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6.1 Desenvolvimento urbano e uso do solo A populaçªo urbana no Brasil cresceu, nas œltimas dØcadas, numa taxa muito alta (figura 6.1 e tabela 6.1). Este crescimento gerou grandes metró- poles na capital dos Estados brasileiros formado por um nœcleo principal e vÆrias cidades circunvizinhas, resultado da expansªo deste crescimento. A proporçªo da populaçªo urbana brasileira Ø de 82% em 2001. O processo de urbanizaçªo acelerado ocorreu depois da dØcada de 60, gerando uma popu- laçªo urbana com uma infra-estrutura inadequada. Atualmente existem pelo menos 12 cidades com mais do que 1 milhªo de habitantes. Alguns Estados brasileiros jÆ apresentam características de urbanizaçªo de países desenvol- vidos, como Sªo Paulo onde 91% da populaçªo Ø urbana. A tendŒncia dos œltimos anos tem sido de reduçªo do crescimento populacional do país, com baixo crescimento populacional da cidade nœcleo na regiªo metropolitana (RM) (tabela 6.2) e aumento da sua periferia. Cida- des acima de 1 milhªo crescem a uma taxa mØdia de 0,9% anual, enquanto os nœcleos regionais como cidades entre 100 e 500 mil, crescem a taxa de 4,8%. Portanto, todos os processos inadequados de urbanizaçªo e impacto ambiental que se observou nas RM estªo se reproduzindo nestas cidades de mØdio porte. Este crescimento urbano tem sido caracterizado por expansªo irregu- lar de periferia com pouca obediŒncia da regulamentaçªo urbana relaciona- da com o Plano Diretor e normas específicas de loteamentos, alØm da ocu- paçªo irregular de Æreas publicas por populaçªo de baixa renda. Este pro- cesso dificulta o ordenamento das açıes nªo-estruturais do controle ambiental urbano. 6 BRASIL Carlos E. M. Tucci, AndrØ Silveira, Joel Goldenfum e AndrØa Germano

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

6.1 Desenvolvimento urbano e uso do solo

A população urbana no Brasil cresceu, nas últimas décadas, numa taxamuito alta (figura 6.1 e tabela 6.1). Este crescimento gerou grandes metró-poles na capital dos Estados brasileiros formado por um núcleo principal evárias cidades circunvizinhas, resultado da expansão deste crescimento. Aproporção da população urbana brasileira é de 82% em 2001. O processo deurbanização acelerado ocorreu depois da década de 60, gerando uma popu-lação urbana com uma infra-estrutura inadequada. Atualmente existem pelomenos 12 cidades com mais do que 1 milhão de habitantes. Alguns Estadosbrasileiros já apresentam características de urbanização de países desenvol-vidos, como São Paulo onde 91% da população é urbana.

A tendência dos últimos anos tem sido de redução do crescimentopopulacional do país, com baixo crescimento populacional da cidade núcleona região metropolitana (RM) (tabela 6.2) e aumento da sua periferia. Cida-des acima de 1 milhão crescem a uma taxa média de 0,9% anual, enquantoos núcleos regionais como cidades entre 100 e 500 mil, crescem a taxa de4,8%. Portanto, todos os processos inadequados de urbanização e impactoambiental que se observou nas RM estão se reproduzindo nestas cidades demédio porte.

Este crescimento urbano tem sido caracterizado por expansão irregu-lar de periferia com pouca obediência da regulamentação urbana relaciona-da com o Plano Diretor e normas específicas de loteamentos, além da ocu-pação irregular de áreas publicas por população de baixa renda. Este pro-cesso dificulta o ordenamento das ações não-estruturais do controle ambientalurbano.

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BRASILCarlos E. M. Tucci, André Silveira, Joel Goldenfum e Andréa Germano

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Figura 6.1 Evolução da urbanização no Brasil e no Mundo

Tabela 6.1 Crescimento da população brasileira e a taxa de urbanização(IBGE, 1996, apud FGV, 1998)

Algumas das causas são as seguintes: (a) pequena renda econômica departe importante da sociedade, agravada nos períodos de crise econômica edesemprego significativo; (b) falta de planejamento e investimento públicono direcionamento da expansão urbana: como o preço da infra-estruturaexigida para o lote é inferior ou próximo do valor de mercado do própriolote (empreendimentos de baixa renda), a mesma não é realizada ficando

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para o poder público o ônus da regularização e implementação futura dainfra-estrutura; (c) medidas restritivas incompatíveis com a realidade brasi-leira: a proteção de mananciais gerou legislações restritivas que condicionarama desobediência. Estas leis impedem o uso das áreas de mananciais sem queo poder público compre a propriedade. O proprietário é penalizado porpossuir esta área, já que na maioria das vezes deve continuar pagando im-posto e ainda preservar a área quase intacta. A desobediência acaba ocor-rendo devido ao aumento do valor econômico das áreas circunvizinhas.Observou-se em algumas cidades a invasão destas áreas por população debaixa renda por convite dos proprietários, como um meio de negociar como poder público.

Tabela 6.2 População e crescimento das principais cidades brasileiras(IBGE, 1998)

Observa-se assim uma cidade legal e uma cidade ilegal que necessitade ordenamento, controle e de políticas mais realistas quanto às áreas demananciais e de riscos de inundação.

O planejamento urbano, embora envolva fundamentosinterdisciplinares, na prática é realizado dentro de um âmbito mais restritodo conhecimento. O planejamento da ocupação do espaço urbano no Bra-sil, através do Plano Diretor Urbano não tem considerado aspectos de dre-nagem urbana e qualidade da água, que trazem grandes transtornos e custospara a sociedade e para o ambiente. O desenvolvimento urbano brasileirotem produzido aumento significativo na freqüência das inundações, na pro-dução de sedimentos e na deterioração da qualidade da água. Os órgãos demeio ambiente não conseguem impor o aumento da cobertura de água e

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saneamento e a recuperação das águas pluviais devido a falta de capacidadeeconômica das cidades.

A ocorrência de inundações em áreas urbanas e ribeirinhas, no Brasil,tem-se intensificado e tornado mais freqüente a cada ano. Este agravamentoé função tanto da crescente impermeabilização do solo decorrente da urba-nização acelerada, como da imprevidente ocupação das áreas ribeirinhas. Acombinação desses processos conduz a picos de vazão cada vez mais difí-ceis de controlar mediante intervenções estruturais tradicionais voltadas àampliação das capacidades de escoamento superficial, o que tem aumenta-do sensivelmente o potencial benefício tanto de dispositivos de detenção, einfiltração como de medidas não-estruturais de caráter essencialmente pre-ventivo. Estas últimas necessitam de uma articulação crescente com os siste-mas de gestão urbana, considerando que as competências para administrarinstrumentos de controle de uso e ocupação do solo, bem como para imporpadrões de edificação e gabaritos urbanísticos, extrapolam o âmbito de açãonormativa e reguladora dos Sistemas Nacional e Estaduais de Gerenciamentode Recursos Hídricos. Como regra, essas matérias pertencem à esfera decompetência dos municípios, não se excluindo, porém, uma forte interaçãocom os poderes públicos estaduais, nos casos de regiões metropolitanas,aglomerações urbanas e micro-regiões, sobre as quais se aplicam os princípi-os constitucionais de cooperação no exercício de funções públicas de inte-resse comum.

6.2 Principais bacias brasileiras

Observa-se a ocorrência de inundações urbanas (pluviais) e ribeiri-nhas (fluviais) em praticamente todas regiões brasileiras. De uma forma ge-ral, as inundações são reportadas quando provocam danos, com prejuízosfinanceiros e/ou perdas humanas, sem serem caracterizadas como ribeiri-nhas ou devido a urbanização.

Um exemplo dessa situação é apresentado na figura 6.2, que mostraum mapeamento dos Municípios atingidos por enchentes ou inundaçõesnos anos de 1998 e 1999. Pode-se observar claramente que a densidade deinundações reportadas é maior justamente onde há uma maior densidadepopulacional. Isso não significa que não tenham ocorrido cheias em outrasáreas, nesse período. O que ocorre é que não há registros de inundaçõesporque não houve população atingida ou prejuízos financeiros diretos.

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O território brasileiro pode ser dividido em grandes baciashidrográficas, como apresentado na figura 6.3 e na tabela 6.3. Essa divisão éadotada no presente capítulo para caracterizar, de uma forma geral, os pro-cessos de inundação predominantes no território brasileiro, através de umadescrição sucinta dos principais impactos em cada bacia hidrográfica desta-cada.

Na tabela 6.3 são também apresentados alguns dados gerais das baci-as e uma síntese de informações relacionando as bacias e as regiões geográ-ficas e Estados brasileiros, além das situação transfronteriça. Como era es-perado a abrangência hidrográfica não corresponde à divisão geográfica.Pode-se observar também que praticamente metade das bacias nacionaistem características transfronteriças. Em algumas delas o país está a jusantedos países vizinhos como na Amazônia, Paraguai e na Lagoa Mirim que fazparte do Atlântico Sul e a montante como no rio Paraná, que é a bacia commaiores alterações antrópicas.

Figura 6.2 Municípios atingidos por enchentes (1998-1999) Fonte: ANA.

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Observa-se também que grande parte das capitais dos Estados Brasi-leiros estão pelo menos 100 km do Oceano Atlântico em bacias litorâneas,onde se misturam os impactos em rios e costeiros.

Tabela 6.3 Bacias brasileiras e divisão geográfica.

* parte brasileira

6.2.1 Bacia do Amazonas

As inundações ribeirinhas ocorrem numa vasta área na região. A po-pulação ribeirinha tem desenvolvido formas de convivência com os períodode inundação, pois ocorre um grande evento por ano com alto grau deprevisibilidade. Nas áreas urbanas como Manaus e Belém, as inundaçõesocorrem também devido a intensidade das chuvas tropicais, superiores em25% as intensidades das áreas fora do trópico úmido (figura 6.4). As inunda-ções urbanas e ribeirinhas causam impacto sobre a sociedade em conjuntocom as doenças de veiculação hídrica típicas de ambientais tropicais.

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Figura 6.3 Grandes bacias brasileiras.

A população regional está habituada à ocorrência de enchentes e as-sim está apta a enfrentá-las. As enchentes, inundando grandes várzeas, sãoambientalmente importantes para preservação da biodiversidade amazôni-ca. Próximo a Manaus, o rio Amazonas apresenta grande amplitude de vari-ação anual, atingindo a cota de 29 m nos meses de maio a junho emcontraponto a cota mínima de 19 m, nos meses de outubro a novembro. Asvariações anuais de nível d�água diminuem gradativamente em direção a fozdo Amazonas, justamente devido à regularização promovida pelas extensasplanícies de inundação, as quais abrigam ecossistemas de transição, adapta-dos ao regime de variação lenta das águas.

Na figura 6.4 são apresentadas as precipitações em função da sua du-ração para Manaus na Amazônia e Porto Alegre (clima subtropical) para amesma duração (1 hora). A diferença de precipitação pode ser observadapara estas duas cidades na figura 6.5 (cerca de 25% maior em Manaus).

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Figura 6.4 Comparação entre a precipitação média máxima de 1 hora de duraçãopara postos do trópico úmido brasileiro e os postos dentro dos 200 e 300 S no

Brasil (Tucci e Porto, 2001).

6.2.2 Bacia do Tocantins

O rio Tocantins apresenta suscetibilidade a inundações ribeirinhas emépoca definida do ano, a sazonalidade apresenta seqüência longa de mesescom precipitação nula, concentrando-se a mesma em poucos meses (outu-bro a abril). A previsão de níveis de inundação pode ser feita com razoávelprecisão e assim possibilitar o zoneamento das áreas alagadas das cidadesvisando a orientação sobre a ocupação de áreas de risco. Inundações ribeiri-nhas, principalmente no baixo Tocantins, e doenças de veiculação hídricasão os aspectos principais com o mesmo destaque da bacia do Amazonas.

A bacia do Tocantins apresenta um período de águas altas entre feve-reiro e abril. No rio Tocantins as cheias ocorrem em fevereiro e março en-quanto que no rio Araguaia, ocorrem em março e abril, por efeito da grandeárea inundada na planície da Ilha do Bananal. Em 1980 foram registradas asmaiores cheias da bacia, quando várias áreas ribeirinhas dos rios Araguaia,Tocantins e Paraná ficaram totalmente inundadas. Cerca de 9% da bacia doTocantins são áreas inundáveis (6% na bacia do Araguaia e 3% na bacia dobraço exclusivo do Tocantins). Quando das cheias são relatados danos em

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Figura 6.5 Precipitações em função da duração para Manaus e Porto Alegre nostempos de retorno de 2 e 5 anos (Tucci e Porto, 2001)

moradias, lavouras e estradas sendo rara a perda de vidas humanas, mascomum a morte de animais. As áreas ribeirinhas inundáveis são usadas paraassentamento preferencial das populações carentes, sem que tenha sido de-senvolvido um mecanismo eficaz para evitar a ocupação de áreas inundáveis.

Na bacia não existem grandes cidades, apenas Palmas, capital doTocantins é uma cidade em crescimento acelerado que deve procurar desen-volver de forma sustentável sua drenagem para evitar os problemas obser-vados na maioria das cidades médias e grandes brasileiras.

6.2.3 Bacia do Atlântico Norte/Nordeste

A bacia comporta várias características climáticas: condições amazô-nicas e de transição nas bacias mais ao Norte, condições semi-áridas na ca-beceira de várias bacias e condições de clima litorâneo no trecho inferior dasmesmas. Nas bacias do Nordeste existe um forte gradiente de precipitaçãodo interior para a foz dos rios. Desde o século XVII há registros de enchen-tes em Recife, tendo sido Maurício de Nassau o mandante da construção daprimeira barragem no leito do Rio Capibaribe para proteger o Recife dasenchentes. As inundações no Vale Mearim, no rio Capiberibe em Pernambucoe no Mundaú, são exemplos de ocupação do espaço de risco. Da mesmaforma observa-se em cidades fortemente urbanizadas como Fortaleza, Re-cife, Maceió e Teresina os impactos da inundações devido à drenagem urba-na inadequada.

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O clima tropical apresenta precipitações convectivas com alta intensi-dade e pequena duração concentradas em poucos dias do ano. As inunda-ções devido a urbanização são mais críticas nestas condições. De outro lado,durante o período chuvoso, quando o volume de precipitação é alto numperíodo curto, problemas de volume podem ocorrer. Por exemplo, Teresina,capital do Piauí, possui polders de proteção contra inundações da junçãodos rios Parnaíba e Poty. Dentro dos polders existem várias áreas de deten-ção natural e o escoamento da drenagem urbana é bombeado para os rios.O período úmido se concentra em poucos meses (2-4 meses) e o total anualé da ordem de 700 mm, mas a precipitação máxima de 15 dias com tempode retorno de 15 anos é de 500 mm. Este volume passa a ser a condiçãocrítica para o bombeamento do sistema interno de escoamento da cidade.

Portanto, as inundações nas bacia litorâneas decorrem de chuvas in-tensas, caracterizando-se por serem eventos relativamente rápidos, que po-dem ser agravadas por ações antrópicas (desmatamentos, construção inade-quada de barreiros e pequenos açudes, obras viárias, entre outras). Há even-tos em escala regional como os ocorridos em 1974, 1975 e 1986 que provo-caram inundações em diversas cidades e áreas rurais, atingindo vários Esta-dos. Recife, em Pernambuco, teve uma enchente de grande porte em 1975.Ocorreram cheias expressivas em 1977, 1979, 1980, 1988, 1989 e 1990 emvárias sub-bacias do Maranhão, Ceará e Alagoas.

6.2.4 Bacia do São Francisco

A bacia do rio São Francisco possui uma grande variabilidade de con-dições hídricas. Nasce numa região úmida com balanço hídrico com produ-ção específica alta e escoa no sentido da região semi-árida. Os principaisaspectos que ocorrem no seu trecho superior não são os mesmos do seutrecho médio e inferior. Na cabeceira do São Francisco a Região Metropoli-tana de Belo Horizonte apresenta sérios problemas de inundações geradaspela urbanização. Outros centros médios e grandes da região apresentam omesmo problema. No leito do rio São Francisco e de alguns afluentes asinundações ribeirinhas são importantes como ocorreu em 1979.

As enchentes mais freqüentes ocorrem nos afluentes do trecho altoda bacia, onde a pluviosidade (1000 a 1500 mm anuais) e o relevo contribu-em para isso. Há inundações regulares nos meses de verão em várias cida-des, principalmente em Minas Gerais (como Divinópolis e Montes Claros).Cidades ribeirinhas do próprio rio São Francisco, em Minas Gerais e Bahia,

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como Pirapora, Januária, Itacarambi, Manga e Bom Jesus da Lapa, sofremcom enchentes regulares, dispondo, muitas delas, de sistemas de diques. Umadas maiores enchentes ocorreu na passagem dos anos de 1979 e 1980. Pra-ticamente todas as cidades situadas nos vales do São Francisco e de seusafluentes foram seriamente atingidas, com perdas humanas, materiais e agro-nômicas significativas. Houve um grande número de desabrigados nas áreasurbanas inundadas. Em Belo Horizonte, devido ao agravamento edensificação populacional decorrentes da urbanização, houve mais de 70mortes. Na bacia este evento de cheia perdurou por dois meses, chegando aafetar a malha rodo-ferroviária de Minas Gerais, ao ponto de isolar grandescidades por alguns dias.

As inundações em Belo Horizonte aumentaram em freqüência com oaumento da população e a impermeabilização (veja capítulo 2), como namaioria das cidades brasileiras no final do século 20.

6.2.5 Bacia do Atlântico Leste

A variabilidade climática no sentido Leste Oeste das bacias litorâneasno Nordeste das bacias do Atlântico Leste mostra grande gradiente de pre-cipitação. Junto à costa as precipitações são 2 a 3 vezes maiores a nível anualque na cabeceira que geralmente ocorrem na região semi-árida. Estas baciasou atravessam a Serra do Mar ou nascem na mesma, onde as precipitaçõessão altas. As principais cidades ocorrem na Costa como Aracaju, Salvador,Vitória e Rio de Janeiro.

Nos rios como Jequitinhonha, Doce e Paraíba do Sul são observadasimportantes inundações ribeirinhas com uma certa freqüência com grandesimpactos econômicos e sociais. Na bacia do rio Paraíba do Sul, onde seencontra grande parte do PIB brasileiro, os impactos das inundações sãosignificativos devido à grande ocupação das áreas ribeirinhas pela popula-ção, comércio e industrias. Em 1999 ocorreu uma inundação ribeirinha sig-nificativa na região com grande prejuízo econômico e social.

Em 2001, as enchentes no início do ano, que atingiram 81,5 mil pes-soas em Minas Gerais, 8,2 mil no Rio de Janeiro e 9,1 mil em São Paulo,levaram o então ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, a reco-nhecer que o governo falhou por não ter se preparado com antecedênciapara enfrentar um problema que se repete a cada mês de janeiro (Jornal doBrasil, 23/01/2001).

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As inundações devido à urbanização ocorrem principalmente na ba-cia do Paraíba, no Rio de Janeiro, Salvador, Vitória e Aracaju que se encon-tram junto ao litoral e apresentam grande densificação urbana. A ocupaçãode áreas de grande declividade associada a chuvas intensas geraescorregamentos com mortes em várias cidades da região. As bacias litorâ-neas, onde se localizam as principais cidades do país é onde mais intensa-mente se observam os efeitos da urbanização. Nestas cidades, além da inun-dação devido às precipitações tropicais que ocorrem principalmente no ve-rão, observa-se o efeito do controle do escoamento de jusante pelo oceano,fazendo com que as áreas mais baixas próximo ao mar sejam as de maiorimpacto, pela associação do efeito de montante com o controle de jusantedo mar.

6.2.6 Bacia do Paraná-Paraguai

As inundações ribeirinhas têm ocorrido com grande freqüência nosrios Iguaçu, Paraná e afluentes como o Tietê. Nesta bacia se observam clara-mente os dois tipos básicos de inundações. As inundações ribeirinhas ocor-rem ao longo de todos os afluentes e o rio principal, atingindo várias comu-nidades como Porto União e União da Vitória no rio Iguaçu. Nesta bacia éonde existe o maior número de Usina hidrelétricas com grandes reservatóri-os. Neste sentido, é comum o cenário de uso conjunto das barragens paraprodução de energia e controle de inundação através da definição de volu-me de espera.

No rio Paraguai, onde as concentrações urbanas são pequenas, obser-vam-se principalmente as inundações ribeirinhas. No capítulo 3 foi descritoo impacto sobre o Pantanal, o regime de variabilidade climática e uso dosolo que ocorreu na bacia, produzindo aumento dos níveis de inundação einviabilizando a sustentabilidade econômica da população das fazendas doPantanal. Durante os anos 60 a 73, a área média de inundação no Pantanalera da ordem de 16 a 20 mil km2, com cota média máxima anual da ordemde 2,0 m. Depois deste período até os últimos anos, observou-se um au-mento significativo na área média anual de inundação do Pantanal para valo-res da ordem de 50 mil km2, com cota média anual máxima em Ladário daordem de 5,0 m. Portanto, quem comprou uma fazenda próximos aos riosnos anos de 60, praticamente perdeu a sua área depois período, já que a áreapassou a ficar quase permanentemente inundada. Na figura 6.6 são apresen-tadas as áreas inundadas no Pantanal.

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De outro lado, a inundação é a fonte de nutrientes que permite asustentabilidade da fauna e flora do Pantanal no período de seca. As figuras6.7 e 6.8 mostram os cenários de inundação e de seca do Pantanal.

As enchentes devido à urbanização são destaque também nesta bacia,pois grandes cidades estão localizadas: na cabeceira do rio Tietê, cidade deSão Paulo; no rio Iguaçu a cidade de Curitiba; além de um grande númerode cidades de porte como Campinas, Piracicaba, Campo Grande, entre ou-tras. Os problemas relacionados com o inadequado desenvolvimento da dre-nagem urbana destas cidades é a principal causa dos impactos ocorridos nosúltimos anos.

O Alto Tietê, que abrange a região metropolitana de São Paulo (figura6.9), produz inundações freqüentes devido à urbanização intensa, com alta

Figura 6.6 Níveis de Inundação estimados no Pantanal (Hamilton et al,1995)

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impermeabilização do solo e macro-drenagem inadequada. As enchentesprovocadas pelos rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, além daquelas emcórregos e ribeirões, atingiram 75.000 habitantes na cheia de 1983.

O médio e alto cursos do rio Iguaçu produzem cheias que atingem aregião metropolitana de Curitiba, no Paraná, tendo também como fator agra-vante o efeito da urbanização. As enchentes ribeirinhas naturais do Iguaçuatingem várias cidades, entre elas União da Vitória (PR) e Porto União (SC),em função de trechos com baixas declividades e grandes planícies de inun-dação que são ocupadas indiscriminadamente.

A laminação de cheias por barragens teve sua efetividade diminuídaporque o benefício que causava a jusante, ao diminuir os níveis e ocorrênci-as das cheias, foi em parte anulado pela ocupação ribeirinha na nova situa-ção.

Nesta região, como um todo, observou-se que o período antes de 83apresentou cheias de magnitudes médias e pequenas. Depois de 83 as inun-

Figura 6.7 Pantanal no período de cheia

Figura 6.8 Pantanal no período de seca

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Figura 6.9 Inundações no rio Tietê na ponte das Bandeiras

dações se amplificaram produzindo impactos significativos sobre a popula-ção que tinha se ocupado as áreas de risco entre os anos 70 e 80, de maiorcrescimento populacional no Sul e Sudeste do Brasil. Os prejuízos foraminevitáveis.

Somado a estes problemas, o desenvolvimento urbano com projetosde drenagem urbana inadequados levaram ao aumento dos prejuízos e afreqüência das inundações. Este processo também ocorreu no mesmo perí-odo e se agravando no final do século passado, continuando neste século.

6.2.7 Bacia do Uruguai

As inundações ribeirinhas são um dos principais problemas regionaisda bacia, principalmente no médio Uruguai (figura 6.10). As cheias se mani-festam mais intensamente nas áreas baixas (planícies de inundação) próxi-mas à calha principal do rio, com o alagamento de áreas urbanas (casos deUruguaiana, Itaqui e São Borja) e áreas rurais economicamente exploradas(arroz e pecuária). Existe a tendência da população ocupar a planície deinundação durante anos de pequenas inundações, criando potencial risco deprejuízos para o futuro, quando ocorrem enchentes mais críticas. No rioUruguai, antes de 1983 observaram-se enchentes pequenas ou médias porum período razoavelmente longo. Esta baixa freqüência induziu a popula-ção a ocupar a área de risco da planície de inundação. Em 1983 ocorreu amaior enchente registrada neste rio, produzindo prejuízos significativos naregião. Foram atingidas 27,7 mil pessoas em 73 cidades com a cheia de 1983,segundo a Defesa Civil do Rio Grande do Sul. Há cheias anuais nesta bacia,atingindo normalmente, mais de 2 mil pessoas.

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Figura 6.10 Características dos recursos hídricos na Bacia do rio Uruguai.

As inundações ribeirinhas são as principais e ocorrem principalmentenas cidades de Marcelino Ramos e Itá no alto Uruguai, Porto Lucena, SãoBorja, Itaqui e Uruguaiana no médio Uruguai, trecho internacional e Ale-grete no rio Ibiraiputã (afluente do Ibicuí, que é afluente da margem esquer-da do rio Uruguai). Depois de 83 foi realizado o mapeamento das áreas deinundação destas cidades no rio Uruguai (excetuando Alegrete e Itá) e ummodelo de previsão de cheia para Itaqui e Uruguaiana pelo IPH para o Con-selho Estadual de Recursos Hídricos. Os municípios não utilizaram omapeamento devido à falta de envolvimento da comunidade nos estudos. Omodelo de previsão vem sendo utilizado pela Defesa Civil para alerta dacomunidade ribeirinha.

6.2.8 Bacia do Atlântico Sul-Sudeste

Esta região apresenta um conjunto de bacias que escoa para o mardesde a divisa entre São Paulo e Rio de Janeiro e o limite brasileiro ao Sul doRio Grande do Sul. As inundações ribeirinhas ocorrem em quase todas asbacias litorâneas (próximo de Joinville e Florianópolis) e nas bacias maiorescomo Ribeira de Iguape, Itajaí-Açu (em 83 e 84 os eventos de inundaçãorepresentaram grandes impactos), Tubarão (em 1974 produziu impactos sig-

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nificativos sobre todo o vale) e a bacia do Jacuí/Taquari (em 1941 provoca-ram a maior inundação ribeirinha de Porto Alegre). Além das inundaçõesribeirinhas a maioria das cidades também experimentam inundações devidoa urbanização como Porto Alegre, Florianópolis, Joinville e outras.

Na bacia do rio Itajaí-Açu em Blumenau existe a maior série de mar-cas históricas e observação hidrológica do Brasil. Desde 1852 são registradastodas as inundações que saem do leito menor rio (cota 9,0 m),correspondendo atualmente a 151 anos de dados. Observa-se que a maiorcota ocorreu em 1880 com 17,10 m. Nesta bacia, como em outras da regiãoSul e Sudeste houve um período muito longo de 1912 a 1982 com cotasinferiores a 13,0 m, sendo que no período posterior e anterior ocorreramvárias cotas superiores.

Na cidade de Porto Alegre existem cotas máximas de cheia desde1889 (figura 6.11), sendo a maior ocorrida em 1941 (figura 6.12). A últimacheia ocorrida em Porto Alegre foi em 1967. Em 1970 foi construído umdique de proteção de inundação, que ainda não foi utilizado, pois nos últi-mos 35 anos as inundações têm sido menores. Nos últimos existem umapressão de parte da comunidade para a retirada do dique de proteção, o queseria uma temeridade.

As inundações nas cidades litorâneas apresentam a conjunção de doisefeitos: (a) precipitações intensas sobre a bacia hidrográfica; (b) oscilação damaré a jusante que represa o escoamento. Estas condições são mais críticasquando ocorrem storm surges , que são o aumento da amplitude da marédevido a tempestades que se deslocam pelo mar, com vento altos. Joinvilleem Santa Catarina pode inundar pelas duas condições acima e mesmo pelaconjunção dos dois fenômenos que seria crítico.

Figura 6.11 Cotas de Inundações em Porto Alegre

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Tucci et al.

Figura 6.12 Inundação de 1941 no Porto de Porto Alegre

6.2.9 Síntese dos recursos hídricos

Tucci (2001) analisou os principais aspectos de recursos hídricos doBrasil, com base nos estudos realizados para o Plano Nacional de RecursosHídricos (FGV,1998). Dentro deste conjunto de análise encontram-se osdestaques da água no meio urbano e as inundações.

Para consolidar uma síntese dos principais aspectos relacionados comrecursos hídricos foram adotados os seguintes componentes

Usos da água: são os usos tradicionais consuntivos: abastecimentodoméstico, animal e industrial e irrigação; e os usos não-consuntivos: energia elétrica, navegação e recreação;Impactos dos usos da água: efluentes domésticos, industriais, da drena-gem urbana e das áreas agrícolas, navegação, energia elétrica;Impactos sobre a sociedade: são as inundações e as doenças de veiculaçãohídrica;Impactos ambientais são os restantes como usos do solo, desmatamento,queimadas, mineração, etc.

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Na tabela 6.4 é apresentado um resumo para todas as bacias brasilei-ras sobre os aspectos mais relevantes de recursos hídricos identificados namesma de acordo os níveis citados e dentro da classificação acima.

Este mapeamento permite num primeiro estágio identificar os princi-pais aspectos de recursos hídricos nas diferentes bacias e verificar quais sãoos reais problemas em nível nacional (grande abrangência espacial) e os comcaracterísticas mais regionais. Como se observa da análise regional, os prin-cipais aspectos que aparecem em todas as bacias são:

Efluentes urbanos: deteriorização da qualidade da água dos rios navizinhança das cidades devido aos efluentes de esgotamento sanitá-rio doméstico, industrial e de drenagem urbana, além dos resíduossólidos;Inundações ribeirinhas e urbanas: inundações resultantes da ocupaçãodas áreas de risco ribeirinhas e as inundações que aumentaram defreqüência e impacto devido a urbanização das cidades;Impactos devido ao inadequado uso do solo: desmatamento, queimadas,contaminação devido as áreas agrícolas e erosão do solo;Monitoramento e previsão : limitações da rede de monitoramento quan-titativo necessita modernização, ampliação para cobrir pequenas ba-cias rurais e urbanas e melhoria para monitoramento de sedimentose qualidade da água; a necessidade de desenvolvimento de previsãoantecipada dos condições hidroclimáticos;Instrumentos legais: ampliar o apoio aos Estados para instituir sua le-gislação estadual e/ou regulamentá-la, criar as bases da gestão anível dos Estados;Instituir os instrumentos de gestão: necessidade de implementação doscomitês e agências de bacia, desenvolvimento dos Planos e dosmecanismos de outorga e cobrança;Capacitação: necessidade de investimento em capacitação em recur-sos hídricos para atender a demanda de todos os níveis.

Os impactos gerados pelo desenvolvimento urbano ocorrem, entreoutros fatores, porque os municípios não possuem capacidade institucionale econômica para administrar o problema, enquanto os Estados e a Uniãoestão distantes demais para buscar uma solução gerencial adequada que osapoie. Cada um dos problemas (abastecimento, esgotamento sanitário, dre-nagem urbana e resíduo sólido) é tratado de forma isolada, sem um planeja-

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mento preventivo ou mesmo curativo dos impactos. Como conseqüência,observam-se prejuízos econômicos, forte degradação da qualidade de vida,com retorno de doenças de veiculação hídrica, mortes, perdas de moradias ebens, interrupção de atividade comercial e industrial em algumas áreas, en-tre outros (ciclo de contaminação, veja capítulo 2). O custo de controle des-tes impactos na fase de planejamento é muito menor que o curativo depoisque os problemas ocorrem.

Tabela 6.4 Resumo dos principais aspectos de recursos hídricos das baciasbrasileiras (Tucci, 2001).

* termos - AM - Amazônia; TO - Tocantins; ANNE - Atlântico Sul - Norte/Nordeste; SF- São Francisco; AL - Atlântico Sul - Leste; PR - Paraná, PA - Paraguai; UR - Uruguai e AS- Atlântico Sul - Sul;* avaliação: 1 destacado; 2 - secundário. Quando não é citado não foi destacado na avaliaçãonem nos programas de ação da bacia; 3 citado com pouco destaque; alguns dos aspectosforam incluídos por este autor, mesmo sem citação no texto em função de sua interpreta-ção de importância.

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Com o gerenciamento por bacias hidrográficas, que deverá contar coma participação de diversos atores sociais, serão colocados os mecanismos deimpulsão para a redução dos impactos. Entretanto, a melhoria dos serviçosde saneamento (aqui incluídos drenagem e resíduos sólidos) dependerá de:mecanismos legais para cobrança de planos integrados urbanos de esgota-mento sanitário, drenagem urbana e resíduo sólido, de acordo com o tama-nho das cidades; mecanismos de financiamento do plano e de suaimplementação. Este processo envolve uma participação financeira dos trêsníveis com subsídio bem direcionado e inteligente com visão integrada delongo prazo dos investimentos para redução das cargas dos efluentes urba-nos.

6.3 Aspectos institucionais relacionados com águas urbanas

6.3.1 Água e saneamento

No âmbito de água e saneamento a constituição brasileira de 1988prevê que o direito de concessão dos serviços público é do município. Noentanto, desde os anos 70 a operação dos serviços de água e saneamento noBrasil tem sido realizado através de empresas estaduais, incentivadas parapossuírem porte econômico para empréstimos e desenvolvimento de servi-ços.

Nos últimos anos o governo, sem recursos públicos para investir nosetor, procurou desenvolver um programa de privatização no setor, masesbarrou na condição de que as empresas estaduais sem o direito de conces-são dos serviços possuíam menor valor econômico. Foi enviada ao Con-gresso em 2001 uma proposta de legislação que permitia às empresas esta-duais gerenciar os serviços de mais de um município, cenário comum nasregiões metropolitanas brasileiras. Houve, no entanto, um impasse na dis-cussão e aprovação desta legislação, já que foi considerado pelo setor políti-co ligado aos municípios que os mesmos poderiam perder o direito de con-cessão, contrariando a constituição. Este impasse tem limitado os investi-mentos na área e agravado as condições de saneamento das cidades brasilei-ras.

A ANA Agência Nacional de Águas, dentro da preocupação de con-trole dos efluentes das cidades brasileiras, lançou em 2001 um programa deCompra esgoto. Este programa subsidia em 50% os investimentos de coleta etratamento de esgoto dos municípios, mas paga na forma de volume de

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tratado e não pelas obras. O município se candidata ao programa desdeque a bacia em que está inserida tenha comitê de bacia instalado em funci-onamento e recebe em títulos para negociar no mercado. O governo de-sembolsa efetivamente com a comprovação do tratamento dentro de ní-veis estabelecidos. Este tipo de procedimento permite garantir que os in-vestimentos sejam gastos tendo como meta a melhoria da qualidade daágua e não obras de pouco resultado efetivo como tem ocorrido na maioriadas cidades. Os recursos para este programa ainda são pequenos e atingemum número pequeno de cidades. Neste programa os outros fatores não sãoconsiderados como a drenagem urbana e os resíduos sólidos.

6.3.2 Inundações e drenagem urbana

Até 1990, o extinto DNOS - Departamento Nacional de Obras deSaneamento -, em nível federal, atendia parte desses problemas. Com o seufechamento e a redução de técnicos, a Secretaria de Desenvolvimento Regi-onal ficou com o pouco que resta para apoiar as cidades, apesar da Consti-tuição Federal no Título III, Capítulo II, Artigo 21o, estabelecer que �competeà União� e, no inciso XVIII, �planejar e promover a defesa permanente contra ascalamidades públicas, especialmente as secas e inundações�. As atribuições relativas aenchentes e secas da Secretaria de Desenvolvimento Regional, após váriasreformas administrativas nos anos 1990, passaram à responsabilidade doMinistério da Integração Nacional, que coordena o Sistema Nacional deDefesa Civil.

Em 2000, pela Lei n.º 9.984, que cria a Agência Nacional de Águas -ANA, é a ela atribuída, no Art. 4(, Item X, a função de �planejar e promoverações destinadas a prevenir ou minimizar os efeitos de secas e inundações,no âmbito do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,em articulação com o órgão central do Sistema Nacional de Defesa Civil ,em apoio aos Estados e Municípios�. Desta forma o Governo Federal recriauma estrutura administrativa capaz de dar maior atenção ao problema dasenchentes, algo que era difícil de executar apenas no âmbito do Ministérioda Integração Nacional.

Foi a Lei n.º 9.433, de 1997, que instituiu a Política Nacional de Re-cursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de RecursosHídricos, acima referido, e que regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Cons-tituição Federal. Entre os vários fundamentos contidos nesta lei, pode-sedestacar para as enchentes que a bacia hidrográfica é a unidade territorial

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para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuaçãodo Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. A gestãodos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participaçãodo poder público, dos usuários e das comunidades. Entre os objetivos estáa preservação e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origemnatural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais. Dentre asdiretrizes que podem ter maior efeito no combate às enchentes destacam-se a integração e articulação da gestão de recursos hídricos com: a gestãoambiental, os planejamentos regional, estadual e nacional e de uso do solo.Como instrumentos básicos, destacam-se os Planos de Recursos Hídricos.

De acordo com este quadro institucional, o Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos, no que se refere à prevenção e con-trole de cheias, sobrepõe-se, mas não opõe-se à estrutura administrativa exis-tente. A lei mantém as competências dos organismos existentes e potencializasua atuação, envolvendo basicamente a Agência Nacional de Águas e o Mi-nistério da Integração Nacional e dois importantes apoios:a Secretaria deObras e o Sistema Nacional de Defesa Civil, principalmente a sua articula-ção e aproximação com Estados e Municípios. O Sistema Nacional deGerenciamento de Recursos Hídricos, ao promover uma descentralizaçãoda gestão para a esfera local da bacia hidrográfica, procura efetivar umaparceria do poder público com a sociedade civil organizada. O poder decisóriopassa a ser compartilhado nos Comitês de Bacia Hidrográfica e nos Conse-lhos de Recursos Hídricos (Nacional ou Estaduais). Está prevista também aviabilidade financeira, ao destinar parte dos recursos arrecadados com a co-brança pelo uso da água ao custeio dos organismos que integram o sistemae à constituição dos financiamentos das intervenções identificadas pelo pro-cesso de planejamento.

Apesar da melhora institucional, talvez por ser muito recente, verifi-ca-se que, atualmente, as administrações estaduais, em geral, não estão pre-paradas técnica e financeiramente para planejar e controlar os impactos dasenchentes, já que os recursos hídricos ainda são normalmente tratados deforma setorizada (energia elétrica, abastecimento urbano e tratamento deesgoto, irrigação e navegação), sem que haja maior interação na administra-ção e seu controle. A regulamentação do impacto ambiental envolve o con-trole da ação do homem sobre o meio ambiente mas não tem sido eficientenas ações de prevenção e controle de enchentes.

Em 2001, o Ministério da Integração Nacional, por ocasião das en-chentes de MG, SP e RJ, reconheceu publicamente que havia necessidade deelaborar planos contra o excesso de chuvas, para não reduzir as ações a

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ajudas emergenciais nas áreas afetadas pelas enchentes. O plano contra en-chentes faria um levantamento histórico das cheias, do que poderia ter sidofeito e não se fez nas enchentes passadas, de forma a ter-se um planoemergencial e um plano preventivo. Aspectos como deslocamento de popu-lações ribeirinhas deveriam ser estudados. Também a articulação em sintoniacom as defesas civis locais, já que a grande dificuldade é que estas são autô-nomas, sem nenhum vínculo com o governo federal. As ações emergenciaissofrem entraves burocráticos incompatíveis com esse adjetivo pela falta decaminhos claros e necessidade de uso das estruturas de defesa civil. É aDefesa Civil do município, ou do Estado, ou a Prefeitura que toma a inicia-tiva de encaminhar à Defesa Civil nacional um projeto de recuperação dosprejuízos (construção de casas, por exemplo) para cujos custos é obrigada adar uma contrapartida. Isso necessita de um convênio com o Governo Fe-deral, pois é por ele que é repassado o dinheiro, feita a fiscalização e entre-gue a prestação de contas ao Tribunal de Contas.

Na esfera municipal, as prefeituras foram pressionadas a estabelece-rem Planos Diretores Urbanos (A Constituição de 1988 dá prazo aos muni-cípios para elaboração destes Planos), que, na sua quase totalidade, não con-templam os aspectos de prevenção contra a ocupação dos espaços de riscode enchentes. Observa-se que os Planos Diretores já tratam de aspectos depreservação ambiental do espaço, disseminados pela divulgação da prote-ção ambiental, mas, por falta de conhecimento e orientação, não se observanenhum dispositivo de prevenção da ocupação das áreas de risco de enchentes.

A gestão atual da drenagem urbana é setorizada em relação aos outrosaspectos das águas urbanas. A atribuição é municipal e tem sido exercidaisoladamente, sem concertação com municípios vizinhos na mesma bacia.A responsabilidade fica geralmente com a secretaria de obras do município.O controle de enchentes urbanas é estabelecido através de medidas desen-volvidas dentro do município através de legislação municipal e ações estru-turais específicas.

A legislação sobre o uso do solo, que pode ter efeito sobre enchentesurbanas, é municipal. Porém, os Estados e a União podem estabelecer nor-mas para o disciplinamento do uso do solo visando a proteção ambiental,controle da poluição, saúde pública e da segurança. Desta forma, observa-seque, no caso da drenagem urbana, que envolve o meio ambiente e o contro-le da poluição, a matéria é de competência concorrente entre Município,Estado e Federação. A tendência é dos municípios introduzirem diretrizesde macrozoneamento urbano nos Planos Diretores urbanos, incentivadospelos Estados.

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Observa-se que, no zoneamento relativo ao uso do solo, não tem sidocontemplados pelos municípios os aspectos de drenagem e inundações. Oque tem sido observado são legislações restritivas quanto à proteção de ma-nanciais e ocupação de áreas ambientais. A legislação muito restritiva so-mente produz reações negativas e desobediência. Portanto, não atingem osobjetivos de controle ambiental. Isto ocorre na forma de invasão das áreas,loteamentos irregulares, entre outros.

Atualmente as legislações do uso do solo se apropriam da proprieda-de privada e ainda exigem o pagamento de impostos pelo proprietário quenão possui alternativa econômica. A conseqüência imediata na maioria dassituações é a desobediência legal.

O licenciamento ambiental estabelece os limites para construção eoperação de canais de drenagem, assim como para outras obras hidráulicaspara drenagem.

Na situação atual, o controle institucional da drenagem que envolvemais de um município pode ser realizado pelo seguinte:

através de legislação municipal adequada para cada município;através de legislação estadual que estabeleça os padrões a seremmantidos nos municípios de tal forma a não serem transferidos osimpactos;uso dos dois procedimentos anteriores.

Provavelmente a última hipótese deverá ocorrer a longo prazo. Acurto prazo é mais viável a primeira opção, até que o comitê da bacia e osPlanos Estaduais desenvolvam a regulamentação setorial. Portanto, quandoforem desenvolvidos os Planos das bacias que envolvam mais de um muni-cípios deve-se buscar acordar ações conjuntas com estes municípios para seobter o planejamento de toda a bacia.

O mecanismo previsto na legislação brasileira para o gerenciamentoexterno das cidades é o Plano de Recursos Hídricos de Bacia. No entanto,dificilmente no referido Plano será possível elaborar o Plano de Drenagemde cada cidade contida na bacia. O Plano deveria estabelecer as metas que ascidades devem atingir para que o rio principal e seus afluentes atinjam níveisambientalmente adequados de qualidade da água. O Plano de DrenagemUrbana deveria obedecer os controles estabelecidos no Plano da bacia noqual estiver inserido. O comitê de bacia subsidiaria parte dos recursos paraelaboração dos Planos. O ressarcimento dos investimentos seria efetuado

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através das taxas municipais específicas para esgotamento sanitário, resí-duo sólido e drenagem urbana, este último baseado na área impermeáveldas propriedades.

Em termos específicos, a legislação municipal deveria preocupar-seem:

inserir nos códigos municipais determinações para evitar crescen-tes impermeabilizações dos terrenos, favorecendo a infiltração ediminuindo a quantidade de água que escoa para os rios e córregos.Uma possibilidade seria fazer com que novas construções tenhamdescontos nos impostos caso disponham de caixas para retençãoda água de chuva. Além de contribuir para a melhoria do sistemade drenagem urbano, a água armazenada pode ser utilizada pararegar jardins e lavagem em geral, possibilitando economia de águapotável;devem ser tomados cuidados para não aumentar os riscos de doen-ças transmitidas por vetores que se desenvolvem na água;delimitar áreas ao longo dos rios para uso como parques recreativose esportivos, evitando ocupação desordenada das margens e permi-tindo que os rios possam extravasar por ocasião das chuvas intensas,como é natural que ocorra.

6.4 Áreas ribeirinhas

6.4.1 Impactos

As enchentes ribeirinhas produzem impactos econômicos significati-vos sobre uma comunidade. Nas cidades de Porto União e União da Vitória,na divisa entre Paraná e Santa Catarina as cheias de 83 (prejuízos de US $ 78milhões) e depois a de 1992 (prejuízos de US $ 55 milhões) afetaram deforma significativa a vida econômica da cidade. JICA(1988) estimou em 7%do valor de todas propriedades de Blumenau o custo médio anual de en-chentes nessa cidade . O prejuízo previsto em todo o Vale do Itajaí para umacheia de 50 anos foi de 250 milhões de dólares.

Os principais impactos das inundações são:

a destruição das propriedades pela água;perdas de vida humana levadas pela correnteza;

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deslizamento de casas devido a drenagem das encostas, produzin-do freqüentes mortes e prejuízos (figura 6.13).

Estes prejuízos geralmente ocorrem pela ocupação da área de risconos anos de pequenas inundações e quando voltam a ocorrer eventos extre-mos os prejuízos são inevitáveis. A percepção do risco geralmente é peque-na e se resume aos poucos anos no passado.

Em Porto Alegre a grande enchente deste século foi em 1941 (Figs.6.11e 6.12) e atingiu grande parte do centro da cidade e algumas áreas ribeiri-nhas. Até 1967, ocorreram enchentes de menor porte, mas depois dessadata, não houve nenhuma cheia importante. Na década de 70, foi construídoum sistema de diques de proteção para a cidade. A necessidade desse siste-ma de proteção vem sendo questionada por parte significativa da popula-ção, já que nos últimos 30 anos, não ocorreu nenhuma enchente que tenhaatingido a cota de proteção. No entanto, as condições de risco não se altera-ram na bacia.

Em algumas cidades onde a freqüência de inundação é alta, as áreasde risco são ocupadas por subabitações, porque representam espaço urbanopertencente ao poder público ou desprezado economicamente pelo poderprivado. A defesa civil é, constantemente, acionada para proteger essa parteda população. A questão com a qual o administrador municipal depara-se,nesse caso, é que, ao transferir essa população para uma área segura, outrosse alojam no mesmo lugar, como resultado das dificuldades econômicas edas diferenças sociais.

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Figura 6.13 Casa em encosta em Caxias do Sul (RS)

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Devido a tais impactos, a população pressiona seus dirigentes porsoluções do tipo estrutural, como canalização, barragens e diques. Essasobras, em geral, têm um custo que os municípios e, muitas vezes, os Esta-dos, não têm condições de suportar.

Na realidade brasileira o impacto ocorreu principalmente porque omaior desenvolvimento se deu durante o período de pequenas inundaçõesna região Sul e Sudeste. Nos anos 80, principalmente depois da cheia de 83os impactos foram significativos já que as áreas de risco tinham sido ocupa-das nos últimos anos.

O controle atual não prioriza a prevenção, pois quando ocorre a inun-dação, é declarada calamidade pública e a cidade recebe recursos públicos afundo perdido e não necessita licitação para gastá-lo. Enquanto este proces-so ocorrer, dificilmente serão implementadas medidas de controle sustentá-veis como o zoneamento das áreas de inundação.

6.4.2 Zoneamento

No Brasil, não existe nenhum programa sistemático de controle deenchentes que envolva seus diferentes aspectos. O que se observa são açõesisoladas.

As enchentes poderiam ser minimizadas por diferentes medidas decontrole : medidas estruturais, que envolvem obras e modificações do rio emedidas não-estruturais que envolvem convivência com o rio. Nestas últi-mas, as medidas são do tipo preventivo e envolvem o zoneamento de áreasde inundação, sistemas de alerta e seguros. Certamente, podem ser combi-nadas medidas estruturais e não-estruturais para a melhor solução.

No Plano Diretor de Estrela, no Rio Grande do Sul foi introduzidaregulamentação para ocupação das áreas de risco em 1979. A legislação pre-via um cota limite inferior para ocupação junto a margem do rio Taquari.Este rio apresenta grandes flutuações de níveis e pode produzir prejuízos erisco a vida humana. Como a Prefeitura não possuía recursos para relocar apopulação que já ocupava a área de risco, criou uma legislação especial quepermite a troca de área de inundação por índice de ocupação nas áreas no-bres da cidade, gerando portanto um mercado para as áreas de inundação(Rezende e Tucci, 1979). Nos últimos anos foi reduzido o número de ocor-rências de inundações na cidade. Na década de 80 a Câmara Municipal deVereadores chegou a diminuir a cota de área de risco, visando a construçãode habitação para população de baixa renda, mas mudou após a reação pú-

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blica a esta ação. Isto demonstra a necessidade de vigília e participaçãopública permanente.

O DAEE (1990), com o apoio de várias Associações ligadas a Recur-sos Naturais, desenvolveu recomendações para artigos da seção de Recur-sos Hídricos nas leis orgânicas dos municípios para o Estado de São Paulo,onde, no art. 2, inciso IV, é prescrito que se deve � proceder ao zoneamento dasáreas sujeitas a riscos de inundações, ..� e, no inciso VI, é recomendado o seguin-te: � implantar sistema de alerta e defesa civil, para garantir a saúde e segurança públi-cas, quando de eventos hidrológicos indesejáveis�.

Na bacia do Uruguai, em 1984, o Conselho de Recursos Hídricos doEstado desenvolveu com o IPH o citado estudo (ver item 6.2.7) dezoneamento para algumas cidades ribeirinhas do vale do rio Uruguai. Oestudo proposto envolvia três etapas e se concentrava em medidas não-estruturais como o zoneamento de inundações e o alerta. Inicialmente fo-ram elaborados os mapas de inundações com informações secundárias eindicadas medidas preliminares para ocupação do solo das cidades: MarcelinoRamos, Porto Lucena, São Borja, Itaqui e Uruguaiana. Na segunda etapa foipreparado um modelo simplificado para prever as enchentes de Uruguaianacom base em Itaqui e de Itaqui com base em São Borja. O zoneamento nãofoi aproveitado pelas cidades, principalmente devido a falta de uma açãoinstitucional mais forte junto aos municípios.

Na bacia do rio Itajaí-Açu ao longo da década de 70 foram construídasduas barragens de controle de inundações (figura 3.9 capítulo 3) pelo DNOS.Na década de 90 foi concluída uma terceira barragem no rio Hercílio, aflu-ente do rio Itajaí. Estas barragens possuem limitada capacidade de controledas inundações. Na década de 80 foi realizado um estudo pela JICA ondeforam previstas várias outras ações de controle estrutural que correspondiamna época (década de 80) a recursos da ordem de US$ 400 milhões. Estasobras correspondiam a canalização e ampliação da capacidade de escoa-mento junto as cidades. Neste mesmo período foi desenvolvido pela CPRMpara o DNAEE um estudo de mapeamento das áreas de inundação emnove cidades da região que poderiam orientar o zoneamento. No entanto,não houve interesse das cidades no desenvolvimento de medidas não-estru-turais. Havia na região uma busca de soluções com obras de canais e barra-gens que deixavam de lado as medidas não - estruturais, mas mesmo assimas medidas estruturais não foram executadas. No entanto, foi instalado nadécada de 80 um sistema de alerta em tempo real para a bacia, que temapresentado contribuição à minimização dos impactos.

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Na bacia do rio Iguaçu em União da Vitória e Porto União o impactodas inundações foi severo para as comunidades, principalmente de 1983para cá, em função de um período muito longo sem inundações significati-vas. As inundações na cidade foram atribuídas inicialmente à construção deuma barragem a jusante da cidade pela COPEL, Companhia de EnergiaElétrica do Paraná. A comunidade e a companhia tiveram um litígio quedurou mais de 10 anos e somente quando houve um trabalho técnico deesclarecimento com a participação de uma ONG (COPRERI) foi possívelencaminhar soluções não estruturais para minimizar os impactos da cidade(veja descrição detalhada deste caso no capítulo 10).

Como se observa, não existe nenhum programa sistemático em qual-quer nível para controle da ocupação das áreas de risco de inundação noBrasil. Há, apenas, poucas ações isoladas de alguns poucos profissionais.Em geral, o atendimento a enchente somente é realizado depois de sua ocor-rência. A tendência é que o problema fique no esquecimento após cadaenchente, retornando na seguinte. Isso se deve a vários fatores, entre osquais estão os seguintes:

falta de conhecimento sobre controle de enchentes por parte dosplanejadores urbanos;desorganização, em níveis federal e estadual, sobre controle de en-chentes;pouca informação técnica sobre o assunto em nível de graduação naEngenharia;o desgaste político para o administrador público, resultante do con-trole não-estrutural (zoneamento), já que a população está sempreesperando uma obra hidráulica;falta de educação da população sobre controle de enchentes.

Como não existe um programa preventivo de controle de inunda-ções, quando ocorre a inundação, o prefeito com o governador declaracalamidade pública e recebe recursos federais e estaduais a fundo perdido.Além disso, para gastar este recurso não é necessário concorrência pública.Este tipo de ação da administração pública incentiva a desorganizaçãopreventiva dos municípios. O zoneamento de áreas de inundação, geral-mente a ação mais apropriada para a maioria das situações deixa de setornar viável, pois requer um esforço político e de esclarecimento públicomuito grande. Observa-se dos exemplos acima, que o zoneamento de áre-

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

as de inundação somente foi efetivamente adotado quando houve interes-se local no estudo e implementação desde seu início.

6.4.3 Sistemas de alerta

As atividades da prevenção de eventos críticos têm estreita relaçãocom as atribuições da Defesa Civil. Enquanto a atuação da defesa civil temo objetivo de reduzir desastres e compreende ações de prevenção, de prepa-ração para emergências e desastres, de resposta ao desastre e de reconstru-ção, a prevenção de eventos críticos está voltada para ações que permitamplanejar com antecedência a melhor forma de controlar as águas de umacheia e os deslizamentos provocados por uma forte chuva. As duas ativida-des complementam-se.

Neste contexto, uma das atividades que se pode destacar é a implanta-ção de sistemas de alerta contra enchentes. O Sistema de Alerta é uma me-dida não-estrutural adotada na minimização de prejuízos causados por chei-as nas bacias hidrográficas. O objetivo é prever, com relativa precisão, even-tos de chuva ou aumento do nível de águas de um rio para avisar às popula-ções, com antecedência, para que desocupem áreas sujeitas a inundações.Em geral, a defesa civil é acionada e começa a funcionar o seu plano deemergência. Ações como circular com veículos de som pela cidade, avisan-do à população que é preciso evacuar áreas de risco, colocar caminhões àdisposição para retirada de móveis e objetos de valor, encaminhar pessoaspara abrigos seguros, recolher alimentos e agasalhos são típicas de uma situ-ação de emergência.

O sistema de alerta contra enchentes na Bacia do Rio Doce

O Sistema de Alerta Hidrológico da Bacia do Rio Doce tem comoobjetivo alertar 16 municípios da bacia quanto ao risco de ocorrência deenchentes. No caso da bacia do rio Doce, o Sistema vem sendo operadodesde janeiro de 1997, com interrupção apenas no período de dezembro de2000 a março de 2001.

O Sistema de Alerta implantado funciona nas dependências da CPRMem Belo Horizonte, Minas Gerais, onde são coletados dados de chuvas evazões das estações hidrometeorológicas e vazões defluentes das usinas hi-drelétricas existentes na região do alerta. A operação do Sistema de Alerta écomposta de 5 etapas: (a) coleta de dados; (b) armazenamento e atualizaçãodos dados coletados; (c) análise; (d) elaboração da previsão hidrológica; (e)

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Tucci et al.

transmissão das informações para os 16 municípios beneficiados pelo Siste-ma, localizados ao longo dos rios Piranga, Piracicaba e Doce.

Para as estações automáticas integrantes do sistema de Alerta, a coletade dados é feita 24 horas por dia, de duas em duas horas, durante a operaçãonormal e de uma em uma hora em situações de alerta. Para as demais esta-ções e as usinas hidrelétricas, a coleta é feita duas vezes por dia, às 7 e 17horas.

O armazenamento dos dados é feito em um banco de dados, permi-tindo análises através do traçado de cotagramas, fluviogramas e hietogramas,bem como o cálculo das vazões das estações fluviométricas e a confecçãodo boletim de acompanhamento dos dados. Além disso, diariamente, às 7horas, é feita a atualização dos dados na página da Internet (www.2xr.com.br/simge) que divulga regularmente a previsão dos níveis para as diversas loca-lidades beneficiadas pelo Sistema.

A partir dos dados coletados e devidamente armazenados, é feita aanálise da evolução dos níveis dos rios, bem como a previsão hidrológicacom antecedência de 6, 12 e 24 horas, dependendo da localidade, principaisprodutos produzidos pelo Sistema de Alerta. A Figura 6.14 mostra comofoi prevista a cheia ocorrida no início de janeiro de 2002.

Figura 6.14 Previsão para a cidade de Governador Valadares,em janeiro de 2002.

Fonte: Sistema de Meteorologia e Recursos Hídricos deMinas Gerais.

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Atualmente, a previsão hidrológica é feita por meio de correlaçõessimples de vazões e fornece a estimativa da vazão e da cota dos rios paraalgumas cidades integrantes do Sistema. Esta correlação não quantifica oincremento de vazão devido a uma chuva localizada. A previsão existentefornece apenas a cota a ser atingida na estação próxima à cidade. Entretanto,não se sabe, efetivamente, qual área será inundada. Para tanto, torna-se ne-cessária a elaboração de um estudo de definição de áreas inundáveis.

A melhoria do Sistema como um todo, contempla, em primeiro lugar,o ajuste de modelos hidrológicos na bacia visando cobrir deficiências daprevisão existente, bem como otimizar a utilização dos dados coletados,principalmente no que diz respeito aos dados de precipitação; em seguida,busca a elaboração de um estudo de definição de planície de inundação, paraos diferentes tempos de retorno, com o objetivo de indicar as áreas de riscode inundação nas cidades e minimizar os impactos das cheias.

O sistema de alerta contra enchentes na Bacia do Rio Itajaí

O vale do Itajaí localiza-se na Região Sul do Brasil, no Estado de San-ta Catarina. Possui uma população da ordem de 900.000 habitantes e o mai-or parque industrial do Estado de Santa Catarina. A bacia do Itajaí sofre,tradicionalmente o efeito de cheias dos rios Itajaí-Açu e Itajaí Mirim devidoà rápida resposta às chuvas fortes que ocorrem em suas bacias. Em quase150 anos de existência, foram registrados 67 enchentes, atingindo cidadescomo Blumenau, Rio do Sul, Gaspar e outras.

Para a prevenção das cheias já existe um sistema de barragens, mas éde fundamental importância dispor-se de um sistema de alerta e previsão deeventos baseado num acompanhamento hidrometeorológico permanente.

As diretrizes principais estabelecidas para o Sistema são: (a)montaruma rede telemétrica de chuva e nível com a aquisição de 17 estações auto-máticas hidrometeorológicas na bacia do rio Itajaí; (b)adequar omonitoramento meteorológico com a utilização do radar da cidade deFraiburgo (SC); e (c)estruturar a central de operações para o sistema de aler-ta na bacia.

O Projeto visará à obtenção de dados com antecipação dos eventoscríticos, com alto nível de precisão e, consequentemente, possibilitando umamaior segurança à população das regiões envolvidas, com a melhor prote-ção à vida e à propriedade. Os próximos passos incluem: desenvolver mode-los matemáticos de previsão de cheias para diversas localidades da bacia,

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elaborar um modelo operacional de gestão do sistema de barragens paracontrole de cheias, implantar uma estrutura de comunicação e divulgaçãodas informações ambientais disponíveis e disponibilizar as informações doradar meteorológico de Fraiburgo (SC).

6.5 Drenagem urbana

6.5.1 Impactos

As enchentes devido à urbanização são inundações também chama-das de enchentes pluviais, que ocorrem devido ao excesso de precipitação queultrapassa a capacidade de infiltração do solo e escoa superficialmente sobrea bacia hidrográfica. Essas enchentes aumentam a sua freqüência e magnitu-de devido à ocupação do solo com superfícies impermeáveis e rede decondutos de escoamentos (figura 6.15).

Este processo ocorre pelo aumento das áreas impermeáveis e pelaredução do tempo de concentração das bacias. Pode-se observar pela figura6.16 que o aumento da população implica em aumento da área impermeávelno ambiente urbano. O tempo de concentração é reduzido pela canalizaçãoe uso de condutos que aceleram o escoamento dentro das bacias urbanas.Existem vários exemplos demonstrando o aumento da magnitude das inun-dações que pode chegar a várias vezes as condições de pré-desenvolvimen-to.

Figura 6.15 Evolução urbana e ocorrência de inundações (adaptado de Ramos,1998)

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Figura 6.16 Relação entre área impermeável e densidade habitacional com dadosde São Paulo, Porto Alegre e Curitiba (Campana e Tucci, 1994).

As enchentes ampliadas pela urbanização, em geral, ocorrem em baci-as de pequeno porte, de alguns quilômetros quadrados. Evidentemente queas exceções são as grandes regiões metropolitanas, como São Paulo, onde oproblema abrange cerca de 800 . Nas grandes bacias, existe o efeito da com-binação da drenagem dos vários canais de macrodrenagem, que são influen-ciados pela distribuição temporal e espacial das precipitações máximas

A tendência da urbanização é de ocorrer no sentido de jusante paramontante, na macrodrenagem urbana, devido às características de relevo.Quando um loteamento é projetado, os municípios exigem apenas que oprojeto de esgotos pluviais seja eficiente no sentido de drenar a água doloteamento. Quando o poder público não controla essa urbanização ou nãoamplia a capacidade da macrodrenagem, a ocorrência das enchentes aumen-ta, com perdas sociais e econômicas. Normalmente, o impacto do aumentoda vazão máxima sobre o restante da bacia não é avaliado pelo projetista ouexigido pelo município. A combinação do impacto dos diferentes loteamentosproduz aumento da ocorrência de enchentes a jusante. Esse processo ocor-re através da sobrecarga da drenagem secundária (condutos) sobre amacrodrenagem (riachos e canais) que atravessa as cidades. As áreas maisafetadas, devido à construção das novas habitações a montante, são as maisantigas, localizadas a jusante (figura 6.17).

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As conseqüências dessa falta de planejamento e regulamentação sãosentidas em, praticamente, todas as cidades de médio e grande portes dopaís. Depois que o espaço está todo ocupado, as soluções disponíveis sãoextremamente caras, tais como canalizações, diques com bombeamentos,reversões e barragens, entre outras. O poder público passa a investir umaparte significativa do seu orçamento para proteger uma parcela da cidadeque sofre devido à imprevidência da ocupação do solo. Esses fundos pro-vêm de impostos de toda a população do município, Estado ou da Federa-ção. Portanto, cabe, muitas vezes, questionar quem deve pagar e se deveriaser permitida essa ocupação.

O desenvolvimento urbano pode também produzir obstruções ao es-coamento como aterros e pontes, drenagens inadequadas e obstruções ao escoamento junto a condutos e assoreamento (capítulo 3).

Alguns dos exemplos de obstrução do escoamento são documenta-dos a seguir:

produção de resíduo sólido que obstrui o escoamento: no capítulo 3 foramdiscutidos a produção de material sólido que, além de reduzir a ca-pacidade de escoamento, obstrui as detenções urbanas para o con-trole local do escoamento. Na figura 6.18 são apresentados sistemasobstruídos por material sólido e por canalização atravessando a dre-nagem;resíduo sólido no sistema de detenção: Uma das grandes dificuldades de

(a)

(b)

Figura 6.17 Tendência da ocupação e impacto

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utilização dos sistemas de detenção na drenagem urbana são aprodução de lixo que chega a drenagem como observado na figu-ra 6.19;problemas de manutenção no sistema de drenagem: no sistema de drena-gem podem ocorrer vários problemas de escoamento em funçãoda falta de limpeza do sistema de drenagem e de projetos inade-quados que não consideram o assoreamento de seções muito lar-gas com seção única (figura 6.20).

Figura 6.18 Obstrução e resíduo na drenagem(fornecidos pela SUDECAP - Belo Horizonte)

Figura 6.19 Obstrução em detenções(fornecidos pela CH

2 Hill Engenharia Ltda)

(c)

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Tucci et al.

6.5.2 Planos de controle

Em São Paulo o controle da macrodrenagem tem sido realizado atra-vés de detenções ao longo da macrodrenagem (figura 6.21), que permitemredução do impacto para jusante, mas sem um planejamento de conjunto dacidade, que ainda não foi realizado.

Algumas cidades desenvolveram o Plano Diretor de Drenagem Urba-na. Porto Alegre em 2000 iniciou o PDDU na sua primeira fase com odesenvolvimento do seguinte: Fundamentos do plano; Plano das Bacias doArroio do Meio, arroio do Areia e Tamandaré; Avaliação das bacias do siste-ma de proteção contra cheias do Guaiba (diques e estações de bomba). Umaparte da legislação proposta foi implementada e as medidas estruturais dosPlanos das bacias estão em fase de implementação. A segunda fase commais três bacias e revisão do manual de drenagem estão em fase de conclu-são. Na bacia do arroio do Meio (bacia urbana de 4,5 km2 em Porto Alegre)foram previstas três detenções na alternativa de controle de macrodrenagemda bacia dentro do Plano Diretor de Drenagem da cidade. Foi também estu-dada a alternativa de canalização, transferindo as inundações para o arroioDilúvio a jusante e a alternativa de não executar nenhuma intervenção. Es-tas alternativas foram estudadas para o cenário futuro de ocupação do PlanoDiretor. Na figura 6.22 pode-se observar o hidrograma no exutório da ba-cia (galeria que atravessa a PUC em direção ao Arroio Dilúvio) para trêscenários. Os custos previstos foram de R$ 2,8 milhões para o cenário comdetenções e R$ 5,5 milhões para cenário com canalização.

Figura 6.20 Obstruções ao escoamento em canais (Porto Alegre)

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Figura 6.21 Detenção do rio Pirajussara em São Paulo(fornecido pelo CH

2 Hill Engenharia Ltda)

O PDDU da Região Metropolitana de Curitiba foi desenvolvido des-de 2001 e representou o primeiro Plano em que englobava mais de umacidade. A grande dificuldade deste plano que foi preparado dentro dos in-vestimentos do Banco Mundial pelo Estado do Paraná é a implementaçãodas ações pelos municípios que fazem parte da RMC devido à falta daimplementação do componente financeiro.

Em Belo Horizonte foi previsto o PDDU em várias fases. A primeirafase foi efetuada onde o principal componente foi o desenvolvimento docadastro de toda a cidade. .

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Tucci et al.

Figura 6.22 Hidrograma de projeto (10 anos) para as alternativas do arroioMoinho em Porto Alegre. A saída da bacia é realizada por uma Galeria que

atravessa a PUC em direção ao arroio Dilúvio (IPH, 2001).

Em 2001 e 2002 foi desenvolvido o Plano Integrado de Esgotamen-to Sanitário e de drenagem urbana para a cidade de Caxias do Sul(IPH,2002). A cidade possui grandes declividades e pouco urbanizaçãoque não deixou nenhum espaço (figura 6.23).

Esta cidade infelizmente foi desenvolvida sem rede de esgoto, por-tanto as alternativas eram de: (a) desenvolver o sistema separador absoluto;(b) considerar um sistema misto e desenvolver o controle com base nacompatibilização entre os sistemas. Segundo IPH (2002) a cidade de Caxiasdo Sul adotou no passado um sistema de esgotamento sanitário misto, ondeno mesmo sistema de esgotamento escoam o esgoto cloacal e pluvial. Estetipo de configuração apresenta as seguintes limitações:

dificulta o gerenciamento do controle da drenagem urbana;propícia condições de odor desfavorável ao longo da cidade nosmeses secos, onde praticamente somente o esgoto cloacal escoa nosistema de drenagem;nos períodos de inundações, quando a capacidade da drenagem ésuperada, existem maiores condições de proliferação de doenças vei-culadas pela água, como a leptospirose.

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Figura 6.23 Ocupação urbana em Caxias do Sul (RS)

No entanto, não é possível reconstruir em toda área ocupada da cida-de um novo sistema de esgotamento sanitário independente, devido ao altocusto concentrado no tempo para a cidade e seus contribuintes. Conside-rando estes aspectos as estratégias deste Plano em conjunto com o Plano deEsgotamento sanitário foram as seguintes:

Para as áreas já densificadas das bacias de microdrenagem, o siste-ma foi previsto para ser mantido misto;Na contribuição para a macrodrenagem haverá um dispositivo quecoletará o volume de esgotamento cloacal (até uma vazãodimensionada), levando para as estações de tratamento o escoamen-to dos condutos pluviais. Os locais de desvio foram examinados deacordo com a distribuição das redes ao longo da cidade em funçãodos condicionantes de local, carga e espaço para as estações de tra-tamento e da rede de coleta;O excedente ao esgoto cloacal, que corresponde ao escoamento plu-vial, será escoado para o sistema de macrodrenagem e controladode acordo com as detenções projetadas ao longo da macrodrenagem;Para as detenções projetadas no sistema secundário ou demicrodrenagem, a estratégia é de desviar todo o volume excedente àcapacidade existente (ou projetada) do sistema de drenagem para a

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detenção e o restante permitir seu escoamento para jusante. Nestecaso, o volume de esgotamento sanitário não entra nestas detençõesdurante a estiagem e durante as inundações a área é utilizada apenaspara amortecer o volume de escoamento excedente a capacidade detratamento.

Estas estratégias foram utilizadas ao longo de todo o sistema para oPlano de Drenagem da cidade, desta forma compatibilizando os dois Planosdentro de seus objetivos.

Dentro dos cenários de desenvolvimento das novas áreas da cidadede Caxias é recomendável que os novos loteamentos e a rede da cidade sejaprojetada com sistema separador, evitando-se os problemas citados. Sempreque houver uma revisão dos Planos de Drenagem e de esgotamento sanitá-rio, deverá ser avaliada economicamente a viabilidade de no futuro a cidadebuscar ampliar o sistema separador para as áreas já existentes e, a longoprazo, concluir de forma adequada todo o seu sistema de gerenciamento deesgotamento dentro de padrões ambientalmente sustentáveis.

Os Planos adotados utilizaram as seguintes estratégicas quanto as me-didas de controle:

Para as áreas a serem desenvolvidas tanto para o loteamento, ou sejanovos parcelamentos, como para a densificação (construção emcada lote ou dentro do parcelamento) foram previstas medidas não-estruturais baseadas numa proposta de legislação de controle dosnovos empreendimentos da cidade.Para as áreas já construídas foram adotadas medidas estruturais decontrole de inundações, detalhadas por bacias.

Desta forma, as medidas não-estruturais buscam conter a transfe-rência dos impactos dentro da cidade e as medidas estruturais tratam deresolver os problemas já existentes. Na figura 6.24 é apresentado um lay-outdas sub-bacias e detenções previstas no Plano da cidade de Caxias. Nafigura 6.25 é apresentado o hidrograma das alternativas de controle nasaída da cidade para o cenário de desenvolvimento urbano projetado etempo de retorno de 10 anos.

(a)

(b)

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Figura 6.24 Lay-out da cidade de Caxias com as detenções previstas (IPH,2002).

6.6 Cenários combinados de inundações

Nos itens anteriores foram descritos os processos de inundação queocorrem em: (a) áreas ribeirinhas onde o principal agente é a ocupação dasáreas ribeirinhas pela população em anos onde as inundações são peque-nas; (b) inundações devido a urbanização pelo aumento das inundações e atransferência de impacto dentro da cidade.

Existem também cenários ao longo do tempo, como o ocorrido emSão Paulo no rio Tietê, onde os dois processos ocorreram em tempos dife-rentes. Inicialmente as áreas de inundação foram sendo ocupadas e o poderpúblico canalizou o Tietê para vazões de cheias observadas. Com o aumen-to da urbanização e das vazões, assoreamento do rio, sua capacidade deescoamento diminuiu e retornaram as inundações. Nesta etapa, como a vár-zea está ocupada não existe mais espaço lateral, restando as opções de di-ques ou aprofundamento de canal, que representam custo muito alto.

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Tucci et al.

Figura 6.25 Hidrogramas das alternativas (IPH, 2002)

No rio Iguaçu na Região Metropolitana de Curitiba este processotenderia a ocorrer, já que a pressão para ocupação da área vizinha ao rioIguaçu era muito grande, com invasões e regularização das áreas nos anoseleitorais. O controle tradicional desta área seria aumentar a capacidadedo rio Iguaçu para a cheia de projeto (25, 50 ou 100 anos) eliminando ascheias freqüentes. No entanto os problemas retornariam quando a urbani-zação das bacias de montante ocorressem. Tucci (1996) apresentou a con-cepção do controle de inundações baseado no seguinte (figura 6.26):

No rio principal: é criada uma área de armazenamento entre o rioIguaçu e um canal paralelo com largura de 300 m a 1km e área de 20km2. O canal gera uma limitação a pressão urbana e aumenta a capa-cidade do escoamento para jusante no Iguaçu. O canal foiimplementado e o parque está em fase de desenvolvimento;

Nos tributários: Desenvolvimento do Plano Diretor de Drenagem Ur-bana para controle dos impactos dos mesmos, utilizando a legisla-ção, parques e áreas de armazenamento que não transfiram parajusante os impactos da urbanização.

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Inundações e Drenagem Urbana - Brasil

Figura 6.26 Cenário combinado de ocupação das áreas ribeirinhas e urbaniza-ção (Tucci, 1996).

6.7 Conflitos e cenários em algumas cidades brasileiras

Belém: é uma cidade na linha do Equador no trópico úmido brasileiro ejunto ao Oceano Atlântico. No mês de março existen combinações do esco-amento do sistema fluvial e costeiro que produzem níveis de inundação decerca de uma semana numa região de Belém no qual ocorre uma lâmina deágua de cerca de 1 m. A população aprendeu a conviver com este cenáriotransportando para o segundo andar os bens de valor. Na cidade observa-seque a dimensão do meio fio para escoamento pluvial se assemelha quase aum canal e as entradas dos veículos das habitações possuem passagem. Istoé decorrência do tipo freqüente de precipitação intensa dos trópicos quecondiciona a ocupação. Belém possui cerca de 280 dias durante o ano comchuva de curta duração e alta intensidade.

Porto Alegre: cidade de cerca de 2,5 milhões de habitantes localizada nalatitude 300 S em clima subtropical. A cidade possui um sistema de prote-ção contra inundações ribeirinhas com dique de concreto e polders que pro-

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Tucci et al.

tegem quase toda a cidade. Este sistema foi construído em 1970 para pro-teger contra as inundações ribeirinhas a cidade da bacia hidrográfica do rioGuaíba e Delta do Jacuí que tem da ordem de 80 mil km2 de área de drena-gem.

Desde de 1967 não ocorrem inundações importantes e uma parte im-portante da população passou a questionar a necessidade deste muro deconcreto no centro da cidade que separa o rio da cidade. Várias organiza-ções públicas criaram campanhas públicas para a retirada do dique. A câma-ra de vereador chegou a aprovar esta ação, que não foi seguido pela adminis-tração do município. No cenário de retirada do dique, a população teriadireito a ressarcimento quando da ocorrência de uma inundação, represen-tando custos altos para a cidade. O risco de inundação não se alterou aolongo dos últimos 100 anos que foi a base da estimativa dos riscos atuais. Oque se observa é que o sistema de proteção está dimensionado para um riscomaior que 200 anos. Quando o mesmo foi projetado a série disponível erade 70 anos.

A cidade aprovou em 2000 um novo Plano Diretor Urbano no qualfoi previsto o controle da drenagem nos novos empreendimentos. Desdemarço do referido ano todos os novos loteamentos são obrigados a contro-lar dentro do empreendimento o aumento da vazão. Um decreto municipalfoi previsto para as novas construções visando incentivar e controlar o im-pacto da densificação (construção nos lotes).

Belo Horizonte: que possui da ordem de 4 milhões de habitantes apresentaum Plano Diretor Urbano de 1996 com restrição as áreas impermeáveis emalgumas áreas da cidade, apesar dos limites não serem alto (20 a 30% daárea) e com efeito limitado sobre aumento da vazões. A legislação previuuma opção para o projetista na forma de reservatório de detenção de lote naproporção de 30 litros/m2 de área impermeável. Desde 1996 quando a le-gislação foi aprovada não foi obedecida porque existia um parágrafo de ex-ceção que virou regra. Neste artigo estava prevista a avaliação da possibili-dade de construção do reservatório de acordo com a avaliação de um enge-nheiro. O empresário impermeabilizava a área e depois obtinha um parecerde um engenheiro atestando que não era possível construir o reservatório.

União Vitória e Porto União (Tucci and Villanueva, 1997) estão nos limi-tes dos Estados do Paraná e Santa Catarina, comunidades que totalizam da

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ordem de 100 mil habitantes. Estas cidades estão sujeitas a freqüentesinundações, apesar do período de 1959 a 1982 tenha ocorrida somenteuma inundação com risco superior a 5 anos. Neste período houve forteocupação das áreas de risco. Em 1980 foi construída a Usina Hidrelétricade Foz de Areia cerca de 100 km a jusante pela COPEL CompanhiaParanaense de Energia Elétrica. Em 1983 ocorreu a maior cheia de umperíodo de 106 anos, produzindo prejuízos da ordem de 83 milhões dedólares. A população assumiu que a cheia tinha sido devido a barragem,enquanto a COPEL alegava que era uma cheia natural extraordinária (uti-lizando a série contínua de dados o valor de 1983 era um outlier com riscode 1000 anos). Contudo em 1992 ocorreu outra inundação de grande mag-nitude. A população deixou de acreditar na COPEL e ampliou-se o confli-to entre a comunidade e a companhia.

Uma ONG (organização nào- governamental) foi criada para desen-volver ações no sentido de melhor encaminhar o assunto das duas comuni-dades de dois Estados diferentes. Os objetivos da CORPRERI (ONG) são:diagnóstico das inundações, negociação com a Companhia sobre as regrasoperacionais e definição do zoneamento das cidades. Alguns estudos (Tucci,1993 e Tucci e Villanueva, 1997) foram desenvolvidos permitindo melhoraras relações e o desenvolvimento de medidas de mitigação para a cidade(veja o capítulo 10 para maiores detalhes).

6.8 Síntese

Observa-se que um país como o Brasil necessita de um programa deminimização dos impactos das inundações que envolvam a União, Estadose municípios. Considerando que o programa de prevenção, segundo a Cons-tituição, é de atribuição da área federal é de se esperar que este processo sejaliderado pelo Governo Federal.

De outro lado é também necessário que através dos mecanismos exis-tentes de legislação de recursos hídricos sejam utilizados para o controle doimpactos que as cidades produzem internamente e externamente nos rios ajusante, criando impactos para as próprias cidades e para as comunidades dejusante. No capítulo 2 e 3 são apresentadas metodologias e sugestões para odesenvolvimento de medidas para dar sustentabilidade ao controle de inun-dações.

Para que este processo possa ter sucesso é indispensável o seguinte:

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Tucci et al.

Participação pública;Atualização profissionais como os engenheiros sobre as medidassustentáveis de controle das inundações urbanas;Implementação e cobranças dos mecanismos legais para controledo processo;Gestão pública.

Neste capítulo são descritas algumas iniciativas que têm sido prati-cadas no Brasil para prevenção de eventos críticos. O que se destaca é quesão soluções setoriais e não englobam todos os aspectos necessários para aintegração do planejamento dos diversos setores envolvidos com a água:planejamento rural e urbano, abastecimento de água, tratamento de esgotos,drenagem urbana e controle de inundações, resíduos sólidos e controleambiental.

Há uma forte inter-relação entre todos estes fatores. Mas, partindo doprincípio que as ações de prevenção devem iniciar-se na esfera local, ou seja,nos municípios, para depois ampliar seus limites de alcance para estaduais,federais, até atingir a bacia hidrográfica como unidade de planejamento, sur-gem algumas dificuldades. A primeira é que os espaços urbanos já estãoocupados indevidamente, necessitando, antes de qualquer medida de açõesque recuperem a qualidade deste meio. A segunda esbarra na limitação téc-nica, política, institucional e econômica dos municípios para resolver ques-tões tão complexas e multidisciplinares. Soma-se a isto o fato de que ogerenciamento atual não incentiva a prevenção de eventos críticos, pois quan-do eles ocorrem, o município declara estado de calamidade pública, receberecursos a fundo perdido e não necessita realizar concorrência pública paragastar. Romper este círculo vicioso é um desafio.

É preciso avançar na aplicação dos conhecimentos sobre ocupaçãodo espaço físico e geográfico, investir na capacitação técnica, promover aparticipação da sociedade e alterar a realidade com o objetivo de tornarefetiva a sustentabilidade sócioambiental da gestão do território. É necessá-rio planejar o futuro de forma sustentável, garantindo que as futuras gera-ções possam usufruir a vida em um ambiente saudável.

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