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Breve Revisão Inter-relação entre doença periodontal e doenças cardiovascular etiopatogenética Relationship between periodontal disease and cardiovascular diseases - an ethiopatogenetic aboarding Periodontia do Centro Ruthi Doutora em Periodon Rac Doutor em Periodontia da Unive D E-mail: analuzia Ind Unitermos: doença periodontal, doenças cardiovasculares, doenças sistêmicas e fatores de risco. Unterms: periodontal disease, cardiovascular diseases, systemic disease and risk factors. Numeração de páginas na revista impressa: 68 à 72 RESUMO As patologias que envolvem os tecidos periodontais podem ter influência sobre a saúde geral dos diretamente ou contribuir para o desenvolvimento de alterações em outros sistemas do organismo, cardiovascular. A identificação de fatores de risco constitui uma condição essencial para o desenvolvimento de diagnóstico e tratamento de doenças sistêmicas. O presente trabalho tem como objetivo estudar a periodontal e as doenças cardiovasculares, enfatizando a primeira como fator de risco para o su

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Breve Revisão

Inter-relação entre doença periodontal e doenças cardiovasculares - abordagem etiopatogenéticaRelationship between periodontal disease and cardiovascular diseases - an ethiopatogenetic aboarding

Periodontia do Centro Odontológico de Estudos e Pesquisa (COESP/PB).

Ruthineia Diógenes A. Uchôa LinsDoutora em Periodontia da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

Rachel de Queiroz F. Rodrigues

Doutor em Periodontia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Daliana Queiroga de C. Gomes

E-mail: [email protected] / [email protected]

Indexado LILACS LLXP: S0034-72642012009700005

Unitermos: doença periodontal, doenças cardiovasculares, doenças sistêmicas e fatores de risco.

Unterms: periodontal disease, cardiovascular diseases, systemic disease and risk factors.

Numeração de páginas na revista impressa: 68 à 72

RESUMO

As patologias que envolvem os tecidos periodontais podem ter influência sobre a saúde geral dos indivíduos ao afetar diretamente ou contribuir para o desenvolvimento de alterações em outros sistemas do organismo, inclusive o sistema cardiovascular.

A identificação de fatores de risco constitui uma condição essencial para o desenvolvimento de métodos de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças sistêmicas. O presente trabalho tem como objetivo estudar a relação entre a doença periodontal e as doenças cardiovasculares, enfatizando a primeira como fator de risco para o surgimento e/ou agravamento dessas últimas.

INTRODUÇÃO

A doença periodontal pode ser definida como uma alteração patológica de caráter inflamatório dos tecidos gengivais, que pode ou não progredir para o periodonto de sustentação, resultando em perda de inserção dentária, provocada pela relação entre o acúmulo local de biofilme dental e a resposta imune do organismo (Genco, Cohen, Goldman, 1997; Lindhe, 2005).A partir da década de 90 do século passado, a doença periodontal, em especial a periodontite tem sido correlacionada com outras doenças sistêmicas, tendo alcançado hoje reconhecido destaque na área médica. Assim como as doenças sistêmicas parecem interferir no curso da doença periodontal como fatores modificadores, a doença periodontal também parece influenciar no curso e no desenvolvimento de doenças e condições

sistêmicas (Feres, Figueiredo, 2007).

Muitos fatores de risco estão associados ao desenvolvimento ou progressão da doença periodontal. Os fatores controláveis incluem o tabagismo, o estresse, uma higiene oral precária e visitas não frequentes ao dentista, enquanto os fatores de risco não controláveis envolvem a hereditariedade, doenças sistêmicas e a idade (Weidlich, Cimões, Pannuti, Oppermann, 2008).

Há muito tempo, relaciona-se a doença periodontal com diversas alterações sistêmicas, sendo considerada, inclusive, como fator de risco para o aparecimento da aterosclerose e outras doenças cardiovasculares (Sinegalia, Nassar, Nassar, Giancursi, 2007).

No final do século XX, as doenças cardiovasculares (DCV) perfaziam metade dos óbitos nos países desenvolvidos e cerca de um quarto nos países em desenvolvimento. Essa proporção vem crescendo de maneira tal que, no Brasil, as DCVs ocupam o primeiro lugar entre as taxas de mortalidade na população adulta, de acordo com as citações de Pereira e Dias (2007). Tal fato justifica a motivação para o desenvolvimento de amplos estudos e pesquisas voltados para a melhoria de métodos de prevenção, diagnóstico e tratamento (Zanotti, Medeiros, 2002).Diante do exposto, o presente trabalho se propõe a abordar, de forma atualizada, a relação existente entre a doença periodontal e as doenças cardiovasculacidos periodontais de proteção (gengivite) e/ou de sustentação (periodontite), resultante de um processo infeccioso mediado principalmente por micro-organismos anaeróbios gram-negativos (Genco, Cohen, Goldman, 1997; Lindhe, 2005).

A etiologia primária da doença periodontal está relacionada aos micro-organismos presentes no biofilme dental, composto predominantemente por Tannerella forsythia, Porphyromonas gingivalis (Pg), Prevotella intermedia, Treponema denticola e Agreggatibacter actinomycetemcomitans (Aa) (Fischer, 2005; Genco, Cohen, Goldman, 1997; Lindhe, 2005). No entanto, sua etiopatogenia é determinada pela relação entre o potencial patogênico desse biofilme e a qualidade da resposta imune do organismo hospedeiro, uma vez que fatores locais e sistêmicos podem modificar a evolução da doença periodontal, proporcionando uma doença mais acentuada (Mattila, Weyne, Tinoco, 2005; Uchôa et al., 2002).

Segundo relatos de Feres e Figueiredo (2007), os principais mecanismos de virulência dessas espécies são: destruição direta das células de defesa, através de leucotoxinas secretadas pelos neutrófilos, ou de tecidos do hospedeiro mediante a ação de proteínas, presença das endotoxinas (LPS), componente da parede celular apenas de bactérias gram-negativas; mecanismos de resistência à defesa do hospedeiro em virtude de sua capacidade de invadir células epiteliais e a liberação de subprodutos tóxicos do metabolismo, incluindo a amônia e os compostos sulfurados voláteis.

A doença periodontal representa uma infecção multifatorial, em que a resposta do hospedeiro diante da liberação de endotoxinas, a partir do biofilme dental e pela localização da infecção, que favorece a proliferação, no interior da bolsa periodontal, de bactérias anaeróbias, resulta em uma produção local de citocinas e mediadores biológicos, inclusive interleucinas e prostaglandinas, bem como na indução da síntese de anticorpos séricos, ou seja, em uma resposta sistêmica (Dias, Almeida, Scheibe et al., 2007).

Doenças cardiovascularesO Ministério da Saúde (2004) define as doenças cardiovasculares como condições que alteram o funcionamento do sistema circulatório, formado pelo coração, vasos sanguíneos e linfáticos, permanecendo como a principal causa de morte e incapacitação em países desenvolvidos. A aterosclerose, por sua vez, é uma doença evolutiva que pode progredir até a oclusão da luz da artéria coronária e promover o risco de instabilização das placas, conduzindo a eventos agudos, como a angina instável e o infarto do miocárdio (Cunha-Cruz, Nadanovsky, 2003).

Não há etiologia única para as doenças cardiovasculares, porém o principal fator responsável é a aterosclerose, que representa um processo de causas multifatoriais, constando de mecanismos de resposta à injúria, atividade imunoinflamatória, lipogênica e infecciosa. No entanto, sabe-se que existem fatores que aumentam a probabilidade de sua ocorrência, que são os chamados fatores de risco cardiovasculares, incluindo a hipertensão arterial, a dislipidemia, o tabagismo, o diabetes mellitus, o sedentarismo, a obesidade, a hereditariedade e o estresse emocional (Saba-Chujfi, Santos-Pereira, Dias, 2007).

A inflamação constitui dois novos fatores de risco para as doenças arteriais coronarianas, tendo em vista a sua capacidade de ativar citocinas inflamatórias, como a interleucina-1 (IL-1) e o fator de necrose tumoral (TNF), os quais estimulam monócitos, lesam o endotélio, aumentam a adesão plaquetária, reduzem a antitrombina III e afetam o sistema fibrinolítico, sendo ainda capazes de estimular os glóbulos brancos nas placas ateromatosas, levando, assim, ao crescimento ou ao rompimento das mesmas (Libby, 2002).

Os eventos inflamatórios envolvidos na patogenia das doenças cardiovasculares incluem a liberação de citocinas pró-inflamatórias pelos monócitos, linfócitos e células endoteliais; a expressão de moléculas de adesão; o aumento na produção de leucócitos polimorfonucleares e plaquetas pela medula óssea; a elevação da síntese hepática de substâncias, como a proteína C-reativa, cujo aumento tem sido descrito como fator de risco para as doenças cardiovasculares, por atuar no processo da trombogênese, e o fibrinogênio que, por sua vez, aumenta a viscosidade do sangue (Lowe, 2001).

BacteremiaConsiderando a inter-relação entre doenças periodontais e doenças sistêmicas, especialmente as doenças cardiovasculares, a importância do conhecimento dos patógenos periodontais está na bacteremia, representada pela passagem de bactérias e endotoxinas do periodonto para o interior da circulação sistêmica, a qual poderá surgir em qualquer procedimento que resulte em sangramento gengival (Zanotti, Medeiros, 2002), como em procedimentos odontológicos invasivos e não invasivos e, também, durante ações do cotidiano, como a mastigação e a escovação dentária, pois uma higienização dental ou periodontal inadequada, além de infecções periapicais, periodontais e da mucosa bucal, pode produzir bacteremias transitórias, mesmo na ausência de procedimentos odontológicos (Branco, Volpato, 2007).

Na doença periodontal a possibilidade de bacteremia é maior pela proximidade dos agentes infecciosos com o tecido conjuntivo e seus

componentes vasculares, como também pela facilidade de deslocamento das bactérias para a corrente sanguínea, podendo disseminar-se para qualquer local do organismo, sendo capazes de atingir, seriamente, outros órgãos internos, como o coração, os rins, os pulmões e até mesmo o cérebro, muitas vezes chegando a ser letal (Rocha, Fernandes, Lucas, 2002).

Apesar das infecções dentárias serem locais, elas também podem desenvolver complicações infecciosas sistêmicas através de uma bacteremia transitória (Barcellos, Almeida, Miotto, 1999). As bactérias periodontopatogênicas podem, devido ao potencial fator de agregação plaquetária, promover a liberação de endotoxinas e citocinas inflamatórias, que induzem a exacerbação de fenômenos tromboembolíticos e ateroscleróticos (Barilli, 2003).

Inter-relação entre doença periodontal e doenças cardiovascularesAs doenças cardiovasculares e periodontais, ambas crônicas e multifatoriais, têm em comum uma base genética de suscetibilidade e, também, componentes comportamentais importantes, incluindo hábitos relacionados à dieta, à higiene e à prática do tabagismo, dentre outros. Alguns são relevantes tanto à etiopatogenia da doença periodontal quanto para a etiopatogenia das doenças cardiovasculares (Dias, Almeida, Scheibe et al., 2007; Weidlich, Cimões, Pannuti, Oppermann, 2008).

Tais alterações patológicas apresentam uma série de características em comum, sendo que ambas ocorrem com maior frequência em pessoas de idade avançada, do sexo masculino, com baixo nível socioeconômico cultural, fumantes, diabéticos, com quadros de estresse emocional, com importante predisposição genética, obesidade e hipertensão arterial (Dave, Batista Jr., Dyke, 2004; Genco, Cohen, Goldman, 1997).

Considera-se que a doença periodontal é um fator de risco independente para as doenças cardiovasculares, pois o periodonto está exposto às endotoxinas de muitas espécies de micro-organismos anaeróbios associados às doenças periodontais. Essas bactérias podem, através de uma bacteremia de baixa intensidade, liberar endotoxinas que afetam a integridade endotelial, o metabolismo das lipoproteínas plasmáticas, a coagulação sanguínea, a função das plaquetas, o aumento do nível de fibrinogênio e, ainda, a contagem de células brancas, sendo estes os fatores que podem levar ao desenvolvimento da doença cardiovascular aterosclerótica (Oliveira, Corrêa, Pereira, 2002).

Zanottti e Medeiros (2002), em um de seus trabalhos, descrevem que os indivíduos com saúde oral precária possuem maior predisposição a desenvolver cardiopatias coronarianas, através de uma bacteremia transitória. Ferraz Jr. e Carvalho (2006) também afirmam que uma infecção crônica pode levar ao processo de formação de uma placa aterogênica por meio da invasão direta de bactérias através das paredes das artérias ou pela liberação de mediadores inflamatórios sistêmicos, em resposta à infecção.

O papel do processo inflamatório na associação entre doença periodental e doenças cardiovasculares poderia ser ressaltado através de uma elevada quantidade de leucócitos, levando à formação de macrófagos espumosos e um consequente efeito sobre a formação de ateromas, observado em portadores de infecções orais, dentre elas a gengivite e a periodontite (Barilli, 2003; Gusmão, Santos, Jovino Silveira, Araújo, 2002).

Assim, as infecções periodontais podem contribuir diretamente para a patogênese da aterosclerose e eventos tromboembolíticos através da promoção de repetidas mudanças vasculares sistêmica, resultantes da presença de endotoxinas, como os lipopolissacarídeos (LPS), e dos próprios micro-organismos, bem como através de citocinas inflamatórias, incluindo o fator de necrose tumoral alfa (TNF-a) e as interleucinas as quais podendo induzir a secreção de proteínas da fase aguda, como a proteína C-reativa (PCR) e o fibrinogênio, que contribuem para a formação de ateromas, podendo isso justificar a associação entre a doença periodontal e a doença cardíaca (Bezerra, 2007; Weidlich, Cimões, Pannuti, Oppermann, 2008).

De acordo com as citações de Braga, Fischer e Figueiredo (2004), o aumento da proteína C-reativa, observado na periodontite, pode ser fator de associação entre a presença desta doença e o aumento do risco de doenças cardiovasculares, pois as manifestações sistêmicas, como a detecção de produtos bacterianos na circulação, o aumento de biomarcadores inflamatórios ou de distúrbios no metabolismo lipídico, podem também estar presentes na periodontite, gerando uma forte associação entre esta e a aterosclerose. 

Segundo relatos do trabalho de Costa, Silva Jr. e Terezan (2005), a saúde periodontal precária estaria associada a elevados níveis de colesterol total, proteína C-reativa e fibrinogênio, o que poderia explicar, em parte, a ligação entre a doença periodontal e o aumento do risco para as doenças cardiovasculares. Como também, o fato de que um aumento do nível sistêmico da proteína C-reativa, da interleucina (IL-6) e de leucócitos poderia intensificar a atividade inflamatória das lesões ateroscleróticas, aumentando potencialmente o risco para eventos cardíacos e cerebrovasculares.No trabalho de Zanotti e Medeiros (2002) existe uma afirmação de que o número de bactérias que habitam uma bolsa periodontal é muito maior do que em qualquer outra superfície epitelial do corpo humano e que a defesa do organismo também é capaz de causar uma resposta inflamatória, resultando em perda de tecido e invasão bacteriana.

Alguns estudos consideram que a natureza infecciosa da doença periodontal poderia produzir uma injúria inicial desencadeadora da aterosclerose ou, até mesmo, provocar o agravamento do processo aterosclerótico preexistente, com várias hipóteses explicativas, incluindo o fato de que o biofilme excede a invasão tecidual através da ação de lipopolissacarídeos e também das citocinas, com aumento ainda de monócitos hipersensíveis, levando a aterosclerose e a eventos tromboembólicos, uma vez que os mesmos estão presentes nas placas ateromatosas (Costa, Silva Jr., Terezan, 2005; Machado, Vandenal, Cortelli, 2004).

De acordo com Kunze, Pilatti e Goiris (2002), as espécies bacterianas gram-negativas colonizam o meio subgengival por intermédio do epitélio ulcerado da bolsa periodontal, o qual permite um contato direto dessas bactérias com as células do infiltrado inflamatório. No periodonto, os monócitos respondem à endotoxina bacteriana (LPS) com a liberação de mediadores inflamatórios como a prostaglandina E2 e determinadas citocinas, incluindo a interleucina-1b e o fator de necrose tumoral alfa (TNF-a). Tais mediadores causam vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, recrutamento de células inflamatórias, degradação do tecido conjuntivo e destruição óssea.

Considerando-se a infecção como um fator de risco para a aterogênese, a oclusão trombótica pode ser desencadeada por bactérias gram-negativas periodontopatogênicas, como o Aa e o Pg presentes em maior quantidade no biofilme supra e subgengival, e também por lipopolissacarídeos, componentes da sua própria parede celular, induzindo a infiltração de células inflamatórias nos principais vasos sanguíneos e desenvolvendo uma série de transtornos, culminando com a coagulação intravascular através da agregação plaquetária (Dias, Almeida, 2007; Pereira, Dias, 2007).

O dano cardíaco pode ocorrer também por uma espécie de fenômeno autoimune induzido pelas bactérias, uma vez que as bactérias periodontais produzem proteínas que têm reação cruzada com as proteínas heat shock humanas, e outro fator considerado são as diferenças individuais da resposta do organismo à agressão bacteriana, ou seja, a ação das células-T e a capacidade secretória dos monócitos (Machado, Vandenal, Cortelli, 2004).

DISCUSSÃO

A associação entre a doença periodontal e as doenças cardiovasculares começou a ser estudada através do trabalho de Listgarten, em 1999, e a partir desta pesquisa numerosos estudos têm relatado uma possível relação entre essas infecções, uma vez que as infecções bucais crônicas, principalmente as doenças periodontais, podem produzir a injúria inicial desencadeadora da aterosclerose ou de eventos tromboembolíticos ou, até mesmo, provocar o agravamento (Genco, Cohen, Goldman, 1997; Kunze, Pilatti, Goiris, 2002).A doença periodontal, por ser um dos tipos mais comuns de inflamação ou infecção crônica na cavidade oral, poderia induzir a produção de PCR, levando a um considerável impacto no risco cardiovascular, sendo por tal motivo notório que várias análises epidemiológicas tenham concluído que existe, de fato, correlação entre as doenças periodontais e as cardiovasculares (Costa, Silva Jr., Terezan, 2005; Gusmão, Santos, Jovino Silveira, Araújo 2002; Kunze, Pilatti, Goiris, 2002). 

As infecções periodontais induzem à bacteremia, à exposição do hospedeiro a endotoxinas que afetam a integridade do endotélio, ao metabolismo das lipoproteínas plasmáticas, à função das plaquetas e à coagulação sanguínea, pelos seguintes mecanismos: presença de lipopolissacarídeos de bactérias anaeróbicas gram-negativas na circulação sanguínea, ativação de polimorfonucleares e macrófagos, ocorrência de resposta imunológica, ativação localizada de citocinas e outras, favorecendo, com isso, a ocorrência de doenças cardiovasculares (Braga, Fischer, Figueiredo, 2004; Cunha-Cruz, Nadanovsky, 2003; Zanotti, Medeiros, 2002).

A associação entre as doenças periodontal e cardiovascular envolve uma série de mecanismos, incluindo o efeito direto do agente infeccioso na formação do ateroma, o efeito indireto ou mediado pelo hospedeiro, desencadeado pela infecção ou predisposição genética, tanto para uma doença como para a outra; além de uma série de características em comum, como o fato de ocorrer com maior frequência em pessoas de idade mais avançada, do sexo masculino e com menor nível socioeconômico-cultural, conforme declaram, em concordância, Zanotti e Medeiros (2002) e Weidlich, Cimões, Pannuti, Oppermann (2008).

De conformidade com Dave, Batista Jr., Dyke (2004), o aumento de bactérias na cavidade bucal poderia resultar na penetração de bactérias e de seus produtos no tecido gengival, provocando uma resposta imunológica com produção de mediadores inflamatórios, tais como tromboxano A2, TNF-a e IL-1b, que irão progredir com os eventos tromboembolíticos e ateroscleróticos.Em adição, De Nardin (2001) afirma que a IL-1b e o TNF-b, dois dos mediadores inflamatórios fortemente associados à periodontite, têm sido encontrados em placas ateromatosas, indicando o seu papel na formação, progressão e ruptura dessas placas. Além disso, o fibrinogênio, precursor da fibrina, em quantidades aumentadas no sangue, como ocorre nos pacientes com periodontite, facilitam a formação, quando da ruptura das placas, dos coágulos, os quais irão causar eventos de infarto no miocárdio.

Depreende-se das citações de Costa, Silva Jr. e Terezan (2005), que um efeito indireto da infecção periodontal, a qual pode explicar a associação entre as doenças periodontal e cardíaca, diz respeito à hipercoagulabilidade sanguínea, devido ao aumento da viscosidade resultante dos níveis elevados de fibrinogênio plasmático, células brancas e do fator de von Willebrand. Desse modo, a infecção periodontal promoveria um aumento na viscosidade sanguínea, trombogênese e, por conseguinte, um aumento no risco da doença cardíaca isquêmica.

Complementando, a infecção periodontal pode produzir destruição indireta do endotélio, induzindo o próprio hospedeiro a aumentar sistemicamente vários tipos de mediadores inflamatórios, principalmente as prostaglandinas, os tromboxanos, os leucotrienos e as citocinas pró-inflamatórias. Além disso, outro efeito mediado pelo hospedeiro seria a ativação de monócitos/macrófagos e o aumento nos níveis de leucócitos no sangue, com consequente trombose e isquemia (Dave, Batista Jr., Dyke, 2004; Uchôa et al., 2002).Apesar de a comprovação epidemiológica da associação entre as infecções orais, em especial as doenças periodontais, e as doenças coronarianas e cardiovasculares, permanecer ainda indefinida, as primeiras poderiam ser realmente consideradas como fator de risco para estas últimas (Bezerra, 2007). Em contrapartida, para Costa, Silva Jr. e Terezan (2005), os fatores de risco clássicos para as DCVs não explicariam todas as suas características epidemiológicas, sustentando a hipótese de que as infecções dentárias representariam apenas um fator de risco para os eventos coronarianos.

É também possível que a associação entre a doença periodontal e a aterosclerose seja meramente uma coincidência. Por essa ótica, a associação seria explicada apenas como um resultado dos fatores de risco em comum que acometem ambas as doenças. Assim sendo, pesquisas adicionais são necessárias para determinar a natureza e a extensão dos fatores que agem isoladamente ou em conjunto para contribuir com a formação da placa de ateroma (Pereira Dias, 2007; Zanotti, Medeiros, 2002; Weidlich, Cimões, Pannuti, Opermann, 2008).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

· De fato, a doença periodontal pode causar bacteremia mediante a possibilidade das bactérias e seus subprodutos, devido a má higiene oral e o resultante acúmulo de biofilme dental, bem como em virtude do próprio tratamento dentário, invadirem os tecidos periodontais e o sistema

circulatório, através do aumento da viscosidade sanguínea e da agregação plaquetária, com consequente efeito trombogênico.· A doença periodontal parece induzir a bacteremia, com consequente efeito sobre a integridade do endotélio, o metabolismo das lipoproteínas plasmáticas, a função das plaquetas e a coagulação sanguínea, estabelecendo, então, uma forte correlação entre a doença periodontal e a doença cardiovascular.· As bases biológicas capazes de explicar tal associação ainda não estão elucidadas por completo, embora existam evidências de que patógenos periodontais poderiam atuar sobre placas ateromatosas, evocando alterações celulares e moleculares, envolvendo mediadores inflamatórios e imunológicos, entre eles a IL-1a, a IL-6, a PCR, o TNF-a e o TX A2, exibindo todos os níveis sorológicos aumentados, o que também esclarece a possível relação entre tais doenças.· Juntamente com fatores como fumo, estresse, hipertensão, hipercolesteremia, dieta, sedentarismo e baixo nível social pode incluir-se a doença periodontal como um provável fator de risco para a aterosclerose e as doenças cardiovasculares.· Considerando que as doenças periodontais, assim como as infecções em geral são fatores de risco para a aterosclerose e ressaltando o seu impacto sistêmico, recomenda-se um controle adequado da doença periodontal, principalmente em indivíduos de alto risco cardiovascular, incluindo a prevenção das infecções dentais e minimizando a inflamação gengival, com o objetivo de limitar a incidência e a severidade das bacteremias provenientes do periodonto, reduzindo assim os fatores de risco. Dessa forma, faz-se necessária a conscientização profissional para a necessidade de promoção de saúde bucal neste grupo de pacientes, como uma medida preventiva adicional contra as DCVs.

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