivo a alcançar. Se este for simplesmente a obtenção de uma

proteína para pesquisa ou uso comercial, as etapas a seguir envolverão sua separação, purificação e

medida da concentração e/ou quantidade obtida. As técnicas bioquímicas utilizadas são clássicas e

dependem dos recursos disponíveis. Mas se o objetivo for a determinação das estruturas primária,

secundária e terciaria dessa proteína, as técnicas são bem mais complexas.

CROMATOGRAFIA

A cromatografia permite separar as substâncias de uma mistura com fins analíticos e preparativos.

Está baseada na migração diferencial das moléculas de uma mistura, colocada em uma fase móvel,

sobre um suporte estacionário ou matriz (Figura 4.3). A separação obedece a três tipos de mecanismos:

o Troca iônica. A matriz está formada por pequenas partículas carregadas que retêm as moléculas de

carga contrária. Como a associação depende de fatores como o pH e a força iônica da solução, a

modificação destes fatores permite controlar a separação.

o Filtração em gel. A matriz consiste em partículas porosas que separam as proteínas em função de

seu tamanho, como uma peneira molecular.

o Afinidade. As partículas da matriz estão unidas por ligações covalentes a moléculas (enzimas,

anticorpos) que interagem com a proteína de interesse. Para liberar a proteína retida na coluna,

muda-se o pH ou a concentração salina. Desse modo, consegue-se a proteína purificada.

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ENZIMAS E ANTICORPOS

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FIGURA 4.3. Cromatografia em coluna

O processo está baseado na velocidade de migração diferencial das moléculas proteicas em uma matriz imersa

em um solvente.

FIGURA 4.4. Eletroforese

Separação dos peptídeos de uma mistura, por migração diferencial em um campo elétrico.

FIGURA 4.5. Difração de raios X

Amostra Solvente Matriz Saída do solvente Tempo Frações coletadas

Mistura de peptídeos Cátodo Ânodo Aplicação de um campo elétrico Migração e separação dos peptídeos

Raios X

Cristais Difração dos Raios X Filme

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Diferentes modalidades dependem das características da fase estacionária: cromatografia em papel,

em camada delgada, cromatografia em gás, cromatografia líquida etc. Na cromatografia em coluna, a

separação das proteínas de uma mistura depende da estrutura da matriz, sólida e permeável, que se

encontra imersa em um solvente. A resolução é maior com a técnica denominada HPLC (do inglês,

High-Pressure Liquid Chromatography), que separa os aminoácidos de uma mistura.

ELETROFORESE

Uma técnica analítica fundamental é a eletroforese, baseada na migração diferencial de moléculas

ionizadas colocadas em um campo elétrico. Se a carga for positiva, elas migrarão para o polo negativo

ou cátodo e, inversamente, se ela for negativa, a migração ocorrerá na direção do polo positivo ou

ânodo (Figura 4.4). Por outro lado, moléculas de menor peso molecular migram mais rapidamente que

moléculas maiores.

Se uma mistura de peptídeos for colocada em um campo elétrico, eles migrarão de acordo com sua

carga, forma e tamanho, formando cada um deles uma banda característica que será visualizada

mediante um corante ou uma reação química específica. Observe-se que a carga de um peptídeo

resulta da soma das cargas correspondentes aos grupos amina e carboxila terminais e dos radicais dos

aminoácidos que o compõem, e que essa carga varia com o pH do meio.

A eletroforese permite separar os componentes de uma mistura. Existem numerosas variações da

técnica em função do suporte (papel de filtro, sílica-gel, membranas de acetato de celulose, gel de

agarose, amido ou poliacrilamida), da disposição da cuba (horizontal ou vertical), da direção da

migração (unidirecional ou bidirecional) etc. Na variante SDS-PAGE (do inglês SDS-Polyacrilamide Gel

Electrophoresis), por exemplo, as proteínas desnaturalizadas com dodecilsulfato de sódio (SDS)

migram em um gel de poliacrilamida.

OUTRAS TÉCNICAS

Utilizando métodos de ionização adaptados às moléculas biológicas como o MALDI (do inglês, Matrix

Assisted Laser Desorption/Ionization), a espectrometria de massa se tornou nos últimos anos uma

ferramenta indispensável na identificação de proteínas, por comparação da massa molecular com

outras de um banco de dados. Também fornece uma análise estrutural da molécula, indicando a

sequência de aminoácidos.

A espectrometria de massa permite estudar o conjunto de proteínas de um organismo (proteoma)

e dissecar as interações das proteínas com outras moléculas. Por ser um método automatizado e

rápido, tem alcançado múltiplas aplicações em farmacologia e diagnóstico.

Os métodos mais adequados para determinar a estrutura tridimensional das proteínas são a

ressonância magnética nuclear (NMR) e a cristalografia de raios X. O primeiro revela a estrutura

atômica tridimensional de uma macromolécula em uma amostra em solução, aplicando um campo

magnético e interpretando o espectro resultante. O segundo fornece uma imagem digital

tridimensional da molécula, baseada na difração dos raios X ao atravessar um cristal (Figura 4.5).

A bioinformática é uma ferramenta fundamental para a modelagem molecular e a interpretação

dos dados. Existem hoje bases de dados de sequências de proteínas de diferentes organismos que

permitem a identificação de moléculas e a comparação de sequências similares.

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AS ENZIMAS

A CATÁLISE ENZIMÁTICA

As reações químicas que ocorrem nos seres vivos dependem da atividade catalítica de um tipo de

proteínas, as enzimas. Estas moléculas agem diminuindo a energia de ativação necessária de uma

reação química, sendo capazes de promovê-las e acelerá-las, sem ser alteradas ou destruídas.

A molécula de enzima reconhece um substrato específico (S), formando com ele um complexo

molecular ou estado de transição (SE). O encaixe no sítio ativo da molécula facilita a transformação do

substrato no(s) produto(s) da reação (P). A enzima é recuperada no fim da reação, podendo atuar

inúmeras vezes (Figura 4.6). A reação pode ser representada como a seguir:

A primeira característica das enzimas é a especificidade; uma enzima como a lactase, que opera sobre

a lactose, não agirá sobre a sacarose; duas enzimas que hidrolisem o amido poderão fazê-lo cortando

a molécula de maneira diferente, como a -amilase e a -amilase. A segunda é que, em função de sua

origem biológica, as enzimas são biodegradáveis e agem em condições brandas de temperatura e pH.

A ação enzimática depende do pH, da temperatura, da presença de cofatores inorgânicos (zinco,

ferro, cobre) e/ou orgânicos (coenzimas, muitas das quais são vitaminas). Os metais pesados alteram

a estrutura molecular da enzima de maneira irreversível, impedindo sua ação catalítica (desnaturação).

Uma inibição da atividade enzimática ocorre quando moléculas muito parecidas com o substrato

competem com este para ocupar o sítio ativo da enzima (inibição competitiva), ou quando outras

moléculas se ligam a determinadas partes da enzima, alterando a estrutura espacial e dificultando o

encaixe com o substrato (inibição não competitiva).

OS DIVERSOS TIPOS DE ENZIMAS

Uma forma de classificar as enzimas é pelo tipo de reação que catalisam, acrescentando o sufixo “ase”

ao nome do substrato que é transformado: protease, lactase, amilase, lipase, celulase. Também se

pode adicionar “ase” ao nome da reação catalisada: hidrolase, oxirredutase. Quando combinadas as

duas regras anteriores, mencionam-se o nome do substrato e da reação catalisada adicionando ”ase”

como, por exemplo, em DNA-polimerase. Porém, algumas enzimas, como a renina ou a trombina,

conservam seus nomes tradicionais (Tabela 4.2).

IMPORTÂNCIA ECONÔMICA DAS ENZIMAS

As enzimas apresentam numerosas vantagens quando utilizadas como agentes biológicos em

processos tecnológicos: especificidade, operação em condições facilmente controláveis e

biodegradabilidade. De um modo geral, os tratamentos enzimáticos diminuem a carga poluidora dos

efluentes industriais.

O mercado se distribui fundamentalmente entre as proteases (59%), as carboidrases (28%) e as

lipases (3%), três grandes conjuntos de enzimas que são utilizadas por diversas indústrias; os 10%

restantes do mercado correspondem às enzimas analíticas e farmacêuticas (Tabela 4.3).

Nos sabões lava-roupas, as enzimas prometem ao consumidor roupas limpas e com aparência de

novas. Um exército constituído por proteases, amilases e lipases digere as manchas difíceis (sangue,

leite, molho de tomate, capim, chocolate, batom etc.), enquanto que as celulases removem as

microfibrilas de celulose das roupas.

S + E SE P + E

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Não sendo mais necessário esfregar as manchas, a limpeza se realiza com pouco esforço e sem

desgaste do tecido; como estas moléculas trabalham a temperaturas baixas, o consumo de energia é

menor. Com mais uma vantagem para o fabricante: as enzimas não representam mais que uma fração

muito pequena do sabão (0,4-0,8%), correspondente a 1% do seu custo. Em 1988, a empresa

Novozymes introduziu no mercado de detergentes a primeira enzima degradadora de lipídios

(Lipolase), obtida por engenharia genética.

As enzimas são empregadas também no acabamento de roupas. Para conseguir o aspecto usado,

os jeans eram lavados com pedras (stone washed), um processo que tinha o inconveniente de causar

a abrasão da maquinaria e o desgaste do tecido. Nos últimos anos, as pedras foram substituídas por

celulases, com resultados satisfatórios.

Os curtumes, em vez de excrementos de cachorro ou de pombo, se valem hoje de enzimas

pancreáticas para amaciar e desengordurar as peles.

Na indústria de alimentos e bebidas, as enzimas participam na produção de adoçantes, de pão,

biscoitos e bolachas e de queijos. Na extração de sucos de frutas, as pectinases aumentam

substancialmente o rendimento do processo, ao liberar o suco retido na pectina das paredes celulares

vegetais. Também facilitam a clarificação de vinhos e cervejas.

----------------

FIGURA 4.6. O mecanismo da atividade enzimática

A. O modelo chave-fechadura

B. A enzima diminui a energia de ativação

Substrato Produtos

Enzima Complexo enzima-substrato Enzima

Reação sem enzima Energia de ativação (sem a enzima) Energia de ativação Reagente Reação (com a enzima) com enzima Nível inicial de energia Produtos Nível final de energia

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ENZIMAS E ANTICORPOS

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As enzimas são utilizadas em desodorantes e artigos para a higiene bucal. Em dermatologia e

cosmética, algumas das aplicações mais frequentes estão no combate ao envelhecimento (proteases,

lipases), no tratamento de acne e de caspa, no desbridamento e limpeza de ferimentos infetados e na

destruição de tecidos necrosados.

Como medicamentos, as enzimas são utilizadas em vários contextos, especialmente em

quimioterapia e nas terapias trombolíticas. E muitos entre os mais corriqueiros testes de diagnóstico

dependem de reagentes enzimáticos. As enzimas permitem a resolução de misturas de moléculas

racêmicas, nas que há duas formas isoméricas, tipo “mão direita” e “mão esquerda”, com diferente

atividade biológica. Desse modo, poderão ser evitados problemas como o da talidomida, um

medicamento que causou o nascimento de numerosos bebês com deformações congênitas, na década

de 1960. A tragédia teria sido consequência da presença no produto comercial da forma molecular

tipo “mão direita”, de ação teratogênica, junto ao tipo “mão esquerda”, de ação calmante.

Atualmente, estão sendo estudados métodos enzimáticos para eliminar os príons responsáveis pela

denominada “doença da vaca louca”. Também se cogita a utilização de enzimas para limpar áreas

contaminadas com agentes químicos como o gás sarin.

---------------

TABELA 4.2. A classificação internacional das enzimas

CLASSE TIPO DE REAÇÃO CATALISADA EXEMPLOS

Oxirredutases Reações onde se transferem elétrons. Desidrogenases, oxidases.

Transferases Reações onde se transferem grupos químicos. Transaminases, fosforilases.

Hidrolases Reações de hidrólise, isto é, de transferência de

grupos funcionais para a água.

Proteases, carboidrases, peptidases,

lipases.

Liases Adição de grupos a duplas ligações ou formação de

duplas ligações por eliminação de grupos.

Decarboxilases (renina, trombina).

Isomerases Produção de isômeros por transferência de grupos

dentro de moléculas.

Isomerases, mutases.

Ligases Formação de ligações C-C, C-S, C-O e C-N por

reações de condensação.

Sintetases.

TABELA 4.3. As enzimas como agentes biológicos

AGENTES BIOLÓGICOS APLICAÇÕES

ENZIMAS

Indústria de alimentos e bebidas (clarificação de vinhos e sucos de frutas, substituição da

maltagem pelo tratamento do amido na elaboração de cervejas, fabricação de pão, biscoitos e

bolachas, produção de adoçantes, fabricação de laticínios, suplementação de rações animais).

Produtos de limpeza (detergentes e lava-roupas para a remoção de manchas difíceis, produtos

para limpar dentaduras e lentes de contato).

Indústria têxtil (desengomado de tecidos, acabamento de jeans).

Curtumes (amaciamento de couros).

Indústrias de papel e celulose (branqueamento de polpa de celulose).

Cosmética (produtos de higiene bucal, depilatórios, tratamento da acne e da caspa,

cosmocêuticos em geral).

Indústria farmacêutica (reagentes para uso em análises clínicas, nucleases para a manipulação

gênica, bioconversões).

Tratamentos médicos (combate de inflamações, edemas e lesões; dissolventes de coágulos

sanguíneos; agentes terapêuticos em transtornos digestivos).

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OS ANTICORPOS

Assim como os animais vertebrados, os invertebrados e as plantas devem se proteger do ataque de

parasitas (vírus e bactérias) e da proliferação de células estranhas ou aberrantes. Também devem

reparar órgãos e tecidos de modo a conservar sua integridade. Estudos recentes indicariam que todos

os seres vivos apresentam algum tipo de resposta imune inata e adquirida.

Dentro da estratégia de defesa de um vertebrado, os anticorpos são proteínas fundamentais no

reconhecimento do “eu” e na eliminação do “não eu” (antígeno). Uma parte importante da resposta

imune envolve a produção de anticorpos que reconhecem o antígeno, desencadeando os mecanismos

de destruição adequados.

A REAÇÃO ANTÍGENO- ANTICORPO

Os anticorpos são proteínas globulares (PM 150.000 - 200.000) que contém um número pequeno de

grupos carboidrato presentes no soro e em outros fluidos dos vertebrados. Sua produção é induzida

quando o sistema linfoide do indivíduo entra em contato com um antígeno (Ig = imunoglobulinas).

Existem diferentes tipos de imunoglobulinas que cumprem funções diferentes no organismo, mas,

devido a sua importância como agentes biológicos de importância para as biotecnologias, neste texto

nos referiremos aos anticorpos contidos na fração proteica do soro sanguíneo caracterizada por

eletroforese como -globulina.

A molécula de IgG é formada por duas cadeias polipeptídicas leves e duas pesadas em forma de Y,

ao qual se associa um pequeno número de grupos carboidrato. Uma parte da molécula é constante;

as regiões variáveis localizadas nas extremidades dos braços do Y respondem pelo reconhecimento do

antígeno (Figura 4.7).

Em condições experimentais de laboratório, essa reação antígeno-anticorpo ocorre quando os

reagentes se encontram em meio líquido e nas concentrações adequadas, sendo visualizada como uma

precipitação, se os antígenos estiverem dissolvidos em um meio líquido ou em um gel (poliacrilamida)

ou uma aglutinação, se os antígenos estiverem localizados sobre partículas (hemácias ou bactérias).

A união antígeno-anticorpo ocorre quando um anticorpo encontra no antígeno uma forma

complementar, geralmente parte de uma molécula livre ou ancorada na membrana celular. Um

antígeno pode ter várias destas formas (epítopos ou determinantes antigênicos) e ser reconhecido por

anticorpos diferentes (Figura 4.8).

----------------

FIGURA 4.7. A estrutura da molécula de anticorpo (IgG)

Cadeia leve Sítio de ligação com o antígeno Cadeia pesada Região constante Região variável

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ENZIMAS E ANTICORPOS

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A PRODUÇÃO DE ANTICORPOS NO ORGANISMO

As células responsáveis pela produção de anticorpos são os linfócitos B, que se formam na medula

óssea. Depois de um processo de diferenciação que envolve uma série de rearranjos genéticos, cada

linfócito pode reconhecer um único epítopo (Figura 4.9).

Ao encontrar o epítopo específico, o linfócito B prolifera, originando um clone de células secretoras

de anticorpos. Uma vez eliminado o antígeno, algumas células desse clone permanecerão no

organismo como células-memória. Em um contato posterior com o mesmo epítopo, as células-

memória darão início à resposta imune, que será mais rápida e mais intensa que a primeira.

Apesar de cada linfócito ser capaz de reconhecer um único epítopo, todos os linfócitos podem

reconhecer aproximadamente 108 epítopos diferentes, o que explica a eficiência da resposta imune.

----------------

FIGURA 4.8. Os anticorpos e o reconhecimento do antígeno

Observe-se que, ao compartilhar estruturas (determinantes antigênicos ou epítopos), alguns antígenos podem

ser reconhecidos por um mesmo anticorpo, dando origem a uma reação cruzada.

FIGURA 4.9. O encontro do linfócito B e do antígeno, e a seleção clonal

Antígeno 1 Antígeno 2 Anticorpos Anticorpos Antígeno 3 Antígeno 4 Anticorpos Anticorpos

Antígeno Linfócitos B de diferente especificidade Seleção do linfócito específico Proliferação celular e secreção do anticorpo correspondente

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A PRODUÇÃO DE ANTICORPOS NO LABORATÓRIO

Os anticorpos ocupam um lugar de destaque nos testes de diagnóstico clínico, por reunir duas

propriedades que os transformam em uma ferramenta ideal: especificidade e diversidade.

A injeção de animais (ratos, ovelhas, coelhos) com um antígeno induz em pouco tempo a produção

de anticorpos específicos que podem ser separados do soro sanguíneo do animal.

----------------

FIGURA 4.10. A produção de anticorpos no laboratório

. Obtenção de anticorpos policlonais B. Obtenção de anticorpos monoclonais Injeção de uma mistura de moléculas Linfócitos B Células de mieloma Hibridomas Cada hibridoma origina um clone Cada clone origina um único tipo de anticorpo

A: A produção de anticorpos policlonais. Recolhe-se o soro de um animal imunizado contra uma mistura de moléculas entre as quais está a molécula X. No soro se encontrarão misturados anticorpos de diferente especificidade, um dos quais reconhece X.

B: A produção de anticorpos monoclonais. Injeta-se em um animal a mesma mistura de moléculas; dias mais tarde, extrai-se o baço do animal e fusionam-se os linfócitos B (alguns dos quais reconhecem a molécula X) com células de mieloma. Os hibridomas são separados, cultivados e testados para identificar os que produzem anticorpos contra X.

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ENZIMAS E ANTICORPOS

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FIGURA 4.11. Os ensaios imunológicos

A. Associação dos anticorpos com moléculas fluorescentes

O anticorpo marcado pode reconhecer diretamente o antígeno (reação direta) ou reconhecer o anticorpo unido ao

antígeno (reação indireta).

B. Associação dos anticorpos com enzimas

O antígeno pode ser reconhecido por um anticorpo associado a uma enzima que reage com o seu substrato, formando um

produto colorido (reação direta). Também pode ser reconhecido por um anticorpo específico, e este por um anticorpo que

reconhece a fração constante do anticorpo. O segundo anticorpo está associado a uma enzima que, ao reagir com o seu

substrato específico, forma um produto colorido (reação indireta).

REAÇÃO DE IMUNOFLUORESCÊNCIA DIRETA Antígeno Anticorpo específico do antígeno, associado a uma molécula fluorescente REAÇÃO DE IMUNOFLUORESCÊNCIA INDIRETA Antígeno Anticorpo Anticorpo específico para a fração específico constante dos anticorpos, associado do antígeno a uma molécula fluorescente

REAÇÃO IMUNOENZIMÁTICA DIRETA Substrato específico da enzima Antígeno Anticorpo específico Formação de um produto do antígeno, associado à enzima colorido REAÇÃO IMUNOENZIMÁTICA INDIRETA Substrato específico da enzima

Antígeno Anticorpo Anticorpo específico para a específico fração constante dos anticorpos, Formação de um produto do antígeno associado à enzima colorido

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Se o antígeno utilizado possuir vários epítopos, no soro extraído se encontrará uma mistura de

anticorpos, chamados “policlonais”, resultantes da ativação de vários clones de linfócitos B, cada um

dos quais reconhece um dos epítopos do antígeno. Observe-se que, além dos anticorpos específicos,

o soro também terá anticorpos contra eventuais impurezas do antígeno, e anticorpos contra outros

antígenos aos que o animal esteve exposto anteriormente. Em consequência, a purificação de um soro

será um processo longo e complexo a ser repetido a cada extração de sangue do animal. Contudo,

reagentes de laboratório deste tipo foram utilizados normalmente até a década de 1980.

Não é possível cultivar separadamente os linfócitos porque sobrevivem pouco tempo in vitro. A

obtenção de clones que sintetizem anticorpos específicos contra um único epítopo (monoclonais) só

se tornou possível com o desenvolvimento da tecnologia de hibridomas (G. Kohler e C. Milstein, 1975).

Um hibridoma resulta da fusão entre um linfócito B e uma célula cancerosa de mieloma. Reunindo

as propriedades de ambas as células, cada hibridoma é capaz de sintetizar um único tipo de anticorpo

(monoclonal) e de se multiplicar indefinidamente no laboratório, seja em cultivo de tecidos, seja na

cavidade do peritoneu de um animal hospedeiro (Figura 4.10).

A UTILIZAÇÃO DOS ANTICORPOS

Os anticorpos monoclonais encontraram imediatamente aplicações, substituindo praticamente os

anticorpos policlonais, tanto na purificação de biomoléculas e células como nos testes de diagnóstico

clínico ou ambiental ou no controle de qualidade dos alimentos.

Anticorpos específicos fixados nas partículas de uma coluna de afinidade permitem separar

moléculas de uma mistura que circule por ela. Outra utilização extremamente engenhosa está na

separação de populações celulares em um aparelho denominado cell sorter. As células são marcadas

com anticorpos ligados a uma molécula fluorescente; ao passar através de raios laser, adquirem cargas

elétricas, sendo separadas mediante uma placa defletora do equipamento.

A visualização da reação entre o antígeno e o anticorpo se vê facilitada quando o anticorpo recebe

alguma marcação direta, fluorescente ou radiativa, ou indireta, por associação com uma enzima que,

em presença do substrato correspondente, forma um produto colorido. No Western blotting, por

exemplo, um anticorpo marcado reconhece a presença de uma proteína determinada em uma

amostra, após eletroforese e transferência a uma membrana de nitrocelulose.

Associados a uma molécula radiativa, os anticorpos são utilizados na dosagem de substâncias

presentes nos fluidos corporais, sendo quantificada a radioatividade por exposição de uma placa

sensível. Em cortes histológicos, o antígeno é localizado pelos anticorpos acoplados a uma molécula

fluorescente que possa ser identificada microscopicamente (Figura 4.11).

A obtenção de anticorpos contra a fração constante da molécula de anticorpos humanos

representa um avanço considerável na produção de reagentes para o diagnóstico clínico. Nos ensaios

imunoenzimáticos como o teste ELISA (do inglês, Enzyme-linked Immunosorbent Assay), que detecta

anticorpos específicos no soro humano e tem numerosas aplicações em diagnóstico, utilizam-se os

anticorpos acoplados a uma enzima que reage com o seu substrato, formando um produto colorido

(Figura 4.11).

A utilização de anticorpos monoclonais com fins terapêuticos demorou muito mais que o esperado.

Sendo produzidos por células de camundongo ou de rato, eles são reconhecidos como estranhos

quando injetados no homem, formando-se complexos imunes que lesionam gravemente os rins.

A fim de evitar essas reações, começaram a ser elaborados anticorpos monoclonais quiméricos (33%

de proteína animal) e humanizados (10% de proteína animal). Estes conservam parte das sequências

animais, especialmente nas partes que reconhecem o antígeno, sendo o restante da molécula

substituído por sequências humanas. A obtenção de anticorpos monoclonais humanos mediante

técnicas de engenharia genética abre novos caminhos para o diagnóstico e o tratamento de doenças

(Tabela 4.4).

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ENZIMAS E ANTICORPOS

45

TABELA 4.4. Os anticorpos como agentes biológicos

AGENTES BIOLÓGICOS APLICAÇÕES

Anticorpos

Purificação de moléculas.

Reagentes de laboratório.

Reagentes para diagnóstico.

Imunoterapias.

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

C A P Í T U L O 5

OS ÁCIDOS NUCLEICOS

OS ÁCIDOS NUCLEICOS

Embora descobertos em 1869, por F. Miescher, no pus das bandagens de ferimentos, o papel dos

ácidos nucleicos (DNA e RNA) na hereditariedade e no controle da atividade celular começou a ser

esclarecido apenas em meados do século XX.

O ácido desoxirribonucleico (DNA) carrega em sua estrutura as instruções necessárias para a

construção de um organismo, direcionando o desenvolvimento de suas características bioquímicas,

fisiológicas, anatômicas e, inclusive, algumas das comportamentais. Nos cromossomos o DNA se

encontra associado a diversas proteínas de importante ação regulatória. O ácido ribonucleico (RNA)

pode ser encontrado tanto no núcleo como no citoplasma.

As células procarióticas contêm um cromossomo circular de DNA e uma ou duas moléculas

adicionais de DNA extracromossômico, denominadas plasmídeos. Nas células eucarióticas, os

cromossomos estão formados por moléculas lineares de DNA. O DNA está localizado principalmente

dentro do núcleo celular, mas há também DNA em algumas organelas, como os cloroplastos e as

mitocôndrias.

Do ponto de vista químico, os ácidos nucleicos (ácido ribonucleico e desoxirribonucleico) são

macromoléculas formadas por unidades chamadas nucleotídeos, unidos por ligações químicas

covalentes (Figura 5.1). Um nucleotídeo resulta da associação de três tipos de elementos: uma

molécula de ácido fosfórico, um açúcar de cinco carbonos (ribose ou desoxirribose) e uma base cíclica

nitrogenada: adenina, citosina, guanina, timina ou uracila. Da união dos nucleotídeos entre as

extremidades 5' e 3', formam-se as cadeias de polinucleotídeos.

A DUPLA HÉLICE

Já na década de 1940, vários trabalhos indicavam que o material responsável pela hereditariedade era

o DNA, mas não se entendia “como” até 1953, quando J. D. Watson e F. Crick formularam um modelo

da estrutura tridimensional do DNA que, segundo suas próprias palavras, apresentava “considerável

interesse biológico”.

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

47

No modelo de Watson e Crick, duas cadeias de nucleotídeos formam uma figura parecida com uma

escada de corda torcida, a dupla hélice. Nessa escada, o ácido fosfórico e o açúcar são as partes

verticais (corrimãos) e as bases nitrogenadas são os degraus (Figura 5.1). As cadeias são antiparalelas,

isto é, se uma corre na direção 5' 3' a outra corre na direção 3' 5. Ambas as cadeias estão unidas

entre si por pontes de hidrogênio entre as bases, sendo que as ligações ocorrem sempre entre adenina

e timina (2 pontes) e entre citosina e guanina (3 pontes).

De acordo com o modelo, quando em um filamento a sequência de bases é AGTACG, no outro

filamento ela será TCATGC. Como as sequências são complementares, cada filamento pode servir

como molde para a síntese de uma nova molécula. E, no momento da divisão celular, cada célula-filha

poderá receber uma molécula semelhante à da célula-mãe (Figura 5.2).

O CÓDIGO GENÉTICO

O funcionamento de uma célula depende, fundamentalmente, de dois tipos de moléculas: os ácidos

nucleicos e as proteínas. Ambos estão relacionados, porque segmentos de DNA (genes) codificam a

estrutura primária de peptídeo. O código é simples: a cada trinca de bases corresponde um

aminoácido.

----------------

FIGURA 5.1. Composição química dos ácidos nucleicos

Observe-se a posição dos grupos 3´ e 5´ no açúcar

O FOSFATO Ácido fosfórico Íon fosfato Também representado como UM DESOXIRRIBONUCLEOTÍD O AÇÚCAR Também representado como na ribose na desoxirribose AS BASES

Purinas: adenina (A), guanina (G) Pirimidinas: citosina (C), timina (T) e uracila (U) Ao carbono 1’ da pentose Ao carbono 1’ da pentose

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48

FIGURA 5.2. A molécula de DNA

Na molécula de DNA, o pareamento das bases ocorre sempre entre uma purina e uma pirimidina: adenina e timina ou uracila; guanina e citosina. Na duplicação, a síntese de duas moléculas semelhantes permite que cada célula receba uma cópia do material genético, com as instruções necessárias para a construção e funcionamento do indivíduo. Observe-se que o processo de duplicação envolve numerosas enzimas, sendo bem mais complexo do que está representado.

TABELA 5.1: O código genético

Abreviaturas: Asp = Ácido Aspártico; Glu = Ácido Glutâmico; Ala = Alanina; Arg = Arginina; Asn = Asparagina; Cys = Cisteína;

Phe = Fenilalanina; Gly = Glicina; Gln = Glutamina; His = Histidina; Ile = Isoleucina; Leu = Leucina; Lys = Lisina; Met = Metionina;

Pro = Prolina; Ser = Serina; Tyr = Tirosina; Thr = Treonina; Trp = Triptófano; Val = Valina.

PRIMEIRA BASE

SEGUNDA BASE

TERCEIRA BASE URACILA (U) CITOSINA (C) ADENINA (A) GUANINA (G)

URACILA (U)

Phe

Phe

Leu

Leu

Ser

Ser

Ser

Ser

Tyr

Tyr

Stop

Stop

Cys

Cys

Stop

Trp

(U)

(C)

(A)

(G)

CITOSINA (C)

Leu

Leu

Leu

Leu

Pro

Pro

Pro

Pro

His

His

Gln

Gln

Arg

Arg

Arg

Arg

(U)

(C)

(A)

(G)

ADENINA (A)

Ile

Ile

Ile

Met

Thr

Thr

Thr

Thr

Asn

Asn

Lys

Lys

Ser

Ser

Arg

Arg

(U)

(C)

(A)

(G)

GUANINA (G)

Val

Val

Val

Val

Ala

Ala

Ala

Ala

Asp

Asp

Glu

Glu

Gly

Gly

Gly

Gly

(U)

(C)

(A)

(G)

A DUPLA-HÉLICE DE DNA A DUPLICAÇÃO DO DNA

Extremidade 3’ Nucleotídeo Nucleotídeo Extremidade 5’

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

49

A tabela 5.1 mostra quais aminoácidos correspondem às diferentes trincas de bases ou códons de

mRNA. Alguns são codificados por uma única trinca, como o triptófano (UGG) ou a metionina (AUG);

outros admitem vários códons que geram sinonímia como, por exemplo, a prolina (CCU, CCC, CCA,

CCG). O início da sequência é sinalizado por AUG, o códon correspondente a metionina, sendo este

aminoácido removido posteriormente; o fim da sequência é sinalizado por UAA, UAG ou UGA, três

códons que significam stop.

Mudanças na sequência de bases do DNA podem ter como consequência a substituição de um

aminoácido por outro. No exemplo da figura 5.3, se GUG for substituído por CGU, no peptídeo

correspondente a valina será substituída por leucina. Mas, em função da sinonímia do código, se a

trinca GUG for substituída por GUA ou GUC, o aminoácido codificado continuará sendo a valina. Perdas

ou adições de uma base modificam o resto da sequência do peptídeo.

A frequência com que ocorrem estas pequenas mudanças aumenta em presença de alguns agentes

químicos e físicos como a luz ultravioleta e os raios X.

A EXPRESSÃO GÊNICA

O FLUXO DA INFORMAÇÃO GENÉTICA

A informação codificada no DNA é transcrita em uma molécula mensageira que a leva até os

ribossomos onde, após a tradução da linguagem dos ácidos nucleicos à linguagem das proteínas, será

montado o peptídeo correspondente. Deste modo, se estabelece na célula um fluxo da informação

genética que segue em uma direção única: do DNA ao RNA, do RNA ao peptídeo (Figura 5.3).

----------------

FIGURA 5.3. O fluxo da informação genética

DNA Filamento codificador

Filamento molde TRANSCRIÇÃO E PROCESSAMENTO r RNA mRNA tRNA + aminoácidos Ribossomo TRADUÇÃO Transporta os aminoácidos Onde ocorre a síntese e os coloca no lugar adequado Peptídeo

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Uma exceção a esta regra é a dos retrovírus, cujo material hereditário é RNA e que contam com uma

enzima (transcriptase reversa) que lhes permite transcrever a informação no sentido RNADNA.

Na síntese de proteínas intervêm, basicamente, um RNA codificador (RNA mensageiro ou mRNA) e

dois RNAs não codificadores, o RNA ribossômico (rRNA) e o RNA de transferência (tRNA).

As células procarióticas e eucarióticas apresentam algumas diferenças em relação às etapas da

síntese de proteínas e aos mecanismos de regulação correspondentes (Figura 5.3). No entanto, em

ambos os tipos de organismos, a informação genética codificada no DNA é transcrita no mRNA e

traduzida no ribossomo com a participação dos tRNAs. O produto final é um peptídeo.

CÉLULAS PROCARIÓTICAS

Uma bactéria pode contar com aproximadamente 2.500 genes; nem todos funcionando

simultaneamente. Se houver lactose no meio (e faltar glicose), as bactérias sintetizarão aquelas

enzimas que possibilitem sua utilização. E se faltar o aminoácido triptófano no meio, produzirão os

vários tipos de enzimas necessárias para sintetizá-lo.

----------------

FIGURA 5.4. A organização e regulação dos genes nas células procarióticas

O funcionamento do óperon depende da função exercida pelos genes (degradação ou síntese). Por isso, a presença de lactose induz a transcrição do óperon lac, sendo sintetizadas várias enzimas necessárias para degradá-la; em ausência de lactose, o óperon deixa de funcionar. Já no óperon Trp, a presença de triptófano reprime a transcrição das enzimas necessárias para sintetizar esse aminoácido.

FIGURA 5.5. A organização e regulação dos genes nas células eucarióticas

As sequências sinalizadoras UTR não são traduzidas.

Gene Sequências reguladoras Sequências reguladoras promotoras da transcrição finalizadoras da transcrição UTR UTR DNA Unidade de transcrição Inclui as sequências iniciais e finais, os éxons e os íntrons

Início da transcrição Fim da transcrição

Óperon Gene Gene Gene regulador promotor operador Genes estruturais

Gene 1 Gene 2 Gene 3

Sequência transcrita Fim da transcrição

Em alguns óperons, o produto do gene regulador bloqueia a entrada da RNA-polimerase no operador; em outros a desbloqueia

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

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Isso se vê facilitado pela agrupação dos genes correspondentes em baterias (óperons), que são ligadas

ou desligadas em conjunto (Figura 5.4), permitindo que a célula se adapte rapidamente e com

economia de recursos às condições ambientais.

O processo de “ligar e desligar” envolve três regiões anteriores à sequência codificadora: o

promotor, o operador e o regulador. Para iniciar a síntese do mensageiro, a enzima RNA-polimerase

deve encaixar no promotor, de onde começará a se deslocar ao longo do gene. O deslocamento

depende de proteínas sintetizadas pelo gene regulador, que agem no operador de modo a abrir ou

bloquear a passagem. Este sistema regula a indução ou repressão da transcrição da sequência

codificadora.

Uma bactéria pode contar com aproximadamente 2.500 genes; nem todos funcionando

simultaneamente. Se houver lactose no meio (e faltar glicose), as bactérias sintetizarão aquelas

enzimas que possibilitem sua utilização. E se faltar o aminoácido triptófano no meio, produzirão os

vários tipos de enzimas necessárias para sintetizá-lo. Isto se vê facilitado pela agrupação dos genes

correspondentes em baterias (óperons), que são ligadas ou desligadas em conjunto (Figura 5.4),

permitindo que a célula se adapte rapidamente e com economia de recursos às condições ambientais.

Na célula procariótica, além dos genes funcionarem em bloco, a síntese proteica começa quando o

mRNA está ainda sendo transcrito, de maneira que a transcrição e a tradução são simultâneas. Uma

sequência específica que não é traduzida indica o sítio de união ao ribossomo.

CÉLULAS EUCARIÓTICAS

As bactérias não são as únicas que ligam e desligam os seus genes, mas, salvo em nematódeos, não

foram achados óperons nas células eucarióticas; os genes responsáveis por uma sequência de reações

metabólicas se encontram dispersos em um ou em vários cromossomos.

O controle da transcrição começa na compactação do cromossomo em redor das histonas e na

metilação de algumas bases, podendo dificultar o acesso da maquinaria de transcrição ao DNA. Esta

inclui fatores de ativação, fatores de transcrição e proteínas reguladoras, algumas das quais dependem

de outras sequências, estimuladoras e inibidoras, distantes do gene em até vários milhares de bases

(Figura 5.5). Fatores externos influenciam a expressão gênica nas células somáticas. No entanto,

estudos recentes indicam que esses efeitos epigenéticos podem gerar alterações nos gametas, sendo

transmitidos às seguintes gerações.

A TRANSCRIÇÃO

Ao reconhecer a presença dos fatores e proteínas reguladoras na região anterior ao gene, a RNA-

polimerase encaixa-se nas sequências promotoras da transcrição. Associada a outros fatores

adicionais, a enzima se desloca abrindo a dupla hélice e transcrevendo a sequência codificadora de um

ou outro filamento no RNA. A enzima avança na direção 5´- 3´, sendo que várias moléculas de RNA-

polimerase podem estar transcrevendo o mesmo gene simultaneamente em algo parecido com uma

fila indiana. Quando a RNA-polimerase encontra uma sequência finalizadora, a síntese acaba e a

molécula de RNA-polimerase será liberada.

Regiões denominadas UTR (do inglês untranslated regions), portadoras de sequências sinalizadoras

que não serão traduzidas, se localizam a montante e a jusante da unidade de transcrição. As sequências

reguladoras levam, além do sítio de união ao ribossomo, outras que podem determinar quando, por

quanto tempo e em que células o gene será transcrito.

O PROCESSAMENTO DO RNA TRANSCRITO

Nos organismos eucarióticos, a estrutura do gene é fragmentada (Figura 5.5). A sequência gênica é

transcrita por inteiro no RNA e, posteriormente, um mecanismo de “corte e reunião” irá eliminar

algumas das sequências intercalares. Estas permanecerão no núcleo (íntrons) enquanto as restantes

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(éxons) formarão o RNA mensageiro que sairá do núcleo na direção do citoplasma. O número e o

tamanho das sequências intercalares variam em diferentes genes.

As consequências biológicas deste mecanismo são importantes. Basta um número pequeno de genes

para codificar numerosas proteínas que serão sintetizadas utilizando as vias alternativas de “corte e

reunião”. Também permite que um único gene se expresse de maneira diferente em diversos

tecidos. O corte e reunião dos fragmentos não é a única modificação do RNA transcrito; este recebe

um revestimento inicial ou cap (7-metilguanosina) que o dirigirá ao ribossomo, e uma cauda de

poli(A) que lhe dará estabilidade na sua viagem até a maquinaria de tradução.

A TRADUÇÃO E O DESTINO DAS PROTEÍNAS

A síntese proteica se inicia depois do mRNA atravessar a membrana nuclear e migrar para o citoplasma.

Assim como a transcrição, a tradução envolve a participação de numerosas enzimas e proteínas

reguladoras.

Algumas moléculas de mRNA levam sequências sinalizadoras que as dirigem até os ribossomos

associados ao retículo endoplasmático, sendo as proteínas sintetizadas secretadas fora da célula.

Outras moléculas de mRNA serão traduzidas nos ribossomos livres no citosol, sendo as proteínas

resultantes utilizadas no mesmo lugar ou nas organelas celulares.

----------------

FIGURA 5.6. As etapas da síntese de proteínas (Recapitulação)

A. Célula eucariótica B. Célula procariótica Citoplasma DNA Núcleo

Íntrons Éxons mRNA DNA

Gene Proteínas TRANSCRIÇÃO hnRNA PROCESSAMENTO mRNA

mRNA

TRADUÇÃO

Proteína

Na célula eucariótica, o processamento envolve a adição de um revestimento inicial e de uma cauda de poli-A, além dos mecanismos de corte e reunião

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

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O mRNA reconhece o ribossomo mediante uma sequência específica, e a associação entre ambos dá

início à síntese peptídica. Cada tRNA carrega o aminoácido correspondente até o ribossomo, onde a

complementariedade entre seu anticódon e um dos códons do mRNA garante que este coloque o

aminoácido no lugar adequado na sequência.

Existem vários mecanismos de regulação. Um deles envolve a ação de proteínas associadas ao

complexo ribossômico, outro determina variações na vida média do mRNA e a tradução do mRNA por

vários ribossomos ao mesmo tempo.

O peptídeo sintetizado passará por diversas modificações e associações, até se constituir no

produto final ativo, uma proteína com uma estrutura quaternária determinada. Uma visão geral

comparativa da síntese proteica em células eucarióticas e procarióticas (Figura 5.6).

O COMPLEXO MUNDO DOS RNAs

A DIVERSIDADE EXISTENTE

Na síntese proteica, o mRNA carrega uma parcela de informação genética do DNA até os ribossomos,

estruturas celulares formadas por rRNA e proteínas onde ocorre a síntese proteica. Os aminoácidos

são carregados por um dos 61 tipos de tRNA, cada um dos quais é capaz de reconhecer

simultaneamente um aminoácido e um códon do mRNA. Tanto o rRNA como os tRNA são transcritos

a partir de genes não codificadores de proteínas.

A participação dos RNAs na regulação da expressão gênica é bem conhecida. As ribozimas, por

exemplo, são RNAs com capacidade catalítica que desempenham funções na replicação e no

processamento do mRNA, sem necessidade de nenhum componente proteico. A existência deste tipo

de moléculas é um argumento a favor da existência de um mundo de RNA prévio à aparição do DNA e

das proteínas. Outras moléculas de RNA, os riboswitches, agem como sensores afetando a expressão

gênica, em resposta a fatores ambientais ou metabólicos.

A atividade regulatória do RNA é possível devido à sua estrutura molecular, que permite o

pareamento com uma molécula de sequência complementar. E também a suas propriedades de se

associar a proteínas e de desenvolver uma atividade catalítica.

Nos últimos anos começou a ser desvendada a existência de pequenas moléculas de RNA não

codificadoras (sRNA, do inglês small RNA), que regulam as atividades celulares. Em procariontes, os

sRNAs determinam modificações metabólicas e estão envolvidos na defesa contra os vírus.

Em eucariontes, a variedade é muito ampla: os pequenos RNAs nucleares (snRNA) associados a

proteínas participam no mecanismo de corte e reunião e na remoção dos íntrons; os pequenos RNAs

nucleolares (snoRNA) processam o RNA ribossômico no nucléolo. Originados a partir de diferentes

moléculas precursoras, os microRNAs (miRNA) participam na repressão do mecanismo de tradução.

Novos tipos de RNA, de sequência mais longa (lncRNA, do inglês, long non coding DNA) cumprem

funções regulatórias, como a inativação do cromossomo X. Menos clara por enquanto é a função dos

RNAs transcritos antisense e dos transcritos a partir de pseudogenes, que sempre foram considerados

não funcionais.

INTERFERÊNCIA E SILENCIAMENTO GÊNICO

O fenômeno de interferência foi descoberto quando, com o objetivo de intensificar a produção de

pigmentos em petúnias, a inserção de um gene extra originou flores brancas em vez das flores O

fenômeno de interferência foi descoberto quando, com o objetivo de intensificar a produção de

pigmentos em petúnias, a inserção de um gene extra originou flores brancas em vez das flores

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ultracoloridas esperadas. Posteriormente, observou-se um fenômeno similar no desenvolvimento de

C. elegans, onde pequenas moléculas de RNA resultantes da clivagem de RNAs transcritos inibem a

tradução de diversos mRNAs.

Os microRNAs (miRNAs) são pequenas moléculas bifilamentares de 21 a 25 pares de nucleotídeos

que agem como silenciadores de mRNA, regulando a tradução. Sua descoberta, mostrando como esses

miRNA controlam a expressão dos genes, valeu a A. Fire e C. Mello o Prêmio Nobel de Medicina de

2006. Estima-se que existiriam entre 300 e 500 miRNAs regulando pelo menos a quarta parte dos genes

humanos.

Nos últimos anos, esse fenômeno de silenciamento gênico tem se transformado em uma

importante ferramenta de pesquisa. Sintetizadas no núcleo, as moléculas de miRNA de filamento

duplo são clivadas por enzimas no citoplasma, formando pequenos fragmentos de aproximadamente

20 nucleotídeos. A associação entre um pequeno fragmento de RNA e um complexo proteico (RISC, do

inglês RNA-induced silencing complex) desencadeia a degradação de um dos filamentos. O filamento

restante permanece associado a RISC, podendo parear com qualquer molécula de RNA, parcial ou

totalmente complementar, e causar sua degradação (Figura 5.7). Trata-se de uma forma de controle

da expressão gênica na célula, porque o miRNA afeta a tradução de qualquer RNA homólogo.

Por outro lado, do ponto de vista biológico, o fenômeno de silenciamento constituiria também uma

reação de imunidade inata das bactérias à infecção por vírus de RNA. O mecanismo de ação dos RNAs

envolvidos é semelhante ao do miRNA, porque utilizam a mesma maquinaria enzimática da célula.

Contudo, se no caso do miRNA de origem endógeno, descrito anteriormente, a molécula precursora

originava uma única molécula interferente, no caso da infecção por RNA exógeno formam-se vários

tipos de molécula interferente.

----------------

FIGURA 5.7. O silenciamento gênico

O silenciamento gênico é uma forma de controle da expressão gênica na célula, porque o miRNA interfere na

tradução de um mRNA homólogo; também é uma forma de resistência à infecção viral.

Molécula de miRNA de dois filamentos Complexo enzimático RISC (20 nucleotídeos aproximadamente) mRNA endógeno ou RNA viral

As duas moléculas são complementares (6 bases, mínimo) Pareamento parcial e bloqueio da tradução Pareamento total e destruição do RNA

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

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O fenômeno existe em bactérias, plantas, drosófilas, camundongos e em seres humanos. Ferramenta

poderosa no laboratório, a injeção na célula de um RNA artificial de sequência parcialmente

semelhante à do DNA de um gene determinado permite silenciar parcialmente sua expressão, de

maneira transiente e sem danificar a célula.

Espera-se que algumas das primeiras aplicações do knockdown por silenciamento de mRNA estejam

relacionadas com testes clínicos e com a repressão de genes implicados no câncer, na degeneração

macular devida à idade e na amiloidose.

O GENOMA HUMANO

O MAPEAMENTO DO GENOMA

O termo genoma designa o conjunto completo de cromossomos haploides que contém toda a

informação genética de um indivíduo. Na espécie humana, o genoma nuclear compreende as 24

moléculas de DNA que formam os diferentes cromossomos (22 autossômicos, X e Y). Devido à

presença de DNA nas mitocôndrias, existe também um genoma mitocondrial de herança

exclusivamente materna, que conta com 37 genes, incluindo os genes codificadores de tRNA e rRNA

utilizados na síntese proteica dentro dessa organela.

Em 1990, teve início o Projeto Genoma Humano (HGP, do inglês Human Genome Project), um dos

projetos científicos mais ambiciosos já realizados, envolvendo pesquisadores de mais de 18 países na

tarefa de mapear e sequenciar o DNA humano e também o de outros organismos.

O projeto encontrou grandes resistências, em parte devido a seu custo faraônico comparável aos

dos projetos Manhattan ou Apolo, em parte pelas consequências que poderia trazer para a sociedade.

A resposta ao público foi o lançamento como parte integral do projeto do programa The Ethical, Legal

and Social Implications (ELSI) Research Program de pesquisa básica e aplicada sobre as implicações

éticas, legais e sociais dos estudos sobre o genoma para os indivíduos, as famílias e as comunidades.

Paralelamente ao mapeamento do genoma humano, milhares de outros organismos (microrganismos,

plantas e animais) foram parcial ou totalmente sequenciados.

Em junho do ano 2000, o International Human Genome Sequencing Consortium e a Celera

Genomics, uma empresa privada norte-americana, anunciaram simultaneamente ter completado o

primeiro rascunho do genoma humano. Os resultados foram publicados em fevereiro de 2001, nas

revistas Nature e Science. Em abril de 2003, cinquenta anos depois da descoberta da dupla hélice, o

Consórcio anunciou ter completado 99% do mapeamento. Os seus resultados estão armazenados em

bancos de dados públicos que podem ser acessados via Internet. As principais conclusões podem ser

resumidas da seguinte forma:

o O número de bases no genoma humano chega a 3,2 bilhões, e o número de genes a um valor entre

20.000 e 25.000 genes; só 1,5% do genoma codificaria proteínas.

o O número de genes em organismos como a mosca Drosophila melanogaster ou o verme

Caenorrabditis elegans é três vezes menor. Compartilhamos com estes organismos alguns genes e

contamos com outros que são característicos dos vertebrados como, por exemplo, vários dos genes

referentes ao sistema imune.

o A densidade dos genes em diversos cromossomos e em diferentes partes deles varia. Existem

grandes espaços entre os genes, às vezes chamados de DNA-lixo. Sequências repetidas, não

codificadoras, cuja função direta ainda não é bem conhecida, ocupam pelo menos 50% do genoma.

o O tamanho dos genes é variável, sendo na média de 3.000 bases. Na realidade, o tamanho não

parece ter muita importância. Como boa parte dos genes poderia ser lida de diversos modos, o

número de proteínas poderia ser bem maior.

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o Independentemente de nossa origem étnica, compartilhamos com os outros seres humanos 99,9%

da sequência gênica.

o As diferenças entre os seres humanos se devem a variações de uma base em 3.000.000 de pontos

dentro e fora dos genes. Estas variações são denominadas polimorfismos de um nucleotídeo único

ou SNPs (do inglês, single nucleotide polymorphisms). Os SNPs podem dar informações sobre a base

genética da susceptibilidade a uma série de doenças ou servir como marcadores das mesmas

(doença cardiovascular, diabetes, artrite e cânceres).

o Em vários genes foram encontradas sequências associadas a doenças (câncer de mama, cegueira,

surdez, doenças musculares).

Vários países de América Latina (Argentina, Brasil, Chile e México) desenvolveram ou participam em

projetos de genômica. De um modo geral, esses projetos envolvem parcerias entre instituições

públicas e privadas, sendo beneficiados por acordos internacionais com países desenvolvidos (Estados

Unidos, França, Alemanha) ou por redes de cooperação inter-regionais (Brasil, Argentina, Chile,

Uruguai e Paraguai). Um dos primeiros êxitos foi o sequenciamento por pesquisadores brasileiros da

bactéria Xylella fastidiosa, causadora da praga do amarelinho das videiras (2000).

OS AVANÇOS POSTERIORES

Nos últimos anos, os custos e o tempo necessários para sequenciar um genoma diminuíram

extraordinariamente. Atualmente, muito do trabalho feito por robôs e computadores está altamente

automatizado, e a informação está armazenada em grandes bancos de dados, acessíveis pela Internet.

O desenvolvimento da Bioinformática, um conjunto de novas tecnologias que utiliza métodos

computacionais e matemáticos para analisar a informação, tem sido fundamental para o progresso

dos estudos sobre os genomas. Muitos dos estudos atuais não são mais feitos in vivo nem in vitro, mas

in silico.

Ao Projeto Genoma sucederam outros projetos, alguns deles concluídos e outros em andamento,

desenvolvidos por redes de cooperação internacional. O projeto HapMap (do inglês, Map of Human

Genetic Variation) publicou um catálogo das variações genéticas que ocorrem nos seres humanos.

O projeto ENCODE confirmou ser pouco mais de 20.000 o número de genes codificadores de

proteínas e descobriu que 80% do DNA restante cumpre alguma função reguladora, de modo que não

pode ser considerado “lixo”.

O Projeto Epigenoma Humano irá identificar, catalogar e interpretar os padrões de metilação dos

genes humanos em cada tecido. Como estes padrões mudam em resposta a fatores exógenos, o

epigenoma pode ser um elo unindo genes, doença e ambiente.

O Projeto Genoma do Câncer fornece informação sobre a doença e especialmente sobre o câncer

de pulmão e o melanoma maligno.

O Projeto dos 1000 Genomas visa sequenciar o conjunto de um número amplo de pessoas. O

Projeto UK10K do Wellcome Trust, lançado em 2010, visa comparar os genomas de 4.000 pessoas

saudáveis com os de 6.000 pessoas afetadas por uma doença de presumida origem genética.

A Genômica surgiu como uma nova disciplina que tenta responder a algumas questões

fundamentais: Onde estão os genes? O que faz cada gene? Como diferem os organismos em relação a

seus genes? Cada uma dessas perguntas criou especialidades como a Genômica estrutural, a Genômica

funcional ou a Genômica comparativa.

No rastro do Genoma, outras perguntas começam a ser formuladas e surgem outras áreas de

investigação:

o A transcriptômica, concernente ao RNA transcrito ou transcriptoma, isto é, aos padrões de

expressão gênica.

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OS ÁCIDOS NUCLEICOS

57

o A proteômica, referente ao conjunto de proteínas da célula ou proteoma, que varia ao se

diferenciarem as células e em resposta a estímulos ambientais.

o A metabolômica, relativa ao conjunto de substratos e subprodutos de reações enzimáticas que

incidem no fenótipo celular.

DNA E RNA COMO AGENTES BIOLÓGICOS

A genômica encontrou aplicações imediatas no campo médico e farmacológico, como os testes

genéticos e de medicamentos novos (Tabela 5.2). Em função da importância econômica dos produtos

farmacológicos, a questão das patentes voltou a estar no centro das atenções. Em 2013, a Suprema

Corte dos Estados Unidos determinou que o DNA natural não pode ser patenteado. A discussão está

centrada atualmente em redor dos procedimentos e de sequências especialmente desenhadas para

testes de diagnóstico.

Nas áreas de agricultura e saúde, a interferência gênica tem sido utilizada na triagem de genes

funcionais em cultivos celulares e organismos modelos. Sabe-se que cumpre uma função reguladora

no amadurecimento das células sanguíneas em mamíferos e está envolvido em vários tipos de câncer,

obesidade e doenças autoimunes. Vários medicamentos baseados no fenômeno de interferência

gênica se encontram em fase de testes clínicos, sendo que a principal dificuldade está na administração

do RNA.

----------------

TABELA 5.2. Os ácidos nucleicos (DNA e RNA) como agentes biológicos

AGENTES

BIOLÓGICOS

APLICAÇÕES

DNA, RNA e

genômica

Identificação de microrganismos patogênicos.

Controle da qualidade dos alimentos.

Medicina molecular (diagnósticos, tratamentos personalizados, terapias

gênicas).

Testes genéticos (diagnósticos, avaliação dos riscos de saúde).

Agronomia e pecuária (métodos seletivos mais eficientes).

Indústria farmacológica (proteínas terapêuticas, vacinas recombinantes e

de DNA).

Prática forense (identificação das pessoas).

Estudos antropológicos e evolutivos.

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

C A P Í T U L O 6

BIOPROCESSOS

BIOPROCESSOS, PROCESSOS FERMENTATIVOS E INDÚSTRIA

A produção de vinhos e cervejas é o primeiro processo fermentativo desenvolvido em escala industrial.

Ao longo do século XX, a expansão da Microbiologia Industrial possibilitou, mediante o

desenvolvimento de processos baseados no metabolismo microbiano, a produção de diversas

substâncias (acetona, butanol, etanol, ácido cítrico, antibióticos etc.). Atualmente, as fermentações

encontram aplicações novas, tanto no tratamento ambiental como na produção de alimentos e

aditivos, de produtos químicos e de medicamentos.

Tradicionais ou revigorados pelas possibilidades oferecidas pela manipulação gênica, os

bioprocessos ou "fermentações" visam um dos seguintes objetivos:

o A multiplicação de microrganismos para a obtenção de biomassa (leveduras, rizobios, proteína de

célula única);

o A obtenção de produtos microbianos (antibióticos, aditivos, álcool, enzimas etc.);

o A conversão de um substrato em outro, por ação de microrganismos ou de enzimas

(transformação de esteroides, isomerização de glicose em frutose) ou

o A purificação de um solvente (tratamento de efluentes, transformação de algum poluente em

alguma substância facilmente degradável etc.).

Por motivos históricos, os biotecnólogos ainda utilizam o termo processos fermentativos para qualquer

processo microbiano operado em grande escala, independentemente de ser ou não uma fermentação.

O recipiente onde ocorre o processo é chamado de biorreator ou fermentador (Figura 6.1). Células

animais e vegetais também podem ser cultivadas em escala, como será visto no próximo capítulo sobre

cultura de tecidos.

OS MICRORGANISMOS INDUSTRIAIS

NOÇÕES SOBRE O METABOLISMO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO

Denominamos metabolismo o conjunto de reações químicas de degradação (catabolismo) e de síntese

(anabolismo) de substâncias em um organismo. As primeiras liberam energia, as outras a consomem.

As células e a maioria dos microrganismos retiram dos compostos orgânicos a energia que

precisam, para a manutenção de sua estrutura e para suas atividades. Nas vias catabólicas, a

degradação de compostos orgânicos em moléculas menores libera energia; uma parte desta será

acumulada sob a forma de ATP (trifosfato de adenosina), e a restante dissipada como calor.

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OS BIOPROCESSOS

59

Respiração e fermentação são as principais vias catabólicas (Figura 6.2). A quantidade de energia

liberada e os produtos finais diferem se a oxidação do composto orgânico for total ou parcial. Na

glicólise, a glicose é degradada até uma molécula de três carbonos, o piruvato. Em presença de

oxigênio, a entrada do piruvato no ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa permitem a quebra total da

glicose em CO2 e H2O, liberando uma grande quantidade de energia sob a forma de ATP (respiração

aeróbia).

Mediante a redução do piruvato ou de algum de seus derivados (fermentação), vários

microrganismos geram outras substâncias orgânicas: acetona, butanol, etanol, ácido láctico, ácido

acético, glicerol etc.

Estas reações ocorrem geralmente em ambientes onde o substrato é abundante, sendo pequena

a quantidade de energia obtida. Dependendo das condições ambientais, isto é, da presença ou

ausência de oxigênio, algumas leveduras e bactérias (assim como as células musculares) podem

respirar ou fermentar.

A respiração e algumas fermentações são representadas mediante equações, como a seguir:

o Respiração aeróbia:

C6H12O6 + 6 O2 +38 ADP + 38Pi 6 CO2 + 6 H2O + 38 ATP

Glicose

o Fermentação alcoólica (leveduras como S. cerevisiae e algumas bactérias):

C6H12O6 + 2 ADP + 2Pi CH3 CH2OH + CO2 + 2 ATP

Glicose Etanol

o Fermentação láctica (bactérias como Streptococcus e Lactobacillus):

C6H12O6 + 2 ADP + 2Pi CH3 CHOH COOH + 2 ATP

Glicose Ácido láctico

No metabolismo, os caminhos de degradação e de síntese se entrecruzam. Em determinados pontos

da via catabólica da glicose, outras moléculas (aminoácidos, ácidos graxos) convergem para a produção

de energia e de pequenas moléculas simples (CO2, H2O e NH3). Inversamente, alguns dos compostos

intermediários do catabolismo são os pontos de partida para vias anabólicas.

Entretanto, as vias metabólicas não são reversíveis: o caminho seguido na degradação de uma

substância é parcial ou totalmente diferente do caminho de síntese correspondente, podendo

inclusive ocorrer em compartimentos celulares diferentes. Esta separação facilita a regulação

enzimática do metabolismo, que ocorre com menor desperdício de matéria e energia.

AS FASES DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO MICROBIANA

De um modo geral, quando os microrganismos se desenvolvem em um meio com uma quantidade

limitada de nutrientes, a população passa por diversas fases (Figura 6.3A).

o Fase lag: período de adaptação em que, apesar de não se multiplicar, os microrganismos sintetizam enzimas e constituintes celulares.

o Fase log: a população cresce de maneira exponencial, sendo sintetizados numerosos metabólitos primários.

o Fase estacionária: devido ao esgotamento dos nutrientes e à acumulação de excretas, algumas células morrem, enquanto outras se dividem. No fim da fase log e início da fase estacionária começam a ser sintetizados os metabólitos secundários.

o Fase de declínio: sem a renovação dos nutrientes, as células morrem em um tempo variável.

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FIGURA 6.1. O processo fermentativo genérico

FIGURA 6.2. Respiração e fermentação

Na respiração, onde o último aceptor de elétrons é o oxigênio, a oxidação de glicose se completa até chegar a CO2 e H2O, produzindo 36-38 moléculas de ATP. Na fermentação, o último aceptor de elétrons é o piruvato ou algum outro derivado, produzindo 2 ATP.

Glicose

GLICÓLISE (2 ATP)

Citoplasma

Ácido pirúvico Substância orgânica

Sem O2 (etanol, ácido láctico)

Com O2

Citoplasma (procariontes)

Mitocôndria (eucariontes)

CO2 , H2O e 36-38 ATP

RESPIRAÇÃO Ciclo de Krebs e cadeia respiratória

FERMENTAÇÃO

FASE DE LABORATÓRIO Preparação do inóculo FASE INDUSTRIAL Preparação do meio Esterilização Ar Controles (temperatura, pH) Esterilização

Tratamento final Subprodutos Produtos Resíduos

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OS BIOPROCESSOS

61

Além das vias metabólicas primárias, que são comuns a todos os microrganismos, existem outras vias

metabólicas secundárias específicas. A ativação de umas e/ou de outras depende do microrganismo e

das condições em que ele se desenvolve em seu ambiente natural ou em que irá ser cultivado.

Os metabólitos primários estão relacionados com o crescimento dos microrganismos e a

transformação de nutrientes em biomassa; sendo os principais exemplos o etanol, o ácido láctico ou

os aminoácidos. Mesmo não sendo essenciais, os metabólitos secundários permitem a sobrevivência

em ambientes extremamente competitivos e com escassos nutrientes. São metabólitos secundários

os antibióticos, os alcaloides, os pigmentos, algumas enzimas e toxinas.

Com vistas ao desenvolvimento de um bioprocesso, a escolha do microrganismo terá que ser feita

em função de suas vias metabólicas; e as condições de cultivo dependerão do objetivo da fermentação,

um metabólito primário ou um metabólito secundário (Figura 6.3B).

---------------

FIGURA 6.3. As diversas fases do crescimento de uma população microbiana e a produção de metabólitos

A. As fases de crescimento de uma população

B. A produção de metabólitos primários e secundários

Os nutrientes do meio permitem a multiplicação celular e a formação do metabólito primário, que pode ser utilizado pelas células para sintetizar o metabólito secundário (a); este pode também ser sintetizado diretamente a partir de alguma substância do meio (b).

a b

Meio nutriente Metabólito secundário Metabólito primário Células

Log do número de células Tempo Fase lag Fase log Fase estacionária Fase de declínio

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MEIOS DE CULTURA E MATÉRIA-PRIMA

A composição do meio de cultura depende das necessidades metabólicas do microrganismo escolhido.

Este deve conter todos os nutrientes necessários nas concentrações adequadas, que variam em função

do microrganismo e do objetivo do processo. Em geral, os meios de cultura utilizados no laboratório

incluem:

o Água.

o Uma fonte de energia e de carbono: glicose, amido etc.

o Uma fonte de nitrogênio: inorgânica (sulfato de amônia, nitrato de potássio etc.), orgânica (asparagina,

succinato de amônia, glutamato, ureia etc.) ou complexa (farinha de soja, peptona etc.).

o Sais minerais, tais como fosfato de potássio (K2HPO4 ou KH2PO4), sulfato de magnésio (MgSO4 7H2O), cloreto

de cálcio (CaCl2) etc.

o Elementos-traço: ferro, zinco, manganês, cobre, cobalto, molibdênio.

Com vistas a uma exploração comercial, os meios definidos são substituídos na indústria por matérias-

primas de baixo custo como, por exemplo, soro de leite, melaço de cana ou de beterraba, amido de

milho etc. Em alguns casos, a matéria-prima passa por um tratamento prévio com métodos físicos e/ou

químicos.

No caso de se tratar de um processo enzimático, o meio deverá levar, além do substrato adequado,

os elementos necessários para que a enzima possa desenvolver sua atividade catalítica (precursores,

cofatores etc.).

A OBTENÇÃO DAS LINHAGENS

De um modo geral, para que o cultivo em um fermentador resulte economicamente viável, o

microrganismo deve ser capaz de se multiplicar rapidamente, sintetizando grande quantidade do

produto a partir de uma matéria-prima barata. Existem Bancos e Coleções de Cultura que vendem esse

tipo de linhagens de microrganismos como culturas puras, geneticamente estáveis e aptas para o

cultivo em grande escala.

Apesar de terem sido isoladas do meio ambiente, as linhagens industriais diferem substancialmente

das linhagens originais, em virtude de uma série de alterações genéticas (mutações, recombinações)

obtidas no laboratório. Atualmente, as grandes empresas selecionam os microrganismos mais

eficientes mediante um processo de evolução dirigida, miniaturizado em plataformas robóticas (Figura

6.4).

A triagem de alta produtividade (HTS, do inglês high throughput screening) permite a seleção em

paralelo de milhares de linhagens e a realização dos ensaios biológicos básicos, em menos tempo e

com menor consumo de reagentes que os métodos tradicionais. Testes com centenas de milhares de

amostras diárias tornam-se rotineiros e acessíveis, graças aos recentes avanços em métodos

fluorescentes e sistemas robóticos que colocam líquidos em quantidades nanométricas.

Nas linhagens industriais, algumas vias metabólicas, especialmente as do metabolismo secundário,

podem ter sido alteradas, de maneira a aumentar ao máximo a síntese do produto desejado e evitar a

produção de algumas substâncias desnecessárias. Em geral, por estar tão selecionadas geneticamente,

tendo inclusive algumas vias metabólicas anuladas ou desbalanceadas, estas linhagens sobrevivem

pouco tempo no meio ambiente. Porém, como norma geral, as linhagens industriais não devem ser

patogênicas nem produzir toxinas. A produção de medicamentos ou de vacinas é um caso crucial,

porque exige medidas de segurança estritas.

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OS BIOPROCESSOS

63

Os microrganismos constituem um grupo biológico muito diversificado e, ainda, pouco conhecido, por

isso existem muitas expectativas em relação à prospecção de linhagens em ambientes extremos ou

pouco usuais. Não se precisa desenvolver um processo novo para cada microrganismo que apresente

alguma característica comercial interessante. A tendência atual é transferir os genes correspondentes,

por engenharia genética, a algum dos microrganismos conhecidos, adaptados às condições industriais.

---------------

FIGURA 6.4. A metodologia HTS para triagem e evolução dirigida de linhagens bacterianas

OS DIFERENTES TIPOS DE BIOPROCESSOS

OS PROCESSOS TRADICIONAIS

Algumas fermentações se desenvolvem sobre resíduos agroindustriais ou florestais, como grãos,

palha, bagaço, serragem etc. Este tipo de fermentação em meio sólido umedecido é utilizada na

produção de alimentos como, por exemplo, o levedo da massa na panificação, a maturação de queijos

por ação de fungos (roquefort, gorgonzola), o cultivo de fungos, a fermentação do cacau, do café e do

chá etc. Na Ásia, a preparação do koji, soja fermentada, é a base de alimentos tradicionais como o tofu,

o missô, o shoyu e o sakê.

Em alguns lugares, estas fermentações ainda ocorrem artesanalmente, dentro de folhas de

bananeira e cestas de bambu ou mesmo em montões; também existem hoje equipamentos

sofisticados com bandejas, colunas, frascos e tambores rotativos, alguns totalmente automatizados

(Figura 6.5 A).

Outra variante interessante do processo fermentativo é a produção tradicional de vinagre

(processo francês ou de Orléans) em barris de carvalho. O vinho é inoculado com bactérias do gênero

Acetobacter que formam na superfície a "mãe do vinagre", uma película que flutua, presa a um

quadriculado de madeira que a impede de afundar. Deste modo, o microrganismo cresce na superfície

de um meio líquido, em contato simultâneo com o ar e com o meio.

O processo fornece excelentes vinagres, mas é lento e exige muito espaço, sendo a capacidade de

cada barril de 200 litros (Figura 6.5 B). Existem outros processos semelhantes, conduzidos por fungos,

que formam uma película de micélio na superfície do líquido.

Biblioteca de mutantes 106 – 1010 de variantes Gene parental Mutação bacterianas Transformação Próxima rodada seletiva

Mutante mais eficiente

Triagem Transferência das colônias Triagem por métodos colorimétricos, a microplacas fluorescentes ou por luminescência

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FIGURA 6.5. Modelos de biorreatores utilizados em processos tradicionais

C. Biorreator para fermentações em fase sólida

D. A produção de vinagre (Método de Orléans)

FIGURA 6.6. Modelo de biorreator utilizado em fermentações submersas

Motor Vapor Entrada de ácido ou de base Bomba Indicador de pressão Sonda de pH (controle) Misturador Saída de gases Sonda de temperatura (controle)

Vapor Entrada de ar Saída do produto

Tubo para adicionar o vinho

Entrada de ar Mãe do vinagre Mosto Retirada do vinagre

Controles Injeção de ar Saída de ar Umidade Bandejas com a matéria-prima para o cultivo de microrganismos

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OS BIOPROCESSOS

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OS PROCESSOS SUBMERSOS

O desenho do biorreator deve se adequar ao objetivo do processo, respondendo eventualmente a

diversos imperativos, tais como a esterilização do sistema, a aeração e homogeneização do meio, o

acréscimo de nutrientes e de aditivos antiespumantes, a manutenção do pH etc.

A maioria dos processos industriais se desenvolve em cubas de vidro ou de aço. Os agentes

biológicos submersos no meio de cultivo ocupam somente 75% da cuba porque, se for necessário

injetar ar, formará espuma.

---------------

FIGURA 6.7. Fermentações, agentes biológicos e biorreatores

Reatores em torre

ou de leito fluidizado

Livres Imobilizadas

FERMENTAÇÕES SUBMERSAS

Podem ser conduzidas por

CÉLULAS E ENZIMAS

Reatores de fibra oca

Reatores de leito fixo

Em suportes inertes

Reatores com agitação mecânica

Entre membranas

Reatores com agitação pneumática

Coluna de bolhas Reatores air-lift

Reatores STR ou com membranas planas

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LABORATÓRIO PILOTO INDÚSTRIA

Os modelos de fermentadores mais utilizados com microrganismos contam com aeração e agitação

mecânica. Esta facilita a distribuição dos nutrientes, mas o calor gerado deve ser eliminado mediante

a circulação de água fria (Figura 6.6). Se o processo exigir assepsia, esta será conseguida mediante:

o A esterilização do meio, dentro ou fora do fermentador.

o A desinfecção ou esterilização do equipamento, por injeção de vapor ou mediante o calor gerado por serpentinas, sendo esta medida extensiva a todos os dutos de entrada e saída e às válvulas correspondentes.

o A esterilização do ar, mediante filtros adequados.

Existem fermentadores adaptados às necessidades de cada agente biológico e de cada tipo de

processos. Nos biorreatores em coluna ou torre, a homogeneização depende da injeção de ar (Figura

6.7). Os tanques podem chegar a 3.000 m3 de capacidade como, por exemplo, os fermentadores para

a produção de proteínas de célula única, da Imperial Chemical Industries (ICI), no Reino Unido. O

monitoramento do processo acompanha o crescimento da população microbiana, ou a quantidade do

produto, nas amostras extraídas ao longo da fermentação.

Os sistemas submersos são apropriados para o cultivo de microrganismos livres, mas resultam

pouco econômicos quando se trabalha com células ou enzimas caras. Neste caso, é preferível a

imobilização do agente biológico a um suporte inerte ou sua inclusão dentro de um polímero que

permita o contato com o meio de cultura. Além de facilitar a reutilização das células ou das enzimas

que permanecem dentro do biorreator, os sistemas imobilizados simplificam a purificação do produto

(Figura 6.7).

---------------

FIGURA 6.8. A mudança de escala, do laboratório à indústria

A mudança de escala entre o processo laboratorial e o processo industrial cria vários problemas de índole tecnológica.

Fermentador de laboratório Fermentador piloto Fermentador industrial 1 - 10 litros 50 – 200 – 500 litros 5.000 – 50.000 – 200.000 litros 5 – 50 – 200 m3

Bancada

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OS BIOPROCESSOS

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DO LABORATÓRIO À INDÚSTRIA

A MUDANÇA DE ESCALA

Uma operação simples de laboratório pode ser impraticável, ou pouco econômica, quando realizada

em grande escala. No laboratório, após a triagem das linhagens mais eficientes ou das primeiras

experiências realizadas na bancada, o processo passa a ser estudado em um biorreator de até 10 litros

de capacidade, onde se analisam o rendimento da linhagem selecionada e as variáveis físico-químicas

em outra escala.

A capacidade de uma cuba varia entre 1 e 10 L para um fermentador de laboratório, chegando a

5.000 l em uma planta piloto e 100.000 l em uma planta industrial. Ao aumentar o tamanho do

equipamento, altera-se a relação superfície/volume, de modo que as condições de operação do

fermentador na planta piloto deverão ser ajustadas até se aproximar das correspondentes a um

processo comercial. Se a experiência na planta piloto for bem-sucedida, o processo poderá ser

desenvolvido em um fermentador industrial (Figura 6.8).

A automatização do monitoramento e do controle da fermentação permite que a informação

relativa aos parâmetros físicos e químicos (pH, temperatura, oxigênio, velocidade de agitação, o nível

do meio etc.) seja recolhida on-line por sondas e sensores. Para que o processo se aproxime das

condições ideais, a informação é analisada em relação a um modelo previamente estabelecido. Como

este se elabora a partir da experiência obtida com cubas menores (laboratório, piloto), os ajustes à

mudança de escala são de grande complexidade.

A CONDUÇÃO DO PROCESSO

O processo fermentativo pode ser conduzido de maneira contínua ou descontínua (batelada), sendo

que ambas as formas apresentam vantagens e inconvenientes.

Em um sistema descontínuo de produção, uma vez que o fermentador é carregado com a

matéria-prima e o inóculo correspondentes, a fermentação prossegue até o esgotamento dos

nutrientes. Concluído o processo e extraído o produto, o fermentador é esvaziado, limpo e esterilizado

antes de receber outra carga.

Apesar do tempo improdutivo entre uma batelada e a seguinte, o sistema é relativamente

flexível, já que o mesmo equipamento pode ser utilizado na fabricação de produtos diferentes. A

produção em bateladas é bastante utilizada na indústria farmacêutica porque o risco de contaminação

permanece relativamente baixo.

Já no sistema contínuo de produção, o acréscimo de nutrientes e a retirada do produto ocorrem

simultaneamente ao longo do processo, eliminando-se quase totalmente o tempo improdutivo. Como

o risco de contaminação aumenta, o sistema se adapta a processos que não exigem assepsia, como a

produção de proteína microbiana e de álcool e, obviamente, o tratamento de água. Entre o sistema

em batelada e o sistema contínuo existe um sistema intermediário de batelada alimentada em que,

periodicamente, parte do conteúdo (meio de cultivo + produto) é retirada e substituída por meio

fresco.

A RECUPERAÇÃO DO PRODUTO

A recuperação do produto representa uma fração considerável do custo de um processo fermentativo.

Se o produto for secretado fora da célula, estará disperso em um volume grande de água e será

necessário separá-lo por decantação ou filtração. Mas se o produto permanecer dentro das células,

estas terão que ser desintegradas antes de proceder a sua extração.

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O produto se concentra por sedimentação, precipitação, filtração, centrifugação, extração por

solventes, destilação, evaporação do solvente e secagem. Se a purificação for necessária, esta

envolverá outros procedimentos, como a cristalização e os métodos cromatográficos.

O acondicionamento final dependerá do tipo de produto. Isto é fundamental no caso das enzimas

usadas em cosméticos, onde os problemas técnicos principais são a manutenção da estabilidade do

produto e sua ativação pela hidratação da pele.

Um problema a considerar é o despejo dos resíduos de uma fermentação, alguns dos quais podem

representar um perigo para o meio ambiente como, por exemplo, o vinhoto resultante da produção

de etanol ou o soro das indústrias de laticínios. Existem formas de tratamento, como o crescimento de

biomassa sobre resíduos industriais, que eliminam o problema e ainda permitem a obtenção de mais

um produto.

BIOPROCESSOS NA INDÚSTRIA

Na produção de bens e serviços, os bioprocessos participam em vários setores produtivos. Os dois

exemplos escolhidos referentes à produção de ácido cítrico e de fertilizantes ilustram sua importância

em áreas tão diversas como a indústria química e a agricultura.

O ÁCIDO CÍTRICO

Descoberto no século XVIII no suco de limão, o ácido cítrico é ainda extraído das frutas cítricas em

alguns países da África e no México. No entanto, a maior parte da produção atual depende do fungo

Aspergillus, do qual tem-se obtido mutantes muito produtivos. Os três procedimentos que garantem

atualmente a produção industrial de ácido cítrico são os seguintes:

o O processo Koji.

A fermentação ocorre na superfície, em meio sólido, com Aspergillus niger como agente biológico.

Depois de 80 a 100 horas de fermentação a 280C, o ácido cítrico é extraído com água quente e

purificado. Muito desenvolvido nos países asiáticos, este tipo de bioprocesso garante ao Japão uma

parte importante da produção anual de ácido cítrico.

o Fermentação na superfície do meio líquido.

Em meio estéril, incubação a 300C com injeção de ar esterilizado. Inoculação com esporos de

Aspergillus niger que germinam e, em 24 horas, cobrem a superfície do líquido, diminuindo o pH a

um valor inferior a 2. O processo demora entre 7 e 15 dias e, a seguir, o ácido cítrico é extraído do

meio de cultivo. Para recuperar uma quantidade maior de ácido cítrico, o micélio é exprimido e

lavado. Este processo responde por 20% da produção anual de ácido cítrico.

o Fermentação submersa em meio líquido.

Em grandes biorreatores de acero inoxidável com agitação mecânica ou em torres air-lift. É o

procedimento preferido porque resulta fácil de automatizar e fornece rendimentos altos (125 g/L).

Responde por 80% da produção anual de ácido cítrico. A figura 6.9 mostra o procedimento de

separação downstream do ácido cítrico e sua purificação.

A produção de ácido cítrico por fermentação é um exemplo clássico de sucesso na utilização de

bioprocessos para a produção de insumos que atendam outras indústrias. O ácido cítrico é um

composto muito versátil, utilizado nas indústrias farmacêutica, de alimentos, de cosmética e de

detergentes. Devido a facilidade com que forma complexos metálicos, também é usado como

antioxidante e na limpeza de metais.

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OS BIOPROCESSOS

69

FIGURA 6.9. A obtenção de ácido cítrico por fermentação

Uma vez retirado o micélio por filtração, acrescenta-se cal no caldo restante para elevar o pH e precipitar o citrato

de cálcio. Este último é retirado por filtração e tratado com ácido sulfúrico concentrado, formando-se sulfato de

cálcio. Outra filtração retira o sulfato de cálcio, deixando o ácido cítrico dissolvido no líquido. Eliminam-se as

impurezas com carvão ativado, e o cálcio residual e outros cátions por intercâmbio iônico. A evaporação do

solvente facilita a cristalização do ácido cítrico, que é recuperado por centrifugação e filtração. Uma vez seco, o

ácido cítrico é empacotado e distribuído.

---------------

OS BIOFERTILIZANTES

O termo biofertilizante se aplica aos produtos que contém agentes biológicos vivos capazes de

favorecer o desenvolvimento vegetal. Um destes agentes é o Rhizobium, uma bactéria simbionte das

raízes de leguminosas que fixa o nitrogênio atmosférico, reduzindo a necessidade de aplicar

fertilizantes nitrogenados nas lavouras e permitindo assim a substituição de produtos químicos

derivados do petróleo por agentes biológicos, menos prejudiciais para o meio ambiente.

Filtração

Solução de ácido cítrico impuro + Ca (OH)2

Precipitado de citrato de cálcio Restos do meio nutriente + H2SO4 concentrado

Ácido cítrico + precipitado de sulfato de cálcio Filtração Solução de ácido cítrico puro Gipsita Evaporação, cristalização, centrifugação, secagem e empacotamento

Ácido cítrico CO2H-CH2-C(OH)(COOH)- CO2H-CH2

20 m3 de cultivo de Aspergillus niger (starter)

Controles de pH, temperatura, CO2, O2

BIORREATOR (200 m3)

Injeção de ar esterilizado

Materiais estéreis: açúcar, melaço, nutrientes, algum agente antiespumante

Retirada semanal do meio

Micélio Metano Descarte

Fermentador anaeróbico

Caldeiras

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Na América Latina, a produção de biofertilizantes envolve numerosas empresas, pequenas e médias,

que contam com um sólido suporte tecnológico originado em universidades e instituições públicas de

pesquisa agronômica. Vários países produzem inoculantes agrícolas; entre eles: Argentina, Brasil,

Chile, Colômbia, Cuba, México, Peru e Uruguai.

As linhagens bacterianas são estirpes selecionadas por sua eficiência em uma ampla gama de

cultivares e amplamente adaptadas às condições locais. O crescimento da população microbiana

ocorre em etapas sucessivas, utilizando recipientes cada vez maiores até chegar a biorreatores de

1.500 litros. Os microrganismos recuperados são veiculados em meio líquido ou em turfa estéril e, uma

vez empacotados, vendidos aos agricultores. Segundo a legislação do Mercosul, durante o prazo de

validade do produto, a concentração deverá ser de 108 microrganismos viáveis por grama de produto.

Até o presente, a indústria baseia a produção dos microrganismos na tecnologia clássica, mas com

mapeamento do genoma de microrganismos como o Rhizobium etli (México) e o Gluconacetobacter

diazotrophicus (Brasil), a biotecnologia moderna começa a se inserir neste campo. Frente as mudanças

climáticas e a necessidade de aumentar a produtividade agrícola, os novos métodos de triagem de

estirpes são uma ferramenta de incalculável valor para o estudo da relação simbionte entre o

microrganismo e a planta hospedeira.

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C A P Í T U L O 7

O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

A MANIPULAÇÃO IN VITRO DE CÉLULAS E TECIDOS VEGETAIS

AS PRIMEIRAS TENTATIVAS

A reprodução assexual das plantas é utilizada para obter um grande número de mudas a partir de um

único exemplar. Dependendo do caso, aproveitam-se bulbos (cebola), cormos (gladíolo), rizomas

(samambaias), tubérculos (batata-inglesa), caules (banana), raízes (batata-doce, maçã, amora), folhas

(begônia, espada-de-são-jorge), estacas (videiras) etc. As plantas obtidas por propagação assexuada

ou vegetativa são idênticas à planta-mãe e idênticas entre si. Em outras palavras, são clones.

A capacidade de uma célula regenerar réplicas do organismo do qual ela deriva é denominada

totipotência. Restringida em animais, esta propriedade característica dos vegetais permite a

sobrevivência das plantas superiores após o ataque de herbívoros, pragas e patógenos ou em

condições ambientais desfavoráveis.

---------------

FIGURA 7.1. As diversas partes de uma planta angiosperma

Gema apical Estípula

Limbo Pecíolo Ramo ou broto lateral desenvolvido a partir de uma gema axilar Gema axilar Entrenó Nó Superfície do sol Região da raiz com pelos absorventes Raiz central Raízes laterais

Folha

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As primeiras tentativas de cultura de tecidos vegetais em laboratório datam de 1902. Contudo, a

primeira experiência bem-sucedida é a germinação in vitro de sementes de orquídea (Knudson, 1922).

Transferidas assepticamente ao meio de cultura e incubadas em condições favoráveis, as sementes e,

mais tarde, as plântulas crescem protegidas do ataque de fungos e bactérias.

Com algumas variações, o método é usado ainda hoje por numerosos floricultores porque, devido ao

tamanho minúsculo das sementes e à ausência de reservas nutritivas, as possibilidades de

sobrevivência das plântulas após a germinação in vivo são muito baixas.

Distintamente do cultivo in vivo, a micropropagação se inicia com a separação dos explantes, isto

é, de pequenos fragmentos de tecido extraídos de diversas partes da planta, tais como folhas, raízes,

segmentos nodais e gemas axilares, gemas florais e apicais (Figura 7.1). O cultivo desses explantes em

meios de composição adequada e condições assépticas possibilitará a regeneração direta da planta.

A cultura in vitro tem a vantagem de ser mais rápida e de ocupar muito menos espaço que a

multiplicação in vivo. As principais aplicações estão no cultivo de plantas ornamentais, de hortaliças e

na silvicultura. A capacidade de regeneração é maior nas plantas herbáceas que nas lenhosas, e em

algumas famílias (solanáceas, crucíferas, gesneriáceas, compostas e liliáceas). Também depende do

genótipo e das condições ambientais, diminuindo com a idade da planta.

---------------

TABELA 7.1. Os componentes do meio de cultura para células vegetais

COMPONENTES CARACTERÍSTICAS E EXEMPLOS

Água destilada Representa 95% do meio nutriente.

Fonte de carbono Geralmente se utiliza sacarose. A fonte de carbono é necessária porque os explantes

não são totalmente autotróficos e a fotossíntese in vitro não supre as necessidades

das células.

Substâncias inorgânicas Macroelementos (N, P, K, Ca, Mg, S) e microelementos (Fe, Co, Zn, Ni, B, Al, Mn, Mo,

Cu, I), em uma proporção que depende da planta escolhida.

Vitaminas Mioinositol, vitamina B1 (tiamina), ácido nicotínico (niacina), vitamina B6 (piridoxina),

pantotenato de cálcio, ácido fólico, vitamina B2 (riboflavina), vitamina C (ácido

ascórbico), vitamina H (biotina), ácido para-aminobenzoico e vitamina E (tocoferol).

Reguladores de crescimento Auxinas: Estas promovem o alongamento celular, a formação de calos e de raízes

adventícias; inibem a formação de brotos axilares adventícios e, às vezes, a

embriogênese em suspensões celulares. Exemplos: IAA (ácido indolacético), NAA

(ácido naftalenoacético), IBA (ácido indolbutírico), 2,4 D (2,4- diclorofenoxiacético).

Citocininas: Estas promovem a divisão celular, regulam o crescimento e o

desenvolvimento dos tecidos vegetais. Exemplos: cinetina, 2iP (2-isopentiladenina),

BAP (benzilaminopurina), zeatina.

Outras substâncias. Exemplos: giberelinas, ácido abcíssico, etileno.

Misturas de substâncias

pouco definidas

Exemplos: extrato de levedura, extratos vegetais, hidrolisados de caseína, peptona e

triptona. A tendência atual em pesquisa é de substituí-los por meios de composição

definida.

Materiais inertes Utilizados como suporte. Exemplos: agar, agarose, outros polissacarídeos (Gelrite,

Phytagel), lã de vidro, papel de filtro, areia, esponjas de poliestireno.

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O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

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OS MEIOS DE CULTURA

Um meio de cultura inclui água, uma fonte de carbono, substâncias inorgânicas (sais minerais),

vitaminas, hormônios e fatores reguladores do crescimento (Tabela 7.1). Alguns desses componentes

podem ser substituídos por misturas pouco definidas, mais econômicas ou simples de manipular (água

de coco, suco de tomate, suco de laranja). Geralmente, o pH do meio varia entre 5,0 e 6,5.

A composição do meio de cultura muda em função das necessidades de cada espécie. O crescimento

e a diferenciação celular são controlados mediante as substâncias reguladoras de crescimento (Tabela

7.1). De um modo geral, se a proporção entre citocininas e auxinas for maior que 1, desenvolvem-se

brotos, se for menor, raízes e, se for igual, calos.

A incubação ocorre a uma temperatura entre 23 e 28C, com 12 a 14 horas diárias de iluminação.

AS ETAPAS DO PROCESSO

Cultivam-se assepticamente os explantes em meios de composição adequada, possibilitando a

regeneração direta da planta. O processo envolve quatro etapas:

A. Estabelecimento de uma cultura asséptica.

Uma vez retirados da planta-mãe, os explantes são desinfetados com um agente químico,

geralmente hipoclorito de sódio, que é mais tarde retirado mediante sucessivas lavagens com água

estéril. A transferência dos explantes para o meio de cultura é realizada em condições assépticas

semelhantes às do cultivo de microrganismos (Figura 7.2). A incubação ocorre a uma temperatura

entre 23 e 28C, com 12 a 14 horas diárias de iluminação

B. Multiplicação.

Dividem-se e transferem-se os propágulos para um meio de multiplicação, de maneira a se obter numerosas subculturas (Figura 7.3).

C. Preparação das plântulas para a transferência ao solo.

Transferem-se as plântulas das subculturas para um meio de enraizamento onde, além de desenvolver raízes, enrijecem e começam a fotossintetizar.

D. Aclimatação.

Transferência das plântulas, primeiro para o solo ou para algum outro substrato, mais tarde para uma casa de vegetação. Protegidas da iluminação solar direta, elas aumentarão sua capacidade fotossintética adaptando-se lentamente às condições ambientais.

AS DIFERENTES MODALIDADES

A CULTURA DE MERISTEMAS

A regeneração de uma planta pode ocorrer a partir da gema apical onde se encontra o meristema, um

tecido embrionário a partir do qual se formam todos os outros tecidos das plantas (Figura 7.4). Os

exemplos citados na bibliografia sobre o cultivo de meristemas são, no mínimo, impressionantes. Se

um tubérculo de inhame de 100 g produz 25 kg de tubérculos em dois anos, por micropropagação

produzirá 300.000 kg; a partir de uma única gema apical podem-se obter 4.000.000 de cravos em um

ano.

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Associando a cultura de meristemas com a termoterapia (incubação a 32-340C, por um tempo

determinado), obtêm-se estoques de plantas livres de vírus e de outros patógenos. Com este método

são recuperadas algumas plantas que só se reproduzem naturalmente pela via assexuada e se

encontram ameaçadas de extinção, devido à contaminação por vírus.

Esta modalidade de cultivo permite a multiplicação de espécies que se reproduzem lenta e/ou

dificilmente (orquídeas) e o aceleramento da produção de mudas em plantas com ciclo anual ou

bianual. Outra variação é a microenxertia, que se aplica às essências florestais (eucalipto) e às árvores

frutíferas (citros). A técnica gera uma alta produtividade de mudas sadias, que são cultivadas em pouco

espaço (mais de 1.000 plantas / m2) sem depender dos fatores climáticos e da época do ano.

Do ponto de vista econômico, o custo destas mudas é alto porque a cultura em meio sólido

necessita um trabalho minucioso e mão de obra especializada. A multiplicação dos propágulos em

biorreatores, análogos aos fermentadores microbianos, visa reduzir os custos. Ao modelo tradicional

de pás giratórias que danifica os tecidos e as células, preferem-se pequenas cubas de 1 a 5 l onde os

propágulos permanecem em sistemas de imersão permanente ou temporária.

Apesar dos custos, a tecnologia é interessante quando se planeja introduzir uma espécie em uma

região determinada porque elimina qualquer contaminação prévia. Também é interessante para iniciar

a propagação vegetativa com mudas certificadas, visando a amplificação posterior dos cultivos.

---------------

FIGURA 7.2. O procedimento a seguir para se obter uma cultura asséptica no laboratório

FIGURA 7.3. Obtenção de subculturas a partir de explantes nodais

Separação Esterilização Lavados Dissecação Incubação dos explantes e semeadura Água + detergente + hipoclorito de sódio Água estéril Condições assépticas, 20-250C, na luz

Planta-mãe

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O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

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A CULTURA DE CALOS

Um calo é uma massa de células desdiferenciadas que prolifera de maneira irregular em resposta aos

ferimentos em órgãos e tecidos, formando in vivo um tecido tumoral. A semeadura in vitro de um

explante em meio adequado gera um calo que pode ser mantido indefinidamente, com a condição de

proceder a uma subdivisão e transferência periódica a um meio nutriente com a mesma composição.

Se o calo for transferido a outro meio com uma concentração diferente de hormônios, formar-se-ão

órgãos ou embriões, a partir dos quais poderão ser regeneradas numerosas plantas (Figura 7.5).

A cultura de calo é a modalidade alternativa para plantas que não podem ser propagadas

diretamente a partir de meristemas e, por isso, menos conveniente para micropropagação. Contudo,

sua utilização é inevitável no caso de algumas espécies economicamente importantes (cereais,

leguminosas, forrageiras, espécies florestais e palmeiras tropicais).

---------------

FIGURA 7.4. A cultura de meristemas

FIGURA 7.5. As diferentes possibilidades dos cultivos de calos

Gema apical Meristema

Transferência a um meio de diferente composição Planta-mãe Cultura de meristema Formação de órgãos Planta-filha

Planta-mãe Explante Calo Formação de órgãos Planta-filha Metabólitos secundários Biorreator Células Embrioides Sementes artificiais

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Diferentemente das outras modalidades de cultura de tecidos, na cultura de calos a proliferação

celular está acompanhada por um aumento das variações genéticas e da instabilidade cromossômica

(variação somaclonal). Esta permite a seleção de variedades de plantas com propriedades novas, tais

como a resistência ao estresse, ao ataque de insetos, a patógenos, a herbicidas, a concentrações

salinas elevadas, a moléculas químicas (Al, Mn). A variabilidade pode ser aumentada pela utilização de

agentes mutagênicos.

A CULTURA DE CÉLULAS E ÓRGÃOS VEGETAIS EM BIORREATORES

A desagregação de um calo em meio líquido gera suspensões de células, que são cultivadas em

biorreatores industriais para produzir metabólitos secundários ou embrioides. Os primeiros são

compostos naturais considerados produtos de Química Fina, de alto valor agregado no mercado. Trata-

se de alcaloides, de glicosídeos cardíacos, de substâncias antitumorais e antimicrobianas, de

hormônios esteroides etc. para a indústria farmacêutica e, também, de corantes, adoçantes e aromas

para as indústrias alimentícia e cosmética.

As “sementes artificiais” são embrioides, isto é, embriões formados a partir de células somáticas,

encapsulados em um gel com nutrientes e envoltos em plástico biodegradável. Como estas sementes

se desenvolvem normalmente quando semeadas na terra, uma das aplicações desta tecnologia é a sua

dispersão por aviões, ou por drones, para o reflorestamento de regiões de difícil acesso.

No início da década de 1990, gerou-se uma enorme expectativa comercial em relação à

possibilidade de substituir os métodos tradicionais de extração ou de síntese pela produção mediante

o cultivo de suspensões celulares em biorreatores. Vários estudos estimaram as condições necessárias

para que a síntese ou a bioconversão de compostos naturais em produtos de alto valor agregado fosse

vantajosa. Os cálculos mostraram que, se o mercado fosse suficientemente amplo e o valor do produto

superasse os US$ 500 ou 1.000 por kg, a produtividade do sistema deveria de ser igual ou superior a

um grama por litro de cultura celular. Essa condição é difícil de alcançar.

Existem numerosas dificuldades técnicas. As células vegetais são grandes (100 m) e sedimentam

com facilidade. A tendência a formar agregados as torna muito sensíveis ao cisalhamento. Como o

crescimento é lento, os riscos de contaminação aumentam. Também existem problemas relacionados

com a transferência de oxigênio.

Vários são os modelos de biorreatores para o cultivo de células vegetais, entre os quais o tradicional

de pás giratórias e outros preferíveis de tipo air-lift ou de leito fluidizado. A condução do processo

pode ser descontínua, semicontínua ou contínua; neste último caso, com células imobilizadas. A

escolha de uma modalidade ou outra de cultivo depende da substância estar, ou não, associada ao

crescimento celular e, também, de se tratar de um produto intra ou extracelular.

O cultivo de órgãos e especialmente de raízes transformadas (hair roots) tem dado bons resultados,

apesar de poucas iniciativas terem alcançado um nível comercial. Entre elas, a produção de shikonina

a partir de raízes (Lithospermum erythrorhizon) pela empresa Mitsui Petrochemical Ind. Ltd.; de

gingenosídeo (Panax ginseng) e de purpurina (Rubia akane) por Nitto Denko Corp.; e de paclitaxel

(Taxos cuspidata), comercializado como Taxol por Phyton Inc., uma empresa associada a Bristol-Myers

Squibb.

Espera-se o estabelecimento das bases de uma agricultura molecular combinando o

desenvolvimento de novos processos industriais com a engenharia metabólica das células. Por

enquanto, as aplicações se restringem à produção de alguns fármacos e de aditivos para a indústria de

alimentos (flavorizantes, corantes e aromas).

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O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

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FIGURA 7.6. As possibilidades do cultivo de células vegetais

---------------

MELHORAMENTO E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE VEGETAL

Várias modalidades de cultura de tecidos contribuem para facilitar a tarefa de melhoramento (Figura

7.6). O método genético tradicional, isto é, a autofecundação das plantas por várias gerações, demora

oito ou dez anos para obter linhagens puras (homozigotas), em que se manifestem os caracteres

recessivos. Esse tempo pode se reduzir a meses mediante a cultura de anteras, gerando-se plantas

haploides (n cromossomos), que, tratadas com colchicina, originam diretamente plantas diploides (2n)

homozigotas. Como as plantas resultantes destes cruzamentos geram sementes que dificilmente se

desenvolvem, frequentemente é necessário retirar os embriões do resto da semente e proceder a sua

recuperação mediante a cultura in vitro.

Os protoplastos se formam por digestão enzimática da parede celular, que poderá ser regenerada

novamente no meio de cultura. Durante o período em que a célula está sem a parede celular, pode-se

introduzir DNA exógeno (transformação) ou fusionar protoplastos de diferentes cultivares ou espécies

(hibridização somática).

Protoplastos, células, calos, gemas apicais e laterais, meristemas, sementes, embriões somáticos e

zigóticos, todos podem ser congelados em nitrogênio líquido a –1960C. A criopreservação facilita a

preservação de numerosas plantas ornamentais, frutíferas, oleaginosas, leguminosas, medicinais e

aromáticas.

Finalmente, deve-se destacar a importância destas técnicas de cultura de células e tecidos vegetais

para a conservação em bancos de germoplasma, tanto das espécies cultivadas como das espécies

selvagens. A conservação da biodiversidade é importante não só do ponto de vista do melhoramento

agronômico como do farmacológico, já que a maioria dos medicamentos de que dispomos contém

princípios ativos extraídos de plantas.

A DIFUSÃO DA TECNOLOGIA

As técnicas de cultura in vitro de vegetais facilitam o melhoramento genético das variedades

comerciais e representam uma etapa indispensável na obtenção de uma planta transgênica, sendo

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rapidamente assimiladas por empresas e instituições de pesquisa e desenvolvimento. Numerosas

empresas as utilizam no mundo todo para garantir a qualidade genética e fitossanitária das mudas e

sementes comercializadas.

Em Cuba, por exemplo, o IBP (do espanhol, Instituto de Biotecnologia de las Plantas) desenvolveu,

junto com outros centros científicos, protocolos para batata, cana-de-açúcar, plátano, banana, goiaba,

abacaxi, maracujá etc. O IBP está associado a uma rede de 15 biofábricas com capacidade de produzir

60 milhões de plântulas in vitro e sementes artificiais.

Esta tecnologia representa, na América Latina, uma corrente comercial da biotecnologia agrícola,

com ampla difusão na olericultura, na hortifruticultura, na floricultura e na propagação de plantas

ornamentais, assim como na produção de plantas de interesse industrial (cana, café) e de mudas de

essências florestais para as indústrias de papel.

A MANIPULAÇÃO IN VITRO DAS CÉLULAS ANIMAIS

AS PRIMEIRAS TENTATIVAS

O primeiro experimento de cultivo de células animais data de 1885, quando W. Roux manteve uma

seção de placa medular de frango em solução salina por alguns dias. Em 1907, R. Harrison conseguiu

cultivar células de embrião de rã no sistema conhecido como “gota pendente”. Pouco depois, o

cirurgião A. Carrel conseguiu cultivar células de coração de galinha e manter os cultivos durante 34

anos, apesar das dificuldades causadas pelas contaminações bacterianas.

Em 1961, L. Hayflick e PS Moorhead demonstraram que as linhagens normais de células têm um

número finito de divisões e reavaliaram o experimento de A. Carrel. Como o crescimento das células

era estimulado mediante a adição de extratos embrionários de frango, é possível que, ao longo dessas

três décadas, numerosas células de frango foram acrescentadas ao cultivo original.

Dois avanços fundamentais permitiram o progresso das técnicas de cultivo de células animais: o

uso de enzimas proteolíticas para liberar as células da matriz tecidual (1916) e o desenho de meios

definidos (década de 1950). Em 1955, dá-se início à produção da primeira vacina da poliomielite em

cultivo de células de rim de macaco, desenvolvida por J. Salk. A partir desse momento, a tecnologia é

considerada madura para o lançamento de outros produtos.

AS DIFERENTES MODALIDADES

Uma das modalidades de importância clínica é a cultura de linfócitos para a análise do cariótipo,

visando detectar as alterações cromossômicas estruturais e numéricas que possam ser a causa de

distúrbios no funcionamento do organismo.

Os linfócitos extraídos do paciente são colocados em um meio líquido que induz a divisão celular.

A adição de colchicina inibe a formação das fibras do fuso mitótico, bloqueando as células na metáfase.

Um choque hipotônico provoca a lise das células e libera os cromossomos (Figura 7.7 A).

Nem todas as células, contudo, se desenvolvem bem em suspensão. Células derivadas de órgãos

como o rim ou o fígado devem primeiro ser separadas, mecânica ou enzimaticamente, da matriz

tecidual. Além de nutrientes, precisam aderir a um suporte inerte (vidro, plástico etc.) para crescer e

o fazem formando uma monocamada de células.

Uma vez esgotados o espaço e os nutrientes, uma fração dessa cultura primária será transferida

para outro recipiente com meio nutriente, onde crescerá até que seja necessário repetir o

procedimento. Assim, por repiques sucessivos, uma cultura primária originará várias culturas

secundárias (Figura 7.7 B).

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O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

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Entretanto, à diferença dos microrganismos, que podem ser repicados indefinidamente, as células

animais normais sofrem um tipo de morte programada (apoptose) depois de 20 a 80 divisões. Deve-

se então reiniciar o cultivo com uma nova amostra.

Existem algumas exceções que escapam dessa limitação, como as células extraídas de tumores ou

as células-tronco; e também os linfócitos B, imortalizados por infecção com o vírus de Epstein-Barr ou

por fusão com células de mieloma (hibridomas). Estas células, que podem crescer em suspensão ou

em camada, não dependem de um suporte onde aderir nem demostram inibição por contato,

dividindo-se a cada 12-24 horas, em vez de 24-96 horas como as células normais.

OS MEIOS DE CULTIVO

O cultivo de células animais só começou a se desenvolver com sucesso na década de 1950, quando H.

Eagle conseguiu definir quais os nutrientes indispensáveis para o crescimento celular (Tabela 7.2).

Basicamente, um meio para o cultivo de células animais inclui água, sais minerais, aminoácidos,

vitaminas, glicose, soro humano, bovino ou de cavalo (fatores de crescimento) e antibióticos (para

prevenir as contaminações microbianas).

---------------

FIGURA 7.7. As culturas de células de origem animal

B. Etapas da cultura de leucócitos para a análise do cariótipo

B. Etapas da cultura de células a partir de um fragmento de tecido

Repique

Meio de cultivo

Suspensão celular Cultura Cultura primária secundária

Desagregação mecânica ou enzimática (tripsina, colagenase)

Amostra de sangue com anticoagulante

Separação dos leucócitos por centrifugação

Cultivo dos leucócitos

Adição de colchicina e lise celular

Fixação e coloração (Bandeamento)

Observação e comparação

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O soro bovino fetal é um suplemento de baixo custo, geralmente adicionado na proporção de 2-10%.

Além de melhorar as características físico-químicas do meio, o soro facilita a aderência ao suporte e

fornece nutrientes, hormônios, fatores de crescimento etc. Em compensação, a qualidade pode variar

de um lote a outro, e a riqueza de nutrientes favorece a contaminação. O soro também dificulta os

estudos imunológicos e a purificação dos produtos proteicos.

Em um meio definido, o soro é substituído por quantidades determinadas de diversas substâncias

inorgânicas e orgânicas, algumas destas últimas produzidas por engenharia genética em bactérias ou

leveduras.

AS LINHAGENS CELULARES Nas Coleções de Culturas encontram-se linhagens celulares de diversos tipos, conservadas por

criopreservação (Tabela 7.3).

A linhagem de células HeLa, uma das mais utilizadas, continua sendo cultivada desde a década de

1950, quando foi isolada do carcinoma uterino de Henrietta Lacks, uma mulher negra e pobre de 31

anos, no Hospital Johns Hopkins (Maryland, Estados Unidos).

---------------

TABELA 7.2. Os componentes de um meio de cultura básico para células animais

COMPONENTES CARACTERÍSTICAS E EXEMPLOS

Água Desmineralizada, destilada.

Fonte de carbono Glicose.

Substâncias inorgânicas NaCl, KCl, CaCl2, MgCl2. 6H2O, NaH2PO4.H2O, NaHCO3.

L –aminoácidos Arginina, cistina, fenilalanina, glutamina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina,

treonina, triptófano, tirosina, valina.

Vitaminas Biotina, ácido fólico, colina, nicotinamida, ácido pantotênico, piridoxal, riboflavina,

tiamina.

Misturas de substâncias

pouco definidas

Soro animal de diversa origem, inclusive humano.

Outros Antibióticos (penicilina, estreptomicina) e vermelho de fenol (pH 7,2-7,4).

TABELA 7.3. Origem e utilização de algumas linhagens celulares

CÉLULAS ORIGEM APLICAÇÕES

HeLa(*) Carcinoma cervical humano Pesquisa

MDCK Rim de cachorro Produção de vacinas veterinárias

3T3 Tecido conjuntivo de camundongo Técnicas laboratoriais

Nawalwa Linfoma humano -interferon

COS-7 Rim de macaco verde africano Estudos sobre multiplicação viral e expressão

VERO (**) Rim de macaco verde africano Produção de vacinas humanas

CHO Hamster Estudos nutricionais e de expressão gênica

(*) Células originadas em 1951, provenientes do carcinoma uterino de Henrietta Lacks.

(**) Esta linhagem, oriunda de rim de macaco-verde africano (Cercopithecus aethiops) está aprovada pela OMS para a

produção de vacinas humanas.

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O CULTIVO DE CÉLULAS E TECIDOS

81

A história de Henrietta Lacks levanta várias questões de bioética. Sem o seu consentimento ou o de

seus parentes, as células foram distribuídas a laboratórios do mundo inteiro com o nome fictício de

Helen Lane e, durante anos, foi negada a sua família qualquer forma de compensação que aliviasse sua

situação econômica. Por outro lado, experimentos da década de 1960 em que se injetaram células

HeLa em presidiários constituem uma das experiências mais antiéticas da história da ciência.

Além de ser mais difícil detectar uma contaminação por células que outra por bactérias ou fungos,

as células HeLa são uma fonte de contaminação temível, devido à facilidade e velocidade com que se

multiplicam. Em 1966, o geneticista S. Gartler descobriu que 18 das culturas de células mais usadas

continham o marcador glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD-A), característico da população negra

americana. A partir de esse momento, as linhagens celulares são monitoradas com marcadores

específicos.

CONDIÇOES DE CULTIVO

As células devem ser isoladas, inoculadas, e cultivadas assepticamente em um meio com os nutrientes

essenciais (aminoácidos, carboidratos, vitaminas, sais minerais) adicionado de hormônios e fatores de

crescimento, ambiente físico-químico regulado (pH, pressão osmótica, temperatura entre 350 a 370 C,

umidade, proporção definida de O2 e CO2). A viabilidade das células é avaliada microscopicamente no

hemocitômetro, após coloração das células mortas com azul tripano.

Uma das limitações destas técnicas é que o crescimento sempre ocorre em um plano, o que dificulta

a compreensão do que acontece dentro de um organismo, por isso trabalhos recentes desenvolvem

outras formas de cultivo que permitam o desenvolvimento em 3D.

A riqueza do meio de cultivo e a diferença na velocidade de crescimento entre uma bactéria e uma

célula favorecem as contaminações das culturas. O risco de contaminação com algum patógeno se

estende ao operador, especialmente se o trabalho envolve uma cultura primária de células humanas

ou de primatas. O risco potencial abrange os vírus HIV e HBV em amostras de sangue, bactérias como

Mycobacterium tuberculosis em amostras de pulmão, vírus SV40 em células transformadas e células

tumorogênicas.

DO LABORATÓRIO À INDÚSTRIA

A cultura in vitro de células animais é a rota seguida para a manufatura em grande escala de vários

produtos, tais como as vacinas e os anticorpos monoclonais. Também é adequada para a produção de

citocinas (linfocinas, interferones, eritropoietina) e de outras proteínas de origem recombinante (fator

ativador de plasminogênio, p.ex.) que, por exigir modificações pós-traducionais complexas, não podem

ser produzidas em bactérias ou leveduras transformadas.

Na hora de passar da escala do laboratório à escala industrial, algumas considerações devem ser

levadas em conta. A cultura de células animais exige um cuidado extremado, meios de cultivo

complexos e caros e condições muito rigorosas. Como as células se dividem lentamente (a cada 20

horas aproximadamente), a assepsia deve ser mantida durante períodos prolongados. A demanda de

oxigênio é alta, e as células são muito frágeis e sensíveis ao cisalhamento. Finalmente, as

concentrações celulares são baixas, o que diminui a produtividade e a rentabilidade do processo.

Embora algumas células possam crescer livremente em suspensão, outras precisam de um suporte

ao qual aderir. No biorreator, este problema pode ser resolvido de diversos modos: mediante o

confinamento das células dentro de membranas semipermeáveis, imobilização em géis ou cápsulas ou

fixação sobre suportes, tal como pequenas partículas de 100 a 400 m em vidro, plástico ou dextrina,

em modelos de fermentadores análogos aos representados no capítulo anterior.

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Biorreatores de tamanho pequeno (até 15 l) e processos descontínuos apresentam menos problemas

de contaminação, já os de maior tamanho (até 1.000 l) exigem a substituição da agitação mecânica por

sistemas de tipo air lift ou leito fluidificado. Evita-se a apoptose ou morte celular renovando

periodicamente parte do meio para retirar os produtos excretados.

Nos últimos anos, as técnicas de cultura in vitro de células animais deram um amplo impulso às

pesquisas básicas e aplicadas, aos testes de diagnóstico, às técnicas de fertilização in vitro, à produção

de compostos biológicos (proteínas recombinantes), de tecidos para transplante e de vacinas para uso

humano e veterinário. Nos estudos toxicológicos, esta tecnologia substitui, ao menos parcialmente, a

experimentação com animais, uma atividade que suscita forte resistência na sociedade devido aos

questionamentos éticos levantados.

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C A P Í T U L O 8

A TECNOLOGIA DO DNA

AS FERRAMENTAS DISPONÍVEIS

A tecnologia do DNA compreende uma série de procedimentos para extrair, fragmentar, sintetizar,

marcar, identificar, amplificar e sequenciar o DNA. Trata-se de um conjunto de ferramentas de uso

rotineiro em laboratórios, geralmente em sistemas automatizados especialmente desenhados para

efetuar rapidamente um número altíssimo de operações.

O primeiro passo a dar no campo da biologia molecular é a extração dos ácidos nucleicos. Os

sistemas tradicionais coexistem com métodos de extração em fase sólida, geralmente oferecidos como

kits por numerosas empresas. Estima-se que o mercado de extração e purificação de ácidos nucleicos

supere os 3.8 milhões de dólares em 2020.

AS NUCLEASES OU ENZIMAS DE RESTRIÇÃO

Entre as numerosas enzimas utilizadas diariamente nos laboratórios, as nucleases merecem atenção

especial porque quebram as ligações entre os nucleotídeos de uma cadeia de DNA. As exonucleases

começam pelas extremidades enquanto as endonucleases cortam a molécula por dentro. Pertencem

a este último grupo as “enzimas de restrição” que reconhecem sítios específicos no DNA.

As enzimas de restrição são produzidas por bactérias como uma arma de defesa contra o ataque

de vírus (bacteriófagos): cortando o DNA viral impedem sua multiplicação. O DNA bacteriano não é

atacado por suas próprias enzimas, seja porque faltam as sequências correspondentes, seja porque

estas estão camufladas pela adição de um grupo metila.

Desde sua descoberta por Werner Arber, na década de 1960, já foram isoladas centenas de enzimas

de restrição que agem como tesouras químicas ao reconhecer, como os seus pontos-alvo,

determinadas sequências de 4 a 8 bases. Por exemplo, a enzima EcoRI, cujo nome deriva de

"Escherichia coli linhagem RY13 (R), primeira endonuclease a ser descoberta" corta o DNA em dois

pedaços (Figura 8.1). A sequência é um palíndromo porque pode ser lida do mesmo modo (GAATTC)

nos dois sentidos (5’- 3’ ou 3’- 5’), de forma análoga a frases como “Amor a Roma” (Figura 8.1).

Assim como há enzimas que cortam o DNA com pontas lascadas, outras fazem um corte reto.

Outras enzimas colam os fragmentos, restabelecendo a ligação entre os nucleotídeos (ligases).

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A ELETROFORESE DO DNA

A eletroforese separa os fragmentos de DNA obtidos com uma enzima de restrição. As amostras são

colocadas em um gel no qual se aplica um campo elétrico. Os fragmentos de DNA carregados

negativamente se movimentam na direção do polo positivo. Ao encontrar uma resistência menor, os

fragmentos menores migram mais rapidamente (Figura 8.2).

---------------

FIGURA 8.1: As enzimas de restrição (EcoRI corta o DNA na sequência palindrômica GAATTC)

5’ G A A T T C 3’ G A A T T C

3’ C T T A A G 5’ C T T A A G

FIGURA 8.2. A eletroforese do DNA

A. Sistemas de eletroforese Fonte de eletricidade Vertical Horizontal

Cátodo Amostra Tampão Marco de plástico Fonte de Gel eletricidade

Gel Tampão Eletrodo Tampão Ânodo C. Migração de diferentes amostras no gel Eletrodo Fragmentos B. Formação de bandas por migração maiores dos fragmentos de restrição no gel Amostra Fragmentos de DNA Migração Eletrodo Fragmentos menores

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A TECNOLOGIA DO DNA

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O poder de separação varia com o suporte (gel de agarose ou de poliacrilamida) e com o tamanho do

poro, que depende da concentração do meio. Também varia com as características do campo elétrico

aplicado. Os fragmentos de restrição formam bandas que podem ser observadas na luz ultravioleta,

após coloração com uma substância fluorescente. Fragmentos de tamanho conhecido inseridos no gel,

à maneira de uma régua molecular, servem como padrão de comparação para estimar o tamanho das

bandas do DNA analisado.

Uma das primeiras aplicações da eletroforese dos fragmentos de restrição foi o estudo dos

polimorfismos. A modificação do sítio de restrição de uma molécula de DNA (como, por exemplo, de

GAATTC para GAACTC) origina fragmentos de tamanhos diferentes, denominados RFLPs ou rifleps

(do inglês, restriction fragment length polymorphism). Os RFLPs são marcadores que podem ser

estudados do mesmo modo que um gene que determina um caráter visível ou uma modificação

bioquímica (Figura 8.3).

---------------

FIGURA 8.3. Os polimorfismos

A. Polimorfismo de restrição (RFLPs) Uma mutação pode gerar dois alelos diferentes, A1 (nenhum sítio de restrição) e A2 (um sítio de restrição). Na eletroforese, o DNA dos indivíduos A1A1 será visualizado como uma banda, o de A1A2 como três bandas e o de A2A2 como duas bandas.

A seta indica o sítio de restrição Eletroforese Caso I (Homozigoto) Caso II (Heterozigoto) Caso III (Homozigoto) B. Polimorfismo de VNTRs presentes no mesmo fragmento de restrição, em 3 indivíduos diferentes. Caso I (6,2) Caso II (3,3)

Caso III (4,5) VNTR Sítio de restrição

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HIBRIDIZAÇÃO E SONDAS GÊNICAS

Determinadas condições físicas (temperatura, pH ou concentração salina) quebram as pontes de

hidrogênio entre as bases complementares, causando a dissociação dos dois filamentos de DNA. Em

condições favoráveis, essas ligações se restabelecem e os filamentos se associam novamente.

A reação de associação ou hibridização também ocorre entre filamentos de DNA ou de RNA de

diferentes origens e tamanhos, sempre que houver algumas sequências complementares. Em função

desta propriedade se constroem filamentos simples de DNA ou RNA de sequência conhecida, que são

usados como sondas para reconhecer a presença de uma sequência complementar em um

cromossomo ou em um fragmento de DNA (Figura 8.4).

--------------

FIGURA 8.4. Hibridização de uma sequência de DNA com uma sonda complementar marcada

--------------

O MÉTODO DE SOUTHERN

Em 1975, E.M. Southern descreveu um método para analisar fragmentos de restrição com sondas

específicas. As bandas de DNA cromossômico do gel de eletroforese são transferidas a uma membrana

de náilon ou de nitrocelulose e o alvo é reconhecido por hibridização com uma sonda radiativa de DNA,

registrando-se o resultado em um filme apropriado (Figura 8.5).

O método, denominado Southern blotting, é aplicado no diagnóstico de doenças genéticas, algumas

das quais causadas por mutações que modificam o padrão de bandas, ao eliminar ou criar um sítio de

restrição. Métodos análogos foram desenhados para estudos de RNA (Northern blotting) e de

proteínas (Western blotting). No primeiro caso, a sonda pode ser um fragmento de ácido nucleico, mas

no segundo a sonda é um anticorpo específico.

O FINGERPRINT

Descrita por A. Jeffreys em 1985, trata-se de uma variante do método de Southern que focaliza as

regiões do genoma que não se expressam e se repetem dispersas ao longo do genoma. Denominadas

VNTR ou vinters (do inglês variable-number tandem repeats), o número de repetições pode variar de

um cromossomo ao seu homólogo (Figura 8.3). Sendo assim, os fragmentos de restrição

correspondentes têm um tamanho diferente, o que pode ser visualizado por eletroforese.

Ao aumentar o número de sondas para o reconhecimento de vários tipos de VNTRs, obtém-se um

padrão de bandas individual, parecido com o código de barras do comércio. Assim como as impressões

Moléculas de DNA Sonda radioativa ou fluorescente Dissociação Reassociação

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A TECNOLOGIA DO DNA

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digitais identificam as pessoas, as sondas revelam a identidade genética de cada um de nós. O

procedimento, não por acaso chamado de Fingerprint, encontrou rápida aplicação tanto na

investigação de paternidade (ou maternidade), como na identificação policial ou forense.

A SÍNTESE E AMPLIFICAÇÃO DE DNA

SÍNTESE DE OLIGONUCLEOTÍDEOS

A síntese de oligonucleotídeos de DNA e RNA se realiza hoje em máquinas automatizadas

(sintetizadores) capazes de construir, em poucos minutos, moléculas com dezenas de pares de bases

(Figura 8.6). Estes oligonucleotídeos podem ser utilizados como sondas ou como primers para a PCR

(ver um pouco mais adiante).

--------------

FIGURA 8.5. A técnica de Southern

A sonda revela a presença de uma sequência complementar. A desaparição de um sítio de restrição por

mutação permite completar o diagnóstico de anemia falciforme em I e II.

1. Preparação dos fragmentos de restrição 2. Eletroforese Papel absorvente Membrana 3. Transferência Gel Buffer Papel de filtro para garantir a hidratação Suporte Buffer 4. Sonda radioativa 5. Autorradiografia

Três amostras de DNA de diferente procedência + enzima de restrição. Separação dos fragmentos de restrição por eletroforese. O DNA é desnaturado, e os fragmentos unifilamentares são transferidos a uma membrana de nitrocelulose. Acrescenta-se uma sonda unifilamentar ao gene procurado. Esta hibridiza com o fragmento portador da sequência complementar. Depois de lavar, para eliminar o excesso de reagente, coloca-se sobre o filtro um filme sensível à radioatividade.

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SÍNTESE DE cDNA

A transcrição da informação genética no sentido RNA DNA pela transcriptase reversa garante aos

vírus com genoma de RNA (HIV, por exemplo) sua multiplicação no hospedeiro. Como ferramenta de

laboratório, a transcriptase reversa possibilita a construção de filamentos de DNA complementares

(cDNA) a qualquer molécula de RNA (Figura 8.7). Diferente do gene original, não haverá íntrons no

cDNA reconstruído a partir de RNA.

--------------

FIGURA 8.6. A síntese de oligonucleotídeos

FIGURA 8.7. A síntese de cDNA por transcriptase reversa

DNA (com íntrons) mRNA Peptídeo Transcriptase reversa Degradação do RNA Síntese do filamento de DNA complementar

Dois filamentos de DNA, sem íntrons cDNA

O primeiro nucleotídeo (Base 1) está fixado a um suporte. Acrescentam-se os nucleotídeos seguintes (Base 2), bloqueados no sítio 5’

O segundo nucleotídeo (Base 2) se une ao nucleotídeo fixo. O bloqueio em 5’ determina a incorporação de um único nucleotídeo

Depois de eliminar por meio de lavagem os nucleotídeos que não se incorporaram na cadeia, retira-se o bloqueio.

Reinicia-se o processo com a incorporação do nucleotídeo seguinte (Base 3)

Bloqueio

Suporte

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A REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE

A reação em cadeia da polimerase (Polymerase Chain Reaction ou PCR) permite obter milhões de

cópias de DNA em poucas horas (Figura 8.8). Para isso, os elementos necessários são: o DNA contendo

a sequência que se deseja amplificar, desoxinucleotídeos dos quatro tipos (dATP, dTTP, dCTP e dGTP),

uma polimerase de DNA e os primers correspondentes. Estes últimos são pequenos fragmentos

sintéticos de DNA complementares às extremidades da sequência-alvo, indispensáveis para que a

polimerase comece a sintetizar DNA.

A chave do processo é a DNA-polimerase, uma enzima estável a altas temperaturas que permite à

bactéria Thermus aquaticus sobreviver em águas termais. Atualmente, esta enzima se produz por

engenharia genética.

--------------

FIGURA 8.8. A reação em cadeia da polimerase

A. Os elementos necessários

Fragmento de DNA Desoxinucleotídeos Enzima taq-DNA polimerase Primers

Os primers são pequenos fragmentos de DNA, complementares às extremidades da sequência que se quer amplificar e indispensáveis para que a enzima DNA-polimerase inicie a síntese de DNA.

B. A amplificação do DNA PRIMEIRO CICLO

950C 680C 720C

Molécula Dissociação dos Associação dos A polimerase inicia 2 cópias original filamentos primers com a a síntese de DNA a complementares sequência partir do primer complementar SEGUNDO CICLO

2 cópias 4 cópias TERCEIRO CICLO

4 cópias 8 cópias

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Em um ciclo pontuado por mudanças de temperatura, os filamentos de DNA são dissociados e

anelados com os primers, possibilitando a síntese do resto da sequência pela polimerase. Repetindo

muitas vezes o ciclo, gera-se em pouco tempo um número altíssimo de cópias que podem ser utilizadas

em qualquer tipo de análise. Um termociclador pode realizar 25 ciclos em menos de uma hora,

amplificando 105 vezes o fragmento de DNA.

A empresa Cetus comprou de seu inventor, K. Mullis, a patente da PCR por U$S 10.000, vendendo-

a pouco tempo depois a Hoffmann-La Roche por U$S 300 milhões; hoje se trata de uma técnica

corriqueira em qualquer laboratório de Biologia Molecular e provavelmente nenhum dos dois fez um

bom negócio. Mais tarde, em 1993, Mullis recebeu o Prêmio Nobel pela invenção da PCR.

Uma das grandes vantagens da PCR é que não há necessidade de isolar previamente o fragmento

a ser amplificado, bastando conhecer as extremidades da sequência e escolher os primers adequados.

Desenvolvendo-se de forma totalmente automatizada, o procedimento admite mais de vinte

variantes.

Como assinalado anteriormente em relação aos sintetizadores de oligonucleotídeos, uma das chaves

do êxito da PCR é o fato de ser um procedimento automatizado que se desenvolve em máquinas

rápidas e eficientes, resultado da integração da Biologia Molecular com a Informática e a Eletrônica.

Sendo uma tecnologia versátil, tem dado origem a mais de 20 variantes do procedimento inicial, todas

com aplicações específicas e diferentes níveis de sensibilidade.

O sucesso da PCR se deve a sua extraordinária versatilidade, permitindo que seja utilizada, com

objetivos diversos, em campos tão diferentes como a agricultura, a medicina veterinária, os estudos

ambientais, os testes de diagnóstico e a medicina forense. Aplica-se também nos estudos

antropológicos e evolutivos, tais como a extração de DNA de múmias egípcias, de animais extintos

como o quagga (um tipo de zebra) ou de insetos presos em âmbar 40 milhões de anos atrás.

O SEQUENCIAMENTO DO DNA

O sequenciamento de um fragmento de DNA é outro procedimento de tipo iterativo que possibilita a

construção de máquinas capazes de realizar rapidamente a tarefa (Figura 8.9). O sequenciamento com

didesoxinucleotídeos é um aprimoramento de Sanger (1977) do método inicial de Maxam & Gilbert

(1973).

O DNA é amplificado e incubado com DNA-polimerase, nucleotídeos normais e

didesoxinucleotídeos marcados. A síntese de DNA é interrompida a cada vez que um

didesoxinucleotídeo é incorporado, gerando fragmentos de diferente tamanho. Um sistema

automatizado permite identificar, na corrida eletroforética, cada um dos quatro didesoxinucleotídeos

incorporados, fornecendo diretamente a sequência do fragmento sequenciado.

Uma vez determinada a sequência de várias amostras, inicia-se a montagem da informação

armazenada nos bancos de dados. Esta etapa se realiza em supercomputadores, exigindo um

tratamento matemático para ordenar as sequências, preencher as lacunas e verificar os dados.

Existem sequenciadores automatizados em que o gel é colocado nos capilares por um braço-robô

que acrescenta o DNA e efetua a limpeza depois da eletroforese. No ano 2000, tais braços permitiam

o tratamento de uma centena de amostras em 4 horas, sem exigir mais do que 15 minutos diários de

atenção humana. No auge do estudo do genoma humano, uma empresa ligada a Celera (Biosystems

Applied) mantinha os computadores funcionando dia e noite, chegando a gastar U$S 1.000.000

mensais com eletricidade.

Apesar de ter possibilitado o estudo de numerosos genomas, a partir de 2006 o método

automatizado de Sanger começou a ser considerado pouco eficiente, surgindo a necessidade de

desenvolver uma nova geração de tecnologias, mais rápidas e mais baratas.

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A TECNOLOGIA DO DNA

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FIGURA 8.9. O sequenciamento de um fragmento de DNA

1. Preparar numerosas cópias do fragmento a sequenciar (tamanho aproximado: 500 pares de bases)

2. Incubar a preparação com as substâncias necessárias para a síntese de filamentos complementares e

acrescentar alguns nucleotídeos, na forma didesóxi, marcados com substâncias fluorescentes de diferente cor.

Primer DNA-polimerase Desoxinucleotídeos Didesoxinucleotídeos 3. Iniciar a síntese dos filamentos complementares que

será bloqueada quando, em vez de um desoxinucleotídeo, se incorporar um didesoxinucleotídeo, porque estes não formam ligações fosfodiéster.

Síntese bloqueada devido à incorporação de

4. Depois de vários ciclos teremos fragmentos de todos os tamanhos:

5. Os fragmentos são separados por eletroforese. O sequenciador identifica cada um deles pela fluorescência do

nucleotídeo didesóxi incorporado e fornece a sequência. Fragmentos maiores Migração Sequência Fragmentos menores

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Várias tecnologias de sequenciamento next generation coexistem atualmente no mercado (454 Life

Sciences, Ion Torrent’s PGM, Pacific Biosciences’ RS and the Illumina MiSeq). O fator comum é o

sequenciamento em paralelo dos fragmentos de DNA sobre um substrato sólido (High throughput

sequencing). A leitura das bases incorporadas é simultânea à sua incorporação, não sendo necessário

separar os fragmentos, como no método didesóxi.

Em 2006, os métodos utilizados eram 500 vezes mais rápidos que os da década anterior. Hoje, além

de serem ainda mais velozes, as tecnologias next generation derrubaram os custos do

sequenciamento. Se, em outubro de 2004, o custo do sequenciamento de 1 Megabase (1.000.000 de

pares de bases) era de US$ 1598,91, em abril de 2014 o preço era de US $ 0,05.

Essas tecnologias revolucionaram as pesquisas genéticas e genômicas. Em consequência, temos

uma enorme avalancha de dados possibilitando estudos comparativos e evolutivos de uma dimensão

inimaginável alguns anos atrás. Também abre o caminho para estudos sobre as diferenças genéticas

que afetam a saúde e a doença.

OS ARRAYS

Como resultado do conhecimento acumulado sobre o genoma do homem e de outros organismos, já

podem ser estudados alguns aspectos relacionados com a expressão e a interação dos genes. Lidar

com um número enorme de informações demanda novos avanços tecnológicos, entre os quais a

construção de chips de DNA ou microarrays. Estes podem analisar em paralelo grandes quantidades

de material biológico (HTS).

Em um tipo de microarray, os testes são processados em microplacas de poliestireno com um

número variável de pequenas cavidades, cada uma delas cumprindo a função de um tubo de ensaio.

Estas placas permitem realizar simultaneamente numerosos testes, utilizando uma quantidade mínima

de reagentes e automatizando a leitura dos resultados.

Um segundo tipo de dispositivo consta de até 100.000 sondas de DNA por centímetro quadrado,

fixadas mediante diferentes tecnologias (robótica, fotolitografia a uma lâmina de vidro, náilon ou

sílica). A hibridização dessas sondas com as moléculas de ácidos nucleicos (cDNA) marcados será

visualizada por varredura (scanner) como pontos fluorescentes e analisada com um software

apropriado para o tratamento da informação (Figura 8.10).

Escolhem-se as sondas entre os genes codificadores de proteínas que se expressam na célula. Desse

modo, se excluem os genes que correspondem ao rRNA, aos tRNAs, às sequências de controle e ao

DNA extragênico. A escolha de sequências transcritas, denominadas ESTs (do inglês, expressed

sequence tags), aumenta as chances de detectar os genes que participam de alguma resposta

patológica.

Os microarrays são utilizados nos estudos de expressão gênica e para o sequenciamento rápido de

oligonucleotídeos. O estudo simultâneo de centenas de genes é um caminho para desvendar as

interrelações existentes entre eles e vários aspectos do funcionamento do genoma.

Numerosas empresas fabricam arrays comercialmente; algumas estimam que em pouco tempo

serão construídos arrays do tamanho de uma moeda, contendo todo o genoma humano.

A CONSTRUÇÃO DE GENOMAS MÍNIMOS

Com o desenvolvimento da genômica e a aparição de novas plataformas tecnológicas e na interface

entre a biologia e a engenharia, nasce a biologia sintética. Trata-se de uma nova área de conhecimento

com finalidades práticas, estimulada pela chegada dos métodos de sequenciamento “next generation”

e a existência de plataformas tecnológicas accessíveis para a síntese de oligonucleotídeos.

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A TECNOLOGIA DO DNA

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FIGURA 8.10. Fundamentos da tecnologia de arrays

Se as sondas representarem ESTs, saberíamos que os genes representados por B7, C2, D4, E10, G8 e H5 estão ativados. O tamanho das sondas depende da tecnologia utilizada na construção do array. Observe-se que cada uma das sondas representadas no desenho corresponde a um conjunto de moléculas semelhantes.

--------------

Na vanguarda deste movimento estão os pesquisadores do Instituto J. Craig Venter com a bactéria

sintética (Synthia, 2010). Na construção, unidades básicas de DNA de Mycoplasma mycoides foram

introduzidas em uma bactéria receptora de outra espécie, Mycoplasma capricolum, eliminando-se

posteriormente o genoma desta. Synthia se reproduz normalmente e carrega sequências específicas

que confirmam sua origem artificial.

Bactérias especialmente desenhadas seriam de interesse para a indústria e para projetos de grande

envergadura, mesmo que hoje nos pareçam um tanto fantasiosos, como a colonização de Marte.

Contudo, alguns aspectos resultam preocupantes. A síntese do vírus da pólio (2002) e a “ressurreição”

do vírus da gripe espanhola levantaram inquietude em relação à disseminação de material que possa

ser utilizado para elaborar armas biológicas ou toxinas.

Outro aspecto de biossegurança a considerar é o desenho de sistemas de contenção que impeçam

a liberação de organismos sintéticos no ambiente, seja utilizando sistemas bioquímicos não naturais,

como a introdução de benzopurinas ou benzopirimidinas no DNA, seja construindo ribossomos que

Microarray com sondas (Oligonucleotídeos de DNA) fixadas a um suporte A partir do mRNA extraído, se prepara o DNA, que é marcado com uma substância fluorescente

Hibridização Eliminação do cDNA marcado que não emparelhar com nenhuma sonda Varredura (scanner) para detectar as sondas que hibridizaram com o cDNA Resultado: Houve complementação com as sondas B7, C2, D4, E10, G8 e H5

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reconheçam códons de 4 bases.

No leque de questões levantadas, destacam-se as seguintes: Quais os sistemas de contenção

necessários para impedir a liberação no ambiente de novas formas de vida? Como seriam modificadas

as leis de propriedade intelectual? Quais as medidas a tomar em caso de acidente? Como impedir o

uso dual de equipamentos e organismos? Quais as implicações éticas do desenho de seres vivos

diferentes?

Esperam-se da biologia sintética avanços substanciais em medicina, indústria, energia e meio

ambiente, porém, será essencial o monitoramento dos riscos para a biossegurança, a biosseguridade

e a bioética.

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

C A P Í T U L O 9

A ENGENHARIA GENÉTICA

O NASCIMENTO DA BIOTECNOLOGIA MODERNA

Ao término da Segunda Guerra Mundial, a Genética e a Biologia molecular se desenvolveram a uma

velocidade tal que bastaram 25 anos para esclarecer os temas fundamentais: a estrutura dos ácidos

nucleicos, o código genético, a ação dos agentes mutagênicos, a genética dos microrganismos, a

estrutura e a síntese das proteínas, a regulação gênica etc. É nesse contexto de avanços muito rápidos

que devemos situar as primeiras experiências de engenharia genética com a tecnologia do DNA-

recombinante.

A utilização da palavra “recombinante” nos remete à recombinação gênica, um fenômeno que

ocorre normalmente durante a meiose, devido à permuta de fragmentos cromossômicos homólogos.

Mediante o corte e a união de pequenos pedaços de DNA, a engenharia genética cria novas

combinações de genes, pertencentes ou não a indivíduos de uma mesma espécie.

A engenharia genética é um instrumento valioso para o estudo dos genomas, a produção de

proteínas em organismos modificados geneticamente e a geração de organismos transgênicos com

propriedades novas.

AS PRIMEIRAS EXPERIÊNCIAS

Em 1972, na Universidade de Stanford (Califórnia), P. Berg conseguira associar o DNA de dois

microrganismos diferentes e formar uma molécula mista de DNA. Na mesma universidade, Stanley

Cohen especializava-se na biologia dos plasmídeos microbianos, pequenas moléculas de DNA circular,

portadoras de alguns genes capazes de se replicar de maneira autônoma. E, na Universidade da

Califórnia (São Francisco), Herbert Boyer isolava a primeira das enzimas de restrição que corta o DNA

em fragmentos com pontas lascadas, uma característica que simplifica a tarefa de associar (“colar”) os

pedaços.

S. Cohen e H. Boyer se encontraram em uma conferência científica no Havaí. A ideia de uma

colaboração entre ambos teria surgido uma noite, diante da praia de Waikiki, ao redor de sanduíches

e cervejas. As experiências conjuntas começaram assim que eles regressaram a seus laboratórios em

São Francisco.

Boyer dispunha da enzima de restrição EcoRI, Cohen, de dois plasmídeos, um deles com um gene

de resistência à kanamicina (pSC102) e o outro com um gene de resistência à tetraciclina e um sítio de

restrição para EcoRI (pSC101).

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FIGURA 9.1. Cortar, colar, copiar: a experiência que deu origem à engenharia genética

FIGURA 9.2. Sapobacter ou Bactosapo?

Com a entrada de um plasmídeo recombinante, com DNA codificador de rRNA de Xenopus, em uma bactéria, esta passa a sintetizar rRNA de Xenopus.

Fragments of amplified Xenopus laevis DNA, coding for 18S and 28S ribosomal RNA and generated by EcoRI restriction endonuclease, have been linked in vitro to the bacterial plasmid pSCl01; and the recombinant molecular species have been introduced into E. coli by transformation. These recombinant plasmids, containing both eukaryotic and prokaryotic DNA, replicate stably in E. coli. RNA isolated from E. coli minicells harboring the plasmids hybridizes to amplified X. laevis rDNA.

Extraído de: Replication and Transcription of Eukaryotic DNA in Escherichia coli (MORROW J.F., COHEN S.N., CHANG A.C. Y., BOYER H.W., GOODMAN H.M.E R.B. HELLING. Proc. Nat. Acad. Sci. USA 71:5, 1974

A. Preparação dos plasmídeos recombinantes

Bactérias T R

CORTAR COLAR Enzimas de restrição pSC 101 Bactérias T S pSC 102 B. Transferência dos plasmídeos e seleção das bactérias recombinantes

Bactérias T R K R recombinantes Plasmídeos Bactérias T S K S COPIAR OU CLONAR Multiplicar

Meio de cultivo com tetraciclina e kanamicina

Legenda

T: tetraciclina, Ts: sensível à tetraciclina, Tr: resistente à tetraciclina, K= kanamicina, Ks: sensível à kanamicina, Kr:

resistente à kanamicina, pSC101: plasmídeo de Stanley Cohen n0 101; pSC102: plasmídeo de Stanley Cohen n0 102.

Xenopus DNA de Xenopus Bactéria recombinante Moléculas de Xenopus

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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No primeiro experimento, os pesquisadores abriram o pSC101 e inseriram fragmentos do pSC102,

utilizando a enzima de restrição EcoRI como “tesoura” e uma ligase como “cola”. A seguir, eles

introduziram o plasmídeo recombinante na bactéria Escherichia coli. A obtenção de clones resistentes

a ambos antibióticos (tetraciclina e kanamicina) mostrou o sucesso do experimento (Figura 9.1).

Boyer e Cohen repetiram a experiência, substituindo o DNA bacteriano por um fragmento de DNA

do sapo Xenopus laevis. Com esse objetivo, selecionaram um gene codificador de rRNA no DNA do

sapo e o inseriram no plasmídeo pSC101. Introduzido o plasmídeo recombinante na bactéria

Escherichia coli, esta começou a sintetizar rRNA de Xenopus (Figura 9.2).

A extraordinária novidade do experimento está na transferência de genes de uma espécie para

outra bem distante na escala evolutiva; um fenômeno limitado na natureza a uma mesma espécie ou

a espécies muito próximas.

MITOS E REALIDADE

As infinitas possibilidades da tecnologia do DNA-recombinante despertaram alguns dos antigos mitos.

Por desobedecer a Zeus, entregando o fogo ao homem, Prometeu sofreu o terrível castigo de ser

acorrentado a uma montanha e ter o fígado devorado por uma águia. Instrumento da vingança divina,

Pandora abrira a caixa da qual saíram todos os males da humanidade. A ambiguidade da nova

biotecnologia, com os seus desafios e promessas, costuma ser representada nas duas faces de Jano,

um rei com o dom de ver simultaneamente o passado e o presente.

Em 1974, P. Berg e mais nove pesquisadores publicaram uma carta nas revistas científicas Science,

Nature e Proceedings of the National Academy of Science, alertando os colegas sobre os possíveis

riscos da nova tecnologia e pedindo uma moratória sobre os experimentos com DNA, até serem

estabelecidos os cuidados e salvaguardas necessárias. Considerando que “o uso desta tecnologia

apresenta vários riscos possíveis porque novos tipos de organismos, alguns deles potencialmente

perigosos, podem ser introduzidos no ambiente, se não existirem os devidos controles”, o National

Institute of Health (NIH) formou o Recombinant DNA Advisory Committee (RAC).

Em 1975, a conferência de Asilomar (Monterrey, Califórnia), reunindo 139 pesquisadores de 17

países, classificou os experimentos em função do risco (baixo, médio ou alto), pedindo a suspensão

dos experimentos de alto risco enquanto não se determinassem quais as formas de contenção

adequadas, tanto físicas como biológicas. Enfatizava-se também a necessidade de trabalhar com

microrganismos enfraquecidos, incapazes de sobreviver fora do laboratório.

Em 1976, o RAC publicou um conjunto de normas de trabalho que, além de revisadas

periodicamente, devem ser seguidas por todos os pesquisadores e instituições que recebam dinheiro

do NIH para pesquisas com DNA-recombinante.

Com base nos trabalhos publicados em 1973, a Universidade de Stanford obteve uma patente que

lhe rendeu U$S 300 milhões, divididos com a Universidade da Califórnia. A Universidade de Stanford

licenciou o uso da tecnologia a mais de 400 empresas, entre as quais Amgen, Eli Lilly, Genentech,

Johnson & Johnson e Schering Plough. Qual o invento patenteado? O processo ou ferramenta

biotecnológica que consiste em inserir um DNA exógeno em um plasmídeo bacteriano e este em uma

bactéria, que, dessa forma, se transforma em uma fábrica capaz de reproduzir esse gene em

quantidades ilimitadas.

Nesta breve recapitulação do nascimento da Biotecnologia moderna, vale destacar a preocupação

com a segurança, mostrada oportunamente pelos pesquisadores e as instituições científicas

envolvidas. Não há na história da ciência ou da tecnologia um episódio de responsabilidade coletiva

comparável ao da Conferência de Asilomar.

Paralelamente a sua exploração comercial, a engenharia genética é utilizada atualmente em

centenas de laboratórios de universidades e institutos de pesquisa. E não há registro ou relato de

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nenhum acidente relacionado com essa tecnologia. Talvez valha a pena lembrar que Prometeu foi

liberado depois de 30 anos, e que bem no fundo da caixa de Pandora estava a esperança.

AS BIBLIOTECAS DE GENES

O enorme tamanho de um genoma dificulta a localização de um gene e seu mapeamento. Uma forma

de facilitar a manipulação é extrair o DNA de um organismo determinado, cortá-lo com enzimas de

restrição, inserir os fragmentos em plasmídeos e introduzir os plasmídeos recombinantes em

bactérias. Cada bactéria formará um clone e cada clone levará um fragmento do genoma do organismo

estudado. O conjunto de clones representa o genoma inteiro de um organismo, constituindo uma

biblioteca genômica (Figura 9.3).

Boa parte do DNA não leva genes codificadores de proteínas. Por isso, um procedimento alternativo

é a montagem de uma biblioteca gênica, incluindo exclusivamente os genes que se expressam, ou seja,

os genes responsáveis pela síntese de proteínas. Separa-se o mRNA codificador, e, com a enzima

transcriptase reversa, constroem-se as moléculas correspondentes de cDNA. Inserem-se estas em

plasmídeos, e os plasmídeos em bactérias. Com este procedimento, obviamente, o número de clones

na biblioteca será menor (Figura 9.3).

O número de clones também depende do tamanho do fragmento que o vetor pode carregar. Tanto

os plasmídeos bacterianos como o bacteriófago transportam fragmentos pequenos de DNA de 10 a 20

kb, outros vetores genéticos foram especialmente desenhados para carregar fragmentos maiores

(cosmídeos, YACs ou yeast artificial cromossomes, BACs ou bacterial artificial chromossomes,

transposons etc.).

A construção de bibliotecas de genes representa o primeiro passo para o mapeamento de um

genoma. Ao sequenciamento dos fragmentos segue a montagem da informação. Trata-se de uma

etapa complexa em que se alinham as sequências, se preenchem lacunas e se verificam os dados. O

tratamento matemático das informações demanda algoritmos sofisticados e computadores

poderosos. Uma vez organizada a sequência, esta é armazenada em bancos de dados. O usuário tem

acesso através da Internet, mediante programas especializados que acumulam uma enorme

quantidade de informações.

A CONSTRUÇÃO DE UM MICRORGANISMO RECOMBINANTE

Uma das primeiras proteínas de origem recombinante foi a somatotropina ou hormônio de

crescimento. Como a enzima de restrição eliminava do cDNA, além da sequência codificadora do

peptídeo-guia, os nucleotídeos correspondentes aos primeiros aminoácidos da molécula, estes

tiveram que ser acrescentados quimicamente, em um processo extremamente engenhoso (Figura 9.4).

A transferência gênica permite obter microrganismos que sintetizem alguma substância diferente,

geralmente visando o cultivo em grande escala. O gene de interesse costuma ser selecionado e

estudado na bactéria de laboratório Escherichia coli e, posteriormente, transferido à espécie na qual

se pretende produzir a proteína correspondente.

Além de Escherichia coli e de Saccharomyces cerevisiae, existem vários outros microrganismos que

são habitualmente utilizados como hospedeiros: Bacillus subtilis, Picchia pastoris, Pseudomonas,

Streptomyces, Aspergillus nidulans, Neurospora crassa etc. Estes microrganismos são utilizados na

produção de fármacos (insulina, hormônio de crescimento, vacinas) ou de enzimas (quimosina) e,

também, na degradação de poluentes.

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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BIBLIOTECA GENÔMICA BIBLIOTECA GÊNICA Contém todas as sequências do genoma Contém as sequências codificadoras de proteínas Extração de DNA Extração de mRNA Transcriptase reversa Fragmentação com enzimas de restrição Síntese do cDNA Inserção no vetor Inserção no vetor Plasmídeos Plasmídeos Incorporação do vetor na célula hospedeira Incorporação do vetor na célula hospedeira (Transformação) (Transformação) Bactérias Bactérias

Multiplicação e seleção das células transformadas Caracterização dos clones Quando o gene não se expressa no hospedeiro Quando o gene se expressa no hospedeiro Mediante sondas gênicas Mediante anticorpos específicos para a proteína recombinante

FIGURA 9.3. A construção de bibliotecas de genes

A triagem dos clones pode ser feita reconhecendo a "etiqueta" representada por uma sequência conhecida no DNA (STS, ou

sequence tagged site; ESTs, ou expressed sequence tagged); no caso do gene se expressar, a triagem também pode ser feita

com anticorpos específicos para a proteína sintetizada.

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FIGURA 9.4. A produção de somatotropina por engenharia genética

FIGURA 9.5. Algumas estratégias possíveis de clonagem

Peptídeo – guia

cDNA obtido a partir do mRNA da somatotropina

A remoção do sinal correspondente ao peptídeo-guia, com a enzima de restrição Hae III, remove também 72 bases, codificadoras dos primeiros 24 aminoácidos da molécula

Fragmento de DNA sintético com as 72 bases correspondentes aos 24 primeiros aminoácidos

União dos dois fragmentos de DNA Inserção em um plasmídeo Plasmídeo recombinante

Transformação

Transcrição

Tradução

Somatotropina

Biblioteca genômica Biblioteca gênica

Identificação do clone com o gene que se procura

Síntese in vitro

Reação em cadeia da polimerase (PCR)

Clonagem e subclonagem em Escherichia coli

Transferência a outro organismo, visando a expressão do gene

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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ENCONTRAR O GENE

De um modo geral, encontrar um gene equivale a procurar uma agulha num palheiro. O gene pode ser

localizado por triagem dos clones de uma livraria gênica ou genômica (Figura 9.3). Se esta não existir,

pode ser necessário construí-la, em uma primeira rodada de clonagem, para achar o gene de interesse.

A identificação do clone de interesse envolve a identificação de uma proteína com anticorpos

marcados ou o reconhecimento de um gene por hibridização com uma sonda marcada.

A segunda dificuldade está na obtenção de numerosas cópias desse gene. Uma solução é a

multiplicação do clone correspondente e posterior isolamento do gene procurado. Outra é a

amplificação do gene mediante a PCR, sempre que se conheçam as sequências iniciais e finais ou,

eventualmente, as sequências adjacentes à região onde está inserido. Se a sequência do gene for

conhecida e relativamente curta, podem-se construir cadeias curtas de oligonucleotídeos e associá-

las, formando um gene sintético que será amplificado por PCR. Existem numerosas estratégias, que

dependem do caso e, também, das características e possibilidades do laboratório (Figura 9.5).

Seja qual for o caminho seguido, uma vez que as cópias do gene de interesse forem obtidas, estas

terão que ser transferidas ao hospedeiro definitivo.

INSERIR O GENE

A transferência de um fragmento estranho de DNA se vê facilitada pela utilização de vetores. Um vetor

é uma molécula de DNA que se duplica de maneira autônoma dentro de uma célula, carregando vários

genes, entre os quais alguns marcadores que permitam reconhecer sua presença dentro da célula. É

no vetor que será inserido o fragmento de DNA estranho, para multiplicação ou integração no genoma.

Além dos plasmídeos (bacterianos e de leveduras) e bacteriófagos (, m13), também se utilizam

como vetores os transpósons, que são elementos genéticos móveis capazes de pular de um lugar a

outro do genoma, espalhando ou não cópias. Construídos em função das necessidades, existem hoje

vetores bacterianos, vetores de leveduras e vetores bifuncionais que podem ser utilizados tanto em

bactérias como em leveduras.

As primeiras experiências de Engenharia Genética foram feitas na bactéria Escherichia coli, um

microrganismo muito conhecido e fácil de cultivar em laboratório. Porém, Escherichia coli não é o

organismo ideal para a expressão de genes eucarióticos. Células procarióticas e eucarióticas diferem

em relação ao processamento do mRNA e às modificações das proteínas depois da tradução. Por este

motivo, quando se procura expressar genes de mamíferos, Escherichia coli é substituída por outras

células eucarióticas, como a levedura Saccharomyces cerevisiae, um fungo utilizado há séculos na

produção de alimentos e bebidas.

Para que um gene se expresse em uma célula hospedeira, é necessário que esta reconheça seus

próprios sinais de expressão. Para poder sintetizar uma proteína exógena, a célula deverá ler a

sequência codificadora com seus próprios sinais de transcrição (promotor) e de tradução (sítio de

ligação com o ribossomo, término de leitura).

O ideal é construir um vetor que já contenha os genes marcadores para seleção ou reconhecimento,

os sítios de restrição, uma sequência promotora e os sinais adequados de início e fim da transcrição.

Ao colocar a sequência codificadora da proteína, o vetor funciona como um “cassette” de expressão

(Figura 9.6).

Outros fatores adicionais intervêm na construção de um vetor de expressão. Um promotor forte,

por exemplo, permitirá sintetizar uma quantidade grande de proteína, o que será comercialmente

interessante se esta for uma enzima. Entretanto, se a proteína em questão for uma toxina que possa

afetar o hospedeiro, será preferível escolher um promotor fraco. Uma possibilidade interessante é a

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utilização de um promotor que responda a um fator externo controlável (substrato, temperatura), de

maneira tal que o gene possa ser ligado ou desligado no momento que se considere conveniente.

Finalmente, também deve ser considerado o destino da proteína dentro da célula; se esta for

secretada haverá que acoplar na construção gênica um gene de sinalização que a leve até a membrana

celular.

Existem diversos métodos para inserir o DNA recombinante dentro da célula. Facilita-se a entrada

do DNA com algumas manipulações, tais como a adição de CaCl2 no meio e/ou a modificação da

temperatura. A aplicação de forças elétricas também aumenta as chances do DNA penetrar na célula,

ao abrir os poros da membrana (eletroporação).

Os plasmídeos atravessam a membrana celular em um processo denominado transformação, que

ocorre em determinadas condições fisiológicas da célula hospedeira. Em se tratando de vetores virais,

a infecção da célula promove a entrada do DNA exógeno dentro da célula. Fala-se neste caso de

transfecção (transformação + infecção).

--------------

FIGURA 9.6. A estrutura de um vetor de expressão

Este deve incluir os elementos genéticos da célula hospedeira para a transcrição e tradução.

--------------

IDENTIFICAR OS MICRORGANISMOS RECOMBINANTES

A tecnologia do DNA-recombinante está baseada em fenômenos que ocorrem em frequências muito

baixas. A existência de métodos de seleção eficientes possibilita detectar e recuperar aquelas células

que incorporaram um gene estranho.

Associa-se o gene estranho a um marcador seletivo como, por exemplo, um gene de resistência a

algum antibiótico. Em presença deste, só poderão se multiplicar e formar clones ou colônias as células

que incorporaram ambos os genes. Entretanto, o uso de genes de resistência a antibióticos é

considerado polêmico, porque existe uma possibilidade remota dos genes serem transferidos das

bactérias transformadas para as bactérias do ambiente.

Também podem ser utilizados como marcadores seletivos os genes que codificam a síntese de um

aminoácido. Neste caso, a seleção do microrganismo recombinante ocorre em um meio sem esse

aminoácido.

Origem da replicação mRNA

Promotor Sinais de término de leitura Sinais de início de leitura Gene exógeno

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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Além dos marcadores seletivos, os pesquisadores contam com outro tipo de marcadores que

permitem identificar as bactérias transformadas e, também, acompanhar a expressão de um gene no

organismo modificado. Destacam-se entre estes marcadores, ou genes repórteres: GAL e GUS,

respectivamente o gene da -galactosidase e o gene da glucuronidase, que transformam o substrato

correspondente em um composto colorido; GFP, um gene da medusa Aequorea Victoria, que sintetiza

uma proteína fluorescente, verde brilhante na luz ultravioleta; LUC, o gene da luciferase, uma enzima

dos vaga-lumes, que emite luz em presença do substrato.

A CHEGADA DA COMUNIDADE DIY

A crise econômica do início de século XXI excluiu dos empregos formais numerosos jovens com boa

formação profissional e, paralelamente, o progresso tecnológico causou uma queda acentuada nos

preços dos equipamentos básicos de laboratório e de síntese/sequenciamento de ácidos nucleicos.

Nos países desenvolvidos, onde a cultura do empreendedorismo é muito forte, algumas iniciativas

educativas de várias organizações (Biobricks Foundation, SYNBIO etc.) e universidades (Harvard, MIT

etc.) promoveram a criação da comunidade DIYBIO (do inglês, do it yourself).

Tomando como referência o nascimento da indústria dos computadores pessoais na Califórnia, esta

geração monta laboratórios de fundo de garagem, absorve o conhecimento disponível em open source

e aproveita equipamentos de segunda mão, quando não cria os próprios. Trabalha com base na livre

difusão de protocolos e sequências biológicas standard que são usadas, com segurança, como blocos

fundamentais (biobricks).

O objetivo de desenhar e construir sistemas biológicos simplificados que cumpram funções

determinadas os integra à Biologia Sintética. Os elementos fundamentais são moléculas de DNA,

associadas entre si como os blocos de Lego. Denominados partes, dispositivos e sistemas em função

de sua complexidade, os elementos serão colocados em um microrganismo ou chassis (Figura 9.7).

Observe-se que os participantes utilizam exclusivamente microrganismos do Grupo de Risco 1, com

baixo ou nenhum risco individual e coletivo, e biobricks seguros disponibilizados por organizações

responsáveis. Inclusive figura na Internet um kit para bioengenharia (Amino, a US$ 700), equivalente

ao Arduino em eletrônica, com tudo o que é preciso para sintetizar microrganismos BS1,

geneticamente modificados, e criar fragrâncias, flavorizantes, materiais, medicamentos etc

--------------

FIGURA 9.7. Semelhanças entre os Legos e os Biobricks (www.biochem.hku.hk/synbio/?_id=148)

A. Classificação hierárquica

Codificam funções básicas e sua eficiência

Exemplos: sequência gênica de uma proteína ou de um promotor da RNA polimerase, número de vezes / momento em que uma polimerase ou um ribossomo passam por determinado ponto.

Coleções de partes que implementam uma função

Exemplo: produção de uma proteína fluorescente como resposta à presença de uma determinada substância no ambiente.

Tarefas complexas

Exemplo: oscilar na emissão de duas cores com uma frequência determinada.

Escherichia coli, Saccharomyces cerevisiae etc.

PARTES

DISPOSITIVOS

SISTEMAS

CHASSIS

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B. Construções intercambiando as partes

--------------

A comunidade DIY compartilha valores e normas de trabalho. O estímulo à inovação científica e

econômica, assim como ao empreendedorismo, está presente nas competições internacionais iGEM

(International Genetically Engineered Machine), organizadas pelo Massachussets Institute of

Technology (MIT), a partir de 2003. No entanto, algumas organizações pedem um controle estrito,

temendo a participação de pessoas sem treinamento adequado (biohackers) ou mal-intencionadas

(biocrackers).

Na comunidade DIY, a biologia sintética se desenvolve em um sistema transparente de código

aberto (Open Source), não sendo possível restringir o acesso a informação, materiais e equipamentos.

Por outro lado, uma regulação estrita limitaria o acesso ao conhecimento de uma comunidade

promissora, explicitamente comprometida com o desenvolvimento de códigos de conduta, protocolos

seguros e regulamentações. Este movimento abre um novo canal para o ensino e divulgação da ciência

que, além de atingir o público geral e complementar a atividade acadêmica, contribui para a

democratização do conhecimento.

A CONSTRUÇÃO DE PLANTAS TRANSGÊNICAS

As primeiras plantas transgênicas datam de 1983 quando, por caminhos independentes e

complementares, M. Van Montagu e J. Schell (Universidade de Gante, Bélgica), M. Dell-Chilton

(Universidade de Washington, St Louis) e R. T. Fraley (Monsanto) conseguiram transferir genes

bacterianos para plantas.

As plantas transgênicas se originam via cultura in vitro a partir de células vegetais modificadas

geneticamente. Portadoras de um gene exógeno ou transgene, sua obtenção visa o melhoramento das

propriedades agronômicas e nutritivas dos vegetais e, também, sua utilização para produzir

substâncias novas (biofábricas).

Gene funcional Vamos mudar o promotor? Enzimas de restrição Novo promotor + ligase

Novo gene funcional

c

c

c

Promotor Sítio de ligação com o ribossomo (rbs)

Sequência Sequências codificadora finalizadoras da da proteína transcrição

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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O TRANSGENE

Para garantir a transferência de uma sequência gênica determinada, deve-se construir em redor uma

estrutura complexa que inclua também um gene marcador, um promotor e as sequências de leitura

adequadas (sequências iniciais e terminais). Denomina-se transgene o conjunto formado pela

sequência gênica e a estrutura que o acompanha.

O promotor desencadeia a transcrição da sequência codificadora de interesse. Um promotor

constitutivo permitirá a expressão gênica na maioria dos tecidos e ao longo da vida da planta,

enquanto outro limitará a expressão a um tecido determinado. Também existem promotores que

respondem a estímulos ambientais internos ou externos, como a luz.

O gene marcador confere resistência a substâncias normalmente tóxicas para as células vegetais,

tais como os antibióticos ou os herbicidas, de modo que, em um meio seletivo, só sobrevivam células

que integraram o transgene.

O uso de marcadores de resistência a antibióticos na construção de plantas desperta vários

questionamentos, apesar de se tratar de antibióticos sem uso clínico e que já estão presentes nas

bactérias do intestino do homem. Estes marcadores podem ser substituídos, mas como sua utilidade

se limita ao processo de transformação, o melhor seria eliminá-los uma vez cumprida sua função. Já

foram desenvolvidas várias técnicas genéticas de remoção dos marcadores, esperando-se que nos

próximos anos sua retirada se transforme em uma prática corriqueira de laboratório.

A TRANSFERÊNCIA DOS GENES A CÉLULAS VEGETAIS

Agrobacterium tumefaciens é uma bactéria do solo, que leva um plasmídeo denominado Ti (do inglês,

Tumour induced plasmid). Quando infectadas com a bactéria portadora desse plasmídeo, as plantas

eudicotiledôneas desenvolvem galhas, isto é, tumores característicos (crown gall).

A eliminação de alguns genes na região T do plasmídeo Ti conserva sua capacidade de inserção no

cromossomo da célula hospedeira, eliminando a propriedade de induzir tumores. Esta característica

transforma o plasmídeo em um vetor adequado para a transferência de genes de outras espécies às

células vegetais. Basta colocar o transgene na região T do plasmídeo previamente desarmado para se

obter um plasmídeo recombinante que poderá ser transferido novamente a Agrobacterium ou a

células hospedeiras, onde o transgene irá se inserir em algum lugar do genoma (Figura 9.8).

Com esta tecnologia criou-se a primeira planta transgênica, um tabaco resistente à kanamicina.

Continua sendo utilizada até hoje, com as eudicotiledôneas. Porém, as plantas monocotiledôneas

(arroz, milho, trigo) e algumas leguminosas não são infetadas por Agrobacterium, de modo que, para

conseguir transferir genes, deve-se recorrer a outros métodos.

Os métodos físicos têm a vantagem de poder ser aplicados tanto nas plantas monocotiledôneas

como nas eudicotiledôneas. A eletroporação e o tratamento com uma substância desestabilizadora da

membrana plasmática (polietilenglicol ou PEG) são técnicas muito utilizadas. Porém, o método

preferido atualmente é a biolística. Um revólver especial (gene gun) dispara microprojéteis de ouro ou

tungstênio, recobertos de DNA, em direção às células. O dispositivo possibilita a entrada do DNA

exógeno no núcleo, nas mitocôndrias ou nos cloroplastos. De um modo geral, a transformação se

realiza em protoplastos, células em que a parede celular foi eliminada com enzimas.

DO LABORATÓRIO AO CAMPO

No laboratório, transfere-se a construção genética às células receptoras por algum dos métodos

possíveis (geralmente eletroporação, biolística ou uso de vetores, como o plasmídeo Ti de

Agrobacterium tumefaciens); a seguir, se selecionam e recuperam as células transformadas e,

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mediante as técnicas de cultura in vitro, se regeneram as plantas correspondentes. Note-se que este

trabalho costuma ser realizado em plantas cujo genótipo favorece a transformação e a regeneração

da planta transformada, mas que geralmente resultam pouco vantajosas do ponto de vista

agronômico.

A presença do transgene, assim como o número de cópias e o lugar em que estas se integraram no

genoma, é conferida mediante técnicas bioquímicas e/ou marcadores moleculares (polimorfismos na

molécula de DNA, repetição de sequências), porque são aspectos que podem influir na expressão

gênica. Considera-se alcançado o êxito quando o transgene se expressa no lugar correspondente e

com um adequado nível de atividade, restando por verificar a estabilidade da expressão gênica e o seu

valor agronômico.

--------------

FIGURA 9.8. A construção de uma planta transgênica no laboratório

O plasmídeo Ti "desarmado" portando um gene exógeno é transferido a células de discos foliares. Formam-se calos que

poderão regenerar a planta inteira.

Plasmídeo Ti Plasmídeo Ti desarmado DNA exógeno Plasmídeo recombinante Planta que será manipulada geneticamente

Transformação Discos foliares Cultura de calos Regeneração da planta com o gene exógeno integrado no genoma

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A ENGENHARIA GENÉTICA

107

Acabada a etapa de laboratório, iniciam-se os testes controlados em casa de vegetação, para

selecionar as plantas-mãe que darão origem a várias gerações de retrocruzamentos seletivos com

alguma das linhagens “elite”. Os testes visam a obtenção de uma linhagem transgênica de alto

rendimento adaptada a um contexto específico. Em outros termos, uma variedade cultivada ou

cultivar, com uma produtividade potencial parecida à da linhagem “elite” e que expresse o traço

codificado pelo novo transgene (Figura 9.9).

Conceitualmente, estes testes são semelhantes aos efetuados no processo de melhoramento

tradicional; no entanto, a utilização de marcadores moleculares e de técnicas de cultura in vitro

permite caracterizar a progênie bem mais rapidamente. Só então se dá início à liberação planejada no

meio ambiente, que envolve o cultivo de plantas em experimentos protegidos e testes de campo em

diferente escala, até que o novo híbrido transgênico esteja pronto para o seu cultivo comercial. A

liberação do cultivo dependerá da autorização da legislação local, geralmente bastante restrita a esse

respeito.

--------------

FIGURA 9.9. As etapas da construção de uma planta transgênica

--------------

CÉLULAS E ANIMAIS TRANSGÊNICOS

A TRANSFERÊNCIA GÊNICA A CÉLULAS ANIMAIS

Um dos objetivos da engenharia genética é a produção de proteínas recombinantes em culturas

celulares. Em relação aos microrganismos, a grande vantagem das células animais é possuir os sistemas

de transcrição e de processamento das proteínas indispensáveis para a expressão dos genes de

organismos superiores.

Observe-se que, em relação às células animais, a palavra transformação designa a conversão de

uma célula normal em maligna, sendo substituída por transfecção. O transporte de DNA exógeno

Transformação por engenharia genética

Regeneração mediante técnicas de cultura de tecidos

Caracterização molecular e bioquímica

Avaliação do valor agronômico

Melhoramento mediante cruzamentos com linhagens de elite

Obtenção de uma variedade transformada geneticamente

Experimentos e testes de campo, em pequena e grande escala

Autorização da legislação local

Liberação do cultivo para sua exploração comercial

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dentro da célula é assegurado por métodos físicos (eletroporação, microinjeção, ingestão de

micropartículas, fusão de lipossomos com a membrana plasmática) e por vetores (vírus, plasmídeos e

transpósons).

A transfecção mediante vetores virais dos quais se eliminaram as sequências patogênicas interessa

ao laboratorista porque os vírus animais infectam tecidos específicos e se integram no genoma da

célula hospedeira de maneira estável. Em mamíferos, os vírus utilizados mais frequentemente como

vetores são o SV40, a vacina, os retrovírus e os adenovírus. Células de inseto também podem ser

manipuladas geneticamente com vetores como os elementos P de transposição de Drosophila, ou

como o baculovírus, uma vez eliminado o gene que permite sua proliferação na natureza.

Assim como visto anteriormente em relação aos microrganismos e às plantas, a sequência

codificadora é colocada em uma construção gênica bem definida que inclui um gene marcador para

selecionar as células que receberam o transgene. Utilizam-se como marcadores genes de resistência a

antibióticos, genes para características metabólicas (Tk ou timidina quinase) etc.

O grande problema é sempre a integração do transgene no lugar desejado, sem interromper a

expressão de outros genes ou causar a ativação de algum oncogene. M. Capecchi, M. Evans e O.

Smithies receberam o Prêmio Nobel de Medicina de 2007 por solucionar esse problema em células-

tronco de camundongo.

Para integrar a construção gênica em um determinado sítio, colocaram, nas extremidades do

transgene, sequências de DNA homólogas às extremidades do segmento a ser substituído. Como

distinguir a integração no lugar desejado (recombinação homóloga) da integração ocorrida em

qualquer outro lugar (recombinação não homóloga)? Acrescentando na construção gênica, um pouco

mais longe, um gene de “seleção negativa”. Se a célula integrar a construção em qualquer outro lugar

do genoma, ela se tornará sensível a um segundo antibiótico. Inversamente, se a célula for resistente

a este antibiótico, isto significa que houve integração no lugar desejado.

APLICAÇÕES

A ovelha Dolly nasceu em 1996, depois de numerosas tentativas de transferir o núcleo de uma célula

mamária a um ovócito anucleado (Figura 9.9). Adorada pela mídia, o clone Dolly teve que ser

sacrificado em 2003 com um tumor no pulmão, artrite e sinais de envelhecimento precoce.

Poucos meses depois do nascimento de Dolly, o mesmo grupo do Instituto Roslin e de PPL

Therapeutics anunciou o nascimento de Polly, uma ovelha transgênica para o gene codificador do fator

IX, uma proteína que falta nos hemofílicos. Em vez de receber, como Dolly, o núcleo de uma célula

diferenciada mantida em cultivo, Polly recebeu um núcleo proveniente de células embrionárias

modificadas geneticamente.

Mesmo sendo difícil de obter, um animal transgênico pode ser bem mais interessante do ponto de

vista econômico que o cultivo de células em biorreatores, um processo complexo e de alto custo. Na

construção de animais transgênicos para a produção em grande escala de uma proteína recombinante,

escolhe-se habitualmente um promotor que se expresse na glândula mamária, de modo que o produto

gênico apareça no leite do animal. Cabras transgênicas produtoras de fator ativador de plasminogênio

(tPA), vacas produtoras de lactoferrina, somatotropina ou insulina já são uma realidade.

Na Argentina, BioSidus mantém uma dinastia de vacas produtoras de hormônio de crescimento. No

Brasil, a Universidade do Ceará conserva um rebanho de cabras transgênicas de raça Canindé que

secreta no leite o fator de estimulação de colônias de granulócitos humanos (hG-CSF). Chama-se Atryn

o primeiro anticoagulante liberado comercialmente, na Europa (2006) e nos Estados Unidos (2009),

produzido no leite de cabra transgênica (GTC Biotherapeutics).

Outra aplicação interessante da tecnologia de transfecção de células-tronco embrionárias

cultivadas in vitro na pesquisa clínica é a construção de modelos animais para o estudo de doenças

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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humanas. Desse modo se obtiveram camundongos transgênicos para genes determinantes de algumas

doenças humanas, tais como câncer de mama (BRCA 1), doença de Huntington, anemia falciforme etc.

Estes animais são de grande utilidade para as pesquisas farmacológicas

--------------

FIGURA 9.10. Construção de animais transgênicos

A. Microinjeção.

Após a transfecção, implantam-se os ovos em fêmeas receptivas (pseudográvidas). Aqueles que incorporaram o transgene

originarão, neste caso, animais de tamanho maior (supermouse).

B. Transfecção de células-tronco embrionárias

A implantação do blastócito com células modificadas em uma fêmea aguti gera animais quiméricos, com células que levam o

caráter para pelagem marrom e células com o caráter para pelagem preta. Do cruzamento entre quimeras, nascem alguns

animais com pelagem preta, tendo incorporado o DNA exógeno no genoma.

Cruzamento Descendência Ovos fertilizados Implantação em fêmeas pseudográvidas Injeção de DNA exógeno

Camundongos de pelo preto Animais quiméricos Descendência Blastocisto Transfecção e seleção das células Blastocisto Camundongo de pelo marrom (aguti) Injeção das células Implantação modificadas

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Esta estratégia é utilizada não só para construir modelos animais com um gene ativo (knock in), mas

também para colocar um gene inativo (knock out). Após a transfecção de células-tronco embrionárias

com um gene desativado, realiza-se sua transferência a blastócitos, que, reimplantados, originarão

animais quiméricos, isto é, animais com células de dois tipos: umas em que o gene está ativado e outras

em que não está ativado porque incorporaram o transgene. Dos cruzamentos entre quimeras com

células germinais portadoras do gene desativado nascerão animais homozigotos com duas cópias do

gene inativo (Figura 9.10).

AS NOVAS TECNOLOGIAS DE EDIÇÃO GÊNICA

BASEADAS NO RNA INTERFERENTE

A injeção na célula de um RNA artificial (siRNA) de sequência parcialmente semelhante à do DNA de

um gene determinado possibilita silenciar sua expressão. Trata-se de uma ferramenta poderosa para

o estudo da genômica funcional para interferir parcialmente (knockdown) com sua tradução no

citoplasma, de maneira temporária e sem danificar a célula.

Com a integração no genoma de um DNA codificador de RNA em forma de grampo de cabelo

(shRNA, do inglês, short hairpin RNA) consegue-se uma resposta permanente. Depois de processado

pela maquinaria celular dos miRNA, o shRNA irá interferir na tradução de uma molécula externa que

lhe for complementar. Adicionando à construção gênica um promotor induzível, pode-se regular sua

expressão em diferentes tecidos ou em determinados intervalos de tempo. Um dos frutos desta

tecnologia é o feijão resistente ao vírus do mosaico dourado da Embrapa.

BASEADAS NAS NUCLEASES SÍTIO-DIRIGIDAS: ZFN’s e TALEN

As técnicas convencionais de engenharia genética inserem o DNA exógeno ao acaso, com o risco de

interromper algum gene de interesse. A recombinação homóloga é um procedimento eficiente em

células-tronco embrionárias de camundongo, mas não se aplica a outros tipos celulares nem a outras

espécies.

As primeiras tecnologias de edição gênica agem mediante proteínas sítio-específicas, unidas a uma

enzima de restrição que corta o DNA. Como o reconhecimento do alvo depende das proteínas, devem-

se construir proteínas específicas para cada sequência-alvo. As duas tecnologias mais utilizadas são as

nucleases dedos de zinco ou ZFN’s (do inglês zinc finger nucleases) e TALEN (do inglês Transcription

Activator-Like Effector Nucleases).

Quando o DNA é cortado, a célula une novamente os dois extremos, um mecanismo natural de

reparação sujeito a erros que causam o knockout do gene em questão. Mas não é esse o único

interesse destas técnicas. Uma vez efetuado o corte, tanto se podem induzir mutações de um par de

bases como gerar inserções ou deleções e, inclusive, inserir um gene exógeno em um lugar bem

definido do genoma.

Tanto ZFN’s (2003) como TALEN (2010) são complexas, trabalhosas e pouco precisas, mas TALEN é

preferida por ser mais fácil de desenhar e, por conseguinte, mais econômica.

BASEADAS NA IMUNIDADE BACTERIANA: CRISPR-Cas9

Como sobrevive uma bactéria ao ataque de um fago? Uma possibilidade é que o fago seja

metabolicamente inativo; a outra é que entrem em ação mecanismos de defesa bacterianos, como a

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A ENGENHARIA GENÉTICA

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fragmentação do DNA viral pelas enzimas de restrição bacterianas. Estas reconhecem sequências

específicas que no próprio genoma estão protegidas por modificações químicas (metilação).

A bactéria sobrevivente poderá, mediante a nuclease Cas, incorporar algumas sequências de DNA do

fago em seu genoma, entre os segmentos repetitivos do sistema CRISPR (do inglês, Clustered regularly

interspaced short palindromic repeats). Se houver um novo ataque, a transcrição e o processamento

desse DNA pode levar à degradação Cas-dependente do DNA do bacteriófago. Estes mecanismos de

defesa (CRISPRs) são frequentes e têm sido encontrados em 40% das eubactérias e 90% das arqueas

sequenciadas.

Baseadas nesse mecanismo de imunidade bacteriana, E. Charpentier (Universidade de UMEA,

Suécia; Universidade de Viena, Áustria) e J. Doudna (Universidade de Califórnia, Estados Unidos)

mostraram que bastava juntar um RNA de fita única com a enzima Cas9 em um tubo de ensaio para

cortar qualquer sequência de DNA no lugar desejado. No ano seguinte, F. Zhang e G. Church (Harvard

Medical School) usaram o sistema CRISPR-Cas9 para editar o genoma de células animais e humanas.

Assim como as nucleases sítio-dirigidas ZNF’s ou TALEN, CRISPR pode ser utilizada para gerar

mutações de ponto, deleções ou inserções. Com pequenas alterações, CRISPR-Cas9 se transforma na

maquinaria ideal para inibir ou ativar genes, desenvolver estudos epigenéticos e induzir a expressão

gênica por substâncias químicas ou estímulos luminousos. Entre outras aplicações, O sucesso de

CRISPR-Cas9 se deve tanto a sua versatilidade como à simplicidade, já que as ferramentas básicas são

a enzima Cas e o RNA-guia, bem mais fácil e econômico de sintetizar que as proteínas (Figura 9.11).

Qual o status de um organismo editado? Em primeira aproximação, seria um organismo

geneticamente modificado. Porém, diferentemente dos OGMs que estão no mercado, um organismo

editado não carrega necessariamente genes de outras espécies. A edição pode inativar um gene, gerar

uma versão mais favorável de um gene existente ou transferir uma variante da mesma espécie, tal

como ocorreria na natureza por mutação espontânea ou por melhoramento. Deste ponto de vista, os

organismos editados não deveriam ser enquadrados na legislação existente.

--------------

FIGURA 9.11. A edição gênica com CRISPR-Cas9

Os mecanismos naturais da célula tendem a reparar o corte sítio-dirigido, produzindo-se alguns erros (mutação de ponto,

deleção) e possibilitando a inserção de um transgene.

Cas9 RNA-guia DNA genômico Corte Transgene + Gene repórter Mutação de ponto Deleção Inserção de um transgene

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Em mamíferos, a enzima e o RNA-guia podem ser introduzidos por injeção em células embrionárias;

em plantas por transfecção de protoplastos ou por agroinfiltração. Posteriormente à edição, as

nucleases são degradadas pelas células e desaparecem do organismo. No caso de usar uma construção

gênica, esta desaparece por segregação na divisão celular. Legalmente, a edição gênica não entraria

nos padrões atuais da regulamentação.

Existem repositórios onde são armazenadas centenas de plasmídeos e milhares de linhagens virais,

expressando Cas e um guia diferente de RNA. Nas bibliotecas de vírus (lentivírus, vírus adeno-

associados) estão armazenadas as sequências de mais de 18.000 genes. Estes bancos pertencem a

instituições como Harvard Plasmid Database, DNASU Plasmid Repository, National Institutes of

Health’s PlasmID, Mammalian Gene Collection ou a organizações independentes como Addgene e Zinc

Finger Consortium. Empresas como Thermofisher oferecem, além dos vetores, sistemas que por

transfecção mediada por lipídios podem ser introduzidos diretamente na célula, gerando resultados

em 4 dias.

A relevância das novas tecnologias de edição é indiscutível, como mostram algumas das primeiras

aplicações. Em bactérias, CRISPR permite remover modificações genéticas para se adequar a critérios

de biossegurança ou de proteção da propriedade intelectual; na indústria de laticínios, é utilizada para

proteger os bacilos lácticos das infecções virais. Também possibilita a obtenção de plantas resistentes

a vírus e árvores com menos lignina e menos taninos (Populus).

Como ferramenta de pesquisa, CRISPR é utilizada no estudo de ativadores e inibidores epigenéticos

e na edição de células-tronco para entender as doenças neurológicas. Desativando simultaneamente

vários genes, abre-se a possibilidade de estudar doenças poligênicas como autismo, diabetes ou

esquizofrenia. Conseguem-se criar animais knockin ou knockout por injeção de Cas9 e do RNA

específico no zigoto fertilizado. Basta que um animal ou as células de uma cultura in vitro tenham

incorporado por transfecção o gene codificador de Cas, para que só seja necessário acrescentar o RNA-

guia específico para as sequências-alvo escolhidas.

A patente das técnicas de edição gênica está sendo disputada por Doudna, Charpentier e Zhang. A

biotecnologia é hoje um empreendimento milionário construído sobre pesquisadores, universidades,

empreendedores, empresas, interesses econômicos de grandes capitais.

Pesquisadores chineses criaram macacos com dois genes alterados. Na Inglaterra, foram autorizados

experimentos de edição gênica com embriões que não serão implantados. A comunidade científica de

vários países começa a vislumbrar a possibilidade de edição genética de embriões para terapias

gênicas. A alteração da linhagem germinal representa até o momento uma fronteira técnica e

moralmente intransponível, mas qual será o posicionamento da sociedade?

BIOSSEGURANÇA E REGULAÇÃO

No Brasil, a principal norma reguladora sobre as atividades com organismos geneticamente

modificados é a Lei de Biossegurança (Lei n0 11.105, de 24 de março de 2005) que agrega diferentes

áreas do direito: ambiental, sanitário, defesa do consumidor, propriedade intelectual, civil,

administrativo e penal.

A palavra final sobre as questões técnicas corresponde à Comissão Nacional Técnica de

Biotecnologia (CTNBio), uma instância colegiada multidisciplinar “cuja finalidade é prestar apoio

técnico consultivo e assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação

da Política Nacional de Biossegurança relativa a OGM, bem como no estabelecimento de normas

técnicas de segurança e pareceres técnicos referentes à proteção da saúde humana, dos organismos

vivos e do meio ambiente, para atividades que envolvam a construção, experimentação, cultivo,

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A ENGENHARIA GENÉTICA

113

manipulação, transporte, comercialização, consumo, armazenamento, liberação e descarte de OGM e

derivados” (http://www.ctnbio.gov.br/index.php/content/view/2.html).

As normas da legislação brasileira estão de acordo com o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança

e as diretrizes do Codex Alimentarius e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico (OCDE).

Nem a biologia sintética nem a edição de genes se enquadram totalmente dentro das previsões de

um sistema regulatório baseado na engenharia genética. À medida que as novas tecnologias se

desenvolvam será necessário adequar a legislação, mantendo os princípios de precaução, contenção

e biossegurança.

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

C A P Í T U L O 10

BIOTECNOLOGÍA E INDÚSTRIA

O PROCESSO WEIZMANN

No século XIX, os principais produtores de borracha natural eram o Brasil e a Inglaterra (plantações na

Malásia). O processo de vulcanização, que confere ao material sua elasticidade e resistência (C. B.

Goodyear, 1839), e a invenção dos pneus (J. Dunlop, 1888) transformaram a borracha em um insumo

estratégico para o crescimento da indústria automotora.

Quando, em uma tentativa de dumping, os países produtores diminuíram a oferta e provocaram

um aumento significativo do preço, desencadeou-se a corrida à borracha sintética. Enquanto a

Alemanha tentava sintetizar a borracha a partir de um derivado do petróleo (butadieno), a Inglaterra

explorava as possibilidades de síntese de moléculas precursoras por fermentação.

Nesse contexto histórico, o químico de origem russa Chaim Weizmann desenvolveu, na

Universidade de Manchester (1914), um processo fermentativo que utilizava a bactéria Clostridium

acetobutilycum para a produção de butanol (um precursor do butadieno) e acetona. Por ser o primeiro

processo fermentativo industrial desenvolvido em condições assépticas, o processo Weizmann é

considerado um marco histórico na biotecnologia industrial.

No início da Primeira Guerra Mundial, a atenção da Inglaterra desviou-se da borracha para a

produção de explosivos e, especialmente, de cordite, uma pólvora à base de nitrocelulose cuja

preparação demanda acetona. Por ser sintetizada a partir de carbonato de cálcio, um insumo

importado da Alemanha, a via química de produção de acetona tornou-se inviável, tendo a Inglaterra

que começar a explorar a via biotecnológica.

Recrutado pelo Comitê de Munições e tendo cedido a patente do processo ao governo britânico,

Weizmann começou a produzir acetona, por fermentação microbiana de amido de milho, na Nicholson

Gin Distillery (Londres), mas, devido à guerra e à falta de alimentos, o suplemento de carboidratos

acabou se tornando um fator limitante na produção.

Em 1916, os britânicos transferiram a produção para uma destilaria em Toronto (Canadá), ao tempo

que era construída outra instalação na Índia. Em 1917 começou a funcionar uma fábrica produtora de

acetona por fermentação de milho em Indiana (Estados Unidos). Finalizada a guerra, a acetona e o

butanol continuaram a ser utilizados como solventes.

Os caminhos da ciência, da tecnologia e da política se cruzaram várias vezes. Químico e jornalista,

Weizmann chegou a ser um dos mais importantes líderes comunitários do movimento sionista

mundial. Sua contribuição ao esforço bélico da Primeira Guerra Mundial estaria relacionada com a

declaração Balfour (1918), que prometera ao povo judeu um lar na Palestina. Finalizado o mandato

conferido pela Liga das Nações à Grã-Bretanha (1947), criou-se o Estado de Israel (1948), do qual

Weizmann foi o primeiro presidente. Fundado em Rehovot (Israel), o Instituto de Pesquisas Científicas

e Tecnológicas leva o seu nome.

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

115

A INDÚSTRIA QUÍMICA

A VIA QUÍMICA

A indústria química se caracteriza por produzir substâncias que atendem as necessidades de outras

indústrias. Enquanto algumas empresas sintetizam os derivados petroquímicos básicos (etileno,

propileno, butadieno), outras os transformam nos petroquímicos finais: polietileno (PE), polipropileno

(PP), policloreto de vinil (PVC), poliésteres e óxido de etileno. Um terceiro grupo converterá esses

materiais em objetos de consumo tais como filmes, recipientes, objetos diversos etc.

As empresas devem responder às mudanças do mercado ajustando-se rapidamente a qualquer

variação de preço da matéria-prima ou da energia. Para subsistir, uma indústria terá que reagir com

versatilidade, mediante o desenvolvimento de processos tecnológicos inovadores e rentáveis. Os

processos descartados poderão ser reutilizados, se a condição do mercado tornar-se favorável

novamente.

Um exemplo típico é a evolução do mercado da acetona. Subproduto da corrida à borracha sintética

durante a Primeira Guerra Mundial, a acetona passou a ser um produto indispensável para a indústria

de armamentos. Uma vez concluído o conflito, reapareceu como solvente essencial na fabricação de

lacas, uma função da qual seria afastada mais tarde por outras substâncias.

A indústria química do século XX se baseou, principalmente, no petróleo e seus derivados. A crise

dos anos 1970 chamou a atenção da sociedade para os riscos da dependência de um recurso não

renovável. A diminuição das reservas conhecidas cria a necessidade de apelar a tecnologias de

extração novas e caras, geralmente insustentáveis. A situação poderá mudar quando, respondendo

aos apelos da sociedade para diminuir as emissões de carbono, o petróleo seja substituído parcial ou

totalmente, por fontes de energia alternativas.

A VIA BIOTECNOLÓGICA

A via biotecnológica está baseada na transformação da biomassa, um recurso barato e renovável. Para

substituir a via química, devem-se desenvolver processos que possibilitem a obtenção de produtos,

materiais e energia a um custo competitivo e com menor impacto ambiental. Todas estas condições

se encontram satisfeitas na obtenção de numerosas moléculas de interesse industrial, a partir de

milho, de óleos vegetais ou de madeira (Tabela 10.1).

--------------

TABELA 10.1. Diversidade de produtos derivados de algumas matérias-primas renováveis

SETOR MATÉRIA-PRIMA COMPONENTES APLICAÇÕES

Açúcar e amido

Cana-de-açúcar, beterraba açucareira, sorgo sacarino, trigo, milho, batata, arroz, mandioca etc.

Açúcar, amido, melaço.

Solventes, produtos farmacêuticos, adesivos, resinas, polímeros, selantes, limpadores, etanol.

Óleos vegetais

Canola, soja, coco, girassol, dendê, gorduras animais.

Triglicerídeos, ácidos graxos, glicerol.

Surfactantes para sabões e detergentes, ingredientes inativos de produtos farmacêuticos, tintas, pinturas, resinas, cosméticos, ácidos graxos, lubrificantes, materiais de construção.

Madeira Pinho, eucalipto. Celulose, papel e lignina.

Materiais de construção, fibras, polímeros, resinas, adesivos, pinturas, revestimentos, tintas, piche.

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A Biotecnologia Industrial fundamenta-se na microbiologia, nas fermentações e na biocatálise,

recebendo o impacto da biotecnologia moderna (genômica, engenharia metabólica, engenharia

genética), que abre perspectivas novas no melhoramento das linhagens microbianas e das variedades

vegetais.

A produção da vitamina B2 (BASF) e do antibiótico cefalexina (DSM Life Sciences Products) são dois

exemplos bem-sucedidos da substituição da síntese química pela ação microbiana. Esta resultará

vantajosa sempre que, entre o substrato inicial e o produto final, existam vários metabólitos

intermediários, porque um agente biológico será capaz de realizar diretamente a sequência completa

de reações.

A utilização de organismos geneticamente modificados, permite melhorar os processos produtivos

e desenhar produtos novos. Em relação à segurança, cabe lembrar que as características metabólicas

das linhagens industriais estão alteradas, de modo a elas crescerem em condições artificiais muito

estritas, tornando-as incapazes de sobreviver fora do laboratório ou, eventualmente, de competir com

os microrganismos do ambiente.

A percepção pública nutre uma atitude neutra, ou favorável, em relação à biotecnologia industrial.

Em parte, porque os produtos são utilizados como insumos para outras indústrias, o que lhes confere

pouca visibilidade. E também porque, ao utilizar matérias-primas renováveis e desenvolver processos

menos poluentes com menor gasto de energia, as biotecnologias ajudam a atenuar a imagem

poluidora da indústria química. Não é por acaso que a biotecnologia industrial é denominada

“biotecnologia branca”.

OS PRODUTOS BIOTECNOLÓGICOS

Alguns processos biotecnológicos geram substâncias em quantidades pequenas (volume baixo) que

serão vendidas a um preço elevado (alto valor agregado). Trata-se geralmente de metabólitos

secundários cuja produção demanda grandes investimentos, um nível tecnológico avançado e uma

mão de obra altamente qualificada. Nesta categoria, denominada química fina, inserem-se os produtos

farmacêuticos e agrícolas, alguns aditivos alimentares, os aminoácidos, as vitaminas e as enzimas.

A via biotecnológica também se aplica a algumas substâncias fabricadas em grandes quantidades

(volume alto), em processos que demandam investimentos menores, e operações mais simples. Entre

estes produtos, de valor agregado intermediário, encontramos metabólitos primários, tais como

alguns solventes, ácidos orgânicos e polímeros.

No caso de substâncias produzidas em grandes quantidades e com baixo valor agregado, como os

biocombustíveis líquidos (etanol, biodiesel) ou gasosos (biogás), alguns países contam com sistemas

produtivos em pequena escala, funcionando em instalações sépticas e com mão de obra não

especializada. Esses sistemas não exigem mais que equipamentos simples e pequenos investimentos,

mas sua eficiência é baixa, de modo que vão sendo substituídos, gradual e progressivamente, por

outros de nível tecnológico avançado, gerenciados por grandes empresas, em empreendimentos

economicamente sustentáveis.

Atualmente, a via biotecnológica resulta economicamente viável para alguns metabólitos, as

enzimas, os bioplásticos e os biocombustíveis.

METABÓLITOS DE INTERESSE COMERCIAL

Estima-se que a biotecnologia branca responderá, nos próximos anos, por 20% das vendas do setor

químico. Entre as moléculas de interesse comercial, vários metabólitos primários e secundários se

destacam por sua versatilidade (Tabela 10.2).

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

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ÁLCOOIS E SOLVENTES

Vimos previamente alguns aspectos históricos relacionados com a produção de acetona e butanol por

fermentação. Estima-se que a imobilização de microrganismos daria um novo impulso à síntese de

solventes, aumentando a produtividade em aproximadamente 60%. Também deve-se destacar a

importância do etanol, 95% do qual é produzido por via biotecnológica.

ÁCIDOS ORGÂNICOS

A produção de ácido cítrico (4.0 x 105 toneladas/ano) depende quase exclusivamente do cultivo do

fungo filamentoso Aspergillus niger, em processos fermentativos de diversos tipos. O ácido cítrico é

utilizado na indústria de alimentos como aditivo (acidulante e antioxidante), na cosmética como

regulador do pH e, na indústria farmacêutica, como anticoagulante e ingrediente de tabletes

efervescentes.

Em relação ao ácido acético, os processos industriais modernos também dependem da ação

bacteriana (gêneros Acetobacter, Gluconacetobacter e Gluconobacter). Com numerosas aplicações, o

ácido acético é um precursor de várias moléculas intermediárias, como o anidrido acético e os acetatos

éster, e de produtos como o acetato de celulose, o celofane, o acetato raiom etc. Também participa

como solvente na produção de borracha, plásticos, gomas, resinas e óleos voláteis. A indústria

farmacêutica o utiliza como acidificante.

O ácido láctico é obtido por fermentação bacteriana (Lactobacillus) ou fúngica (Rhizopus oryzae),

sendo um importante insumo para as indústrias de alimentos e de fármacos e a cosmética. Também

toma parte, como monômero, na síntese de um polímero biodegradável, o ácido poliláctico (PLA).

O ácido succínico encontra aplicações em várias indústrias (alimentos, fármacos, cosmética), assim

como na produção de plásticos e de materiais para a indústria automotora. Trata-se de outro bloco

fundamental para a síntese de polímeros, resinas de ABS (acrilo-nitrilo-butadieno), Nylon 6.6,

solventes etc.

AMINOÁCIDOS

A produção industrial de aminoácidos se destina, principalmente, à nutrição humana (66%) e ao

enriquecimento de rações animais (33%) e, em menor grau, às indústrias farmacêuticas e cosméticas

(1%). O método produtivo mais antigo é a extração, por hidrólise de proteínas (soja, cabelos); os outros

métodos incluem a síntese, a fermentação e a biocatálise.

A síntese química apresenta o inconveniente de gerar misturas das duas formas isoméricas (acil-D

e acil-L), representadas habitualmente como tipo “mão direita" e tipo "mão esquerda". Como os

organismos vivos só assimilam L-aminoácidos, estes devem ser separados das misturas racêmicas por

biocatálise. A imobilização de enzimas estereoespecíficas nos biorreatores facilita a produção

industrial, reduzindo os custos de maneira significativa. Observe-se que a separação é desnecessária

no caso da glicina, que não apresenta ambas as formas, e da DL-metionina, já que os seres vivos

convertem a forma D em L.

A via fermentativa é conveniente para a produção de vários aminoácidos. O agente biológico

Corynebacterium glutamicum produz ácido glutâmico (1,1 milhão de toneladas/ano), que é usado na

cozinha oriental como flavorizante (glutamato monossódico), para realçar o sabor dos alimentos.

A L-fenilalanina e o ácido L-aspártico são obtidos por imobilização conjunta de Escherichia coli e

Pseudomonas dacunhae, em uma coluna de fermentação, ou por uma bactéria geneticamente

modificada (Escherichia coli). Ambos são os componentes do adoçante não calórico Aspartame®

(15.000 toneladas/ano).

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TABELA 10.2. Metabólitos primários e secundários obtidos por fermentação e/ou bioconversão enzimática

METABÓLITOS PRIMÁRIOS EXEMPLOS

Álcoois e solventes Etanol, butanol, acetona, glicerol, manitol.

Ácidos orgânicos Ácido láctico, ácido cítrico, ácido acético, ácido glucônico, ácido itacônico, ácido málico, ácido tartárico, ácido pirúvico, ácido succínico.

Aminoácidos Ácido L-glutâmico (monoglutamato de sódio), L-lisina, L-fenilalanina, ácido L-aspártico, L-carnitina.

Polissacarídeos Xantana, dextrana, pululana, gelana, agar, alginatos, carrageninas.

Nucleotídeos e nucleosídeos Ácido guanílico (5’GMP) e ácido inosínico (5’IMP).

Vitaminas Vitamina B2 (riboflavina), vitamina C (ácido L-ascórbico), vitamina B12 (cianocobalamina).

Corantes β-caroteno, astaxantina, ficocianina, monascina.

METABÓLITOS SECUNDÁRIOS EXEMPLOS

Moléculas para a saúde humana e/ou animal

Antibacterianos, antivirais, antifúngicos, anti-helmínticos, antitumorais, soros, imunoglobulinas, vacinas, imunossupressores, estatinas etc.

Moléculas para a agricultura Inseticidas e pesticidas, fatores de crescimento vegetal.

Moléculas para a indústria de alimentos

Condimentantes e aromatizantes para a indústria alimentícia.

--------------

Outros aminoácidos cumprem a função de aditivo em alimentos (L-cisteína, 3.000 toneladas/ano), ou

de complemento nutricional em rações animais (L-treonina, 50.000 toneladas/ano; L-lisina 550.000

toneladas/ano). Por outro lado, a indústria farmacêutica absorve 1.000 toneladas/ano de L-arginina e

500 toneladas/ano de L-triptófano, de L-valina e de L-leucina.

NUCLEOTÍDEOS E NUCLEOSÍDEOS

No Japão, os ácidos guanílico (5’-GMP) e inosínico (5’-IMP) são obtidos mediante diferentes processos

fermentativos, e vendidos comercialmente como potenciadores de sabor.

POLISSACARÍDEOS

Os espessantes e gelificantes, extraídos das algas marinhas, estão sendo substituídos, parcialmente,

por polissacarídeos de origem microbiana. A goma xantana (20.000 toneladas/ano), um produto de

fermentação da bactéria Xanthomonas campestris, entra na composição de molhos prontos, pudins,

geleias, sorvetes, dentifrícios etc. Suas propriedades espessantes também são utilizadas na

recuperação do petróleo.

As dextranas (200 toneladas/ano) são obtidas por via fermentativa, a partir de diversos

microrganismos. As de alto peso molecular são empregadas como espessantes na indústria de

alimentos, na preparação de filmes protetores de sementes (indústria agrícola) e na composição das

emulsões fotográficas. As de baixo peso molecular são usadas como plasma sanguíneo artificial, para

melhorar o fluxo sanguíneo em casos de traumatismos e cirurgias.

VITAMINAS

Apesar da maior parte das vitaminas serem obtidas, industrialmente, por via sintética ou extrativa, a

via fermentativa é vantajosa nos casos da riboflavina (vitamina B2) e do ácido ascórbico (vitamina C).

Ainda é a única possível para a cianocobalamina (vitamina B12), uma molécula complexa que não é

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sintetizada nem por animais nem por vegetais.

Um precursor da vitamina A, o -caroteno, é sintetizado pela alga Dunaliella bardawil, que cresce

na água salobra, em grandes tanques ao ar livre, em uma região desértica perto da costa do Mar

Vermelho (Israel).

ENZIMAS

Algumas enzimas podem ser extraídas facilmente dos tecidos ou dos órgãos de seres vivos: as amilases

do malte da cevada; a papaína da papaia; a ficina do figo, a bromelina do látex do abacaxi. Do estômago

de suínos se separa a pepsina e do pâncreas dos mesmos se obtém a pancreatina, que é uma mistura

de amilases, proteases e lipases. Já a renina é extraída do quarto estômago de bezerros, e a catalase,

do fígado ou do sangue de bovinos.

A extração de enzimas de origem vegetal ou animal está sujeita à disponibilidade de terra e às

flutuações das colheitas ou do abate. Por isso, a tendência é substituí-las por outras de origem

microbiana que, obtidas mediante processos fermentativos em grande escala, garantem uma

produção regular de qualidade constante.

Mesmo cumprindo uma função idêntica, duas enzimas produzidas por microrganismos diferentes

podem apresentar propriedades dessemelhantes. Por exemplo, a lactase (-galactosidase), uma

enzima que hidrolisa a lactose, está presente em bactérias, leveduras e fungos. No entanto, as

condições ótimas de funcionamento diferem uma da outra: 400C, 370C e 55-600C (temperatura); 3-4,

7,2 e 6,6 (pH). A escolha de uma enzima proveniente de um microrganismo ou de outro dependerá

das condições que o bioprocesso demande.

Considerando que ainda há muito a desvendar sobre a biodiversidade microbiana e a arte de alterar

suas vias metabólicas, existem grandes chances de encontrar enzimas com propriedades diferentes,

que possibilitem o desenho de processos industriais inovadores. Por outro lado, a chegada das novas

técnicas de biologia molecular aliadas aos sistemas robotizados de HTS (do inglês, High Throughput

Selection) dará, certamente, um impulso extraordinário a esta área.

A otimização de um processo industrial contempla o custo da matéria-prima, o tipo de fermentação

(submersa ou em meio semissólido) e os controles de pH e temperatura, necessários para o bom

desenvolvimento do processo. Do ponto de vista econômico, não vale a pena elaborar ou

redimensionar esses parâmetros para todo microrganismo produtor de uma enzima interessante.

Muito mais proveitosa é a transferência da sequência codificadora dessa enzima a um dos

microrganismos industriais já bem conhecidos, tais como as bactérias do gênero Bacillus (Bacillus

subtilis) e os fungos do gênero Aspergillus (Aspergillus oryzae).

Mais de 60% da produção comercial de enzimas procede da biotecnologia moderna, com linhagens

seguras, versáteis, altamente produtivas, sem desvios metabólicos laterais, e adaptáveis aos

bioprocessos industriais.

Um fator que incide no custo de uma enzima é a dificuldade técnica encontrada na separação e

purificação (etapa downstream). Em geral, as enzimas mais baratas são as extracelulares, ou seja, as

que são secretadas para fora da célula como, por exemplo, as hidrolases (amilases, proteases e

celulases). As mais caras são as enzimas intracelulares, que precisam ter um grau de pureza maior para

ser utilizadas como fármacos, ou como reagentes em testes de diagnóstico.

As enzimas são insumos para outras indústrias, especialmente as de alimentos e bebidas, rações,

detergentes, analíticas e farmacêuticas. Atualmente, o maior produtor é Novozyme (Dinamarca), que

responde por 48% do mercado. A empresa mantém em funcionamento vários fermentadores de

80.000 l, contabiliza mais de 6.000 patentes e 700 produtos, dedicando a quase totalidade de seu

orçamento de pesquisa e desenvolvimento à otimização de microrganismos, produtos enzimáticos e

tecnologia. A demanda de enzimas industriais se mantém relativamente estável em economias

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maduras (Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá) e cresce em economias em

desenvolvimento.

BIOPOLÍMEROS E BIOPLÁSTICOS

A denominação de biopolímeros abrange aqueles que são sintetizados pelos seres vivos, como a

celulose, o amido e os óleos vegetais; e os que resultam da polimerização de uma molécula básica,

como o ácido láctico, proveniente de uma fonte renovável.

Um dos bioplásticos mais versáteis é o polilactato (PLA), um poliéster comercializado como Ingeo®,

obtido por polimerização do ácido láctico, um produto da fermentação de milho. Utiliza-se como

revestimento de filmes e de papel (BASF), recheio de almofadas e edredons (NatureWorks) e material

de embalagens descartáveis por diversas empresas (Coca-Cola, McDonald’s). Também está sendo

aproveitado na indústria automotora (Hyundai) e eletrônica (Samsung). Uma das novas aplicações do

Ingeo® por NatureWorks, está nas impressoras 3D.

Polímeros sintetizados diretamente por microrganismos, como os poli-hidroxialcanoatos (PHAs) e

o poli-hidroxibutirato (PHB), já entraram no mercado de embalagens das indústrias de alimentos e de

cosméticos. Este último, por ser biocompatível, encontrou importantes aplicações nas áreas médica e

veterinária (Biopol). No interior de São Paulo, uma usina piloto (Biocycle), relacionada com empresas

do setor sucroalcooleiro (Biagi, Balbo), já está produzindo PHB por fermentação bacteriana do açúcar

de cana. Está sendo pesquisada a transferência dos genes codificadores de PHA (Ralstonia eutropha)

e de PHB (Alcaligenes eutropus), a microrganismos e plantas (canola).

A indústria dispõe atualmente de, aproximadamente, trinta moléculas essenciais para a construção

de polímeros, tais como os ácidos carboxílicos, o etanol, os aminoácidos, os triglicerídeos, o furfural, o

sorbitol, o glicerol etc. Essas biomoléculas possibilitam tanto a obtenção de plásticos inovadores

biodegradáveis, como a de plásticos convencionais, não biodegradáveis e semelhantes aos de origem

petroquímica. Entre estes: as resinas de poliuretano sintetizadas a partir de óleo de soja, o poliéster

de origem bacteriano Sorona 3GT (DuPont, Genencor) de amplo uso na indústria têxtil, do PVC ou

“polietileno verde” (Braskem, Tetrapak), que é um polímero do etileno obtido a partir do etanol de

cana utilizado nas embalagens de leite e sucos de fruta, e na confecção de sacos de lixo.

Como caracterizar um bioplástico? Pela origem? Pela biodegradabilidade? Existe bastante confusão

a esse respeito, porque alguns setores consideram que a proveniência ou a biodegradabilidade

bastariam para aplicar-se o rótulo de bioplástico. Contudo, uma substância só deveria ser considerada

bioplástico se respondesse, simultaneamente, aos dois critérios: proveniência de uma fonte renovável

e biodegradabilidade.

OS BIOCOMBUSTÍVEIS

A combustão é a forma mais simples de liberar energia; por isso algumas comunidades rurais queimam

madeira, resíduos vegetais ou excrementos secos de ruminantes. Contudo, 75% da energia consumida

no planeta é retirada dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural). Considerando que as

reservas são limitadas, e que a queima de combustíveis fósseis é a causa de vários problemas

ambientais, parece acertado buscar outras formas de extrair energia.

Uma fonte alternativa é a biomassa, um recurso que, por ser renovável, pode fornecer energia de

modo sustentável. A grande vantagem da biomassa sobre os combustíveis fósseis é que libera uma

quantidade de CO2 igual à que absorveu durante o seu crescimento em um período recente, enquanto

a quantidade de CO2 liberada pelos combustíveis fósseis fora removida do ambiente há milhões de

anos.

--------------

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

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FIGURA 10.1. As etapas necessárias para a produção de etanol a partir de diferentes matérias-primas

--------------

A tecnologia fermentativa nos oferece combustíveis eficientes, como o etanol ou o biogás. Existem

outras possibilidades, tais como a obtenção de biodiesel por transformação química de óleos vegetais

e, futuramente, a produção de hidrogênio a partir de água, utilizando a capacidade fotossintética das

microalgas.

Os biocombustíveis contribuem para reduzir alguns dos problemas ambientais que tanto nos afligem,

tais como a acumulação de CO2 e outros gases de efeito estufa (óxido nitroso e metano). Nos países

que os adotam, os biocombustíveis substituem a gasolina, parcial ou totalmente, modificando a

realidade do setor de transportes.

Curiosamente, os primeiros automóveis de Henry Ford, com motores de ignição por centelha,

funcionavam com etanol de milho, e os primeiros motores de Rudolf Diesel, de ignição por

compressão, o faziam com óleo de amendoim. Com o petróleo barato, passou-se a utilizar gasolina e

óleo diesel para os automotores, mas o aumento dos preços, ocorrido na década de 1970, mostrou a

conveniência de substituir os derivados do petróleo por etanol e biodiesel.

Atualmente, o etanol é o principal biocombustível líquido para transporte. A maior parte da

produção (90%) está concentrada no Brasil e nos Estados Unidos, como produto da fermentação da

cana-de-açúcar e do milho, respectivamente. Os outros países produtores são o Canadá, a China, a

União Europeia (França e Alemanha) e a Índia.

Embora um litro de etanol forneça bem menos energia que um litro de gasolina (66%), sua maior

octanagem melhora o desempenho das misturas etanol-gasolina. Até que ponto o etanol será capaz

de substituir a gasolina? A resposta dependerá da tecnologia disponível, do processo produtivo e do

preço do petróleo. Estima-se que, no Brasil, o bioetanol de cana-de-açúcar seria competitivo com o

barril de petróleo a US$ 30-35; nos Estados Unidos, onde o etanol se produz a partir de milho, isso

ocorreria com o barril de petróleo a US$ 55-80.

No entanto, a produção de etanol a partir de biomassa levanta alguns problemas. Como os cultivos

do milho e da cana demandam muita água, procura-se encontrar outras fontes menos exigentes:

pinhão-manso, sorgo sacarino, capim (Panicum virgatum) e outras gramíneas perenes (Miscanthus).

Hidrólise enzimática Hidrólise ácida ou enzimática

CALDO AÇUCARADO FERMENTESCÍVEL

Fermentação

Destilação

BIOMASSA CELULÓSICA BIOMASSA SACARINA BIOMASSA AMILÁCEA

ETANOL

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Uma fonte de controvérsia é o desvio de matérias-primas alimentícias, como o milho ou a soja, para a

produção de biocombustíveis, porque redunda no aumento do preço dos alimentos e penaliza os

setores mais pobres da população. Também preocupa a expansão dos cultivos agroindustriais,

favorecendo o desmatamento e afetando a biodiversidade. A solução parece estar na obtenção de

etanol a partir de resíduos lignocelulósicos, uma tecnologia complexa, ainda em desenvolvimento

(Figura 10.1).

O ETANOL

A PRODUÇÃO POR VIA FERMENTATIVA

A produção de etanol pela via biotecnológica envolve a ação fermentativa de leveduras sobre um

substrato adequado: cana-de-açúcar, beterraba açucareira, sorgo sacarino, milho. No Brasil, a matéria-

prima é a cana-de-açúcar (Figura 10.2).

Após a colheita, a cana é transportada até a usina onde é triturada, separando o caldo do bagaço, que

é utilizado como combustível, gerando calor e eletricidade para o próprio estabelecimento. Reserva-

se o caldo à produção de açúcar ou de etanol. Um subproduto da produção de açúcar, o melaço, é

reincorporado ao processo produtivo de sacarose ou misturado ao caldo de cana para a obtenção de

etanol.

Antes de dar início à fermentação, são acrescentados no caldo os nutrientes e antissépticos

necessários, ajustando-se também outros parâmetros, como a temperatura e o pH. O processo

fermentativo ocorre nas dornas (biorreatores) por obra das leveduras, naturais ou selecionadas. A

condução do procedimento, contínua ou descontínua, depende do estabelecimento assim como da

complexidade e automação dos equipamentos disponíveis. Concluída a fermentação, recuperam-se as

leveduras por centrifugação, com vistas a uma posterior reutilização e/ou à produção de ração animal.

Da destilação do vinho se obtém a flegma, um líquido com álcool em maior concentração, e um

resíduo denominado vinhaça ou vinhoto, que deve ser tratado antes de despejado no ambiente. A

retificação, isto é, a eliminação das impurezas da flegma, gera o álcool hidratado, que é convertido em

álcool anidro por desidratação.

A SUBSTITUIÇÃO DA GASOLINA – O CASO DO BRASIL

No Brasil, 63% da energia provém de fontes renováveis: grandes hidroelétricas (42%), madeira (10%),

cana-de-açúcar (9%), outras (2%). A contribuição da cana-de-açúcar está diretamente relacionada com

o uso do etanol como combustível.

Calcula-se que 60% da cana-de-açúcar plantada no Brasil destina-se à produção de etanol por

fermentação. Em outros países utilizam-se matérias-primas diferentes, tais como a beterraba

açucareira (União Europeia) ou o milho (Estados Unidos). A desvantagem das matérias-primas

amiláceas é que demandam um tratamento enzimático (sacarificação), antes da fermentação (Figura

10.1).

A crise do petróleo, na década de 1970, provocou um aumento significativo do preço, mostrando a

necessidade de substituir a gasolina por outras fontes de energia. Em 1975, o Brasil instituiu o

Programa Nacional do Álcool (Pró-Álcool), visando a produção de etanol como combustível alternativo

para os carros de passeio. Pouco tempo depois, na década de 1980, 5.000.000 de carros funcionavam

com etanol (94% de etanol, 6% de água), e outros 9.000.000 com uma mistura de álcool e gasolina

(78% de gasolina, 22% de álcool).

Em 1989, a queda do preço do petróleo e os problemas inerentes ao próprio Pró-Álcool (subsídios,

baixa produtividade) provocaram uma crise de desabastecimento, abalando seriamente o programa.

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Reativado na década de 1990, desta vez obedecendo a critérios de produtividade, tanto na lavoura

como na indústria, o programa deixou de receber subsídios.

Hoje, mais de três milhões de carros são movidos com álcool hidratado, enquanto o álcool anidro

é aditivado à gasolina, em uma proporção que varia entre 20 e 24%, dependendo da relação

oferta/procura. A introdução, em 2003, da tecnologia flexfuel, que permite abastecer os carros tanto

com gasolina como com álcool hidratado, deixa ao consumidor a possibilidade de escolher o

combustível, em função de considerações econômicas e ambientais.

A produção de etanol no Brasil, estimada em 29,2 bilhões de litros, passa por uma fase de pouco

crescimento, devido às políticas energéticas. O setor sucroalcooleiro de hoje é um enorme complexo

--------------

FIGURA 10.2. A produção de etanol a partir da cana-de-açúcar

LAVOURA Transporte Trituração e extração

CALDO, GARAPA BAGAÇO Combustível OU MOSTO

LEVEDURAS Reaproveitamento Fermentação

MELAÇO AÇÚCAR CO2 VINHO LEVEDURAS Ração animal Destilação

FLEGMA VINHAÇA Fertilizante Retificação Desidratação

CANA-DE-AÇÚCAR

ETANOL HIDRATADO

ETANOL ANIDRO

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industrial de mais de 400 indústrias, com participação de várias multinacionais em um mercado

consolidado através de ciclos de aquisições e fusões. As pequenas usinas foram suplantadas por outras,

tecnologicamente aprimoradas, que desenvolvem sistemas de produção integrados (biorrefinerias).

Lentamente, a mecanização da colheita elimina a necessidade das queimadas e modifica as

condições de trabalho nos canaviais. Além de etanol, as instalações industriais fabricam aglomerado,

ração animal, adubo, celulose etc. O aproveitamento do bagaço é fundamental, porque permite gerar

a energia necessária para o funcionamento das usinas e até exportá-la, aumentando a matriz

energética renovável do país.

A obtenção de variedades de cana-de-açúcar com diferentes períodos de desenvolvimento (rápido,

médio e tardio), assim como o plantio sequencial, diminuem as flutuações na oferta de matéria-prima.

O projeto Genoma-cana, uma parceria entre a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de

São Paulo), várias universidades e o setor sucroalcooleiro, facilitará o melhoramento da planta (teor

de açúcar, resistência a pragas, resistência à seca). Encontra-se em andamento o melhoramento das

leveduras, procurando desenvolver microrganismos mais produtivos e tolerantes ao etanol, ou com

características (floculação) que facilitem sua recuperação uma vez concluída a fermentação.

O BIOGÁS

A BIODIGESTÃO ANAERÓBIA

A digestão microbiana da matéria orgânica, em condições aeróbias produz água (H2O) e dióxido de

carbono (CO2), e em condições anaeróbias, metano (CH4), dióxido de carbono (CO2) e água (Figura

10.3). Nos ambientes confinados de pântanos e sepulcros, o metano liberado gera alguns fenômenos

assustadores de combustão espontânea (“luzes dos cemitérios”). Nas condições mais controladas de

um aterro sanitário ou de um biorreator (= biodigestor), o gás acumulado poderá ser utilizado como

combustível (biogás).

O processo fermentativo de biodigestão anaeróbia se desenvolve sobre resíduos rurais (esterco),

agroindustriais (vinhaça, efluentes das indústrias de laticínios e dos matadouros), domésticos ou

comunitários (lama de esgotos) e, também, sobre plantas (aguapé). Coloca-se a matéria-prima no

biodigestor, em condições anaeróbias e pH neutro (6,7-7,7), evitando a presença de substâncias

solventes ou de inseticidas, que prejudicariam o desenvolvimento do processo.

Dependendo da temperatura do biodigestor, haverá uma multiplicação de bactérias mesófilas

(350C) que processarão a matéria-prima em 15-30 dias, ou termófilas (550C) que o farão em 12-14 dias.

A segunda opção libera mais biogás, mas requer maior consumo de energia e um monitoramento

cuidadoso, porque as bactérias termófilas não suportam bem as variações de temperatura.

A decomposição anaeróbia envolve a sucessão biológica de várias populações naturais de

microrganismos, de modo que as melhoras tecnológicas visam, exclusivamente, a engenharia do

processo. Este pode ser conduzido tanto de maneira descontínua como contínua, em biodigestores

especialmente construídos para permitir o abastecimento diário de matéria-prima e a retirada de

biogás. Existe um número grande de modelos de fermentadores, desde os muito simples (modelo

tailandês, chinês, indiano) até os automatizados, que processam um volume grande de matéria-prima.

Um dos resíduos da biodigestão é um material sólido fibroso que, uma vez compostado e prensado,

vende-se como “solo artificial”, para o cultivo de plantas ou para melhorar a qualidade do solo. O outro

é um efluente líquido, que se aproveita como adubo (Figura 10.4).

A UTILIZAÇÃO DO BIOGÁS

O biogás está formado por 50-65% de metano e 35-50% de dióxido de carbono, com traços de gás

sulfídrico (corrosivo), nitrogênio, oxigênio e hidrogênio; pode ser usado diretamente ou armazenado.

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

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RESÍDUOS ORGÂNICOS VEGETAIS E ANIMAIS

O2 MOLÉCULAS ORGÂNICAS SIMPLES

ACETATO

Aerobiose Anaerobiose

H2O CO2

Entre as aplicações possíveis está o abastecimento do consumo doméstico (fogões, lampiões ou

aquecedores), a geração de energia elétrica e o acionamento de motores de veículos. Seu poder

calorífico é menor que o do gás natural, um combustível fóssil cuja composição inclui metano, etano,

propano e butano (Tabela 10.3).

A primeira fábrica de biogás começou a funcionar em 1859 em Bumbai (Índia). A iniciativa

alcançou bastante sucesso e, em 1980, a Índia contava com 150.000 biodigestores. Talvez seja esta

uma das razões pelas quais a digestão anaeróbia seja considerada um processo biotecnológico

apropriado para pequenas cidades e comunidades rurais. No entanto, a produção de biogás pode

alcançar outra dimensão, se for encarada como uma tecnologia moderna que visa a produção de calor

e de eletricidade (Figura 10.5).

A Dinamarca é o líder mundial na produção de biogás, estando a tecnologia bem desenvolvida em

outros países como os Estados Unidos, a Alemanha, a França, o Japão e a Suécia. Em 1995, quando

contabilizava mais de cinco milhões de pequenos biodigestores rurais, a China teve o empenho de

construir reatores tecnologicamente avançados para o tratamento de rejeitos urbanos e a geração

de eletricidade.

Na América Latina, algumas pequenas comunidades contam com geradores de biogás que as

abastecem com energia suficiente para cozer os alimentos ou alimentar um motor. Contudo, nos

últimos anos surgiram vários projetos ambiciosos de exploração do potencial existente nos aterros

sanitários urbanos (Olavarría, Argentina; Bandeirantes, Nova Iguaçu e Petrópolis, Brasil; Santiago,

Chile; Monterrey, México; Maldonado, Uruguai). O tratamento dos rejeitos agroindustriais,

especialmente da indústria açucareira e da suinocultura, também é uma fonte considerável de biogás.

Cuba conta com mais de 100 fábricas produtoras de biogás.

A produção de bioplásticos a partir do biogás gerado em estabelecimentos agrícolas representa

uma tecnologia recente, patenteada pela empresa norteamericana Newlight. A empresa sueca IKEA,

especializada em mobiliário doméstico, planeja substituir 40% do plástico utilizado pelo bioplástico

da Newlight.

--------------

FIGURA 10.3. A biodigestão em condições aeróbias e anaeróbias.

H2O CH4 CO2

BIOGÁS

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FIGURA 10.4. As complexas etapas da produção de biogás dentro do biodigestor

TABELA 10.3. O poder calorífico de vários combustíveis.

GÁS PODER CALORÍFICO (Kcal/m3) GÁS PODER CALORÍFICO (Kcal/m3)

Butano 28.000 Gás natural 7.600

Propano 22.000 Biogás 5.500

Metano 8.500 Gás de cidade 4.000

FIGURA 10.5. As utilizações do biogás

MATÉRIA-PRIMA

MOLÉCULAS COMPLEXAS

Microrganismos fermentativos

MOLÉCULAS SIMPLES

Bactérias acidogênicas BIODIGESTOR

ÁCIDOS E ÁLCOOIS

Bactérias acetogênicas

ACETATO

Bactérias metanogênicas

MATERIAL SÓLIDO FIBROSO

+ EFLUENTE LÍQUIDO

BIOGÁS

BIOGÁS

ENERGIA TÉRMICA ENERGIA ELÉTRICA

COMBUSTÍVEL

TRANSPORTE AUTOMOTOR

PLANTAS PURIFICADORAS E DE ARMAZENAMENTO

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

127

O BIODIESEL

A TRANSESTERIFICAÇÃO

O biodiesel é um combustível composto por ésteres (etílicos ou metílicos) produzidos na reação

química de transesterificação entre óleos vegetais e álcool (etanol ou metanol), em presença de um

catalisador inorgânico ou enzimático (lípases) (Figura 10.6).

Um dos subprodutos da reação é o glicerol (5 a 10% do produto bruto), geralmente aproveitado

pelas indústrias de alimentos, de cosmética e de medicamentos. Diferentemente do bagaço de cana,

o glicerol gera uma substância tóxica (acroleína) quando é queimado, de modo que aumentar a

produção de biodiesel significa aumentar o leque de aplicações do glicerol.

O biodiesel fornece entre 88 e 95% da energia do diesel, mas pode ser misturado com o diesel

convencional, em proporção variando de 1% (B1) a 20% (B20), aumentando a qualidade do

combustível e diminuindo a emissão de partículas poluentes e de gases tóxicos na atmosfera.

--------------

FIGURA 10.6. A reação de transesterificação

--------------

A PRODUÇÃO DE BIODIESEL

A produção de biodiesel está localizada principalmente na União Europeia (60%) e, em menor parte,

nos Estados Unidos, na China, na Indonésia e na Malásia. A matéria-prima é variada: soja nos Estados

Unidos, canola na União Europeia e no Canadá, soja e girassol na Argentina, dendê na Ásia. No Brasil,

tem-se experimentado soja, mamona, babaçu, dendê, girassol, milho, amendoim, pinhão-manso etc.

A implementação do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) estimula a

produção sustentável, enfatizando a inclusão social e o desenvolvimento regional. Desde 2010,

adiciona-se no Brasil 5% de biodiesel ao diesel convencional, estimando-se que a proporção chegue a

20% até 2020.

Restam alguns pontos a considerar, especialmente em relação à utilização de matérias-primas

como a mamona, com o intuito de estimular o pequeno agricultor. Em princípio, o biodiesel é carbono-

neutro. No entanto, diferente do etanol de cana, o sistema produtivo seria carbono-negativo, quando

se leva em conta a energia necessária para adubação e irrigação da terra, a movimentação da

maquinaria agrícola, o armazenamento e transporte da matéria-prima e dos produtos etc.

H2C – O – CO – R CH2OH

HC – O – CO – R + 3R’ – OH HCOH + 3R – O – CO – R’

H2C – O – CO – R CH2OH

Triglicerídeos Álcool Glicerol Ésteres

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Do ponto de vista energético, os sistemas produtivos tradicionais mais eficientes seriam os associados

aos complexos agroindustriais (soja, milho, girassol), embora apresentem o grave defeito de desviar

para a produção de energia as matérias-primas de alimentos e rações.

O PANORAMA ATUAL

A primeira geração de biocombustíveis abrange o etanol (açúcar de cana-de-açúcar, sorgo sacarino ou

beterraba, amido de milho) e o biodiesel (óleos vegetais). A segunda geração de bioetanol utilizaria

biomassa lignocelulósica proveniente dos resíduos agroindustriais, tais como bagaço e folhas de cana,

palha e sabugo de milho, serraduras e aparas de madeira etc.

A maior dificuldade reside na própria estrutura da matéria-prima lignocelulósica. A celulose

(polímero de hexoses) e a hemicelulose (polímero de hexoses e de pentoses) se encontram

circundadas por lignina, uma substância de suporte das plantas, sendo necessário um pré-tratamento

que as separe, possibilitando a hidrólise enzimática e a liberação de açúcares fermentescíveis (hexoses

e pentoses).

Equipamentos com o design apropriado e enzimas celulolíticas (celulases e hemicelulases) para uso

indústrial já estão a caminho. Algumas indústrias funcionam experimentalmente na Suécia, na

Espanha, na Dinamarca, no Canadá e nos Estados Unidos. O Brasil conta, desde 2013, com uma

instalação piloto em Alagoas (GranBio).

BIORREFINARIAS E NOVAS BIOINDÚSTRIAS

O milho dá origem a numerosos produtos: glicose, ácido cítrico, bioplástico, biocorantes, bioetanol,

xantano, lisina, vitaminas etc. Por analogia com as refinarias de petróleo, uma biorrefinaria é um

complexo industrial com instalações para o processamento biotecnológico, químico, físico e térmico

da matéria-prima renovável, que será transformada em numerosos intermediários químicos e

bioquímicos, alimentando um conjunto de linhas de produção muito diversificado.

Localizadas perto das fontes de matéria-prima, e visando a autossustentabilidade energética, o

objetivo final das biorrefinarias é gerar numerosos produtos intermediários e funcionar sem

desperdício algum.

Distante do consumidor, a Biotecnologia Industrial encontra poucas resistências. O

desenvolvimento da biologia molecular e a chegada da biologia sintética abrem novas perspectivas,

que vão desde a produção de biocombustíveis (volume alto, baixo valor agregado) para o transporte

até a obtenção de metabólitos intermediários (volume baixo, alto valor agregado) para as indústrias

de cosmética e de alimentação.

Dentre as numerosas empresas existentes, que utilizam a biologia sintética para novas aplicações,

Amyris do Brasil e Solazyme Bunge mantêm instalações no Brasil, perto do setor sucroalcooleiro ao

qual estão ligadas. Os pareceres da CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) sobre as

construções microbianas respectivas podem ser consultados em www.ctnbio.gov.br.

O CASO AMYRIS

A artemisina (quinghaosu) é um medicamento antimalárico, obtido a partir de um extrato da planta

Artemisia annua. Sua descoberta, em plena Revolução Cultural, valeu o Prêmio Nobel de Medicina de

2015 à pesquisadora chinesa Tu YouYou.

Em 2000, a equipe de J. Keasling em Berkeley (Califórnia, Estados Unidos) obteve, via engenharia

genética, uma levedura produtora de artemisina. Em 2003, Keasling fundou a empresa Amyris

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BIOTECNOLOGIA E INDÚSTRIA

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MATÉRIA-PRIMA (Açúcar) ARTEMISINA (antimalárico)

BIOFENO ® NEOSSANCE®

Farneseno (C15) Esqualeno e COSMÉTICOS Hemiesqualeno Farnesano BIODIESEL E OUTROS PRODUTOS QUÍMICOS Isopreno (C5) COMBUSTÍVEL DE AVIAÇÃO Isoprenoides (C10) POLÍMEROS

Biotechnology e, com o apoio da Fundação Bill e Melinda Gates e de Sanofi-Aventis, conseguiu

aumentar significativamente (100.000 X) a produção de artemisina, diminuindo o custo do tratamento

a menos de 1 dólar (Figura 10.7 A).

Bloqueando uma via metabólica celular da levedura, Amyris obteve uma linhagem que, em vez de

artemisina, produz farneseno (Biofene®, C15H24). Além de ser o precursor químico de numerosos

produtos, a hidrogenação o transforma em farnesano ou bioquerosene. Um trunfo, considerando que

os custos tornam inviável a produção de farneseno pelas vias convencionais.

O caminho metabólico da artemisina consta de nove genes, cada um com aproximadamente 1.500

bases. Modificações nas vias metabólicas abrem o caminho para a produção de combustíveis, ou de

qualquer outra substância (Figura 10.7 B). Procurando as combinações mais interessantes e eficientes,

infinitas variantes génicas da levedura foram sintetizadas e testadas, utilizando microarrays de DNA e

sistemas robotizados de rastreio de alto rendimento (HTS).

--------------

FIGURA 10.7. O caso Amyris

A. Do quinghaosu à artemisina.

B. Produtos gerados na plataforma tecnológica baseada na engenharia metabólica da levedura (via dos

isoprenoides ou terpenos)

Artemisia annua

QINGHAOSU

Escherichia coli

ARTEMISINA

Saccharomyces cerevisiae

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A empresa conta hoje com leveduras capazes de transformar a cana de açúcar (Amyris do Brasil) ou o

sorgo sacarino (Amyris Fuels, Estados Unidos) em biodiesel ou combustível de avião, este último

testado em parceria com a empresa TOTAL. Atualmente, a plataforma tecnológica do farneseno

renovável pode sintetizar mais de 1.000 produtos, entre combustíveis, cosméticos, emolientes,

fragrâncias, polímeros, lubrificantes e biofármacos.

De particular interesse são o esqualeno e hemiesqualeno, derivados do farneseno, que compõem

a linha Biossance®, um emoliente com numerosas aplicações em cosmética, inclusive na remoção de

maquillage.

O CASO SOLAZYME (TerraVia)

Assim como as plantas, as microalgas sintetizam e acumulam lipídios. Existem dois métodos clássicos

para o cultivo de microalgas autotróficas, ambos com algumas vantagens e desvantagens. Os grandes

tanques ao ar livre aproveitam terras não cultiváveis, água salobra e luz solar, mas contaminam com

facilidade. Os fotobiorreatores fechados contaminam muito menos, mas são mais caros, porque

demandam iluminação artificial e certa complexidade tecnológica.

A empresa Solazyme modificou geneticamente a alga heterotrófica Prototheca moriformis, de

modo a produzir grande quantidade de óleos vegetais (triglicerídeos) e bioprodutos a partir de uma

matéria-prima que pode ser sacarose de cana, dextrose de milho e, inclusive, materiais de origem

celulósicos (Figura 10.8).

Em relação ao biodiesel, o uso de algas para a produção de hidrocarbonetos e triacilglicerídeos

permitiria dedicar terras férteis e água doce à produção de alimentos. Por outro lado, a adição de

bioquerosene ao querosene diminuiria os custos do combustível de avião. A plataforma tecnológica

permite a produção de biodiesel, surfactantes, lubricantes, polímeros, óleos comestíveis, suplementos

nutricionais etc.

Recentemente, a empresa Solazyme mudou seu nome para TerraVia anunciando que no futuro sua

plataforma estaria dedicada à produção de produtos alimentícios (proteína, lipídios, óleos de cozinha)

e cosméticos. Um dos produtos de sucesso é o Algenist® um emoliente para a pele, de interesse

cosmético, que pode ser encontrado em grandes redes de distribuição dos Estados Unidos, da Europa

e do Japão (Sephora).

--------------

FIGURA 10.8. O caso Solazyme

Luz solar + CO2 BIOCOMBUSTÍVEIS (Biodiesel)

Biomassa QUÍMICA VERDE (Surfactantes, lubricantes e polímeros) Algas Triglicerídeos

ALIMENTOS E RAÇÕES (Suplementos nutricionais, óleos comestíveis)

COSMÉTICA (emolientes, Algenist® para o cuidado da pele)

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C A P Í T U L O 11

BIOTECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE

O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Qual o impacto das atividades humanas sobre o meio ambiente? Que legado deixaremos para as

próximas gerações? Da resposta emerge o conceito de desenvolvimento sustentável, definido como

“a capacidade de atender às necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações

futuras em atender suas próprias necessidades” (Informe Brütland, 1987).

O desenvolvimento sustentável depende das ações realizadas nas áreas econômica, social e

ambiental. Esse é o consenso alcançado ao longo de mais de duas décadas, de várias conferências

internacionais (Rio de Janeiro, 1992 e Agenda 21; Kyoto, 1997; Johanesburgo, 2002; Copenhague,

2009; Cancún, 2010; Durban, 2011; Rio de Janeiro, 2012) e dos acordos alcançados, na Agenda 21 e

nas Conferências das Partes sobre Biodiversidade e Clima. Os relatórios publicados, em 2007, pelo

Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) apontaram a responsabilidade do

homem no futuro do planeta, indicando que não podem ser proteladas as ações concretas de proteção

do meio ambiente.

Qual a contribuição das biotecnologias para o desenvolvimento sustentável? Em relação à

economia, diminuir os custos não só da matéria-prima como da produção industrial, com processos e

produtos novos e/ou de maior valor agregado. Na área social, possibilitar a conservação ou a criação

de empregos através do desenvolvimento de novas plataformas tecnológicas. E, na área ambiental,

cumprir um importante papel na prevenção, no monitoramento e na remediação da contaminação.

Pensar globalmente, agir localmente. Os problemas ambientais são muito pontuais, cada um deles

demanda um tratamento particular, e o procedimento deve ter uma relação custo/benefício

interessante. Nem sempre existe um produto a patentear; havendo um serviço a prestar, a tecnologia

fica a cargo de organizações governamentais ou de firmas que agem localmente. A fim de responder

às diversas demandas do mercado, algumas contam com uma plataforma de produção de

microrganismos, isolados da natureza, em escala industrial.

AS TECNOLOGIAS LIMPAS

Pouco a pouco, a sociedade está aceitando que é preferível deixar de contaminar, a desenvolver

métodos para limpar o ambiente. No contexto das chamadas "biotecnologias brancas", várias

tecnologias limpas podem substituir outras mais poluentes, ajudando também a reduzir o volume de

resíduos domésticos, agrícolas e industriais.

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A SUBSTITUIÇÃO DE PROCESSOS INDUSTRIAIS

A TECNOLOGIA ENZIMÁTICA

Diferentemente dos catalisadores não biológicos, as enzimas são específicas, não tóxicas e

biodegradáveis. Essas propriedades permitem, à tecnologia enzimática, a substituição de alguns

processos e produtos industriais por outros menos agressivos ao meio ambiente em setores

reconhecidamente poluentes, tais como as indústrias de alimentos, rações, detergentes, têxteis, papel

e celulose, couros etc.

Nos curtumes, o uso de enzimas reduz em 40% o consumo de derivados do enxofre, ao tempo que

produz couro de melhor qualidade. A introdução de até oito enzimas nos detergentes evita a fervura

das roupas, diminuindo o consumo de energia e facilitando a retirada das manchas.

Os plásticos representam uma fração significativa (20% v/v) do lixo dos países industrializados,

sendo a maior parte proveniente das embalagens convencionais da indústria de alimentos. Além de

permanecerem por longo tempo na natureza, sua fabricação envolve uma matéria-prima não

renovável (petróleo) e um processo de síntese muito poluente, que gasta uma quantidade grande de

energia.

Em curto ou médio prazo, esses plásticos convencionais poderão ser substituídos por polímeros de

origem bacteriana ou vegetal, compostáveis em poucos meses. Uma das vantagens das embalagens

bioplásticas de alimentos é que degradam junto com os restos de comida, dispensando as etapas de

triagem e limpeza.

Na maioria dos casos, as linhagens utilizadas na tecnologia enzimática e na produção de bioplásticos

são OGMs (Organismos Geneticamente Modificados) que não geram maior oposição na sociedade,

talvez devido ao seu uso para a produção de insumos, dentro de fermentadores industriais, em

sistemas de contenção.

Como agentes biológicos, as enzimas tornam os processos produtivos mais limpos e seguros,

diminuindo o consumo de energia e a quantidade de resíduos. O desenvolvimento de enzimas ativas

a altas temperaturas, em solventes não aquosos e em meios sólidos, poderá futuramente expandir

suas aplicações.

A INDÚSTRIA DE PAPEL E CELULOSE

A indústria de papel e celulose é uma atividade em expansão que gera, no Brasil, 128.000 empregos

diretos (77.000 na indústria e 51.000 nas florestas) e 640.000 indiretos, em 540 municípios.

Atualmente, as principais empresas são Klabin, Suzano e Fibria, uma fusão entre a Votorantim e a

Aracruz.

A atividade industrial exige a expansão das florestas, porque a matéria-prima para a produção de

papel e celulose é a madeira. Estima-se que, em 2017, o Brasil contará com 2,5 milhões de hectares de

florestas plantadas de eucaliptos (60%) e pinhos (30%).

A maior dificuldade reside na própria estrutura da matéria-prima lignocelulósica. Na madeira, a

celulose (polímero de hexoses) e a hemicelulose (polímero de hexoses e de pentoses) estão

circundadas por lignina, uma substância de suporte das plantas, que deve ser descartada, mediante

um tratamento químico, em meio alcalino e a altas temperaturas. A eliminação da maior parte da

lignina (90%) libera as fibras de celulose e hemicelulose, possibilitando a hidrólise enzimática da

madeira e a formação de açúcares fermentescíveis (hexoses e pentoses).

No tratamento químico da lignina, resta uma pequena quantidade (10%) que confere uma cor

característica à pasta Kraft, base da fabricação de cartão e papel pardo. O branqueamento do papel

requer outro tratamento específico, com oxigênio e cloro, no qual se formam derivados clorados

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BIOTECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE

133

tóxicos. Um procedimento alternativo é o biopulping, em que a enzima xilanase degrada o xilano da

hemicelulose, facilitando a eliminação da lignina que lhe está associada (Figura 11.1).

A inserção da biotecnologia moderna ocorre através de duas linhas de ação: o desenvolvimento da

tecnologia enzimática e o melhoramento vegetal. O sequenciamento do genoma do fungo

Phanerochaete chrysosporium ("podridão branca") revelou a existência de mais de 240 genes

codificadores de enzimas extracelulares, envolvidas na degradação de carboidratos, que poderiam ser

utilizadas na degradação da madeira e no branqueamento da polpa de papel e de têxteis. O

sequenciamento do genoma do eucalipto trouxe novas perspectivas para o melhoramento da

qualidade da madeira, especialmente visando aumentar a proporção celulose/lignina.

Em 2015, a CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) aprovou a liberação no meio

ambiente, para uso comercial, do eucalipto geneticamente modificado da FuturaGene, uma empresa

controlada pela Suzano Papel e Celulose. A produtividade do eucalipto transgênico de crescimento

rápido é 20% maior que a do eucalipto convencional. A invasão da empresa por mulheres do MST

(Movimento Sem Terra) e a destruição dos laboratórios e das mudas que demandaram dez anos de

trabalho mostram as dificuldades em separar tecnologia de ideologia, em alguns setores da sociedade.

Um fenômeno análogo ocorreu na Europa, em 2010, depois da aprovação pela Comissão Europeia

da batata Amflora (Basf Plant Science), geneticamente modificada, para uso na fabricação do papel.

Essa batata produz amido de alta qualidade com 99% de amilopectina, uma substância que confere

rigidez à massa e melhora o acabamento. Destinado exclusivamente ao uso industrial, o tubérculo

estaria fisicamente separado da batata destinada ao consumo humano ou animal. Porém, em função

da oposição encontrada, em 2012, BASF Plant Science decidiu suspender a comercialização da batata

Amflora. Em 2013, um tribunal anulou a decisão de aprovação da Comissão Europeia.

--------------

FIGURA 11.1. A indústria de papel e de celulose.

O branqueamento da pasta Kraft admite tratamentos químicos (cloro) e biológicos (xilanase); estes últimos diminuem a carga poluidora do efluente

MADEIRA Lignina + celulose + hemicelulose Extração alcalina a alta temperatura Lignina (90%) PASTA KRAFT Lignina (10%) + celulose + hemicelulose Branqueamento com cloro Branqueamento com xilanase Eliminação da lignina Derivados clorados da lignina

POLPA BRANCA EFLUENTE EFLUENTE

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A SUBSTITUIÇÃO DE INSUMOS AGRÍCOLAS

Um segundo conjunto de tecnologias limpas visa a substituição parcial de alguns insumos utilizados na

agricultura, tais como os fertilizantes e praguicidas.

A intensa aplicação de fertilizantes agrícolas, derivados do petróleo, tem consequências negativas

no ambiente, porque uma parte do nitrogênio (N) e do fósforo (P) não é absorvida pelas plantas e

acaba sendo arrastada pelas chuvas até os rios e as reservas de água. O excesso de nutrientes estimula

a proliferação de algas, consumindo o oxigênio dos cursos de água e produzindo toxinas que afetam

os peixes e o gado.

MICRORGANISMOS VS FERTILIZANTES QUÍMICOS

O nitrogênio é um nutriente indispensável para os cultivos vegetais porque faz parte da composição

das proteínas e dos ácidos nucleicos. Encontra-se na atmosfera como N2 e no solo como nitrato,

resultante da decomposição da matéria orgânica, ou proveniente dos fertilizantes agrícolas. Alguns

microrganismos livres (Azotobacter, Azospirillum) e outros simbiontes (Rhizobium ou Bradirhizobium),

que vivem nos nódulos das raízes das leguminosas (soja, feijão), podem fixar diretamente o nitrogênio

atmosférico em uma forma utilizável pelas plantas.

Aplica-se o termo biofertilizante aos produtos que contêm agentes biológicos vivos, capazes de

favorecer o desenvolvimento vegetal. Um destes agentes é o Rhizobium, uma bactéria simbionte das

raízes de leguminosas que fixa o nitrogênio atmosférico, reduzindo a necessidade de aplicar

fertilizantes nitrogenados nas lavouras. Para proceder à inoculação, mistura-se o produto com as

sementes umedecidas, antes do plantio, em tambores ou betoneiras.

A produção industrial de rizóbios selecionados para aplicação antes do plantio permite substituir

produtos químicos, derivados do petróleo, por agentes biológicos, menos prejudiciais para o meio

ambiente. Na América Latina, a produção de biofertilizantes envolve numerosas empresas, pequenas

e médias, que contam com um sólido suporte tecnológico originado em universidades e instituições

públicas de pesquisa agronômica.

Vários países produzem inoculantes agrícolas, entre eles: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba,

México, Peru e Uruguai. No Brasil, várias empresas nacionais e estrangeiras produzem inoculantes para

leguminosas; a maioria está localizada no Paraná e Rio Grande do Sul.

As linhagens bacterianas são estirpes selecionadas por sua eficiência, em uma ampla gama de

cultivares, e amplamente adaptadas às condições locais. Até o presente, a indústria baseia a produção

dos microrganismos na tecnologia clássica, mas com o mapeamento do genoma de microrganismos

como o Rhizobium etli (México) e o Gluconacetobacter diazotrophicus (Brasil), a biotecnologia

moderna começa a se inserir neste campo. Frente às mudanças climáticas e a necessidade de

aumentar a produtividade agrícola, os novos métodos de triagem de estirpes são uma ferramenta de

incalculável valor para o estudo da relação simbionte entre o microrganismo e a planta hospedeira.

As pesquisas sobre a fixação de nitrogênio nas gramíneas forrageiras, iniciadas por Johanna

Döbereiner (Embrapa), na segunda metade do século XX, permitem dispensar parcialmente a aplicação

de nutrientes químicos nos cereais e na cana-de-açúcar, com a correspondente economia de recursos.

O fósforo se origina a partir das rochas do solo e da decomposição dos seres vivos. Nos solos ácidos,

característicos das regiões tropicais, a maior parte dos fosfatos (95-99%) forma compostos minerais

ou orgânicos insolúveis, que não são acessíveis diretamente às plantas. Por isso, o fósforo se torna um

nutriente limitante para o crescimento das plantas.

Os micorrizos são associações simbióticas entre raízes vegetais e fungos, que absorvem os

nutrientes minerais e a água do solo, transferindo-os para a planta hospedeira. Muitas espécies de

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BIOTECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE

135

fungos micorrízicos são comestíveis, e vários gêneros são comercializados a nível mundial: Tuber,

Tricholoma, Boletu, Cantharellus, Morchella, Lactarius e Suillus.

A inoculação dos solos ou micorrização é uma tecnologia agrícola, associada ao reflorestamento de

pinhos e eucaliptos, que elimina ou diminui a necessidade de se acrescentar fósforo.

Além dos fertilizantes agrícolas, outra das causas de liberação excessiva de fósforo no ambiente é

a criação intensiva de animais. Os porcos e as aves não metabolizam o fitato, um derivado do fósforo

presente nas rações. Complementando-as com fitase, uma enzima produzida industrialmente por um

microrganismo geneticamente modificado, o fósforo excretado diminui em mais de 30%, reduzindo a

contaminação dos lençóis de água.

MANEJO INTEGRADO DE PRAGAS VS AGROTÓXICOS

A utilização de variedades selecionadas e a rotação dos cultivos são práticas agrícolas que reduzem,

substancialmente, a necessidade de aplicar pesticidas sintéticos. Um passo além é dado pelo controle

biológico, que preconiza a substituição dos praguicidas químicos por alternativas biológicas, tais como

bactérias, fungos e vírus entomopatogênicos. Observe-se que, em seu clássico livro A primavera

silenciosa (1972), a pesquisadora Rachel Carson já alertava para os danos causados pelo uso do DDT,

recomendando a procura de soluções de cunho biológico para o controle das populações de insetos.

Anos mais tarde, contamos com numerosos exemplos em que os pesticidas são substituídos por

agentes biológicos específicos (Tabela 11.1). Um deles é a aplicação, nas lavouras de soja, de partículas

de baculovírus, um organismo que, normalmente, infecta e mata as lagartas de Anticarsia gemmatalis,

parasitas das plantas. Gemstar, um produto que contém o baculovírus Ihara é usado no combate à

Helicoverpa armigera, uma praga que afeta os cultivos de soja. A pulverização de esporos do fungo

Metarhizium anisopliae, é uma arma na luta contra a cigarrinha-da-folha-da-cana-de-açúcar ou a

broca-dos-citros. A broca-da-cana é controlada pela ação sinérgica de duas microvespas (Cotesia e

Trichogramma) que agem em diferentes momentos do ciclo de vida da praga.

Contudo, o exemplo mais conhecido dessa tecnologia verde envolve a bactéria do solo Bacillus

thuringiensis ou Bt. Citada como promissora por R. Carson, essa bactéria é utilizada como pesticida

agrícola há mais de cinquenta anos, sem que suas toxinas tenham causado danos às pessoas, à vida

silvestre ou à maioria dos insetos benéficos.

--------------

TABELA 11.1. Alguns exemplos de utilização de agentes biológicos como pesticidas

AGENTE BIOLÓGICO PRAGA COMBATIDA

Fungo Metarhizium anisopliae Cigarrinha-da-folha-da-cana-de-açúcar (Mahanarva posticata), cigarrinha-da-raiz-da-cana-de-açúcar (Mahanarva fimbriolata), cigarrinha-das-pastagens (Deois flavopicta).

Fungo Beauveria bassiana Diversas, florestais.

Bactéria Bacillus thuringiensis var kurstaki

Lagartas desfolhadoras de grandes culturas e reflorestamentos.

Bactéria Bacillus thuringiensis var israelensis

Larvas do mosquito da dengue (Aedes aegypti, transmissor da dengue e da febre amarela) e dos borrachudos (Simulium spp.).

Bactéria Bacillus sphaericus Larvas do mosquito prego (Anopheles spp., transmissor da malária) e do mosquito urbano ou pernilongo (Culex spp., transmissor da encefalite e da filaríase).

Vírus Baculovírus anticarsia Lagarta-da-soja (Anticarsia gemmatalis).

Vírus Baculovírus spodoptera Lagarta-do-cartucho-do-milho (Spodoptera frugiperda).

Vespa Cotesia flavipes Broca-da-cana-de-açúcar (Diatraea saccharalis).

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No Brasil, existem atualmente numerosos produtos a base de Bacillus thuringiensis para o combate às

pragas que afetam a agricultura, comercializados com diferentes nomes (Bac-control, Bactur, Dipel,

Ecotech, Thuricide etc.) por várias empresas nacionais e estrangeiras (Vectorcontrol, Milenia,

Sumitomo, Bayer, Iharabras etc.).

Com o desenvolvimento da engenharia genética, os genes correspondentes foram transferidos a

várias plantas (milho, algodão etc.) que agora produzem diretamente a toxina inseticida. Baseado no

conhecimento da ecologia dos agroecossistemas, o controle biológico permite o Manejo Integrado de

Pragas (MIP). No Brasil, deve-se destacar o trabalho da Embrapa e de várias universidades visando a

preservação das plantações e a salvaguarda da produção de alimentos.

A formação de nuvens de gafanhotos, uma das pragas mais temidas da humanidade, é atualmente

monitorada e companhada por via satélite. A aplicação do feromônio PAN (fenilacetonitrilo) induz a

dispersão dos insetos e sua volta a um comportamento solitário. No combate aos gafanhotos também

são utilizados reguladores de crescimento e, como biopesticida, o fungo Metarrizhium anisopliae

varacridum.

O controle biológico envolve, além do uso de feromônios, armadilhas e atrativos alimentares.

Alguns procedimentos são econômicos e muito engenhosos, como o desenvolvido em Cuba para

combater o tetuán del camote, um gorgulho (Cylas formicarius) que ataca a batata-doce. Pendura-se

na plantação uma lata com uma pequena quantidade de feromônio, pulverizando em redor esporos

do fungo Beauveria bassian. Atraídos pelo feromônio, os machos se aproximam da lata e são

contaminados mortalmente pelo fungo, que é inócuo para os seres humanos, os animais e as plantas.

Para Cuba, a experiência de várias décadas de trabalho com controle biológico resultou crucial

quando, devido ao embargo propiciado por Estados Unidos, o país teve que substituir o uso de

agrotóxicos nas lavouras. Atualmente, o programa cubano de controle biológico de pragas envolve

laboratórios regionais, estações de defesa vegetal, postos equipados com laboratórios de diagnósticos

e mais de 200 centros de reprodução de entomófagos e entomopatógenos.

BIOINSETICIDAS VS. INSETICIDAS QUÍMICOS

Em 2016, o Brasil vive uma situação sanitária dramática, devido à proliferação do mosquito Aedes

aegypti, cuja fêmea é transmissora de várias doenças de origem viral: dengue, chikungunya, zika. Em

fins do século XIX e início do século XX, o Aedes causou epidemias terríveis de febre amarela, sendo

erradicado das zonas urbanas graças à ação pioneira de Oswaldo Cruz. Por falta de saneamento básico

e de medidas de combate eficientes, hoje, o mosquito está novamente disseminado no Brasil e no

restante das Américas.

A primeira medida para diminuir o número de focos do mosquito é a eliminação das águas paradas,

onde ele deposita os ovos e as larvas proliferam. Se isso não for feito, deverá se apelar para os

inseticidas químicos, como o Pyriproxyfen, um produto para uso em campanhas de saúde pública.

Inseticidas químicos podem ser substituídos por bioinseticidas. Desenvolvido a partir de estudos da

Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, a empresa Bthek Biotecnologia comercializa um

bioinseticida que tem como ingrediente ativo a bactéria Bacillus thuringiensis israelensis e permite o

controle das larvas do mosquito (Aedes aegypti) e do borrachudo (Simulium spp.).

Outra das armas para evitar a transmissão de doenças por Aedes aegypti contempla a infecção da

população natural do mosquito pela bactéria Wolbacchia pipientes, um parasita intracelular frequente

em várias espécies de insetos, sem risco algum para os vertebrados.

Os mosquitos infetados com Wolbacchia não transmitem dengue e passam a bactéria a sua

descendência. Como o acasalamento de uma fêmea não infetada com um macho infetado é estéril,

basta liberar mosquitos infetados com Wolbacchia para que a infecção com Wolbacchia se espalhe,

diminuindo o número dos transmissores de dengue.

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FIGURA 11.2. Controle biológico do Aedes aegypti

B. Ciclo de vida do mosquito Aedes aegypti

E. Controle por Wolbacchia

F. Controle por irradiação

G. Controle por engenharia genética

Aedes aegypti (fêmea) Pupa Ovos (100-200) 4 a 5 dias 2 a 3 dias

Larva Duração total do ciclo: 10 a 14 dias

Cruzamentos possíveis

Ovos infetados

Linhagem infetada com Wolbacchia

Criação de mosquitos Pupas Irradiação Seleção adultos estéreis

Criação de mosquitos transgênicos Larvas Mosquitos Mosquitos transgênicas transgênicos da natureza Sem tetraciclina, Seleção as larvas morrem

(com tetraciclina) Acasalamento

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Os primeiros experimentos, em algumas cidades no nordeste da Austrália, no Vietnã e na Indonésia,

foram bem-sucedidos. A Fundação Oswaldo Cruz iniciou os primeiros testes em alguns bairros do Rio

de Janeiro.

Uma estratégia de controle biológico tradicional consiste na liberação, no ambiente, de mosquitos

machos esterilizados por radiação. Embora o comportamento de cópula dos machos estéreis e dos

férteis seja o mesmo, o acasalamento das fêmeas com os machos estéreis não deixa descendência.

Recentemente aplicada na ilha de Fernando de Noronha (PE), esta metodologia levou à redução do

tamanho da população e do número de casos de dengue.

Mais elaborada, e na linha da biotecnologia moderna, é a construção de uma linhagem transgênica

de mosquito que depende de tetraciclina para seu desenvolvimento, uma condição que só existe no

laboratório. Liberados no ambiente, os machos transgênicos copulam com as fêmeas normais, gerando

larvas que morrem por falta de tetraciclina.

Em 2013, a CTNBio aprovou a liberação comercial da linhagem OX513A de Aedes aegypti. Os testes

realizados oportunamente em bairros de Juazeiro (PE) e de Piracicaba (SP) reduziram

significativamente a população de mosquitos. Participam no empreendimento do chamado “mosquito

do bem” a USP (Universidade de São Paulo) e as empresas Oxitec (Reinio Unido) e Moscamed (Brasil).

Como em ocasiões anteriores, alguns setores se posicionaram contra o mosquito transgênico,

invocando o princípio de precaução.

Das mais simples às mais sofisticadas, não faltam armas para lutar contra o Aedes aegypti; todas

podem contribuir para melhorar o saneamento básico e a saúde da população (Figura 11.2).

A REDUÇÃO DOS RESÍDUOS

A degradação do lixo (resíduos sólidos) e o tratamento de esgoto (resíduos líquidos) são dois exemplos

tradicionais de prestação de serviços da biotecnologia tradicional nem sempre valorizados, apesar do

imenso volume de matéria que transformam e de sua relevância para o meio ambiente.

A DEGRADAÇÃO DO LIXO

Em condições adequadas, todos os compostos naturais podem ser biodegradados. As populações

microbianas do ambiente degradam as substâncias orgânicas através de numerosas reações, sem que

sejam necessários os cuidados assépticos ou a utilização de culturas puras. Em condições aeróbias, os

produtos finais da mineralização da matéria orgânica são dióxido de carbono (CO2) e água; em

condições anaeróbias, forma-se biogás.

Na compostagem, uma etapa intermediária da mineralização, os próprios microrganismos do lixo

degradam a matéria orgânica, previamente fragmentada e misturada (Figura 11.3). No início da

biodigestão, a liberação de energia provoca um aumento de temperatura que elimina a maioria dos

microrganismos indesejáveis (sanitização). À medida que a atividade microbiana decresce, o sistema

se estabiliza e amadurece, até perder todo o seu potencial de biodegradação.

O processo pode ser conduzido em sistemas simples (pilhas ao ar livre), ou complexos (silos,

biorreatores), sendo necessário, em ambos os casos, remover o material periodicamente, de maneira

manual ou mecânica, para assegurar a aeração. A otimização do processo depende do controle de

alguns parâmetros, tais como a relação carbono/nitrogênio, o oxigênio, a umidade e a temperatura.

O tratamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU) em usinas de compostagem é um procedimento

alternativo à incineração e ao depósito em lixões e aterros sanitários. Nesses estabelecimentos, a

separação prévia dos componentes permite a reciclagem de alguns materiais (metais, vidro etc.).

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A biodegradação aeróbia dos restos orgânicos os transforma em um "composto", utilizado no

melhoramento de solos, em atividades de reflorestamento, para colmatar terrenos e combater a

erosão. A decomposição in natura do lixo, nos aterros sanitários, cria uma zona de anaerobiose onde

se produz biogás, que é liberado na atmosfera, contribuindo para o efeito estufa e as alterações

climáticas.

--------------

FIGURA 11.3. A compostagem

O TRATAMENTO DAS ÁGUAS RESIDUAIS

O esgoto arrasta excrementos (fezes e urina), águas de uso doméstico (banho, lavagem de roupas etc.)

e, eventualmente, alguns dejetos de origem industrial. Liberadas diretamente nos cursos de água, as

águas servidas causam a desestabilização das populações microbianas, que se multiplicam

rapidamente, consumindo o oxigênio dissolvido e ocasionando a morte de peixes e crustáceos.

Várias populações naturais participam na biodegradação das águas do esgoto. Os microrganismos

aeróbios (bactérias e protozoários ciliados) mineralizam parte da matéria orgânica do efluente. As

bactérias anaeróbicas procedem à biodigestão dos lodos, permitindo a obtenção de biogás e a

remoção de alguns nutrientes (N e P principalmente), que poderiam criar desequilíbrios ecológicos.

O tratamento das águas residuais envolve métodos físicos, químicos e biológicos (Figura 11.4),

aplicados em pelo menos três etapas:

o Tratamento primário.

O esgoto passa por um processo de filtração, que remove objetos grandes, lixo e areia. No tanque

de sedimentação, a gordura sobrenadante é separada do lodo sedimentado, que pode ser

transferido a um biodigestor.

o Tratamento secundário.

- O líquido efluente do tanque de sedimentação pode ser tratado de vários modos:

AR ÁGUA FONTE DE NITROGÊNIO Fragmentação e mistura das partículas Aumento da temperatura (sanitização) BIODIGESTÃO AERÓBIA Diminuição e estabilização da temperatura Maturação CALOR CO2 ÁGUA OUTRAS SUBSTÂNCIAS

LIXO ORGÂNICO

COMPOSTO

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- Em lagoas de baixa profundidade.

- Em filtros de gotejamento (1), colonizados pelos próprios microrganismos do esgoto que se

desenvolvem digerindo a matéria orgânica do meio.

- Em tanques de lodo ativado (2), onde o meio é agitado e oxigenado, mediante a injeção de ar

comprimido.

- Em um segundo tanque de sedimentação para separar o efluente do lodo.

o Tratamento terciário.

Este é realizado para eliminar substâncias inorgânicas e orgânicas, envolvendo procedimentos

como a filtração, a volatilização da amônia, a precipitação de fosfato etc.

o Tratamento avançado.

A degradação microbiana dos resíduos orgânicos diminui consideravelmente a carga de

microrganismos patogênicos liberada no ambiente, mas não a elimina totalmente. Os

microrganismos patogênicos recalcitrantes só podem ser eliminados mediante alguns métodos

adicionais, como a cloração, a irradiação UV e o tratamento com ozônio.

--------------

FIGURA 11.4. O tratamento das águas residuais

O TRATAMENTO DOS EFLUENTES INDUSTRIAIS

O tratamento dos efluentes industriais é fundamental para a população e o ambiente; também é

estratégico para o melhoramento da imagem das indústrias mais poluentes, entre as quais figuram as

químicas, as papeleiras, as têxteis, as de couro, as de alimentos, as de extração de metais e minerais e

as de produção de energia.

A produção de etanol gera um efluente (vinhaça) que, anos atrás, era liberado diretamente nos rios

e cursos de água, provocando a eutrofização e a mortandade de peixes e de outros seres vivos. Para

avaliar a dimensão do problema, basta lembrar que, para cada litro de álcool, a indústria produz até

12 litros de vinhaça. Hoje, as indústrias mais responsáveis tratam o efluente por biodigestão anaeróbia,

gerando fertilizante e biogás.

Fossas sépticas

Gradeamento Lagoas de oxidação Tanque de areia Filtros de gotejamento (1) Tanque de sedimentação Tanque de sedimentação Lodo ativado (2 ) Lodo Lodo Biodigestor anaeróbico

EFLUENTE

EFLUENTE

EFLUENTE

RESÍDUO SÓLIDO

ESGOTO

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Outro caso interessante é o dos efluentes das indústrias de laticínios, utilizados como matéria-prima

para o crescimento de microrganismos que, posteriormente, serão adicionados às rações animais. De

forma análoga, o licor sulfítico dos efluentes da indústria de papel e celulose pode ser eliminado

produzindo biomassa, com o fungo Paecilomyces.

Em 2014, a enxurrada de lama provocada pela ruptura de uma barragem, com o refugo de extração

de minério da empresa Samarco, causou 17 mortes, além da destruição do vilarejo de Bento Rodrigues

e a contaminação do Rio Doce. A tragédia de Mariana, considerada o pior acidente da história da

mineração, reflete o descaso de algumas empresas com o meio ambiente.

À diferença dos resíduos agrícolas e urbanos, que são biodegradados, os metais procedentes das

atividades extrativas e industriais (cádmio, zinco, chumbo, selênio) permanecem no ambiente, em

concentrações tóxicas. Sua absorção e concentração (bioacumulação) por plantas tolerantes aos

metais reduz a toxicidade do solo e facilita sua remoção em faixas de terreno pouco profundas.

Existem já plantas geneticamente modificadas para transformar os compostos organomercuriais

formados em diversas atividades (extração de carvão e de ouro etc.) em uma forma volátil muito

menos tóxica.

Em relação aos resíduos gasosos de processos industriais, o tratamento de compostos orgânicos

voláteis (VOCs, da sigla em inglês) é feito mediante filtros biológicos de diferentes tipos e

complexidade tecnológica.

AS EMISSÕES DE GASES E O EFEITO ESTUFA

Existem fontes naturais de gases, como os vulcões e os cupins. Estes, devido à atividade da flora

intestinal simbionte que lhes permite digerir celulose, liberam 40 milhões de toneladas de metano por

ano. No entanto, o homem é o principal responsável pela emissão dos gases que causam o efeito

estufa, através de atividades como o depósito do lixo em aterros sanitários, o cultivo do arroz, a criação

de gado, a liberação de efluentes agroindustriais sem tratamento e a queima de combustíveis fósseis

(petróleo, gás natural e carvão).

Os níveis de metano atmosférico são hoje duas vezes maiores que na era pré-industrial, um dado

preocupante, sabendo que a contribuição do metano para o efeito estufa é 20 vezes superior à do

dióxido de carbono. Embora sua utilização como combustível elimine uma fonte de contaminação

atmosférica, a rentabilidade do processo nem sempre justifica o seu aproveitamento.

Várias iniciativas tendem a recuperar o metano dos aterros sanitários e utilizá-lo como combustível

alternativo. A América Latina, que emite 6% dos gases contaminantes, já está entrando neste mercado

com vários projetos de reaproveitamento do metano (aterros sanitários, resíduos agroindustriais) na

Argentina, no Brasil, no Chile, em Cuba, no México, no Uruguai. As iniciativas dependem de empresas

privadas e/ou de organismos governamentais; alguns estudos preliminares contaram com

financiamento do Banco Mundial.

Em relação à gasolina, a combustão dos biocombustíveis (mistura gasolina-etanol ou etanol puro)

emite quantidades menores de monóxido de carbono (CO), óxidos de enxofre (SOx), hidrocarbonetos

e outros compostos poluentes. Em compensação, liberam-se aldeídos cancerígenos e, dependendo do

motor, óxidos de nitrogênio (NOx). Apesar disso, estima-se que, entre 2004 e 2008, o uso de

biocombustíveis na frota flexfuel brasileira teria deixado de liberar na atmosfera 35 milhões de

toneladas de CO2. Calcula-se também que, para que essa economia fosse de 530 milhões de toneladas

de CO2, bastaria misturar com álcool apenas 10% da gasolina disponível no planeta.

O Protocolo de Kyoto (1997) previa a redução da emissão de gases contaminantes (dióxido de

carbono, metano, óxidos nitrosos e clorofluorocarbonetos). Ratificado por numerosos países, mas não

por Estados Unidos nem Rússia, responsáveis respectivamente por 36% e 17% das emissões, o

protocolo de Kyoto não teve ainda os resultados esperados.

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Contudo, criou-se um mercado paralelo da descontaminação através da compra e venda do Certificado

de Redução de Emissões (CER, do inglês Certificate of Emission’s Reduction), que nada mais é que um

bônus sobre a quantidade de contaminação deixada de emitir. Deste modo, o Protocolo de Kyoto

permite que, tendo superado a cota de gases a emitir, um país continue contaminando a atmosfera,

se comprar bônus de um país que não a contamina, ou que reduz sua própria contaminação.

A RECUPERAÇÃO DE RECURSOS NATURAIS

O PETRÓLEO

Na extração de petróleo, técnicas especiais (EOR, do inglês enhanced oil recovery) envolvem o uso de

polímeros de origem microbiana (xantana) para aumentar a viscosidade e facilitar o seu

bombeamento. A introdução direta dos microrganismos no poço (MEOR, do inglês microrganism

enhanced oil recovery) parece menos interessante do ponto de vista econômico, mas isso poderia

mudar, se o petróleo começar a se esgotar.

A MINERAÇÃO

A extração dos metais solubilizados nas águas escuras e ácidas do Rio Tinto (Andaluzia, Espanha) data

do domínio romano; abandonadas durante séculos, as minas foram exploradas a partir do século XIX

por uma empresa inglesa, hoje australiana. Em 1947, o isolamento de bactérias quimiotróficas do

gênero Thiobacillus mostrou que a acidificação das águas e a consequente solubilização dos metais

eram o resultado de uma ação combinada entre agentes químicos e biológicos.

As bactérias transformam os sulfetos metálicos insolúveis em sulfatos solúveis, mediante uma

reação de oxidação que libera a energia necessária para sua reprodução e crescimento. A fixação de

dióxido de carbono fornece o carbono necessário para a síntese dos componentes celulares, de modo

que os requerimentos bacterianos se limitam ao oxigênio e a pequenas quantidades de nitrogênio e

fósforo.

A biolixiviação se aplica especialmente à extração de cobre, urânio, ouro, zinco, chumbo, níquel e

cobalto. A tecnologia é relativamente simples e requer pouca inversão, sendo adaptada aos países em

desenvolvimento. Na América Latina, usa-se a biolixiviação para a extração de cobre (Chile, México e

Peru) e de ouro (Brasil, Chile e Peru).

A BIOMINERAÇÃO NO CHILE

Os Andes chilenos guardam as maiores reservas de cobre do planeta. Na época pré-colombiana, foi

utilizado, pelas culturas Tiahuanaco e Inca, na produção de bronze, uma liga de cobre e estanho.

Durante o período colonial, a produção de cobre se manteve baixa, mas entre 1820 e 1900 extraíram-

se dois milhões de toneladas. Ao finalizar o século XIX, as jazidas com alta concentração de cobre

começaram a dar indícios de esgotamento.

No século XX, os consórcios internacionais, que dominavam a tecnologia necessária para a extração

do cobre chileno de baixa concentração, assumiram o controle da indústria (Braden Copper Co.,

Kenecott Corporation, Chile Exploration Company). Após uma década de “chilenização”, em 1971 as

principais minas de cobre foram nacionalizadas. Atualmente, 31% da produção de cobre do Chile está

em mãos da Codelco (do espanhol, Corporación Nacional del Cobre), uma empresa estatal criada em

1976, que emprega 47.000 pessoas; o resto é produzido pelo setor privado. Em 2014, Codelco foi o

maior produtor de cobre de mina do mundo e o segundo de molibdeno de mina.

As primeiras experiências de biolixiviação foram realizadas, entre 1950 e 1980, em Rio Tinto

(Espanha), Cananea (México) e Toromocho (Peru). A exploração da mina de Pudahuel (Codelco, Chile),

com tecnologia nacional de biolixiviação, começou na metade da década de 1980. A bio-

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hidrometalurgia se estendeu rapidamente, havendo estabelecimentos que extraem o cobre

exclusivamente por biolixiviação.

As operações são especialmente apropriadas para as minas de baixa qualidade ou semiesgotadas,

assim como para a recuperação do cobre, nos refugos existentes. A tecnologia envolve a produção de

biomassa, em biorreatores que geram diferentes soluções de microrganismos específicos, com as

quais se regam as pilhas de minério. Os microrganismos dissolvem o ferro e o enxofre, liberando o

cobre e deixando-o em forma solúvel. Uma vez recolhido em piscinas, esse líquido rico em cobre passa

para as plantas de extração, onde se obtêm os cátodos de cobre de alta pureza.

A oxidação biológica dos amontoados ou pilhas permite recuperar 75 a 90% do cobre, a um custo

muito baixo, em períodos de 6 a 12 meses. No desenvolvimento tecnológico da biomineração,

participaram universidades e institutos de pesquisa, além do setor produtivo, com apoio do governo e

do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). As pesquisas atuais contemplam o

uso de microrganismos termofílicos (Sulfobolus) e a otimização do processo de bio-oxidação

(Thiobacillus ferroxidans).

Fundada em 2002, por Codelco e Nippon Mining & Metals Co. Ltd., a empresa BioSigma desenvolve

estudos microbiológicos e genômicos, assim como as tecnologias de produção de biomassa, que

permitem a inoculação das pilhas, acelerando a recuperação de minério. A partir de uma primeira

patente, descrevendo um método para modificar geneticamente as bactérias extremófilas, do gênero

Acidithiobacillus, encontradas no minério de cobre, Biosigma conta com mais de 80 patentes

concedidas no Chile e no exterior, além de muitas outras em andamento. Hoje, 5% da produção

cuprífera do Chile é obtida por biolixiviação.

O DIAGNÓSTICO DE CONTAMINAÇÃO AMBIENTAL

O diagnóstico de contaminação ambiental exige o monitoramento da água, do ar e do solo. As

biotecnologias desenvolvidas abrangem o uso de indicadores biológicos, de técnicas imunológicas e

genéticas e de biossensores.

INDICADORES BIOLÓGICOS

Plantas e animais, capazes de acumular metais pesados, e poluentes orgânicos persistentes podem ser

utilizados como indicadores biológicos. A contaminação ambiental é avaliada, diretamente, pela

concentração do contaminante em um organismo específico. Na avaliação indireta, são analisadas

outras variáveis, tais como o número de plantas e de espécies microbianas, o número de indivíduos

nessas espécies etc.

TÉCNICAS GENÉTICAS

As técnicas genéticas são aplicadas para identificar as populações microbianas presentes no ambiente.

Como ainda não sabemos como cultivar no laboratório a maior parte dos microrganismos ambientais,

uma boa parte dessa biodiversidade permanece desconhecida.

A tecnologia do DNA facilita a identificação dessas espécies, em função das sequências gênicas

correspondentes ao RNA ribossômico (rRNA de 16S), e ajuda a monitorar as mudanças nas

comunidades microbianas utilizadas na remoção de poluentes, de maneira a detectar qualquer

variação ambiental e restaurar rapidamente as condições ótimas do sistema.

Microarrays adequados avaliam a expressão dos genes em uma linhagem ou uma comunidade

microbiana em relação a um agente ambiental (genossensores).

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Substrato Membrana Biodetector imobilizado O substrato reage com o biodetector, originando um produto específico Ao detectar um produto específico, o transdutor gera um sinal elétrico Sinal de saída (Output)

Circuito

Amplificador

TÉCNICAS IMUNOLÓGICAS

As técnicas imunológicas utilizam anticorpos específicos, marcados ou associados a enzimas. As

técnicas imunoenzimáticas, cujos resultados podem ser apreciados, simplesmente, por uma mudança

de cor, resultam especialmente apropriadas para os testes de campo. Substituem testes tradicionais e

lentos, que exigem um equipamento complexo, como os de presença de coliformes na água.

Imunoensaios de diversos tipos permitem o monitoramento contínuo, automatizado e barato de

pesticidas como o dieldrin, o parathion e os PCBs.

BIOSSENSORES

Os biossensores combinam diferentes componentes biológicos e eletrônicos, geralmente sob a forma

de um chip; alguns são muito seletivos, outros são sensíveis a um amplo espectro de substâncias.

O componente biológico pode ser uma enzima, um anticorpo ou um microrganismo. Respondendo

a um estímulo ambiental se verifica uma mudança em suas propriedades, mudança que é detectada

óptica ou eletronicamente, fornecendo uma medida quantitativa do contaminante (Figura 11.5).

Bactérias ou leveduras imobilizadas revelam a presença de uma determinada substância, seja

porque a metabolizam, seja porque esta inibe o próprio metabolismo microbiano. Especialmente

interessante é a utilização de organismos geneticamente modificados, associando o promotor do gene

de uma enzima, que reage com a substância procurada (arsênico, por exemplo), com genes indicadores

(luminescência, fluorescência ou produção de uma substância colorida).

--------------

FIGURA 11.5. O funcionamento de um biossensor

O sinal aumenta ou diminui em função da concentração do substrato contaminante, que estimula ou inibe a ação do agente biológico.

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A BIORREMEDIAÇÃO

Como resultado das atividades humanas, aproximadamente 2,5 milhões de toneladas de substâncias

químicas perigosas são liberadas anualmente no meio ambiente (Tabela 11.2). Em alguns casos, trata-

se de emissões deliberadas e regulamentadas (resíduos industriais), em outros, de escapamentos

acidentais (manchas de óleo ou de petróleo).

Muitas das substâncias químicas presentes no ambiente foram geradas pelo homem. Algumas

podem ser degradadas, em poucos meses, por algum organismo; outras persistem na natureza

durante um longo tempo. Consideradas recalcitrantes, essas moléculas são alheias ao mundo dos seres

vivos (xenobióticas). Não são biodegradadas ou, quando o são, o processo é lentíssimo, podendo

demorar centenas de anos.

Existem várias estratégias para retirar substâncias recalcitrantes do meio ambiente (Figura 11.6).

As opções contemplam a construção de barreiras físicas, a lavagem ou ventilação do solo contaminado

e sua destruição, por incineração ou por biorremediação. Para que esta última possa ser aplicada, é

necessário que o poluente seja transformado metabolicamente por algum agente biológico, que os

produtos finais sejam seguros e que as condições ambientais favoreçam a atividade microbiana.

--------------

TABELA 11.2. Os principais contaminantes do meio ambiente

CATEGORIA EXEMPLO

Inorgânicos Metais (cádmio, mercúrio, prata, cobalto, chumbo, cobre, cromo, ferro), isótopos radiativos, nitratos, nitritos, fosfatos, cianetos, asbestos.

Orgânicos Resíduos petroquímicos: petróleo, gasóleo, compostos aromáticos (benzeno, tolueno, etilbenzeno, xileno).

Produtos sintéticos: pesticidas organo-halogenados como os bifeniles policlorados (PCBs) ou os hidrocarbonetos poliaromáticos.

Gasosos Gases: dióxido de enxofre (SO2), dióxido de carbono (CO2), óxidos nitrosos (NOx), metano (CH4).

Compostos voláteis: clorofluorocarbonetos (CFCs), compostos orgânicos voláteis (VOCs).

FIGURA 11.6. As estratégias de biorremediação

Microrganismos Microrganismos Microrganismos geneticamente

do ambiente selecionados modificados (em sistema fechado)

Otimização dos fatores que estimulam a ação bacteriana (estrutura do solo,

pH, aceptores de elétrons).

MEIO CONTAMINADO

Suplemento de nutrientes

MEIO DESCONTAMINADO

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Uma forma de biorremediação é o tratamento in situ, que envolve a produção de biomassa específica

no local contaminado. Bactérias e/ou fungos do ambiente digerem o material tóxico, transformando-

o em produtos inofensivos, voltando posteriormente a seu nível populacional normal no ambiente ou

morrendo. O crescimento da população microbiana pode ser estimulado pelo acréscimo de nutrientes.

Outra forma de biorremediação dos solos contaminados é o tratamento ex situ, em que o solo

escavado é transferido a um biodigestor. Como a liberação de microrganismos geneticamente

modificados no ambiente é vista com extrema desconfiança, sua utilização costuma estar restringida

a esses sistemas fechados.

Uma das raízes dessa desconfiança pode ser atribuída à Conferência de Asilomar. Em 1975, a

preocupação principal dos pesquisadores era a contenção dos microrganismos geneticamente

modificados, recomendando o uso de microrganismos fracos que, eventualmente, não sobrevivessem

no ambiente. Essas condições eram fundamentais para a continuidade das pesquisas, apesar de ter

estimulado o medo e a hostilidade da sociedade, em relação à liberação de microrganismos

geneticamente modificados engenherados no ambiente.

Na década de 1980, com o objetivo de evitar o congelamento dos cultivos de morango da Califórnia,

a empresa AGS (Advanced Genetic Sciences) desenvolveu a bactéria Pseudomonas syringae,

geneticamente modificada para eliminar uma proteína que facilitava a formação de gelo.

Boa parte da opinião pública se mostrou totalmente contrária à utilização da P.syringae, variedade

ice minus, temendo que alterasse a composição das nuvens e o regime de chuvas. Em 1987, um

processo judicial culminou com a autorização para realizar os testes de campo correspondentes. Os

experimentos foram bem-sucedidos, mas, em função da resistência encontrada, a empresa

abandonou o projeto.

Em compensação, AGS comercializou Snowmax®, um produto criado para aumentar a eficiência da

maquinaria produtora de neve artificial. Um dos principais ingredientes era a variedade convencional

de P. syringae, produtora da proteína facilitadora da formação de gelo. Snowmax® garantiu a neve

dos Jogos Olímpicos de Inverno de 1988, em Calgary (Canada).

OS VAZAMENTOS DE PETRÓLEO

A formação de carvão e de petróleo nas profundezas da terra é possível porque, em condições

anaeróbias, tanto a lignina como os hidrocarbonetos são compostos químicos estáveis. Porém, em

condições aeróbias, ambos são degradados pelos microrganismos presentes no ambiente.

Um dos mais sérios problemas de contaminação ambiental é o derramamento de petróleo nos

mares, devido a acidentes notórios (Prestige, Exxon Valdez, Torrey Canyon, Amoco Cadiz, Braer and

Sea Empress, British Petroleum) e a situações bélicas (Guerra do Golfo). As manchas de óleo

despejadas no mar contêm compostos tóxicos, que representam uma ameaça para a ecologia marinha

e costeira, afetando todas as formas de vida aquática e constituindo um risco para a saúde da

população.

O petróleo derramado no mar flutua na superfície, onde os componentes voláteis evaporam

rapidamente. O que não for recuperado pelo homem será dispersado pelo movimento das ondas,

permanecendo em alto-mar, ou sendo levado até a costa. Sua degradação dependerá dos

microrganismos naturalmente presentes no ambiente marinho.

Em 1971, A. Chakrabarty desenvolveu, a partir de várias linhagens de Pseudomonas spp., uma

superbactéria que reunia, em um único plasmídio, os genes necessários para degradar quatro

componentes do petróleo: cânfora, xileno, octano e naftaleno. Depois de um longo processo judicial

que culminou em 1980, Chakrabarty recebeu a primeira patente de um ser vivo: uma bactéria

geneticamente modificada, projetada para degradar componentes do petróleo. Embora tenha

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BIOTECNOLOGIA E MEIO AMBIENTE

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passado com êxito nos testes laboratoriais, a bactéria de Chakrabarty não chegou a ser utilizada no

acidente do Exxon Valdez no Alaska (1989) nem em outros vazamentos posteriores.

Hoje, admite-se que um microrganismo geneticamente modificado teria poucas possibilidades de

sobrevivência na natureza, onde enfrentaria populações de microrganismos extremamente

competitivas. Por isso, a tendência atual é de estudar consórcios microbianos naturais, selecionados

de modo a que cada tipo de microrganismo sintetize alguma das enzimas necessárias para a

degradação da substância contaminante.

Obviamente, existem também pesquisas sobre microrganismos ambientais, como Alcanivorax

borkumensis, que é capaz de metabolizar 70% dos componentes do petróleo; sendo de especial

interesse toda informação nova sobre suas rotas metabólicas e seus requerimentos de fósforo e de

nitrogênio. Também há pesquisas visando a produção de biosurfactantes por algas, para substituir os

surfactantes usados atualmente, que são muito tóxicos.

A principal estratégia aplicada, atualmente, para remediar os vazamentos de petróleo é a

bioestimulação. Como o ambiente marinho é geralmente pobre em nitratos e fosfatos, acrescentam-

se nutrientes aos dispersantes químicos (detergentes), ou às espumas de limpeza das rocas da costa,

de maneira a estimular a ação dos microrganismos presentes no sítio contaminado. Estima-se que, até

o momento, o solo de mais de 30.000 sítios contaminados com petróleo, proveniente de vazamentos

de tanques de armazenamento, tenha sido tratado por bioaumentação.

A RADIAÇÃO

Após o acidente da planta nuclear de Chernobyl (1986), tentou-se remover a contaminação mediante

o plantio de girassóis, que absorvem e concentram o césio radiativo. As plantas devem ser cortadas e

tratadas como material contaminado, após a floração e antes da frutificação, porque as sementes

poderiam ser dispersadas pelos pássaros. Devido à estrutura diferente do solo, esta estratégia não

funcionou em Fukushima (Japão), onde uma mistura de algas e fungos parece ser mais eficiente.

ARMAS E CONFLITOS BÉLICOS

Além de causar enorme sofrimento humano, a indústria bélica cria também problemas ambientais de

grandes proporções, como ocorrido na Carolina do Sul (Estados Unidos), na década de 1990, quando

o tricloroetileno (TCE) utilizado, como desengordurante, na fabricação de armas, fora despejado no

solo, contaminando as águas subterrâneas e o rio Savannah.

Na descontaminação, utilizaram-se microrganismos que sobrevivem no ambiente contaminado,

por ter sistemas enzimáticos capazes de digerir os poluentes-alvo, ligeiramente diferentes de seus

substratos normais. Escolheu-se uma bactéria que metaboliza metano, mas é capaz de degradar o TCE.

Ao bombear metano no solo, a bactéria se multiplica; ao suspender o bombeamento, ela passa a

degradar o TCE por um tempo, até o bombeamento de metano se tornar novamente necessário.

A repetição cíclica do processo reduziu a contaminação a um nível aceitável. A utilização do

“metabolismo gratuito” bacteriano é considerada viável do ponto de vista comercial.

Outro composto que causou danos incalculáveis foi o Agente Laranja, lançado como desfolhante

nas florestas vietnamitas, pelos Estados Unidos, durante a guerra do Vietnam. Em fins da década de

1960, Chakrabarty conseguira uma mistura de linhagens bacterianas capaz de degradar um de seus

principais componentes, o herbicida 2,4,5-T. Não temos encontrado registros de uso dessa bactéria.

Porém, recentemente, foram aplicadas com sucesso técnicas de biorremediação no entorno da base

de Danang para eliminar a dioxina, outro dos componentes do Agente Laranja.

Um problema de difícil solução é a detecção e eliminação das 60 a 70 milhões de minas

antipessoais, espalhadas no mundo. Uma possível saída parece ser a utilização de plantas de

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Arabidopsis transgênicas (Aresa, Dinamarca). Estas plantas, portadoras de genes microbianos,

degradam a trinitroglicerina (TNT) liberando NO2, que é absorvido pela planta, modificando, três

semanas mais tarde, a cor das folhas.

Os conflitos bélicos atuais no Oriente Médio não se limitam unicamente a uma tragédia humana

sem precedentes. Deixarão uma herança ambiental terrível.

ORGANISMOS NOVOS NA NATUREZA E BIOSSEGURANÇA

A construção de Synthia (Instituto J. Craig Venter, 2010) e a disponibilidade das novas plataformas

tecnológicas sugerem que os organismos novos na natureza (NTN, do inglês, New to Nature),

originados por Biologia Sintética, podem estar mais próximos do que imaginamos.

Poderia ser inseguro um NTN construído com partes seguras? A preocupação com biossegurança é

inerente ao desenvolvimento da biotecnologia e, assim como em Asilomar, a questão fundamental

continua sendo a contenção. Vários são os questionamentos para os quais ainda não temos respostas:

qual seria o comportamento na natureza de um organismo construído juntando partes, dispositivos e

sistemas biológicos, dentro de determinado chassis? Qual seria o impacto ambiental desse organismo

sintético, se a contenção for insuficiente? O que aconteceria com um NTN liberado em um ambiente

sem predadores específicos? Poderia haver intercâmbio genético entre um organismo NTN e um

organismo biológico convencional, contaminando o pool genético natural?

Poder-se-ia falar de certeza de contenção (CoC, do inglês Certainty of Contention) de um NTN se a

probabilidade de escapamento, sua disseminação e a interação não intencionada com o ambiente

fossem praticamente zero. Nesse caso, em vez de Organismos Geneticamente Modificados, teríamos

Organismos Geneticamente Seguros.

Algumas das primeiras hipóteses contempladas, para garantir a contenção de um NTN, esbarraram

no fenômeno de transferência horizontal, frequente entre os microrganismos ambientais. Por esse

motivo, foram descartados tanto o uso de marcadores de resistência a antibióticos, como a inclusão

de genes suicidas, desenhados para provocar a morte do organismo, uma vez cumprida sua função.

As discussões atuais estão centradas na utilização de alguns sistemas bioquímicos modificados que

garantiriam a certeza de contenção. Entre as possibilidades consideradas, teríamos a expansão do

alfabeto genético com outras bases de DNA, a construção de ribossomos que reconheçam um código

de 4 bases, a substituição de códons para permitir a inclusão de aminoácidos não naturais etc.

Contudo, resta avaliar qual seria a eficiência desses sistemas e, ainda, responder à seguinte

pergunta: Solucionariam o problema ou criariam outros?

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C A P Í T U L O 12

BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

O conceito de biodiversidade abrange toda a variação existente nos seres vivos. Há 1,75 milhão de

espécies identificadas até o momento, o que representa uma pequena fração dos 13 milhões que

existiriam no planeta. Pouco sabemos da biodiversidade existente em regiões remotas, como as

calotas glaciares ou as profundezas submarinas.

Em outra acepção do termo, a biodiversidade compreende a variabilidade genética intraespecífica.

Considerando que apenas estamos começando a entender a estrutura dos genomas correspondentes

às diferentes espécies, muito resta a estudar.

As mudanças climáticas terão graves consequências para a biodiversidade. A desestabilização dos

ecossistemas afetará a extensão de terra cultivável, deixando sequelas na produção de alimentos e

favorecendo a aparição de doenças emergentes e reemergentes. O Plano Estratégico para a

Conservação da Biodiversidade (Nações Unidas) fixa, para a década de 2011 a 2020, os seguintes

objetivos: conservar a biodiversidade e fomentar sua utilização sustentável; distribuir de maneira justa

os benefícios do uso dos recursos genéticos.

A DESAPARIÇÃO DOS ECOSSISTEMAS NATURAIS

O cultivo de plantas e a domesticação de animais acompanharam o homem na passagem de uma vida

nômade para uma vida sedentária; uma mudança que ocorreu repetidas vezes, em diversas

populações e em lugares diferentes. As primeiras plantas cultivadas foram a cevada e o trigo (vales do

Eufrates e do Nilo, entre 13.000 a.C. e 10.000 a.C.), o arroz (regiões fluviais da China e da Índia, 10.000

a.C.), e o milho e a abóbora (América Central, entre 9.000 e 7000 a.C.).

No continente europeu, durante a Antiguidade, os cultivos estiveram restringidos a umas poucas

espécies locais. As plantas provenientes de outros lugares chegaram lentamente, através do incipiente

intercâmbio comercial, ou como troféus de guerra, de romanos e cruzados. As técnicas agrícolas

primitivas limitavam-se à tração animal do arado e ao armazenamento de alimentos. Na Idade Média,

a introdução da rotação trienal de culturas possibilitou a conservação do solo e o aumento da

produção.

As grandes navegações e a descoberta do Novo Mundo mudaram o perfil das plantas cultivadas em

cada continente. O milho, a batata, o tomate, o feijão, o girassol e o tabaco foram introduzidos na

Europa. Procedentes de diferentes lugares, o trigo, o grão-de-bico, o arroz, os cítricos, a banana, o café

e a cana-de-açúcar se aclimataram na América (Figura 12.1).

No Novo Mundo e ligado ao tráfico de escravos, o ciclo da agricultura das plantações providenciou

o cultivo de plantas produtoras de fibras (algodão, juta) e de borracha (caucho), de açúcar (cana-de-

açúcar), de óleo (amendoim, palma), de frutos (banana), de substâncias estimulantes (chá, café, cacau)

etc.

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Cultivos diversos (1%) Grãos e cereais (10%) Florestas (31%) Pradarias e pastagens (24%) Outros usos (34%)

FIGURA 12.1. O transporte de plantas de um continente a outro

1: Trigo, aveia, videira, grão-de-bico.

2: Abóbora, feijão, milho, pimenta, tabaco, batata, tomate.

3: Café, inhame.

4: Abacaxi, amendoim, cacau, caucho, mandioca, milho, tomate, pimenta, cinchona.

5: Cítricos, banana, soja, cana-de-açúcar, arroz.

6: Abacaxi, amendoim, cacau, caucho, mandioca, milho, tomate, algodão, abacate.

FIGURA 12.2. Distribuição da produção agrícola (grãos e cereais, pradarias e pastagens, cultivos diversos) na área

habitável do planeta

--------------

Nesse marco econômico, ficaram definidas algumas das características da agricultura moderna, que

visa satisfazer as necessidades dos consumidores, relativas à produção de alimentos e de insumos

industriais.

A história da domesticação dos animais segue um curso parecido, começando com o cachorro, na Ásia,

no final do Paleolítico. Entre 8.000 e 7.000 a.C., foram domesticadas a cabra e a ovelha (Mesopotâmia),

o boi e o zebu (Mesopotâmia, Egito), o porco (China, Europa) e o gato (Mediterrâneo). A domesticação

do cavalo ocorreria bem mais tarde (Ucrânia, 4.000 a.C.).

Antes da chegada dos europeus ao continente americano, os povos originários sustentavam

criações de lhamas, alpacas, vicunhas, perus e preás. Os europeus importaram seus animais

domésticos uma vez conquistado o Novo Mundo. Cavalos, vacas, porcos e cachorros se multiplicaram

rapidamente, causando grande devastação na flora local e tornando as grandes planícies um lugar

ideal para a criação de gado.

A expansão dos ecossistemas agrícolas acompanhou a ocupação, pelo homem, da superfície

habitável do planeta, que exclui os oceanos, os mares, os desertos, as montanhas e as regiões polares

(Figura 12.2). O aumento significativo da produtividade agrícola no século XX esteve diretamente

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

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ligado às novas práticas agronômicas, à mecanização do trabalho no campo e ao melhoramento

genético. Contudo, esse progresso teve um impacto negativo na biodiversidade, ao limitar o número

de espécies cultivadas.

Para evitar o desaparecimento dos ecossistemas naturais, precisa-se de uma agricultura e pecuária

sustentáveis, que possibilitem a conservação e a manutenção dos solos, da água, dos processos

ecológicos e dos recursos genéticos.

O HOMEM E AS PLANTAS

AS PLANTAS ALIMENTÍCIAS

Os vegetais ocupam um lugar preponderante na dieta humana. Embora nossa alimentação inclua

também produtos animais (carne, leite, ovos, peixes, mariscos), a maioria das proteínas que ingerimos

é de origem vegetal. Os carboidratos presentes nos cereais fornecem 75% de nossas necessidades

calóricas, sendo as restantes complementadas pela ingestão de tubérculos, raízes, plantas oleaginosas

e sacarinas. Embora provendo uma pequena quantidade de calorias, as hortaliças e as frutas são

importantes devido a outros valores nutritivos (Tabela 12.1).

Apesar de existir uma enorme diversidade de plantas comestíveis, 90% dos alimentos consumidos

pelo homem restringem-se a um pequeno grupo de 20 a 25 espécies, sendo os principais a banana, a

mandioca, o milho, o amendoim, algumas leguminosas, o milheto, a batata, o arroz, o sorgo, a batata-

doce, a soja e o trigo (Figura 12.3).

A população humana passará, em meio século, de 6 bilhões de pessoas (2000) a 9 bilhões (2050).

Será suficiente a produção de alimentos para satisfazer as necessidades dessa população? Ao longo

dos últimos sessenta anos, duplicou-se a colheita de cereais e reduziram-se significativamente os

preços. O aumento da produção de alimentos deve-se à seleção de variedades mais produtivas e ao

cultivo em condições otimizadas. O progresso tecnológico da Revolução Verde (década de 1960) gerou

suficientes alimentos para suprir a humanidade, até hoje.

Contudo, ainda hoje, 4,5 bilhões de pessoas vivem na pobreza, 24.000 pessoas morrem diariamente

de fome e outras 800.000, principalmente crianças e mulheres, sofrem de desnutrição. A carência de

vitamina A afeta 14 milhões de crianças, e a falta de ferro, um bilhão de pessoas. Mesmo havendo

suficientes alimentos para todos, eles não chegam aos dois bilhões de pessoas que vivem com menos

de dois dólares por dia.

--------------

TABELA 12.1. Os principais tipos de vegetais que entram em nossa alimentação

TIPOS DE VEGETAIS EXEMPLOS

Cereais Trigo, arroz, milho, centeio, aveia, cevada, sorgo etc.

Plantas proteaginosas Diversos tipos de feijão, lentilha, grão-de-bico, amendoim, ervilha etc.

Raízes e tubérculos Batata, cará, batata-doce, mandioca, cenoura, beterraba etc.

Plantas oleaginosas Soja, algodão, colza, canola, amendoim, girassol etc.

Plantas produtoras de açúcar

Cana-de-açúcar, beterraba sacarina.

Frutas e hortaliças Banana, tâmara, coco, azeitona, abacate, manga, uva, fruta-pão, couve, couve-flor, tomate, pimenta, quiabo, berinjela, pepino, abóbora etc.

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FIGURA 12.3. Os vegetais na alimentação humana

--------------

Segundo a Food and Agriculture Organization (FAO), para responder às necessidades da população, a

produção de alimentos deverá aumentar em 60%, nos próximos 30 anos. Considerando que 90% das

pessoas viverão na faixa intertropical do planeta, onde está situada a maioria dos países em

desenvolvimento, a falta de alimentos poderá se agravar. Em parte, porque, salvo algumas exceções

significativas (chá, café, cacau, banana etc.), os alimentos são consumidos no mesmo lugar onde são

produzidos. E também porque, em função das mudanças climáticas e da tendência migratória para as

grandes cidades, aumentará o número de pessoas que, em vez de produzir alimentos, deverá comprá-

los.

Embora em vários lugares tenham aparecido sinais de erosão e de esgotamento do solo, a expansão

da fronteira agrícola parece improvável. Boa parte da terra não utilizada se encontra em regiões pouco

férteis, distantes, carentes de infraestrutura ou cobertas por florestas. Sua ocupação aceleraria a

degradação de ecossistemas, com perda de biodiversidade e risco de aparição de doenças.

Os grandes desafios atuais da humanidade são o aumento da produtividade dos sistemas agrícolas

e a redução da desigualdade de acesso aos alimentos. Se, para o primeiro, o desenvolvimento

tecnológico é indispensável, a história mostra que, sem mudanças sociais e políticas, não haverá

solução para o problema da fome.

AS PLANTAS COMERCIAIS

A PRODUÇÃO DE INSUMOS

Várias plantas são cultivadas e comercializadas, às vezes internacionalmente, como matéria-prima

para diversas indústrias (Tabela 12.2). Assim como o ouro, a carne, o petróleo e o gás natural, os grãos

são considerados produtos equivalentes (commodities), independentemente do produtor. Os preços

são fixados em mercados futuros, que estabelecem a quantidade e a qualidade da commodity a ser

comercializada.

De todas as plantas industriais, a soja é uma das mais importantes, devido à extraordinária

versatilidade de seus produtos.

O grão e os brotos podem ser consumidos diretamente ou como farinha na composição de pães,

doces, bebidas, massas, biscoitos etc. Os grãos fermentados são utilizados na culinária oriental (misó,

tempeh).

A fração proteica do grão substitui a proteína de origem animal como carne de soja. Também é

usada na elaboração de produtos dietéticos, pastas e cremes, massas, sucrilhos, comida de bebês,

bebidas etc. A torta de soja é incluída nas rações animais. Por outro lado, essa fração proteica entra

na composição de adesivos, reagentes analíticos, colas de madeira, emulsão asfáltica, produtos de

limpeza, cosméticos, substitutos de couro e plásticos.

O óleo extraído do grão é usado para cozinhar e como condimento para saladas e, na indústria de

alimentos, entra na composição de molhos, maioneses, coberturas de bolo, bebidas, patês e

Espécies comestíveis (10.000 – 80.000)

Espécies outrora consumidas como alimento (5.000)

Espécies cultivadas atualmente (2.300)

Espécies cultivadas comercialmente (150)

Espécies essenciais na dieta humana (20-25)

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

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margarinas. Outras indústrias o utilizam como anticorrosivo e antiestático, entrando na composição

de agentes dispersantes e antiespumantes, selantes, cosméticos, madeirite, corantes e tintas.

Atualmente, 80-90% do óleo de soja produzido provém de culturas transgênicas.

Assim como a soja, o milho apresenta um espectro de aplicações de amplidão equivalente na

alimentação e na indústria. Não é de surpreender que os primeiros cultivos transgênicos

comercializados correspondessem a quatro das plantas industriais: a soja, o milho, o algodão e a

canola.

--------------

TABELA 12.2. As plantas e a indústria

PRODUTO PLANTAS INDUSTRIAIS

Biocombustíveis Cana-de-açúcar, beterraba sacarina, cereais, soja, mamona etc.

Fibras têxteis Algodão, sisal, linho, cânhamo, juta, coco, rami, piaçava.

Óleos e gorduras Soja, algodão, colza, canola, amendoim, girassol, dendezeiro, babaçu, mamona, sésamo, oliveira, linhaça.

Essências e fragrâncias Sassafrás, menta, citronela, geraniol, eugenol, capim-limão.

Látex Borracha, chicle (sapoti).

Ceras Carnaúba, jojoba.

Resinas Bálsamos e gomas.

Especiarias Pimenta-do-reino, noz moscada, canela, gengibre, cravo-da-índia.

Taninos Acácia, quebracho, eucaliptos.

Tinturas Pau-brasil, pau-campeche, urucum.

--------------

A EXPLORAÇÃO DAS FLORESTAS

As florestas naturais têm um valor intrínseco fundamental na preservação da biodiversidade. No

entanto, a lenha ainda é utilizada como combustível, e as madeiras nobres continuam a ser exploradas.

As florestas também são uma fonte de matéria-prima para a indústria de papel e celulose. As

biotecnologias facilitam o reflorestamento, através da micropropagação e do plantio clonal de árvores

mais produtivas, obtidas por melhoramento genético convencional ou por engenharia genética.

Técnicas de engenharia genética visam reduzir a lignina em 45-50%, de modo a diminuir a necessidade

de tratamentos poluentes, no processamento da polpa.

A maioria dos estudos sobre essências se limita aos gêneros Pinus, Eucalyptus, Picea, Populus,

Quercus e Acácia. O mapeamento de genomas (Pinus, Eucalyptus) e a utilização de marcadores

genéticos permitem selecionar alelos em genes que controlam a variação fenotípica. Aplicam-se

também as duas tecnologias para a obtenção de árvores que possam crescer em solos ácidos ou com

salinidade acentuada.

A comercialização do eucalipto transgênico de crescimento rápido da FuturaGene (Suzano),

aprovado pela CTNBio, redundaria na limitação da expansão das plantações, diminuindo a energia

gasta em transporte.

Além do Brasil, outros países já realizaram experiências de transformação genética em árvores. Na

China, a tecnologia é considerada fundamental para o reflorestamento; plantações de Populus

resistente a insetos (portador de um transgene codificador da toxina do Bacillus thuringiensis) estão

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sendo monitoradas, desde o ano 2000. Outros estudos visam a resistência à salinidade, ao estresse, à

seca etc.

A FLORICULTURA

A floricultura é o cultivo de plantas ornamentais e de flores. Trata-se de um mercado em expansão, de

importância comercial para a América do Sul, o Oriente Médio, a Asia e a África. A produção de material

de propagação (mudas, sementes e bulbos) para a floricultura tende a se concentrar em grandes

empresas internacionais. Cultivam-se poucas espécies nativas para exportação. A maioria das plantas

comercializadas é o resultado de cruzamentos tradicionais, técnicas de cultivo de tecidos

(micropropagação e embriogênese somática), haploidização e fusão de protoplastos.

A produção comercial de orquídeas, por exemplo, depende hoje totalmente das técnicas de cultura

in vitro; boa parte do desenvolvimento das plantas ocorre em condições de laboratório bem

controladas, que permitem a obtenção de mudas sadias e de variedades novas.

O Brasil exporta flores e plantas tradicionais (crisântemos, rosas, gladíolos, cravos, gérberas etc.) e

plantas tropicais (helicônias, bromélias, orquídeas, antúrios etc.) em diferentes modalidades (flores de

corte, flores em vaso, plantas verdes e plantas para paisagismo).

A Argentina exporta rosas, cravos e palmas para cidades como Miami e Milão, de onde são

distribuídas internacionalmente. Também exporta bulbos de tulipa e uma variedade de rosa preta sem

espinhos. O Instituto Nacional de Tecnologia (INTA) e a Japan International Cooperation Agency (JICA)

participam de um programa de cooperação para o desenvolvimento da floricultura, assim como da

produção hortifrutícola.

Aproximadamente 75% do mercado mundial de flores corresponde a cravos, rosas, crisântemos e

gérberas, espécies nas quais faltam os pigmentos responsáveis pela coloração azul (antocianinas). Com

a transferência de um gene de petúnia ao cravo, as empresas Florigene (australiana) e Suntori

(japonesa) conseguiram colocar no mercado flores inovadoras, tais como os cravos (Dianthus

caryophyllus L.) de cor malva (Moondust) ou violeta (Moonshadow).

Na Colômbia, os cravos azuis são cultivados, desde 2000, por Flores Colombianas S.A., uma filial da

empresa holandesa Floriyin, e comercializados em diversos países, inclusive dentro da União Europeia,

onde levam a seguinte ressalva: “Este produto é um cravo geneticamente modificado” e “inapropriado

para o consumo por seres humanos e animais”.

Em 2009, a Colômbia iniciou o cultivo de rosas e crisântemos azuis transgênicos, que não são

vendidos na União Europeia; os melhores clientes estão no Japão que, no século VIII, adotara o

crisântemo como emblema do selo imperial.

Em relação à engenharia genética, não há muito interesse em desenvolver novas variedades,

porque os custos dos testes necessários para obter a aprovação de um transgênico são muito altos.

No entanto, existem várias linhas de pesquisa visando o desenvolvimento de fragrâncias e a resistência

a doenças e ao estresse. Também se estuda a transferência, a várias espécies ornamentais, de genes

que prolonguem a conservação das flores nos vasos.

A COSMÉTICA

As indústrias cosméticas utilizam, em seus produtos, numerosos ativos vegetais extraídos de plantas e

de algas. Em conjunto com pequenas comunidades rurais, várias empresas desenvolveram uma forma

de produção sustentável de substâncias intermediárias, como óleos (coco, castanha) e outros extratos

vegetais (maracujá, açaí, andiroba etc.).

A “onda verde” que se alastra na sociedade levou várias empresas nacionais (Natura, O Boticário,

Granado etc.) e estrangeiras (L’Oréal-Body Shop, Zhiel’s, Yves Rocher etc.) a aderir, com sucesso, a este

modelo.

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

155

AS PLANTAS MEDICINAIS

Até o momento, foram identificadas aproximadamente 20.000 espécies de plantas medicinais. Sem

acesso aos medicamentos comercializados, 80% da população rural depende delas.

A metade das drogas medicamentosas consumidas atualmente é extraída de 250 espécies de

plantas silvestres, que representam 0,1% das 250.000 plantas vasculares. Em alguns casos, o princípio

ativo das plantas foi identificado e sintetizado quimicamente. O ácido acetilsalicílico da fórmula da

aspirina, por exemplo, tem um efeito comparável ao do ácido salicílico, extraído da casca do salgueiro

e administrado como analgésico e antitérmico, em chás e poções, desde a Antiguidade.

A procura por novos medicamentos começa pela coleta das plantas, seguida da extração de

substâncias químicas que são submetidas a testes de atividade biológica. Encontrar um princípio ativo

pode gerar lucros muito altos, embora só um, em cada 10.000 produtos testados, chegue ao mercado.

Entre os fitoquímicos bem-sucedidos estão: a diosinina (produção de anticoncepcionais), a vincristina

e a vinblastina (medicamentos anticancerosos), a morfina (anestésico) e o curare (relaxante em

cirurgias).

A BIODIVERSIDADE AMEAÇADA

A EROSÃO GENÉTICA

A perda de biodiversidade acarreta a perda de variação genética (erosão genética). Os dados são

estarrecedores: 11 milhões de Ha/ano de florestas destruídas; avanço da desertificação em 27 milhões

de Ha/ano; desaparição de 30 a 300 espécies por dia. A destruição dos ecossistemas, a diminuição do

número de espécies existentes e a perda de variabilidade genética são danos irreparáveis, porque é

preciso recorrer aos genes das variedades silvestres para melhorar geneticamente as plantas

cultivadas e os rebanhos existentes.

A erosão genética é inquietante em relação às plantas alimentícias, cultivadas em número restrito e uniformizadas em função das práticas agrícolas modernas. Se, no início do século XX, existiam na Índia mais de 30.000 variedades nativas de arroz, hoje provavelmente não restam mais de 50. Por outro lado, o risco de extinção ameaça, aproximadamente, 30% das variedades ou raças dos animais de criação.

Também preocupa o futuro das plantas medicinais, muitas delas silvestres, porque as melhores

plantas são as primeiras a ser colhidas, enquanto as restantes ficam no terreno, produzindo as

sementes que darão origem às próximas gerações. Este tipo de seleção negativa contribui para a

erosão genética das espécies.

A EXPANSÃO DO AGRONEGÓCIO

Embora as novas tecnologias de edição genética possam modificar rapidamente o panorama, as

plantas geneticamente modificadas se limitam, por enquanto, a um número reduzido de espécies e a

poucos traços, principalmente tolerância a herbicidas e resistência a insetos. A globalização dos

cultivos de plantas geneticamente modificadas traz alguns questionamentos relativos ao seu impacto

sobre a biodiversidade.

Vários cenários são possíveis, com diferentes consequências para os ecossistemas e sua

biodiversidade. No primeiro, a expansão do agronegócio afetaria os espaços dedicados a outras

culturas, pastagens e florestas. No segundo, ao aumentar a produção agrícola, as variedades

transgênicas diminuiriam a pressão sobre as áreas não cultivadas, especialmente as florestas.

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156

A materialização de um ou outro, assim como a de qualquer outro cenário intermediário, dependerá

das pressões socioeconômicas e das políticas públicas relativas à produção de alimentos, exportações

e proteção do meio ambiente. Mas não da transgênese em si, porque os cenários seriam os mesmos

se em vez de plantas geneticamente modificadas dispuséssemos de plantas melhoradas por métodos

tradicionais.

A expansão da monocultura de um pequeno número de espécies representa, sem dúvida, uma

perda da biodiversidade existente no ambiente natural. No entanto, o mercado de sementes difere de

outros mercados globalizados, como o de bebidas gasosas, o de eletrônica ou o de informática, que

geram produtos standard, de modo que a comercialização de um único tipo de semente não significa

necessariamente a total uniformização do material genético.

Nenhuma semente está presente ou é comercializada em todo o globo, criando-se variedades

adaptadas a contextos específicos. Essas variedades ou cultivares distinguem-se entre si por suas

características morfológicas, fisiológicas, bioquímicas ou moleculares, herdadas geneticamente. A

estratégia é a mesma em relação às plantas transgênicas. Por exemplo, das 668 cultivares de soja

(Glycine max (L.) Merrill), registradas no Registro Nacional de Cultivares (RNC/ MAPA), mais de 200 são

transgênicas.

A TRANSGÊNESE

Muitas das plantas consideradas naturais são um invento recente do homem. Um exemplo é o

morango, resultante de um cruzamento acidental entre duas variedades que não coexistem na

natureza: a norte-americana Fragaria virginiana e a sul-americana Fragaria chiloense, ocorrido no

século XIX em um Jardim Botânico da França.

Outro exemplo é o tritical, um híbrido de trigo e centeio, obtido em laboratório em fins do mesmo

século. Tratado inicialmente como uma curiosidade científica, este cereal teve suas propriedades

agronômicas desenvolvidas recentemente, sendo utilizado hoje na composição de pães e biscoitos e

de rações animais; também é vendido em algumas lojas de produtos naturais.

A valorização do que é natural varia de uma pessoa a outra. Se a natureza for vista como boa e

protetora, toda intervenção humana será observada com desconfiança. Ao contrário, frente a uma

natureza perigosa e ameaçadora, cabe ao homem se resguardar. Dessas duas visões do mundo natural

nascem a tecnofobia e a tecnofilia, duas correntes que se enfrentam frequentemente.

A transgênese é especialmente perturbadora para alguns setores de opinião, contrários ao uso

dessa tecnologia. Em alguns casos, existiria desconfiança na ligação atual entre a ciência, a tecnologia

e o mundo empresarial. Ao associar o progresso científico às vantagens econômicas, a ciência perderia

sua histórica imagem de pureza, honestidade e desinteresse.

Em outros, o temor consistiria na modificação do padrão das espécies, por transferência de genes,

quebrando a ordem estabelecida na Criação e gerando o caos genético. Na mitologia, esse medo se

encontra representado na quimera, um misto de leão, cabra e dragão que vomitava fogo e que, na

Idade Média, simbolizava o mal. Figuras mistas de homem, animal e planta se encontram

magistralmente representadas pelo pintor flamengo Hieronymus Bosch (El jardín de las delicias, 1510).

Por ser de cunho religioso e essencialmente subjetiva, esta última visão não corresponde ao nosso

conhecimento atual sobre as espécies, que são unidades morfológicas e reprodutivas essencialmente

dinâmicas. Sem fundamentação científica, o criacionismo e o fixismo ignoram os inúmeros estudos

sobre a evolução dos seres vivos, assim como descobertas recentes sobre os genomas, mostrando o

compartilhamento de um número grande de genes entre as diferentes espécies.

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

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A PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE

OS CENTROS DE DIVERSIFICAÇÃO

No início do século XX, o geógrafo e geneticista russo Nikolai I. Vavilov organizou mais de 100

expedições que percorreram 64 países, coletando sementes, grãos, tubérculos etc. Nessas viagens, ele

observou que a diversidade das variedades cultivadas era muito maior em algumas áreas que em

outras. Essas áreas geográficas seriam os centros de origem dessas variedades.

Na Cordilheira dos Andes, existem mais de 1.000 variedades de batata, cada uma delas identificada

com um nome pela população local. Para Vavilov, isso revelaria que a região andina seria seu centro

de origem e de diversificação. A partir de observações análogas, ele localizou seis a oito centros

geográficos onde, presumivelmente, teria-se originado a agricultura (Tabela 12.3).

Vavilov não chegou a completar sua obra. Encarcerado por defender o conceito mendeliano da

herança, faleceu na prisão de Saratov, em 1943. Como comentado anteriormente, a genética foi

considerada uma teoria reacionária e burguesa, na antiga União de Repúblicas Socialistas Soviéticas

(URSS), entre 1929 e 1964.

A teoria de Vavilov foi extremamente fecunda para os estudos evolutivos das plantas cultivadas e,

consequentemente, para a conservação da biodiversidade. Admite-se hoje que a diversidade das

plantas cultivadas e silvestres, bem maior em alguns pontos geográficos, indica que alguns biomas

foram mais propícios que outros para o nascimento de práticas agrícolas.

Atualmente, sabe-se que os centros origem nem sempre coincidem com os centros de diversidade,

porque as migrações humanas geraram centros de diversidade secundária em que, respondendo às

práticas agrícolas e à pressão do ambiente, as espécies se diversificaram, tornando-se tolerantes às

condições ambientais e resistentes às doenças locais.

A CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

Uma das consequências do processo evolutivo é a extinção de espécies: o número de espécies vivas

não chega a 1% das que, alguma vez, povoaram a Terra. Mais que a aparição e desaparição das

espécies, o que preocupa é a velocidade com que isso está acontecendo, porque configura uma

extinção em massa, causada pelo homem. --------------

TABELA 12.3. Os centros de diversificação e os cultivos originários

REGIÃO CULTIVOS

América Central e do Norte Milho, amaranto, feijão, batata-doce, mandioca, algodão, sisal, papaia, abacate, goiaba, pimenta, abóbora, tomate, baunilha, cacau, girassol, morango, noz pecã, tabaco etc.

América do Sul Amaranto, amendoim, feijão, lupino, batata, mandioca, amendoim, algodão, caju, fruta-de-conde, abacaxi, papaia, abacate, morango, pimentão, abóbora, coca, mate, borracha etc.

Índia e Sudeste asiático Limão, pepino, arroz, melão, manga, cana-de-açúcar, algodão, cânhamo, coco, arroz, fruta-pão, laranja, tangerina, banana, plátano, noz-moscada, berinjela etc.

China Soja, colza, lichia, pera, pêssego, repolho, chá, gengibre, ginseng, cânfora etc.

África (Etiópia) Café, melão, melancia, inhame, sorgo etc.

Ásia menor Alfafa, trigo, aveia, centeio, cevada, rabanete, cenoura, ervilha, grão-de-bico, lentilha, azeitona, figo, amêndoa, vinha, maçã, beterraba, alho, cebola, açafrão, papoula, alcaçuz etc.

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158

Consideremos, por exemplo, o caso da Mata Atlântica brasileira, cuja biodiversidade é maior que a da

Amazônia. A devastação é tal que só restam pedaços da floresta original, e sua conservação depende

da manutenção de corredores entre os diversos fragmentos.

Preservar a biodiversidade e os recursos genéticos é muito mais que salvá-los da extinção, significa

conservar suficiente diversidade dentro de cada espécie, de forma a garantir que seu potencial

genético possa ser usado no futuro.

Todas as variedades cultivadas atualmente têm incorporados genes de variedades selvagens, ou

dos estoques genéticos, conservados pelos povos que praticam uma agricultura tradicional. A

produção comercial do tomate, por exemplo, seria impossível sem a contribuição de genes silvestres

de América Latina. Graças aos trigos selvagens, dispomos de variedades resistentes aos fungos, à seca,

ao calor ou ao frio. A resistência a quatro doenças do arroz cultivado atualmente deve-se a uma única

variedade, encontrada na Índia central.

A CONSERVAÇÃO IN SITU

A biodiversidade pode ser conservada in situ, mediante a proteção ambiental de uma determinada

região. Além de manter a dinâmica evolutiva das espécies, nas Unidades de Conservação Ambiental

devem-se contemplar as necessidades da população local, criando reservas de desenvolvimento

sustentável (Mamirauá, Brasil; Slan K’an, México). Na Costa Rica, uma lei de 1996 compensa aqueles

que conservem, ou aumentem, a área de floresta dentro de suas propriedades.

Algumas iniciativas interessantes para a proteção da biodiversidade envolvem o rastreamento por

satélite (baleias, lontras) e o uso de aplicativos para telefones celulares, que facilitam o monitoramento

da fauna silvestre (SISSGEO, Centro de informação em Saúde Silvestre, Fiocruz).

Uma nova tendência é o retorno da vida selvagem, mediante a reintrodução de animais como o

urso, nos Pirineus, ou o lobo, nas florestas europeias. Projetos mais arrojados contemplam a criação

de comunidades de grandes mamíferos. Em Oostvaarderplassen (Países Baixos), o objetivo é

reconstituir, sem intervenção humana, a paisagem original da região. Os animais extintos foram

substituídos por outros que lhes são aparentados. Em vez do auroque, que desapareceu em 1627,

introduziu-se o auroque de Heck, criado em 1920 por cruzamento entre as mais antigas raças de

bovinos europeus. O pônei Konik da Polônia ocupa o lugar do tarpan, um cavalo selvagem extinto.

A ideia é controvertida porque, inevitavelmente, o ecossistema reconstituído será diferente do

padrão antigo e, também, porque os defensores dos direitos dos animais consideram uma crueldade

o abandono dos animais a seu destino. Um projeto análogo procura recriar as estepes da tundra,

anteriores à última era glacial (Parque Pleistocênico, Rússia).

Outra tendência é o uso da biotecnologia moderna para salvar espécies ameaçadas, como os

rinocerontes, mortos por caçadores inescrupulosos para extrair e vender os chifres, como troféu ou

como medicamento. Uma empresa norte-americana transferiu a uma levedura um gene capaz de

sintetizar queratina de rinoceronte que, misturada ao DNA do animal, seria utilizada para fabricar

chifres artificiais. Outra empresa, envolvida na conservação dos rinocerontes, injeta no chifre do

animal anestesiado um corante azul que pode causar vômitos e diarreias, de modo a impedir seu uso

como ornamento ou medicamento.

A CONSERVAÇÃO EX SITU

Os anfíbios enfrentam sérios riscos de extinção em massa, devido à perda de habitats e a uma doença

causada pelo fungo Batrachochytrium dendrobatidis, nativo de África do Sul, onde vive em forma

simbiótica com a rã de unhas africana (Xenopus laevis). Na década de 1930, essa rã fora distribuída no

mundo inteiro, para a realização de testes de gravidez. Embora a doença possa ser tratada facilmente

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

159

em cativeiro, o mesmo não ocorre na natureza. Até o momento, a conservação dos anuros depende

da manutenção e cuidado das espécies em jardins zoológicos.

Diferentemente dos tradicionais, os jardins zoológicos modernos recriam os habitats naturais dos

animais, sem jaulas (San Diego Zoo, California). Esses jardins cumprem um rol importante na

preservação das espécies ameaçadas, mantendo instalações de criopreservação (Frozen Zoo) e

coleções de DNA, esperma, ovos, embriões e tecidos vivos.

O progresso tecnológico permite o sequenciamento de animais extintos, como os dois mamutes

(Mammuthus primigenius) congelados no permafrost da Sibéria, 60 mil e 20 mil anos atrás. Uma vez

descartadas as sequências de microrganismos que contaminaram os fósseis, a comparação com o

genoma do elefante africano atual permitirá entender as principais mudanças evolutivas e, talvez, a

causa de sua extinção.

Contudo, a expectativa de clonar um mamute resulta um tanto fantasiosa, lembrando-nos do livro

de M. Crichton, “Parque dos dinossauros”. Para recriar o mamute, seria necessário complementar as

partes do genoma faltantes com sequências de elefante africano; substituir, em um zigoto, o genoma

do elefante africano pelo do mamute; inseminar artificialmente uma fêmea de elefante africano e

aguardar dois anos até a cria nascer. Esta seria, provavelmente, muito parecida ao mamute, mas qual

seria o destino desses animais?

A conservação ex situ de plantas envolve a coleta de amostras representativas de uma população

e sua manutenção em bancos de germoplasma e/ou jardins botânicos, na forma de sementes, estacas,

plantas inteiras etc.

A criopreservação é aplicada, especialmente, às plantas cultivadas que se reproduzem por

sementes. Estas podem ser conservadas, no frio, durante longos períodos de tempo (20 a 30 anos a

50C; um século a -180C-200C). Periodicamente, algumas sementes serão germinadas para retirar, das

plantas que frutifiquem, a geração seguinte de sementes frescas e substituir as antigas nas câmaras

frias.

A criopreservação tem a vantagem de manter o material em um espaço reduzido e com cuidados

extremos. Porém, devido às limitações no tamanho das amostras e aos custos de manutenção, nem

sempre o sistema consegue conservar os recursos fitogenéticos. Um exemplo é a coleção da Estação

Experimental Vavilov (São Petersburgo, Rússia), que sobreviveu à Segunda Guerra Mundial e

atualmente enfrenta grandes dificuldades econômicas.

As técnicas de cultura de tecidos permitem conservar muitas das plantas que não resistem à

dessecação (coco, cacau, cítricos, café, dendê, borracha e 70% das árvores das florestas tropicais) e,

também, as plantas de multiplicação vegetativa (raízes, como a mandioca, tubérculos como a batata,

banana, cana-de-açúcar).

A incorporação da tecnologia do DNA e dos estudos genômicos facilita os estudos de diversidade

genética; a disponibilidade dos dados no domínio público abre perspectivas novas de conservação.

Existem hoje mais de 1.400 bancos de genes e de germoplasma, com mais de 6.000.000 de amostras.

Os principais se encontram nos Estados Unidos, na China, na Alemanha e no Brasil (Embrapa). Na

Noruega, a 1.000 km do Polo Norte, um lugar considerado a salvo de mudanças climáticas, desastres

naturais e guerras, criou-se recentemente o banco de sementes de Svalbard, com capacidade para

armazenar 4,5 milhões de amostras, cada uma com 500 sementes.

Devido à localização geográfica dos centros de origem e de diversificação, é preocupante a

multiplicação recente dos conflitos bélicos (Afeganistão, Iraque, Síria), que afetam a população local e

comprometem seu futuro, ao devastar a Ásia Menor, uma região de grande biodiversidade e riqueza

genética.

Os bancos de germoplasma podem, também, ajudar a restaurar uma agricultura devastada por

conflitos bélicos. Em Ruanda, um país em que 90% das pessoas dependiam da agricultura e onde eram

conhecidas 600 variedades de feijão, o conflito bélico entre etnias rivais causou, em 1994, a morte de

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800.000 pessoas e a migração forçada de dois milhões de pessoas. Durante esse período, organizações

internacionais conservaram, em bancos de germoplasma, as sementes essenciais para a reconstrução

do país.

A LEGISLAÇÃO VIGENTE

Aprovada por 175 países, a Convenção sobre Diversidade Biológica (1992) reconhece a soberania

nacional sobre a biodiversidade, estabelece a repartição de bebefícios decorrentes do uso dos recursos

genéticos e reconhece os direitos das comunidades locais e indígenas sobre seus conhecimentos.

No Brasil, a proteção da biodiversidade está regida pela Lei nº 13.123/2015 que determina as regras

para acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado, assim como a repartição

de benefícios.

O CGIAR E O CENTRO INTERNACIONAL DA BATATA

Uma das organizações dedicadas à conservação da biodiversidade e ao desenvolvimento agrícola dos

países em desenvolvimento é a Future Harvest, uma iniciativa com 16 centros localizados em diversos

lugares, porém mantendo uma estrutura descentralizada que favorece a difusão das informações. Os

centros são mantidos pelos governos de 165 países, fundações privadas e organizações internacionais

e regionais que integram o Consultative Group on International Agricultural Research (CGIAR), apoiado

pela Food and Agriculture Organization (FAO). Os centros do CGIAR na América Latina são: o Centro

Internacional para el Mejoramiento del Maíz y el Trigo (CIMMYT) no México, o Centro Internacional de

la Papa (CIP) no Peru e o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT) na Colômbia.

A batata é originária da região andina. No século XVI chegou à Europa onde, depois de vencer a

resistência da população, transformou-se em um dos poucos alimentos consumidos pela população

mais pobre. Quando, em meados do século XIX, o fungo Phytophtora infestans infectou as batatas,

desencadeou-se na Irlanda um terrível período de fome, que causou a morte de um milhão de pessoas

e a emigração de boa parte da população.

Hoje, a batata é o quarto cultivo mais importante do mundo, com uma produção anual de 300

milhões de toneladas. Em muitos países, a população depende de batata e de outros tubérculos

(batata-doce) para sua alimentação, por serem relativamente ricos em energia e nutrientes.

O Centro Internacional da Papa (CIP) preserva a batata (Solanum tuberosum), a batata-doce

(Ipomoea batatas) e nove tubérculos ou raízes andinas (Oca, Ulluco, Mashua, Arracacha, Yacon, Achira,

Ahipa, Maca, Mauka). O banco de germoplasma de batata inclui amostras de uma centena de espécies

selvagens, coletadas em 8 países de América Latina, além das variedades cultivadas tradicionalmente

pela população andina.

Entre os objetivos do CIP se encontra o melhoramento da qualidade nutricional, da resistência a

doenças e a condições climáticas adversas, como a seca e a geada. O centro utiliza a biotecnologia para

criar formas adaptadas às condições locais e distribui as variedades tradicionais e melhoradas sob a

forma de sementes, tubérculos ou vitroplantas. Atualmente também estimula as utilizações comerciais

das variedades autóctones: distribuição em pacotes (t’ikapapa), elaboração de chips ou hojuelas a

partir de rodelas com um visual variado.

O PROTOCOLO DE CARTAGENA DE BIOSSEGURANÇA

Vigorando desde setembro de 2003, o Protocolo de Cartagena de Biossegurança suplementa a

Convenção sobre a Diversidade Biológica. O acordo contempla o risco potencial decorrente do

transporte e do manuseio de todos os organismos vivos modificados (OVMs) que possam ter um efeito

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BIOTECNOLOGIA E BIODIVERSIDADE

161

adverso na conservação e no uso sustentável da diversidade, levando em consideração os riscos para

a saúde humana.

Frente à apreensão suscitada pelo trânsito e movimento dos organismos transgênicos através de

fronteiras, os países membros determinaram que a expressão pode conter OGMs identifique toda

carga proveniente de lavouras transgênicas destinada à alimentação, ração ou processamento.

O Protocolo não cobre os produtos derivados dos transgênicos (como, por exemplo, papel

produzido a partir de árvores transgênicas) nem os transgênicos produtores de fármacos, que são

regulados por outras organizações.

Mediante o Protocolo de Cartagena se estabelece a cooperação internacional, a fim de ajudar os países

em desenvolvimento a utilizar a biotecnologia com segurança e a regulá-la eficientemente. Os

governos membros se propõem a promover o fluxo de informações e a transferência de tecnologia,

conhecimentos e recursos, mediante o treinamento científico e técnico correspondente.

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C A P Í T U L O 13

BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA

A EVOLUÇÃO DAS PRÁTICAS AGRÍCOLAS

Embora as práticas agrícolas e as plantas cultivadas tenham-se desenvolvido em um curto período da

história evolutiva dos vegetais, as plantas cultivadas atualmente são o resultado de milhares de anos

de seleção artificial pela mão do homem e guardam muito pouca semelhança com suas ancestrais

selvagens (Figura 13.1).

Na Europa, o uso de ferramentas rudimentares prevaleceu até a Idade Média, quando, em função

de várias inovações, as práticas agrícolas se tornaram mais eficientes. Datam desse período o

aproveitamento da força de tração animal, a invenção dos moinhos, a prática de descanso dos solos e

a construção de sistemas de irrigação.

No século XVIII, a integração das atividades agrícolas e a criação de animais originou uma nova

agricultura que, além de envolver a utilização de esterco como fertilizante, promoveu a rotação entre

os cultivos de gramíneas, leguminosas e plantas forrageiras.

A incidência do progresso científico e tecnológico caracteriza a agricultura do século XIX,

destacando-se a preocupação com as necessidades nutricionais das plantas e com as doenças que

afetavam os cultivos e as criações (antraz das ovelhas, cólera das aves, doenças do bicho-da-seda etc.).

Originadas por cruzamentos seletivos, novas variedades e híbridos de trigo foram comercializadas

internacionalmente, a partir de 1850. Com a invenção da máquina a vapor e as primeiras utilizações

da eletricidade, iniciou-se a mecanização do campo.

No início do século XX, o uso do trator se espalhou rapidamente. A substituição da tração animal

pela maquinaria agrícola diminuiu a necessidade de produzir rações, liberando para outros cultivos a

superfície anteriormente dedicada à produção de feno e aveia. Com o redescobrimento das leis de

Mendel e a teoria cromossômica da herança, iniciou-se uma nova era no melhoramento de vegetais e

animais.

O cruzamento entre duas linhagens puras de milho origina um híbrido semelhante às linhagens

parentais, mas com qualidades superiores. Esta propriedade, denominada heterose ou vigor híbrido,

permite a geração de plantas mais produtivas, suficientemente homogêneas para facilitar a colheita

mecânica (Figura 13.2). As primeiras empresas comerciais a explorar a heterose do milho surgiram, a

partir de 1920, nos Estados Unidos e no Canadá (Hi-Bred Corn Company, mais tarde Pioneer Hi-Bred).

Essas empresas selecionavam as linhagens parentais de milho, procediam aos cruzamentos

correspondentes e vendiam as sementes híbridas ao agricultor. A perda do efeito da heterose diminui

a produtividade da descendência das plantas híbridas, de modo que o agricultor passou a comprar as

sementes

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BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA

163

Em 1960, o milho híbrido era cultivado, com raras exceções, em todas as plantações dos Estados

Unidos e do Canadá. O melhoramento das plantas já não dependia daqueles que estavam diretamente

envolvidos em seu cultivo, mas daqueles que produziam as sementes.

Na década de 1960, o desenvolvimento de uma variedade de trigo de alto rendimento e resistente

a doenças permitiu aumentar a quantidade de alimentos disponíveis, salvando da fome mais de 1

bilhão de pessoas. Por ser o artífice da “revolução verde”, uma contribuição fundamental para a paz

mundial, o engenheiro agrônomo Norman Borlaug recebeu o Prêmio Nobel da Paz (1970).

A “revolução verde” duplicou a produtividade dos cereais mediante o desenvolvimento e cultivo de

variedades melhoradas geneticamente, complementados por práticas agrícolas complexas (irrigação,

mecanização, aplicação de fertilizantes e pesticidas). Porém, trouxe problemas ambientais, sociais e

de saúde, devido à necessidade de grandes investimentos de capital para a mecanização e à aplicação

de produtos químicos, que foram usados em quantidades excessivas.

--------------

FIGURA 13.1. O milho

O milho de 5.000 a 7.000 anos atrás era bem menor do que o que

conhecemos atualmente. O cruzamento acidental com o teosinto, uma

erva que ainda existe na natureza, teria dado origem ao milho moderno,

que passou por várias modificações até se estender pela América pré-

colombiana. Diversas variedades de milho persistem até hoje no

continente.

www.learner.org/courses/essential/life/session5/closer1.html

FIGURA 13.2. A produção de milho híbrido

A hibridização permite obter híbridos simples, a partir de duas linhagens, e híbridos duplos, a partir de quatro linhagens. Existem híbridos múltiplos construídos a partir de pelo menos cinco linhagens.

Linhagem A Linhagem B Linhagem (AxB) Linhagem (AxB)x(CXD) (Planta de milho híbrido) Colheita Linhagem C Linhagem D Linhagem (CxD)

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Em alguns países, os pequenos agricultores não chegaram a usufruir a “revolução verde”. Se, desde

1960, a produção de cereais aumentou em mais de 40% na Ásia e na América do Sul, na África diminuiu

13%.

Com a crise do petróleo da década de 1980, o setor de sementes agrícolas foi invadido por grandes

empresas transnacionais, produtoras de agrotóxicos e fertilizantes que, mediante um investimento

extraordinário de recursos em pesquisa e desenvolvimento, conseguiram introduzir as técnicas de

engenharia genética no melhoramento das sementes. Traspassando as barreiras interespecíficas,

obtiveram plantas mais produtivas ou com propriedades novas.

Comercializadas a partir de 1996, as principais plantas geneticamente modificadas (PGMs)

cultivadas atualmente são a soja, o milho, o algodão e uma variedade de colza denominada canola. Os

traços mais frequentes são a tolerância a herbicidas e/ou a resistência a pragas. Em relação aos

métodos tradicionais, as biotecnologias modernas inserem a tecnologia na semente.

Em 2015, dos 28 países que semearam cultivos biotecnológicos, 20 deles foram países em

desenvolvimento. Produtores de América Latina, Ásia e África cultivaram 54% da área global plantada

com PGM.

A OBTENÇÃO DE NOVAS VARIEDADES

MUTAÇÃO GÊNICA E SELEÇÃO

O melhoramento clássico está baseado na reprodução seletiva entre indivíduos de uma mesma

espécie. A variação intraespecífica é limitada, mas alguns agentes físicos e químicos podem induzir

mutações aleatórias. No caso de aparecer algum mutante interessante, será cruzado por várias

gerações com um dos tipos parentais, até que este incorpore, por introgressão gênica, as

características desejadas.

Esse processo de mutação e seleção demora de cinco a quinze anos e, quando finalizado, o gene

selecionado pode estar acompanhado por outros não desejáveis. Duas variedades comerciais de

batata (Lenape, 1960; Magnum bonum, 1990), obtidas por este método, tiveram que ser retiradas do

mercado devido ao alto conteúdo de alcaloides, característico das plantas selvagens.

O progresso alcançado na indução de mutações (TILLING, do inglês Targeting induced local lesions

in genomes) e na seleção assistida por marcadores moleculares facilita a obtenção de novas variedades

(batata Amflora, BASF). A genômica também trouxe avanços notáveis, como a identificação de 40

genes de resistência a patógenos no tomate, que foram reunidos em um genótipo único. Contudo, em

ambos os casos, a variação se deve a genes pertencentes à mesma espécie.

ALTERAÇÃO DO NÚMERO DE CROMOSSOMOS

A multiplicação do número de cromossomos (poliploidia) é um fenômeno que acontece

espontaneamente nos vegetais, seja por não disjunção dos cromossomos ou por uma falha da

citocinese durante a divisão celular. Ao longo do processo evolutivo, duplicações dos lotes

cromossômicos originais (autopoliploidia) ocorreram em várias das espécies cultivadas atualmente,

tais como a batata ou a cana-de-açúcar.

A multiplicação dos lotes cromossômicos pode ocorrer em híbridos interespecíficos, pouco férteis

ou estéreis, restaurando a fertilidade e gerando uma nova espécie, diferente de ambas as linhagens

parentais. Este mecanismo (alopoliploidia) deu origem a plantas como o trigo, a colza, a aveia, o

tabaco, o algodão, o café etc.

A descoberta da colchicina (1935), uma substância que interfere com a formação dos fusos

mitóticos, permitiu a criação de novas espécies poliploides. A hibridização do trigo e do centeio,

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seguida de uma duplicação cromossômica, originou o triticale, uma planta que reúne a qualidade do

grão do primeiro e a rusticidade do segundo.

Outra forma de alteração do número de cromossomos é a cultura de anteras, para a obtenção de

plantas haploides. Essa tecnologia permite identificar mutantes recessivos e obter rapidamente

variedades diferentes por hibridização ou duplicação cromossômica.

ENGENHARIA GENÉTICA

À medida que a distância entre as espécies aumenta, os cruzamentos se tornam cada vez mais difíceis

e a transferência dos genes pode exigir o uso de técnicas complexas, como a fusão de protoplastos e

o cultivo de embriões. Quando os recursos genéticos provêm de outros organismos distantes na escala

evolutiva (plantas, microrganismos ou animais), sua transferência só é possível por engenharia

genética.

Qual a diferença entre uma planta obtida por cruzamento seletivo e outra por engenharia genética?

Na primeira, genes da mesma espécie ou de uma espécie muito próxima são introduzidos

aleatoriamente. Na segunda, incorpora-se diretamente uma construção gênica, proveniente da

mesma espécie (construção cisgênica) ou de uma espécie distante (construção transgênica). Trata-se

de uma tecnologia poderosa demais para ser negligenciada.

NO LABORATÓRIO

A construção de uma planta geneticamente modificada (PGM) começa com o isolamento e

caracterização do gene de interesse (transgene) e a construção de uma estrutura genética complexa,

que inclui um gene promotor e um gene marcador. O primeiro possibilita a transcrição do transgene,

determinando se este irá se expressar em todas as células ou somente em alguns tecidos. O segundo

permite selecionar as células transformadas.

A construção genética é transferida às células receptoras por algum dos métodos disponíveis

(eletroporação, biolística ou uso de vetores, como o plasmídeo Ti de Agrobacterium tumefaciens). As

células transformadas são recuperadas, procedendo-se à regeneração das plantas mediante técnicas

de cultura in vitro. Mediante técnicas bioquímicas e/ou acompanhamento de marcadores moleculares

(polimorfismos na molécula de DNA, repetição de sequências), constata-se a transferência gênica e

outros aspectos que podem influir na expressão gênica, como o número de cópias e o lugar em que

estas se integraram ao genoma.

O trabalho laboratorial é realizado com plantas cujo genótipo favoreça a transformação e a

regeneração da planta transformada, geralmente pouco vantajosas do ponto de vista agronômico.

Considera-se alcançado o sucesso quando o transgene se expressa no lugar correspondente e com um

adequado nível de atividade, restando por verificar a estabilidade da expressão gênica e o seu valor

agronômico.

AS ETAPAS POSTERIORES

Acabada a etapa de laboratório, iniciam-se os testes controlados em casa de vegetação, para

selecionar as plantas-mãe das quais procederão várias gerações de retrocruzamentos seletivos com

alguma das linhagens elite, visando a obtenção de uma linhagem transgênica de alto rendimento,

adaptada a um contexto específico. O resultado é uma variedade ou cultivar que expressa o traço

codificado pelo transgene e apresenta um potencial de produtividade parecido ao da linhagem elite.

Conceitualmente, a metodologia seguida depois da transformação mantém semelhança com à do

melhoramento tradicional, mas o processo é acelerado pela utilização de técnicas de cultura in vitro e

de marcadores moleculares na caracterização da progênie.

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Uma vez obtida a nova variedade de PGM, dá-se início à liberação planejada no meio ambiente, que

abrange o cultivo em experimentos protegidos e testes de campo realizados em diferente escala, até

a nova variedade estar pronta para o seu cultivo comercial. A liberação do cultivo dependerá da

autorização da legislação local, geralmente bastante restrita a esse respeito (Figura 13.3).

No Brasil, esta autorização é dada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio),

definida pela Lei de Biossegurança como o órgão multidisciplinar responsável pelo controle dessa

tecnologia no país (Lei 11.105/2005, Política de desenvolvimento da Biotecnologia; Decreto

6.041/2007).

A BIOSSEGURANÇA E O PRINCÍPIO DE PRECAUÇÃO

Poucas tecnologias suscitaram tanta polêmica como a introdução das PGMs na agricultura, uma

questão que não pode ser tratada levianamente. Além de conhecimentos e tempo, a construção de

uma planta transgênica exige o consenso das numerosas pessoas que participam no processo e a

aprovação da autoridade correspondente.

--------------

FIGURA 13.3. As etapas da construção de uma planta transgênica

Duração do processo: 10 a 15 anos.

Transformação Regeneração das plantas transformadas Caracterização molecular e bioquímica Avaliação do valor agronômico (Casa de vegetação, campo) Introgressão em uma linhagem comercial de elite Linhagem-mãe Linhagem comercial de elite Retrocruzamentos Obtenção da variedade geneticamente modificada Experimentos protegidos e testes de campo, em pequena e grande escala

Autorização das autoridades locais, de acordo com a legislação vigente

Liberação do cultivo para sua exploração comercial

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Ainda hoje, parte da opinião pública considera que as PGMs não deveriam ter sido introduzidas no

ambiente, nem utilizadas para o consumo humano, até não ser demonstrada a ausência de qualquer

risco. A exigência apoia-se no princípio de precaução, um princípio que pode ser entendido de diversas

maneiras.

Podemos dizer, de maneira simplista, que “havendo a possibilidade de algo ruim me acontecer na

rua, melhor ficar em casa”, ou que “havendo a possibilidade de algo ruim me acontecer na rua, ao sair

de casa é bom ter cuidado e prestar atenção no sinal, nos carros, nas bicicletas que circulam na

contramão e, também, no bandido”. Note-se que a decisão de “não sair de casa” também envolve

riscos, tais como escorregar e levar um tombo no banheiro, queimar-se ao acender o fogão ou receber

um vírus via Internet. Não existe risco zero, toda ação apresenta riscos que devem ser analisados para

ser posteriormente gerenciados.

No Brasil, o cultivo de plantas transgênicas é regido pela Lei de Biossegurança, que estabelece a

observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente. O Princípio 15 da Declaração

do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (1992) diz o seguinte: “De

modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos

Estados, de acordo com as suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis,

a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas

eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.

Diferente da prevenção, que trata de riscos conhecidos, a precaução contempla riscos potenciais

que demandam uma avaliação detalhada. Mesmo havendo incertezas ou falta de unanimidade entre

os expertos, o princípio de precaução não justifica a falta de ações concretas para a proteção do meio

ambiente.

Por outro lado, o Princípio 10 da mesma declaração nos diz que: “A melhor maneira de tratar

questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos

interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao

meio ambiente de que disponham autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e

atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar em processos de

tomada de decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública,

colocando a informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos

judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos”.

Vários pontos merecem ser destacados: admite-se a incerteza e a falta de unanimidade entre os

expertos, afirma-se o direito de todos à informação e pede-se a participação, no nível apropriado, de

todos os cidadãos interessados. A responsabilidade pela tomada de decisões não será exclusivamente

de um grupo de indivíduos, sejam estes cientistas, administradores, empresários, políticos ou

comunicadores. Terá que ser democraticamente assumida por um grupo heterogêneo que represente

os interesses da sociedade, mesmo tendo que abrir as portas ao marketing, aos lobbies e à pressão

dos grupos políticos, ambientalistas ou não.

Considerado por alguns grupos de opinião como um dos alicerces do desenvolvimento sustentável

e uma proteção contra o controle da tecnologia pelas grandes empresas, o princípio de precaução

também é visto por outros como um obstáculo ao progresso e uma tentativa de protecionismo.

A formalização do princípio mediante uma estrutura jurídica, como a Lei de Biossegurança, assim

como o estabelecimento de normas, regras e procedimentos claros, é a melhor maneira de gerenciar

o desenvolvimento tecnológico, minimizando os riscos correspondentes.

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AS PGMs DE INTERESSE AGRONÔMICO

As PGMs atuais apresentam traços, inseridos como transgenes, que visam modificar suas propriedades

agronômicas e/ou melhorar suas qualidades nutricionais, industriais ou ambientais.

Poderiam escapar dos limites do plantio e suplantar as plantas silvestres, tornando-se invasoras?

Existe o precedente de plantas ornamentais se transformarem em pragas quando introduzidas,

inadvertidamente, em um ambiente novo: a lantana prolifera descontroladamente na Austrália; o

kudzu, procedente do Japão, se espalha no sul dos Estados Unidos; e o rododendro, originário da

Península Ibérica, se multiplica na Inglaterra.

Além da degradação ambiental devida ao desmatamento, à jardinagem ou à agricultura, para que

o cenário se repetisse seriam necessárias várias características hereditárias, que são sistematicamente

eliminadas como fatores indesejáveis nas plantas cultivadas: dormência da semente, plasticidade

fenotípica, crescimento indeterminado, florescimento e produção contínua de sementes etc.

Com o objetivo de reduzir o risco futuro de introduzir um gene que transforme uma planta normal

em praga, a FAO (Food and Agriculture Organization) estabeleceu uma série de diretrizes, cumpridas

em 130 países, que se aplicam também a insetos, bactérias e fungos. Nenhum dos cultivos

biotecnológicos disponíveis no mercado mostrou-se persistente ou invasor nos testes prévios a sua

comercialização ou no monitoramento posterior.

Diante da necessidade de mitigar os efeitos das mudanças climáticas, espera-se que em um futuro

próximo sejam desenvolvidas plantas mais eficientes no uso do nitrogênio e tolerantes à salinidade. A

maior produtividade dos cultivos também é necessária para conseguir mais alimentos sem aumentar

a área plantada e, também, porque plantas de uso industrial podem ser exportadas, gerando divisas.

Os principais cultivos comercializados atualmente, conforme já dito, são a soja, o milho, o algodão

e uma variedade de colza denominada canola. As propriedades agronômicas modificadas são a

tolerância a herbicidas, a resistência a insetos, a resistência a vírus, o conteúdo e a qualidade do óleo,

a tolerância à seca etc.

A TOLERÂNCIA A HERBICIDAS

A LUTA CONTRA AS ERVAS DANINHAS

O crescimento das ervas daninhas no campo é prejudicial por dois motivos: competem pelos mesmos

nutrientes e contaminam a colheita. Para eliminá-las, o agricultor pode aplicar herbicida antes do

plantio, uma prática que demanda o revolvimento prévio do solo, acelerando a erosão. Contudo, se

uma planta for tolerante a um herbicida de amplo espectro, bastará semeá-la diretamente e aplicar o

herbicida depois da germinação, para eliminar as ervas daninhas.

Os cultivos tolerantes a herbicidas facilitam o plantio direto, um sistema no qual as sementes e os

fertilizantes são depositados em sulcos, reduzindo a erosão e a demanda de combustível. Em vários

países, comercializam-se sementes transgênicas de soja, de milho, de algodão e de canola tolerantes

a herbicidas.

O herbicida não seletivo mais utilizado é o glifosato, presente em vários produtos comerciais, tais

como Roundup®, Buccaneer®, Rodeo®, Accord® etc. Sua ação inibitória se aplica a sistemas

enzimáticos dos vegetais, ausentes em animais e seres humanos. Considerado pouco tóxico em caso

de exposição oral ou de inalação, o glifosato é degradado rapidamente no ambiente.

As sementes de plantas tolerantes ao glifosato são comercializadas com o nome de

RoundupReady® (RR, Monsanto). As vendas geminadas de sementes e herbicida encerraram-se no ano

2000, com o vencimento da patente do Roundup® e o aparecimento no mercado de outras variações

do produto, mais econômicas para o agricultor.

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Outro herbicida utilizado é o glufosinato, presente em outro grupo de produtos (Basta®, Liberty®,

Ignite® etc.). As sementes tolerantes ao glufosinato são comercializadas com o nome LibertyLink por

BayerCropScience.

Glifosato e glufosinato não são os únicos herbicidas no mercado. Existem outras substâncias, do

grupo das imidazolinonas, cuja tolerância tem sido transferida à soja Cultivance®, um

empreendimento conjunto da Embrapa e da Basf.

O GLIFOSATO

No Brasil, o glifosato não está limitado exclusivamente à agricultura, sendo utilizado, desde 1978, em

áreas urbanas e na manutenção de estradas e ferrovias, sem evidências de impactos no meio

ambiente.

Em 2015, o IARC (do inglês, International Agency on Research on Cancer), uma extensão

semiautônoma da Organização Mundial da Saúde, reclassificou o glifosato como provável agente

carcinogênico, no grupo 2 A. Esta categoria inclui, além do malation e da acrilamida, o chimarrão

quente, a malária, a carne vermelha, a disrupção dos ritmos circadianos e as emissões de frituras em

alta temperatura.

Das quatro agências encarregadas de avaliar o glifosato, o IARC foi a única a encontrar essa

associação. Outras agências manifestaram seu desacordo e questionaram a reclassificação. Nos

Estados Unidos, a EPA (do inglês, Environmental Protection Agency) continua classificando o glifosato

na categoria E, que reúne substâncias que apresentam “evidências de ausência de carcinogenicidade

em seres humanos”. Na União Europeia, a EFSA (do inglês, European Food Safety Agency) considera

improvável que o glifosato represente um risco para os seres humanos e não justifica sua classificação

como agente carcinogênico potencial.

A APARIÇÃO DE PLANTAS SILVESTRES RESISTENTES AO GLIFOSATO

Ao diminuir a aplicação dos agroquímicos tradicionais, os cultivos biotecnológicos favorecem a

conservação dos recursos ambientais. Sua vantagem sobre as plantas silvestres depende da presença

de um agente seletivo como, por exemplo, um herbicida ao qual elas sejam tolerantes. Sem o

herbicida, ou fora de seu alcance, as PGMs não têm nenhuma vantagem sobre as plantas silvestres

nem conseguem competir com elas em ambientes naturais.

Contudo, o fluxo gênico em sentido contrário é preocupante, porque, tornando-se tolerantes a

herbicidas, as plantas silvestres podem competir no terreno com as plantas cultivadas e comportar-se

como ervas daninhas. Admite-se que a aparição de resistência em pelo menos 34 espécies poderia ter

sido causada pela transferência do gene correspondente, das plantas cultivadas às plantas silvestres.

No Brasil, há relatos sobre resistência ao glifosato no azevém (Lolium multiflorum) e na buva (Conyza

bonariensis e C. canadiensis). Por outro lado, algumas plantas são naturalmente resistentes ao

glifosato como, por exemplo, a trapoeraba (Commelina benghalensis).

A aparição de plantas resistentes ao glifosato, que é o herbicida mais utilizado no mundo, está

sendo acompanhada com atenção. Estima-se que, depois de 10 a 20 anos de uso intenso, seja

inevitável o aparecimento de plantas silvestres tolerantes. Contudo, o agricultor pode retardar a

aparição dessa tolerância, mediante algumas ações preventivas: rotar as culturas, evitar o uso repetido

do mesmo herbicida, aplicar as doses adequadas em condições meteorológicas propícias, acrescentar

outras modalidades de controle etc.

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A RESISTÊNCIA A INSETOS

A TRANSFERÊNCIA DA TOXINA Bt ÀS PLANTAS

Os insetos causam quebras de safra, estimadas em 20 a 40% da produção agrícola. Contudo, o combate

mediante o uso de agrotóxicos tem causado problemas no ambiente e na saúde humana, sendo,

portanto, necessário encontrar métodos alternativos de luta.

Há mais de 50 anos que os agricultores convencionais e orgânicos utilizam um inseticida biológico

para proteger suas colheitas. Trata-se da toxina produzida por um microrganismo do solo, o Bacillus

thuringiensis, inócua para o ser humano e fatal para os insetos. Uma vez ingerida pelas lagartas, a

toxina age no sistema digestório, matando-as em poucos dias. O produto comercial é vendido com os

nomes de Dipel®, Thuricida® ou Vectobac®.

Uma vez transferido o gene codificador da toxina do Bacillus thuringiensis às plantas, estas passam

a produzi-la diretamente. Existem diversas versões do gene Cry que codificam toxinas muito

específicas, efetivas em diferentes ordens de insetos. Algumas variedades (YieldGard®, Agrisure®)

diferem pela posição do transgene, o que caracteriza eventos diferentes e permite a comercialização

com nomes diferentes, como algodão Bollgard® e milho Yieldgard®, da Monsanto, ou milho Agrisure®,

da Syngenta.

As plantas Bt demandam menos pesticidas e reduzem as emissões de carbono, ao diminuir o uso

de combustível. Outra das vantagens das variedades Bt sobre as variedades convencionais está na

menor quantidade de micotoxinas (aflatoxina e fumonisina) perigosas para a saúde humana, em

função da menor contaminação por fungos dos ferimentos causados pelos insetos.

AS PRÁTICAS AGRONÔMICAS

Todo inseticida age como agente seletivo, sendo inevitável a aparição de insetos resistentes. A fim de

evitar ou retardar a aparição de larvas resistentes à toxina do Bacillus thuringiensis, uma possibilidade

é utilizar variedades Bt que produzam uma quantidade de toxina maior que a dose aplicada

habitualmente como inseticida.

Outra possibilidade mais sutil é o plantio de variedades convencionais (não Bt) em espaços

predeterminados onde os insetos não entram em contato com a toxina. Em vez de tentar eliminar o

inseto, diminui-se a infestação mediante uma pressão seletiva mais frouxa, que mantém a

sensibilidade ao inseticida em uma proporção considerável da população. Hoje, a manutenção de

refúgios nas lavouras de plantas Bt (algodão, milho) é uma prática bem estabelecida para o controle

de insetos.

O gerenciamento dos riscos envolve algumas medidas complementares que visam amortecer o

impacto eventual do fluxo gênico a outros cultivos. Um gene que confere tolerância a um herbicida

não será vantajoso em ausência do mesmo. Mas o que ocorreria se esse gene conferisse algum valor

adaptativo, tal como a produção de um inseticida?

O risco de polinização cruzada depende da espécie, sendo mais fácil de acontecer no milho, em que

o pólen se dispersa levado pelo vento, do que na soja ou no trigo, plantas com autofecundação. A

presença de espaços ou corredores de isolamento evita a disseminação de pólen transgênico para as

variedades silvestres e, também, para as convencionais semeadas nos campos vizinhos, evitando

prejuízos significativos para o agricultor que as comercializa.

O tamanho dos espaços ou corredores de isolamento depende das características reprodutivas da

espécie em questão e de fatores ambientais, como o vento. No caso do milho, por exemplo, estima-se

que o risco de polinização cruzada entre os cultivos diminui, de 1% a zero, quando a distância entre

ambos aumenta de 100 a 1.000 pés.

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A VIDA SILVESTRE

A probabilidade de ocorrer fluxo gênico aumenta se houver, na proximidade, espécies silvestres

compatíveis. Por isso, devem-se extremar os cuidados em relação ao cultivo de plantas geneticamente

modificadas nos lugares onde existam variedades silvestres aparentadas, tais como a batata no Peru,

o milho no México, o arroz na Índia, a soja na Coreia e na China. No Brasil, onde existem variedades

silvestres do algodão, a CTNBio delimitou preventivamente zonas de exclusão para o cultivo de algodão

biotecnológico.

Em relação à vida silvestre, apesar do estardalhaço causado oportunamente pela notícia de que as

borboletas monarcas seriam afetadas pelo contato com pólen de plantas de milho Bt, os próprios

autores do estudo declararam que era uma experiência laboratorial, desenvolvida em condições

diferentes das de um ambiente natural.

A RESISTÊNCIA A VÍRUS

Assim como a vacinação, a resistência a vírus está baseada na transferência ao hospedeiro de uma

parte do genoma viral. A produção em excesso da proteína de revestimento viral, por exemplo, inibe

a síntese de seu material genético. Esta tecnologia foi utilizada para erradicar viroses da batata, da

beterraba, do pepino, do tomate, da couve-flor e do melão.

Os produtos hortícolas têm recebido menos atenção que os cereais e as leguminosas, em parte

devido à resistência do consumidor e, também, porque o custo da construção de uma planta

transgênica para cultivos com pequena produção não é interessante economicamente. Contudo, as

variedades de papaia resistente a vírus (UH Rainbow, UH SunUp), comercializadas nos Estados Unidos,

salvaram o estado do Havaí de um desastre econômico.

No Brasil, a CTNBio autorizou em 2011 o cultivo do feijão tolerante ao vírus do mosaico dourado,

desenvolvido pela Embrapa, por tecnologia do iRNA. O vírus é transmitido pela mosca branca Bemisia

tabaci e causa a perda de 40 a 85% da safra, uma quantidade de feijão que poderia alimentar entre 9

milhões a 18 milhões de pessoas adultas. Esse feijão deve ser comercializado a partir de 2016.

A COEXISTÊNCIA ENTRE PLANTAS CONVENCIONAIS E PGMs

Todos os sistemas agrícolas exercem algum impacto sobre o meio ambiente. No entanto, uma

agricultura sustentável pode minimizar os efeitos negativos da produção agrícola, restaurando a

fertilidade e limitando a erosão da terra.

Algumas práticas agrícolas já são compartilhadas pelas diversas modalidades agrícolas (orgânica,

industrial ou de precisão), incluindo a rotação de culturas, a adubação verde, o manejo de pragas e de

nutrientes, o plantio direto com uma cobertura na superfície do solo etc. Outras são específicas, como,

por exemplo, a proibição para os produtores orgânicos de utilizar sementes geneticamente

modificadas ou de cultivar terrenos onde previamente tenham sido plantadas PGMs.

Cultivos convencionais e biotecnológicos ocupam diferentes faixas de mercado e crescem em

função das oportunidades econômicas. A proporção de variedades convencionais e biotecnológicas

varia nos principais cultivos industriais, que são a soja, o algodão, o milho e a canola. No Brasil a CTNBio

exige um isolamento mínimo de 400 metros, ou de 40 dias, entre os plantios de milho GM e milho

convencional.

A contaminação de um cultivo convencional por um cultivo biotecnológico acarreta perdas

consideráveis para o produtor rural. Nos Estados Unidos, a contaminação de cultivos convencionais de

arroz e milho por cultivos geneticamente modificados custou 1 bilhão de dólares às empresas

produtoras de sementes.

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172

Medidas de proteção são tomadas, envolvendo o distanciamento dos cultivos e a manutenção de

faixas de exclusão de diferente tamanho, segundo as características da fecundação, autopolinização

ou polinização cruzada. Testes genéticos e imunológicos permitem identificar a presença de

organismos geneticamente modificados em uma carga de cultivos convencionais. O objetivo dessas

medidas é reduzir a presença de sementes adventícias a um limite comercialmente aceitável (0,9%).

Os modelos de regulação dos cultivos tradicionais, orgânicos e biotecnológicos são considerados

de índole econômica, porque dão ao agricultor a possibilidade de escolher a modalidade que melhor

lhe convier. Não envolvem biossegurança, porque esta é analisada no momento da aprovação da

variedade biotecnológica, uma vez satisfeitas as normas legais.

Nos países onde o cultivo de OGMs está permitido, os agricultores têm a opção de semear cultivos

orgânicos, convencionais e biotecnológicos sempre que sejam respeitadas as medidas de coexistência.

Um modelo de regulação, baseado em normas de coexistência, vem sendo desenvolvido na

Espanha desde 2005.

O CULTIVO DE OUTROS TIPOS DE PGMs

PGMs DE INTERESSE NUTRICIONAL

Uma segunda leva de plantas transgênicas contempla a modificação das qualidades das plantas, isto

é, das propriedades que interessam ao consumidor como, por exemplo, o melhoramento da qualidade

nutricional, a redução de alérgenos, modificações do tempo de conservação e das características

organolépticas, a adequação ao processamento industrial dos óleos e amidos etc.

Em 1974, a variedade Tower de Brassica napus recebeu o nome de canola (do inglês “canadian oil,

low acid”). Trata-se da colza, uma planta oleaginosa que a modificação genética tornou comestível, ao

diminuir o teor de ácidos graxos saturados e a quantidade de glucosinolato. Modificações posteriores

originaram numerosas variedades que diferem na composição dos ácidos graxos, sendo algumas delas

também tolerantes a herbicidas.

Entretanto, o principal marco no desenvolvimento deste tipo de transgênicos é o arroz com

vitamina A (Golden Rice). A carência de vitamina A decorrente de uma dieta baseada exclusivamente

no arroz causa a cegueira irreversível e a morte de milhões de crianças na Ásia.

A inserção de dois genes de narciso e um gene bacteriano em uma variedade de arroz indica deu

origem a um grão amarelado contendo -caroteno, que é um dos precursores da vitamina A.

Considerado um empreendimento humanitário, várias empresas cederam, nos países em

desenvolvimento, os seus direitos sobre suas patentes relacionadas com a construção do arroz

dourado.

Espera-se que sejam produzidas plantas com outras alterações no teor de nutrientes: arroz

contendo ferro, milho enriquecido com os aminoácidos lisina e triptófano e batata com alto teor de

proteínas com metionina e lisina. A soja Vistive® apresenta baixo teor de ácido linolênico, o que torna

o óleo mais estável e dispensa a hidrogenação, uma fonte de gordura trans. Este óleo de soja é utilizado

como ingrediente de biscoitos (Cargill e Kellogg’s).

A China desenvolveu e liberou recentemente o milho com fitase para integrar as rações animais.

Este milho permitirá a assimilação de fosfatos pelos suínos, melhorando a produtividade do rebanho

e diminuindo a poluição ambiental.

PGMs PRODUTORAS DE MEDICAMENTOS

Existe uma terceira leva de plantas biotecnológicas desenvolvidas especialmente para desempenhar o

papel de fábricas biológicas, produzindo fármacos, vacinas e plásticos. Estão em andamento os testes

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BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA

173

de campo com alfafa, milho, arroz, tabaco, banana e batata.

Para evitar a contaminação acidental dos alimentos, essas plantas terão que ser cultivadas em

confinamento e processadas separadamente das plantas comuns. Formas alternativas de evitar a

disseminação do transgene no pólen estão sendo desenvolvidas, tais como sua inserção no DNA dos

cloroplastos. As proteínas extraídas e purificadas serão utilizadas pela indústria farmacêutica. Uma

regulação estrita deverá controlar o cultivo, o transporte e a distribuição destas plantas.

Os sistemas que poderiam tornar estéreis as plantas de interesse agronômico ou nutricional

despertaram uma forte reação contrária na opinião pública (sistemas de proteção tecnológicos ou

TPSs, do inglês technology protection systems; tecnologias de uso genético restrito ou GURTs, do

inglês, genetic use restriction technologies). No entanto, é bem possível que voltem a ser considerados

em relação às plantas produtoras de medicamentos.

O AGRONEGÓCIO

AS PRIMEIRAS EMPRESAS PRODUTORAS DE SEMENTES

Nos países do continente africano e de parte da Ásia, em que a agricultura é a principal fonte de

alimentos, os pequenos agricultores dependem das sementes. Na época da colheita, eles separam uma

parte e a conservam para o plantio do próximo ano.

Devido à mecanização do campo, nos países desenvolvidos, a proporção da população dedicada às

tarefas agrícolas é bem menor. A agricultura de subsistência cede lugar a um enorme complexo

agroindustrial, que integra outras atividades, como a venda de insumos (maquinarias, produtos

químicos, sementes etc.) e a transformação e distribuição de produtos.

A produção de sementes como atividade lucrativa remonta ao ano 1774 e à pequena loja da família

Vilmorin, na França. Em 1874, Henry de Vilmorin obtém o primeiro trigo híbrido (Dattel),

comercializado em 1883 e cultivado até hoje. Nos Estados Unidos e no Canadá, as primeiras empresas

a comercializarem os milhos híbridos surgem a partir de 1920.

As construções genéticas conferem vigor (heterose) às plantas híbridas, mas forçam o agricultor a

comprar novas sementes, ano após ano. A transgênese não inviabiliza a utilização de sementes para o

ano seguinte. No entanto, as novas tecnologias inseridas no grão devem ser pagas mediante

complexos sistemas de royalties às empresas detentoras das patentes correspondentes.

OS GIGANTES GÊNICOS

Logo depois da crise do petróleo da década de 1980, as grandes empresas transnacionais produtoras

de agrotóxicos e fertilizantes químicos entraram na área agrícola. Uma das razões é que o mercado de

sementes tem uma margem de lucro maior; a outra é que leva menos tempo desenvolver uma planta

geneticamente modificada que um produto químico novo.

Vários ciclos de fusões caracterizaram um processo de concentração e consolidação em que

centenas de pequenas empresas foram absorvidas por enormes conglomerados, produtores de

agroquímicos e de sementes, com ramificações na indústria farmacêutica. Na linha de frente das novas

tecnologias, estas empresas concentram um enorme poder que é malvisto pelo público.

Denominadas Gigantes Gênicos (do inglês, Gene Giants), as principais empresas produtoras de

sementes são Monsanto, Dupont (Pioneer), Dow AgroSciences nos Estados Unidos, Syngenta na Suiça,

Limagrain (Vilmorin) na França, Bayer CropScience na Alemanha e Sakata no Japão. Estima-se que, em

2020, o mercado de sementes biotecnológicas será de 42 bilhões de dólares comerciais, em um

mercado global de sementes comerciais de 73 bilhões de dólares.

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174

A CADEIA PRODUTIVA DA SEMENTE

Cada país desenvolve variedades adaptadas a seus solos e condições climáticas. Uma vez aprovadas e

registradas, esses cultivares poderão ser disponibilizados para os agricultores. O processo de

amplificação do número de sementes, estritamente regulamentado, contempla várias etapas de que

participam diferentes entidades do setor público ou privado (Figura 13.4).

No caso da característica transgênica, esta precisa da aprovação das instâncias legais competentes,

antes de ser transferida para os cultivares locais e passar por todo o processo de multiplicação,

certificação e registro, até chegar ao agricultor e este dar início ao plantio.

A cadeia produtiva da semente envolve inventores e obtentores, multiplicadores, produtores e

comerciantes de sementes e agricultores. A qualidade das sementes é estabelecida pela legislação e

pelas agências de certificação de sementes, que garantem ao comprador sementes dentro dos

padrões.

PATENTES E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

No Brasil, a produção de mudas e sementes oriundas do melhoramento clássico está regulada pela Lei

de Proteção de Cultivares (n.º 9.456/97); o produtor rural que compra uma semente paga pelo

germoplasma desse cultivar.

A inserção de um transgene é considerada um evento e demanda a aprovação das autoridades

correspondentes. Em 2010, estimava-se que o processo de inserção de um evento demorava 13 anos,

a um custo de 136 milhões de dólares.

A patente é uma forma de proteção da inovação tecnológica, regulada pela Lei da Propriedade

Industrial (n.º 9.279/96) que, além de lucro, permite à empresa o ressarcimento do investimento e o

financiamento de novas pesquisas. O produtor rural que compra uma semente geneticamente

modificada paga pelo germoplasma e pela propriedade intelectual do produto. Organismos vivos não

podem ser patenteados.

-----------------

FIGURA 13.4. Os elos que integram a cadeia produtiva da semente

.

Diversa estrutura empresarial

Diversa estrutura empresarial

Estado (Institutos de pesquisa, universidades)

Empresas nacionais (sociedades, cooperativas e empresas familiares)

Empresas internacionais

Inventores / Obtentores

Multiplicadores

Produtores e comerciantes

Agricultores

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BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA

175

O produtor rural pode pagar os royalties ou taxa tecnológica (TT) na compra da semente. Quando as

sementes biotecnológicas não têm as limitações dos híbridos, ele pode optar por guardar legalmente

parte do produto da safra para o próximo plantio, pagando um percentual antes da entrega na moega.

Se ele não salvar as sementes de acordo com a lei, será cobrado na entrega do grão.

As patentes têm uma duração limitada; entre as que já expiraram estão a do herbicida Roundup

(2000) e a da primeira variedade RR1 de soja RoundupReady (2015). Algumas organizações se

manifestaram a favor de uma versão pública sem royalties, algo assim como um genérico (Open Source

Seed Iniciative), mas a inovação está nas mãos das empresas produtoras de sementes, que logo lançam

no mercado produtos cada vez mais eficientes, para substituir os que perderam a proteção.

A novidade no mercado são as plantas “piramidadas”, que combinam vários eventos, tais como a

tolerância a dois herbicidas, a tolerância à herbicida e a resistência a insetos, ou a resistência a dois

tipos de insetos, um que ataca a raiz e outro a parte superior da planta.

Seu número aumenta a cada dia. A soja RR2 Bt, que reúne a tolerância à herbicida e a resistência a

insetos, substituiu a soja RR1. O milho Genuity SmartStaxTM (Monsanto, DowAgroSciences), por

exemplo, reúne oito genes para o controle de pragas acima e abaixo do solo, e a tolerância a herbicidas

para o controle de plantas daninhas. Na África, o projeto WEMA (do inglês, Water Efficiency for Africa)

espera dispor, em 2017, de um milho Bt com eventos piramidados de resistência a insetos e tolerância

à sequia.

A ADOÇÃO DOS CULTIVOS BIOTECNOLÓGICOS NO MUNDO

Em 1996, Estados Unidos, China, Argentina, Canadá e Austrália iniciaram o cultivo de PGMs em 1,7

milhão de hectares.

O International Service for the Aquisition of Agri-Biotech Applications (ISAAA) é uma organização

internacional que divulga anualmente os dados correspondentes à adoção dos cultivos biotecnológicos

no mundo. Segundo o ISAAA, em 2015, 28 países semearam com PGMs uma superfície de 179,7

milhões de hectares, liderados por Estados Unidos, Brasil, Argentina, Índia e Canadá.

Dos 28 países que semearam PGMs, 8 são industrializados e 20 em vias de desenvolvimento. Dentre

os países que não permitem o cultivo de PGMs, 39 os importam (Tabela 16.1). O traço dominante foi

a tolerância à herbicida e os principais cultivos soja, milho, algodão e canola, seguidos por beterraba

sacarina, alfafa e papaia.

Mais de 90% dos 18 milhões de agricultores que plantaram sementes biotecnológicas são pequenos

produtores rurais, especialmente na China, na Índia, nas Filipinas e na África do Sul. Os cultivos

biotecnológicos possibilitaram o aumento da produção agrícola e melhoraram as condições

econômicas desses agricultores.

Nos países onde a mão de obra agrícola está constituída principalmente por mulheres, os cultivos

biotecnológicos melhoraram suas condições de vida, ao permitir que elas dedicassem mais tempo ao

cuidado das crianças ou a outras atividades. Os problemas de saúde causados pela contaminação

ambiental com agrotóxicos diminuíram em função de uma redução de 14% na aplicação de inseticidas,

sendo que em alguns casos essa diminuição teria chegado a 50% (China, Argentina).

Com a liberação da comercialização do arroz Bt na China e do feijão resistente a vírus no Brasil,

inicia-se uma nova etapa que contempla as principais fontes de alimento locais. Encontram-se em

andamento vários estudos, sobre o grão de bico na África, a berinjela na Índia, o milho resistente à

seca nos Estados Unidos e na África subsaariana.

OS ESTADOS UNIDOS E A UNIÃO EUROPEIA

Nos Estados Unidos, três agências controlam e regulamentam o uso das novas tecnologias genéticas:

USDA (United States Department of Agriculture), EPA (Environmental Protection Agency) e FDA (Food

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and Drug Administration). Embora a resistência aos cultivos transgênicos seja muito baixa, sendo

plenamente adotados desde 1996, cresce em alguns estados um movimento de oposição que pede a

rotulagem.

Na União Europeia, a resistência às PGMs é muito alta. Em 1999, uma moratória suspendeu o

cultivo de novas variedades transgênicas, assim como a comercialização de seus produtos. Não atingiu

algumas variedades autorizadas anteriormente para cultivo, importação ou utilização na produção de

alimentos ou de rações.

Em 2003 foram estabelecidas normas de rotulagem e de rastreamento de traços transgênicos e

com a implantação de diretrizes para o cultivo de plantas transgênicas, de maneira a minimizar a

contaminação dos campos de cultivos orgânicos e convencionais.

Recentemente o Conselho da União Europeia estabeleceu que cada Estado poderá interditar um

cultivo geneticamente modificado com base em considerações éticas ou socioeconômicas, sem

invocar argumentos científicos. Apesar da hostilidade das autoridades do Conselho Europeu, há um

bom número de organizações favoráveis ao cultivo de plantas geneticamente modificadas: 33 no Reino

Unido, 23 na Itália, 16 na Espanha e 11 na Alemanha.

ISRAEL

Israel não assinou o Protocolo de Cartagena e não restringe a importação de PGMs nem de seus

derivados. Desenvolve pesquisas biotecnológicas sobre tomate, batata, eucalipto, soja, algodão,

milho, morango, banana e flores. Os testes de campo devem ser autorizados pelo PPIS (do inglês, Plant

Protection and Inspection Services of Israel).

Encontra-se em preparação uma regulamentação que exige a rotulagem dos produtos com mais de

0,9% de ingredientes derivados de PGMs. Os produtos sem DNA ou proteína derivada de uma OGNM

não serão rotulados.

OS PAÍSES DE AMÉRICA LATINA

Na América Latina (Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai, Bolívia, Colômbia, Chile, Costa Rica, Cuba e

Honduras), os principais cultivos biotecnológicos são a soja, o milho e o algodão (Tabela 16.1). Embora

o desenvolvimento das sementes dependa geralmente do setor privado, em vários países (Argentina,

Brasil, México, Colômbia) o setor público começou a gerar suas próprias variedades, respondendo à

demanda local.

Na Argentina, os primeiros exemplos são a soja tolerante à sequia da empresa Indear e a batata

resistente à vírus, desenvolvida pela Tecnoplant, uma empresa do grupo Sidus. No Brasil, o feijão

resistente a vírus desenvolvido pela Embrapa, e a soja tolerante ao glufosinato, fruto de uma

colaboração entre a Embrapa e a Basf.

Os países da América Latina contam com uma comunidade acadêmica de alto nível científico e

tecnológico, ativa nas universidades e nos centros de pesquisa, com empresas de tradição histórica na

difusão da tecnologia agropecuária e, em vários casos, com condições econômicas limitadas pelas

sucessivas crises políticas. Em ambos os países, numerosas empresas privadas ocupam lugares de

destaque em diferentes setores do mercado biotecnológico. A existência de convênios e programas

de intercâmbio científico tende a elevar o nível das atividades científicas e tecnológicas.

Ao longo dos primeiros quinze anos de implantação das novas tecnologias agrícolas, cada país seguiu

sua própria trajetória até estabelecer as normas legais que garantem o progresso em condições

seguras.

ÁFRICA SUBSAARIANA

O desenvolvimento da agricultura africana permitiria reduzir a pobreza e aumentar a segurança dos

alimentos. Até o momento, África do Sul, Burkina Faso e Sudão comercializam o algodão resistente a

insetos e a soja e o milho tolerantes ao glifosato. Em Burkina Faso, Quênia, Moçambique, Nigéria,

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BIOTECNOLOGIA E AGRICULTURA

177

África do Sul, Tanzânia e Uganda a comunidade científica conta com o apoio de organizações

internacionais para desenvolver cultivos de interesse local: milho, batata-doce, mandioca, arroz, sorgo

e banana. Os traços principais são a resistência a pragas, a tolerância à sequia e à salinidade e outras

condições, como a biofortificação em vitamina A, zinco e ferro.

Contudo, existem dificuldades devido à pressão cultural da União Europeia e, também, à falta de

regulamentações locais que possibilitem avançar nos testes de campo.

CHINA

Com uma população de mais de 1,3 bilhão de habitantes e graves problemas ambientais, a China estará

investindo 4 bilhões de dólares em biotecnologia, até 2020.

A China é o maior importador de alimentos do mundo, de modo que parte das pesquisas está

relacionada com o arroz, o milho, o trigo e a soja. Em relação ao meio ambiente, a adoção do algodão

BT por 70% dos agricultores permitiu em 5 a 8 anos a redução do uso de pesticidas em 50 a 60 %.

AS NOVAS TECNOLOGIAS

Nos últimos 20 anos, diferentes países tiveram uma atitude que variou entre a rejeição absoluta e a

aceitação dos cultivos geneticamente modificados. Atualmente, 271 organizações e instituições

científicas reconhecem a segurança dos cultivos geneticamente modificados e seus benefícios

potenciais.

Tanto o setor público como o setor privado de vários países têm capacidade para utilizar a

tecnologia em benefício da sociedade, colocando no mercado cultivos adaptados às condições locais,

uma vez satisfeitos os requerimentos e as regulamentações determinados pelas autoridades

competentes.

As novas tecnologias de edição gênica já estão sendo usadas: na China, para obter um trigo

resistente a fungo e um arroz mais produtivo; no Reino Unido, para produzir uma variedade de cevada

resistente à seca. O primeiro produto comercializado é a SU Canola, resistente ao herbicida

sulfoniltiouréia. Contudo, ainda é cedo para prever qual será o destino das novas variedades, porque

sua implantação depende do processo regulatório a ser adotado.

--------------

TABELA 16.1. As plantas geneticamente modificadas no mundo (Dados do ISAAA, março de 2016) A. Os cultivos de plantas geneticamente modificadas

Abóbora (Cucurbita pepo), Alfafa (Medicago sativa), Algodão (Gossypium hirsutum L.), Ameixa (Prunus domestica), Arroz

(Oryza sativa L.), Batata (Solanum tuberosum L.), Berinjela (Solanum melongena), Beterraba sacarina (Beta vulgaris), Cana-

de-açúcar (Saccharum sp), Canola argentina (Brassica napus), Canola polonesa (Brassica rapa), Chicória (Cichorium intybus),

Choupo (Populus sp.), Cravo (Dianthus caryophyllus), Eucalipto (Eucalyptus sp.), Feijão (Phaseolus vulgaris), Grama Creeping

Bentgrass (Agrostis stolonifera), Linho (Linum usitatissumum L.), Maçã (Malus x Domestica), Melão (Cucumis melo), Milho

(Zea mays L.), Papaia (Carica papaya), Petúnia (Petunia hybrida), Pimentão doce (Capsicum annuum), Rosa (Rosa hybrida),

Soja (Glycine max L.), Tabaco (Nicotiana tabacum L.), Tomate (Lycopersicon esculentum), Trigo (Triticum aestivum).

B. Países que pararam de plantar cultivos geneticamente modificados

Países (N0 de eventos aprovados)

Cultivos geneticamente modificados

Egito (1) Milho.

Indonésia (15) Cana de açúcar, milho, soja.

Irã (1) Arroz.

União Europeia*** (86) Algodão, batata, beterraba sacarina, canola argentina, cravo, milho, soja.

(***) Bulgária, França, Alemanha, Polônia, Suécia

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C. Países que plantam cultivos geneticamente modificados.

Países (N0 de eventos aprovados)

Cultivos geneticamente modificados

África do Sul (67) Algodão, arroz, canola argentina, milho, soja.

Argentina (40) Algodão, milho, soja.

Austrália (107) Alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, cravo, milho, rosa, soja, trigo.

Bangladesh (1) Berinjela.

Bolívia (1) Soja.

Brasil (50) Algodão, eucalipto, feijão, milho, soja.

Burkina Faso (1) Algodão.

Canadá (165) Abóbora, alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, canola polonesa, linho, maçã, milho, papaia, soja, tomate.

Chile (3) Canola argentina, milho, soja.

China (60) Algodão, arroz, beterraba sacarina, canola argentina, choupo, milho, papaia, petúnia, pimentão doce, soja, tomate.

Colômbia (73) Algodão, arroz, beterraba sacarina, cravo, linho, milho, rosa, soja, trigo.

Costa Rica (15) Algodão, soja.

Cuba (1) Milho.

Estados Unidos de América (190)

Abóbora, alfafa, algodão, ameixa, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, chicória, grama, linho, maçã, melão, milho, papaia, rosa, soja, tabaco, tomate, trigo.

Filipinas (88) Alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja.

Honduras (8) Arroz, milho.

Índia (11) Algodão, soja.

México (158) Alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja, trigo.

Myanmar (1) Algodão.

Paquistão (2) Algodão.

Paraguai (20) Algodão, milho, soja.

Sudão (1) Algodão.

União Europeia*(86) Algodão, batata, beterraba sacarina, canola argentina, cravo, milho, soja.

Uruguai (17) Milho, soja.

Vietnã (6) Milho.

(*) Espanha, Portugal, República Tcheca, Romênia, Eslováquia

D. Países que importam cultivos geneticamente modificados

Países (N0 de eventos aprovados)

Cultivos geneticamente modificados

Coreia do Sul (138) Alfafa, algodão, batata, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja.

Federação Russa (23) Arroz, batata, beterraba sacarina, milho, soja.

Japão (214) Alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, cravo, milho, papaia, rosa, soja.

Malásia (22) Cravo, milho, soja.

Noruega (11) Cravo.

Nova Zelândia (92) Alfafa, algodão, arroz, batata, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja, trigo.

Panamá (1) Milho.

Singapura (24) Alfafa, algodão, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja.

Suiça (4) Milho, soja.

Tailândia (15) Milho, soja.

Taiwan (117) Algodão, beterraba sacarina, canola argentina, milho, soja.

Turquia (32) Milho, soja.

União Europeia**(86) Algodão, batata, beterraba sacarina, canola argentina, cravo, milho, soja.

(**) Áustria, Bélgica, Croácia, Chipre, Dinamarca, Estônia, Finlândia, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Eslovênia, Reino Unido .

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C A P Í T U L O 14

BIOTECNOLOGIA

E CRIAÇÃO DE ANIMAIS

Das 148 espécies conhecidas de mamíferos terrestres, onívoros ou herbívoros, que alcançam um peso

de 45 kg, somente 14 foram domesticadas. Em relação às restantes, o fracasso costuma ser atribuído

a seis razões: uma dieta que o homem não pode ministrar; crescimento lento e espaçado (elefantes e

gorilas); tendências agressivas (ursos e rinocerontes); relutância a se reproduzir em cativeiro (pandas,

guepardos); falta de estruturas de liderança (antílope); tendência ao pânico em lugares fechados ou

em presença de um predador (gazelas).

Seja como for, a criação de animais para a alimentação está limitada a um pequeno número de

espécies de mamíferos, ruminantes (bovinos, ovinos, caprinos) e monogástricos (suínos, coelhos e

aves), de peixes, de crustáceos e de mariscos. Também se criam animais para a prática de esportes

(cavalos) e como companhia (gatos, cachorros, pássaros, peixes).

Os grandes estabelecimentos agrícolas praticam a cultura extensiva de gado (bovino, ovino,

caprino) em pradarias e pastagens, enquanto os menores tendem a investir em culturas intensivas de

altos rendimentos (gado leiteiro, aves, suínos e peixes), que degradam o ambiente.

A produção agrícola depende também de fatores econômicos e sociais. À medida que melhora o

nível de vida da população, mudam os padrões de consumo e, consequentemente, a atividade

agropecuária. Estima-se que, entre 1993 e 2020, os países em desenvolvimento duplicarão o consumo

de carne. Pequenas empresas familiares serão substituídas por outras de produção intensiva,

orientadas a satisfazer o mercado urbano; a criação de aves e suínos aumentará em detrimento da

criação de ruminantes. Essas mudanças exigirão maior eficiência na seleção, no gerenciamento das

empresas e nos cuidados com a alimentação e a saúde dos animais.

Nos países desenvolvidos, o objetivo primordial é aumentar, ou manter, a quantidade de produtos

(leite, ovos, carne e lã) e, simultaneamente, diminuir os custos. Em relação aos métodos produtivos,

isso significa reduzir o número de animais, o trabalho humano e o impacto causado pelas doenças.

As biotecnologias inserem-se tanto na alimentação, como na conservação da saúde dos animais,

possibilitando também o controle da reprodução e a aceleração da seleção genética. Perspectivas

novas surgem com a utilização dos animais como biorreatores, para a produção de fármacos.

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180

A NUTRIÇÃO DOS ANIMAIS

A NECESSIDADE DE RAÇÕES

A criação e engorda de gado de corte nas pastagens é possível em países com grandes extensões

territoriais, tais como a Argentina, a Austrália, o Brasil e a Nova Zelândia. O alimento básico do gado é

o capim, que cresce de maneira desigual ao longo das quatro estações do ano. Nos períodos em que

falta capim deve-se suplementar a dieta do rebanho com feno (forragem dessecada), silagem

(forragem e grãos fermentados), grãos, concentrados e/ou resíduos agroindustriais.

À medida que a agricultura invade as áreas de pastagem, a pecuária adota os regimes de

semiconfinamento ou confinamento, estabelecendo como objetivo primordial o aumento da

produtividade (gado leiteiro, aves e suínos). Parte dos cultivos de cereais (milho) e de leguminosas

(tortas de soja, algodão, colza e girassol) é utilizada como ração, para suprir as necessidades proteicas

e energéticas dos animais, sendo necessários de 3 a 10 kg de grãos para obter 1 kg de carne.

Como o valor nutricional dos grãos é variável, acrescentam-se às rações alguns complementos

nutritivos. Vários produtos industrializados fornecem um conteúdo de nutrientes equilibrado para as

necessidades dos animais, em função de sua espécie, sua idade etc.

DE LIEBIG À VACA LOUCA

Os suplementos nutritivos proteicos foram introduzidos em fins do século XIX. Em 1865, Liebig

inventou um procedimento industrial para transformar os restos dos animais em extrato e farinha de

carne. O primeiro era vendido como complemento para a alimentação humana; a segunda era utilizada

para fortificar as rações animais. Bem antes da Segunda Guerra Mundial, as rações dos ruminantes dos

países desenvolvidos incluíam farinha de carne, em uma proporção de 2 a 5%.

Até 1973, a Europa importava grãos para as rações animais. Quando condições climáticas adversas

causaram uma grande quebra da safra de soja, os Estados Unidos embargaram o grão disponível, para

garantir suas necessidades internas. Sem grãos como fonte proteica das rações, a única opção que

restou aos europeus foi a farinha de carne. Na tentativa de baratear ao máximo os custos das rações,

deixou-se de extrair a gordura com solvente e modificaram-se as condições de esterilização.

A inclusão de restos de animais doentes, inicialmente ovelhas com scrapie, uma doença esporádica,

conhecida no Reino Unido desde 1732, pode ter contaminado as vacas e provocado o surto da doença

da vaca louca, uma variante da doença de Creutzfeldt-Jakob que afeta o homem, causando-lhe danos

neurológicos graves. Esta variante ataca as pessoas jovens e se manifesta mais rapidamente.

Em 1988, a farinha de carne foi proibida na alimentação do gado bovino e ovino. A epidemia exigiu

o sacrifício de boa parte dos rebanhos, no Reino Unido e outros países da Europa, colocando em

discussão a composição das rações animais e mostrando a necessidade de aumentar a quantidade e a

qualidade dos suprimentos de grãos e de plantas forrageiras.

VARIAÇÕES SOBRE A COMPOSIÇÃO DAS RAÇÕES

Além da farinha de carne, outros produtos já foram utilizados como suplemento proteico, entre eles o

leite desnatado em pó e a farinha de pescado, que hoje está sendo abandonada devido ao aumento

do preço, resultante da pesca excessiva e da diminuição dos cardumes.

Como fonte alternativa de proteínas, a biomassa microbiana seca tem dado bons resultados.

Denominada SCP (do inglês, single cell protein), a proteína unicelular pode ser obtida de diversas

fontes. As leveduras, como Saccharomyces cerevisiae, são um subproduto nas destilarias de álcool;

outras, como Candida utilis ou Torula, se multiplicam sobre os efluentes das indústrias de papel ou de

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BIOTECNOLOGIA E CRIAÇÃO DE ANIMAIS

181

laticínios. A bactéria Methylophilus methylotropus cresce sobre metanol, obtido a partir do gás do Mar

do Norte, originando uma SCP que é comercializada, no Reino Unido, sob o nome de Pruteen.

O acréscimo de enzimas (proteases, celulases, amilases etc.) tende a aumentar a digestibilidade das

rações. Uma dieta baseada em grãos tem o inconveniente de introduzir fósforo e outros nutrientes,

complexados ao ácido fítico. No caso dos ruminantes, a flora microbiana do sistema digestório

consegue disponibilizar parte do fósforo, mas isso não ocorre nos animais monogástricos como os

suínos, as aves e, inclusive, o homem. Os fitatos impedem a assimilação do fósforo, porém, a adição

da enzima fitase na ração melhora a assimilação dos nutrientes e diminui a quantidade de fósforo

excretado no ambiente, que é uma das causas da eutrofização dos cursos de água.

A adição de antibióticos visa proteger as rações da ação bacteriana. Já a adição de probióticos

procura modificar o ambiente gastrintestinal, estimulando a multiplicação de certos tipos bacterianos

em detrimento de outros.

A fitase é produzida por fermentação microbiana e, na Europa, é obrigatório adicioná-la às rações.

O mercado global de fitase é de, aproximadamente, 500 milhões de dólares, 40% do qual situado na

China.

AS RAÇÕES TRANSGÊNICAS

A União Europeia exige o etiquetado de toda ração contendo mais de 0,9% de um Organismo

Geneticamente Modificado aprovado previamente, mas não considera necessário rotular os alimentos

provenientes de animais alimentados com rações geneticamente modificadas (carne, ovos, leite).

O escândalo da “vaca louca”, seguido pelo caso dos frangos contaminados com dioxina, mostrou o

descaso dos produtores europeus em relação às rações animais. Isso explica a repercussão de alguns

trabalhos (A. Pusztai, 1998; G-E. Séralini, 2012), declarando ter encontrado alterações do sistema

imune ou formação de tumores em ratos alimentados com batatas ou milho transgênico. Esses

trabalhos foram totalmente desqualificados pela comunidade científica, mas ainda são citados como

“prova” do perigo das rações e dos alimentos transgênicos.

As rações representam até 70% dos custos da criação de animais. Por ser um dos gargalos da

produção agrícola, toda tentativa de baratear as rações costuma ser assimilada rapidamente. Contudo,

devido aos escândalos precedentes e à desconfiança da população, a introdução de plantas

geneticamente modificadas teve que ser analisada cuidadosamente, em diversos tipos de animais. Não

foram encontrados sinais de toxicidade da soja, da ervilha, do lupino, do algodão e da batata em ratos

nem da colza em coelhos. As características das carcaças, dos tecidos e das carnes não mudaram em

animais que receberam alimentos transgênicos.

Numerosos estudos, desenvolvidos em instituições de pesquisa e universidades, mostraram que,

tanto em relação à composição química, como à digestibilidade e ao valor nutritivo, as plantas

biotecnológicas disponíveis são substancialmente equivalentes às convencionais (não transgênicas).

Organizações internacionais como FAO/WHO (Food and Agriculture Organization e World Health

Organization) consideram, desde 1991, que a ingestão de DNA é segura, independentemente de ser

sua fonte transgênica ou não. As organizações norte-americanas FDA (Food and Drug Agency), em

1992, e EPA (Environmental Protection Agency), em 2000, manifestaram-se no mesmo sentido.

Segundo a FASS (Federation of Animal Science Societies), as rações são digeridas normalmente

pelos animais estudados, sem que sejam detectados ácidos nucleicos ou proteínas de origem

transgênica na carne, no leite ou nos ovos. Este era um resultado esperado, porque, em função dos

conhecimentos sobre digestão e absorção, tanto as proteínas como o DNA são degradados durante o

processo digestivo.

Em alguns casos, em que as plantas têm as propriedades agronômicas modificadas, como, por

exemplo, o milho resistente a insetos (milho-bt), verifica-se uma redução substancial de micotoxinas.

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Estas são muito perigosas, para os animais que ingerem os grãos contaminados, porque causam

hemorragias, danos no fígado e nos rins, diarreias e câncer. Ao diminuir os ataques de insetos, há

menos lesões que possibilitem a infecção e o crescimento dos fungos. Em consequência, o milho

transgênico melhora a qualidade do alimento e a saúde animal, especialmente dos monogástricos,

mais sensíveis as micotoxinas que os ruminantes.

A aprovação do milho com fitase (Academia de Ciências Agrícolas da China, Origin Agritech Ltda.)

representa um marco importantíssimo para a China.

Estão sendo estudadas plantas com maior digestibilidade, como uma alfafa transgênica com menos

lignina. Por outro lado, o melhoramento das plantas forrageiras também abre perspectivas

interessantes. Observou-se, por exemplo, aumento de peso e bom crescimento da lã em ovelhas

alimentadas com lupino transformado geneticamente, para sintetizar uma proteína de girassol com

alto conteúdo de metionina.

O MELHORAMENTO GENÉTICO DO GADO

Existem hoje mais de 5.000 raças de gado, resultantes de muitos anos de adaptação a diferentes

condições ambientais. O melhoramento genético visa três objetivos fundamentais: aumentar a

eficiência da conversão do alimento para incrementar a taxa de crescimento corporal; acrescer a

produtividade (leite, ovos); modificar a composição da carcaça, aumentando a quantidade de proteína

(carne e leite), em detrimento da gordura.

Diferentemente da área de melhoramento vegetal em que, através da venda anual de sementes,

as grandes empresas conseguem recuperar rapidamente seus investimentos; a área de melhoramento

animal tem um retorno mais lento porque existem períodos maiores entre uma geração e outra.

Muitas das características selecionadas em animais mostram uma variação contínua, que, em vez

de responder a um gene único, resulta da contribuição de vários genes (herança poligênica ou

quantitativa). Se estiverem situados em cromossomos diferentes, a seleção dos genes de interesse

acarretará genes vizinhos, que podem ser desfavoráveis.

Os frangos do tipo broiler, por exemplo, têm-se transformado em um alimento comum e barato,

em contraste com anos atrás. Selecionados por 50 gerações, esses frangos crescem quatro ou cinco

vezes mais rápido que seus antepassados. Mas, no caminho, apareceram alguns efeitos deletérios, tais

como o aumento do teor de gorduras, a fertilidade baixa e a presença de anormalidades esqueléticas.

Por outro lado, galinhas selecionadas como poedeiras desenvolveram osteoporose, ao desviar o

cálcio do esqueleto para a construção da casca dos ovos. E os perus desenvolveram um tamanho tal

que não conseguem acasalar sem riscos, sendo necessário proceder à inseminação artificial. A seleção

assistida por marcadores moleculares obteve um grande sucesso na área, justamente por amenizar a

dificuldade de se lidar com traços multigênicos.

Ciclos de vida mais longos tornam mais lenta a recuperação dos investimentos de modo que, a

exceção da produção de frangos, o setor resulta menos atrativo para as grandes empresas privadas. A

distribuição do material genético se encontra nas mãos dos pecuaristas e de pequenos

empreendimentos privados, responsáveis por mais de 80% da pesquisa e desenvolvimento na área

agropecuária dos países desenvolvidos.

O CONTROLE DA REPRODUÇÃO

O controle da reprodução dos animais permite a expansão rápida dos estoques, reduzindo os custos

de transporte de animais. O processo começa com a seleção dos pais (reprodutores e matrizes),

escolhidos pelas suas características genéticas, relativas à produtividade e à saúde (Figura 15.1).

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Desde meados do século XX, pratica-se a inseminação artificial no gado bovino, ovino, caprino, porcino

e em aves (perus, frangos). A técnica é mais utilizada com o gado de leite que com o de corte, porque

o preço por cabeça é mais alto. Complementa-se a inseminação artificial com a sexagem prévia do

sêmen, a fim de escolher os espermatozoides que poderão dar origem a fêmeas.

O sêmen colhido de um reprodutor é introduzido no útero das matrizes. Considerando que uma

única ejaculação de um touro produz aproximadamente 100 doses de sêmen, que um animal chega a

produzir 4.000 doses por ano e que a eficiência da inseminação chega a 50%, o método permite obter

aproximadamente 2.000 crias por reprodutor ao ano.

O desenvolvimento das técnicas de criopreservação permite utilizar tanto o sêmen fresco como o

congelado, possibilitando, também, a conservação da biodiversidade de raças em perigo de extinção.

Uma dose de sêmen custa a partir de 15 reais e, se for de qualidade comprovada, 20 reais. O touro

Bandido, que teve uma exitosa participação em uma novela de televisão e morreu prematuramente,

deixou sêmen congelado. Dele descendem os touros Zangão, Matador e Carrancudo, que participam

em festas de rodeio por todo o Brasil.

Normalmente, uma vaca produz uma cria por ano. Tratada com hormônios para induzir uma

superovulação e inseminada artificialmente, essa vaca poderá gerar simultaneamente cinco embriões,

que serão colhidos mediante a lavagem do útero e transferidos a uma vaca receptora. A

criopreservação garante que 25 a 50% dos embriões congelados possam originar animais vivos. Como

o processo todo (superovulação + inseminação + transferência dos embriões) pode ser repetido quatro

vezes por ano, apesar de algumas limitações técnicas, uma vaca parirá 10 crias por ano.

--------------

FIGURA 14.1. O Controle da reprodução em bovinos

O controle da reprodução dos animais domésticos depende de diversas técnicas (superovulação, inseminação artificial, coleta de ovócitos ou de embriões, criopreservação, transplante de embriões).

Vaca doadora Touro reprodutor Vaca doadora Ovários obtidos nos matadouros Superovulação Sêmen Superovulação Congelamento Coleta dos Coleta dos ovócitos ovócitos Inseminação artificial Fecundação in vitro Coleta dos embriões Desenvolvimento in vitro dos embriões Testes genéticos Congelamento Transplante Transplante

Vacas receptoras Vacas receptoras

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Outra variante consiste em extrair os ovócitos das vacas superovuladas, ou dos ovários de animais

sacrificados, procedendo a uma fecundação artificial, antes de reimplantar os embriões nas vacas

receptoras. O número de embriões também pode ser aumentado por bipartição, por

micromanipulação do blastócito com 64 a 128 células. A aplicação de testes genéticos nos pais e nos

embriões, antes de ser reimplantados, permite uma seleção apurada da descendência.

Sendo a produção de alimentos um dos objetivos fundamentais da atividade agropecuária, os

modificadores metabólicos são utilizados tanto para incrementar a produção, como para modificar a

relação entre carne e gordura, e, assim, diminuir o desperdício.

AS NOVAS TECNOLOGIAS

MARCADORES MOLECULARES E SELEÇÃO GENÔMICA

O estudo do genoma dos animais domésticos fornece informações para a seleção de alguns caracteres.

Em relação aos monogênicos, o processo seletivo oferece poucas dificuldades, especialmente se o

gene responsável por uma característica de interesse estiver estreitamente associado a um

determinado marcador, que possa ser detectado facilmente por técnicas moleculares. O processo se

complica com os caracteres poligênicos, porque devem correlacionar-se os principais genes que

participam na variação do traço escolhido, e as sequências não funcionais que, distribuídas ao longo

do genoma, irão cumprir o rol de marcadores moleculares.

Centenas de marcadores foram identificados em diferentes espécies. Trata-se de SNPs e de

sequências curtas de DNA repetidas um número variável de vezes (mini ou microssatélites), que são

transmitidas de uma geração a outra e podem ser identificadas por eletroforese. Além de facilitar a

seleção, os marcadores permitem a determinação do parentesco (pedigree) e a identificação dos

animais, tanto no campo como nos produtos derivados.

Já foram sequenciados vários genomas de animais domésticos: frango (Gallus gallus), porco (Sus

scrofa), cachorro (Canus familiaris), vaca (Bos taurus), cavalo (Equus caballus), gato (Felis catus), coelho

(Oryctolagus cuniculus), peru-selvagem (Meleagris gallopavo), dromedário (Camelus dromedarius),

abelha (Apis melífera), ovelha (Ovis aries), peixe-zebra (Danius raris) etc.

À medida que um genoma é completado, as técnicas eletroforéticas são substituídas por chips de

DNA (microarrays). O sequenciamento do genoma cria uma quantidade extraordinária de dados,

correlacionando marcadores e características fenotípicas. Com essa informação, estabelecem-se

equações preditivas para os cruzamentos seletivos, substituindo a seleção por marcadores pela

seleção genômica.

A CLONAGEM

Em 1975, J. Gurdon (Prêmio Nobel de Medicina 2012) mostrou que, transferindo um núcleo de girino

a um ovócito anucleado de rã, gerava-se um girino normal e, após a metamorfose, uma rã adulta. O

sucesso do experimento diminuía notavelmente quando o núcleo era extraído de células

diferenciadas.

No Instituto Roslin (Escócia), Ian Wilmut tentou transferir o núcleo de uma célula de glândula

mamária de ovelha Finn Dorset a um ovócito receptor anucleado de uma ovelha Scottish Blackface. O

embrião resultante seria implantado em uma ovelha Scottish Blackface. Depois de 277 tentativas

frustradas, nasceu uma ovelha Finn Dorset, Dolly (1977-2003), o primeiro animal obtido por

transferência nuclear (Figura 14.2). Fenômeno midiático, Dolly desenvolveu um tumor no pulmão,

sendo sacrificada depois de desenvolver artrite em uma pata e de mostrar sinais de envelhecimento

precoce.

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As dificuldades técnicas estão, principalmente, na estimulação do citoplasma receptor e na

coordenação entre a atividade citoplasmática e a nuclear. Quando a reprogramação celular é

incompleta, observam-se fenômenos epigenéticos que abrangem o DNA, a cromatina e a inativação

do cromossomo X. Como resultante de efeitos aleatórios e de influências ambientais, os animais

clonados não são totalmente idênticos.

Por outro lado, os problemas de saúde são mais frequentes em clones, porque a gestação é mais

demorada e o tamanho do recém-nascido é maior. As taxas de mortandade perinatal aumentam, assim

como o número de malformações congênitas.

A clonagem é utilizada com os animais fundadores, principalmente bovinos e suínos, porque são os

únicos em que os benefícios justificam o custo do procedimento. Alguns exemplos são ilustrativos: Bull

86 Squared, um clone de um animal resistente à brucelose, salmonelose e tuberculose; Annabell Zeta,

uma vaca da raça Holstein recordista da produção de manteiga, clonada com sucesso por apresentar

problemas de fertilidade; Second Chance, nascido depois de 189 tentativas de clonagem de Chance,

um touro que participou de rodeios e filmes.

A tecnologia está sendo desenvolvida também na Argentina e no Brasil. Ciruelito é um clone de

Ciruelo, grande campeão da raça Brangus. Lenda e Glória da Embrapa descendem de Vitória, uma vaca

da raça Simental, nascida por transferência nuclear; Porã e Potira descendem, via bipartição

embrionária, de uma vaca da raça bovina Junqueira, em alto risco de extinção; também zebuínos foram

clonados. Em ambos os países existem empresas privadas especializadas na clonagem comercial de

bovinos (BioSidus, ARG Natural Beef; Vitrogen, Geneal) em empreendimentos ligados a universidades

ou institutos de pesquisa agronômica.

De um modo geral, a clonagem é utilizada para animais de elite, doentes ou acidentados,

estimando-se o preço de um bezerro clonado, nos Estados Unidos, em redor de 20.000 dólares. Ainda

pode demorar vários anos até que o preço se torne interessante para o melhoramento direto na

pecuária.

--------------

FIGURA 14.2. Dolly, um clone obtido por transferência nuclear

Ovelha Finn Dorset Ovelha Scottish Blackface Cultivo de células de glândula mamária Extração do glóbulo polar e dos cromossomos do ovócito Transferência nuclear Ativação elétrica e fusão Implantação do embrião em uma ovelha Scottish Blackface Nasce Dolly (Finn Dorset)

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Diferente dos bovinos, os equinos nasceriam mais saudáveis. Em 2003, a mula Joy of Idaho foi o

primeiro clone de um híbrido de uma égua e um jumento. No mesmo ano e depois de 847 tentativas,

nasceu na Itália a égua Prometea, gerada a partir de uma célula somática materna, o que a torna ao

mesmo tempo filha e irmã gêmea de sua mãe. Em 2005 obtiveram-se os primeiros clones de um cavalo

de corrida (Pieraz Cryozootech) e de um cavalo de salto (Paris-Texas). Recentemente, nasceu na

Argentina BS Ñandubay, clone de Ñandubay, um cavalo crioulo (Halitus, BioSidus). No Brasil, as potras

Branca e Neve foram obtidas por bipartição embrionária. Observe-se que a inseminação artificial e os

tratamentos de fertilidade estão proibidos em cavalos de corrida, puros-sangues.

Contudo, as possibilidades da clonagem vão além do aumento da taxa de fertilidade de animais

elite e da conservação de animais com características interessantes. A clonagem pode ser utilizada

para a conservação de espécies raras e em risco de extinção, para a criação de rebanhos homogêneos

que facilitem trabalhos de pesquisa e para a propagação rápida de alguns organismos transgênicos.

A TRANSGÊNESE

Na década de 1980, a transferência de um gene codificador de hormônio de crescimento humano

originou ratos duas vezes maiores. Quando repetida a experiência com porcos, obteve-se o Beltsville

pig, um animal que apresentou problemas variados: dificuldades respiratórias, artrite, letargia etc. O

experimento suscitou vários questionamentos éticos em relação ao tratamento infligido aos animais.

De um modo geral, salvo em peixes, a transgênese do hormônio de crescimento (GH, do inglês growth

hormone e GHFR, do inglês growth hormone factor releasing) nos animais domésticos revelou-se

problemática.

Um caso interessante pelos benefícios que poderia trazer para o meio ambiente é o do Enviropig

(Universidade de Guelph, Canada), um porco portador de um gene bacteriano codificador de fitase.

Secretada na saliva, a enzima reduz em 40% a concentração de fósforo no esterco. Por falta de apoio

financeiro e sem a aprovação das autoridades pertinentes, em 2012, o projeto teve que ser

descontinuado, e os porcos, sacrificados.

A partir de 1988 começaram a ser produzidos vacas, cabras, coelhos, ovelhas, frangos, porcos e

peixes transgênicos. As novas tecnologias de edição gênica poderão modificar a velocidade do

processo. No entanto, a comercialização de animais transgênicos ou seus produtos seguirá avançando

lentamente, não só pelos altos custos, como pelo tempo demandado para responder ao processo

regulatório e pela resistência eventual dos consumidores.

Experiências de transgênese visam melhorar a qualidade do leite de vaca, modificando as proteínas

(leite humanizado para lactantes) ou reduzindo a lactose (para as pessoas com intolerância). Na Nova

Zelândia e nos Estados Unidos vêm sendo obtidas vacas que produzem mais caseína no leite, uma

propriedade interessante para a indústria de queijos.

Algumas tentativas também foram feitas em relação à produção de fibras animais: ovelhas

transgênicas que não precisassem de determinados suplementos de aminoácidos na dieta;

modificação da estrutura das fibras de lã e de caxemira para facilitar o tingimento e diminuir o

encolhimento; alteração das propriedades da seda. A partir de uma proteína de aranha, sintetizada

por uma cabra transgênica, se desenvolveu e patenteou o BiosteelTM, um produto muito resistente

que pode ter diversos usos, inclusive militares.

Uma das maiores preocupações existentes é o risco de escapamento de um animal transgênico, e

a consequente possibilidade de difundir o transgene nas populações naturais. O risco depende de

algumas características do animal, especialmente a mobilidade, a capacidade de escapar do cativeiro

e a de voltar ao estado selvagem (Tabela 14.1). Outros fatores adicionais que devem ser considerados

em uma simulação de risco são a viabilidade juvenil, a idade de amadurecimento sexual, a fertilidade

do macho, a fecundidade da fêmea, a viabilidade do adulto etc.

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TABELA 14.1. O risco de escapamento de um animal transgênico

ESPÉCIE MOBILIDADE CAPACIDADE DE VOLTAR AO ESTADO SELVAGEM

CAPACIDADE DE ESCAPAR DO CONFINAMENTO

Camundongos Alta Alta Alta

Peixes Alta Alta Alta

Insetos Alta Alta Alta

Porcos Baixa Alta Moderada

Aves Baixa Baixa Baixa

Vacas Baixa Baixa Baixa

--------------

AS NOVAS TECNOLOGIAS DE EDIÇÃO GÊNICA

A ablação dos chifres de animais criados em confinamento é um procedimento cruento que visa evitar

ferimentos do própio animal e do pessoal que os cuida. Algumas raças de gado estão desprovistas de

chifres, mas as etapas necessárias para introduzir esse carácter por cruzamento e seleção reduz a

qualidade da cria. Uma das primeiras aplicações da tecnologia CRISPR (do inglês, Clustered Regularly

Interspaced Short Palindromic Repeats) visa a obtenção de touros sem chifres.

Outras aplicações previstas abrangem o melhoramento genético de mascotes (peixes, cachorros) e

a marcação de ovos de galinha, possibilitando a sexagem dos embriões e sua inclusão na cadeia

alimentícia ou na produção de vacinas.

A AQUICULTURA

Os principais países produtores de peixes, mariscos e crustáceos por aquicultura são a Noruega, o

Chile, o Canadá, os Estados Unidos, o Reino Unido, a Nova Zelândia e os países asiáticos.

O desenvolvimento da aquicultura parece uma alternativa razoável para a produção de alimentos

porque, em função da pesca desmedida, os estoques de peixes nos mares e oceanos têm diminuído

assustadoramente. No entanto, do ponto de vista ecológico, ainda subsistem dúvidas em relação à

aquicultura. Alguns peixes não exigem nenhuma complementação da ração, como as carpas e tilápias.

Já o camarão e o salmão são criados com rações que incluem farinha de peixe. Quais seriam as

vantagens da aquicultura se for necessário extrair peixe para a preparação das rações?

A criação de peixes e mariscos é uma atividade empresarial que cria empregos, demanda poucos

insumos e gera um produto de alto valor agregado. Contudo, alguns problemas subsistem, como a

distância dos mercados de destino e a contaminação das águas costeiras, que dificulta a criação de

mariscos filtradores de plâncton, favorecendo o florescimento das algas. O gerenciamento destas

variáveis, nas fazendas de salmão, dá um retorno econômico importante para a Noruega, o Chile o

Canadá e os Estados Unidos.

No entanto, como as águas e os invernos canadenses são muito mais frios que os chilenos, onde o

salmão pode ser criado o ano inteiro, os produtores canadenses e norte-americanos se interessaram

por um salmão resistente ao frio e de crescimento rápido. Dentro desse contexto, a empresa

AquaBounty transferiu para o salmão do Atlântico um cassete de expressão, denominado

AquAdvantageTM, com dois genes codificadores de uma proteína anticongelamento e um hormônio de

crescimento do salmão do Pacífico (Figura 14.3). O peixe cresce rapidamente em condições comerciais,

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alcançando o tamanho equivalente ao de um salmão convencional em menos tempo (18 meses em

vez de 24 ou 30).

Para alguns especialistas, existiria o risco de invasão e substituição dos salmões naturais pelos

transgênicos, ou a introdução de genes de valor adaptativo, inicialmente maior que os das populações

selvagens, mas cujo valor diminuiria a médio prazo, levando a espécie à extinção (genes troianos). A

empresa AquaBounty considera esses riscos sob controle, em função da condição triploide dos

salmões GM AquAdvantage, que garante a esterilidade de 98,9% dos peixes e das condições

ambientais desfavoráveis em Prince Edwards Island (Canadá), onde serão produzidos os ovos.

Segundo o Protocolo de Cartagena, os peixes transgênicos devem ser criados exclusivamente em

contenção. Por isso, a exploração comercial de salmões transgênicos não poderá ser feita como até

agora, em jaulas marinhas; eles terão que crescer confinados em fazendas dentro do território, de

maneira a diminuir os riscos de escapamento. AquaBounty planeja desenvolver o processo no Panamá,

em regiões de altitude, com temperatura adequada e rios desfavoráveis para a sobrevivência do

salmão. A aprovação, em 2015, do FDA (Food and Drug Administration), da liberação comercial do

salmão AquAdvantage o torna o primeiro animal transgênico a entrar no mercado.

Estima-se que atualmente existam umas 30 variedades de peixes transgênicos em laboratórios de

diferentes lugares. Tilápias e carpas transgênicas se encontram em vias de aprovação em Cuba e na

China, respectivamente. Também estão sendo desenvolvidos camarões e mariscos desprovidos da

proteína responsável por 80% das alergias e uma truta com mais ácidos graxos Ômega 3.

--------------

FIGURA 14.3. O salmão transgênico AquAdvantage (Aquabounty Technologies)

Salmão do Pacífico (Chinook) Enguia do nordeste do Atlântico Oncorhynchus tshawytscha Zoarces americanos Gene codificador Gene codificador de de hormônio de crescimento proteínas anticongelamento Salmão do Atlântico (Salmo salar) Alcança o tamanho definitivo em

18 meses, em vez de 24 a 30. Salmão AquAdvantage

Criado em contenção (AquaBounty Technologies)

(Protocolo de Cartagena).

Triploidia (esterilidade de 98,9%)

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BIOTECNOLOGIA E CRIAÇÃO DE ANIMAIS

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A SAÚDE DOS ANIMAIS

OS MODIFICADORES METABÓLICOS

Os hormônios são modificadores metabólicos que estimulam o crescimento, em bezerros e porcos, e

a produção de leite, em vacas. Os mais usados são os hormônios bST (somatropina bovina) e pST

(somatropina porcina), produzidos a partir de microrganismos transformados por engenharia genética.

Sua utilização gerou polêmicas, sendo proibidos em alguns países da Europa, mas permitidos em 19

países, entre os quais a Argentina, o México e o Brasil.

RESISTÊNCIA A DOENÇAS

A seleção genética de animais resistentes às doenças é uma forma de reduzir o prejuízo que elas

causam, estimado em 10 a 20% da produção. No Reino Unido, a resistência ao scrapie, por exemplo,

se tornou uma condição indispensável para a entrada de qualquer ovino em um programa de

melhoramento. Outra possibilidade interessante é a obtenção de bovinos resistentes à vaca louca, à

mastite e à brucelose.

O mapeamento do genoma dos animais domésticos facilita a tarefa de selecionar animais

resistentes a doenças, tais como frangos resistentes à doença de Marek e à salmonelose. Várias

pesquisas estão direcionadas à introdução de genes que confiram resistência a doenças que afetam o

gado, como a tripanossomíase ou a aftosa.

O porco africano é resistente ao vírus da febre suína, enquanto o porco europeu é sensível ao vírus.

Como eles não cruzam, os métodos clássicos de melhoramento tiveram que ser descartados. O

Instituto Roslin (Reino Unido) obteve porcos europeus resistentes ao vírus da febre suína africana,

alterando uma única base do genoma, mediante as novas ferramentas de edição gênica (ZFNs,

TALENs). A modificação esteve baseada na comparação entre os genomas de ambos os porcos.

PREVENÇÃO E TRATAMENTO

Na área agropecuária, a defesa sanitária envolve o controle de vacinas e o diagnóstico de doenças,

víricas (febre aftosa, peste suína) e bacterianas (tuberculose, brucelose, botulismo). Devido a sua

importância econômica, essas atividades exigem condições de trabalho estritas em laboratórios com

elevado nível de biossegurança (NB3, NB4).

Os principais produtos desenvolvidos para a saúde animal são vacinas, kits de diagnóstico,

tratamentos (antibióticos, antiparasitários) e suplementos (hormônios). Estes produtos são

necessários porque as práticas intensivas ou semi-intensivas favorecem a transmissão de doenças

entre os animais.

Existem numerosas vacinas contra as doenças dos animais; muitas pesquisas se direcionam

atualmente para a elaboração de vacinas de subunidades de antígeno em plantas modificadas

geneticamente, que possam ser administradas na ração. Também está sendo desenvolvida uma vacina

para imunizar os animais contra um hormônio reprodutivo (GnRH ou gonadotrophin-release

hormone), sendo esta uma alternativa para a castração de touros e porcos.

As análises de DNA possibilitam a tipificação dos agentes patogênicos e os estudos epidemiológicos.

Os ensaios imunoenzimáticos são utilizados para o diagnóstico de várias patologias e também para o

reconhecimento de diversos tipos de contaminação nos produtos (Salmonella, Escherichia coli,

Listeria).

A produção de medicamentos visa umas 200 doenças animais diferentes. As indústrias de saúde

investem aproximadamente US$ 400 milhões por ano em pesquisa e desenvolvimento, mas, de um

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modo geral, a saúde animal movimenta muito menos dinheiro que a saúde humana. Salvo em relação

aos animais de estimação, o mercado de saúde animal cresce lentamente. Algumas experiências em

andamento são a produção de anticorpos monoclonais para a artrite reumatoide no leite de

ruminantes, ou a síntese de um antibiótico de amplo espectro por vacas leiteiras, a fim de diminuir a

incidência de mastite por Staphylococus aureus.

Na América Latina, numerosas empresas do setor privado elaboram medicamentos, vacinas e

testes diagnósticos dirigidos à saúde animal. Entre as principais: Biogénesis e Bagó (Argentina), Vallée

(Brasil), BiosChile (Chile), Laverlam (Colômbia), IASA (México), Laboratórios Santa Elena (Uruguai).

Cuba se destaca pela vacina contra o carrapato, que é vendida em vários países da América Latina.

A aquicultura abre um espaço para as empresas que desenvolvem testes de diagnóstico e vacinas

para os patógenos que afetam as fazendas, como a argentina Tecnovax S.A. e as chilenas Recalcine e

AquaGestión, que desenvolveram uma vacina contra o vírus da anemia infecciosa do salmão.

Em relação à febre aftosa, uma endemia que afeta a produção de carne e de leite, novas vacinas

mais eficientes e fáceis de aplicar são indispensáveis nas regiões em que a doença não foi totalmente

erradicada e em que aparecem surtos eventuais: Argentina, Brasil, Colômbia, México, Paraguai e

Uruguai.

Do ponto de vista comercial, as vacinas DIVA (do inglês, differentiating infected from vaccinated

animals) são especialmente interessantes porque permitem distinguir animais infectados de animais

vacinados. Estuda-se também a substituição da vacina atual de vírus inativado, por alfafa transgênica

que expresse algumas proteínas do vírus da aftosa (plant-pharming).

Tecnologias avançadas são habitualmente aplicadas na produção de vacinas veterinárias. Até o

início de 2016, 20 vacinas geneticamente modificadas foram liberadas no Brasil pela CTNBio (Comissão

Técnica Nacional de Biossegurança).

NOVAS UTILIZAÇÕES DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS

MODELOS DE ESTUDO PARA DOENÇAS HUMANAS

A transgênese é utilizada em vários animais (ratos, camundongos, coelhos e macacos), para transferir

características que permitem sua utilização como modelo de doenças humanas.

O primeiro modelo foi obtido em 1988, ao se transplantar tecidos do sistema imune extraídos de

um feto humano a camundongos geneticamente imunodeficientes; os animais adquiriram um sistema

imune humano. No mesmo ano, obtivera-se o oncomouse, um camundongo com um gene para câncer

de mama que permite testar tanto o efeito carcinogênico de algumas substâncias como a ação

terapêutica de outras. Com este camundongo, a Universidade de Harvard recebeu a primeira patente

para um animal transgênico.

A partir desse momento vários animais foram redesenhados para servir como modelo; coelhos com

diferentes genes para lipoproteínas humanas constituem linhagens sensíveis ou resistentes a regimes

ricos em colesterol; camundongos modificados geneticamente possibilitam os estudos sobre epilepsia,

obesidade; mapeamento genético de doenças neuropsiquiátricas em cachorros etc.

Mediante as novas técnicas de edição gênica (TALENs), o Instituto Roslin obteve, recentemente,

um modelo animal (porco) para o estudo da arterioesclerose. Foram alterados os genes codificadores

dos receptores da lipoproteína de baixa densidade (LDL), sem os quais essa fração do colesterol se

acumula no sangue, causando a doença.

Alguns animais domésticos constituem um reservatório de doenças e as transmitem ao homem.

Preservar a saúde dos animais diminui o risco de contágio. Deste modo, uma vacina contra a

leishmaniose canina desenvolvida recentemente no Brasil visa a cortar a corrente de transmissão da

doença do cachorro ao homem.

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BIOTECNOLOGIA E CRIAÇÃO DE ANIMAIS

191

XENOTRANSPLANTES

O porco é considerado o fornecedor ideal de órgãos para transplante, porque o tamanho e a função

destes são equivalentes aos dos humanos. Válvulas de porco substituem já as válvulas cardíacas

humanas, depois de eliminar todas as células de porco. A rejeição a um órgão transplantado poderia

ser evitada por knock out ou pelas novas técnicas de edição gênica, do gene da α 1,3-

galactosiltransferase (α1,3 GalT). Contudo, restaria um dos maiores riscos dos xenotransplantes, que

é a transmissão de vírus de uma espécie a outra.

OS ANIMAIS COMO BIORREATORES

As proteínas terapêuticas incluem hormônios, anticorpos, fatores de crescimento e fatores de

coagulação. Os genes codificadores de várias delas já foram transferidos a microrganismos. Porém,

devido à necessidade de modificações pós-traducionais, algumas proteínas só podem ser sintetizadas

em células animais, cultivadas em biorreatores. Contudo, a quantidade de proteína produzida é muito

pequena e os custos operacionais muito altos.

Uma alternativa é a transformação genética de um animal para convertê-lo em um biorreator que

expresse a proteína de interesse no leite, no sangue, na urina ou nos ovos. De fato, precisa-se de 2 a 3

vezes menos capital inicial, e o custo da proteína recombinante cai entre cinco e dez vezes.

Obviamente, a eleição de uma ou outra tecnologia dependerá da demanda do mercado e da dosagem

requerida. A aprovação de um produto demanda os testes clínicos correspondentes e normas

regulatórias são estritas e demoradas.

Poucos meses depois do nascimento de Dolly, o mesmo grupo do Instituto Roslin e PPL Therapeutics

anunciou o nascimento de Polly, uma ovelha transgênica para o gene codificador do fator IX, uma

proteína fundamental para a coagulação sanguínea e que falta nos hemofílicos. Muitos produtos estão

sendo desenvolvidos atualmente no leite (vacas, cabras, ovelhas, porcos) e nos ovos (aves). Em relação

ao fator IX humano, por exemplo, porcos transgênicos excretam a proteína no leite em quantidade

250 a 1.000 vezes maior do que se consegue em biorreatores microbianos. Bastariam algumas

centenas de animais para suprir as necessidades de toda a população.

Testes clínicos de vários medicamentos encontram-se em andamento. Na Escócia, PPL Therapeutics

Ltd. cria 200 ovelhas produtoras de AAT (-1-antitripsina), uma substância que se encontra em testes

clínicos para o tratamento de enfisema hereditário e fibrose cística. Nos Paises Baixos, Pharming BV

obteve vacas produtoras de lactoferrina humana, uma proteína com propriedades antimicrobianas.

Na Argentina, BioSidus mantém um tambo farmacéutico com duas dinastias de vacas: Pampa,

produtora de hormônio de crescimento, e Patagonia, produtora de insulina. No Brasil, a Universidade

do Ceará mantém um rebanho de cabras transgênicas de raça Canindé que secreta no leite o fator de

estimulação de colônias de granulócitos humanos (hG-CSF).

Hematech Inc. mantém um rebanho em que os genes bovinos foram removidos (knock out) e

substituídos (knock in) por genes humanos. Uma vez imunizados, os animais produzem anticorpos

policlonais humanos que podem ser utilizados para combater infecções, assistir a pessoas com o

sistema imune comprometido ou tratar doenças autoimunes (artrite reumatoide). Anticorpos

humanos (Origen Therapeutics) e interferon (AviGenics) também são produzidos em ovos de aves

transgênicas.

A empresa GTC Biotherapeutics produz mais de 60 proteínas terapêuticas diferentes no leite de

cabras e vacas.Com a liberação de ATryn, uma antitrombina com propriedades anti-inflamatórias e

anticoagulantes, na Europa (2006) e nos Estados Unidos (2009), esperava-se uma modificação no

mercado de fatores de coagulação recombinantes. Porém, as promessas não se confirmaram. Só em

dezembro de 2015, o FDA aprovou a liberação comercial do medicamento Kanuma (sebepilase alfa),

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192

de Alexion Pharmaceuticals, para o tratamento de uma doença lisossômica. A enzima é produzida nos

ovos de galinhas geneticamente modificadas.

Outros produtos estão sendo preparados para fazer frente a um eventual surto de bioterrorismo

como, por exemplo, anticorpos humanos contra antraz, varíola e botulismo em vacas transgênicas

(TransOva), ou antídotos contra as armas químicas como o gás Sarin em cabras (Nexia).

Todas estas aplicações exigem o respeito a normas de segurança estritas. Parece fundamental

extremar os cuidados com a eliminação das carcaças e evitar o escapamento de animais transgênicos

para produtos medicinais, assim como a entrada acidental de seus produtos na cadeia dos alimentos.

O MARCO CONCEITUAL DOS TRÊS Rs

O uso de animais em experimentos tem suscitado numerosos debates, em função do sofrimento que

se lhes infringe e da dificuldade em se transpor ao ser humano a informação obtida nessas pesquisas.

Estima-se em 115 milhões o número de animais utilizados por ano em pesquisas científicas entre

roedores (83,5%), primatas (0,15%), gatos (0,06%) e cães (0,24%).

Em 1959, Russell e Burch estabeleceram um marco conceitual conhecido hoje como “os três Rs”

(do inglês replacement, reduction and refinement). No momento atual, a ciência não tem como

prescindir dos testes em animais em algum momento do desenvolvimento de novos medicamentos e

de outras pesquisas. Contudo, os Rs deram início a uma reflexão ética em relação aos animais (Tabela

14.2).

Admite-se hoje que nem tudo o que é tecnicamente possível deve ser permitido, cabendo aos

Comitês de Ética das instituições de pesquisa discutir este aspecto em relação aos projetos que

envolvem seres vivos, a fim de evitar o conflito entre o bem dos seres humanos e o dos animais.

Nos últimos anos tem-se desenvolvido numerosas iniciativas para substituir ou reduzir o número

de animais no ensino, especialmente na formação de pesquisadores e técnicos. Em bancos de dados

como NORINA (A Norwegian Inventory of Alternatives) encontram-se numerosas alternativas para

substituir as dissecções e outras práticas que envolvam procedimentos com animais.

Contudo, nem sempre os maus-tratos decorrem dos procedimentos experimentais, também

podem ser genéticos. Um exemplo significativo é o da raça bovina Belgian Blue, que apresenta um

crescimento muscular extraordinário devido a uma mutação no gene codificador da miosina. A carne

é macia e com muito pouca gordura, mas devido à largura reduzida do canal pélvico e ao grande

tamanho dos bezerros, o nascimento só é possível por cesárea. Alguns países, como a Dinamarca,

pedem a extinção desta raça.

--------------

TABELA 14.2. Significado e alcance dos três Rs (do inglês replacement, reduction, refinement)

R SIGNIFICADO EXEMPLOS

1 Substituir Substituição de animais vertebrados conscientes por seres inscientes ou por métodos in vitro.

2 Reduzir Redução do número de animais necessário para a pesquisa mediante desenhos experimentais mais apurados estatisticamente.

3 Refinar Minimizar ao máximo o desconforto ou o sofrimento dos animais.

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BIOTECNOLOGIA E CRIAÇÃO DE ANIMAIS

193

OS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO

O bem-estar dos animais domésticos é uma responsabilidade do homem, que deve lhes dar qualidade

de vida e minimizar o sofrimento e a dor. Entre estes, os bichinhos de estimação constituem um grupo

à parte. Submetidos a processos seletivos diversos, eles experimentam algumas consequências

negativas como a surdez, que atinge quase 10% dos dálmatas. Os cachorros, aliás, carregam 300

condições genéticas recessivas das quais 250 foram descritas também no homem.

Em 2015, estimaram-se em mais de 14 bilhões de dólares os gastos em produtos de saúde para os

pets norte-americanos. Trata-se de vacinas (raiva, hepatite, leucemia felina etc.) e medicamentos

(artrite, parasitas, alergias, problemas dentários, doenças cardíacas, falência renal, ansiedade de

separação, síndrome de disfunção cognitiva etc.).

O mercado também é propício para a clonagem dos animais de estimação. Algumas empresas já

estão envolvidas com a tecnologia, que até agora parece ser mais fácil em relação aos gatos que aos

cachorros.

O desenvolvimento de Night Pearls, um peixe transgênico que brilha no escuro, custou US$ 2,9

milhões. Inicialmente desenhado para monitorar a qualidade da água, este peixe se transformou em

mascote. Existem variedades com fluorescência verde, vermelha e com uma combinação das duas

cores, a um preço de US$ 17,40, no lançamento em Taiwan (2003).

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C A P Í T U L O 15

BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

OS ALIMENTOS FERMENTADOS

As fermentações foram descobertas empiricamente por diversos povos, em diferentes momentos

históricos. Assimiladas rapidamente pelo homem, suas duas vantages fundamentais eram a

preservação dos alimentos e a eliminação das substâncias tóxicas de alguns grãos.

Os processos fermentativos desenvolveram-se de modo artesanal até a segunda metade do século

XIX, quando as descobertas científicas sobre os microrganismos e as enzimas possibilitaram o

desenvolvimento da indústria de alimentos, que soube se apropriar de todas as ciências afins

(microbiologia, bioquímica, engenharia química, automação etc.).

Os alimentos fermentados constituem hoje a terceira parte da dieta humana. Seja por facilitar a

assimilação dos nutrientes, seja por apresentar menos substâncias tóxicas, esses alimentos entram na

categoria dos denominados alimentos funcionais, isto é, alimentos que provêm benefícios extras, além

dos que seriam esperados em função de sua composição.

Afora os produtos de panificação, as bebidas alcoólicas e os laticínios, existem muitos outros tipos

de alimentos fermentados. Alguns são de origem animal (pescado, embutidos e presuntos), mas a

maioria é de origem vegetal, tanto no Ocidente (chucrute, picles, azeitonas, café, cacau, chá) como no

Oriente (shoyu, misó, tempeh, kimchi etc.) e na África (gari, kokonte ou lafun, agbelima, togwa, kenkey

etc.).

O PÃO

A arte da panificação surgiu em diferentes lugares, entre 7000 e 5000 a.C. Os primeiros pães eram

umas bolachas planas, de cereais moídos e água, cozidas sobre pedras quentes. Logo deve ter sido

observado que, deixando a massa em repouso por um tempo, melhorava-se a textura e a

digestibilidade dos pães. O passo seguinte ocorreu, provavelmente, ao observar o crescimento do pão

quando se juntava, à massa recém-preparada, uma pequena parte da massa crua da preparação

anterior (“massa ácida” ou “pé de massa”). Este procedimento já era conhecido por egípcios e hebreus,

5 mil anos atrás.

Os estudos microbiológicos atuais indicam a coexistência, no “pé de massa”, de bactérias lácticas e

leveduras. As enzimas presentes no grão catalisam a transformação do amido em açúcares, que são

transformados em ácido láctico, pelas bactérias, e em etanol pelas leveduras. Devido à liberação de

CO2, formam-se bolhas que conferem porosidade e leveza à massa. Além de acelerar o crescimento, a

preparação de um “pé de massa” permite a seleção e o enriquecimento dos microrganismos dos

cereais.

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

195

FIGURA 15.1. A panificação

A massa também pode levar outros ingredientes, tais como gordura, açúcar, leite em pó, ovos, mel, xaropes, frutas,

especiarias etc.

--------------

Durante muitos séculos, a preparação do pão envolvia, necessariamente, o processo natural de

fermentação, de modo que cada padeiro tinha que preparar seu “pé de massa”. A passagem do

procedimento artesanal à panificação industrial ocorreu em 1876, nos Estados Unidos, com a produção

e venda de cubos de levedura prensada, mediante um processo patenteado pelos imigrantes austro-

húngaros Charles e Max Fleischmann.

Atualmente, comercializam-se três tipos de fermento biológico (levedura Saccharomyces

cerevisiae) para a panificação: o fermento prensado ativo, com 68-72% de umidade, que requer

refrigeração durante o armazenamento e dura entre três e cinco semanas; o fermento seco não ativo,

que se conserva mais tempo e não exige refrigeração, mas deve ser hidratado antes de usar; e o

fermento ativo instantâneo, que não requer hidratação e pode ser adicionado diretamente aos

ingredientes secos.

Neste campo, as inovações não são bem aceitas. Na década de 1990, comercializaram-se no Reino

Unido linhagens obtidas por engenharia genética. Apesar de fermentar o pão rapidamente, facilitando

a vida e o sono dos padeiros, o seu uso foi logo descontinuado, principalmente devido à pouca

aceitação dos consumidores.

Apesar de alguns padeiros conservarem a prática da fermentação natural, os processos artesanais

estão desaparecendo, substituídos pela tecnologia da panificação industrial. Prepara-se a massa

misturando farinhas de um ou mais tipos, água, leveduras e diversos aditivos: emulsificadores, agentes

oxidantes e redutores, enzimas (e -amilases, hemicelulases, lipases etc.) e aceleradores da

fermentação.

Farinhas Água Leveduras Enzimas Outros Aditivos

Mistura dos ingredientes Divisão da massa Boleamento Moldagem Cozimento Resfriamento Corte em fatias Embalagem e distribuição

Fermentação final

Fermentação principal

Fermentação secundária

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O processo fermentativo envolve várias etapas, durante as quais o CO2 liberado forma bolhas que,

retidas na massa, aumentam seu volume. Entre uma e outra etapa, a massa é dividida e boleada,

facilitando a redistribuição dos ingredientes e o desenvolvimento das características organolépticas. A

moldagem visa o alinhamento das fibras proteicas do glúten. Durante a cocção, a mistura etanol-água

se transforma em vapor, e a crosta adquire uma cor dourada. A seguir, os pães são cortados e

embalados (Figura 15.1).

O VINHO

A VINIFICAÇÃO

O vinho é uma bebida proveniente da fermentação alcoólica da uva, originada no norte da África e na

Europa, por volta de 3000 a.C. Durante o amadurecimento da uva, várias espécies microbianas se

sucedem, primeiro transformando os açúcares em etanol e, posteriormente, o etanol em ácido

acético. Considerando que o destino natural da uva é o vinagre, a arte da vinificação representa um

ganho tecnológico indiscutível.

A uva é composta por água (86%), açúcares fermentescíveis (12%) e moléculas diversas (2%). Retira-

se o sumo espremendo ou prensando a polpa, sendo frequente o agregado de enzimas de maceração

(pectinases, celulases e hemicelulases) para melhorar o rendimento.

O agente biológico da fermentação alcoólica é a levedura Saccharomyces ellipsoidea, que se

encontra na pele da uva. Salvo na produção artesanal, a fermentação não depende das leveduras

naturais da uva; a indústria vitivinícola conta com um leque amplo de linhagens, selecionadas para

favorecer o processo fermentativo.

Na vinificação, monitora-se cuidadosamente a fermentação alcoólica, até a conclusão do processo.

Procede-se então a duas trafegas, entre as quais ocorre uma segunda fermentação, denominada

fermentação malolática. Esta etapa, que é uma das mais complexas na elaboração dos tintos, se deve

à ação de bactérias lácticas, como Oenococcus oeni, que transformam o ácido málico (diácido) em

ácido láctico (monoácido). Em consequência da fermentação malolática, a acidez do vinho diminui e

aparecem as primeiras modificações aromáticas. Posteriormente, o vinho é clarificado e colocado para

envelhecer em tonéis ou garrafas, até o total desenvolvimento do buquê.

A obtenção de um vinho tinto ou branco depende basicamente do tipo de uva e do procedimento

seguido (Figura 15.2). Se quisermos obter vinho branco, utilizaremos uvas brancas ou tintas sem a pele

ou casca que as recobre. As uvas tintas com pele originam vinhos tintos, porque esta libera compostos

fenólicos (antocianinas, flavonas, taninos).

O CULTIVO DA VIDEIRA

Existem diferentes espécies de videiras. A Vitis vinifera fornece os vinhos mais finos, enquanto a Vitis

labrusca, a Vitis ripari e outras variedades mais rústicas da própria Vitis vinifera são utilizadas para a

elaboração de vinhos comuns. Para cada cultivo, existe uma combinação de solo e clima ideais,

denominada terroir, sem a qual dificilmente se obterão os melhores resultados.

Alguns vinhos resultam da mistura de uvas diferentes, sendo chamados vinhos genéricos ou de

corte. Os que são elaborados a partir de uma única variedade denominam-se varietais. Esta categoria

inclui nomes como Pinot Noir, Chardonnay e Pinot Blanc (vinhos de Borgonha), Cabernet-Sauvignon

(vinhos de Bordeaux), Alvarinho (vinhos de Portugal e Galícia), Tempranillo (vinho da ribeira do Douro),

Sangiovese (vinhos de Chianti) e Zinfendel (vinhos da Califórnia). Observe-se que, dependendo do

processo utilizado para a elaboração do vinho, a partir de uma variedade de uva como a Pinot Noir

poderão ser obtidos vinhos tão diferentes como um Borgonha ou um Champanhe.

Em 2007, um grupo franco-italiano completou o mapa do genoma da Vitis vinifera, variedade Pinot

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

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Uva tinta Uva branca Desengaçamento e esmagamento Desengaçamento e esmagamento Maceração Inoculação Inoculação Clarificação Clarificação Envelhecimento Engarrafamento Engarrafamento Vinho tinto Vinho branco

Fermentação alcoólica Fermentação alcoólica

Fermentação malolática

Noir. A informação abrange mais de 30.000 genes, muitos dos quais respondem pelos aromas e

sabores dos vinhos, e outros regulam a quantidade de resveratrol, uma molécula que diminui os níveis

de colesterol. Os estudos genômicos abrem numerosas perspectivas para os viticultores. Uma

aplicação importante é o monitoramento da maduração da fruta, mediante arrays de marcadores

moleculares, possibilitando a escolha do momento adequado para a vindima.

--------------

FIGURA 15.2. A vinificação

Vinificação em tinto O mosto obtido por esmagamento da uva tinta passa para a cuba de fermentação, uma vez corrigidas a acidez e a quantidade

de açúcar. Depois da primeira fermentação (fermentação alcoólica), separa-se, por trasfega, o mosto da borra. Inicia-se a

segunda fermentação (fermentação malolática). Depois de clarificado, o vinho deve aguardar dois anos até estabilizar e ser

engarrafado. Os vinhos rosados ou rosés são obtidos seguindo um procedimento semelhante, mas deixando macerar durante

menos tempo o mosto com as cascas de uva. Também é possível consegui-los misturando vinhos brancos e tintos.

Vinificação em branco O mosto é obtido por esmagamento de uva branca ou de uva tinta sem casca, sem permitir a maceração. Salvo em alguns

vinhos brancos de Borgonha, evita-se a fermentação malolática. Os vinhos espumantes (Champagne, Cava, Prosecco) passam

por uma segunda fermentação alcoólica na garrafa.

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O cultivo da videira é uma tarefa complexa que exige tratamentos, enxertos e podas. Os viticultores

praticam a multiplicação vegetativa das videiras, o que garante uma qualidade constante, porém

aumenta a susceptibilidade da plantação aos patógenos. Espera-se que os estudos genômicos

permitam identificar e selecionar genes de resistência a algumas das enfermidades que afetam as

videiras.

A transferência de genes de resistência de uma variedade a outra é vista com muita desconfiança

pelos produtores, porque o rótulo de varietal é parte da estratégia de vendas dos vinhos de qualidade.

Contudo, alguns produtores consideram aceitável a transferência de genes de videiras rústicas para

plantas de elite, com o objetivo de melhorar a produção.

Com a entrada no mercado internacional de países menos apegados às tradições (Estados Unidos,

Chile, Argentina, Brasil, África do Sul, Austrália etc.), pode ser que as novas tecnologias genômicas se

apliquem na produção de plantas resistentes a doenças e pragas.

O ROL DA LEVEDURA NA VINIFICAÇÃO

Embora as propriedades organolépticas dos vinhos dependam basicamente do cultivar escolhido, as

enzimas da uva e as atividades metabólicas microbianas cumprem, também, um papel importante.

A transformação do mosto em vinho envolve inúmeras reações químicas, desenvolvidas por

leveduras e bactérias lácticas. Com o mapeamento do genoma de ambos os microrganismos, e a

construção de microarrays adequados, estas reações poderão vir a ser bem conhecidas e controladas.

Existe a tendência, na indústria moderna, de substituir as leveduras selvagens por leveduras

enológicas selecionadas. Contudo, alguns produtores consideram que estas últimas massificam a

qualidade do vinho, preferindo utilizar as leveduras nativas e obter assim um produto original

qualitativamente diferente dos outros. Bancos de leveduras nativas facilitam a preservação da

biodiversidade.

Recentemente, duas linhagens de leveduras geneticamente modificadas fizeram sua entrada na

indústria de vinhos dos Estados Unidos e Canadá. Trata-se da levedura ML01, que realiza ambas as

fermentações (alcoólica e malolática), evitando a produção de histaminas e da levedura ECMo01 que

degrada a ureia, impedindo a formação de uma substância carcinogênica.

A CERVEJA

As bebidas fermentadas representam uma opção saudável, na falta de água ou no caso de ela estar

contaminada. Todos os povos elaboraram alguma bebida fermentada a partir dos elementos de seu

entorno, fossem grãos, frutas, raízes, caules ou folhas.

Em 4000 a.C, os habitantes das margens dos rios Tigre e Eufrates (Mesopotâmia) preparavam 20

variedades de cerveja a partir de um procedimento bem simples. Esmigalhava-se o pão de cevada em

um recipiente com água açucarada e, uma vez concluída a fermentação, a bebida era filtrada e

transvasada a outro recipiente.

Os procedimentos melhoraram a partir do século VII, quando os frades introduziram algumas

inovações, como incluir diferentes tipos de ervas, uma prática que culminou com a adição de lúpulo,

no século XI. A descoberta da técnica de fermentação baixa, no século XIV, deu maior estabilidade à

bebida. Os trabalhos de Pasteur e o progresso da Microbiologia permitiram, no século XIX, o

desenvolvimento de uma poderosa indústria, cuja produção mundial supera os 1.000 milhões de

hectolitros por ano.

A fabricação da cerveja começa com a maltagem, um processo em que os grãos de cevada

germinados são secados e moídos. O malte assim obtido contém as enzimas desenvolvidas durante a

germinação, capazes de catalisar a transformação do amido em açúcares fermentescíveis (Figura 15.3).

Este processo é indispensável porque, não tendo amilases, as leveduras não fermentam o amido.

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

199

Na brasagem o malte é misturado com água, possibilitando a digestão do amido por ação enzimática.

Mais tarde o mosto é filtrado e fervido, sendo então acrescentadas as flores de lúpulo (Humulus

lupulus, da família das Canabináceas) que, além de ter uma ação antisséptica, conferem à bebida seu

sabor amargo característico.

A maltagem e a brasagem são atividades prévias à fermentação alcoólica, que será conduzida por

leveduras (Saccharomyces cerevisiae e Sacharomyces carlbergiensis). Os processos mais tradicionais

utilizam leveduras que se acumulam no topo da cuba, originando as cervejas do tipo ale, com menos

de 4% de álcool. Contudo, existem outras leveduras que sedimentam no fundo, gerando as cervejas

de tipo lager, com mais de 6% de álcool. Uma vez concluída a fermentação do mosto, este recebe os

tratamentos finais que consistem em maturação, clarificação, carbonatação, pasteurização e

engarrafamento.

No momento, a tecnologia do DNA-recombinante se limita a transformações com genes do mesmo

gênero (Saccharomyces), visando conseguir linhagens mais eficientes em relação ao processo

fermentativo, adequadas à cevada e ao lúpulo de diferentes regiões do mundo. Até o momento, essas

linhagens não são utilizadas comercialmente.

--------------

FIGURA 15.3. As etapas da produção de cerveja.

--------------

OS QUEIJOS E IOGURTES

A PRODUÇÃO DE LATICÍNIOS

As raízes da produção de laticínios remontam ao ano 3000 a.C. (Oriente Médio), quando o homem

comprovara que o leite mudava de consistência e de sabor ao azedar. O soro podia ser consumido

fresco, e a adição de sal ao coágulo o conservava por mais tempo. Em torno de 2.000 a.C., a utilização

de estômagos de cabras e de ovelhas, como recipientes para o leite, permitiu obter queijos mais

Cevada

Maltagem (Maceração, germinação secagem e moagem do malte) Malte

Brasagem (Mistura, filtração e fervura do mosto) Mosto Cerveja

Acabamento (Amadurecimento, pasteurização e engarrafamento)

Comercialização

Fermentação alcoólica

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sólidos e robustos. Mais tarde, os romanos introduziram extratos de plantas, como o figo, para

coagular o leite.

A explicação destes fenômenos é simples. As bactérias que normalmente se encontram no úbere

dos animais contaminam o leite, proliferando e formando ácido láctico. Nesse meio ácido, as proteínas

precipitam, separando-se do soro. A coagulação também ocorre em presença das enzimas renina e

pepsina, da mucosa estomacal, e da ficina, do figo. Hoje, a produção mundial de leite fermentado

(iogurte, coalhada, quefir etc.) é de três milhões de toneladas por ano, enquanto a de queijos chega a

15 milhões de toneladas por ano (Figura 15.4 A).

Várias espécies bacterianas podem fermentar o leite: Streptococcus thermofilus, Lactobacillus

bulgaricus, Lactobacillus acidophilus, Streptococcus lactis, Bifidobacterium bifidum etc. A maioria dos

produtos vendidos como “leite fermentado” contém um número alto de microrganismos vivos; sendo

consumidos como probióticos, para prevenir o desenvolvimento de outros microrganismos

indesejáveis ou patogênicos no tubo digestivo.

Todos os queijos passam por três etapas: a coagulação, o dessoramento e a maturação (Figura 15.4

B). No entanto, a tecnologia de produção de queijos permite uma série de variações, que se traduz em

mais de 400 tipos diferentes. Algumas dessas variações são a origem do leite (vaca, cabra, ovelha,

búfalo), o agente da coagulação (calor, enzimas, bactérias lácticas ou ambas), a umidade e consistência

(mole, semiduro, duro e muito duro) e a maturação. Muitos países aceitam 35 variedades, definidas

por regras internacionais.

O ROL DE MICRORGANISMOS E ENZIMAS

A produção de queijos envolve a acidificação do meio pelas bactérias lácticas, geralmente Lactococcus

lactis e Streptococcus thermophilus. O coalho, uma substância extraída do estômago de bezerros, foi

utilizado, durante séculos, como agente da coagulação enzimática, mas sua obtenção ficou cada vez

mais cara e difícil.

Para estabilizar a produção, e satisfazer a maior demanda pelos produtos lácteos, transferiu-se o

gene da renina a uma bactéria (Escherichia coli) e, mais tarde, a uma levedura (Kluyveromyces) e um

mofo (Aspergillus). Além da enzima produzida (quimosina) ser mais pura que a renina, os suplementos

são constantes, aumentando a eficiência da produção de laticínios e diminuindo os custos.

O desenvolvimento de bactérias e fungos durante a maturação confere suas características típicas

a alguns queijos como, por exemplo, a presença de olhaduras produzidas por Propionabacterium no

Gruyère, ou de um manto branco de Penicillium no Camembert e no Brie ou, ainda, as estrias azuis de

Penicillium no Gorgonzola ou no Roquefort.

O melhoramento de bactérias lácticas visa a obtenção de linhagens mais estáveis, resistentes aos

vírus bacteriófagos, e produtoras de bacteriocinas, que são substâncias com atividade antimicrobiana.

Linhagens capazes de liberar mais rapidamente suas enzimas poderiam acelerar o processo de

formação de aromas. Com o mapeamento do genoma, espera-se uma intensificação das pesquisas

nessa direção.

O sequenciamento de várias linhagens de Streptococcus thermophilus, na década de 2000, revelou

a presença de sequências CRISPR, relacionadas com a infecção por bacteriófagos, sugerindo a

existência de um mecanismo de defesa bacteriano. Exposta a um vírus, a bactéria integra algumas de

suas sequências gênicas; em um contato posterior essas sequências servirão como guia para a

destruição de qualquer DNA semelhante. O trabalho fora iniciado na empresa Danisco, posteriormente

adquirida por DuPont, que acumula várias patentes. A edição gênica é a técnica mais recente

disponível para conseguir a resistência das bactérias da indústria de laticínios aos bacteriófagos, uma

ameaça que causa grandes perdas.

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

201

Leite

Pasteurização

Inoculação com lactobacilos, coalho ou enzimas e adição de CaCl2

Coagulação

Dessoramento

Enformagem, prensagem, viragem e salga

Inoculação com fungos e/ou bactérias

Maturação

Embalagem e comercialização

Fermentação láctica

FIGURA 15.4. A produção de laticínios

A. Iogurte tradicional e iogurte batido. As variações dependem de acréscimos (açúcar, frutas etc.) e de modificações de consistência (cremoso, firme, batido).

B. Queijo. Os agentes biológicos intervêm nas etapas de coagulação e na maturação de alguns produtos.

Leite + leite em pó (+ açúcar)

Pasteurização

Inoculação com lactobacilos Preenchimento das embalagens Resfriamento Agitação (+ adição de frutas) Preenchimento das embalagens Iogurte tradicional Iogurte batido Comercialização Comercialização

Fermentação láctica Fermentação láctica

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202

A PROTEÍNA DE CÉLULA ÚNICA

Em um sentido amplo, o termo SCP (do inglês single cell protein) se refere à proteína bruta ou refinada,

originada pelo crescimento de bactérias, algas, fungos ou mofos. De fato, os microrganismos são muito

mais produtivos que os animais de criação. Enquanto uma vaca produz 200 g de proteína por dia, os

microrganismos, teoricamente, podem produzir 25 toneladas, no mesmo tempo e em condições

ideais.

Nas décadas de 1960 e 1970, especulava-se com a utilização de derivados do petróleo como

matéria-prima para o crescimento microbiano, mas, com a crise dos anos 1980, a ideia de um “bife de

petróleo” foi abandonada. Atualmente utilizam-se como substrato os excedentes e os restos agrícolas

ou industriais, e a maioria dos processos visa o enriquecimento de rações animais.

A introdução de proteína microbiana na alimentação humana demanda um processo extra de

purificação, por ter um conteúdo de ácido úrico muito alto. Contudo, a empresa Ranks Hovis

McDougall (RHM) conseguiu um produto, denominado Quorn, adaptado para a nutrição humana,

utilizando o fungo Fusarium graminearum. Comercializado no Reino Unido, o alimento apresenta um

alto teor proteico (45%), uma composição em aminoácidos parecida com a da carne de vaca, um alto

conteúdo de fibras e uma quantidade aceitável de ácidos nucleicos (1%). Por não ter cheiro ou sabor,

o produto pode ser utilizado como substituto de peixe, frango ou carne. A semelhança dependeria do

comprimento das fibras.

OS ADITIVOS

OS DIVERSOS TIPOS

A adição de algumas substâncias nos alimentos tem diversos objetivos como, por exemplo, conservá-

los por mais tempo (antibióticos, ácido acético, ácido láctico, etanol), complementar seu valor nutritivo

(vitaminas, aminoácidos) ou mudar a consistência (gomas e enzimas). Os aditivos também são usados

para melhorar a cor e o flavor, um termo que abarca o aroma, o sabor e a textura. Apesar da má fama

que os acompanha, só uma em 6.000 pessoas apresenta alergia e intolerância aos aditivos, um número

baixo, considerando que uma pessoa em 50 é alérgica ou intolerante a algum alimento.

Os principais aditivos utilizados pela indústria de alimentos são os ácidos cítrico e láctico, alguns

corantes naturais (-caroteno, riboflavina), flavorizantes (monoglutamato de sódio, extrato de

levedura, aromas), gomas espessantes (xantana, gelana, dextrana), antioxidantes (-caroteno),

vitaminas (B2, B12, Biotina), enzimas e antibióticos. Alguns desses aditivos são obtidos em culturas de

células vegetais. Outros têm uma origem microbiana, sendo utilizadas linhagens de microrganismos

geneticamente modificados para sua produção industrial.

Vimos, anteriormente, o importante rol desempenhado por algumas enzimas na produção de

alimentos e bebidas por fermentação. Falta destacar o uso da lactase na elaboração do leite

deslactosado, um produto dirigido às pessoas com intolerância à lactose. E da pectinase, que, junto

com celulases e amilases, facilita a extração do suco de frutas retido na pectina, sendo também

utilizada na clarificação do suco.

Finalmente, entre os antibióticos usados para conservar alimentos, citaremos a Nisina (INS234),

que inibe o crescimento de bactérias Gram-positivas em queijos, salsichas e produtos cozidos de

origem avícola, e também a Natamicina ou Pimaricina (INS235), utilizada como conservante na

superfície de produtos cárneos embutidos.

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

203

FIGURA 15.5. A produção de xarope de frutose

A hidrólise e a sacarificação do amido produzem glicose; esta é transformada em frutose pela enzima glicose-isomerase, imobilizada em um biorreator.

--------------

OS ADOÇANTES

Outro caso interessante é o dos adoçantes. O aspartame (ácido aspártico e fenilalanina) é consumido

para limitar a ingestão de calorias, e o xilitol, para diminuir a incidência de cáries dentárias. Outros,

como o xarope de glicose ou de frutose, substituem o açúcar na indústria de alimentos.

A hidrólise ácida ou enzimática (-amilase e glicoamilase) do amido do milho produz xaropes de

maltose e de glicose. Já a ação enzimática da lactase sobre o soro das indústrias de laticínios origina

um xarope de dextrose (glicose, galactose). Uma vez refinados e concentrados, esses xaropes podem

ser usados como ingredientes na elaboração de produtos alimentícios (biscoitos, sorvetes etc.).

O poder adoçante da glicose é menor que o da frutose, mas a transformação enzimática (invertase

ou glicose isomerase) transforma uma em outra (Figura 15.5). O resultado é um xarope (42% de

frutose, 52% de glicose), que pode ser concentrado por métodos cromatográficos, até alcançar um

teor de 90% de frutose. A indústria de refrigerantes substitui a sacarose pelo xarope de frutose, com

uma concentração de 55%, obtido mediante a mistura dos dois tipos.

O processo começou a ser estudado na década de 1960, sendo o custo da glicose-isomerase o

principal fator limitante da tecnologia. Com o desenvolvimento das técnicas de imobilização

enzimática, o processo tornou-se econômico, possibilitando o uso do amido proveniente de cereais

excedentes, mas, por outro lado, prejudicou os países produtores de açúcar, que viram diminuir a

demanda por este produto.

O descobrimento de um gene microbiano capaz de transformar a sacarose em cadeias curtas de

frutose (fructanos), com o mesmo gosto e desprovidas de calorias, indica que novos produtos poderão

entrar em breve no mercado de adoçantes.

OS ALIMENTOS BIOFORTIFICADOS

Combate-se a fome de uma população dando-lhe acesso aos alimentos. Contudo, a falta total de

alimentos é, hoje, um fenômeno menos frequente que a desnutrição, por carência de determinados

nutrientes na dieta. Descrita magistralmente por Josué de Castro, na década de 1950, essa fome

Amido de milho, batata ou trigo Amilases e glicoamilases

Hidrólise e sacarificação

Glicose

Isomerização (Invertase imobilizada)

Frutose

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parcial, ou fome oculta, ainda afeta mais da metade da população mundial, fundamentalmente

mulheres e crianças, sendo a causa de diversas doenças.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, o ferro, o zinco e a vitamina A são as principais

deficiências nutricionais dos países em desenvolvimento. A estratégia tradicional consiste em

suplementar os alimentos industrializados com os nutrientes correspondentes. Existem outras

possibilidades, tais como a fertilização dos solos e, consequentemente, o enriquecimento das culturas

de base.

Contudo, o melhoramento genético parece ser a estratégia mais promissora para aumentar as

concentrações de nutrientes nas culturas de base (arroz, milho, trigo, feijão, mandioca e batata-doce).

A engenharia genética pareceria, a priori, a via mais rápida para fortificar os alimentos. Porém, os

empecilhos legais encontrados pelo arroz com provitamina A (Golden Rice), que conta com mais de 10

anos pronto sem ter sido comercializado, desestimulam a escolha dessa tecnologia.

Na biofortificação dos cultivos são utilizadas outras tecnologias com base biológica. Nos Bancos de

Germoplasma do CGIAR já foram encontradas variedades de feijão com maior conteúdo de ferro, de

arroz e trigo com altos níveis de zinco, de mandioca, milho e batata-doce ricos em vitamina A etc. As

novas técnicas de análise genética de traços quantitativos e, especialmente, a seleção assistida por

marcadores moleculares facilitam o melhoramento genético das culturas de base.

As novas variedades deverão ser altamente produtivas e contar com os nutrientes desejados.

Espera-se que contem com a aceitação das populações necessitadas e, também, que os nutrientes

sejam assimilados de maneira a melhorar sua condição nutricional.

A biofortificação de alimentos é um programa internacional desenvolvido por HarvestPlus (CGIAR),

um consórcio de instituições de pesquisa e agências de desenvolvimento que age especialmente na

América Latina e na África. No Brasil, a Embrapa Agroindústria de Alimentos participa com o projeto

BioFORT, tendo já desenvolvido variedades biofortificadas de feijão e milho. Os primeiros testes estão

sendo realizados em Sergipe.

SEGURANÇA ALIMENTAR

A noção de segurança alimentar está baseada na tradição, de modo que é inevitável que, com o

desenvolvimento de uma moderna indústria de alimentos, surjam alguns questionamentos.

Atualmente, utilizam-se linhagens microbianas selecionadas (starters) para iniciar as fermentações;

ao acabar o processo fermentativo, essas linhagens permanecem no meio, como os lactobacilos dos

iogurtes, ou são eliminadas por calor ou filtração, como as leveduras do pão e da cerveja.

Apesar de ter passado por uma série de processos seletivos, que as torna muito diferentes

geneticamente das linhagens selvagens, as linhagens starters são bem conhecidas e não representam

risco algum para a saúde. Classificadas pelas agências internacionais como GRAS (do inglês, generally

recognized as safe), essas linhagens são as únicas permitidas na produção de alimentos.

Não existem normas explícitas sobre o que seria um OGM food-grade, isto é, um microrganismo

transgênico que possa ser utilizado na indústria de alimentos. Alguns aspetos de biossegurança teriam

que ser considerados. Um deles seria evitar ou eliminar qualquer gene de resistência a antibióticos

que tivesse sido introduzido como marcador seletivo na transferência gênica. O outro diz respeito aos

organismos doadores de genes, esboçando-se diferentes critérios.

Segundo um critério estrito, para poder ser considerado food grade, um OGM deveria conter

exclusivamente DNA da mesma espécie (cisgênico), aceitando-se a presença de pequenos fragmentos

sintéticos de DNA, sempre que não codifiquem DNA ou RNA, na construção gênica. Em outros termos,

a tecnologia do DNA-recombinante utilizaria microrganismos de diferentes linhagens da mesma

espécie.

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BIOTECNOLOGIA E ALIMENTOS

205

Atualmente, tem obtido aceitação um critério mais amplo, permitindo a inclusão de DNA de outros

microrganismos alimentares, sob a condição de estes pertencerem ao mesmo grupo de

microrganismos que participam no processo como, por exemplo, a transferência de genes das

bactérias maloláticas para as leveduras da vinificação.

A aceitação de OGMs nos alimentos depende das regulamentações de cada país, bem menos

flexíveis na Europa que nos Estados Unidos e no Canadá, onde recentemente fora colocada no

mercado uma linhagem de Lactococcus, geneticamente modificada e considerada GRAS.

As enzimas cumprem um importante papel em várias das indústrias de alimentos (produção de

pães, biscoitos, laticínios, sucos de frutas, bebidas alcoólicas, derivados do amido e de proteínas).

Atualmente, mais de 30 enzimas diferentes são utilizadas no processamento de alimentos.

A primeira enzima sintetizada por um microrganismo transgênico foi a quimosina, utilizada há anos

na produção de queijos, como substituto da renina de origem animal. Hoje, aproximadamente 80%

dos queijos são elaborados com quimosina, sendo aceitos pelos consumidores lactovegetarianos.

Os microrganismos utilizados para a síntese de enzimas food-grade são organismos pertencentes à

categoria GRAS, bem conhecidos e altamente produtivos, aos quais foram transferidos os genes de

interesse, mediante engenharia genética. Esses OGMs não estão presentes na preparação final que,

depois de purificada, contém exclusivamente a enzima. Essa modalidade produtiva garante à indústria

de alimentos várias enzimas seguras e de baixo custo, entre proteases, amilases, lipases, lactases,

pectinases, glicose-oxidase, invertases etc.

A esse respeito, pareceria haver um consenso amplo, incluindo a Comissão Europeia, que considera

que os aditivos (corantes, aromas e flavorizantes), só devem ser rotulados como sendo de origem

transgênica se o produto final tiver DNA ou proteína de origem recombinante.

A mais alta autoridade internacional sobre os alimentos é o Codex Alimentarius, uma comissão de

FAO/WHO, reconhecida por 169 países. Esta Comissão se encarrega de estabelecer uma metodologia

que permite analisar a segurança alimentar em relação aos produtos derivados de microrganismos

geneticamente modificados

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C A P Í T U L O 16

BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

Será transgênico? Quantas vezes temos escutado essa pergunta, imbuída de desconfiança? A resposta

nem sempre é fácil porque o termo “transgênico” é aplicado, no dia a dia, com distinto sentido e em

contextos diferentes, aos alimentos geneticamente modificados (AGMs).

Mesmo aprovados pelas autoridades correspondentes, poucos AGMs são consumidos

diretamente: o milho, a batata inglesa e a berinjela resistentes a insetos, o feijão e a papaia resistentes

a vírus e o salmão de crescimento rápido. Os cultivos transgênicos biofortificados, como o arroz com

vitamina A (arroz dourado), ainda não foram aprovados.

--------------

FIGURA 16.1. O que é um transgênico?

(1) Feijão resistente a vírus, milho resistente a insetos, salmão de crescimento rápido; (2) Frango; (3) Queijos, Aspartame;

(4) Arroz dourado; (5) Óleo de soja; (6) Biscoitos e mistura para bolos.

1. Plantas e/ou animais

transgênicos, consumidos como

alimento

2. Animais alimentados com rações

preparadas com cultivos

transgênicos

3. Aditivos (conservantes, adoçantes,

modificadores de consistência,

complementos, enzimas etc.)

produzidos por microrganismos

transgênicos.

5. Produtos industrializados,

derivados de um cultivo

transgênico

6. Produtos industrializados, contendo

ingredientes provenientes de cultivos

transgênicos

4. Cultivos biofortificados

(transgênicos)

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BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

207

A maioria das rações dos animais de criação contém soja e milho transgênicos, isto é, tolerantes a

herbicidas e/ou resistentes a insetos. Sua aceitação é cada vez mais ampla, simplesmente porque a

quantidade de milho e soja convencional não é suficiente para alimentar os animais de criação.

O óleo de soja, utilizado na culinária, é extraído do grão de soja geneticamente modificado, sendo

considerado transgênico apesar de não conter DNA. Os alimentos industrializados podem conter

alguns componentes de origem transgênica (soja, milho), assim como substâncias produzidas por

microrganismos geneticamente modificados (enzimas, aditivos etc.).

Contudo, para a maioria das pessoas, as diferenças entre esses alimentos permanecem confusas e

o termo “transgênico” muitas vezes é utilizado em forma pejorativa (Figura 16.1).

A ENTRADA DOS TRANSGÊNICOS NA CADEIA ALIMENTAR

Basta olhar com atenção as naturezas-mortas dos quadros de pintores de séculos passados para

comprovar que os produtos expostos nas prateleiras dos supermercados pouco têm a ver com os

vegetais e animais de outrora.

Sem conhecimento nenhum das leis da hereditariedade, o homem selecionou as variedades que

lhe pareceram mais interessantes, por serem plantas mais produtivas, ter frutos mais saborosos etc.

Em princípios do século XX, a Genética deu embasamento científico ao melhoramento vegetal e animal

e, a partir da década de 1940, utilizaram-se a radiação e as substâncias mutagênicas para obter novas

variedades vegetais, com mais apelo para produtores e consumidores.

A seguinte revolução genética ocorreu na década de 1990, com a primeira onda de plantas

geneticamente modificadas: milho, soja, algodão e canola. Com traços de tolerância a herbicidas e/ou

de resistência a insetos e infecções virais, essas plantas mais produtivas geram mais lucros, sendo

aceitas rapidamente pelos produtores agrícolas de vários países.

Embora em alguns casos, como o milho, as novas tecnologias diminuíram as contaminações por

fungos e melhoraram a qualidade da matéria-prima, a percepção dos consumidores não identificou

vantagens diretas. Isso poderia explicar, em parte, a adoção de uma atitude negativa em relação aos

organismos geneticamente modificados.

MELHORANDO A CONSERVAÇÃO

Para despertar o interesse do consumidor seria necessário fornecer-lhe produto com qualidades que

o beneficiem diretamente, tais como uma melhor conservação dos frutos. Uma dessas tentativas foi a

produção de um tomate com maior durabilidade na prateleira.

O tomate amolece com o tempo, tendo que ser colhido ainda verde e transportado rapidamente

até o lugar de comercialização, onde a maturação é induzida com etileno. Inativando a enzima

responsável pelo amolecimento do fruto, o fruto permanece mais tempo na planta, ganhando cor e

sabor.

Gerado por tecnologia anti-sense, o primeiro AGM foi o tomate FlavSavr (Calgene Inc.), liberado

nos Estados Unidos em 1994 e descontinuado pouco tempo depois, devido a seu custo. Mais tarde,

outro tomate de maturação lenta ocupou esse nicho de mercado. Diferentemente do FlavSavr, este

tomate, que não é transgênico, teve uma expansão muito rápida, sendo comercializado em vários

países com diferentes nomes.

Dos AGMs que são consumidos diretamente, poucos foram comercializados: o milho resistente a

insetos (em numerosos países), a batata e a berinjela resistentes a insetos (esta última em Bangladesh)

e a papaia resistente a vírus, que, na década de 1980, salvara da falência os produtores do Havaí. Nos

Estados Unidos, já entraram no mercado as maçãs Arctic Granny e Arctic Golden (Okanagan Specialty

Fruits Inc.). Nas duas variedades foi silenciado o gene codificador da enzima polifenol oxidase, que

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causa o escurecimento das maçãs. Outro produto aprovado é a batata Innate (J.R.Simplot), uma marca

que se aplica a cinco variedades, geneticamente modificadas, para resistir ao míldio e formar menos

acrilamida na fritura.

MELHORANDO AS PROPRIEDADES INDUSTRIAIS

Outra forma de interessar o consumidor é melhorando algumas das propriedades dos alimentos

industriais: óleo de canola de composição adequada às frituras; trigo com características especiais para

a panificação; ou batata com mais amido para absorver menos gordura ao fritar.

Contudo, nem sempre a tentativa esteve acompanhada de sucesso. Um tomate com mais pectina,

desenvolvido por Zeneca Plant Science, a partir de variações genéticas detectadas em cultura de

tecidos, chegou a ser comercializado no Reino Unido, na década de 1990. Esse tomate era utilizado na

preparação de massa ou purê de tomate, com menos consumo de energia e menor necessidade de

aditivos (espessantes) que o fruto tradicional. O produto resultava mais econômico, para a indústria e

o consumidor, sendo vendido pela rede Sainsbury com bastante aceitação. No auge da campanha

contra os ALMs (Frankenfoods), o produto teve que ser retirado do mercado.

Recentemente aprovado nos Estados Unidos, o salmão AquAdvantage de crescimento rápido

poderia encontrar menos aceitação entre os consumidores que entre os aquicultores de outros países,

potenciais compradores de alevinos.

MELHORANDO AS CARACTERÍSTICAS NUTRICIONAIS

Uma terceira forma de chegar ao consumidor seria mediante produtos com melhores características

nutricionais: carne e leite com menos gordura, soja e batata com mais proteína, canola com vitamina

A, milho com metionina, mandioca e batata sem toxinas, camarão e amendoim sem substâncias

alergênicas etc.

Também seriam bem-vindos alimentos com melhores propriedades organolépticas, tais como

pimentões e melões com mais aroma, ou cebolas que não façam chorar. O consumidor também

poderia ser atraído por alimentos com componentes biologicamente ativos, como os antioxidantes do

chá verde ou as substâncias capazes de diminuir o colesterol do alho e da cebola.

Contudo, os casos analisados a seguir indicam que o problema pode ser muito mais complexo.

O arroz é uma planta que não produz vitamina A. Na Ásia, onde este constitui a base da

alimentação, a deficiência vitamínica mata 1 milhão de pessoas por ano e causa cegueira irreversível

em outras 500.000. Um grupo de pesquisadores, liderado por I. Potrykus, obteve, na Suíça, mediante

a transferência de genes do narciso, um arroz (Golden Rice) com a capacidade de sintetizar o ß-

caroteno, que é um precursor da vitamina A.

O projeto, que interessa mais os pobres que os ricos, contou com subvenções privadas, e várias das

grandes corporações cederam as suas patentes. Apesar de estar pronto desde 1999, o Golden Rice

ainda não chegou ao mercado, tais os empecilhos legais encontrados pelos grupos contrários aos

transgênicos, que adiam sua distribuição. Se o arroz dourado tivesse sido obtido por vias

convencionais, estaria no mercado desde 2003.

Bem diferente é o caso da soja Vistive® (Monsanto), que reúne um traço transferido por técnicas

de melhoramento convencionais (baixo teor de ácido linolênico) e um traço de origem transgênica

(tolerância ao herbicida Roundup). Com 60% menos de gordura saturada, o produto representa um

passo adiante na prevenção de doenças cardiovasculares e de altos níveis de colesterol. Lançado no

mercado norte-americano em 2005, empresas como Kellog e Cargill o utilizaram logo na preparação

de alimentos com melhor qualidade nutricional. Por se tratar de um nicho promissor, outras

variedades com alterações no tipo de ácidos graxos estão a caminho (Soymega™, com mais Ômega 3).

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BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

209

A FAVOR OU CONTRA?

O homem não se alimenta exclusivamente por motivos fisiológicos. Escolhem-se os alimentos em

função da satisfação sensorial, emocional e afetiva que se espera obter, sendo determinante o peso

das considerações econômicas. A seleção dos alimentos ocorre dentro de uma tradição sociocultural,

que inclui a noção do que é saudável, um conceito mal definido e cambiante.

Por essas razões, a pergunta do título banaliza uma questão complexa e reflete a falta de consenso

sobre o tema. Seja qual for a resposta, ela estará atrelada ao momento histórico que vivemos e às

nossas concepções políticas, econômicas e sociais. Nossa atitude depende da confiança depositada no

conhecimento científico e no progresso tecnológico, em função da qual os novos alimentos serão

vistos como produtos interessantes ou como uma ameaça.

Apesar da subjetividade que rodeia a questão, alguns dados precisos ajudam a compreender

melhor a origem e os alcances da polêmica. Em 1996, culmina na Europa a crise da “vaca louca”. Em

1997, a União Europeia aprova o milho resistente à broca de Novartis, portador de um gene marcador

de resistência a ampicilina. Em 1999, estoura na Bélgica o escândalo dos frangos contaminados por

dioxinas. No mesmo ano, A. Pusztai faz uma comunicação mediática sobre a toxicidade de batatas

transgênicas (não comerciais) em ratos, que nunca foram confirmadas. Seja como for, a percepção

pública é de insegurança alimentar, possibilitando a formação de uma oposição feroz.

De um lado, estavam as empresas de biotecnologia, ligadas a poderosos conglomerados

multinacionais e com interesses econômicos muito bem definidos. Do outro, as redes de distribuição

de alimentos (Carrefour, Mark & Spencer), associadas aos ambientalistas (Greenpeace, Friends of

Earth) e aos produtores agrícolas (Confédération Paysanne). Com uma bem-sucedida campanha de

marketing (“não queremos frankenfood”), essas redes aproveitaram a oportunidade para impulsionar

seus próprios produtos e lançar suas próprias marcas.

Sem argumentações baseadas em princípios científicos, a discussão acirrou o enfrentamento entre

partidários e oponentes dos AGMs. Os termos progressista e reacionário foram usados

indiscriminadamente por ambos os grupos, esquecendo que o dissenso e a discussão fazem parte das

sociedades democráticas. Infelizmente, nessa campanha, queimaram-se comércios, laboratórios de

pesquisa e campos com cultivos experimentais.

Os fatos continuam sendo preocupantes porque, se nos países ricos da União Europeia não faltam

alimentos, e a escolha de uma tecnologia pode depender de considerações econômicas ou ideológicas,

nos países mais pobres, a adoção ou rejeição de uma tecnologia é uma decisão que pode ter

gravíssimas consequências para sua população, condenando-a inclusive à fome. Na Zâmbia (2002) e

em Angola (2004), os governos rejeitaram o milho, enviado como ajuda humanitária para alimentar a

população, argumentando que era transgênico. Outros países africanos também chegaram a proibir a

importação de AGM (Malaui, Moçambique e Zimbábue).

O QUE O CONSUMIDOR PRECISA SABER

A NOÇÃO DE SEGURANÇA

A noção de segurança alimentar costuma ser bastante flexível. Quando introduzida na Europa, a batata

foi vista como um alimento perigoso. A pasteurização do leite teve opositores ferrenhos,

argumentando que alteraria a qualidade de um alimento saudável. O amendoim é considerado seguro,

mas pode não sê-lo se estiver contaminado com fungos. Muitas pessoas são alérgicas ao kiwi,

introduzido recentemente no Ocidente. Algumas pessoas continuam ingerindo gorduras em

quantidade, mesmo sabendo que são perigosas.

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Todos os AGMs comercializados atualmente foram devidamente analisados, e aprovados, no país de

origem. Milhões de consumidores os consomem há duas décadas, entre norte-americanos,

canadenses, sul-africanos, brasileiros, argentinos e chineses. E vários Comitês Científicos, Prêmios

Nobel, Academias de Ciências e organizações internacionais concluíram que os AGMs disponíveis são

tão seguros quanto os alimentos tradicionais.

Porém, frente a uma intensa propaganda e recebendo opiniões contraditórias, o consumidor

consciente acaba sentindo-se inseguro sobre várias questões.

A INGESTÃO DE DNA

A ingestão de DNA, per se, não é perigosa. Este é um componente de nossos alimentos: um tomate

tem 7mg de DNA, uma banana, 50 mg, e um sanduíche, 60 mg. Esse DNA é digerido normalmente,

junto com os outros componentes dos alimentos.

Em relação ao AGM, calcula-se que uma vaca de 600 kg consumindo uma ração composta por milho

geneticamente modificado, ingeriria 600 mg de DNA por dia, dos quais 1,5 mg seria DNA

recombinante, o que corresponde a 0,00024% do DNA ingerido diariamente na ração, uma proporção

muito baixa.

Até o momento, não há evidência alguma de transferência do DNA ingerido ao homem. Alguns

fragmentos muito pequenos e degradados de DNA podem ser encontrados no plasma sanguíneo e no

espaço intercelular. Denominado cfDNA (do inglês, cell-free DNA), sua origem são as células dos

alimentos digeridos no intestino e as células mortas dos tecidos em redor. Esses pequenos fragmentos

do cfDNA não entram nas células; se isso acontecesse, ter-se-iam encontrado sequências de nossos

alimentos integradas no genoma.

OS MARCADORES DE RESISTÊNCIA A ANTIBIÓTICOS

Tampouco temos evidências de transferência in vivo do DNA ingerido aos microrganismos do intestino.

Porém, os estudos in vitro indicam que, mesmo em uma frequência extremamente baixa, essa

transferência poderia ocorrer.

Apesar de sabermos que, se uma bactéria tivesse se tornado resistente, sua implantação no trato

digestório só poderia ocorrer na presença do antibiótico como agente seletivo, a utilização de

marcadores de resistência a antibióticos no transgene é uma crítica razoável (Figura 16.2).

--------------

FIGURA 16.2. A estrutura de um transgene

Para garantir a seleção e a expressão da sequência codificadora que será transferida, deve-se construir em redor uma

estrutura complexa que, além de um promotor e uma sequência terminal, inclui um gene marcador.

Gene marcador Promotor Transgene Sequência terminal

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BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

211

Geralmente, os marcadores utilizados são antibióticos sem uso clínico, e para os quais já se encontrou

resistência nas bactérias intestinais, de maneira que a transferência do marcador não mudaria a

situação. Considerando que já existe a tecnologia apropriada, a recomendação das agências

internacionais é de substituir ou eliminar esse tipo de marcadores. Alguns produtos, como o milho

MON810 (YieldGard, Monsanto) e o milho LY038 (Renessen LLC), já não levam marcadores seletivos.

A COMPOSIÇÃO QUÍMICA

Em relação aos produtos comercializados, o AGM tem a mesma composição química e o mesmo valor

nutritivo que o alimento convencional equivalente. No caso de um AGM que sintetize uma vitamina

extra, por exemplo, a situação é diferente e não pode ser considerado igual ao alimento convencional,

sendo necessários estudos adicionais.

A PRODUÇÃO DE TOXINAS

Outra preocupação diz respeito à produção eventual de toxinas. Sabe-se que, para sua defesa, as

plantas sintetizam substâncias químicas que podem ser tóxicas para o homem ou os animais. Uma

delas é a toxina do Bacillus thuringiensis que, por ser prejudicial para os insetos e inócua para o

homem, é utilizada sem problemas nas lavouras orgânicas, há mais de 50 anos.

Normalmente, a presença de uma toxina é investigada mediante ensaios biológicos em diversas

espécies de animais, alimentados durante um tempo com o produto transgênico. Os ensaios são

complementados com estudos de anatomia patológica. A avaliação toxicológica dos AGMs

comercializados não detectou efeitos adversos.

A PRODUÇÃO DE ALÉRGENOS

As alergias alimentares caracterizam-se pela hipersensibilidade a uma ou mais proteínas, que

desencadeiam reações diversas, tais como urticária, vômito ou diarreia. Sua incidência é de 1-2% em

adultos e 5% em crianças, sendo provocadas principalmente por trigo, leite de vaca, ovos, peixe,

amendoim e soja.

A transgênese ou a edição de genes poderão vir a melhorar a qualidade dos alimentos, se forem

utilizadas como ferramentas para eliminar substâncias sabidamente alergênicas dos alimentos. Mas

não é essa a preocupação do consumidor; seu o temor é que o transgene sintetize alguma proteína

capaz de desencadear alergias.

Uma mesma proteína pode ser inócua para uma pessoa e alergênica para outra, sendo impossível

prever o efeito que ela terá em uma terceira. Entretanto, sabendo que alguns alimentos são mais

alergênicos que outros, deve-se ter cuidado em relação à origem do transgene. Um projeto citado

frequentemente é o da transferência à soja de um gene da castanha-do-pará, com o objetivo de

melhorar suas qualidades nutritivas. Porém, frente à possibilidade de induzir reações alérgicas, em

pessoas sensíveis à castanha-do-pará, o projeto foi descontinuado sem que essa soja saísse do

laboratório.

É sabido que o risco de uma proteína ser alergênica aumenta se esta apresentar determinadas

sequências de aminoácidos, se ela se degradar lentamente no tubo digestivo ou se permanecer estável

durante o processamento industrial. Estas características são passíveis de estudos, havendo diretrizes

internacionalmente aceitas para a avaliação de alergenicidade. Complementa-se a informação

mediante análises laboratoriais com os anticorpos de pessoas sensibilizadas e, também, mediante

testes em animais, capazes de desenvolver alergias aos mesmos tipos de alimentos que os seres

humanos.

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212

Em 2000, o milho Star Link (2000), liberado nos Estados Unidos para compor rações animais,

contaminou tortillas e tacos destinados ao consumo humano. Nenhuma das denúncias de alergia à

proteína correspondente fora confirmada, mas restou uma lição bem clara em relação à

biossegurança: não se pode liberar um cultivo para ração se este for inadequado para seres humanos.

O risco de alergenicidade dos AGMs comercializados até agora não é maior que o dos alimentos

convencionais. Observe-se que esses alimentos passaram por testes que nunca foram aplicados no

arroz, no milho, na batata ou no kiwi, uma fruta introduzida recentemente no Ocidente e que provou

ser altamente alergênica.

O RISCO DE CÂNCER

Recentemente, o pesquisador francês G-E. Séralini (2012) noticiou ter detectado tumores em ratos

alimentados com milho geneticamente modificado. Devido a erros no desenho experimental e ao uso

de uma linhagem de ratos, especialmente selecionada para o desenvolvimento de tumores, o artigo

de Séralini teve que ser retirado, em 2013, da revista Food and Chemical Toxicology. Em 2014, o

trabalho de Séralini foi publicado novamente em outra revista (Environmental Sciences Europe).

O posicionamento prévio de Séralini em relação aos transgênicos, assim como sua relação com

organizações interessadas economicamente no banimento dos ALMs, são públicos. É lamentável que,

mesmo totalmente desqualificados pela comunidade científica, esses trabalhos sejam citados como

“prova” do perigo das rações e dos alimentos transgênicos.

A UTILIZAÇÃO DE UM PROMOTOR VIRAL (CaMV)

Na construção de um transgene, colocam-se sequências promotoras para determinar quando, onde e

como irá se expressar a proteína codificada. Alguns pesquisadores manifestaram sua preocupação com

a utilização do promotor do vírus do mosaico da couve-flor (CaMV), considerando que sua

transferência horizontal de uma planta transgênica às células do aparelho digestório poderia ativar

outros genes não virais (oncogenes).

Essa preocupação não tem maiores fundamentos, dado que o promotor CaMV é detectado em 14

a 25% da produção de canola, de couve-flor e de repolho convencionais, sendo ingerido pelo homem

em quantidades consideráveis, faz décadas, e sem nenhum efeito reconhecido.

OUTROS EFEITOS

A inserção de várias cópias gênicas em diferentes lugares do genoma poderia gerar a ativação ou

desativação de outros genes, gerando no organismo geneticamente modificado algum tipo de

alteração que não fora previsto. Até agora, não fora registrado nenhum efeito deste tipo nos produtos

comercializados, e os avanços tecnológicos (sequenciamento, microarrays) permitem excluir essa

possibilidade.

PERSPECTIVA HISTÓRICA

Nem os alimentos convencionais, incluídos os orgânicos, nem os que foram obtidos por por radiação

ou técnicas genéticas clássicas passam por uma avaliação de risco antes de ser oferecidos ao

consumidor. Só os AGMs que chegaram a nossa mesa foram devidamente analisados pelas

autoridades correspondentes e trilhões de refeições consumidas por milhões de pessoas em diferentes

países, durante duas décadas, incluíram algum componente transgênico, sem que fosse registrado um

único incidente.

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BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

213

COMO GARANTIR A SEGURANÇA ALIMENTAR?

O PRINCÍPIO DE EQUIVALÊNCIA SUBSTANCIAL

Antes de comercializar um alimento transgênico, avaliam-se os riscos que este apresenta para os seres

humanos, os animais e o ambiente.

Assim como não há cidade segura, há cidades mais seguras que outras. O conceito de segurança se

estabelece sempre em relação a algum marco de referência. Quando se trata de segurança alimentar,

o referencial é o alimento já conhecido e consumido habitualmente. Por isso, antes de chegar ao

mercado, os aditivos, os conservantes e os corantes convencionais novos estão sujeitos à aprovação.

Assim como qualquer novo ingrediente de origem biotecnológica.

Um alimento originado por biotecnologia moderna é tão seguro para o consumo quanto um

alimento que tenha a mesma composição, as mesmas características nutritivas e um histórico de uso

seguro. Esse é o denominado princípio de equivalência substancial, admitido por numerosas

organizações internacionais como FAO (Food and Agriculture Organization), WHO (World Health

Organization), OECD (Organization for Economic Cooperation and Development), ILSI (International

Life Science Institute). O princípio dá toda a importância ao produto final e não à tecnologia aplicada

para sua obtenção.

A AVALIAÇÃO DE RISCOS

Não é possível dizer que “todos os alimentos transgênicos são seguros”, nem se “este alimento

transgênico é seguro”. Só podemos afirmar que “os alimentos transgênicos podem ser seguros ou

não”, e que “determinado alimento transgênico é tão seguro quanto o seu equivalente”. A análise terá

que ser feita caso a caso.

Por exemplo, o amido de uma batata resistente a vírus é idêntico ao amido de uma batata qualquer.

Porque o amido é um carboidrato purificado, sem DNA nem proteína da planta da qual foi extraído. O

mesmo raciocínio pode ser feito em relação ao óleo de canola ou de soja. Já no caso da torta de soja

ou da espiga de milho, os genes inseridos sintetizam proteínas, e ambos se encontram no produto

final, por conseguinte, deve-se analisar se estes podem ter algum efeito no organismo que os ingere.

Todos os parâmetros anteriormente citados terão que ser avaliados: a construção do transgene, os

efeitos devidos à presença do transgene (eventualmente, substâncias tóxicas ou alergênicas), o valor

nutritivo e, também, os efeitos não previstos devidos à presença do transgene. E como em dois

organismos, o mesmo gene pode ser inserido em diferentes lugares e de diferentes modos, cada

evento deverá ser analisado separadamente.

Essa metodologia, denominada análise de risco de alimentos geneticamente modificados para a

saúde humana, garante que o alimento, e quaisquer substâncias que resultem da modificação

genética, seja tão seguro quanto seu análogo convencional.

A ROTULAGEM DOS ALIMENTOS

Não há no momento um consenso em relação aos rótulos: em alguns países não há nenhuma

regulamentação, em outros se adota o rotulado voluntário ou se estabelecem normas rígidas.

Nos Estados Unidos, o sistema está baseado na responsabilidade da indústria e na avaliação de

várias agências federais, cabendo à FDA (US Food and Drug Administration) a avaliação da segurança

alimentar das novas variedades (vegetais, laticínios, peixes, frutos de mar e aditivos) e à USDA (US

Department of Agriculture) a regulação dos produtos cárneos e avícolas, além dos testes de campo de

todas as plantas geneticamente modificadas. Tendo a responsabilidade pelo uso de pesticidas

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químicos, corresponde à EPA (Environmental Protection Agency) a aprovação das plantas

geneticamente resistentes a pragas.

Aproximadamente 20 das variedades transgênicas cultivadas estão autorizadas para o consumo

humano, nos Estados Unidos. Não são rotuladas, a menos que o valor nutricional do alimento tenha

sido alterado, como no caso do óleo Vistive, ou se tiver sido incorporada alguma substância capaz de

produzir alergias. A experiência de mais de uma década de consumo de alimentos transgênicos

confirma que estes são equivalentes aos alimentos convencionais. Apesar de alguns grupos ativistas

terem manifestado sua oposição aos alimentos transgênicos, isto não tem afetado a estabilidade do

sistema de avaliação.

Assim como nos Estados Unidos, na Argentina e no Canadá a rotulagem não é obrigatória.

Na União Europeia, rege o princípio de precaução. Como o que importa é o processo seguido na

produção do alimento, a legislação de 2004 manda rotular todos os produtos de origem transgênica,

destinados à alimentação humana ou animal. A regulamentação é extensiva a cantinas e restaurantes.

Também é obrigatório o rótulo nos alimentos que contenham mais de 0,9% de material geneticamente

modificado, incluindo rações, óleos vegetais, sementes etc.

Por outro lado, a legislação europeia considera que, sendo auxiliares de transformação, não há

necessidade de rotular alimentos e bebidas preparados com substâncias produzidas por OGM, se estes

ou seus resíduos não estiverem presentes no produto final. Tampouco são rotulados os produtos

provenientes de animais alimentados com rações transgênicas (carne, leite, ovos) nem o mel de

abelhas alimentadas com néctar de flores de plantas transgênicas.

Japão, Coreia do Sul e Rússia rotulam os alimentos a partir de um limite percentual de 5%.

O objetivo destas medidas é garantir a escolha do consumidor e a rastreabilidade dos transgenes

ao longo da cadeia alimentar. O rótulo indica "este alimento contém organismos geneticamente

modificados" ou "produzido a partir de (nome do organismo) geneticamente modificado".

No Brasil, o Decreto 4.680 (24/4/2003) determina que, a partir de abril 2004, todos os produtos

com mais de 1% de ingredientes transgênicos sejam rotulados, com um símbolo específico de tamanho

maior a 1 cm2, um triângulo com uma letra T inserida dentro (Figura 16.3).

RÓTULO E INFORMAÇÃO

Quando se trata de escolher entre dois alimentos, basta recorrer à nossa percepção sensorial ou,

ainda, à nossa experiência pessoal. Nenhuma das duas permite reconhecer a presença de ingredientes

transgênicos, ou de origem transgênica, nos alimentos. Em função da resistência de alguns grupos de

consumidores, a rotulagem pareceria a saída mais lógica para informar de maneira honesta, exata e

completa sobre os produtos das prateleiras.

--------------

FIGURA 16.3. O símbolo de transgênico adotado no Brasil.

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BIOTECNOLOGIA E NOVOS ALIMENTOS

215

Vimos no Capítulo 13 que os produtores de sementes comerciais admitem como aceitável uma

contaminação de 1% entre as variedades convencionais. Essa contaminação também é inevitável,

quando coexistem plantações transgênicas e convencionais. Por conseguinte, o limite de 1% redefine

o nível de pureza de um ingrediente de origem vegetal, admitindo-se que todo valor inferior a esse

limite pode ser o resultado de uma contaminação acidental.

Sendo assim, o consumidor pode comprar um produto com mais de 1% de ingredientes

transgênicos ou um produto convencional cuja composição conta mais de 99% de ingredientes não

transgênicos. Em outras palavras, o rótulo não garante ao consumidor a ausência de transgênicos.

Finalmente, cabe refletir sobre o significado de um rótulo para a maioria dos consumidores, e se a

escolha entre um produto e outro não dependerá essencialmente do preço e do marketing. Somente

o processo educativo pode dar à população os elementos básicos para formar uma opinião informada

e responsável e fazer suas escolhas.

O RASTREAMENTO DE UM TRANSGENE

Em um mundo globalizado, a variedade de regulamentos e de modalidades de rotulagem é um fator

de complicação das transações comerciais, em que a qualidade de um produto pode ter que ser

definida em relação à presença ou ausência de um transgene.

A aceitação dos transgênicos varia de um país para outro e, também, entre diversos grupos de

consumidores. Por isso é importante contar com formas de rastreamento como a técnica da PCR

(reação em cadeia da polimerase), que pode ser aplicada em diferentes modalidades:

o Testes qualitativos, para reconhecer a presença ou ausência do transgene.

o Testes semiquantitativos, em que a presença ou ausência do transgene é determinada em função

de um limite como 1%, por exemplo.

o Testes quantitativos, que fornecem informação sobre a quantidade do transgene por comparação

com amostras de referência com concentrações conhecidas. A técnica permite identificar DNA

exógeno em uma quantidade de 0,1% (1 grama em 1 quilograma), mas algumas variantes

extremamente sensíveis reconhecem a presença de 0,001% do transgene.

Observe-se que, para aplicar estes testes, se precisa de informação sobre as sequências do transgene.

Uma forma de simplificá-los seria a inclusão, em todas as construções genéticas, de uma sequência

conhecida. Esta funcionaria como uma etiqueta molecular, facilitando a identificação de qualquer

transgene.

Por outro lado, nem sempre a PCR é informativa. Em amostras de grãos ou alimentos processados,

o DNA pode estar quase totalmente degradado. Nesse caso, é necessário saber quais as

transformações que o produto sofreu e estabelecer protocolos adequados. Existem métodos

imunológicos (Western Blot, ELISA) que permitem detectar a proteína sintetizada pelo transgene e,

eventualmente, estimar a quantidade presente. Contudo, o custo de todos esses testes será pago pelo

consumidor.

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BIOTECNOLOGIA: ENSINO E DIVULGAÇÃO (http://bteduc.com)

C A P Í T U L O 17

BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

AS DOENÇAS INFECCIOSAS

O desenvolvimento da agricultura aumentou a disponibilidade de alimentos, sustentando populações

mais densas e sedentárias. O contato com os animais domesticados, por favorecer a evolução e a

passagem dos germes ao homem, estaria na origem de doenças como a varíola, o sarampo, a

coqueluche, a tuberculose e a gripe.

Uma vacina é um produto destinado a estimular o sistema imune, de maneira a prevenir ou

controlar uma infecção. No século XIX, mais de 80% das crianças morriam de doença antes dos 10 anos

de idade. Hoje, programas de vacinação sistemática as imunizam contra tuberculose, hepatite B,

poliomielite, difteria, tétano, coqueluche, meningite, sarampo, rubéola, caxumba e infecções por

rotavírus e pneumococos.

Nos dois séculos que nos separam de Jenner, o descobridor da primeira vacina antivariólica, temos

alcançado o sucesso na prevenção de um bom número de doenças infecciosas. A vacinação chega às

crianças e aos grupos de pessoas sujeitos a maiores riscos, como as mulheres (sarampo e rubéola), os

maiores de 60 anos (gripe, pneumonias) e os profissionais de saúde (hepatite B, antraz). Também

resguarda os residentes em determinadas áreas e os viajantes (febre amarela). A vacinação dos

animais os protege das doenças e quebra o elo de transmissão ao homem.

A melhora das condições econômicas de uma população repercute na saúde da mesma e,

inversamente, a diminuição da incidência de doenças com suas sequelas de invalidez ou morte

prematura dá às pessoas a possibilidade de melhorar suas condições de vida. O custo de implantação

de um sistema de vacinações é baixo, porque a proteção atinge não só a pessoa que as recebe como

as que entram em contato com ela.

Em uma variante do velho ditado “prevenir é melhor que curar”, a WHO (Organização Mundial da

Saúde; do inglês, World Health Organization) ressalta que o maior impacto na área de saúde é

conseguido com água limpa e vacinas. Lamentavelmente, ainda morrem anualmente dois milhões de

crianças de doenças porque as vacinas existentes não chegam até elas, devido aos conflitos armados

e à dificuldade de acesso aos centros de saúde. E ainda não temos vacinas para doenças como a

tuberculose, a malária ou o HIV/AIDS.

A AQUISIÇÃO DE IMUNIDADE

Um antígeno é uma substância que estimula a produção de proteínas específicas (anticorpos) capazes

de se ligar a ele. Microrganismos infecciosos, suas moléculas e substâncias químicas são antígenos,

assim como as células de um organismo transplantadas a outro, o pólen, pelos de animais e certos

alimentos nas pessoas sensibilizadas.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

217

No primeiro contato com um antígeno, o organismo reage com uma resposta imunológica primária de

intensidade baixa e curta duração, acompanhada de alguns sintomas como febre, dor de cabeça,

erupção cutânea. Essa primeira resposta facilita a eliminação do antígeno estranho e a produção de

células de memória. Em um segundo contato, a resposta imunológica envolverá numerosas células e

moléculas e será rápida, intensa e duradoura (Figura 17.1).

Todo patógeno é um antígeno estranho e, como tal, será detectado pelo sistema imune quando

penetrar no organismo. A resposta envolverá uma ação humoral e uma ação mediada por células,

coordenadas por diversos componentes do sistema imunológico. As duas formas de ação dependem

das características do ataque do patógeno: o pneumococo se multiplica nos pulmões, o bacilo do

tétano produz uma toxina letal, o bacilo de Koch e todos os vírus parasitam as células.

No caso de uma bactéria ou de uma toxina, os anticorpos específicos produzidos pelos linfócitos B

reconhecem os microrganismos ou as toxinas circulantes, dando início a sua destruição. Os vírus e

algumas bactérias demandam outro tipo de combate, porque, ao invadir as células, ficam protegidos

dos anticorpos. A célula infectada será destruída pelos linfócitos T matadores (também chamados Tc,

do inglês T citotoxic), que reconhecem uma combinação das proteínas celulares com algumas

proteínas do invasor, expostas na superfície celular.

Tanto a ação humoral como a ação mediada por células dependem da participação dos linfócitos

auxiliadores Ta, também chamados Th (do inglês, T helpers), que reconhecem o antígeno e produzem

moléculas que estimulam a proliferação das células B e T. Finalizada a resposta primária, algumas

células de memória (B, T) permanecerão no sistema, possibilitando a aceleração dos mecanismos de

defesa em ocasião de um segundo contato com o antígeno (Figura 17.2).

--------------

FIGURA 17.1. As respostas primária e secundária do organismo

Intensidade da

resposta imune

1 2 3 4 5 6 7 8

Primeiro contato com o patógeno (antígeno)

Segundo contato com o patógeno (antígeno)

Semanas

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Uma vacina é um produto destinado a ensinar o sistema imune a reconhecer determinado patógeno

e impedi-lo de desencadear uma infecção ou uma doença. A vacina prepara os mecanismos de defesa,

em previsão de um segundo contato, desta vez com o patógeno original.

A vacinação estabelece o primeiro contato do organismo com um patógeno que, estando

incapacitado para causar a doença, conserva sua identidade molecular e a capacidade de induzir uma

resposta imune. As vacinas estimulam a imunidade humoral, a imunidade mediada por células ou,

preferentemente, ambas ao mesmo tempo.

--------------

FIGURA 17.2. A memória imunológica

--------------

OS DIFERENTES TIPOS DE VACINAS

AS VACINAS TRADICIONAIS OU DE PRIMEIRA GERAÇÃO

AS VACINAS DE PATÓGENOS VIVOS ATENUADOS

Nestas vacinas, os patógenos vivos são cultivados em diferentes meios e/ou passam por vários

tratamentos físicos (temperatura, pressão e pH), de modo a selecionar mutantes que, apesar de ter

perdido a patogenicidade, conservem a capacidade de induzir uma resposta imune intensa e

duradoura, que envolva ambas as vias, a humoral e a celular.

Estas vacinas são muito eficientes já que, salvo em caso de imunização por via oral, basta uma única

dose para obter a imunidade desejada. Contudo, elas apresentam alguns inconvenientes. Além de

serem inadequadas para as pessoas imunodeprimidas, existe o risco de uma forma atenuada reverter

para uma forma ativa. Outra desvantagem é a necessidade de conservá-las refrigeradas, mantendo

uma cadeia de frio.

Utilizam-se na prevenção de doenças de origem viral, como a febre amarela, o sarampo, a rubéola,

a caxumba e a poliomielite (Sabin ou OPV, do inglês oral polio vaccine). A vacina contra a tuberculose

é a única preparada com uma bactéria viva, o bacilo de Calmette-Guérin ou BCG.

Linfócitos T citotóxicos Linfócitos T auxiliadores Linfócitos B

Antígeno

Detectado por células que ativam os diferentes tipos de linfócitos

Neutralizam ou marcam o antígeno dando início a sua eliminação

Síntese de anticorpos

Eliminam as células infectadas

Células de memória

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

219

AS VACINAS DE PATÓGENOS MORTOS E DE TOXOIDES

Estas vacinas incluem microrganismos mortos ou toxinas inativadas (toxoides) por procedimentos

físicos ou químicos. Conferem uma resposta imune de tipo humoral pouco intensa ou duradoura, pelo

que se devem administrar várias doses e, mais tarde, manter a imunidade com doses de reforço.

Requerem, também, a introdução de substâncias coadjuvantes para estimular a resposta imune.

Apesar de ser estáveis e não depender da cadeia do frio, estas vacinas devem ser modificadas

frequentemente para se adaptar aos sorotipos bacterianos patogênicos, que são muito variáveis. Além

de vacinas de toxoides contra a difteria e o tétano, existem vacinas de microrganismos mortos contra

a cólera, a gripe, a hepatite A, a peste, a poliomielite (vacina Salk) e a raiva.

AS NOVAS VACINAS OU DE SEGUNDA GERAÇÃO

A chegada da engenharia genética revolucionou o campo das vacinas ao permitir a produção de

antígenos de tipo proteico em microrganismos transformados, que podem ser cultivados sem riscos

em um fermentador (Escherichia coli, Saccharomyces cerevisiae, Picchia pastoris).

Devem-se à tecnologia do DNA recombinante (Figura 17.3), as vacinas contra a hepatite B (HBV) e

contra o papiloma humano (HPV). Outro benefício é o desenvolvimento de vacinas veterinárias DIVA

(do inglês, Differentiate Infected from Vaccinates Animals), que permitem distinguir um animal

vacinado de outro doente.

AS VACINAS DE SUBUNIDADES DE ANTÍGENOS

Nestas vacinas se colocam, em vez do microrganismo todo, só um a 20 antígenos da superfície celular,

capazes de induzir a resposta imune. Demandam um longo trabalho de pesquisa prévia para

determinar quais os melhores antígenos (subunidades) que deverão ser incluídos na vacina e precisam

de substâncias coadjuvantes para estimular a imunidade.

Por não levar mais que fragmentos do microrganismo, estas vacinas não apresentam os riscos das

vacinas de microrganismos vivos e independem da cadeia do frio. Existem vacinas de subunidades

contra a influenza ou gripe, a doença de Lyme, a hepatite B, a coqueluche e a pneumonia.

--------------

FIGURA 17.3. A utilização da tecnologia do DNA-recombinante na vacina contra a hepatite B

Síntese do antígeno

Vírus HBV

Gene codificador do antígeno de superfície HBsAg

Levedura transformada

Vacina

Levedura

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AS VACINAS CONJUGADAS

Alguns microrganismos (pneumococos, meningococos) protegem-se com uma cápsula de

polissacarídeos, que dificulta sua identificação pelo sistema imune, ainda imaturo, de uma criança. As

novas tecnologias possibilitam a associação de um toxoide às subunidades de polissacarídeo, de

maneira a estimular a resposta imune e o reconhecimento dos antígenos capsulares.

Estas vacinas de antígenos conjugados são utilizadas na imunização contra o Haemophilus

influenzae B (meningite) e o Streptococcus pneumoniae ou pneumococo. As vacinas contra este último

devem ser modificadas frequentemente, adicionando outros antígenos capsulares das mais de 80

linhagens que causam pneumonia em seres humanos.

AS VACINAS VETORIZADAS

Outro tipo interessante de vacinas são as vetorizadas, em que o gene codificador do antígeno é

transferido a um microrganismo inócuo (bactéria ou vírus) que age como vetor. Ao infetar o

hospedeiro, ele se multiplica e começa a produzir o antígeno, induzindo uma resposta imune contra o

patógeno. Com uma vacina deste tipo imunizam-se as raposas, atualmente um dos principais elos na

transmissão de raiva na Europa.

Em um segundo tipo de vacinas vetorizadas, o vetor não se multiplica no hospedeiro. Agindo como

uma seringa molecular, ele introduz, na célula, o gene codificador do antígeno. Um vetor deste tipo, o

canarypox, que se multiplica em aves, exclusivamente, é utilizado na vacinação contra as doenças de

Marek e Gumboro. Existem 12 vacinas vetorizadas para uso veterinário, mas nenhuma aprovada para

uso humano.

A ÚLTIMA GERAÇÃO

A tecnologia mais promissora parece ser a das vacinas genéticas, também denominadas vacinas de

DNA nu. Estas consistem de um plasmídeo com uma construção gênica que inclui o gene codificador

do antígeno. Injetado diretamente no músculo, o DNA irá penetrar nas células dendríticas,

apresentadoras de antígeno. Estas migrarão até os órgãos linfoides, onde sintetizarão o antígeno,

estimulando uma resposta imune de tipo celular que permitirá imunizar o hospedeiro.

Esta tecnologia teria uma vantagem fundamental, por ser um método genérico que facilita o

desenvolvimento e produção de novas vacinas (Figura 17.4). Estas poderão ser elaboradas

substituindo um gene por outro no cassete de expressão gênica, o que diminuiria os custos e o tempo

necessário para responder a uma emergência sanitária. Também se poderia conseguir uma

supervacina com vários genes codificadores de antígenos, capaz de imunizar o organismo contra várias

doenças simultaneamente. Por outro lado, as vacinas de DNA estimulam ambas as respostas, humoral

e mediada por células.

Na área veterinária, já foram aprovadas nos Estados Unidos vacinas de DNA contra o vírus IHNV,

causante da necrose hematopoiética em trutas e salmões; contra o vírus da doença do oeste do Nilo,

que ataca os equinos; contra o melanoma canino e para terapia gênica relacionada à liberação

hormonal do fator de crescimento em suínos.

Na área humana, ainda em fase experimental ou em testes clínicos, se encontram em andamento

várias vacinas deste tipo contra HIV/AIDS, malária, herpes, tuberculose, hepatite B, influenza, rotavírus

etc.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

221

FIGURA 17.4. Os diferentes tipos de vacinas

--------------

A PRODUÇÃO DE VACINAS

PESQUISA E DESENVOLVIMENTO

Para chegar a ser comercializada, uma vacina deve cumprir etapas sucessivas de pesquisa,

desenvolvimento e operações industriais, que podem demandar em média 12 anos de trabalho e

investimento.

A etapa exploratória tem uma duração de 2 a 4 anos e se inicia nas bancadas de um laboratório de

pesquisa, onde serão identificados os antígenos naturais ou sintéticos que podem prevenir ou tratar

uma doença.

Segue uma etapa pré-clínica de 1 a 2 anos de duração, que pode envolver pesquisadores de uma

indústria privada. Os experimentos são realizados em cultivos de células ou de tecidos e, a seguir, com

animais de laboratório (camundongos, cobaias e/ou macacos). Depois de comprovar sua capacidade

de imunizar um ser vivo, seleciona-se o melhor candidato vacinal. Os estudos também permitem obter

uma estimativa sobre a dose a ser aplicada em etapas posteriores e a forma de administrar a vacina.

A primeira fase dos estudos clínicos em seres humanos inicia-se em um grupo de 20 a 80 voluntários

adultos e deve ser realizada no pais de produção da vacina, mesmo quando o produto não se destine

a essa população. Os participantes são monitorados bem de perto, a fim de verificar a segurança

V. patogênico V. relacionado V. atenuado V. morto Subunidades Recombinante

Tipos de vacinas

Transfecção

Linfócitos B e T

Doença e recuperação

Imunidade adquirida (artificial)

Imunidade adquirida (espontânea)

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(toxicidade e farmacocinética) do candidato vacinal. Se a vacina for desenhada para crianças, os testes

devem ser iniciados com adultos e jovens.

A segunda fase envolve 80 a 300 pessoas e inclui alguns indivíduos da população alvo, isto é,

pertencentes aos grupos de risco de contrair a doença. Nesta fase os testes incluem um grupo placebo

e visam estudar a imunogenicidade e o efeito protetor da vacina (fase 2 a), isto é, sua eficácia por

exposição com inóculos padronizados do agente infeccioso. Também se avalia a relação dose-resposta

e sua eficácia por exposição natural à infecção em áreas de transmissão (fase 2b), assim como o melhor

calendário de vacinações e a forma de aplicação.

A terceira fase, que envolve milhares de pessoas, testa a eficácia do candidato vacinal em proteger

os indivíduos vacinados contra a doença e a ausência de fatores adversos que possam ter sido

inadvertidos em ensaios com uma amostra menor de pessoas. Testes randomizados, aplicados em

duplo-cego, permitem comparar o efeito da vacina experimental e o de um placebo, seja este uma

solução salina, outra vacina ou qualquer outra substância.

A duração total das três fases correspondentes aos estudos clínicos é de 6 a 8 anos para as vacinas

humanas. Se os resultados dos estudos clínicos não forem satisfatórios, será necessária a realização

de estudos adicionais, chegando, eventualmente, a interromper os estudos clínicos e proceder à

escolha de outro candidato vacinal. Contudo, uma vez comprovado que a vacina é segura e eficiente,

a indústria farmacêutica poderá solicitar aos órgãos competentes a licença para comercializar o

produto. Esta etapa dura de 12 a 18 meses.

A liberação da vacina marca o início do processo de manufatura e da fase de vigilância

farmacológica, um monitoramento amplo e rigoroso que coleta toda informação sobre algum efeito

adverso que possa ocorrer. Em 1999, por exemplo, uma primeira vacina contra o rotavírus teve que

ser retirada do mercado em consequência de alguns casos de intussuscepção relacionados com sua

aplicação.

As vacinas veterinárias passam pelas mesmas etapas, mas as exigências são menores. É possível

simplificar os testes com animais de laboratório e testar o candidato vacinal no animal para o qual é

destinado o produto. O número de indivíduos necessários para os testes clínicos também é menor.

O MARCO ÉTICO

As pesquisas com seres humanos e, por conseguinte, todos os testes clínicos, devem ser desenvolvidos

dentro do marco ético elaborado pelo tribunal de Nuremberg, por ocasião do julgamento de 20

médicos condenados como criminosos de guerra, devido aos brutais experimentos realizados com

prisioneiros durante a Segunda Guerra Mundial.

Segundo o Código de Nuremberg (1949), os experimentos em seres humanos devem visar o bem

da sociedade e ser levados a cabo por pessoas cientificamente qualificadas. Os participantes receberão

todas as explicações necessárias, antes de dar livremente o seu consentimento. As experiências serão

a continuação de outras que, realizadas em modelos animais, permitam prever um resultado tal que

justifique a inclusão de testes em seres humanos. O sofrimento mental e físico será evitado, e as

pessoas receberão proteção em caso de ocorrer algum efeito adverso.

Nos testes clínicos de avaliação de uma nova vacina, as pessoas participam voluntariamente e são

informadas sobre os riscos e benefícios de sua participação. Contudo, discute-se a validação do

consentimento informado quando os testes são realizados em populações de escassos recursos, com

baixos níveis de instrução.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

223

OPERAÇÕES INDUSTRIAIS

Na produção de vacinas, cada lote da vacina deve passar por controles estritos, a fim de garantir a

qualidade e manter a credibilidade não só da indústria, mas da própria vacinação. Aplicada

correntemente em vários países, a vacina Salk de vírus inativados é considerada hoje uma das vacinas

mais seguras. Porém, um problema na fabricação da vacina no Laboratório Cutter (Estados Unidos)

causou a inativação incompleta de algumas partículas virais e, duas semanas depois de liberada, em

1954, induziu 260 casos de pólio e 10 mortes.

Uma vacina deve reunir várias qualidades, principalmente eficiência, pureza, segurança e baixo

custo. O processo industrial varia em função do microrganismo utilizado e responde a critérios estritos

de qualidade (BPL ou Boas Práticas de Laboratório; BPF ou Boas Práticas de Fabricação). Atualmente,

o controle de qualidade ocupa 70% do tempo dedicado à produção de uma vacina.

As bactérias multiplicam-se em biorreatores, em condições que dependem da produtividade do

próprio processo fermentativo e do tratamento posterior, para a extração de antígenos ou de toxoides.

Vacinas antibacterianas podem ser preparadas em grandes quantidades, com equipamento

relativamente simples.

As proteínas recombinantes de vírus ou bactérias são produzidas em biorreatores, por leveduras,

ou em cultivos celulares. Ao processo de extração seguem-se várias operações de purificação por

técnicas complexas (ultrafiltração, cromatografia em coluna etc.).

Os vírus, parasitas obrigatórios, precisam de células para se multiplicar. Tradicionalmente, utilizam-

se pele de bezerro e ovos de galinha, mas a tendência atual é substituí-los por culturas celulares que

possibilitem o desenvolvimento de vacinas virais para uso humano (poliomielite, sarampo, rubéola,

influenza, caxumba, raiva) e veterinário (febre aftosa, raiva, encefalite equina, doença de Mareck e de

Newcastle etc.).

Além do antígeno, na formulação de uma vacina incluem-se outras substâncias: os adjuvantes, que

permitem dosagens menores por serem capazes de estimular a resposta imune; os estabilizantes, que

impedem as alterações devidas ao calor, à luz ou à umidade; os conservantes, nos frascos com doses

múltiplas.

Uma das tendências atuais na administração de vacinas é a redução do número de doses por

imunização simultânea, em uma mesma injeção, para várias doenças (tríplice viral ou tríplice

bacteriana). Também se dá preferência a sistemas que diminuam a necessidade de refrigeração, que

representa 15% dos custos dos programas de vacinação.

Outras novidades virão da procura de novas formas de aplicação para substituir o uso de seringas,

tais como pistolas, géis, adesivos cutâneos, cápsulas, tabletes, inaladores e sprays nasais. Estes últimos

começaram a ser utilizados na aplicação de vacinas contra a gripe (FluMist, nos Estados Unidos;

NasVax, em Israel). As vacinas orais têm importantes aplicações na área veterinária.

Plantas e animais transgênicos produtores de antígenos poderão revolucionar alguns aspectos da

produção de vacinas. A ideia de ter vacinas “comestíveis” e de poder vacinar as crianças com uma

banana em vez de uma injeção é muito sedutora. Contudo, alguns problemas de segurança exigem

atenção, como, por exemplo, o risco de se misturar bananas-vacina e bananas-alimento,

contaminando os alimentos ou dificultando o reconhecimento de um medicamento como tal.

Provavelmente, os antígenos serão extraídos e administrados em tabletes ou cápsulas.

Em 2005, Dow AgroSciences registrou nos Estados Unidos uma vacina para a doença de Newcastle em

aves, produzida na planta aquática Lemna. Encontra-se em andamento uma nova vacina contra a febre

amarela em plantas de tabaco, em um centro a ser implantado no Ceará, pela Fundação Oswaldo Cruz

(Fiocruz) em parceria com instituições dos Estados Unidos.

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O MERCADO DAS VACINAS

A produção de vacinas é uma atividade menos rentável que a produção de medicamentos. Contudo, a

chegada das novas tecnologias com base biológica despertou novamente o interesse do setor

farmacêutico. Atualmente, cinco grandes empresas (Merck, Pfizer, Sanofi-Pasteur, GlaxoSmithKline e

Novartis) concentram de 80% a 90% do mercado global de vacinas humanas, estimado em US$ 61

bilhões em 2020. O resto está ocupado por 200 a 250 empresas que desenvolvem mais de 600

produtos.

O processo de desenvolvimento de uma nova vacina leva em média 12 anos, a um custo que pode

variar entre US$ 300 milhões e US$ 1 bilhão. Alguns produtos, como a vacina antimeningococo Prevnar

(Pfizer), atingiram níveis de vendas que superam o bilhão de dólares anuais.

Estima-se que o mercado aumentará significativamente nos próximos anos, em função do

crescimento do setor adulto e, fundamentalmente, das vacinas terapêuticas, que serão analisadas no

Capítulo 20. Também aquecerão o mercado produtos novos, tais como as vacinas para a gripe

(influenza) e as vacinas que protejam o turista (febre amarela, dengue) ou diminuam o abuso de drogas

(nicotina).

Em meio a numerosas crises econômicas, vários países latino-americanos descuidaram de suas

estruturas científicas e tecnológicas e passaram a importar as vacinas necessárias para a população.

No entanto, e por diferentes motivos, depois de várias décadas de retração na área de produção de

vacinas, esta começa a ser considerada novamente uma área estratégica.

Para os países em desenvolvimento, o estímulo à produção nacional de vacinas é parte das

obrigações frente a sua população. Em termos de saúde pública, trata-se de um setor que não pode

ser negligenciado e no qual é preciso manter independência.

Alguns países, como Brasil, China e Índia, contam com instituições de pesquisa e desenvolvimento

para a produção de imunobiológicos, sendo frequentes as parcerias com as grandes empresas

farmacêuticas. Fundações privadas, como a Bill & Melinda Gates Foundation, fornecem fundos em prol

de melhores e novas vacinas, que protejam as crianças das doenças. Para organizações internacionais

como a WHO, a vacina é a mais simples das medidas preventivas possíveis na área de saúde.

Nos próximos anos, haverá progressos na preparação das vacinas preventivas e no

desenvolvimento de produtos novos, como as vacinas terapêuticas. Entretanto, esperam-se vacinas

novas ou melhores contra as doenças que afetam um número altíssimo de pessoas, tais como

HIV/AIDS, malária, dengue e tuberculose.

UM SETOR ESTRATÉGICO PARA A SOCIEDADE

No Brasil, onde existe uma tradição de mais de um século na produção de imunobiológicos (vacinas,

soros, hemoderivados e reativos para diagnóstico), as vendas chegam a US$ 600 milhões por ano, o

que representa 3% do mercado da indústria farmacêutica.

Até a década de 1960, muitas vacinas humanas e veterinárias eram fabricadas no país. A perda da

autossuficiência criou uma situação crítica quando, em inícios da década de 1980, uma multinacional

retirou-se do mercado, deixando a população em risco de ficar sem vacina tríplice, soros antitóxicos e

antiofídicos. Evidenciou-se nessa ocasião que a sociedade deve ter o acesso garantido às vacinas.

O Programa de Autossuficiência Nacional de Imunobiológicos (PASNI) de 1985 reverteu essa situação,

mediante uma estratégia de substituição das importações que estimulou a modernização das

instalações e a incorporação de novas tecnologias em cinco dos laboratórios oficiais: Instituto Butantan

(SP), Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Biomanguinhos, Fiocruz, RJ), Instituto Vital Brazil

(IVB,RJ), Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar, PR), Fundação Ezequiel Dias (Funed, MG).

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

225

Atualmente, o Brasil produz 75% das vacinas que são distribuídas pelo serviço público, a metade delas

produzida pelo Butantan (Tabela 17.1). Várias vacinas estão sendo desenvolvidas em parcerias entre

as instituições citadas ou com laboratórios estrangeiros (Sanofi-Pasteur, GlaxoSmithKline, Instituto

Finlay etc.). Algumas das vacinas resultantes desses convênios protegem a população de sarampo,

caxumba e rubéola (tríplice viral), influenza, rotavírus, raiva (cultivo do vírus em células Vero) etc.

Os diferentes acordos de cooperação internacional entre os países latino-americanos também

terão uma importância fundamental para o desenvolvimento de políticas de saúde pública que

garantam à população o acesso às vacinas.

--------------

TABELA 17.1. A produção de vacinas no Brasil

INSTITUIÇÃO VACINAS

Instituto Butantan

Dupla, Infantil DT (difteria e tétano)

Dupla, Adulto dT (difteria e tétano)

Tríplice DTP (difteria, tétano e coqueluche ou pertussis)

Hepatite B recombinante

Influenza sazonal trivalente

Raiva (VR/VERO)

HPV, em parceria com a MSD (Merck)

Hepatite A, em parceria com a MSD (Merck)

dTpa (difteria, tétano e coqueluche ou pertussis), para gestantes, em parceria com GSK (GlaxoSmithKline)

Laboratório BioManguinhos

Poliomielite inativada (VIP) e oral (VOP)

Tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola)

Tetravalente viral (catapora, sarampo, caxumba e rubéola)

HIB (meningite e pneumonia)

Tetravalente viral HIB, DTP (Difteria, tétano, coqueluche ou pertussis e HIB)

Pneumocócica -10 valente

Febre amarela

Rotavírus humano, em parceria com GSK (GlaxoSmithKline)

Tecpar Antirrábica de uso veterinário e humano (PV-BHK)

Fundação Ataulfo de Paiva Antituberculose (BCG)

Fundação Ezequiel Dias Vacina meningocócica C

AS VACINAS E A ERRADICAÇÃO DA DOENÇA

Dispomos hoje de vacinas para numerosas doenças que afetaram a humanidade durante séculos. De

um modo geral, elas protegem 80% a 95% das pessoas imunizadas, com baixíssimas frequências de

efeitos adversos. O calendário de imunizações depende das autoridades nacionais e, em vários países,

a vacinação não é obrigatória.

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O impacto das vacinas na morbidade infantil relega ao passado algumas das temíveis doenças que

assolaram o século XX: difteria, coqueluche, tétano, poliomielite, meningite, caxumba, sarampo,

rubéola, varicela). Lamentavelmente, alguns setores da sociedade se recusam a aceitar o óbvio.

Um dos ataques mais desonesto às vacinas foi a publicação em uma revista científica de um artigo

relacionando-as com o autismo. A revista teve que se retratar e o trabalho foi declarado fraudulento

pelo Conselho Geral de Medicina do Reino Unido (2011). Organizações como o CDC (do inglês, Centers

for Disease Control and Prevention), o Instituto de Medicina da Academia Nacional de Ciências (Estados

Unidos) e o Serviço Nacional de Saúde (Reino Unido) não encontraram relação entre as vacinas e o

autismo.

Em algumas comunidades, a resistência às vacinas subsiste por motivos culturais, religiosos ou

políticos. Algumas das razões invocadas são: intromissão na liberdade individual, desafio à vontade

divina, degradação dos costumes ou interferência no desenvolvimento nacional. Algumas

comunidades descuidam da prevenção quando a doença passa um tempo sem se manifestar,

favorecendo, assim, a reaparição epidêmica da doença.

O impacto das vacinas pode relegar ao passado algumas das temíveis doenças que assolaram a

humanidade, porém, isso não significa que tenham sido totalmente erradicadas. As vacinas

mostraram-se eficazes para erradicar mundialmente a varíola e reduzir enormemente o número de

casos de poliomielite, na maioria dos países. Em relação à gripe, ainda não há uma vacina capaz de

estimular a imunidade a todas as linhagens do patógeno.

A VARÍOLA

A varíola é uma doença eruptiva contagiosa, transmitida por um poxvírus. A incubação dura de 7 a 17

dias; os sintomas principais são febre alta, fadiga e uma erupção de vesículas em todo o corpo. A

mortandade é de 30%, e os sobreviventes conservam lesões características.

A varíola teria sido levada até a Índia por mercadores do Egito, onde vitimara o faraó Ramsés V. A

doença se alastrou até a China (século I) e o Japão (século VI), retornando mais tarde ao Oriente Médio

e alcançando a Europa com os Cruzados (século XI-XII). A varíola não fazia distinção entre camponeses,

burgueses ou nobres, cobrando vidas de humildes e poderosos, como o rei da França Luís XV.

Quem adoece uma vez e se recupera, não adoece uma segunda vez; essa observação deu lugar à

primeira estratégia de combate à varíola. No Oriente (Índia e China, século XI), inoculavam-se as

pessoas sadias com o pus das vesículas de doentes com uma forma benigna da varíola. A maioria das

pessoas inoculadas manifestava uma doença leve e ficava protegida pelo resto de sua vida. A varíola

regrediu entre os povos que praticavam a variolização, embora 1% a 2% das pessoas inoculadas

morresse ao desenvolver a doença em sua forma mais grave.

Em 1520, com a chegada ao México de um escravo contaminado, a varíola entrou no continente

americano. O convívio de vários séculos com a doença desenvolveu nos europeus alguma forma de

resistência, mas, para as populações ameríndias, o contato com um germe novo significou o extermínio

de 95% de seus integrantes, em menos de 200 anos.

No século XVIII, a prática da variolização foi introduzida na Inglaterra. Um inoculador, o médico

Edward Jenner, observou que as ordenhadeiras nunca desenvolviam a varíola. Segundo uma crença

popular, essa resistência era consequência da contaminação com a varíola das vacas (variola vacum

ou vacina), uma doença inofensiva que se manifesta por pústulas no úbere das vacas. Em 1796, Jenner

inoculou a variola vacum em uma criança e, poucos dias mais tarde, a varíola humana; a criança não

adoeceu. A partir dessa experiência, a vacinação se estendeu rapidamente por toda Europa.

No Brasil, a vacinação foi introduzida em 1840 pelo Barão de Barbacena. Porém, quando, em 1904,

sendo Oswaldo Cruz o Diretor Geral de Saúde Pública, o governo decretou a vacinação obrigatória, a

resistência se manifestou no Rio de Janeiro sob a forma de motins, estourando uma revolta que

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

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obrigou o governo a rever a medida. Contudo, a população terminou aceitando a vacinação depois da

violenta epidemia de varíola de 1908, que teve 10 mil casos diagnosticados.

Apesar dos surtos terem-se espaçado, 300 milhões de pessoas morreram de varíola no século XX.

Na década de 1970, a WHO substituiu a vacinação em massa por uma campanha de erradicação em

anel. A estratégia consiste em isolar os pacientes cada vez que um caso novo é detectado, e vacinar

rapidamente todas as pessoas que tiveram algum contato com o doente. Como a vacina tem um efeito

muito rápido, os resultados foram extraordinários. Contudo, por ocasião de um surto havido na

Iugoslávia (1972), foi necessário complementar as medidas com uma vacinação em massa. O último

caso de varíola registrado ocorreu na Somália em 1977.

Uma vez confirmada a erradicação da varíola em 1979, o vírus da varíola começou a ser eliminado

dos laboratórios para evitar acidentes como o ocorrido um ano antes, quando o escapamento do vírus

de um laboratório da Universidade de Birmingham (Reino Unido) causou a morte de duas pessoas.

Preventivamente, dois estoques virais foram conservados, um deles no CDC (Center for Disease Control

and Prevention, Atlanta, Estados Unidos), o outro no VECTRO (Instituto para Preparações Virais,

Moscou, Rússia). Apesar de estar prevista sua destruição no ano 2000, esta não ocorreu.

Ninguém pode afirmar que não existe algum estoque de vírus em algum lugar, e a mera

possibilidade de um ato de terrorismo é assustadora. Em caso de um surto de varíola, os médicos

teriam dificuldades em diagnosticar uma doença que hoje está restrita aos livros. A população deixou

de ser vacinada em fins da década de 1970, de modo que boa parte da população nunca foi imunizada;

sem doses de reforço, o restante pode ter perdido a imunidade. Por outro lado, a validade de um

pequeno estoque de vacinas que sobrou de décadas atrás está comprometida, e a aplicação da vacina

contraindicada em pessoas com eczemas ou imunodeprimidas, muito mais frequentes que no início

do século XX.

Mesmo tendo erradicado a varíola, precisaríamos de vacinas antivariólicas eficientes e seguras,

formuladas com tecnologia recente. Algumas já se encontrariam na etapa dos estudos clínicos.

A POLIOMIELITE

A poliomielite ou paralisia infantil é uma doença causada por um picornavírus (poliovírus), transmitido

pela água. O período de incubação é de 4 a 35 dias, e 10% das pessoas infectadas desenvolvem os

seguintes sintomas: febre, fadiga, dor de cabeça, vômitos, constipação ou diarreia, rigidez na nuca e

dor nas extremidades.

Em 1% dos casos, o vírus da poliomielite passa do intestino para a corrente sanguínea e invade o

sistema nervoso central, onde se multiplica, destruindo os neurônios motores. As pessoas afetadas

desenvolvem a forma paralítica da doença, e, se o vírus se alojar no bulbo, os pacientes precisarão de

ajuda mecânica para respirar. A doença pode deixar sequelas motoras permanentes (SPP ou síndrome

post-pólio).

Apesar de haver evidências da doença no Antigo Egito, os primeiros surtos epidêmicos ocorreram

em fins do século XIX. Em 1908, confirmou-se que a poliomielite é uma doença infecciosa. Na primeira

metade do século XX, as epidemias deixaram numerosas vítimas, principalmente entre as crianças,

mas também entre os adultos como, por exemplo, Franklin Delano Roosevelt, presidente dos Estados

Unidos.

As melhores condições higiênicas do século XX diminuíram o contato prematuro da população com o

vírus, suspeitando-se que a exposição de um grupo vulnerável ao vírus, em idade escolar, foi um dos

fatores desencadeante dos surtos. Na década de 1950, a doença era aterradora. Quando aparecia a

pólio, as escolas fechavam e as crianças eram privadas do contato entre elas, permanecendo isoladas

e trancadas em casa, até o perigo passar.

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A descoberta de uma vacina teve uma repercussão extraordinária. Em 1954, começou a ser aplicada a

vacina de vírus inativados de Jonas Salk (IPV, do inglês, injetable polio vaccine), elaborada com três

tipos de poliovírus, cultivados em rim de macaco, e inativada com formalina. Em 1963, houve uma

segunda opção, a vacina de vírus atenuados de Albert Sabin (OPV, do inglês oral polio vaccine).

Modificações nos processos produtivos aumentaram significativamente a eficiência de ambas as

vacinas.

Ambas têm vantagens e desvantagens. Para ser aplicada, a IPV demanda agulhas e seringas

estéreis, um procedimento mais caro e complicado que a ingestão das gotas da OPV. Em contrapartida,

por ser uma vacina de vírus atenuados, a OPV exige a manutenção da rede de frio, o que a IPV dispensa.

Do ponto de vista da eficiência, a OPV confere uma imunidade mais ampla porque abrange a

mucosa digestiva, impedindo a entrada do vírus selvagem no organismo e a infecção das células

nervosas. Contudo, como o vírus atenuado da vacina, eliminado nas fezes, permanece no ambiente, a

OPV acaba por atingir outras pessoas, afetando os não vacinados e os imunodeprimidos presentes no

entorno. Por isso, alguns países preferem a IPV e outros a OPV.

Novas vacinas estão sendo pesquisadas como, por exemplo, uma que leva o gene codificador de

uma proteína do capsídeo viral, inserido em Escherichia coli. A síntese dessa proteína por uma bactéria,

que coloniza normalmente o intestino, possibilitaria a imunização do hospedeiro.

Quando em 1992-1993, nos Países Baixos, um surto da doença atingiu um grupo que se opõe à

vacinação por motivos religiosos, verificou-se que o vírus selvagem continua presente no ambiente.

Em 2000, a pólio reapareceu no Haiti e na República Dominicana. Na ocasião, revelou-se que o vírus

atenuado pode reverter a sua forma patogênica, de modo que, mesmo tendo desaparecido a doença,

a vacinação terá que ser mantida. Em 2004, com a aparição de um novo surto de pólio em países do

oeste africano, confirmou-se que o objetivo ainda se encontra distante.

Apesar do sucesso alcançado pela vacinação, a erradicação da doença parece ser bem mais difícil

do que o esperado. Em 2015, a pólio ainda era endêmica no Paquistão e no Afeganistão, e alguns surtos

ocorreram em Madagascar, Guiné e Ucrânia. Alguns países são vulneráveis, por estar situados em

regiões onde as campanhas de vacinação são complexas e muitas vezes interrompidas por conflitos

bélicos, corrupção e/ou superstição (Camarões, Guiné Equatorial, Etiópia, Iraque, Nigéria, Somália,

Sudão do Sul e a República Árabe Síria).

A INFLUENZA

A influenza ou gripe é uma doença transmitida por um ortomixovírus (influenzavírus) e apresenta os

seguintes sintomas: febre, dores musculares, garganta inflamada, fadiga e dor de cabeça. O material

genético é RNA que está rodeado por um capsídeo proteico e um envelope, derivado da membrana

celular do hospedeiro. O RNA confere a seu portador uma enorme variabilidade porque, diferente do

DNA, os erros de replicação não são reparados por nenhum mecanismo celular.

Em função das proteínas do capsídeo, classificam-se os influenzavírus em três grupos: A, B, e C. Os

vírus dos grupos B e C infetam exclusivamente seres humanos e não causam epidemias. Os vírus da

influenza da categoria A são os mais perigosos, porque se multiplicam tanto no homem como em

outras espécies (aves, suínos, cachorros, cavalos, focas, baleias). As variantes de duas proteínas do

envelope, a hemaglutinina (HÁ) e a neuraminidase (NA), são utilizadas para identificar os diferentes

subtipos da categoria A: H1N1, H5N1 etc.

Ao pular de uma espécie a outra, a recombinação do material genético de diferente origem origina

vírus com características novas. Basta que esse vírus infecte o homem e sofra uma mutação que

possibilite a transmissão pessoa a pessoa para desencadear uma pandemia.

Ao longo do século XX, várias pandemias de gripe assolaram a terra. Em 1918, um surto de gripe

sobreveio na Espanha, espalhando-se pelo mundo e causando a morte de 40 a 70 milhões de pessoas.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

229

O vírus H1N1 da gripe espanhola circulou durante várias décadas, embora tenha perdido parte de sua

patogenicidade a partir de 1920.

Em 1957, uma segunda pandemia originou-se na China. A gripe asiática (H2N2) causou a morte de

2 milhões de pessoas. Poucos anos mais tarde, em 1968, o subtipo H3N2 apareceu em Hong Kong e

alastrou-se pelo mundo, deixando 47 mil mortos.

A gripe aviária (H5N1) surgiu na Ásia, em 1997. Embora a transmissão tenha sempre ocorrido no

sentido ave-ave e ave-homem, milhares de aves foram sacrificadas durante os surtos de 2003 e 2004,

devido ao temor de uma mutação que possibilitasse a transmissão do homem ao homem. A aparição

do subtipo H5N1 demandou a modificação dos métodos tradicionais de produção de vacinas em

embriões de galinha. Transferindo a informação genética relevante do vírus para um vírus de

laboratório, obteve-se um protótipo viral, codificador dos antígenos correspondentes ao H5N1 que

pode crescer em embriões de galinha.

A gripe A (H1N1) ou gripe suína apareceu no México em 2009. Diferentemente das variantes

anteriores, esta causou mais vítimas entre os jovens e as mulheres grávidas. A resistência dos mais

velhos poderia ser explicada por um contato prévio com vírus de tipo H1N1, que circularam por um

tempo na população.

A existência de medicamentos antivirais contribuiu para o controle da pandemia. A rápida

mobilização das autoridades nacionais e internacionais, assim como das empresas farmacêuticas, foi

decisiva para a obtenção de uma vacina adequada. Contudo, algumas fraquezas foram expostas. Uma

delas é a dificuldade de produzir rapidamente uma vacina, dado que, para obter 300 milhões de doses

de vacina, são necessários 900 milhões de ovos embrionados. Em caso de urgência, a produção em

cultivos celulares resultaria mais rápida.

Mutação do RNA e recombinação de RNAs de diferente origem são as duas estratégias que explicam

a enorme variabilidade do vírus da influenza e justificam a necessidade de mudar continuamente os

antígenos da vacina. O candidato vacinal de hoje pode ser inócuo amanhã, sendo difícil prever contra

quais antígenos do vírus dirigir a vacina. Por isso, as vacinas contra a gripe são preparadas anualmente,

escolhendo as linhagens que se supõe que causarão a próxima epidemia.

TUBERCULOSE, MALÁRIA E HIV/AIDS

Ainda não temos vacinas para a tuberculose, a malária ou o HIV/AIDS, três doenças que causam um

elevado número de mortes.

A malária é uma doença causada por um protozoário (Gênero Plasmodium), transmitido através da

picada de um mosquito (Gênero Anopheles). O decréscimo da incidência global da doença em 37%, e

da mortalidade em 60%, observado a partir do ano 2000, deve ser atribuído à prevenção e ao

tratamento dos doentes. No entanto, em 2015 registraram-se no mundo inteiro 214 milhões de casos.

A maior dificuldade no desenho de uma vacina contra a malária reside no complexo ciclo do

parasita, que se reproduz na glândula salivar do mosquito, se desloca na corrente sanguínea do

hospedeiro, se replica no fígado e infecta as hemácias para multiplicar-se novamente. As vacinas em

andamento, dirigidas a uma única etapa da vida do parasita, só conseguem imunizar parte das crianças

vacinadas. Para ser eficiente, a vacina teria que combater o parasita em cada etapa do ciclo.

Uma possibilidade engenhosa, em fase laboratorial, propõe induzir, no homem, anticorpos contra a

forma do parasita que reside nas glândulas salivares do mosquito. Na picada, o Anopheles ingeriria os

anticorpos, e estes bloqueariam a reprodução do parasita.

A tuberculose é uma doença causada pelo bacilo de Koch (Mycobacterium tuberculosis),

transmitido pelo ar. O declínio de 47% de casos, observado entre 1990 e 2015, deve ser atribuído aos

melhores métodos de diagnóstico e tratamento. No entanto, em 2014, registraram-se 9,6 milhões de

casos.

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230

Nos alvéolos pulmonares, as bactérias são fagocitadas pelos macrófagos, dentro dos quais elas se

multiplicam lentamente, sem ser destruídas. Em algumas pessoas, a infecção permanece latente, em

outras se manifesta com diferentes graus de gravidade.

A vacina existente utiliza o bacilo atenuado BCG (Bacilo de Calmette-Guérin) para induzir imunidade

ao bacilo de Koch. A vacina é eficiente em crianças pequenas, mas não imuniza crianças mais velhas

ou adultos. Por outro lado, a eficácia da vacina diminui nas regiões perto do Equador, onde há

numerosas infecções por micobactérias aparentadas. As pesquisas atuais visam entender melhor a

imunidade no adulto e as características hereditárias que tornam as pessoas mais susceptíveis.

Por enquanto, a mais insidiosa das três doenças é a HIV/AIDS, porque destrói a capacidade do

sistema imune de responder a infecções oportunistas. Os primeiros casos apareceram em 1981 e se

estenderam rapidamente pela população. Em 2013, 35 milhões de pessoas viviam com HIV/AIDS e 1,5

milhão de pessoas morreram de doenças ligadas a AIDS.

A maior parte das novas contaminações ocorre nos países em desenvolvimento, especialmente o

sul da África e a Ásia. No rasto da HIV/AIDS (e da adição a drogas injetáveis), a tuberculose reaparece

com germes resistentes aos medicamentos.

Apesar das medidas preventivas e dos grandes progressos alcançados no tratamento da HIV/AIDS,

o ideal seria encontrar uma vacina. As dificuldades são enormes porque, para ativar a resposta imune,

devem-se ativar as células T auxiliadoras que a coordenam, e são justamente estas as que o vírus

destrói. Como geralmente o vírus penetra no organismo por via anal ou vaginal, permanecendo um

tempo na corrente sanguínea antes de invadir as células, a vacina deveria estimular ambas as vias, a

humoral e a celular, e se estender às mucosas.

Na luta contra o HIV/AIDS, diversas estratégias são possíveis; uma delas seria impedir a invasão do

organismo pelo vírus, a outra, ajudar o organismo a impedir a progressão e/ou a transmissão da

doença. A falta de um modelo animal adequado e as frequentes mutações do vírus complicam a tarefa.

Embora os resultados obtidos até agora tenham sido decepcionantes, estão sendo realizados os

estudos clínicos correspondentes a vacinas de subunidades, de vetores virais recombinantes e de DNA.

A AMEAÇA DAS DOENÇAS EMERGENTES

À medida que eliminamos ou controlamos doenças, outras novas emergem e algumas das antigas

reaparecem. Os microrganismos adquirem resistência aos medicamentos, e a destruição de habitats

naturais deixa o homem a mercê de agentes infecciosos com os quais não teve contato prévio. O

crescimento da população e sua concentração em zonas urbanas, as mudanças climáticas, o

incremento das viagens internacionais e do comércio, assim como as mudanças comportamentais, são

outros fatores determinantes para a dispersão de agentes infecciosos.

Alguns exemplos de doenças emergentes são a gripe espanhola, a hepatite B, as febres

hemorrágicas (Junín, Lassa, Marburg, Ebola etc.), a doença de Lyme, a BSE (encefalopatia

espongiforme bovina), a doença dos Legionários, o HIV/AIDS, a Escherichia coli 0157:H7, a doença do

vírus do Nilo ocidental, o SARS (do inglês, severe acute respiratory), o MERS (do inglês, middle east

respiratory sindrome) e a dengue. Várias dessas doenças contam com testes diagnósticos, e, para

algumas, já temos vacinas (hepatite B, doença de Lyme). Testes clínicos em seres humanos estão sendo

realizados com vacinas contra HIV/AIDS, malária, dengue, cólera etc.

Entre 2013 e 2016, uma epidemia de Ebola devastou a África ocidental, afetando Guiné, Libéria e

Serra Leoa, e alastrando-se até o Senegal, a Nigéria e o Mali. O vírus de Ebola é comum na região, e

embora sua forma de transmissão ao homem ainda não tenha sido totalmente esclarecida, sabe-se

que envolve vários animais da região (chimpanzés, gorilas e morcegos).

As mudanças evolutivas do vírus parecem ter influído menos na gravidade da epidemia que as

condições sociais e culturais existentes: infraestrutura destruída por décadas de guerras civis;

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / VACINAS

231

dificuldade das equipes médicas em distinguir entre diversas infecções com sintomas parecidos;

práticas religiosas de sepultamento dos doentes facilitando o contágio.

Mais de 28 mil casos e 11 mil mortes abalaram a já comprometida estrutura social e econômica dos

países afetados. Os surtos que ocorreram nos Estados Unidos e na Europa, originados por pessoal das

equipes médicas transferido para tratamento em seus países de origem, foram rapidamente

controlados. Também a Nigéria conseguiu controlar um surto incipiente, utilizando a estrutura

sanitária criada, com o apoio de organizações internacionais, para a erradicação da pólio.

Nenhum país está preparado para a emergência de uma doença desconhecida. No entanto, a

epidemia de Ebola deixa duas lições: a necessidade de contar com testes de diagnóstico rápidos e a

obrigação moral de manter em alerta uma infraestrutura sanitária sólida; as vacinas serão de utilidade

mais adiante, em ocasião do próximo surto.

Atualmente, vários países de América Latina (Brasil, Colômbia) enfrentam uma epidemia de

dengue, chikungunya e zika, três doenças de origem viral transmitidas por mosquitos do gênero Aedes

(A. aegypti e A. albopictus), transmissores, também, da febre amarela. Existe uma vacina para a febre

amarela e encontram-se adiantadas duas vacinas contra a dengue (Sanofi-Pasteur e Butantan).

Os fatores determinantes da emergência dessas doenças são as mudanças climáticas, a abertura

de rotas comerciais, as viagens internacionais e, fundamentalmente, a falta de saneamento básico,

porque facilitam a dispersão e a proliferação do mosquito nas áreas urbanas. Sistemas de atendimento

médico precários e falta de testes de diagnóstico agravam a situação da região.

A aparição de numerosos casos de microcefalia, atribuídos ao vírus zika, exige uma resposta rápida,

mas qual? Uma vacina demora em chegar, e por muito que se queira apressar, não há como diminuir

o tempo necessário para fazer os testes clínicos pertinentes e produzir o número de doses necessárias.

O caminho parece ser impedir a multiplicação do mosquito, e várias formas foram descritas no Capítulo

11.

BIOTERRORISMO E BIOSSEGURIDADE

Esporos disseminados pelos correios causaram um surto de antraz, logo depois do atentado às torres

do World Trade Center (Estados Unidos, setembro de 2001), alertando o mundo sobre a ameaça de

bioterrorismo.

Não foi a primeira vez que foram utilizadas armas biológicas. Os romanos usavam animais mortos

para infectar os poços de seus inimigos. Antes de levantar o sítio à cidadela de Kaffa (Crimeia, 1346),

o exército tártaro de Janibeg catapultou para dentro das muralhas os mortos de peste, iniciando uma

terrível epidemia que se difundiu na Europa e dizimou a população. Na América (do Sul e do Norte),

os colonizadores exterminaram tribos indígenas com cobertores contaminados com varíola, deixados

como presente. Em 1941, durante o conflito sino-japonês, o exército do Japão disseminou a peste

bubônica no norte da China, em cinco ocasiões.

Estima-se que uma dúzia de países teria armas biológicas de destruição em massa, envolvendo

aproximadamente 70 agentes infecciosos. Atualmente, ou em curto prazo, existem vacinas para alguns

deles (Bacillus anthracis, Clostridium botulinicum, Yersinia pestis, Francisella tulariensis, varíola e

hantavírus). Entretanto, de um ponto de vista científico, sanitário ou financeiro, a vacinação poderia

não ser o método de combate mais eficiente. Por isso, boa parte do esforço antiterrorista está sendo

orientado atualmente para o melhoramento de diagnósticos e a procura de novos medicamentos

antivirais e antibacterianos.

Outro motivo de preocupação está na quantidade de informação referente ao genoma de

patógenos disponível nos bancos de dados públicos, porque existe o temor que esse conhecimento

possa ser utilizado para elaborar armas biológicas.

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Em 2002, um grupo de pesquisadores americanos mostrou que partículas infecciosas sintéticas de

poliovírus podem ser obtidas a partir da sequência genômica disponível na Internet. Esses

pesquisadores sintetizaram alguns fragmentos de DNA e encomendaram outros a empresas

especializadas. Juntando os pedaços, eles construíram uma molécula de DNA de 7.500 pares de bases.

Depois de transcrever a informação e colocar o RNA em um meio com componentes celulares, eles

obtiveram partículas virais. Recentemente, outro grupo de pesquisadores utilizou o mesmo método

para sintetizar o vírus da gripe espanhola.

No fim do ano 2011, pesquisadores holandeses e norte-americanos noticiaram ter conseguido

manipular o vírus H5N1 em laboratório, tornando-o facilmente transmissível em seres humanos. O

trabalho, que poderia servir tanto para elaborar uma vacina como para criar uma arma letal, levanta

o problema da liberação dos dados da pesquisa que, normalmente, são compartilhados por

pesquisadores de todos os países.

O perigo do bioterrorismo não deve ser subestimado. Biosseguridade é uma nova disciplina que

lida com a utilização inadequada do conhecimento biológico e, particularmente, com as pesquisas

consideradas de uso duplo, que podem ser utilizadas para o bem ou para o mal.

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C A P Í T U L O 18

BIOTECNOLOGIA E SAÚDE

OS TESTES DIAGNÓSTICOS

O conhecimento e a experiência do médico são determinantes no reconhecimento dos sintomas de

uma doença. O diagnóstico será estabelecido a partir de vários elementos, tais como a história clínica

do paciente, a anamnese, os exames físicos e uma bateria de análises e/ou testes laboratoriais.

Solicitados pelo médico, para monitorar o estado de saúde do paciente, os testes de rastreio

identificam fatores químicos, microbianos ou genéticos que possam causar uma doença ou estar

associados a ela. Constituem uma rotina que varia dependendo do sexo e da idade do paciente. Os

resultados serão avaliados em relação a um conjunto de valores considerados normais e remetidos ao

médico como uma fonte objetiva de informação.

Geralmente realizados em amostras de sangue e de urina, o objetivo desses testes é detectar

qualquer disfunção, seja para induzir mudanças no estilo de vida do paciente e/ou para iniciar um

tratamento. Como exemplos, o hemograma, a análise de urina, o lipidograma, a identificação do

antígeno prostático para diagnóstico de câncer etc.

Qualquer negligência relativa à adoção dos testes adequados pode ter consequências graves para

a saúde pública. Em 1985, embora a empresa Abbott já tivesse no mercado um teste de rastreio do

vírus HIV nas doações de sangue, a França preferiu aguardar o lançamento de um teste francês. Em

poucos meses, 297 dos pacientes transfundidos foram contaminados e três ministros de Estado

tiveram que comparecer na Justiça e responder pelo incidente.

Inserida nas áreas veterinárias e médicas, a indústria de diagnósticos in vitro cresce rapidamente

no setor de diagnósticos moleculares (doenças infecciosas e cardiovasculares, oncologia e

farmacogenética), acompanhando as demandas dos mercados da América Latina, do Leste Europeu,

do Oriente Médio e do Leste Asiático.

AS TENDÊNCIAS ATUAIS

A maior parte dos testes diagnósticos é realizada hoje com alta tecnologia, reunindo em ambientes

automatizados diversos reagentes, instrumentos analíticos e produtos acessórios de controle de

qualidade. Em consequência, as análises clínicas estão se concentrando em umas poucas empresas,

com suficiente poder econômico para tratar um volume grande de amostras que justifique a utilização

de sistemas robotizados.

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234

Em outra vertente mercadológica, kits relativamente simples permitem o diagnóstico de gravidez e o

monitoramento de algumas condições crônicas, como a diabete, sendo vendidos nas farmácias ou via

Internet. Comercializado recentemente, outro tipo de kit informa os clientes interessados sobre sua

ancestralidade e predisposição a várias doenças.

DISPOSITIVOS MINIATURIZADOS

A construção de biochips, dispositivos miniaturizados de arrays moleculares de proteínas, anticorpos

ou ácidos nucleicos, estimulou o desenvolvimento de várias plataformas comerciais que

revolucionaram o setor de testes de diagnóstico. Essa tendência se vê acentuada com a chegada de

materiais e dispositivos em escala nanométrica.

O desenvolvimento da tecnologia microfluídica permitiu miniaturizar os ensaios em dispositivos

que realizam automaticamente todas as etapas do protocolo. Um biochip microfluídico típico pode

reunir, em um único dispositivo, um procedimento complexo: extração da amostra, separação

eletroforética, coloração/descoloração e identificação.

Os biochips microfluídicos ou lab-on-a-chip (LOC) permitem obter resultados rapidamente, no

consultório médico, no hospital (emergência, unidade de terapia intensiva), em algum lugar isolado ou

em uma emergência de biosseguridade, sem precisar recorrer ao laboratório (Figura 18.1). O lab-on-

a-chip demanda uma intervenção humana mínima, dando um resultado preciso que pode ser

arquivado facilmente.

--------------

FIGURA 18.1. Imagens comerciais de alguns dispositivos miniaturizados utilizados em testes diagnósticos

A. Lab-on-a-chip de Agilent (lab-on-a-chip-loc-243049.jpg (http://www.directindustry.com).

B. Chip de DNA para diagnóstico de Toshiba (http://www.toshiba.co.jp/rdc/rd/fields/06_t29_e.htm).

C. Gene chip de Affymetrix (http://www.pgbeautygroomingscience.com).

A B C

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE/ TESTES DIAGNÓSTICOS

235

O QUE É UM BOM TESTE

As técnicas bioquímicas, imunológicas e genéticas ocupam um lugar preponderante no setor de

diagnósticos, porque reúnem várias qualidades que são indispensáveis: sensibilidade, especificidade,

exatidão e reprodutibilidade (Tabela 18.1).

Apesar ser aplicadas também na área ambiental (análise de solos, qualidade da água) e na indústria

de alimentos (detecção de contaminantes nos alimentos ou nas matérias-primas), neste capítulo nos

limitaremos a analisar sua utilização na área de saúde.

--------------

TABELA 18.1. As qualidades de um bom teste de diagnóstico.

QUALIDADE DEFINIÇÃO

Sensibilidade Probabilidade de dar um resultado positivo quando a condição está presente.

Especificidade Probabilidade de dar um resultado negativo quando a condição não está presente.

Exatidão Dar o mesmo valor que o obtido com outro método.

Reprodutibilidade Em se tratando de um teste quantitativo, dar sempre o mesmo valor na mesma amostra.

--------------

AS TÉCNICAS COM BASE BIOQUÍMICA

As técnicas clássicas de identificação microbiana estão sendo substituídas, desde a década de 1970,

por sistemas miniaturizados. Nos sistemas API da empresa Biomérieux, por exemplo, uma suspensão

de microrganismos é adicionada a uma galeria de minitubos contendo os reagentes necessários para

desenvolver diferentes reações químicas. Após a incubação, a análise dos resultados possibilita a

identificação do microrganismo (Figura 18.2).

Diversos tipos de galerias conseguem identificar quase todas as bactérias e leveduras de interesse

clínico. Além de ser mais seguros, o sucesso desses dispositivos se deve à redução da quantidade de

reagentes e do trabalho laboratorial, dois fatores que incidem nos custos.

Na clínica médica, o combate à infecção depende da seleção de um antibiótico adequado. Os

métodos tradicionais de elaboração de um antibiograma, para identificar os antibióticos aos quais o

patógeno é sensível, demandam um lapso de 24 a 48 horas que pode ser fatal para o paciente. Os

primeiros ensaios, com biochips microfluídicos portáveis, permitiriam obter o antibiograma de um

patógeno com menor gasto de reagentes e em menos tempo (2 a 4 horas). Espera-se que esses

dispositivos estejam disponíveis em curto prazo.

--------------

FIGURA 18.2. Imagem comercial dos sistemas API de Biomérieux

(http://www.tgw1916.net/Tests/api.html).

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AS TÉCNICAS COM BASE IMUNOLÓGICA

Baseadas nas reações de aglutinação e precipitação entre um antígeno e o anticorpo específico, as

técnicas imunológicas receberam grande impulso com a descoberta e o desenvolvimento da

tecnologia de hibridomas.

Apesar de ser complexa, demorada e cara, a tecnologia de hibridomas abastece os laboratórios

com reagentes standard, específicos e sensíveis. Associados a moléculas radiativas ou fluorescentes,

os anticorpos monoclonais detectam os antígenos específicos em células, tecidos, soros e corridas

eletroforéticas (imunofluorescência, radioimunoensaio, Western Blot etc.). Utilizam-se também para

separar diferentes populações celulares (CellSorter) e localizar tumores.

Em outro tipo de testes, os anticorpos estão acoplados a enzimas que formam um produto colorido

em presença do substrato (ELISA, do inglês Enzyme Linked Immunosorbent Assay). Esses testes

detectam e quantificam tanto a concentração de anticorpos em infecções ou doenças autoimunes,

como a de antígenos, sejam hormônios, marcadores cancerosos, alérgenos em alimentos e na poeira

caseira, toxinas alimentares, esteroides usados ilicitamente por atletas, drogas como a cocaína e os

opiáceos etc. (Figura 18.3).

--------------

FIGURA 18.3. O método direto e indireto de um teste positivo de ELISA.

MÉTODO DIRETO MÉTODO INDIRETO

O anticorpo é fixado na placa de microtitulação.

O antígeno é fixado na placa de microtitulação.

Coloca-se uma amostra de sangue como fonte de antígeno. Este se fixa nos anticorpos. Retira-se o excesso por lavado.

Coloca-se uma amostra de soro como fonte de anticorpos. Estes se fixam no antígeno. Retira-se o excesso por lavado.

Acrescentam-se anticorpos ligados a uma enzima E, que se fixam no antígeno. Retira-se o excesso por lavado.

Acrescentam-se anticorpos específicos para a imunoglobulina humana, ligados a uma enzima E, que se fixam nos anticorpos do soro, fixados previamente no antígeno. Retira-se o excesso por lavado.

Adiciona-se o substrato da enzima, formando-se um produto colorido P.

Adiciona-se o substrato da enzima, formando-se um produto colorido P.

A cor é proporcional à quantidade de antígeno no sangue. A cor é proporcional à quantidade de anticorpos no soro.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE/ TESTES DIAGNÓSTICOS

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AS TÉCNICAS COM BASE GENÉTICA

O acúmulo de conhecimento sobre o genoma humano favorece a utilização das tecnologias genéticas

para o diagnóstico clínico. Os estudos cromossômicos evoluíram notavelmente com a utilização de

sondas de DNA acopladas a moléculas fluorescentes (SKY, do inglês spectral karyotyping). O

computador transforma a imagem microscópica em outra de cores brilhantes bem definidas,

facilitando a identificação dos pares cromossômicos e de pequenas translocações (Figura 18.4 A).

Sondas específicas também possibilitam a localização de sequências gênicas nas células (FISH, do

inglês fluorescence in situ hibridization, ASO, do inglês Allele-specific oligonucleotide) e nos fragmentos

de ácidos nucleicos, previamente separados por eletroforese em gel (Southern Blot, Fingerprint).

Contudo, a grande estrela continua sendo a reação em cadeia da polimerase ou PCR (do inglês,

polymerase chain reaction), uma tecnologia que amplifica quantidades ínfimas de DNA, facilitando as

análises posteriores (Figura 18.4 B). Na área clínica, a PCR é aplicada na identificação de patógenos e

na pesquisa de variações genéticas nos pacientes.

A versatilidade da técnica tem dado origem a procedimentos bem diversificados, alguns dos quais

integrados em microdispositivos do tipo Lab-on-a-chip. Pode-se monitorar a reação de amplificação

com anticorpos fluorescentes, eliminando os estudos complementares de eletroforese posteriores e

obtendo os resultados “em tempo real”.

Os biochips de DNA encontraram aplicações em áreas tão diversas como meio ambiente,

epidemiologia, controle de qualidade de alimentos etc. Na área de saúde, a tecnologia é utilizada com

diferentes objetivos: identificar um patógeno, descobrir quais os genes ativados em um tecido;

comparar as sequências de dois alelos; encontrar o medicamento adequado para um paciente; prever

o risco de uma pessoa se for exposta a uma substância X. Os dispositivos miniaturizados facilitam,

também, a escolha de tratamentos farmacológicos adequados ao perfil do paciente, o diagnóstico do

câncer e das doenças cardíacas e neuropsiquiátricas.

Por ser portáveis, robustos e relativamente baratos, os dispositivos miniaturizados com diferentes

painéis de genes têm um espaço garantido no setor de testes diagnósticos. No entanto, a chegada das

novas tecnologias de sequenciamento de DNA, que permitem analisar o genoma todo, abre um novo

espaço para o diagnóstico genético.

--------------

FIGURA 18.4: As técnicas com base genética

A. Imagem mostrando a identificação dos 46 pares de cromossomos

humanos mediante a técnica de SKY, segundo o National Human Genome

Research Institute (http://www.genome.gov).

B. Imagem comercial de um termociclador para a reação em cadeia da

polimerase, de Applied Biosystems (http://appliedbiosystems.com).

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O DIAGNÓSTICO DAS DOENÇAS INFECCIOSAS

A evolução de uma doença é detida com o diagnóstico, seguido de tratamento. Nos países

desenvolvidos, e em alguns setores dos países em desenvolvimento, os novos testes de diagnóstico se

encontram disponíveis para a população. Contudo, essa não é a realidade dos países mais pobres, sem

acesso a uma tecnologia que exige conhecimentos, material e equipamentos especializados. Nesses

países, uma das principais causas de mortalidade continuam sendo as doenças infecciosas, como

HIV/AIDS, tuberculose e malária.

O diagnóstico de HIV está baseado no reconhecimento da proteína p24 do vírus e na presença de

anticorpos detectados mediante os testes ELISA ou Western Blot, que atualmente podem ser

combinados em um só. Uma vez diagnosticada a infecção por HIV, acompanha-se a evolução mediante

a medição da carga viral, por PCR quantitativa, e a contagem de células CD4. Dependendo dos

resultados, dá-se início ao tratamento.

Em alguns países, encontram-se à venda kits para diagnóstico de HIV/AIDS, mas sua utilização

individual está muito limitada pela dificuldade de enfrentar o diagnóstico sem um apoio psicológico

adequado. Também é difícil, para o leigo, lidar com os conceitos de “falso positivo” ou “falso negativo”.

No entanto, os testes de diagnóstico rápido são uma ferramenta preciosa em mãos de pessoal

treinado.

O diagnóstico da tuberculose envolve várias etapas, lentas e trabalhosas. Descoberta a infecção

latente pela reação à tuberculina, os estudos posteriores exigem radiografias, observações

microscópicas e cultivos microbianos. Testes mais recentes identificam rapidamente os anticorpos no

sangue, pelo teste ELISA, e o Mycobacterium tuberculosis na amostra de esputo, com sondas genéticas,

mas sua difusão é limitada pelo custo.

O diagnóstico de malária depende de observações clínicas confirmadas por microscopia, uma

técnica relativamente econômica, mas que exige pessoal treinado. Apesar da existência de testes

genéticos, os testes imunológicos rápidos resultam mais convenientes nas regiões remotas, sem

laboratórios ou equipamentos apropriados. Além de mais econômicos, facilitam a escolha do

tratamento, porque diferenciam o Plasmodium falciparum, resistente à cloroquina, de outras espécies

que podem causar a doença e são sensíveis ao medicamento.

Os países emergentes precisam de testes de diagnóstico rápidos e baratos, adaptados às tantas

outras doenças que os afligem (leischmaniose, leptospirose, dengue, chikungunya, zika, infecções por

rotavírus, doença de Chagas etc.). Para acompanhar a evolução das doenças emergentes, a grande

inovação seria complementar os testes de diagnóstico laboratoriais com outros, mais simples e

rápidos, realizados com microdispositivos portáveis.

A TIPIFICAÇÃO DE TECIDOS

SANGUE

A tipificação das hemácias classifica as pessoas em quatro grupos para os marcadores ABO (A, B, AB e

O) e dois para o sistema Rh (Rh+ e Rh-). A caracterização rotineira deste último durante a gravidez

permite tomar medidas em caso de incompatibilidade sanguínea mãe-feto. Também se tipificam os

sistemas ABO e Rh antes de uma transfusão sanguínea, uma intervenção salva-vidas em pacientes que

sofreram uma hemorragia (acidente, cirurgia, doenças digestivas etc.), ou que apresentam um quadro

de anemia séria (quimioterapia, câncer, doenças hematológicas).

A tipificação dos antígenos ABO e Rh da superfície das hemácias nem sempre é suficiente, porque

existem vários outros sistemas de grupos sanguíneos capazes de desencadear uma reação de

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incompatibilidade. Em pacientes com um passado de gravidez ou de transfusão prévia, os anticorpos

a esses sistemas são pesquisados no soro com kits de hemácias específicas.

--------------

FIGURA 18.5. O sistema HLA

C. A herança dos haplótipos.

D. Reação mista ou “cross-matching”. Colocam-se em contato as células do doador com o soro do receptor, em presença

de complemento. Se as células do doador ficam intactas, há compatibilidade.

TRANSPLANTE INCOMPATÍVEL Células Soro Complemento Lise do doador do receptor

TRANSPLANTE COMPATÍVEL Células Soro Complemento Células intactas do doador do receptor

O CROMOSSOMO 6 CRUZAMENTO

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A palavra final corresponde aos testes de compatibilidade, em que se coloca o soro do receptor em

presença das hemácias do doador. Indispensáveis na rotina de um banco de sangue, esses testes

personalizados são realizados por pessoal médico ou técnico.

Nos centros hospitalares que processam um número alto de amostras de sangue, os testes

sorológicos clássicos em tubos de vidro estão sendo substituídos por novas tecnologias, em estações

de trabalho automatizadas. Os Gel Tests para tipificação de hemácias estão baseados na centrifugação

controlada das hemácias em um gel de dextrana-acrilamida.

Entre suas vantagens está a possibilidade de trabalhar com numerosas amostras de pequeno

volume, a eliminação da etapa de lavados e a obtenção de resultados estáveis. Se for necessário, os

dados poderão ser analisados posteriormente e reavaliados por um supervisor.

Também se utilizam técnicas cromatográficas como a ACT (do inglês affinity column technology),

para identificar subclasses de imunoglobulinas em hemácias sensibilizadas, e placas de microtitulação,

para pesquisa de anticorpos.

OUTROS TECIDOS E ÓRGÃOS

A rejeição de um órgão transplantado deve-se à incompatibilidade entre os tecidos do doador e do

receptor. Além dos antígenos do grupo sanguíneo (ABO), existem outros marcadores de identidade

que também se expressam nas células de um organismo, como os antígenos leucocitários do sistema

HLA (do inglês, human leucocyte antigen). O sistema imune os utiliza para diferenciar as células que

fazem parte do organismo (“eu”) das que não pertencem a ele (“não eu”).

Os antígenos do sistema HLA são codificados por um conjunto de genes estreitamente ligados,

localizados no cromossomo 6. Os genes A, B e C determinam os antígenos de classe I, presentes em

todas as células, salvo as hemácias. Já o locus D determina outros três antígenos (DR, DQ e DP),

denominados de Classe II, que são encontrados em algumas células (macrófagos, monócitos, células

dendríticas e células endoteliais). Os de maior importância clínica são os antígenos de classe I,

codificados pelos alelos de A e B, e os de classe II, relativos a DR.

A herança do sistema HLA segue um padrão de codominância, ou seja, ambos os alelos se

expressam nas células. Quando uma pessoa é caracterizada como HLA - A1 A3 B8 B14 DR2 DR10, isto

significa que, em um cromossomo, leva os alelos A1 B8 DR2 herdados de um dos genitores, e, no outro,

A3 B14 DR10, herdados do outro. Por estarem estreitamente ligados, esses genes são transmitidos em

blocos, denominados haplótipos (Figura 18.5 A).

Como esses genes contam com mais de 450 alelos, seria possível ter milhões de combinações que

dariam a cada indivíduo uma identidade única. Contudo, alguns haplótipos são mais frequentes que

outros, especialmente em diferentes grupos raciais.

Os testes de histocompatibilidade são prévios a um transplante de rim ou de células-tronco

hematopoiéticas. Para selecionar os pares doador-receptor histocompatíveis, identificam-se os

antígenos celulares de ambos mediante painéis de anticorpos e instrumentação laboratorial. Utiliza-

se também a PCR para caracterizar os genes HLA-DP do doador e do receptor.

Como gravidezes, transplantes anteriores ou transfusões podem originar, no receptor, anticorpos

contra o órgão a transplantar, a verificação da compatibilidade é fundamental. O teste para prevenir

a rejeição é a reação mista ou cross-matching, em que se coloca o soro do receptor em contato com

as células do doador, em presença de complemento. Se houver compatibilidade, as células do doador

ficarão intactas; em caso de incompatibilidade, haverá lise celular (Figura 18.5 B).

Os testes de histocompatibilidade também são utilizados no diagnóstico de doenças autoimunes.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE/ TESTES DIAGNÓSTICOS

241

O DIAGNÓSTICO DE DOENÇAS GENÉTICAS

AS LIMITAÇÕES DOS TESTES

As doenças de origem genética representam um grupo heterogêneo de patologias que obedecem a

causas diversas: alterações no número e na estrutura dos cromossomos, ação de um gene

determinando a síntese de uma proteína ou sua ausência, ação de vários genes interagindo com

fatores ambientais, tais como o fumo, a dieta, o estresse etc. (Tabela 18.2).

O diagnóstico das doenças monogênicas está baseado em observações clínicas e testes

laboratoriais (metabolismo, cromossomos, DNA). A localização e o sequenciamento dos genes

responsáveis pelas principais doenças monogênicas possibilitaram o desenvolvimento de testes

genéticos. Contudo, esses testes apresentam algumas limitações, devidas à própria heterogeneidade

do determinismo genético:

o Algumas mutações são inócuas para a saúde do portador (polimorfismos).

o Mutações em genes diferentes podem causar a mesma doença.

o Mutações diferentes dentro de um mesmo gene podem causar a mesma doença.

o Mutações diferentes dentro do mesmo gene podem causar doenças parecidas, com prognóstico

diferente (benigno ou grave).

Um teste genético pode não detectar todas as mutações capazes de causar uma doença. Por outro

lado, sua sensibilidade depende da inclusão da informação mais recente, resultante da pesquisa

genética.

Também existem doenças genéticas que aparecem em uma família devido a mutações em algum

gene ainda desconhecido, de modo que não é possível sua identificação. O caso não será resolvido, a

menos que se encontre uma ligação com outro gene próximo e bem conhecido, que funcionará como

um marcador. A transmissão do gene marcador permitirá inferir o modo de transmissão do gene

desconhecido.

Nessa linha de investigação, um estudo desenvolvido por 50 grupos de pesquisa (Wellcome Trust

Case Control Consortium) identificou recentemente 24 regiões do genoma humano fortemente

relacionadas com 7 doenças diferentes (Doença de Crohn, diabete tipo 1 e 2, doença cardiovascular,

hipertensão, artrite reumatoide e doença bipolar).

Outro problema de difícil solução é a análise do determinismo genético de doenças que apresentam

um padrão de herança complexo, em que diversos fatores ambientais interagem com vários genes. A

no ser que se encontre um gene que tenha um efeito muito maior dos restantes, os testes genéticos

serão de difícil elaboração.

A presença de determinados alelos, como BRCA1 e BRCA2, está associada a uma predisposição

familiar ao câncer de mama (Figura 18.6). Porém, esses alelos não são detectados na maioria dos

outros casos da mesma doença. Em outros termos, nem todas as doenças de origem genética são

familiares, podendo aparecer devido a mutações ou alterações cromossômicas ocorridas ao longo da

vida.

AS ESTRATÉGIAS SEGUIDAS

Apesar de suas limitações, os testes genéticos representam um avanço significativo do ponto de vista

médico e individual. Aplicados em qualquer momento da vida de uma pessoa, respondem a diferentes

objetivos.

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OS TESTES GENÉTICOS NO ADULTO

No adulto, os testes genéticos são feitos a partir de alguma evidência clínica, para confirmar ou

descartar um diagnóstico. Realizam-se também para prever se uma pessoa que não apresenta

sintomas irá desenvolver uma doença da qual já existem casos na família (doença de Huntington,

doença de Alzheimer), ou para detectar a presença de algumas mutações gênicas associadas à

predisposição a alguma doença.

O RASTREIO DE PORTADORES

O rastreio de portadores é realizado quando um casal planeja ter filhos e deseja saber se tem ou não

um determinado alelo. Geralmente, é solicitado quando há casos de doença na família ou quando o

casal pertence a uma população em que a frequência da doença é alta. Nas famílias afetadas, os testes

genéticos identificam os indivíduos portadores de um gene ou de uma alteração cromossômica que

possa trazer problemas para eles ou para sua descendência.

Rastreio de portadores e aconselhamento genético são duas medidas que conseguiram diminuir a

incidência de várias doenças em algumas comunidades norte-americanas: a anemia falciforme entre

os afro-americanos, a doença de Tay-Sachs entre os judeus askenazim, a fibrose cística entre os

irlandeses.

O DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL

O diagnóstico pré-natal é realizado quando há algum risco ou indício de doença genética no feto. Por

exemplo, uma concentração elevada de -fetoproteína no sangue materno, entre a 15a e a 20a semana

de gravidez, indica a possibilidade de o feto apresentar anomalias, como a síndrome de Down. Nesse

caso, a mãe poderá ser aconselhada a fazer uma amniocentese, extraindo-se uma pequena quantidade

de líquido amniótico e estudando as células do feto para confirmar ou excluir vários diagnósticos.

Também poderá optar por uma biópsia de vilosidades coriônicas, em que se retiram algumas células

da placenta (córion) para análise.

Em uma fecundação in vitro, o diagnóstico pré-natal pode preceder a implantação do embrião. Após

três divisões celulares, quando o embrião se encontra num estado de oito células, uma delas é

removida para a determinação do sexo e das características genéticas. O procedimento não causa dano

ao embrião.

O RASTREIO NO RECÉM-NASCIDO

O rastreio de erros inatos do metabolismo no recém-nascido possibilita o tratamento de algumas

condições hereditárias, evitando danos e lesões irreparáveis. Aproximadamente 5% das crianças

nascem com problemas congênitos ou hereditários, alguns dos quais podem ser previstos mediante

testes genéticos de rastreio.

A partir da década de 1960, diminuíram as deficiências mentais causadas pela fenilcetonúria, graças

à implantação do Teste de Guthrie ou “do pezinho”, que mede a quantidade de fenilalanina no sangue.

Uma técnica nova, derivada da espectrometria de massa, é capaz de detectar 20 transtornos

metabólicos em um único teste.

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243

TABELA 18.2. Algumas das mais de 8.000 doenças genéticas descritas

Nas doenças monogênicas, a transmissão mostra um padrão claro de herança nem sempre fácil de evidenciar nas doenças esporádicas ou multifatoriais. Nestas, a genética tem um rol importante, mas nem sempre suficiente para, por exemplo, determinar a manifestação dos sintomas.

TIPO DE DOENÇAS HERANÇA EXEMPLO

Cromossômicas Esporádica Síndrome de Down, síndrome de Turner, síndrome de Klinefelter.

Mitocondriais Materna Síndrome MERRF, síndrome MELAS, doença de Leigh (NARP), doença de Leber.

Monogênicas

Autossômica recessiva Fibrose cística, fenilcetonúria, anemia falciforme, doença de Tay-Sachs, talassemias.

Autossômica dominante Hipercolesterolemia familiar, doença de Huntington, rim policístico, neurofibromatose, acondroplasia.

Recessiva ligada ao X Hemofilias, distrofia muscular de Duchenne, síndrome de Lesch-Nyan, síndrome do X frágil.

Dominante ligada ao X Síndrome de Rett.

Multifatoriais Contribuição genética variável; influência de fatores ambientais

Malformações congênitas (palato fendido, defeitos do tubo neural).

Câncer (intestino, mama, ovário, próstata e melanoma).

Doenças cardiovasculares (hipertensão arterial, pressão alta, alguns casos de doença cardíaca, hipercolesterolemia).

Doenças metabólicas (Diabetes, gota).

Doenças neurológicas e/ou psiquiátricas (Alzheimer em idade avançada, esquizofrenia, doença bipolar).

Doenças musculoesqueléticas (artrite, transtornos reumáticos, osteoporose).

Doenças dermatológicas (psoríase, eczema).

Doenças respiratórias (asma, alergias, enfisema).

--------------

DIAGNÓSTICO PREVENTIVO E PREDITIVO

Ao associar um gene a uma doença, os testes genéticos permitem iniciar um tratamento que trate os

sintomas ou retarde sua aparição (hemofilia, distrofia muscular de Becker-Duchenne, fibrose cística

etc.). Contudo, quando se trata de uma doença para a qual não existe nem cura nem alívio, a existência

de um teste de diagnóstico pode exigir escolhas muito complexas.

Consideremos, por exemplo, a Coreia de Huntington, uma doença autossômica dominante de difícil

tratamento e que se manifesta tardiamente. A decisão de fazer o teste depende da pessoa interessada,

mas atinge seus familiares, porque o diagnóstico pode ser informativo sobre a constituição genética

dos outros integrantes da família. Outro exemplo é o da transmissão familiar da doença de Alzheimer,

em que algumas pessoas querem saber se vão a desenvolver os sintomas e outras preferem não saber.

Os avanços tecnológicos recentes abrem caminho para o estudo das doenças que resultam da

interação de fatores genéticos e ambientais. Já não se trata de prever uma doença, mas de calcular

qual a probabilidade de vir a desenvolvê-la. A função de um diagnóstico preditivo é de dar ao paciente

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a possibilidade de fazer escolhas saudáveis, modificando seu modo de vida e aumentando a vigilância

frente a determinados sintomas. Hoje existem testes de predisposição a doenças cardiovasculares e a

vários tipos de câncer. E estão sendo desenvolvidos testes preditivos de resposta a medicamentos.

A predição tem suas limitações. Por exemplo, as mulheres com o gene BRCA1 têm 80% de chances

de desenvolver câncer de mama aos 65 anos de idade; um risco considerado alto, mas sem certeza

absoluta (Figura 18.6). Graças ao diagnóstico preditivo, elas poderão aumentar as medidas

preventivas, isto é, mamografias, controles médicos etc.; outras, como a atriz Angelina Jolie, optarão

por uma mastectomia e a extirpação de ovários. Contudo, do ponto de vista preventivo, a

predisposição familiar responde só por 5 a 10% dos casos de câncer, os 90 a 95% restantes devem-se

a mutações adquiridas ao longo da vida.

--------------

FIGURA 18.6. O uso de arrays no diagnóstico de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2

Compara-se o padrão obtido na hibridização dos fragmentos de DNA marcados de uma paciente e os de um controle normal. A hibridização de ambos DNAs, do DNA da paciente ou do DNA do controle com as sondas, detectada por varredura (scanner), é sinalizada com cores diferentes em uma imagem computadorizada.

Tecido da paciente Tecido controle

Extração de mRNA

Extração de mRNA

Preparação de cDNA (transcriptase reversa)

Preparação de cDNA

(transcriptase reversa)

Amplificação do DNA e marcação com uma

substância fluorescente

Amplificação do DNA e marcação com

outra substância fluorescente

Mistura de ambos os cDNAs marcados

Hibridização com as sondas fixadas na placa do microarray e rinsagem

Varredura e leitura

Diagnóstico

Os pontos verdes e vermelhos identificam, respectivamente, os sítios de hibridização de cada um dos DNAs testados. Os pontos amarelos identificam os sítios de hibridização de ambas as amostras, os pontos pretos, os de nenhuma das duas amostras.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE/ TESTES DIAGNÓSTICOS

245

Um caso muito controverso é o da empresa 23andMe, com sedes nos Estados Unidos e no Reino Unido.

Mediante 199 dólares e uma amostra de saliva, acondicionada em um kit especialmente preparado e

enviado pelo correio, a empresa informa o cliente sobre sua ancestralidade e algumas características

gênicas que poderiam passar a sua descendência. Apesar de ser uma informação pouco relevante e

sem utilidade para a maioria das pessoas, a empresa tem sucesso comercial.

Calcula-se que, em 20 anos, nos países desenvolvidos, a expansão do mercado dos testes genéticos

possibilitará tratamentos de saúde pré-sintomáticos. Quantos desses testes serão necessários?

Quantas pessoas estarão dispostas a mudar seu estilo de vida em função de uma estimativa de risco?

Quantas pessoas se sentirão erroneamente seguras em relação ao estilo de vida que adotarem?

A implementação da medicina preditiva deve ser analisada criteriosamente por todos os setores da

sociedade. Quem controlará a aplicação dos testes genéticos? Como garantir que a decisão de se

submeter a um teste obedeça exclusivamente a uma escolha pessoal? Como seria armazenada essa

informação e com quem seria compartilhada? Seria possível formar uma subclasse de indivíduos sem

seguros de saúde nem empregos, discriminados em função de seus genes?

AS PATENTES

Nos Estados Unidos, até 2013, uma patente outorgava direitos sobre uma sequência de DNA ou um

gene a quem os identificara pela primeira vez. O indivíduo ou a empresa que obteve a patente podia

determinar, durante 20 anos, como essa sequência ou esse gene seriam usados em atividades de

pesquisa ou em testes clínicos.

Nessa data, e em ocasião do julgamento dos direitos da empresa Myriad sobre os genes BRCA1 e

BRCA2, a Corte Suprema de Justiça revogou todas as patentes anteriores, disponibilizando mais de 4

mil genes. Os juízes argumentaram que, por ser um produto da natureza, um gene não poderia ser

patenteado; em contraposição, o cDNA poderia ser patenteado, porque é um produto elaborado pelo

homem e não se encontra na natureza.

No Brasil, não são patenteáveis as sequencias de nucleotídeos isolados de organismos vivos

naturais. Contudo, o cDNA pode ser patenteado sempre que seja diferente do DNA codificador, com

base nos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

O ESPORTE

Na Olimpíada de Roma (1960), o atleta etíope Abebe Bikila ganhou a maratona correndo descalço. Um

fato dessa magnitude desafia a estrutura do esporte. Treinamento? Sem dúvida. Predisposição

genética? Hoje sabe-se que a aptidão para atividades de força ou de resistência está relacionada com

a estrutura das fibras musculares e da proteína codificada pelo gene ACTN3.

Teria a ancestralidade alguma relação com a subida ao pódio? Os atletas do leste africano brilham

nas maratonas, os do norte e oeste africano nas corridas de velocidade, os asiáticos nas provas de

levantamento de peso, os chineses na ginástica etc. Baseado nos dados coletados em numerosos

atletas de destaque em diferentes modalidades, o próximo passo poderia ser a utilização de

marcadores genéticos para selecionar atletas e direcioná-los para a modalidade esportiva considerada

mais adequada.

O determinismo genético pode, eventualmente, mostrar uma predisposição a certo tipo de

esporte, mas não define quem levará as medalhas: a vontade de ganhar, os fatores culturais e um

treinamento intenso parecem ser decisivos.

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246

A PRÁTICA FORENSE

Com exceção dos gêmeos idênticos, nenhuma pessoa é geneticamente idêntica à outra. Durante quase

um século, a identificação das pessoas dependeu das impressões digitais e, apesar das enormes

dificuldades em encontrar uma quantidade suficiente de material em estado de conservação

adequado, muitos crimes foram resolvidos graças a estudos bioquímicos e imunológicos.

A análise do DNA para a identificação das pessoas é utilizada desde a década de 1980, quando A.

Jeffreys idealizou a técnica do Fingerprint, estabelecendo uma relação única entre um indivíduo e sua

sequência gênica. A identificação recorre a pequenas sequências não codificadoras dispersas no DNA,

denominadas VNTRs ou vinters (do inglês, variable-number tandem repeats). Essas sequências

polimórficas repetem-se um número de vezes que pode variar de um cromossomo ao seu homólogo,

de modo que os fragmentos de restrição terão tamanhos diferentes.

Sondas genéticas específicas identificam até 20 tipos diferentes de sequências VNTRs. No gel de

eletroforese aparecerá um padrão de bandas individual, parecido com os códigos de barras usados no

comércio. Como a probabilidade de duas pessoas escolhidas ao acaso terem o mesmo perfil de DNA é

menor a um em um trilhão, o resultado é praticamente único para cada indivíduo.

Na determinação da paternidade, os estudos de grupos sanguíneos e de proteínas do soro têm sido

complementados ou substituídos pelos testes de DNA, que se transformaram no eixo de várias

investigações muito comentadas na mídia. No Brasil, o jogador de futebol Pelé teve que reconhecer a

paternidade de Sandra Regina, e o menino Pedrinho, sequestrado na maternidade logo após seu

nascimento pôde, anos mais tarde, reencontrar sua verdadeira família.

Apesar das críticas levantadas em relação às possibilidades de erros laboratoriais devidos à

contaminação de amostras, ao risco da participação de pessoal treinado inadequadamente e às

dificuldades de interpretar estatisticamente os dados, em poucos anos a análise de DNA se

transformou em uma ferramenta indispensável na prática forense.

Nos Estados Unidos, uma mancha de sêmem no vestido azul de uma estagiária se transformou em

uma peça essencial para solicitar o impeachment do presidente Clinton.

Depois de anos de mistérios e rumores, os cadáveres enterrados em uma fossa comum perto de

Jekaterinburg foram reconhecidos, em 1994, como sendo os do tzar Nicolau II, sua família e servidores,

assassinados durante a Revolução Russa (1918). Em 2012, a descoberta dos ossos do rei Ricardo III sob

um estacionamento e a análise do cromossomo Y, transmitido de pai a filho, levantou dúvidas sobre a

legitimidade da linha dos Plantagenetas ao trono da Inglaterra.

Em 1992, os ossos encontrados, anos antes, em uma tumba no Brasil, foram identificados como

pertencentes ao comandante do campo de extermínio de Auschwitz, Joseph Mengele, um dos homens

mais procurados após a Segunda Guerra Mundial. Determinadas variantes gênicas foram decisivas

para a sobrevivência, com 200 calorias diárias, dos defensores do sítio de Leningrado.

A análise de DNA é a única forma de reconhecer as vítimas de catástrofes, conflitos bélicos e

atentados como o do World Trade Center (Nova York, 2001) ou da estação de Madri (2004). E, anos

mais tarde, de seu instigador, Osama Bin Laden.

Quando as amostras estão muito degradadas, analisa-se o DNA mitocondrial. Transmitido por via

materna, esse DNA conta com uma região muito variável, apta para identificar pessoas e esclarecer

laços de parentesco. Entre 1976 e 1985, o regime militar que governou a Argentina exterminou 9 mil

a 30 mil pessoas (desaparecidas). Muitas crianças pequenas, separadas de suas famílias, foram

entregues para adoção. A comparação entre o seu DNA e o de suas avós maternas possibilitou a muitos

filhos de desaparecidos recuperar sua identidade verdadeira.

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C A P Í T U L O 19

BIOTECNOLOGIA E SAÚDE

A INDÚSTRIA DE MEDICAMENTOS

A origem da farmácia é atribuída a Galeno (século II), um médico romano que utilizava preparações

medicinais para tentar reestabelecer o equilíbrio destruído pela doença. Durante a Idade Média,

conservou-se seu legado, a denominada “farmácia galênica”, em conventos e monastérios. No século

XVI, o médico e alquimista suíço Paracelso formulou dois conceitos fundamentais: existe um remédio

específico para cada doença e qualquer remédio pode ser tóxico, dependendo da dose.

No século XVIII, o desenvolvimento da química na Europa resgatou do medievo algumas técnicas,

como a destilação e a extração com solventes. A química orgânica nasceu na primeira metade do

século XIX e, na mesma época, fundaram-se os primeiros laboratórios farmacêuticos. Rapidamente, os

métodos artesanais foram substituídos por sistemas de produção industrial.

Ao longo do século XX, gerou-se um setor que compreende os fabricantes de diversas categorias

de medicamentos (de marca, genéricos e de venda liberada), além de empresas que elaboram

produtos novos e outras que desenvolvem pesquisas, geralmente terceirizadas.

O mercado mundial de medicamentos movimenta mais de um trilhão de dólares por ano. Os

medicamentos mais vendidos são os oncológicos, os agentes respiratórios, os reguladores de lipídios,

os antidiabéticos e os antipsicóticos.

Apesar das empresas farmacêuticas dedicarem algumas pesquisas às doenças tropicais dos países

em desenvolvimento, ainda faltam medicamentos adequados para a malária, a doença de Chagas,

a doença do sono, a leishmaniose, a filariose, o dengue e a esquistossomose. Só 3% dos medicamentos

desenvolvidos entre 1975 e 1999 foram dedicados ao tratamento das doenças negligenciadas, e a

metade fora incentivada pela Organização Mundial da Saúde.

O controle da produção de medicamentos depende das grandes corporações multinacionais, que

evoluem em contínuos ciclos de fusão, consolidação e expansão. Por ser extremamente competitivo e

dinâmico, o setor é capaz de absorver rapidamente os avanços científicos e tecnológicos. Na disputa

por um mercado em crescimento, destacam-se como empresas líderes: Pfizer (Estados Unidos),

Novartis (Suíça), SanofiAventisPasteur (França), Roche Holding (Suiça), Merck & Co (Estados Unidos),

GlaxoSmithKline (Reino Unido), Amgen (Estados Unidos), AstraZeneca (Reino Unido), Eli Lilly & Co

(Estados Unidos) e Abbott Laboratories (Estados Unidos).

Apesar do número de medicamentos novos colocados no mercado ter diminuído nos últimos anos,

o número de compostos em testes pré-clínicos ou clínicos aumentou. A estrutura do setor poderá ser

reorganizada nos próximos anos, em função da chegada de novas tecnologias robóticas, informáticas

e biológicas.

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248

O DESENVOLVIMENTO DE UM MEDICAMENTO NOVO

A procura por um medicamento novo começa com estudos laboratoriais e testes em animais,

destinados a selecionar algumas moléculas seguras e com a atividade biológica procurada. Na indústria

cosmética, os testes em animais tendem a ser substituídos por testes em cultivos celulares e, na

indústria farmacêutica, começam a ser realizados testes em micro-órgãos de 3 a 4 milímetros, criados

a partir de células-tronco.

No final da fase pré-clínica, elabora-se o pedido de patente das moléculas consideradas

promissoras e solicita-se a aprovação das autoridades correspondentes para dar início aos testes

clínicos em seres humanos.

Uma vez aprovado o pedido, a primeira fase de testes visa o acompanhamento farmacocinético da

molécula em questão em 20 a 100 voluntários sadios, nos quais são realizados os primeiros estudos

de segurança e dosagem. A segunda fase analisa a eficiência do produto e detecta efeitos colaterais

em 100 a 500 pacientes voluntários. Na terceira fase monitoram-se as reações adversas ao uso

prolongado do medicamento em mil a 5 mil pacientes voluntários.

As 3 fases de testes clínicos podem levar de 4 a 8 anos. O medicamento só poderá ser

comercializado após a aprovação das autoridades, sendo necessária uma fase posterior de vigilância

farmacológica, porque alguns efeitos secundários de baixa frequência só podem ser evidenciados em

amostras numerosas. Muitos medicamentos não conseguem superar essa quarta fase, e houve casos

em que um produto teve que ser retirado do mercado. É o caso do Vioxx (Merck), um medicamento

comercializado para o tratamento da artrite e das dores articulares, descontinuado por aumentar o

risco de ataques cardíacos e derrames.

A indústria sustenta numerosas atividades de pesquisa e desenvolvimento de produtos novos. Das

5 mil a 10 mil substâncias que passam o crivo de uma primeira triagem, só uma chegará ao mercado,

em um processo que leva de 10 a 15 anos, a um custo mínimo estimado em 1 bilhão de dólares. O

retorno do investimento é garantido pelos lucros e por um sistema de patentes válido por 20 anos

(Figura 19.1).

PATENTES, GENÉRICOS E BIOSSIMILARES

A patente sobre um medicamento confere à empresa que o desenvolveu o direito de exclusividade

sobre sua comercialização durante 20 anos. Além de sustentar os custos de pesquisa e

desenvolvimento de um medicamento, boa parte do orçamento das empresas farmacêuticas está

dedicado a propaganda e marketing de seus produtos. Ao vencer a patente de um medicamento, este

se torna de domínio público, sendo copiado e comercializado como medicamento genérico por um

preço 30 a 50% menor.

Esse medicamento que entra no mercado é uma molécula sintética com seu nome genérico

(paracetamol, por exemplo) e sem o nome comercial (Tylenol). Com o mesmo princípio ativo e a

mesma dose que o medicamento de referência, os produtos genéricos causam efeitos terapêuticos

semelhantes. No Brasil, para ser comercializados, precisam da aprovação da Anvisa nos testes de

qualidade.

Em relação aos biofármacos, o medicamento produzido após o vencimento da patente é

denominado biossimilar, porque é sintetizado por um agente biológico e porque o processo de

obtenção pode não ser o mesmo. Sua atividade deve ser avaliada em ensaios bioquímicos,

imunológicos e biológicos in vivo e só pode ser considerado biossimilar se apresentar a mesma

qualidade, eficácia e segurança do produto original de referência. No Brasil, para ser comercializados,

os medicamentos biossimilares também precisam da aprovação da Anvisa nos testes de qualidade. Em

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2015, o Remsima® (infliximabe) foi o primeiro anticorpo monoclonal aprovado para uso no país, depois

de demonstrada sua similaridade com o produto biológico inovador Remicade® (infliximabe).

A distribuição de genéricos e biossimilares na rede pública de saúde representa, em qualquer país,

uma economia considerável. A produção de sete antivirais genéricos para o tratamento de HIV/Aids

por Farmanguinhos, e a preferência destes sobre os medicamentos de marca, para sua compra e

distribuição na rede pública de saúde, representaram para o Brasil uma economia de mais de US$ 400

milhões por ano.

Admite-se que, em alguns casos, como situações de emergências nacionais, circunstâncias de

extrema urgência e práticas anticompetitivas, o uso de uma patente sem a autorização do detentor do

direito seja justificado. Esta salvaguarda se encontra no Acordo sobre Aspectos dos Direitos de

Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS Agreement), da Organização Mundial do

Comércio, vigente desde 1995. O artigo 31 assinala que o uso da patente sem autorização estaria

justificado se tivessem sido feitos os esforços para sua utilização em condições comerciais razoáveis.

Quando da ameaça terrorista de antraz, os Estados Unidos cogitaram quebrar a patente do

antibiótico Cipro. Nos países em desenvolvimento, o acesso aos medicamentos é considerado um

direito fundamental dos pacientes de HIV/Aids, porém, apesar das longas discussões no marco da

Organização Mundial de Comércio, milhões de pessoas morrem anualmente por falta desses

medicamentos.

--------------

FIGURA 19.1. As etapas do desenvolvimento de um medicamento

Início das pesquisas. Estudos laboratoriais e testes em animais para avaliar a atividade biológica e a segurança.

Pedido de patente (3 a 4 anos). Pedido de aprovação para dar início aos testes em seres humanos. Fase I. Acompanhamento farmacocinético e primeiros estudos sobre segurança e dosagem em 20 a 100 voluntários sadios (1 a 2 anos). Fase II. Eficiência e efeitos colaterais em 100 a 500 pacientes voluntários (2 anos). Fase III. Monitoramento das reações ao uso prolongado do medicamento em 1.000 a 5.000 pacientes voluntários (3 a 4 anos).

Processo de aprovação do novo medicamento (1 a 2 anos)

Fase IV. Vigilância farmacológica Vencimento da patente

Genéricos

5.000 compostos

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24

Anos

5 compostos

1 composto

Descoberta Fase pré-clínica

Testes clínicos

Procedimentos administrativos

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OS PRINCÍPIOS ATIVOS DAS PLANTAS

O CASO DA ASPIRINA

Devido a seu poder de curar febres e acalmar dores, a casca do salgueiro (Salix Alba) era utilizada, já

no século XVIII, na preparação de poções medicamentosas. O princípio ativo é a salicilina, da qual foi

extraído o ácido salicílico. Em 1874, fundou-se a primeira empresa para sintetizar quimicamente o

ácido salicílico, uma substância que é capaz de aliviar eficazmente a dor, mas tem um gosto amargo

muito desagradável e causa problemas estomacais.

Por acetilação do ácido salicílico, o químico Felix Hoffman obteve o ácido acetilsalicílico, um

produto com menos efeitos colaterais que começou a ser comercializado em 1900 pela Bayer, sob o

nome de aspirina (Figura 19.2). Vendem-se hoje, aproximadamente, 10 bilhões de comprimidos por

ano.

Embora a aspirina alcançasse uma popularização extraordinária, o seu modo de ação permaneceu

desconhecido por muito tempo. Isso não impediu que fosse utilizada pelos astronautas durante o

primeiro voo à lua da nave Apolo, em 1969.

Dois anos mais tarde, descobriu-se que a ligação entre o ácido acetilsalicílico e algumas enzimas

dificulta a síntese de prostaglandinas, um grupo de substâncias que tornam os nervos mais sensíveis à

dor e são produzidas naturalmente durante as infecções ou na ocasião de ferimentos. Por impedir a

agregação das plaquetas, a aspirina também ajuda a prevenir problemas de coagulação sanguínea e

ataques cardíacos.

--------------

FIGURA 19.2: A fórmula da aspirina

--------------

OS FITOTERÁPICOS

Até o momento, os estudos etnobotânicos identificaram mais de 50 mil espécies de plantas medicinais.

Muitas delas representam a única fonte de tratamento acessível para a população mais pobre.

Também são utilizadas por outra parcela da população, adepta das medicinas alternativas e do

consumo de medicamentos fitoterápicos tradicionais, considerados mais suaves e com menos efeitos

colaterais. Nessa corrente de pensamento, o “natural” é percebido como bom, admitindo-se que o

extrato vegetal seria mais eficiente que alguma de suas partes, entre as quais se encontra o princípio

biologicamente ativo.

Os fitoterápicos são produtos relativamente baratos, de venda livre e com poucas oportunidades

de patentes. Contudo, sua eficácia depende das condições de cultivo das plantas, porque a síntese das

substâncias ativas depende do solo, da estação e até do momento do dia. Outras limitações

COOH COOH

Ácido salicílico Ácido acetilsalicílico OH O-CO-CH3

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importantes são a falta de conhecimento sobre os efeitos secundários, a ausência de estudos clínicos

em grande escala e a carência de controles de qualidade estritos.

A promoção da medicina tradicional pela WHO (do inglês, World Health Organization), enunciada

na declaração de Alma-Ata (1978) sobre a atenção primária a saúde, marca uma mudança de atitude

em relação aos fitoterápicos. A partir de 1990, o uso dos fitoterápicos aumentou significativamente,

estimando-se que o mercado global seja de US$ 62 bilhões por ano.

Com a publicação de um manual relativo ao controle de qualidade dos materiais extraídos das

plantas medicinais (WHO, 1998) e o estabelecimento de diretrizes gerais sobre metodologias de

pesquisa e avaliação das medicinas tradicionais (WHO, 2000), o mercado dos fitoterápicos entrou em

uma nova etapa.

AS TENDÊNCIAS RECENTES

Em uma linha totalmente diferente perfilam-se as grandes empresas de produtos farmacêuticos. A

descoberta recente de algumas substâncias antitumorais (taxol, vinblastina, vincristina etc.) de origem

vegetal estimulou a procura por princípios ativos em plantas, animais e microrganismos,

especialmente em regiões de grande biodiversidade.

Contudo, as opiniões não são unânimes em relação a possíveis e eventuais descobertas de

moléculas com aplicações terapêuticas. Algumas empresas farmacêuticas consideram que, em quase

duzentos anos de prospecção, já teriam sido descobertos praticamente todos os princípios ativos de

interesse e preferem passar ao desenho de medicamentos por química combinatória e modelos

computacionais. Outras ponderam que é na diversidade dos microrganismos e das plantas que devem

ser procuradas novas moléculas, porque ainda existiriam numerosas fontes de princípios ativos

desconhecidos na flora tão diversa como mal estudada de muitas regiões.

Recentemente, verificaram-se mudanças enormes no campo da pesquisa de produtos naturais,

graças à disponibilidade de tecnologias baseadas na robótica e na automação dos ensaios biológicos.

Em plena revolução cultural, a medicina chinesa obteve um antimalárico, a artemisina ou quinghaosu,

a partir de um extrato vegetal. Contudo, em 2000, sua produção por biologia sintética reduziu o custo

do tratamento a menos de 1 dólar.

A análise das substâncias químicas (alcaloides, terpenos, esteroides, glicosídeos etc.) presentes em

uma planta ou em seu extrato depende de técnicas analíticas automatizadas e de bancos de dados nos

quais armazenar as informações (Chemical Fingerprint). Os estudos quimioinformáticos estabelecem

correlações entre estrutura e atividade através de métodos estatísticos.

Uma vez identificado um princípio ativo, suas características farmacológicas poderão ser

melhoradas mediante transformações químicas, chegando-se a substituir uma molécula natural por

outra sintética equivalente ou ligeiramente modificada. A robotização permite realizar ensaios de

atividade biológica de até 200 mil produtos por dia em sistemas de alto rendimento (HTS, do inglês,

high throughput screening).

A IMPORTÂNCIA DE UM MARCO LEGAL

Nos países que contam com uma biodiversidade importante, discute-se como desenvolver os estudos

de bioprospecção e qual o papel que deveria ser desempenhado pelas instituições, nacionais e

estrangeiras, e pelas empresas farmacêuticas. O risco de biopirataria é real. No século XIX, plantas de

seringueira foram levadas de modo sub-reptício da Amazônia à Malásia. O captopril, um medicamento

derivado do veneno da cobra Bothrops, é hoje importado pelo Brasil em uma versão sintética.

Na Costa Rica, o InBio (Instituto Nacional de Biodiversidade) negociou, a partir de 1991, acordos de

bioprospecção no valor de US$ 1 milhão com a Merck e, mais tarde, com outras empresas

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farmacêuticas. Esses acordos contribuíram para aumentar a capacitação do país desde vários pontos

de vista: científico, tecnológico e institucional. No entanto, apesar de ter encontrado várias moléculas

promissoras, até o momento nenhuma delas originou um medicamento novo.

Aproximadamente na mesma época teve início um programa de prospecção de agentes bioativos

em terras áridas da América Latina. As numerosas críticas levantadas por estas e outras iniciativas,

como o convênio Novartis-Fundação Bio-Amazônia (2000), mostram as dificuldades em estabelecer

normas de trabalho dentro do marco legal para a proteção da biodiversidade, respeitando a

Convenção da Diversidade Biológica (1992) e os acordos posteriores.

Um exemplo recente refere-se às possíveis aplicações da sabara (Guiera senegalensis), uma planta

do Sahel, tradicionalmente utilizada pelo povo Dogon (Mali). Pesquisadores franceses isolaram um

princípio ativo (Guieranon B) que mostrara atividade anticancerosa nos testes pré-clínicos, registraram

a patente e planejam desenvolver um medicamento. Até o momento não foi contemplada nenhuma

compensação para o povo Dogon.

AS SUBSTÂNCIAS ANTIBIÓTICAS

O CASO DA PENICILINA

Até a Segunda Guerra Mundial, as únicas armas disponíveis no combate às infecções eram umas

poucas vacinas e antitoxinas. No início do século XX fora descoberto, no laboratório de Paul Ehrlich,

um derivado do arsênico para o tratamento da sífilis. Comercializado em 1910 pela empresa Hoechst,

o Salvarsan resultou em um terrível fracasso por duas razões: era tóxico e devia ser injetado, em uma

época em que não existiam seringas. Os primeiros inibidores do crescimento microbiano bem-

sucedidos foram as “sulfas”, derivados da sulfonamida, no final da década de 1930.

Em 1928, o bacteriologista Alexander Fleming observou a ausência de crescimento bacteriano em

um cultivo de estafilococos contaminado por um fungo. Depois de isolar, cultivar e identificar o fungo

como Penicillium notatum, Fleming conseguiu extrair a penicilina, uma substância antimicrobiana

eficaz quando testada em animais. Esse resultado não teve repercussão alguma na comunidade

científica, e, durante quase 10 anos, Fleming tentou infrutiferamente obter penicilina em estado puro.

Em 1940, nos laboratórios da Universidade de Oxford, H. Florey e E. Chain obtiveram um sal sódico

de penicilina que teve um efeito extraordinário nos primeiros ensaios clínicos (Figura 19.3). Contudo,

a quantidade disponível era pequena para uso terapêutico e, em plena Segunda Guerra Mundial

(1941), Florey e Chain transferiram-se para Peoria (Illinois, Estados Unidos), com o objetivo de iniciar

uma produção em grande escala.

--------------

FIGURA 19.3. A fórmula da penicilina

Na fórmula da penicilina pode-se observar um anel -lactâmico e uma cadeia

lateral (R). Algumas bactérias sintetizam -lactamases, enzimas que, ao destruir o anel correspondente, desativam as penicilinas naturais. Modificando a cadeia lateral, obtiveram-se as penicilinas semissintéticas, resistentes a essas enzimas.

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Dois fatores possibilitaram a produção industrial de penicilina. O primeiro, a descoberta em um melão

podre de uma linhagem de Penicillium chrysogenum capaz de produzir 200 vezes mais penicilina que

a linhagem original. O segundo, a substituição do cultivo em garrafas pelo cultivo submerso em

biorreatores, com capacidade entre 40 mil e 200 mil litros, possibilitando um aumento na

produtividade que passou de 50 a 100 mg/l.

A participação da indústria farmacêutica (Pfizer, Merck) foi decisiva para o sucesso do

empreendimento. Em 1944, as forças aliadas dispuseram de suficiente penicilina para o tratamento

dos soldados feridos na invasão da Europa.

OS LIMITES AO USO DE ANTIBIÓTICOS

O sucesso da penicilina estimulou a procura de microrganismos produtores de antibióticos no solo, um

ambiente muito competitivo, onde um antimicrobiano confere uma vantagem seletiva. Assim,

descobriram-se a actinomicina, a neomicina e a estreptomicina, o primeiro antibiótico eficiente para

o tratamento da tuberculose. Um pouco mais tarde entraram no mercado alguns antibióticos de amplo

espectro, como o cloranfenicol, a aureomicina e a terramicina.

Paralelamente, a indústria aperfeiçoou os métodos de extração e de purificação e as pesquisas

sobre formas moleculares alternativas mais eficientes. Alguns antibióticos de origem natural, como a

penicilina e o cloranfenicol, podem ser sintetizados e/ou modificados quimicamente.

A descoberta de outros antibióticos (eritromicina, vancomicina, ampicilina, meticilina,

cefalosporina) possibilitou a cura de doentes e feridos para os quais, meio século atrás, a medicina não

tinha tratamento. Contudo, o tempo mostrou o outro lado da moeda. O uso indiscriminado de

antibióticos, na clínica médica e nas criações de animais, favoreceu a aparição de linhagens resistentes,

que se espalharam rapidamente.

Os antibióticos agem de diversos modos, mas sempre tendo como alvos algumas poucas funções

vitais da célula bacteriana, tais como a síntese da parede celular, dos ácidos nucleicos, das proteínas

ou do ácido fólico. Para cada alvo atingido, aparece uma forma específica de resistência. O anel -

lactâmico das penicilinas e cefalosporinas, por exemplo, é desativado pelas bactérias produtoras de -

lactamases. Uma modificação do sítio-alvo no ribossomo acaba com a inibição da síntese proteica pela

estreptomicina. Basta uma alteração da permeabilidade celular para que a tetraciclina seja bombeada

para fora das células. E a transferência horizontal de plasmídeos entre microrganismos pode

disseminar a resistência múltipla às drogas.

De fato, se quisermos manter alguma vantagem sobre as bactérias, nessa corrida sem fim entre a

utilização de antibióticos e a aparição de microrganismos resistentes, novos medicamentos terão que

ser descobertos.

A NECESSIDADE DE INOVAÇÃO

Existem muitas substâncias com propriedades antibióticas, mas poucas são interessantes do ponto de

vista clínico. As principais classes de antibióticos foram descobertas entre 1940 e 1962. Depois de

várias décadas sem grandes inovações nesse campo, foram descobertas as oxazolidinonas, moléculas

bloqueadoras da síntese de proteínas bacterianas (Tabela 19.1).

Em mais de 40 anos, nenhum antibiótico novo contra bactérias Gram negativas chegou ao mercado.

Estima-se que, em 2050, os microrganismos multirresistentes a antibióticos poderiam causar a morte

de 10 milhões de pessoas por ano e perdas econômicas de 100 trilhões de dólares.

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TABELA 19.1. A linha do tempo de entrada dos antibióticos e antibacterianos no mercado

ANTIBIÓTICOS E ANTIBACTERIANOS Introdução

Sulfonamidas (Sulfas) 1936

β-lactâmicos 1940

Cloranfenicol, Tetraciclinas 1949

Aminoglicosídeos 1950

Macrolídeos 1952

Quinolonas, estreptograminas 1962

Oxazolidinonas 2000

Lipopeptídeos 2003

Glicilciclinas 2005

Mutilinas 2007

--------------

Devido às dificuldades encontradas em descobrir moléculas novas, e para contornar a aparição de

resistência, a indústria investiu nas chamadas me-too-Drugs, isto é, substâncias iguais com pequenas

modificações químicas. Por outro lado, o vencimento de muitas das patentes possibilitou o

aparecimento das formas genéricas de alguns dos antibióticos mais difundidos, como o Augmentin

(amoxacilina/clavulanato) ou o Cipro (ciproflaxin). Os antibióticos representam 65% do mercado de

medicamentos anti-infecciosos, que inclui também os antivirais e os antifúngicos.

Nos últimos anos, muitas empresas abandonaram o mercado para atender o setor, bem mais

lucrativo, das doenças crônicas. Não obstante, cinco das maiores ainda continuam produzindo

antibióticos: Abbott, Novartis, AstraZeneca, Merck, Pfizer e Johnson & Johnson. Outras firmas novas

ocuparam o espaço vacante, como Basilea Pharmaceutica, que lançou o Ceftobiprole, uma

cefalosporina de quinta geração, eficaz contra os MRSA (do inglês, meticillin-resistent Staphylococcus

aureus) e outros supermicróbios.

Atualmente, existem várias estratégias para o desenvolvimento de novos antibióticos. Sistemas

robotizados para triagem de alto desempenho (HTS, high-throughput screening) podem testar a

atividade inibitória do crescimento de microrganismos em centenas de compostos ou extratos

naturais. Ou pesquisar os peptídeos naturais, produzidos por seres vivos terrestres e marinhos, e

incrementar sua ação antibiótica mediante alterações na estrutura molecular. E, também, investigar a

atividade antimicrobiana de peptídeos sintéticos, construídos por química combinatória.

Procura-se algum alvo, no metabolismo bacteriano, que impeça a infecção. Os novos métodos in

silico possibilitam a triagem de estruturas moleculares relacionadas com uma atividade biológica

determinada, assim como a utilização dos dados genômicos para identificar um alvo medicamentoso.

O desenho de produtos novos estaria ligado à genômica comparativa e funcional dos

microrganismos, uma área capaz de esclarecer a função dos genes e de mostrar quais os alvos que

poderiam ser atacados. Centenas de genomas bacterianos já têm sido sequenciados. Estima-se que os

antibióticos baseados na genômica estejam disponíveis na próxima década.

O caminho está sendo trilhado por algumas pequenas empresas biotecnológicas, apesar da

dificuldade em enfrentar a etapa dos testes clínicos, que demandam inversões estimadas em 150 a

200 milhões de dólares, valores altíssimos que só podem ser cobertos pelas grandes empresas

farmacêuticas.

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AS PRIMEIRAS MOLÉCULAS TERAPÊUTICAS

O CASO DA INSULINA

A insulina é um mensageiro químico (hormônio), produzido no pâncreas, que regula o metabolismo

do açúcar (glicose) no corpo. (Figura 19.4). A destruição das células do pâncreas pelo sistema imune

causa uma deficiência na produção de insulina, um aumento no nível de glicose no sangue e sua

excreção na urina.

As complicações resultantes incluem nefropatias, retinopatias, neuropatias e doenças

cardiovasculares. O quadro descreve o diabetes mellitus tipo 1, ou diabetes juvenil, uma doença que

ataca crianças e adolescentes, conhecida há séculos e que hoje pode ser tratada.

Existe outra forma da doença, diabete tipo 2, devida à redução do número de receptores de insulina

nas células musculares e adiposas. O paciente não responde adequadamente à insulina ou não a

produz em quantidade suficiente.

Esta forma costuma se manifestar em pessoas mais velhas, com sobrepeso, inativas e com uma

história familiar. O tratamento envolve dieta e exercícios moderados, além de medicamentos, entre

os quais, eventualmente, a insulina.

Em 1920, F. Banting comprovou o efeito hipoglicemiante de extratos de pâncreas de cachorro e,

logo depois, deu-se início à comercialização de insulina extraída de pâncreas bovinos e porcinos. Essas

insulinas animais salvaram numerosas vidas, mas, por diferir da insulina humana em alguns

aminoácidos, acabavam provocando reações alérgicas.

Do ponto de vista da estrutura química, as diferenças são pequenas. A molécula de insulina humana

consta de 51 aminoácidos, distribuídos em duas cadeias unidas entre si por pontes bissulfeto. A

insulina bovina difere da humana nas posições 8 e 10 da cadeia A e na posição 30 da cadeia B, mas a

insulina porcina só difere na posição 30 da cadeia B (Figura 19.4 A).

O tamanho da molécula de insulina torna a síntese química economicamente inviável (Figura 19.4

A). Contudo, basta substituir um aminoácido (alanina) por outro (treonina) na extremidade de uma

das cadeias da insulina suína para que a sequência molecular seja igual à da insulina humana. Esta

insulina semissintética representou um enorme progresso em relação às insulinas animais.

A tecnologia do DNA recombinante revolucionou a produção de insulina humana, possibilitando a

síntese em microrganismos geneticamente modificados: primeiro em Escherichia coli (Eli Lilly, 1982),

mais tarde em leveduras (Novo, 1987). Por ser um produto mais estável e de melhor qualidade que os

anteriores existentes no mercado, a insulina recombinante representa um dos primeiros e indiscutíveis

sucessos da biotecnologia (Figura 19.4 B).

A SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO NATURAL

Seja por influência de fatores genéticos, ambientais ou culturais, ou também pela existência de

melhores métodos de diagnóstico, milhões de pessoas no mundo inteiro dependem hoje de injeções

regulares de insulina. A incidência da diabete de tipo 2 está aumentando em crianças e adolescentes,

em alguns grupos étnicos que adotaram modos de vida e de alimentação diferente e, também, nas

populações urbanas de migrantes. Em 2025, o número de diabéticos poderia chegar a 300 milhões.

Nos próximos anos, o mercado passará por reformulações, ao expirar algumas patentes e serem

disponibilizadas insulinas não injetáveis, administradas oralmente ou por inalação. Algumas inovações,

como o grau de pureza e o tempo de reação, são de grande importância para a eficácia do tratamento.

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FIGURA 19.4. A insulina humana

C. A molécula de insulina

D. A síntese da insulina

a) A síntese in vivo da insulina nas células pancreáticas

b) A síntese em Escherichia coli (1982)

Um organismo procarionte é incapaz de realizar modificações pós-traducionais. É possível sintetizar pró-insulina para transformá-la enzimaticamente em insulina, ou sintetizar cada uma das cadeias em separado e associá-las mais tarde, como ilustrado no esquema.

Cadeia B

Cadeia A

Peptídeo-sinal Remoção do sinal e Remoção Tradução união das cadeias A e B da cadeia C

mRNA de insulina Molécula precursora Pró-insulina Insulina

Síntese da cadeia A

Inserção no plasmídeo Extração da cadeia proteica A e clonagem em E.coli Síntese da cadeia B Inserção no plasmídeo Extração da cadeia proteica B e clonagem em E.coli

União química das cadeias A e B

Insulina

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Em 2001, a Novo Nordisk absorveu a área de produção da Biobrás, uma empresa brasileira que durante

mais de 20 anos abasteceu de insulina grande parte do mercado latino-americano. Uma parceria entre

a Fundação Oswaldo Cruz e a empresa Biomm, que conservou a patente para a insulina humana

desenvolvida anteriormente pela Biobrás, poderá colocar a insulina no mercado e distribuí-la no SUS

(Sistema único de Saúde), a partir de 2017.

Atualmente, a produção de insulina humana recombinante se concentra em três grandes

conglomerados farmacêuticos: Eli Lilly, Novo Nordisk e Sanofi.

AS PROTEÍNAS RECOMBINANTES

AS BASES TECNOLÓGICAS

As proteínas de uso terapêutico têm um tamanho 100 vezes maior que o das moléculas presentes nos

medicamentos convencionais. Sua produção seria inviável sem a tecnologia do DNA-recombinante,

porque os métodos extrativos fornecem quantidades mínimas que nunca chegariam a satisfazer a

demanda do mercado.

A rápida incorporação das novas tecnologias nos métodos de produção facilitou, já na década de

1980, a obtenção de insulina e de interferon mediante bactérias e leveduras modificadas

geneticamente, cultivadas em biorreatores. Mais tarde, os microrganismos foram substituídos em

alguns processos por células animais que, apesar de mais difíceis de cultivar, são capazes de levar a

cabo as modificações pós-traducionais indispensáveis.

Com o objetivo de aumentar a produtividade e diminuir os custos, foram construídos plantas e

animais transgênicos (vacas, cabras, ovelhas etc.) para uma centena de proteínas de tipo

recombinante, muitas das quais se encontram já na fase de testes clínicos. O primeiro anticoagulante

extraído do leite de uma cabra transgênica entrou no mercado em 2009 (Atryn, GTC Biotherapeutics).

O medicamento ZMapp (Mapp Biopharmaceuticals), para tratamento de Ebola, reúne 3 anticorpos

monoclonais humanizados, produzidos em folhas de tabaco. Ainda em fase experimental, teve sucesso

quando utilizado emergencialmente para tratar pessoal de saúde contaminado por ocasião da

epidemia que assolou vários países africanos.

A hostilidade da sociedade, em relação às plantas e animais transgênicos, não existe quando se

trata de produzir medicamentos. O princípio de equivalência, contencioso no setor de agroalimentos,

é totalmente aceito em relação aos novos medicamentos. Uma atitude contraditória que incita à

reflexão.

OS PRODUTOS E SUAS UTILIZAÇÕES

Além da insulina recombinante, um dos primeiros produtos obtidos por engenharia genética foi o

interferon (IFN), uma proteína que interfere na replicação de vírus, bactérias e células tumorais.

Existem vários tipos e são utilizados no tratamento de câncer, esclerose múltipla, hepatite B e C.

As proteínas terapêuticas de origem recombinante cumprem diversas funções (Tabela 19.2).

Algumas substituem ou complementam moléculas naturais, tais como hormônios, interferones,

interleucinas, fatores estimuladores do crescimento celular, fatores de coagulação sanguínea,

enzimas. Outras são produtos especialmente desenhados para cumprir uma função medicamentosa:

trombolíticos (tPA ou fator ativador de plasminogênio, estreptoquinase, uroquinase), anticorpos

monoclonais e antígenos bacterianos para vacinas.

Utilizam-se fundamentalmente nas áreas de hematologia, oncologia, diabetes e endocrinologia,

artrite, inflamação, doenças imunes e doenças genéticas lisossômicas (Gaucher, Hurler, Fabry, Pompe).

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Proximamente estarão vencendo as patentes de várias moléculas: -interferon, insulina humana,

hormônio de crescimento, vacina contra a hepatite B etc. Dado o custo que os novos medicamentos

representam para os sistemas de saúde, cogita-se a produção de genéricos de várias proteínas

terapêuticas.

OS MEDICAMENTOS PERSONALIZADOS

A FARMACOGENÔMICA

O mapeamento do genoma foi o primeiro passo para o desenvolvimento de novos produtos e ações

terapêuticas, um terreno onde se firma a farmacogenômica, uma disciplina nova que visa identificar

as diferenças genéticas associadas a diversas doenças.

Os seres humanos compartilham 99,9% do genoma, de modo que as variações entre eles devem

ser procuradas no 0,1% restante, isto é, entre os 30 milhões de polimorfismos de um único nucleotídeo

ou SNPs (do inglês, single nucleotide polymorphisms). Trata-se de variações de uma base a cada 1.000

nucleotídeos, distribuídas ao longo do genoma. As mais interessantes são as que ocorrem dentro de

um gene ou em uma região reguladora.

Sabendo que dois pontos que se encontram muito próximos no cromossomo tenderão a ser

transmitidos juntos, pode-se dividir o cromossomo em blocos de aproximadamente 10 mil bases

(haplótipos) e caracterizá-los por alguns dos SNPs de cada bloco. Esse era o objetivo do International

HapMap, recentemente concluído e baseado no genoma de pessoas de origem europeia, asiática e

africana.

A importância do mapeamento do genoma foi claramente percebida pelas empresas

farmacêuticas. Antes de se completar, algumas das grandes empresas farmacêuticas (Glaxo Wellcome,

Novartis) começaram a compilar informações sobre genes associados a doenças e a localizar SNPs em

alguns genes previamente selecionados. Essas informações serão complementadas com os dados

obtidos mediante os novos métodos de sequenciamento.

Em 1999, a empresa americana deCode obteve, por 200 milhões de dólares, a exclusividade para

elaborar um gigantesco banco de dados com os registros de saúde, as genealogias e os perfis de DNA

dos habitantes da Islândia. O objetivo principal era o estudo das doenças no contexto histórico-

evolutivo de uma população homogênea dos 270 mil habitantes da ilha, povoada mil anos atrás pelos

viquingues e com poucos contatos externos posteriores.

O projeto suscitou controvérsia. Um acordo da deCode com a Hoffmann-La Roche visava identificar

os genes responsáveis por várias doenças. No caso de serem obtidos resultados positivos, os

habitantes de Islândia teriam direito, por cinco anos, à gratuidade nos medicamentos desenvolvidos.

Em função dos problemas éticos e legais, levantados oportunamente, a empresa enfrentou algumas

dificuldades na construção de seu banco de dados de 140.000 islandeses.

Apesar de ter descoberto uma dezena de alvos medicamentosos, entre os quais proteínas

envolvidas em doença cardíaca, osteoporose e esquizofrenia, a empresa não obteve resultados

suficientemente rápidos para satisfazer os seus investidores. Em bancarrota, a empresa acabou sendo

vendida, sendo atualmente propriedade da Amgen Decode Genetics. Devido a impedimentos legais,

os dados e as amostras biológicas não puderam ser vendidos e permanecem na Islândia.

A empresa conta hoje com dados parciais de 150 mil pessoas voluntárias e com o sequenciamento

de 10 mil genomas que, associados aos registros de saúde, permitiram inferir quais os riscos de

determinadas variantes gênicas. Contudo, em função de uma condição de sigilo contratual, a empresa

não pode transmitir aos voluntários a informação sobre quais os seus riscos de doença.

Existem outros projetos na mesma linha de investigação, tais como Estonian Genome (Estonia),

Galileo Genomics (Canadá), Oxagen (Inglaterra), Rockefeller University (Micronésia), UK.Bank

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / INDÚSTRIA DE MEDICAMENTOS

259

(Inglaterra). Wellcome Trust Case Control Consortium encontrou 24 associações a 7 doenças (Crohn,

diabetes 1 e 2, doença cardiovascular, hipertensão, artrite reumatoide e transtorno bipolar).

A FARMACOGENÉTICA

Outra disciplina nova é a farmacogenética, que investiga as diferenças genéticas em uma população

que permitem prever diferentes respostas a um medicamento. Receadas por médicos e pacientes, as

reações adversas são temidas pela indústria farmacêutica, que se protege mediante bulas

cuidadosamente redigidas. Nos Estados Unidos, as reações adversas causam 100 mil mortes e 2

milhões de hospitalizações por ano.

Os medicamentos passam por várias fases de estudos clínicos antes de chegar ao mercado.

Contudo, as pessoas não reagem do mesmo modo a um medicamento, que pode ser eficiente para

uns e tóxico para outros.

Aproximadamente 60% dos medicamentos são metabolizados por uma família de enzimas

(citocromo P450). Algumas pessoas os degradam rapidamente, outras não, dependendo de suas

características enzimáticas individuais. Sabendo a qual dos dois grupos pertence um paciente, pode-

se determinar qual a dose do anticoagulante que lhe deverá ser administrada, minimizando os efeitos

adversos.

Associando marcadores genéticos a respostas diferenciais a medicamentos, pode-se dividir a

população em subgrupos e oferecer um tratamento “personalizado”. Atualmente, antes de iniciar um

tratamento de câncer de mama com a herceptina, deve-se realizar um teste genético na paciente para

saber se o medicamento se ajusta, ou não, ao seu caso. Em pacientes HIV positivos, procura-se

determinar a presença do alelo HLA-B*5701 antes de iniciar o tratamento com abacavir, porque os

portadores desse alelo podem ser hipersensíveis ao medicamento. Aprovado pela FDA, o Bidil é um

medicamento para doença cardiovascular, destinado exclusivamente aos pacientes afroamericanos.

O desenvolvimento da farmacogenética dará aos pacientes mais chances de receber a medicação

adequada e na dose certa. Por outro lado, as empresas farmacêuticas poderão escolher seus

voluntários para os testes clínicos no subgrupo apropriado, evitando que um produto novo seja

descartado por falta de resposta adequada. No futuro, em vez de um único produto campeão de

vendas, as empresas farmacêuticas poderão oferecer medicamentos diferentes, cada um dos quais

respondendo às expectativas de um tipo de consumidor.

AS DOENÇAS ÓRFÃS

Uma doença é considerara rara, ou órfã, quando atinge um número pequeno de pessoas. Existem

aproximadamente 7 mil tipos de doenças raras, 80% de origem genética, que afetam 350 milhões de

pessoas. Para a indústria, a menos que receba algumas compensações, qualquer doença que afete

menos de 200 mil pessoas é desinteressante, em termos de pesquisa e desenvolvimento de

medicamentos.

Nos Estados Unidos, o Orphan Drug Act (1983) garante incentivos financeiros às empresas

farmacêuticas que desenvolvam produtos para essas doenças. Também garante que, durante sete

anos, nenhum medicamento equivalente será aprovado, a não ser que se trate de outro que lhe seja

superior. Legislações equivalentes foram promulgadas em outros países (Japão, 1993; Austrália, 1998;

Cingapura, 1999; União Europeia, 2000).

Abre-se assim um campo no qual as empresas de biotecnologia se inserem com sucesso, já que

seus produtos visam doenças de origem genética, envolvendo alterações de receptores celulares,

enzimas e proteínas estruturais. Em 2015, a metade dos medicamentos aprovados correspondia a

doenças órfãs e, atualmente, mais de 560 encontram-se em desenvolvimento.

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260

TABELA 19.2. Alguns biofármacos de interesse médico

Fonte: Nature Biotechnology, 2003, vol. 21, nº8, em Porque Biotecnologia, Cuaderno n049

PRODUTO INDICACÃO TERAPÊUTICA

FATORES DE COAGULAÇÃO

Fator VIII Hemofilia A

Fator IX Hemofilia B

Fator VIIa Certas formas de hemofilia

ANTICOAGULANTES

Fator ativador de plasminogênio Infarto de miocárdio

Fator ativador de plasminogênio Infarto de miocárdio

Hirudina Trombocitopenia e prevenção de trombose

HORMÔNIOS

Insulina Diabete

Hormônio de crescimento Deficiência do hormônio em crianças, acromegalia, síndrome de Turner

Hormônio folículo-estimulante Infertilidade, anovulação e superovulação

Hormônio paratiróideo Osteoporose

Gonadotrofina coriônica Reprodução assistida

Tirotrofina Detecção /tratamento de câncer de tireoide

Hormônio luteinizante Algumas formas de infertilidade

Calcitonina Doença de Paget

Glucagon Hipoglicemia

FATORES HEMATOPOIÉTICOS

Eritropoietina (EPO) Anemia

Fator estimulante de colônias de granulócitos/macrófagos (GM-CSF)

Neutropenia, transplante autólogo de medula

INTERFERON E INTERLEUCINAS

Interferon alfa (IFN alfa) Hepatite B e C, diferentes tipos de câncer

Interferon beta (IFN beta) Esclerose múltipla

Interferon gamma (IFN gamma 1b) Granulomatose crônica

Interleucina 2 (IL-2) Câncer de rim

VACINAS

Hepatite B Imunização contra a hepatite B

Hepatite A Imunização contra a hepatite A

Doença de Lyme Imunização contra a doença de Lyme

ANTICORPOS MONOCLONAIS RECOMBINANTES

Anti-IgE (recombinante) Asma

Anti-TNF (recombinante) Artrite reumatoide

Anti-IL2 Prevenção da rejeição aguda do transplante de rim

OUTROS PRODUTOS RECOMBINANTES

Proteína morfogênica do osso-2 Fratura de tíbia

Galactosidase Doença de Fabry (deficiência de α-galactosidase)

Iaronidase Mucopolissacaridose

Proteína C Sepse severa

β-glucocerebrosidase Doença de Gaucher

DNAse Fibrose cística

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / INDÚSTRIA DE MEDICAMENTOS

261

Dada a demora e as dificuldades inerentes ao lançamento de um medicamento novo, as doenças órfãs

representam um filão economicamente interessante, tanto para as pequenas como para as grandes

empresas. Além de receber mais rapidamente a aprovação das autoridades, o grupo-alvo é integrado

com pacientes diagnosticados e não tratados, dispostos a aceitar o uso de um medicamento. Se a

resposta dos pacientes for favorável, as possibilidades de lucro aumentam consideravelmente.

E do ponto de vista dos pacientes? Consideremos o caso de Kalideco, de Vertex Pharmaceuticals,

que rende aproximadamente 300 mil dólares por ano. Trata-se de uma medicação para fibrose cística

muito eficiente para os pacientes com uma mutação em G551D, presente em 4% dos 70 mil casos de

fibrose cística, mas ineficiente em pacientes com a mutação em F508, que afeta 50% dos casos

existentes.

O MERCADO DOS BIOMEDICAMENTOS

A TENDÊNCIA GERAL

Estima-se que o mercado global de produtos biotecnológicos represente pouco mais da décima parte

do mercado farmacêutico mundial. Mais de 300 proteínas recombinantes aprovadas e muitas outras

em testes clínicos indicam um mercado em crescimento, do qual o setor mais dinâmico é o dos

anticorpos monoclonais. Vários desses biofármacos, líderes de vendas, destinam-se aos tratamentos

oncológicos, de artrite e de outras doenças imunes e inflamatórias. (Tabela 19.3). Contudo, existe pelo

menos um que permite a obtenção de imagens, e outro em que a molécula se encontra acoplada a

uma toxina que destrói a célula cancerosa.

Em função dos avanços nos estudos genômicos, muitos outros biofármacos, visando uma centena

de doenças, serão descobertos e patenteados nos próximos anos. Os imensos bancos de dados e as

técnicas de triagem assistidas por computador permitirão diminuir o tempo necessário para os estudos

experimentais. Os principais alvos de uma centena de doenças dos mais de 900 medicamentos que se

encontram em desenvolvimento são o câncer (37%), as doenças infecciosas (vacinas, 15%), doenças

autoimunes (8%) e doenças cardiovasculares (6%).

Do consumo mundial de medicamentos, 88% correspondem a um bloco de regiões formado por

América do Norte (49%), Europa (28%) e Japão (11%). Como a população destes países está

envelhecendo, os principais alvos para o desenvolvimento de medicamentos novos são as doenças

cardiovasculares, o câncer, as alterações respiratórias e as que afetam a qualidade de vida

(osteoporose, artrite, doenças de Parkinson e de Alzheimer).

A maioria das grandes corporações está instalada nos Estados Unidos, onde, além de seu principal

mercado, encontram uma legislação favorável. Na América Latina, o setor está dominado pelas

empresas internacionais e, salvo algumas exceções (Bio Sidus, ProBioMed, Heber Biotec), há poucos

investimentos na pesquisa e no desenvolvimento de novos produtos.

O custo dos medicamentos depende em grande parte dos investimentos da indústria farmacêutica

em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. O tempo e o custo de desenvolvimento de um

medicamento dependem da duração dos testes clínicos e do uso da tecnologia (robótica,

bioinformática, química combinatória, triagem de compostos biológicos em alta velocidade, biochips

e microarrays).

Em 2014, as principais empresas produtoras de proteínas terapêuticas foram Roche Holding (Suiça),

Gilead Sciences (Estados Unidos), Amgen (Estados Unidos), Biogen (Estados Unidos), Celgene (Estados

Unidos), Shire (Reino Unido), CSL (Estados Unidos), Crifols (Espanha), UCB (Bélgica) e Novo Nordisk

(Dinamarca). Estima-se que, em 2020, a metade dos 100 medicamentos mais vendidos seja

biotecnológica.

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262

TABELA 19.3. Os medicamentos biológicos mais lucrativos em 2014 (Statista, Phrma)

TRATAMENTO NOME COMERCIAL (Nome genérico)

EMPRESAS / VENDAS (MILHÕES DE DÓLARES)

Artrite reumatoide e doenças relacionadas

HUMIRA (Adalimumab) Abbott / 12.543

REMICADE (Infliximab) Johnson & Johnson / 9.240

RITUXAN (Rituximab) Biogen Idec / 8.678

ENBREL (Etarnecept) Amgen / 8.538

Diabete LANTUS (Insulina Humana) Sanofi / 7.279

Diversos tipos de câncer AVASTIN (Bevazizumab) Roche / 6.957

HERCEPTIN (Trastuzumab) Roche / 6.793

NEULASTA (Pegfilgastrin) Amgen / 5.857

REVLIMID (lenalidomide) Celgene / 4.980

GLEEVEC (Imatinib) Novartis / 4.695

VELCADE (Bortezomibe) Takeda/J&J / 1766

Pneumonia meningocóccica PREVNAR (Vacina) Pfizer/ 4.464

Esclerose múltipla AVONEX (α e β Interferon) Biogen Idec / 3.013

REBIF (β interferon) Merck / 2.414

Doenças hematológicas SOLIRIS (Eculizumab) Alexion Pharmaceuticals / 2.225

ADVATE (Fator VIII) Baxter / 2.083

--------------

Para as grandes empresas farmacêuticas, uma medida do sucesso significa conseguir um medicamento

que alcance um valor de vendas de 1 bilhão de dólares (blockbusters). Em 2014, os maiores lucros

corresponderam aos medicamentos destinados ao tratamento de artrite e doenças relacionadas,

diversos tipos de câncer, diabete, esclerose múltipla e uma vacina antimeningocóccica (Tabela 19.3).

No mesmo ano, dos dez medicamentos melhor colocados, 6 eram anticorpos monoclonais.

AMÉRICA LATINA

Na América Latina existe uma indústria farmacêutica que fabrica medicamentos para consumo interno

e para exportação, destacando-se Argentina, Brasil, Cuba e México. Os principais produtos

biotecnológicos são os anticoagulantes (eritropoietina), os hormônios, os interferones (α e β) e os

fatores estimuladores do crescimento celular.

A Argentina conta com um setor farmacêutico sólido e competitivo. Várias proteínas

recombinantes são produzidas localmente, por três empresas biotecnológicas nacionais (Bio Sidus, PC-

gen, Zelltek) que vendem seus produtos através de suas empresas farmacêuticas correspondentes

(Sidus, Pablo Cassará) e os exportam para diversos países de Ásia, Oriente e América Latina. Uma

empresa estrangeira, Sanofi, produz vacinas contra a hepatite B.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / INDÚSTRIA DE MEDICAMENTOS

263

Bio Sidus obteve sucesso com seu tambo farmacéutico, pequenos rebanhos de vacas transgênicas

produtoras de hormônio de crescimento, de insulina ou de leite maternizado, um empreendimento

que irá sem dúvida lhe garantir uma posição de destaque no setor produtivo. O Laboratório Pablo

Cassará é outra empresa tradicional que proximamente irá colocar no mercado uma nova vacina em

duas doses contra a hepatite B e, recentemente, obteve uma enzima recombinante capaz de reparar

as lesões causadas pela exposição aos raios X. Ambas as empresas distribuem seus produtos no Brasil.

Diferente da Argentina, no Brasil as empresas públicas como Farmanguinhos e Instituto Butantã

tem um papel determinante na produção de medicamentos, destacando-se respectivamente na

produção de retrovirais e eritropoietina. Contudo, depende-se ainda da importação de biofármacos,

alguns dos quais são distribuídos pelo Sistema Único de Saúde (eritropoietina, imunoglucerase,

infliximab, interferon, somatotropina recombinante humana). Acordos de transferência de tecnologia,

envolvendo laboratórios nacionais (públicos e privados) e estrangeiros, visam reverter essa

dependência.

México é produtor de medicamentos de alta tecnologia (antibióticos, antiinflamatórios,

tratamentos contra o câncer). A empresa ProBioMed tem desenvolvido com o setor universitário uma

dezena de proteínas recombinantes (anticoagulantes, interferones, fatores estimuladores do

crescimento celular) para uso interno e exportação para outros países de América Central e América

do Sul. Outros laboratórios (Instituto Bioclón, grupo Silanes) têm se destacado na produção de

antitoxinas.

Cuba tem registrados numerosos produtos biotecnológicos, desenvolvidos por Centros de Pesquisa

(Centro de Inmunología Molecular, Centro de Ingeniería Genética y Biotecnología, Centro Nacional de

Biopreparados e Instituto Finlay) e comercializados por empresas farmacêuticas associadas (Heber

Biotec, CIMAB etc.). Hoje Cuba produz vacinas, moléculas terapêuticas e vários sistemas de

imunodiagnóstico. Esses produtos renderam aproximadamente 900 patentes no exterior e são

exportados para 40 países. Assim como o níquel, o tabaco e o açúcar, a biotecnologia é um dos

principais produtos de exportação da ilha.

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C A P Í T U L O 20

BIOTECNOLOGIA E SAÚDE

OS NOVOS TRATAMENTOS

A APROVAÇÃO DE UM TRATAMENTO EXPERIMENTAL

Assim como qualquer medicamento novo, um tratamento passa por várias etapas antes de se instituir

como prática médica. Os estudos pré-clínicos iniciais incluem as pesquisas relativas a lesões ou doença,

em testes laboratoriais e experimentação em animais, desenvolvidas em universidades ou empresas e

financiadas com dinheiro público e/ou privado.

Os resultados são revisados, publicados e repetidos numerosas vezes pela comunidade científica,

até que, em função da quantidade de informação reunida, pareça razoável estender o procedimento

ao ser humano.

O novo tratamento será considerado experimental quando utilize medicamentos, vacinas, testes

diagnósticos, aparelhos ou técnicas que sejam, ainda, objeto de investigações em seres humanos.

Solicita-se então, por meio de um processo formal, uma autorização para dar início aos testes clínicos,

que fornecerão informações sobre a segurança, a eficácia e os efeitos colaterais desse tratamento.

Os ensaios ou testes clínicos seguem desenhos experimentais rigorosos e controles severos para

garantir a confiabilidade dos estudos. Abrangem um número pequeno de participantes, que deverão

assinar previamente um termo de consentimento informado, reconhecendo estarem cientes das

opções de tratamento e dos riscos, assim como de seus direitos e responsabilidades.

Durante os testes clínicos, o tratamento experimental pode se revelar melhor ou pior que os já

existentes. Se os resultados forem satisfatórios, será solicitada a aprovação da agência reguladora

correspondente (FDA, US Food and Drug Administration, nos Estados Unidos; EMA, European Medical

Agency, na União Europeia; Anvisa, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no Brasil; Anmat,

Administración Nacional de Medicamentos, Alimentos y Tecnología Médica, na Argentina).

Uma vez autorizado, o tratamento experimental passa a ser uma prática médica de uso geral, mas

continuará a ser objeto de vigilância para monitorar efeitos negativos que só possam ser detectados

em uma população maior.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

265

OS TRANSPLANTES

OS TRANSPLANTES DE ÓRGÃOS

Em 1899, a primeira tentativa de transplante de rim de um cachorro a outro causou a morte do

receptor, mostrando que o fenômeno de rejeição seria o principal obstáculo aos transplantes de

órgãos. Uma exceção é a córnea, cujo primeiro transplante bem-sucedido realizara-se em 1905.

O primeiro transplante de coração, realizado pelo cirurgião Christian Barnard (África do Sul, 1967),

teve uma repercussão enorme nos meios de comunicação. O mundo inteiro acompanhou os

comunicados médicos emitidos na Cidade do Cabo, até a morte do paciente, 18 dias mais tarde.

Durante vários anos, os problemas de rejeição pareceram intransponíveis.

Na década de 1980, a melhoria das técnicas cirúrgicas, a caracterização dos antígenos dos tecidos

e a descoberta dos primeiros medicamentos imunossupressores (ciclosporinas) revolucionaram os

transplantes, que se tornaram uma intervenção rotineira. Hoje, em centros médicos de todos os países

são substituídos, com sucesso, diversos órgãos e tecidos: coração, rim, fígado, pulmão, intestino, timo,

córneas, medula óssea, pele, pâncreas, válvulas cardíacas, veias etc.

A relação entre o doador e o receptor simplifica, ou dificulta, o procedimento. Não há rejeição no

isotransplante, em que a transferência de um ovário ou de um rim é feita de um indivíduo a seu gêmeo

idêntico; nem no autotransplante, em que se substitui uma artéria coronária por uma safena do

mesmo indivíduo, ou um fragmento de pele danificado por outro. Contudo, o alotransplante, em que

um órgão é transferido a outro indivíduo, requer a supressão do sistema imune, para que o organismo

possa aceitar uma parte “non-self”. Caso contrário, o órgão será rejeitado e, também, o órgão poderá

rejeitar o hospedeiro.

OS XENOTRANSPLANTES

À dificuldade em achar um doador compatível se soma a de encontrar doadores, já que o número de

doações é insuficiente em relação à demanda. Uma alternativa seria o xenotransplante, isto é, a

transferência de um órgão de um animal ao homem.

Devido ao tamanho e a estrutura de seus órgãos, o porco parece o animal mais indicado. Já em

1902, ligara-se o rim de uma paciente a um porco, em uma experiência que resultou fatal. Hoje é

sabido que, devido à presença nas células suínas de um tipo de molécula (-1-3-galactose), ausente

em primatas, a não ser que sejam aplicadas doses maciças de medicamentos imunossupressores,

ocorrerá um fenômeno de rejeição violento.

Em 2002, duas empresas (PPL Therapeutics e Immerge Bio Therapeutics) anunciaram a clonagem

de porcos com o gene da -1-3-galactose desativado, por knockout duplo. Esses porcos poderiam vir

a ser uma fonte de órgãos, para transplantes temporários em seres humanos, eliminando o perigo da

rejeição aguda. Porém, não se evitaria o processo lento de rejeição que seria desencadeado pelas

proteínas suínas. Existe outra objeção aos xenotransplantes, que é o risco de introduzir retrovírus de

outras espécies em seres humanos, com resultados imprevisíveis.

O encapsulado das células animais em uma matriz inerte que as isole e, ao mesmo tempo, deixe

passar os nutrientes e produtos celulares, poderia evitar a rejeição. Este procedimento foi utilizado

recentemente em pacientes diabéticos, que receberam células suínas encapsuladas e passaram a

secretar insulina. E em uma centena de pacientes de câncer, para a secreção de moléculas que

aliviassem a dor.

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266

A ENGENHARIA DE TECIDOS

A engenharia de tecidos, uma área que visa a substituição de órgãos e tecidos, ocupa uma interface

existente entre a biologia celular, a medicina, a bioquímica e a bioengenharia.

O cultivo de pele in vitro é utilizado rotineiramente para reparar as lesões causadas por

queimaduras. Um pequeno fragmento de pele, isolado do próprio paciente, é o bastante para, em três

semanas, formar uma superfície 50 vezes maior. Amolda-se a nova pele a uma superfície

biodegradável para evitar que rasgue quando aplicada no paciente. O procedimento se adapta ao

tratamento de queimaduras e de lesões de difícil cicatrização.

A biomimética consegue reparar in vivo o tecido ósseo, utilizando como molde um polímero, para

onde migram e se expandem as células regenerativas internas. A tecnologia se aplica na reparação de

fraturas e de lesões causadas por doença periodontal, assim como a reconstrução da cartilagem das

articulações.

Recentemente, transplantou-se com sucesso uma traqueia, construída com células-tronco do

próprio paciente cultivadas sobre um molde poroso. Talvez seja esse o primeiro passo na construção

in vitro de estruturas tridimensionais análogas aos órgãos.

As estruturas mecânicas com poucos tipos celulares diferentes parecem mais fáceis de construir

que órgãos complexos, como um rim ou um pulmão. Uma técnica promissora contempla a eliminação

das células animais até deixar uma estrutura inerte que seria repovoada com células-tronco. Essa

estrutura também poderia ser obtida por impressão em 3D.

Do ponto de vista experimental, um dos avanços mais importantes é o crescimento in vitro de

organoides a partir de células-tronco. Pode-se, por exemplo, transformar uma célula da pele em iPSC

(do inglês, induced pluripotent stem cells), diferenciá-la em neurônio e cultivar uma estrutura análoga

a um cérebro, comparável ao de um feto com um trimestre de desenvolvimento.

AS TERAPIAS CELULARES

As células-tronco multipotentes são as responsáveis pelo crescimento e a reparação dos tecidos.

Presentes em tecidos adultos, conservam a capacidade de se diferenciar em vários tipos celulares, em

resposta a estímulos adequados.

As células-tronco hematopoiéticas encontram-se em frequências baixíssimas na medula óssea

(1:10.000 a 1:15.000) e no sangue periférico (1:100.000). Embora não apresentem características

morfológicas que as distingam das outras células, a presença de marcadores moleculares específicos

na membrana permite separá-las e introduzi-las mais tarde na mesma pessoa ou em outra que seja

compatível. O procedimento possibilita a regeneração dos elementos sanguíneos no tratamento de

leucemias e de linfomas, de doenças hereditárias hematológicas e na recuperação dos pacientes que

receberam quimioterapia.

Numerosos bancos de sangue, públicos e privados, oferecem um serviço de armazenamento de

sangue de cordão umbilical que asseguraria a recuperação de células-tronco hematopoiéticas, em caso

de necessidade. Como a probabilidade de uma pessoa vir a precisar de suas próprias células é

baixíssima (1/100.000), a existência de grandes bancos públicos representa a garantia de encontrar

doadores compatíveis. Até o momento, o único produto terapêutico aprovado para o tratamento de

doenças do sistema hematopoiético é o Hemacord, do New York Blood Center.

A presença de células multipotentes em tecidos e órgãos explica o sucesso alcançado em outros

tratamentos. A capacidade regenerativa das células-tronco adultas permite a cicatrização de

queimaduras, a substituição de células da córnea, a regeneração de osso e cartilagem, o tratamento

da artrite e a reparação de fraturas.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

267

Terapias experimentais para a regeneração do miocárdio de doentes cardíacos tiveram resultados

promissores. Encontram-se em andamento numerosos ensaios clínicos de terapias com células-tronco

para diabetes, derrame, esclerose amiotrófica lateral e regeneração da medula espinal.

FRAUDES E DESATINOS

No início da década de 2000, a perspectiva de utilizar células-tronco embrionárias nas pesquisas

parecia uma via promissora. Em 2004, um grupo sul-coreano anunciou avanços na direção da clonagem

terapêutica com a obtenção de linhagens de células-tronco embrionárias a partir de um embrião

humano clonado. Essas linhagens poderiam ser utilizadas na regeneração de órgãos lesionados, sem

problemas de rejeição e, eventualmente, depois de ter passado por uma terapia gênica (Figura 20.1).

Quando se descobriu que os resultados eram fraudulentos, e o trabalho realizado em condições

éticas inadmissíveis, a comunidade científica ficou abalada. Afortunadamente, a obtenção das células

iPSC abriu perspectivas menos conflitivas, e as pesquisas foram orientadas em outra direção.

Por outro lado, no fim de 2002, a seita dos raelianos anunciou na mídia o nascimento de vários

bebês humanos clonados. Eles teriam usado a técnica de transferência nuclear para gerar indivíduos

geneticamente idênticos ao doador. Considerando as dificuldades técnicas a falta de provas

apresentadas, concluiu-se que o anúncio não passaria de um golpe publicitário. A clonagem

reprodutiva é considerada um crime contra a humanidade e, por enquanto, restringida ao domínio da

fantasia e da ficção científica.

Outro efeito perverso do entusiasmo com as terapias celulares é a proliferação do turismo médico

atrás das promessas de curas milagrosas. Recentemente, um garoto israelense com ataxia-

telangiectasia desenvolveu um tumor cerebral depois de um tratamento com células-tronco fetais

realizado na Rússia. Os estudos com marcadores celulares mostraram que, na origem do tumor,

estavam as células implantadas.

--------------

FIGURA 20.1. O princípio da clonagem terapêutica, uma forma de gerar células-tronco embrionárias com a

informação genética do doador do núcleo

Transferência nuclear Célula

saudável

Ovócito

Embrião

Infusão

Células-tronco diferenciadas

Células-tronco recuperadas

Paciente

Ovócito anucleado

Fusão celular

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268

O desenvolvimento de um tratamento novo é um processo lento que se desenvolve em etapas bem

definidas, com histórias de fracasso e de sucesso. Não existem milagres; do laboratório até a prática

médica, muitos pequenos passos são necessários.

AS IMUNOTERAPIAS

O PROGRESSO

Na segunda metade do século XIX, E. Von Behring e S. Kitasato estabeleceram as bases da

imunoterapia. O soro de um animal infectado com uma toxina diftérica inativada (antitoxina),

administrado em outro animal que fora inoculado previamente com toxina diftérica, provocava uma

reação imune, imediata, passiva e de curta duração. Estabelecidos os princípios da soroterapia, ela

constitui ainda hoje a principal arma de defesa disponível, contra os venenos de cobras e outros

animais peçonhentos.

O progresso da engenharia genética facilitou a produção de proteínas e, consequentemente, de

outras terapias biológicas baseadas na utilização do sistema imune no combate às doenças. No

paciente de câncer, por exemplo, a atividade imunológica é reforçada com moléculas proteicas,

moduladoras da comunicação celular (citoquinas), tais como o -interferon e a interleuquina IL-2. A

produção de elementos sanguíneos, afetada pelos tratamentos quimioterápicos e/ou radioterápicos,

é incrementada por fatores proteicos, como a eritropoietina ou o fator estimulador de colônias.

OS ANTICORPOS MONOCLONAIS

A chegada da tecnologia de hibridomas despertou grandes esperanças, imaginando que os anticorpos

monoclonais cumpririam a função da mítica “bala mágica”, no reconhecimento do alvo. Contudo,

depois do muromonab CD3 (Orthoclone OK3), um anticorpo monoclonal que reduz a resposta imune

para evitar a rejeição aos transplantes, passaram-se vários anos antes que algum outro produto

recebesse a aprovação das agências reguladoras. Frustrando as expectativas, o sucesso chegou antes

no campo das análises clínicas que no âmbito terapêutico.

A razão para o impasse era técnica. Produzidos com células de roedores, os anticorpos monoclonais

eram reconhecidos como non-self pelos seres humanos, o que desencadeava uma resposta imune. A

modificação e, eventualmente, a substituição de partes da molécula murina gerou moléculas

“quiméricas”, “humanizadas” e, mais tarde, “humanas”, em linhagens microbianas ou em animais

transgênicos. Uma vez solucionado esse problema, os anticorpos monoclonais conseguiram entrar no

mercado terapêutico.

Diversos produtos estão disponíveis para a prevenção de infecções virais, bloqueio de IgE (asma

alérgico), inibição de inflamações (artrite reumatoide, doença de Crohn, psoríase), tratamento de

esclerose múltipla e outras doenças autoimunes (lúpus), diversos tipos de câncer etc. Alguns estão

associados a uma substância citotóxica (gemtuzumab ozogamicin – Mylotarg®, de Wyeth), ou a um

radioisótopo (Y-ibritumomab tiuxetan – Zevalin®, de Spectrum Pharmaceuticals).

Aprovado pelo FDA em 2014, o Blyncito (Amgem), primeiro medicamento para o tratamento de

leucemia linfoblástica, está baseado em um produto de especificidade dupla. Trata-se de uma proteína

formada por dois anticorpos monoclonais, um deles reconhece a célula T-killer e o outro a célula-alvo.

Essa estrutura direciona as células T-citotóxicas para as células tumorales, nem sempre reconhecidas

como alvo pelas células de defesa.

Vários anticorpos monoclonais de uso terapêutico são blockbusters. Estima-se que o mercado global

chegue a 125 bilhões de dólares em 2020, com 70 produtos disponíveis. No momento, o principal

entrave à popularização das terapias biológicas é o preço dos produtos. Consideremos o caso do

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

269

Herceptin® (trastuzumab), que reconhece e inativa o receptor de um fator de crescimento, presente

em algumas células tumorais. Até o momento, é o único anticorpo monoclonal eficiente no combate

aos tumores sólidos, mas o custo anual de um tratamento com Herceptin® varia entre 70 mil e 100 mil

dólares.

O DESAFIO DA BARREIRA HEMATOENCEFÁLICA

Nos capilares sanguíneos do cérebro, a densidade das células endoteliais é tão alta que impede a

passagem de 95% das substâncias presentes na circulação. Forma-se uma barreira permeável para os

nutrientes celulares básicos, porém intransponível para moléculas grandes, como as proteínas

medicamentosas.

Contudo, algumas estratégias podem dar resultado. Por exemplo, no caso da esclerose múltipla, a

inflamação crônica permite a passagem dos macrófagos e das células T, que destroem a bainha de

mielina. Essa falha, própria da doença, facilita a entrada do Tysabri (natalizumab), um anticorpo para

o tratamento da doença.

O desafio da barreira hematoencefálica é também uma limitação para o tratamento da doença de

Alzheimer. A empresa Genentech pesquisa uma proteína formada por dois anticorpos; um deles

reconhece o receptor de transferrina, que permitirá transpor a barreira; o outro inibe a enzima

secretase, indispensável para sintetizar a proteína β-amiloide característica da doença. Em diferentes

etapas de desenvolvimento, outras estratégias parecem promissoras no combate à doença de

Parkinson e aos tumores cerebrais.

O CÂNCER

UMA DOENÇA DE ORIGEM GENÉTICA

A palavra câncer designa mais de 100 doenças que afetam uma a cada oito pessoas e se desenvolvem

em qualquer órgão do corpo. As células cancerosas evadem os sinais de controle da divisão celular,

dividindo-se indefinidamente sem chegar a se diferenciar. Com a perda de alguns receptores da

membrana celular, essas células se separam das células vizinhas espalhando-se pelo corpo.

A transformação de uma célula normal em cancerosa depende de dois tipos de genes. Um deles,

reúne genes que codificam proteínas estimuladoras da divisão celular, inibindo a diferenciação e

detendo a apoptose ou “suicídio” celular. Uma mutação que os transforme em oncogenes aumentará

a síntese dessas proteínas, induzindo as células a se multiplicar indefinidamente. O outro é o grupo

dos genes supressores de tumor que, normalmente, estimulam a autodestruição das células que

sofreram mutação. Esses genes encontram-se alterados ou ausentes nas células cancerosas.

Nas células, as mutações geram “antígenos específicos do tumor” como, por exemplo, as proteínas

anormais dos genes ras e p53, a elevação significativa da quantidade da enzima tirosinase ou a

reaparição das proteínas oncofetais (alfafetoproteína e antígeno carcinoembriogênico). Embora

alguns desses “antígenos específicos do tumor” se expressem exclusivamente no tumor de um único

indivíduo, outros aparecem nas células tumorais da maioria dos indivíduos afetados por determinado

tipo de tumor. Em genes que não estão envolvidos diretamente com a formação tumoral, as mutações

podem originar “antígenos associados ao tumor”, que são utilizados como biomarcadores.

As mutações são ocasionadas por fatores ambientais (agentes químicos, radiação, vírus) ou

genéticos (hereditários ou adquiridos ao longo da vida). Quase sempre ocorrem nas células somáticas,

mas também acontecem nas células germinais; algumas são pontuais, outras envolvem rearranjos

cromossômicos; e várias são necessárias para que a célula adquira as características cancerosas.

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Embora o processo possa levar mais de 50 anos, as mutações herdadas (predisposição) possibilitarão

um desenvolvimento prematuro do câncer (Figura 20.2).

AS TERAPIAS BIOLÓGICAS

As terapias biológicas são complementares aos tratamentos clássicos do câncer, que continuam sendo

a cirurgia, a quimioterapia e a radioterapia. Algumas reforçam a atividade imunológica, através de

mensageiros químicos que estabelecem a comunicação entre as células do sistema imune (-

interferon, interleuquina IL-2). Outras são administradas a pacientes que passaram por quimioterapias

ou sofrem de imunodeficiência, para estimular a proliferação das células sanguíneas (eritropoietina).

A construção de nanodispositivos, como lipossomos e nanopartículas magnéticas, permitiria dirigir

os medicamentos até as células-alvo. Também em fase experimental, outra possibilidade é o bloqueio

mediante um inibidor da glutaminase (CB-839, de Calithera Biosciences) da síntese de ácido glutâmico,

que a célula cancerosa consome em um ritmo muito maior.

OS VIRUS ONCOLÍTICOS

Outra via complementar para o tratamento do câncer seria o uso de vírus oncolíticos, geneticamente

modificados de modo a infectar e destruir as células cancerosas. Na construção desses vírus, eliminam-

se os genes que os tornam patogênicos e alteram-se as proteínas de superfície para que reconheçam,

exclusivamente, os receptores de membrana da célula cancerosa.

Aprovado pela FDA em 2015, encontra-se prestes a entrar no mercado o T-Vec (Talimogene

laherparepvec, de Amgen), um vírus herpes simplex 1 modificado para o tratamento de melanoma

que expressa o gene produtor de GMCSF (do inglês, granulocyte-macrophage colony-stimulating fator)

para ativar o sistema imune do paciente.

--------------

FIGURA 20.2. A transformação de uma célula normal em cancerosa por mutação (câncer de cólon).

Célula normal

1a mutação (gene APC) 2a mutação (gene ras) 3a mutação (gene DCC)

4a mutação (gene p53)

Célula cancerosa

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

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AS VACINAS TERAPÊUTICAS

As vacinas profiláticas são aplicadas em indivíduos saudáveis, para a prevenção de doenças. Dentro

dessa linha, existem vacinas contra alguns dos agentes virais que, sabidamente, estão relacionados

com o desenvolvimento do câncer. Trata-se das vacinas contra o vírus da hepatite B (VHB), associado

ao câncer de fígado, e contra o papilomavírus (VPH), responsável por 70% dos cânceres de útero

(Gardasil®, de Merck; Cevarix®, de GlaxoSmithKline). Essas vacinas cumprem uma ação profilática.

Uma das primeiras terapias complementares do câncer, ainda usada atualmente, é a inoculação

com a vacina BCG (bacilo de Calmette e Guérin), para estimular no paciente uma reação imunológica

de tipo celular, que se estende às células cancerosas.

Diferente das vacinas profiláticas, as vacinas terapêuticas visam o tratamento dos indivíduos que já

estão doentes. O seu objetivo é estimular diretamente a resposta imune do organismo, para que este

possa eliminar as células cancerosas. Um dos principais problemas reside na escolha dos antígenos que

deveriam entrar na composição da vacina, pois se alguns são comuns a vários tipos de células

cancerosas, outros só aparecem em cânceres específicos. A vacina ideal teria que ser eficaz em

qualquer paciente com um determinado tipo de câncer.

--------------

FIGURA 20.3. O tratamento com sipuleucel-T (Provenge®).

A. Extração das células dendríticas

B. Incubação das células com Provenge®

C. Reinfusão das células modificadas no paciente (3 vezes com 2 semanas de intervalo)

Estímulo da resposta das células-T contra o antígeno tumoral PAP-GM-CSF e, consequentemente, contra as células cancerosas

Leucoferese (3 horas)

Células dendríticas

Células dendríticas + Provenge® (PAP-GM-CSF)

Células dendríticas que incorporaram o antígeno tumoral PAP-GM-CSF

2 a 3 dias

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Uma possibilidade seria a elaboração de vacinas de tumores, com células cancerosas enfraquecidas ou

mortas. Provenientes do mesmo paciente ou de algum outro, essas células expressariam antígenos

associados a um tumor, estimulando a resposta imune.

Outra estratégia seria a aplicação direta de antígenos sintéticos, específicos ou associados ao tumor.

Contudo, as vacinas de antígenos conseguem uma resposta imunológica mais fraca que as vacinas de

vetores (vírus, DNA nu). Um vetor viral modificado poderia infectar exclusivamente as células

cancerosas, levando moléculas moduladoras da resposta imune, ou enzimas capazes de transformar

uma droga inativa em ativa.

Uma variante de vacina terapêutica envolve o estímulo ex vivo das células imunes de modo a que

estas reconheçam o antígeno tumoral (Figura 20.3). Essa estratégia deu origem à primeira vacina

terapêutica (sipuleucel-T ou Provenge®, de Dendreon) contra o câncer de próstata hormonorefratário,

autorizada pelo FDA, nos Estados Unidos, em 2010.

O sipuleucel-T é uma proteína de fusão entre uma enzima específica das células prostáticas cancerosas

(PAP, do inglês prostatic alcaline phosphatase) e um modulador da resposta imune (GM-CSF, do inglês

granulocytes and macrophages colony stimulating factor). O tratamento, que deve ser adaptado a

cada paciente, começa com a extração das células apresentadoras do antígeno do doente, segue com

a incorporação in vitro dos antígenos tumorais e encerra-se com a reinfusão das células modificadas

no paciente.

O empreendimento, no qual a empresa Dendreon investiu 1 bilhão de dólares, não teve os

resultados esperados devido tanto à complexidade tecnológica, como aos custos de um tratamento

personalizado, estimado em 93 mil dólares. Em bancarrota, Dendreon foi comprada por outra

empresa, Valeant. Embora o sipuleuncel não tenha dados os resultados esperados, abriu um caminho

para o tratamento potencial de outras variedades de câncer mediante outras vacinas terapêuticas.

AS TERAPIAS GÊNICAS

TERAPIA SOMÁTICA E GERMINAL

Um dos objetivos das terapias gênicas é a inativação de um gene, inibindo sua expressão ou

interferindo com o produto gênico. Outro, mais complexo, é a substituição de um gene inativo por

uma cópia funcional, que se expresse e sintetize uma proteína ausente.

As terapias gênicas pretendem modificar, exclusivamente, as células somáticas de um indivíduo,

sem que essa modificação seja transmitida à geração seguinte. Assim como em um transplante

transfere-se um órgão ou um tecido, na terapia somática se transfere um gene, e o efeito se limita ao

indivíduo que o recebe (Figura 20.4).

Do mesmo modo que em relação a qualquer tipo de terapia experimental, as objeções giram em

torno da utilização de uma tecnologia ainda imperfeita, envolvendo riscos e da qual se desconhecem

os efeitos a longo prazo. Contudo, o que suscita mais controvérsia é uma eventual transferência de

genes às células germinais, porque as modificações seriam transmitidas à descendência.

Qualquer tentativa de modificação da linhagem germinal permitiria a eugenia, isto é, a seleção

genética à procura de um “genótipo ideal”. Dentro desta ótica, quais os caracteres que seriam

considerados saudáveis? E por quem? A história do século XX, com sua sequela de horrores

(esterilização de deficientes e doentes mentais nos Estados Unidos, persecuções na Alemanha nazista

etc.) mostra que devem ser tomados todos os cuidados para impedir a discriminação genética e a

implantação de uma sociedade arbitrária.

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

273

OS ALTOS E BAIXOS DE UMA TECNOLOGIA

As primeiras experiências de terapia gênica foram realizadas em 1980, por Martin Cline, nos Estados

Unidos. Além de fracassar, essas tentativas despertaram uma reação contrária unânime: os estudos

experimentais prévios eram insuficientes, e a realização do procedimento não estava autorizada pelo

comitê de ética correspondente. O episódio motivou o estabelecimento de regras estritas para este

tipo de tratamento.

A primeira terapia gênica foi autorizada, em 1990, nos Estados Unidos, para o tratamento de

Imunodeficiência Severa Combinada (SCID, do inglês severe combined immunodeficiency), uma doença

em que a falta da enzima ADA (desaminase de adenosina) bloqueia um caminho metabólico, causando

o acúmulo de uma substância que destrói os linfócitos e, consequentemente, a imunidade do paciente.

As crianças com SCID, ou “crianças-bolha”, sofrem continuamente de infecções e têm uma

expectativa de vida curta. O tratamento habitual contempla a administração de enzimas, mas os

pacientes acabam desenvolvendo alergias aos componentes do produto injetado. Para essas crianças,

a única perspectiva restante é um transplante de medula óssea, com a condição de encontrar um

doador compatível.

A terapia gênica aprovada consistia na extração de linfócitos do sangue, sua modificação genética

in vitro por transferência de um gene normal de ADA e a reinfusão dos linfócitos modificados na

circulação sanguínea do paciente. Aplicou-se o procedimento em uma menina, Ashanti da Silva, e ela

melhorou significativamente.

Porém, como os linfócitos têm um período de vida curto, o procedimento teve que ser repetido

periodicamente, durante dois anos. Algumas células modificadas sobreviviam e produziam ADA, mas

a quantidade era insuficiente e Ashanti nunca pôde prescindir totalmente do tratamento enzimático

complementar. O problema persistiu em estudos posteriores, e nenhum dos pacientes tratados pôde

abandonar o tratamento alternativo com a enzima.

--------------

FIGURA 20.4: O princípio da terapia gênica.

Inserção em um vetor

Cópias de um gene normal, previamente clonado em bactérias

Lipossomo Vírus

Introdução do gene normal nas células de uma pessoa portadora de uma doença genética

Reimplantação

Cultivo de células (medula óssea)

Pulmão Músculo Fígado

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Uma tragédia esfriou o interesse pelas pesquisas nesta área. Em 1999, Jesse Gelsinger, um jovem de

18 anos afetado por uma deficiência de OTC (ornitina transcarbamilase), que se apresentara como

voluntário para um tratamento de terapia gênica na Universidade da Pensilvânia, morreu de uma

reação imunológica adversa ao vetor utilizado, um adenovírus.

Em 2000, na França, a terapia gênica de uma variante de imunodeficiência (SCID-X1) pareceu

alcançar sucesso em nove de dez crianças tratadas. Contudo, outra tragédia aconteceu quando o vetor

viral se inseriu em um lugar não esperado, inativando um gene supressor de tumor. Quatro das

crianças desenvolveram leucemia e uma delas morreu.

Dois anos mais tarde, renovaram-se as esperanças dos pacientes de SCID e seus familiares com o

descobrimento de uma nova técnica de remoção parcial da medula óssea, que permite o

desenvolvimento de células-tronco e sua modificação genética. Em 2002, Salsabil, uma menina

palestina de dois anos de idade recebeu o tratamento em Israel. A terapia restaurou a atividade da

desaminase de adenosina e Salsabil cresce saudável.

Uma terapia que envolve a modificação genética ex vivo de células-tronco é um tratamento

personalizado complexo. Os empreendimentos para doenças de baixa frequência entram na categoria

de tratamentos/medicamentos órfãos, garantindo incentivos financeiros às empresas farmacêuticas.

OS RESULTADOS ALCANÇADOS

Do mesmo modo que em relação a qualquer tipo de terapia experimental, as objeções se centram na

utilização de uma tecnologia ainda imperfeita, que envolve riscos e da qual se desconhecem os efeitos

a longo prazo. As dificuldades são grandes, porque além de transferir um gene a uma determinada

célula de certo tecido, o gene deve funcionar adequadamente e de forma duradoura.

Os dois grandes gargalos ainda são a necessidade de vetores seguros e de procedimentos eficientes.

No entanto, algumas tentativas foram exitosas, como na terapia gênica da amaurose congênita de

Leber, uma doença degenerativa da retina que cega as crianças afetadas. A origem é uma mutação no

gene RPE65, que metaboliza uma forma de vitamina A e condiciona o bom funcionamento de cones e

bastonetes.

O vetor escolhido é o vírus AAV (do inglês, adeno-associated virus), que não estimula uma reação

imune. A terapia começa injetando diretamente na retina o vírus modificado; o gene exógeno penetra

em 15 a 20% das células do epitélio pigmentado da retina, na camada nutritiva situada embaixo das

células visuais. As crianças que receberam o tratamento recuperaram, em diferentes graus, a

sensibilidade à luz.

O olho é um órgão mais fácil de atingir e os oculistas estão familiarizados com os procedimentos,

por isso não é de estranhar que os primeiros tratamentos disponíveis visem doenças ligadas à visão,

como o LentiVector para a degeneração macular, e outros para a doença de Stargardt, a síndrome de

Usher e a rejeição ao transplante de córnea.

Em outras áreas, muitos dos numerosos estudos em vias de realização fracassam nas fases I e II dos

testes clínicos. No entanto, aguardam-se resultados positivos em relação a síndromes genéticas

(hemofilia, talassemia, Huntington, Duchenne, fibrose cística, SCID) e infecções virais (HIV/AIDS), além

de avanços nos estudos sobre doenças cardiovasculares, neurológicas e oncológicas.

O progresso das terapias gênicas levanta também algumas inquietudes em relação ao esporte. Em

1998, uma equipe inteira de ciclistas foi eliminada do Tour de France devido ao uso indevido da

eritropoietina, que aumenta o número de hemácias. O incidente determinou a criação da World Anti-

Doping Agency.

No momento, existe um produto comercial disponível no mercado, desenvolvido e autorizado na

China, em 2004. A Gendicina® (Shenzhen SiBiono GeneTech). Trata-se de um adenovírus com o gene

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BIOTECNOLOGIA E SAÚDE / NOVOS TRATAMENTOS

275

supressor de tumores p53, utilizado no tratamento do carcinoma de células escamosas de cabeça e

pescoço.

A FIV TRIPARENTAL

As mitocôndrias são as organelas citoplasmáticas responsáveis pela respiração celular e a obtenção de

energia. A transmissão de uma geração a outra ocorre por via materna, de modo que todos os filhos/as

recebem as mitocôndrias de sua mãe. Mutações nesse genoma mitocondrial de 37 genes determinam

várias doenças musculoesqueléticas, metabólicas e neurodegenerativas.

Em 2015, o Reino Unido aprovou uma lei autorizando as clínicas de fertilidade a realizar o

procedimento denominado TP IVF (do inglês, Three Parent In Vitro Fertilization), para substituir as

mitocôndrias com genes associados a doenças.

Durante o procedimento, o núcleo celular de um ovócito da mãe afetada será removido e

transferido ao ovócito anucleado de outra mulher. Com o núcleo materno e o citoplasma e as

mitocôndrias saudáveis de uma doadora, o ovócito reconstruído será fertilizado com o esperma

paterno e reimplantado na mãe. A criança nascerá com o DNA de três pessoas, duas mulheres e um

homem.

AS PROMESSAS DO RNA

Ao longo dos últimos trinta anos descobriram-se vários mecanismos de silenciamento gênico,

baseados nos diversos tipos de RNA e suas propriedades (Figura 20.5). As principais vantagens das

terapias de RNA seriam sua especificidade e o custo relativamente baixo, mas ainda enfrentam

algumas dificuldades para aplicar o tratamento no lugar certo, em uma concentração eficaz que

garanta, também, a durabilidade do efeito.

AS RIBOZIMAS

As ribozimas são moléculas de RNA, com propriedades catalíticas, que cortam outras moléculas de

RNA que apresentem em sua sequência alguns nucleotídeos complementares. Sua descoberta teve

uma importância extraordinária porque deu origem a uma teoria sobre os primórdios da vida, em um

mundo de RNA. Numerosas pesquisas foram desenvolvidas com ribozimas, seja para inativar um gene

ou para tentar inibir a replicação do HIV em células infectadas. Apesar de laboratorialmente bem-

sucedidos, nenhum produto entrou até agora no mercado.

A TECNOLOGIA ANTI-SENSE

Também trouxe grande expectativa a tecnologia anti-sense, que utiliza o mecanismo de transcrição

para inativar um gene. Normalmente, o RNA transcrito é complementar a um dos filamentos de DNA.

Colocando um promotor no outro filamento, a transcrição ocorrerá em sentido contrário e se formará

um asRNA (anti-sense RNA). A associação dos dois RNAs complementares (sense e anti-sense) forma

uma molécula de dois filamentos que não conseguirá se unir ao ribossomo.

A tecnologia anti-sense tornou possível o desenvolvimento de um medicamento para o tratamento

de infecções oculares por citomegalovírus em pacientes com HIV/AIDS. O formivirsen (Vitravene®, de

Isis Pharmaceuticals) foi autorizado em 1998 pelo FDA, nos Estados Unidos. Outro medicamento anti-

sense que está no mercado, desde 2013, para tratamento de hipercolesterolemia familiar é o Kynamro

(Mipomersen, de Isis Pharmaceuticals) que visa a apoliproteína B, um componente-chave do LDL

colesterol.

A maior dificuldade para desenvolver este tipo de medicamentos reside na dificuldade de chegar

com o medicamento até o alvo correspondente, que os torna pouco eficazes.

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Síntese de proteínas Inibição da síntese proteica por RNA anti-sense Transcrição DNA Transcrição Transcrição RNA anti-sense mRNA mRNA Tradução

Não há tradução

FIGURA 20.5: As tecnologias de silenciamento gênico.

A. As ribozimas

B. O RNA anti-sense

C. O RNA interferente

RNA clivado

Ribozima

RNA

mRNA mRNA

mRNA Pequeno RNA interferente (siRNA)

dsRNA (RNA de dois filamentos)

Complexo enzimático

Clivagem do mRNA

Exterior Membrana Citoplasma celular

Fragmentos de RNA

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277

O RNA INTERFERENTE

O fundamento da tecnologia do RNA interferente (iRNA) é a introdução, na célula, de uma sequência

de RNA complementar a aquela que se deseja silenciar; a molécula de RNA formada, com dois

filamentos, será destruída pela maquinaria celular.

Essa tecnologia constitui uma ferramenta de laboratório poderosa para entender a função dos

genes e a regulação da expressão gênica. As pesquisas laboratoriais têm dado informações

valiosíssimas sobre genômica funcional. Elas abriram novas perspectivas no tratamento de infecções

virais e esclareceram diversos aspectos de várias doenças genéticas e neurológicas. Em relação ao

câncer, elas permitiram a inativação in vitro de moléculas associadas à patologia e à progressão da

doença humana.

Antes de superar a fase experimental e chegar à clínica médica, alguns problemas terão que ser

resolvidos, como a maneira de introduzir o ácido nucleico na célula e controlar seu raio de ação, para

que a interferência seja restringida à molécula-alvo. Apesar do sucesso alcançado nos estudos in vitro,

a tecnologia do iRNA ainda precisa melhorar suas qualidades de eficiência, segurança e confiabilidade.

Considera-se que os tecidos que poderiam ser mais facilmente tratados seriam o olho, a pele, as

membranas mucosas e os tumores locais. Ainda em fase clínica, os testes mais avançados

correspondem ao tratamento da degeneração macular e da infecção pelo vírus respiratório sincicial.

OS miRNAs

Diferente dos RNA antisense e do iRNA, que são sintetizados no laboratório e aplicados no paciente

para diminuir ou impedir a formação de uma proteína associada à doença, os microRNAs são um tipo

de RNA de duplo filamento, sintetizado pela própria célula para regular a expressão gênica. Em muitas

doenças, o paciente sintetiza muito ou pouco miRNA. Alguns produtos encontram-se nas fases iniciais

dos testes clínicos.

A EDIÇÃO GÊNICA

Baseada no fenômeno natural de quebra e reparação do DNA, a tecnologia de edição gênica utiliza o

sistema CRISPR (do inglês, clustered regularly interspaced short palindromic repeats), associado ao

complexo enzimático Cas, para cortar qualquer sequência de DNA no lugar desejado e gerar mutações

de ponto, deleções ou inserções.

As primeiras tentativas planejam a modificação in vitro de células de sangue periférico ou medula

e sua reimplantação no paciente (Intellia Therapeutics, CRISPR Therapeutics). Outras aplicações

contemplam o combate à hepatite C e às contaminações por fungos. Ainda em fase experimental, a

transferência de CRISPR/CAS 9 com um vírus AAV, para impedir a expressão de 3 genes no cérebro de

camundongos (Editas Medicine).

Em 2015, pesquisadores chineses anunciaram ter aplicado a tecnologia CRISPR/Cas9 para modificar

geneticamente embriões não viáveis. No Reino Unido, um grupo de pesquisadores aguarda a

autorização das autoridades para tentar a transferência de genes a embriões supranumerários das

clínicas de fertilização assistida. Esses embriões seriam posteriormente descartados. O tema é

controverso, porque possibilita o design de bebês e abre a porta para a eugenia, afetando a evolução

das futuras gerações de maneira imprevisível.

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C A P Í T U L O 21

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A biotecnologia é uma área baseada no conhecimento, com uma plataforma tecnológica que gera

múltiplas aplicações em campos muito diversos. Nos capítulos anteriores revisamos seus fundamentos

e seu impacto na sociedade, destacando alguns exemplos de empreendimentos latino-americanos

bem-sucedidos: o desenvolvimento do setor agropecuário e da indústria de medicamentos da

Argentina, a plataforma genômica e a produção de vacinas no Brasil, o alcance da biomineração no

Chile, o sucesso da experiência de Cuba etc.

Apesar das dificuldades econômicas e políticas, essas experiências foram possíveis porque se

cumpriu a condição fundamental de contar com instituições competentes, uma massa crítica de

pesquisadores e pessoal técnico treinado. Em alguns casos, estas existiam previamente, em outros,

elas foram criadas.

O avanço tecnológico é irreversível. Em todos os seus níveis, a educação tem um papel fundamental

na formação dos quadros profissionais e na difusão dos conhecimentos básicos indispensáveis, que

permitirão avaliar adequadamente os benefícios dessa tecnologia e estabelecer as normas para sua

utilização.

As previsões futuras dependem das regulamentações existentes e do projeto político e social de

cada país. No entanto, não se pode descartar a influência das circunstâncias que nos rodeiam:

mudanças climáticas, necessidade de aumentar a produção de alimentos, conflitos bélicos, migrações,

doenças emergentes etc. Também são determinantes os aspectos culturais e a influência da percepção

pública.

Várias são as incógnitas que nos cercam:

o Como estimular o interesse das novas gerações pelo conhecimento científico e tecnológico?

o Como impedir o aumento do distanciamento científico e tecnológico entre os países desenvolvidos

e os países em desenvolvimento?

o Como a privatização da pesquisa científica e tecnológica irá alterar a transparência do processo de

aquisição e divulgação do conhecimento?

o Como passar da pesquisa científica ao desenvolvimento tecnológico de um produto ou de um

serviço?

o Como incubar e agrupar as empresas que estão dando os seus primeiros passos?

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

279

o Como manter a comunicação e a transferência de conhecimentos entre os países em

desenvolvimento?

o Como evitar a manipulação da opinião pública?

o Como assegurar que os benefícios das biotecnologias cheguem aos povos mais desfavorecidos?

o Como conciliar a cultura de segurança e o desenvolvimento de novas tecnologias?

o Como lidar com as pesquisas de uso duplo, que podem ser usadas tanto para o bem como para o

mal?

o Como inserir as novas tecnologias em um contexto que garanta o respeito aos princípios éticos

fundamentais de nossa sociedade?

Para estas perguntas não há uma única resposta. Discussão e consenso são fundamentais.

Rio de Janeiro, maio de 2016.

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Page 312: BIOTECNOLOGIA · BIOTECNOLOGÍA E INDÚSTRIA.....114 O processo Weizmann. A indústria química: as vias química e biotecnológica. Os produtos biotecnológicos: metabólitos de

Maria Antonia Malajovich é bióloga, com Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade de Buenos Aires,

mestrado e doutorado em Genética pela UFRJ (Brasil). Foi bolsista da CAPES e

CNPq (Brasil), do Ministério das Relações Exteriores da França, da World ORT e

da Universidade das Nações Unidas (UNU-BIOLAC). Exerceu a docência na

Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e na Universidade ORT

Uruguay, onde é professora visitante.

Entre 1990 e 2015, desempenhou as funções de Professora e Coordenadora de

Ciências e de Biotecnologia no Instituto de Tecnologia ORT do Rio de Janeiro. Ao

longo de mais de vinte e cinco anos dedicados ao ensino científico e tecnológico,

ministrou cursos de Biotecnologia em vários países latino-americanos

(Argentina, Brasil, Peru, Uruguai e Venezuela).

Atua na área de Educação Científica e Tecnológica, com ênfase especial em Biotecnologia, sendo autora do

livro Biotecnologia publicado no Brasil (Axcell Books do Brasil, 2004) e na Argentina (Universidad de Quilmes

Editorial, 2006, 2012), de vários artigos e manuais de atividades práticas, do site Biotecnologia: Ensino e Divulgação e

de sua versão em espanhol.

Em 2008, recebeu o prêmio Beatrice Wand-Polak, outorgado por World ORT aos Professores que se destacam no

desenvolvimento de novos programas, materiais e tecnologias educacionais. Em 2011, foi homenageada pelo Dia

do Biólogo, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, em reconhecimento à sua dedicação em defesa da

Biodiversidade e do Meio Ambiente. Integra a direção científica da Associação Nacional de Biossegurança (ANBIO).

É membro da Comissão Técnica de Biotecnologia do Conselho Federal de Biologia (CFBio). Atualmente é Diretora

Científica na empresa ACTE- Treinamento e Desenvolvimento.