Brasil ignora mais uma vez chance de aproximação … · relevantes conquistas dos Estados Unidos...
Transcript of Brasil ignora mais uma vez chance de aproximação … · relevantes conquistas dos Estados Unidos...
Ano 5 | Nº 42 | 21 de novembro de 2008
Relacionamento bilateral
Brasil ignora mais uma vez chance de aproximação com a China
1
O mecanismo de Diálogo Estratégico estabelecido pela China com países considerados
parceiros estratégicos tem se transformado cada vez mais em melhor canal para
tratamento de assuntos econômicos e aproximação política. Estabelecido com
aproximadamente 10 países – entre eles, Estados Unidos, Japão, África do Sul, México,
Índia, Austrália, Alemanha e Brasil –, o Diálogo também pode ser interpretado como
termômetro de tensões e interesses de Pequim, ora como arena menos burocrática para
negociação de questões comerciais, ora como instrumento de pressão para inclusão de
temas na agenda bilateral e aprimoramento das relações diplomáticas.
Embora sua primeira implementação seja relativamente recente, realizada em 2005, tal
mecanismo já apresenta resultados significativamente positivos - como acordos bilaterais
e redução de barreiras comerciais - para aqueles parceiros que reconhecem sua
importância para o relacionamento com a China, sobretudo os Estados Unidos e União
Européia. Reconhecer importância significa regularidade de encontros e presença assídua
de autoridades de maior destaque da esfera governamental.
A receita para o melhor andamento das negociações é, em especial, entender que nada
substitui o contato direto e constante entre principais líderes do governo, uma vez que, na
China, respeito e amizade são particularmente prezados, afirma Henry Paulson, secretário
do Tesouro norte-americano. Paulson destaca ainda que visitas freqüentes ao país asiático
são fundamentais para entender o dinamismo da economia chinesa, bem como para
familiarizar-se com a perspectiva da China sobre temas em agenda. Entre as mais
relevantes conquistas dos Estados Unidos decorrentes do Dialogo Estratégico, podem ser
citadas a abertura do mercado chinês para as companhias norte-americanas de aviação
comercial, adoção de projetos nacionais de controle de emissão de dióxido sulfúrico pelo
governo chinês em dezembro de 2007 e acordo de proteção e incentivo a investimentos,
firmado em julho de 2008, a fim de tranqüilizar investidores norte-americanos face à
aprovação da nova legislação anti-monopólio da China e demais medidas restritivas de
acesso ao mercado chinês.
O secretário e o vice-primeiro-ministro Wang Qishan lideram as sessões do Diálogo que
ocorrem aproximadamente seis vezes ao ano em encontros presenciais e que contam com
a participação de todos os ministros relacionados a questões econômicas de ambos os www.cebc.org.br
Governo brasileiro desperdiça canais estratégicos ao aprofundamento das relações com a China
China injetará US$ 586 bilhões na economia para atenuar impactos da crise mundial
Obamania chega à China e mostra-se importante para vitória de Barack Obama nos Estados Unidos
Governo chinês confirma, mas não define diretrizes de reformas na zona rural
Dragonomics analisa a China sob efeitos da crise de liquidez internacional
Reavaliação do modelo de crescimento da China, por Roberto Dumas Damas, representante-chefe do Itaú BBA na China
Nesta edição
2
2Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Frente aos claros sinais de contração da demanda global e da economia doméstica no
terceiro trimestre de 2008, que registrou crescimento de “apenas” 9,9% comparados aos
11,5% no mesmo período do ano anterior, Pequim divulgou o maior pacote de incentivo
econômico de sua história em novembro, de gastos estimados em US$ 586 bilhões até
2010.
Os impactos da crise de liquidez global fizeram-se sentir na economia real chinesa ao longo
dos últimos meses. Além da desaceleração da demanda internacional em função da crise
creditícia, os já anteriores aumentos dos custos produtivos – mão-de-obra, insumos e
energia – e valorização do renminbi pressionaram os lucros de empresas chinesas
substancialmente, pressionaram taxa de desemprego do país e aceleraram processo de
fechamento daquelas menos eficientes, já aguardado por especialistas e pelo governo
chinês. Ainda no primeiro semestre, cerca de 67 mil empresas haviam sido fechadas – o
setor de brinquedos parece especialmente afetado, com suposto encerramento de
operações de 3,5 mil empresas. Tal cenário negativo foi responsável ainda pela
desaceleração do comércio da China com o mundo e queda significativa da produção
industrial no terceiro trimestre do ano.
Antes da aprovação do pacote de estímulo, Pequim já havia anunciado uma série de
medidas para manter aquecida a economia doméstica. Em outubro, o governo cortou taxa
de juros pela terceira vez em pouco mais de dois meses, para 6,66%, tendo também
diminuído em 0,27 pontos percentuais (p.p.) a taxa de depósito bancário, para 3,6%.
Também anterior ao pacote de novembro, o governo chinês divulgou novos investimentos
em infra-estrutura, com US$ 292 bilhões a serem utilizados em construção de ferrovias e
também manutenção de projetos de investimento previstos pelo 11º Plano Qüinqüenal. Em
relação à queda de preços, construção e demanda registrados pelo setor imobiliário em
diversas regiões do país, Pequim tomou medidas para atenuar oscilações no mercado de
imóveis destinados aos consumidores de menor renda, como redução de impostos sobre
compra de imóveis com menos de 90m² e de juros incidentes sobre empréstimos
hipotecários.
países. Duas vezes ao ano os presidentes da China e dos Estados Unidos participam das
reuniões do mecanismo.
O México, que recentemente aderiu ao mecanismo oferecido pela China, entendeu a
importância de manter diálogo estratégico e regular com o país asiático. É o próprio
presidente Felipe Calderón quem lidera o mecanismo pelo lado mexicano e que inaugurou o
primeiro encontro durante sua visita à China em julho desse ano.
O Brasil, entretanto, parece ainda não entender as oportunidades atreladas ao título de
“parceiro estratégico” e opta por desperdiçar a possibilidade de discutir diretamente
assuntos relacionados à política monetária, balança comercial e barreiras, liberalização do
sistema financeiro chinês, energia e meio ambiente – temas usualmente presentes em
encontros do Diálogo.
Para a maior parte dos parceiros denominados estratégicos, o mecanismo não é o único
canal de diálogo regular com a China. A União Européia faz uso de outros vários
mecanismos de periodicidade similar que, muitas vezes, são divididos por setor industrial
ou temas de interesse a fim de torná-los cada vez mais práticos e eficientes. No caso das
relações sino-brasileiras, foi estabelecida também a Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível
de Concertação e Cooperação (COSBAN). Desde o primeiro encontro, realizado ainda em
março de 2006 na China, não houve nenhuma outra reunião e mais um instrumento para
aproximação e cooperação entre os dois países caiu no ostracismo.
Encorajar a comunicação para atenuar o emaranhado burocrático, interesses conflitantes e
diferenças culturais é fundamental para o aproveitamento de oportunidades atreladas à
ascensão econômica e política da China, já o segundo maior parceiro comercial brasileiro. A
posição inerte do Brasil abre espaço para que demais países, atentos à relevância da China
no cenário internacional e doméstico, possam, em seu lugar, fortalecer seus laços com o
governo chinês. O Brasil ainda precisa entender que desprezar a China é apostar contra si
mesmo.
Crise
China lança maior pacote de estímulo econômico de sua história para conter impactos de crise de liquidez global
3
3Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
O pacote de US$ 586 bilhões será destinado a investimentos em infra-estrutura rural,
transporte urbano, reconstrução das áreas afetadas pelo terremoto de maio de 2008 e
desenvolvimento ambiental, como tratamento de esgoto e lixo. Ainda, estão previstas
medidas de estímulo à expansão do consumo interno que, em um país de 1,4 bilhão de
habitantes, continua ainda modesto. Dentre as políticas a serem implementadas tem-se
maiores gastos em educação, saúde e aumento indireto da renda familiar através de
subsídios à produção agrícola e às famílias urbanas de baixa renda, bem como via expansão
de fundos de pensão para empregados urbanos.
Sob perspectiva de impacto negativo da demanda global, o setor industrial também
recebeu incentivo através de mais abrangentes regras para abatimento de Impostos sobre
Valor Agregado (VAT, na sigla em inglês) que, segundo Pequim, irá poupar cerca de US$ 17
bilhões às empresas chinesas em 2009. Como medida imediata de apoio ao setor
exportador – que registrou queda no terceiro trimestre de 2008 de 3,3 p.p., para 23,1%,
em relação ao mesmo período de 2007 –, o Conselho de Estado anunciou elevação dos
incentivos tributários para 27,9% dos produtos chineses embarcados. A medida prioriza
produtos que obtiveram maior queda recentemente, como máquinas e produtos elétricos,
e foi interpretada como parte do esforço do governo chinês para manter a viabilidade de sua
indústria exportadora, reduzindo pressões sobre lucros empresariais e índice de
desemprego.
O pacote de estímulo à economia é, portanto, tentativa do governo chinês de oferecer
suporte à demanda doméstica e aumentar investimentos para garantir manutenção do
ritmo crescimento econômico. A maior parte de analistas acredita que o pacote de
novembro conseguirá manter o crescimento de 8% a 9% em 2009 – de acordo com
autoridades chinesas, crescimento inferior a 8% comprometeria a geração de empregos
necessária para a estabilidade social da do país. Apesar de a estimativa de crescimento do
PIB ser baixa em comparação às taxas de crescimento apresentadas recentemente pela
China, o cenário não é demasiadamente negativo, principalmente se comparado ao ritmo
de expansão de economias norte-americana e de demais países emergentes. Contudo, os
efeitos dos pacotes anunciados não serão imediatos, em especial face agravamento da
crise mundial, o que deverá encorajar novas propostas de estímulo e revisão de diretrizes
econômicas do país.
As conseqüências do modelo de crescimento chinês orientado para investimentos na
indústria pesada tem tido várias implicações locais e internacionais. Certamente esse
modelo leva a um cenário não ótimo em termos de crescimento econômico e geração de
empregos, além de impactar seriamente o setor energético mundial e o meio ambiente e
suscitar tensões comerciais de várias partes do mundo.
É notório que o governo central chinês tenha dado alguns passos na direção de mudanças
em seu modelo econômico de crescimento, ao mesmo tempo em que tem se mostrado
nitidamente preocupado com os impactos advindos de sua continuidade. O
rebalanceamento da economia chinesa é um assunto prioritário do governo central. O
Estado chinês quer que o crescimento econômico seja mais sustentável economicamente,
menos dependente de investimentos, menos intensivo em consumo de energia e matérias-
primas e cada vez mais sustentável ambientalmente, além de mais equânime em termos
de geração de empregos e distribuição de renda. Diversas medidas têm sido tomadas pelo
Por Roberto Dumas Damas¹
Modelo de crescimento econômico chinês: rebalanceamento
¹ Roberto Dumas Damas é representante-chefe do Itaú BBA na China, professor visitante do China Europe International Business School e mestre em economia pela Universidade de Birmingham.
Fonte: Citigroup
Obras de reconstrução pós-terremoto de Sichuan
Ferrovias
Transporte público urbano
Produção de energia
Infra-estrutura de rede elétrica
Total
58,3
29,2
17
62,3
17,5
184,3
29,2
47,7
26,9
114,5
29,2
247,5
87,5
47,7
29,2
114,5
32,1
311,0
Projetos 2º Sem. 2008 2009 2010
Projetos de investimento previstos pelo governo chinês (em US$ bilhões)
4
4Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
governo central em relação ao rebalanceamento de seu modelo econômico, procurando
torná-lo mais “consumption oriented”.
Neste artigo procuramos justamente explicar as razões que têm levado o governo central
chinês a mudar sua postura em relação ao seu modelo de crescimento. Não obstante,
dadas suas relações com outras esferas do poder (local, provincial etc), essa tarefa não
será simples.
Contabilidade do crescimento: De que forma a economia chinesa tem crescido e quais
fatores têm possibilitado esse crescimento acelerado? Em economia, crescimento
econômico deriva-se basicamente de 3 variáveis: Aumento do consumo, dos
investimentos e das exportações líquidas. No caso da China, sem dúvida a força motriz do
crescimento econômico tem sido o elevado nível de investimentos.
Como mostra a tabela 1, de 1996 a 2006, o nível da formação bruta de capital passou de
40,4% para 44,9%. Obviamente, esse grau de investimentos requer elevado nível de
poupança, que acreditávamos estar sendo gerado pelas famílias chinesas. Porém,
observamos que esta poupança recuou de 20,1% do PIB em 1996 para 15,3% em 2006.
Por outro lado, o nível de poupança das empresas, aumentou de 15,6% para 28,3%, no
mesmo período, tornando-se o principal responsável pelo crescimento dos investimentos
na economia da China.
Esse nível de poupança elevada das empresas, que é reinvestido no processo de produção,
se justifica em um cenário econômico de taxas de juros reais negativas, produto do sistema
cambial chinês que limita a atuação de sua política monetária. Num sistema cambial
pegged, com taxas de juros reais negativas e a não exigência de distribuição de dividendos
até 2008, permitiram que o nível de poupança das empresas crescesse acentuadamente
durante o período.
Uma das medidas estabelecidas pelo governo chinês para mudar o perfil de seu
crescimento econômico de “investment oriented” para “consumption oriented”, foi obrigar
as empresas listadas a distribuírem pelo menos 25% de seus lucros como dividendos, a
partir de 2008.
Na tabela 2 notamos que a contribuição da formação bruta de capital para o crescimento
econômico chinês foi significativamente maior durante o período 1993-2005, em
comparação com 1978-1993. Por outro lado, a contribuição da Produtividade Total dos
Fatores (PTF) declinou de 4,0% para 3,2%, do primeiro para o segundo período analisado.
Tabela 1
Tabela 2
Fonte: Rebalancing China’s Growth: Bert Hofman and Louis KujisDebating China’s Exchange Rate Polity - Ed. Morris Goldstein and Nicholas R. Lardy.Peterson Institute for International Economics.
Poupança Doméstica Bruta
Famílias
Empresas
Governo
Formação Bruta de Capital
40,7%
20,1%
15,6%
5,0%
10,1%
37,6%
16,3%
14,4%
6,9%
37,9%
36,9%
14,8%
15,3%
6,8%
35,1%
43,0%
15,4%
19,8%
7,8%
43,3%
50,6%
15,3%
28,3%
7,0%
44,9%
Ítem 1996 2000
Poupança e investimentos na China – (%) PIB
2002 2004 2006
Crescimento PIB
Emprego
Produtividade total de fatores
Formação bruta de capital
9,7%
2,5%
3,2%
4,0%
29,90%
9,6%
1,1%
5,3%
3,2%
36,80%
Fonte 1978-1993 1993-2005
Fontes do crescimento econômico chinês
Investimento / PIB
Fonte: Rebalancing China’s Growth: Bert Hofman and Louis KujisDebating China’s Exchange Rate Polity - Ed. Morris Goldstein and Nicholas R. Lardy.Peterson Institute for International Economics.
5
5Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Dentro desse contexto, percebemos que o crescimento econômico chinês tem se
sustentado muito mais pelo acúmulo de capital do que pelo aumento da produtividade
(PTF). Para que esse crescimento vigoroso continue, o nível de investimentos da economia
chinesa terá que se manter em ascensão, com impactos ainda maiores no mercado de
commodities e no meio ambiente.
Como mostra o gráfico 1 a seguir, de 1992 a 2006, a relação entre capital necessário e
produção (ICOR) aumentou de 2,6x para 4,2x. Ou seja, no mesmo período, a China
precisou de mais investimentos para gerar o mesmo nível de crescimento econômico - com
óbvios efeitos no meio ambiente e no mercado de commodities. Entretanto, um menor
nível de investimentos é mais consistente com a tendência demográfica da população e a
evolução da poupança interna chinesa, exemplos: nova legislação trabalhista, maior
governança corporativa nas empresas, aumento de dividendos, crescimento de
investimentos governamentais em saúde e rede social, sendo esse último um importante
fator de estímulo ao consumo das famílias chinesas.
Relações políticas – central vs. local: Muitas pessoas acreditam que o sistema
unipartidário do governo central da China exerce poderio total sobre todos os níveis de
governo. Nada mais equivocado. A habilidade de Pequim em impor unilateralmente seus
interesses por toda a nação é de certa forma limitada.
Em 1978, um programa de descentralização foi introduzido na China como forma de dar
aos governos locais e provinciais uma base sólida de receitas. Na prática, isso significava
que o sistema de impostos era provincial ou local, tendo o governo central que negociar
com os governos locais as divisões das receitas governamentais. Desta maneira, os
poderes locais passaram a desenvolver suas próprias bases de receitas, tornando-os cada
vez mais independentes dos cofres do governo central.
O processo de descentralização também resultou em relevante obstáculo às políticas
fiscais do governo central, uma vez que os governos locais costumeiramente ignoravam as
diretrizes macroeconômicas do poder central, muitas vezes indo contra as políticas
contracionistas impostas por Pequim como forma de suavizar os impactos dos ciclos
econômicos.
Ficava claro, portanto, que esse tipo de divisão suscitava um conflito intrínseco entre as
várias instâncias do governo. Ou seja, os governos locais enfrentavam o dilema de acatar
diretamente as ordens do governo central, o que eventualmente poderia não ser de
interesse econômico da província ou poderiam focar em seus interesses locais, desviando-
se dos planos e objetivos macroeconômicos impostos pelo governo central.
Para limitar essa dimensão de possibilidades de corrupção e da capacidade do poder central
em implantar sua política fiscal como instrumento de política econômica, o governo chinês
iniciou em 1994 seu processo de recentralização, transferindo o papel da receita
novamente para o governo federal. Antes da recentralização, a participação dos governos
locais na receita governamental era de quase 80%. Em 2004, no entanto, os governos
locais tiveram sua participação reduzida a 45%. Apesar desse decréscimo, os governos
locais continuaram responsáveis por quase 72% de todo o gasto orçamentário local. Ou
seja, mesmo com uma receita menor, Pequim continua impondo o fardo dos gastos com
² Economy, Elizabeth and Liebretahl, K. (2007) – “Scorched Earth – Will Environmental Risks in China Overwhelm Its Opportunities?” – Harvard Business Review – June/2007.
1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
ICOR – China
2,6
3,2 3,2
3,84,0 4,1
4,2
4,4
4,2 4,1
4,34,2 4,2
Fonte: ICOR - Incremental Capital Output Ratio = Fixed Asset Investment / ÄReal GDP
Assessing China’s Economic Rise: Strengths, Weakness and Implications - Albert Keidel - July/07
Gráfico 1
4,8 4,8
6
6Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
programas sociais nas costas dos governos locais. Dada essa pressão por receitas, diversos
oficiais locais não encontram outra alternativa a não ser ignorar as diretrizes do governo
central, quanto ao crescimento sustentável, a preservação ambiental e a administração
eficiente de recursos. As províncias prosseguem na política de “crescimento a qualquer
custo”.
O dilema existente entre os governos locais e o governo central em relação à “política de
crescimento a qualquer custo”, torna-se ainda maior devido à, muitas vezes, as promoções
de oficiais locais a cargos superiores serem baseada na performance econômica de suas
localidades². Apesar de Pequim impor condições e métricas de controle ambiental em suas
avaliações, os oficiais locais ainda preferem perseguir a política de crescimento a qualquer
custo, do que serem obrigados a fechar plantas industriais em suas províncias por não
estarem atendendo a diretrizes ambientais. Além disso, fechar indústrias significa
aumento do nível de desemprego e possibilidade de tensão social local - esta última
amplamente considerada pelo governo central na promoção dos oficiais locais a postos
mais elevados dentro do Partido Comunista da China.
É notória a intenção de Pequim em promover crescimento sustentável com menor impacto
ambiental e muito mais “consumption oriented”, entretanto o elevado grau de autonomia
dos governos locais, muitas vezes, torna complexo o cumprimento das diretrizes impostas
pela Capital.
Indústria pesada de capital intensivo: Apesar dos elevados níveis de investimentos na
economia chinesa, como força propulsora de seu crescimento econômico, por que será que
esses investimentos foram direcionados ao setor de manufaturas, mais especificamente à
indústria pesada?
Uma das explicações para a atração de investimentos para o setor manufatureiro,
certamente está atrelada ao nível da paridade da moeda chinesa. Uma moeda depreciada
afeta a lucratividade do setor exportador, e por sua vez atrai mais investimentos para esse
setor. Soma-se a isso a capacidade dos governos locais em proverem terras a preços
atrativos e a precária aplicabilidade das regulações de proteção ambiental na esfera local.
Investimentos em indústria pesada também são de certa maneira encorajados pelo
sistema financeiro chinês. As grandes empresas estatais (SOEs, na sigla em inglês),
geralmente indústrias, têm mais facilidade de acesso a empréstimos junto aos principais
bancos chineses. Estima-se que as Médias e Pequenas Empresas (SMEs, na sigla em
inglês) - significativamente mais atuantes no setor de serviços – apesar de responderem
por mais de 50% do crescimento econômico chinês, têm acesso a apenas 10% do total de
empréstimos bancários do sistema.³
Consumo de energia e impactos ambientais: Esse modelo de crescimento econômico,
baseado em investimentos em indústrias pesadas eletrointensivas, tem suscitado grande
volatilidade no mercado de commodities internacional e levantado questões quanto a sua
sustentabilidade e seus impactos nacional e internacional.
Como mostra a Tabela 3, em 2005 o setor industrial na China respondia por 64% de toda
energia consumida no país, enquanto que os setores comerciais, residenciais e de
transportes respondiam apenas por 4,7%, 12,3% e 12,8%, respectivamente.
³ He, Jianwu and Kujis, Louis (2007) – “Rebalancing China’s Economy – Modeling a Policy Package”- World Bank China Research Paper n°7 – September/2007.
Fonte: International Energy Agency, World Energy Statistics and Balances 2007.
Bergstein, C. Fred; Freeman, C.; Lardy, N.; Mitchell, D.J.(200*): “China’s Rise: Challenges and Opportunities” - Cap.7. Energy Implications of China Growth
Agricultura
Industrial
Comercial
Residencial
Transportes
Outros
4,6%
63,8%
4,7%
12,3%
12,8%
1,9%
7,2%
52,1%
3,0%
16,7%
18,5%
2,5%
4,9%
41,1%
6,8%
10,3%
36,9%
0,0%
0,9%
38,3%
17,7%
15,7%
26,9%
0,0%
Setor China Índia
Demanda de energia por setor em 2005 – (%)
Brasil Japão
Total (MM tons de equivalente óleo)
1,1%
26,8%
13,0%
16,8%
41,4%
0,9%
EUA
2,4%
37,8%
9,0%
17,1%
31,5%
2,0%
Mundo
890 199
2,3%
38,4%
8,1%
26,2%
22,7%
2,1%
Rússia
417 128 348 1.546 6.893
2,2%
32,4%
10,5%
22,0%
29,8%
0,0%
UE-27
1.249
Tabela 3
7
7Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
4 World Energy Outlook (2007)5 ibid1 Fernanda Ramone é Internacionalista, consultora, correspondente internacional da BandNews Tv e reside em Beijing há 4 anos.
O marketing virtual utilizado na divulgação da campanha de Barack Obama, pela
corrida presidencial norte-americana é apontada como um dos fatores que culminaram no
êxito da disputa. É também o instrumento responsável pela aproximação do candidato com
uma parcela da população chinesa, atualmente composta por 228,5 milhões de
internautas.
Os números ajudam a dimensionar em termos gerais o impacto da Obamania na China.
Segundo pesquisa on-line realizada pela The Economist, também os chineses preferem em
sua grande maioria (83%) Obama.
1Fernanda Ramone
Percepções e análise sobre a vitória de Barack Obama na China
Em termos de matriz energética, aproximadamente 80% da energia elétrica consumida
na China provém de termelétricas a carvão. É bem verdade que quase 70% da
necessidade desse insumo é produzida internamente, mas acidentes ou intempéries,
como a nevasca que assolou o país em janeiro de 2008 e os fechamentos de pequenas
minas de carvão em março do mesmo ano, limitaram acesso às termelétricas ou ao seu
destino final. De tal sorte que o crescimento do parque industrial chinês tem levado
também o país a importar mais petróleo de parceiros comerciais como Irã, Sudão e
Venezuela.
A dependência da China por petróleo importado saltou de 30% em 2002 para quase 50%
em 2006, tendo contribuído com 36% de crescimento da demanda mundial, comparado 4com 14% dos EUA , e culminando com toda a volatilidade observada no preço dessa
commodity no período.
Em termos ambientais, as emissões anuais de CO2 cresceram 30% desde o ano de 2002 e
agora representam duas vezes o nível de emissão dos Estados Unidos. Em 2007, a China 5ultrapassou os Estados Unidos e se tornou o maior emissor de CO2 em bases anuais .
Claramente existe uma série de estatísticas que corroboram o fato de que o governo chinês
deve adequar o seu modelo de crescimento econômico a um modelo menos intensivo em
investimentos e mais “consumption oriented”, com menos impactos nos mercados
energéticos e no meio ambiente.
Distribuição de renda e desigualdade social: Um relevante efeito colateral suscitado
pelo modelo de crescimento “investment oriented” adotado pelo governo chinês é a
incapacidade de grande geração de empregos, quando comparado a um modelo de
crescimento “consumption oriented”. Analisando a tabela 1, verifica-se que apesar
do expressivo crescimento econômico médio de 9,6% observado durante o período de
1993 a 2005, a geração de empregos correspondeu a apenas 1,1% desse aumento
em média. Ou seja, a adoção de um modelo de crescimento econômico de trabalho
intensivo ao invés de capital intensivo, teria a capacidade de migrar da zona rural para a
zona urbana mais trabalhadores, diminuindo significativamente o hiato existente entre as
rendas dessas classes, além de minimizar a possibilidade de crescentes tensões sociais
no país.
Um modelo de crescimento econômico chinês mais alinhado com as limitações de
matérias-primas e energia, mais inclinado a criação de empregos, mais “consumption
driven” e menos suscetível as oscilações econômicas internacionais, certamente se
desenvolveria de forma mais sustentável e sem dúvida seria verdadeiro “motor” para o
crescimento econômico mundial.
8
8Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Na esfera do Politburo, todavia, as expectativas eram contrárias. O Partido Comunista
Chinês se identifica com a real politik de livre-comércio dos republicanos em detrimento ao
protecionismo dos democratas. Especialmente em época de crise financeira global, quando
a importância das exportações, um dos pilares do rápido desenvolvimento econômico do
país, abrandou em outubro junto com a queda de 3,2% da produção industrial, pior índice
em sete anos.
Causa certo incômodo ainda as metas de Obama para países em vias de desenvolvimento
no que concerne às medidas para redução da poluição e promessas de implementar
padrões laborais e ambientais na esfera dos acordos comerciais. Sobretudo na semana da
reunião do G20 em Washington. O fórum de cooperação para tratar dos problemas
referentes ao sistema financeiro global e suas conseqüências, como as cotas para emissões
de gases de efeito estufa na atmosfera, onde a China já ocupa a primeira posição, seguido
pelos EUA.
Pequim valoriza os alicerces históricos e, sendo assim, a primeira visita do presidente
republicano Richard Nixon em 1972 e o estabelecimento das relações diplomáticas sino-
americanas, no contexto do cenário bipolar da Guerra Fria. Tal período foi marcado pelo
processo de liberalização e desenvolvimento das bases para a industrialização chinesa e,
em seguida, pelo estabelecimento do sistema industrial independente e bastante
diversificado. E graças às políticas de Deng Xiao Ping, implementadas durante os anos
seguintes, a economia chinesa conseguiu manter seu rápido crescimento.
As relações bilaterais nesta ocasião há tempos deixaram de ser consideradas pelos Estados
Unidos como resquício da configuração da nova ordem mundial graças à corrida chinesa em
reiterar sua posição no novo cenário. A aquisição da importância estratégica da China
aproximou os países no que tange, por exemplo, à natureza das relações. No momento em
que deixou de promover a cooperação exclusivamente em prol das relações internacionais,
passando ao advento mútuo dos interesses comuns apesar das suas diferenças. Além de
considerar as intenções de ambas as partes e a aproximação no cenário internacional.
Colégio Eleitoral GlobalSe o mundo inteiro pudesse votar
China
John McCainSenador norte-americano
pelo estado do Arizona
Barack ObamaSenador norte-americano pelo estado de Illinois
Partido Republicano Partido Democrata
Votos do colégio eleitoral: 1900McCain 17% / Obama 83%
Fonte: The Economist
9
9Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Tal cenário presenciaria os discursos de linha dura de Bush pai e Bill Clinton em relação à
China anterior à Organização Mundial do Comércio (OMC) e o tom mais moderado de
ambos proferido mediante a realidade da economia interdependente. Interdependência
esta que preparou o Sudeste Asiático no pós-crise financeira de 1997 para enfrentar a crise
atual e determinou o posicionamento da ação dos países asiáticos em bloco, unidos e
atuando em conjunto diante das mudanças, especialmente as de ordem protecionista.
Obama, o candidato classificado como “triplo A”, americano, com fortes conexões com a
África e Ásia (o padrasto viveu na Indonésia) pelo diretor da China National Association for
International Studies, Gao Zhikai, é também traçado como jovem e mais propício ao
comportamento aventureiro. Ademais também é considerado vulnerável às temáticas em
voga, como os direitos humanos e menos flexível às tentativas de entender as condições
dos países em desenvolvimento e civilizações antigas como a China.
As preocupações de entendimento confessáveis envolvem em especial a exportação de
material bélico norte-americano à Taiwan, que concatenaram na recente suspensão da
cooperação militar sino-americana, e os diálogos com Dalai Lama, que intrinsecamente
englobam a questão da liberdade do Tibet. Nos meandros mais reservados, a Obamania e o
sucesso atraído pela figura do candidato não se enquadram exatamente na conduta
aplicada na China. No país não existe espaço para a atuação de políticos prodígios pela
própria hierarquia do Partido Comunista, que elege e promove os líderes em processos que
percorrem décadas neste esforço de quase 30 anos de não personificar e não criar novos
mitos como o desencadeado pelo culto ao Mao.
De consumado, o cenário pré-posse registrou por enquanto o poder que a internet
desempenha no território chinês e o telefonema de felicitações do presidente chinês Hu
Jintao ao seu homólogo recém eleito, Obama. Durante a conversa houve entendimento de
que o relacionamento sino-americano é de grande importância para a promoção e
manutenção da paz, estabilidade e desenvolvimento mundial.
Reforma
Setor agrícola: De pilar do processo de modernização e abertura a fardo econômico
Símbolo de modernização durante fase inicial do processo de abertura da economia, o setor
agrícola da China atualmente evidencia fraquezas do modelo de crescimento do qual,
anteriormente, foi motor. Com intuito de atender a necessidade de novo salto de
produtividade agrícola, atenuar tensões causadas por confisco de propriedades, bem como
contribuir para redução da desigualdade entre zona urbana e rural, o 17º Comitê Central do
Partido Comunista aprovou, durante plenárias em outubro, pacote de reformas para o
setor.
As medidas a serem implementadas e a profundidade da reforma não foram publicadas
com clareza. Após enormes expectativas, o comunicado emitido ao término da reunião,
que se acreditava conter diretrizes para nova revolução no campo, pouco trouxe a respeito.
Oficialmente, apenas compromisso de dobrar a renda per capita na zona rural até 2020 foi
anunciado. A ausência de referências concretas elucida divisão dentro do próprio Partido -
entre membros que acreditam que a reforma poderá estimular surgimento de grandes
latifúndios e acelerar a migração urbana, e demais integrantes defensores de que a medida
é passo significativo para crescimento da produção de alimentos e necessária ao aumento
da renda campesina. Dessa forma, a opção pela omissão indica também característica
marcante de tomada e implementação de decisões na China: o gradualismo.
Sobre a esperada revisão da Lei de Administração de Terras, que estenderia ao campo
permissão de compra e venda de direitos de uso de propriedades já em vigor na zona
urbana desde outubro de 2007, não houve pronunciamentos oficiais além de promessas de
“implementação de sistema normativo e estrito de administração de propriedades rurais”.
Com eventual mudança da legislação, o governo central se comprometeria a facilitar tal
comercialização que, na prática, já acontece. Contudo, assim como tem sido desde a
descoletivização do campo ocorrida em 1978, as terras permaneceriam sob propriedade de
governos locais, mantendo intacta importante fonte de rendimento dessas autoridades –
freqüentemente governos locais autorizam desapropriação e venda de terrenos para
investidores imobiliários a preços significativamente superiores aos pagos em
indenizações aos antigos donos dos direitos de uso.
Carta da China 26
Leia mais
10
10Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Poucos dias após o término das reuniões, no entanto, alguns sinais de que a reforma de fato
havia sido aprovada começaram a aparecer. O governo da província de Sichuan anunciou a
abertura de mercado para comercialização dos direitos de uso de terras na capital da
província. Em seguida, autoridades do Partido Comunista realizaram pronunciamentos em
veículos de comunicação no país afirmando a criação de novos mercados de transação,
sem especificar prazos e localidades.
A maior inovação, até o momento, limita-se à comercialização de terras não agricultáveis,
que não mais precisarão ser retornadas ao governo antes da transferência do contrato de
uso de um indivíduo para outro. Tal mudança, já experimentada na província de
Guangdong, contudo, não soluciona um dos maiores motivadores de manifestações sociais
no país, confisco de terras por parte de autoridades locais sem indenizações justas. Por
reconhecer que o atraso da zona rural representa atualmente fonte de instabilidade política
e econômica no país, o governo central tem adotado várias medidas de forma a tentar
suavizar tensões. Além dos planos “Go West” e “Go Northeast”, que objetivam a
revitalização e desenvolvimento de novos pólos industriais, foram implementadas
educação básica gratuita no último Plano Qüinqüenal (2006-2010), política de facilitação
de crédito para residentes no campo e créditos específicos para consumo de bens
supérfluos (como eletrodomésticos). Ainda, expansão do número de agências bancárias,
recapitalização do Agricultural Bank of China em US$ 20 bilhões e criação de órgão
específico para cuidar de distribuição e qualidade da água no campo também fazem parte
das políticas de melhorias no campo. Tais iniciativas, contudo, não atacam diretamente e
de forma eficaz os maiores problemas da zona rural gerados pelo próprio modelo de
desenvolvimento adotado pelo país: abuso de poder por parte de autoridades locais
desigualdade de renda e permanência de sistema de produção de pequena escala, que não
atende ao imperativo de crescimento do índice de produtividade do país e aumento de
rendimentos dos 750 milhões de chineses da zona rural.
Durante o último mês de tempestades financeiras nos afastamos de prover uma visão
compreensiva do cenário para a China. Nossa hesitação reflete, em parte, grau de
incerteza em relação às condições domésticas e, em parte, incerteza mais séria sobre o
quão ruim a economia global iria ficar. O maior problema, no entanto, foi que a atual crise
suscita amplos questionamentos sobre a estrutura da economia global e a relação da China
com a mesma, que deve perdurar durante a próxima década e não apenas nos próximos
18-24 meses. Nós queríamos ter certeza de que tínhamos a estrutura conceitual para
permitir que nossos leitores pudessem se posicionar propriamente no curto e no longo
prazo. O artigo de hoje tem o objetivo de esboçar essa estrutura, a qual esperamos que
permita aos nossos leitores interpretarem apropriadamente as manchetes
desesperançosas que estão vindo da China. Notas adicionais durante as próximas semanas
irão preencher alguns detalhes técnicos.
Principais visões de curto prazo: Iremos começar apresentando, de forma até
dogmática, nossas breves respostas às perguntas que vimos serem mais freqüentemente
levantadas nas últimas semanas. Elas podem ser resumidas à seguinte visão: a economia
chinesa está desacelerando devido à crise global e por razões de ciclos domésticos.
Contudo, a desaceleração será modesta e simultaneamente irá prover oportunidade bem-
vinda e necessária à consolidação de indústrias, ao contrário de impor risco mais
existencial. Alguns problemas setoriais – em especial relativos a propriedades de alto valor
agregado e exportações de baixo valor agregado – tenderão a erodir nos próximos anos os
lucros bancários de seu alto nível atual. No entanto, com possível exceção de um ou dois
bancos pequenos e de pouco capital, o sistema financeiro não enfrenta nenhum risco
significativo em sua folha de balanço. Entretanto, esperanças de que a demanda da China
irá substituir a decrescente demanda da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OECD, sigla em inglês) e resgatar o mundo da recessão irão provar-se
Após a tormenta: China depois da crise do crédito7Arthur Kroeber
7 Arthur Kroeber é co-editor do China Economic Quarterly e diretor da Dragonomics Research & Advisory, empresa de pesquisa especializada em economia chinesa.
11
11Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
infundadas. Ainda, os preços de commodities acabaram incorporando otimismo do
crescimento da demanda na China no médio prazo e precisarão de reavaliação para baixo
mais ampla.
Agora, em detalhes:
1) Leve aterrissagem para o crescimento chinês: Nós esperamos que a China irá
registrar crescimento real do PIB de cerca de 9,5% em 2008, seguido por crescimento
aproximado de 8% a 8,5% em 2009 e 2010. Essas taxas de crescimento estão
consideravelmente abaixo dos 11% e 12% dos últimos dois anos, entretanto, são
expressivas se comparadas a qualquer outro padrão razoável, e apenas um pouco inferior
da tendência das taxas no longo prazo. Elas são sustentadas pelas tendências das taxas de
demografia, produtividade e urbanização. Os problemas estruturais que contribuíram para
as duas recessões chinesas anteriores (1989-90 e 1998-99) simplesmente não existem
mais. Ainda, a desaceleração cíclica será mais branda que as anteriores.
2) Descolamento da crise financeira global: O impacto financeiro direto da crise
financeira global na China será modesto devido ao isolamento e insulamento do sistema
financeiro chinês, que permanece voltado ao âmbito doméstico. O impacto econômico mais
amplo terá origem na desaceleração da demanda global agregada que já reduziu
significativamente o volume de exportações chinesas. Entretanto, enquanto produtora de
baixo-custo da maioria dos produtos que exporta, a China está em posição favorável ao
aumento de sua participação no mercado durante a desaceleração, significando que a
queda nas exportações e de investimentos relacionados às mesmas, não será catastrófica.
Ainda, a desaceleração global também irá diminuir o preço de commodities, fator
determinante na pauta de importações chinesa. Então, enquanto o superávit comercial já
atingiu provavelmente seu valor máximo, seu declínio – e impacto negativo no crescimento
do PIB – será provavelmente lento.
3) Desequilíbrios domésticos chineses levam a desequilíbrios externos, não o
contrário: Olhando de fora para dentro, a China é freqüentemente descrita como
economia puxada pelas exportações, fortemente dependente da demanda externa, da
qual tira proveito por meio de taxa de câmbio desvalorizada. O principal desequilíbrio é
externo e, portanto, a China está vulnerável à desaceleração da demanda externa. Nós
discordamos fundamentalmente dessa visão, uma vez que a China é uma grande economia
continental e não uma economia aberta e pequena fantasiada por economistas. Nós acreditamos que é melhor olhar a China de dentro para fora. De acordo com essa
perspectiva, o principal desequilíbrio é a taxa de poupança extraordinariamente alta, o que
tem sido ultimamente reflexo da ineficiência de sistemas financeiro e fiscal em transformar
voluptuosas poupanças governamentais e corporativas (lucros e arrecadações tributárias)
em consumo privado ou do governo. A alta taxa de poupança provoca lacuna entre
poupança/investimento, expressa no superávit comercial, com a taxa de câmbio
desvalorizada desempenhando papel exacerbador, e não causal. Atual política tem como
objetivo melhorar a eficiência dos sistemas financeiro e fiscal, e conforme esses sistemas
forem apresentando melhorias ao longo dos próximos anos, o superávit comercial (que já
atingiu seu ponto máximo) irá manter-se constante ou cair modestamente em termos
absolutos, declinando em relação ao PIB.
4) Melhorias na eficiência espalham más notícias para a demanda de
commodities no curto prazo: Entre 2002 e 2007, crescimento do PIB chinês acelerou de
8% para 12%, enquanto a intensidade de recursos para o crescimento (volume de recursos
utilizados na produção de cada dólar gerado pelo PIB) também aumentou – fenômeno que
chamamos de “dupla aceleração”. Como resultado, a demanda chinesa total por recursos
aumentou dramaticamente e tal crescimento foi refletido nos preços das commodities.
Estamos agora entrando em período em que o PIB irá desacelerar para cerca de 8% e no
qual os ganhos de eficiência do mercado e das políticas tenderão também a diminuir o
aumento da intensidade de recursos para o crescimento – em outras palavras, “dupla
desaceleração”. Na medida em que os preços das commodities incorporaram uma visão do
crescimento da demanda baseada nos últimos cinco anos de “dupla aceleração”, precisam
ser revistos agora, para englobar a “dupla desaceleração”. De médio a longo prazo, no
entanto, os processos de industrialização e urbanização da China, que não estão nem
próximos de terminarem, suportam tendência de alta de preços das commodities.
5) Melhorias na eficiência irão levar a consolidação industrial: Nós já ouvimos
muitas notícias sobre fechamento de fábricas no sul, na região do delta do Rio Pérola,
12
12Edição Nº 40 |
www.cebc.org.br
centro produtivo de manufaturas leves, e estamos começando a ver notícias sobre
falências empresariais mais adiante. Nós desaconselhamos os leitores a igualarem
fechamento de fábricas e falências empresariais em razão de mal-estar econômico. Maior
parte das indústrias chinesas é altamente fragmentada e muitos setores industriais estão
desordenados em produtores de pequena escala que operam no alto da curva de custos e
com baixa eficiência. Muitas dessas pequenas firmas deverão deixar os negócios e sua
capacidade produtiva será consolidada por produtores maiores e mais eficientes.
Estatísticas referentes a remuneração no país sugerem que o mercado de trabalho tem
operado relativamente apertado, o que significa que essa consolidação poderão ocorrer
sem provocar aumento do desemprego a níveis socialmente arriscados. Comparado à
grande reestruturação do setor estatal entre 1995 e 2005, que resultou na perda de 50
milhões de empregos, o ajuste que está por vir será relativamente indolor.
6) Propriedade: problemas no mercado mais sofisticado; demanda sólida por
propriedades mais baratas: Destinaremos uma nota especial para o setor imobiliário,
portanto, não iremos tratá-lo aqui com detalhes. Contudo, o mais importante a ser
lembrado é que a China possui em essência dois mercados imobiliários. O mercado de
propriedades de baixo custo está solidamente baseada na geração anual de
aproximadamente 4 milhões novos de lares urbanos, majoritariamente de rendimentos
modestos. A outra parte é precariamente fundamentada em rendimentos crescentes de
residentes urbanos já estabelecidos, e contém significativo componente especulativo. Em
ambos os segmentos existem lacuna a ser compensada e antecipamos que as noticias do
setor imobiliário permanecerão ruins nos próximos 6 a 9 meses. Entretanto, a lacuna
inferior do mercado será compensada relativamente rápido, e com ajuda de políticas
governamentais para construção, ainda na segunda parte de 2009. Por outro lado, a
especulação no mercado de imóveis destinado a consumidores de alta renda –onde a maior
parte das empresas listadas opera – deverá continuar em 2010.
7) Crescimento do lucro dos bancos irá erodir, no entanto risco nos balanços é
pequeno: Pessoas que relacionam o sistema bancário chinês de hoje com aquele de uma
década atrás, ou ao japonês na década de 80, simplesmente não sabem sobre o que estão
falando. A taxa estrutural de crescimento do PIB chinês é o dobro do que a do Japão
registrou na década de 80, os valores de ativos estão longe de atingir alturas vertiginosas
observados durante a bolha japonesa e a maior parte do credito bancário chinês ainda
destina-se a projetos industriais produtivos e não ao mercado imobiliário não produtivo.
Atrevemos-nos a dizer que, desajeitados como eles são, os bancos chineses estão bem
melhor preparados do que suas contrapartes internacionais e melhoraram muito na última
década. Créditos irrecuperáveis correspondem hoje a aproximadamente de 5% dos ativos,
comparados aos cerca de 50% dos ativos em 1997. Mesmo que a inadimplência do setor
imobiliário e vulnerabilidade das indústrias exportadoras aumentem o nível de créditos
irrecuperáveis para 10-12% nos próximos anos, o que é possível, o risco do sistema
bancário chinês está em uma ordem de magnitude menor do que esteve no final da década
de 90 e pode facilmente ser absorvido pelos lucros dos bancos, que são bem altos desde
2005. Alguns bancos pequenos e fracamente capitalizados, de maior exposição ao
mercado imobiliário em Guangdong, Pequim e no leste da China, podem estar indo na
direção de problemas sérios; no entanto, o resultado provável é que eles serão
simplesmente englobados por instituições maiores.
Entendendo os ciclos econômicos chineses: Nossas visões de curto-prazo são
condicionadas à nossa percepção de como a economia chinesa funcionará no longo-prazo.
Visto que o valor das exportações hoje corresponde a 37% do PIB e a conta-corrente
excede em 10% o PIB, convencionou-se ver a China como uma economia movida por
exportações, altamente vulnerável a desacelerações na economia global. Nós acreditamos
que esta é uma concepção errônea e que visão mais ampla dos ciclos econômicos chineses
é melhor ponto de partida.
A figura 1 mostra que nas três décadas da era de reforma econômica chinesa, a
contribuição das exportações líquidas explica muito pouco os três maiores períodos de
aceleração (começados em 1983, 1993 e 2003). A maior variável liderando a transição
entre boom e (relativo) declínio é o investimento doméstico. Mesmo nos últimos três anos,
quando as exportações líquidas fizeram sua maior contribuição para o crescimento,
adicionaram apenas 2,3 pontos percentuais (p.p.) de crescimento, comparadas aos 9 p.p.
da demanda doméstica. O poder explicativo das exportações líquidas na equação da
economia chinesa simplesmente não é tão grande.
O que causou as duas últimas aterrissagens bruscas? Em cada caso, houve uma tripla
maldição, de desaceleração cíclica, choque externo e um severo problema estrutural. Em
1989, a alta inflação de anos anteriores teve de ser reduzida por política monetária mais
restritiva e crescimento mais lento (a desaceleração cíclica). O choque externo foi o
protesto político da Praça de Tiananmen, reflexo de profunda divisão entre a liderança
acerca da velocidade e natureza das reformas política e econômica. O maior problema
estrutural era as duas vias de precificação: naquele estágio relativamente inicial da
transição da economia planejada para economia de mercado, a maioria das commodities 13
13Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Para uma visão mais ampla, nos voltamos à figura 2, que é um dos nossos gráficos mais
utilizados e nos desculpamos aos leitores de longa data por lhes infligi-la novamente. Ela
mostra duas estimativas da taxa de crescimento do PIB chinês desde 1980. A linha verde
mostra números oficiais, enquanto a linha vermelha apresenta estimativa diferente
calculada pelo Dragonomics com base nos dados de gastos, que mostram de forma mais
acurada a volatilidade escondida pelos números oficiais “politicamente” tratados. Pelos
dados oficiais, a taxa de crescimento médio da China entre 1980 e 2007 foi de 9,9%,
enquanto por nossas estimativas revisadas a taxa de crescimento médio é cerca de 1 p.p.
mais baixa.
Como o gráfico deixa claro, a China passou por duas grandes recessões nas últimas três
décadas: uma centrada em 1989 e a outra por volta de 1998. Em cada caso houve cerca de
1 ano de crescimento significativamente abaixo da tendência (-2% em 1989 e por volta de
5% em 1998, de acordo com nossas estimativas). As taxas médias de crescimento dos
cinco anos para os períodos centrados nestes dois marcos (1987-1991 e 1996-2000) foram
acima de 8% pelos números oficiais e 6,2% e 6,4%, respectivamente, por nossas
estimativas mais conservadoras. Isto nos permite, então, dar uma definição para
aterrissagem brusca, estilo chinês: um ano de crescimento muito lento e uma taxa
média de crescimento em 5 anos de 6,2% a 6,5%. Em outras palavras, aterrissagem
brusca na China simplesmente não é tão dura pelos padrões da maioria de outros países e,
como veremos em um momento, nós não acreditamos que a chance de aterrissagem
brusca neste momento seja muito alta.
Figura 1
1978 - 82
14,0
12,0
10,0
8,0
6,0
4,0
2,0
0
1983 - 87 1988 - 92 1993 - 97
Contribuição para crescimento do PIB – De 1978 a 2007
-2,01998 - 02 2003 - 07
Exportações líquidas Formação bruta de capital Gastos em consumo final
Figura 2
Crescimento do PIB – De 1980 a 2010
10,0
8,0
6,0
4,0
2,0
-2,0
0
Oficial Estimativa do Dragonomics
12,0
14,0
16,0
1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010
1987-1991
Dragonomics 6,2Oficial 8,1
1996-2000
Dragonomics 6,4Oficial 8,6
14
14Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
possuía tanto preço planejado quanto de mercado. Tal sistema criou inúmeras
oportunidades para arbitragens e corrupção oficial, além de garantir sistema ineficiente.
Uma das conseqüências imediatas da crise de 1989 foi o consenso da liderança chinesa de
que a reforma de preços precisaria ser acelerada e, em meados dos anos 90, a maioria dos
preços – com exceção de commodities industriais mais importantes – era determinada pelo
mercado. Desde então, tais commodities industriais têm sido progressivamente
liberalizadas, ainda que de forma incompleta.
Em 1998, houve desaceleração cíclica em decorrência de adoção de política monetária
contracionista imposta em 1994 para restringir o boom de investimentos do início dos anos
90. O choque exógeno foi a crise financeira asiática, que resultou em repentina e severa
revalorização do renminbi contra outras moedas asiáticas e levou a crescimento das
exportações a zero. Já o problema estrutural foi existência de setor industrial estatal sólido
e ineficiente, mantido vivo por sistema bancário crescentemente precário. Em 1998, quase
metade de todas as estatais reportava prejuízo e os lucros agregados da indústria chinesa
eram de cerca de 1% do PIB, valor tristemente baixo. Créditos irrecuperáveis estavam
próximos de 50% do ativo dos bancos. Todo setor estatal representava uma draga ao
crescimento de produtividade nacional. A solução era reestruturação industrial massiva -
que resultou em eliminação de 50 milhões de empregos industriais no setor estatal entre
1995 e 2005 - e reestruturação e recapitalização do sistema bancário - para que este não
fosse mais obrigado a prover empréstimos de “bem-estar” para empresas insolventes,
mas pudesse se focar na função clássica do modelo bancário de desenvolvimento industrial
do leste asiático: fornecer crédito barato a pequenas indústrias promissoras.
Quando examinamos hoje as circunstâncias para avaliarmos o risco de “aterrissagem
brusca”, encontramos clara desaceleração cíclica e o choque externo é óbvio. No entanto,
os problemas estruturais que exacerbaram as desacelerações anteriores são notáveis por
sua ausência. Os preços, com exceção de alguns poucos preços de energia, são
fundamentalmente determinados pelo mercado. A indústria chinesa é agora mistura muito
mais saudável de empresas estatais de grande escala e empresas privadas de pequena
escala - lucros industriais elevaram-se para cerca de 11% do PIB em 2007, dos quais
quase 5% representam lucros do setor estatal (figura 3). Bancos chineses têm sido
largamente lucrativos ao longo dos últimos anos e agora têm cerca de 20% de seu portfólio
de empréstimos voltados a consumidores; os empréstimos industriais não são disfarçados
como empréstimos de “bem-estar”, mas empréstimos verdadeiros para empresas
conscientes e mais eficientes. A exposição dos bancos ao superaquecido setor imobiliário é
significante, entretanto, deve causar efeito negativo nos lucros, e não erosão dos balanços.
O mercado de trabalho é um dos mais flexíveis do mundo, mesmo com os esforços recentes
para fortalecer a proteção aos trabalhadores.
E por aí vai: para onde quer que se olhe, procuram-se em vão as rigidezes sistêmicas que
tendiam a agravar desacelerações passadas. Ao invés disso, encontram-se padrão
consistente de alto crescimento de produtividade e flexibilidade tanto no setor privado
como nas políticas do governo, bem como enormes reservas monetárias que podem ser
utilizadas para mitigar efeitos da desaceleração. Prima facie, portanto, a probabilidade de
“aterrissagem brusca” parece extremamente pequena, a maior probabilidade é de que
tendências de demografia favorável, alta produtividade e catch-up tecnológico vão
permitir aterrissagem suave com alguns anos de taxas de crescimento apenas
modestamente abaixo da tendência de longo prazo (ou seja, de 8% a 8,5%, comparados
com a tendência de longo prazo de 8,5% a 9,5%).
Lucros industriais
1200
1600
0
2000
400
800
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007* 2008**
2400
6%
8%
0%
10%
2%
4%
12%
bilhões de RMB Lucros/PIB
Lucro industrial Setor estatal Lucros/PIB *estimativa ** dados de janeiro a maio
Figura 3
Passando ao lado doméstico, é mais uma vez difícil ficar muito preocupado. A dívida
doméstica do governo é de apenas cerca de 15% do PIB, abaixo dos 20% do início da
década. Receitas cresceram constantemente em relação ao PIB e houve superávit fiscal de
quase 1% do PIB em 2007 - superávit igual ou superior é esperado para este ano (figura 5).
Como vimos, empresas são muito lucrativas e mesmo se os lucros corporativos em relação
ao PIB decrescessem para metade de seu nível atual, o setor corporativo ficaria em forma
bem melhor do que esteve durante a recessão de 1997-1999. Já as famílias chinesas de
nenhuma maneira registram excessos: a poupança doméstica equivale a cerca de 75% do
PIB e o valor total dos empréstimos hipotecários feitos ao longo dos últimos sete anos é de
apenas 35% do valor total de vendas de imóveis no mesmo período. Os setores
governamental, corporativo e imobiliário parecem providos de liquidez e apenas
conservadoramente alavancados.
Dívidas externas registradas podem ser
triviais, mas e quanto às dívidas não
registradas? Não temos maneira de
saber, claro, mas dado o nível trivial de
dívidas registradas, temos que presumir
níveis gigantescos de dívidas escondidas
para que se tornem problema. De
qualquer forma, fica evidente de que
com superávit em conta corrente
superior a 10% do PIB, a China não
depende de capital estrangeiro
emprestado para financiar seus
investimentos. Assim, o risco de fuga
súbita de empréstimos estrangeiros
ocasionando crash de investimentos
domésticos é negligenciável.
Uma questão final é se a aparente saúde da economia chinesa mascara dependência
excessiva em dívidas que, caso precisem ser honradas às pressas, podem fazer parecer
repentinamente que as coisas são muito piores. Afinal, as economias do sudeste asiático e
a Coréia do Sul pareciam em boa forma no início de 1997 e em péssima forma no fim do ano
graças ao acúmulo insustentável de dívidas. Estamos bastante convencidos, contudo, de
que a China está em posição muito mais sólida de que as economias na Crise Asiática.
A forma mais arriscada de dívida é empréstimo em moeda estrangeira, uma vez que o valor
nominal em moeda local desta dívida pode explodir caso a mesma veja-se sobre ataque. A
figura 4 sugere que este não é grande problema: os empréstimos totais da China ao final de
2007 representavam menos de 12% do PIB, com dívidas de curto-prazo de apenas 7%, e
não houve aumento significativo nos níveis gerais de empréstimos nos últimos seis anos. O
aumento de dívidas de curto-prazo representa aumento em crédito de comércio,
equivalente a cerca de um terço de todos os empréstimos externos. Estes últimos
cresceram seis vezes desde 2002, enquanto valor total de comércio triplicou. As dívidas
externas registradas por empresas não financeiras da China, na realidade, caíram de US$
10 bilhões no fim de 2002 para US$ 4,6 bilhões em março de 2008, presumivelmente
refletindo o fato de que, se as empresas chinesas necessitam de moeda estrangeira, não
precisam mais pegar emprestado e podem simplesmente comprá-la. A dívida externa
registrada por instituições financeiras chinesas subiu de US$ 33 bilhões em dezembro de
2002 para US$ 83 bilhões em março de 2008, porém, estes números representam apenas
1,6% e 1,4% da base de depósito doméstica nesses dois meses, respectivamente.
15
15Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Dívida externa/PIB
14%
12%
10%
8%
4%
6%
0%
Figura 4
16%
18%
20%
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
20
05
20
06
20
07
2%
Total Longo Prazo Curto Prazo
Receita do governo e equilíbrio orçamentário - Part. (%) PIB
12%
16%
0
20%
4%
8%
1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
24%
Receita do governo Equilíbrio Fiscal
Figura 5
- 4%
Tudo sob controle, porém sem ter aonde ir: Em resumo, a estrutura da economia
doméstica chinesa é razoavelmente sólida, a dependência de exportações para alimentar
crescimento não é excessiva, nível de dívidas é reduzido e a liquidez é alta. Não há
nenhuma razão em particular para acreditar que – afora uma catastrófica depressão global
– a China irá enfrentar nada pior que aterrissagem suave, o que irá provocar alguma
consolidação industrial bem-vinda e investimentos mais eficientes. A única nota de
precaução significante é que, retornando à figura 2, parece evidente que a China tende a
incorrer em ciclos de cinco anos de boom e retração razoavelmente pronunciados. Se o
precedente se mantiver, acabamos de passar por cinco anos de boom e estamos agora
entrando em cinco anos nos quais taxas de crescimento devem manter-se ao redor de 8% e
9%. Previsões baseadas nos últimos cinco anos – a exemplo das relacionadas à demanda
por commodities -, são, provavelmente, otimistas demais.
Um grupo final de questões, que podem apenas ser inicialmente apresentadas aqui, é o que
a China irá fazer com sua montanha de dinheiro - US$ 1,8 trilhão em reservas oficiais e
outros US$ 500 bilhões, aproximadamente, em reservas estrangeiras pertencentes ao
fundo soberano, China Investment Corporation (CIC), e bancos comerciais - e qual papel a
China irá assumir face à reestruturação da ordem financeira internacional que deve ocorrer
uma vez estabilizada a atual crise de crédito. Parece óbvio que a China deve tornar-se
compradora massiva de ativos globais (além de títulos de baixo retorno do Tesouro norte-
americano) ao longo dos próximos anos e que sua posição como maior nação credora vai
lhe dar voz considerável na formação de novos arranjos financeiros e monetários. No
entanto, o que parece óbvio pode não ocorrer de fato.
Primeiramente, acreditamos que o crescimento vertiginoso da posição de ativos
estrangeiros da China – que alcançou taxa anualizada de US$ 800 bilhões em junho e
excedeu largamente o que pode ser creditado ao comércio normal e entrada de
investimentos diretos – deve desacelerar e até mesmo reverter-se. Grande parte deste
aumento refletia entrada de capital especulativo que está prestes a desaparecer agora que
o crescimento chinês está arrefecendo e o resto do mundo, ao invés de vender dólares para
comprar Renminbi que se valoriza, está desesperadamente comprando dólares. Se entrada
de capital especulativo tornar-se negativa e superávit comercial começar a declinar, como
esperamos que aconteça, é concebível que a China verá suas posições em moeda
estrangeira contrair-se no próximo ano. Dado o crescente custo de esterilizar estes
influxos, tal desenvolvimento dificilmente será mal-visto em Pequim.
Em segundo lugar, as opções da China por diversificar seus investimentos em detrimento
dos títulos do Tesouro norte-americano são limitadas. O país sofreu severas perdas nos
poucos investimentos no setor financeiro de países da OCDE: o CIC assistiu o valor de suas
posições na Blackstone e Morgan Stanley erodirem-se em mais de dois terços, enquanto a
Ping An Insurance viu três quartos de seu lucro serem levados por investimento inoportuno
no Banco Fortis. Dadas estas desventuras, é improvável que empresas chinesas irão
ativamente às compras no porão de barganhas do setor financeiro global.
Ativos de recursos estratégicos irão continuar a atrair a atenção, claro, mas a perseguição
de alvos marginais e arriscados pode muito bem desacelerar agora que os preços de
commodities estão caindo. Investimento em portfólio é outra opção. A State
Administration of Foreign Exchange Investment Co. (SAFE Investment Co.), subsidiária do
Banco do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) que é, na verdade, o segundo (e mais
disfarçado) fundo soberano, efetivamente garantiu posição no índice do mercado de
equities britânico ao comprar de 0,5 a 1% de praticamente todas as maiores companhias
listadas em Londres. Pode também ter posições similares em outros mercados: a única
razão pela qual sabemos sobre suas posições britânicas foi o excelente trabalho de detetive
do Daily Telegraph. No curto prazo, contudo, quanto dos mercados financeiros de outros
povos a China pode comprar sem provocar uma reação política indesejada?
Então, esperamos que a China continue a comprar montes de papéis do Tesouro norte-
americano e assim subscreva, a taxas míseras de retorno, a reconstrução do arriscado
setor financeiro norte-americano. Certamente isto lhe dará grande voz em determinar
quaisquer novas regras do setor financeiro internacional que sejam desenvolvidas uma vez
que o desastre do atual engavetamento mundial seja superado? Talvez, mas isto iria
requerer que a China definisse seus interesses e metas em tal ordem. Não deve haver mais
que meia-dúzia de oficiais sênior no governo chinês com conhecimento suficiente acerca do
funcionamento de mercados financeiros internacionais para contribuir substantivamente
ao novo desenho monetário global. Como ressaltamos em nota anterior, a probabilidade do
centro de gravidade financeira mundial mover-se para o leste, em direção ao Renminbi, é 16
16Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
praticamente zero, visto que a China está a décadas de possuir a profundidade de
mercados de dívida ou a abertura formal a influxos de capital que fariam tal movimento
possível. Mais provavelmente, os líderes chineses irão pressionar para estabilidade como
critério chave para arranjos financeiros internacionais, sem necessariamente conseguir
especificar em detalhes como isto seria atingido. Se sugerido que a China poderia
contribuir para a estabilidade ao agir mais agressivamente na tentativa de limitar
desequilíbrio externo – assim reduzindo sua “gula por poupança” que ajudou a alimentar
excessos de crédito do mundo rico – a resposta de Pequim é provavelmente pouco
entusiástica. A China pode ter imensa reserva de ativos estrangeiros, contudo, precisa
ainda demonstrar capacidade de fazer estas reservas gerarem retornos razoáveis ou de
aumentarem a credibilidade de Pequim enquanto grande player na criação de regras
financeiras internacionais.
17
17Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
© Dragonomics Research & Advisory. Esta análise foi preparada a partir de fontes de dados que nós acreditamos serem confiáveis, mas nós não fazemos nenhuma representação de sua precisão ou integridade. Esta análise é publicada apenas para a informação dos clientes da Dragonomics Research & Advisory e não é uma oferta de venda ou compra, nem uma solicitação de oferta para a oferta de compra ou venda de um derivativo. Esta análise não deve ser interpretada como a provisão de investimentos para nenhum estado, país, ou jurisdição nas quais esses serviços sejam ilegais. As opiniões e estimativas expressadas nessa análise constituem nossa julgamento dos dados que nos foram apresentados e são sujeitos à mudança sem notificação prévia.
Reprodução autorizada de artigo do Dragonomics Research & Advisory (www.dragonomics.net) publicado em 15.10.2008. O conteúdo não reflete necessariamente a posição do CEBC nem de seus associados. Os editores da Carta da China traduzem os artigos publicados no convênio CEBC-Dragonomics Research & Advisory sem alteração ao conteúdo original.
Curtas
Defesa comercial
Aviação
Sistema bancário
Brasil amplia investigações antidumping e aplica medidas provisórias sobre fibras de viscose da China, Taiwan e Áustria
China fecha maior contrato internacional de venda de aeronaves
Internacionalização de bancos chineses: Aprovada entrada do Bank of China no Brasil e ICBC abre quatro agências no exterior
A CAMEX aprovou, em 03 de outubro de 2008, tarifas antidumping de validade de seis
meses, sobre fibras de viscose com procedência da China, Taiwan e Áustria. Após
verificação preliminar de prática de dumping e prejuízo à indústria nacional, foram
aplicadas tarifas provisórias de US$ 0,33/kg para produtos provenientes da Áustria, US$
0,39/kg de Taiwan e US$ 0,18/kg da China, que irão perdurar até o final da investigação –
iniciada ainda em maio de 2008 após pedido da empresa Vicunha Têxtil S.A. Tomadas as
importações de fibras de viscose dos três países, sua participação no valor total importado
pelo Brasil do produto cresceu de 6,1% em 2003 para 38,3% em 2007. O valor das
importações de fibras de viscose chinesas pelo Brasil passou de US$ 31,5 mil em 2003 para
cerca de US$ 12,5 milhões em 2007, equivalente a aumento de quase 40.000%.
Entre julho e setembro de 2008, a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) iniciou quatorze
investigações de dumping, sendo quatro delas contra a China. Além de fio de viscose, estão
em curso investigações contra filmes de BOPP, pneus para automóveis e eletrodos de
grafite menores importados de origem chinesa.
General Electric Commercial Airplanes Services (GECAS, na sigla em inglês), pertencente
ao conglomerado General Electric (GE), assinou acordo de compra de vinte e cinco aviões
do modelo ARJ-21-700 fabricados pela empresa chinesa Commercial Aircraft Corporation
of China (CACC, na sigla em inglês), uma das principais concorrentes chinesas da Embraer
e Bombardier Inc.. O contrato, avaliado em cerca de US$ 750 milhões, é o primeiro da
empresa chinesa no exterior e o maior contrato de exportação da China em volume de
aeronaves e valor. Serão 25 aviões a serem entregues a partir de 2013 e utilizados em vôos
regionais.
Em conformidade com o processo de internacionalização das empresas chinesas, que
exigem cada vez mais serviços financeiros em localidades onde atuam, os bancos chineses
18
18Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Mercado de capitais
Fusões e aquisições
América Latina
Pequim toma medida para deter queda vertiginosa no mercado de capitais
Blackstone amplia investimentos na China e permite maior participação do fundo soberano chinês
China recebe aval e se torna mais um sócio do BID
Frente a perdas recentes significativas no mercado de capitais, autoridades chinesas
tomaram medidas para diminuir perdas e instabilidade. A China Securities Regulatory
Commission (CSRC, na sigla em inglês) anunciou, em 09 de outubro de 2008, que
empresas somente obterão autorização para recapitalização no mercado caso tenham, nos
últimos três anos, efetuado pagamentos a seus acionários em dinheiro e em valor igual ou
superior a 30% dos lucros distribuídos, com o intuito de estabilizar expectativas de retorno
e desencorajar especulação.
Já a China Insurance Regulatory Comission (CIRC, em inglês) convocou maiores
seguradoras do país e ordenou que atuassem de forma mais assertiva e estabilizadora do
mercado, comprando ou mantendo ações em momentos de queda, apesar das recentes
perdas das principais empresas do setor como a China Life Insurance, Ping An Insurance e
China Pacific Insurance.
Blackstone Group, gigante norte-americano de private equity, e China Chemical
Corporation (ChinaChem) anunciaram, em outubro de 2008, conclusão das negociações
para investimento de US$ 600 milhões pela Blackstone na BlueStar Corporation,
subsidiária da ChinaChem. A joint-venture, China National BlueStar (Group) Co. Ltd., terá
20% de participação da Blackstone. A BlueStar, que atua no desenvolvimento e produção
de compostos químicos e novos materiais, possui mais de 30 subsidiárias e institutos de
pesquisa científica na China.
A Blackstone anunciou também em outubro que, apesar da turbulência nos mercados
internacionais e da desaceleração do mercado imobiliário chinês, pretende prosseguir com
seus investimentos no segmento. A empresa norte-americana está em negociação para
comprar participações em novos projetos de imóveis comerciais no valor aproximado de
US$ 1 bilhão. Foi também anunciada recentemente ampliação do limite de participação do
fundo soberano, China Investment Corporation (C.I.C.), na Blackstone, de 9,9% para
12,5%.
Após dois anos de negociações, China tornou-se sócia do Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), principal órgão de financiamento da América Latina. O país
asiático forneceu US$ 350 milhões à instituição, que terá como principal destino
deram novos passos em suas estratégias de internacionalização. De setembro a outubro de
2008, o Industrial and Commercial Bank of China (ICBC), maior banco em valor de
mercado mundial, abriu quatro novas agências, em Nova York (EUA), Sidney (Austrália),
Dubai (Emirados Árabes Unidos) e Doha (Qatar) – as primeiras agências do banco nestes
países. O ICBC, maior dos bancos estatais chineses, possui mais de 120 agências e
subsidiárias em 15 países, e obteve lucro líquido de US$ 9,5 bilhões no primeiro semestre
de 2008.
Já o Bank of China Limited (BoC), terceiro maior banco da China em valor de ativos,
recebeu, em novembro, autorização para instalar-se no Brasil e deve iniciar operações nos
primeiros meses de 2009. O presidente brasileiro assinou decreto, publicado no Diário
Oficial, ratificando a decisão do Conselho Monetário Nacional do Brasil de permitir a
instalação da primeira agência do BoC no Brasil (e na América Latina). O BoC, cujo capital
inicial estimado é de cerca de US$ 100 milhões, terá como principal objetivo o aumento de
linhas de financiamento para o comércio sino-brasileiro e deverá instalar-se em São Paulo.
O Bank of China já opera em vinte e seis outros países e, em outra operação de expansão
recente, adquiriu 20% dos ativos da LCFR, gestora de recursos do banco francês LCF
Rothschild Group, por US$ 342 milhões.Carta da China 41
Leia mais
19
19Edição Nº 42 |
Energia
Sistema bancário
Calçados
China e Rússia acordam sobre bifurcação de oleoduto
China anuncia plano de implementação das regras do Acordo de Basiléia II com antecedência
Comissão Européia contraria maioria de membros e estende medidas anti-dumping contra calçados de China e Vietnã
China e Rússia assinaram, por meio das estatais China National Petroleum Corporation
(CNPC) e da russa Transneft, acordo para construção de bifurcação de oleoduto que unirá
reservas da Sibéria à Daqing, norte da China. O projeto, de cerca de 70 km de extensão,
permitirá fornecimento de equivalente a 15 milhões de toneladas anuais de petróleo à
China, ou 4% da demanda total do país em 2007. O oleoduto integra projeto maior, já em
construção, que transportará petróleo da Sibéria ao Pacífico e também abastecerá o Japão.
Desde 2003 o projeto de construção de oleoduto até Daqing havia sido suspenso, em face
de negociações mais atrativas para construção de trecho de distribuição para o Japão.
A Comissão de Regulação Bancária da China (CBRC, na sigla em inglês) anunciou, em 17 de
outubro de 2008, diretrizes para adequação do sistema bancário chinês ao Acordo de
Basiléia II. Segundo CBRC, os bancos chineses deverão enviar relatórios iniciais de
cumprimento a exigências do acordo até o término de 2008 e novas diretrizes serão
publicadas em 2009. Enquanto os Estados Unidos postergaram implementação e apesar do
prazo para a China adequar-se ao Basiléia II ser apenas 2010, as primeiras
regulamentações entraram em vigor com um ano de antecedência no país.
Publicado em 2004, Basiléia II tem como objetivo criar padrões internacionais de regulação
bancária, centrados em procedimentos de avaliação e redução de riscos – seus três pilares
são maior sensibilidade de requerimentos de capital ao risco, supervisão bancária e
transparência de mercado. Desde a última década, o sistema bancário chinês tem passado
por intensa reforma - que inclui reestruturação e recapitalização de instituições do setor,
redução significativa de créditos irrecuperáveis e maior rigor de política de empréstimos -
com intuito de adequar-se aos programas de abertura e crescimento econômico do país,
bem como atender a padrões internacionais do setor.
A Comissão Européia, braço Executivo da União Européia, anunciou extensão temporária
de tarifas anti-dumping de 16,5% sobre calçados de couro chineses e de 10% sobre
vietnamitas, ao início de outubro de 2008. Tais medidas foram implementadas em 05 de
outubro de 2006 e vigorariam por dois anos. Os 27 Estados-Membros da União Européia www.cebc.org.br
departamentos responsáveis pelo financiamento de projetos no setor privado. Por
exemplo, a Corporação Interamericana de Investimentos (CII) recebeu US$ 75 milhões
para investir em pequenas e médias empresas e o Fundo Multilateral de Investimentos
recebeu US$ 75 milhões para financiamento de microempresas na região.
A China participará do BID em condições idênticas a de sócios como Estados Unidos, Japão
e países europeus, ou seja, não poderá ser beneficiada por empréstimos e detém direito a
voto no conselho de administração do órgão. Como sócio do BID, empresas chinesas
poderão participar de projetos financiados pelo banco, por meio de fornecimento de
serviços e equipamentos aos projetos na região, uma vez que apenas empresas de países-
membros podem ser contratadas com recursos do órgão. Com a entrada no BID, a China
conquista posição estratégica para aproximação de potenciais parceiros latino-
americanos.
Comércio entre China e América Latina somou US$ 110 bilhões em 2007 de acordo com o
BID, porém, os investimentos chineses na região ainda são comparativamente tímidos,
totalizando apenas US$ 3 bilhões no mesmo ano. O Brasil e outros 25 países latino-
americanos que estão autorizados a receber empréstimos da instituição controlam metade
do capital do BID.
Carta da China 17
Leia mais
OMC
Propriedade intelectual
Telecomunicações
Decisão parcial da OMC sobre propriedade intelectual não condena China em todos os pontos requisitados por Washington
Huawei e Nokia anunciam acordo cruzado de patentes
China continua ampla reforma do setor de telecomunicações e obriga empresas a compartilharem infra-estrutura
Em parecer parcial, a Organização Mundial do Comércio (OMC) condenou ausência de
proteção de direitos autorais de obras não permitidas pelas autoridades chinesas no país,
porém rejeitou alegação norte-americana de que os limites mínimos estabelecidos pela
China para investigação e condenação por violação de propriedade intelectual não estão de
acordo com as regras da organização.
Após tentativa de acordo sem sucesso, os Estados Unidos solicitaram abertura de painel
investigativo contra a China em dezembro de 2007. Além de desrespeito à propriedade
intelectual, o governo norte-americano alegou que o limite mínimo utilizado pela legislação
chinesa para processar criminalmente infratores - US$ 7.000 em valor ou 500 cópias de
produtos pirateados – é interpretação muito flexível do critério de “escala comercial”
determinado pelo artigo 61 do Acordo TRIPS (Trade-Related Aspects of Intelectual
Property Rights). Contudo, não conseguiu provar que o limite estabelecido pela China
permite falsificações em “escala comercial”.
Esse foi o primeiro painel relacionado ao direito de propriedade intelectual contra a China e,
embora a decisão seja parcial, é pouco provável que sofra alteração mesmo se as partes
envolvidas recorrerem. O parecer final da deverá ser divulgado em novembro de 2008.
Nokia e a Nokia Siemens Networks assinaram acordo de licenciamento cruzado de patentes
de rede de comunicação sem fio com a empresa chinesa de telecomunicações Huawei, em
29 de outubro de 2008. O compartilhamento, importante contribuinte à inovação
industrial, abrange tecnologias como GSM, WCDMA, CDMA2000, TD-SCDMA e também
patentes do padrão de telefonia 3G da China, em fase de implementação. Atualmente, a
Huawei ocupa o quarto lugar no mercado de mundial de comunicação sem fio , atrás de
Ericsson, da Nokia Siemens e da Alcatel-Lucent.
A partir de 1º de outubro de 2008, os três grandes conglomerados de telecomunicações
chineses - China Mobile, China Telecom e China Unicom - estão obrigados a
compartilharem e construírem em conjunto infra-estrutura, conforme decisão do
Ministério da Indústria e da Tecnologia da Informação (MIIT, na sigla em inglês) e a
Comissão de Administração e Supervisão de Ativos Estatais (SASAC, na sigla em inglês). Com a nova legislação, torres e linhas de telecomunicações devem ser abertas às demais
empresas do setor e, caso não tenham capacidade de atendê-las, deverão ser ampliadas.
Ainda, projetos de construção de novas estruturas devem ser informados às demais
operadoras, que terão dez dias para notificarem se a estrutura já existe e poderá ser
compartilhada ou se irão juntar-se à construção das mesmas. A medida deverá
enfraquecer a China Mobile, que quase detém monopólio do setor.20
20Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
foram consultados sobre a prorrogação das medidas, havendo 15 deles se manifestado
contrários. Contudo, a legislação anti-dumping européia obriga a Comissão a lançar painel
de revisão dos direitos aplicados em função do pedido efetuado por alguns industriais
europeus, o que significa, na prática, a extensão temporária das medidas.
Segundo Financial Times, as vendas de calçados de ambos os países para a Europa
alcançaram US$ 3,4 bilhões entre julho de 2007 e junho de 2008, mais da metade do
volume total importado pelo bloco. A Comissão afirmou que, devido aos interesses
levantados pela questão, irá acelerar a revisão para que o procedimento termine antes dos
12 a 15 meses usuais.
Carta da China 41
Leia mais
21
21Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Relações bilaterais I
Segurança
Saúde
China e Rússia encerram disputa fronteiriça
Relações Taiwan - Estados Unidos não abalam a aproximação com a China
Governo chinês abre projeto de reforma do sistema de saúde à opinião pública
Após anos de negociações, China e Rússia assinaram acordo que põe fim a 40 anos de
disputas e consolida a fronteira de 4.300 km entre os dois países, em 14 de outubro de
2008. Os ministros das Relações Exteriores chinês e russo, Li Zhaoxing e Sergei Lavrov,
formalizaram o Protocolo Adicional de Descrição da Fronteira Estatal Sino-Russa em sua
parte Oriental, já ratificado por seus parlamentos. O acordo foi baseado em tratados
bilaterais já existentes e normas e leis internacionais.
Entre o estipulado pelo Protocolo, os dois países acordaram a divisão de um conjunto de
ilhas de 375 km². A ilha de Torabarova e parte da ilha do Grande Ussuri, rica em recursos
naturais e pouca habitada, foram devolvidas para a China. A finalização das disputas está
em conformidade com o Protocolo Adicional assinado em outubro de 2004 que já havia
devolvido uma parcela do território litigioso para China. Tais territórios foram ocupados
pela União Soviética ainda em 1929 por razões estratégicas devido à possibilidade, na
época, de conflito entre os dois países.
Em razão de contrato de vendas de armamentos norte-americanos avaliados em US$ 6,5
bilhões à Taiwan, divulgado pelo Congresso dos Estados Unidos em 03 de outubro de 2008,
China rompeu cooperação militar com Washington. O acordo, que inclui, helicópteros
Apache, lançadores de mísseis submarinos e interceptadores de mísseis aéreos,
inicialmente era de US$ 12 bilhões.
A cooperação militar entre Taiwan e Estados Unidos iniciou-se em 1979 pelo Ato de
Relações, que estabelece venda de armas e participação dos Estados Unidos na defesa de
Taiwan em eventual conflito. A cooperação militar entre os dois países havia enfraquecido
nos últimos anos, o que facilitou maior aproximação da China com os Estados Unidos no
setor.
Governo chinês lançou projeto do plano de reforma do sistema de saúde do país para
debate público. Especialistas do setor e oficiais do governo da China de 16 departamentos -
dentre eles o Ministério da Saúde e a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma
(NDRC, na sigla em inglês) -, visitaram mais de 20 províncias do país para verificar a
situação do sistema de saúde. Resultado das visitas e pesquisas realizadas por nove
organizações estrangeiras, incluindo a Organização Mundial de Saúde (OMS), também foi
utilizado na formulação da pauta do projeto de reforma.
Em 2007, o NDRC já havia fornecido oportunidade de avaliação do sistema de saúde do país
pela internet e recebeu, em seis meses, mais de 1500 sugestões, além de 600 cartas. A
reforma proposta pelo governo central tem como base a reestruturação e fornecimento de
tratamentos médicos de qualidade a todos residentes rurais e urbanos até 2020. De acordo
com documentos oficiais, os serviços médicos deverão ser “seguros, eficientes,
convenientes e acessíveis”.
Esta nova regulamentação faz parte da ampla reforma do setor de telecomunicações
chinês, que visa a fortalecer a competitividade e permitir que companhias de telefonia fixa
participem do mercado de telefonia móvel, líder de crescimento mundial. Em maio de
2008, Pequim ordenou que as seis empresas do setor se unissem, dando origem a três
grandes conglomerados: China Mobile, China Telecom e China Unicom. Em setembro do
mesmo ano, novas regulamentações facilitaram a entrada de empresas estrangeiras no
Carta da China 41
Carta da China 41
Carta da China 38
Leia mais
Leia mais
Leia mais
Relações bilaterais II
Liberdades civis
China concede empréstimo ao Paquistão
China concede maior liberdade a jornalistas estrangeiros
O presidente do Paquistão, Asif Ali Zardari, realizou sua primeira visita oficial à China, em
outubro de 2008. Além, do caráter estratégico, uma vez que os dois países são aliados
históricos, a autoridade paquistanesa buscava conseguir empréstimos do governo chinês a
fim de atenuar crise econômica no país. Apesar de não ter sido bem sucedido a princípio, o
encontro rendeu outros acordos de cooperação nos setores ambiental, espacial, energético
e comercial – que incluem a construção e lançamento de satélites em conjunto, construção
de duas novas usinas nucleares no Paquistão para fins pacíficos e estabelecimento de meta
para dobrar o fluxo de comércio entre os países até 2011, atingindo US$ 15 bilhões. O
Paquistão se comprometeu ainda em criar zonas especiais com incentivos para as
empresas chinesas. No entanto, com a deterioração da crise financeira global e da crise
interna do Paquistão, a China liberou, em novembro, US$ 500 milhões em empréstimos. O
governo chinês já havia emprestado a mesma quantia para auxiliar o Banco do Estado do
Paquistão em junho desse ano.
O governo chinês anunciou em 17 de outubro de 2008 a permanência de facilidades
concedidas a jornalistas durante as Olimpíadas de Pequim que expirariam no mesmo dia.
Entre outros avanços, jornalistas estrangeiros permanecerão sem precisar solicitar
autorização governamental para entrevistar cidadãos chineses e viajar pelo país. No
entanto, algumas áreas como o Tibete permanecem com acesso restrito e precisam da
aprovação prévia de autoridades locais.
A nova regulamentação estava em vigor desde o início de 2007 e substituía, a princípio
temporariamente, as normas de maior restrição à imprensa que entraram em vigor em
1990, após as manifestações ocorridas na Praça de Tiananmen em 1989. A decisão, no
entanto, não se estende aos jornalistas chineses.
22
22Edição Nº 42 |
www.cebc.org.br
Carta da ChinaA Carta da China é publicada mensalmente pela secretaria executiva do Conselho Empresarial Brasil-China. Os artigos publicados não necessariamente refletem a opinião do CEBC nem de seus associados. A escolha de artigos analíticos, de matérias comentadas e de resumos de notícias é de responsabilidade da secretaria executiva do CEBC.
A Carta da China é distribuída a associados do Conselho Empresarial Brasil-China e a destinatários recomendados por associados.
EditoresRodrigo Tavares MacielVivian AltZaira Lanna
Estagiários: Ana Luiza do Carmo, Lara Azevedo e Thiago Scot
Atendimento ao leitor
Edições anterioresDisponíveis para download em
Projeto gráficoPresto Design
www.cebc.org.br