BOLETIM CONTEÚDO Boletim JURÍDICO N. 578 · 2016-04-04 · » A teoria da constitucionalização...

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 578

(ano VIII)

(04/04/2016)

 

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BRASÍLIA ‐ 2016 

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–1984-0454

 

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ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

04/04/2016 Rômulo de Andrade Moreira 

» A nova Lei nº.13.257/16 ampliou a possibilidade da prisão domiciliar 

e deve ser aplicada imediatamente

ARTIGOS 

04/04/2016 Rafael Bruno de Sá » Inaplicabilidade do pseudo‐princípio do non olet ao direito penal e a consequente 

impossibilidade do crime de sonegação fiscal derivado de rendas provenientes de atividade 

ilícita 

04/04/2016 Vinícius Borges Meschick da Silva 

» Conhecimento de depósito e warrant e outros títulos de créditos 

04/04/2016 Eliardo Soares Moraes 

» Conceitos acerca da Regra‐matriz de incidência, obrigação tributária e sujeição passiva à luz 

do Direito Tributário 

04/04/2016 Lucas Silveira Pordeus 

» A teoria da constitucionalização simbólica de Marcelo Neves 

04/04/2016 Fernanda Isabela de Figueiredo 

» Soberania popular e jurisdição eleitoral 

04/04/2016 Aline Pecorelli da Cunha Martins 

» Aspectos relevantes sobre a jornada extraordinária do bancário 

04/04/2016 Raissa Pacífico Palitot Remígio 

» Neoconstitucionalismo: aspectos gerais 

 

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A NOVA LEI Nº.13.257/16 AMPLIOU A POSSIBILIDADE DA PRISÃO DOMICILIAR E DEVE SER APLICADA IMEDIATAMENTE

RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA: Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor de Direito Processual Penal da UNIFACS. Pós‐graduado, lato sensu, pela Universidade  de  Salamanca/Espanha  (Direito  Processual Penal). Especialista em Processo pela UNIFACS. 

A Lei nº. 13.257/16, publicada no dia 09 de março, alterou o art. 318 do Código de Processo Penal, para acrescentar mais duas hipóteses em que será possível a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar, além de deixar de exigir que este direito somente possa ser usufruído pela mulher gestante em risco ou acima do sétimo mês de gravidez.

Assim, com a alteração, deverá o Juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for gestante; mulher com filho de até doze anos de idade incompletos ou homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até doze anos de idade incompletos.

A modificação foi extremamente salutar e põe em relevo a importância do princípio da dignidade da pessoa humana (especialmente das mulheres e das crianças) já ressaltada por nós em artigo escrito em parceria com Alexandre Morais da Rosa, quando advertíamos não fazer sentido a limitação imposta pela lei (com a redação anterior) de que a gravidez fosse de alto risco ou a gestação a partir do sétimo mês (conferir: http://emporiododireito.com.br/mulher-gravida-e-presa-so-consegue-no-stf-o-reconhecimento-da-dignidade-por-romulo-de-andrade-moreira-e-alexandre-morais-da-rosa/).

Feita a alteração legislativa, impõe-se agora a seguinte indagação: esta nova lei deve ser aplicada retroativamente, ou seja, em relação aos réus ou investigados que supostamente cometeram infrações penais anteriormente à sua vigência? Ou, ao contrário, tão

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somente em relação aos fatos vindouros, tendo em vista tratar-se de uma lei processual penal?

Sabemos que há dois princípios que regem o direito intertemporal em matéria criminal: a lei penal não retroage, salvo para beneficiar o acusado (art. 2°, parágrafo único do Código Penal e art. 5°, XL da Constituição da República) e a lei processual penal aplica-se imediatamente (art. 2°. do Código de Processo Penal: tempus regit actum).

O princípio da irretroatividade da lei penal, salvo quando benéfica, insere-se no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais da Constituição, tendo força vinculante, “no sólo a los poderes públicos, sino también a todos los ciudadanos”, como afirma Perez Luño[1], tendo também uma conotação imperativa, “porque dotada de caráter jurídico-positivo”[2].

Logo, à vista desses dois princípios, haveremos de analisar o disposto no novo art. 318, IV, V e VI do Código de Processo Penal.

Desde logo, é preciso definir a natureza da norma contida neste dispositivo legal: seria ela de conteúdo processual ou penal?

É certo que ela trata de uma medida cautelar, impondo a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar em determinados casos. Neste aspecto, ela tem uma conotação claramente processual. Se admitirmos tratar-se de norma processual não há que se falar, obviamente, em retroatividade, fenômeno jurídico típico do direito intertemporal relativo às normas penais.

Porém, é preciso atentar que esta medida cautelar diz respeito ao direito de liberdade (provisória) do investigado/acusado matéria, obviamente, de direito material, prevista no art. 5º., LXVI da Constituição Federal. Trata-se, portanto, de uma norma processual

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material, ainda que tal diferença, em alguns casos, não seja tão perceptível. Klaus Tiedemann, por exemplo, “destaca a exigência metodológica e a importância prática da distinção das normas processuais em normas processuais meramente formais ou técnicas e normas processuais substancialmente materiais.”[3]

No Brasil, comentando a respeito de tais normas, Tucci entende que elas “deverão ser aplicadas, em face da conotação prevalecente de direito penal material das respectivas normas, as disposições legais mais favoráveis ao réu, ressalvando-se sempre, como em todos os sucessos ventilados, a possibilidade de temperança pelas regras de direito transitório, – estas excepcionais por natureza.”[4]

No mesmo sentido é a opinião de Grandinetti Castanho de Carvalho: “Se a norma processual contém dispositivo que, de alguma forma, limita direitos fundamentais do cidadão, materialmente assegurados, já não se pode defini-la como norma puramente processual, mas como norma processual com conteúdo material ou norma mista. Sendo assim, a ela se aplica a regra de direito intertemporal penal e não processual.”[5] Atente-se “que a natureza processual de uma lei não depende do corpo de disposições em que esteja inserida, mas sim de seu conteúdo próprio.”[6]

Assim, sendo uma norma processual penal material, é possível a sua aplicação a partir de uma visão mais benéfica para o suposto autor do fato, seja para fazer incidir a regra (do jogo) anterior (em uma espécie de “ultratividade”), seja proibindo a “retroatividade” da nova regra (do jogo) para casos passados.

Saliente-se que por lei mais benéfica não se deve entender apenas aquela que comine pena menor, pois “en principio, la retroactividad es de la ley penal e debe extenderse a toda disposición penal que desincrimine, que convierta un delito en

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contravención, que introduzca una nueva causa de justificación, una nueva causa de inculpabilidad o una causa que impida la operatividad de la punibilidad, es dicer, al todo el contenido que hace recaer sobre la conduta, sendo necessário que se tenha em conta uma série de outras circunstâncias, o que implica em admitir que “la individualización de la ley penal más benigna deba hacerse en cada caso concreto, tal como ensina Zaffaroni.[7].

Concluindo: a partir de agora, é preciso que os Juízes e Tribunais revejam todos os casos em que réus (ou indiciados) estão presos provisoriamente e estejam em uma das situações indicadas nos três últimos incisos do art. 318, ora modificados. Neste sentido, devem fazê-lo de ofício, independentemente, portanto, de requerimento. Se não o fizerem ou negarem o direito (subjetivo público do preso), cabível será a impetração de Habeas Corpus, tendo em vista a patente ilegalidade perpetrada.

Notas e Referências

[1] Los Derechos Fundamentales, Madrid: Editora Tecnos, 1993, p. 67.

[2] Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, Alberto Silva Franco, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 7ª. ed., 2001, p. 62.

[3]Apud Taipa de Carvalho, Sucessão de Leis Penais, Coimbra: Coimbra Editora, pág. 220.

[4] Direito Intertemporal e a Nova Codificação Processual Penal, São Paulo: José Bushatsky Editor, 1975, p. 124.

[5] O Processo Penal em Face da Constituição, Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 137.

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[6] Eduardo J. Couture, Interpretação das Leis Processuais, Rio de Janeiro: Forense, 4ª, ed., 2001, p. 36.

[7] Tratado de Derecho Penal, Parte General, I, Buenos Aires: Editora Ediar, 1987, págs. 463 e 464.

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INAPLICABILIDADE DO PSEUDO-PRINCÍPIO DO NON OLET AO DIREITO PENAL E A CONSEQUENTE IMPOSSIBILIDADE DO CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL DERIVADO DE RENDAS PROVENIENTES DE ATIVIDADE ILÍCITA

RAFAEL BRUNO DE SÁ: Advogado Criminalista. Bacharel em Direito pela Universidade Salvador - UNIFACS. Monografia orientada pelo Prof. Rômulo Moreira. Pós-graduado em Direito Penal Econômico e Europeu pelo Instituto de Direito Penal Económico e Europeu (IDPEE), da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). Pós-Graduado em Ciências Criminais pelo Juspodivm - Faculdade Baiana de Direito.

Ultimamente, em tempos de crise, tem-se observado forte atuação do Estado na cobrança de tributos, estando envolvidos os três poderes clássicos, Executivo, Judiciário e Legislativo. Até aí, tudo bem.

Ocorre que esta atuação tem extravasado para a espera penal, tendo surgido um sem-número de ações penais relacionadas a fatos criminosos comuns, mas que “aproveita-se” para imputar ao réu, também, crime de sonegação fiscal em relação a rendas de proveniência ilícita, em clara manifestação de excesso de acusação.

Primeiramente, deve-se ter a perfeita noção da desnecessidade absoluta de se tributarem os atos ilícitos. Efetivamente, será efeito automático de uma eventual sentença condenatória a perda do produto do crime, nos exatos termos do art. 91, II, b do Código Penal:

Art. 91 - São efeitos da condenação:

[...]

II – a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

[...]

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b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso. [grifos aditados]

Assim, de nada adianta falar em tributação tendo em vista que, ao final, o agente perderá, se condenado for, todos os bens relacionados com o crime.

O que é intolerável, significativamente, é a necessidade de se tributar ilícito que tenha origem penal, seja porque é desnecessário, haja vista o efeito acessório da perda do crime, seja por lhe faltar fundamento ético.

Efetivamente, a tributação dos atos ilícitos transformaria o Estado em um ente receptador, já que passaria a compartilhar, diretamente, do produto do crime. O Estado passaria a arrecadar parte dos valores oriundos de tráfico, de corrupção, de crimes patrimoniais, tornando-se beneficiário direto destes valores, agindo, pois, como verdadeiro receptador, o que é inaceitável.

Para além disso, além da desnecessidade e da falta de respaldo ético, tenha-se consciência de que a tributação de comportamentos referentes à prática de crimes representaria, com o passar do tempo, verdadeira permissão para que as condutas fossem praticadas. Tributar estes atos seria um passo em prol da legalização.

De outra parte, à luz da teoria do crime, consumado um delito, todos os atos subsequentes são tidos, por motivos de política criminal, como fatos posteriores impuníveis.

Ora, se o cidadão traficou, receptou, furtou, roubou, enfim, se praticou um ilícito qualquer, não irá responder pela prática de qualquer fato posterior. É o que ocorre no chamado princípio da consunção ou da absorção, que respalda o entendimento de que não existe concursus delictorum nem na progressão criminosa, nem no crime progressivo.

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Com efeito, uma Constituição pródiga em garantias, que consagrou princípios processuais como o do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da presunção de inocência, da vedação das provas obtidas por meios ilícitos, não pode, certamente, se conciliar com a imposição da confissão de um crime para que outro não seja cometido.

É um absurdo, carente de qualquer fundamento científico.

Neste contexto, é de se invocar o direito de não produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere), também denominado de privilégio contra a autoincriminação (privilege against self-incrimination), que se insere no direito à defesa e na cláusula do devido processo legal, positivados na Constituição da República Federativo do Brasil de 1988.

Um dos aspectos do princípio nemo tenetur se detegere é o direito ao silêncio que assiste a todo suspeito, indiciado ou acusado da prática de crime. Deflui da regra constitucional estampada no art. 5º, LXIII, da CF/88, e encontra previsão expressa no art. 8º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 1969, incorporado ao ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto 678/92. A propósito, confira-se a posição do Supremo Tribunal Federal sobre essa garantia fundamental:

COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO - PRIVILÉGIO CONTRA A AUTO-INCRIMINAÇÃO - DIREITO QUE ASSISTE A QUALQUER INDICIADO OU TESTEMUNHA - IMPOSSIBILIDADE DE O PODER PÚBLICO IMPOR MEDIDAS RESTRITIVAS A QUEM EXERCE, REGULARMENTE, ESSA PRERROGATIVA– PEDIDO DE HABEAS CORPUS DEFERIDO. - O privilégio contra a auto-incriminação – queé plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito - traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa, que, na condição de testemunha, de indiciado ou de réu, deva prestar depoimento perante órgãos do

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Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário. –O exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental. Precedentes. O direito ao silêncio - enquanto poder jurídico reconhecido a qualquer pessoa relativamente a perguntas cujas respostas possam incriminá-la (nemo tenetur se detegere) - impede, quando concretamente exercido, que aquele que o invocou venha, por tal específica razão, a ser preso, ou ameaçado de prisão, pelos agentes ou pelas autoridades do Estado. - Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário. Precedentes.(STF, HC 79812, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 08/11/2000, DJ 16-02-2001 PP-00021 EMENT VOL-02019-01 PP-00196) [grifos aditados]

Além do direito ao silêncio, assiste ao indivíduo sobre quem pese suspeita ou acusação de crime, também sob o pálio do princípio nemo tenetur se detegere, a prerrogativa de eximir-se da prática de qualquer conduta que implique colaboração na produção de prova que lhe seja potencialmente desfavorável, de que são exemplos o fornecimento de material gráfico e a participação em

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reprodução simulada dos fatos.Com fundamento no privilégio contra a auto-incriminação, aduz Pedro Luiz Amaral Marino que:

a ação do contribuinte, por exemplo, omitindo informação ou prestando declaração falsa às autoridades fazendárias, com o único propósito de não confessar um crime contra a ordem tributária ou outro de qualquer natureza, não tipifica o delito previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.

Também não comete o crime previsto no parágrafo único do art. 1º, da mesma Lei, o contribuinte que deixa de atender exigência da autoridade, no prazo legal, com a finalidade de acobertar anterior conduta criminosa.

Ademais, deve-se atentar para o elemento subjetivo especial do tipo, que no artigo 1º, consiste no especial fim de suprimir ou reduzir tributo e, no artigo 2º, I, na finalidade de eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo.

Se, com a omissão de informação ou com a informação prestada incorretamente, o contribuinte intenta unicamente evitar a confissão de um crime já praticado, e não suprimir ou reduzir tributo ou eximir-se do seu pagamento, não ocorre a implementação dos tipos penais referidos, por conta da não configuração do tipo subjetivo.

Por tais razões, tem-se que o alcance correto da interpretação dos artigos 118 e 126 do CTN foi dado por Sacha Calmon Navarro Coelho:

evidentemente não se trata da tributação dos atos ilícitos tipificados como delituosos, já que o fato gerador dos tributos é sempre um fato lícito. A questão se resolve da seguinte maneira: a) são tributáveis os fatos lícitos embora realizados ilicitamente; b) não podem ser tributados os fatos

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ilícitos, como, por exemplo, o rufianismo, o jogo do bicho ou o tráfico de drogas.

Logo, além de manifestamente inconstitucional, é absolutamente descabido aplicar-se, ao Direito Penal, o princípio do non olet.

Destarte, não se mostra possível a configuração de crime contra a ordem tributária em razão das rendas alegadamente omitidas supostamente derivarem de ato supostamente ilícito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

COELHO, Sacha Calmon Navarro.Manual de Direito Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 378.

MARINO, Pedro Luiz Amaral. O dever de Informar e o Direito ao Silêncio: o direito ao silêncio (CF, art. 5º, LXII); o dever de informar (CTN, art. 197) e o direito de não se auto-incriminar. Inadmissibilidade de discriminação contra o contribuinte. In.: MARIZ DE OLIVERIA, Antonio Cláudio; CAMPOS, Dejalma de.Direito Penal Tributário Contemporâneo: Estudos de Especialistas. São Paulo: Atlas, 1996, p. 115.

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 3ª ed. rev. e atual., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios constitucionais penais e processuais penais. São Paulo: RT, 2010

PRADO, Luiz Regis. Direito penal econômico: ordem econômica, relações de consumo, sistema financeiro, ordem tributária, sistema previdenciário, lavagem de capitais, crime organizado. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

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CONHECIMENTO DE DEPÓSITO E WARRANT E OUTROS TÍTULOS DE CRÉDITOS

VINÍCIUS BORGES MESCHICK DA SILVA: Graduando em Direito pelo Instituto de Ensino Superior Presidente Tancredo de Almeida Neves.

RESUMO: O presente trabalho tem por finalidade abordar os temas Conhecimento de Depósito e Warrant e Outros Títulos de Créditos, tendo por base a obraTítulos de Crédito do renomado doutrinador Wille Duarte Costa. Em primeira instancia será abordado sobre o conhecimento de depósito juntamente com Warrant e suas considerações. Em seguida será destacado sobre as denominações e características do portador do título, a ação de regresso e locupletamento e por fim os títulos de crédito rural. Para tanto, a metodologia utilizada no presente trabalho é empírico-analítica, utilizando-se da revisão bibliográfica e documental. Conclui-se que várias são as peculiaridades referentes aos depósitos, em vista dos que mais são comentados, tornando-se básicos. Obter o conhecimento de como são realizados direcionados proporciona a todos uma maior atenção, principalmente aos empresários que não possuem ciência disso.

PALAVRAS-CHAVE: Depósito; Warrant; Outros Títulos de Créditos

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por finalidade abordar os temas Conhecimento de Depósito e Warrant e Outros Títulos de Créditos, tendo por base a obra Títulos de Crédito do renomado doutrinador Wille Duarte Costa.

Em primeira instancia será abordado sobre o conhecimento de depósito juntamente com Warrant e suas considerações. Em seguida será destacado sobre as denominações e características

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do portador do titulo, a ação de regresso e locupletamento e por fim os títulos de crédito rural.

Visamos ressaltar, baseados no entendimento do ilustre professor, a relevância do assunto. Ao longo do estudo esclareceremos seu funcionamento bem a sua aplicabilidade dos mesmos, considerando em regra geral a particularidade de cada um.

1. CONHECIMENTO DE DEPÓSITO E WARRANT

São Títulos de Crédito que surgem a partir do depósito de determinadas mercadorias em Armazéns Gerais. Antes de falarmos desses títulos precisamos definir Armazéns Gerais.

1.1. Armazéns Gerais

São Estabelecimentos especializados para depósito e armazenagem de mercadorias e produtos. Vários são os motivos que levam produtores a utilizarem esses estabelecimentos: Falta de espaço em seus próprios depósitos, falta de estrutura própria para estocagem, ou mesmo necessidade de deixá-los guardados para, no futuro, obterem melhores preços para negociação.

Os Armazéns Gerais precisam dar garantia de conservação e segurança dos produtos e mercadorias ali depositados, seguro contra incêndio, por exemplo, e emissão de Recibo de Depósito onde conste a designação da mercadoria depositada, sua natureza, quantidade, nomes usuais praticados, peso, estado das embalagens, marcas e indicações que possibilitem serem identificados.

O proprietário da mercadoria pode optar por negociar a mercadoria depositada, seja vendendo parte ou toda a mercadoria, ou mesmo utilizando-a como garantia de determinada operação

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financeira, surgem então os Títulos de Crédito: Conhecimento de Depósito e Warrant, que são regulados pelo Decreto 1.102 de 21/11/1903.

Vale ressaltar que produtos agropecuários, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômicos são legislados pela Lei 9.973 de 2000 e os Títulos de Crédito surgidos destes produtos são denominados: Conhecimento de Depósito Agropecuário (CDA) e Warrant Agropecuário (WA).

2. CONHECIMENTO DE DEPÓSITO

Ao depositar suas mercadorias, o proprietário (depositante) pode solicitar a emissão do Conhecimento de Depósito, que nasce junto com o Warrant, que veremos mais adiante.

O Conhecimento de Depósito nada mais é que um documento, através do qual, o Armazém Geral garante e descreve pormenorizadamente, que determinada mercadoria se encontra em seu poder.

De posse deste documento o proprietário pode negociar sua mercadoria com terceiros, sem que precise transportá-la para apresentar ao interessado. Por isso é considerado um Título de Crédito, pois o portador do Conhecimento de Depósito passa a ser o proprietário da mercadoria, pelo fato de poderem circular, são títulos à ordem.

São Também considerados Títulos causais, podem nascem de uma causa, que é o depósito de determinada mercadoria ou produto em um Armazém Geral.

Requisitos:

a) Denominação do armazém geral e sua sede

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b) Nome, profissão e domicílio do depositante ou terceiro por ele indicado.

c) Lugar e o prazo depósito. Pode ser acordado entre deposito e depositante que posteriormente a mercadoria seja transferida para outro armazém. Neste caso, deve-se acrescentar aos títulos as seguintes informações:

d) Local para onde se transferirá a mercadoria

e) As despesas decorrentes da transferência, inclusive contratação de seguro.

f) Designação da mercadoria depositada, sua natureza, quantidade, nomes usuais praticados, peso, estado das embalagens, marcas e indicações que possibilitem ser identificadas ressalvadas as peculiaridades das mercadorias a granel.

g) Qualidade das mercadorias

h) Indicação do segurador das mercadorias

i) Declaração de impostos e direitos fiscais, encargos e despesas a que a mercadoria estará sujeitam e o dia em que começa a valer o depósito.

j) Data de emissão do título e assinatura do empresário ou pessoa por este habilitada.

k) Com a emissão do Conhecimento de Depósito, varias consequências surgem:

l) O recibo de depósito perde seu valor e é substituído pelo Conhecimento de Depósito e Warrant

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m) O armazém se torna responsável pela conservação das mercadorias tal como foram depositadas.

n) Não pode extrair amostras que alterem peso, quantidade ou mesmo conteúdo dos volumes ou sua embalagem.

o) O armazém deve devolver as mercadorias tal como foram descritas no título, salvo casos de força maior.

p) As mercadorias não podem ser embargadas, penhoras ou sequestradas por credores do armazém. Se isso ocorrer antes da emissão do título, não se pode mais emiti-lo, daí a importância para o proprietário da mercadoria solicitar a sua emissão.

3. WARRANT

A partir do depósito da mercadoria no armazém, o proprietário pode solicitar que seja emitido o Conhecimento de Depósito e o Warrant. Os dois títulos nascem juntos, mas podem ser utilizados separadamente.

Se o Conhecimento de Depósito permite que o proprietário da mercadoria a negocie, mediante endosso, enquanto ela estiver no armazém.

O Warrant, por sua vez, permite que o proprietário a utilize (a mercadoria) como garantia de determinada operação financeira, que também se dá mediante endosso.

O endosso pode ser, em ambos os papeis, em branco ou em preto.

O endossatário somente do Conhecimento de Depósito tem o direito sobre as mercadorias, desde que respeite os direitos do

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portador do Warrant. Para tanto, caso queira retirar ou utilizar as mercadorias depositadas deverá liquidar o débito relativo ao Warrant.

Por isso, no verso do conhecimento do depósito devem constar informações da existência do endosso no Warrant, taxa de juros e data do vencimento.

O endossatário do conhecimento do depósito pode liquidar antecipadamente a dívida descrita no Warrant, pode retirar antecipadamente as mercadorias depositadas, desde que consignem os valores necessários ao resgate do Warrant.

No caso do endosso somente no Warrant, equivale dizer que o endossatário tem direito de penhor sobre as mercadorias depositadas. Por isso, por ocasião do primeiro endosso, deve ser informada a importância do crédito garantido, taxa de juros e vencimento. Caso a importância do crédito não seja informada, presume-se que seja o valor total das mercadorias depositadas.

Se não houver a informação da data de vencimento, presume-se que seja à vista.

4. DIREITOS E DEVERES DO PORTADOR DO TÍTULO

O portador do Conhecimento de Depósito pode dispor de toda a mercadoria, retirá-las em todos ou em partes, desde que respeitados os direitos do possuidor de Warrant. Sendo assim, faz-se necessário que os dois títulos sejam apresentados ao armazém.

Do contrário, deverá consignar ao armazém os valores relativos ao cumprimento das obrigações geradas pelo Warrant.

O endossante do Conhecimento de Depósito nada responde, pois o verdadeiro responsável pela existência da mercadoria é o armazém geral.

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Já o endossante do Warrant responde pelo pagamento da dívida e, caso o possuidor do Warrant não receba seu crédito na data do vencimento, deverá protestar no prazo e forma aplicável às Letras de Câmbio e Notas Promissórias, ou seja, primeiro dia útil após o vencimento.

Embora o portador do Warrant tenha direito ao recebimento de seu crédito, devem ser respeitadas as seguintes preferências: a) Fazenda Nacional; b) Corretor ou leiloeiro c) o Armazém Geral.

Caso a mercadoria seja levada a leilão para pagamento do débito assumido pelo Warrant, o proprietário da mercadoria poderá, antes da adjudicação pelo maior lanço pagar imediatamente a dívida do Warrant, impostos fiscais, despesas devidas ao armazém, custas do processo, corretor ou agente de leilões, juros de mora e outras.

5. AÇÃO DE REGRESSO E LOCUPLETAMENTO

O portador do Warrant deve protestar em tempo hábil, a falta de pagamento (1º dia útil após o vencimento) e dez dias após o protesto deve vender a mercadoria. Se não fizer isso, conserva o direito de ação somente contra o primeiro endossante do Warrant e os demais endossantes do Conhecimento de Depósito.

Neste ponto surge uma divergência, porque os endossantes do Conhecimento de Depósito devem ser obrigados a garantir o pagamento de uma dívida que não foi contraída por ele, mesmo porque, o Conhecimento de Depósito nada mais garante que a existência da mercadoria.

Considerando que o portador do Warrant seguiu os passos necessários: Protesto e venda de mercadorias em tampo hábil, mas não conseguiu ser integralmente pago, pode propor ação contra

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todos os endossantes anteriores, visto que se tornam devedores solidários.

5.1. Perda e Extinção dos Títulos

5.1.1. Da perda, roubo, furto extravio ou destruição do título.

No caso de perda, roubo, furto extravio ou destruição do título o interessado deverá avisar ao armazém-geral e anunciar o fato durante três dias, em jornal de maior circulação da sede do armazém.

Sendo Conhecimento do Deposito e do respectivo Warrant, ou só do primeiro, o interessado poderá obter duplicata ou entrega da mercadoria, garantindo o direito do portador do Warrant, se este foi negociado, ou do saldo a sua disposição, se a mercadoria foi vendida, requerendo a notificação do armazém-geral para não entregar, sem ordem judicial, a mercadoria ou saldo disponível no caso de ser ou ter sido vendida, justificando sumariamente a sua propriedade.

5.1.2. O procedimento Judicial é o seguinte.

a) o requerente deve ser instruído com um exemplar do jornal em que for anunciada a perda com cópia fiel do talão do título perdido, fornecida pelo armazém-geral, e por este autenticada.

b) o armazém terá ciência do dia e da hora da justificação e, para esta, se o Warrant foi negociado e ainda não voltou ao armazém-geral, será citado o endossatário desse título, cujo nome deve constar do correspondente Conhecimento do Deposito perdido.

c) o juiz, na sentença que julgar procedente a justificação, mandará publicar editais com ao prazo de 30 dias para reclamações. Não havendo reclamação, o juiz expedirá mandado

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conforme o requerido ao armazém-geral ou depósito. Sendo ordenada a duplicata, dela constará esta circunstância.

d) Havendo reclamação, o juiz marcará prazo de 10 dias para provas e, findos estes, após os arrazoados das partes julgará o feito. Os prazos fixados na norma são improrrogáveis e fatias e correrão em cartório, independentemente de lançamento em audiência.

No caso de perda, roubo, furto extravio ou destruição do Warrant, o interessado que provar a sua propriedade terá o direito de receber a importância do crédito garantido, sendo o procedimento seguinte:

a) para justificação sumária serão citados o primeiro endossador e outros que forem conhecidos. O armazém será avisado do dia e hora da justificação e notificado judicialmente da perda do título.

b) o mandado judicial de pagamento será expedido contra o primeiro endossador ou contra quem tiver em consignação ou depósito a importância correspondente à devida Warrant.

c) o referido mandado, se a dívida não está vencida, será apresentado àquele primeiro endossador no dia do vencimento, sendo aplicável o processo previsto no art. 23 – protesto do título e leilão da mercadoria.

Assim cessa a responsabilidade do armazém-geral e do devedor quando, por ordem judicial, emitir duplicata ou entregar a mercadoria ou saldo em seu poder para pagar a dívida. Sendo o foro competente para julgamento onde estiver instalada a sede do armazém-geral.

5.1.3. Extinção dos Títulos

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Os dois títulos serão considerados extintos quando devolvidos, ambos, ao armazém-geral, mediante a entrega das mercadorias. Nesse caso, o Warrant deverá estar livre qualquer pagamento, seja porque não negociado, seja negociado, foi efetuado o pagamento do principal e juros devidos. Sendo anotada a restituição do verso do talão.

Se o interessado tem apenas o Conhecimento de Deposito poderá procurar o portador do Warrant e com ele negociar a liquidação do título, pagando o principal e juros, retirando assim a mercadoria e devolvendo os dois títulos ao armazém-geral, extinguindo os referidos títulos. No caso de não saber poderá consignar a importância devida, equivalendo-se assim ao efetivo pagamento do débito.

A extinção do título depende da situação de cada um, principalmente do Warrant. Sendo este o título negociável e negociado, pelo que para sua extinção depende da liquidação do débito por ele garantido. Feito isso e estando ambos dos títulos nas mãos da mesma pessoa, sua extinção só depende da retirada das mercadorias e a devolução dos títulos ao armazém-geral.

5.1.4. Cédula de Crédito

O Conceito gênero Cédula de Crédito é um título de credito, representando uma promessa direta de pagamento ou promessa de entrega de produtos, com ou sem garantia rela ou fidejussória, constituída cedularmente, representada por hipoteca, penhor alienação fiduciária ou aval. De forma geral todas têm características que são comuns, podendo se dito tratar-se de títulos que oferecem grandes garantia, principalmente em relação aos bens hipotecados, empenhados ou dados em alienação fiduciária que, para tanto não dependem de escritura pública, pois a garantia é constituída na própria cédula e, depois levada o registro,

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objetivando assim facilidade, controle e velocidade na execução do negócio jurídico que deu origem a cédula.

De maneira geral as cédulas decorrem de financiamento concedido pelas instituições financeiras, tanto para pessoas físicas quanto jurídicas. Mas há ainda as cédulas de Produto Rural que correspondem a uma promessa de entrega de produtos rurais.

Todos os títulos que tem a forma de um contrato obedecem a requisitos essenciais para sua validade podendo receber outros dados para uma identificação melhor dos ajustes.

São líquidos, certos e exigíveis, cabendo à ação de execução para a cobrança do valor devido.

5.2. Títulos de Crédito Industrial

O Decreto-lei nº 413, de 9 de janeiro de 1969, regula tudo o que diz respeito aos Títulos de Crédito Industriais, que engloba tanto a disciplina das Cédulas de Crédito Industrial quanto a Nota de Crédito Industrial. Sendo que as disposições legais aplicáveis à Cédula de Crédito Industrial são também a Nota de Crédito Industrial, com exceção do que se refere às garantias e à inscrição, pois a Nota de Crédito Industrial não exige garantia real cedularmente constituída.

A definição de cédula de crédito industrial se encontra no artigo 9? do Decreto-lei n? 413/69, e dispõe que esta é “uma promessa de pagamento em dinheiro, com garantia real, cedularmente constituída”. Tal garantia real poderá ser constituída através de penhor, alienação fiduciária ou hipoteca e ser oferecida por terceiro, sendo apresentado no próprio título, dispensando documento à parte, até mesmo na hipoteca.

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No artigo 10º deste mesmo Decreto-lei regula este tipo de cédula de crédito, onde este será um titulo líquido e certo, “com exigibilidade obtida através da soma constante ou do endosso, além de juros, da comissão de fiscalização e das demais despesas que forem realizadas pelo credor com o intuito de segurar, realizar e regularizar o seu direito creditório”.

5.3. Cédula de Crédito Industrial

É uma promessa de pagamento em dinheiro, com garantia real cedularmente constituída, é título à ordem e a dívida no título inscrita é líquida e certa, exigível pela soma dele constante ou do endosso, além dos jurus e comissão de fiscalização, se houver, e demais despesas que o credor fizer para segurança, regularidade e realização de seu direito creditório, não constando do endosso o valor pelo qual se transfere a cédula, prevalecerá o da soma declarada no título, acrescido dos acessórios, deduzidas as quitações parciais passadas o próprio título. A inadimplência de qualquer obrigação do emitente implicará no vencimento antecipado da dívida resultante da cédula.

A Cédula de Crédito Industrial pode ser aditada, ratificada, retificada por meio de menções adicionadas e de aditivos, datados e assinados pelo emitente e pelo credor, lavrados em folha à parte do mesmo formato e que passarão a fazer parte integrante do documento cedular. Os requisitos que devem estar presentes em uma Cédula de Crédito Industrial, que se encontram dispostos no artigo 14 do Decreto-lei 413/69, sendo eles:

1. A denominação “Cédula de Crédito Industrial”;

2. A data de pagamento, no caso de parcelamento a cláusula deverá conter descriminado a data e o valor de cada prestação;

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3. Cláusula discriminando só pagamentos parcelados, quando cabível, será incluída logo após a descrição das parcelas

4. O nome do credor e cláusula à ordem;

5. O valor do crédito aprovado, devendo este ser lançado por extenso e em algarismos, e sua forma de utilização;

6. A descrição dos bens no caso de penhor ou alienação fiduciária, que serão indicados pela espécie, quantidade, qualidade e marca, se houver, além do local ou do depósito de sua situação indicando-se no caso de hipoteca, confrontações, dimensões, confrontações, benfeitorias, títulos e datas de aquisição do imóvel e anotações do registro imobiliário;

7. A descrição dos bens vinculados poderá ser feita em documento à parte, em duas vias, assinadas pelo emitente e pelo credor, fazendo-se na cédula menção a essa circunstância;

8. Da descrição dispensa-se qualquer alusão à data, forma e condições de aquisição dos bens. Também se dispensa qualquer referência às dimensões, confrontações, benfeitorias, títulos de posse de do mínio, para a caracterização das locas ou do depósito dos bens empenhados ou alienados fiduciariamente.

9. Se a descrição do imóvel hipotecado se processar em documento separado, deverão constar também da cédula todas as indicações exigidas, exceto confrontações e benfeitorias.

10. A taxa de juros a pagar e comissão de fiscalização, caso haja, e épocas que serão exigíveis podendo ser capitalizadas;

11. A obrigatoriedade de seguro dos bens objetos da garantia;

12. O local do pagamento;

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13. A data e lugar da emissão; e.

14. A assinatura do próprio punho do emitente ou de representante com poderes especiais. A lei permite, no entanto, que seja colocado em documento à parte os bens vinculados à Cédula, devendo conter a assinatura do emitente e credor.

O Decreto-lei 413/69, em seu artigo 20 especifica os bens que podem ser objetos de penhor cedular, incluído, no artigo 21, os bens adquiridos e pagos pelo financiamento. Pertencendo a terceiros, estes também subscreverão o título que se constitua o vínculo. E para valer contra terceiro o título deve estar inscrito no cartório de Registro de Imóveis de onde se localizam os bens.

5.4. Notas de Crédito Industrial

A nota de crédito industrial é uma promessa de pagamento em dinheiro, sem garantia real. Pois o título privilegia os bens descritos no art. 1563 do CC de 1916, neste sentido, o credito decorrente do título terá uma classificação especial como credor privilegiado, nos casos de recuperação ou falência do emitente.

A cédula de crédito industrial conterá os seguintes requisitos, lançados no contexto:

I - Denominação "Cédula de Crédito Industrial".

II - Data do pagamento, se a cédula for emitida para pagamento parcelado, acrescentar-se-á cláusula discriminando valor e data de pagamento das prestações.

III - Nome do credor e cláusula à ordem.

IV - Valor do crédito deferido, lançado em algarismos por extenso, e a forma de sua utilização.

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V - Descrição dos bens objeto do penhor, ou da alienação fiduciária, que se indicarão pela espécie, qualidade, quantidade e marca, se houver, além do local ou do depósito de sua situação, indicando-se, no caso de hipoteca, situação, dimensões, confrontações, benfeitorias, título e data de aquisição do imóvel e anotações (número, livro e folha) do registro imobiliário.

VI - Taxa de juros a pagar e comissão de fiscalização, se houver, e épocas em que serão exigíveis, podendo ser capitalizadas.

VII - Obrigatoriedade de seguro dos bens objeto da garantia.

VIII - Praça do pagamento.

IX - Data e lugar da emissão.

X - Assinatura do próprio punho do emitente ou de representante com poderes especiais.

Exceto no que se refere às garantias e à inscrição, aplicam-se à nota de Crédito Industrial as disposições do decreto-lei 413/1969 sobre a Cédula de Crédito Industrial.

Modelo de cédula de crédito Industrial

Nº............ Vencimento em ..............de..............................de 20....... R$__________________________________________________ A ......................de....................................de 20..........................pagar............................................. por esta cédula de crédito industrial a ................................................................................ . .....................ou à sua ordem, a quantia de__________________________________________

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__________________________________________________ _________________________________________________ em moeda corrente, valor do crédito deferido para aplicação na forma do orçamento anexo e que será utilizado do seguinte modo:............................................................................ ................................................................................ ........................................................ ................................................................................ ........................................................ ................................................................................ ........................................................ ................................................................................ ........................................................ Os juros são devidos à taxa de ..........................................ao ano exigíveis em trinta (30) de junho trinta e um (31) de dezembro, no vencimento e na liquidação da cédula........................... ................................................................................ ........................................................ sendo de ................................................................. .......................................... a comissão de fiscalização exigível juntamente com os juros................................................... ................................................................................ ........................................................ O pagamento será efetuado na praça de .............................................................................. Os bens vinculados, obrigatòriamente segurados, são os seguintes: ...................................... ................................................................................ ........................................................ ................................................................................ ........................................................ ................................................................................ ........................................................

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Modelo de Notas de Crédito Industrial

Notas de Crédito Industrial - obs.dji: Art. 15; Títulos de Crédito à Exportação - L-006.313-1975

Nº......... Vencimento em..........de...............de 200...........

R$________________________________

A ................................de...........................de 200................pagar......................................

por esta nota de crédito industrial a ................................................................................ ....

......................................ou à sua ordem, a quantia de ________________________________

___________________________________________________

___________________________________________________

em moeda corrente, valor do crédito deferido para aplicação na forma do orçamento anexo a que será utilizado do seguinte modo: ................................................................................ ..

................................................................................

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Os juros são devido à taxa de .........................................ao ano exigíveis em trinta (30) de junho, trinta e um (31) de dezembro no vencimento e na liquidação da cédula ..........................

................................................................................

........................................................

sendo de ................................................................................ ..........................................

a comissão de fiscalização, exigivel juntamente com os juros.................................................

................................................................................

........................................................

O pagamento será efetuado na praça de ..............................................................................

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........................................................

5.5. Títulos de Crédito Comercial

São empréstimos concedidos por Instituições Financeiras a pessoa física ou jurídica que se dedique à atividade comercial ou prestação de serviço. Podem se utilizados os títulos: Cédula de Crédito Comercial e Nota de Crédito Comercial. Ambos criados pela Lei 6.840/1980. Semelhante ao Decreto-lei 413/1969 conforme cita o Aplicam-se à Cédula de Crédito Comercial e à Nota de Crédito Comercial as normas do Decreto-lei 413/1969 inclusive quanto aos modelos anexos àquele diploma, respeitadas, em cada caso, a respectiva denominação e as disposições desta Lei.

5.6. Cédula de Crédito Comercial e Nota de Crédito Comercial

Conforme acentua o art. 5º da Lei que rege Aplicam-se à Cédula de Crédito Comercial e à Nota de Crédito Comercial as normas do Decreto-lei 413/1969, assim por consequência são idênticas, inclusive quanto aos modelos, as Cédulas de Crédito e Nota Comercial.

Modelo de cédula de crédito Comercial

Nº............ Vencimento em ..............de..............................de 20....... R$______________________________________________________ A ......................de....................................de

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20..........................pagar............................................. por esta cédula de crédito comercial a ................................................................................ . .....................ou à sua ordem, a quantia de__________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ em moeda corrente, valor do crédito deferido para aplicação na forma do orçamento anexo e que será utilizado do seguinte modo:................................................................................... ........................................................................................................................................................................................................................................................................................................ ................................................................................

Os juros são devidos à taxa de ..........................................ao ano exigíveis em trinta (30) de junho trinta e um (31) de dezembro, no vencimento e na liquidação da cédula........................... ................................................................................ ....................................................... sendo de ................................................................................ .......................................... a comissão de fiscalização exigível juntamente com os juros................................................... ........................................................................................................................................ O pagamento será efetuado na praça de .............................................................................. Os bens vinculados, obrigatòriamente segurados, são os seguintes:................................................................................ ........................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

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Modelo de Notas de Crédito Comercial

Notas de Crédito Industrial - obs.dji: Art. 15; Títulos de Crédito à Exportação - L-006.313-1975

Nº......... Vencimento em..........de...............de 200...........

R$________________________________

A ................................de...........................de 200................pagar......................................

por esta nota de crédito comercial a ................................................................................ ....

......................................ou à sua ordem, a quantia de

____________________________________________________

____________________________________________________

em moeda corrente, valor do crédito deferido para aplicação na forma do orçamento anexo a que será utilizado do seguinte modo: ................................................................................ ..

................................................................................

................................................................................

................................................................................

................................................................................

................................................................................

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................................................................................

................................................................................

Os juros são devido à taxa de .........................................ao ano exigíveis em trinta (30) de junho, trinta e um (31) de dezembro no vencimento e na liquidação da cédula ...........................................

.........................................................................................................

.........................................................................................................

sendo de ................................................................................ ..........................................................................................................

a comissão de fiscalização, exigivel juntamente com os juros.............................................................................................

......................................................................................................

.....................................................................................................

O pagamento será efetuado na praça de ..............................................................................

................................................................................

..............................................................................

................................................................................

.................................................................................

6. TÍTULOS DE CRÉDITO RURAL

São regulados pelo Decreto-Lei 167, de 14/02/1967, além de dar outras providências. Dentre os títulos estão às cédulas de crédito rural, a nota de crédito rural, a nota promissória rural e a duplicata rural,

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6.1. Cédula de Crédito Rural

Promessa de pagamento em dinheiro, com ou sem garantia real constituída, destinada ao financiamento rural. Tais títulos são líquidos, certos e exigíveis pela soma deles constante ou do endosso, além dos juros, da comissão de fiscalização (se houver) e demais despesas feitas para segurança e regularidade. Se a atividade for intensa e dirigir-se para o mercado, os títulos serão mercantis, e não civis.

1.1- Cédula rural pignoratícia: requisito deve descrever os BENS PENHORADOS, deve indicar a espécie, qualidade, quantidade, marca ou período de produção, se for o caso, além do local ou depósito dos mesmos.

1.2- Cédula rural hipotecária: requisito deve descrever o IMÓVEL HIPOTECADO com suas dimensões, confrontações, benfeitorias, títulos e data da aquisição e anotações (número, livro e folha) do registro imobiliário e indicação do nome se houver.

1.3- Cédula rural pignoratícia e hipotecária: descrever os bens penhorados e imóveis hipotecados como descritos acima.

Observações

a) A célula de crédito rural poderá ser aditada, ratificada ou retificada, por meio de menções adicionais e aditivas, datadas e assinadas pelo credor.

b) Para ter eficácia contra terceiros, deve ser inscrita no Cartório de Registro de Imóveis da comarca do imóvel ou dos bens.

6.2. Nota de Crédito Rural É uma espécie de cédula de crédito rural, mas sem garantia

real, pois sua emissão depende somente do crédito pessoal do devedor. É regido pela Lei 11.101/2005, que determina seus requisitos:

1.1- A denominação Nota de Crédito Rural;

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1.2- A data e condições do pagamento; havendo prestações periódicas ou prorrogações d vencimento, ao título devem ser acrescentadas, como acontecem com as demais cédulas de crédito rural, cláusulas consistentes nas expressões “nos termos da cláusula Forma de Pagamento abaixo” ou “no termos da cláusula Ajuste de Prorrogação abaixo”;

1.3- O nome do devedor e a cláusula à ordem; 1.4- O valor de crédito deferido, lançado em algarismos e

por extenso, com indicação da finalidade ruralista a que se destina o financiamento concedido e a forma de sua utilização;

1.5- Taxa de juros a pagar e da comissão de fiscalização, se houver, e tempo de seu pagamento.

1.6- Praça de pagamento

1.7- Data e lugar da emissão

1.8- Assinatura do próprio punho do emitente ou de representante com poderes especiais.

Para ter eficácia contra terceiros, deve ser inscrita no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição do imóvel cuja exploração se destina o financiamento.

6.3. Nota Promissória Rural É uma promessa direta de pagamento, que o seu criador

(emitente), faz o favor do credor que é o beneficiário da declaração cambial firmada.

Sua única diferença com a nota promissória regulada pela Lei Uniforme de Genebra está na indicação dos produtos objetos da compra e venda ou da entrega. Sua emissão dá-se em razão da entrega a terceiros para revenda ou venda a prazo de qualquer bem de natureza agrícola pelo produtor rural ou por intermédio de suas cooperativas, assim sendo considerados títulos causais e não abstratos.

Seus requisitos são: 1.1- A denominação “Nota Promissória Rural; 1.2- A data do pagamento;

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1.3- O nome da pessoa ou entidade que vende ou entrega bens e a qual deve ser paga a importância mencionada no título. Em seguida ao nome deve ser inserida a cláusula à ordem (endossável);

1.4- A praça de pagamento; 1.5- A soma a pagar em dinheiro em algarismos e por

extenso, que corresponderá ao preço dos produtos adquiridos ou recebidos, ou em adiantamento por conta do preço dos produtos recebidos para venda;

1.6- A indicação dos produtos objeto da compra e venda ou da entrega;

1.7- A data e o lugar da emissão; 1.8- A assinatura do próprio punho do emitente ou de

representante com poderes especiais; Na execução dela podem-se penhorar os bens indicados ou

outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, em seu lugar. O credo tem “o direito de promover, a qualquer tempo, contestada ou não a ação, a venda daqueles bens, observado o disposto nos arts. 704 e 705 CPC, podendo ainda levantar desde logo, mediante caução idônea, o produto líquido da venda, à conta e no limite de seu crédito, prosseguindo-se na ação”.

O portador da nota promissória rural terá classificação especial como credor privilegiado, nos casos de recuperação ou falência do emitente comprador.

6.4. Duplicata Rural

Também é regulada pelo Decreto-lei 167/1967 (arts 46 a 54). Nas vendas a prazo de quaisquer vens de natureza agrícola, extrativa ou pastoril, quando efetuado diretamente por produtores rurais ou por suas cooperativas, também poderá ser utilizada como título de crédito. Portanto é um título causal e à ordem.

Só pode atender às vendas a prazo dos produtos já referidos e não tem modelo fixado em lei. Goza de privilégio especial sobre os

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bens enumerados no art. 1563 do CC/16, ou seja, será credo privilegiado nos casos de recuperação ou falência do comprador.

Requisitos

1- Denominação Duplicata Rural; 2- Data do pagamento, ou a declaração de dar-se a

tantos dias da data da apresentação ou de ser à vista; 3- Nome e domicílio do comprador; 4- Nome e domicílio do vendedor; 5- Soma a pagar em dinheiro, lançada em algarismo e

por extenso, que corresponderá ao preço dos produtos adquiridos; 6- Praça de pagamento; 7- Indicação dos produtos objeto da compra e venda; 8- Data e lugar da emissão; 9- Cláusula à ordem; 10- Reconhecimento da sua exatidão e a obrigação de

pagá-la, para ser firmada do próprio punho do comprador ou de representante com poderes especiais;

11- Assinatura do próprio punho do vendedor ou de representante com poderes especiais.

Depois de emitida deve ser remetida ao comprador para receber deste o seu aceite e ser devolvida ao vendedor. A remessa de duplicata pode ser feita diretamente pelo vendedor ou por seu representante, procurador ou correspondente, por intermédio de instituição financeira, que se incumbe de apresentá-la ao comprador na praça ou lugar de seu domicílio. A devolução deve ocorrer dentro de 10 dias da apresentação, se seu vencimento não for à vista, com o aceite ou a recusa escrita. Poderá ser protestado pelo vendedor se ocorrer a não devolução no prazo legal (protesto por indicação), ou devolução sem aceite e sem a declaração escrita justificando a falta de aceite. A perda ou extravio obriga o vendedor a extrair um novo documento que contenha a expressão “segunda via”.

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O aval é nulo se não for dado por pessoas físicas participantes da pessoa jurídica compradora ou de outras pessoas jurídicas. Porém o protesto é dispensado para assegurar direito de regresso conta endossante e sés avalistas.

6.5. Cédula de Produto Rural Diferencia-se das demais cédulas por representar promessa

de entrega de produtos rurais em vez de promessa de pagamento em dinheiro, promessa essa que se prende à entrega de produtos rurais (Lei 8929). É emitida com ou sem garantia cedularmente constituída. Emitida pelo produtor rural, suas associações ou cooperativas.

Requisitos: 1- Denominação “Cédula de Produto Rural”, 2- Data de entrega, 3- Nome do credor e cláusula à ordem, 4- Promessa pura e simples de entregar o produto, sua

indicação e as especificações de qualidade e quantidade, 5- Local e condições de entrega, 6- Descrição dos bens cedularmente vinculados em

garantia (pode ser feito em documento à parte desde que mencionado na cédula),

7- Data e lugar da emissão, 8- Assinatura do emitente. Segundo os parágrafos 3º e 4º do art. 19 da Lei 8929, a CPR

registrada em sistema de registro e liquidação financeira de ativos autorizada pelo BCB terá as seguintes características:

1- será cartular antes do seu registro e após a sua baixa e escritural ou eletrônica enquanto permanecer registrada em sistema de registro e de liquidação financeira; (Incluído pela Lei nº 11.076, de 2004).

2- os negócios ocorridos durante o período em que a CPR estiver registrada em sistema de registro e de liquidação financeira não serão transcritos no verso dos títulos; (Incluído pela Lei nº 11.076, de 2004).

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3- a entidade registradora é responsável pela manutenção do registro da cadeia de negócios ocorridos no período em que os títulos estiverem registrados. (Incluído pela Lei nº 11.076, de 2004).

4- Na hipótese de contar com garantia de instituição financeira ou seguradora, a CPR poderá ser emitida em favor do garantidor, devendo o emitente entregá-la a este, por meio de endosso-mandato com poderes para negociá-la, custodiá-la, registrá-la em sistema de registro e liquidação financeira de ativos autorizada pelo Banco Central do Brasil e endossá-la ao credor informado pelo sistema de registro.

A CPR é título líquido e certo, exigível pela quantidade e qualidade de produto nela previsto. A garantia cedular de obrigação poderá ser constituída por hipoteca, penhor ou alienação fiduciária.

As regras do direito cambial são aplicáveis a CPR: 1- Os endossos devem ser completos

2- Os endossantes não responder pela entrega do produto, mas tão somente pela entrega da obrigação.

3- É dispensado o protesto cambial para assegurar o direito de regresso contra avalistas.

O emitente da CPR além de responder pela evicção, não pode invocar em seu benefício caso fortuito ou força maior. Para ter eficácia contra terceiros, deve ser averbada ou inscrita no Cartório de Registro de Imóveis do domicílio do emitente.

Poderá ser considerada vencida na hipótese de inadimplemento de qualquer das obrigações do emitente e, para sua cobrança, caberá à execução de cobrança de coisa incerta (arts. 629 a 631 CPC). Se houver garantia decorrente de alienação fiduciária, a busca e apreensão do bem, promovida pelo credor, não elide posterior execução.

6.6. Certificado de Depósito Agropecuário – CDA e Warrant Agropecuário- WA

São títulos de crédito semelhantes só conhecimento de depósito e do Warrant de emissão dos armazéns gerais, ambos são títulos executivos extrajudiciais. (Lei 11.076)

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O CDA representa uma promessa de entrega de produtos agropecuários, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico, já o WA confere direito de penhor sobre o produto descrito no CDA correspondente (Lei 9.973).

São títulos unidos, pois são emitidos simultaneamente pelo depositário, podendo ser transmitidos unidos ou separadamente, mediante endosso, segundo as normas de direito cambial:

1- Os endossos devem ser completos

2- Os endossantes não responder pela entrega do produto, mas tão somente pela entrega da obrigação.

3- É dispensado o protesto cambial para assegurar o direito de regresso contra avalistas

O CDA e o WA serão cartulares, antes de seu registro em sistema de registro e de liquidação financeira, ou serão escriturais ou eletrônicos, enquanto permanecerem registrados em sistema de registro e de liquidação financeira. Seu registro é obrigatório, no prazo de 10 dias contados a partir da data de sua emissão.

Para efeitos legais: 1- Depositário é a pessoa jurídica apta a exercer as

atividades de guarda e conservação dos produtos agropecuários, incluindo as cooperativas, de terceiros e de associados;

2- Depositante é a pessoa física ou jurídica responsável pelos produtos entregues a um depositário para guarda e conservação;

3- Entidade registradora autorizada: é o sistema de registro e de liquidação financeira de ativos autorizados pelo Bando Central do Brasil;

4- Fica autorizada a emissão do CDA e do WA pelo prazo de dois anos por armazéns que não detenham a certificação prevista no art.2º da Lei 9.973, mas que atendam aos requisitos mínimos a ser definidor pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento.

Podem ser negociado nos mercados de bolsa e balcão como ativos financeiros.

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Da emissão do CDA e WA

Devem conter as seguintes informações

1- Denominação de título; 2- Número de controle que deve ser idêntico para cada

conjunto de CDA e WA; 3- Menção de que o deposito do produto se sujeita à

Lei 9973, a essa Lei e, no caso das cooperativas, à Lei 5764; 4- Identificação qualificação e endereços do

depositante e de depositário

5- Identificação comercial do depositário; 6- Cláusula à ordem; 7- Endereço completo do local do armazenamento; 8- Descrição e especificação do produto; 9- Peso bruto e líquido; 10- Forma de acondicionamento; 11- Número de valores, quando cabível; 12- Valor dos serviços de armazenagem, conservação e

expedição, a periodicidade de sua cobrança e a indicação do responsável pelo seu pagamento;

13- Identificação do segurador do produto e do valor do seguro;

14- Qualificação da garantia oferecida pelo depositário, quando for o caso;

15- Data de recebimento do produto e prazo do depósito; 16- Data da emissão do título; 17- Identificação, qualificação e assinatura dos

representantes legais do depositário; 18- Identificação precisa dos direitos que conferem. Emitidos o CDA e WA o produto a que se referem não poderá

ser objeto de penhora, embargo, sequestro ou qualquer embaraço que prejudique sua livre e plena disposição.

O depositário é responsável, civil e criminalmente, inclusive perante terceiros pelas irregularidades e inexatidões constantes no CDA e WA (art. 178 CPB).

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Do registro

Seu registro é obrigatório, no prazo de 10 dias contados a partir da data de sua emissão. Não sendo registrado no prazo referido, o depositante deverá solicitar o cancelamento do título e sua substituição pó novos ou recibo de depósito em seu nome.

Os registros do CDA e WA, unidos ou separados serão atualizados eletronicamente pela entidade registradora autorizada, que é responsável pala manutenção do registro da cadeia de negócios ocorridos no período em que os títulos estiverem registrados em sistema de registro e liquidação financeira de ativos autorizados pelo Banco Central do Brasil.

Do seguro

Para emissão de CDA e WA é obrigatório o seguro determinado pelo art. 6º da Lei 9.973, com cobertura contra incêndio, raio, explosão de qualquer natureza, danos elétricos, vendaval, alagamento, inundação, furacão, ciclone, tornado, granizo, quedas de aeronaves ou quaisquer outros engenhos aéreos ou espaciais, impacto de veículos terrestres, fumaça e quaisquer intempéries que destruam ou deteriorem o produto vinculado àqueles títulos. No caso de armazéns públicos, o seguro obrigatório também conterá cláusula de furto e roubo.

6.7. Certificado de Direitos Creditórios dos Agronegócios - CDCA

“O Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA) é um título de crédito nominativo, de livre negociação, representativo de promessa de pagamento em dinheiro emitido com base em lastro de recebíveis originados de negócios entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, inclusive financiamentos ou empréstimos relacionados com a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária.

6.8. Emissão da CDCA

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Podem emitir CDCA as cooperativas de produtores rurais e de outras pessoas jurídicas que exerçam a atividade de comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos e insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária.

O CDCA deve conter, no mínimo, os requisitos exigidos na legislação aplicável ao título.

Os lastros do título devem ser registrados em entidades autorizadas pelo Banco Central, como o RTA, por exemplo.

6.9. Letra de Crédito do Agronegócio – LCA

É também um título de crédito, instituído pela Lei 11.076. Também é vinculada a direitos creditórios originários de negócios realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, inclusive financiamentos ou empréstimos, relacionados com a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários ou de máquina e implementos utilizados na atividade pecuária.

É um título de crédito nominativo, de livre negociação, representativo de promessa de pagamento em dinheiro e constitui título executivo extrajudicial. É de emissão exclusiva de instituições financeiras públicas ou privadas.

Requisitos

1- O nome da instituição financeira e assinatura de seus representantes legais;

2- O número de ordem, local e data da emissão; 3- A denominação “Letra de Crédito do Agronegócio”; 4- Valor nominal; 5- A identificação dos direitos creditórios a ela

vinculados e seus respectivos valores, o que poderá ser feita em documento à parte;

6- Taxa de juros, fixa ou flutuante, admitida a capitalização;

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7- Data de vencimento ou, se emitido para pagamento parcelado, discriminação dos valores e datas de vencimento das diversas parcelas;

8- Nome do titular

9- Cláusula “à ordem”, ressalvado se emitido sob a forma escritural.

6.10. Certificado de Recebíveis do Agronegócio - CRA

É um título de crédito nominativo, de livre negociação, representativo de promessa de pagamento em dinheiro e constitui título executivo extrajudicial. É vinculado a direitos creditórios originários de negócios realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, inclusive financiamentos ou empréstimos relacionados com a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária. Sua emissão é exclusiva das companhias securitizadores de direitos creditórios do agronegócio.

Requisitos: 1- Nome da companhia emitente; 2- Número de ordem, local e data da emissão; 3- Denominação “certificado de Recebíveis do

Agronegócio”

4- Nome do titular; 5- Valor nominal; 6- Data do vencimento ou, se emitido para pagamento

parcelado, discriminação dos valores e datas de vencimento das diversas parcelas;

7- Taxa de juros, fica ou flutuante, admitida a capitalização;

8- Identificação do Termo de Securitização de Direito Creditórios que lhe tenha dado origem.

6.11. Títulos de Crédito à Exportação

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São títulos de crédito destinados às operações de financiamento à exportação ou a produção de bens para exportação, bem como as atividades de apoio e complementação integrantes e fundamentais da exportação realizadas por Instituições Financeiras. São representados pela Cédula de Crédito à Exportação e pela Nota de Crédito à Exportação.

Os títulos acima mencionados são iguais à Cédula de Crédito Industrial e a Nota de Crédito Industrial. Apesar das Cédulas e Notas de Créditos à Exportação serem regidos pela Lei nº 6.313/78, o Decreto-lei 413/69 que regula à Cédula e a Nota de Crédito Industrial é aplicado de forma subsidiária àqueles títulos.

Os títulos de crédito em estudo podem ser emitidos por pessoas físicas ou jurídicas, que se dediquem a qualquer das atividades ligadas à exportação, ficando os respectivos financiamentos isentos do Imposto sobre Operações Financeiras.

6.12. Cédula de Crédito Bancário

A Cédula de Crédito Bancário é regulada pela Lei nº 10.931/04, em seu art. 26 que reza:

Art. 26. A Cédula de Crédito Bancária é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade.

Como o próprio artigo menciona esta modalidade de título de crédito, não vem a atender uma linha de crédito específica, mas sim qualquer operação de crédito, de qualquer modalidade. E esta é a diferença básica entre a Cédula de Crédito Bancário e os demais títulos de crédito.

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A emissão de Cédula de Crédito Bancário pode ser feita em moeda estrangeira, em favor de instituição domiciliada no exterior, desde que a obrigação esteja sujeita exclusivamente à lei e ao foro brasileiro.

Seus requisitos essenciais são:

a) A denominação “Cédula de Crédito Bancário”;

b) A promessa do emitente de pagar a dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível no seu vencimento ou, no caso de dívida oriunda de contrato de abertura de crédito bancário, a promessa do emitente de pagar a dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível correspondente ao crédito utilizado;

c) A data e o lugar do pagamento da dívida e, no caso de pagamento parcelado, as datas e os valores de cada prestação, ou os critérios para essa determinação;

d) O nome da instituição credora, podendo conter cláusula à ordem;

e) A data e o lugar de sua emissão; e.

f) A assinatura do emitente e, se for o caso, do terceiro garantidor da obrigação, ou de seus respectivos mandatários.

A Cédula de Crédito Bancário pode ser transferida por endosso em preto, transmitindo todos os direitos por ela conferidos, sendo aplicáveis os dispositivos atinentes à legislação cambial. Ela é emitida em várias vias, uma para cada parte, sendo, porém,

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negociável apenas a via do credor, as demais deverão conter em seu corpo a expressão “não negociável”.

Ela pode ser aditada, retificada ou ratificada, mediante documento escrito, datado, com os requisitos previstos na lei, passando a fazer parte da cédula para todos os efeitos.

O referido título pode ser emitido com ou sem garantias real ou fidejussória. Sendo emitida com garantia real esta pode ser constituída por bem de qualquer espécie e seus acessórios cuja titularidade pertença ao próprio emitente ou a terceiro garantidor da obrigação principal. A constituição da garantia poderá ser feita na própria Cédula de Crédito Bancário ou em documento separado, neste caso fazendo-se, na Cédula, menção a tal circunstância.

A validade e eficácia do título não dependem de registro, entretanto, se nele houver garantia real, deve sujeitá-lo a registro para valer contra terceiros.

Se, porventura, o exequente, numa ação judicial, cobrar valor maior do que o valor expresso no título deverá ele pagar em dobro o valor cobrado excedente, sem prejuízo das perdas e danos resultantes.

Não é necessário o protesto para garantir o direito de cobrança do emitente ou seu garantidor, como também não é necessário o protesto para garantir o direito de cobrança contra endossantes, seus avalistas e terceiros garantidores. Pode, no entanto, o credor, se quiser protestar o título por simples indicação, desde que apresente declaração de posse da sua única via negociável, inclusive no caso de protesto parcial.

6.13. Cédula Hipotecária

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A Cédula hipotecária é um título nominativo que surgiu com a organização do sistema financeiro de habitação. Seu objetivo é o de criar condições para aquisição da casa própria aos associados das Associações de Poupança e Empréstimos, bem como captar, incentivar e disseminar a poupança popular.

São requisitos obrigatórios que deverão ser lançados no título:

No anverso do título:

a) Nome, qualificação e endereço do emitente, e do devedor;

b) Número e série da Cédula Hipotecária, com indicação da parcela ou totalidade de crédito que represente;

c) Número, data, livro e folhas do Registro Geral de Imóveis em que foi inscrita a hipoteca e averbada a Cédula Hipotecária;

d) Individualização do imóvel dado em garantia;

e) O valor da cédula como previsto no Decreto-lei, os juros convencionados e a multa estipulada para o caso de inadimplemento;

f) O número de ordem da prestação a que corresponder a Cédula Hipotecária, quando houver;

g) A data do vencimento da Cédula Hipotecária ou quando representativa de várias prestações, os seus vencimentos de amortização e juros;

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h) A autenticação feita pelo oficial de Registro Geral de Imóveis;

i) A data da emissão, e as assinaturas do emitente, com a promessa de pagamento do devedor;

j) O lugar de pagamento do principal, juros, seguros e taxas;

k) No verso do título:

l) Data ou datas de transferência por endosso;

m) Nome, assinatura e endereço do endossante;

n) Nome, qualificação, endereço e assinatura do endossatário;

o) As condições do endosso;

p) A designação do agente recebedor e sua comissão;

q) A indicação dos seguros obrigatórios, estipulados pelo Banco Nacional de Habitação.

Para entrar em circulação, esse título deverá ser averbado, à margem da inscrição da hipoteca a que disser respeito, no Registro Geral de Imóveis. Deve conter nas Cédulas Hipotecária averbada a autenticação do Oficial de Registro de Imóveis. Há casos em que não poderá ser realizada a averbação das referidas cédulas, como nos caso de pré-notação ou anotação de qualquer outro ônus real, ação, penhora ou procedimento judicial que afetem o imóvel, direta ou indiretamente, ou de Cédula Hipotecária anterior, salvo nos casos de Cédula Hipotecária integral ou fracionária.

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A Cédula Hipotecária pode ser transferida por endosso em preto lançado no verso do título, sendo-lhe aplicáveis as disposições referentes à cessão de crédito estabelecida no Código Civil.

No caso de não haver nenhuma notificação, o emitente e o endossante permanecem solidariamente responsáveis pela liquidação do crédito contido na Cédula de Crédito Hipotecário. Para que se eximem da responsabilidade é necessário que seja feita a notificação ao devedor hipotecário e ao segurador, quando houver, de cada emissão ou endosso, até 30 dias após sua realização mediante carta (do emitente ou do endossante, conforme o caso), entregue por recibo ou enviada pelo Registro de Títulos e Documentos, ou ainda por meio de notificação judicial, indicando-se, na carta ou na notificação, o nome, a qualificação e o endereço completo do beneficiário (caso trate de emissão) ou do endossatário (caso trate de endosso). Cabe ainda dizer, que no endosso da Cédula Hipotecária é dispensada a outorga uxória (§ 2º do art. 17), dispensando-se as regras contidas no art. 1.647, I, do CC/02.

Não é permitida a emissão de cédulas hipotecárias sobre hipotecas cujos contratos não prevejam a obrigação do devedor de:

·Conservar o imóvel hipotecado em condições normais de uso;

·Pagar nas épocas próprias todos os impostos, taxas, multas ou quaisquer outras obrigações fiscais que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel;

·Manter o imóvel seguro por quantia no mínimo correspondente ao de seu valor monetário corrigido.

6.14. Debêntures

a) Características

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São títulos regidos pelos arts. 52 a 74 da Lei 6.404/76, que dispõe sobre as S.A. Estes títulos, também chamados de obrigações ao portador, são títulos de crédito causais, que representam frações de valor de contrato de mútuo que as companhias emitem conferindo aos seus titulares direito de crédito contra elas, nas condições constantes da escritura de emissão e do certificado.

b) Emissões em séries

As companhias poderão efetuar mais de uma emissão de Debêntures, e cada emissão pode ser dividida em série. As Debêntures da mesma série terão igual valor nominal e conferirão a seus titulares os mesmo direitos.

c) Valor nominal

As Debêntures terão valor nominal expresso em moeda nacional. Porém, no caso de obrigação, pode ter o pagamento estipulado em moeda estrangeira. Poderão conter cláusulas de correção monetária, aos mesmos coeficientes fixados para a correção dos títulos da dívida pública, ou com base na variação da taxa cambial.

d) Vencimento, amortização e resgate.

A época do vencimento da debênture deverá constar da escritura de emissão e do certificado, podendo a companhia estipular amortizações parciais de cada série, criar fundos de amortização e reservar-se o direito de resgate antecipado, parcial ou total, dos títulos da mesma série.

e) Juros e outros direitos

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A Debênture poderá assegurar a seu titular juros, fixos ou variáveis, participação no lucro da companhia ou prêmio de reembolso.

f) Conversibilidade em ações

A Debênture poderá ser conversível em ações nas condições constante da escritura de emissão, que especificará:

a) A base da conversão seja em números de ações em que poderá ser convertida cada Debênture e o preço da emissão das ações;

b) A espécie e a classe das ações para o exercício do direito à conversão;

c) O prazo e a época para o exercício do direito à conversão;

d) A demais condição a que a conversão acaso fique sujeita.

g) Espécies

Existem duas espécies de Debêntures:

a) Debêntures simples

b) Debêntures conversíveis em ações

Podem as Debêntures ainda serem classificadas segundo a garantia que oferecem:

a) Garantia real

b) Garantia flutuante

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c) Sem garantia (quirografárias)

d) Subordinadas

A garantia flutuante assegura à Debênture privilégio geral sobre o ativo da companhia, mas não impede a negociação dos bens que compõe esse ativo.

As Debêntures que não gozarem de garantia poderá conter cláusula de subordinação aos credores quirografários, preferindo apenas aos acionistas no ativo remanescente, se houver, em caso de liquidação da companhia.

h) Criação e emissão – competência

A competência para criação e emissão de debêntures é da assembleia geral, não podendo ela efetuar novas emissões, antes de colocadas todas as Debêntures das séries de emissão anterior ou canceladas as séries não colocadas, nem negociar nova série da mesma emissão antes de colocadas as anteriores ou cancelado o saldo não colocado.

A assembleia geral fixará:

a) O valor da emissão ou os critérios de determinação do seu limite, e a sua divisão em séries, se for o caso;

b) O número e o valor nominal das Debêntures;

c) As garantias reais ou a garantia flutuante se houver;

d) As condições de correção monetária se houver;

e) A conversibilidade ou não em ações e as condições a serem observadas na conversão;

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f) A época e as condições de vencimento, amortização ou resgate;

g) A época e as condições do pagamento dos juros, da participação nos lucros e do prêmio de reembolso, se houver;

h) O modo de subscrição ou colocação, e o tipo das Debêntures.

i) Limites de emissão

O total do valor das emissões de Debêntures não pode ultrapassar o capital social da companhia, excetuados os casos previstos em leis especiais. Esse limite pode ser excedido até alcançar:

a) 80% do valor dos bens gravados, próprios ou de terceiros, nos casos de Debêntures com garantia real.

b) 70% do valor contábil ativo da companhia, diminuído do montante das suas dívidas garantidas por direitos reais, no caso de Debêntures com garantia flutuante.

Cabe salientar, que os limites previstos acima não se aplicam à emissão de Debêntures subordinadas.

Para que possa haver emissão de Debêntures, alguns requisitos devem ser satisfeitos:

a) Arquivamento no Registro do Comércio, e publicação da ata da assembleia-geral que deliberou sobre a emissão;

b) Inscrição da escritura de emissão no registro de imóveis do lugar da sede da companhia;

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c) Constituição das garantias reais se for o caso.

d) – Conhecimento de Transporte

Segundo entendimento de COSTA (2008, p. 502), Conhecimento de Transporte, não é título de crédito, sendo apenas considerado um contrato de transporte, seja transporte por terra, multimodal ou aéreo. E isto se deve ao fato de que o Decreto nº 19.473/1930 que o regulava ter sido revogado pelo Decreto s/n de abril de 1991, expedido pelo ex-presidente Fernando Collor, restando em vigor apenas o Conhecimento de Transporte Marítimo, já que não foi revogada a parte segunda do Código Comercial referente ao Comércio Marítimo (arts. 457 e seguintes).

O Conhecimento de Frete Marítimo é regulado pelos arts. 575 a 589 do Código Comercial brasileiro. E ele é considerado um título de crédito tendo em vista o disposto no art. 587 do Código Comercial que estabelece ser ele transferível e negociável por via de endosso.

O Conhecimento de Frete Marítimo conterá os seguintes requisitos, estipulados no art. 575 do Código Comercial:

a) O nome do capitão, e o do carregador e consignatário (podendo o omitir o nome deste se for à ordem) e o nome e porte do navio.

b) A qualidade e a quantidade dos objetos da carga, suas marcas e números, anotados à margem.

c) O lugar da partida e a do destino, com declaração das escalas, havendo-as.

d) O preço do frete e primagem, se esta for estipulada, e o lugar e a forma de pagamento.

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e) A assinatura do capitão e a do carregador.

O título original prova o recebimento da mercadoria para o transporte e a obrigação de entregá-la no lugar de destino. Sendo a carga tomada em virtude da carta de fretamento, o portador do conhecimento não fica responsável por alguma condição ou obrigação especial contida na mesma carta, se o conhecimento não tiver a cláusula, segundo a carta de fretamento.

6.15. Letra de Crédito Imobiliário – LCI

A Letra de Crédito Imobiliário – LCI é um título de crédito nominativo regulado pela Lei nº 10.931/04 em seus artigos 12 e seguintes, expedidos por instituições expressamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil, independente de tradição efetiva, lastreadas por créditos imobiliários garantidos por hipoteca ou por alienação fiduciária de coisa imóvel, conferindo aos tomadores direito de crédito pelo valor nominal, juros e, se for o caso, atualização monetária nelas estipulados.

A LCI pode ser transferida por endosso em preto, sendo que o endossante responderá pela veracidade do título, não sendo ele responsável solidário, não cabendo, portanto, ação de regresso contra ele.

O prazo de seu vencimento não poderá ser superior ao prazo de quaisquer dos créditos imobiliários que lhe servem de lastro.

São requisitos que devem conter na LCI:

a) O nome da instituição emitente e as assinaturas de seus representantes;

b) O número de ordem, o local e data da emissão;

c) A denominação “Letra de Crédito Imobiliário”;

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d) O valor nominal e o vencimento;

e) A forma, a periodicidade e o local de pagamento do principal, dos juros e, se for o caso, da atualização monetária;

f) Os juros, fixos ou flutuantes, que poderão ser renegociáveis, a critério das partes;

g) A identificação dos créditos caucionados e seu valor;

h) O nome do titular; e.

i) Cláusula à ordem, se endossável.

6.16. Cédula de Crédito Imobiliário – CCI

A Cédula de Crédito Imobiliário – CCI é um título executivo extrajudicial que representa créditos imobiliários. Vem regulado nos artigos 18 e seguintes da Lei nº 10.931/04. É um título que é exigível pelo valor apurado de acordo com as cláusulas e condições pactuadas no contrato que lhe deu origem.

A emissão da CCI sobre a forma escritural far-se-á mediante escritura pública e ou instrumento particular, devendo este instrumento permanecer custodiado em instituição financeira e registrado em sistema de registro e liquidação financeira de títulos privados autorizados pelo Banco Central do Brasil.

Se o crédito imobiliário for garantido por direito real, deverá proceder a averbação da emissão da CCI no Registro de Imóveis da situação do bem, na respectiva matrícula, devendo dela constar, exclusivamente, o número, a série e a instituição custodiante.

A cessão do crédito contido na CCI poderá ser feito pelo endosso, bem como por meio de sistemas de registro e de

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liquidação financeira de títulos privados autorizados pelo Banco Central do Brasil. A cessão implica em automática transmissão das respectivas garantias ao cessionário, sub-rogando-o em todos os direitos representados pela cédula. A emissão e a negociação da CCI independem de autorização do devedor do crédito imobiliário que ela representa.

São requisitos da CCI:

a) A denominação “Cédula de Crédito Imobiliário”, quando emitida cartularmente;

b) O nome, a qualificação e o endereço do credor e do devedor e, no caso de emissão escritural, também o do custodiante;

c) A identificação do imóvel objeto do crédito imobiliário, com a indicação da respectiva matrícula no Registro de Imóveis competente e do registro da constituição da garantia, se for o caso;

d) A modalidade da garantia se for o caso;

e) O número e a séria da cédula;

f) O valor do crédito que representa;

g) O prazo, a data de vencimento, o valor da prestação total, nela incluídas as parcelas de amortização e juros, as taxas, seguros e demais encargos contratuais de responsabilidade do devedor, a forma de reajuste e o valor das multas previstas contratualmente, com a indicação do local de pagamento;

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h) A condição de integral ou fracionária e, nessa última hipótese, também a indicação da fração que representa;

i) O local e a data da emissão;

j) A assinatura do credor, quando emitida cartularmente;

k) A autenticação pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, no caso de contar com garantia real; e.

l) Cláusula à ordem, se endossável.

Cabe dizer que é vedada a averbação da emissão da CCI com garantia real quando houver pré-notação ou registro de qualquer outro ônus real sobre os direitos imobiliários respectivos, inclusive penhora ou averbação de qualquer mandado ou ação judicial.

O resgate da dívida provar-se com a declaração de quitação, emitida pelo credor, ou, na falta dessa, por outros meios admitidos em direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De fato podemos observar que várias são as peculiaridades referentes aos depósitos, em vista dos que mais são comentados, tornando-se básicos. Obter o conhecimento de como são realizados direcionados proporciona a todos uma maior atenção, principalmente aos empresários que não possuem ciência disso.

Por fim, cabem os profissionais responsáveis em direcionar seus clientes perante as vantagens e desvantagem em relação ao contexto. Não menos deverá ser aos produtores rurais que muitas das vezes são esquecidos. Cabe aqui a nossa observação.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Lei Nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil). Acessada em: 18/02/2016. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Institui o Código Civil). Acessada em: 17/02/2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm

BRASIL. Lei Nº 8.935, de 18 de novembro de 1994 (Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro - Lei dos cartórios). Acessada em: 17/02/2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8935.htm

BRASIL. Lei Nº 9.492, de 10 de setembro de 1997 (Define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências). Acessada em: 17/02/2016. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9492.htm

COSTA, Wille Duarte. Títulos de Crédito: De Acordo com o Novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

DORIA, Dylson. Curso de direito comercial. 9. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1994.

GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, volume I, 14ª ed., 2012, São Paulo: Saraiva;

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GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume I, 10ª ed., 2012, São Paulo: Saraiva;

MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito cambiário. 2. ed. Campinas: Bookseller, 2001, v.1.

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Títulos de Crédito. 8ª edição revista e atualizada. Renovar. Rio de Janeiro: 2014.

SARAIVA, Jose Antônio. A cambial: doutrina, jurisprudência, legislação. Rio de Janeiro: 1947.

CONCEITOS ACERCA DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA, OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA E SUJEIÇÃO PASSIVA À LUZ DO DIREITO TRIBUTÁRIO

ELIARDO SOARES MORAES: Advogado.

RESUMO: A regra-matriz de incidência, obrigação tributária e sujeição passiva são elementos necessários para a formação do crédito tributário. Portanto, tais institutos jurídicos devem ser analisados individualmente, analisando-se cada peculiaridade e os possíveis desdobramentos que eles podem refletir na relação jurídica-tributária existente entre o contribuinte e o Poder Tributante.

Palavras-chaves: Regra-matriz de incidência, obrigação tributária e sujeição passiva.

1 Introdução

Para se entender melhor o crédito tributário, e seus desdobramentos na relação jurídica tributária, é necessário tecer considerações acerca da regra-matriz de incidência, obrigação tributária e sujeição passiva do crédito tributário, com base na jurisprudência e doutrina mais avalizada.

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2. A regra-matriz de incidência tributária e a função do consequente normativo

A definição de norma jurídica é assunto central no discurso científico da teoria geral do direito, despertando inúmeros debates e definições. Dentre as muitas definições que se sobressaem, neste trabalho, esposaremos aquela adotada por Paulo de Barros Carvalho:

As normas jurídicas têm a organização interna das proposições condicionais, em que se enlaça determinada consequência à realização de um fato. Dentro desse arcabouço, a hipótese refere-se a um fato de possível ocorrência, enquanto o consequente prescreve a relação jurídica que se vai instaurar, onde e quando acontecer o fato cogitado no suposto normativo.[1]

Em outro momento, assevera referido autor: “Norma Jurídica” é a expressão mínima e

irredutível (com o perdão do pleonasmo) de manifestação do deôntico, com o sentido completo. Dá-se porque os comandos jurídicos, para serem compreendidos no contexto de uma comunicação bem sucedida, devem revestir um quantum de estrutura formal.[2]

A norma jurídica, portanto, é mais do que uma simples proposição prescritiva, como colocado por Bobbio.[3] Em sua estrutura completa, ela determina a realização de determinado comportamento como decorrência de certo acontecimento por ela descrito.

No que tange à regra-matriz de incidência tributária (RMIT), criação de Paulo de Barros Carvalho, sua esquematização lógica deriva da aplicação do pensamento de Lourival Vilanova, o chamado constructivismo lógico-semântico.[4] Ela foi bem conceituada por Ferragut:

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Regra-matriz de incidência tributária é norma jurídica, definida por nós como sendo a significação organizada numa estrutura lógica hipotético-condicional (juízo implicacional), construída pelo intérprete a partir do direito positivo, seu suporte físico. Tem por função regular condutas intersubjetivas.

Difere das demais normas existentes no direito positivo apenas em virtude de seu conteúdo, que descreve um fato típico tributário e prescreve a relação obrigacional que se estabelece entre os sujeitos ativo e passivo, tendo por objeto o pagamento de uma prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nessa se possa exprimir, não decorrente de ato ilícito (tributo).[5]

Digno de nota, portanto, que a regra-matriz de incidência tributária traz em seu antecedente a descrição do fato jurídico tributário e, em seu consequente, prescreve ao sujeito passivo o dever de levar dinheiro aos cofres públicos. Em outras palavras, ela prevê a hipótese de incidência tributária e a obrigação tributária dela decorrente.

A função do consequente da regra-matriz de incidência tributária, como se pode inferir, é trazer os critérios para que determine como poderá ocorrer o cumprimento da obrigação tributária. Para tanto, nela se identificam os sujeitos ativos e passivos da obrigação – critério pessoal –, bem como o objeto da prestação pecuniária a ser cumprida – critério quantitativo.[6]

3. Obrigação tributária e deveres instrumentais. Neste segmento, concordamos inteiramente com a doutrina

de Paulo de Barros Carvalho. A correta distinção entre obrigação tributária e deveres

instrumentais exige que se realize, primeiro, outra distinção: entre

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relação jurídica e obrigação. Segundo pontua este autor, são obrigações as relações jurídicas cuja prestação possa ser objeto de apreciação econômica.[7] Nessa mesma senda, a prestação prevista no art. 3º do Código Tributário Nacional, de cunho evidentemente patrimonial, que compõe a RMIT dos tributos, obviamente, caracteriza-se como obrigação, diferentemente das relações jurídicas que estatuem prestações de fazer ou não fazer de índole tributária. Estas, por não serem susceptíveis de apreciação econômica, constituem-se em meros deveres instrumentais ou formais.[8]

O CTN, em seu art. 113, caput, divide as obrigações em principais e acessórias, sendo que estas corresponderiam aos já mencionados deveres instrumentais. A nomenclatura obrigações acessóriasrevela-se imprópria por duas razões: primeiramente, por não terem conteúdo econômico, não podem ser chamadas de obrigações; em segundo lugar, nem sempre serão acessórias, haja vista que, nem sempre, haverá uma obrigação principal a quem se refiram, afinal de contas, os deveres instrumentais devem ser cumpridos mesmo que não exista prestação pecuniária a ser adimplida.[9]

O código, sem sombra de dúvidas, cometeu grande imprecisão ao afirmar, no §1º do artigo 113, que a obrigação principal tem por objeto pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Crítica contundente e precisa ao dispositivo foi realizada por Paulo de Barros Carvalho:

Por amor às formulações singelas e desamor ao senso jurídico, na se admite comprometer a estrutura sistêmica de tão relevantes instituições, que jamais se confundem numa única realidade, mas que operam conjugadas para dar força e expressão ao direito.

Sobrados motivos existem para dirigirmos graves censuras à composição verbal do texto

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analisado. É imperioso depurá-lo, suprimindo, por imposição do próprio sistema, as palavras ou penalidade pecuniária, salvaguardando, desse modo, a pureza e a integridade do conceito de obrigação tributária.

Acaso estivesse pensando o político nas vantagens de equiparar relações, com o fito de cobrá-las conjuntamente, como de fato acontece, não se expressou bem, ingressando pelo setor perigoso das equivalências espúrias e desautorizadas.[10]

Categorias jurídicas distintas – obrigação tributária e pecuniária –, ao, serem tratadas da mesma forma, ensejam inúmeras confusões. Decorrência disso é que, em vários outros momentos nos quais o código se refere a cumprimento de obrigações principais, pairam dúvidas doutrinárias a respeito de tal expressão incluir também penalidades pecuniárias. Exemplo disso pode ser encontrado na questão n . 6, item b, adiante. Há grandes divergências quando se trata de responder se a sucessão tributária de que trata o artigo 133 do CTN refere-se também às penalidades pecuniárias, pois o dispositivo assevera que o sucessor será responsável pelos “tributos”. Referia-se o legislador, quando fala em “tributos”, à obrigação principal do artigo 113, §1º, que também inclui penalidade pecuniária? Tais perplexidades são o preço que se paga pela confusão no texto legislado entre realidades jurídicas absolutamente distintas.[11]

4. Conceito de Base de Cálculo

Uma vez mais, ecoaremos a doutrina de Paulo de Barros Carvalho, para quem:

Temos para nós que a base de cálculo é a grandeza instituída na consequência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do

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comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária. Paralelamente, tem a virtude de confirmar, infirmar ou afirmar o critério material expresso na composição do suposto normativo. A versatilidade categorial desse instrumento jurídico se apresenta em três funções distintas: a) medir as proporções reais do fato; b) compor a específica determinação da dívida; e c) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente da norma.[12]

Definida a base de cálculo como medida situada no consequente da regra-matriz de incidência tributária – trata-se de componente do seu critério quantitativo – destinada a dimensionar o fato gerador, ela se presta ainda, como se vê, a compor com a alíquota a operação aritmética que definirá o valor da obrigação tributária e, por último, a afirmar, confirmar ou infirmar a hipótese de incidência do tributo quando da definição de sua espécie. A tais funções, respectivamente, Barros Carvalho atribui as denominações de mensuradora, objetiva e comparativa.[13] Esse entendimento também é acolhido por Roque Antonio Carrazza.[14]

No que toca à função comparativa, dada a sua elevada importância, alguns esclarecimentos precisam ser prestados. Barros Carvalho a pormenoriza da seguinte maneira:

(...) A grandeza haverá de ser mensuradora adequada da materialidade do evento, constituindo-se, obrigatoriamente, de uma característica peculiar ao fato jurídico tributário. Eis a base de cálculo, na sua função comparativa, confirmando, infirmando ou afirmando o verdadeiro critério material da hipótese tributária. Confirmando, toda vez que

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houver perfeita sintonia entre o padrão da medida e o núcleo do fato dimensionado. Infirmando, quando for manifesta a incompatibilidade entre a grandeza eleita e o acontecimento que o legislador declara como a medula da previsão fáctica. Por fim, afirmando, na eventualidade de ser obscura a formulação legal, prevalecendo, então, como critério material da hipótese, ação-tipo que está sendo avaliada.

Introduzimos uma noção de induvidosa operatividade, para a qual convocamos todas as atenções: havendo desencontro entre os termos do binômio (hipótese de incidência e base de cálculo), a base é que deve prevalecer.[15]

Dessa forma, a base de cálculo, em sua função comparativa, presta-se à investigação da verdadeira natureza da espécie tributária analisada. Nesse sentido, Roque Carrazza nos traz exemplos bastante elucidativos. Afirma citado autor que, se determinada exação é criada e tem como sua hipótese de incidência a aquisição de renda, jamais sua base de cálculo poderia ser o patrimônio, por exemplo, mas alguma medida de renda, sob pena de se criar um imposto sobre patrimônio, e não sobre a renda.[16]

5. Sujeição passiva: : (i) sujeito passivo; (ii) contribuinte; (iii) responsável tributário; e (iv) substituto tributário – distinguindo: substituição tributária para trás; substituição (convencional); agente de retenção e substituição para frente.

Barros Carvalho distingue a capacidade para praticar fatos tributários, a qual, independe da existência de personalidade jurídica, da capacidade de ser pólo passivo em obrigação tributária, situação para a qual a personalidade jurídica afigura-se imprescindível.[17] A essas duas situações, respectivamente, correspondem os conceitos de sujeição passiva e capacidade

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passiva. Com isso, é lícito afirmar que, por exemplo, uma sociedade de fato, entidade despersonalizada, possui capacidade para a realização de atos tributários. Ela não poderá, contudo, ser pólo passivo de uma relação jurídica tributária, na medida em que, por não possuir personalidade jurídica, não pode ser sujeito de direitos e deveres, é, portanto, destituída de patrimônio.

O conceito de sujeito passivo, por sua vez, em nossa acepção, foi muito bem definido por Ferragut:

Para nós, é a pessoa física ou jurídica, privada ou pública, detentora de personalidade, e de quem juridicamente exige-se o cumprimento da prestação. Consta, obrigatoriamente, do pólo passivo da relação jurídica, única forma que o direito reconhece para obrigar alguém a cumprir determinada conduta.[18]

No mesmo sentido, Andréa Darzé, quando comenta o artigo 121 do Código Tributário: “Figurar como devedor da relação jurídica tributária, independentemente do tipo de vínculo que mantém com o suporte factual do tributo, é, nos termos dessa norma geral, condição suficiente para ser incluído na classe dos sujeitos passivos tributários.”[19] Sendo o sujeito passivo aquele que ocupa o pólo passivo do laço obrigacional, o sujeito passivo da obrigação tributária será o gênero que abrigará as espécies contribuinte e responsável. Citemos novamente a conceituação de Ferragut, a qual subscrevemos inteiramente:

Contribuinte é a pessoa que realizou o fato jurídico tributário, e que cumulativamente encontra-se no pólo passivo da relação obrigacional. Se uma das duas condições estiver ausente, ou o sujeito será responsável, ou será realizador do fato jurídico, mas não contribuinte. Praticar o evento, portanto, é condição

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necessária para essa qualificação, mas insuficiente.[20]

Portanto, o contribuinte será o sujeito passivo que possui relação pessoal e direita com o fato tributário (art. 121, I do CTN), ao passo que o responsável é o sujeito passivo da obrigação tributária indiretamente vinculado ao fato tributário (art. 121, II do CTN). Alguns autores, a exemplo de Carrazza, falam em sujeitos passivos indiretos, para se referir aos responsáveis tributários.[21]

Quanto à substituição tributária, mais uma vez adotamos o posicionamento de Ferragut, que assim define a norma que estabelece essa modalidade de responsabilidade:

Substituição é proposição prescritiva (norma jurídica lato sensu) que prevê, em seu antecedente, uma relação direta ou indireta firmada entre o substituto e substituído, ou direta entre o substituto e o fato jurídico tributário (tal como venda e compra de mercadorias, pagamento e recebimento de salário, pagamento e recebimento de honorários por serviços prestados etc.) e prescreve, em seu conseqüente, a obrigação de o substituto cumprir a obrigação tributária gerada em virtude de fato juridicamente relevante praticado pelo substituído, ao mesmo tempo que exonera este último de cumprir com a obrigação.[22]

A substituição tributária apresenta-se sob três formas. A primeira é a substituição tributária para trás, na qual o substituto é responsável pelo pagamento de créditos tributários referentes a fatos jurídicos tributários anteriormente realizados pelo substituído. A segunda é a substituição tributária convencional, em que a responsabilização se processa simultaneamente à ocorrência do fato jurídico tributário. Por fim, a substituição tributária para frente, na qual o substituto responde por créditos tributários presumidos referentes a fatos jurídicos tributários ainda a serem praticados pelo

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substituído.[23] Esta última sistemática, a nosso ver, reveste-se de incontornável inconstitucionalidade, em que pesem entendimentos jurisprudenciais diversos e a alteração promovida na Lei Maior para incluir um §7º em seu artigo 150 a autorizar a cobrança de tributos por fatos geradores ainda não ocorridos – tal dispositivo, a nosso ver, é igualmente inconstitucional.

No que toca ao agente de retenção, faz-se mister realizar uma pequena incursão no trabalho de Luís César Souza Queiroz. Para tal autor, diferentemente dos supramencionados, o único sujeito de direito que pode figurar como pólo passivo numa obrigação de natureza tributária é o contribuinte.[24] O responsável tributário, segundo ele, não é sujeito passivo de uma relação jurídica de cunho tributário, mas de relação que pode ser de caráter sancionatório ou, simplesmente não-tributária – seria o caso da responsabilidade decorrente de sub-rogação subjetiva.[25] Por fim, em relação à substituição tributária, por se tratar de instituto que se fundamenta no interesse da Administração Tributária, duas relações jurídicas de seriam por ela abrangidas:

- a primeira, de natureza tributária, é aquela entre o contribuinte (a única pessoa, repise-se, que, na visão deste autor, pode figurar no pólo passivo de obrigação tributária) e o Estado, o qual, na substituição tributária, é representado por um agente arrecadador, que é nada mais do que o substituto;

- uma segunda, de natureza administrativo-fiscal, que se trava entre o agente arrecadador (substituto) e o Estado, segundo o qual aquele é obrigado a entregar a este o dinheiro recebido do contribuinte.[26]

Em face dos fundamentos já expostos, não concordamos com a esquematização proposta por este autor. Como dito, para nós, tanto o responsável quanto o contribuinte podem ser sujeitos passivos de uma obrigação tributária. O que Souza Queiroz, em sua complicada elaboração, denomina de agente arrecadador, nós chamamos simplesmente de substituto. A nosso ver, este autor buscou distinguir objetos idênticos, quais sejam, as relações

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jurídico-obrigacionais nas quais figuram como pólo passivo o contribuinte e o responsável, pois são ambas de caráter tributário.

6. O responsável Tributário

O responsável tributário poderá ser sujeito passivo de relação jurídico tributária, sancionatória e de relação de dever instrumental. Poderá ser sujeito passivo de relação jurídica de dever instrumental sempre que o legislador determinar-lhe o cumprimento de obrigações de dar e fazer não sujeitas a apreciação de cunho econômico (vide supra, quando distinguimos obrigação jurídica de dever instrumental).

Referentemente às outras possibilidades, na opinião de Barros Carvalho, sempre que o responsável tributário for escolhido pelo legislador entre pessoas estranhas à ocorrência do fato tributário, será pólo passivo de obrigação jurídica de cunho sancionatório[27]. A sanção, nesses casos, por decisão política do legislador, possuiria o mesmo valor pecuniário da obrigação tributária, sendo que seu pagamento implica na extinção de ambos os vínculos.[28]

Ferragut, por sua vez, afirma que a norma de responsabilidade poderá implicar em uma obrigação jurídica de natureza tributária ou sancionatória, conforme o antecedente da norma que estabeleça a responsabilidade preveja um acontecimento lícito ou ilícito, respectivamente.[29] Já Andréa Darzé, enxerga a necessidade de um requisito além de o antecedente da norma sancionadora prever um comportamento ilícito:

Noutros termos, a prática de ato ilícito é condição necessária, mas não suficiente, para se atribuir responsabilidade tributária, sendo indispensável que da infração decorra resultado específico, qual seja, mascarar a ocorrência de evento tributário para não recolher a quantia devida a título de tributo, pagá-la com redução,

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ou diferir, no tempo, a prestação pecuniária. Do contrário, ter-se-á responsabilidade de outra natureza, que não tributária.[30]

Como já afirmamos em resposta a item anterior, a obrigação tributária não se confunde com a obrigação pecuniária decorrente de norma sancionadora. O legislador, entretanto, ignorou essa distinção e equiparou essas duas categorias sob o manto da obrigação principal com o intuito de facilitar a sua cobrança, submetendo-as ao mesmo regime. O que se pode concluir disso é que, tanto a obrigação tributária (decorrente da prática do fato tributário e que resulta na obrigação de pagar a prestação pecuniária a que se refere o artigo 3º do CTN) quanto a de natureza sancionatória submetem-se ao regime jurídico tributário, obedecendo, por exemplo, aos preceitos relativos a prescrição, decadência, suspensão da exigibilidade, extinção do crédito etc. previstos do CTN.

No final das contas, a responsabilidade tributária terá caráter sancionatório sempre que for decorrente de norma cujo antecedente traga um comportamento ilícito por parte do responsável, tendo como consequente a sujeição passiva tributária. Entretanto, contrariamente a Andréa Darzé, entendemos que não há necessidade do segundo requisito por ela colocado para que se estabeleça a responsabilidade tributária sancionatória, qual seja, a finalidade específica consistente na evasão de deveres tributários. Basta pensar no caso do artigo 135 do CTN, não é preciso, por exemplo, que um dirigente haja com o intuito específico de não pagar tributos para que seja penalizado com a responsabilidade tributária, basta que viole lei, contrato social, estatuto para tanto.

7. A sucessão empresarial à luz do Direito Tributário

Imaginemos a seguinte problemática: A empresa “A” adquiriu estabelecimento industrial da empresa

“B” e continuou sua atividade. Aproximadamente um ano depois da aquisição, a empresa “A” é demandada pelo Fisco em relação a

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fatos geradores realizados pela empresa “B”. No contrato de compra e venda não há disciplina a respeito das dívidas tributárias anteriores à aquisição. Pergunta-se:

a) Pode o Fisco, após a indigitada operação de compra e venda, exigir os tributos, cujos fatos geradores foram realizados por “B” antes da sua aquisição, diretamente de “A”? Há relevância se houver no contrato cláusula de responsabilidade de “B” quanto aos débitos anteriores à operação?

A situação narrada subsume-se ao disposto no artigo 133, II do Código Tributário Nacional. Houve alienação de estabelecimento sem que a pessoa jurídica alienante cessasse a exploração da atividade, portanto o adquirente é subsidiariamente responsável pelos tributos devidos pelo alienante relativamente a tal estabelecimento até a data da alienação.

O cerne da questão consiste em saber se a responsabilidade do sucessor existirá apenas relativamente aos tributos constituídos antes da aquisição do estabelecimento ou apenas se também abrange aqueles decorrentes de atos praticados antes da alienação mas ainda não constituídos, como parece ser o que dispõe a literalidade do artigo 129 do CTN. Com relação a isso, concordamos inteiramente com a doutrina de Andréa Darzé:

A nosso ver, entretanto, essa generalização não se sustenta. Diante das premissas fixadas no curso deste estudo, a conclusão só pode ser uma: em situações de normalidade, o sucessor não pode ser responsabilizado por créditos tributários que não estavam, ao menos, em curso de constituição no instante em que celebrou qualquer dos negócios jurídicos previstos nos artigos 130 a 133 do CTN. Essa tomada de posição é mero desdobramento dos limites constitucionais que regem a responsabilidade não sancionatória, os quais

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exigem que ela venha sempre acompanhada de norma de repercussão jurídica.[31]

Portanto, poderá o Fisco exigir os tributos decorrentes de fatos geradores ocorridos antes da indigitada operação apenas se os respectivos créditos já haviam sido constituídos até a data da operação ou, ao menos, estavam em curso de constituição.

Eventual contrato com cláusula que atribuísse responsabilidade por créditos tributários a “B” teria relevância apenas interpartes. Em face do disposto no artigo 23 do CTN, não poderia ser outro o entendimento a ser adotado.

Por fim, no que tange às multas e juros, remetemos o leitor ao item seguinte.

b) A empresa “A” sujeita-se às sanções tributárias materiais: (i) multa de mora, (ii) multa pelo não pagamento de tributo, (iii) juros e (iv) multa pelo descumprimento de deveres formais se aplicadas antes da operação de compra e venda? E se aplicadas depois da operação? (Vide anexos I e II).

Nesse particular Maria Rita Ferragut, inicialmente, assevera o seguinte:

Entendemos que a responsabilidade do sucessor englobará não só o valor atualizado dos tributos então devidos pelo sucedido, como também as multas, já que ambos integram o passivo fiscal. Tributo, na redação dos referidos artigos, equivale a ‘crédito tributário’, que engloba tanto o principal quanto as cominações legais.[32]

Posteriormente, a autora faz a ressalva de que nem todas as multas podem ser objeto de sucessão, mas apenas aquelas de natureza moratória.[33] Em que pese tal entendimento doutrinário, firmados na premissa exposta no item anterior, segundo a qual o sucessor será responsável apenas pelos tributos já constituídos ou em curso de constituição à data da alienação do estabelecimento

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ou fundo de comércio, vislumbramos, da mesma maneira, que “A” está sujeita apenas às sanções tributárias que já constituídas ou em curso de constituição quando da aquisição do estabelecimento industrial de “B”.

8. A responsabilidade prevista no art. 135 do CTN

Em que pesem entendimentos contrários – por exemplo, Peixoto[34] –, o artigo 135 do Código Tributário Nacional é muito claro ao definir que as pessoas apontadas em seus incisos são pessoalmente responsáveis pelos atos que pratiquem com excesso de poderes, infração à lei e contrato social ou estatuto, não havendo, na matéria legislada, nenhum outro dispositivo que enseje uma interpretação no sentido de que tal responsabilidade é subsidiária ou solidária. Nesse sentido, Ferragut.[35]

Em decorrência desse entendimento, não poderíamos admitir que fosse possível a proposição de execução fiscal solidariamente ao contribuinte. A responsabilidade baseada no artigo 135 é, como dito, pessoal, logo, apenas os indivíduos indicados em seus incisos poderiam ser executados com fulcro nesse dispositivo.

9. A hipótese de dissolução irregular

Sem dúvida, a dissolução irregular de sociedade caracteriza-se como infração apta a ensejar a responsabilidade do sócio pela pessoa jurídica. A situação enquadra-se perfeitamente à noção de infração à lei prevista no caput do artigo 135, cuja consequência consiste na responsabilização do sócio que para tanto tenha competido.

Acompanhamos, contudo, a ressalva feita por Peixoto ao tratar do tema da responsabilidade tributária decorrente da dissolução irregular de sociedades empresárias. Referido autor assevera que, para efeitos de responsabilização tributária em uma dissolução irregular, o ponto a ser observado é se há poderes de gestão.[36] Portanto, não basta ser sócio, é necessário que seja

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administrador, que tenha poder de decisão e haja intervindo na dissolução irregular da sociedade.

Com relação à questão do mero inadimplemento da obrigação de pagar o tributo, a nosso ver, ele não é suficiente para responsabilização do sócio de pessoa jurídica. Aqui, seguimos a lição de Ferragut, que assevera que a norma de responsabilização do artigo 135 prevê, em seu antecedente, a prática de ato ilícito por alguma das pessoas indicadas em seus incisos. De tal ato deve decorrer obrigação tributária, a qual, em função da norma de responsabilidade, deve ser adimplida por elas.[37]

O simples inadimplemento de tributo não decorre de ato contrário à lei. Há, no entendimento contrário, uma inversão da fenomenologia da incidência da norma de responsabilidade pessoa prevista no supracitado dispositivo do Código. Além do quê, a admissão da responsabilização dos sócios em decorrência do mero inadimplemento de tributo implica em uma relativização absolutamente indesejável da personalidade jurídica. É sempre bom rememorar que o intuito da pessoa jurídica é exatamente criar uma separação entre o patrimônio da empresa (no caso de sociedade empresária) e o patrimônio de seus sócios, até como forma de se incentivar a atividade empresária. Esse, aliás, é o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo.

10. Conclusão

A regra-matriz de incidência tributária traz em seu antecedente a descrição do fato jurídico tributário e, em seu consequente, prescreve ao sujeito passivo o dever de levar dinheiro aos cofres públicos. Em outras palavras, ela prevê a hipótese de incidência tributária e a obrigação tributária dela decorrente.

A função do consequente da regra-matriz de incidência tributária, como se pode inferir, é trazer os critérios para que determine como poderá ocorrer o cumprimento da obrigação

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tributária. Para tanto, nela se identificam os sujeitos ativos e passivos da obrigação – critério pessoal –, bem como o objeto da prestação pecuniária a ser cumprida – critério quantitativo

O CTN, em seu art. 113, caput, divide as obrigações em principais e acessórias, sendo que estas corresponderiam aos já mencionados deveres instrumentais. A nomenclatura obrigações acessórias revela-se imprópria por duas razões: primeiramente, por não terem conteúdo econômico, não podem ser chamadas de obrigações; em segundo lugar, nem sempre serão acessórias, haja vista que, nem sempre, haverá uma obrigação principal a quem se refiram, afinal de contas, os deveres instrumentais devem ser cumpridos mesmo que não exista prestação pecuniária a ser adimplida

Define-se a base de cálculo como medida situada no consequente da regra-matriz de incidência tributária – trata-se de componente do seu critério quantitativo – destinada a dimensionar o fato gerador, ela se presta ainda, como se vê, a compor com a alíquota a operação aritmética que definirá o valor da obrigação tributária e, por último, a afirmar, confirmar ou infirmar a hipótese de incidência do tributo quando da definição de sua espécie.

Por sua vez, o contribuinte será o sujeito passivo que possui relação pessoal e direita com o fato tributário (art. 121, I do CTN), ao passo que o responsável é o sujeito passivo da obrigação tributária indiretamente vinculado ao fato tributário (art. 121, II do CTN). Alguns autores, a exemplo de Carrazza, falam em sujeitos passivos indiretos, para se referir aos responsáveis tributários.

O responsável tributário poderá ser sujeito passivo de relação jurídico tributária, sancionatória e de relação de dever instrumental. Poderá ser sujeito passivo de relação jurídica de dever instrumental sempre que o legislador determinar-lhe o cumprimento de obrigações de dar e fazer não sujeitas a apreciação de cunho econômico (vide supra, quando distinguimos obrigação jurídica de dever instrumental).

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O simples inadimplemento de tributo não decorre de ato contrário à lei. Há, no entendimento contrário, uma inversão da fenomenologia da incidência da norma de responsabilidade pessoa prevista no supracitado dispositivo do Código

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. 3. ed. Bauru: Edipro, 2005.

CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

______. Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011.

DARZÉ, Andréa Medrado. Responsabilidade tributária dos sucessores: conteúdo e alcance do art. 129 do código tributário nacional. In Congresso Nacional de Estudos Tributários, VI, 2009, São Paulo.Sistema tributário brasileiro e a crise atual. São Paulo: Noeses, 2009.

FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2009.

PEIXOTO, Daniel Monteiro. Dissolução de sociedades e a responsabilidade tributária no contexto de regras de direito tributário e de direito societário. InCongresso Nacional de Estudos Tributários, VI, 2009, São Paulo. Sistema tributário brasileiro e a crise atual. São Paulo: Noeses, 2009.

QUEIROZ, Luís César Souza. Sujeição passiva tributária. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

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NOTAS:

[1] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 137.

[2] Id. Ibidem, p. 609.

[3] BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. 3. ed. Bauru: Edipro, 2005, p. 72.

[4] CARVALHO, Paulo de Barros. Ibidem. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 146.

[5] FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 25.

[6] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 353.

[7] Id. Ibidem, p. 158.

[8] Id. Ibidem, p. 159.

[9] Id. Ibidem, p. 361-362.

[10] Id. Ibidem, p. 365.

[11] Conferir nosso posicionamento na resposta ao item mencionado.

[12] Id. Ibidem, p. 400.

[13] Id. Ibidem, p. 405.

[14] CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária, São Paulo: Noeses, 2010, p. 173.

[15] CARVALHO, Paulo de Barros. Ibidem, p.405.

[16] CARRAZZA, Roque Antonio. Ibidem, p. 171.

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[17] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método, 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 637-38.

[18] FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002, 2. ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 29.

[19] DARZÉ, Andréa Medrado. Responsabilidade tributária dos sucessores: conteúdo e alcance do art. 129 do código tributário nacional. In Congresso Nacional de Estudos Tributários, VI, 2009, São Paulo.Sistema tributário brasileiro e a crise atual. São Paulo: Noeses, 2009, p. 90.

[20] Id, Ibidem, p. 29-30.

[21] CARRAZZA, Roque Antonio. Ibidem, p. 163.

[22] FERRAGUT, Maria Rita. Ibidem, 2. ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 60-61.

[23] Id. Ibidem, p. 64.

[24] QUEIROZ, Luís César Souza. Sujeição passiva tributária. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.180.

[25] Id. Ibidem, p. 199.

[26] Id. Ibidem, p. 201.

[27] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método, 4. ed. São Paulo: Noeses, 2011, p. 646.

[28] Id. Ibidem, p. 648.

[29] FERRAGUT, Maria Rita. Ibidem, p. 60-61.

[30] DARZÉ, Andréa Medrado. Ibidem, p. 97.

[31] Id. Ibidem, p. 109.

[32] FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade tributária e o Código Civil de 2002, 2. ed. São Paulo: Noeses, 2009, p. 95.

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[33] Id. Ibidem, p. 98.

[34] PEIXOTO, Daniel Monteiro. Dissolução de sociedades e a responsabilidade tributária no contexto de regras de direito tributário e de direito societário. InCongresso Nacional de Estudos Tributários, VI, 2009, São Paulo. Sistema tributário brasileiro e a crise atual. São Paulo: Noeses, 2009, p. 269.

[35] FERRAGUT, Maria Rita, Ibidem, p. 118-119.

[36] PEIXOTO, Daniel Monteiro. Ibidem, p. 273.

[37] FERRAGUT, Maria Rita. Ibidem, p. 123

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A TEORIA DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA DE MARCELO NEVES

LUCAS SILVEIRA PORDEUS: Advogado, graduado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), pós-graduado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET).

RESUMO: O presente trabalho busca explicar o fenômeno chamado pelo jusfilósofo Marcelo Neves deconstitucionalização simbólica. São descritos, primeiramente, os fundamentos teóricos da constitucionalização simbólica, que são a linguagem sistêmica de Niklas Luhmann e a noção de legislação simbólica. Os principais conceitos atinentes à teoria sistêmica que embasam a constitucionalização simbólica são as diferenciações entre sociedade, sistemas e subsistemas; a função do subsistema jurídico e a sua autonomia operacional. A legislação simbólica, por sua vez, consiste na hipertrofia da função simbólica da lei em detrimento da sua função instrumental. A constitucionalização simbólica é caracterizada como a hipertrofia da função simbólica da norma constitucional em detrimento da sua função instrumental da qual resultem danos ao núcleo do subsistema constitucional, compreendido pelas eleições democráticas, princípio da separação de poderes e os direitos fundamentais. Da constitucionalização simbólica são explicitadas diferentes consequências: do ponto de vista sistêmico, o subsistema jurídico enfrenta problemas tanto com relação à sua auto-referência quanto em relação à heterorreferência; do ponto de vista semiótico, a constitucionalização simbólica resulta em deficiências sintáticas, semânticas e pragmáticas do subsistema jurídico; politicamente, as consequências observáveis são três, o inconformismo das massas, a indiferença ou a imposição autoritária.

Palavras-chave: 1. Constitucionalização simbólica; 2. Teoria sistêmica; 3. Legislação simbólica.

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1. INTRODUÇÃO

Este artigo a teoria da constitucionalização simbólica de Marcelo Neves, a qual se afigura como uma matéria de filosofia do direito que se insere na temática do constitucionalismo. Trata-se de questão pertinente à concretização das normas constitucionais sob uma perspectiva sistêmica e semiótica.

Será visto que Marcelo Neves busca, ao tratar da constitucionalização simbólica, explorar as relações entre a função instrumental da norma jurídica constitucional (qual seja, a função de regular a conduta) com a função simbólica, a função político-ideológica. Nesse sentido, a constitucionalização simbólica surge em face da hipertrofia da função simbólica em detrimento da função instrumental da norma jurídica constitucional, da discrepância entre uma e outra dimensão.

Dessa maneira, começaremos com a explanação de alguns dos principais marcos teóricos utilizados por Marcelo Neves na confecção de sua teoria da constitucionalização simbólica. Tal explanação começará pela teoria sistêmica de Luhmann, uma das grandes influências de Marcelo Neves. Serão elucidados conceitos como a ideia de sistema e de ambiente, código binário, diferenciação funcional, bem como algumas particularidades do sistema jurídico. Em seguida, outra importante fonte teoria da teoria da constitucionalização simbólica será abordada: a legislação simbólica.

Posteriormente, trabalhar-se-á a teoria da constitucionalização simbólica propriamente dita. Realizar-se-á a definição da constitucionalização simbólica, e, após, serão analisadas algumas consequências sistêmicas, semióticas e políticas da constitucionalização simbólica.

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2. DAS BASES TEÓRICAS DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA

Este item objetiva elucidar algumas das premissas teóricas utilizadas por Marcelo Neves (jurista pernambucano contemporâneo cuja produção acadêmica concentra-se nos campos da filosofia e sociologia do direito, ciência política e direito constitucional) na elaboração da sua teoria da constitucionalização simbólica. Isso se faz necessário em razão da complexidade dos autores nos quais Neves fundamenta-se para desenvolver sua teoria.

2.1 Sobre a Teoria Sistêmica do Direito de Luhmann A linguagem e os conceitos da teoria sistêmica do direito nos

moldes formulados por Niklas Luhmann são uma referência constante na obra de Neves. No tocante à constitucionalização simbólica, em seu trabalho no qual desenvolve tal teoria, Neves (2007, p. 218-223) faz referência a sessenta e duas obras diferentes de Luhmann. Percebe-se, portanto, a importância desse autor no pensamento de Neves. A compreensão da teoria sistêmica de Luhmann começa pela sua visão da sociedade, a partir da qual surgem as suas principais conceituações, as quais serão vistas mais detalhadamente logo adiante.

2.1.1 Elementos da Teoria Sistêmica do Direito: sociedade,

sistemas e subsistemas Niklas Luhmann (1983, p. 34) formula a teoria sistêmica do

direito a partir de sua teoria sociológica. A sua concepção de sociedade e direito, entretanto, é diferente das abordagens tradicionais, razão pela qual Luhmann afirma:

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Em termos de esclarecimento suficientemente abstrato da relação entre os desenvolvimentos da sociedade e do direito faltava, tanto na teoria social quanto na teoria do direito, o instrumental conceitual adequado. Daí surgiram as análises parciais já expostas e que, baseadas em pontos de referência diferentes, esclareciam aspectos isolados, mas nunca a totalidade do fenômeno jurídico contemporâneo.

As abordagens tradicionais da sociologia jurídica são inadequadas, desse modo, em razão do fato de que são incapazes de uma compreensão global do fenômeno jurídico, recaindo apenas sob aspectos limitados da questão. Em outras palavras, tais abordagens tradicionais da sociologia jurídica seriam, na perspectiva de Luhmann, escapistas, como observa Mello (2006, p. 352). Luhmann buscou superar tais limitações das teorias sociológicas tradicionais por meio da aplicação da teoria sistêmica, originária de estudos biológicos, trazendo-as ao campo da sociologia. Desse modo, segundo a perspectiva sistêmica:

[…] a sociedade se apresenta como um sistema complexo, tendo como seu mundo circundante e exterior o “ambiente”. O que separa o sistema de seu ambiente é a circunstância de naquele existirem certas operações fáticas denominadas “comunicações”, que se encontram em um processo constante de reprodução (LEITE, 2008, 15).

Do trecho citado, retira-se um dos conceitos fundamentais da teoria sistêmica do direito, qual seja, a dicotomia sistema/ambiente. Como colocado por Ferraz Jr. (1980, p. 4), pode-se dizer que “sistema é para Luhmann um conjunto de elementos delimitados

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segundo o princípio da diferenciação”. Estes elementos formam entre si um conjunto diferenciado dos demais. Os demais elementos, os excluídos do conjunto, são o seu ambiente.

Tal binômio indica-nos que todo acontecimento deve pertencer, ao mesmo tempo, a um determinado sistema e ao ambiente de outro sistema (NEVES, 2008, p. 59)[1]. Ou seja, um determinado evento não pode ocorrer, de uma só vez, tanto no interior do sistema quanto no seu ambiente. Sendo a sociedade, como citado, um sistema caracterizado pela ocorrência de comunicações, é forçoso concluir que tais operações denominadas de comunicações ocorrem apenas no sistema social, e não no seu ambiente.

Luhmann (1983), ao discorrer sobre a maneira pela qual se dá a diferenciação dos elementos do sistema social (as comunicações), argumenta que a sociedade contemporânea se encontra como um sistema diferenciado funcionalmente, diferentemente do passado, quando se verificava uma diferenciação social segmentária. Mas o que significa dizer isso? Segundo Luhmann (1983, p. 176):

Na diferenciação segmentária são formados diversos sistemas iguais ou semelhantes: a sociedade compõe-se de diversas famílias, tribos, etc. Na diferenciação funcional os sistemas parciais, ao contrário, são formados para exercerem funções especiais e específicas, sendo portanto distintos entre si: para a política e a administração, para a economia, para a satisfação de necessidades religiosas, para a educação, para cuidar dos doentes, para funções familiares residuais (assistência, socialização, recreação), etc.

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Dizer que a sociedade é um sistema diferenciado funcionalmente nada mais significa do que dizer que o sistema social divide-se em sistemas parciais, subsistemas, cada qual incumbido, como visto, de uma função específica, dentre os quais está o subsistema jurídico, o subsistema político, o econômico etc. Tal é a caracterização da sociedade contemporânea.

O reconhecimento da multiplicidade dos sistemas sociais coloca-nos diante da questão do reconhecimento de determinado sistema como sendo um subsistema social ou não. Como visto, o que caracteriza o sistema social em oposição ao seu ambiente é a ocorrência no seu interior de operações denominadas comunicações. O mesmo deverá ocorrer com os seus sistemas parciais. Assim, não há de se falar em subsistema social caso não existam comunicações em determinado sistema.

As comunicações, aliás, além de se prestarem à classificação de determinado sistema como sendo um subsistema social, irão também diferenciar os subsistemas sociais entre si. Cada um desses sistemas parciais opera com uma rede de comunicações particular, produzindo e reproduzindo tais comunicações conforme os seus códigos binários específicos. Cada um deles possui o seu próprio código binário, que consiste num par de “valores opostos (positivo/negativo)” (LEITE, 2008, 20), segundo o qual se operarão as suas comunicações, donde o subsistema jurídico, v.g., opera o código lícito/ilícito, o econômico opera o código ter/não-ter, o científico o código verdadeiro/falso etc. Desse modo, para que se saiba diferenciar os subsistemas sociais entre si, basta conhecer os seus respectivos códigos binários.

2.1.2 O subsistema jurídico: função e auto-referência Visto que a sociedade, na perspectiva de Luhmann, é um

sistema que se caracteriza pela ocorrência de operações

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denominadas comunicações, diferenciada funcionalmente em sistemas parciais, interessa-nos, neste momento, estudar especificamente o subsistema jurídico e suas principais características conforme a referida perspectiva teórica. O primeiro ponto a ser elucidado com relação ao subsistema jurídico diz respeito à sua função.

Primeiramente, deve-se colocar que a diferenciação funcional da sociedade contemporânea ocorreu em razão da sua alta complexidade e da contingência que a permeia. Complexidade e contingência são conceitos bastante específicos na obra de Luhmann (1983, p. 45): “Por complexidade queremos dizer que sempre existem mais possibilidades do que se pode realizar”. A contingência, por sua vez, é vista por Luhmann da seguinte maneira: “Por contingência entendemos o fato de que as possibilidades apontadas para as demais experiências podem ser diferentes das esperadas” (1983, p. 45). Em outras palavras, as possibilidades são inúmeras na contemporaneidade, mas deve-se escolher entre elas, aí reside a complexidade, nessa situação de seleção forçada. A contingência diz respeito ao risco de as possibilidades esperadas não correspondam à realidade, de que não se concretizem, o que pode resultar em decepção no agente que nutria tais expectativas.

Um elevado grau de complexidade e de contingência implicam num elevado risco de desapontamento diante da não concretização de uma determinada expectativa. Para que seja possível contornar as instabilidades sociais que resultariam de tal modelo, Luhmann (1983, p. 56) relata a criação de duas estratégias para contornar a quebra de expectativas, permitindo que elas perdurem: o surgimento de expectativas cognitivas e normativas.

Ao nível cognitivo são experimentadas e tratadas as expectativas que, no caso de desapontamentos, são adaptadas à realidade.

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Nas expectativas normativas ocorre o contrário: elas não são abandonadas se alguém as transgride. […] Dessa forma as expectativas cognitivas são caracterizadas por uma nem sempre consciente disposição de assimilação em termos de aprendizado, e as expectativas normativas, ao contrário, caracterizam-se pela determinação em não assimilar o desapontamento.

Desse modo, diante do desapontamento de determinada expectativa, quando tal expectativa for reformulada para que fique de acordo com o que se observou, estar-se-á diante de uma expectativa cognitiva. Verificar-se-á uma expectativa normativa quando, ao contrário, a expectativa não se modifique mesmo em face de sua não concretização ou incompatibilidade com a realidade, mas permaneça ainda assim como uma expectativa válida.

Ferraz Jr. (2003, p. 103-104) dá continuidade ao raciocínio pontuando que, no caso das expectativas cognitivas, o que garante a sua durabilidade é a generalização das possibilidades por meio da observação, enquanto que, nas normativas, a durabilidade será garantida por uma generalização não adaptativa, elas seriam expectativas contrafáticas. Por contrafáticas, o autor quer dizer que tais expectativas continuam se sustentando mesmo quando os fatos se mostram contrários a elas, quando não se verificam no plano fático.

Um exemplo de expectativas cognitivas é encontrado na ciência: pode até ser que determinado comportamento seja esperado, mas, caso seja observado, em alguma pesquisa, por exemplo, que tal comportamento esperado não sucede, esse comportamento passará então a ser inesperado. Ou seja, ocorreu uma adaptação da expectativa. Já uma expectativa normativa ocorre, v.g., quando,

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uma lei obrigar o pagamento de determinado tributo. Caso alguém não pague o tributo, as outras pessoas, ainda assim, esperarão que tal tributo deverá ser pago. Nesse caso, apesar de sua inobservância, a expectativa continua a se sustentar.

Feitas essas considerações, ainda resta a pergunta, qual é a função do subsistema jurídico? Segundo Leite (2008, p. 18), a função do direito na perspectiva sistêmica é “[...] garantir expectativas normativas estabilizadas que viabilizem interações recíprocas entre indivíduos, diminuindo, dessa forma, a contingência”. Com efeito, segundo a definição de contingência apresentada acima – risco de decepção em face da não concretização de determinada expectativa – o subsistema jurídico, ao estabilizar determinada expectativa normativa, permitirá que ela continue valendo mesmo em caso de sua inobservância.

Segundo Luhmann (1983, p. 109), o direito cumpriria a sua função estabilizadora das expectativas comportamentais por meio do que ele chama de generalização congruente de expectativas nas dimensões temporal, social e prática, as quais se dariam, respectivamente, por meio da normatização, institucionalização e criação de núcleos de sentido. É desnecessário, contudo, descer a tais meandros do pensamento de Luhmann para se ater ao escopo deste trabalho. Devemos ter em mente que estamos tratando da teoria da constitucionalização simbólica de Marcelo Neves, e que aquele é citado apenas para que o pensamento deste possa ser mais bem compreendido.

2.1.3 A autopoiese do direito Além de conhecer a função estabilizadora do direito na

sociedade, outro conceito luhmanniano fundamental à compreensão da constitucionalização simbólica e relativo ao subsistema jurídico é o da autopoiese do direito. É preciso, contudo,

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entender primeiramente o que é a autopoiese, saber o que significa dizer que um sistema é autopoiético.

Neves (1996, 403)[2] observa que a palavra autopoiese tem origem grega, significando auto-criação, auto-reprodução. Isso teria lugar porque, nessa acepção, o sistema é constituído a partir dos elementos criados por ele mesmo, segundo o seu código-binário. O sistema autopoiético, desse modo, é chamado também de sistema fechado, ou auto-referencial.

A ideia de ser constituído a partir dos elementos que ele mesmo produz, entretanto, é apenas um dos momentos da auto-referência, chamado de auto-referência elementar, pois há ainda outros dois: a reflexividade e a reflexão. Fala-se em reflexividade quando, em um sistema, é possível verificar que um determinado processo refere-se ao mesmo tipo de processo sistêmico, devendo o processo referente e referido, portanto, possuir o mesmo código binário; a reflexão, por sua vez, remonta à ideia de auto-descrição, é o sistema referindo-se a ele mesmo para diferenciá-lo do ambiente (NEVES, 1996, p. 406-407). Ambos os conceitos são mais facilmente compreensíveis através da exemplificação. A reflexividade de um sistema autopoiético ocorreria quando, tomando como exemplo a pedagogia, ensina-se a se ensinar. A reflexão ocorreria quando se tenta identificar o que seja o sistema pedagógico.

Com relação ao âmbito específico do sistema jurídico, ele é visto por Luhmann como sendo um sistema autopoiético. Contudo, o seu fechamento não é absoluto, não há um isolamento completo do seu ambiente. Na verdade, fala-se que o sistema jurídico é operacionalmente fechado, ou normativamente fechado, ao mesmo tempo em que também é cognitivamente aberto. Como dispõe Neves (2007, p. 136-137):

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Sendo assim, o sistema jurídico pode assimilar, de acordo com os seus próprios critérios, osfatores do ambiente, não sendo diretamente influenciado por esses fatores. A vigência jurídica das expectativas normativas não é determinada imediatamente por interesses econômicos, critérios políticos, representações éticas, nem mesmo por proposições científicas, pois depende de processos seletivos de filtragem conceitual no interior do sistema jurídico.

Isso quer dizer que o sistema jurídico, embora fechado, recebe estímulos do seu ambiente, mas processa-os de acordo com os seus critérios próprios. Na verdade, a autonomia do sistema jurídico implica que, embora receba esses estímulos externos, ele os processe conforme o seu código binário próprio. Assim, se o governo decide aumentar o valor de uma determinada taxa, por exemplo, tal evento certamente surtirá efeitos no sistema econômico, político e jurídico, mas esses efeitos serão processados por tais sistemas, caso sejam todos autopoiéticos, conforme os seus códigos binários específicos.

Os três momentos da auto-referência mencionados anteriormente também se aplicam ao direito. Dessa forma, auto-referência elementar, reflexividade e reflexão são relacionadas por Neves (2007, p. 153-154), respectivamente, com legalidade, constitucionalidade e teoria do direito. A legalidade relaciona-se com a auto-referência elementar porque o juízo de legalidade implica numa operação de aplicação do código binário do sistema jurídico, lícito/ilícito. A constitucionalidade relaciona-se com a reflexividade porque ela significa normatização das normas jurídicas. A teoria do direito, por sua vez, pode ser vista como

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reflexão, já que implica em auto-descrição do sistema jurídico e sua diferenciação do ambiente.

2.2 Da legislação simbólica à constitucionalização simbólica Outro dos pilares da teoria da constitucionalização simbólica é

precisamente o tema da legislação simbólica. Mas em que consiste a legislação simbólica e quais são as suas características? A resposta a tais questões é fundamental para que se compreenda o que é a constitucionalização simbólica. Tais respostas, entretanto, serão mais bem compreendidas após algumas notas a respeito da linguagem jurídica que ajudarão a contextualizar a problemática da legislação simbólica no âmbito da teoria de Neves.

2.2.1 Apontamentos à linguagem jurídica Os recursos à linguística como instrumento de investigação

científica ocorrem com cada vez mais frequência no âmbito das ciências sociais, e com o direito tem ocorrido coisa semelhante, notadamente por meio do auxílio da semiótica em seus três níveis de investigação.

Mas em que consistem sintática, semântica e pragmática? Segundo Tércio Sampaio Ferraz Júnior (2003, p. 123): “A semiótica é a teoria dos signos (por exemplo, dos signos linguísticos, das palavras), em sua tríplice relação: signos entre si (sintaxe), em relação ao objeto (semântica) e aos seus usuários (pragmática) ”. Abrantes e Gonçalves da Silva (2005, p. 178) trazem maiores elucidações: “O vocábulo Semiótica vem da raiz grega semeion que significa signo, no sentido de linguagem. Sendo, pois, a ciência geral de todos os signos, símbolos, ligados à linguagem. ” Ou seja, semiótica é a ciência dos signos, signo é tudo aquilo que tem significado.

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O professor Gustavo Rabay Guerra (2009, p. 13) aprofunda o significado das diferentes dimensões semióticas, inclusive do ponto de vista da sua instrumentalidade, a começar pela semântica:

Na análise semântica, o campo de estudo é o vínculo do signo com a realidade que exprime, onde o objetivo da investigação é procurar destacar dentre diversos possíveis, o significado correto dos signos, distinguindo e eliminando os demais que a ele se encontram associados, procurando extrair ao máximo toda a imprecisão natural dos termos, na maior parte oriundos da linguagem natural.

Juridicamente, a investigação semiótica no plano semântico prende-se à noção de realização da norma jurídica, pois aqui o signo é a norma, enquanto o objeto é o mundo dos fatos, onde se verificará a correspondência entre a prescrição normativa e a realidade. Concepções de cunho sociológico do direito possuem certa identificação com essa dimensão semiótica. Guerra (2009, p. 13) segue adiante com explicações sobre a dimensão sintática:

Na análise sintática, o ponto central de observação é sua relação com os demais que integram o sistema. Assim, tendo em vista o significado lingüístico contido em determinado signo, ou seja, seu conceito através da análise semântica, a investigação desloca-se para a relação formal como os demais integrantes do sistema onde encontra-se situado, imperando, nesse particular, as regras de sintaxe, representadas, sobretudo, pela gramática.

Transportando essa concepção para o direito, as teorias positivistas que tendem a ver o fenômeno jurídico com ênfase nas

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relações que as normas jurídicas travam entre si, como, por exemplo, o purismo jurídico kelseniano, costumam valer-se desse plano da análise semiótica como forma de trabalho. Por fim, o professor Guerra (Idem, p. 14) explana sobre a ótica pragmática:

Sob o aspecto pragmático, interessam os efeitos interacionais que o uso da linguagem produz entre os membros de uma comunidade linguística; vale dizer, estudam-se as relações sociais que se instauram através do uso concreto da linguagem.

Do ponto de vista jurídico, trata-se das relações instauradas entre os usuários dessa linguagem, o legislador, o aplicador e operador do direito, o intérprete etc. As análises puramente sintáticas do direito mostraram-se insuficientes para explicar satisfatoriamente a complexidade do fenômeno jurídico. A realidade é que as dimensões sintáticas e pragmáticas acabam sendo mais eficazes enquanto instrumento de análise do direito enquanto subsistema social.

De fato, se olharmos para o que foi mencionado anteriormente sobre as comunicações enquanto fenômeno caracterizador do sistema social e o aplicarmos especificamente sobre o sistema jurídico, percebe-se claramente a importância da análise semântico-pragmático desta linguagem. Veja-se Neves (2007, p. 88):

De acordo com o modelo luhmanniano, pode-se sustentar que a especialização da linguagem ordinária relaciona-se com o desenvolvimento separado de mecanismos complementares para a linguagem [...] e, por isso, com a formação dos esquemas binários correspondentes; no caso do direito, a especialização da linguagem resultaria do uso

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do código-diferença “lícito/ilícito” exclusivamente em um sistema funcional para isso diferenciado.

Como se vê, a linguagem jurídica é uma linguagem especializada a partir da linguagem ordinária que: “desenvolve-se basicamente a partir da situação semântico pragmática, variando intensamente de significado conforme a situação e o contexto comunicativos.” (NEVES, 2007, p. 88). Nesse sentido, o estudo da legislação simbólica insere-se plenamente no contexto dos campos semântico e pragmático da investigação linguístico-jurídica.

Como será visto adiante, o estudo da legislação simbólica implica numa análise tanto da concretização (relação signo-objeto) quanto das intenções ocultas na criação de diplomas legislativos (relação signo-usuário). Essa análise da linguagem jurídica sob o enfoque semiótico é, portanto, um bom link entre a teoria sistêmica luhmanniana – notadamente no que tange às comunicações e ao código binário do subsistema jurídico – com a legislação simbólica, ambas as perspectivas teóricas basilares na construção da teoria da constitucionalização simbólica de Marcelo Neves.

2.2.2 Da legislação simbólica Dando seguimento à questão da legislação simbólica, é preciso

primeiramente colocar que expressões como “simbólico”, “simbolismo” e “símbolo” possuem significados abundantes e variados no âmbito das ciências humanas e sociais. Em primeiro lugar, devemos mencionar trecho em que Neves (2005, p. 3)[3] procura explicar da sua maneira a expressão: “Muito comumente, a referência ao termo 'simbólico' sugere que se trata de algo diferente do fático, real. No entanto, toda a dimensão do semiótico, não apenas o simbólico no sentido que pretendo utilizar aqui, é realidade concernente à realidade”. Buscando, em seguida, escapar de eventuais confusões semânticas, procura estabelecer o

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significado adotado por ele da expressão “simbólico”. Para tanto, Neves (2007, p. 22) introduz os conceitos de agir instrumental e simbólico:

Diferentemente das variáveis instrumentais, a atitude simbólica não é orientada conforme uma relação linear de meio-fim e, por outro lado, não se caracteriza por uma conexão direta e manifesta entre significante e significado, distinguindo-se por seu significado mediato e latente.

No que toca o agir instrumental, por se tratar meramente de relação de meio-fim, não há ambiguidades, há apenas o seu significado imediato, as coisas são da maneira como se apresentam. Com relação ao agir simbólico, além do significado imediato, há um significado latente, indireto.

Ademais, ao afirmar-se que determinada ação é simbólica ou instrumental, não se quer dizer que ocorre apenas uma ou outra, apenas, mas que uma delas predomina em relação à outra (NEVES, 2007, p. 23). A ideia de simbólico, nos moldes adotados por Neves, nunca está, na prática, completamente desvinculada do instrumental, e vice-versa. Tal sobreposição de uma dessas duas funções, instrumental ou simbólica, sobre a outra pode ocorrer também no âmbito da produção legislativa. Com efeito, Neves (2007, p. 30) assevera:

Em sentido mais abrangente, pode-se dizer que uma quantidade considerável de leis desempenha funções sociais latentes em contradição com sua eficácia normativo-jurídica, ou seja, em oposição ao seu sentido jurídico manifesto […] pode-se definir a legislação simbólica como produção de textos cuja

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referência manifesta à realidade é normativo-jurídica, mas que serve, primária e hipertroficamente, a finalidades políticas de caráter não especificamente normativo-jurídico.

Tal definição, como se vê, encaixa-se muito bem nos conceitos de agir instrumental e simbólico trazidos anteriormente. O normativo-jurídico relaciona-se com o agir instrumental, por se tratar de relação de meio-fim, com significado direto e manifesto.

Quando uma norma determinando certa conduta é adotada precipuamente com o fim de fazer com que tal conduta seja observada, trata-se de um caso em que a função normativo-jurídica, instrumental, sobrepõe-se à político-ideológica, simbólica. Em sentido oposto, quando o que se busca não é, primariamente, a observância da conduta preceituada na norma, mas a realização de determinadas finalidades político-ideológicas, pode-se dizer que a norma tem um significado latente, indireto, que se sobrepõe a regulação instrumental do comportamento dos destinatários da norma.

Neves (2007, p. 33) adota, ademais, classificação que divide a legislação simbólica em três tipos diferentes: a legislação simbólica como confirmação de valores sociais, legislação-álibi e legislação como fórmula de compromisso dilatório.

Muitas vezes, no decorrer do processo legislativo, grupos de interesses afeitos a diferentes valores digladiam-se entre si pela aprovação de lei os reflita. Quando um grupo, então, ao final do processo legislativo, vê os seus valores contemplados em detrimento dos de outro grupo oposto, considera-se em posição de vantagem social. A eficácia da lei figa em segundo plano para este grupo, mais importante é o reconhecimento social dos seus valores, é nisso que consiste a legislação simbólica como confirmação de valores sociais.

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Em continuidade, Neves (2007, p. 33-34) cita a seguinte caso a respeito dessa modalidade de legislação simbólica:

Um clássico exemplo no estudo da legislação simbólica é o caso da “lei seca” nos Estados Unidos, abordado pormenorizadamente por Gusfield. A sua tese central afirma que os defensores da proibição de consumo de bebidas alcoólicas não estavam interessados na sua eficácia instrumental, mas sobretudo em adquirir maior respeito social, constituindo-se a respectiva legislação como símbolo de status.

O significado latente, indireto, dessa modalidade de legislação simbólica residiria no reconhecimento dos valores sociais que ela implica, essa é a sua dimensão político-ideológica, que é hipertrofiada com relação à dimensão instrumental, sua eficácia. No exemplo, não interessa aos apoiadores da lei seca que não se consumisse bebidas mais do que o status que a aprovação de uma legislação nesse sentido lhes conferiria.

A segunda categoria de constitucionalização simbólica, a legislação-álibi, foi mencionada por Neves (2007, p. 37) da seguinte maneira:

O legislador, muitas vezes sob pressão direta do público, elabora diplomas normativos para satisfazer as expectativas dos cidadãos, sem que com isso haja o mínimo de condições de efetivação das respectivas normas. A essa atitude referiu-se Kindermann com a expressão “legislação-álibi”. Através dela, o legislador procura descarregar-se de pressões políticas ou apresentar o Estado como sensível às exigências e expectativas dos cidadãos.

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Interessa muito mais ao legislador, nesse caso, dar uma resposta à população por meio da edição de uma lei do que, propriamente, em vê-la sendo cumprida. Exemplo típico, e que tem sido observado com relativa frequência no Brasil, é o da legislação penal editada após algum caso de violência que gere comoção nacional. Trata-se de tentativa de satisfazer a população pela simples criação da lei, não de sua observância. Diante do episódio de violência, o eleitorado exige uma resposta que se apresenta sob a forma de uma lei penal severa, que normalmente é inobservada e inócua do ponto de vista da redução da criminalidade. Contudo, tal resposta satisfaz os ânimos do eleitorado.

Ainda com relação à legislação-álibi, é interessante citar trecho em que Neves (2007, p. 39) faz observações finais a respeito de tal modalidade de legislação simbólica:

Parece, portanto, mais adequado afirmar que a legislação-álibi destina-se a criar a imagem de um Estado que responde normativamente aos problemas reais da sociedade, embora as respectivas relações sociais não sejam efetivamente normatizadas de maneira consequente conforme os respectivo texto legal.

Há que se mencionar ainda a última das modalidades de legislação simbólica. Trata-se da legislação simbólica como fórmula de compromisso dilatório. Assim como no caso da legislação como confirmação de valores sociais, nesse caso, ocorrerá também uma disputa entre grupos político-ideológicos diversos que se desdobrará no uso da legislação simbólica. Veja-se o seguinte trecho no qual Marcelo Neves (2007, p. 41) tece comentários a respeito da legislação simbólica enquanto fórmula de compromisso dilatório:

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A legislação simbólica também pode servir para adiar a solução de conflitos sociais através de compromissos dilatórios. Nesse caso, as divergências entre grupos políticos não são resolvidas por meio do ato legislativo, que, porém, será aprovado consensualmente pelas partes envolvidas, exatamente porque está presente a perspectiva da ineficácia da respectiva lei.

A ideia é a de que, já prevendo que a lei não vá ser observada, o legislador aprova-a com vistas ao adiamento da solução da questão à que lei se propões resolver. É precisamente nesse adiamento da resolução do conflito que reside o significado latente da lei, ao passo que o significado manifesto está na noção de que ela solucionará a controvérsia.

Bastante ilustrativo, também, é o exemplo elencado por Neves (2007, p. 41-42) dessa modalidade de legislação simbólica:

Como “compromisso fórmula-dilatório” […] enquadra-se perfeitamente o caso da Lei norueguesa sobre empregados domésticos (1948), investigado muito habilidosamente por Aubert. A função manifesta dessa Lei teria sido a regulamentação das relações de trabalho; instrumentalmente o seu fim haveria sido a melhora das condições de trabalho dos empregados domésticos e a proteção dos seus interesses. A suavidade das normas sancionadoras a serem aplicadas nas donas de casa nas hipóteses de violação do diploma legal, dispositivos punitivos cujas dificuldades de aplicação decorriam da própria Lei, constituía um fator importante para garantir sua ineficácia. […]

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Foi exatamente essa previsível falta de efetiva concretização normativa que possibilitou o acordo entre grupos “progressistas” e tendências “conservadoras” em torno do conteúdo da Lei .

Como se vê, o conflito dos grupos de interesse resolve na própria perspectiva de ineficácia da lei, o que faz com que ambas as facções acordem em torno do seu conteúdo. O mesmo não se dá com a legislação simbólica como confirmação de valores sociais, hipótese na qual um dos grupos sai como vitorioso ideológico, mesmo que a lei não seja aplicada.

Bercovici (2005, p. 38), tratando do que ele chama de “batalha” pela implementação da constituição econômica, rememorou a questão das fórmulas de compromissos dilatórios:

Já em sua Teoria da Constituição (Verfassungslehre), de 1928, Carl Schmitt afirmava que essa Constituição, embora contivesse decisões políticas fundamentais sobre a forma de existência política concreta do povo alemão, possuía em seu texto inúmeros compromissos e obscuridades que não levavam a decisão alguma, mas, pelo contrário, cuja decisão havia sido adiada.

A citação do autor referida a Schmitt ilustra perfeitamente o sentido da legislação simbólica na modalidade de compromisso fórmula-dilatório. Trata-se da ideia de que é por meio de uma decisão legislativa que nada se decide.

A constitucionalização simbólica, contudo, não se confunde com a legislação simbólica. Como se verá, não é possível pegar aleatoriamente um dispositivo ou outro da constituição e classificá-lo como caso de fórmula de compromisso dilatório, legislação-álibi

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ou confirmação de valores sociais e daí concluir que se está diante de um caso de constitucionalização simbólica. Isso ocorrerá mesmo que em tal dispositivo haja uma discrepância entre sua função político-ideológica exacerbada e sua função instrumental rarefeita. A configuração da constitucionalização simbólica importa em mais requisitos do que a da legislação simbólica. Para compreender melhor a necessidade de tais requisitos, é preciso, antes, que sejam feitas algumas considerações sobre constituição, constitucionalização e concretização constitucional.

3. À CONSTITUCIONALIZAÇÃO SIMBÓLICA

No item anterior, foram vistos os pressupostos que dão sustentação à teoria da constitucionalização simbólica de Marcelo Neves, no presente, estudar-se-á a dita teoria em si. A principal referência será encontrada na obra do próprio Marcelo Neves, notadamente na segunda edição de A constitucionalização simbólica, publicada no Brasil em 2007.

Se a noção de legislação simbólica está clara como se deseja, é preciso, antes de se chegar à constitucionalização simbólica, tecer algumas considerações sobre a constituição no sentido pretendido por Neves. Aí estão inseridas questões como a diferença entre os conceitos de constituição e constitucionalização, bem como as relações entre constituição, direito e política.

Assim como a legislação simbólica relaciona-se com a questão da eficácia normativa, o mesmo se dá com a constitucionalização simbólica, sendo oportuno, portanto, explorar a dicotomia constituição/realidade constitucional. Por fim, caberá a conceituação da constitucionalização simbólica e a análise das suas consequências, tanto do ponto de vista sistêmico quanto sob outras perspectivas.

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3.1 Constituição, constitucionalização e concretização

constitucional Assim como os conceitos de símbolo, simbólico e simbolismo, a

expressão constituição também possui uma pluralidade de sentidos. Diante desse fato, Neves (2007, p. 64), ao tratar do assunto, faz uma recapitulação dos principais sentidos do termo – passando por Aristóteles, Lassalle, Kelsen, Karl Schmitt, entre outros – para, posteriormente, proceder a uma delimitação semântica:

De acordo com a orientação assumida no presente trabalho, os procedimentos decisórios, tanto constituintes como de concretização constitucional, filtram as expectativas jurídico-normativas vigentes. […] um subsistema normativo-jurídico, o qual, de um lado, tem uma relativa autonomia, de outro, encontra-se em permanente e variado inter-relacionamento com os sistemas sociais primariamente cognitivos, os outros sistemas ou formas de comunicação primariamente normativas e, especialmente, com outras dimensões do sistema jurídico.

Como se vê da definição, a constituição é um subsistema (normativo) do sistema jurídico. Ela mantém relações com outros sistemas sociais (relações estas denominadas, como se verá adiante, prestações) com o sistema social como um todo (relação a qual se denomina, como será explicado, função) e com outros subsistemas jurídicos.

Tais relações envolvem o subsistema constitucional, o sistema jurídico, o político e o social como um todo em uma intrincada rede cuja complexidade demanda análise pormenorizada. Esse

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complexo será examinado sob a ótica da constitucionalização. Para tanto, faz-se mister compreendê-la.

O termo constitucionalização, segundo Neves (2007, p. 64-65), liga-se à ideia de constituição no sentido moderno, ou seja, “limitação jurídica ao governo”, “antítese do regime arbitrário”. Nesse diapasão, a constituição no sentido moderno pode ser vista como decorrência da diferenciação funcional entre direito e política, sendo que a constitucionalização é o meio através do qual se dá essa diferenciação. É nesse ponto que, por meio de uma leitura sistêmica, fala-se em constituição como acoplamento estrutural entre direito e política. Explica-se.

A diferenciação funcional ocasionou, como visto, o surgimento de um sistema social onde podem ser encontrados um sem número de subsistemas, cada um realizando suas operações mediante códigos-binários próprios. O sistema jurídico e o político, embora sejam ambos os subsistemas autopoiéticos, isto é, operativamente fechados, possuem uma relação de bastante estreiteza entre si.

Na verdade, os sistemas político e jurídico estão sempre realizando interferências recíprocas, embora permaneçam autopoiéticos. O que possibilita isso é precisamente o fenômeno da constitucionalização, do surgimento da constituição em sentido moderno, pelo que Neves (2007, p. 67) assim explicita:

Através da Constituição como acoplamento estrutural, as ingerências da política no direito não mediatizadas por mecanismos especificamente jurídicos são excluídas e vice-versa. A autonomia operacional de ambos os sistemas é condição e resultado da existência desse “acoplamento estrutural”.

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A leitura adotada por Neves (2007) é a de que a constitucionalização, o advento das constituições modernas, consiste na ideia de constituição enquanto acoplamento estrutural entre sistema jurídico e político, no fato de que ambos influenciam-se mutuamente apesar de permanecerem operando conforme o código-binário que lhes é próprio (ou seja, permanecendo autônomos) tendo a constituição como ferramenta que possibilita esse status. Curioso notar é que a ocorrência das relações entre direito e política com a manutenção do caráter autopoiético desses sistemas é viabilizada pela constituição, um subsistema normativo do sistema jurídico. Os sistemas político e jurídico, por meio desse arranjo, permanecem autônomos do ponto de vista operacional, embora se irritem reciprocamente.

É possível, aliás, fazer a seguinte analogia: enquanto sistemas não autônomos interagem como gêmeos siameses, a política e o direito, por meio do acoplamento estrutural consistente no subsistema constitucional, interagem como bolas de bilhar, que, embora se chocando umas com as outras, permanecem intactas (CADEMARTORI, 2004, p. 182).

Da constituição enquanto acoplamento estrutural entre direito e política, é possível extrair algumas implicações. A primeira delas diz respeito à importância da constituição para a autonomia do sistema jurídico. A segunda diz respeito à função social e a prestação política da constituição. Para elucidar o significado delas, é preciso dissecar a maneira como elas ocorrem no âmbito das relações que cercam o trinômio direito-constituição-política.

Marcelo Neves (2007, p. 70-71), mais uma vez apoiando-se em Luhmann, entende que é a constituição que permite a autonomia operacional do sistema jurídico. Senão vejamos:

A hierarquização interna “Constituição/lei” atua como condição de reprodução autopoiética

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do direito moderno; serve, portanto, ao seu fechamento normativo e operacional. […] Dessa maneira, qualquer intervenção legiferante do sistema político no direito é mediatizada por normas jurídicas. O sistema jurídico ganha com isso critérios para a aplicação do código “lícito/ilícito” ao procedimento legislativo.

Com isso, Neves (2007) quer dizer que a constituição impede que questões políticas passem por cima do direito, sem respeito ao seu código-binário, através da criação de normas para elaboração de normas. Para que alguma questão decorrente do sistema político possa afetar as operações do sistema jurídico, é preciso antes que se submeta ao procedimento legislativo descrito no âmbito constitucional, tornando-se, dessa forma, norma jurídica. Trata-se, portanto, de uma questão dereflexividade – no sentido técnico visto acima de processo que se refere ao mesmo tipo de processo dentro do próprio sistema, fazendo uso, portanto, do mesmo código binário – do sistema jurídico.

Em passagem bastante contundente por sua clareza, Neves (2007, p. 71) assevera:

O direito constitucional funciona – pode-se afirmar do ponto de vista jurídico-sociológico – como limite sistêmico-interno para a capacidade de aprendizado (abertura cognitiva) do direito positivo; em outras palavras: a Constituição determina como e até que ponto o sistema jurídico pode reciclar-se sem perder sua autonomia operacional.

Isso significa que o sistema jurídico poderá absorver influências de outros sistemas dentro das balizas traçadas pela constituição para que permaneça autopoiético. Tais balizas residem

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precisamente no processo legislativo. Todas as injunções intersistêmicas que seguirem os trâmites de tal processo tornam-se norma jurídica, ingressam no sistema jurídico e permite que ele esteja em constante reciclagem e renovação.

No que diz respeito à segunda das consequências da constitucionalização, a função social e a prestação política da constituição, trata-se, primeiramente, de esclarecer que é um assunto precipuamente voltado para as relações entre a constituição, enquanto subsistema do sistema jurídico, com a sociedade e o subsistema político. Se as constituições modernas desempenham um papel perante o sistema jurídico, garantindo-lhe a sua autonomia, é certo que também o fazem com relação ao sistema social e ao seu subsistema político.

Devemos, primeiramente, ressaltar que a nomenclatura adotada para estas relações, segundo Neves, é dividida entre função em sentido estrito eprestação em sentido estrito (2007, p. 74), sendo que aquela diz respeito às relações entre um subsistema e a sociedade enquanto sistema social mais abrangente; e esta, às relações que subsistemas da sociedade travam entre si. Aplicando-se tal sistemática ao tema em estudo, vemos que as relações entre a constituição (um subsistema do direito) com a sociedade consistem num caso de função. Já as relações entre constituição e subsistema político, logo, serão um caso de prestação.

Comecemos com a função social em sentido estrito desempenhada pelas constituições. Veja-se o que diz Neves (2007, p. 78) ao sintetizar a visão sobre o assunto:

Nessa perspectiva pode-se afirmar que, na sociedade supercomplexa de hoje, fundadas em expectativas e interesses os mais diversos e entre si contraditórios, o direito só poderá exercer satisfatoriamente sua função de

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congruente generalização de expectativas normativas de comportamento enquanto forem institucionalizados constitucionalmente os princípios da inclusão e da diferenciação funcional e, por conseguinte, os direitos fundamentais sociais (Estado de bem-estar) e os concernentes à liberdade civil e à participação política.

Como é possível perceber, Neves (2007) relaciona os direitos fundamentais – institucionalizados por meio das constituições modernas – aos princípios da inclusão e da diferenciação funcional, e os reputa como necessários ao cumprimento da função do direito, já expressa anteriormente, qual seja, estabilizar as expectativas normativas. O trecho supracitado, entretanto, demanda algum detalhamento do significado do princípio da inclusão e da diferenciação funcional.

No que tange ao princípio da inclusão, este diz respeito “à inserção de toda a população nas prestações de cada um dos sistemas dos sistemas funcionais da sociedade” (NEVES, 2007, p. 76). Isso se dá quando os direitos fundamentais asseguram, por exemplo, a participação na vida coletiva, na política, e inclusive condições materiais mínimas por meio dos direitos de cunho social, relacionados ao Estado de bem-estar. O fato de a população inserir-se em todas as prestações dos sistemas funcionais da sociedade – prestações que, como visto logo acima, em seu sentido estrito, significam as relações entre os sistemas parciais da sociedade – está perfeitamente em sintonia com a ideia de institucionalização do princípio da diferenciação funcional. Isso porque a diferenciação funcional dos subsistemas sociais decorrente da crescente complexidade da sociedade atual não é compatível com a não inclusão da população nos diversos grupos sociais.

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Além da função social em sentido estrito das constituições, interessa-nos também as suas prestações políticas, notadamente no que tange às eleições democráticas e do princípio da separação dos poderes. Como é fácil perceber, a função social da constituição (a institucionalização dos direitos humanos) abrange as suas prestações políticas, tendo em vista que os direitos políticos e a separação dos poderes são categorias inseridas nos direitos fundamentais, notadamente nos chamados direitos fundamentais de primeira geração. Ainda assim, entretanto, eles merecem análise pormenorizada em face da sua importância.

Em primeiro lugar, a regulação jurídico-constitucional do procedimento democrático como prestação em sentido estrito do direito com relação à política. Vejamos a opinião de Marcelo Neves (2007, p. 80) sobre o assunto:

A “generalização do apoio político” que decorre do procedimento eleitoral constitucionalmente regulado serve, por conseguinte, à diferenciação do sistema político, funcionando como empecilho à sua manipulação por interesses particularistas. Sem eleições democráticas ou um equivalente funcional, parece impossível, na sociedade complexa de hoje, que os sistemas político e jurídico não se identifiquem excludentemente com concepções ideológicas abrangentes ou interesses de grupos privilegiados. A falta de eleições democráticas conduz, nas condições atuais, à identificação do “Estado” com determinados grupos e, com isso, à desdiferenciação do sistema jurídico, inadequada à complexidade da conexão de comunicações, expectativas e interesses constitutivos da sociedade.

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Como é possível apreender da citação acima, a regulamentação constitucional de eleições democráticas é assunto que se entrelaça com os mencionados princípios da diferenciação funcional e da inclusão. Se o procedimento eleitoral caracteriza-se por adotar um voto universal, secreto e igual para todos, ocorrerá o seguinte: todos participarão do sufrágio (o voto é universal), há, dessa maneira, inclusão; por ser secreto, não haverá coação na escolha daquele em quem votar; e, finalmente, por ser igual, o voto dos integrantes de classes sociais que possuem status diferente terá o mesmo peso na escolha dos candidatos. Todos os grupos sociais estão incluídos no procedimento eleitoral (princípio da inclusão) e há independência do eleitor em face de seus outros papéis funcionais (diferenciação funcional) com a regulamentação constitucional das eleições.

A segunda das prestações políticas realizadas pela constituição a ser estudada – e a mais importante delas para o exame do problema abordado neste trabalho monográfico – consiste na institucionalização constitucional da separação dos poderes. Como é possível depreender da citação transcrita a seguir, trata-se, mais uma vez, de evitar a confusão entre direito e política, ou seja, impedir a desdiferenciação entre esses sistemas parciais da sociedade. Vejamos como Neves (2007, p. 81) se posiciona sobre esta questão:

A introdução de procedimentos funcionalmente diferenciados (legislativo, judiciário e político-administrativo), mediante a institucionalização da “divisão de poderes”, aumenta a capacidade dos sistemas político e jurídico de responder às exigências do seu respectivo ambiente, repleto de expectativas as mais diversas e entre si contraditórias. A ausência ou deformação do princípio da “divisão dos poderes” leva a desdiferenciação das

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esferas da vida (politização abrangente) e tem-se mostrado incompatível com a complexidade da sociedade atual.

Desse modo, vemos que Neves considera que a divisão dos poderes se presta “à limitação do poder político por uma esfera jurídica autônoma” (2007, p. 81). Isso claramente significa uma adequação ao princípio da especialização funcional. A própria ideia de separação de funções do Estado, que subjaz à teoria clássica da separação dos poderes, não poderia combinar mais com a noção de especialização funcional.

Mas em quais situações é possível afirmar que o princípio da separação dos poderes está presente e em quais não está? Em obra posterior, Neves (2008, p. 186) propõe uma releitura conceitual do supracitado princípio. Segundo o autor, ao invés de separação dos poderes, no Estado Democrático de Direito, é mais adequado falar em pluralidade e circularidade de procedimentos, pois “O Estado Democrático de Direito legitima-se problematicamente através da conexão circular e conflituosa entre procedimentos eleitoral, legislativo-parlamentar, jurisdicional e político-administrativo”. A releitura proposta por Neves privilegia a ideia de que, além de caracterizem-se por procedimentos distintos (plurais), os poderes interagem entre si, estão conectados. Destarte, é possível concluir que não ocorre separação dos poderes quando há uma quebra da pluralidade ou da circularidade dos procedimentos que caracterizam o Estado Democrático de Direito.

3.2 A constitucionalização simbólica: sentidos e definição Conhecendo as teorias em torno da legislação simbólica e a

ideia de Constituição sob a perspectiva da teoria sistêmica, pode-se, finalmente, partir para a elucidação da teoria da constitucionalização simbólica. Assim como na legislação simbólica,

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a constitucionalização simbólica implica uma hipertrofia da função simbólica da norma constitucional em detrimento da sua função instrumental. Trata-se de um problema, segundo o tratamento dispensado por Neves (2007) ao assunto, que envolve a realidade constitucional em oposição ao texto constitucional. Em outras palavras, trata-se de um problema de concretização constitucional.

Neves (2007, p. 85), entretanto, não aborda a questão da concretização do texto constitucional pura e simplesmente por meio da discrepância entre norma e realidade constitucional. Sustentado pelo pensamento dos constitucionalistas Friedrich Müller e Peter Häberle, ele entende que a questão da concretização constitucional envolve tanto o ambiente no qual a norma jurídica está inserida quanto as pessoas e grupos envolvidos na sua aplicação, respectivamente. Segundo o pensamento de Müller, lembrado por Neves (2007, p. 85): “A norma jurídica, especialmente a norma constitucional, é produzida no decorrer do processo de concretização”. A perspectiva Häberliana, por seu turno, envolve os participantes da interpretação constitucional, donde é possível deduzir que “o texto constitucional só obtém sua normatividade mediante a inclusão do público pluralisticamente organizado no processo interpretativo” (NEVES, 2007, p. 86).

Tais teorias interpretativas podem ser também explicadas, por meio do recurso à semiótica, sob as perspectivas sintática, semântica e pragmática. Veja-se o que assevera Neves (2007, p. 86-87) a respeito da das visões de tais autores sob um ângulo semiótico:

Em Müller, trata-se das características semânticas da linguagem jurídica, especialmente da linguagem constitucional, a ambiguidade e a vagueza, que exigem um “processo de concretização”, não simplesmente um “procedimento de aplicação” conforme

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regras de subsunção. No caso de Häberle, a questão diz respeito à relação pragmática da linguagem com diversos expectantes e “utentes”, o que implica um discurso conflituoso e “ideológico”. Os aspectos semânticos e pragmáticos relacionam-se, porém, mutuamente [...] Somente sob as condições de uma unidade de interesse e concepção do mundo, as questões constitucionais perderiam sua relevância semântico-pragmática, para se tornarem primariamente questões sintáticas, orientadas pelas regras da dedução lógica e subsunção. Mas tal situação é seguramente incompatível com a complexidade da sociedade moderna.

Como se vê, além de explicitar os pensamentos de Müller e Häberle de um ponto de vista semiótico, Neves (2007) critica as acepções que tendem a ver o direito de uma maneira sintática – aqui ele refere-se às teorias positivistas, cujo cerne reside nas relações que as normas jurídicas travam entre si, deixando de lado as relações entre a norma jurídica e o seu ambiente (perspectiva semântica) e entre a norma e os seus usuários (perspectiva pragmática) –, cujo paradigma é a teoria kelseniana do direito. Uma perspectiva puramente semântica do direito é uma simplificação do fenômeno jurídico que não corresponde à realidade, ainda mais no campo do direito constitucional, onde o texto das normas é mais vago e ambíguo, no que decorre uma preponderância ainda maior do papel do intérprete. Ferraz Júnior (2003, p. 190) traz uma excelente exemplificação de como se dão as relações de concretização normativa no âmbito constitucional:

Ademais, a posição pragmática é de que o sistema do ordenamento, não se reduzindo a

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uma (única) unidade hierárquica, não tem estrutura de pirâmide, mas estrutura circular de competências referidas mutuamente, dotada de coesão. Por exemplo, o Supremo Tribunal Federal recebe do poder constituinte originário sua competência para determinar em última instância o sentido normativo das normas constitucionais. Desse modo, seus acórdãos ou norma cuja validade decorre de uma norma constitucional de competência, configurando uma subordinação do STF ao poder constituinte originário. No entanto, como o STF pode determinar o sentido da validade da própria norma que lhe dá aquela competência, de certo modo, a validade da norma constitucional de competência do STF também depende de seus acórdãos (norma), configurando uma subordinação do poder constituinte originário ao STF.

Como se vê, há, na verdade, uma relação de circularidade hierárquica entre aquilo que é decidido pelo tribunal constitucional e o próprio texto constitucional. A corte constitucional deve decidir conforme a constituição, e o significado do texto da constituição deve ser elucidado através da interpretação feita pela corte constitucional. Desse modo, podemos afirmar também que o dogma da supremacia hierárquica da constituição, sempre presente nas explicações de cunho sintático do direito, não é sustentável quando se atenta para as outras duas perspectivas semióticas.

O bom entendimento das relações entre a constituição e a realidade constitucional é fundamental para a compreensão do primeiro dos dois sentidos da constitucionalização simbólica, o sentido negativo, o qual é definido por Neves (2007, p. 91) como

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sendo a “insuficiente concretização normativo-jurídica generalizada do texto constitucional”. Considerando-se o que foi visto a respeito de concretização constitucional, devemos ter em mente que essa é uma questão que, além de envolver a dicotomia entre texto e realidade constitucional, inclui também os participantes do processo de concretização constitucional. Isso significa que, em situações de constitucionalização simbólica, “as disposições constitucionais não são relevantes para os órgãos estatais vinculados estritamente à sua interpretação-aplicação” (NEVES, 2007, p. 94). Entre os órgãos estatais vinculados estritamente à interpretação-aplicação da constituição, devemos incluir necessariamente aqueles para os quais o texto constitucional emite mandamentos, v.g., Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal, Conselho Nacional de Justiça etc.

Se a constitucionalização simbólica possui dois sentidos, sendo o primeiro deles o sentido negativo, que consiste na insuficiente concretização normativa do seu texto, cabe perquirir a respeito do seu segundo sentido. Este é o sentido positivo, que se caracteriza pela função político-ideológica da atividade constituinte e do texto constitucional. Como é possível perceber, o sentido positivo da constitucionalização simbólica relaciona-se com a própria função simbólica da constituição, hipertrofiada em comparação à função instrumental, tal qual se passa com a legislação simbólica. Ao falar sobre as características de uma constituição simbólica, Marcelo Neves assevera (2007, p. 96):

Portanto, sentido positivo da constitucionalização simbólica está vinculado à sua característica negativa, já considerada no item anterior. Sua definição engloba esses dois momentos: de um lado, sua função não é regular as condutas e orientar as expectativas conforme as determinações jurídicas das respectivas disposições constitucionais; mas, de outro lado, ela responde a exigências e objetivos políticos concretos.

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Percebe-se, portanto, que a constitucionalização simbólica, assim como a legislação simbólica, tem como característica marcante a hipertrofia da função simbólica (o papel político-ideológico) em detrimento da função instrumental (o papel de orientação de condutas e expectativas) da norma. Mas em que ponto elas diferem? Afinal de contas, se fossem a mesma coisa, seria inconveniente a criação de duas categorias distintas.

As duas diferenciam-se, na verdade, pelo fato de que a constitucionalização simbólica possui maior abrangência do que a legislação simbólica. Na verdade, a constitucionalização simbólica ocorre quando há comprometimento do sistema jurídico como um todo, e não apenas de diplomas jurídicos específicos, como ocorre com a legislação simbólica. Vejamos a definição de Neves (2007, p. 100):

Fala-se de constitucionalização simbólica quando o problema do funcionamento hipertroficamente político-ideológico da atividade e texto constitucionais afeta os alicerces do sistema jurídico constitucional. Isso ocorre quando as instituições constitucionais básicas – os direitos fundamentais (civis, políticos e sociais), a “separação” de poderes e eleição democrática – não encontram ressonância generalizada na práxis dos órgãos estatais nem na conduta e expectativas da população.

Como é possível perceber, a abrangência da constitucionalização simbólica vai além de certos diplomas legais ou dispositivos normativos, atingindo o âmago do sistema jurídico-constitucional, retratado por Neves (2007, p. 74) como sendo os direitos fundamentais, a divisão dos poderes e a regulamentação de eleições democráticas. É interessante perceber que essas “instituições constitucionais básicas” são, na verdade, a função e a prestação política em sentido estrito desempenhados pelo sistema constitucional perante o sistema social como um todo e o sistema político, respectivamente. Isso leva a crer que a

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constitucionalização simbólica acarreta importantes consequências do ponto de vista sistêmico – assim como do ponto de vista semiótico –, as quais serão objeto de estudo no próximo item.

Tais consequências, entretanto, serão abordadas em momento mais oportuno, adiante. Interessa-nos, neste momento, abordar outro traço que diferencia a legislação simbólica da constitucionalização simbólica, o qual está relacionado com a tipologia daquela. Vimos que a legislação simbólica é passível de ser classificada em três tipos: a legislação simbólica enquanto confirmação dos valores sociais, como fórmula de compromisso dilatório e a legislação-álibi.

A estas três formas de legislação simbólica, poder-se-ia criar uma correspondência com a constitucionalização simbólica, donde resultaria a seguinte tipologia: “1) a constitucionalização simbólica destinada à corroboração de determinados valores sociais; 2) a Constituição como fórmula de compromisso dilatório; 3) a constitucionalização-álibi” (NEVES, 2007, p. 102). Neves (2007, p. 102-103), no entanto, opta por restringir a constitucionalização simbólica aos casos de constitucionalização álibi, pois apenas nessa situação é possível verificar efetivamente o comprometimento do sistema jurídico-constitucional em seus alicerces (como visto, direitos fundamentais, eleições democráticas e separação dos poderes. Nas hipóteses de constitucionalização simbólica enquanto confirmação de valores sociais e fórmula de compromisso dilatório, a hipertrofia da função simbólica do texto constitucional em detrimento da sua função instrumental restringir-se-ia a questões pontuais, das quais não seria possível observar danos ao núcleo do sistema jurídico-constitucional.

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3.3 Consequências sistêmicas, semióticas e políticas da

constitucionalização simbólica Vimos que a constitucionalização simbólica foi definida por

Neves (2007) como a situação na qual ocorre hipertrofia da função simbólica do texto constitucional em detrimento de sua função instrumental com consequente abalo ao núcleo do sistema constitucional, o qual compreende os direitos fundamentais, as eleições democráticas e a divisão de poderes. Qual é, destarte, o significado de um quadro de constitucionalização simbólica do ponto de vista da teoria dos sistemas de Luhmann?

Neves (2007) aborda a questão de um ponto de vista bastante inovador. Para ele, a ideia de que o direito seja um sistema autopoiético é passível de críticas. Neves entende, na verdade, que o direito em certas situações, entre as quais podemos citar a constitucionalização simbólica, é alopoiético, isto é, não possui autonomia operacional.

Embora seja uma perspectiva bastante inovadora de encarar a teoria sistêmica do direito, Neves não é o único a criticar a noção de direito como sistema autopoiético. Autores como Teubner, Ladeur e Pogrebinschi também o fazem. Vejamos a opinião da autora brasileira, que tece comentários ácidos à teoria luhmannuana à luz da nossa realidade (PROGRESBINSCHI, 2004, p. 166):

Para que serve a teoria dos sistemas autopoiéticos se ela é incapaz de explicar a realidade jurídica contemporânea? Seu valor é unicamente teórico. […] Como o direito no Brasil pode ser descrito na linguagem luhmanniana, se não (sic) como um sistema alopoiético, se não (sic) pela corrupção dos códigos? Basta pensar em uma decisão do nosso Supremo Tribunal Federal para perceber que é de outro conceito de autonomia jurídica que precisamos.

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Vejamos agora, segundo Neves (2007, p. 146-147) quais são os mecanismos por trás da autopoiese do direito:

Isso significa a sobreposição de outros códigos de comunicação, especialmente do econômico (ter/não ter) e do político (poder/ não poder), sobre o código “lícito/ilícito”, em detrimento da eficiência, funcionalidade e mesmo racionalidade do direito. […] É na capacidade de “releitura” própria das determinantes ambientais que o sistema se afirma como autopoiético. Na medida em que, ao contrário, os agentes dos sistema jurídico estatal põem de lado o código-diferença “lícito/ilícito” e os respectivos programas e critérios, conduzindo-se ou orientando-se primária e frequentemente com base em injunções diretas da economia, do poder, das relações familiares etc., cabe, sem dúvida, sustentar a existência da alopoiese do direito.

Desse modo, um sistema alopoiético é o oposto do autopoiético, tendo em vista que não tem capacidade de determinar a si mesmo conforme o seu próprio código. O código binário de um sistema alopoiético é, na verdade, bloqueado pelo código de outro sistema que a ele se sobrepõe. Nesse sentido, é possível distinguir a constitucionalização simbólica como um quadro em que a autonomia operacional do direito é violada pelo sistema político. O código binário do direito (lícito/ilícito), que se manifesta na função instrumental da norma jurídica, é bloqueado pelo código binário do sistema político (poder/não-poder), o qual se manifesta na função simbólica da norma.

De fato, Neves (2007, p. 149) compreende a constitucionalização simbólica a alopoiese do sistema jurídico causado pela sobreposição do sistema político a este:

No caso de constitucionalização simbólica, a politização desdiferenciante do sistema jurídico não resulta do conteúdo dos próprios dispositivos constitucionais. Ao contrário, o texto

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constitucional proclama um modelo político-jurídico no qual estaria assegurada a autonomia operacional do direito. Mas do sentido em que se orientam a atividade constituinte e a concretização do texto constitucional resulta o bloqueio político da reprodução operacionalmente autônoma do sistema jurídico.

O trecho acima corrobora a noção de que a constitucionalização simbólica é, do ponto de vista sistêmico, a sobreposição do sistema político ao jurídico por meio do bloqueio do código binário daquele por este, com a consequente quebra da autonomia operacional do direito. É de se notar, no entanto, que, embora a insuficiente concretização do texto constitucional em razão de injunções políticas (quebra da autonomia operacional do direito pela política) seja encarada como característica negativa – no sentido de omissão – da constitucionalização simbólica, ela decorre da ação dos agentes responsáveis pela concretização constitucional, que não é orientada no sentido de promover uma maior realização da função instrumental do texto da constituição. Ela está também está ligada, portanto, a uma característica positiva (comitiva), qual seja, o atuar desses agentes.

Interessa-nos salientar, ademais, que, embora o sistema político sobreponha-se ao jurídico nas hipóteses de constitucionalização simbólica, não se deve crer que o sistema político seja por isso autônomo. O sistema político é igualmente alopoiético, sendo o seu código-binário subordinado a outros. Neves (2007, p. 153) entende que a constitucionalização simbólica é uma forma de “encobrimento da falta de autonomia e da ineficiência do sistema político estatal, sobretudo com relação a interesses econômicos particularistas”. Dessa forma, podemos concluir que o sistema político é, na realidade, o veículo por meio do qual outros sistemas – notadamente o econômico, como podemos aduzir do trecho imediatamente anterior – bloqueiam o código binário do sistema jurídico e subsequentemente quebram a sua autonomia.

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Podemos nos aprofundar nas consequências sistêmicas da constitucionalização simbólica em dois pontos: a auto e a heterorreferência do direito enquanto sistema. A auto-referência do sistema jurídico, como visto no item 1.1, é constituída de três momentos: a auto-referência elementar, a reflexividade e a reflexão. Vimos também que estes três momentos são relacionados por Neves, respectivamente, com legalidade, constitucionalidade e teoria do direito. Pergunta-se, quais seriam as consequências da constitucionalização simbólica sobre a auto-referência do sistema jurídico?

Esses três momentos da auto-referência do sistema jurídico são, na verdade, interdependentes (NEVES, 2007, p. 156). Não é possível falar em legalidade quando não há uma cultura de constitucionalidade na qual se determine o que é legal ou não, assim como também não há que se falar em constitucionalidade em um cenário no qual a legalidade não é respeitada, afinal de contas, a legalidade faz parte do núcleo do sistema jurídico-constitucional na medida em que constitui um dos mais relevantes caracteres dos direitos fundamentais. Por fim, tanto a legalidade quanto a constitucionalidade não prescindem de uma teoria do direito bem estabelecida e vice-versa, tendo em vista que elas atuam reciprocamente na construção e institucionalização umas das outras. Sendo assim, na hipótese de constitucionalização simbólica, onde ocorre alopoiese do sistema jurídico e insuficiente concretização do texto constitucional, é forçoso concluir que não haverá uma adequada auto-referência do direito, estando esta prejudicada em seus três momentos.

Além da auto-referência (fechamento operacional do direito), a constitucionalização simbólica, logicamente, afetará a heterorreferência, isto é, a maneira como este subsistema social relaciona-se com a sociedade e com outros subsistemas. Falamos

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aqui, naturalmente, da função e das prestações políticas da constituição.

A função da constituição perante a sociedade é a institucionalização dos direitos fundamentais, e as suas prestações políticas consistem na previsão de eleições democráticas e da divisão de poderes. Tais relações serviriam como meio de viabilizar a diferenciação funcional e a inclusão social, conforme visto em item anterior. Elas são também (as eleições democráticas, a divisão de poderes e os direitos fundamentais) o núcleo do sistema constitucional, que, caso seja mal concretizado numa situação de hipertrofia função simbólica das normas constitucionais, resultará num quadro de constitucionalização simbólica. É fácil deduzir, portanto, que, havendo constitucionalização simbólica, necessariamente ocorrerão problemas de heterorreferência no sistema jurídico-constitucional em pelo menos uma de suas relações, seja ela função ou prestação.

Do ponto de vista semiótico, outras consequências da constitucionalização simbólica podem ser verificadas. Primeiramente, a insuficiente concretização do texto constitucional indica desde já uma deficiência semântica das constituições enquadráveis como simbólicas. Do ponto de vista sintático, sendo a constituição uma instância normativa que regulamenta outras normas, temos que a constituição simbólica não possui normatividade o suficiente para ter a devida influência sobre as outras normas. Por fim, pragmaticamente falando, vimos que há uma deficiência, no sentido de que os responsáveis pela interpretação e aplicação da carta constitucional muitas vezes são aqueles que deturpam o seu sentido e aplicabilidade.

Outra constatação interessante que pode ser feita relativamente às relações entre semiótica e constitucionalização simbólica insere-se no contexto dos códigos fortes e fracos. Trata-se, na verdade, de

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uma distinção entre os códigos da linguagem em razão da postura dos seus usuários, conforme explica Ferraz Júnior 2003, p. 284):

O código forte confere à prescrição um sentido estrito. […] O rigor, porém, estreita o espaço de manobra do destinatário, pois dele se exige um comportamento estrito. Assim, a tendência do receptor é ganhar espaço, ampliar sua possibilidade de comportamento. Por isso ele decodifica a prescrição conforme um “código fraco”, isto é, pouco rigoroso e flexível .

Neves (2007, p. 165), valendo-se dessa distinção, chega às seguintes conclusões:

[…] é possível afirmar-se que a constitucionalização simbólica implica um código jurídico fraco em face dos códigos binários “poder/não-poder” (político) e “ter/não-ter” (econômico). Esses, códigos fortes, bloqueiam a comunicação consistente e generalizada nos termos da diferença “lícito/ilícito” como código fraco.

Ou seja, trata-se de outra forma de dizer que o sistema político e o econômico sobrepõem-se ao jurídico, o qual perde sua autonomia operacional, mudando o seu status de sistema autopoiético para alopoiético. Isso ocorre quando a função simbólica das normas constitucionais é hipertrófica em relação à sua função instrumental de modo que afete algum dos alicerces do sistema constitucional (direitos fundamentais, eleições democráticas e separação dos poderes).

Do ponto de vista político, por sua vez, é possível estabelecer algumas correlações interessantes decorrentes da constitucionalização simbólica. Para chegar a tais correlações, Neves (2007, p. 105-107) utiliza-se do modelo classificatório de Loewenstein, segundo o qual as constituições podem ser dividas em normativas, nominalistas e semânticas.

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As constituições normativas seriam aquelas em que “direcionam realmente o processo de poder”. São aquelas constituições cujas prescrições normativas são dotadas de eficácia, que se concretizam e determinam de fato a conduta de todos os agentes para os quais os seus mandamentos estão voltados. Ela difere radicalmente das constituições nominalistas, as quais, segundo Neves (2007, p. 105), “apesar de conterem disposições de limitação e controle da dominação política, não teriam ressonância no processo real de poder, inexistindo suficiente concretização”. As constituições nominalistas, na verdade, situam-se entre os extremos da constituição normativa e semântica.

Os apontamentos de Neves (2007, p. 109) relativos às constituições semânticas começam com uma nomenclatura que ele considera mais adequada à espécie em questão:

Em relação às “Constituições semânticas”, cabe inicialmente uma mudança de denominação [...] Considerando-se que elas foram designadas “instrumentos” dos detentores do poder, parece mais adequada a expressão “Constituições instrumentalistas”.

Prossegue o autor com a descrição desse tipo de constituição comparando-a com as outras duas (2007, p. 109):

As “Constituições instrumentalistas”, ao contrário das “nominalistas”, correspondem à realidade do processo de poder, mas, por outro lado, em oposição às “normativas”, não têm nenhuma reação contrafática (normativa) relevante sobre a atividade dos ocasionais detentores do poder. É o caso das experiências autocráticas contemporâneas, sejam autoritárias ou totalitárias.

Nota-se, portanto, que as constituições instrumentalistas são o veículo por excelência de regimes não democráticos, sendo apenas reflexo das relações reais de poder. Nas próprias disposições

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normativas desse tipo de constituição é possível encontrar elementos que refletem a subordinação da esfera jurídica à política. Percebemos, por outro lado, que a constituição nominalista é aquela que mais se aproxima da ideia de constitucionalização simbólica, tendo em vista que ela busca preservar uma aparência de democracia e respeito aos direitos políticos e fundamentais, que se desfaz em face da não concretização de seus dispositivos

Mas quais são as consequências políticas da constitucionalização simbólica? O que poderá resultar nas relações de poder em uma sociedade cuja constituição caracterize-se como simbólica? Neves (2007, p. 126) elenca as seguintes possibilidades:

Como problema estruturalmente condicionado, o desgaste da constitucionalização simbólica poderá conduzir a movimentos sociais e políticos por transformações consequentes em direção a um sistema constitucional democrático efetivo. É possível também que conduza à apatia das massas e ao cinismo das elites. A reação mais grave, contudo, é o recurso à “realidade constitucional” mediante a imposição do padrão autoritário e o estabelecimento de constituição instrumental, na qual se exclui ou limita radicalmente o espaço da crítica à própria “realidade” de poder.

Percebe-se que três situações diferentes podem emergir duma condição de constitucionalização simbólica. Uma delas decorre do inconformismo das massas com o estado de coisas resultante da constitucionalização simbólica, redundando na luta pela implementação de uma constituição concreta, capaz de condicionar as relações de poder no seio da sociedade. A segunda ocorreria em face da indiferença, a população toleraria a situação, enquanto os donos do poder se aproveitam de sua posição privilegiada. Por fim, temos a possibilidade da imposição do regime autoritário, por meio do recurso à constituição instrumental; esta solução muitas vezes é apresentada à população como forma de tirar as elites do poder e

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devolvê-lo ao povo, mas esconde, na verdade, mecanismos que institucionalizam a dominação.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vimos, neste trabalho, que duas das principais referências teóricas adotadas por Marcelo Neves para chegar à sua teoria da constitucionalização simbólica encontram-se na teoria sistêmica de Luhmann e nos debates em torno da legislação simbólica. Sendo assim, o conhecimento de alguns elementos destes marcos teóricos é fundamental para a compreensão do trabalho de Marcelo Neves.

Nesse diapasão, alguns dos principais conceitos do arcabouço teórico luhmanniano foram abordados, por exemplo, a diferença sistema/ambiente, os códigos-binários, a noção de direito enquanto subsistema da sociedade bem como o seu fechamento operacional. Antes de se falar propriamente em legislação simbólica, couberam alguns comentários à cerca da linguagem jurídica em geral, bem como da semiótica como forma de investigação do direito nas suas três dimensões: sintática, semântica e pragmática.

Do lado da legislação simbólica, foi vista a sua definição como norma jurídica cuja função político-ideológica funciona hipertrofiadamente em relação à sua função instrumental, bem como a diferença entre eficácia e efetividade normativas. Esta diz respeito à realização da finalidade da lei, aquela diz respeito à concretização da hipótese normativa da lei. Viu-se também a tipologia adotada por Neves de legislação simbólica, a qual compreende três espécies: a legislação enquanto fórmula-dilatória, a legislação-álibi e a legislação enquanto confirmação de valores sociais.

Dando continuidade, no segundo capítulo foi estudada efetivamente a teoria da constitucionalização simbólica, a começar pelo esclarecimento das noções de constituição,

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constitucionalização e concretização constitucional. A constitucionalização foi abordada como processo de implementação da constituição moderna, ou seja, da limitação jurídica do governo. Trata-se, do ponto de vista sistêmico, de uma visão da constituição enquanto acoplamento estrutural dos subsistemas político e jurídico, no qual ambos, embora permaneçam operacionalmente autônomos, estão em constante fricção.

Viu-se também que o núcleo do sistema constitucional é formado por três pilares: os direitos fundamentais, a separação de poderes e as eleições democráticas. Sempre que algum desses pilares não estiver presente, não se pode falar em constituição em sentido moderno. A concretização constitucional, por seu turno, foi vista sob a ótica das teorias de Häberle e Müller, que se relacionam respectivamente com as dimensões pragmática e semântica da semiótica.

Depois disso, foi possível chegar a uma definição da constitucionalização simbólica, entendida como situação na qual o funcionamento hipertroficamente simbólica de norma constitucional afeta algum dos pilares do sistema constitucional. Várias conseqüências puderam ser daí extraídas, notadamente do ponto de vista sistêmico, onde se verifica, nos casos de constitucionalização simbólica, o direito não mais como sistema autopoiético, mas alopopiético, sem autonomia operacional, com o seu código binário subordinado ao código-binário do subsistema político.

REFERÊNCIAS

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GUERRA, Gustavo Rabay. O argumento jurídico: noções básicas de filosofia e teoria geral do direito (Normatividade, Sistema, Interpretação, Linguagem & Argumentação). João Pessoa, 2009 (material disponibilizado na disciplina Metodologia da Pesquisa Jurídica, Curso de Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas, UFPB).

LEITE, Glauco Salomão. A “politização” da jurisdição constitucional: uma análise sob a perspectiva da teoria dos sistemas de Niklas Luhmann. Revista Eletrônica sobre Reforma do Estado, Salvador, nº13, março/abril/maio, 2008. Disponível em: < http://www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 04.jul.2009.

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NOTAS:

[1] Trata-se de obra na qual Marcelo Neves realiza uma releitura conceitual do estado democrático de direito valendo-se das premissas teóricas de Luhmann e de Habermas.

[2] Trata-se de artigo no qual Marcelo Neves trata especificamente do direito enquanto sistema autopoiético, visão que ele considera passível de restrições, notadamente no que tange aos países subdesenvolvidos.

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[3] Trata-se de artigo no qual Neves aborda as relações entre o simbólico na política e a instrumentalidade dos direitos humanos.

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SOBERANIA POPULAR E JURISDIÇÃO ELEITORAL

FERNANDA ISABELA DE FIGUEIREDO: servidora pública municipal.

RESUMO: A presente dissertação tem como objeto de estudo as decisões da Justiça eleitoral nos casos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97. O objetivo do estudo consiste na análise do aparente conflito entre a vontade popular manifestada nas urnas e as decisões judiciais que determinam a desconstituição do mandato eletivo do candidato infrator, tendo em mira o sistema democrático e a soberania popular.

Palavras-chave: mandato eletivo, perda, democracia, soberania popular, decisão judicial.

INTRODUÇÃO

Com efeito, a história recente das eleições em nosso país tem mostrado uma intervenção mais ativa do Poder Judiciário, notadamente no que diz respeito às decisões que determinam a cassação de mandatos eletivos, no mais das vezes de modo a alterar drasticamente o quadro dos candidatos consagrados pelo voto popular.

Nesse sentido, o objeto do presente estudo compreende a análise da atuação da Justiça Eleitoral nos casos de cassação de registros de candidaturas e mandatos eletivos em decorrência da aplicação do art. 41-A da Lei nº 9.504/97.

Assim, indaga-se a respeito da legitimidade democrática dessa atuação do Poder Judiciário em matéria eleitoral, por meio de uma análise do aparente conflito entre a pretensa vontade popular

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manifestada nas urnas e a decisão judicial que desconstitui o mandato eletivo com base no art. 41-A da Lei nº 9.504/97.

Conforme reza a Carta Magna de 1988, a República Federativa do Brasil tem como um de seus fundamentos a soberania popular (art. 1º).

O conceito de soberania nasceu no século XVI, como elemento fundamental para a formação do Estado Moderno. A primeira tentativa de conceituação ocorreu com Bodin, no ano de 1576. Conforme ensina Bernardo Gonçalves Fernandes, a soberania, neste momento, era entendida como o poder supremo atribuído ao monarca no âmbito interno, sem qualquer referência à ideia de independência de um Estado em relação aos demais.[1]

Posteriormente, a soberania passou a representar um poder político que conjugava duas características: supremacia e independência. No escólio de Marcelo Novelino, supremacia, por não estar limitado a nenhum outro na ordem interna (soberania interna); independência, por não estar condicionado, no plano internacional, ao poder de outros povos (soberania externa).[2]

Somente com a evolução do Estado de Direito meramente formal para um Estado Democrático de Direito, o conceito de soberania, no plano interno, migrou do monarca para o povo, passando a apresentar-se como soberania popular. O artigo 1º, parágrafo único, da Constituição de República, ao dispor que “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos desta Constituição”, define bem a amplitude da vontade popular nos tempos hodiernos.

Nessa esteira, a soberania popular, em nossa ordem jurídica, se exterioriza por meio do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos (art. 14, CF/1988). A vontade dos cidadãos, elegendo seus representantes políticos, é o

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momento instituinte dos mandatos eletivos e de manifestação da soberania popular.

Pode-se dizer que a soberania popular representa a fusão de duas liberdades fundamentais: o direito de votar e o direito de ser votado. Tanto é que oCódigo Eleitoral, produzido em plena ditadura militar, parece ter percebido esses dois direitos políticos em seu artigo inaugural: “Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos, precipuamente os de votar e ser votado.”[3]

Assim, um dos maiores questionamentos quanto ao controle judicial das eleições é a invocada falta de legitimidade democrática dos juízes, que não são eleitos nem representam a vontade popular, ainda mais no caso do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que implica na cassação imediata do registro ou diploma do candidato infrator.

Em outros termos, questiona-se se pode a Justiça Eleitoral cassar o mandato eletivo adquirido nas urnas como consequência da decisão de um povo e, nesse sentido, se tal decisão não afrontaria diretamente a soberania popular, sobretudo nos casos em que o segundo colocado é chamado a assumir o cargo eletivo.

No âmbito doutrinário, não são poucas as afirmações de que a atuação da Justiça Eleitoral seria contramajoritária. Nessa linha é a opinião de Adriano Soares da Costa, senão vejamos:

É inegável que há perversão em uma democracia cujo eleito é o segundo colocado. Desconheço que assim seja em outros países. Quando o eleito é cassado por corrupção eleitoral, presumem-se duas coisas: a) que o processo eleitoral foi ilegítimo e b) que os órgão de fiscalização falharam em sua missão.

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(...)

Todos aguardam ansiosos que a Justiça Eleitoral endireite a nossa democracia, porque o povo, ao que parece, seria incapaz de fazê-lo. Que país engraçado o nosso: institucionalizamos o terceiro turno e clamamos que os tribunais resolvam, ao fim e ao cabo, o que deveria ser submetido apenas ao crivo popular. Construímos uma república dos derrotados, dos sem-votos, escolhidos pela eleição indireta dos eleitores togados.[4]

Assim, para que seja possível compatibilizar a atuação do Poder Judiciário no âmbito eleitoral, notadamente no caso do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, com as ideias de democracia e soberania popular, torna-se imprescindível analisar os fundamentos e o papel do Poder Judiciário no nosso atual modelo de Estado Constitucional Democrático.

Nesse sentido, após a segunda metade do século XX, houve significativas alterações nos paradigmas de Estado e de Constituição. A constatação de que a legalidade estrita poderia justificar regimes autoritários e atrocidades como as cometidas durante a Segunda Guerra mundial, levaram a uma nova dogmática centrada na dignidade da pessoa humana.

Conforme ensina Fredie Didier Júnior, a essa nova fase do pensamento jurídico deu-se o nome de Neoconstitucionalismo, que apresenta como principais características: a) o reconhecimento da força normativa da Constituição; b) o desenvolvimento da teoria dos princípios, reconhecendo-lhes eficácia normativa; c) a expansão e consagração dos direitos fundamentais; d) a transformação da hermenêutica jurídica, com o reconhecimento do papel normativo e criativo do Poder judiciário.[5]

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Quanto a esta última característica, tem-se que a Constituição passou a condicionar as decisões da maioria, tendo como principais protagonistas os juízes, e não mais o legislador. Nesse sentido, Dirley da Cunha Júnior assevera que:

“Desse modo, a ideia de soberania do Legislativo, em razão da representatividade popular, e da separação dos Poderes, com a submissão do Judiciário à lei, cederam espaço para o novo paradigma do Estado Democrático de Direito, que se assenta num regime democrático e na garantia dos direitos fundamentas, onde a justiça constitucional é nota essencial. Com efeito, a soberania do Legislativo foi substituída pela soberania e supremacia da Constituição, em face da qual o Legislativo é um Poder constituído e vinculado pelas normas constitucionais, e o dogma da separação de Poderes foi superado pela prevalência dos direitos fundamentais ante o Estado.”[6]

Neste ponto, vale um paralelo com o controle judicial de constitucionalidade, no qual também há discussão acerca da legitimidade do juiz em invalidar a produção feita por um órgão direta e democraticamente legitimado.

A respeito, deve-se ter em mente que quando o Poder judiciário invalida uma lei infraconstitucional, ele não opõe sua própria vontade ao Legislativo, mas sim a vontade mesma da nação, do povo, expressa na Constituição. Assim, onde a vontade do Legislativo, manifestada na lei, situar-se em oposição à vontade do povo, declarada na Constituição de um Estado, os juízes devem curvar-se a esta, e não à primeira. Não é outro o entendimento de Meirelles Teixeira, que afirma:

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Se num país de rigidez constitucional acha-se a lei ordinária em desacordo com a Constituição, essa lei ordinária é apenas uma “aparência” da vontade nacional, uma pseudovontade da Nação, pois a autêntica, a verdadeira vontade nacional já se manifestou, cercando-se de todas as cautelas, soberana e inconfundível, nos preceitos constitucionais.[7]

Assim, no atual paradigma do Estado Constitucional Democrático, o juiz deixou de ser o “boca da lei”, a quem se permitia tão somente declarar o direito criado pelo Legislador, para juiz transformador da realidade social e concretizador dos valores e direitos fundamentais inseridos na Constituição da República.

Nessa toada, a Carta Política de 1988 expressamente dispõe em seu art. 14 que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”. No mesmo artigo, já em seu §9º, o constituinte inseriu verdadeiro mandamento de concretização de valores, ao dispor que “lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.

De se notar, destarte, que o Poder constituinte, que representa a vontade da Nação, deixou consignado na Constituição os valores que devem ser tutelados em uma eleição, a fim de que o exercício da soberania popular se dê de forma legítima, sendo certo que a violação de tais postulados axiológicos no curso do processo eleitoral legitima a cassação do mandato eletivo.

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Há inegável autorização constitucional para que práticas como o abuso de poder econômico, corrupção e fraudes, sejam coibidas pela Justiça Eleitoral. O Poder Judiciário, alçado à condição de guardião dos valores fundamentais inscritos na Constituição, deve fazer valer tais valores frente a uma pretensa maioria resultante de aliciamento e corrupção eleitoral.

Não é outro o entendimento de Marcio Luiz Coelho de Freitas, para quem:

Daí a legitimidade da atuação da Justiça Eleitoral no expurgo do processo eleitoral daqueles candidatos que tenham demonstrado desrespeito ao princípio democrático, sendo certo que tal atuação está longe de caracterizar a institucionalização de um “terceiro turno” pela judicialização das eleições ou uma decisão no tapetão. Ao contrário, o rigor do processo judicial, sujeito à possibilidade de reapreciação por uma instância superior, e a necessidade de argumentação racional, baseada em provas produzidas sob o crivo do contraditório, existem exatamente para garantir que nesse processo contínuo de evolução e amadurecimento institucional as velhas práticas coronelistas e clientelistas sejam gradativamente abandonadas em prol da construção de uma democracia mais sólida e forte.[8]

Assim, discutida e percebida a legitimidade da atuação da Justiça Eleitoral, o que deve ser realmente repensado é a consequência advinda da cassação do mandato eletivo do candidato infrator.

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Isto porque, conforme prevê o art. 222 do Código Eleitoral, a captação ilícita de voto torna anulável a votação dela resultante. Por conseguinte, o art. 224 do mesmo diploma legal declara que se a nulidade atingir mais da metade dos votos em caso de eleições majoritárias, julgar-se-á prejudicado o pleito, marcando-se nova eleição. Logo, só há nova eleição quando o candidato cassado houver obtido mais de 50% (cinquenta por cento) dos votos válidos. Nos demais casos, o segundo colocado nas urnas assume o cargo.

O fato é que não se pode presumir que todos os eleitores que votaram no candidato infrator tiveram suas vontades cooptadas por meios ilícitos. Assim, desconsiderar todos os votos dados ao candidato cassado e, por via de consequência, atribuir o mandato eletivo ao segundo colocado, que não obteve nem a maioria simples nas urnas, não é medida que se coaduna com o princípio democrático.

A própria Constituição Federal, em seu art. 77, §2º e 3º, impõe a necessidade de que o eleito para cargos do Poder Executivo obtenha a maioria absoluta de votos. Assim, a melhor maneira de compatibilizar a cassação de mandatos eletivos pela Justiça eleitoral com o regime democrático e a soberania popular é a realização de novas eleições em ambos os casos, aplicando-se por analogia o art. 81 da Carta Política.

Mas mais que isso. A atuação do Poder judiciário, bem como do Ministério Público Eleitoral, deve ser acima de tudo preventiva e fiscalizatória, por meio de instrumentos mais eficazes de combate à corrupção eleitoral. A prestação de contas de campanha, por exemplo, ao invés de representar mero simulacro de legalidade, como ocorre nos dias atuais, deveria ter que se apresentada na medida em que os gastos fossem sendo realizados.

Em suma, todo o processo que antecede o fatídico domingo de votação deve ser acompanhado de perto tanto pelos órgãos

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legitimamente incumbidos de tal mister, como pela sociedade civil como um todo, a fim de que a cassação de mandatos eletivos se torna medida cada vez mais rara e excepcional.

CONCLUSÃO

Prática já enraizada no cenário político nacional, a compra de votos se tornou um dos principais mecanismos de campanha dos aspirantes a cargos públicos. Para a maioria deles, salvo raras exceções, a outorga de benefícios materiais a eleitores carentes é meio mais rápido e cômodo de angariamento de votos, o qual prescinde de qualquer discussão política sobre plataformas e projetos de governo.

Conforme restou consignado, no atual paradigma do Estado Constitucional Democrático, a legitimidade da atuação da Justiça Eleitoral em tais casos se funda na própria Constituição Federal, que alçou o Poder Judiciário à condição de guardião dos valores fundamentais inscritos na Carta Política, dentre eles a probidade administrativa, a moralidade para o exercício de mandato eletivo e a legitimidade das eleições.

É imprescindível que se entenda, de uma vez por todas, que voto não tem preço, tem consequências. Somente com essa mudança positiva de atitude poderá se chegar à consolidação do tão propalado Estado Democrático de Direito.

REFERÊNCIAS

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CÂNDIDO, Joel J. Direito Eleitoral brasileiro. 14ª ed. São Paulo: EDIPRO, 2010.

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NOTAS:

[1] FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Direito constitucional, p. 293

[2] NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional, p. 370.

[3] CÓDIGO ELEITORAL

[4] COSTA, Adriano Soares da. Democracia, judicialização das eleições e terceiro turno. Disponível em: <<http://adrianosoaresdacosta.blogspot.com.br/2009/02/democracia-judicializacao-das-eleicoes.html>>. Acesso em: 20 mai 2014.

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[5] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual civil. 14ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2012, p. 27.

[6] CUNHA JÚNIOR, Dirley. Controle de constitucionalidade: teoria e prática. 6ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2012, p. 47.

[7] TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Forense Universitária, 1991, p. 375.

[8] FREITAS, Marcio Luiz Coelho de. Soberania popular, democracia e jurisdição eleitoral: reflexões acerca da legitimidade democrática da cassação de mandatos pela Justiça Eleitoral. Disponível em: <<http://jus.com.br/artigos/22278/soberania-popular-democracia-e-jurisdicao-eleitoral-reflexoes-acerca-da-legitimidade-democratica-da-cassacao-de-mandatos-pela-justica-eleitoral>>. Acesso em: 20 maio 2014.

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ASPECTOS RELEVANTES SOBRE A JORNADA EXTRAORDINÁRIA DO BANCÁRIO

ALINE PECORELLI DA CUNHA MARTINS: Assessora Jurídica da 1ª Circunscrição Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Bacharela em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa - UNIPÊ, Especialista em Direito do Trabalho pelo Centro Universitário Leonardo Da Vinci de Santa Catarina.

Resumo: O presente artigo tem por objetivo estudar alguns aspectos sobre a jornada extraordinária do bancário. A ideia de abordar o tema surgiu da observação do aparecimento de um grande número de reclamações postuladas na justiça do trabalho, em virtude do desvirtuamento pelos bancos da jornada de trabalho dessa categoria. Isso porque, o bancário possui uma jornada especial garantida por lei e só em hipóteses excepcionais é que essa jornada pode ser diferenciada, mas os bancos vêm comissionando grande parte de seus empregados apenas para burlar a jornada especial de seis horas diárias desses trabalhadores. São necessários dois requisitos concomitantes para que essa jornada seja diferenciada, que o bancário exerça função de confiança e que perceba uma gratificação não inferior a um terço do salário do cargo efetivo. Através de uma pesquisa bibliográfica e documental será feita uma análise sobre a configuração ou não do exercício da função de confiança a que se refere o art. 224, §2° da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pois o cargo de confiança é uma exceção à jornada especial do bancário e sendo empregado conforme a lei, não acarreta prejuízo ao trabalhador.

Palavras-chave: Trabalho. Extraordinário. Bancário. Desvirtuamento. Configuração. Função de confiança.

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2. Introdução

O contrato do bancário encontra-se inserido na CLT dentro das Normas especiais de Tutela de Trabalho, trazendo na Seção I, art. 224, os trabalhadores que se enquadram no conceito de bancário, ou seja, aqueles que trabalham em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal. A jurisprudência também tratou de incluir, além desses, os empregados das empresas de crédito, financiamento ou investimento e os de processamento de dados, exceto quando esse último prestar serviços a banco e a empresas não bancárias do mesmo grupo econômico ou a terceiros. (Súmulas 55 e 239 do TST).

Passamos a analisar então os aspectos referentes à jornada de trabalho dessa categoria, que tanto vem sendo debatida na seara dos Tribunais, uma vez que por ser excepcional, tem sido objeto de distorções por parte de muitas empresas.

Para os bancários, há três tipos de jornadas: seis horas, para os que cumprem a jornada normal, sem fidúcia diferenciada, estabelecida no caput do art. 224 da CLT; oito horas, para os exercentes de cargo de confiança, que possuem uma fidúcia diferenciada, tendo direito à percepção de gratificação não inferior a 1/3 do salário do cargo efetivo, que visa remunerar este excesso laborado (7ª e 8ª horas), prevista no §2º do mesmo artigo; e, por último, a jornada que não sofre controle, que é aquela exercida pelos gestores, com expressivo poder de mando e gestão, sem limite de horários, estando enquadrada no art. 62, II, da CLT.

Essa diferenciação, no entanto, não é tão simples quanto parece, pois não basta a mera alteração da função para que reste configurado o enquadramento em uma dessas três hipóteses, deve haver o cumprimento dos requisitos legais mínimos, para que haja a correta remuneração de tais cargos. Logo, será a análise das reais atividades exercidas pelo empregado somado ao requisito da

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gratificação, que irá caracterizar o tipo de cargo desempenhado por ele.

Diante disso, percebemos que o legislador, ao estabelecer uma jornada de seis horas diárias para o bancário, deu-lhe uma proteção diferenciada em relação aos demais trabalhadores e fixou as hipóteses excepcionais em que ela não é empregada, que seriam justamente as constantes no§2º do art. 224 e no inciso II do art. 62 da CLT.

No que concerte mais especificadamente ao cargo de confiança (art. 224, §2º da CLT), encontramos uma maior facilidade no que se refere ao desrespeito dos ditames legais, uma vez que por ser de inteira complexidade a identificação das reais atividades desses trabalhadores, é que muitas vezes as atribuições previstas em determinados cargos não correspondem àquela fidúcia diferenciada que resulta na elevação da jornada, ou, ainda, quando não há a exata correspondência entre aquilo que está previsto nos normativos dos bancos com as reais atividades desempenhadas pelo bancário.

Nesse passo, o desvirtuamento da previsão legal pode acarretar excesso de jornada não remunerado devidamente, importando em prejuízos gravíssimos para o trabalhador. É necessário um exame concreto sobre as reais atividades do empregado para que haja o enquadramento na exceção prevista no parágrafo segundo do artigo consolidado, que por ser uma norma excepcional, não comporta interpretação extensiva.

Sobre o tema, Russomano nos explica:

“Pela natureza da organização bancária, muitos cargos estão na linha limítrofe que separa as funções efetivas das funções de confiança, de modo que podem surgir

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dificuldades para se estabelecer em que medida se aplicará a determinado trabalhador o sistema geral ou o sistema próprio dos bancários”.[1]

O Princípio da primazia da realidade que norteia o Direito do Trabalho exerce grande importância nesse contexto, já que ele valoriza o fato real em detrimento dos documentos formais, tendo em vista que por ser o empregador o detentor de uma posição privilegiada de poder econômico em relação ao empregado, pouco importa o nome jurídico ou a qualificação formal atribuída a determinado documento.

É válido esclarecer que os bancários que cumprem jornada de trabalho de seis horas diárias são aqueles detentores de fidúcia ordinária, os quais têm direito a horas extras quando prestam serviços além da 6ª hora diária.

Os exercentes de cargo de confiança (poder diretivo e fidúcia diferenciada), objeto deste estudo, cumprem jornada de oito horas, com direito a gratificação superior a 1/3 de seu salário, remuneratória da 7ª e 8ª horas diárias. Caso prestado labor após a 8ª hora do dia, têm direito a perceber as horas extras correspondentes.

Os gestores (significativos poderes de mando), por sua vez, não têm qualquer limitação de jornada de trabalho, não sofrem controle, nem fazem jus à percepção de remuneração a título de hora extra.

3. Desenvolvimento

I- Função de confiança

É muito comum atribuir a todo e qualquer cargo de direção, a denominação de cargo de confiança. Isso porque a lei não traz

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claramente o conceito de cargo de confiança. No entanto, podemos observar algumas características traçadas pela doutrina, vejamos:

“É o poder de representar o patrão, de substituir a pessoa ou pessoas do empregador. Este poder caracteriza-se pela faculdade de praticar o empregado atos jurídicos, com certa autonomia, sob uma subordinação extraordinariamente reduzida, e respondendo por perdas e danos.”[2]

O mesmo autor, mais adiante, citando Mario de la Cueva, tenta nos esclarecer com maior propriedade:

“Quando estiverem em jogo a existência da empresa, seus interesses fundamentais, seu êxito, sua prosperidade, a segurança de seus estabelecimentos, a ordem necessária que deve reinar entre seus trabalhadores – aí se deve falar em empregados de confiança.”[3]

Convém destacar que todo contrato de trabalho pressupõe certa confiança por parte do empregado, mas esta representa sinônimo de colaboração, não se confundindo com aquela que caracteriza o cargo de confiança, que poderá ensejar a substituição da pessoa do empregador.

Prunes, afirma que a confiança depositada pelo empregador é a máxima e a subordinação é a mais baixa dentre todos os empregados, o que resultará, muitas vezes, na execução de tarefas muito assemelhadas às do próprio empregador. [4] Porém, não podemos englobar nesse conceito os cargos de direção técnica, que exige uma certa habilitação do empregado, inerente a determinado ofício, arte ou profissão, pois este não tem a direção geral do negócio, não representa pessoalmente o empregador, nem o substitui, é, como define Carvalho, “o mais graduado na escala

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técnica e, por isso, orienta os demais técnicos, sem que se possa falar em representação jurídica, atributo dos diretores, gerentes etc.” [5] O exercício do cardo de confiança pressupõe uma relação de afinidade com a vontade do empregador, podendo resolver e agir em nome dele.

Encontramos ainda na doutrina a distinção entre confiança técnica e administrativa, aquela é outorgada a empregado especializado em determinado ramo da ciência ou das artes, não constituindo cargo de confiança, nesta o seu titular até certo limite representa a alta chefia da empresa e, por isso, se torna investido em função de confiança. [6] Nesse sentido, temos o julgado:

CARGO DE CONFIANÇA – DISTINÇÕES ENTRE NATUREZA TÉCNICA E ADMINISTRATIVA – É tradicional na doutrina a distinção entre a confiança de natureza técnica, depositada num empregado qualificado, ao qual se atribuem funções compatíveis com seu grau de conhecimento e experiência, e aquela, de ordem administrativa, que implica a outorga de prerrogativas de mando e representação do empregador (ainda que de forma limitada no âmbito bancário), como autêntica extensão do poder hierárquico. É exclusivamente desta última que cogitam os arts. 62, II e 224, §2º da CLT.[7]

Para a categoria bancária, serão considerados de confiança aqueles que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes.

A fim de tornar mais claro nosso entendimento acerca de tais cargos de confiança e compreender de que maneira eles são exercidos por seus empregados, colacionamos o julgado a seguir:

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Nos estabelecimentos bancários, os empregados somente serão reputados como de especial confiança quando, em nível intermediário da escala hierárquica, sua atividade exclusiva – e não apenas preponderante – consistir, cumulativamente, em a) dirigir, controlar ou fiscalizar o trabalho de outros, (poder de mando, subordinação) e b) praticar, mediante autorização ou delegação expressa, atos em nome do empregador (representação e substituição). Em nível intermediário, porque se estiver situado no topo da organização, tais atividades o caracterizarão como órgão ou representante com amplos poderes de mando e gestão. Isso exclui os chamados cargos técnicos, ou de direção técnica, em que prepondera uma particular habilitação do empregado, inerente a determinado ofício, arte ou profissão, ou cujas tarefas se qualificam por uma complexidade maior do que a das demais funções.[8]

Nas agências bancárias, a gerência é desdobrada em gerência geral ou principal e gerências setoriais, estas últimas subordinadas à primeira. O empregado qualificado como gerente geral ocupa cargo de confiança imediata do empregador, com poderes que o habilitam a administrar a unidade descentralizada, já o gerente setorial ocupa cargo de confiança mediata, com poderes secundários de gestão. Daí porque a Súmula nº 287 do TST enquadra o gerente de agência (setorial) no §2º do art. 224 e o gerente geral na hipótese do inciso II do art. 62, ambos da CLT.

O cargo de confiança bancária passa a ter um alcance muito maior do que aquele previsto no art. 62, II da CLT, pois abrange todos os cargos que pressupõem atividade de coordenação,

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supervisão ou fiscalização, não sendo necessária a presença de amplos poderes de mando e gestão. [9]

A confiança prevista no §2º do art. 224 da CLT, é, como afirma Godinho, específica, não se confundindo com aquela tipificada no art. 62 da CLT, nesta o empregado deve ter amplos poderes de mando e gestão, sendo a confiança depositada nele excepcional, a ponto de substituir o próprio empregador, podendo colocar em risco a empresa. Naquela, os poderes não são tão elevados, sendo necessário que o empregado se enquadre na descrição do dispositivo legal próprio, ou equivalente. Lembra-nos, ainda, o autor, que o exercício de chefia atende ao requisito legal, não se exigindo, necessariamente, chefia de departamento ou filial. [10]

É necessário ressaltar que a confiança bancária, mesmo não tendo o rigor das funções gerenciais do art. 62 da CLT, não será enquadrada como qualquer função de maior responsabilidade ou qualificação técnica, ela deverá ter algum poder de mando ou representação, além de ser fundamental que o empregado exerça uma ascendência hierárquica sobre alguns colegas.

II - Denominação do cargo

É importante estabelecermos critérios diferenciadores entre a natureza do serviço e a denominação do cargo, a fim de evitar o errôneo enquadramento de determinadas funções como de confiança, que leva o empregador a se esquivar do pagamento de horas extras.

Existem muitos cargos que possuem denominação enganadora com o intuito de excluir o empregado da proteção legal, porém, devemos atentar para real natureza da função e não para o rótulo que ela ostenta, pois, segundo Carvalho, é a natureza do serviço e não a designação que obedece a uma nomenclatura variável de caráter privado.[11] Nesse sentido, Prunes enfatiza que

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“as denominações, para serem adequadas devem ser compatíveis com o conteúdo a que se referem” [12].

Devemos lembrar que o Direito do Trabalho tem como princípio a Primazia da Realidade, que leva à apreciação do contrato em face de sua real natureza e finalidade. É por isso que a mera denominação de chefe, sem haver poder de chefia, não permite o enquadramento da função na hipótese do § 2º do art. 224 da CLT, é preciso que seja demonstrada alguma fidúcia especial depositada pelo empregador e que o cargo também a exija, para que assim o empregado possa ser considerado de confiança.

A fim de corroborar com esse entendimento, destacamos os julgados a seguir:

Bancário. A circunstância de ter o legislador querido atribuir à confiança bancária contornos distintos daqueles dos demais empregados de confiança não constitui em autorização para que a denominação do cargo sirva como elemento suficiente para excluir o empregado da jornada normal dos bancários. Assim, sua caracterização exige o exercício de funções de chefia, direção, gerenciamento e fiscalização ou equivalentes. Ou seja, faz-se necessário que seja demonstrado que a atividade do empregado o enquadra em qualquer dessas referências.[13]

O bancário foi contemplado com jornada especial de seis horas diante da penosidade da função (CLT. Art. 224). A ressalva do § 2º supõe, necessariamente, o exercício de função de direção, na qual se contenha como elemento fundamental a fidúcia (idem, § 1º). Não será sofisticando a denominação do cargo ou

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generalizando a ressalva que se comprometerá a duração da carga de trabalho, substituindo-se a contraprestação pelo trabalho extraordinário por mera gratificação.[14]

Além disso, a Súmula 102, I do TST é clara ao estabelecer que: “A configuração, ou não, do exercício da função de confiança a que se refere o art. 224, § 2º, da CLT, dependente da prova das reais atribuições do empregado, é insuscetível de exame mediante recurso de revista ou de embargos”. [15]

Portanto, o enquadramento do bancário na exceção art. 224, § 2.º, da CLT, não se relaciona com a nominação do cargo ou descrição de atividades em documentos internos, mas sim com as reais atribuições desempenhadas pelo empregado.

III - Requisitos legais

O § 2º do art. 224 da CLT traz como requisitos para caracterização da função de confiança dois elementos, quais sejam: que o empregado desempenhe funções de direção, gerenciamento, fiscalização ou chefia e que perceba gratificação de função de um terço do salário do cargo efetivo.

Demonstramos no tópico anterior que o título de chefe não é suficiente para que o empregado seja excepcionado da regra normal dos bancários, resta-nos esclarecer que a maior responsabilidade atribuída ao empregado enseja, portanto, uma maior remuneração e maiores acréscimos obrigacionais.

A função de confiança é tida como um cargo especial, que leva o empregado a ter uma posição de destaque em relação aos demais, o que necessariamente traz maior responsabilidade. É fácil

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entender, portanto, que tais requisitos são concomitantes, uma vez que só há remuneração superior quando a natureza do serviço prestado for alterada a ponto de colocar o empregado numa condição especial, em que terá maiores atribuições, responsabilidades e, consequentemente, maior quantidade de trabalho.

Não sendo comprovado os requisitos impostos pela norma excepcional, há que ser afastado o exercício do cargo de confiança, ressaltando, ainda, que por serem requisitos concomitantes, o cumprimento apenas da gratificação superior, por exemplo, servirá apenas para remunerar as maiores atribuições que o bancário desenvolveu, devendo o mesmo ser enquadrado na jornada especial bancária, ou seja, de seis horas, e perceber como extraordinárias as horas laboradas a título de confiança.

IV - Considerações acerca do disposto no art. 224, § 2º da CLT.

Como sabemos, as regras concernentes à jornada do bancário não se aplicam àqueles empregados que exercem funções de direção, chefia e equivalentes ou que desempenham outros cargos de confiança, desde que o valor da gratificação percebida não seja inferior a um terço do salário do cargo efetivo.

Ocorre que essa exceção vem sendo objeto de muitas reclamações trabalhistas, grande parte delas favoráveis ao empregado, porque os bancos vêm comissionando muitos dos seus empregados apenas para burlar a jornada especial de seis horas diárias da categoria.

Assim, mesmo que o bancário não exerça função de confiança, o banco o comissiona, segundo suas nomenclaturas próprias, mas destituído de poder, para que o bancário passe a receber, ao invés da hora extra, a gratificação permitida por lei. Vê-

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se, portanto, que ele se utiliza de uma exceção para fazer valer seus interesses, o que para o Direito, seria o mesmo que agir em benefício da própria torpeza.

O ideal seria que os empregadores seguissem à risca o que determina o dispositivo legal, que por ser excepcional, não permite interpretação extensiva. Sendo certo que “a lei exclui do limite de jornada o cargo de confiança típico, não atinge aquele de mera nomenclatura, não contemplando os mascaramentos e rotulações tendentes ao alijamento de direitos do empregado” [16].

Sabemos que a categoria bancária sempre lutou por uma jornada reduzida que compensasse o grande desgaste físico e mental que eles sofriam e que tal diferenciação justifica-se por ser um trabalho de grande responsabilidade, que expõe o empregado aos riscos da fadiga e do esgotamento.

Trata-se de uma alternativa autorizada por lei para que o empregador, em casos excepcionais, não sofresse o ônus do pagamento de horas suplementares, estimulando o empregado a crescer na empresa. Atitude esta que é benéfica para ambas às partes.

A alternativa para evitar o desvirtuamento da norma deve ser no sentido de buscar meios para facilitar o cumprimento da lei, que poderia ser obtido com uma maior fiscalização dos normativos criados pelos bancos, observando o enquadramento de cada uma das funções, levando em consideração não o ‘nomem juris’ do cargo, mas as responsabilidades e prerrogativas do verdadeiro cargo de confiança, uma vez que a problemática surge exatamente no momento da criação do cargo e suas atribuições, sendo tal solução uma maneira de atingir a raiz do problema.

Percebemos o quanto é importante qualificar devidamente os denominados cargos de confiança, pois se trata de um imperativo

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legal destinado a proteger a saúde do trabalhador, não podendo ser renunciado pelo mesmo, através de acordo individual com o empregador, uma vez que as alterações contratuais, se prejudiciais aos interesses obreiros, serão inválidas.

4. Conclusão

A problemática em questão evidencia a banalização do cargo de confiança, uma prática muito comum entre os bancos públicos e privados, que consiste no desvirtuamento da função de confiança, tornando praticamente sem efeito um instituto criado com a finalidade de estimular o trabalhador, considerando a grande desvalorização do salário referente ao cargo efetivo, desempenhado pela totalidade dos bancários.

Percebemos a importância deste tema, quando nos deparamos com a imensa gama de processos que se acumulam na justiça do trabalho atualmente, o que nos leva a valorizar a discussão do problema, não só tentando descobrir maneiras para regularização da situação, atuando de forma repressiva e condenando as empresas infratoras com o pagamento de horas extraordinárias, mas, também, estimulando uma maior fiscalização por parte dos sindicatos da categoria, sendo esta uma forma preventiva de conter essa prática que tanto prejudica o trabalhador.

Notas:

[1] RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. 4. Ed. Curitiba: Juruá, 1991. p. 280.

2 CARVALHO, José Antero. Cargos de direção no direito do trabalho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Jornal do Comercio, 1949. p. 48.

3 CUEVA, Mario de la. Apud José Antero de Carvalho, Ibidem. p. 67.

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4 PRUNES, José Luiz Ferreira. Cargos de Confiança, direção e comissão no Direito do Trabalho. 1. Ed. Biblioteca LTr Digital, 2006.

5 CARVALHO. op. cit. p. 70

6 Passim.

7 BRASIL. TRT da 2ª região. Recurso Ordinário n. 19999058423, (20010198240). Relatora: Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva. Oitava Turma. São Paulo. Publicado em 22.05.2001. In PRUNES. op. cit. p.41.

8 BRASIL. TRT da 2ª região. Recurso Ordinário n. 02990255448, Ac. 20000223128, Relator: Luiz Carlos Gomes Godoi.. 7ª Turma. São Paulo. Publicado em 16.06.2000. In PRUNES. op. cit. p.41.

9 BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2008.

10 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2006.

11 CARVALHO, José Antero. Cargos de direção no direito do trabalho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Jornal do Comercio, 1949.

12 PRUNES. op. cit. p. 32.

13 BRASIL. TRT da 1ª região. Recurso Ordinário n. 0473 de 1995. Relatora: Doris Luise de Castro Neves. 6ª Turma. Rio de Janeiro. Publicado em 16.01.1998. In PRUNES. op. cit. p.32.

14 BRASIL. TRT da 2 região. Recurso Ordinário n. 19990477640, (20000544145). Relator: José Carlos da Silva

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Arouca. 8ª Turma. São Paulo. Publicado em 28.11.2000. In PRUNES. op. cit. p.32.

15 BRASIL, SÚMULAS DO TST. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2009.

16 Levi Fernandes Pinto apud José Luiz Ferreira Prunes. op. cit. p. 32.

Referências

1. BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2008.

2. BRASIL, SUMULAS DO TST. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2009.

3. CARVALHO, José Antero. Cargos de direção no direito do trabalho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Jornal do Comercio, 1949.

4. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2006.

5. PRUNES, José Luiz Ferreira. Cargos de Confiança, direção e comissão no Direito do Trabalho. 1. Ed. Biblioteca LTr Digital, 2006.

6. RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. 4. Ed. Curitiba: Juruá, 1991.

NOTAS:

[1] RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. 4. Ed. Curitiba: Juruá, 1991. p. 280.

[2] CARVALHO, José Antero. Cargos de direção no direito do trabalho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Jornal do Comercio, 1949. p. 48.

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[3] CUEVA, Mario de la. Apud José Antero de Carvalho, Ibidem. p. 67.

[4] PRUNES, José Luiz Ferreira. Cargos de Confiança, direção e comissão no Direito do Trabalho. 1. Ed. Biblioteca LTr Digital, 2006.

[5] CARVALHO. op. cit. p. 70

[6] Passim.

[7] BRASIL. TRT da 2ª região. Recurso Ordinário n. 19999058423, (20010198240). Relatora: Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva. Oitava Turma. São Paulo. Publicado em 22.05.2001. In PRUNES. op. cit. p.41.

[8] BRASIL. TRT da 2ª região. Recurso Ordinário n. 02990255448, Ac. 20000223128, Relator: Luiz Carlos Gomes Godoi.. 7ª Turma. São Paulo. Publicado em 16.06.2000. In PRUNES. op. cit. p.41.

[9] BARROS, Alice Monteiro. Contratos e regulamentações especiais de trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2008.

[10] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2006.

[11] CARVALHO, José Antero. Cargos de direção no direito do trabalho. 2. Ed. Rio de Janeiro: Jornal do Comercio, 1949.

[12] PRUNES. op. cit. p. 32.

[13] BRASIL. TRT da 1ª região. Recurso Ordinário n. 0473 de 1995. Relatora: Doris Luise de Castro Neves. 6ª Turma. Rio de Janeiro. Publicado em 16.01.1998. In PRUNES. op. cit. p.32.

[14] BRASIL. TRT da 2 região. Recurso Ordinário n. 19990477640, (20000544145). Relator: José Carlos da Silva Arouca. 8ª Turma. São Paulo. Publicado em 28.11.2000. In PRUNES. op. cit. p.32.

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[15] BRASIL, SÚMULAS DO TST. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2009.

[16] Levi Fernandes Pinto apud José Luiz Ferreira Prunes. op. cit. p. 32.

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NEOCONSTITUCIONALISMO: ASPECTOS GERAIS

RAISSA PACÍFICO PALITOT REMÍGIO: Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa (2012.1), Assessora Jurídica de Promotor de Justiça no Ministério Público da Paraíba desde novembro de 2012, Pós-Graduanda em Direito Civil pela Anhanguera-Uniderp (Convênio Rede LFG), aprovada Defensora Pública no 1.° Concurso Público da Defensoria Pública do Estado da Paraíba - DPE/PB (FCC/2014-2015).

Resumo: O presente trabalho resulta de profundas reflexões acerca do atual cenário jurídico após a absorção, pela comunidade jurídica, da teoria neoconstitucionalista, a qual é tratada aqui com base em seus marcos histórico, teórico e filosófico. O neoconstitucionalismo é uma corrente filosófica, ideológica e metodológica com origem nos países da Europa Ocidental, após o segundo pós-guerra, momento em que os doutrinadores começaram a refletir o atual papel das constituições e do próprio direito, buscando encontrar soluções corretivas para o direito e alternativas capazes de reagir às atrocidades cometidas pelos Estados totalitários. O cenário jurídico foi reformulado depois das inovações apresentadas por essa nova corrente constitucionalista, a qual se utilizou de teorias de alguns doutrinadores para justificar, por exemplo, a atribuição de força normativa à constituição (inspiração em Konran Hesse e J. J. Gomes Canotilho), reaproximação entre direito e moral (retorno das teorias jusnaturalistas e superação do positivismo tradicional), reconhecimento de normatividade dos princípios jurídicos e consequentemente criação de novos métodos na hermenêutica constitucional (técnica da ponderação de Robert Alexy), entre outros. Contudo, a absorção dos aspectos neoconstitucionalistas pela prática jurídica brasileira, principalmente pela jurisdição constitucional, representada pelo Supremo Tribunal Federal, está causando riscos à democracia e à aplicação do direito, ante o ativismo judicial, gerando decisionismo e subjetivismo, além de insegurança jurídica.

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Palavras-chave: Neoconstitucionalismo. Princípios Jurídicos. Pós-positivismo. Ponderação. Insegurança Jurídica. Ativismo Judicial.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico é resultado de profundas reflexões, após análise acurada da maneira pela qual o neoconstitucionalismo está sendo tratado pela prática jurídica brasileira, mormente sua influência no Direito Civil brasileiro o qual recebeu influxos constitucionais e deixou de ser o centro do ordenamento jurídico, culminando na descodificação do ordenamnto jurídico.

O neoconstitucionalismo, corrente do direito constitucional contemporâneo, será abordado, neste trabalho, de acordo com seus marcos histórico, teórico e filosófico.

O marco histórico é representado pela constitucionalização e redemocratização do segundo pós-guerra ocorrida primeiramente nos países da Europa continental, quando a comunidade jurídica sentiu a necessidade repensar e reformular o direito, de maneira que possibilitasse uma reação ao positivismo clássico, o qual foi considerado o responsável pelas atrocidades cometidas durante os regimes totalitários e não compatível com a estrutura das novas constituições e do próprio Estado democrático de direito.

O marco teórico abrange as transformações no plano da efetivação das constituições, que passaram a ganhar força normativa, gerando, assim, a expansão da jurisdição constitucional a qual criou novos mecanismos para possibilitar maior aplicabilidade das normas constitucionais, as quais, por sua vez, deram azo aos novos métodos de interpretação constitucional, como a técnica da ponderação, considerando que os métodos tradicionais da hermenêutica já não são totalmente compatíveis com a estrutura de algumas normas positivadas constitucionalmente.

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O pós-positivismo é o marco filosófico do neoconstitucionalismo, caracterizando-se pelo resgate de aspectos jusnaturalistas, superando o positivismo tradicional, o qual, como já asseverado algures, quedou-se incompatível com a realidade jurídica contemporânea, sendo também meio ineficaz para se lograr a justiça e as finalidades corretivas propostas pelo Estado democrático de direito.

A proposta do pós-positivismo está centrada na perspectiva de reaproximação entre o direito e a moral, através de normas com cunho ético e finalidades corretivas. Essas normas são os princípios jurídicos que ganharam status de normas jurídicas, proporcionando, assim, uma revisitação das fontes do direito, pois são considerados como núcleos axiológicos do ordenamento jurídico.

2 NEOCONSTITUCIONALISMO

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A doutrina constitucionalista estrangeira e a nacional, esta de maneira menos original, vêm criando novas teorias que resultaram de um conjunto de causas e efeitos no plano jurídico, político e histórico. Essas temáticas inovadoras são denominadas por prefixos que designam “posterioridade”, “novidade”, e a mais debatida é o “neoconstitucionalismo”, objeto de estudos desde a segunda metade do século passado até os dias hodiernos.

Este capítulo analisará essa recente corrente teórica, metodológica e ideológica, abrangendo sua origem, evolução e aspectos gerais.

No Brasil, podemos citar Luís Roberto Barroso, Eduardo Ribeiro Moreira, Daniel Sarmento, Cláudio Pereira Souza Neto, Paulo Ricardo Schier, Écio Oto Ramos Duarte. Esses pensadores nacionais aderiram direta ou indiretamente a tal fenômeno. Outros poucos, porém, adotaram postura crítica sobre a nova perspectiva constitucional, como Dimitri Dimoulis, Humberto Ávila e, mais recentemente, Lênio Luiz Streck.

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Em decorrência dessa multiplicidade e da diversidade das visões desse fenômeno jurídico na contemporaneidade, inexiste um único neoconstitucionalismo. A definição e unicidade dessa nova corrente é tão incerta que o mais referido adepto na doutrina brasileira, Luís Roberto Barroso, comentando sobre esse tema, assevera que “[...] mas não se sabe ainda o que é. Tudo é ainda incerto. Pode ser avanço. Pode ser uma volta ao passado. Pode ser apenas um movimento circular, uma dessas guinadas de 360 graus”. (BARROSO, 2007).

Na doutrina estrangeira e na brasileira, mais efetivamente, apesar da diversidade de posições e entendimentos sobre o tema, percebe-se que há um consenso entre os pensadores, quanto às características centrais desse novo paradigma. Assim, é possível abordar o neoconstitucionalismo, sob esse prisma de seus aspectos nevrálgicos, sem cair em contradição, como será visto adiante.

2.2.1 Marco Histórico

O neoconstitucionalismo foi um fenômeno iniciado na Europa ocidental e absorvido pelos brasileiros posteriormente. Nesse sentido, este trabalho seguirá uma ordem cronológica, abordando-o na Europa primeiramente e depois, no Brasil, para melhor desenvolvimento do conteúdo do presente tópico.

Os Estados totalitários europeus, os quais impuseram o nazismo e o fascismo como regime político, cometeram vultosas atrocidades contra os direitos humanos, de uma maneira que nunca se viu na história da humanidade. A maior lembrança que jamais será esquecida é a da atuação de Hitler que massacrou e dizimou vários grupos minoritários.

Contudo, a maioria dessas desumanidades não eram ilegais nem inconstitucionais, porque quase todas eram legitimadas por normas jurídicas. Ressalve-se que, naquela época, a validade da lei dependia tão apenas da emanação delas pelo Legislativo, e o conteúdo normativo não influenciava na condição de validade. Para ilustrar a legitimidade das ações de Hitler contra o povo alemão e os estrangeiros:

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[...] através de Decreto expedido em 7/4/1933 os Judeus foram afastados do funcionalismo público, do exército e das universidades; através da Lei publicada em 14/7/1933 foram retirados os direitos de cidadão dos Judeus imigrantes no Leste Europeu; a chamada ‘Lei da Cidadania’ dos judeus e alemães a cidadania alemã; a ‘Lei da Proteção da Honra e Sangue Alemão’ proibia os casamentos dos Judeus com os não Judeus, proibia o emprego de Judeus na Alemanha e proibia os Judeus de exibirem a bandeira alemã, entre outras medidas. Por fim, através do Decreto assinado pelo então presidente Paul Von Heindenburg, foram suspensas sete seções da Constituição de 1919 da República de Weimar que garantiam liberdades individuais e civis ao povo. (PADILHA, 2011, p. 1).

Houve uma queda do modelo Estado de direito, pois a necessidade de limitação dos poderes estatais era patente. Nesse diapasão, as constituições do novo modelo de Estado, o constitucional de direito, tornavam-se técnicas de limitação desses poderes e sobremaneira de garantia de direitos fundamentais, imprescindíveis para instrumentalizar a justiça e a paz social. As novas constituições europeias eram semelhantes à norte-americana, a qual, desde os primeiros tempos de constitucionalização, já positivava direitos individuais, previa a organização dos poderes e do Estado, além de limitar a atuação desses.

Verificou-se também, com a derrota dos regimes totalitários europeus, a necessidade de criação de “catálogos de direitos e garantias fundamentais para a defesa do cidadão frente aos abusos que poderiam vir a ser cometidos pelo Estado ou por quaisquer detentores do poder” (CAMBI, 2011, p. 33) em suas manifestações

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políticas, econômicas, intelectuais, entre outras. Assim, a reconstitucionalização possibilitou a positivação constitucional dos direitos humanos, tornando-se direitos fundamentais, a partir dessa inserção nas constituições.

Outrossim, repensou-se também sobre autoconsciência da condição humana, depois do genocídio marcado pelo extermínio de aproximadamente seis milhões de judeus e cinco milhões de comunistas ciganos e outros “indesejados” nos campos de concentração. Apenas em Auschwitz-Birkenau, foram executados cerca de 1.750.000 judeus (POWER, p. 70-71).

Com efeito, a conscientização que essa época do nazifascimo trouxe para a comunidade jurídica foi que:

[...] não se deverá olvidar que a dignidade constitui atributo reconhecido a qualquer ser humano, visto que, em princípio, todos são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas e integrantes da comunidade humana, ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes ou consigo mesmos. (SARLET, In: LEITE; SARLET; CARBONELL, 2011, p. 567).

A dignidade da pessoa humana se tornou o núcleo axiológico da tutela constitucional e ainda de todo o ordenamento jurídico, a partir dessa reflexão e autoconsciência da condição humana.

Ademais, pode-se asseverar que “a Constituição foi capaz de promover, de maneira bem sucedida, a travessia do Estado brasileiro de um regime autoritário, intolerante e, por vezes, violento para um Estado democrático de direito”. (BARROSO, 2007).

Com isso, o marco histórico do neoconstitucionalismo é formado pelas mudanças ocorridas após o segundo pós-guerra, as quais proporcionaram a criação do Estado democrático constitucional, marcado pela redemocratização da Europa

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Ocidental e do Brasil, superando, desse modo, períodos de forte exceção e limitação de direitos.

2.2.2 Marco Teórico

Outro marco do neoconstitucionalismo é o teórico, abrangendo três grandes transformações na aplicação do direito constitucional, quais sejam: o reconhecimento de força normativa à Constituição, a expansão da jurisdição constitucional, o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional. Cada um desses elementos citados será explanado adiante.

2.2.2.1 A força normativa da constituição

A supremacia da constituição, que passou a ser considerada norma superior no ordenamento jurídico, além da atribuição de força normativa às normas constitucionais são um dos elementos basilares encontrados nas doutrinas dos adeptos do neoconstitucionalismo. Apresentaremos aqui o caminho percorrido para se chegar à consagração doutrinária e jurisprudencial da equiparação de normas constitucionais a normas jurídicas.

A força normativa da constituição ou a normatividade constitucional é definida, pela doutrina constitucionalista dominante, como um atributo que essas cartas magnas possuem, tornando-as leis vinculantes, dotadas de efetividade e aplicabilidade. Assim, “afasta-se a tese generalizadamente aceita nos fins do século XIX e nas primeiras décadas do século XX que atribuía à constituição um ‘valor declaratório’, ‘uma natureza de simples direcção política’”. (CANOTILHO, 2003, p. 1150).

Com a reconstitucionalização que seguiu o segundo pós-guerra, a atribuição de força normativa às normas constitucionais - que passaram a ser dotadas de imperatividade - iniciou-se na Alemanha (1949), posteriormente, na Itália (1947), na Espanha e em Portugal (1976). (BARROSO, 2007).

A ideia de status de norma jurídica das normas constitucionais chegou ao Brasil, nos idos dos anos oitenta, timidamente. Porém, apenas a partir da Constituição vigente,

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começou o processo de rompimento do entendimento retrógrado do século passado e a absorção doutrinária e jurisprudencial da teoria da força normativa constitucional. O doutrinador portenho supracitado teve contribuição importante em incutir essa ideia na comunidade jurídica brasileira, após apresentar sua teoria de constituição dirigente, no Brasil.

No Brasil, antes da Constituição de 1988, as normas constitucionais não passavam de programas que norteavam os poderes e as atividades do Estado, mas, como já apontado algures, sua não efetivação ou seu descumprimento não acarretavam em sanção alguma, pois elas não possuíam imperatividade. A realização programática inserida no texto constitucional dependia da boa vontade do legislador e dos políticos, além de uma regulamentação infraconstitucional. As leis valiam mais que a Constituição e, para o direito público, o decreto e a portaria ainda valiam ainda mais.

Podemos citar os resultados logrados pela sociedade durante os primeiros vinte anos da Constituição de 1988, para exemplificar, de fato, a força normativa que uma constituição possui:

[...] a Carta de 1988 tem propiciado o mais longo período de estabilidade institucional da história republicana do país. E não foram tempos banais. Ao longo de sua vigência, destituiu-se por impeachment um Presidente da República, houve um grave escândalo envolvendo a Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, foram afastados Senadores importantes no esquema de poder da República, foi eleito um Presidente de oposição e do Partido dos Trabalhadores, surgiram denúncias estridentes envolvendo esquemas de financiamento eleitoral e de vantagens para parlamentares, em meio a outros episódios. Em nenhum desses eventos houve a cogitação

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de qualquer solução que não fosse o respeito à legalidade constitucional. (grifo nosso) (BARROSO, 2007, p. 3).

Retira-se da tese de Konrad Hesse (2009) que a intensidade da força normativa da constituição está condicionada principalmente à questão da vontade normativa, de vontade de constituição, a qual, por sua vez, é determinada pela convicção sobre a inviolabilidade da constituição entre os membros de uma sociedade e substancialmente entre os principais responsáveis pela vida constitucional.

2.2.2.2 A expansão da jurisdição constitucional O marco teórico abrangeu ainda outra grande transformação

na aplicação do direito constitucional, qual seja, a expansão da jurisdição constitucional, ocorrida a partir do final dos anos quarenta, na Europa ocidental, deflagrando na queda da soberania do Parlamento e na predominância da atuação do Judiciário. Essa mudança de relevância institucional é denominada “crepúsculo da legislação” por George Marmelstein (In: LEITE; SARLET; CARBONELL, 2011, p. 448), que a entende como “um processo de enfraquecimento do legislativo enquanto instância de tomada de decisões”.

Os direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana, como já elucidado no tópico anterior, estão positivados e passaram a ter aplicabilidade imediata. Nesse diapasão, o Judiciário ganhou a responsabilidade de assegurá-los aos cidadãos, em face das ingerências negativas do Estado e dos próprios particulares. Logo, os reflexos dessa constitucionalização dos direitos fundamentais podem ser mostrados por:

A consagração de direitos fundamentais sociais, econômicos e culturais, nas Constituições contemporâneas, gerou, nas últimas décadas, uma explosão de litigiosidade, trazendo ao Judiciário ações individuais e coletivas voltadas a (sic) efetivação desses

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direitos constitucionais. O desempenho judiciário passou a ter maior relevância social e suas decisões se tornaram objeto de controvérsias públicas e políticas. O Poder Judiciário está constitucionalmente vinculado à efetivação dos direitos fundamentais [...]. (CAMBI, 2011, p. 194-195).

Em virtude dessa atribuição de realizar os sonhos constitucionais ao Judiciário, Luis Prieto Sanchís (2003, p. 101) assevera que o neoconstitucionalismo é “mais juiz que legislador”, e Humberto Ávila (2009, p. 160) perfilha que um dos quatro fundamentos do neoconstitucionalismo é o organizacional, consistindo na transferência da preponderância “do Poder Legislativo ao Poder Judiciário”. Os auspícios de mudanças sociais, de promoção da paz e da justiça são depositados na atividade de dizer o direito (juris dictio).

A Constituição de 1988, então, ampliou essa jurisdição constitucional de maneira considerável. O primeiro fator foi o alargamento do rol dos legitimados ativos ao direito de propositura das ações diretas, no art. 103 da Constituição Federal. O único legitimado a pleitear esse modelo de controle de constitucionalidade era o Procurador-Geral da República, antes da Constituição vigente.

Essa expansão, no Brasil, além da ampliação do rol de legitimados para propositura de ações diretas e de criação de novos mecanismos de controle de constitucionalidade, também significou uma maior atuação do Judiciário, pois, como já referido acima, a atribuição de concretização da Constituição de 1988 foi conferida a esse Poder, e a sociedade passou, então, a ter maior conscientização de seus direitos fundamentais, pleiteando-os judicialmente.

O cenário exposto até aqui representa sumariamente as mudanças, inovações e principalmente a expansão da jurisdição constitucional europeia e brasileira, em razão dos fatores trazidos pelo neoconstitucionalismo à jurisdição constitucional.

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2.2.2.3 A nova interpretação constitucional A nova interpretação constitucional é considerada o terceiro

elemento que compõe o marco teórico do neoconstitucionalismo, na sistemática adota por Luís Roberto Barroso que a conceitua como um conjunto de “novos conceitos e categorias, agrupados sob a denominação de nova interpretação constitucional, que se utiliza de um arsenal teórico diversificado, em um verdadeiro sincretismo metodológico”. (BARROSO, 2007, p. 8).

As principais causas dessa nova hermenêutica constitucional encontram-se na estrutura das novas constituições dos Estados constitucionais de direito - as quais possuem caráter principiológico e força normativa - e na expansão da jurisdição constitucional, a qual, além de ser marcada pelo surgimento de novos meios de controle de constitucionalidade e novas mudanças no plano processual, também é representada pela maior atuação do Judiciário na concretização da constituição.

A técnica da ponderação surge em decorrência justamente do conflito normativo entre princípios constitucionais e da inviabilidade de balanceamento ou de harmonização entre eles, gerando também uma rota de colisão entre direitos fundamentais, quando temos dois ou mais princípios constitucionais antagônicos possíveis para fundamentar decisões opostas em um mesmo caso concreto. Segundo George Mermelstein (In: LEITE; SARLET; CARBONELL, 2011, p. 445), nessas situações, “há duas normas de igual hierarquia jurídica capazes de fornecer soluções contraditórias para o mesmo problema”.

Assim, o intérprete não terá outra alternativa, a menos que utilizar a técnica da ponderação. Porém, deverá decidir de forma clara e apresentar justificativas de maneira objetiva, evitando o subjetivismo. Não existem critérios pré-estabelecidos pela metodologia jurídica, mas eles podem ser: a análise das nuances do caso concreto, a boa argumentação e a percepção ética do juiz. (MARMELSTEIN, In: LEITE; SARLET; CARBONELL, 2011).

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A propósito, o Supremo Tribunal Federal utiliza a técnica da ponderação para decidir os casos difíceis em que direitos fundamentais, sem nenhuma relação de precedência ou grau de hierarquia no ordenamento jurídico, estejam em rota de colisão, como no causídico abaixo e nos demais que serão analisados no último capítulo, criteriosamente.

Na ponderação desses conflitos, entendemos que a colisão entre princípios não pode ser resolvida por critérios pré-estabelecidos, abstratamente, dependendo das circunstâncias dos casos concretos, a construir uma hierarquia móvel entre os que são colidentes.

2.2.3 Marco Filosófico: pós-positivismo

O marco filosófico do neoconstitucionalismo é o pós-positivismo. Segundo Roberto Barroso (2009, p. 246), “o debate acerca de sua caracterização situa-se na confluência das duas grandes correntes de pensamento que oferecem paradigmas opostos para o Direito: o jusnaturalismo e o positivismo”. Ademais, a condição em que os princípios jurídicos se encontram nos atuais ordenamentos jurídicos é uma das principais dialéticas do pós-positivismo.

O positivismo jurídico não seria compatível com o novo modelo do direito constitucional contemporâneo nem seria suficiente para explicar o neoconstitucionalismo. Os novos métodos de interpretação, por exemplo, não existiriam, caso não houvesse a superação dessa corrente jusfilosófica:

[...] o positivismo jurídico seria incapaz de explicar os métodos de interpretação que demanda o direito constitucional contemporâneo. O positivismo jurídico seria caracterizado por reconhecer a subsunção como único método de interpretação e, por isso, deixaria de fora de suas considerações a aplicabilidade dos princípios, que somente

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seriam aplicáveis a partir do método de ponderação. (MÖLLER, 2011, p. 44-45).

O neopositivismo – termo equivalente ao pós-positivismo – procura superar as seguintes características do positivismo jurídico:

a) a identificação plena do direito com a lei; b) a completude do ordenamento jurídico (não admissão de lacunas); c) o não reconhecimento dos princípios como normas; d) a dificuldade para explicar os conceitos indeterminados; e) a identificação entre vigência e validade da lei; f) o formalismo jurídico; g) o não tratamento da questão da legitimidade do direito. (CAMBI, 2011, p. 80).

Nesse cenário, a ética e a moral foram reaproximadas do direito, que começou a ser concebido em conexão com a Filosofia moral e a Filosofia política. Legitimidade e legalidade não eram mais termos equivalentes, pois a lei poderia ser válida, mas deveria conter senso de justiça, para ser considerada legítima. Reconheceu-se que o ordenamento jurídico poderia ter lacunas e essas seriam colmatadas por métodos interpretativos novos, e os princípios seriam vigas mestras nesse processo de colmatação.

Os princípios são considerados pelo neoconstitucionalismo os responsáveis pelo constitucionalismo do segundo pós-guerra e pela renovação do cenário jurídico, especialmente, no que tange à reaproximação aqui tratada, em virtude da forte carga axiológica que carregam.

É nesse sentido que surge a necessidade de um método de aplicação compatível com essa estrutura principiológica, a qual não determina uma solução pronta, devendo ser confrontada com princípios contrários, através da técnica da ponderação, largamente discutida, quando tratamos da nova interpretação constitucional.

Podemos afirmar, a partir do que pesquisado na doutrina neoconstitucionalista e exposto neste trabalho, que o neoconstitucionalismo, de fato, poderia não seria tão discutido nas

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dialéticas constitucionais, caso o estudo da principiologia estivesse fora desses debates.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Proucurou-se estudar o neoconstitucinoalismo, a partir de seus marcos tórico, histórico e filosófico para poder analisar como esse viés teórico do direito constitucional transfirmou a ideia de constituição, que passou a ser dotada de força normativa e a estar em uma posição de supremacia, em relação às demais normas do ordenamento jurídico, ocasionando diversas transformações na seara jurídica, a saber, novos métodos de hermenêutica constitucional, expansão da jurisdição constitucional, reaproximação entre o direito e a moral, entre outros.

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