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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 646

(Ano VIII)

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BRASÍLIA ‐ 2016 

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COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

30/06/2016 Rômulo de Andrade Moreira 

» Corrompa‐se, pero no mucho, disse o Ministério Público 

Federal!

ARTIGOS  

30/06/2016 Marcelo Alves Batista dos Santos » O grampo de Lula, o bloqueio do Whatsapp e o afastamento de Cunha. 

Estudos de caso, ponderação de princípios e ativismo judicial 

30/06/2016 Georges Cobiniano Sousa de Melo 

» Lei interpretativa e a inexistência de iniciativa exclusiva 

30/06/2016 Igor Souza Marques 

» A insuficiência de núcleos da Defensoria Pública da União no interior do 

Estado da Bahia como um obstáculo à efetiva prestação da assistência 

jurídica 

30/06/2016 Roberto Teixeira de Mendonça 

» Ônus tributário brasileiro e sua contribuição social 

30/06/2016 Rafael Xavier Arruda 

» Desapropriação Confiscatória 

30/06/2016 Thiago Nunes Leite 

» Sistema de meação e herança do cônjuge sobrevivente 

30/06/2016 Thallita Oliveira Andrade Santana 

» Direito de Greve 

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CORROMPA-SE, PERO NO MUCHO, DISSE O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL! 

 RÔMULO  DE  ANDRADE MOREIRA:  Procurador  de Justiça  do Ministério  Público  do  Estado  da  Bahia. Professor de Direito Processual Penal da UNIFACS. Pós‐graduado,  lato  sensu,  pela  Universidade  de Salamanca/Espanha  (Direito  Processual  Penal). Especialista em Processo pela UNIFACS.

Muito curioso (usando de um eufemismo, óbvio) o Enunciado nº. 34 da 5ª. Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, órgão colegiado previsto na Lei Complementar nº. 75/93, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o Estatuto do Ministério Público da União. Dentre outras várias atribuições, cabe à Câmara "manifestar-se sobre o arquivamento de inquérito policial, inquérito parlamentar ou peças de informação, exceto no caso de competência (sic) originário do Procurador-Geral."

Diz o texto do Enunciado que "o combate à corrupção privilegiará os casos em que o prejuízo ao erário o ou enriquecimento ilícito, atualizado monetariamente, seja superior a vinte mil reais, tendo em vista os princípios da proporcionalidade, da eficiência e da utilidade. Nos casos em que o prejuízo for inferior, é admissível a promoção de arquivamento sujeita à homologação da 5ª. Câmara, ressalvadas também as situações em que, a despeito da baixa repercussão patrimonial, verifique-se a ofensa significativa a princípios ou a bens de natureza imaterial merecedores de providências sancionatórias, no campo penal e/ou da improbidade administrativa."

Em outras palavras: o Ministério Público Federal, ao menos por um de seus órgãos colegiados, admite que o servidor público federal corrompa-se ou o particular o corrompa, desde que o valor da "propina" não ultrapasse os vinte mil reais. Até esse valor, portanto,

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está liberado. Isso é o que podemos chamar de seletividade às avessas!

Algumas perguntas são, a meu ver, (im)pertinentes:

1) Como ficam os cidadãos que sofreram a coação e o constrangimento moral e financeiro (e, às vezes, até físicos) por parte destes funcionários públicos federais, eles que foram extorquidos pelos agentes públicos e procuraram o Ministério Público Federal?

2) Que critério é este de moralidade pública ou de probidade administrativa que supõem ter os integrantes da 5ª. Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal?

3) Como querem combater a "grande corrupção", deixando impunes "a pequena corrupção"? As aspas são significativas, obviamente.

4) Qual a coerência em se propor as tais dez medidas anticorrupção (boa parte delas inconstitucional) se, institucionalmente, tolera-se que, por exemplo, um servidor público federal solicite ou receba R$ 19.999,99 de um comerciante para não lavrar um auto de infração? Ou não denunciar um contribuinte que oferece a mesma quantia ao funcionário público para que ele não o autue por sonegação fiscal?

5) O que dizer a um Delegado de Polícia Federal que lavrou o Auto de Prisão em Flagrante de um servidor público federal que cumpriu o seu dever, gastando dinheiro público (com diligências, etc.), tempo e, depara-se, com um pedido de arquivamento pelo Procurador da República?

Aliás, na página do Ministério Público Federal em que são apresentadas as tais medidas, afirma-se que "

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se queremos um país livre de corrupção, precisamos nos unir. O Ministério Público Federal acredita em um Brasil mais justo, com menos corrupção e menos impunidade. É possível transformar a indignação com a corrupção em mudanças efetivas para a sociedade. Para acabar com o círculo vicioso de corrupção privada e pública, é preciso implementar mudanças sistêmicas e estruturais. Essas mudanças incluem o fim da impunidade, pois esta e a corrupção aparecem intimamente relacionadas em diversos estudos e pesquisas internacionais sobre esse problema."[1]

Parece-me um tanto quanto incoerente (para dizer o mínimo) que se possa acreditar "em um Brasil mais justo, com menos corrupção e menos impunidade" e, ao mesmo tempo, dar um "cheque em branco" para corruptores e corruptos "de bagatelas". Que tipo de moralidade é essa? Claro que não estamos aqui confundindo Direito e Moral, como tantas vezes Lênio Streck vem alertando. Não![2] Tampouco somos arautos do punitivismo ou contra a aplicação do Princípio da Insignificância, muito pelo contrário.

Tampouco acredito que o Sistema Jurídico vai acabar com a corrupção (aliás, isso é de uma ingenuidade que beira a demência), mas o que eu cobro, inclusive porque sou membro do Ministério Público brasileiro é coerência e integridade institucional.

A propósito, muito interessante o que escreveu Jacinto Coutinho:

"Um exemplo para os homens: suponha-se que você tem um carro velho e nele aparece, por conta de uma forte ferrugem (daquelas que furam a lataria), várias bolhas na pintura, que se não consegue tapar com adesivos. Preocupado com a situação e querendo resolver o problema, você

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leva o automóvel até uma Oficina e, nela, o latoeiro lhe dá uma sugestão: “Doutor, isso é coisa simples, basta dar uma lixada e passar uma demão que está resolvido!” – O carro é seu; a opção é sua; e o dinheiro também! Um exemplo para as mulheres: suponha-se que você casou com um sujeito que bebe muito porque esperava o final da festa etílica com o casamento, mas isso não ocorreu. Passados alguns anos a coisa foi ficando cada vez pior e agregado a outros problemas lhe veio uma insônia terrível. Com ela, vieram as inevitáveis olheiras. Para resolver seu problema você vai ao médico que lhe indicaram, um cirurgião plástico. Ele, porém, logo lhe diz que não tem muito para fazer mas que na clínica dele há um novo setor, de estética, no qual tem profissionais especializados na situação. Você vai a tal setor e nele é atendida. O especialista – por sinal muito capacitado – é rápido e taxativo: “Doutora, resolvo seu problema com pancake, blush e uma nova resina facial inventada nos Estados Unidos da América e, portanto, a última palavra no assunto – porque o que se faz nos EUA é sempre melhor! –, daquela que só sai com água fervendo no banho.” – O marido é seu; a olheira é sua; a opção é sua; e o dinheiro também! Os dois exemplos são suficientes para se perceber como o latoeiro e o esteticista têm uma solução – sem dúvida! –, mas elas não resolvem os problemas das pessoas, embora, de certo modo, resolva o deles, que vendem seus produtos e serviços. Assim, resolvem e não resolvem os problemas. No que resolvem, fazem-no parcialmente, isto é, parte dos problemas encontram solução. A parte, porém – sabe-se há muito – não é o todo e nele está o verdadeiro problema, aquele que se deve

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resolver. Assim, uma lixada e uma demão (no caso da solução do latoeiro) ou o pancake, blush e uma nova resina facial norte-americana (no caso da solução do esteticista) são expressões daquilo que pode ser legal ou ilegal mas que, sempre, enganam o freguês se, de fato, o que ele quer como resultado é outra coisa: os buracos causados pela ferrugem não vão acabar, muito menos o marido da doutora vai se curar do alcoolismo. Pode ser, porém, que as pessoas queiram se enganar, o que não é de se descartar, mormente quando estejam em situações psicologicamente complexas. Nesse ponto, a questão depende sobremaneira do vendedor que, ciente do problema, não deve oferecer como solução à parte se, para resolver o problema, precisa dar conta do todo. Eis por que, em outro cenário, algo ficou conhecido como ouro de tolo."[3]

Ademais, o Enunciado é extremamente indeterminado, digamos assim, quando invoca os princípios da proporcionalidade, da eficiência (que eu nem sabia que era princípio) e da utilidade (tampouco). Bem, falar em princípio da proporcionalidade, neste caso, e não dizer nada é a mesma coisa. Eficiência e Processo Penal afastam-se como "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (Glauber). Utilidade? Será que estão falando de uma tal condição da ação (interesse-utilidade), conto da carochinha inventado por Liebman e até hoje contado para as nossas crianças?

Enfim, talvez os integrantes da 5ª Câmara do Ministério Publico Federal devessem ler Antígona, de Sófocles, quando a filha de Édipo, desafiando o tirano Creonte, diz: "A tua lei não é a lei dos deuses; apenas o capricho ocasional de um homem."[4]

NOTAS:

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[1] http://www.dezmedidas.mpf.mp.br/

[2] Aliás, escreveu Jacinto Coutinho: "Claro que não estamos aqui confundindo Direito com MoralA moral é necessária, enfim; mas é outra coisa, que se não ajusta com a generalidade, razão por que cada um – como padrão – tem a sua e, sendo assim, não se presta para regular um espaço que vai – e deve ir – sempre marcado pela diferença; e, principalmente, pelo respeito à diferença." (https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/5668-MPF-As-10-medidas-contra-a-corrupcao-sao-so-ousadashttp://www.dezmedidas.mpf.mp.br/, acessado em 19 de junho de 2016).

[3] https://www.ibccrim.org.br/boletim_artigo/5668-MPF-As-10-medidas-contra-a-corrupcao-sao-so-ousadas, acessado em 19 de junho de 2016.

[4] Antígona, Sófocles, São Paulo/Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015, p. 25.  

 

   

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O GRAMPO DE LULA, O BLOQUEIO DO WHATSAPP E O AFASTAMENTO DE CUNHA. ESTUDOS DE CASO, PONDERAÇÃO DE PRINCÍPIOS E ATIVISMO JUDICIAL

MARCELO ALVES BATISTA DOS SANTOS: Bacharel em Direito e Pós Graduando em Direito Público pela Faculdade Paraiso do Ceará- FAP. Funcionário Público desde 2001, fui membro da Corregedoria e chefe da divisão de Ronda Escolar da Guarda Municipal de Juazeiro do Norte-CE de 2009 a 2012.

Este texto não busca tomar partido por um lado político dos últimos acontecimentos da política brasileira nem tão pouco avaliar se existe uma eventual ingerência que viole a independência dos poderes, ou se contrapor a expansão das redes sociais nem garantir a impunidade de quem se esconde nos meios virtuais.

O objetivo é tão somente instigar ao leitor, o quanto o poder judiciário precisa cada vez mais ponderar princípios dentro de situações para resolver contendas, zelar pelos princípios e garantias fundamentais consagradas na nossa constituição e buscar o alcance da justiça.

Para ilustrar nossa tese vamos a três casos recentes de ponderação e mitigação de princípios aplicados pelo Poder Judiciário, tomando como ponto de partida o grampo do ex-presidente Lula e outros divulgado pelo Juiz Sérgio Moro da 13º Vara Federal de Curitiba na operação Lava a Jato no dia 17 de março deste ano.

Nos autos do processo nº 5006617-29.2016.4.04.7000 com a alegação de que processo de apuração de possíveis crimes contra a Administração Pública, o interesse público e a previsão constitucional de publicidade dos processos (art. 5º, LX, e art. 93, IX, da Constituição Federal) que impediam a imposição da continuidade de sigilo sobre autos o juiz Moro liberou a divulgação dos áudios do ex presidente Lula conversando com varias pessoas, criticando autoridades, e conversando com a presidenta Dilma

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sobre uma eventual estratégia para escapar se beneficiar com uma suposta prerrogativa de foro.

Surgiu então a alegação da Advocacia Geral da União que tal divulgação violaria o artigo 102, I, b da Constituição Federal que restringe a competência de investigação e até da divulgação para o Supremo Tribunal Federal, sendo que esta foi à tese foi aceita pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki, que ainda citou que a interceptação da maneira que ocorreu violou a garantia fundamental de sigilo do artigo 5º, XII da Carta Magna.

O Ministro relator também citou a Lei de Interceptações telefônicas Lei 9.269/1996, vedar expressamente a divulgação de qualquer conversação interceptada (art. 8º), determina a inutilização das gravações que não interessem à investigação criminal (art. 9º).

Nesse momento as paixões partidárias defendem os dois lados mas na pratica podemos observar o embate entre o interesse público e a publicidade dos processos de um lado e do outro o direito ao sigilo e a prerrogativa de função que esta prevista na Constituição Federal.

Acima da difícil missão do Poder Judiciário de mitigar princípios em detrimento de outros vale aprofundar o debate no caso em tela para relembrar antigas perguntas que são feitas nos bancos acadêmicos de uma faculdade de direito.

Os interesses individuais, neste caso o sigilo devem permanecer sobre o interesse público? A prerrogativa de função seria privilégio para se abusar de um poder ou a garantia para a manutenção do Estado Democrático de Direito? Haveria outros meios de configuração da materialidade delitiva e de pressionar a punição politica e jurídica dos supostos acusados?

No segundo caso temos o bloqueio do aplicativo Whatsapp determinado pelo Juiz Marcel Montalvão da Vara Criminal de Lagarto em Sergipe com fundamentação nos artigos 11, 12,13 e 15 caput do Novo Marco Civil da Internet.

A investigação foi iniciada após uma apreensão de drogas na cidade de Lagarto, a 75 km de Aracaju e o mesmo juiz pediu em novembro de 2015 que o Facebook informasse o nome dos usuários de uma conta no WhatsApp em que informações sobre drogas eram

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trocadas. As informações desse processo correm em segredo de Justiça.

O vice-presidente do Facebook já tinha sido preso no dia 01 de março deste ano e no dia 02 de maio o aplicativo foi bloqueado por nova decisão.

A decisão foi derrubada pelo Desembargador Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima, do Tribunal de Justiça de Sergipe no processo de nº 201600110899 TJ-SE.

Apesar do sigilo do processo também fica clara a colisão de princípios onde de um lado estão à segurança pública e do outro o direito a informação e o interesse público.

Com isso novamente emergem questionamentos da ordem de que prejuízos à limitação de um aplicativo desses pode causar a vida cotidiana das pessoas? É possível combater o crime organizado sem o acesso aos dados de tal aplicativo? Cercear 100 milhões de usuários para a obtenção dessas informações é uma medida razoável?

Vidas em jogo na mão de quadrilhas criminosas não justificariam tal bloqueio como maneira de coerção das empresas?

No terceiro caso temos o afastamento do presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha pedido pelo Procurador da Republica Rodrigo Jannot que foi aceito liminarmente pelo Ministro Teori Zavascki e depois confirmado pelo pleno do Supremo Tribunal Federal no dia 05 de maio deste ano.

No pedido o Procurador Geral afirmou que o afastamento era "fundamental" para o garantir o "regular funcionamento das instituições sem embaraços ou condutas espúrias", ante o risco de o deputado praticar "novos ilícitos" e o relator acatou o pedido alegando que Cunha "não tem condições pessoais mínimas" para ser presidente da Câmara, pois "não se qualifica" para eventualmente substituir o presidente da República, já que é réu de ação penal, denunciado e investigado pela Operação Lava Jato.

“Alegou ainda que o exercício do cargo, nas circunstâncias indicadas, compromete a vontade da Constituição, sobretudo a que

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está manifestada nos princípios de probidade e moralidade que devem governar o comportamento dos agentes políticos”.

Nesse momento alguns parlamentares alegaram que estaria havendo interferência nos poderes por parte do Supremo Tribunal Federal.

Como essa decisão pode interferir numa eventual Vice Presidência da Republica e o Poder Judiciário teve que se posicionar de uma forma inédita e “excepcional” conforme palavras dos próprios Ministros aparecem novos questionamentos a sociedade.

A presunção de inocência consagrada na nossa Constituição e a separação e independência dos poderes poderia proteger o presidente de um eventual afastamento e da retirada de seus direitos como parlamentar? O Judiciário pode interferir no poder legislativo em um ato que seria privativo do plenário da Câmara? O afastamento do Presidente que é réu se justifica pelos princípios da moralidade e da probidade podem justificar tal medida?

Após a alusão dos três casos é possível aferir que o Judiciário brasileiro está em ebulição tendo que se debruçar em casos nunca antes vistos como um grampo do Ex-presidente Lula em diálogo com a presidenta, um bloqueio que afetou mais da metade do Brasil e o afastamento do Presidente da Câmara dos Deputados.

A ponderação e a mitigação de princípios e garantias fundamentais não é novidade para o judiciário brasileiro nem são os primeiros casos de grande repercussão decididos nesses moldes, mas sem duvida os três casos são casos de extrema importância para a manutenção do Estado democrático de Direito e para fomento dos princípios e direitos fundamentais.

REFERENCIAS

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Pesquisa de Jurisprudência. Disponívelhttp://www2.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=consulta_processual_resultado_pesquisa&txtPalavraGerada=PqCu&hdnRefId=888a4bdd30236ce2f4d53e25464d4b18&selForma=NU&txtVal

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or=50066172920164047000&chkMostrarBaixados=&todasfases=&todosvalores=&todaspartes=&txtDataFase=&selOrigem=PR&sistema=&codigoparte=&txtChave=&paginaSubmeteuPesquisa=letrasem:Acesso em 07 de Mai.2016

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Portal de Noticias. Disponível emhttp://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=316009. Acesso em 06 de Mai.2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Portal de Noticias. Disponível emhttp://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Rcl23457.pdf. Acesso em 06 de Mai.2016

BRASIL. Presidência da Republica . Consulta de Legislação. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm Acesso em 07 de Mai.2016.

BRASIL. Presidência da Republica. Consulta de Legislação. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

Acesso em 07 de Mai.2016.

SERGIPE. Tribunal de Justiça. Portal de Noticias. Disponívelhttp://www.tjse.jus.br/agencia/decisoes/item/9187-juiz-criminal-de-lagarto-determina-suspensao-do-whatsapp-por-72-horas:

Acesso em 07 de Mai.2016

SERGIPE. Tribunal de Justiça. Portal de Noticias. Disponívelhttp://www.tjse.jus.br/agencia/noticias/item/9192-desembargador-ricardo-mucio-decide-pelo-cancelamento-da-suspensao-do-whatsapp

Acesso em 07 de Mai.2016.

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PARANÁ. Justiça Federal do Paraná. Pesquisa de Jurisprudência. Disponívelhttp://www2.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=consulta_processual_resultado_pesquisa&txtPalavraGerada=PqCu&hdnRefId=888a4bdd30236ce2f4d53e25464d4b18&selForma=NU&txtValor=50066172920164047000&chkMostrarBaixados=&todasfases=&todosvalores=&todaspartes=&txtDataFase=&selOrigem=PR&sistema=&codigoparte=&txtChave=&paginaSubmeteuPesquisa=letrasem:Acesso em 07 de Mai.2016

 

   

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LEI INTERPRETATIVA E A INEXISTÊNCIA DE INICIATIVA EXCLUSIVA

GEORGES COBINIANO SOUSA DE MELO: Consultor Legislativo da Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba.Advogado. OAB nº 19.769/PB

RESUMO: Pouco tem tratado a doutrina acerca da Lei Interpretativa. Outrossim, esse assunto quase não é visualizado na legislação e na jurisprudência, merecendo mais comentários. Em meio à carência de informação, surgem dúvidas quanto à sua validade e se as iniciativas reservadas ou exclusivas, em determinadas matérias, impediriam o Parlamentar de propor leis interpretativas. A pesquisa de tal tema revela-se de inestimável importância. Uma lei deficientemente elaborada, ou reiteradamente mal aplicada, pode agravar conflitos sociais, em vez de apaziguá-los. Para a compreensão da temática, procedeu-se, nesta pesquisa, ao estudo da interpretação, bem como de suas espécies, extensões e efeitos, sempre à luz da legislação, da doutrina e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Palavras-chave: Lei interpretativa; interpretação; iniciativa; STF.

ABSTRACT: Little has treated the doctrine of the Interpretive Law . Moreover , the issue is little seen in legislation and case law , deserving further comment. Amid the lack of information , questions arise as to its validity and the reserved initiatives or unique , in certain matters , would prevent the Parliamentary proposing interpretative laws. The research reveals this issue is invaluable . A law poorly drafted or repeatedly misapplied , can exacerbate social conflicts rather than appease them . For the understanding of the subject, was carried out this research, the study of interpretation, and of its species , extensions and effects, according to the legislation , doctrine and jurisprudence of the Supreme Court .

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Keywords: Interpretative Law; Interpretation; Initiative; STF.

SUMÁRIO: 1 A Interpretação do Direito; 2 Os Elementos de Interpretação; 3 Dos Resultados da Interpretação; 4 Lei Interpretativa ou Autêntica; 5 Poder Legislativo e a Típica Função Fiscalizatória; 6 Efeito Retroativo da Interpretação Autêntica; 7 Requisitos da Interpretação Autêntica; Conclusões; e Referências.

1. A Interpretação do Direito A Lei, nem sempre, é clara. Nesses momentos, em que o

significado da norma não é, à primeira vista, extraível do texto legal, faz-se necessário o uso de métodos interpretativos.

Paulo Nader (2014, pp. 259 e 269) ensina que interpretar é “o ato de explicar o sentido de alguma coisa; é revelar o significado de uma expressão verbal, artística ou constituída por um objeto, atitude ou gesto”. Mostra que só o intérprete, por meio do uso de diversos recursos técnicos, lógicos e de conhecimentos sociais, é capaz de desentranhar o sentido e o alcance de determinada expressão jurídica.

2 Os Elementos de Interpretação Uma norma obscura, contraditória ou incompleta pode ser

fonte de inúmeras controvérsias, gerando situações de injustiça e acendendo conflitos sociais, ao invés de preveni-los ou, ao menos, apaziguá-los.

Para se descobrir o correto sentido e o alcance de uma norma, de maneira a torná-la adequada à solução dos problemas sociais, o jurista deve se valer da exegese. O intérprete pode se valer de vários elementos necessários à compreensão da norma jurídica e chegar a resultados que podem reduzir, ampliar ou manter inalterado o alcance da norma.

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Os elementos gramatical, lógico, sistemático, histórico e teleológico, resumidamente, baseiam-se: a) na averiguação da literalidade e dos aspectos semânticos do texto; b) na lógica interna, a partir dos elementos internos do texto, e na lógica externa, voltada às razões sociais que determinaram a edição do comando legal; c) na abominação do estudo apenas de dispositivos isolados, utilizando-se da comparação com o restante do ordenamento jurídico; d) na análise da evolução dos institutos do Direito ao longo do tempo; e e) na busca dos fins da lei, de quais necessidades ela visa a garantir, de modo a dar-lhe uma interpretação que mais bem se coadune com a atualidade.

Deve-se ressalvar que, frequentemente, esses elementos não surgem isoladamente, inter-relacionando-se.

3 Dos Resultados da Interpretação A exegese tem por fim revelar a norma, chegando a uma

conclusão que pode diferir ou não do texto legal. Dependendo do resultado, a interpretação pode ser a) declarativa, b) restritiva ou c) extensiva.

Na interpretação declarativa, o exegeta, ao verificar que o legislador se utilizou das palavras corretamente, conclui que o texto expõe exatamente a vontade da Lei, declarando, apenas, sua conformidade.

Pode acontecer, também, de o legislador dizer mais do que deveria, ao fazer uso, por exemplo, de palavra cujo sentido é mais amplo do que o devido. Nesse caso, o intérprete limita o alcance da expressão. Trata-se da interpretação restritiva.

A interpretação extensiva, por seu turno, resulta de uma conclusão oposta à anterior: percebe-se que o legislador disse menos do que queria a Lei, devendo ser alargada a aplicação da norma. É o caso da redação do art. 535, do Código de Processo Civil, que levou a doutrina e o Superior Tribunal de Justiça à

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compreensão de que, naquela disposição, onde constava “na sentença ou no acórdão”, dever-se-ia incluir todos os tipos de decisões judiciais, a exemplo das decisões interlocutórias (NADER, 2014, pp. 264-265).

4 Lei Interpretativa ou Autêntica A exegese do texto normativo pode partir de diferentes

fontes, a saber, doutrinária, judicial e legislativa. A fonte doutrinária se refere aos estudiosos do Direito, responsáveis pela elaboração de obras especializadas ou de pareceres. Já a judicial diz respeito aos juízes e tribunais. Definem o alcance e o sentido da norma no caso concreto, com exceção do controle concentrado de constitucionalidade, de índole abstrata, realizado no âmbito do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça, no caso destes, quando julgam leis municipais e estaduais.

A interpretação legislativa ou autêntica é aquela que é desempenhada pelo próprio órgão competente pela edição do ato interpretado. No caso das leis federais, estaduais, distritais e municipais, tal mister cabe, respectivamente, ao Congresso Nacional, à Assembleia Legislativa, à Câmara Legislativa e à Câmara Municipal, e é levado a cabo por meio da edição de nova lei federal, estadual, distrital e municipal, destinada a interpretar a primeira.

O Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966) prevê, expressamente, a figura da interpretação autêntica:

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:

I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;

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Embora rara em nosso ordenamento jurídico, a lei interpretativa é reconhecida pela doutrina:

Também denominada legislativa, a interpretação autêntica é a que emana do próprio órgão competente para a edição do ato interpretado. (...) se o ato interpretado for uma lei, quando estão caberá ao Legislativo a exegese. (NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 265)

A interpretação é autêntica, também chamada interpretação legislativa, quando uma lei interpreta outra lei de sentido obscuro, duvidoso ou até mesmo controvertido. Há, portanto, duas leis no caso, e que são, respectivamente, a lei anterior, cujo sentido se deseja apurar, e a lei nova que a interpreta (SECCO, Orlando de Almeida. Introdução ao Direito. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 272).

Autêntica, se dada pelo próprio legislador através de lei. É a estabelecida por norma jurídica (lei, regulamento, decreto-lei, tratado etc.), tendo por objeto norma anterior obscura (GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, pp. 219-220).

O Supremo Tribunal Federal adota posicionamento idêntico, considerando as leis interpretativas válidas e aptas a produzir efeitos em nosso sistema jurídico:

É plausível, em face do ordenamento constitucional brasileiro, o reconhecimento da admissibilidade das leis interpretativas, que configuram instrumento juridicamente

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idôneo de veiculação da denominada interpretação autêntica. As leis interpretativas - desde que reconhecida a sua existência em nosso sistema de direito positivo - não traduzem usurpação das atribuições institucionais do Judiciário e, em consequência, não ofendem o postulado fundamental da divisão funcional do poder (STF, ADIn 605-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DO de 5-3-1993).

Ao Parlamentar, representante do povo e legislador por excelência (art. 1º, parágrafo único, CRFB), cabe conhecer a realidade social e optar entre diversas possibilidades legislativas, fixando-lhes um sentido e delimitando o seu âmbito de aplicação, ao apontar os fatos sociais a serem regulados pela norma.

Desse modo, tem-se que o Parlamentar, além de responsável pela tramitação e discussão envolvidas na elaboração de cada diploma legal, também é competente para acompanhar sua aplicação, seja individualmente, seja por meio de suas Comissões Temáticas, seja, ainda, sob os auspícios da Casa Legislativa, reunida em Plenário.

Portanto, legítima e apropriada se revela a interpretação autêntica, efetuada pelo Poder Legislativo, no sentido de garantir a harmonia do ordenamento jurídico, a proteção de direitos fundamentais e o uso eficiente dos recursos públicos.

5 Poder Legislativo e a Típica Função Fiscalizatória É função precípua do Poder Legislativo proceder à

fiscalização contábil, financeira, orçamentária, patrimonial e operacional da Administração Pública, tendo por objeto, dentre outros, a legalidade, a legitimidade, a economicidade, a aplicação das subvenções e a renúncia de receitas (art. 70, CRFB).

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Frequentemente, uma norma, mal elaborada ou interpretada erroneamente, leva à equívocos na arrecadação e aplicação de receitas. O Poder Legislativo, a quem cabe precipuamente a função fiscalizatória, cabe decidir a correta interpretação dessas normas, para que se proceda ao manuseio probo dos recursos públicos. Essa é a hipótese mais comum de leis interpretativas, nos diversos níveis federativos.

Desse modo, tem-se que a interpretação autêntica ou legislativa se coaduna com as funções primárias do Poder Legislativo. O parlamentar, legislador por excelência, define o sentido e o alcance das normas, através de um processo legislativo democrático. Por outro lado, verifica a correta aplicação dos recursos públicos, confrontando-a com o interesse social visado pela Lei.

6 Efeito Retroativo da Interpretação Autêntica O Código Tributário Nacional reconhece efeito retroativo à

lei estritamente interpretativa:

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:

I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados;

A doutrina segue o mesmo entendimento:

A interpretação autêntica retroage ao início de vigência do texto interpretado. Especialmente por esse motivo – interpretação retroativa – cuidado especial deverá ter o aplicador da lei, para verificar se o ato interpretado limitou-se a revelar o sentido do texto anterior (NADER,

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Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 265).

Como se pode deduzir, a lei nova remete os seus efeitos a período anterior à sua própria existência, o que demonstra ser ela, a lei antiga, já devidamente esclarecida. Fica assim evidenciado que se trata realmente de interpretação, e não de revogação, o que a lei nova concretiza em relação à lei antiga (SECCO, Orlando de Almeida. Introdução ao Direito. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 273).

Essa interpretação importa a retroatividade da lei que a estabelece, sendo obrigatória da data em que se entrou em vigor a lei interpretada pelo legislador (GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, pp. 219-220).

O Supremo Tribunal Federal permite a retroação da lei interpretativa, desde que não se violem princípios constitucionais, como a intangibilidade dodireito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada:

- O Princípio da Irretroatividade somente condiciona a atividade jurídica do Estado nas hipóteses expressamente previstas pela Constituição, em ordem a inibir a ação do Poder Público eventualmente configuradora de restrição gravosa (a) ao “status libertatis” da pessoa (CF, art. 5º, XL), (b) ao “status subjectionis” do contribuinte em matéria tributária (CF, art. 150, III, “a”) e (c) àsegurança jurídica no domínio das relações sociais (CF, art. 5º, XXXVI).

- Na medida em que a retroprojeção normativa da lei nãogere e nem produza os

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gravames referidos, nada impede que o Estado edite e prescreva atos normativos com efeito retroativo.

- As leis, em face do caráter prospectivo de que se revestem, devem, ordinariamente, dispor para o futuro. O sistema jurídico-constitucional brasileiro, contudo,não assentou, como postulado absoluto, incondicional e inderrogável, o princípio da irretroatividade (STF, ADIn 605-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DO de 5-3-1993).

Portanto, tem-se que a Lei Interpretativa, quando aprovada, poderá retroprojetar seus efeitos à data de publicação, se assim previr a novel norma. Deve-se, contudo, resguardar eventuais direitos adquiridos, atos jurídicos perfeitos e a coisa julgada.

7 Requisitos da Interpretação Autêntica A interpretação autêntica impõe que o ato interpretativo

emane da mesma fonte de produção normativa e ostente o mesmo grau de validade e de eficácia jurídica da regra de direito positivo interpretada, conforme assentou o Supremo Tribunal de Federal:

A configuração da interpretação autêntica impõe que o ato interpretativo emane da mesma fonte de produção normativa e ostente o mesmo grau de validade e de eficácia jurídica da regra de direito positivo interpretada (ADI 605-MC, voto do Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 23-10-1991, Plenário, DJ de 5-3-1993). [grifos nossos]

Percebe-se que a Lei interpretativa deve preencher dois requisitos para a sua validade: i) provir da mesma fonte de produção da Lei Interpretada – Congresso Nacional, Assembleia Legislativa, Câmara Legislativa ou Câmara Municipal (requisito orgânico); e ii) pertencer à mesma espécie da norma interpretada – emenda constitucional, lei complementar, lei ordinária etc (requisito objetivo).

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Conclusões

Desse modo, não há que se falar em inconstitucionalidade formal subjetiva (vício de iniciativa) quando uma lei, de autoria parlamentar, interpreta outra norma, cuja iniciativa seja exclusiva do Poder Executivo ou Judiciário. A Lei Interpretativa não modifica a norma, apenas esclarece seu alcance e sentido.

Ademais, o Poder Legislativo é o guardião do ordenamento jurídico por excelência, e a ele compete a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, patrimonial e operacional da Administração Pública, inclusive dos demais Poderes.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Planalto. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, 5 de outubro de 1988.

BRASIL. Planalto. Lei nº 5.172. Brasília, 25 de outubro de 1966. Disponível em: <<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm>>. Acesso em: 27/06/2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn 605-MC. Relator: Min. Celso de Mello. Tribunal Pleno. DJ de 05/03/1993.

GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

SECCO, Orlando de Almeida. Introdução ao Direito. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

   

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A INSUFICIÊNCIA DE NÚCLEOS DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO NO INTERIOR DO ESTADO DA BAHIA COMO UM OBSTÁCULO À EFETIVA PRESTAÇÃO DA ASSISTÊNCIA JURÍDICA

IGOR SOUZA MARQUES: Analista Técnico Jurídico no Ministério Público do Estado da Bahia. Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador. Pós-graduando em Direito Público pela PUC-MG.

Resumo: Este trabalho procura compreender o acesso à justiça na esfera federal por parte das pessoas carentes que residem no interior do Estado da Bahia ante o fenômeno da interiorização da Justiça Federal. Para tanto, analisa a evolução do movimento em prol do acesso à justiça no âmbito internacional e no Brasil, estuda a Defensoria Pública da União, bem como a interiorização do judiciário federal. Os resultados mostram que a quantidade insuficiente de núcleos da DPU no interior do Estado baiano contribui com a permanência de óbices ao acesso por parte das pessoas sem recursos que lá residem.

Palavras-chave: Acesso à Justiça; Defensoria Pública; Interiorização da Justiça Federal.

Abstract: This text tries to understand the access to justice in federal’s sphere of devoid people’s part that live in the country of Bahia’s state face of the Federal Justice internalization phenomenon. For that, it analyzes the evolution of access to justice’s movement in international scope and in Brazil, it studies the Defensoria Pública da União and the federal justice’s internalization. The results show that DPU’s offices failure in the baiano state’s country contributes to the persistence of obstacles to access by poor people that live there.

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Keywords: Access to Justice. Defensoria Pública. Federal Justice Internalization.

Sumário: Introdução; 1. Acesso à justiça; 1.1. Desenvolvimento do acesso à justiça no Brasil; 2. Identificação dos obstáculos à efetivação do acesso à justiça; 2.1. As custas processuais; 2.2. Possibilidades das partes; Problemas com os interesses difusos; 2.4. Reformas para a superação das barreiras do acesso à justiça; 2.4.1. A assistência judiciaria; 2.4.2. A representação judicial para os interesses difusos; 2.4.3. Novo enfoque de acesso à justiça; 3. A Defensoria Pública da União; 3.1. Aspectos gerais e organização dos núcleos da DPU na Bahia; 3.2. Panorama da Defensoria Pública; 4. Interiorização da Justiça Federal e da DPU; Considerações finais.

Introdução:

Uma das grandes questões que se encontra em pauta na ciência jurídica hodiernamente diz respeito à efetivação dos direitos fundamentais. Após longa fase de abstrações, período em que foram formulados os direitos substantivos dos homens através do desenvolvimento de teorias elaboradas – como a do negócio jurídico, do contrato, da posse, dentre outros temas utilizados no mundo forense –, percebe-se hoje que os direitos já estão postos e delineados suficientemente, restando ser efetivados (BOBBIO, 1992).

Com efeito, o estudo processual moderno revela que os conceitos inerentes à sua ciência já alcançaram níveis satisfatórios, de sorte que “não se justifica mais a clássica postura metafísica consistente nas investigações conceituais destituídas de endereçamento teleológico” (DINAMARCO, 1987, p. 20). Portanto, já há algum tempo o tema em foco é ainstrumentalidade do processo, ou seja, como fazer para que o instrumento do qual o direito de vale seja capaz de tornar realizável o poder jurisdicional.

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A temática do acesso à justiça está imersa neste ponto. É dizer, para que o processo possa assumir o seu caráter instrumental - e, assim, possibilitar a efetivação do direito material – é necessário que haja um processo de inclusão, ampliando-se o acesso com a mitigação das suas barreiras (HABERMAS, 2002).

O acesso à justiça é tido hoje como um direito fundamental no sentido de que a sua inexistência acarretaria a denegação de todos os demais (SANTOS, 2000, p. 167). Do mesmo modo, o acesso à justiça é tratado também, em seu significado constitucional, como o mais básico de todos os Direitos Humanos (SCHELEDER, 2009). Sua efetivação pressupõe a superação de barreiras das mais diversas naturezas, como a questão das custas processuais, das distintas possibilidades pessoais e jurídicas das partes, bem como o problema relacionado à representação judicial dos interesses difusos. Entretanto, mais que isso, uma prática de acesso vai além da representação judicial de interesses, perpassando por um novo enfoque muito mais amplo, abrangendo, inclusive, alterações nos procedimentos judiciais, mudança na estrutura oucriação de tribunais, modificações no direito substantivo, etc. (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

O processo de interiorização da Justiça Federal é exemplo de reforma judicial com o propósito de adotar no Brasil um “novo enfoque ao acesso à justiça”, simplificando a acessibilidade das partes ao Poder Judiciário na medida em que aproxima os cidadãos dos órgãos julgadores (MONTAGNOLI, 2009). Este fenômeno teve início com o advento da Lei n. 10.772/03, que instituiu os Juizados Especiais Federais e criou Subseções da Justiça Federal no interior do Estado da Bahia, ampliando a “quantidade de tribunais” (ou seja, de órgãos do judiciário federal) e alterando a sua estrutura.

Entretanto, o Poder Público não criou uma quantidade simétrica e proporcional de núcleos da DPU (Defensoria Pública da União), órgão público constituído de advogados remunerados pelo Estado que prestam assistência jurídica aos necessitados. Em outras palavras, não houve (ainda) uma adequadainteriorização da

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Defensoria Pública federal, surgindo então o questionamento inevitável, que é o problema desta pesquisa: a insuficiência de núcleos da DPU no interior da Bahia faz com que permaneçam obstáculos ao acesso efetivo à justiça? Não seria um óbice à prestação da assistência jurídica?

O presente trabalho trata de uma pesquisa qualitativa que objetiva entender a problemática exposta e buscar caminhos que contribuam para o enfrentamento das questões suscitadas. Para tanto, fará uso do método dialético argumentativo, consistindo em revisão de literatura específica e demais materiais bibliográficos pertinentes.

Optou-se por uma pesquisa qualitativa porque nesta é aberto um espaço para buscar percepções e entendimentos de natureza geral de uma questão, ampliando-se a interpretação. Entende-se pesquisa qualitativa como sendo “[…] studies that include qualitative analysis. This means that qualitative research is seen as one sector of the grey area of approaches and methodological solutions surrounding the social survey” (ALASUTARI, 1995, p. 09).

Para que um estudo adote esta metodologia, “[...] it must be assumed that interferences based on purely qualitative analysis, or other references to excerpts or cases in the data, are used as clues in solving theriddle. However, this definition of qualitative research does not rule out the possibility that quantitative analysis of qualitative data, or even a social survey, is used alongside qualitative analysis” (ALASUTARI, 1995).

O método dialético, por sua vez, não se limita às concepções marxista ou hegeliana. Costumou-se dizer que na dialética não há nada em definitivo, absoluto ou sagrado, pois nada existe além do processo ininterrupto do devir e do transitório (KONDER, 1987, p. 34). Mas não é só isso. A dialética assume também outras conotações, podendo ser concebida como um método que se baseia em um processo argumentativo no qual, ao expor as contradições de determinada proposição, tenta produzir verdade

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(conhecimento) (REALE, 2007, p. 234-256). É esta noção que aqui será empregada. A argumentação assume, nesse contexto, um papel importante, pois designa várias formas de raciocínio que não se deixam enquadrar nas regras da lógica convencional e implicam o relacionamento entre pelo menos dois interlocutores, um deles procurando convencer o outro (THIOLLENT, 2000, p. 29).

Tal estudo é imprescindível para buscarpraticidade nas políticas governamentais que visem minimizar as disparidades econômicas entre as partes econcretizar o acesso à justiça para todos. É também atual, uma vez que a Defensoria Pública enquanto instituição é bastante recente, sobretudo a Defensoria Pública da União, que somente foi organizada em 1994 e teve o primeiro concurso para ingresso na carreira no ano 2000. Os destinatários deste trabalho são, de forma direta, os gestores da Administração Pública e estudantes do tema “acesso à justiça” e, indiretamente, a população, beneficiária das reflexões propostas.

Este trabalho busca, portanto, examina o movimento em prol do acesso à justiça (sua evolução e surgimento no Brasil), a identificação dos obstáculos à sua efetivação (as custas processuais, as distintas possibilidades das partes e a questão dos interesses difusos) e as propostas para solução, dando ênfase à assistência judiciária.

Em seguida, analisa a Defensoria Pública da União situando-a entre as “propostas de solução”, identifica os seus “clientes”, examina a natureza do serviço que presta, observando a sua estrutura organizacional (macro e local) e, por fim, visualizando um panorama atual.

Ao final, estuda a Lei n. 10.772/03 e a interiorização da Justiça Federal, questionando a insuficiência de núcleos da DPU nestas localidades.

1. Acesso à Justiça

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Para muitos autores, a ideia de acesso à justiça, assim como diversas noções jurídicas e políticas, tem origem na civilização greco-romana. Em Atenas, sob o argumento de que “todo direito ofendido deve encontrar defensor e meios de defesa”, eram nomeados, anualmente, dez advogados para defender os pobres, perante os tribunais civis e criminais, enquanto que em Roma, a ideia de igualdade formal (igualdade perante a lei) contribuiu para consolidar o patrocínio jurídico gratuito aos necessitados, inserindo na legislação de Justiniano a obrigação estatal de “dar advogado a quem não possuísse meios para constituir patrono” (MORAES, 1988, p. 229).

Com os gregos, noticia-se o surgimento da ideia hoje conhecida como isonomia, cuja concepção futuramente teria grande influência sobre os jusnaturalistas na elaboração de estudos dos chamados “direitos humanos”. E, antes mesmo do pensamento socrático, “a Escola Pitagórica já simbolizava a justiça pela figura geométrica do quadrado, em razão da absoluta igualdade dos seus lados, além da utilização de algarismos” (CARNEIRO, 2003, p. 04-05). Dentre os grandes pensadores desta época, Aristóteles é o que mais se destaca, pois foi o formulador do que hoje se entende por justiça, uma vez que desde então já pensava que “o equitativo é justo, porém não o legalmente justo, e sim uma correção da justiça legal” (ARISTÓTELES, 1973, p. 336-337).

Os romanos, por sua vez, sedimentaram as instituições e o formalismo procedimental, etapa fundamental para que futuramente fosse possível pensar em due processo of Law. Percebe-se nesse momento um “notável desenvolvimento dos institutos jurídicos” e clara linha de “evolução da jurisdição” (CARNEIRO, 2003, p. 07).

Em Roma, a religião desenvolve-se e, com ela, o próprio Estado, que assume a função de resolver os conflitos de interesses. Era preciso, então, que o cidadão comparecesse diante do magistrado-pretor e aceitasse a decisão. O pretor elaborava a regra e indicava um árbitro, que decidiria a questão. Com o passar do tempo, o pretor não apenas cria a regra, passando a aplicá-la. Só

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então é possível falar em jurisdição. Sintetizando, “enquanto o período grego foi rico na discussão de ideias filosóficas, os romanos foram fortes na elaboração do seu direito positivo” (CARNEIRO, 2003, p. 08).

No período medieval, as ideias em torno do acesso à justiça seguem desde a Idade Média bizantina e europeia (séculos IV e V) até o começo do pensamento moderno, com o Renascimento (séculos XV e XVI). Nesse momento, foi incorporado forte conteúdo religioso ao direito e a concepção de justiça passou a ser medida pela sua fé (CARNEIRO, 2003, p. 09).

Teóricos como Santo Agostinho, Santo Isidoro de Sevilha e São Tomás de Aquino desenvolveram pensamentos que influenciaram as correntes filosóficas futuras, sobretudo as reflexões acerca da justiça. No entanto, “as elaboradas discussões acerca da justiça e do justo não tiveram correspondência na prática judiciária institucional”, pois nesta época, ordálios (juízos de Deus) constituíam a fonte primária de julgamento, sendo praticamente desnecessária a representação em juízo. Com efeito, a própria parte, ao se submeter às provas de água ou fogo, proporcionava o julgamento (CARNEIRO, 2003, p. 12-13).

No período moderno, há uma ruptura com a lógica que predominava até então no período medieval de relação entre justiça e religião. A Escola Clássica do Direito Natural passa a reconhecer que a natureza humana é que seria fonte do Direito Natural. Com a divulgação dos escritos de autores como Rousseau e Hugo Grotius, não fica afastada a origem divina do poder dos reis, mas se esboça limitações, de sorte que “começava a se difundir a ideia de que o poder teria por fim a felicidade do povo” (CARNEIRO, 2003, p. 14).

A Revolução Gloriosa (1689) incorpora tais ideias, destacando-se a contribuição de Locke, que sustentava suas teses de Estado de Natureza e de Contrato Social (CHEVALLIER, 1980, p. 105).[i] Tal movimento foi exitoso e já no século XVIII as colônias norte-americanas se insurgem contra a coroa britânica. Na

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Declaração dos Direitos da Virgínia, documento elaborado após a independência, já se anunciava a consagração dos Direitos do Homem. Em seguida, com a Revolução Francesa, tais direitos universalizam-se. A burguesia, com o propósito de limitar os poderes do Estado, utiliza a teoria da separação dos poderes e do princípio da legalidade, adotando visão absolutamente individualista, protegendo especialmente a propriedade e a autonomia privada (CARNEIRO, 2003, p. 16).

As revoluções burguesas alteram também a própria ideia de nação, Estado e poder popular, criando um novo conceito de Estado Nacional, cuja identidade será resultado da Constituição, documento este que expressa o sentimento comum e a homogeneidade de um grupo (CARNEIRO, 2003, p. 17).

Com a ruptura do Estado Absolutista para o Estado Liberal, houve uma mudança de paradigma na organização e concepção de justiça, a qual acarretou o esvaziamento de uma tendência histórica em favor do acesso à justiça. Isso porque durante a vigência daquele modelo político, os juízes reinícolas[ii] eram um dos pilares estatais, pois justificavam os interesses governistas ao aplicar normas jurídicas contrárias ao bem comum e que somente beneficiavam o soberano e seu poder ilimitado. Diante deste quadro, com o explodir das revoluções burguesas, a tendência era a retirada do poder destes juízes, reduzindo a sua função à de declarar o conteúdo da lei.[iii] Assim, não há qualquer preocupação do Estado Liberal com a prática do acesso à justiça.

Para Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (2003, p. 17), surgia, então, um paradoxo, pois “[...] ao mesmo tempo em que a Constituição do Estado (o novo modelo de organização social) assegura, ao menos formalmente e em tese, a igualdade entre os indivíduos, o que deveria, também em tese, assegurar um igual acesso à justiça, a realidade era bastante diversa. Deveras, a minimização do Judiciário conduz a uma ausência de preocupação com a questão do acesso. Em outras palavras: se a instância judiciária não é importante, por que se preocupar com o acesso?”.

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Nas sociedades burguesas, a concepção vigente era a de que, “embora o acesso à justiça pudesse ser um ‘direito natural’, os direitos naturais não necessitavam de uma ação do estado para a sua proteção”. Por serem direitos anteriores à organização estatal, a sua tutela limitava-se a exigir que o Estado não permitisse que ele fosse infringido por outros. O Estado, portanto, permanecia “passivo, com relação a problemas tais como aptidão de uma pessoa para reconhecer seus direitos e defendê-los adequadamente, na prática” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 10).

A justiça – considerada como um bem ou serviço e não como um direito assegurado – somente era acessível, dentro da perspectiva do laissez-faire, àqueles que pudessem pagar por ela. Com efeito, o acesso meramente formal ao judiciário refletia uma igualdade de mesmo grau entre os abastados e os integrantes das classes menos favorecidas (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

O liberalismo econômico e a sua influência política trouxeram à tona graves desigualdades socioeconômicas, gerando concentração e acumulação de riquezas pela classe burguesa industrial, dando ensejo ao surgimento de questões relevantes expressadas nas correntes socialistas, anarquistas e outras (CARNEIRO, 2003, p. 19-20).

Com o empobrecimento resultante da referida concentração de riquezas, sob a influência da filosofia de marxista – que aponta as mazelas do capitalismo -, surgem disputas entre burguesia e proletariado até então inexistentes.

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (2003, p. 20) registra que as “reivindicações do movimento marxista, especialmente no campo trabalhista, serviram de marco histórico em muitos países para a discussão do acesso à justiça, enquanto proteção do trabalhador”, concluindo que “o direito do trabalho foi o ponto de partida do verdadeiro acesso à justiça”.

Conforme as sociedades liberais foram crescendo em tamanho e complexidade, o “conceito de direitos humanos começou a sofrer

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uma transformação radical” e com esse crescimento, os conflitos sociais passaram a ser mais frequentes, v.g., nas causas consumeristas, e ganharam complexidade, como é o caso da urgência em tutelar os interesses difusos (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 10).

Assim, uma postura estatal ativa passou a ser exigida a fim de proteger esses novos direitos humanos e de superar a igualdade formal até então vigente, adotando-se ações governamentais para garantir a efetivação dos direitos daqueles que não têm condições de custear a sua tutela. Dessa forma, o direito ao acesso à justiça teve atenção especial com as reformas surgidas no welfare state, procurando-se “armar” os indivíduos de novos direitos substantivos, pois “a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 11).

No Estado Social, o Poder Público intervém visando assegurar “[...] não mais aquela igualdade puramente formal, utópica, concebida pelo Liberalismo, mas a procura de uma igualdade material, permitindo que os mais desfavorecidos tivessem acesso à escola, à cultura, à saúde, à participação, àquilo que já se sustentava no passado, a felicidade” (CARNEIRO, 2003, p. 21).

Superando-se a concepção exacerbadamente individualista pós-revolucionária que vigorava nas sociedades burguesas europeias, o chamado Estado de bem-estar social logrou pensar e desenvolver alternativas à desigualdade do acesso à justiça existente entre pessoas que possuíam condições financeiras e os chamados “necessitados”, ou “juridicamente pobres”.

Durante a década de 90, verificou-se uma “contrarreação” ao Estado Social, que seria a fase “pós-social”. Nesta, a intervenção é cada vez menor em função das economias de mercado, que impossibilitam a manutenção de programas sociais, privatizando serviços não essenciais e diminuindo investimentos nos serviços essenciais, gerando desemprego e diminuição da assistência a

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direitos básicos, tais como a saúde, o idoso e a criança, inclusive causando obstáculos materiais ao acesso à justiça (CARNEIRO, 2003, p. 30).

Atualmente, o direito de acesso à justiça é considerado um direito charneira, porque a insuficiência deste acarretaria a denegação a todos os demais (SANTOS, 2000, p. 167); entrementes, continua encontrando grandes obstáculos à sua efetivação.[iv] O certo é que a difusão das ideias de acesso seguiram do berço europeu rumo aos demais países do mundo e este processo não se deu de forma homogênea.

1.1.Desenvolvimento do acesso à justiça no Brasil

No Brasil, o acesso à justiça sofreu duras quedas até se estabilizar. Do ponto de vista legislativo, há estudos que consideram que a assistência judiciária tem suas origens fincadas nas Ordenações Filipinas. Nesse sentido, Humberto Penha de Moraes (1988) destaca que este diploma legal previa, no seu Livro III, Título 84, § 10, a seguinte redação: “[...] em sendo o aggravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de raiz, nem por onde pagua o agrgravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater Noster pela alma del Rey Don Diniz, ser-lhe-á havido, como que pagasse os novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro no tempo, em que havia de pagar o aggravo"[sic].

As Ordenações Filipinas passaram a vigorar no Brasil em 11 de janeiro de 1603 e tinham algumas disposições sobre um suposto direito das pessoas pobres e miseráveis terem patrocínio de advogado, destacando-se dispositivo segundo o qual “o juiz deve sempre preferir o advogado de mais idade e de melhor fama ao mais moço e, principalmente, a fim de que não seja mais perito o da parte contrária” (CARNEIRO, 2003, p. 34).

Após a proclamação da Independência do Brasil em 1822, o cenário do acesso à justiça no país em nada mudou. A Constituição de 1824, por sua vez, concedia ao Imperador “poderes que o colocavam na vanguarda de um governo de cunho

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absolutista”,[v]apesar dos avanços conscritos no título VIII, influenciado pelo modelo francês de 1791, que tratava das garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, e mesmo quase três séculos depois, as Ordenações Filipinas continuavam vigendo no país (CARNEIRO, 2003, p. 35).

Entretanto, consoante Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (2003, p. 36), o acesso à justiça em verdade “simplesmente inexistiu no Império brasileiro, até porque é fruto de um processo histórico e político ainda não consolidado àquela altura da evolução do País”.

Após a abolição da escravatura e a queda do Império, em 1889, foi proclamada a República e, em seguida, ao longo do século XX, “a noção de acesso à justiça como atividade criativa, como favor prestado aos mais pobres única e exclusivamente no campo da litigância, do processo, e em especial na área penal, foi a tônica dominante” [sic]. Ao longo de todo o século e praticamente até a década de 80, a “legislação brasileira apresenta normas com tendências sociais e de política largamente intervencionista do Estado, na trilha teórica e mesmo institucional daquelas editadas nos países desenvolvidos” (CARNEIRO, 2003, p. 37).

O direito de acesso à justiça ganhou previsão constitucional no Brasil pela primeira vez com a promulgação da Constituição Federal de 1934,[vi] que inseriu a assistência judiciária no seu art. 113, n. 32, dentro dos “Direitos e Garantias Individuais” e desde então esse direito vem, sistematicamente, sendo reconhecido pelas ordens constitucionais subsequentes.

Por outro lado, a regulamentação desta previsão somente quase vinte anos depois, com o advento da Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, estabelecendo normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados. Somente após a edição desta lei passou a existir interesse pela criação de órgãos de assistência judiciária, tendo os Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo criado o cargo de Defensor Público, com a particularidade de que neste último o defensor fazia parte da Procuradoria-Geral do

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Estado, enquanto que naquele o defensor integrava o Ministério Público (CARNEIRO, 2003, p. 38).

A previsão constitucional deste direito foi mantida nas Constituições seguintes, ora com avanços, ora com retrocessos.

A Constituição de 1937, que inaugura o Estado Novo, tem como principal ponto de atraso a possibilidade conferida ao Poder Executivo de suprimir as conquistas relativas à ação popular e à assistência judiciária. Por sua vez, a Constituição de 1946 foi duramente afetada por atos institucionais que se sucederam a partir de 9 de abril de 1964, estabelecendo a ditadura militar, perdurando por cerca de vinte anos (CARNEIRO, 2003, p. 38-39).

Durante a vigência do período militar, houve uma estagnação do movimento em prol do acesso à justiça e dos direitos sociais como um todo, que somente teve nova propulsão com a promulgação da Constituição de 1988. Com a nova ordem constitucional, o movimento ganhou fôlego e visibilidade, consagrando o acesso como direito fundamental (art. 5º, XXXV, da CF/88) (ANONNI, 2009, p. 77).

A atual Constituição foi além, assegurando ainda o direito à assistência jurídica integral e gratuita, também com o patamar de cláusula pétrea, ampliando a assistência judiciária e reconhecendo o direito do cidadão à assistência também ao processo administrativo. A gratuidade integral abrange não apenas a isenção das custas judiciais, mas “a todos os instrumentos que se fizerem necessários ao amplo e irrestrito acesso à justiça, desde o advogado até mesmo a emissão de certidões pelos órgãos públicos” (ANONNI, 2009, p. 77).

Instituiu ainda a Constituição Federal vigente, em seu art. 134, caput, a Defensoria Pública como “instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados [...]”, dispositivo que somente foi regulamentado em 1994, com a Lei Complementar n. 80.

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Como se vê, ao longo do processo de consolidação do ideal de acesso à justiça, surgiram severos óbices à sua implementação. A seguir, serão identificados e analisados os principais obstáculos percebidos.

2. Identificação dos obstáculos à efetivação do acesso à justiça

O movimento em prol do acesso à justiça não encontrou facilidades, assim como não encontra atualmente. Diversos são os obstáculos à operacionalidade deste direito, inviabilizando a existência de uma ordem jurídica justa (WATANABE, 1988).

As razões para tanto são diversas e a sua compreensão perpassa pelo entendimento prévio de que o processo, enquanto instrumento de efetivação do direito, é prenhe de valores e ideologias, possuindo a finalidade de garantir a ordem dominante.

Calmon de Passos observa que, a partir dos governantes, “o direito é uma forma de controle social e de manutenção do status quo, o que se traduz em cristalização e desigualdade que foi institucionalizada e, por conseguinte, realizar-se o máximo de injustiça tolerável” (1988, p. 87).

Em relação às dificuldades de implementação enfrentadas pelo movimento do acesso à justiça, alguns autores têm elencado obstáculos a ser transpostos rumo ao seu exercício, destacando-se a contribuição de Mauro Cappelletti e Bryant Garth. Para eles, a efetividade perfeita do acesso seria com a completa igualdade de armas entre as partes, quer sejam abastadas, quer humildes, mas esta hipótese é utópica porquanto as “diferenças entre as partes não possam jamais ser completamente erradicadas” (1988, p. 15). E realmente jamais seriam, pois há uma função social a ser cumprida também pela disparidade de armas.

Estes autores apontam três principais óbices à efetivação do acesso: a) as custas judiciais; b) as possibilidades das partes; e c) o problema dos interesses difusos.

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2.1.As custas processuais

O primeiro grande obstáculo ao acesso à justiça apontado por estes autores são as custas judiciais, pois o Estado, ao prestar o seu poder-dever jurisdicional, tem gastos inerentes a este serviço, tais como o salário de servidores, de juízes, compra de material, manutenção de edifícios, dentre outros, de sorte que os litigantes precisam suportar com parte destas despesas, incluindo os honorários advocatícios.

É importante esclarecer, desde já, que as custas aqui referidas envolvem tanto as taxas judiciais pagas pelo autor ao Estado pela prestação do serviço público que usufruirá, quanto os demais gastos efetuados por autor e réu, quais sejam, pagamento de honorários de advogados, peritos, assistentes técnicos, dentre outros. Com efeito, as custas processuais assumem aqui um conteúdo extensivo, envolvendo todo desembolso financeiro que as partes tenham que arcar licitamente para ver tutelado o seu direito.

Para Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988, p. 16), estas custas judiciais agem como “uma barreira poderosa sob o sistema mais amplamente difundido, que impõe ao vencido os ônus de sucumbência”. Portanto, tendo em vista que o processo sempre envolve um risco, pois há incerteza quanto ao provimento jurisdicional final da ação (notadamente se o autor terá êxito ou não), as custas servem também como um aviso para que este não ingresse em aventuras judiciais, sob pena de, se ao final sua demanda for julgada improcedente, ter que arcar com os ônus da sucumbência. Nesta hipótese, o risco é ainda maior, pois além de ter que pagar as custas judiciais e os honorários do seu advogado, terá que arcar com os gastos da outra parte.

Percebe-se que além de viabilizar o ressarcimento aos cofres públicos pelos gastos realizados com a disponibilização da justiça aos jurisdicionados, que é a sua função primordial, as taxas processuais assumem ainda uma função secundária, qual seja, o papel de inibir lides temerárias, pois em caso de improcedência,

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caberá ao autor o pagamento das custas e das despesas realizadas pela parte contrária.

Ao tratar sobre esta função secundária da taxa judicial, Wilson Alves de Souza (2006, p. 32) escreve que “o conflito é da natureza humana, existe antes e fora do processo, e não pelo fato de não se pagar pela prestação do serviço” e, na sequência, este mesmo autor observa que “o processo também tem, sob outra perspectiva, de todo modo, um elevado custo para os litigantes, porque têm que pagar advogados e, não raro, despesas com peritos, assistentes técnicos, etc.”.

Portanto, não é de todo certo que as taxas processuais exerçam esta função senão de um ponto de vista teórico não demonstrado no mundo fático.

Os honorários advocatícios pagos pelas partes assumem importância particular, porquanto representem a parcela mais onerosa dos gastos processuais. A relevância das despesas com advogados se dá pelo fato notório que os serviços destes profissionais são geralmente caros, impossibilitando que grande parcela da população tenha acesso a este serviço.[vii]

Ainda dentro do ponto referente aos gastos processuais, Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988, p. 19) sugerem outro aspecto que obstaculiza o acesso, que é a questão das pequenas causas. Isto porque, para eles, quanto menor é o valor da causa em questão, vale dizer, quanto menor a mensuração econômica do bem da vida pretendido pelo autor, maior, relativamente, serão as custas processuais, ou seja, a taxa judicial cobrada pelo Estado é tanto mais significativa em termos relativos quanto menor e mais irrelevante é o interesse da parte.[viii]

Além desses dois aspectos, há de ser considerado também o tempo que cada parte suporta enquanto o litígio perdura, pois, sendo notório que os processos demoram a se resolverem, existe diferença de capacidade entre a parte que, por possuir recursos, depende em menor intensidade do interesse pleiteado na ação e

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pode continuar vivendo tranquilamente enquanto aguarda o desfecho processual e aquela que depende em grande intensidade deste interesse pleiteado (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 22).

Como exemplo, caso uma pessoa ajuíze uma ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social visando concessão do benefício previdenciário, o autor com recursos financeiros suficientes terá maiores possibilidades para suportar a delonga processual. De outro lado, se o autor desta mesma ação fosse uma pessoa sem recursos e que convive em um núcleo familiar de desempregados, realidade perceptível atualmente no Estado da Bahia, haverá menor possibilidade, em tese, de esperar o fim do procedimento.

Outro aspecto importante a ser observado ainda quanto ao tempo é a questão da efetividade da prestação jurisdicional. Para Wilson Alves de Souza(2006, p. 31), a problemática da demora demasiada dos processos é aspecto dos mais graves, pois “[...] está diretamente relacionado com a idéia de efetividade, resultando muitas vezes, na prática, em verdadeira negação do acesso à justiça, o que, consequentemente, afeta os direitos fundamentais do cidadão que está a precisar da tutela jurisdicional do Estado, como também deixa em dúvida a própria credibilidade das instituições estatais”.

A delonga processual faz com que os custos aumentem com a inflação monetária, pressionando os economicamente mais fracos a abandonar as suas causas ou a aceitar acordos por valores muito inferiores àqueles a que teriam direito. Em resumo, em qualquer que seja o processo, “os altos custos, na medida em que uma ou ambas as partes devam suportá-los, constitui uma importante barreira ao acesso à justiça” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 18).

2.2.Possibilidades das partes

O segundo obstáculo é discrepância entre as possibilidades das partes. A falta de isonomia entre pessoas decorrente desta disparidade lastreia-se no fato de que alguns litigantes gozam de vantagens estratégicas que facilitam o seu acesso à justiça. Esse

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ponto é amplo e não comporta delimitações, mas Cappelletti e Garth visualizam como mais tangíveis osrecursos financeiros, a aptidão para reconhecer um direito e propor uma ação e a distinção entre os chamados litigantes eventuais e os litigantes habituais(1988, p. 21).

Enquanto os recursos financeiros são facilmente detectáveis, possibilitando que determinadas pessoas possam “pagar para litigar” e, assim, sejam capazes de suportar a demora dos litígios, a aptidão para reconhecer e propor uma ação, por outro lado, é questão mais complexa.

Os autores sintetizam as barreiras relacionadas às possibilidades das partes em dois pontos: a) a aptidão para reconhecer um direito e propor uma ação ou sua defesa; e b) as diferenças entre litigantes habituais e eventuais.

Em relação à aptidão para reconhecer um direito, Cappelletti e Garth (1988, p. 23) tratam da noção que chamam de “capacidade jurídica”, a qual constitui conceito rico, abrangendo as inúmeras barreiras que precisam ser pessoalmente superadas antes mesmo da reivindicação do direito. Envolve as vantagens de recursos financeiros, meio e status social, entre outros aspectos. Essa barreira é ponto de maior importância, pois afeta não somente os despossuídos, mas toda a população em muitos tipos de conflitos.

O “problema educacional” apontado por Wilson Alves de Souza encontra-se inserto nesta noção. Para ele, “o acesso à justiça começa a partir da possibilidade de conhecer os direitos e, quando violados, os mecanismos de exercê-lo, na medida em que o conhecimento dos direitos, em larga medida, passa inicialmente pela informação” (2006, p. 26). Esta premissa já havia sido apontada pelo próprio Kazuo Watanabe, para quem o direito à informação, que inclui a compreensão plena dos direitos subjetivos do cidadão, é pressuposto de uma ordem jurídica justa(1988, p. 128-135).

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Além desta “capacidade jurídica”, há também a “capacidade psicológica”, que é a disposição psicológica para que alguém recorra às vias judiciais, pois ainda que alguém saiba da lesão do seu direito e da sua exigibilidade, poderá não buscar o judiciário (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, P. 23). As razões para isto são as mais diversas, como a falta de credibilidade da justiça, receio de advogados e da ritualística forense.

Wilson Alves de Souza (2006, p. 30) trata esta questão como um problema cultural, ressaltando que este envolve a desconfiança das pessoas em relação aos advogados e também ao poder judiciário como um todo. Mas, ao que parece, a questão não se resume ao aspecto cultural, avançando ao plano psicológico de cada indivíduo e da sua história de vida (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

Por fim, há notórias vantagens entre os “litigantes habituais” – corporações empresariais e entes estatais, que possuem núcleos jurídicos próprios e que sempre estão enfrentando uma pendência jurídica – e os litigantes eventuais – pessoas comuns, que raramente recorrem ao Poder Judiciário, podendo mesmo morrer sem vir a precisar do auxílio de um advogado. Estas vantagens são as seguintes: a) a maior experiência com o direito e possibilidade de planejar o litígio; b) economia de escala, por possuir maiores casos; c) desenvolvimento de relações informais com membros de instâncias decisórias; d) possibilidade de diluir o risco da demanda por maior número de casos; e) possibilidade de testar estratégias em alguns casos (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 25).

2.3.Problemas com os interesses difusos

O terceiro obstáculo se relaciona à questão dos interesses difusos.

Com a mudança do perfil do Estado, notadamente a transformação do Estado Liberal e não-intervencionista para um Estado Social que percebe que o bem comum depende de sua atuação social positiva, surge também uma mudança da

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compreensão dos direitos, emergindo, assim, os ditos direitos difusos.[ix]

Ocorre que também a tutela destes direitos é complexa, pois não há interesse econômico direto na sua defesa. Isso porque, considerando que a mola propulsora que leva alguém a ajuizar uma ação em face de um banco por uma cobrança indevida é uma eventual futura indenização em quantia, o mesmo não se dá quanto ao meio ambiente, por exemplo, pois na hipótese de ajuizamento de uma ação popular contra ato que lesa a fauna e flora de determinado local, o autor não será beneficiado monetariamente por sua atitude (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 26-27).

Da falta de interesse econômico direto e o notório desestímulo a uma aventura processual que não poderá refletir qualquer benefício direto, emerge uma consequência: é preciso conceder a alguém o poder-dever de atuar na defesa destes interesses, tendo em conta a inestimável importância destes direitos ao funcionamento harmônico da sociedade. Fica claro, assim, que havia grande óbice à tutela dos interesses difusos.

Enquanto se identificava os obstáculos mencionados, foram elaboradas diversas propostas para solucioná-los, possibilitando o acesso. A seguir, serão expostas algumas dessas soluções.

2.4.Reformas para a superação das barreiras ao acesso à justiça

Mauro Cappelletti e Bryant Garth identificam três movimentos de reformas visando solucionar os problemas acima identificados, chamando-os de “as três ondas”. A primeira fundamenta-se na assistência judiciária e tem por base a superação dos obstáculos individualmente considerados. Entre as outras duas, a segunda busca uma representação jurídica para os interesses difusos e a última dá um novo enfoque de acesso à justiça (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 31).

2.4.1. A assistência judiciária

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A representação judicial por um advogado é, atualmente, de essencial grandeza, pois se para os técnicos já é complexa a atividade de compreensão do fenômeno jurídico, quiçá imaginar isso de pessoas humildes e excluídas socialmente. Portanto, não só para estas pessoas, mas para todos é imprescindível o acompanhamento de um profissional especializado e, sobretudo, conhecedor dos ritos processuais (SOUZA, 2006).

A assistência judiciária é, portanto, a disponibilização de serviços jurídicos por parte de um profissional técnico aos pobres (aqueles que não possuem recursos para arcarem com os gastos de um advogado particular). Ela teve início como um munus honorificum (se baseava em serviços prestados por advogados particulares,[x] sem contraprestação, inspirados num sentimento de solidariedade) e, com o seu reconhecimento veio a omissão estatal na adoção de medidas concernentes à sua implementação. Diante da ineficiência deste modelo, surgiu uma primeira grande reforma que originou o sistema judicare(CAPPELLETTI; GARTH, 1998, p. 32).

Neste modelo, implementado originariamente na Áustria, Inglaterra, Holanda, França e Alemanha Ocidental, o serviço de assistência judiciária, que é tido como um direito, também era prestado por advogados particulares, contudo estes não são inspirados meramente em sentimentos de solidarismo, sendo remunerados pelo Estado. Os advogados cadastravam-se como concedentes do serviço cuja lista era extensa, pois a remuneração paga pelo Estado para estes profissionais era suficiente para atrair quase todos eles. Por sua vez, os resultados deste modelo são gritantemente positivos, em que pese suas limitações (os advogados não atuavam em diversas áreas e não se prestava à tutela dos direitos difusos) (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 36).

Não obstante, a despeito das conquistas deste esquema, Mauro Cappelletti e Bryant Garth direcionam duras críticas a este modelo, notadamente que ojudicare, embora supere as barreiras de custo, não ataca os obstáculos de outras naturezas, pois confia aos

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pobres a tarefa de reconhecer as causas e procurar auxílio, além de não encorajar, nem permitir que o profissional individual auxilie os pobres a compreender seus direitos e identificar as áreas em que se pode valer de remédios jurídicos (1988, p. 38).

Ademais, embora seja intuitivo que o necessitado geralmente procura por advogado em causas que lhes são próximas (v.g. matéria criminal ou de família), não é correto imaginar que este poderia identificar os seus “novos direitos” porventura violados e, por outro lado, permaneceriam as barreiras psicológicas e culturais para a busca por um escritório de advocacia na perspectiva de discutir a questão com um advogado particular (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

Tal proposta não enfrenta, igualmente, a questão da disparidade entre os litigantes organizacionais e continua tratando os pobres como indivíduos, negligenciando a sua situação enquanto classe, não oferecendo auxílio para casos-testes ou ações coletivas. Em síntese: o judicare não é aparelhado para transcender os remédios individuais (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

Outro modelo de assistência judiciária que surgiu ao longo do movimento em prol da consolidação do acesso à justiça foi o esquema de advogados remunerados pelos cofres públicos, o qual se aponta como surgido com o Programa de Serviços Jurídicos doOffice of Economic Opportunity, em 1965. Segundo essa proposta, a assistência judiciária, prestada por advogados pagos pelo Estado e encarregados de defender os interesses dos pobres enquanto classe deveria ser prestada por “escritórios de vizinhança”.[xi]Não exclui a possibilidade de defesa individual dos direitos dos pobres, mas caracteriza-se por “grandes esforços no sentido de fazer as pessoas pobres conscientes de seus novos direitos e desejosas de utilizar advogados para ajudar a obtê-los” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

A mais importante característica desse modelo é que “[...] os advogados tentavam ampliar os direitos dos

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pobres, enquanto classe, através de casos-teste, do exercício de atividade de lobby, e de outras atividades tendentes a obter reformas da legislação, em benefício dos pobres, dentro de um enfoque de classe”(CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 40).

São nítidas as vantagens desta proposta sobre o sistema judicare, pois ataca outras barreiras ao acesso individual além dos custos, em destaque os obstáculos que se relacionam à desinformação jurídica pessoal dos pobres, podendo ainda suportar os interesses difusos ou de classe dos necessitados, adquirindo vantagens sob os litigantes habituais por meio dos casos-teste com a aquisição de experiência para futuras situações. Sintetizando, nesse modelo cria-se uma categoria de profissionais eficientes para atuar pelos pobres e inaugura-se uma tendência educacional, auxiliando-os a reivindicar os seus direitos.

Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988, p. 41) apontam algumas críticas a este esquema, como a agressividade nos casos-teste, minimizando a importância dos casos individuais, ou o seu caráter paternalista ao tratar os pobres como incapazes de pleitear seus próprios direitos, mas a principal crítica é, sem dúvida, a necessidade de apoio governamentalpara atividades de natureza política que muitas vezes é dirigida contra o próprio Estado. A solução vislumbrada a este óbice é a independência de influência governamental direta.[xii]

Entretanto, esta solução não basta por si só, devendo ser combinada com outras, posto que, ao revés do que ocorre no juicare, não pode garantir o auxílio jurídico como um direito. Ressaltam Cappelletti e Garth que “não é possível manter advogados em número suficiente para dar atendimento individual de primeira categoria a todos os pobres com problemas jurídicos” (1988, p. 43).

Portanto, embora louvável o êxito dos dois modelos comentados, a assistência judiciária não pode ser o único enfoque a ser dado na tentativa de viabilizar o acesso, pois comporta

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intrinsecamente limitações no seu exercício, sendo identificáveis, de plano, quatro grandes problemas. São eles o exorbitante número de advogados necessário, por vezes maior que a procura; disponibilidade de profissionais para atendimento às pessoas carentes, aumentando a dotação orçamentária estatal; a inviabilidade para solucionar as pequenas causas individuais e, finalmente, a ineficácia para a tutela dos direitos difusos não ligados diretamente aos pobres, ou seja, aqueles não considerados como direitos da “classe pobre” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 49).

2.4.2. A representação judicial para os interesses difusos

Na “segunda onda”, o problema a ser resolvido era a dificuldade para tutelar os interesses difusos diversos daqueles dos pobres (pois, como já dito, no sistema do office economic opportunity também havia possibilidade de tutelar os direitos difusos, mas tão-somente aqueles relacionados aos necessitados).

Nesse momento, buscou-se uma “reflexão sobre noções tradicionais muito básicas do processo civil e sobre o papel dos tribunais” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 49). Isso porque a concepção processual tradicionalista não deixava espaço para a proteção dos interesses difusos, pois o processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre as mesmas a respeito de seus próprios interesses individuais.

Surgiram, então, importantes reformas que mudaram esta noção clássica: i) num primeiro momento, no que toca à legitimidade ativa, reformas legislativas e importantes decisões de tribunais estão cada vez mais permitindo que indivíduos ou grupos atuem em representação dos interesses difusos (é o caso atualmente da ação popular e da legitimação de associações para a propositura de ação civil pública); ii) num segundo momento, a proteção de tais interesses tornou necessária a transformação do papel do juiz e de conceitos básicos como citação, coisa julgada e odireito de ser ouvido, sendo importante que haja um representante adequado

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para agir em benefício da coletividade, ainda que seus membros não sejam citados individualmente (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 50).

Alguns modelos apontados por Cappelletti e Garth surgiram para tentar solucionar tal problema. São eles: i) a ação governamental; ii) o procurador-geral privado; e iii) o advogado particular do interesse público.

No primeiro modelo (fórmula oficial), o Poder Público cria órgãos encarregados de representar e defender os interesses coletivos, tal como ocorre com o Ministério Público. No entanto, tais órgãos são, “por sua própria natureza, incapazes de fazê-lo”, seja por não dispor de treinamento adequado e experiência necessária, seja porque a condição de funcionário público poderá inibi-lo de adotar posição independente de um “advogado do povo” contra poderosas organizações ou contra o próprio Estado (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 51).

Outras soluções são as agências regulamentadoras, que embora sejam mais especializadas que o Ministério Público e organizações desta natureza, também são limitadas, pois “inclinam-se a atender mais facilmente a interesses organizados, com ênfase no resultado das suas decisões” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 52).

Com relação à técnica do procurador-geral privado, esta consiste em permitir a propositura, por indivíduos, de ações em defesa da coletividade. É exatamente esse o caso da ação popular, garantia prevista na Constituição Federal, que legitima que qualquer cidadão ajuíze ação visando anular ato lesivo ao patrimônio público ou a entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, isentando o autor ainda do pagamento de custas processuais e honorários de sucumbência (art. 5º, LXXIII).

Por fim, com relação ao modelo do “advogado particular do interesse público”, tal proposta passa pelo reconhecimento prévio

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de que é necessário permitir ações coletivas no interesse público. A partir daí, surgem diversas reformas, principalmente na França (lei Royer) e na Alemanha (lei sobre contratos-padrão, de 19 de abril de 1977). Em seguida, o foco passa a serorganizar e fortalecer grupos privados para a defesa de interesses difusos, pois enquanto alguns interesses coletivos são bastante organizados, como os trabalhistas, outros não são, como é com os direitos dos consumidores (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 57-59).

Cappelletti e Garth destacam algumas ações concretas que têm esta função: de um lado, aponta asações coletivas, as ações de interesse público e associedades de advogados que se ocupam delas e, de outro, as assessorias públicas (1988, p. 49-67).

A distinção entre as ações coletivas (“class action”) e as ações de interesse público é que a primeira permite que um litigante represente toda uma classe de pessoas em certa demanda, evitando os custos de criação de uma organização permanente, sendo que os honorários advocatícios são condicionais (somente são pagos caso haja êxito na demanda). No entanto, uma e outra exigem especialização, experiência e recursos em áreas específicas, que apenas grupos permanentes, prósperos e bem assessorados possuem (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 61).

O “advogado do interesse público” é outra solução que surgiu nos Estados Unidos em 1970. Nesse caso os advogados do interesse público “[...] acreditam que os pobres não são os únicos excluídos do processo de tomada de decisão em assuntos de importância vital para eles. Todas as pessoas que se preocupam com a degradação ambiental, com a qualidade dos produtos, com a proteção do consumidor, qualquer que seja sua classe sócio-econômica, estão efetivamente excluídas das decisões-chave que afetam seus interesses”(HALPERN apud CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 62).

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Como esses interesses não puderam ser protegidos por organizações, organizaram então sociedades de advogados do interesse público para atender a esse tipo de demanda. Mas tais advogados têm sido bastante criticados por não serem responsabilizáveis pelos interesses que representam, existindo ainda dúvidas quanto à sua viabilidade a longo prazo.

Há ainda uma fórmula entre a proposta oficial e a privada de advogados do interesse público, chamada de assessoria pública. A ideia consiste em “usar recursos públicos, mas confiar na energia, interesse e fiscalização dos grupos particulares” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 64).

A alternativa apontada por Cappelletti e Garth como mais vantajosa para a sociedade é a adoção de um modelo pluralístico, pois “[...] esses interesses exigem uma eficiente ação de grupos particulares, sempre que possível; mas grupos particulares nem sempre estão disponíveis e costumam ser difíceis de organizar. A combinação de recursos, tais como as ações coletivas, as sociedades de advogados do interesse público, a assessoria pública e o advogado público podem auxiliar a superar este problema e conduzir à reivindicação eficiente dos interesses difusos” (1988, p. 66-67).

2.4.3. Novo enfoque de acesso à justiça

Como visto, houve grande progresso nas reformas da assistência jurídica e da busca de mecanismos de reivindicação para representação de interesses públicos. Os programas de assistência judiciária estão tornando disponíveis advogados para muitos que não podem custear esses serviços, tornando as pessoas cada vez mais conscientes dos seus direitos, havendo progresso ainda quanto à reivindicação dos direitos tradicionais e novos. Foram desenvolvidos também mecanismos para representação dos interesses difusos, não apenas dos pobres, mas de toda a sociedade.

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Entretanto, o reconhecimento da importância dessas reformas “não deve impedir-nos de enxergar os seus limites” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 67). É preciso um novo enfoque de acesso à justiça cujo alcance seja bem mais amplo.

Com efeito, enquanto a primeira e a segunda onda preocupam-se com a representação efetiva dos interesses anteriormente não representados ou mal representados, a “terceira onda” inclui a advocacia, judicial e extrajudicial, através de advogados particulares e públicos, e vai além, centrando suas atenções no “conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 67-68). Seu método não consiste em abandonar as técnicas mencionadas nas duas primeiras “ondas” de reforma, mas tratá-las como apenas algumas de uma série de possibilidades para melhorar o acesso.

A representação judicial meramente não se mostrou suficiente, por si só, para tornar essa mudança de regras “vantagens tangíveis” na prática. Não é possível nem desejável resolver estes problemas com advogados somente, pois cada vez mais a questão se revela muito mais complexa.

Para Cappelletti e Garth, um novo enfoque encoraja a exploração de uma ampla variedade de reformas, inclusive alterações no procedimento, mudança na estrutura dos tribunais, criação de novos tribunais, uso de pessoas leigas ou “paraprofissionais”, modificações no direito substantivo destinadas a evitar litígios ou facilitar sua solução e a utilização de mecanismos privados ou informais de solução de litígios (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 71).

A noção de assistência jurídica proposta inscrita na Constituição de 1988 está relacionada a essa nova postura, existindo nítida distinção entre esta, aassistência judiciária e o benefício da gratuidade da justiça.

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A gratuidade da justiça diz respeito somente à “garantia conferida ao cidadão de ter acesso à justiça sem necessidade de pagamento de taxa judiciária, custas e toda e qualquer despesa processual independentemente do resultado do julgamento da causa” (CAPPELLETTI; GARTH, 1988, p. 33), ou ainda o “direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual perante o juiz que promete a prestação jurisdicional” (PONTES DE MIRANDA apud PIMENTA, 2004, p. 101). Envolve, portanto, o direito de não pagar honorários de advogado da parte contrária em caso de sucumbência. Por outro lado, a assistência judiciária constitui a gratuidade da justiça e a concessão de advogado para demandar judicialmente.

A assistência jurídica é mais ampla e implica “o serviço de defender o cidadão em juízo (assistência judiciária) e o serviço de orientação profissional, respostas a consultas, etc.” (SOUZA, 2006, p. 33).

Nota-se que o surgimento dessas noções do campo do direito está diretamente associado à percepção dos obstáculos já identificados anteriormente. Em outras palavras, ao compreender que custas e honorários obstaculizavam o acesso, criou-se a gratuidade da justiça; quando foi constatado o peso que os honorários advocatícios exerciam, criou-se a assistência judiciária gratuita e, por derradeiro, quando se verificou que os óbices persistiam por conta da falta de orientação e educação jurídica, findou-se por desenvolver a ideia de assistência jurídica.

Em resumo, a assistência jurídica “engloba a assistência judiciária, além de outros serviços não relacionados ao processo, tais como orientar, esclarecimento de dúvidas e prestando orientação e auxílio à comunidade [...]” (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 103).

O acesso à justiça para as pessoas carentes pressupõe então não só a gratuidade da justiça, mas também a existência de núcleos de assistência jurídica, de sorte que a disponibilidade ao cidadão de

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meros órgãos de assistência judiciária não é suficiente ao exercício, de fato, do direito de acesso pelos pobres, pois permaneceriam graves obstáculos à sua concretização, como a desinformação, impossibilidade de perceber a lesão de um direito, inexistência de tutela às demandas coletivas, etc.

De acordo com previsão constitucional, a DPU é órgão de assistência jurídica e não se limita ao fornecimento de advogados aos pobres para o acompanhamento de suas lides, mais que isso, importa a “orientação jurídica e a defesa dos necessitados”. Ou seja, a Defensoria Pública proporciona “[...] além da assistência jurídica integral, o efetivo exercício do contraditório e da ampla defesa, mesmo àqueles economicamente suficientes, quando a causa verse sobre direitos indisponíveis, como é o caso dos réus na justiça criminal, ou em casos de relevante interesse público, na curadoria ao vínculo” (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 103).

Diante disto, resta indagar: qual dos modelos mencionados o Brasil adotou? Em que cenário se enquadram a Defensoria Pública da União e o fenômeno da interiorização da Justiça Federal?

3. A Defensoria Pública da União

A DPU é um órgão estatal composto por defensores públicos que, a rigor, são advogados remunerados pelo Estado, aos quais cabe a prestação da assistência jurídica aos necessitados no âmbito federal. É, por assim dizer, uma das soluções encontradas pela sociedade brasileira para superar os obstáculos enfrentados pelas pessoas carentes no que tange ao acesso à justiça.

Entretanto, é imprescindível seja respondida, de logo, a seguinte questão: qual foi o modelo adotado pela sociedade brasileira: o esquema do judicare ou dooffice economic opportunity?

A Constituição Federal de 1988 trata a Defensoria Pública como “instituição essencial à função jurisdicional” e atribui a este órgão a função de prestar orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, determinando ainda que a organização

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da carreira de Defensor Público se dê via lei complementar, estabelecendo, para tanto, algumas premissas básicas a serem seguidas, quais sejam, o ingresso na carreira mediante concurso público de provas e títulos, assegurando-se aos integrantes a inamovibilidade e vedando o exercício da advocacia fora das atribuições constitucionais.

A lei que veio regulamentar a mencionada carreira de Defensor Público Federal[xiii] foi a Lei Complementar n. 80, de 12 de janeiro de 1994, a qual organiza a DPU e prescreve normas gerais para as defensorias públicas dos Estados. Segundo esta lei, com alteração que sofreu pela Lei Complementar n. 132, de 2009, a Defensoria Pública é “[...] instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicialmente, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados [...]”.

Assim, percebe-se que a DPU reflexo da influência brasileira do modelo americano do office economic opportunity, posto que compreende uma equipe de advogados remunerados pelos cofres públicos com a incumbência de defender os interesses dos pobres, judicial e extrajudicialmente, inclusive defendendo os seus interesses enquanto classe, porquanto tenha atribuições para a defesa dos interesses difusos.

A questão dos “escritórios de vizinhança” idealizada pelo modelo americano foi bem concebida pelo direito brasileiro, pois, segundo a LC 80/94, a atuação da DPU será por meio de núcleos coordenados por um Defensor Público-Chefe e, mais recentemente, com a alteração sofrida pela Lei Complementar n. 132, de 2009, foi acrescido o art. 15-A, segundo o qual “a organização da Defensoria Pública da União deve primar pela descentralização, e sua atuação deve incluir atendimento interdisciplinar, bem como a tutela dos interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos”.

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Aliás, a Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou a Resolução AG/RES 2821 (XLIV-O/14) buscando garantir o acesso à ajustiça, visando aprofundar o compromisso dos Estados-membros em prol do fortalecimento e da autonomia das Defensorias Públicas oficiais.

No entanto, o modelo brasileiro não é um office economic opportunity “puro”, pois, tendo em conta as deficiências deste sistema já analisadas, diante da inexistência de Defensoria Pública no local, a praxe forense, sobretudo em matéria penal, continua sendo a de nomeação de defensores dativos e ad hoc, de forma que seria melhor classificado como um office economic opportunity “misto”.[xiv]

A Constituição foi além e conferiu à Defensoria Pública também a legitimidade para representar judicialmente interesses difusos, autorização normativa esta que já havia sido conferida desde o advento da Lei da Ação Civil Pública (art. 5º, inciso II, da Lei 7.347/85). Nesse aspecto, a defensoria é um exemplo de ação governamental, tal como o Ministério Público e as Agências Reguladoras, uma vez que não se trata de uma iniciativa particular propriamente dita, pois nestas, as pessoas, por meio de advogados particulares, ajuízam ações visando defender determinado direito difuso, enquanto que a tutela dos interesses difusos pela Defensoria Pública independe de representação por parte do cidadão, bastando que o defensor tenha conhecimento da irregularidade.

Mais que representar juridicamente interesses, a Defensoria Pública encontra-se na ideia daquilo que Cappelletti e Garth chamam de “novo enfoque de acesso à justiça”, pois tal órgão é incumbido de prestarassistência jurídica (aconselhamento jurídico, assessoria jurídica popular).

Mas não são todas as pessoas que têm o direito de serem assistidos pela Defensoria Pública. Consoante dispõe a Constituição da República, “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de

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recursos”.[xv]Trata-se de conceito jurídico indeterminado,[xvi] técnica legislativa comum do constituinte, cujo conteúdo há de ser preenchido ante a realidade fática.

O conceito de necessitado não pode ser vislumbrado através de um parâmetro objetivo das condições financeiras daquele que postula em juízo, vale dizer, é preciso que sejam examinadas as diferenças financeiras entre as partes litigantes, além do valor da causa, de tal sorte que se maior for a sua mensuração econômica, a parte economicamente fraca não terá como arcar com os gastos da lide, óbice este que inexistiria caso o valor fosse reduzido.

Nas palavras de Wilson Alves de Souza,“necessitado não é conceito que se restrinja aos conceitos de miserável ou pobre, mas sim deve ser entendido como referente à pessoa que, nas circunstâncias do caso concreto, não tem condições de arcar com as despesas do processo, de modo a que o custo do processo a colocaria ou a sua família em dificuldades financeiras, ou então teria que alienar bens para postular a tutela dos seus direitos perante o Estado-Juiz” (2006, p. 33).

No entanto, esta imprecisão fez com que o CSDPU (Conselho Superior da Defensoria Pública da União) criasse a Resolução n. 13, de 25 de outubro de 2006, de acordo com a qual “presume-se necessitado todo aquele que integre família cuja renda mensal não ultrapasse o valor de isenção de pagamento do Imposto de Renda”[xvii], instituindo assim um parâmetro objetivo. Portanto, no procedimento de concessão da assistência jurídica gratuita pela DPU prevalece o critério objetivo instituído pela citada Resolução.

Censurável por igualar formalmente situações distintas (pois, como dito, o conceito de necessitado jurídico depende da natureza na demanda e da condição econômica da parte contrária), tal critério ofende também ao princípio da igualdade material, pois toma como base a renda do núcleo familiar, de sorte que uma pessoa que tenha salário ligeiramente inferior ao valor de isenção do pagamento de Imposto de Renda poderia ser “assistida” pela defensoria, mas

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alguém que seja integrante de um núcleo familiar composto por cinco ou mais pessoas cuja renda bruta totaliza um valor pouco acima do referido valor de isenção não poderia ser acompanhada pela DPU, em que pese a diferença das condições vivenciadas entre as partes e, principalmente, da natureza da lide.

A Constituição Federal e a própria LC 80/94 preveem alguns princípios institucionais, prerrogativas e garantias dos membros da Defensoria Pública. De acordo com o art. 3º da LC 80/94, são princípios da defensoria a unidade, a indivisibilidade e aindependência funcional.

Por unidade (ou unicidade), entende-se que “a Defensoria Pública corresponde a um todo orgânico, sob uma mesma direção, mesmos fundamentos e mesmas finalidades” (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 112). Permite-se, assim, aos membros da Defensoria Pública substituírem-se uns aos outros, sendo cada um deles parte de um todo.

O princípio da indivisibilidade, por sua vez, significa que “a Defensoria Pública atua como um todo orgânico”, não estando sujeita a rupturas e fracionamentos, sendo este princípio uma consequência lógica daquele anteriormente tratado (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 113).

Por fim, o princípio da independência funcionalrefere-se à autonomia da qual a instituição é dotada perante os demais órgãos estatais, estando “imune de qualquer interferência política que afete a sua atuação” (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 114). Tal princípio é de suma importância, mormente porque em diversas situações o defensor patrocina causa de alguém que litiga contra o próprio Estado. Embora o Defensor Público Geral ocupe o maior grau hierárquico, esta subordinação é apenas sob o ponto de vista administrativo, não podendo o mesmo impor a qualquer dos membros que lhe seja subordinado que atue ou deixe de atuar em determinada causa.

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Os Defensores Públicos são dotados ainda de certas garantias funcionais.

Consoante dispõe a Constituição da República em seu art. 134, ao Defensor Público é garantida inamovibilidade, garantia esta que é disciplinada novamente nos arts. 34, 43 e 127 da LC 80/94, acrescentando ainda a autonomia funcional no desempenho das suas atribuições, a irredutibilidade dos vencimentos e a estabilidade.

Por inamovibilidade, entende-se que o “Defensor Público não pode ser removido do seu órgão de atuação contra a sua vontade”, sendo importante frisar que tal garantia prevalece inclusive dentro da mesma comarca, não podendo o defensor ser removido do órgão de atuação do qual é titular para outro da mesma comarca ou fórum (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 114).

A garantia da independência funcional equivale aoprincípio da autonomia funcional já tratado.

Finalmente, também a irredutibilidade de vencimentos visa garantir maior proteção à atuação do Defensor Público, pois, após três anos efetivo de exercício no cargo, ou seja, após o período de estágio probatório, este somente poderá ser demitido mediante processo administrativo.[xviii]

Ademais, além dessas garantias, há ainda as prerrogativas atribuídas aos defensores para que possam melhor exercer sua função.

Segundo Hely Lopes Meirelles, prerrogativas “são privilégios funcionais, normalmente conferidos aos agentes políticos ou mesmo aos altos funcionários, para a correta execução de suas atribuições legais” (1992, p. 74).

As prerrogativas da Defensoria Pública encontram-se insculpidas nos art. 44 e 128 da LC 80/94, sendo que enquanto o primeiro dispositivo versa sobre as prerrogativas da DPU, o

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segundo trata das prerrogativas das Defensorias Públicas Estaduais.

São prerrogativas funcionais da DPU, dentre outras, as seguintes: a) intimação pessoal e prazo em dobro; b) não ser preso, senão por ordem judicial escrita, salvo em flagrante, quando o Defensor Público Geral deverá ser imediatamente comunicado; c) ser recolhido em prisão especial ou em sala de Estado Maior; d) usar vestes talares e as insígnias privativas da Defensoria Pública; e) comunicar-se, pessoalmente e reservadamente, com seu assistido; f) deixar de patrocinar ação, quando ela for manifestamente incabível ou inconveniente aos interesses da parte; g) ter o mesmo tratamento reservado aos magistrados e demais titulares dos cargos das funções essenciais à justiça.

Com relação à intimação pessoal, a LC 132/09 deu nova redação ao art. 44, inciso I, da LC 80/94, e, atualmente, é prerrogativa dos membros da Defensoria Pública da União “receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos”. Esta prerrogativa é antiga e foi inserida no ordenamento jurídico positivado desde o advento da Lei 7.871/89, que inseriu o § 5° ao art. 5º na Lei 1.060/50.[xix]

A intimação pessoal deverá prevalecer inclusive em processos administrativos, mas não tem aplicabilidade em sede de Juizados Especiais por conta do princípio da celeridade[xx] que vigora neste foro especializado. Por outro lado, no que tange à desnecessidade de mandato outorgado ao Defensor Público, esta prerrogativa tem por razão o fato de que a natureza jurídica da representação ao assistido em juízo decorre de lei e a investidura do agente no cargo, e não da outorga do mandato.

A atuação do defensor envolve algumas atribuições das quais os mesmos são dotados, atribuições estas que são classificadas em típicas e atípicas. As primeiras dizem respeito à defesa dos

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hipossuficientes, enquanto que as atípicas são aquelas que não possuem relação com a condição do assistido, como é o caso da curadoria especial, curadoria ao vínculo, proteção do idoso, fiscalização das delegacias e defesa em ação penal.[xxi]

Os deveres do Defensor Público encontram-se insculpidos nos arts. 18, 45 e 129 da LC 80/94, dentre os quais se destaca o dever de residir na localidade onde exerce suas funções, e as suas proibições estão previstas nos arts. 46 e 130 da LC 80/94 e art. 134, parágrafo único, da CF/88, entre as quais consta a proibição de exercer advocacia privada.[xxii]

Há ainda as causas de impedimento previstas nos arts. 47 e 131, bem como a aplicação analógica das causas de impedimento e suspeição previstas nos Códigos de Processo Civil e de Processo Penal, sendo relevante frisar que o Defensor Público responde funcionalmente pelos seus atos, estando sujeito às sanções de advertência, suspensão por até 90 (noventa) dias, remoção compulsória,[xxiii] demissão e cassação de aposentadoria, a depender da gravidade da falta cometida.

Toda a estruturação da carreira de defensor público federal foi traçada na LC 80/94, sendo que os pontos omissos ou suscetíveis de regulamentação foram objeto de resoluções ou provimentos.

3.1. Aspectos gerais e organização dos núcleos da DPU na Bahia

A Defensoria Pública da União é formada por órgãos de administração superior, órgãos de atuação e órgãos de execução. São órgãos de administração superior da DPU a Defensoria Pública Geral da União, a Sub-Defensoria Pública Geral da União, o Conselho Superior da Defensoria Pública da União e a Corregedoria-Geral da Defensoria Pública da União. Os órgãos de atuação da DPU são as Defensorias Públicas da União nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios e os Núcleos da Defensoria Pública da União. Por fim, são órgãos de execução da

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DPU os Defensores Públicos Federais nos Estados, no DF e nos Territórios.

O Defensor Público-Geral Federal é o chefe da DPU e é nomeado pelo Presidente da República, dentre membros estáveis da carreira e maiores de 35 (trinta e cinco) anos, escolhidos em lista tríplice em voto direto, secreto, plurinominal e obrigatório de seus membros, após a aprovação do seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para o mandato de 02 (dois) anos, permitida a reeleição, desde que precedida de nova aprovação perante o Senado.

O Conselho Superior da Defensoria Pública da União (CSDPU), presidido pelo Defensor Público-Geral Federal, será composto por este, pelo Subdefensor Público-Geral Federal, pelo Corregedor-Geral Federal e por membros natos, em sua maioria representantes estáveis da carreira, dois por categoria, eleitos por voto direito, plurinominal, obrigatório e secreto de todos os integrantes da carreira. Suas atribuições são descritas no art. 10, da LC 80/94.

A Corregedoria Geral da DPU é órgão de fiscalização da atividade funcional e da conduta dos membros e servidores da Defensoria Pública da União.

Conforme dispõe a Lei Complementar n. 80, a carreira é composta por três categorias de cargos efetivos: Defensor Público Federal de 2ª Categoria (inicial); Defensor Público Federal de 1ª Categoria (intermediária); e Defensor Público Federal de Categoria Especial (final). Os Defensores Públicos Federais de 2ª Categoria atuam junto aos Juízos Federais, aos Juízos do Trabalho, às Juntas e aos Juízos Eleitorais, aos Juízes Militares, às Auditorias Militares, ao Tribunal Marítimo e às instâncias administrativas; os Defensores Públicos Federais de 1ª Categoria atuam nos Tribunais Regionais Federais, nas Turmas dos Juizados Especiais Federais, nos Tribunais Regionais do Trabalho e nos Tribunais Regionais Eleitorais; e, por fim, os Defensores Públicos Federais de Categoria

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Especial atuam perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Tribunal Superior do Trabalho (TST), no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no Superior Tribunal Militar (STM) e na Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais. O Defensor Público-Geral Federal atuará perante o Supremo Tribunal Federal (STF).

No ano de 2009, atuavam na Bahia dois Defensores Públicos Federais de 1ª Categoria, cada qual titular de um dos Ofícios Regionais, e outros doze Defensores Públicos Federais de 2ª Categoria, encarregados por três Ofícios Cíveis, três Ofícios Criminais, cinco Ofícios Cíveis Especiais (atuação perante os JEF’s) e um Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, sendo que havia somente um núcleo em todo o Estado da Bahia, situado na capital.[xxiv]

A DPU ampliou significativamente o seu quadro de defensores desde então.

Atualmente, existem quatro Ofícios Regionais, quatro Ofícios Criminais, sete Ofícios Cíveis Especiais, cinco Ofícios Cíveis Ordinários e um Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, perfazendo um total de vinte e um defensores públicos.[xxv]

A par do núcleo da Capital, existem também outros três situados no interior do Estado. O núcleo de Feira de Santana-BA conta com três defensores públicos federais, enquanto que as unidades de Juazeiro-BA e de Vitória da Conquista-BA possuem outros dois defensores cada.

Além dos defensores públicos federais, compõem os núcleos da DPU no Estado da Bahia servidores, assessores, estagiários estudantes de direito e funcionários terceirizados.

As Assessorias Jurídicas prestam suporte aos defensores e subdividem-se em razão da matéria em Assessoria Jurídica de Direito Civil, Assessoria Jurídica de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, Assessoria Jurídica de Direito Penal, Assessoria Jurídica

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de Direito Previdenciário e, por fim, Assessoria Jurídica Regional.[xxvi]

Estes profissionais exercem função importante ao funcionamento da defensoria, porque o número de defensores é menor do que o necessário ao atendimento da demanda. Este fenômeno é um dos problemas decorrentes da adoção do modelo do office economic opportunity (a necessidade de oferecimento de bons salários para atrair profissionais diligentes acaba onerando os cofres públicos e dificultando a contratação de advogados, causando um déficit do serviço prestado pelos núcleos).

Os servidores exercem funções administrativas, auxiliados pelos funcionários terceirizados, mas, a rigor, é incoerente falar-se em servidores da DPU, posto que desde a sua criação e implementação, foram realizados somente quatro concursos para ingresso na carreira de Defensor Público da União (agora Defensor Público Federal) e houve apenas um certame para o provimento de cargos da Defensoria Pública da União.[xxvii] Os servidores que atualmente compõem o órgão são, em sua maioria, oriundos de outros órgãos da Administração Pública Federal.

Por fim estão os estagiários estudantes de direito. De acordo com a LC 80/94, as Defensorias Públicas adotarão providências no sentido de “selecionar, como estagiários, os acadêmicos de Direito que, comprovadamente, estejam matriculados nos quatro últimos semestres de cursos mantidos por estabelecimentos de ensino oficialmente reconhecidos”, determinando ainda que o tempo de estágio será considerado serviço público relevante e prática forense.

São os estagiários de direito que, por conta do escasso número de defensores, acabam desempenhando a mais importante tarefa da DPU, que é o atendimento ao cidadão, sendo a atuação diária destes acadêmicos vital ao funcionamento da defensoria, seja no âmbito estadual, seja no federal.

3.2. Panorama da Defensoria Pública

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No dia 3 de novembro de 2009, o Ministério da Justiça divulgou o III Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, lançado na abertura do VIII Congresso Nacional dos Defensores Públicos, em Porto Alegre/RS. Este estudo, produzido pelo Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas Sócio-Econômicos (INBRAPE) sob a coordenação da Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, além da parceria estabelecida com o Conselho Nacional dos Defensores Públicos Gerais (CONDEGE), da Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP) e da Associação Nacional dos Defensores Públicos da União (ANDPU), apresenta informações sobre a Defensoria no ano de 2008 e compara este desempenho com os anos de 2004 e 2006.

Este trabalho traça um panorama institucional da Defensoria Pública e constrói também um perfil socioeconômico dos defensores, analisando, dentre outros aspectos, dados sobre a estrutura, orçamento, atividades da defensoria, número de membros, áreas de atuação, remuneração, etc.

O referido estudo demonstra que o número de atendimentos dos Defensores Públicos Federais aos assistidos aumentou, pois em 2006, a DPU contava com 268 membros e realizou 123.548 atendimentos durante o ano, enquanto que em 2008, os Defensores Federais totalizavam 336 membros, com 513.598 atendimentos.

Também a participação dos membros da DPU em audiências de procedimentos judiciais ou administrativos aumentou: em 2006, os Defensores Federais atuaram em 643 audiências cíveis e 2.470 criminais. Já em 2007, esse número elevou-se para 1.604 audiências cíveis e 4.923 criminais. Em 2008, a participação da DPU totaliza 1.633 audiências na área cível e 4.225 na área criminal.

O diagnóstico revela ainda a necessidade de Defensores Federais por unidade da federação. De acordo com o mesmo, em 2008, 213 cargos de defensor estavam vagos e em 2009 esse número reduziu para 145 vagas, esclarecendo ainda que o

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percentual de preenchimento dos cargos em 2009 é de 69,85%, e que se estima que a DPU necessite de 1.280 para o seu funcionamento satisfatório.

Questão que também foi abordada pelo relatório é a falta da autonomia administrativa, financeira e orçamentária da DPU, que era subordinada ao Poder Executivo, através do Ministério da Justiça, que ensejou, inclusive, a edição de emenda constitucional visando solucioná-la.

Esta pesquisa demonstra ainda que, no país, a produtividade dos defensores em exercício passou de 1,68 mil atendimentos por profissional em 2005, para 2,3 mil em 2008. No último ano, houve um aumento no número de atendimentos em 45,17%. No ano de 2003, 4,5 milhões de pessoas foram atendidas, enquanto que em 2008; 9,6 milhões de cidadãos tiveram acesso aos serviços da defensoria.[xxviii]

4. Interiorização da Justiça Federal e da DPU

Durante muitos anos, um grande obstáculo ao acesso à justiça vivenciado pelas pessoas que moram no campo em todo Brasil era a falta de órgãos do judiciário federal próximos às suas residências. Diante desta situação, normalmente a competência para julgamento das causas que envolviam interesse da União ou de uma das suas entidades autárquicas ou empresas públicas era atribuída ao órgão do judiciário estadual existente na localidade, o qual então acumulava a jurisdição estadual e federal.

Ocorre que o trabalho do próprio juiz estadual já é bastante volumoso, acarretando a notória delonga na prestação jurisdicional, situação esta que evidencia, mais uma vez, obstáculos ao acesso à justiça, pois, de um lado, não era disponibilizado órgão incumbido de poder jurisdicional para prestar tal serviço e, de outra mão, o tempo demandado para o julgamento de uma lide federal perante o juízo estadual evidenciava as possibilidades das partes, fazendo com que indivíduos com poucos recursos desistam ou não se encorajem a ajuizar uma ação judicial.

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A solução para tal impasse se deu com o advento da Lei 10.772/03, que criou 183 (cento e oitenta e três) varas federais destinadas à interiorização da Justiça Federal de primeiro grau e à implantação dos Juizados Especiais Federais no país, vale dizer, cuida-se de uma inversão da lógica até então vigente, passando a priorizar pela criação de juízos federais nas comarcas situadas no interior. Foram criadas, então, as Subseções da Justiça Federal no interior do Estado da Bahia.

Para José Américo Silva Montagnoli (2009), com a interiorização da Justiça Federal, está “[...] lançada a chance para uma processualística inclusiva, em que a sumariedade pela simplificação dos ritos não vulnera mas, ao contrário, prestigia os pilares constitucionais do devido processo, quais sejam, o contraditório, a ampla defesa e a isonomia, numa dinâmica em que, conforme lembra Jürgen Habermas, os passos de qualquer argumentação – inclusive a judiciária – não pode ser idiossincrático, mas têm de permanecer exeqüíveis intersubjetivamente, não reduzindo os demais atores sociais a meros receptores da resolução emanada de um decisor estatal”.

Atualmente, existem quinze subseções da Justiça Federal no interior do Estado da Bahia, situados nas seguintes cidades: Alagoinhas, Barreiras, Bom Jesus da Lapa, Campo Formoso, Eunápolis, Feira de Santana, Guanambi, Ilhéus, Irecê, Itabuna, Jequié, Juazeiro, Paula Afonso, Teixeira de Freitas e Vitória da Conquista.[xxix]

Considerando que somente nas causas previdenciárias, como regra, haverá competência concorrente entre a Seção Judiciária da capital e a Subseção Judiciária no interior, conclui-se intuitivamente que, na maior parte das situações, a ação, de fato, correrá na Subseção Judiciária interiorana, e assim deveria ser, sob pena de violar o próprio propósito do fenômeno da interiorização da Justiça Federal, que se deu com o objetivo de minimizar os óbices ao acesso à justiça que havia por conta da inexistência de órgãos do judiciário federal no interior.

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Por outro lado, nas causas em que a União seja autora, como é o caso das ações de execução fiscal ou de ressarcimento ao erário, caso o indivíduo resida em cidade abrangida por uma Subseção da Justiça Federal, a competência deste juízo para processar e julgar o feito é absoluta por força de disposição constitucional expressa.

Assim, foi dado um primeiro passo rumo à superação das barreiras existentes que obstam o acesso à justiça por parte das pessoas que moram no interior do Estado da Bahia. O problema é que a DPU permanece com uma quantidade de núcleos insuficiente no interior para acompanhar o processo das pessoas carentes que são autoras ou rés nos processos federais em curso nas Subseções. Essa situação acarreta a decretação de revelias, perda de prazos e todos os tipos de danos processuais que o não acompanhamento por um técnico pode levar, sobretudo a falta de orientação e educação jurídica popular. Isso porque, conforme já dito, existem apenas três núcleos da DPU no interior do Estado baiano, enquanto que o Poder Judiciário federal está presente em quinze cidades.

Percebe-se que, não obstante a criação das Subseções Judiciárias Federais no interior para tentar sanar o obstáculo ao acesso à justiça que existia, a falta de simetria por parte da DPU faz com que outros obstáculos persistam. Embora haja órgãos incumbidos de poder jurisdicional próximos às localidades em que os moradores carentes do campo vivem, os mesmos permanecem sem recursos para pagar honorários a advogados particulares.

O caráter misto do sistema office economic opportunity, considerada possível solução ao impasse (pois, nos casos em que não houvesse núcleos dos escritórios jurídicos populares, a defesa da pessoa carente seria prestada por advogados particulares) aplica-se, em regra, na prática forense baiana somente nas causas que envolvem direitos indisponíveis, como causas criminais. Não há uma prática judiciária tendente a restringir os casos de decretação

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de revelias ou de perda de prazos, pois no processo civil, busca-se uma verdade meramente formal.

Ademais, mesmo com a nomeação de dativos ead hoc, permaneceriam os problemas já noticiados quando se tratava do sistema judicare, pois tais profissionais tutelariam o direito meramente individual, não prestariam assistência judiciária (orientação e educação jurídica), não enfrentariam a questão da disparidade dos litigantes organizacionais e tratariam os pobres como indivíduos, negligenciando sua situação como classe.

Aqueles que residem no interior e são partes em processos que tramitam no interior, ao recorrerem à DPU em Salvador, enfrentando longas viagens (que, ressalte-se, envolvem custos significativos) para a capital baiana, onde são informados da impossibilidade de os membros desta defensoria em atuar nas causas que correm no interior, até mesmo por conta da garantia da inamovibilidade. Os membros da Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE), por sua vez, embora considerado o princípio da unicidade e da possibilidade, em tese, de atuação no foro federal pelos membros deste órgão, rejeitam atuar nas causas federais fundamentados na autonomia funcional da qual são dotados, mormente pela impossibilidade de cumular as atribuições da DPE e DPU sem prejuízo da qualidade do serviço do qual tem a obrigação funcional de prestar, ou seja, uma impossibilidade de ordem material.

Em face desse breve quadro, percebe-se que não basta a criação de órgãos do judiciário federal no interior da Bahia para que reste minimizado o problema do acesso à justiça por parte da população que lá reside, sendo imprescindível a criação de uma quantidade proporcional de núcleos da DPU para a prestação do serviço de assistência jurídica àqueles que não têm condições de arcar com os gastos de um advogado. A insuficiência de núcleos da DPU no interior do Estado da Bahia acarreta desrespeito a garantias processuais mínimas conferidas pela própria Constituição Federal, tais como o direito ao contraditório e à ampla defesa e o direito à assistência jurídica integral e gratuita, permanecendo obstáculos

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individuais ao acesso à justiça por parte das pessoas carentes que residem em municípios jurisdicionados por uma Subseção Federal, pois não é conferida oportunidade a essas pessoas para exercer sequer o direito à assistência judiciária, quiçá da assistência jurídica.

A questão da falta de simetria entre a interiorização da Justiça Federal e os núcleos da DPU é problema que já foi inclusive identificado pelo Poder Executivo. A interiorização necessária e sugerida da DPU iniciou-se no dia 7 de outubro de 2009, quando entrou em vigência a LC 132/09, que alterou a LC 80/94 e a lei 1.060/50, diploma este que, através do seu art. 15-A, determinou que a Defensoria Pública da União deverá “primar pela descentralização, e sua atuação deve incluir atendimento interdisciplinar, bem como a tutela dos interesses individuais, difusos, coletivos e individuais homogêneos”.

Por fim, dispõe o art. 98 da Emenda Constitucional n. 80 que “o número de defensores públicos na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda pelo serviço da Defensoria Pública e à respectiva população, estabelecendo também que “no prazo de 8 (oito) anos, a União, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais”.

Considerações finais:

Em face do exposto, traçando de forma esquemática e em síntese, pode-se concluir o seguinte:

a) O movimento em prol da efetivação do acesso à justiça é fenômeno que tem início remoto, o qual veio a se aperfeiçoar durante o welfare state;

b) Ao longo dessa marcha, foram identificados diversos obstáculos, dentre os quais se destacam os gastos enfrentados pelas partes, as distintas possibilidades das partes e a impossibilidade de tutela individual dos direitos difusos;

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c) Dentre as soluções encontradas para solucionar o problema das custas, surgiu a assistência judiciária, ou seja, a disponibilização de um advogado pago pelos cofres públicos para tutelar os direitos dos pobres, e a representação judicial para os direitos difusos;

d) A representação judicial de interesses não é, por si só, suficiente para concretizar o acesso à justiça, sendo necessário um novo enfoque, que perpassa pela mudança de procedimentos, alteração e criação de tribunais, modificação nos direitos subjetivos, etc.;

e) O Brasil adotou um modelo de office economic opportunity misto, pois existem núcleos de assistência em que trabalham advogados públicos encarregados de fornecer conselhos jurídicos aos necessitados – a Defensoria Pública – e, quando inexistem núcleos desta natureza, são nomeados advogados particulares a serem pagos pelos cofres públicos (defensores dativos ou ad hoc);

f) A Defensoria Pública da União é, conforme a Constituição, o órgão público encarregado de prestar assistência jurídica no âmbito federal àqueles que comprovem carência. No entanto, a DPU, assim como qualquer exemplo de aplicação do modelo do office economic opportunity, encontra dificuldades ao desempenhar as suas funções, pois depende excessivamente de apoio governamental;

g) A interiorização da Justiça Federal encontra-se na esteira de uma tendência de ampliação do acesso à justiça (novo enfoque), na medida em que o acesso ao órgão do judiciário é, em si, um óbice à justiça, e tornar tais órgãos mais próximos à população diminui as barreiras que existem. Nesse sentido, foram criadas Subseções no interior que prestam tutela jurisdicional às cidades lá situadas;

h) Não obstante, para que a interiorização da Justiça Federal seja completa, faz-se necessária uma atitude simétrica da Defensoria da União, ou seja, é preciso que sejam criados uma

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quantidade proporcional de núcleos da DPU que atuem perante as Subseções criadas no interior;

i) A não criação de tais núcleos tem como principal fator a vinculação excessiva da DPU ao Poder Executivo, dependendo deste para obter materiais, em que pese ter sido reconhecida a sua autonomia no plano normativo.

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NOTAS:

[i] “No estado natural, cada um é juiz em causa própria; cada um, igual ao outro, é de certo modo rei; pode achar-se tentado a observar com pouca exatidão a eqüidade, a ser parcial em seu proveito e no dos amigos, por interesse, amor-próprio e fraqueza; pode achar-se tentado a punir por paixão e vingança: quantas ameaças graves à conservação da liberdade, da igualdade natural,

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ao gozo tranqüilo da propriedade! Em suma, nesse estado natural, à primeira vista idílico, faltam: leis estabelecidas, conhecidas, recebidas e aprovadas por meio de comum consentimento; juízes reconhecidos, imparciais, criados para terminar todas as contendas de acordo com as leis estabelecidas; enfim, um poder coativo, capaz de assegurar a execução dos juízos proferidos. Ora, tudo isso se encontra no estado social, sendo precisamente o que caracteriza tal estado. E foi para se beneficiarem de tais aperfeiçoamentos que os homens deixaram o primitivo estado” (CHEVALLIER, Jean-Jaques, op. cit., p. 107-108).

[ii] Paulo Cezar Pinheiro Carneiro (2003) utiliza esta expressão referindo-se aos juízes que proferiam decisões favoráveis ao monarca, manifestamente em contrariedade ao bom senso e ao interesse da população, legitimando o Estado Absolutista.

[iii] “Os juízes de uma nação não são, como dissemos, mais do que a boca que pronuncia as sentenças da lei, seres inanimados que não podem moderar sua força nem seu vigor” (MONTESQUIEU, 1995, apud CARNEIRO, 2003, p. 17).

[iv] Para Luis Roberto Barroso, efetividade“representa a materialização, no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social” (BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1996. p. 83).

[v] Vide o art. 10 e 98 a 101, que instituíam o Poder Moderador.

[vi] Questão que merece olhar especial, ainda que de forma incidental, diz respeito à força normativa da Constituição, pois, embora tenha ganhado patamar de norma constitucional desde 1934, o direito ao acesso à justiça não foi então respeitado e, ainda hoje, não é garantido a todos cidadãos. Alguns diriam que não houve reflexos desta norma no “mundo do ser” porque esta não refletia a Constituição real. Contudo, tal distinção feita por Ferdinand Lassale vem sendo mitigada. Sobre esse assunto, Konrad Hesse assinala que “a Constituição jurídica não significa simplesmente pedaço de papel, tal como caracterizada por Lassale. Ela não se afigura ‘impotente para dominar, efetivamente, a distribuição de poder’, tal como ensinado por Georg Jellinek e como,

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hodiernamente, divulgado por um naturalismo e sociologismo que se pretende cético. A Constituição não está desvinculada da realidade histórica concreta do seu tempo. Todavia, ela não está condicionada, simplesmente, por essa realidade. Em caso de eventual conflito, a Constituição não deve ser considerada, necessariamente, a parte mais fraca. Ao contrário, existem pressupostos realizáveis (realizierbare Voraussetzungen) que, mesmo em caso de confronto, permitem assegurar a força normativa da Constituição. Somente quando esses pressupostos não puderem ser satisfeitos, dar-se-á a conversão dos problemas constitucionais, enquanto questões jurídicas (Rechtsfragen), em questões de poder (Machtfragen). Nesse caso, a Constituição jurídica sucumbirá em face da Constituição real” (HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: SAFE, 1991, p. 25).

[vii] Em verdade, esta constatação feita outrora assume hoje uma similitude distinta, pois ao reconhecer esse fato em sua pesquisa, Mauro Cappelletti e Bryant Garth estudavam sociedades que tinham na função do advogado um sinônimo de elite intelectual e econômica cuja mola propulsora era a existência de poucas escolas de direito e pela falta de oportunidades para que as classes populares pudessem formar seus filhos nestas instituições. Hoje, com a proliferação de escolas de direito, particularmente no Brasil, há certa tendência de que os serviços jurídicos sejam mais baratos e, portanto, acessíveis, por se tratar de mera questão lógica de economia de mercados. Há, no mesmo sentido, nítida tendência de perda de qualificação destes profissionais que estão sendo lançados no mercado, não se podendo cogitar, assim, em superação de obstáculo com a disponibilização de péssimos profissionais para os pobres. Caso ocorresse esta situação hipotética, haveria clara distinção entre aqueles que podem pagar bons advogados (profissionais e responsáveis) e aqueles que somente podem pagar advogados que não atuam com profissionalismo e exigem honorários mais baixos. Percebe-se perfeitamente que, ainda assim, não haveria a paridade de armas e o fato gerador permaneceria sendo o mesmo, ou seja, as despesas que não podem ser arcadas por uma parte e são possíveis de ser assumidas pela outra.

[viii] Cf. Mauro Cappelletti & Bryant Garth, “os dados reunidos no Projeto de Florença mostram claramente que a relação entre os custos a serem enfrentados nas ações cresce na medida em que se

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reduz o valor da causa. Na Alemanha, por exemplo, as despesas para intentar uma causa cujo valor corresponda a US$ 100, no sistema judiciário regular, estão estimadas em cerca de US$ 150, mesmo que seja utilizada apenas a primeira instância, enquanto os custos de uma ação de US$ 5.000, envolvendo duas instâncias, seria aproximadamente US$ 4.200 – ainda muito elevados, mas numa proporção bastante inferior, em relação ao valor da causa” (CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant, op. cit., p. 19).

[ix] Para Wilson Alves de Souza (2006, p. 68), “a expressão direito coletivo é gênero, abrangendo as espécies direitos difusos e direitos coletivos em sentido estrito. Os direitos individuais homogêneos, como evidentemente resulta do nome, são individuais, mas por abranger número considerável de pessoas, a exemplo de determinadas situações de relações de consumo, são tratados juridicamente como se fossem coletivos. Os direitos difusos são os mais amplos, se caracterizam pela transindividualidade, pela indivisibilidade, pela indeterminação dos titulares que estejam ligados por circunstâncias de fato”.

[x] É certo que a fundamentação da assistência judiciária em serviços de advogados particulares não concretiza a igualdade de armas entre ricos e pobres, pois os advogados mais experientes e mais bem preparados, em uma economia de mercados, não dedicariam seu tempo ao auxílio de pobres (CAPPELLETTI & GARTH, 1988, p. 32)..

[xi] Os escritórios eram pequenos e localizados na própria comunidade a fim de minimizar os obstáculos de classe, culturais e psicológicos. “Neighbourhood Law Offices: The New Wave in Legal Services for the Poor” (CAHN e CAHN, 1964, apud CAPPELLETTI & GARTH, 1988, p. 40).

[xii] Cappelletti e Garth (1988, p. 42) registram que “apenas recentemente, depois de uma disputa legislativa muito difícil, envolvendo um veto presidencial, é que a Legal Services Corporation tornou-se independente de influência governamental direta.

[xiii] Após a entrada em vigor da Lei Complementar n. 132, de 2009, o cargo ocupado por estes profissionais passou a ser chamado de Defensor Público da União para Defensor Público Federal.

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[xiv] De acordo com o art. 109, § 3º da CF/88, “serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça estadual”

[xv] Art. 5º, LXXIV, da CF/88.

[xvi] As chamadas “cláusulas gerais” não se confundem com os conceitos jurídicos indeterminados. As premissas normativas geralmente prevêem uma determinada conduta social a ser disciplinada e um conseqüente jurídico. No caso dos conceitos jurídicos indeterminados, essas regras prevêem a conseqüência que o direito atribui a elas, mas não especifica a conduta a ser regulada; já em relação às cláusulas gerais, não há previsão nem da conduta, nem da conseqüência, dando um espaço enorme para o ativismo jurídico tão temido pelos liberais (MARTINS-COSTA, Judith Hofmeister. O direito privado como um “sistema em construção”. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 02 set. 2008.

[xvii] De acordo com a tabela progressiva para o cálculo mensal do imposto de renda da pessoa, no ano de 2009, são isentos aqueles que têm base de cálculo mensal de R$ 1.372,69. Informação extraída do sítio eletrônico da Receita Federal do Brasil. Disponível em: <http://www.receita.fazenda.gov.br/aliquotas/ContribFont.htm>. Acesso em: 09.10.2009.

[xviii] Cleber Francisco Alves e Marília Gonçalves Pimenta (2004, p. 115) registram que a Constituição Estadual do Rio de Janeiro estabelece em seu art. 181, inciso I, alínea g, que os defensores públicos só perderão o cargo em virtude de sentença judicial, o que caracteriza a vitaliciedade.

[xix] “Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem quer que exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as instâncias, contando-se-lhes em dobro todos os prazos” (art. 5º, § 5º da Lei 1.060/50).

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[xx] O STF decidiu pela inaplicabilidade da prerrogativa de intimação pessoal aos Defensores Públicos nos Juizados Especiais (STF – HC 76.915-RS. Rel. Min. Marco Aurélio, Informativo 115).

[xxi] Para José Augusto Garcia (2004, p. 208), as chamadas funções atípicas da defensoria são assim denominadas “em razão de sua gênese não se encontrar sediada no pré-questionamento do estado do juridicamente necessitado”.

[xxii] Tal proibição tem natureza relativa, pois os defensores públicos que ingressaram antes da Constituição Federal de 1988 podem advogar (ALVES; PIMENTA, 2004, p. 122).

[xxiii] Há autores que consideram a remoção compulsória inconstitucional, por ofender ao princípio da inamovibilidade, previsto expressamente na Constituição Federal (Cf. ALVES; PIMENTA, op. cit., p. 124).

[xxiv] Informação retirada no sítio eletrônico da Defensoria Pública da União. Disponível em: <http://www.dpu.gov.br>. Acesso em: 01. nov. 2009.

[xxv] Disponível em <www.dpu.gov.br>. Acesso em 22 jun. 2016.

[xxvi] Cf. Ordem de Serviço DPU/BA n. 016, de 9 de junho de 2009.

[xxvii] Informação extraída do sítio eletrônico da DPU. Disponível em: < http://www.dpu.gov.br>. Acesso em: 16 nov. 2009.

[xxviii] Informação extraída no sítio eletrônico da Defensoria Pública da União. Disponível em: <http://www.dpu.gov.br>. Acesso em: 20 nov. 2009.

[xxix] Disponível em <http://portal.trf1.jus.br/sjba/>. Acesso em 18 jun. 2016.

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ÔNUS TRIBUTÁRIO BRASILEIRO E SUA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL

ROBERTO TEIXEIRA DE MENDONÇA: Bacharelando do Curso de Graduação Ciências Aplicadas e Sociais da Universidade Camilo Castelo Branco.

RESUMO: O presente trabalho é um resultado de pesquisa relacionada aos tributos brasileiros, voltando para a sua existência e distinção à qual esta última nem sempre retorna ao fim devido. Nota-se que em todas sociedades, associações, ou organizações precisam de arrecadações financeiras para serem bem administradas, e isto acontece também com um País. Sendo assim todos os países fazem suas arrecadações através de tributos, em outras palavras, com cobranças de impostos para a sua população, baseando nesta cobrança de impostos o país deveria arcar com o básico para os seus habitantes viverem uma vida digna, atribuindo uma distribuição básica para esta vida digna seria moradia, alimentação, educação, saúde e segurança. Mas infelizmente no Brasil é que se constata uma das maiores cargas tributárias do mundo, e um dos piores retornos em todas as áreas para a população. Isto por causa do grande rombo orçamentário que acontece todos os anos e a enorme corrupção que está na maioria políticos, em grande parte dos empresários, e também em uma porcentagem muito grande dos cidadãos brasileiros. Portanto, nota-se com o cenário atual, a população sofrendo com a situação financeira mal resolvida, e uma vida digna distante de ser alcançada.

Palavras-chave: tributação; impostos; devolução; brasileiros; corrupção.

ABSTRAT: This work is a result of research related to Brazilian taxes, returning to their existence and distinction to which the latter does not always return the end due. Note that in all societies,

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associations or organizations need financial collections to be well managed, and this also happens to a country. Being thus all countries make their collections through taxes, in other words, with tax collections to its population, based on this tax collection the country should afford the basics to its inhabitants live a dignified life, giving a basic distribution for this worthy life would be housing, food, education, health and safety. But unfortunately in Brazil is that it appears one of the highest tax burdens in the world, and one of the worst returns in all areas for the population. This because of the large budget gap that takes place every year and the massive corruption that is in most politicians, largely of entrepreneurs, and in a very large percentage of Brazilian citizens. Therefore, it is noted with the current scenario, the population suffering from the unresolved financial situation, and a distant dignified life to be achieved.

Keywords: taxation; taxes; devolution; Brazilians; corruption.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. CONCEITO DE DIREITO TRIBUTÁRIO. 3. ORIGEM DOS TRIBUTOS NO BRASIL. 4. A INDEPENDENCIA DO BRASIL E SUA ARRECADAÇÃO TRIBUTARIA. 5. A REPUBLICA E OS TRIBUTOS BRASILEIROS. 6. ATUAIS TRIBUTOS NO BRASIL. 6.1. ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA. 6.2. OS PRINCIPAIS TRIBUTOS COBRADOS NO BRASIL. 6.2.1. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS FEDERAIS. 6.2.2. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS ESTADUAIS. 6.2.3. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS MUNICIPAIS. 7. O PESO DOS TRIBUTOS SOBRE OS CONTRIBUINTES. 8. O ROMBO ORÇAMENTÁRIO. 9. DESPESAS COM PARLAMENTARES. 10. CORRUPÇÃO NO BRASIL. 11. ÚLTIMOS CASOS FAMOSOS DE CORRUPÇÃO. 12. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.

1. INTRODUÇÃO

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O Estado necessita. Em sua atividade financeira, captar recursos materiais para manter sua estrutura, disponibilizando ao cidadão contribuinte os serviços que lhe compete, como autêntico provedor das necessidades coletivas. A cobrança de tributos se mostra como uma das principais fontes das receitas públicas, voltadas para atingir os objetivos fundamentais, relacionados no art. 3º da Constituição Federal, tais como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, com a redução das desigualdades sociais, bem como a promoção do bem estar da coletividade.

O Estado, com o fim de atender o bem comum, necessita de meios para cumprir seus fins. Um dos aspectos da soberania de um Estado, como esclarece Machado (2005), é o seu poder de penetrar no patrimônio dos particulares, exigindo-lhes as contribuições de que necessita, dentro, é claro do que estiver legalmente previsto. Esse ato de o Estado recolher recursos de que necessita é a tributação. No mesmo sentido, o autor acima destacado afirma que para que o Estado possa proporcionar qualidade de vida a seus cidadãos é necessária a existência de recursos para os investimentos que se fizerem necessários.

Dessa forma, “a maior parte das normas ditas tributárias tem em vista a cobertura das necessidades financeiras dos entes públicos” (CAMPOS; Campos, 2001, p. 39).

Consequentemente, antes de ser uma simples atividade financeira, a tributação é uma condição mais do que necessária para que o Estado possa atender a ampla gama de atribuições definidos pela Carta Constitucional, ou seja, os objetivos inerentes ao desenvolvimento econômicos e social.

“No estágio atual das finanças públicas, dificilmente um tributo é utilizado apenas como instrumento de

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arrecadação. Pode ser a arrecadação o seu principal objetivo, mas não o único. Por outro lado, segundo lição prevalente na doutrina, também o tributo é utilizado como fonte de recursos destinados ao custeio de atividades que, em princípio, não são próprias do Estado, mas este às desenvolve, por intermédio de entidades específicas, no mais das vezes com a forma de autarquia” ( Machado, Hugo de Brito; Curso de Direito Tributário.30º Edição-São Paulo:Malheiros 2009, pag.81-82)

Por sua atividade financeira, o Estado desenvolve diversas ações para obter, gerir e aplicar os meios próprios para satisfazer os interesses da coletividade e realizar os seus fins. É através das receitas financeiras que o Estado realiza os seus fins.

O tributo é o instrumento básico viabilizador de qualquer sociedade constituída. Quanto mais evoluída for a organização da sociedade, mais evoluído será o sistema tributário.

As receitas alcançadas pelo Estado devem ser geridas e retornadas ao povo através do mínimo necessário para que se viva com dignidade, quando isto não ocorre, por inúmeras razões, a máquina estatal passa a não vigorar da maneira que deveria causando prejuízos sociais de toda ordem.

Um dos aspectos que fere o bom funcionamento estatal é o devido da utilização verba recebida, que não volta ao povo pelo seu uso indevido, voltado para gastos irregulares e atos de corrupção.

“Corrupção na política sempre existiu, faz parte do jogo de interesse e poder desde o nascimento da vida em sociedade”. No Império Romano, por exemplo, existia até uma tabela paralela de corrupção feita pelo próprio senado para burlar as leis, a corrupção

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não é uma exclusividade brasileira. Ela sempre existiu em todos os sistemas e teocracias, governos populistas e ditaduras militares. Mas o esforço de compreensão das raízes da corrupção e da relação da sociedade com esse desvio da lei em um local específico, no caso o Brasil, exige ir além das estatísticas e das definições generalizantes. É necessário analisar a formação social e política do país. Diz José Odair da Silva, historiador e doutor em Ciência da Religião pela PUC-SP.

Mas como se sabe a corrupção vai além da política, está instalada nas relações sociais. E os prejuízos são evidentes, sobretudo em termos de cultura política, prevalecendo a tese de que o mundo é dos espertos e de que a lei não alcança igualmente a todos. “uma lógica de malandragem se espalha pelo país como normal e dificulta o estabelecimento de uma cultura cidadã, democrática e especificamente moderna”, lembra Rogério Baptistini Mendes, doutor em Sociologia pela UNESP.

Segundo Dionísio da Silva em “De onde vêm as palavras”, a palavra corrupção vem do latim corruptione, apodrecimento, decomposição. Foi inicialmente empregada ao fim que todos teremos após morte. O vocabulário designa também atos ilícitos praticados, sobretudo, por políticos, os corrompidos, e empresários, os corruptos. Entretanto esta palavra costumava se referir a declíneo moral como no caso do livro escrito por Mikhail Shchertov, “Da Corrupção da Moral na Rússia no século XVIII”. Uma forma de começar a compreender o nível de tolerância para a corrupção.

2. CONCEITO DE DIREITO TRIBUTÁRIO

O Direito Tributário é ramo do direito público, tendo natureza obrigacional, pois se refere a relação de crédito e débito entre os sujeitos da relação jurídica.

“é possível conceituar o Direito Tributário como o ramo do Direito que se ocupa das relações entre o fisco e as pessoas sujeitas a imposições

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tributárias de quaisquer espécie, limitando o poder de tributar e protegendo o cidadão contra os abusos desse poder”.

A relação jurídica é polarizada, destacando-se no polo ativo (credor) os Fiscos (União, Estados, DF e Municípios). Já no polo passivo (devedor) encontra-se a figura do contribuinte, representado pelas pessoas físicas ou jurídicas.

Dessa forma cria-se o cenário referente a invasão patrimonial, caracterizador do sistema tributário, em que o credor avança em relação ao patrimônio do devedor, de maneira compulsória, com o objetivo de retirar valores para a satisfação dos interesses coletivos.

Essa invasão é inevitável, não tendo como dela se furtar, exceto se o tributo apresentar-se ilegítimo (fora dos parâmetros da CF).

O Direito Tributário é o ramo do Direito Público que estuda princípios e normas disciplinadoras das atividades de criação, cobrança e fiscalização dos tributos.

"Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituí- da em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada"

Vale ressaltar que o campo de interesse do Direito Tributário termina com a entrada de dinheiro nos cofres públicos, ao passo que o destino do dinheiro arrecadado pertence ao campo de interesse do Direito Financeiro.

Definição segundo o legislador Hugo de Brito Machado Direito Tributário é “o ramo do Direito que se ocupa das relações entre fisco

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e as pessoas sujeitas a imposições tributárias de qualquer espécie, limitando o poder de tributar e protegendo o cidadão contra abusos desse poder”.[1]

3. ORIGEM DOS TRIBUTOS NO BRASIL

Por se tratar de um trabalho acadêmico, não há como deixar de apresentar um retrospecto da tributação em nossa Pátria, assim, notar que sempre houve uma atuação forte do Estado para cada vez mais aumentar a carga tributária desde os tempos do Brasil Colônia, passando pelo período imperial, o efeito da chegada da Família Real ao Brasil em 1821, bem como todo o período republicano (A velha a nova o período de ditadura e a atual) inclusive a criação do Imposto de Renda ainda na República Velha.

No Brasil colonial, as contas eram prestadas em forma de matéria extraída e produzidas aqui no Brasil, por não existir dinheiro corrente na época, os primeiros modelos de tributação, seriam de uma forma diferente da que se adota hoje, era através da exploração de nossas riquezas naturais como o pau-brasil o ouro e outras riquezas naturais do solo brasileiro na chegada dos portugueses, no ano de 1500, que logicamente se tornou uma forma de tributo à monarquia portuguesa daquela.

Visto por parte da corte portuguesa e outros países colonizadores que o Brasil era muito rico em minério, diante disto, originou-se a conhecida grande primeira etapa de tributação no Brasil, e composta das quinze Capitanias Hereditárias, anteriormente eram conhecidas por Donatárias, que estavam a serviços exclusivamente aos interesses de Portugal através do seu rei português D. João III. Tendo esta divisão, foi nomeado um “Capitão-Mor” individualmente, consistindo assim o representante do Rei, atuando como órgãos tributários de todas as atividades de suas jurisdições.

“Porém, em 1548, foi substituído por um governo-geral para a atuação das capitanias hereditárias, porém

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mantendo-as como divisão, e foi nomeado um governador-geral, e foi proclamado Thomé de Souza, para se colocar como representante aos interesses do rei no Brasil. Sendo assim, os sesmeiros, proprietários das terras debaixo da ordem da carta das sesmarias, agora sendo taxados a impostos, tributos e obrigações”[2].

Já na segunda fase da administração tributária, houve uma mudança em que foi proclamado um provedor-mor da Real Fazenda, Antônio Cardoso de Barros, e adjuntos que eram chamados de provedores-parciais nas mais variadas capitanias, ocorrendo que Brás Cubas, em São Vicente, foi o primeiro, através da edição que se deu o nome de Lei Tributária, sendo assim, os tributos já passaram a serem classificados em três espécies, o primeiro tributo foi denominado de Derramas. Este tributo fiscalizaria a cobrança da diferença do que realmente deveria ter sido pago e não foi, (Ex: cobrança do quinto do ouro em atraso); o segundo se chamava Finta, este era equivalente à renda que o contribuinte com o exercício de sua atividade; e por fim, o terceiro englobava as contribuições de suas designações subsidiárias, sob o aspecto de aquele que não consistia nem derrama e tão menos em fintas.

A primeira chamada alfândega, foi edificada na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, que foi fundada pelo nobre Sr. Estácio de Sá no ano de 1565, que auto se nomeou como provedor-parcial. Já pelos anos de 1649, seguindo boa fase de arrecadação durante cem anos que se seguiram, inclusive com o monopólio do comércio através da tributação se tratando da totalidade das atividades com mais lucros na atual situação, foi instituída a Companhia Geral do Comércio, que concederia, de forma igual, o monopólio legal e forma ainda maior da economia. Em seguida com a criação de do órgão, a Fazenda Real conseguiu controle absoluto sobre a sonegação de impostos.

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4. A INDEPENDENCIA DO BRASIL E SUA ARRECADAÇÃO TRIBUTARIA

Já no tempo em que D. João VI resolveu voltar para Portugal, em abril de 1821 e deixou em seu lugar, no Brasil, o filho D. Pedro como príncipe regente, era sabido que inevitavelmente o país teria sua independência. O movimento de independência deu origem à Constituição de 1824, onde a amplificação do ideal liberal predominou; havia uma intensa preocupação em limitar o Estado, nos preceitos individualistas, tornando as questões sociais em matérias secundárias. Dessa forma, o processo legislativo foi influenciado pelo liberalismo, originando leis do mesmo teor. Durante este período, o sistema de arrecadação se tornou um caos, sendo que os tributos eram cobrados sempre de maneira cumulativa. Estabeleceu-se, ainda, a classificação em:

- Receitas gerais;

- Receitas provinciais;

- Receitas municipais[3].

5. A REPUBLICA E OS TRIBUTOS BRASILEIROS

Com a proclamação da república do Brasil e com ela, a Constituição de 1891; o Brasil naturalmente passou a ser uma Estado Federativo, mas sendo as receitas tributárias atribuídas à União e aos Estados, sendo assim excluídos os municípios, ficando caracterizado um sistema censitário, manipulador e concentrador de poder. Existia, pois, competência concorrente entre a União e os Estados, mas sem ter algo bem definido, constituindo várias divergências entre União, Estados e agora os Municípios também.

Em seguida, diante de toda a crise econômica mundial 1929, foi declarada a chamada Revolução de 30, onde foram instituídas, através de decreto (DEC. 21.930 de 11 de maio de1932), as contribuições de melhoria (espécie de tributo prevista no atual código tributário), trazendo a visão de reconstruir o país que

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acabara de passar por uma guerra. Em 1934, surge a chamada Constituição Social - Democrata que trazendo taxativamente em seu texto, o Imposto de Renda sendo um tributo federal.

Em uma fase seguinte, nasceu a Constituição de 1946, constituída de caráter democrático; tentou viabilizar a quebra da centralização do poder, dando mais força aos municípios e concedendo assim suas próprias receitas. Segue os principais pontos destacados neste ato constituído[4]:

* O rompimento das referências à dupla tributação feitas nas Constituições de 1934 e 1937, mostrando ela seria por completo inconstitucional, sem que isto precisasse ser falado;

* O conceito expresso da contribuição de melhoria para a hipótese de valorização do imóvel em consequência de obras públicas;

* Limitando o poder de tributar que foram ampliadas, tornando-se imunes os templos, bens e serviços de partidos políticos, instituições educacionais assistenciais e o papel destinado exclusivamente a jornais, periódicos e livros;

* Os impostos deveriam ser, sempre impreterivelmente que possível, pessoais e graduados pela capacidade econômica do contribuinte;

* Aplicando a visão de proteger os setores mais pobres, baixando a antiga tradição da tributação regressiva, onde se onera mais os que menos têm condições financeiras de pagar.

* O instituto do direito anglo-saxão que implicava na redistribuição de tributos arrecadados pela competência federal para a órbita estadual e municipal.

Já no mês de dezembro de 1965, o sistema tributário passa a ser sistemático sendo através da Emenda Constitucional nº 18 - de

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01 de dezembro de 1965 - procurou encontrar uma nova ordem tributária para o Brasil. Com esta nova proposta se conseguiu colocar em prática as seguintes características:

· Nasceu o IPI (imposto sobre produtos industrializados) com a característica da seletividade.

· Fez surgir o ICM (imposto sobre circulação de mercadorias) antecessor do ICMS;

· Originou o ISS (imposto sobre serviços), que extinguiu o IIP (imposto sobre indústrias e profissões).

Com tudo isto se deu origem ao CTN e a Constituição de 1967 - Código Tributário Nacional foi proposto em 19.08.1953 sob a vigência da Constituição de 1946, mas só foi aprovado em 25.10.1966 por lei ordinária; logo após isso, foi tido como inconstitucional, pois a então Constituição de 1967 determinava que matéria tributária devesse ser tratada só através de lei complementar.

Sendo finalmente, a atual Constituição da República Federativa do Brasil de 05.10.1988 dispõe, no seu título VI, sobre a "Tributação e o Orçamento". Dentro deste título, há uma divisão, a saber[5]:

a) Trata dos princípios gerais e das limitações do poder de tributar;

b) Discrimina as receitas dos impostos pela União, por Estados e o Distrito Federal e pelos Municípios;

c) Dispõe sobre a repartição das receitas tributárias.

O Sistema Tributário Nacional atual encontra-se sob a regência dos artigos 145 a 162 da Constituição de 1988, de leis complementares resolvidas pelo Senado Federal, sob as

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competências das leis federais, municipais, estaduais e constitucionais. E, de acordo com o art. 146, as limitações constitucionais quanto ao poder de tributar cabem à lei complementar federal. A lei complementar à Constituição tem o papel de estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios na economia, sem prejuízo da competência da União, por lei, de estabelecer normas de igual objetivo.

No Brasil, cada nível de governo tem o direito de instituir os impostos e contribuições que são permitidos constitucionalmente. A Constituição Federal define as competências tributarias de cada esfera de governo, não havendo a possibilidade de sobreposição de competências tributárias.

6. OS ATUAIS TRIBUTOS NO BRASIL

É fato que todos os indivíduos pagam tributos, direta ou indiretamente, toda estrutura administrativa dos governos são formadas para assegurar dos contribuintes o recebimento dos tributos, seja ele o Governo Federal, seja no Governo Estadual, seja no Distrito Federal ou também no Governo Municipal.

6.1. ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA

“Numa classificação com alguma utilidade didática, mas sem rigor científico, a doutrina costuma discriminar três modalidades de competência tributária: privativa, residual e comum'. Designa-se privativa a competência”

“A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas

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Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, observando o que estabelece o Código Tributário Nacional no seu artigo 6º.”

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estão ainda obrigados à observância das normas gerais de Direito Tributário que são estabelecidas em leis complementares, conforme determina o artigo 146 da Constituição Federal[6].

Só a pessoa jurídica de Direito público que exercita a atividade estatal específica pode instituir o tributo vinculado a essa atividade. A competência tributária, assim, é privativa do ente estatal que exercita a atividade respectiva. Indicar-se como competência comum os tributos vinculados não se mostra adequado. É necessário dizer que estes tributos são privativos de quem exerce a atividade estatal a que se ligam, sendo a competência para o exercício dessa atividade estatal matéria estranha ao Direito Tributário.

6.2. OS PRICIPAIS TRIBUTOS COBRADOS NO BRASIL

Os principais tributos no Brasil são, os Impostos, Empréstimo Compulsórios, Taxas, Contribuição de Melhoria e contribuições Especiais, destacando-se neste trabalho os Impostos.

“Imposto é espécie de tributo. Já examinamos o conceito de tributo, que é gênero e como tal está definido no artigo 3º do Código Tributário Nacional. Que também define imposto sendo um tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte, que se encontra no

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artigo 16º do Código Tributário Nacional”.

6.2.1. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS FEDERAIS.

Imposto de Importação, também conhecido vulgarmente como “tarifa aduaneira”, sua função extrafiscal, ele é muito importante como instrumento de proteção da indústria nacional, e está no artigo 19º do Código Tributário Nacional.

Imposto de Exportação, tem função predominante extrafiscal, sua função intimamente ligada à política econômica relacionada com o comércio internacional, o fato gerador desse imposto é a saída do Território Nacional, de produtos nacional ou nacionalizado, o âmbito material de incidência do imposto sobre exportações é, nos termos do artigo 153, inciso III, da Constituição Federal e do artigo 23º do Código Tributário Nacional.

“O art. 153 da Constituição 1988 enumera os impostos que a União Federal pode instituir, enquanto o art. 154, inciso I, estabelece que, além daqueles, a união pode instituir, mediante lei complementar, impostos ali não previstos, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador e base de cálculo próprios dos impostos nela discriminados”[7].

Imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza, ou simplesmente imposto de renda, sua função é de enorme importância no orçamento da União Federal, onde figura como a principal fonte de receita tributária, função esta nitidamente fiscal, é inegável também a importância do imposto de renda como instrumento de intervenção do Poder Público no domínio econômico. Assim, pode-se afirmar que o imposto de renda, embora tenha função predominantemente fiscal, tem também função extrafiscal altamente relevante, seu fato gerador tem em vista o

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dispositivo no artigo 153 inciso III da Constituição Federal, e no artigo 43 do Código Tributário Nacional.

Imposto sobre produtos industrializados ou IPI, embora utilizando como instrumento de função extrafiscal, sendo, como é, por força de dispositivo constitucional, um imposto seletivo em função da essencialidade do produto, está estabelecido no artigo 153, § 2º, inciso IV da Constituição Federal.

Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários, ou na forma resumida conhecido como imposto sobre operações financeiras, IOF, tem função predominantemente extrafiscal, embora também seja bastante significativa a sua função fiscal, porque enseja a arrecadação de somas consideráveis. Está descrito no artigo 153, inciso V da Constituição Federal e também no artigo 63 do Código Tributário Nacional.

Imposto sobre a propriedade territorial rural, sua função é predominantemente extrafiscal, vem explicito no artigo 153, inciso VI da Constituição Federal e também no artigo 29 do Código Tributário Nacional, é considerado um importante instrumento no combate aos latifúndios improdutivos, e por isso a Lei 9.393/96, estabeleceu alíquotas progressivas em função da área do imóvel e do grau de sua utilização.

Imposto sobre grandes fortunas, vem no artigo 153, inciso VII da Constituição Federal, até agora este imposto não foi instituído, nem editada lei complementar para definir o que se deve entender como grande fortuna, e a razão para essa inércia do legislador é exclusivamente política[8].

Impostos extraordinários, é estabelecido no artigo 76 do Código Tributário Nacional, também no artigo 154, inciso II da Constituição Federal, poderá a União institui na iminência de guerra, há hipóteses de incidência desses impostos extraordinários podem ser livremente estabelecidos pelo legislador, que pode extrapolar a

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competência da união, inclusive invadir a competência tributária dos Estados e do Municípios.

Imposto da competência residual, seria exclusivamente para o Finsocial, tivemos na verdade uma decisão política, destinada a preservar a arrecadação de recursos que seriam destinados ao combate à pobreza, e abrange impostos que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados no artigo 154, inciso I da Constituição Federal.

6.2.2. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS ESTADUAIS.

Impostos sobre heranças e doações, é de competência dos Estados e do Distrito Federal instituir este imposto conforme estabelece o artigo 155, inciso I da Constituição Federal, com a finalidade de gerar recursos financeiros aos cofres públicos.

Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de serviços, mais conhecido como ICMS, também compete aos Estados e ao Distrito Federal, e está no artigo 155, § 2º, inciso III da Constituição Federal, é fonte de receita bastante expressiva, e tem sido utilizado também como função extrafiscal, mas esta prática é desaconselhável, em virtude das práticas fraudulentas que o tratamento diferenciado pode estimular.

Imposto sobre propriedade de veículos automotores, ou seja o IPVA, a emenda constitucional nº 27, de 28.11.1985, atribuiu aos Estados e ao distrito federal competência para instituir tal imposto, o IPVA tem função predominantemente fiscal, e foi criado para melhorar a arrecadação dos Estados e Municípios.

6.2.3. A COMPETÊNCIA DOS IMPOSTOS MUNICIPAIS.

Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, ou seja o IPTU, vem estabelecido no artigo 156, inciso I da Constituição Federal e também no artigo 32 do Código Tributário Nacional, sua função é tipicamente fiscal, o fato gerador é domínio útil ou a posse do bem imóvel por natureza ou por acessão física.

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Imposto sobre a transmissão “inter vivos” de bens imóveis e direitos a ele relativos, está estabelecido no artigo 156, inciso II da Constituição Federal, a função é predominantemente fiscal, vale, dizer, a de obtenção de recursos financeiros para a Fazenda Pública, o fato gerador a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou por acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto o de garantia, bem como cessão de direitos à sua aquisição.

Imposto sobre serviços de qualquer natureza, também conhecido como ISS, vem estabelecido no artigo 156, inciso III da Constituição Federal, sua função é predominantemente fiscal, sendo uma importante fonte de receita tributária dos Municípios, o fato gerador desse imposto é o descrito em lei ordinária do Município, dentro, obviamente, de seu âmbito constitucional, segundo a Lei nº 116/2003tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da Lista anexa a referida lei, ainda que tais serviços não constituam a atividade preponderante do prestador.

As contribuições sociais, com característica ora de imposto, ora de taxa, as contribuições ditas paraestatais, ou sociais, ou de previdência, seria para a doutrina jurídica, um ponto de intermináveis controvérsias. Segundo o artigo 149 da Constituição federal, compete a União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, e já no seu parágrafo único desse mesmo dispositivo, porém permite que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituam contribuição, a ser cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistema de previdência e assistência social. A função das contribuições sociais tem algumas para fiscal e ouras extrafiscal.

Existem quaro espécies de contribuições sociais, sendo as contribuições de intervenção no domínio econômico, as contribuições de interesse de categoria profissionais ou

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econômicas, as contribuições de seguridade social e as contribuições sociais gerais[9].

As taxas tem seu fato gerador vinculado a uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, diferentemente do imposto, a taxa é um tributo contraprestacional, o seu pagamento corresponde a uma contraprestação do contribuinte ao Estado, pelo serviço que lhe presta, ou pela vantagem que lhe proporciona. Acrescente-se pois que a taxa é vinculada a serviço público, ou ao exercício do poder de polícia. A competência de instituir e cobrar a taxa é a pessoa Jurídica de Direito Público que seja competente para a realização da atividade à qual se vincule o fato gerador respectivo.

7. O PESO DOS TRIBUTOS SOBRE O POVO BRASILEIRO

Brasileiro trabalhará até 31 de maio só para pagar impostos, diz IBPT, consumidores trabalharão 151 dias em 2015 para pagar tributos, diz estudo.

Neste ano, 41,37% de todo o rendimento que os brasileiros ganharem, em média, será destinado para pagar tributos. A estimativa é do tributarista Gilberto Luiz do Amaral, do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). Segundo o cálculo, isso equivale a 151 dias de trabalho, o equivalente ao período que se encerra em 31 de maio. Os dados foram divulgados pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP). O número de dias trabalhados necessários para pagar tributos é igual ao do ano passado. Em 2012 e em 2013, eram 150.

O IBPT divulgou que a carga tributária brasileira (valor de todos os impostos pagos pelos cidadãos e empresas na proporção das riquezas produzidas no país) subiu pelo segundo ano consecutivo e somou 35,42% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014, ante um percentual de 35,04% em 2013.

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O percentual de 35,42% é o maior da série histórica da pesquisa, iniciada em 1986. A carga tributária oficial do país só deve ser divulgada pela Receita Federal no final do ano[10].

8. O ROMBO ORÇAMENTÁRIO

O rombo orçamentário federal demonstra claramente incompetência na gestão das contas públicas, vimos a apresentação de um orçamento com grande défice para 2016, com previsão em torno de 0,5% (cerca de R$ 30 bilhões) da soma das riquezas do país (PIB), com estes números comprova que o governo não está sabendo o que fazer para tirar a economia brasileira do abismo em que foi colocada. Em apenas poucos meses, a meta fiscal de 2016 passou de superávit de 2% do PIB para a inédita projeção de déficit já confirmada. Na avaliação mostra a falta de habilidade administrativa deste governo e a falta de gestão das contas públicas, vemos que não se faz a lição de casa para controlar os gastos públicos. O mais grave de toda esta situação é que todas as investidas do governo contra as finanças nacionais traz consigo uma grande carga desobediência à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), pois não há equilíbrio entre receitas e despesas da União, depois tendo que mascarar o orçamento fiscal. O rombo nas contas públicas estimado para o próximo ano demonstra, a péssima administração governamental pela incompetência e pela total falta de crédito de suas ações.

O governo em 2016 deverá obter uma arrecadação de R$ 2,6 trilhões, finalizando o ano batendo o recorde histórico com esta arrecadação. Contudo isso, o governo publica que o orçamento de 2016 de R$ 2,6 Trilhões não cobrirá as despesas, demonstrando que o governo pretende jogar no ralo o dinheiro arrecadado, e com isso gastando mais do que arrecadado. Com este governo descontrolado, nós brasileiros infelizmente continuaremos pagando a conta, com isso também o governo tenta culpar o Congresso e responsabiliza-lo pela má administração, não que ele seja totalmente isento de responsabilidade, esperando que seja apoiado as decisões governamentais para aprovar algum “tributo emergencial” a fim de cobrir o rombo no orçamento público. Situação de rombo esta

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ocasionada pela roubalheira de um governo corrupto e sem escrúpulos, que vem agindo de forma amadora e irresponsável, não eu diria de forma muito capaz no quesito desvio de verbas públicas e corrupção, além de jogar o país em uma recessão crescente e com isso permitir que o Brasil venha perdendo gradativamente o grau de investimento, perdendo a credibilidade de investidores estrangeiros, e ganhando notoriedade internacional como pais de impunidade e políticos desonestos.[11]

O desequilíbrio das contas pode ser visto na expansão de números dos servidores públicos federais. De 2003 a 2013, houve aumento considerável de 28%, subindo de 456 mil para quase 600 mil funcionários, e essa maioria na Presidência da República e secretarias ligadas à Presidência. Segundo o jornal “O Globo”, o número de ministros é recorde, fazendo o Brasil com mais pastas num ranking das 50 nações com as maiores economias.

Para cobrir o buraco que já foi amenizado por uma revisão das despesas não obrigatórias, uma das alternativas é a criação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), que renderia 60 bilhões aos cofres da União, onde os Estados e Municípios ficariam com uma parcela. Esta ideia já gerou uma reação veemente do setor produtivo e do próprio Congresso, que resistem a um aumento de impostos neste momento de recessão.

9. DESPESAS COM PARLAMENTARES

Todos políticos que foram eleitos em 2014 e que estão ocupando as cadeiras do Congresso, o custo deste político foi no mínimo, R$ 1 bilhão de reais aos cofres públicos em 2015. Este levantamento foi feito pelo R7, considerando uma média dos salários e dos principais benefícios pagos a deputados e senadores, e na contratação assessores e pagar combustível.

Em certo tempo havia uma certa diferença nos valores pagos a cada parlamentar, como no caso do “cotão” verba para gastos nos escritórios montados nos Estados, viagens com passagens aéreas e divulgação das ações de seu mandato foi usado para o cálculo

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sempre o valor mais baixo. Toda essa ajudinha variava conforme o Estado que o parlamentar representa. Além disso, alguns muitos repasses não têm os valores divulgados ou dizem serem difíceis de calcular, como despesas médicas, cota gráfica e manutenção dos apartamentos funcionais. O que significa que o número final dos custos que os políticos geram é ainda maior do que o mencionado, pois eles tem muito mais direitos do que possamos imaginar, e ainda dizendo que atuam de acordo com a lei que o beneficia, dizendo que todos os atos são legais, mas agora o que não quer calar, são legais os atos deles, mas são morais e éticos perante a sociedade[12].

São 513 deputados e 81 senadores que receberão R$ 33,7 mil por mês em salários durante o ano todo. Essa remuneração é 26% maior do que a recebida pela última legislatura, já que os congressistas concederam a si próprios um aumento salarial no final de 2014. Os salários, antes do aumento, eram de R$ 26,7 mil por deputado ou senador. Além disso, todos recebem um auxílio moradia no valor de R$ 3.800.

Na Câmara, os deputados têm direito a uma cota para atividade parlamentar que varia entre R$ 27,9 mil e R$ 41,6 mil, de acordo com seu Estado de origem, mais uma verba de gabinete de R$ 78 mil.

Além disso, cada um dos 513 deputados pode contratar até 25 funcionários para seu gabinete pagando salários que vão de R$ 845 a R$ 12.940.

Somando tudo isso, utilizando sempre os valores mais baixos, encontramos o seguinte resultado: um deputado custa por mês R$ 143,4 mil. Por ano, esse valor é de R$ 1.720.800. Todos os 513 vão custar, portanto, 882.770.400.

No Senado, o cenário é parecido. Os 81 senadores recebem o "cotão" variando entre R$ 21 mil e R$ 44 mil. Cada parlamentar pode contratar até 55 funcionários para seus gabinetes, com verba de gabinete média de R$ 80 mil. Além disso, todos têm direito a

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gastos ilimitados com celulares, que não estão incluídos no "cotão", ao contrário da Câmara. Eles também têm direito a um veículo oficial, alugado pelo Senado, e com o combustível pago.

Assim, somando o que é possível somar, constata-se: Um senador custa por mês R$ 138,5 mil. Por ano, esse valor é de R$ 1.662.000. Todos os 81 custam, portanto, R$ 134.622.000.

Juntando os valores das duas Casas, chegamos à conclusão que os parlamentares custam anualmente R$ 1.017.392.400. No mínimo.

Com toda esta situação, notamos que, os parlamentares ditam o ganho deles, não tem dissidio, não tem acordo, não tem nada, simplesmente reúnem-se, e elevam os salários, as ajudas, os auxílios, e nós povo, que somos os patrões deles, temos que aceitar como se o dinheiro fosse deles, a empresa Brasil é deles, e vem tachas, impostos, contribuições sobre o povo[13].

10. CORRUPÇÃO NO BRASIL

A corrupção vem do latim corruptos, que tem o significado de quebrado em pedaços, já o verbo corromper significa “tornar pútrido”. Nos dias de hoje a corrupção pode ser definida como utilização do poder ou autoridade para conseguir obter vantagens e fazer uso do dinheiro público para seu próprio interesse ou de outrem.

A questão da corrupção nos últimos tempos ocupou os cientistas sociais de maneira diferenciada. Existem abordagens bem diversas que mostram em última análise certa complexidade dos especialistas em torno da matéria.

Uma abordagem mais genérica poderia denomina-la de cultural é o fator “confiança”. É notório que quando as evidências de corrupção se acumulam, pela divulgação de notícias sobre ela, o ambiente começa a ficar muito carregado e os atores sociais começam a ficar muito preocupado. Gerando assim um fator de incerteza e se agrava muito quando o protagonista é o governo, ele é o ponto de referência, e se não for digno de confiança, isto poderá

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se transmitir para toda a sociedade, e todo sistema político poderá ser questionado.

A corrupção é presente em maior evidência em países não democráticos e de terceiro mundo. Essa prática infelizmente está presente nas três esferas do poder (legislativo, executivo e judiciário). O uso do cargo ou da posição para obter qualquer vantagem, é denominado de tráfico de influência.

Toda sociedade corrupta sacrifica a camada mais pobre, que depende puramente dos serviços públicos, ficando assim muito difícil de suprir todas as necessidades sociais, e quando o governo não tem transparência em sua administração é mais provável que haja ou que incentive essa prática, não existe país com corrupção zero, embora os países ricos democráticos tenham menos corrupção, pois sua população é bem mais esclarecida acerca de seus direitos[14].

Corrupção no tempo do Império, segundoRaymundo Faoro, a corrupção é um vício herdado domundo ibérico, é o resultado de uma relaçãopatrimonialista entre Estado e Sociedade. Já sabemos que o nepotismo teria desembarcado no Brasil a bordo da grande primeira caravela, sendo apontado como exemplo a Carta a El-Rei D. Manuel que foi escrita porPero Vaz de Caminha, onde requeria do rei que mandasse "vir buscar da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro", notamos aqui pero Vaz de Caminha, já dando um jeitinho e colocando se genro em um serviço público. Para ocupar e administrar o novo território, tarefa bastante árdua e complicada pela distância geográfica e a poucas condições de comunicações, a coroa portuguesa teve de oferecer incentivos e relaxou na vigilância de seus prepostos. Isso gerou um ambiente de tal modo muito favorável à prática da corrupção que já no século XVII, o padre Antônio Vieira denunciou-o através do “Sermão do Bom Ladrão”, onde expõe corajosamente os desmandos praticados por colonos e administradores no Brasil:

Vemos também a corrupção durante o Regime Militar, Castelo Branco: Tivemos no entanto o combate à corrupção que foi uma das grandes bandeiras levantada com o golpe militar de 1964. Foi alvo específico, assim como a denúncia da "infiltração comunista" na

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vida brasileira e o discurso moralista, pode ser encarado como fruto da vinculação entre os militares, o comunismo conseguiram dar uma boa amenizada, mas a corrupção que está impregnada na vida do ser humano não teve controle.

Durante a ditadura, a corrupção não foi uma política de governo, mas de Estado, uma vez que seu principal escopo foi a defesa de interesses econômicos de grupos particulares.[15]"

A corrupção pós-ditadura, já nas últimas duas décadas do século XX, particularmente após o fim do regime militar, muitos casos de corrupção notórios obtiveram grande destaque na mídia brasileira e internacional, tendo inclusive como resultado no afastamento do presidente Fernando Collor de Mello. Pela primeira vez, a imprensa apresentava detalhes e provas documentais e a real extensão dos roubos de material, desvios de recursos públicos e corrupção, denunciava desmandos nos poderes executivos e legislativos. Com isso a partir de 1993, a extensão das denúncias abalou a crença nas instituições e no futuro do país e provocou a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que ficou conhecida como a CPI do Orçamento, presidida pelo então senador Jarbas Passarinho e tendo como relator o governador de Pernambuco à época, Roberto Magalhães. Em 2014, todavia, o ex-presidente Collor foi inocentado pelo Supremo Tribunal Federal das denúncias de corrupção que lhe foram imputadas e que resultaram no seu "impeachment”.

11. ÚLTIMOS CASOS FAMOSOS DE CORRUPÇÃO

Mensalão, é o nome dado ao escândalo de corrupção política mediante compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional do Brasil, que ocorreu entre 2005 e 2006. O caso teve como protagonistas alguns integrantes do governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, membros do Partido dos Trabalhadores e de outros partidos, sendo objeto da ação penal de número 470, movida pelo Ministério Público no Supremo Tribunal Federal.

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Operação Lava Jato, é o nome de uma investigação realizada pela Polícia Federal do Brasil, cuja o início da fase mais aguda se deu em 17 de março de 2014, com o cumprimento de mais de vários de mandados de busca e apreensão, prisões temporárias, preventivas e conduções coercitivas, tendo como principal alvo apurar um esquema de lavagem de dinheiro, suspeito de movimentar de bilhões de reais. Já está considerado pela Polícia Federal como a maior investigação de corrupção da história do País e uma das maiores do mundo. De acordo com as delações recebidas pela força-tarefa da Lava Jato, estão envolvidos vário partidos políticos, mas principalmente o PT, vários empresários de grandes empreiteiras e as próprias empreiteiras foram beneficiados com o esquema[16].

Com o decorrer da investigação identificou-se ainda que o doleiro Alberto Youssef havia comprado e presenteado com um veículo Land Rover Evoque àPaulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras. Foram ainda colhidos indícios de pagamentos indevidos realizados por empresas vencedoras de contratos na (Refinaria Abreu e Lima) estes pertencentes ao doleiro Alberto Youssef. Em abril de 2014, a operação lava jato contava com 46 pessoas indiciadas pelos crimes de formação de organização criminosa, crimes contra o sistema financeiro nacional, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro trinta pessoas presas.

Operação Pixuléco. A operação surgiu da 17º fase da Operação Lava Jato este termo usado pelo tesoureiro do PT João Vaccari Neto para tratar o dinheiro com este codinome, segundo afirmou o empreiteiro da UTC, Ricardo Pessoa, em sua delação premiada. A operação teve como objetivo principal o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu e foram cumpridos 3 mandados de prisão preventiva, 5 de prisão temporária, 26 de busca e apreensão e 6 de condução coercitiva. As ordens são do Dr. Juiz Federal Sérgio Moro, que os processos da Lava Jato, em Curitiba. De acordo com os procuradores da Lava Jato, a empresa de José Dirceu, JD Assessoria e Consultoria, cumpria a mesma função das empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef, alvo central da investigação sobre desvios, fraudes e corrupção na Petrobras. As empresas

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emitiam notas fiscais para as maiores empreiteiras do País por assessorias e outros serviços fictícios.

E assim vem atuando a polícia federal, com várias fases na operação Lava Jato, em fevereiro de 2014 chegou na fase 24, e pedindo para o ex-presidente da república Luís Inácio Lula da Silva (LULA) a depor coercivamente. Hoje nós vemos que o principal alvo das investigações seria o Sr. Luís Inácio Lula da Silva.

A operação Lava Jato vem se destacando entre todas as operações, pois conseguiram desmantelar um esquema sistêmico de corrupção, com o envolvimento de vários políticos de renomes no país e também várias empresas, que até então era acima de qualquer suspeita.[17]

Estamos vendo a atuação do Juiz Federal Sérgio Moro, que está afrente da operação Lava Jato, com o braço firme para que a ordem e a decência seja estabelecida no Brasil, mesmo lutando contra um sistema corrupto, onde corre o risco de morte, ele e os demais integrantes da polícia federal apurando com rigor os fatos, para mandar para a cadeia grandes empresários de grandes empreiteiras e renomados políticos que fazem de tudo para burlar as leis brasileiras, achando-se dono do Brasil.

12. CONCLUSÃO

Com base em todo pensamento exposto, conclui-se que muito embora o tributo seja uma cobrança imposta pelo Estado aos seus cidadãos com o intuito de oferecerem em troca uma vida digna, conforme o artigo 3º da Constituição Federal, mas infelizmente percebe-se muito bem que no Brasil isto está longe de acontecer, pois, é a sociedade brasileira é uma das que mais é cobrada pela União, Estados e Municípios através dos tributos e que menos se beneficiam, desde quando começou os tributos no Brasil, no tempo da colonização e no tempo do Império, passando pela República, argumentando algo sobre na época do militarismo e entrando no final do século XX, com a chamada democracia.

Colocando-se em pauta o rombo orçamentário governamental, onde o governo brasileiro por sua incapacidade de governar, gasta muito mais que arrecada, onde os parlamentares por suma ganância, para favorecimentos próprio, legislando em

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causa própria, e sem escrúpulo nenhum roubando os cofres púbicos.

Esta corrupção está dentro dos nossos lares, quando falamos para o nossos filhos mentirem, mandando eles falarem para uma pessoa que o papai não está, quando nós cruzamos um semáforo vermelho, dizendo não vinha ninguém e não tinha um guarda para me multar, quando deixamos de fazer algo simples no trabalho e procuramos jogar a culpa no companheiro de serviço.

Cabe a todos nós mudarmos este conceito de vida em todos os locais, nos nossos lares, na nossa rua, no nosso trabalho, na nossa escola, no nosso Município, no nosso Estado e no nosso País, é preciso colocarmos em prática o bom caráter, as boas intenções, usando de boa fé em tudo que fizermos, para que as pessoa lá fora olha para nosso Brasil e para o povo brasileiro não com o olhar de desprezo, dizendo que o brasil é o país do futebol e do carnaval, mas falarem, ali está um País exemplar com um povo comprometido com a lealdade a verdade.

BIBLIOGRÁFICA:

Machado, Hugo de Brito; Curso de Direito Tributário. 30ª Edição São Paulo: Malheiros 2009, Pag. 81-82

https://jus.com.br/artigos/32990/o-credito-tributario-naleei-11-105-05

Machado, Hugo de Brito; Curso de Direito Tributário. 30ª Edição - São Paulo: Malheiros.2009. Pag. 50 ..... 433

Amaro, Luciano. Direito Tributário Brasileiro - São Paulo: Saraiva, 2014, Pag. 41.

Ferreira, Benedito. A História da Tributação no Brasil Causas e Efeitos. Brasília, 1986. Pag. 32.

https://rogerbam.wordpress.com/2010/10/19/a-corrupcao-no-brasil-3/

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https://oceanoazulresearch.wordpress.com/2010/06/07/corrupcao-no-brasil-uma-analise-sociologica/

https://jus.com.br/39319/a-origem-da-tributação-no-brasi

https://www.webartigos.com/artigos/a-historia-do-brasil-pelos-tributos/37019/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Capitanias_do_Brasil

https://jus.com.br/39319/a-origem-da-tributação-no-brasil

https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handiel/10438/2568/86620.pdf? seq

htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://minutosrtao.com.br/noticia/9754/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

http://noticias.r7.com/brasil/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://www.tribunahoje.com/noticia/130033/politica/2015/01/24/custo-com-salarios-e -beneficios-de-parlamentares/

htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://minutosertao.com.br/noticia/9754/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/o-que-corrupcao.htm

www.uff.br/econ/download/tds/UFF_TD209.

htpps://comendadorrmarcioborlringhifasano.wordpress.com/2015/02/13/brasil-historia-da-

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https://wikipedia.org/wiki/corrupcao¬_no_brasil

htpp://www.cartacapital.com.br/cultura/mera-coincidencia

htpp://teoriasefatos.com.br/paginas/corpo-politica-operacaolavajato.php

NOTAS:

[1] Machado, Hugo Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª Edição. Pag. 50 - São Paulo: Malheiros. 2009.

Amaro, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, Pag. 18. São Paulo: Saraiva, 1997; ed. 12º.

[2] Ferreira, Benedito. A História da Tributação no Brasil Causas e Efeitos. Brasília, p. 32, 1986.

[3] Ferreira, Benedito. A História da Tributação no Brasil Causas e Efeitos. Brasília, p. 32, 1986.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Capitanias_do_Brasil

https://jus.com.br/39319/a-origem-da-tributação-no-brasil

[4] https://www.webartigos.com/artigos/a-historia-do-brasil-pelos-tributos/37019/

https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handiel/10438/2568/86620.pdf?seq

[5] https://jus.com.br/39319/a-origem-da-tributação-no-brasil

https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handiel/10438/2568/86620.pdf?seq

[6] Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª Edição-São Paulo: Malheiros. 2009.Pag. 272

https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handiel/10438/2568/86620.pdf?seq.

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htpp://www.stf.jus.br/portal/constituição/constituição.asp

[7] Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª Edição-São Paulo: Malheiros.2009. Pag. 398

Machado, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª Edição-São Paulo: Malheiros.2009. Pag. 295

[8] Machado, Hugo de Brito; Curso de Direito Tributário. 30ª Edição - São Paulo: Malheiros 2009. Pags. 328 – 392

[9] Machado, Hugo de Brito; Curso de Direito Tributário. 30ª Edição - São Paulo: Malheiros 2009, Pags. 397 – 433

[10]htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://minutosrtao.com.br/noticia/9754/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

[11]htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://minutosrtao.com.br/noticia/9754/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

[12] http://noticias.r7.com/brasil/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

[13] http://noticias.r7.com/brasil/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://www.tribunahoje.com/noticia/130033/politica/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

[14]htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpp://minutosrtao.com.br/noticia/9754/2015/01/24/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

[15]http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/oquecorrupcao.htmwww.uff.br/econ/download/tds/UFF_TD209.

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[16]htpp:/www.jornalcorreiodovale.com.br/noticia/custo-com-salarios-e-beneficios-de-parlamentares/

htpps://comendadorrmarcioborlringhifasano.wordpress.com/2015/02/13/brasil-historia-da-

[17]htpps://comendadorrmarcioborlringhifasano.wordpress.com/2015/02/13/brasil-historia-da-corrupcao/

https://wikipedia.org/wiki/corrupcao¬_no_brasil htpp://www.cartacapital.com.br/cultura/mera-coincidencia

 

   

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DESAPROPRIAÇÃO CONFISCATÓRIA

RAFAEL XAVIER ARRUDA: Analista Judiciário no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais. Graduado pela Universidade Federal de Uberlândia. Pós-graduado em Ciências Criminais pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Foi Oficial do Ministério Público de Minas Gerais e Analista Judiciário e Chefe de Cartório no Tribunal Regional Eleitoral do Pará.

RESUMO: Esse trabalho buscou tratar de forma detalhada sobre a forma supressiva de intervenção do Estado na propriedade denominada desapropriação confiscatória em virtude de cultivo ilícito de plantas psicotrópicas. O assunto foi trabalhado a partir de suas balizas constitucionais, fundamentos, características, procedimento, fases, regulação infraconstitucional e jurisprudência sobre o tema.

PALAVRAS-CHAVE: Intervenção, Estado, Propriedade, Supressiva, Desapropriação, Confisco, Confiscatória, Plantas, Psicotrópicas.

1 INTRODUÇÃO

A desapropriação confiscatória ou desapropriação-confisco tem sede constitucional no art. 243 da Constituição Federal.

Conforme lição de Carvalho Filho,

[...] a desapropriação-confisco tem objetivo a expropriação, sem qualquer indenização ao proprietário, de glebas em que sejam localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas, as

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quais passam a ser destinadas ao assentamento de colonos para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.[i]

A expropriação ocorrerá visando o assentamento de colonos para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem o pagamento de nenhuma indenização para o proprietário, possuidor ou ocupante a qualquer título, independente das demais sanções previstas em outras leis.

Porém, quando nos reportamos aos conceitos de desapropriação apresentados pelos diversos autores, observamos que há sempre a referência à necessidade de indenização. É o caso de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para quem o instituto:

[...] é o procedimento administrativo pelo qual o poder público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização.[ii]

Diante disso, alguns autores não consideram a hipótese tratada no artigo 243 da Carta Maior como espécie de desapropriação, mas simplesmente como confisco [iii]. Outros, mesmo incluindo o direito à indenização no conceito de desapropriação ressalvam a existência de uma modalidade que não é indenizável[iv]ou simplesmente não apresentam maiores explicações.

Entendemos que a corrente doutrinária que entende que a desapropriação-confisco se trata de mais uma exceção à regra geral das desapropriações, traçada no art. 5º, XXIV, CF, tem razão. Como vimos no capítulo anterior, além da exceção do art. 243, que não exige indenização, temos a desapropriação urbanística sancionatória prevista no art. 182, § 2º e a desapropriação rural do

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caput do art. 184 que não exigem que a indenização seja prévia e em dinheiro.

2 REGULAMENTAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL

O dispositivo constitucional que trata da desapropriação confiscatória é regulamentado pela Lei n° 8.257, de 26/11/1991 e pelo Decreto 577/92.

Tais atos normativos são de extrema importância, uma vez que a modalidade de desapropriação ora estudada apresenta procedimento próprio, discrepante do procedimento geral das desapropriações.

3 PLANTAS PSICOTRÓPICAS

Conforme o artigo 2º da Lei 8.257/91 e do Decreto 577/92, plantas psicotrópicas são aquelas que permitem a obtenção de substância entorpecente proscrita, plantas estas elencadas no rol emitido pelo órgão sanitário competente do Ministério da Saúde.[v]

Dessa forma, a lei deixa a cargo do órgão competente desse Ministério a classificação, através de portaria, de determinada planta como psicotrópica.

Além disso, cabe ressaltar que a cultura de plantas psicotrópicas não é caracterizada somente pelo plantio, mas também no preparo da terra destinada à plantio, semeadura, ou colheita. [vi]

Portanto, o preparo da terra fins de semeadura ou colheita é, da mesma forma que o plantio, ensejador da desapropriação confiscatória.

Mas há hipóteses em que a cultura de plantas psicotrópicas não será considerada ilegal e não desencadeará o processo expropriatório. É que, em determinadas situações, como em caso

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de pesquisa para fins medicinais ou científicos, o cultivo de plantas consideradas psicotrópicas se faz necessário ou útil.

A lei 11.343/2006, conhecida como lei de entorpecentes, que veio a revogar a lei 6.368/76, traz em seu artigo 2º:

Art. 2o Ficam proibidas, em todo o território nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-religioso.[vii]

Parágrafo único. Pode a União autorizar o plantio, a cultura e a colheita dos vegetais referidos no caput deste artigo, exclusivamente para fins medicinais ou científicos, em local e prazo predeterminados, mediante fiscalização, respeitadas as ressalvas supramencionadas.[viii]

Portanto, o cultivo em situações previamente autorizadas pelos órgãos competentes não será considerado ilegal.

Quanto à Convenção de Viena, que ingressou em nosso sistema normativo através do Decreto 79.388/77, vale transcrevermos trecho que aparece no artigo 32:

4. O Estado em cujo território cresçam plantas silvestres que contenha substâncias psicotrópicas (...), que são tradicionalmente utilizadas por pequenos grupos, nitidamente, em rituais mágicos ou religiosos, poderão, no

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momento da assinatura, ratificação ou adesão, formular reservas em relação a tais plantas [...]

Interessante e polêmica ressalva, uma vez que algumas seitas ou religiões se utilizam de substâncias alucinógenas em seus cultos e, para legitimarem a prática, invocam exatamente o dispositivo supracitado.

4 PROCEDIMENTO 4.1 Fase administrativa

Conforme ensina Carvalho Filho, a primeira característica que distingue a desapropriação-confisco das demais modalidades:

[...] consiste em que na desapropriação confiscatória, por sua própria particularidade, não há ensejo para a expedição de decreto declaratório prévio. Por essa razão, a fase administrativa limita-se à formalização das atividades gerais e as de polícia dos órgãos públicos com vistas à preparação da ação de desapropriação.[ix]

Nesse sentido de preparação da ação da desapropriação, competirá à Polícia Federal diligenciar para a localização de culturas ilegais de plantas psicotrópicas, visando a imediata expropriação do imóvel em que forem localizadas.

Portanto, é necessário que a Autoridade Policial determine a realização de diligências em caráter permanente ou temporário, dependendo do caso, para que sejam localizadas as culturas ilegais de plantas psicotrópicas e para que, dessa forma, a União, através da Procuradoria e com o auxílio do Incra, possa tomar as medidas judiciais necessárias à expropriação.

O sujeito ativo da ação é, portanto, a União. Porém, conforme artigo 9º do decreto citado, a Polícia Federal e o Incra poderão firmar entre sim e com os Estados, Municípios, órgãos e entidades das respectivas administrações os convênios e ajustes com o objetivo

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de dar agilidade e garantia às providências de ocupação dos imóveis e assentamento dos colonos.

O procedimento se iniciará com a remessa de cópia do inquérito policial e o recolhimento de dados que integrarão o relatório técnico, que nada mais é que um documento contendo os requisitos definidos em lei, a fim de instruir a ação. Os elementos que devem constar do relatório são:

I - a caracterização do imóvel onde foi localizada a cultura ilegal de plantas psicotrópicas, mediante indicação, pelo menos, da denominação e das confrontações e das vias de acesso;

II - descrição da área onde localizada a cultura;

III - comprovação da existência de cultivo ilegal;

IV - indicação e qualificação do proprietário ou do possuidor do imóvel, bem como as de todos os seus ocupantes e de outras pessoas nele presentes no momento da lavratura do auto de apreensão;

V - relação de bens móveis encontrados na área e apreendidos.[x]

A partir daí, o processo formado pelo relatório técnico – que deverá ser elaborado em 8 dias -, pelo inquérito policial e quaisquer outros documentos que a autoridade policial entenda importantes, será remetido ao órgão da Procuradoria da União, representante judicial da União.

4. 2 Fase Judicial

O Procedimento judicial é especial e regido pela Lei n° 8.257/91, possuindo caráter sumário. O Código de Processo Civil será aplicado apenas subsidiariamente, nas disposições não reguladas na lei especial.

Assim, uma vez que Lei nº 8.257/91 não traça regra especial para a petição inicial, esta deve conter os requisitos previstos no

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CPC. Portanto nesta modalidade desapropriatória não há nem oferta de preço e nem juntada de exemplar do diário oficial, tal como se exige para as demais.[xi]

A justiça competente para julgamento do processo é a Justiça Federal, no foro da localidade onde se localiza a plantação, conforme o artigo 95 do CPC e artigo e artigo 109, I, CF. [xii]

O juiz, após recebimento da inicial, mandará citar o réu dentro de 5 dias. Já ao ordenar a citação o juiz nomeará perito, que elaborará laudo respondendo aos quesitos formulados e o depositará em cartório, no prazo de 8 dias, contados da investidura.

Ainda de acordo com a lei, o prazo para contestação e indicação dos assistentes é de 10 dias, contado o prazo da juntada do mandado aos autos, devendo o juiz designar a audiência de instrução e julgamento dentro de 15 dias, contados da contestação.[xiii] Porém, Carvalho Filho esclarece que:

A lei refere-se à audiência no prazo de 15 dias a contar da data da contestação.[xiv] Essa data, na verdade, não tem qualquer relevância processual, e isso porque nada prova. Em nosso entender, deve interpretar-se o dispositivo, até mesmo para assegurar o direito de defesa ao réu, no sentido de que o início do prazo há de ocorrer na datadaprotocolização formal da contestação no órgão jurisdicional competente.[xv]Essa sim tem relevância jurídica, pois que indica o momento formal em que o réu exerceu o contraditório.[xvi]

Nesta audiência, que não poderá ser adiada, salvo força maior devidamente justificada, cada parte poderá indicar até cinco testemunhas. Se a audiência não puder ser concluída no mesmo dia, por impossibilidade de produção de toda a prova oral, não será a audiência postergada para prazo superior a 3 dias.

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A citação também deve ser feita na forma previsto pelo Código de Processo Civil em seu artigo 221: por carta, oficial de justiça ou por edital. Vale lembrar que, por se tratar normalmente de área rural, a citação por carta é rara, sendo feita, na maioria das vezes, por oficial de justiça.

4.2.1 Imissão liminar na posse

Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Imissão provisória na posse, define Celso Antônio Bandeira de Mello, "é a transferência da posse do bem objeto da expropriação para o expropriante, já no início da lide, obrigatoriamente concedida pelo juiz, se o Poder Público declarar urgência e depositar em juízo, em favor do proprietário, importância fixada segundo critério previsto em lei”.[xvii]

Portanto, como bem definido por Mello, a imissão provisória é a transferência da posse, não da propriedade.

Na desapropriação confiscatória, uma vez concedida pelo juiz a liminar, necessário será a realização de audiência de justificação para exercício do contraditório.

E o órgão investido de poderes para imitir-se, em nome da União, na posse do imóvel expropriando, será o Incra. Além disso, este órgão indicará ao responsável pela representação judicial da União – o órgão da Procuradoria da União – o assistente técnico, se houver.

Assim, é o Incra quem irá realizar a imissão na posse, além de adotar as medidas necessárias e indicar o assistente técnico ao órgão da Procuradoria da União, sempre em nome desta.

Note-se que nessa modalidade de desapropriação não há, na lei, nenhuma exigência quanto à situação de urgência. Portanto, basta que o órgão da Procuradoria da União requeira, na inicial,

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para que o juiz possa decidir sobre a imissão. Não determina a lei também nenhum prazo para que o juiz defira o pedido liminar.

4.2.2 Sentença

Encerrada a instrução, o juiz deverá prolatar a sentença no prazo de 5 dias, da qual caberá recurso de apelação, nos moldes do artigo 513 do Código de Processo Civil.

Também é o Incra quem, após trânsito em julgado da sentença que confirmar a expropriação, tomará as medidas necessárias para incorporação definitiva do bem ao patrimônio da União, para isso apresentando relatório circunstanciado da situação do imóvel.

Efeito principal do trânsito em julgado da sentença é a incorporação definitiva do imóvel ao patrimônio da União, conforme o artigo 15 da lei nº 8.257/91.

Ademais, esclarece o texto legal que mesmo em caso de impossibilidade de imediata destinação das terras expropriadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, o imóvel permanecerá incorporado ao patrimônio da União, até que seja possível cumprir a destinação legal.[xviii]

O decreto nº 577/92 ainda estabelece que quaisquer bens de valor econômico, apreendidos em virtude do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas serão confiscados e reverterão em benefício de instituições especializadas no tratamento e custeio de atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas substâncias. [xix]

Além disso, a expropriação ocorrerá na forma prescrita em lei independente da existência de direitos reais de garantia, sendo vedados embargos de terceiro, fundados em dívida anticrética, hipotecário ou pignoratícia.

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5 EXTENSÃO

Discussão que se arrasta há muito tempo na doutrina e na jurisprudência é relativa à extensão em que ocorrerá a desapropriação, ou seja, uma vez localizada a cultura ilegal em uma parte da propriedade, resta dúvida sobre a desapropriação incidir apenas na parte cultivada ou em sua totalidade.

Ao se referir “às glebas de qualquer região do país”, não há no texto legal uma resposta à questão suscitada. [xx]

José dos Santos Carvalho Filho, ao lado da doutrina majoritária, perfilha o entendimento de que “a desapropriação deve alcançar a propriedade integralmente, ainda que o cultivo se dê apenas em parte dela”.[xxi]

Ainda segundo Carvalho Filho:

O proprietário tem o dever de vigilância sobre sua propriedade, de modo qie é de se presumir que conhecia o cultivo. Para nós, a hipótese só vai comportar solução diversa no caso de o proprietário comprovar que o cultivo é processado por terceiros à sua revelia, mas aqui o ônus da prova desse fato se inverte e cabe ao proprietário. Neste caso, parece-nos não se consumar o pressuposto que inspirou essa forma de expropriação. Em síntese: não há desapropriação parcial; ou se desapropria a gleba integralmente, se persente o pressuposto constitucional, ou não será caso de expropriação,[xxii] devendo-se, nessa hipótese, destruir a cultura ilegal e processar os respectivos responsáveis.[xxiii]

A jurisprudência encontrou, até então, grandes divergências. Parte entendia que a expressão glebas fazia referência apenas à parcela de terra utilizada no cultivo das plantas psicotrópicas, como

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foi o entendimento da 1ª turma do TRF – 5ª região, no julgamento da Apelação Cível 13308 PE 92.05.05404-6, de publicação em 07/04/1995:

Ementa

CONSTITUCIONAL. CULTIVO DE PLANTAS PSICOTROPICAS. EXPROPRIAÇÃO DE GLEBAS. ART. 243 DA CF/88.JURISDIÇÕES CIVIL E PENAL. INDEPENDENCIA. - A EXPROPRIAÇÃO DE GLEBAS NAS QUAIS E ENCONTRADO CULTIVO DE PLANTAS PSICOTROPICAS TEM NATUREZA PUNITIVA, MAS INDEPENDE DE AÇÃO PENAL. PROCESSA-SE NO JUÍZO CIVEL E DEVE LEVAR EM CONTA O PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE. - O DESEJO DE PROMOVER A REFORMA AGRARIA, COM O ASSENTAMENTO DE COLONOS,NÃO AUTORIZA VIOLAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL, QUE DETERMINA A EXPROPRIAÇÃO DAS GLEBAS ONDE FOREM LOCALIZADAS CULTURAS ILEGAIS DE PLANTAS PSICOTROPICAS, E NÃO DE TODA A AREA DE TERRAS PERTENCENTES AO RESPONSAVEL POR AQUELAS CULTURAS.[xxiv] - O ART. 243 DA CF/88 ALBERGA NORMA AUTO-APLICAVEL, E ASSIM PODIA SER APLICADO MASMO ANTES DA LEI 8257, DE 26/11/91, E INDEPENDENTEMENTE DE AÇÃO PENAL.[xxv]

O mesmo tribunal, através de novo julgamento da 1ª turma, em 25/10/2000, decidiu de maneira diversa:

Ementa

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CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL RURAL. CULTIVO DE PLANTAS PSICOTRÓPICAS. COMPROVAÇÃO DO ENVOLVIMENTO DOS PROPRIETÁRIOS. ALCANCE DA ÁREA EXPROPRIADA. ART. 243 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. - NÃO SUBSISTINDO QUALQUER DÚVIDA QUANTO À EXISTÊNCIA DA CULTURA ILEGAL DE PLANTAS PSICOTRÓPICAS (MACONHA), À SUA EXATA LOCALIZAÇÃO, À IDENTIFICAÇÃO DO POSSUIDOR DA GLEBA ONDE OCORREU O PLANTIO ILEGAL, BEM COMO QUANTO AO ENVOLVIMENTO DOS HERDEIROS DO IMÓVEL - SEJA PELA RESPONSABILIDADE DIRETA PELO CULTIVO, UM DELES, SEJA PELA TOLERÂNCIA COM A PRÁTICA DO DELITO, OS DEMAIS - CABÍVEL É A EXPROPRIAÇÃO DA GLEBA, NOS TERMOS DO ART. 243 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. - SE O CONSTITUINTE PRETENDESSE RESTRINGIR A EXTENSÃO DA NORMA QUE DISPÕE ACERCA DA EXPROPRIAÇÃO DE TERRAS ONDE ENCONTRADOS PLANTIOS DE CANNABIS SATIVA, TERIA UTILIZADO EXPRESSÕES USUAIS, COMO "A PORÇÃO DA GLEBA ONDE FORAM LOCALIZADAS PLANTAS PSICOTRÓPICAS", OU DESIGNAÇÃO SEMELHANTE. - AFASTADA, ASSIM, UMA ANÁLISE RESTRITIVA DA NORMA CONSTITUCIONAL, DESAUTORIZADA PELA PRÓPRIA REDAÇÃO QUE USOU O LEGISLADOR CONSTITUINTE.[xxvi] - PRECEDENTE DESTA CORTE (EAC 13308/PE). - APELAÇÃO IMPROVIDA.[xxvii]

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O Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário nº 543974/MG, interposto pela União contra uma decisão de segunda instância que decidira em favor do proprietário cuja fazenda possuía pés de maconha numa área de 150 metros quadrados, proferiu entendimento no sentido de que a expropriação deve abranger toda a propriedade, e não apenas a parcela de terra efetivamente plantada:

Ementa

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO. GLEBAS. CULTURAS ILEGAIS. PLANTAS PSICOTRÓPICAS. ARTIGO 243 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO. LINGUAGEM DO DIREITO. LINGUAGEM JURÍDICA. ARTIGO 5º, LIV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. O CHAMADO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE.

1. Gleba, no artigo 243 da Constituição do Brasil, só pode ser entendida como a propriedade na qual sejam localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas. O preceito não refere áreas em que sejam cultivadas plantas psicotrópicas, mas as glebas, no seu todo.[xxviii]

2. A gleba expropriada será destinada ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.

3. A linguagem jurídica corresponde à linguagem natural, de modo que é nesta, linguagem natural, que se há de buscar o significado das palavras e expressões que se compõem naquela. Cada vocábulo nela assume significado no contexto no qual inserido. O

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sentido de cada palavra há de ser discernido em cada caso. No seu contexto e em face das circunstâncias do caso. Não se pode atribuir à palavra qualquer sentido distinto do que ela tem em estado de dicionário, ainda que não baste a consulta aos dicionários, ignorando-se o contexto no qual ela é usada, para que esse sentido seja em cada caso discernido. A interpretação/aplicação do direito se faz não apenas a partir de elementos colhidos do texto normativo [mundo do dever-ser], mas também a partir de elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a partir de dados da realidade [mundo do ser].

4. O direito, qual ensinou CARLOS MAXIMILIANO, deve ser interpretado "inteligentemente, não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis".

5. O entendimento sufragado no acórdão recorrido não pode ser acolhido, conduzindo ao absurdo de expropriar-se 150 m² de terra rural para nesses mesmos 150 m² assentar-se colonos, tendo em vista o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.

6. Não violação do preceito veiculado pelo artigo 5º, LIV da Constituição do Brasil e do chamado "princípio" da proporcionalidade. Ausência de "desvio de poder legislativo" Recurso extraordinário a que se dá provimento.

Decisão

A Turma, por votação unânime, acolhendo proposta do Relator, submeteu o exame deste

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caso ao Plenário do Supremo Tribunal Federal. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 11.03.2008.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, deu provimento ao recurso extraordinário. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa. Falou pela Advocacia-Geral da União o Ministro José Antônio Dias Toffoli. Plenário, 26.03.2009.[xxix]

Assim, decidiu o pleno do STF, seguindo o voto então do Min. Rel. Eros Grau, pela desapropriação de toda a fazenda, uma vez que padrões mínimos de razoabilidade não permitiriam que apenas 150 metros quadrados fossem desapropriados para o assentamento de colonos visando o cultivo de bens produtivos alimentícios e medicamentosos. Realmente, não poderia ser essa a intenção do constituinte.

6 CULPA IN VIGILANDO

Outra matéria controversa quando se trata da desapropriação confiscatória pelo cultivo de plantas psicotrópicas é a chamada responsabilização do proprietário pela culpa in vigilando. A matéria tem importância quando, no caso concreto, a propriedade foi utilizada por terceiro, que não o proprietário ou possuidor do imóvel, para o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas. Discute-se, destarte, se o proprietário ou possuidor tem ou não responsabilidade pelo cultivo ilegal, uma vez que não realizou o poder-dever de vigia sobre as terras. Surge a dúvida sobre a natureza da responsabilidade nesses casos, se objetiva ou se subjetiva.

Decisão da primeira turma do TRF – 5ª região, de julgamento da AC 16674/PE, realizado em 12/04/2000, decidiu pela desapropriação de imóvel que havia sido completamente

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abandonado pela proprietária. Confirmou-se também a necessidade de comprovação de envolvimento do proprietário, seja de forma direta ou por negligência, sendo vedada qualquer presunção de culpa:

Ementa

CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO. PLANTAÇÕES DE CANNABIS SATIVA. CULPA IN VIGILANDO DA PROPRIETÁRIA. ABANDONO DAS TERRAS. CONFISCO DA PROPRIEDADE EM SUA INTEGRALIDADE. PRECEDENTE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. "AS GLEBAS DE QUALQUER REGIÃO DO PAÍS ONDE FOREM LOCALIZADAS CULTURAS ILEGAIS DE PLANTAS PSICOTRÓPICAS SERÃO IMEDIATAMENTE EXPROPRIADAS E ESPECIFICAMENTE DESTINADAS AO ASSENTAMENTO DE COLONOS, PARA CULTIVO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS E MEDICAMENTOSOS, SEM QUALQUER INDENIZAÇÃO AO PROPRIETÁRIO E SEM PREJUÍZO DE OUTRAS SANÇOES PREVISTAS EM LEI". (CF/88, ART. 243).

2. NÃO SE PODE PRESUMIR QUE O PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL EM QUE ENCONTRADAS PLANTAS PSICOTRÓPICAS CONCORREU PARA A ILICITUDE. É IMPERIOSA A CABAL COMPROVAÇÃO DE SEU ENVOLVIMENTO, SEJA DE MODO DIRETO, SEJA POR NEGLIGÊNCIA NA VIGILÂNCIA DE SEUS DOMÍNIOS, SEJA, AINDA, POR MERA TOLERÂNCIA.[xxx]

3. A EXPROPRIADA ABANDONOU, POR COMPLETO, O IMÓVEL RURAL

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EXPROPRIADO, NÃO SENDO ENCONTRADA NO ENDEREÇO INDICADO, SENDO DESCONHECIDA E DE PARADEIRO IGNORADO NA REGIÃO; ESTA CIRCUNSTÂNCIA DEMONSTRA QUE A MESMA NÃO POSSUI O MÍNIMO INTERESSE EM PRESERVAR, EM SEU PATRIMÔNIO, O BEM EXPROPRIADO, OMITINDO-SE EM SEU DEVER DE EMPRESTAR-LHE A FUNÇÃO SOCIAL ADEQUADA, CARACTERIZANDO-SE, POIS, A SUA CULPA "IN VIGILANDO".[xxxi]

4. "SE O CONSTITUINTE PRETENDESSE RESTRINGIR A EXTENSÃO EM NORMA QUE DISPÕE ACERCA DA EXPROPRIAÇÃO DE TERRAS ONDE ENCONTRADOS PLANTIOS DE CANNABIS SATIVA, TERIA UTILIZADO AS EXPRESSÕES USUAIS, COMO A PORÇÃO DA GLEBA ONDE FOREM LOCALIZADAS PLANTAS PSICOTRÓPICAS, DESIGNAÇÃO SEMELHANTE". (EAC Nº 13.308/PE, REL. JUIZ ARAKEN MARIZ, JULG. EM 15/05/96, PUBL. DJU DE 07/06/96).

5. APELAÇÃO IMPROVIDA.[xxxii]

Acontece que, posteriormente, o mesmo tribunal firmou entendimento de que a responsabilidade do proprietário, no caso do artigo 243, CF, é objetiva:

Ementa

CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO. ART. 243 DA CF. CULTIVO DE PLANTA PSICOTRÓPICA (MACONHA). FAZENDA CAIÇARA. INTEGRALIDADE DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. - A expropriação prevista no art. 243 da CF deve ser

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extensiva a toda propriedade em que for localizado o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas. - Embora provada a responsabilidade dos expropriados na plantação da "cannabis sativa linneu",prevalece neste tribunal o entendimento de que a responsabilidade na hipótese é objetiva e independe de culpa dos proprietários do imóvel.[xxxiii] - Apelações improvidas.[xxxiv]

Ementa

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. EXPROPRIAÇÃO. DE GLEBAS. CULTIVO ILEGAL DE PLANTAS PSICOTRÓPICAS (MACONHA). ART. 243, DA CF/88. LEI Nº8.257/91. DECRETO 577/92. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PROPRIETÁRIO.

I. O art. 243 da Constituição Federal instituiu importante mecanismo de combate ao tráfico ilícito de entorpecentes, ao permitir a imediata expropriação de quaisquer terras onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas.

II. Não haverá prescrição no que tange ao prazo de promoção da desapropriação do art. 243 da Carta Magma, posto que a Lei que regula essa espécie de expropriação silencia a respeito.

III. O cultivo de plantas psicotrópicas, sem a devida autorização da autoridade competente, caracteriza-se por ilícito que acarretará na desapropriação sem direito à indenização.

IV. O Pleno desta Corte Regional já se posicionou no sentido de que é objetiva a responsabilidade do proprietário de terras

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destinadas para o plantio de espécies psicotrópicas, sendo em conseqüência irrelevante, a existência ou inexistência de culpa na utilização criminosa.[xxxv] (AR nº 4.842 - PE, Pleno, Rel. Des. Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, julg. 21.09.2005, publ. 28.10.2005). [xxxvi]

V. APELAÇÃO IMPROVIDA.

Na decisão do RE nº 543974/MG, já citada anteriormente, o Supremo Tribunal Federal não discutiu a questão da responsabilidade subjetiva ou objetiva.

Recentemente, reconheceu o mesmo tribunal a repercussão geral em matéria contida no Recurso Extraordinário nº 635336, que visa a definição de qual a responsabilidade – objetiva ou subjetiva – de proprietário de terra na qual foram cultivadas plantas psicotrópicas. [xxxvii]

O recurso foi interposto em fevereiro deste ano pelo Ministério Público Federal, contra decisão do TRF – 5ª região, em posicionamento análogo aos apresentados em suas ementas acima reproduzidas. O MPF alega violação ao caput do artigo 243 da Magna Carta, uma vez que a responsabilidade do proprietário de imóvel onde forem encontradas plantas psicotrópicas é subjetiva e não objetiva, como já vinha decidindo esse TRF. [xxxviii]

Na verdade, o que defende o MPF é que seja demonstrada a culpa ou o dolo do proprietário para que haja desapropriação-confisco. Nos autos, o Procurador-Geral da República afirma que o espírito da constituição “é punir o criminoso, não o terceiro de boa-fé”.[xxxix]

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Assim, percebe-se que a desapropriação confiscatória constitui a forma mais gravosa de intervenção do Estado na

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propriedade privada, justificada pela necessidade de combater o cultivo de plantas psicotrópicas e, consequentemente, o tráfico ilícito de entorpecentes.

Ademais, tal mister deve ser visto, hodiernamente, sob uma perspectiva global, já que tem sido perseguido não apenas pelo ordenamento jurídico pátrio, mas pela grande maioria das nações, seja através de normas internas, seja através de instrumentos jurídicos internacionais.

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NOTAS:

[i] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 21. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 852.

[ii] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 149.

[iii] GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 622.

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[iv] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 853.

[v] BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 20 jun. 2011.

[vi] ibid.

[vii] Grifo nosso

[viii] Grifo nosso

[ix] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 853.

[x] ibid.

[xi] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 834.

[xii] BRASIL, loc. cit.

[xiii] CARVALHO FILHO, op. cit., p.854.

[xiv] Grifo do autor

[xv] Grifo do autor

[xvi] ibid.

[xvii] DI PIETRO, op. cit., p. 176.

[xviii] ibid.

[xix] ibid.

[xx] BRASIL, loc. cit.

[xxi] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 853.

[xxii] Grifo do autor

[xxiii] CARVALHO FILHO, op. cit., p. 853-854.

[xxiv] Grifo nosso

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[xxv] AC 13308/PE. Relator: Desembargador Federal Francisco Falcão. Julgamento em: 12/09/1994, publicado no DJ de 07/04/1995. Disponível em <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/90583/apelacao-civel-ac-13308-pe-920505404-6-trf5>. Acesso em 13 ago. 2011.

[xxvi] Grifo nosso

[xxvii] AC 180933/PE. Relator: Desembargador Federal Castro Meira. Julgamento em: 25/10/2000, publicado no DJ de 16/03/2001. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/129110/apelacao-civel-ac-180933-pe-990541161-5-trf5>. Acesso em 13 ago. 2011.

[xxviii] Grifo nosso

[xxix] RE 543974/MG. Relator: Min. Eros Grau. Julgamento em: 26/03/2009, publicado no DJ de 29/05/2009. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/4130696/recurso-extraordinario-re-543974-mg-stf>. Acesso em 13 ago. 2011.

[xxx] Grifo nosso

[xxxi] Grifo nosso

[xxxii] AC 16674/PE. Relator: Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante. Julgamento em: 12/04/2000, publicado no DJ de 30/06/2000. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/123380/apelacao-civel-ac-16674-pe-990531666-3-trf5>. Acesso em 13 ago. 2011.

[xxxiii] Grifo nosso

[xxxiv] AC 304272/PE. Relator: Desembargador Federal Ridalvo Costa. Julgamento em: 23/05/2007, publicado no DJ de 13/06/2007. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/261354/apelacao-civel-ac-304272-pe-20020500023208-6-trf5>. Acesso em 13 ago. 2011.

[xxxv] Grifo nosso

[xxxvi] AC 442212/PE. Relatora: Desembargadora Federal Margarida Cantarelli. Julgamento em: 02/12/2008, publicado no DJ

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[xxxvii] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. STF analisará responsabilidade de proprietário de terra com cultivo de maconha. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=180787>. Acesso em: 16 ago. 2011.

[xxxviii] ibid.

[xxxix] ibid.

 

   

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SISTEMA DE MEAÇÃO E HERANÇA DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE

THIAGO NUNES LEITE: Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Camilo Castelo Branco.

Orientador: Thalita Toffoli Páez[1].

RESUMO: A sucessão envolve a ideia de substituição de um titular por outro, mantendo-se a continuidade das relações jurídicas, ocorre a modificação de sujeitos, mas subsiste o conteúdo; não há alteração na substância do direito, que já se acha integralmente constituído, mas encerrando-se com a morte o ciclo da atividade pessoal e patrimonial do seu titular, é preciso que este seja substituído no posto vago. No presente trabalho é analisada a sucessão hereditária do cônjuge no âmbito do Código Civil vigente. Realizado o estudo com base nas publicações mais relevantes para a pesquisa, concluiu-se que o cônjuge elevado à categoria de herdeiro necessário pode perfeitamente ser privado do direito sucessório, caso tenha praticado as causas taxativas que acarretam a exclusão pela indignidade, atingindo, assim, sua cota hereditária que vier a receber em concorrência com descendentes ou ascendentes; também sustentou-se pela alteração do dispositivo com a inclusão do cônjuge entre os sancionados pela deserdação, por inúmeras injustiças que a lacuna existente pode provocar, muito embora se tenha defendido que a separação judicial seja um caminho direto para exclusão do cônjuge da sucessão. Verificou-se ainda que, com o advento do atual Código Civil brasileiro, a tutela sucessória do cônjuge encontrou melhor estrutura normativa, privilegiando sua posição sucessória, elevando-o à categoria de herdeiro necessário.

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PALAVRAS-CHAVE: Direitos de Sucessão. Novo Código Civil. Direitos do Cônjuge.

ABSTRACT: The sequence involves the replacement idea of the holder on the other, keeping the continuity of legal relationships, is subject to modification but remains content; there is no change in the substance of the law, which already finds himself fully built up, but ending with the death cycle of personal and property activity of its owner, it is necessary that this be replaced in the vacant post. In this paper we analyzed the hereditary succession of a spouse under the current Civil Code. Conducted the study based on the most relevant publications for research, it was concluded that the high spouse to the necessary heir category may well be deprived of inheritance law, if you practiced the exhaustive causes that lead to exclusion by the indignity, reaching thus his hereditary quota that may receive in competition with descendants or ascendants; also supported by the device change to include the spouse of the sanctioned disinheritance, for numerous injustices that the gap can cause, even though it has been argued that the legal separation is a direct path to exclusion of the spouse of succession. It was also found that, with the advent of the current Brazilian Civil Code, succession tutelage of spouse found better regulatory framework, favoring his succession position, elevating it to the necessary heir category.

KEY-WORDS: Rights of Succession. New Civil Code. Rights of Spouse.

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 O DIREITO DAS SUCESSÕES. 2.1 Da Sucessão em Geral. 2.2 Das modalidades de sucessão. 3 DIREITOS DO CÔNJUGE. 3.1 O sujeito do casamento. 3.2 O cônjuge no direito sucessório. 3.2.1 Igualdade entre casados e conviventes. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.

1 INTRODUÇÃO

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A sucessão hereditária do cônjuge no âmbito do Código Civil vigente foi levada a efeito pela promulgação da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

O referido Código Civil, fruto de longo processo legislativo que, pode-se dizer, iniciou há mais de cento e cinquenta anos. Isto porque não se trata de uma criação, mas de uma revisão ao Código Civil de 1916.

Nesse sentido, há profundas inovações quanto a matéria relativa à sucessão do cônjuge e do companheiro. Foi esta, certamente, a maior alteração feita pelo novo Código em matéria de Direito das Sucessões. Melhorou muito o novo Código.

O direito das sucessões é tratado há muito tempo, tanto que no direito romano, fazia parte do “jus civile”, ao lado do direito das coisas e do direito de família. Assim, no princípio dos tempos, a sucessão dava-se no âmbito religioso, ou seja, o “de cujus” era sucedido, no comando do culto familiar. Ao varão mais velho, descendente do falecido, competia a direção da vida religiosa, doméstica e também do acervo dos bens da família.

Conforme destaca Delben, após, esta época, onde o patrimônio era familiar e não do morto, passou-se à propriedade individual, e assim, a preocupação passou em se deixar o patrimônio do falecido dentro das posses da sua família, para evitar a repartição daquele.

Já no período medieval, a sucessão não acontecia, vez que os bens eram do Estado, e só estavam sob a posse ilegítima do falecido, e com sua morte os bens voltavam para aquele.

E, por fim, no direito das sucessões dá-se o alinhamento do direito de família ao direito de propriedade, e aqui, a família não se preocupa apenas com a continuidade patrimonial, conquistados com a economia e com o trabalho, mas, sim, com a perpetuidade da família, agregando-se assim, a ordem sucessória entre os colaterais, cônjuges e recentemente, os companheiros.

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Desse modo, no curso da história, viu-se que ora o patrimônio era relevante ora não, ora o que era sucedido era a direção da família e do culto religioso, ora os bens de família, isto quando esses não eram do Estado.

Viu-se com Pieri que o direito das sucessões sofreu inúmeras alterações no decorrer dos tempos, notadamente na classificação dos herdeiros conforme a ordem de vocação hereditária, determinada por lei e segundo uma hierarquia que coloca os sucessores em graus de preferência em relação ao sucessível e conforme a classe a que pertencem.

Esta ordem de vocação hereditária corresponde ao deferimento sucessório aos herdeiros legítimos, nos termos do artigo 1.786 do atual Código Civil, onde se dispõe que a sucessão se dá por lei ou disposição de última vontade. Assim, falecendo a pessoa sem testamento, o artigo 1.788 normatiza que se transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento, subsistindo a sucessão legítima se o testamento caducar ou for julgado nulo.

Dessa forma, não havendo testamento, a sucessão legítima é aplicada por inteiro ou na parte em que o testamento for omisso, fazendo-se o chamamento dos sucessores segundo a ordem de vocação hereditária.

Ainda segundo Pieri, foi justamente na alteração da ordem de vocação hereditária, por intermédio do artigo 1.829 do Código Civil vigente, que o legislador inovou o direito sucessório do cônjuge sobrevivo, incluindo-o como herdeiro necessário e concorrendo, em certas situações, com descendentes ou ascendentes. Para que seja reconhecido o direito sucessório ao cônjuge sobrevivo, o legislador impõe restrições, envolvendo o regime de bens do casamento, bem como, a distribuição da quota hereditária entre descendentes comuns, com a reserva da quarta parte ao cônjuge sobrevivo.

A nova posição sucessória é benéfica ao cônjuge sobrevivo; porém, as restrições impostas pelo legislador geram controvérsias

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doutrinárias, bem como pelo fato de que, ao inseri-lo como herdeiro necessário, esqueceu-se de harmonizar os demais dispositivos que tratam da matéria, notadamente os que cuidam da colação e deserdação, deixando lacunas na forma de aplicação ao cônjuge.

Sendo assim, com a inovação legislativa e as omissões existentes, imprime relevância a temática, motivo pelo qual no decorrer da presente pesquisa é demonstrado, com enfoque na sucessão legítima e utilizando-se de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, a forma de aplicação do direito sucessório ao cônjuge, ressaltando sua nova posição sucessória e a concorrência com descendentes, ascendentes e seus respectivos quinhões.

2 O DIREITO DAS SUCESSÕES

O Direito das Sucessões está previsto no inciso XXX do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 no rol dos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. Conforme descrito por Cahale (2007, p. 23);

No Código Civil, a matéria é tratada no Livro V, em quatro títulos a saber:

Título I – Da sucessão em geral – (artigos 1.784 ao 1.828): disciplina as normas gerais pertinentes à sucessão legítima, à sucessão testamentária e à sucessão do companheiro; da herança e sua administração e à vocação hereditária. Estabelecendo regras que abrangem a abertura, transmissão, posse, titularidade, aceitação e renúncia da herança, dos excluídos da sucessão, da herança jacente e petição de herança;

Título II – Da sucessão legítima – (artigos 1.829 ao 1.856): regula a sucessão que se opera por força de lei, as regras atinentes à transmissão do patrimônio seguido de normas

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expressas descritas na ordem de vocação hereditária;

Título III – Da sucessão testamentária – (artigos 1.857 ao 1.990): contém disposições relativas à transmissão de bens para após a morte, por ato de última vontade;

Título IV – Do inventário e da partilha – (artigos 1.991 ao 2.027): trata das normas procedimentais pelas quais se efetua a partilha dos bens entre os herdeiros e normas pertinentes à colação e aos sonegados;

Livro Complementar - Das Disposições Finais e Transitórias do Código Civil - artigos 2.028 ao 2.046.

O referido autor também indica que, no Código de Processo Civil, a matéria é tratada sob o aspecto processual, nos artigos 982 ao 1.045, do Capítulo IX do Livro IV dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa.

A introdução da Lei n. 11.441, de 04 de janeiro de 2007, que alterou os artigos 1º e 2º, ambos da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, facultando a realização de inventário e partilha consensual por via administrativa.

2.1 Da Sucessão em Geral

Com a morte da pessoa natural, abre-se a sucessão nos precisos termos da legislação civil, transmitindo-se aos herdeiros legítimos e testamentários o seu lugar nas relações jurídicas.

Conforme explanado por Cahale (2007), o patrimônio é objeto de direito que não se extingue com a morte, os sucessores sub-rogam-se nos direitos e obrigações sobre os bens do morto, excetuando-se tão somente aquelas relações jurídicas não

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patrimoniais, e as de caráter personalíssimo, que com o morto se extinguem.

Os herdeiros respondem pelos encargos deixados pelo morto no limite da quota herdada, conforme dispõe o art. 1.792 CC, com a seguinte redação: “o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a excuse, demonstrando o valor dos bens herdados”.

No entanto, é oportuno observar que mesmo os não patrimoniais comportam as suas exceções, conforme disserta Gama (2003), é imperioso ressaltar que a sucessão causa mortis não se restringe a referir-se às situações jurídicas patrimoniais, abrangendo inúmeros aspectos relacionados às situações jurídicas existenciais, como na eventualidade de reconhecimento de filhos em testamento, nomeação de tutores e testamenteiros, disposições testamentárias em favor de pessoas pobres de certas localidades, a transmissão mortis causa de alguns direitos morais do autor de obra científica, artística ou literária, entre outras.

Para Cahali e Hironaka (2003, p. 31), entretanto,

são excluídas da herança as relações jurídicas não patrimoniais e as personalíssimas, mesmo com conteúdo econômico, tituladas pelo falecido, como por exemplo, o pátrio poder, a tutela, a curatela eventualmente exercidos pelo de cujus, o usufruto, o uso, o direito real de habitação, as rendas vitalícias, a pensão previdenciária, o contrato de trabalho, porque o sucessor não é a continuação da pessoa do de cujus.

Na lição de Oliveira (1987, p. 22), “a ideia de sucessão está toda na permanência de uma relação de direito que perdura e subsiste a despeito da mudança dos respectivos titulares”.

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Nesse sentido, Gomes (2012, p. 5) conceitua:

A expressão sucessão hereditária emprega-se nos sentidos objetivo e subjetivo. No sentido objetivo, é sinônimo de herança, massa de bens e encargos, direitos e obrigações que compunham o patrimônio do defunto. No sentido subjetivo, equivale ao direito de sucede, isto é, de recolher os bens da herança.

Completando o conceito, Rodrigues (2002, p. 3) aduz que o direito das sucessões se apresenta como um conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores. A definição usa a palavra patrimônio, em vez de referir-se à transmissão de bens ou valores, porque a sucessão hereditária envolve a passagem, para o sucessor, tanto do ativo como do passivo do defunto.

Cumpre salientar, conforme destacado por Reis e Reis (2013), que o precípuo objetivo do direito sucessório é disciplinar a transmissão de bens deixados por uma pessoa após sua morte, demonstrando o seu destino, observando-se a existência de manifestação de última vontade e/ou a determinação legal.

Venosa (2012) acrescenta ainda que, na sucessão, ocorre a substituição do titular de um direito por outra pessoa. Quando o conteúdo e o objeto da relação jurídica permanecem os mesmos, mas mudam os titulares da relação jurídica, com uma substituição, diz-se que houve uma transmissão no direito ou uma sucessão. Destarte, sempre que uma pessoa tomar o lugar de outra em uma relação jurídica, há uma sucessão.

Neste mesmo sentido é a opinião do doutrinador Monteiro (2006, p. 1), dizendo que a palavra sucessão significa o ato pelo qual uma pessoa toma o lugar de outra, investindo-se, a qualquer título, no todo ou em parte, nos direitos que lhe competiam.

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Feitas estas breves considerações a respeito do direito sucessório resta determinar o momento da abertura da sucessão, e, nesse desiderato, impõe-se esclarecer, que a lei a qual se deve considerar para efeito de partilha é a que estava em vigência no momento da abertura da sucessão, ou seja, no momento da morte do respectivo titular.

Diante do exposto, Reis e Reis (2013) concebem que seria possível que, hoje, tenhamos a aplicação do Código anterior, mesmo durante a vigência do Código Civil de 2002.

2.2 Das modalidades de sucessão

Segundo Carvalho Neto (2005), sucessão, em sentido comum, implica a ideia de transmissão de bens. Suceder, no dizer de Venosa (2012), substituir, tomar o lugar de outrem, no campo dos fenômenos jurídicos.

Etimologicamente, “sucessão” adveio do termo latino sucessio, que deriva por sua vez do verbo succedere (ir para debaixo de, vir debaixo, vir para o lugar de, tomar o lugar de, vir depois, vir em seguida)7. Sendo assim, teríamos sucessão legal ou voluntária, a título gratuito ou a título oneroso, inter vivos ou causa mortis. No Direito das Sucessões, contudo, só cuidamos da sucessão gratuita causa mortis.

Nesse sentido, Rodrigues (2002) define o Direito das Sucessões como “o conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores”.

Em sentido objetivo, a expressão designa o conjunto de normas relativas à transmissão dos bens; em sentido subjetivo, o direito de uma pessoa a receber a herança de outrem.

Quanto à fonte, a sucessão pode ser testamentária ou legítima. Testamentária, se baseada em testamento; legítima, ao contrário, se fundada na lei, por não haver testamento válido e

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eficaz, ou não abranger ele todos os bens. Quanto aos efeitos, a sucessão pode ser universal ou singular. Universal é a sucessão em que se transfere toda a herança, ou uma quota ideal dela, sem discriminação de bens; singular, ao contrário, é a sucessão em bens individuados.

Conforme explica Carvalho Neto (2005), à sucessão universal chama-se herança; à sucessão singular, legado. Se se deixa em testamento, metade dos bens a outrem, ter-se-á uma sucessão a título universal; se, ao contrário, deixa-se uma determinada casa, a sucessão se dará a título singular.

Nada impede, contudo, que, instituindo herdeiro, designe bens concretos para preencher a sua quota, o que não desvirtuará a sua condição de herdeiro. Assim, observa-se que a sucessão legítima é sempre universal, ao passo que a sucessão testamentária pode ser universal ou singular. Um outro fator distintivo entre herança e legado: só o herdeiro continua a posse do autor da sucessão, enquanto o legatário tem uma posse nova (CARVALHO NETO, 2005).

Para Carvalho (2015), a sucessão legítima ocorre na ausência de testamento, ou seja, quando ode cujus falece ab intestato, ou se o testamento for nulo, caduco ou não dispôs de todos os bens (art.1.788,CC), observando que a capacidade para suceder é a do tempo da abertura da sucessão, conforme art. 1.787, CC.

Na ausência do testamento o legislador estabelece que a herança será deferida a determinadas pessoas obedecendo certas preferências denominadas ordem de vocação hereditária.

Os herdeiros legítimos herdam na seguinte ordem, conforme estabelece o art. 1.829 do Código Civil: os descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se este era casado com o autor da herança no regime de comunhão universal de bens, de separação obrigatória ou comunhão parcial se o falecido não deixou bens particulares; os ascendentes, em concorrência com o cônjuge, qualquer que seja o regime de bens; o cônjuge

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sobrevivente, na hipótese de ausência de ascendente e descendente será herdeiro único, qualquer que seja o regime de bens; os colaterais até o quarto grau.

O art. 1.829 não incluiu na ordem de vocação hereditária o companheiro(a), entretanto, por força do art. 1.790, também do Código Civil, que alterou os direitos do companheiro previstos nas Leis 8.971/94 e 9.278/96, estabelece que também herdará na sucessão legítima em concorrência com os descendentes, ascendentes e colaterais, sendo herdeiro único na ausência destes parentes.

Cada grupo de herdeiros, estabelecido pelo art. 1.829 do Código Civil, é chamado de classe, portanto, se não houver herdeiros na classe dos descendentes, convoca-se a classe dos ascendentes. Inexistindo herdeiros a herança será transferida ao Município, Distrito Federal ou União (art. 1.844, CC).

O Código Civil vigente incluiu o cônjuge entre os herdeiros necessários (art. 1.845), portanto o autor da herança não pode dispor em testamento de mais da metade dos bens se for casado (art. 1.846) e será herdeiro único, qualquer que seja o regime de bens, desde que não esteja separado judicialmente ou de fato há mais de dois anos, salvo se não teve culpa (art. 1830).

A possibilidade de discussão de culpa na separação de fato do casal no direito sucessório vai gerar grande discussão na doutrina e jurisprudência, posto que a cada dia se fortalece a corrente que exclui a discussão de culpa do casal na separação judicial e estendê-la, do direito de família ao sucessório, é no mínimo um retrocesso.

Não há que confundir meação (efeito da comunhão dos bens) com o direito hereditário (que independe do regime, salvo se concorrer com descendentes). A meação pertence ao cônjuge sobrevivente por direito próprio e não por herança, sendo intangível (não pode ser privada por indignidade ou deserdação).

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Os herdeiros são os sucessores do falecido, contemplando a legislação brasileira, algumas formas de sucessão, como a legitima, a testamentária e a mista.

Porém, antes de tratar sobre estas é necessário esclarecer que existem duas formas de sucessão no direito, uma delas é aquela que ocorre por ato entre vivos, como uma transação comercial, uma doação, sendo a outra modalidade aquela que ocorre após a morte de alguém. Nesta modalidade, os sucessores receberão os direitos e/ou obrigações do de cujus, sendo esses sucessores os herdeiros ou os legatários.

Verifica-se, pois que no direito sucessório, as pessoas que recebem a herança são chamadas de herdeiros, sendo necessários aqueles que não podem ser afastados da sucessão por mera liberalidade do falecido, são eles: os descendentes, os ascendentes e os cônjuges. Assim, o de cujus, obrigatoriamente deverá deixar metade de seus bens a esses, o que se chama de sucessão legítima, e a outra metade poderá dispor em testamento, que seria a sucessão testamentária.

Por isso, Venosa (2012) esclarece que, a sucessão dependerá da vontade do falecido, quando esse deixa um testamento, sendo uma: a sucessão testamentária, e a outra chamada de sem testamento, a sucessão ab intestado. Porém, para melhor compreensão da disciplina os operadores do direito acabam por classificar a sucessão em três maneiras, ou seja, a legítima, aquela descrita na lei; a testamentária, aquela onde o sucedido deixa um testamento sobre a disposição de seus bens, se não tem herdeiro necessário (descendentes, ascendentes e cônjuge), poderá dispor de 100% de seu patrimônio, do contrário, poderá testar apenas 50% desse acervo; já na sucessão mista, quando a pessoa falecida deixa parte de seus bens, no testamento e parcela sem estar descrita no testamento, e aqui o patrimônio deverá ser partilhado, como na sucessão legítima, que é o chamamento dos herdeiros que sucederão bens, direitos e obrigações do falecido que findou ab intestato.

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Esse chamado obedece a uma ordem de vocação hereditária, sendo que os parentes mais próximos ao herdar excluem os demais, os subsequentes. Assim, os ascendentes mais próximos excluirão os mais remotos (nesse sentido, pai e mãe como herdeiros, os avós não herdarão), ao passo que se houver igualdade de grau e diversidade de linha ambos lados receberão proporcionalmente os bens deixados pelo extinto.

A sucessão legítima está prevista no art. 1829 do Código Civil de 2002. Porém, o art. 1836 desse Código, esclarece que a falta de descendentes traz à sucessão os ascendentes, que concorrerá com o cônjuge sobrevivente, sendo que os parágrafos da citada norma estabelecem que não haverá distinção de linhas sucessórias.

Já no tocante à sucessão testamentária, Delben (2010, p. 81) explica que esta acontece quando um sujeito de direitos, maior de dezesseis anos, em gozo de suas faculdades mentais, conforme art. 1.860 do Código Civil resolve por disposição de última vontade contemplar determinadas pessoas em seu testamento.

Compreende-se, a partir das explanações do referido autor, que o cônjuge habilitado a suceder é aquele que é casado sob o regime da comunhão parcial de bens, disciplinado nos arts. 1658 a 1666 do Código Civil de 2002, onde os bens adquiridos posteriormente ao casamento fazem parte da meação, porém, os bens particulares são objetos de partilha da herança para o consorte supérstite, como herdeiro necessário em concorrência com descendentes e ascendentes conforme art. 1845 desse codex, ainda que, uma das partes não tenha bens a inventariar em razão de seu falecimento.

Porém, há que se destacar que o cônjuge perderá a capacidade sucessória, quando da separação judicial ou do divórcio, porque como “[…] a dissolução da sociedade conjugal acarreta a ausência de legitimidade do cônjuge para suceder.”

Mesmo em caso de ausência de culpa, decretada a separação judicial do casal um não poderá mais suceder com a

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morte do outro. Assim, podem-se concluir, ao analisar o art. 1830 do Código Civil de 2002, que as hipóteses de exclusão do cônjuge da sucessão, seria o caso da separação judicial, posto que ainda que permaneça o vínculo conjugal, que só é rompido no divórcio ou na morte, a sociedade conjugal é desfeita, nos moldes do art. 1571 desse Código. Outro motivo seria a separação de fato há mais de dois anos, desde que o sobrevivente seja culpado pela separação.

Desta constatação acima, Caio Mário da Silva Pereira esclarece que é necessária a homologação da separação judicial do casal em caso de separação consensual e no caso da separação litigiosa, esta deverá contar com sentença transitada em julgado, sob pena de a morte absorver esse estado e ao invés de separado a pessoa passará a ser viúva, pois não houve a chancela judicial.

Para Paulo Nader há, ainda, outra possibilidade de exclusão do cônjuge da sucessão, que seria o caso do falecimento de um deles durante a ação que requeresse a invalidação do casamento. Assim, se, o sobrevivente soubesse do vício do casamento, esse não herdaria, ao passo, que se tivesse de boa-fé, o casamento seria putativo e o supérstite, concorreria à herança e se o de cujus, não tivesse deixado nem descendentes nem ascendentes, o viúvo herdaria a totalidade do acervo patrimonial do extinto. Há que se advertir, porém que, com a reconciliação do casal, antes de decretado o divórcio em conformidade com o art. 1577 do Código Civil de 2002, restabelece os direitos dos pares, até mesmo o sucessório.

O companheiro também poderá ser herdeiro e meeiro do seu par falecido. Quanto à meação, estabelece o art. 1.725: “na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.” Conforme se verifica no art. 1829 do Código Civil de 2002, já mencionado, a sucessão legítima, não contemplou a possibilidade de participar da sucessão dos bens particulares deixados pelo de cujus, sendo que esses só aproveitarão os bens adquiridos onerosamente, durante o período que vigeu a união

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estável entre o casal nos moldes do art. 1790 do Código Civil de 2002.

Resguardando-se os bens adquiridos que o falecido, em vida havia conquistado por doação ou por herança, percebe-se com a interpretação do artigo acima, que no tocante aos bens adquiridos onerosamente, os primeiros a herdar serão os descendentes. Se, o falecido, não os tiver deixado os ascendentes serão chamados à sucessão e após os colaterais até o quarto grau. Assim, só ai se não tiver nenhum desses parentes é que o companheiro poderá receber a totalidade do patrimônio que era do extinto.

3 DIREITOS DO CÔNJUGE

3.1 O sujeito do casamento

Assim vos declaro marido e mulher. Com esta celebre frase, o padre ou pastor conjuga os esposos na celebração do matrimônio religioso, passando aqueles de um ser individualizado para um ser uno, esposo e esposa e Deus, o mesmo acontecendo quando o juiz de paz declara que aos olhos da lei, marido e esposa formam um casal.

Na pesquisa de Delben (2010), os personagens são os cônjuges e os companheiros supérstites. O autor destaca, porém, que, no campo do direito, tem-se que exprimir que só é cônjuge aquele que contrai núpcias com outrem, respeitados o grau de afinidade e de vontade, para o ato, e cônjuge seriam “[…] pessoas conjugando suas vidas intimamente, por um afeto que as enlaça especialmente, quanto aos fins e aos meios de vivência, convivência e sobrevivência”.

O Código Civil de 2002, trata em seu art. 1.521 sobre os impossibilitados de casar, como os ascendentes com os descentes e dos adotantes ou os adotados com os cônjuges um do outro. Também não podem se casar os irmãos (independente se unilaterais ou bilaterais) e os demais colaterais, bem como, as pessoas, ainda casadas também não podem se casar novamente,

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e, tampouco, podem o cônjuge sobrevivente com aquele que foi condenado por homicídio ou tentativa de homicídio de seu consorte.

Por ser o Brasil um país católico, a Constituição Federal de 1988, embora resguarde todas as formas de entidade familiar, prima pelo casamento, sempre privilegiando a união entre homens e mulheres que se entrelaçam civilmente, tanto que não dificulta a conversão da união estável em casamento. Assim, na busca de conceituar o que seja cônjuge, Barros (2004) defende que: “Cônjuges são, como o próprio nome diz, os que se sentem conjugados por uma origem ou destino de vida em comum. Nessa conjugação de vidas, atua o afeto”.

O casamento se consuma em face da affectio maritalis, que cria entre os esposos uma expectativa de direito consubstanciada no respeito, na convivência, na ajuda mútua, na sinceridade recíproca, no relacionamento duradouro e na observância de princípios e de valores que devem reinar na intimidade da sociedade familiar formada. Sobre o casamento, Dias (2003) se pronuncia esclarecendo que, embora a lei não conceitue casamento, ele é fundamento da sociedade, constituído pela vontade dos pares, que tem a liberdade de unirem-se, tendo forma definida em lei.

Desta maneira, nada mais justo do que encarar o afeto como um direito individual, que não pode ser negado a qualquer pessoa, por ser um direito fundamental135, de primeira dimensão, sendo o “direito ao afeto a liberdade de afeiçoar-se um ao outro”136, direito esse que está “implícito na Constituição, cujo § 2º do art. 5º admite direitos que, mesmo não declarados, decorram do regime e princípios por ela adotados.”

Assim, o casamento é a união mais comum de afeiçoarem-se homens e mulheres, tornando-os esposos, por afeto e vontade própria, com intuito de formarem família e que obedece a procedimentos ditados em lei.

3.2 O cônjuge no direito sucessório

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Conforme descrito por Delben (2010), as entidades familiares consagradas no ordenamento jurídico brasileiro são aquelas formadas pelo casamento, pela união estável, pela monoparentalidade, amparando-se também, pela evolução dos tempos, a família socioafetiva, aquela formada pelos padrastos e madrastas com os enteados, filhos exclusivos de seu par, porém, afetivamente considerados com se seus fossem.

Ocorre, porém, que se reconhece como casais, aqueles participes unidos pelo casamento e pela união estável, que poderão partilhar, mear e herdar bens e obrigações quando do falecimento de seu consorte, obedecendo critérios trazidos pelo Código Civil de 2002, que já estavam sendo consagrados pela jurisprudência, quando reconhecia a sociedade de fato havida entre aqueles que viviam como se casados fossem, tanto que a Constituição Federal de 1988, consagrou esta família, que foi regulamentada pelas leis 8971 de 29 de dezembro de 1994 e 9278 de 10 de maio 1996.

Ainda para Carvalho (2015, p. 2), O Código Civil de 2002 introduziu diversas inovações quanto ao cônjuge no direito sucessório, estando atualmente na situação jurídica de herdeiro necessário, herdeiro concorrente com descendentes e ascendentes, herdeiro único, conferindo-lhe ainda direito real de habitação e de ser preferencialmente o inventariante.

A primeira inovação foi incluí-lo entre os descendentes e ascendentes como herdeiro necessário nos bens e não apenas no direito a usufruto, não podendo o autor da herança dispor de mais da metade dos bens se for casado, ainda que não possua descendentes e ascendentes (art. 1.845 e 1.846), sendo necessário, para exclusão do cônjuge, que exista justa causa que autorize deserdação ou atos de indignidade, não se aplicando o disposto no art. 1.850.

Na mesma ordem de vocação hereditária do Código de 1916, o atual Código Civil mantém o cônjuge como herdeiro único. Assim, na ausência de descendentes e ascendentes recebe por inteiro a

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herança, independentemente do regime de bens (art. 1.838), desde que não estivesse separado judicialmente, posto que dissolvida a sociedade conjugal (art. 1.830, 1ª parte).

O novo Código Civil inovou porém ao estabelecer a exclusão do cônjuge na sucessão se estiver separado de fato há mais de dois anos (art. 1.830, 2ª parte), admitindo-se, entretanto, que o cônjuge herdeiro comprove que não teve culpa no rompimento da convivência, sendo reconhecido, neste caso, o seu direito sucessório.

3.2.1 Igualdade entre casados e conviventes

No intuito de resolver a indagação a respeito de que são ou não tratados com igualdade as entidades familiares formadas pelo casamento e pela união estável, no direito sucessório, faz-se necessário um breve estudo sobre o tratamento igualitário entre os gêneros sexuais, para após, solucionar a questão.

Pinho (2005) esclarece que se entende por gênero o conjunto de conceitos essenciais vocacionado a aportar elementos metodológicos e teóricos centrados nas relações sociais e culturais que são elaboradas e construídas entre os sexos.

O homem sempre foi considerado um ser “privilegiado, dotado de alguma coisa a mais, ignorada pelas mulheres: o mais forte, mais inteligente, mais corajoso, mais responsável, mais criativo ou mais racional. Sempre havia um mais para justificar a relação hierárquica com as mulheres, ou pelo menos com a sua”.

Isto porque,

[…] o dualismo masculino-feminino é transposto para o discurso jurídico numa perspectiva hierárquica em que o nível superior é identificado ao homem. O discurso jurídico também esconde uma ideologia sexista que, fazendo constante referência ao princípio da

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igualdade, recusa-se a reconhecer as reais desigualdades entre os sexos (MONTEIRO, 2003, p. 30-31).

Segundo Hermann (2001, p. 7), os “costumes e práticas sociais ainda continuam a ser obstáculos para a implementação da igualdade e da equidade de gênero”, porém, mesmo que existam diferenças físicas e históricas, estas não podem constituir em fatores determinantes para uma possível dominação desse em relação àquela (PINHO, 2005).

Somando partido aos que pregam a igualdade entre os pares, sejam eles casados ou conviventes e fulminando a idéia de arbitrariedade no tratamento, verifica-se que “o art. 1º do atual Código Civil utiliza o termo pessoa, não mais homem, como fazia o art. 2º do Código Civil de 1916, deixando claro que não será admitida qualquer forma de distinção decorrente do sexo”.

O princípio da igualdade dos cônjuges baseia-se em “uma nova forma de comunidade afetiva, […] em total paridade de deveres, consideradas as funções de ajuda mútua e a conseqüente divisão dos resultados econômicos surgidos desta parceria, isto por que o que se pretende é a preservação da dignidade da pessoa humana. De fato, o desrespeito à dignidade da pessoa humana da mulher e aos seus direitos da personalidade são os elementos essenciais que compõem o seu problema histórico e nuclear: a desigualdade na distribuição de toda a sorte de bens da vida.

Madaleno (2005/2006) interpreta esta determinação dizendo que direitos e deveres de cônjuges e companheiros “recebem a tutela integral do Estado, sem restrições pelo gênero. Os direitos dos seus membros são autônomos, e suas decisões passam a ser sempre tomadas em conjunto, e a benefício da sociedade familiar”.

Assim, analisando os arts. 1.566 e 1.567, do Código Civil de 2002, se verifica que dentre os deveres dos casados estão a fidelidade, coabitação, respeito, mútua assistência, guarda e sustento dos filhos, cabendo a ambos a direção da sociedade

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conjugal, sob pena de que se existirem conflitos, esses poderão ser solucionados por uma decisão judicial. Desse modo, não existe tratamento diferente entre os pares, eliminando-se assim, a posição de inferioridade com que a mulher era vista.

Após as considerações a respeito de que não mais existem diferenças entre homens e mulheres, posto que ambos tem direitos e deveres dentro de uma sociedade conjugal debruça-se a indagação se são equiparados os cônjuges aos companheiros, devendo ser observados as questões que os equipara e os diferencia, mesmo porque não existindo motivo para tratar as pessoas de maneiras desiguais é porque o tratamento deverá dado de maneira igual (DELBEN, 2010, p. 70).

A comunhão de vida entre os cônjuges tem pilar na igualdade, não só entre esses, mas, também entre os companheiros, baseando-se em preceitos do art. 1.511 do Código Civil de 2002 c.c. art. 226, § 3º, da Constituição Federal, e pelos arts. 1.723 a 1.727 do atual Código Civil.

Em outros dispositivos do Código Civil de 2002, a equiparação entre cônjuges e companheiros também está clara258, posto que tanto um como o outro poderá requerer a ação de separação de corpos (art. 1562). É assegurado a ambos os casais, o parentesco por afinidade com a família de seu par (art. 1595).

Outra equiparação é a trazida pela combinação dos arts. 1631, 1632, 1636, onde aflora o poder familiar, que permanece mesmo em caso de separação dos casados, como na dissolução da união estável, no caso dos companheiros e até em caso de contraírem novas núpcias ou novo companheirismo. A permissão de tanto o cônjuge como o companheiro pleitear ação de alimentos contra seu consorte, conforme disposição do art. 1694, enquanto o par não contrair nova relação, nos moldes do art. 1708, também é uma forma de igualar estas instituições. Querendo, podem os casados ou os que vivem em união estável, destinar até um terço de seus bens, como bens de família, como preceitua o art. 1711.

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Outros deveres que tem tanto o cônjuge como o companheiro é a curadoria do outro, nos termos do art. 1775 e a administração da herança enquanto não nomeado o inventariante, a rigor do art. 1795. Tudo isso porque, o art. 1723 do Código Civil de 2002, afirma a união estável como entidade familiar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A morte determina a abertura da sucessão, passando a propriedade e a posse da herança aos herdeiros legítimos e testamentários, nas mesmas condições em que as tinha o finado, o que acontece de forma instantânea. O sistema pátrio adotou a tese da imediata integração dos herdeiros à posição do falecido, tudo se passando como se ele os investisse na herança, sem separação temporal entre a declaração e aquisição da herança, ficando a participação definitiva dos interessados e sua aceitação, que retroage à data do óbito.

A morte gera efeitos distintos, um no Direito de Família, extinguindo o casamento, o que faz cessar o regime de bens entre os cônjuges, cuja meação do patrimônio comum seguirá as regras do regime adotado; mas também afeta o Direito das Sucessões, pois o patrimônio do falecido, agora herança, será imediatamente transmitida a seus herdeiros e legatários, pelo direito de saisine.

O acervo deixado constitui-se, em regra, da meação e da herança, que são institutos pertencentes a diferentes ramos jurídicos, embora confusão que se costuma estabelecer.

A meação não é direito sucessório, mas direito patrimonial resultante do regime de bens do casamento, e pela morte do parceiro aquela parcela do cabedal comum se integra ao direito do supérstite, extinto o condomínio pelo decesso.

A meação do finado, agora herança, será transmitida a seus sucessores, mas como podia ele dispor da metade de seus bens para testar, o catálogo canônico declara pertencer aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança ou

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legítima (CC, artigo 1.846), constituída pelo patrimônio existente na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas de funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos à colação (CC, artigo 1.847); morrendo a pessoa sem testamento, a herança é transmitida aos herdeiros legítimos (CC, artigo 1.788, 1ª parte).

A herança é uma universalidade, compondo-se não só da meação sobre os bens comuns, mas também do patrimônio particular do defunto, o que tem sido causa de discórdia quando se examina sua transmissão ao cônjuge sobrevivo em rivalidade com outros herdeiros.

Com o advento do atual Código Civil brasileiro, levado a efeito pela Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, a tutela sucessória do cônjuge encontrou melhor estrutura normativa, privilegiando sua posição sucessória, elevando-o à categoria de herdeiro necessário (PIERI, 2008).

É certo que o legislador procurou dar uma equivalência hereditária benéfica ao cônjuge, com a finalidade de amparar o âmbito familiar em consonância com os princípios constitucionais, alterando substancialmente a ordem da vocação hereditária.

No entanto, verificou-se com Pieri (2008) que a aplicação da nova regra contida no artigo 1.829 do atual Código Civil, ao incluir o cônjuge sobrevivo como herdeiro necessário (e concorrente), provoca discussões e controvérsias, quer na doutrina ou na jurisprudência, desenvolvendo uma nova dogmática sucessória em razão de inúmeras situações híbridas que podem ocorrer, principalmente quando da concorrência do cônjuge com descendentes comuns e exclusivos.

Primeiramente, embora tenha sido encontrado entendimento doutrinário divergente conclui-se na presente pesquisa, quanto à existência da concorrência sucessória do cônjuge com herdeiros comuns e exclusivos, pela não prevalência da reserva da quarta parte e, assim, a herança é distribuída em partes iguais. Sobre este

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posicionamento encontra-se respaldo favorável na doutrina e na jurisprudência.

Dessa forma, o cônjuge nessa situação recebe uma quota igual à dos descendentes que sucederem por cabeça; se forem três os filhos, parte da herança objeto da concorrência é dividida em quatro partes iguais, atribuindo-se uma cota a cada um dos filhos, bem como uma ao cônjuge; se os filhos são comuns do autor da herança e do cônjuge sobrevivente, este tem assegurado um quarto da parte da herança em relação à qual há concorrência.

Apesar de ser essa a lógica imposta pela redação do referido artigo, verificou-se que a questão gera desigualdade de quinhões quando o cônjuge concorrer com quatro filhos comuns (ou mais), haja vista que estes perdem uma parte da herança em favor do cônjuge sobrevivo. A contrario sensu, se os descendentes são exclusivos do de cujus, o cônjuge não tem direito a essa quarta parte; se concorrer cinco filhos, todos exclusivos do falecido, a divisão será realizada em seis partes, uma delas correspondente ao cônjuge.

Por outro lado, muito embora se considere que o reconhecimento da concorrência sucessória ao cônjuge não é absoluta, posto que somente lhe é deferido se, ao tempo da abertura da sucessão, não estava separado judicialmente ou de fato por mais de dois anos do falecido, salvo se provar que a separação não decorreu de sua culpa, encontrou-se a possibilidade de concorrência sucessória entre cônjuge e companheiro.

REFERÊNCIAS

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CAHALI, F. J; HIRONAKA, G. M. F. N. Curso Avançado de Direito Civil: Direito das Sucessões. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. v.6.

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CARVALHO, D. M. de. Sucessão legítima do cônjuge e do companheiro no novo código civil.Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/32144-38079-1-PB.pdf> Acesso em: 29 set. 2015.

DELBEN, A. C. O princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, analisado no direito das sucessões à luz do princípio da ignidade da pessoa humana, para realização dos direitos da personalidade. 2010. 143 f.Dissertação (Mestrado em Direito) – Centro Universitário de Maringá. Maringá, 2010.

DIAS, M. B. Ponto final: Art. 1829, inciso I, do novo Código Civil. Disponível em: <http:// www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4634>. Acesso em: 25 set. 2015.

GAMA, G. C. N. da. Direito Civil - Sucessões. Fundamentos jurídicos. São Paulo: Atlas, 2003.

GOMES, O. Sucessões. 15.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

HERMANN, J. (org.). As Mulheres e os Direitos Humanos. Traduzindo a legislação com a Perspectiva de Gênero. Rio de Janeiro: CEPIA, 2001. v.2.

MADALENO, R. A retroatividade restritiva do contrato de convivência. Revista Brasileira de Direito de Família, n. 33, p. 147-160, dez.2005/jan.2006.

MONTEIRO, G. T. M. Construção Jurídica das Relações de Gênero: O Processo de Codificação Civil na Instauração da Ordem Liberal Conservadora do Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

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VENOSA, S. de S. Direito civil: direito das sucessões. 12.ed. São Paulo: Atlas, 2012, v.7.

NOTA:

[1] Graduação em Ciências Jurídicas e Sociais na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2005); Especialização em Direito Empresarial e Tributário pelo Centro Universitário Toledo, Brasil (2013); Especialização em Direito Civil e Direito Constitucional pela Anhanguera/Uniderp (2013/2014) Mestrado Profissional em andamento em Ciências Ambientais; Professora Universitária na Universidade Camilo Castelo Branco.

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DIREITO DE GREVE

THALLITA OLIVEIRA ANDRADE SANTANA: Acadêmica do curso de Direito da Faculdade FANESE.

Resumo: O presente artigo científico tem por objetivo mostrar brevemente características e contornos importantes do direito de greve, desde o seu contexto histórico, onde este era interpretado como um tipo de delito, e era combatido em Estados absolutos, e que passou a ser aceito com o surgimento do Estado liberal, e com o passar do tempo foi sendo aceito como direito essencial, para os trabalhadores e que passou a ser previsto com ênfase nos textos de muitas Constituições.

Palavras-Chave: Direito de Greve, Estado, Democracia, Trabalhadores, Movimentos Sociais, Constituição, Sindicatos, Serviços Essenciais.

1 INTRODUÇÃO

O direito de greve é um direito que se estende a todos os tipos de trabalhadores, inclusive aos servidores públicos, com algumas ressalvas. Um instrumento que cabe apenas aos trabalhadores decidirem o melhor momento para utiliza-lo, em prol de suas reivindicações, sejam elas por melhorias nas condições de trabalho, melhores salários, ou contra abusos de seus chefes. Dessa forma os patrões e os governantes não podem vir a punir tais trabalhadores que estão usufruindo de um direito garantido constitucionalmente. Mas nem sempre foi assim, há pouco tempo atrás o direito de greve no Brasil não era aceito, foram muitas as lutas para conquistar e tornar eficaz tal direito, que hoje está positivado pela nossa atual Constituição Federal. A eficácia que lhe pode ser conferida, social ou juridicamente, assim como seus limites, e a responsabilização por seus abusos.

2 BREVE CONTEXTO HISTÓRICO

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A greve pode ser concebida como uma das mais importantes e complexas manifestações coletivas produzidas pela sociedade contemporânea. O vocábulo greve foi utilizado pela primeira vez no final do século XVIII, precisamente numa praça em Paris, chamada dePlace de Grève, onde se reuniam tanto desempregados quanto trabalhadores que, insatisfeitos geralmente com os baixos salários e com as jornadas excessivas, paralisavam suas atividades laborativas e reivindicavam melhores condições de trabalho. Na referida praça, acumulavam-se gravetos trazidos pelas enchentes do rio Sena. Daí o termo greve, originário de graveto. (BEZERRA LEITE. 2001)

Com a revolução industrial, e a demanda pela produção em massa, que a sociedade consumerista fez surgir, houve a necessidade de se produzir muito, no entanto as condições que os empregadores ofereciam aos seus funcionários não eram dignas para tais trabalhadores, que sofreram muito com isso em função da desigualdade socioeconômica entre os patrões e seus trabalhadores.

A concentração das massas proletárias, advinda do nascimento da indústria, associada à precariedade de sua situação socioeconômica frente aos patrões, impulsionada pela difusão das doutrinas socialistas, contribuíram para a formação das associações profissionais, que exaltavam a greve como forma de educar os trabalhadores, de reivindicar e de obter melhorias das condições de trabalho.(BARROS. 2010, p. 1305)

No Brasil, a história do direito de greve aconteceu de forma contraria a muitos outros lugares do mundo. Inicialmente a greve era aceita como um direito de liberdade, e com a constituição de 1937, passou a qualifica-la como crime. Pouco tempo depois com a CLT de 1943 a greve era permitida se tivesse primeiro a autorização do tribunal trabalhista.

Essa fase permeou ate à promulgação da Constituição de 1946, que reconheceu tal direito, como um ato licito e legitimo, e

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ainda foi criada lei que regulava os dias de serviços que os trabalhadores ficavam parados, os quais não contariam como tempo a ser remunerado. A nossa Constituição de 1969, por sua vez, manteve tal direito dos trabalhadores, contudo, trouxe também algumas proibições, no que concerne a alguns serviços públicos ou essenciais a ordem social.

Após o ano 1988, com a nossa atual Constituição, surge uma nova relação de trabalho, onde o art. 8º, inciso I, fala que é vedado ao Estado intervir e interferir na organização sindical, a lei não poderá exigir autorização estatal para a fundação de sindicato.

3 GREVE NO MOVIMENTO SOCIAL

Como percebemos a greve se tornou o principal instrumento de luta utilizado pelos movimentos sociais dos trabalhadores em busca dos direitos e garantias inerentes aos mesmos. É mister entender que a greve foi vedada por tanto tempo para manter os interesses do Estado e da elite empregadora, uma vez que, as manifestações oriundas desses movimentos reivindicam direitos que vão em desencontros aos interesses capitalistas de quem emprega. A reivindicação coletiva só passou a ser reconhecido após diversas lutas e um processo de democratização.

A revolução de cada movimento dependeu amplamente da reação do estado. Quando governos mostraram alguma aparência de acomodação a suas demandas e surgiram uma liberação política, os movimentos foram canalizados para um processo de democratização do Estado no limite da manutenção da essência da dominação pela elite. (CASTELLS, 2013, pag.61)

Diante das inúmeras lutas, atreladas á busca pela justiça e proteção a democracia, os movimentos sociais constituíram-se como produto da realidade de cada povo. O processo de democratização deu aos interesses coletivos o direito de expressar suas insatisfações e cobrar melhorias nas condições de trabalho de

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forma livre, pública e pacifica contra as imposições arbitrarias dos empregadores.

O processo de evolução histórica, já abordado, mostra que a greve se fez necessária para combater abusos dos empregadores em detrimentos aos direitos dos empregados. Os seus anseios eram gritantes e apenas se firmaram através da reunião de forças para lutar coletivamente.

E assim, das profundezas do desespero, por toda parte, surgiram um sonho e um projeto: reinventar a democracia, encontrar maneiras que possibilitem aos seres humanos administrar coletivamente suas vidas de acordo com os princípios amplamente compartilhados em suas mentes e em Geral negligenciados em sua experiência diária. (CASTELLS, 2013, pag. 142)

O autor Castells nos mostra que os movimentos sociais coletivos possuíam o desejo de reinventar a democracia, de maneira que pudessem administrar coletivamente os interesses comungados por toda uma classe, de acordo com os princípios comumente compartilhados. Sendo assim, iniciou-se uma árdua luta para conquistar algo que ate então estava criminalizado.

É certo que a mera reunião de interesses comuns, não se efetivaria sem as articulações e reivindicações que impuseram uma transformação política. “A respeito da articulação de movimentos sociais, ela pode sim se realizar, e devemos saber quais são as articulações em que há mais possibilidade de ocorrer uma transformação política em relação a outras” (SANTOS, 2007, p.105). O uso dos movimentos populares é temido pelos governantes e pela elite opressora, ao passo que, encontra força contra a tirania que massacra a classes subalternas, seja qual for o seguimento, que neste caso se evidência nas classes trabalhadoras.

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4 CONTORNOS DO DIREITO DE GREVE CONTEMPORÂNEO

A greve pode ser considerada antes de tudo um fato social, estudado também pela sociologia. Seria um fato social que não estaria sujeito à regulamentação jurídica. A greve de fome é um comportamento individual que não tem relação com o trabalho. Ocorre que da greve dos trabalhadores resultam efeitos que vão ser irradiados nas relações jurídicas, havendo, assim, necessidade de estudo por parte do direito. (MARTINS. 2006, p, 834)

Nossa atual Carta Magna prevê o direito de greve em seu art. 9º, que fala que é assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender. Dessa forma, pode-se dizer que tal direito ganha relevância de direito fundamental ao trabalhador.

A greve é um direito fundamental que se arrima na Declaração dos Direitos do Homem. Com efeito, o ato internacional em causa, de modo explícito, cuida de assegurar condições justas e favoráveis de trabalho. Para obtê-las ou confirmá-las todo trabalhador tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para a proteção de seus interesses. Não há greve sem sindicato. O sindicato tornar-se-ia uma mera associação corporativa assistencial se não dispuser do direito de fazer greve. (PRADO LEITE. 1998, p, 427)

Muitos teóricos definem o direito de greve como a paralisação do trabalho por um indeterminado tempo, por parte de um determinado grupo de empregados, com o intuito de postular pretensões junto ao seu empregador. Onde o tempo de serviço parado serve como instrumento que pressiona o chefe a atender suas reivindicações. A lógica da greve reside em uma interrupção da atividade habitual do determinado grupo de trabalhadores, fato que propicia a abertura de negociação entre estes e seu

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empregador, para assim através de dialogo analisarem melhores condições para a categoria profissional envolvida.

O conceito jurídico de greve não oferece dificuldade, uma vez que é incontroverso que se configura como tal a paralisação combinada do trabalho para o fim de postular uma pretensão perante o empregador; não é greve, ensinam os juristas, a paralisação de um só trabalhador, de modo que a sua caracterização pressupõe um grupo que tem um interesse comum. Todavia, a dificuldade repousa em delimitar quais os atos coletivos se enquadram no conceito de greve e quais não se enquadram, caracterizando atos ilícitos que, em suma, se apoiam em práticas violentas afastadas do ordenamento jurídico. Podemos citar como exemplos de tais atos violentos que se distinguem do conceito de greve o boicote, a sabotagem e o piquete. (PEREIRA. 2006)

Então, a paralisação de apenas um trabalhador não caracteriza uma greve, a lei estabelece que deve ser um grupo determinado de trabalhadores que se organizam para tal feito, a adesão de uma coletividade ao movimento, ou o fato de os trabalhadores realizarem as suas atividades de forma lenta, não caracteriza greve, tem que existir a real paralisação. Com esse intuito surgem os sindicatos. A liberdade sindical tem como importante corolário o direito de greve, sendo este um instrumento indispensável de equilíbrio entre o capital e o trabalho.

4.1 Papel do Sindicato na Efetivação do Direito de Greve. A titularidade do direito de greve pertence ao trabalhador, e

não ao sindicato, mas a prerrogativa de coordenar e operacionalizar a greve, bem como a garantia de representar a categoria profissional no polo da relação negocial, pertence a este.

O art. 4ª da lei nº 7.783/89 (lei de greve), estabelece que caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da

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categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços.

Dessa forma o estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação de quorum para a deliberação, tanto da deflagração quanto da cessação da greve. Na falta de entidade sindical, a assembleia geral dos trabalhadores interessados deliberará sobre a paralisação, constituindo uma comissão que possa representa-los na negociação. (art. 4ª, §1º, da Lei nº 7.783/89)

Então, é de grande relevância o papel dos sindicatos, na efetivação dos direitos dos trabalhadores, pois dessa forma a paralisação será feita de forma organizada, logo terá mais impacto, por ser bem planejada, ter realmente ciência dos ideais reivindicados, da forma que pode ser reivindicado, sem ultrapassar os limites impostos pela lei.

4.2 Direito de Greve dos Servidores Públicos. A Organização Internacional do Trabalho - OIT não possui

convenção específica sobre greve, mas a doutrina é praticamente unânime em afirmar que as Convenções 1987 e 1998, que dispõem sobre liberdade sindical e negociação coletiva, contemplam, implicitamente, a greve como um direito fundamental dos trabalhadores, tanto do setor público quanto do setor privado, sendo certo que apenas os funcionários das forças armadas podem ter, segundo aquele organismo internacional, algumas restrições ou até mesmo vedações ao exercício do direito de greve.

O §1º do art. 9º da Constituição Federal, fala que a lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. Que estão elencadas na já referida Lei de greve.

Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

II - assistência médica e hospitalar;

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III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

IV - funerários;

V - transporte coletivo;

VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;

VII - telecomunicações;

VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;

X - controle de tráfego aéreo;

XI compensação bancária. Para esses serviços, a paralisação não pode ser total, assim,

uma pequena parcela desses servidores tem que manter as suas atividades habituais, por serem de necessidades inadiáveis da comunidade.

O ordenamento jurídico brasileiro ainda estabelece alguns requisitos para a admissibilidade da greve, uma previa tentativa de negociação coletiva, aprovação pelos trabalhadores, aviso-prévio ao empregador e atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Destarte, percebe-se que o direito de greve do servidor público, é ainda restringido, principalmente no que concerne aos militares, pois depende de edição de lei complementar que faça tal regulação, exigida pelo próprio texto constitucional. Que fica a mercê da inércia do Congresso nacional, que nada fez ainda, no sentido de efetivar tal direito. E ao que tudo indica, não há empenho e vontade política para que tal aconteça.

4.3 Abusos do Direito de Greve, e Responsabilidades.

Da mesma maneira que aos grevistas são assegurados direitos para exercício da greve, ou seja, bônus pelo exercício da greve, são exigidos dos mesmos trabalhadores o cumprimento de determinados deveres, ou seja, ônus pelo exercício da greve, a fim de equilibrar os interesses envolvidos em um movimentoparedista.

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Assegurar a prestação de serviços indispensáveis às necessidades inadiáveis da comunidade, quando realizando greve em serviços ou atividades essenciais (acrescendo-se que o Poder Público poderá suprir tal atendimento); organizar equipes para manutenção de serviços cuja paralisação provoque prejuízos irreparáveis ou que sejam essenciais à posterior retomada de atividades pela empresa; não fazer greve após celebração de convenção ou acordo coletivos ou decisão judicial relativa ao movimento (respeitada a ocorrência de fatores que se englobem na chamada cláusula rebus sic stantibus); respeitar direitos fundamentais de outrem; não produzir atos de violência, quer se trate de depredação de bens, quer sejam ofensas físicas ou morais a alguém. (DELGADO. 2011, p, 1326)

Neste sentido, o abuso de direito na greve resta caracterizado quando ultrapassa os limites normais de civilidade, de respeito ao patrimônio particular alheio, ou público, e dos bons costumes. Limites jurídicos tão importantes e fundamentais quanto os direitos dos próprios manifestantes.

De qualquer modo, o direito de greve como direito fundamental é tão importante que não deve ser banalizado como se tem visto em alguns casos, ele existe para ser utilizado, sim, pelos trabalhadores, sempre que necessário, mas como ultima forma de solução de conflitos coletivos de trabalho. Antes o dialogo deve ser procurado por empregados e empregadores, porque a greve é um instrumento que existe para causar prejuízo ao empregador, podendo também prejudicar o trabalhador, quando dela se

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utiliza de forma irresponsável. (MELO. 2009, p, 72)

O art. 15 da lei de greve, fala que a responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos, no curso da greve, será apurado, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil e penal.

No tocante à responsabilidade trabalhista, poderá o empregado ser advertido, suspenso ou até mesmo despedido, de acordo com cada caso concreto, de acordo com a natureza e a gravidade dos atos praticados. Já no âmbito civil, prevalece no direito comparado a tese da responsabilidade civil pelos danos resultantes de atos ilícitos praticados com a greve durante o seu curso. Na esfera do Direito Penal, a responsabilidade, de caráter individual, deve ser apurada e é amplamente admitida pela doutrina. (PESSOA. 2000)

Então, da mesma forma que deve ser respeitado o direito de greve, os manifestantes, devem resguardar os direitos alheios, no momento da manifestação, de maneira pacifica e sem causar danos ao patrimônio ou a integridade física e moral de qualquer outro individuo, para dessa forma atender aos ideais que prega a democracia, e assim possam ter suas reivindicações atendidas, ao invés de serem responsabilizados, por condutas antissociais.

5 CONCLUSÃO

Então, percebe-se que de forma semelhante aos direitos fundamentais, o direito de greve passou por um longo e difícil processo de evolução, ate ser aceito como um direito tão essencial. De maneira que, não pode ser usado de forma abusiva, pois certamente causará danos para ambas as partes, tanto para o trabalhador quanto para o empregador. A greve veio para efetivar os asseios coletivos das classes desfavorecidas de trabalhadores

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contra os patrões opressores sejam eles de ordem privada ou publica. É certo que se tornou instrumento de grande força para os movimentos sociais que passaram a, de certa forma, se impor de forma coletiva a todas as situações que os desfavoreciam e assim alcançar seus direitos, contudo não foi tão simples chegar a esse ponto, para a greve ser aceita inclusive como direito positivado, fora necessário inúmeras lutas ao decorrer do tempo e um longo processo de evolução democrático. Para alguns o direito de greve é visto até como uma forma de autotutela no nosso ordenamento jurídico, mas que tem seus limites, e quando desrespeitados, impõe determinadas sanções para os eventuais descumpridores. Portanto, a greve deve ser exercida sim, por ser um instrumento fundamental na hora de viabilizar uma negociação coletiva em favor dos trabalhadores, mas de forma que se compatibilize com os demais direitos do cidadão, para serem evitados abusos, pois o que deve acontecer, ou o que se dever buscar primeiramente é um dialogo entres as partes, para se resolver o que está motivando o conflito, de forma pacifica. E no que concerne ao direito de greve do servidor público, falta ainda uma efetivação prática, ou uma verdadeira regulamentação, que sofre com a omissão do poder legislativo, mas que por outro lado vem sendo viabilizada por parte do judiciário.

5 REFERÊNCIAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6 ed. São Paulo: LTR, 2010.

CASTELLS, Manuel. Redes de Indignação e Esperança – movimentos sociais na era da internet. Manuel Castells. Ed. Zahar, Rio de Janeiro, 2013.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 10 ed. São Paulo: LTr, 2011.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. A greve do servidor publico civil e os direitos humanos.Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_34/artigos/Art_carlos.htm. Acessado em 04 de novembro de 2015.

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LEITE, Julio Cesar do Prado. O papel da greve na negociação coletiva. São Paulo: LTr. 1998.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 22ª Ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MELO, Raimundo Simão de. A greve no direito brasileiro. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 2009.

PEREIRA, Andiara Maciel. Direito de greve. 2006.Disponível em:http://paineljuridico.wordpress.com/direito-de-greve/. Acessado em 04 de novembro de 2015.

PESSOA, Valton Dória. Controle Judicial dos Atos Abusivos na Greve. Disponível em:<http://web.unifacs.br/revistajuridica/edicao_agosto2000/convidados/LTr- Mestrado%20-%20ATOS%20ABUSIVOS%20NA%20GREVE%20(1).doc>. Acesso em 04 de novembro 2015.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Renovar a Teoria Critica e Reinventar a Emancipação Social. Tradução Mouzar Benedito. –São Paulo : Boitempo, 2007.