Boletim Enfam n° 03

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Número 3 - setembro/outubro de 2009 Entrevista: Conselheiro Walter Nunes Enfam estreia no universo do ensino a distância pág. 9 Enfam participa de Assembleia da RIAEJ no México pág. 14 C onselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicado ao cargo pelo Superior Tribunal de Jus- tiça (STJ), Walter Nunes é juiz ti- tular da Segunda Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte. Possui os títulos de mestre em Direito Constitucional pela Uni- versidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em convênio com a Universidade Federal de Pernam- buco (UFPE), e de doutor em Direi- to Processual Penal por essa última universidade. Iniciou sua carreira na área da Justiça como promotor, foi juiz de Direito e procurador da República. Subsequentemente, ingressou na Justiça Federal, tendo atuado como membro do Conselho da Justiça Federal (CJF) e, ainda, como juiz auxiliar da Presidência e da Corte Especial do STJ. Também se dedica à atividade acadêmica, como pro- fessor adjunto de Direito Processu- al Penal da UFRN. Em entrevista ao Boletim da Enfam, o conselheiro Walter Nunes focaliza a missão do CNJ, o impac- to das recomendações do Conselho sobre os magistrados brasileiros, a qualidade da magistratura, a sele- ção de juízes e a respectiva forma- ção e aperfeiçoamento, ocasião em que traz importantes contribuições para o leitor melhor compreender tais assuntos, que, em decorrência do atual contexto de mudanças, são de especial interesse daqueles que militam na área da Justiça. págs. 3 e 4 Juiz vocacionado ou técnico? por Roberto Amaral Rodrigues Alves pág. 12 A Lei Maria da Penha e os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher por Adriana Ramos de Mello pág. 11 Luiz Silveira

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Boletim Enfam Número 3 - setembro/outubro de 2009

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Número 3 - setembro/outubro de 2009

Entrevista:Conselheiro Walter Nunes

Enfam estreia no universo do ensino a distância pág. 9

Enfam participa de Assembleia da RIAEJ no México pág. 14

Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), indicado ao cargo pelo Superior Tribunal de Jus-

tiça (STJ), Walter Nunes é juiz ti-tular da Segunda Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte. Possui os títulos de mestre em Direito Constitucional pela Uni-versidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em convênio com a Universidade Federal de Pernam-buco (UFPE), e de doutor em Direi-to Processual Penal por essa última universidade.

Iniciou sua carreira na área da Justiça como promotor, foi juiz de Direito e procurador da República. Subsequentemente, ingressou na Justiça Federal, tendo atuado como membro do Conselho da Justiça

Federal (CJF) e, ainda, como juiz auxiliar da Presidência e da Corte Especial do STJ. Também se dedica à atividade acadêmica, como pro-fessor adjunto de Direito Processu-al Penal da UFRN.

Em entrevista ao Boletim da Enfam, o conselheiro Walter Nunes focaliza a missão do CNJ, o impac-to das recomendações do Conselho sobre os magistrados brasileiros, a qualidade da magistratura, a sele-ção de juízes e a respectiva forma-ção e aperfeiçoamento, ocasião em que traz importantes contribuições para o leitor melhor compreender tais assuntos, que, em decorrência do atual contexto de mudanças, são de especial interesse daqueles que militam na área da Justiça.

págs. 3 e 4

Juiz vocacionado ou técnico?por Roberto Amaral Rodrigues Alves pág. 12

A Lei Maria da Penha e os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulherpor Adriana Ramos de Mello pág. 11

Luiz

Silv

eira

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Editorial

EXPEDIENTEEscola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados

Diretor-GeralMinistro Fernando Gonçalves

Vice-DiretorMinistro Felix Fischer

SecretárioMarcos Rosas Degaut Pontes

Coordenador de Planejamento EstratégicoRodolfo Freitas Rodrigues Alves

Coordenadora de Relações InstitucionaisMaria Raimunda Mendes da Veiga

Coordenadora Acadêmica Cinthia Barcelos Leitão Fischer Dias

Coordenadora de PesquisaRita Helena dos Anjos

Coordenador de Administração e FinançasPaulo Mendes de Oliveira Castro

RedaçãoDaniela Caixeta Nogueira

Revisão Janete Chaves

Projeto Gráfi coTaís Villela

FotosLuiz Antonio, Moreno e Sandra Fado

ImpressãoSEREN/STJ

Tiragem: 250 exemplares

SAFS Quadra 6 - Lote 1 - Trecho IIIEd. da Administração - 1.º andar - sala F 102

Tels.: (61) 3319-9019/9814

www.enfam.stj.jus.br

e-mail: [email protected]

Angelina e Maria da Penhapor Manoel Alberto Rebelo dos Santos

“Irene preta, Irene boa,Irene sempre de bom humor.Imagino Irene entrando no céu:– Licença, meu branco.E São Pedro, bonachão:– Entra, Irene, você não precisa pedir licença.”

O que cantou Manuel Bandei-ra de Irene pode-se dizer de An-gelina, que, se pecado tem, é o de fornecer-nos pretexto para o cometimento do pecado da gula. Angelina boa, suave, pura, sim-ples, ingênua, sempre alegre e bem-humorada, de uma como-vente ternura e boa vontade e, em suas poucas luzes, sagaz e inteligente.

Estava eu sentado à mesa da cozinha com minha mulher. Em dado momento, alertando-a so-bre um fi ctício mosquito que teria pousado em seu cabelo, pergun-tei-lhe se poderia matá-lo. Dian-te de sua resposta afi rmativa, distanciei a mão, fi ngindo que iria aplicar-lhe um tapa na cabe-ça com toda a força. Angelina,

percebendo a brincadeira, sorriu, e, ante meu comentário de que parecia despreocupada com o que estaria prestes a acontecer, advertiu-me:

– O senhor conhece a Lei Maria da Penha, não conhece?

À minha resposta evidente-mente afi rmativa, acrescentou com candura:

– Pois é, não precisa bater, basta ameaçar...

Angelina é do povo, Angelina conhece a Lei Maria da Penha, o povo conhece a Lei Maria da Penha. Se há, pois, entre nós, como se costuma criticar, “leis que pegam” e “leis que não pe-gam”, dessa se pode seguramen-te dizer que “pegou”. Que o diga Angelina.

Manoel Alberto Rebelo dos Santos é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e diretor-geral da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ).

Desde sua efetiva implemen-tação, há três anos, na gestão do ministro Nilson Naves, até o presente momento, sob a direção do ministro Fernando Gonçalves, vem a Enfam imprimindo ingen-tes esforços no sentido de formu-lar alternativas para melhorar a prestação jurisdicional, tendo por certo que só atingirá tal objetivo investindo, maciçamente, no pre-paro e aperfeiçoamento contínuo dos magistrados.

Alcançar esse desiderato não tem sido tarefa fácil à Escola Na-cional, consideradas as contingên-cias de toda ordem que se apre-sentam e necessitam ser vencidas com determinação e fi rmeza de propósitos. Contudo, é possível que façamos mais. Podemos su-perar, inclusive, a distância geo-gráfi ca, instruindo e capacitando magistrados que se encontram a centenas e milhares de quilôme-tros dos centros formadores. Ou seja, levar o professor ao aluno.

A Escola Nacional foi inserida, agora, no ambiente do ensino a distância, solução a nós propor-cionada pelo Tribunal Regional Fe-deral da 4ª Região, por meio da utilização do know-how e da pla-taforma tecnológica de sua Escola da Magistratura (EMAGIS).

As fronteiras foram rompidas, e o ensino atingirá todos os rin-cões deste país. Ensinar e apren-der demandará um simples clicar no mouse do computador. O saber irromperá nas telas e se alastrará onde houver um ponto de recep-ção. Não haverá, pois, comarca, foro ou circunscrição à qual não nos ligaremos. A Enfam pode en-vaidecer-se de ser esse elo. E me-lhor, de ser uma escola nacional, na acepção plena da palavra.

Não há dúvida de que a dis-seminação, sem barreiras, dos necessários cursos de aperfeiçoa-mento só se concretiza em decor-rência dessa aliança, pautada pela comunhão de interesses em pro-ver todos os magistrados desse país de instrumental educacional de qualidade uniforme.

Marcos DegautSecretário da Enfam

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Entrevista

Conselheiro Walter Nunes

Como ex-presidente da Asso-ciação dos Juízes Federais – AJU-FE, de que modo o senhor anali-sa certa resistência por parte de segmentos da magistratura às orientações e recomendações do Conselho Nacional de Justi-ça – por exemplo, a que criou a conhecida como Meta 2?

O CNJ foi recebido com certa des-confi ança por parcela considerável da magistratura, especialmente em razão do receio de que sua atuação viesse, de alguma forma, a compro-meter a independência funcional do juiz. Embora essa primeira impres-são tenha sido desmistifi cada com a atuação estratégica do Conselho, na qualidade de órgão central do sistema judicial cuja missão é for-mular e estimular o desenvolvimen-to de política judicial uniforme para toda a magistratura, determinadas medidas adotadas causam inquie-tação. De certa forma, a resistên-cia ao cumprimento de algumas orientações e recomendações do CNJ é um elemento natural de todo e qualquer processo de mudança. No Brasil, pela primeira vez em sua história, foram estabelecidas metas a serem cumpridas a curto, médio e longo prazo pela magistratura. A Meta 2 é apenas uma das dez metas

estabelecidas com o Pacto do Judi-ciário, formalizadas na Carta do Ju-diciário. É importante salientar que ela foi defi nida em reunião que con-tou com a participação de todos os presidentes dos tribunais do país. Não foi imposta pelo CNJ.

Para o senhor procedem as críticas de que o CNJ expõe e fragiliza os juízes perante a opi-nião pública?

Pelo contrário. O CNJ, em verda-de, está conferindo visibilidade ao Judiciário. Inegavelmente, hoje o Judiciário é mais conhecido. As pes-soas sabem, por exemplo, quantos processos há no País; o número de interceptações telefônicas existen-tes; quanto ganha um juiz; que os casos de nepotismo são apurados e eliminados; que magistrados, inde-pendentemente da classe, quando encontrados em culpa, são punidos; que a carga de trabalho do juiz é de-sumana; e que o Estado deve dimi-nuir sua litigância contra as pessoas.

Qual é, ou deveria ser, em sua perspectiva, a efetiva mis-são institucional do CNJ? O Con-selho deve descer a minúcias e se preocupar, exemplifi cativa-mente, com a regulação, aqui-sição, locação e uso de veículos ofi ciais no âmbito do Poder Ju-diciário?

A arquitetura complexa do Ju-diciário brasileiro, própria de um Estado organizado sob a forma de federação, reclama a existência do CNJ, na qualidade de órgão central do sistema judicial, no sentido de coordenar o planejamento e a ges-tão do Judiciário, tendo em conta a unicidade do Poder Judiciário e a consequente necessidade da defi ni-ção de diretrizes nacionais. Identi-fi cados abusos no uso de veículos ofi ciais e a falta de uniformidade no tratamento a respeito, impõe-se a atuação regulamentar do CNJ.

Como avalia, em termos qualitativos, a magistratura de nosso país? O senhor acha que nossos juízes estão realmente

preparados para proporcionar uma efetiva prestação jurisdi-cional?

A pesquisa revela que os juí-zes brasileiros possuem excelente formação acadêmica. A despeito do processo de juvenilização da magistratura, a maioria dos juí-zes possui pós-graduação, muitos com mestrado e doutorado. Após a Emenda Constitucional n.º 45, de 2005, as escolas da magistratura passaram a oferecer diversos cur-sos de especialização. De qualquer sorte, ainda há muito a fazer para o melhor aperfeiçoamento do ma-gistrado tendo em vista a prestação de uma atividade jurisdicional mais qualifi cada, papel a ser desempe-nhado pelas escolas da magistra-tura. Para todos os efeitos, não é missão das universidades formar juízes; portanto, a aprovação em concurso não quer dizer que o ma-gistrado esteja preparado para a função. Com a aprovação é que se inicia, propriamente, a formação do juiz pelas escolas da magistratura.

O senhor acredita que o mo-

delo atual de seleção de juízes é adequado para selecionar os ma-gistrados mais vocacionados? É necessário existir cursos especí-fi cos para ingresso na magistra-tura, como etapa obrigatória do concurso público?

Infelizmente, nota-se que nos concursos para a magistratura o conteúdo das provas se preocupa mais com o conhecimento do direito positivo, em detrimento da avalia-ção do pensamento jurídico do can-didato. É preciso que esse processo seletivo seja efi ciente na captação do candidato que reúna as qualida-des indispensáveis para ser um bom juiz e não se limite a perquirir co-nhecimentos técnico-jurídicos. Esse modelo não se presta para o recru-tamento do juiz que a sociedade do nosso tempo reclama.

O descompasso na forma de re-crutamento tem permitido o ingresso na magistratura de pessoas inexpe-rientes, imaturas, sem conhecimen-

Luiz

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eira

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A arquitetura

complexa do Judiciário

brasileiro, própria de

um Estado organizado

sob a forma de

federação, reclama

a existência do CNJ,

na qualidade de

órgão central do

sistema judicial.

to das pequenas coisas do cotidiano forense e, o que é mais grave, com-pletamente alheias ao aspecto polí-tico que a função judicante possui. Por isso mesmo, é indispensável re-direcionar a sistemática de avalia-ção das pessoas habilitadas para o ingresso na magistratura, de modo que o concurso público de provas e títulos averigue menos o conheci-mento do direito positivo do candi-dato e mais a formação humanís-tica; o senso ético-profi ssional; as capacidades de apreensão, trans-missão crítica e produção criativa do Direito; o raciocínio lógico; e a aptidão para equacionar problemas e encontrar soluções compassadas com os reclamos sociais e conheci-mentos atualizados.

Não tem sentido a exigência de cursos preparatórios para o concur-so de recrutamento para a judica-tura. A prévia habilitação em con-curso ofi cial de preparação constava da Carta de 1967. A Constituição de 1988 suprimiu a autorização para que o curso preparatório fosse ado-tado como requisito para o concurso e, dessa forma, quando ela fala em cursos de formação, há de se en-tender que faz referência aos candi-datos aprovados.

O senhor entende que os cur-sos de aperfeiçoamento são pres-supostos indispensáveis para a promoção na carreira de magis-trado e para o vitaliciamento?

Creio que, em rigor, as escolas da magistratura devem ter progra-mas específi cos para curso de pre-paração, destinado aos recém-apro-vados, com a fi nalidade de conferir formação mínima e necessária para o desempenho da função; curso de vitaliciamento, ministrado durante todo o período de estágio probató-rio, com o qual se deve dar conti-nuidade à preparação/formação e avaliar o desempenho do juiz; curso de reciclagem ou aperfeiçoamento; e curso para promoção ou remoção, como requisito e critério objetivo para a aferição do merecimento.

Seguindo essa linha de racio-cínio, qual o papel concreto a ser desempenhado pela Enfam? Qual a leitura que o senhor faz das

competências atribuídas pela Constituição à Enfam?

Cabe à Enfam, entre outras fun-ções, estabelecer regras gerais e básicas para o funcionamento das escolas da magistratura e, na qua-lidade de centro nacional de pes-quisas judiciárias, subsidiar as es-colas da magistratura com dados e informações. Seria o caso, ainda, de promover cursos de formação de professores para as escolas da magistratura e manter cadastro na-cional de magistrados formadores, a fi m de disponibilizar às escolas da magistratura nomes habilitados para a docência.

É correto sustentar a tese de que às escolas estaduais e fede-rais da magistratura e à Enfam caberia a função de recomendar aos tribunais o vitaliciamento e a promoção dos magistrados? Da mesma forma, deveriam re-presentantes dessas institui-

ções integrar as bancas exami-nadoras dos concursos públicos para recrutamento de juízes?

O programa do curso de vitali-ciamento deve ser voltado, espe-cifi camente, para que a escola, no fi nal, recomende, ou não, o vitali-ciamento do juiz ao tribunal. Para todos os efeitos, o vitaliciamento se constitui na etapa fi nal do concurso. Até por isso creio que o correto é as escolas da magistratura, na qua-lidade de órgãos estratégicos dos respectivos tribunais, participarem da elaboração do conteúdo dos pro-gramas dos concursos, defi nirem a forma de avaliação dos candidatos e serem representadas, ainda, na banca examinadora.

Conselheiro, para as escolas desempenharem a contento a missão confi ada pela Constitui-ção, não seria imprescindível que tivessem autonomia orça-mentária e fi nanceira?

As escolas da magistratura – respeitados os princípios e linhas básicas traçados pela Enfam para o recrutamento, seleção, preparação, aperfeiçoamento e reciclagem de magistrados – devem possuir au-tonomia, não apenas em relação às atividades didáticas, mas também quanto à gestão plena, o que inclui autonomia orçamentária e fi nancei-ra, mediante a previsão de rubrica orçamentária própria nos orçamen-tos dos tribunais correspondentes.

É incumbência da Enfam, em conjunto com as escolas da ma-gistratura, defi nir um perfi l de magistrado adequado às cres-centes demandas da sociedade provocadas pelas cada vez mais constantes transformações so-ciais?

É preciso que a escola da magis-

tratura, como órgão auxiliar do Po-der Judiciário, defi na, mediante es-tudos, o perfi l de magistrado próprio para um país marcado por tantas de-sigualdades sociais, constituído sob a ótica do Estado democrático-cons-titucional, que tem como premissa o respeito e o pleno reconhecimento dos direitos fundamentais.

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Artigo

Natureza, estrutura e fi nalidades das escolas da magistratura no Brasil por Antonio Rulli Junior

É fácil ser pessoa, difícil é ser

cidadão. As escolas da magistratura

proporcionam a formação da

consciência histórica da ética, da

cidadania plena e da democracia.

Muito se tem escrito sobre as escolas da magistratura com o intuito de fi xar sua na-

tureza, estrutura, fi nalidades e objetivos, destinados à formação e ao aperfeiçoamento de juízes. O movimento de criação das es-colas da magistratura começou em 1979, após a edição da Lei Orgânica da Magistratura Nacio-nal (Loman).

Com um grupo integrante da Associação Paulista de Magistra-dos (Apamagis), iniciou-se a dis-cussão sobre a viabilidade de um centro de estudos que possibili-tasse a constante atualização dos juízes no campo da legislação e da jurisprudência. Discutia-se a criação das escolas da magis-tratura pelas Associações de Ma-gistrados ou pelos Tribunais de Justiça, formando-se grupos de debates, que acabaram por con-cluir que a criação poderia dar-se pelas Associações ou pelos Tribu-nais.

Em São Paulo, defi niu-se que as escolas da magistratura deve-riam ser criadas por Resolução do Tribunal de Justiça, o que se deu em 1988, após a promulga-ção da Constituição Federal. Al-gumas escolas da magistratura foram criadas por associações de magistrados (Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Es-pírito Santo, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal) e outras pe-los Tribunais de Justiça. O Dis-trito Federal tem duas escolas da magistratura, uma vinculada à associação e outra ao Tribunal

de Justiça, o que também ocorre com Santa Catarina.

Natureza das escolas da magistratura

A natureza das escolas da ma-gistratura é institucional, porque decorre da própria Constituição Federal (Emenda Constitucional n.º 45/2004), que trata em seus dispositivos de cursos ofi ciais de preparação, aperfeiçoamen-to e promoção de magistrados, constituindo etapa obrigatória do processo de vitaliciamento a participação em curso ofi cial ou reconhecido por escola nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados (art. 93, IV), e de cursos ofi ciais para o ingresso e promoção na carreira, regula-mentados por escola nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados (art. 105, parágrafo único, I). A Constituição Federal, ao abordar a jurisdição, tem por parâmetro o art. 2.º, que garante a separação das funções em le-gislativa, judiciária e executiva. Portanto, a função jurisdicional é considerada como função do po-der político do Estado (o que se separa são as funções, o poder é único e indivisível).

É inquestionável que as es-colas da magistratura servem à formação e aperfeiçoamento dos magistrados com a característica de poder instituído. Daí sua insti-tucionalização pela Constituição Federal.

A natureza das escolas da

magistratura é, pois, institucio-nal, como o é a da Escola Na-cional de Formação e Aperfeiço-amento de Magistrados (Enfam), conforme defl ui do texto da Carta Maior, art. l05, parágra-fo único, I. Nesse dispositivo se estabelece o funcionamento da "Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistra-dos, cabendo-lhe, dentre outras funções, regulamentar os cursos ofi ciais para o ingresso e promo-ção na carreira". As escolas da magistratura devem realizar os objetivos fi xados pela Escola Na-cional.

A Constituição Federal, dessa forma, ao tratar dos cursos para ingresso e promoção na carrei-ra, prevê a criação da Escola Nacional de Formação e Aperfei-çoamento de Magistrados, com funcionamento junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Contudo, a institucionaliza-ção das escolas da magistratura não retira o lado acadêmico, que prevalece como complemento da instituição criada constitucional-mente. As escolas da magistratu-ra têm sua natureza institucional, que é a prevalente na formação e aperfeiçoamento de magistra-dos, e sua natureza acadêmica, que reside na estruturação, de-senvolvimento e organização dos cursos, como consequência ou complemento.

Estrutura dos cursos

A Constituição Federal, no art. 93, II, c, determina que a aferi-ção do merecimento se faça pelos critérios de presteza e segurança no exercício da jurisdição e pela frequência e aproveitamento em cursos reconhecidos de aperfei-çoamento, como forma de vitali-ciamento e promoção por mereci-mento, consoante regulamentado na Resolução n.º 2/2007 e na Ins-trução Normativa n.º 2/2008, da Enfam.

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A estrutura dos cursos é intei-ramente voltada para a formação e o aperfeiçoamento dos magis-trados na aferição dos critérios para o vitaliciamento e para a promoção por merecimento, so-mada aos critérios de presteza e segurança no exercício da juris-dição.

O art. 78, § 1º, da Lei Comple-mentar n.º 35, de 14 de março de 1979 (Lei Orgânica da Magis-tratura Nacional), estabelece que pode ser exigido dos candidatos, para inscrição em concurso de ingresso na carreira da magis-tratura, título de habilitação em curso ofi cial de preparação, mais um critério na estrutura das Es-colas da Magistratura. Algumas mantêm cursos preparatórios, contando-se tempo de um ano e meio, com frequência e apro-veitamento nesses cursos, que correspondem, de certa forma, ao notável saber jurídico e ao aperfeiçoamento dos magistra-dos, como critério de ingresso na carreira.

Há, pois, a necessidade de formação permanente de juízes aptos a elaborar novas técnicas e processos, com desempenho diferenciado de egressos dos cursos externos, visando prefe-rencialmente ao aprofundamento de conhecimentos ou técnicas de pesquisa científi ca da jurisdição, permitindo presteza e segurança nas decisões.

Finalidades e objetivos das escolas da magistratura

As escolas da magistratura vi-sam enfatizar o aprofundamento da formação profi ssional do ma-gistrado, no exercício da juris-dição, em parte conquistada na graduação do curso de Direito (por vezes defi citários).

Torna-se inarredável a ma-nutenção de níveis de qualidade condizentes com os padrões de formação profi ssional fi xados nas cargas horárias e disciplinas bá-sicas e afi ns, com conteúdo que atenda às fi nalidades das esco-las da magistratura (Resoluções n.ºS 1/2008 e 2/2008 e Instru-

ções Normativas n.ºS 1/2008 e 2/2008, todas da Enfam).

As fi nalidades prendem-se à formação profi ssional do magis-trado e esta requer estrutura cur-ricular clara e consistente, vin-culada a sua especifi cidade, que articule o ensino com a aplicação profi ssional de forma diferenciada

e fl exível, em termos coerentes com seus objetivos e compatível com um tempo mínimo, como se vê nas Resoluções da Enfam aci-ma indicadas.

De outro lado, as fi nalidades das escolas da magistratura exi-gem quadro docente integrado predominantemente por juízes (juízes ensinando juízes, como maneira de atender e viabilizar os custos dos cursos presenciais e os cursos por videoconferên-cia), com produção intelectual di-vulgada em veículos conhecidos e com ampla circulação em sua área de conhecimento (tornando viáveis os custos das publicações de periódicos), podendo, ainda, uma parcela desse quadro ser constituída de profi ssionais com qualifi cação e experiência inques-tionáveis em campo pertinente (matérias afi ns) ao da proposta do curso.

Nos objetivos se estabelecem, ainda, apresentação de trabalho fi nal que demonstre domínio do objeto de estudo, sob a forma de análise de caso e performan-ce, entre outras, de acordo com a natureza da área e os fi ns do cur-so, e capacidade de expressar-se lucidamente sobre ele, condições para avaliação razoável de cada participante.

Outra característica dos obje-tivos é a avaliação periódica em conjunto com os demais progra-mas e atividades das escolas da magistratura, razão pela qual a produção técnico-científi ca de-corrente de atividades de pes-quisa, extensão e serviços pres-tados no efetivo exercício da jurisdição deverá ser especial-mente valorizada. Isso porque a experiência e os conhecimentos enriquecem a atividade do juiz, trazendo aprimoramento pessoal e institucional, com refl exos po-sitivos para a sociedade, e aper-feiçoando a cidadania dentro de um quadro ético e democrático, considerada a realidade atual da magistratura nacional, voltada para bem servir à população. A consecução desse objetivo das escolas da magistratura trará maior entendimento entre os magistrados e a sociedade, al-

A institucionalização

das escolas da

magistratura não retira

o lado acadêmico,

que prevalece como

complemento da

instituição criada

constitucionalmente.

As escolas da

magistratura têm sua

natureza institucional,

que é a prevalente

na formação e

aperfeiçoamento

de magistrados,

e sua natureza

acadêmica, que reside

na estruturação,

desenvolvimento e

organização dos cursos

como consequência

ou complemento.

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cançando uma cidadania comum e plena e solidifi cando os valores éticos e democráticos.

Tais objetivos são formadores de postura: possibilitam a melho-ria da qualidade de nossos juízes, na área da administração judicial e de relações públicas governa-mentais, inclusive nas relações entre institutos do Direito Público e do Direito Privado, propiciando a harmonização da legislação e da jurisdição, assim como do sis-tema judiciário; aperfeiçoam a qualidade das entidades nacionais públicas e privadas e de organis-mos internacionais vinculados ou interessados, por qualquer meio, na conformação do sistema judi-cial; e melhoram o desempenho no combate ao crime organizado e ao narcotráfi co, como também a atuação nas áreas do Direito Tributário, Previdenciário, Traba-lhista, Processual, Internacional, Penal, Administrativo, Consti-tucional, Civil e Comercial e na área do Direito referente ao meio ambiente e ao consumidor, entre outras, seguindo a estrutura dos Códigos brasileiros.

Em outras palavras, com rela-ção ao tema Direito e Jurisdição, é possível ao participante esco-lher a matéria de seu interesse (Penal, Processual Penal, Civil, Comercial, Processual Civil, Tra-balhista, Processual do Trabalho, Constitucional, entre outras). No Direito Privado, deve ser dado destaque ao aspecto econômico, em face da grande infl uência da economia de mercado, em torno da qual gira quase toda a ativi-dade humana.

O Direito e a Jurisdição cons-tituem, assim, a pedra de to-que da cidadania. A doutrina e a legislação serão discutidas por meio de casos da jurisprudência de primeira instância e dos tribu-nais. É fácil ser pessoa, difícil é ser cidadão. Em suma, as esco-las da magistratura, pelas suas fi nalidades e objetivos primor-diais, proporcionam a formação da consciência histórica da ética, da cidadania plena e da demo-cracia. A segurança e a presteza no exercício da jurisdição cons-tituem pedra angular da Justiça,

como determina a Constituição Federal, benefi ciando de forma efetiva a cidadania.

Desse modo, é imprescindí-vel:

– Formar juízes operadores em assuntos de relações jurídicas,

A produção

técnico-científi ca

decorrente de

atividades de

pesquisa, extensão

e serviços prestados

no efetivo exercício

da jurisdição deverá

ser especialmente

valorizada, porque

a experiência e

os conhecimentos

enriquecem a atividade

do juiz, com refl exos

positivos para a

sociedadade.

”sociais e econômicas, quer do ponto de vista da administração pública, quer do ponto de vista do setor privado, no contexto da jurisdição, dando visão transdis-ciplinar e interdisciplinar (Curso de Formação de Formadores).

– Qualifi car os juízes nos sis-temas jurídicos, mostrando o elo das relações jurídicas e possibili-tando a dinamização da área pú-blica e do setor privado.

– Institucionalizar e manter linhas permanentes de pesquisa transdisciplinar e interdisciplinar para os assuntos de jurisdição, direcionando a produção científi -ca aí gerada para o atendimento das demandas institucionais do sistema brasileiro de jurisdição.

As escolas superiores da ma-gistratura foram implantadas no Brasil, em geral, a partir de 1980 (a mais antiga e anterior a esse ano, a de Minas Gerais, possui 32 anos de existência), quando começaram os cursos prepara-tórios, de aperfeiçoamento e de atualização dos juízes, o que re-sultou em trabalho altamente po-sitivo.

Ao mesmo tempo ocorria no Brasil a modernização do Poder Judiciário, inclusive com implan-tação do sistema de informática jurídica e da internet.

Essa nova realidade trouxe à discussão o aprimoramento dos juízes, uma vez que a Constitui-ção Federal de 1988 e a Lei Or-gânica da Magistratura de 1979 estabelecem como princípio a se-gurança e a presteza no exercício da jurisdição.

Conclusão

A natureza das escolas da ma-gistratura é institucional, mas isso não exclui sua natureza acadêmi-ca, o que determina sua estrutu-ra também constitucional, com a criação da Enfam, como meio de atingir a presteza (duração razo-ável do processo) e a segurança nas decisões judiciais, buscando alcançar suas fi nalidades e obje-tivos ligados à formação e aper-feiçoamento dos magistrados e atendendo às disposições da Car-ta Maior nesse sentido.

Antonio Rulli Junior é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Diretor da Escola Paulista da Magistratura (EPM) e Presidente do Colégio Permanente de Diretores das Escolas Estaduais da Magistratura (COPEDEM).

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O secretário, Marcos Degaut, e o coordenador de planejamento estratégico, Rodolfo Freitas, representaram a Enfam na reunião do Copedem em Aracaju

Aracaju sedia a XVIII reunião do COPEDEM

No dia 4 de setembro, o Colégio Permanente de Diretores de Escolas Es-taduais de Magistratura

(COPEDEM) reuniu-se em Aracaju, Sergipe. A XVIII reunião do Colégio contou com a participação da En-fam, representada por seu secre-tário, Marcos Rosas Degaut Pontes, e por seu coordenador de planeja-mento estratégico, Rodolfo Freitas Rodrigues Alves.

Como um dos pontos favoráveis do encontro, fi cou decidido que a Enfam passará a constituir mem-bro do COPEDEM, de modo integral, com direito a voz e voto.

Foi debatido, ainda, o currícu-lo mínimo dos cursos de formação inicial para a magistratura, consi-derando-se as diretrizes formuladas pela Enfam na Resolução n.º 2, de 16 de março de 2009.

A criação de núcleos de pesquisa para diagnósticos de confl itos so-ciais e defi nição de novos paradig-mas de administração do Judiciário foi outro tema examinado, ocasião em que os participantes do COPE-DEM aventaram duas possibilidades. A primeira refere-se às escolas esta-duais que detêm condições físicas, fi nanceiras e materiais. Nesse caso, poderão instalar seus próprios nú-

cleos e realizar, de forma inde-pendente, as pesquisas que defi nirem como necessárias ou prioritárias. A segunda é o es-tabelecimento de parceria en-tre a Enfam e as demais escolas para a implan-tação de tais núcleos, nos moldes já efetuados com o Tribunal Federal da 4.ª Região, a Escola de Magistratu-ra da 5ª Região, a Escola Superior de Magistratura de Pernambuco, a Escola da Magistratura do Rio de Janeiro e a Escola da Magistratura Regional Federal da 2ª Região.

No fi nal da reunião, foi redigi-da a Carta de Aracaju, contendo as deliberações dos membros do COPEDEM. No documento, conside-rando estar atento aos problemas da magistratura estadual e posicio-nando-se pela busca do constante aperfeiçoamento dos juízes, o Colé-gio reafi rma a obrigatoriedade dos cursos de aperfeiçoamento de ma-gistrados como pressuposto consti-tucional para a promoção por mere-cimento e para o vitaliciamento, de

acordo com o art. 6.º da Resolução n.º 2/2007 da Enfam.

Em prol da sociedade e da afi r-mação do Poder Judiciário, o COPE-DEM sugere aos Tribunais de Justiça e às Escolas Judiciais o desenvolvi-mento de atividades de pesquisas científi cas para o diagnóstico de problemas localizados e desafi ado-res. Ratifi ca, também, que as Es-colas da Magistratura constituem o foro adequado para a discussão de projetos de gestão judiciária.

Por fi m, fi cou decidido o enca-minhamento de uma cópia da Car-ta ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para reforçar o entendimen-to da obrigatoriedade de os juízes frequentarem os cursos de aperfei-çoamento para a promoção por me-recimento e para o vitaliciamento.

Primeiro Curso de Mediação regionalizado acontece em Recife

Foi realizado nos dias 23, 24 e 25 de setembro, em Recife, o primeiro curso regionalizado de Forma-

ção de Multiplicadores em Media-ção e Técnicas Autocompositivas, destinado a juízes federais. O evento resultou de parceria entre a Enfam, a Secretaria de Reforma do Judiciário (SRJ) e a Escola da Magistratura Federal do TRF da 5ª Região (ESMAFE).

Durante a abertura do curso, o desembargador Lázaro Guima-rães, diretor da ESMAFE, desta-

cou a importância da mediação como instrumento que pode não só ace-lerar a prestação jurisdicional, mas também proporcionar às partes uma relação saudável pós-demanda.

Representando a Enfam, o se-cretário Marcos Degaut, também na abertura, lembrou da importância das parcerias estabelecidas entre instituições unidas por objetivos co-muns, dos quais o principal é recrutar e capacitar os magistrados, de modo a torná-los mais éticos, mais voca-cionados, mais preparados para o exercício da magistratura. “E isso se

torna, sobretudo, possível quan-do baseado na real disposição dos magistrados em continuar seu aprimoramento técnico-jurídico”, afi rmou. Participou também da solenidade inicial, representando o Ministério da Justiça, Marcelo Vieira, assessor da SRJ.

O curso, coordenado pelos juí-zes Roberto Bacellar, André Gom-ma de Azevedo e Eduardo Picarelli, assim como pelo desembargador Néfi Cordeiro, dá continuidade ao programa de formação em me-diação e técnicas de resolução de confl itos. O próximo curso desse programa deverá ocorrer em São Paulo, com o objetivo de capaci-tar juízes do Tribunal Regional Fe-deral da 3ª Região.

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Enfam estreia no universo do ensino a distância

Foi realizada, no dia 14 de outubro, a aula inaugural do Curso sobre Metodologia de Estudo de Caso, que marca

a inserção da Enfam no universo do ensino a distância. É o primeiro curso desenvolvido totalmente em ambiente virtual e tem como ob-jetivo preparar magistrados para a utilização da metodologia de es-tudo de casos. Será realizado até o dia 13 de dezembro deste ano e tem a participação de 20 juízes federais. Por se tratar de projeto-piloto, portanto de caráter expe-rimental, foram oferecidas apenas quatro vagas por Tribunal Regional Federal.

A aula foi transmitida às Escolas da Ma-gistratura Fe-derais por meio de videocon-ferência, ope-racionalizada pelo Conselho da Justiça Fe-deral (CJF), e contou com a presença do de-sembargador Rogério Gesta Leal, tutor do curso, do de-sembargador Tadaaqui Hiro-se, presidente da Escola da Magistratura da 4ª Re-gião (EMAGIS), e do secretário da Enfam, Marcos Degaut. Por ques-tões de saúde, o Ministro Fernando Gonçalves, diretor-geral da Enfam, não pôde estar presente.

Durante a abertura do evento, o desembargador Tadaaqui Hirose relembrou a atitude pioneira e o histórico de cursos realizados pela EMAGIS por meio de educação a distância e destacou as facilidades e vantagens que o método oferece. “O magistrado não precisa se afas-tar da função jurisdicional e não há gastos com passagens e diárias”, explicou. Hirose também acentuou a importância da cooperação entre

a Enfam e a EMAGIS na implanta-ção da plataforma virtual em prol de uma prestação jurisdicional mais efi ciente.

O desembargador Rogério Gesta Leal explicou aspectos básicos da metodologia do curso: divisão em módulos, postagem de materiais na plataforma, envio de atividades concluídas pelos alunos e avaliação. O curso tem nove módulos, sendo o primeiro de ambientação. Todos os domingos há postagens de textos de referência, que são trabalhados durante a semana, e os magistra-dos têm até o domingo seguinte para enviarem ao tutor as ativida-

des realizadas. Gesta Leal ainda ressaltou a importância da efetiva participação dos magistrados para construírem, conjuntamente, uma metodologia de avaliação de estu-do de casos, com o objetivo de ele-var a prestação judicial.

Finalizando, o secretário Marcos Degaut declarou que a Enfam alme-ja a superação da distância geográ-fi ca e planeja disponibilizar 17 cur-sos por meio do ensino a distância, além dos presenciais, no próximo ano. Ele ainda enfatizou que a re-alização de cursos a distância só é possível em face da valiosa coope-ração do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região e da EMAGIS.

Marcos Degaut, secretário da Enfam, desembargador Tadaaqui Hirose, diretor da Escola da Magistratura da 4ª Região e desembargador Rogério Gesta Leal, tutor do curso

Durante a III Jornada da Lei Maria da Penha rea-lizada no Conselho Na-cional de Justiça (CNJ),

em 31 de março deste ano, foi criado o Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid) com a fi nalidade de reunir juízes de todo o Brasil que atuam com a temática da violência doméstica. O Fórum atua para garantir a promoção dos direitos fundamentais e a aplica-ção dos dispositivos previstos na Lei n.º 11.340/2006 – Lei Maria da Penha, assim como propõe dis-cussões jurídicas visando ao aper-feiçoamento e à ampliação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

O I Encontro do Fonavid será realizado no período de 23 a 25 de novembro de 2009, no Rio de Janeiro, e focalizará o tema Efeti-vidade da Lei Maria da Penha. O evento tem como objetivos com-partilhar experiências e uniformi-zar procedimentos afetos à Lei Ma-ria da Penha, discutir as decisões dos Juizados e Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mu-lher sob o prisma da efetividade jurídica e avaliar as vantagens e desvantagens da ampliação de competência do sistema. O I En-contro do Fórum será organizado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e contará, ainda, com o apoio do CNJ, da Secretaria Especial de Política para as Mulhe-res, da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justi-ça, da Associação dos Magistrados Brasileiros e da Enfam.

As inscrições estarão abertas até o dia 10 de novembro e de-verão ser realizadas pelo endere-ço eletrônico [email protected], não sendo possível outras formas de inscrição. Estão disponíveis 200 vagas para magistrados de todo o país e 50 vagas para técnicos das equipes multidisciplinares dos Juizados e Varas Especializadas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

I Fonavid será realizado em novembro

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Cooperação entre Brasil e França para aperfeiçoamento de magistrados

Prisão temporária: análise e perspectivas de uma releitura garantista da Lei n.º 7.960, de 21 de dezembro de 1989, de autoria de Luís Geraldo Sant’Ana, Quartier Latin do Brasil, 1. ed., 2009, 271 p.

Uma posição que refl ete tanto prática profi ssional quanto arse-nal teórico de irrefutável riqueza e profundidade acerca do instituto da prisão temporária; análise críti-ca e técnica da natureza jurídica; e aspectos controvertidos da lei que introduziu esse instituto no orde-namento jurídico brasileiro (Lei n.º 7.960, de 21/12/1989) – é o que nos apresenta o Juiz de Direito Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi em sua obra, desenvolvida com base em pesquisas no Brasil e no exterior. O autor é Juiz de Direito em São Paulo e apresentou o tema Prisão Temporária como dissertação para obtenção do título de Mestre em Direito Processual Penal pela Facul-dade de Direito da Universidade de

São Paulo (USP). É especialista em Direito Penal e Econômico Europeu, pelo Instituto de Direito Penal Eco-nômico e Europeu da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Portugal).

Com inteireza, são analisados en-foques e perspectivas para o aperfei-çoamento do instituto da prisão tem-porária, que atribui ao juiz a árdua tarefa de julgar, à luz dos princípios constitucionais, com acuidade, regra e parcimônia, sopesando o interes-se do Estado na persecução penal e, inexoravelmente, garantir a preva-lência dos direitos individuais do acu-sado, assim como sua liberdade ou separação dos demais detentos em caso de decretação dessa prisão.

O autor ressalta o importante pa-pel do juiz na verifi cação da necessi-dade de uma prisão cautelar (juiz de garantia) e os parâmetros imprescin-díveis à forma de análise das medi-das cautelares constritivas de liber-dade no processo penal, tais como: presunção de inocência, necessidade

Dica de leitura por Maria dos Reis de Almeida Neves

No dia 7 de setembro, a Enfam fi rmou convênio com a École Na-tionale de la Magistrature (ENM) da França. O ministro Fernando Gonçalves, diretor-geral da En-fam, e Jean François Thony, di-retor-geral da ENM, celebraram o acordo em Brasília durante a visi-ta do presidente francês, Nicolas Sarkozy, ao Brasil. O convênio faz parte de uma série de iniciativas dos governos francês e brasileiro para a aproximação das duas na-ções e tem como objetivo promo-ver o aperfeiçoamento dos magis-trados de ambos países por meio de intercâmbio de experiências, enfatizando uma abordagem prá-tica, multidisciplinar e humanísti-ca dos conteúdos de ensino.

No âmbito dessa cooperação franco-brasileira, a Embaixada da França no Brasil oferece bol-sas de estágio para magistrados e funcionários públicos na ENM. O

programa proporciona oportuni-dade de aprimoramento intensivo em vários temas, o que permite a participação de candidatos com diferentes perfi s.

Neste ano, foram colocadas à disposição da Enfam três bolsas para cursos de aperfeiçoamento na ENM, com duração de até um mês. Em face da proximidade do término do ano, há somente um curso com tempo hábil para parti-cipação e será realizado entre os dias 16 e 27 de novembro, foca-lizando o tema Investigação Eco-nômica e Financeira.

As escolas brasileiras da ma-gistratura tiveram a oportunidade de indicar um magistrado de sua região para escolha de três can-didatos por parte da ENM. O do-mínio da língua francesa foi um dos requisitos fundamentais para a candidatura à vaga.

A bolsa é no valor de 920 eu-

ros, com divisão pro rata do nú-mero de dias de duração do cur-so. Os custos pedagógicos fi carão a cargo da Embaixada da França, e os custos do transporte inter-nacional dos candidatos fi carão a cargo das escolas brasileiras ou do próprio participante.

Brasil e França em favor do Haiti

Com base no acordo Enfam/ENM, foi proposta pela escola francesa a cooperação das duas instituições em favor do Hai-ti. Os trabalhos que poderão ser desenvolvidos em comum abor-darão quatro áreas: organização de formação de formadores, aju-da na concepção de cursos para formação inicial dos magistrados, formação especializada sobre o crime organizado e formações pontuais.

de fundamentação sufi ciente e pro-porcionalidade. Salienta, ainda, o grande desafi o dos ordenamentos jurídicos na conciliação dos propó-sitos de efi ciência com o modelo de valores fundantes do novo processo penal legitimamente democrático e o papel-dever de o legislador ordinário levar em consideração a temática da ofensividade do bem jurídico-penal tutelado e de dotar a persecução pe-nal dos meios garantidores da eluci-dação dos crimes.

São estabelecidos, ainda, os an-tecedentes desse modelo de prisão no ordenamento jurídico nacional, delineando-se, no tempo e no espa-ço, o momento histórico da eclosão. É apresentado breve apanhado da disciplina da prisão durante inves-tigações sobre experiências realiza-das em outros países, semelhantes ao modelo brasileiro.

Obra de eloquente linguagem, clareza e objetividade, indispensá-vel ao acervo das boas instituições jurídicas.

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A Lei Maria da Penha e os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher

Artigo

por Adriana Ramos de Mello

Em 7 de agosto de 2006 foi sancionada a Lei n.º 11.340, também denomi-nada Lei Maria da Penha,

que, apesar de ter como fi nalida-de a criação de mecanismos para coibir a violência contra a mulher, trouxe em seu bojo importante inovação para a Justiça brasileira: a criação dos Juizados de Violên-cia Doméstica e Familiar contra a Mulher.

A referida lei foi prontamente denominada de Lei Maria da Penha, em homenagem à biofarmacêutica Maria da Penha, vítima de um caso de violência doméstica que se tor-nou emblemático. Maria da Penha foi vítima duas vezes de tentativa de homicídio, mas conseguiu so-breviver. O seu marido, no entan-to, fi cou impune por 19 anos e seis meses, quando, fi nalmente, veio a ser condenado e preso.

Diante dessa morosidade da Jus-tiça, o caso foi levado até a Comis-são Interamericana de Direitos Hu-manos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que, em respos-ta, publicou o Relatório n.º 54, de 2001, no qual consta recomenda-ção dirigida à República Federativa do Brasil para que fosse realizada profunda reforma legislativa, com a fi nalidade de proporcionar efetivo combate à violência doméstica con-tra a mulher.

Atendendo a essa recomenda-ção, o Brasil fez surgir a Lei Maria da Penha. Com esse instrumento legislativo, o país avançou muito em relação ao combate à violência doméstica e familiar contra a mu-lher, prevendo medidas de prote-ção de urgência à mulher que sofre com essa forma de violência.

Não obstante, uma das maiores inovações trazidas pela Lei Maria da Penha é a previsão da criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que me-lhor seria se a lei tivesse mencio-nado vara, em vez de juizado, a fi m de evitar confusão com os Juizados Especiais Criminais, criados pela Lei n.º 9.099/95 e tão criticados por

não terem dado a resposta neces-sária aos crimes de violência do-méstica.

Os Juizados de Violência Do-méstica e Familiar contra a Mulher, com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União e pelos estados da Federação, para processo, julgamento e execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. Entretanto, a ne-cessidade de tutela dos direitos fun-damentais das mulheres é urgente, e nem todos os estados instalaram os Juizados de Violência Doméstica, em fl agrante ofensa aos preceitos constitucionais e legais.

As políticas públicas previstas na Lei n.º 11.340/2006 constituem verdadeiros direitos públicos sub-jetivos das mulheres, passíveis de serem pleiteados no Judiciário, em caso de inércia do Poder Público, pois se referem aos direitos funda-mentais das mulheres.

A Lei Maria da Penha cumpriu a exigência constitucional prevista no art. 226, § 8º, de que, por ser uma norma de efi cácia limitada, dependeria de lei infraconstitucio-nal para disciplinar e criar mecanis-mos competentes, capazes de coi-bir a violência no âmbito de suas relações.

Nesse contexto, os direitos pú-blicos subjetivos podem ser concre-tizados pelo Poder Judiciário, que, dentro de sua esfera de competên-cia, deve zelar pelo cumprimento

da Constituição e das leis, coibindo abusos e até mesmo implementan-do direitos fundamentais, na hipó-tese de inércia do Poder Público, sem que essa interferência repre-sente afronta ao princípio da sepa-ração dos poderes.

A instalação dos Juizados de Violência Doméstica é imprescindí-vel para garantir a promoção dos direitos fundamentais e a aplicação dos dispositivos previstos na Lei Maria da Penha, devendo o Poder Judiciário adotar uma postura pro-ativa, exigindo do Poder Público a implementação das políticas pú-blicas, para tutelar os direitos das mulheres vítimas de violência do-méstica.

Necessária também é a constan-te capacitação e aperfeiçoamento de todos os profi ssionais envolvidos no atendimento às vítimas da vio-lência doméstica, sejam policiais, promotores de Justiça, defensores públicos, advogados e magistrados, para que esse atendimento seja o mais humanizado, organizado e efi -ciente possível, visando à satisfação dos interesses da vítima.

A Lei n.º 11.340/2006 é uma ação afi rmativa em favor da mulher vítima de violência e tem de ser in-terpretada observando-se os fi ns a que ela se destina, devendo o in-térprete da Lei ver o fenômeno da violência doméstica e familiar como uma violação aos direitos humanos da mulher. É com esse enfoque que se deve buscar a aplicação da Lei.

Adriana Ramos de Mello é Juíza de Direito Titular do I Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Rio de Janeiro e mestre em Ciências Penais pela Universidade Cândido Mendes. Ocupa, ainda, os cargos de Presidente do Fórum Permanente de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro (EMERJ) e Presidente do Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (FONAVID).

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Artigo

Juiz vocacionado ou técnico? por Roberto Amaral Rodrigues Alves

Juízes vocacionados

praticam o ofício com tal

desprendimento e desapego

material e com tamanha

dedicação social que, de

regra, são eleitos sacerdotes

do Direito e da Justiça.

A Escola de Direito da Uni-versidade de São Paulo (EDUSP), em 1990, repu-blicou artigo da lavra do

inesquecível RUI BARBOSA1 re-ferindo-se à imprensa e ao dever da verdade, cujo conteúdo é deste teor, in verbis:

“[...] o homem público é o homem da confi ança dos seus concidadãos, de quem eles esperam a ciência e o conselho, a honestidade e a lisu-ra, o desinteresse e a lealdade; é o vigia da lei, o amigo da justiça, o sacerdote do civismo. Não pode ser o composto de uma tribuna e uma alcova, de uma escola e um balcão, de uma pena e uma gazua, de uma consciência e uma máscara; Só as-sim estará na condição de inspirar fé aos seus conterrâneos; e, se na fé consiste a crença, na fé a segurança, na fé a salvação, ninguém põe a sua fé senão onde tenha convicção de se achar a verdade. Logo, [...] se o homem público há de viver na fé que inspirar aos seus concidadãos, o primeiro, o maior, o mais inviolável dos deveres do ho-mem público é o dever da verdade: verdade nos conselhos, verdade nos debates, verdade nos atos; verdade no governo, verdade na tribuna, na imprensa em tudo verdade, verdade e mais verdade”.É com esta inspiração, notada-

mente ética, eternizada por Rui Barbosa, que se busca numa visão humanista e profundamente preo-cupada, de advogado militante, en-contrar parâmetros que permitam 1 BARBOSA, Rui. A imprensa e o dever da verdade. São Paulo: Com-Arte; Editora da Universidade de São Paulo, 1990, 80 p. (Clássicos do Jornalismo Brasileiro; 2.)

lançar luzes sobre a nobre missão dos juízes no ofício de compor con-fl itos entre seus semelhantes ou mesmo de julgar seus atos e ações. Duas vertentes se mostram preocu-pantes e interessam no particular.

A primeira concernente ao JUIZ VOCACIONADO e a segunda ao JUIZ TÉCNICO.

Certamente dirão que as situa-ções são iguais, pelo menos quanto à forma de acesso ao cargo.

De fato, sob a ótica de ingresso – o que é bastante positivo para essa abordagem –, as exigências são absolutamente iguais. Um e outro, além dos pré-requisitos implícitos para a função, submetem-se à su-peração de certame previamente estabelecido por édito público. No entanto, antes mesmo de cotejar a forma de atuação ou as diferenças do JUIZ VOCACIONADO e do JUIZ TÉCNICO, é conveniente revolver passado longínquo, justamente com o fi lósofo, escritor e político iluminista MONTESQUIEU, há qua-se trezentos anos.

Personagem central do iluminis-mo, Charles de Montesquieu, muito jovem, já manifestava sua intole-rância contra o regime absolutista. Discordava frontalmente do sistema monárquico de então pela excessiva concentração de poderes nas mãos do rei. Em sua peregrinação contra o absolutismo legou ao mundo sua

consagrada obra sobre a indepen-dência e harmonia do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.

É justamente essa trilogia har-mônica montesquiana, concebida há mais de três séculos, vigorando nos dias atuais, que permitiu a tri-partição das instituições a que se denominou de “PODERES”.

Não se cogita, nesta perfunc-tória incursão sobre tão palpitante tema, nenhuma pretensão crítica – nem haveria preparo para tal – de discutir o acerto ou não do uso do vocábulo “poder” para distinguir as três mais importantes instituições do Estado na forma concebida por Montesquieu.

Veja-se que, na concepção jurí-dica constitucional, Poder Judiciário “é aquele a quem, segundo a orga-nização constitucional do Estado, compete assegurar a aplicação das leis que garantem os direitos indivi-duais”. Portanto, uma defi nição até simplista, da qual decorre outorga ao Estado-Juiz para que se obrigue a “assegurar a aplicação das leis que garantem os direitos individuais”.

A essa subordinação, de asse-gurar e aplicar leis como escopo de garantir os direitos individuais, en-tre outras, é que estão submetidos os juízes indistintamente, em qual-quer grau ou instância.

Dessa forma, quando nos referi-mos a “juízes vocacionados” e “ju-ízes técnicos”, procuramos tão-so-mente fi xar uma diferenciação que o advogado militante vê entre os primeiros e os segundos, concer-nente ao desempenho e à forma de aplicação e uso desses “poderes” especiais dos quais foram dotados ao ingressarem na magistratura. Aquela visão típica de Piero Cala-mandrei (Eles, os Juízes, Vistos por Nós, os Advogados).

É plenamente exógena e visível a atuação dos primeiros, independen-temente das atribuições e “poderes” a eles concedidos por imposição legal. Reúnem, carregam e trans-bordam em suas personalidades, dentro dos próprios cromossomos, implícitas virtudes humanas, espe-lhadas num despojamento invulgar e virtuoso da dimensão e estatura

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Esquecem-se os

tecnocratas de que

para julgar não se pode

abdicar do altruísmo,

da serenidade,

do equilíbrio, do

despojamento, da

compreensão, da

absoluta isenção,

todos atributos

implícitos da vocação.

do cargo. São nascidos juízes por-que dotados do dom de julgar como verdadeira vocação derivada da imagem e semelhança do Criador.

São seres realmente vocacio-nados. São bons e justos, biologi-camente, por força dessa genética especial de que foram constituídos. Para eles, a função conciliadora ou julgadora é apenas um exercício continuado das virtudes herdadas na origem da concepção. De regra, não precisam, não carecem de ma-nual ou cartilha para desempenho efi ciente de seus múnus. Tudo lhes parece comum e muito normal, tal a naturalidade de suas ações, tal a amplitude da visão humanística com a qual conduzem as lides e aplicam os textos legais em suas decisões.

Na aparência, confundem-se com os cidadãos comuns, mas são facilmente identifi cados no convívio social e particularmente no ofício profi ssional, dadas as características especiais de que são portadores.

Respeitosos, brandos, simples, acessíveis. Extremamente educa-dos e ciosos de suas responsabili-dades, transmitem inigualável se-gurança com absoluta naturalidade no desempenho da função, aliada à destacada cultura e primoroso preparo. Expressam-se na faina do dia a dia usando diálogos simples, despojados de vocábulos pedantes e excesso de formalidades, sempre forrados de equilíbrio, respeito e soluções conciliadoras.

Juízes conatos, magistrados por vocação são seres especiais que ja-mais perdem a aura e o prestígio que o ofício lhes impõe com ou sem auxílio da negra beca.

Agem despretensiosamente até por força das virtudes congênitas de suas personalidades; não pre-cisam exibir as prerrogativas ou aqueles “poderes” que o cargo lhes outorga.

As becas negras que vestem seus corpos e destacam suas au-ras são símbolos sufi cientemente visíveis e austeros para assegurar a todos, notadamente aos jurisdi-cionados, a relevância e seriedade do múnus desses abnegados mis-sionários. Tornam-se paradigmas únicos na prática dos atributos da missão de julgar. São referenciais irrepreensíveis para o bom, correto

e justo exercício da magistratura independentemente da paraferná-lia de leis, decretos, atos, portarias, instruções, editados para fi scalizar, limitar e dosar os tais “poderes” outorgados à função.

Em suma, juízes vocaciona-dos praticam o ofício com tal des-prendimento e desapego material e com tamanha dedicação social que, de regra, são eleitos sacerdo-tes do Direito e da Justiça.

São esses atributos que dão exa-ta dimensão ao ofício de julgar. São eles – vocacionados – os verdadei-ros espelhos que hão de refl etir nos que chegarem o modo humano de praticar e distribuir a Justiça da qual são os detentores na Terra.

O “poder do juiz” não pode ser um trunfo, uma vantagem, um fa-vor, um objeto de barganha ou ain-da um instrumento para imposição e submissão da vontade.

É justamente essa visão que di-ferencia os vocacionados dos técni-cos. Estes, ressalve-se, perfi lam os mesmos caminhos e disputas para ingresso na função. Daí, não haver demérito na expressão.

A distinção quer se referir àque-les juízes que, não obstante dedi-cados, esforçados, estudiosos, fre-quentadores assíduos e constantes

de cursos de formação e aperfei-çoamento, mesmo exercendo com correção e idoneidade suas funções, são tecnicistas. Apegam-se com extremado exagero e rigor àquelas prerrogativas contidas nos “pode-res” que lhes são conferidos. Mesmo no continuado empenho e dedicação aos estudos, tornam-se prisioneiros de regras e fórmulas que difi cultam dotá-los de humildade e desprendi-mento que permitam superar a efê-mera vaidade e prestígio do cargo.

Ingressam com o vezo de supre-macia, de superioridade, em face da disputa entre tantos. Conferem a si mesmos desempenho superior, além de maior competência que seus con-correntes, e, por isso, jactam-se de que sua vitória é resultado de “seu preparo” sobre os demais.

Em exercício, não conseguem desprender-se das equações e fór-mulas estereotipadas dos cursos preparatórios. Convencem-se, en-tão, de serem dotados de atribui-ções que tudo lhes permite. Afi nal, são juízes.

Esquecem-se os tecnocratas de que para julgar não se pode ab-dicar do altruísmo, da serenidade, do equilíbrio, do despojamento, da compreensão, da absoluta isen-ção, todos atributos implícitos da vocação.

Essa, para ser praticada, não precisa de apoio em dogmas ou conceitos preconcebidos. Nem de-manda almanaques jurídicos, muito menos bulas de direito, porquanto agem com a prudência e a sereni-dade inatas dos virtuosos, por isso vocacionados.

Entendo, por fi m, ser este o único caminho e fórmula capaz de transformar o Poder Judiciário numa instituição de elevado prestígio e garantidora dos direitos dos cida-dãos, porque provida de homens vocacionados e não tecnicistas.

Roberto Amaral Rodrigues Alves é advogado em Brasília, Distrito Federal, especializado em Direito de Família. Participou da elaboração de Esboço de Projeto de Lei que, substitutivo a outros projetos, visa regulamentar dispositivo da Constituição Federal (art. 226, § 3.º), para criar o estatuto da união estável e da união civil homoafetiva.

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Enfam participa de Assembleia da Riaej no México por Daniela Nogueira

Nos dias 7, 8 e 9 de outu-bro, a Cidade do México sediou a V Assembleia-Geral da Rede Ibero-ame-

ricana de Escolas Judiciais (RIAEJ) e a Reunião da Junta Diretiva, co-legiado que preside a Rede, formu-la propostas e planos de ação. A Enfam, que faz parte do Conselho Diretor, esteve presente por meio de seu diretor-geral, Ministro Fer-nando Gonçalves, e do secretário, Marcos Degaut.

Durante a Reunião da Junta Di-retiva, o secretário Marcos Degaut apresentou o processo de criação da Enfam, mediante a Emenda Constitucional n.º 45, focalizando a missão institucional da Escola, seus objetivos, competências, composi-ção e forma de atuação. Em segui-da, o Ministro Fernando Gonçalves fez um relato de como a Escola tem trabalhado, suas prioridades, pro-jetos e perspectivas, ressaltando o ingresso no mundo virtual, com a educação a distância.

Marcos Degaut explicou que a Enfam e a Escola Nacional de Formação e Aperfeiço-amento de Magistrados do Trabalho (Enamat) são as únicas escolas ofi ciais da magistratura de âmbito nacional. Informou, ainda, que, no âmbito abrangido pela Enfam, existem 27 escolas estaduais e 5 fede-rais.

Na primeira parte da Assembleia foi aprovada uma proposta de alteração estatutária, elaborada pela Junta Diretiva, que permite às re-des de escolas ofi ciais de formação de magistrados se incorporarem à RIAEJ, com voz, mas sem direito a voto. Assim, foram aceitas como novos membros a Rede de Escolas de Capacitação do Poder Judiciário da República Argentina (REFLEJAR) e a Rede de Escolas Judiciais dos Estados da República Mexicana (REJEM).

Num segundo momento, o Minis-tro Fernando Gonçalves e o secre-

tário da Enfam foram responsáveis, como moderadores, por uma mesa de debates sobre o tema Oralidade em Matéria Penal, que durou cerca de duas horas. A mesa foi compos-ta por especialistas de seis países, além do Brasil, e mais de cinquenta pessoas acompanharam a discus-são. Marcos Degaut fez um histó-rico da utilização do procedimento da oralidade no Brasil, e o Ministro Fernando Gonçalves analisou as

vantagens e desvantagens desse procedimento explicando a siste-mática de sua utilização no país.

Houve, ainda, eleições para os novos membros da Junta Diretiva. O Brasil, que adotou uma postura bastante ativa, foi reeleito. Com-põem a nova direção o Brasil, a Co-lômbia, a Costa Rica, a República Dominicana, o México, a Espanha e o Uruguai.

A próxima reunião da Junta Di-retiva será em Barcelona, em mar-

ço de 2010, e a VI Assembléia-Ge-ral, em 2011, na Colômbia.

A história da Enfam na Riaej

A Enfam foi admitida na RIAEJ em maio de 2007, durante a IV As-sembleia-Geral da Rede, e aprova-da, por aclamação, como parte do Conselho Diretor. A Assembleia foi realizada no Rio de Janeiro, com a participação das escolas integran-

tes e de representantes dos orga-nismos internacionais convidados como observadores. O ministro Nil-son Naves, diretor-geral da Enfam na época, representou a Escola du-rante a reunião.

No evento foi aprovado o Pla-no de Ação da Rede para o biênio 2007-2009, contendo quatro eixos temáticos a serem trabalhados. O Brasil e a Colômbia coordenam o primeiro, sobre Formação Judicial: Modelos Educativos e Sistemas de Qualidade. O objetivo é avaliar os padrões de qualidade do ensino-aprendizagem nas escolas judiciais que são membros da RIAEJ e usar as informações para a melhoria do processo. A Escola da Colômbia elaborou o formulário, e a Enfam o enviou às escolas brasileiras da magistratura para preenchimento. Após, compilou os dados obtidos,

Mesa de debates sobre Oralidade em Matéria Penal

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remetendo-os em seguida à Escola colombiana.

As informações coletadas pela Enfam foram entregues, em forma de relatório, ao Ministro Hamilton Carvalhido, que se encarregou de apresentá-lo na XIX Reunião da Junta Diretiva, ocorrida na Costa Rica, em março de 2009. O relató-rio, encaminhado à Escola Judicial da Colômbia, integrou o trabalho sobre o tema apresentado na V Assembleia-Geral da RIAEJ.

A segunda plataforma de traba-lho oriunda do Plano de Ação 2007-2009 é a Redução da Brecha Digi-tal: A Formação dos Juízes para a Sociedade do Conhecimento. Esse projeto teve por objetivo, em sua primeira etapa de desenvolvimen-to, determinar as reais condições de acesso à tecnologia por parte dos integrantes da área jurisdicio-nal dos países-membros da Rede. A Escola Judicial da Costa Rica, uma das coordenadoras desse projeto, elaborou um questionário para ob-ter informações de caráter geral por parte dos magistrados e de profi s-sionais da área de tecnologia.

O Brasil participou dessa etapa com levantamento de informações. Com o incentivo da Enfam, 332 magistrados, entre juízes estadu-ais e federais, desembargadores estaduais e federais, juízes e de-sembargadores do trabalho, juízes auditores da justiça militar e minis-tros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) responderam ao questionário acessando diretamente a página da Escola Judicial da Costa Rica.

Os dados coletados foram pro-cessados pela equipe de profi ssio-nais das áreas de tecnologia da in-formação, comunicação, estatística e pedagogia das Escolas coordena-doras. A partir dessa análise, serão estabelecidas ações concretas para proporcionar melhor acesso à tec-nologia, visando à formação e capa-citação dos magistrados dos Pode-res Judiciais dos países da Península Ibérica e da América Latina.

Na V Assembleia-Geral da RIAEJ fi cou decidido que o Brasil passa a coordenar o grupo ao lado do Mé-xico e da Costa Rica. Os trabalhos preparatórios dos grupos foram aprovados e serão desenvolvidos durante o biênio 2009-2011.

Brasil e Costa Rica juntos no aperfeiçoamento de magistrados

Foi realizada, no dia 5 de outubro, a cerimônia de assinatura do Protocolo de Cooperação entre a Enfam

e a Escola Judicial Edgar Cervan-te Villalta, da Costa Rica, país que sediou o evento. O acordo tem como objetivo a promoção do aperfeiçoamento e da capacita-ção dos magistrados por meio de intercâmbio de conhecimentos e experiências.

Durante a cerimônia, o diretor da Escola Judicial da Costa Rica, Marvin Carvajal Pérez, ressaltou que o acordo de cooperação resul-ta em importante aliança estraté-gica entre países com Poderes Ju-diciários que possuem estruturas distintas, mas problemas comuns. “O Brasil sempre representou um modelo a ser seguido no que diz respeito à qualifi cação dos magis-trados, e a En-fam tem muito a oferecer ao Poder Judicial da Costa Rica”, afi rmou.

Segundo o Ministro Fer-nando Gonçal-ves, diretor-geral da Enfam, o desejo de c o o p e r a ç ã o inst i tuc ional implica deter-minação para elaborar inicia-tivas viáveis e concretas que traduzam, de modo preciso, o comprome-timento das instituições com a construção de um Poder Judiciário capaz de atender adequadamente às demandas da sociedade e de cumprir, com efi ciência, sua mis-são constitucional. “E tenho cer-teza de que, parceiros constantes que somos, estamos irmanados nessa luta árdua pela promoção da Justiça, pilar da própria demo-cracia”, afi rmou.

O embaixador do Brasil na Cos-ta Rica, Tadeu Valadares, afi rmou não ter dúvida de que o acordo refl ete o processo de aproxima-ção entre o Brasil e a Costa Rica, razão pela qual esse instrumento jurídico assume importância fun-damental. “É um marco na rela-ção entre os dois países, baseado em convergência de valores e afi -nidades”, concluiu.

A cooperação está fundada no esforço conjunto e no encontro da vontade recíproca de soluções ágeis e efi cazes para os proble-mas comuns que afetam os pode-res judiciários de ambos os paí-ses. “Em boa hora se fi rma esse acordo, a fi m de intercambiar opiniões não só sobre a formação de juízes, mas também sobre pro-blemas comuns enfrentados pelos Judiciários dos dois países, como

Marvin Carvajal, diretor da Escola Judicial da Costa Rica, e o ministro Fernando Gonçalves, diretor-geral da Enfam, celebram acordo de cooperação

a oralidade, o uso da informática e a celeridade”, declarou o presi-dente da Suprema Corte costarri-quenha, Luis Paulino Mora.

No acordo estão previstas re-alizações, em que estarão parti-cipando ambas as instituições, de conferências, seminários e outros encontros técnicos e acadêmicos que versem sobre assuntos e te-mas de interesse mútuo.

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Cooperação

Rede Ibero-americana de Escolas Judiciais – Riaej por Henry Molina

A Rede Ibero-americana de Escolas Judiciais (RIAEJ) é uma comunidade voltada para a cooperação, o ali-

nhamento e o apoio recíproco en-tre as escolas judiciais e os centros públicos de capacitação judicial da América Latina e da Península Ibé-rica. Tem como objetivos contribuir para o intercâmbio de informações sobre programas, metodologias e sistemas de capacitação judicial; facilitar a coordenação de ativida-des entre seus membros; e plane-jar atividades conjuntas de capa-citação. A Rede se apoia em uma estrutura organizacional fl exível e respeitosa da autonomia de cada um de seus membros.

A RIAEJ aspira ser considerada, no âmbito da capacitação judicial, como um modelo de coordenação e integração ibero-americana, por sua contribuição para o bom fun-cionamento do espaço judicial co-mum e para o fortalecimento dos sistemas judiciais e do Estado de Direito.

História

A RIAEJ foi criada durante a re-alização do II Encontro Ibero-ame-ricano dos Conselhos da Magis-tratura e aprovada na VI Reunião Ibero-americana de Presidentes de Cortes Supremas e Superiores Tribunais de Justiça, realizada na Espanha, em maio de 2001.

Desde então, a Rede, que se ini-ciou com 14 escolas judiciais, vem crescendo. Atualmente, é compos-ta por 26 membros, entre escolas judiciais e centros de capacitação

judicial da América Latina e da Pe-nínsula Ibérica.

Estrutura organizacional

São integrantes da Rede as esco-las judiciais e os centros públicos e unidades de capacitação judicial dos países ibero-americanos, assim como as instituições ibero-americanas de capacitação judicial de âmbito regio-nal. A RIAEJ está estruturada por:

Uma • Assembleia-Geral, com-posta por todas as escolas judi-ciais e centros públicos de capa-citação judicial integrantes. Tem como função primordial aprovar o plano de ação da Rede, eleger a Junta Diretiva e a Secretaria-Geral entre seus integrantes e receber os resultados das tare-fas desenvolvidas pelos grupos de trabalho. A presidência da Assembleia é eleita pelo voto de seus membros. Uma • Junta Diretiva, integrada por cinco membros da Rede eleitos pela Assembleia-Geral, com mandatos que vigoram até a realização da Assembleia-Geral seguinte. Suas funções são tomar decisões acerca do funcionamento da Rede entre uma Assembleia e outra e con-vocar a Assembleia-Geral, por iniciativa própria ou a pedido de ¼ dos membros da RIAEJ. Uma • Secretaria-Geral, que é sede temporária da RIAEJ e re-cai sobre um membro da Junta Diretiva. Suas funções são faci-

litar as relações entre a RIAEJ e os organismos nacionais e in-ternacionais e realizar trabalhos que lhe atribua a Junta Dire-tiva. Grupos de Trabalho• , cujas fun-ções estão vinculadas ao es-tudo de temas concretos, que possam servir de base para a tomada de decisões por parte da Assembleia, e de temas que assegurem o funcionamento da Rede.

Resultados

A RIAEJ já realizou cinco As-sembleias-Gerais: a primeira em Porto Rico, a segunda na Repúbli-ca Dominicana, a terceira na Espa-nha, a quarta no Brasil e a quinta, neste mês de outubro, no México, onde se debateu o papel das es-colas judiciais e a implementação das reformas processuais, a capa-citação no sistema acusatório oral e outros temas atuais relacionados com a capacitação.

Esse enriquecedor encontro entre as escolas e os centros de capacitação membros da Rede é importante oportunidade para permuta, entre outras questões, de experiências, conhecimentos e metodologias de trabalho.

Os resultados das decisões to-madas nas Assembleias têm apon-tado o aperfeiçoamento e o forta-lecimento dos sistemas judiciais de cada um dos países integrantes da Rede, intensifi cando a comuni-cação entre os membros, e fomen-tado, cada vez mais, uma melhor capacitação dos aplicadores do Di-reito.

Além disso, cabe destacar que deve ser submetido à Assembleia-Geral um prévio informe da Junta Diretiva sobre a solicitação de ad-missão de novos membros.

Henry Molina é secretário-geral da Rede Ibero-americana de Escolas Judiciais (RIAEJ) e diretor da Escola Nacional da Magistratura da República Dominicana.

A RIAEJ aspira por ser

considerada, no âmbito da

capacitação judicial, como

um modelo de coordenação e

integração ibero-americana.