Cad Mais Educacao 2

Pressupostos para Projetos Pedaggicos de Educao Integral

REDE DESABERESMAIS EDUCAO

Srie Mais Educao

1 edio

Braslia 2009

Ministrio da Educao

Srie Mais Educao

REDE DE SABERES MAIS EDUCAOPressupostos para Projetos Pedaggicos de Educao Integral

Srie Mais Educao

REDE DE SABERES MAIS EDUCAOPressupostos para Projetos Pedaggicos de Educao Integral

1 edio

Braslia2009

Ministrio da Educao

Secad/MEC, 2009

RealizaoSecretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade do Ministrio da EducaoEsplanada dos Ministrios, Bloco LCEP 70.047-900, Braslia, DFportal.mec.gov.br/secad

SRIE MAIS EDUCAO

Organizao:Jaqueline Moll

Coordenao editorial:Gesuna de Ftima Elias LeclercJos Zuchiwschi Leandro da Costa Fialho

CADERNO REDE DE SABERES MAIS EDUCAO

Elaborao, texto e edioSueli de Lima

ColaboraoBen Fonteles

Equipe Casa das Artes: Lola Azevedo, Ftima Magalhes, Rose Carol Andr da Silva, Roberta Andr da Silva, Rosana dos Santos Sobreiro, Arlete Rodrigues da Silva, Cristiano Csar, Viviane Trindade dos Santos, Renata Machado Brando, Carlos Henrique da Silva Vicente, Leandra Laurentino Gilberto Frana, Leo Tomasquine e Cristina Deane

Maria Luisa Alessio e Equipe da Secretaria Municipal de Educao de Recife/PE: Beatriz de Barros, Cristiane Maria Gonalves Soares, Elizabeth Braz, Ester Rosa, Elcyene Vasconcelos de Carvalho, Enivalda Vieira dos Santos, Eroflim Joo de Queiroz, Eleta de Carvalho Freire, Emir Jos Andrade, Francisca Maura Lima, Mauricio Valrio de Medeiros, Mirza Cabral Ribeiro, Nvea Maria V. Negreiros Penedo

Luis Antonio Garcia

Equipe tcnica da Coordenao Geral de Aes Educacionais Complementares da Secad/MEC: Leandro da Costa Fialho, Ernesto Erivelton Rodrigues, Lucenir Pinheiro, Rochester Gomes Alagia, Snia de Ftima Bonfante Mello, Clarissa Guedes Machado, Elis ngela Lopetti Fagan

Frum Mais Educao: Ministrio da Cultura; Ministrio do Esporte, Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome, Ministrio da Cincia e Tecnologia, Ministrio do Meio Ambiente, Secretaria Nacional da Juventude / Presidncia da Repblica

Projeto grficoBen Fonteles / Licurgo S. Botelho

Reviso de textosItamar Rigueira Jr. e Elizabeth Simes

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

R314 Rede de saberes mais educao : pressupostos para projetos pedaggicos de educao integral : caderno para professores e diretores de escolas. 1. ed. Braslia : Ministrio da Educao, 2009.

92 p. : il. (Srie Mais Educao)

ISBN 978-85-60731-76-3

1. Educao integral. 2. Educao bsica. 3. Projetos pedaggicos. 4. Programa Mais Educao. I. Brasil. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade. II. Srie.

CDU 371.314.1(81)

5REDE DE SABERES MAIS EDUCAO

Reunir comunidades s escolas em torno de projetos de educao implica, alm da ampliao de tempos e espaos, a promoo do dilogo entre

saberes diferenciados.

AGRADECIMENtOSA Mila Petrillo pelo ensaio fotogrfico gentilmente cedido, a Ben Fonteles, Simone Bichara, Maria Dguia, Jos Ivacy, Antnio Buca, Lia e Roberto Bicca e Ricardo Basbaum pelas imagens cedidas, a Adriana Barbosa, Maribel Alves Fierro Sevilla, Sylvia Rosalem e Ricardo Henriques pelas atenciosas colaboraes.

LEGENDAS MANDALAS

1. Mandala, 2001 / Pintura de Jos Ivacy Braslia 2. Mandala desenhada com areia e pigmentos pelos monges tibetanos 3. Pintura de Antnio Buca dcada de 90 Cear 4. Codex Borgia, manuscrito dos astecas, sc. XV Mxico 5. Pintura sobre pele de bfalo dos ndios Navajos EUA 6. Vitral da Catedral de Chartres, sc XIII Frana 7. Mandala, 2000 / Desenho sobre papel de Maria Dguia Paraba 8. Pintura Cerimonial tingari sobre casca de rvores dos aborgenes australianos 9. Mandala indiana com o smbolo grfico do mantra OM 10. Desenho dos ndios Yanomame representando sua oca Roraima 11. Mandala Pintura sobre papel de Simone Bichara Acre 12. Mandala zodiacal, templo de Dendera Egito 13. Emblema Mandala / Pintura de Rubem Valentim, 1990 So Paulo 14. Escudo de Davi, gravao sobre pedra nos muros de Jerusalm

Legendas das fotos:

OBRASRicardo Basbaum, Aes e Reaes, Adriana Barreto, Andra Gerhadt, Cssio Ferras, Claudete Castro, Cristina Ribas, Everton Almeida, Roberta Benevit, Campo de Pesquisa Corpos Perfomticos, Jaes Caicedo, Fabiana Rossarola, Estudantes da Casa das ArtesPablo Picasso Mulher Chorando, 1937 leo s/tela 60 x 49 cm Coleo Penrose Londres


S U M R I O

1. Apresentao ............................................................................................................................................................................................................ 9

2 Introduo ..................................................................................................................................................................................................................13

3. As diferenas na escola, a comunidade sem lugar ....................................................................................................19

4. Apresentando a Mandala .........................................................................................................................................................................23

5. Os Saberes e as Mandalas ........................................................................................................................................................................27

6. Mandala do Mais Educao ...................................................................................................................................................................33

7. Saberes Comunitrios ..................................................................................................................................................................................37

8. Saberes Escolares ...............................................................................................................................................................................................43

As reas do conhecimento escolar........................................................................................................................44

9. Mandala Relaes de Saberes ............................................................................................................................................................46

10. Programas de Governo que integram o Mais Educao ....................................................................................49

Ministrio do Esporte ............................................................................................................................................................50

Ministrio da Cultura ...............................................................................................................................................................54

Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome ......................................................58

Ministrio da Cincia e tecnologia .........................................................................................................................64

Ministrio da Educao ........................................................................................................................................................68

Ministrio do Meio Ambiente .......................................................................................................................................74

11. A Mandala como instrumento para construo de projetos pedaggicos ...............................79

Pr-requisitos e mtodo do Professor Comunitrio .........................................................................79

Sugestes de processos facilitadores ..................................................................................................................80

12. A Mandala para as escolas .....................................................................................................................................................................83

Construo de projetos pedaggicos de educao integral para escolas .............84

13 Mandalas para professores/ Planejamento de cursos .........................................................................................87

14. Concluso ....................................................................................................................................................................................................................89

15. Bibliografia .................................................................................................................................................................................................................91

8 REDE DE SABERES MAIS EDUCAO

Muito alm da escolarizao formal, preciso reconhecer

que a escola representa espao fundamental para

o desenvolvimento da criana, do adolescente e do jovem, constituindo-se como um importante

contexto de socializao, de construo de identidades,

exerccio da autonomia e do protagonismo, de respeito diversidade tnico-racial, de gnero e orientao sexual

e, finalmente, de afirmao, proteo e resgate de direitos.


AEducao Integral tem sido um ideal presente na legislao educacional brasileira e nas formulaes de nossos mais lcidos educadores. Iniciativas diversas, em diferentes momentos da vida pblica do pas, levaram esse ideal para perto das escolas implantando propostas e modelos de grande riqueza, mas ainda pontuais e espordicos.

O Ministrio da Educao, por meio das Secretarias de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade (SECAD) e da Educao Bsica (SEB), em parceria com o FNDE, retomou esse ideal para, a partir do aprendizado com experincias bem sucedidas, lev-lo como prtica s redes de ensino dos estados e municpios do pas.

As experincias recentes indicam o papel central que a escola deve ter no projeto de educao integral, mas tambm apontam a necessidade de articular outras polticas pblicas que contribuam para a diversidade de vivncias que tornam a educao integral uma experincia inovadora e sustentvel ao longo do tempo. Com essas premissas, foi institudo o Programa Mais Educao no mbito do Plano de Desenvolvimento da Educao PDE.

O Programa Mais Educao alcanou construir parcerias intersetoriais e inter governamentais. Por um lado, no Frum Mais Educao constitudo no Governo Federal, diferentes Ministrios tm aportado seus programas e aes em torno de um princpio simples: lugar de crianas, adolescente e jovens na escola. Portanto, programas e aes de governo voltados para esse pblico devem prever,

1. Apresentao


necessariamente, um dilogo com as redes de educao. Por outro lado, o compromisso dos estados e municpios em aprimorar a qualidade da educao pblica motivou uma ampla adeso dessas redes proposta em construo.

O Programa Mais Educao j uma realidade que, como tudo que se faz em educao, ser progressivamente aprimorada com a participao de educadores, educandos, artistas, atletas, equipes de sade e da rea ambiental, cientistas, gestores das reas sociais, enfim, com todos aqueles que, pessoal e profissionalmente, dedicam-se tarefa de garantir os direitos de nossas crianas, adolescentes e jovens.

A educao integral exige mais do que compromissos: impe tambm e principalmente projeto pedaggico, formao de seus agentes, infra-estrutura e meios para sua implantao. Ela ser o resultado dessas condies de partida e daquilo que for criado e construdo em cada escola, em cada rede de ensino, com a participao dos educadores, educandos e das comunidades que podem e devem contribuir para ampliar os tempos e os espaos de formao de nossas crianas, adolescentes e jovens na perspectiva de que o acesso a educao pblica seja complementado pelos processos de permanncia e aprendizagem.

A trilogia que apresentamos tem o propsito de contribuir para a conceituao, a operacionalizao e a implementao do Programa Mais Educao. O primeiro caderno intitula-se Gesto Intersetorial no Territrio e ocupa-se dos marcos legais do Programa Mais Educao, das temticas Educao Integral e Gesto Intersetorial, da estrutura organizacional e operacional do Programa Mais Educao, dos projetos e programas ministeriais que o compem e de sugestes para procedimentos de gesto nos territrios.

O segundo caderno intitula-se Educao Integral e apresenta o texto referncia sobre Educao Integral para o debate nacional. O texto foi produzido pelo Grupo de trabalho composto por gestores e educadores municipais, estaduais, e federais, representantes da Unio


Nacional dos Dirigentes Municipais de Educao UNDIME, do Conselho Nacional dos Secretrios de Educao CONSED, da Confederao Nacional dos trabalhadores em Educao CNtE, da Associao Nacional pela Formao de Profissionais da Educao ANFOPE, de universidades e de Organizaes no Governamentais comprometidas com a educao. O Grupo de trabalho foi convocado pelo Ministrio da Educao, sob coordenao da SECAD.

O terceiro caderno intitula-se Rede de Saberes Mais Educao e sugere caminhos para a elaborao de propostas pedaggicas de Educao Integral por meio do dilogo entre saberes escolares e comunitrios. Esses caminhos so representados na forma de Mandalas de Saberes para incorporar as diversas realidades territoriais brasileiras.

Esta trilogia inicial pretende desencadear um amplo dilogo nacional, que envolva atores diretos da cena escolar estudantes, trabalhador e trabalhadora da educao, pais, mes, gestor, gestora e demais profissionais e instituies que possam colaborar para a construo de novas configuraes educativas que nos ajudem a superar os desafios histricos da educao pblica. Alm disso, esta trilogia, no contexto das polticas educacionais brasileiras, prope-se a animar o debate e a construo de um paradigma contemporneo de educao integral, que possa constituir-se como legado qualificado e sustentvel.

Diretoria de Educao Integral, Direitos Humanos e Cidadania

Secretaria de Educao Continuada, Alfabetizao e Diversidade

Secretaria de Educao Bsica

Ministrio da Educao

Para transformar a escola num espao onde a cultura local

possa dialogar com os currculos

escolares, importante

reconhecermos que as experincias educacionais se

desenvolvem dentro e fora das escolas.


Parte constitutiva do PDE, o programa Mais Educao, institudo atravs da Portaria Interministerial n 17 de 24 de abril de 2007, firmada entre os Ministrios da Educao, do Desenvolvimento Social, dos Esportes, da Cincia e tecnologia, da Cultura e do Meio Ambiente, objetiva a implementao de educao integral a partir da reunio dos projetos sociais desenvolvidos pelos ministrios envolvidos inicialmente para estudantes do ensino fundamental nas escolas com baixo Ideb.

Este caderno do programa Mais Educao, apresenta o programa e sugere bases para a elaborao de propostas pedaggicas. O projeto de educao integral tem como desafio estabelecer um dilogo ampliado entre escolas e comunidades. Acreditamos que, enfrentando a distncia que hoje caracteriza as relaes entre escola e comunidade, poderemos ampliar a dimenso das experincias educadoras na vida dos estudantes, promovendo a qualificao da educao pblica brasileira. Para isso, os diversos programas de governo que integram o Mais Educao precisam estar articulados s principais questes com que se defrontam estudantes e professores cotidianamente.

Para transformar a escola num espao onde a cultura local possa dialogar com os currculos escolares, importante reconhecer que as experincias educacionais se desenvolvem dentro e fora das escolas.

Como o objetivo do Mais Educao a conquista efetiva da escolaridade dos estudantes, atravs da ampliao de experincias educadoras, as prticas realizadas alm do horrio escolar precisam estar sintonizadas com o currculo e os desafios acadmicos. Este trabalho tem como objetivo auxiliar na construo de espaos de interseo de tal forma que os conhecimentos escolares tenham condies de trocas com os conhecimentos locais e vice-versa. Espera-se, assim, colaborar para a elaborao de um paradigma de educao integral que rena diversas reas, experincias e saberes.

O programa Mais Educao prope uma metodologia de trabalho capaz de fazer dos programas de governo que integram esta ao um instrumento sensvel de produo de conhecimento e cultura, pois considera a diversidade dos saberes que compem a realidade social brasileira. Sendo assim, essa metodologia no pretende apresentar um modelo; ao contrrio, quer compor diversos modelos porque nasce da riqueza de saberes existentes no Brasil. Esta proposta possui, naturalmente, uma estrutura que a fundamenta, mas pretende-se aberta, mutvel, capaz de assumir

2. Introduo


vrios contornos e refletir as vocaes e experincias comunitrias, frente s principais questes de estudantes brasileiros. tal inteno desafia a todos ns envolvidos porque exige profissionais atentos para a necessidade de constantemente redesenh-la.

A metodologia para educao integral apresentada aqui pode ser compreendida como um instrumento de dilogo e troca entre os saberes de escolas e comunidades. Acreditamos que as escolas no Brasil s tm a ganhar se buscarem se abrir para as vivncias comunitrias, assim como as comunidades para suas escolas; dessa forma, esperamos poder formular saberes diferenciados, ou seja, saberes diferentes dos originais. Queremos uma educao integral em que as diferenas e saberes possam desenvolver condies de mtuas influncias e negociaes sucessivas. Uma educao integral estruturada a partir de um conceito de integralidade, que supere termos como contraturno e atividades complementares, bem como saberes escolares e saberes comunitrios.

No Brasil, atualmente, so muitas as concepes de educao integral; esta proposta nasce em meio ao debate e apresenta uma viso capaz de levar escola contempornea uma ampliao das necessidades formativas do sujeito, contemplando as dimenses afetiva, tica, esttica, social, cultural, poltica e cognitiva. Esta concepo de educao integral no se limita ao aumento do tempo e espao nos projetos de educao, mas parte da idia de que os estudantes


so seres portadores de uma complexa experincia social e merecem ateno diferenciada porque so fruto de processos igualmente diferenciados. Compreende a educao como um desafio para escolas e comunidades e pretende dialogar com a complexidade de agentes sociais, territrios e saberes que envolvem as experincias comunitrias, buscando construir-se para alm do espao escolar.

A educao abrange diversas atividades sociais que ocorrem em muitos espaos, na escola e para alm dela. No entanto, atribuda escola toda a responsabilidade formativa dos cidados, especialmente das crianas e jovens. Sem dvida, cabe escola a sistematizao do conhecimento universalizado, mas o sucesso de seu trabalho em muito pode enriquecer-se ao ampliarem-se as trocas com outras instncias sociais.

interessante notar que esse processo de responsabilizao progressiva da escola no projeto educacional promoveu o afastamento da comunidade. Genericamente associa-se educao escola afastando-se o resto da sociedade de qualquer compromisso com a rea. Romper com tal pensamento implica assumir uma disposio para o dilogo e para a construo de um projeto pedaggico que contemple princpios e aes compartilhadas na direo de uma educao integrada de responsabilidade tanto de escolas como de comunidades.

neste contexto que propomos uma educao intercultural. Ela surge no mbito da luta contra os processos de excluso social por meio dos diversos movimentos sociais que reconhecem o sentido e a identidade cultural de cada grupo e, ao mesmo tempo, busca constituir-se atravs do espao de dilogo/conflito/negociao que possuem como desafio. A educao intercultural desenvolve-se na busca por espaos de interao de grupos diferenciados e enriquece-se neste processo.

A educao, como nos ensinou Paulo Freire1, um lugar de conflito, onde o dilogo precisa ser conquistado. A aposta desta formulao para a educao integral est na construo de um instrumento capaz de lidar com saberes oriundos de distintas experincias e avanar na direo da escuta mtua e das trocas capazes de constituir um saber diferenciado. Se o homem o sujeito de sua prpria educao, no somente objeto dela; como ser inacabado no deve render-se, mas interrogar e questionar. Escola e comunidade esto convidadas a fazer este exerccio.

Partindo desses pressupostos, o presente trabalho buscar pensar mais diretamente as relaes entre escola e comunidade, isto porque no basta reconhecer que precisam romper os isolamentos em que se encontram, necessrio superar o desafio. Sem abrir-se para a comunidade a escola dificilmente poder cumprir sua funo social. A comunidade, por sua vez, no pode nem deve prescindir da escola para seus projetos. A educao no mbito da comunidade tem dupla dimenso: a comunidade como agente educador e, ao mesmo tempo, como sujeito (coletivo) que se educa.

importante ainda deixar claro que a diversidade de saberes que coloca de um lado as escolas, com relaes diretas com o circuito acadmico, e de outro

1 Freire, Paulo. Educao e mudana. So Paulo: Editora Paz e Terra, 2006.

A aposta desta formulao para a educao integral est na construo de um instrumento capaz de lidar com saberes oriundos

de distintas experincias e

avanar na direo da escuta mtua e das trocas capazes de constituir um

saber diferenciado.


as comunidades e suas muitas instncias sociais pode ser vista como produtiva e no estigmatizadora. Essas diferenas, alm de naturais dentro de suas distintas funes sociais, so enriquecedoras; o desafio est na construo de caminhos de mo dupla, ou seja, de dilogos. As escolas (e seu funcionamento tributrio de uma tradio cientificista do conhecimento, filtrada pela tecnologia da produo) ainda no encontraram uma via clara, na qual possam fluir e se ramificar em processos educacionais as diversas experincias comunitrias e seu saber fazer. A vida cotidiana ainda distante da prtica escolar.

Este trabalho aponta um conjunto de princpios para formulao de projetos de educao integral2 atravs da intercomunicao entre as experincias e desafios comunitrios e escolares.

Sabe-se que nos ltimos anos muitos foram os programas de governo na rea da educao. O desafio atual a construo da sinergia, ou seja, a reunio dos esforos numa mesma direo: a conquista do sucesso escolar para todos os estudantes brasileiros das escolas pblicas. trata-se, sem dvida, de um tema amplo, com muitas experincias acumuladas e outras ainda em processo de desenvolvimento, sobre o qual ns educadores somos desafiados. Aqui apresentamos um instrumento que quer colaborar para que a escola possa, mais prontamente, reconhecer os mecanismos sociais em constante mutao, deixando-se atravessar pelo mundo l fora.

As pesquisas mais recentes3 no campo da educao brasileira tm apontado que as escolas que mais avanaram no dilogo com a comunidade, ampliando fronteiras, foram as que atingiram os resultados acadmicos mais positivos. Entretanto, ns professores, quando nos colocamos frente de um projeto de curso, muitas vezes ainda no nos deixamos atravessar pelos processos, atores, territrios e saberes sociais que compem a realidade de nossa escola. Para que possamos progredir nessa direo, este trabalho apresenta um instrumento articulado, um sistema de saberes capaz de assumir diversas formas, pois mantm-se aberto s respostas e experincias de todos. trata-se de um instrumento para facilitar as relaes que queremos construir entre escola e comunidade, uma vez que valoriza as especificidades de cada uma e procura entrelaar suas questes na busca por uma formao mais ampla do estudante brasileiro.

Este trabalho foi inspirado no processo de criao de alguns artistas plsticos contemporneos que buscaram dividir com o espectador o sentido de suas criaes: Lygia Clark, Helio Oiticica, Ricardo Basbaum, entre muitos outros, cujos trabalhos, embora distintos entre si, possuem uma estrutura comum atravs de uma potica indeterminada. Em relao no direta aos artistas citados, Umberto Eco (um estudioso da cultura contempornea) escreve um ensaio acerca da produo da arte atual que denominou de Obra aberta4, no qual debate a estrutura que acredita estar presente de modo diferenciado em muitos artistas. As obras abertas seriam

2 Ver no Caderno Gesto Intersetorial no Territrio desta coleo a referncia construo de projetos coletivos de educao integral.

3 Redes de aprendizagem boas prticas de municpios que garantem o direito de aprender. Unicef / MEC / Inep / Undime 2008

4 Eco, Umberto.Obra aberta. So Paulo: Editora Perspectiva, 2007.

interessante notar que o mundo da

vida e seus saberes no necessita

diretamente do mundo da escola para sobreviver e

efetivar sua singular produtividade, mas o que dizer de uma escola que atua em separado da vida cotidiana na qual

est inserida?


sistemas imprevisveis, no fechados em si, interpenetrveis e simultaneamente auto-organizveis. A obra aberta depende da interao com o pblico e, desta forma, assume distintos formatos. Esse raciocnio orientou a rede de saberes proposta nas Mandalas e apresentadas neste caderno.

Os pressupostos para educao integral que apresentamos quer assumir um formato aberto pois pretende nascer da diversidade cultural e educacional brasileira. Estrutura, por um lado, uma articulao com distintas reas dos saberes comunitrios (onze campos do conhecimento que, independentemente de grupo social, esto presentes em todo o pas de forma diferenciada). So os saberes que desenvolvemos na relao com o mundo, nossa forma de viver. Afinal, todos ns possumos formas especficas de habitar, nos vestir, comer, narrar histrias, nos expressar artisticamente, cuidar de nossa sade, trabalhar, nos relacionar com o meio ambiente, estruturar o poder poltico, lutar por direitos, brincar e

nos organizar em torno de um calendrio. De outro lado esto os desafios escolares. Neste trabalho abordamos a formao do estudante para alm do currculo escolar, vinculando-a com instncias mais gerais de sua trajetria: a conquista da pesquisa. Pensamos que fundamental para o estudante desenvolver a curiosidade, o questionamento, a observao, hipteses, descobrir, experimentar, identificar e distinguir, relacionar, classificar, sistematizar, criar, jogar, debater, comparar e concluir, entre outras experincias formadoras. Essas habilidades so inerentes prtica escolar e sob muitos aspectos relacionam-se tambm com os saberes comunitrios.

claro que no tarefa simples construir uma proposta capaz de manter vivo o debate entre escolas e comunidades, flexibilizando suas possibilidades. Entendemos que o campo no qual devemos conceber os projetos pedaggicos do Mais Educao situa-se na formulao de espaos de dilogo nos quais distintos saberes possam encontrar-se e reestruturar-se.

A educao um dos ambientes da

cultura, um ambiente em que a sociedade

reprocessa a si mesma numa operao

sem fim, recriando conhecimentos,

tecnologias, saberes e prticas.

Independentemente da rea em que

nos formamos, ns professores trabalhamos em territrios culturais.


Qualquer escola est inserida em uma comunidade com especificidades culturais (saberes, valores, prticas, crenas etc.) algumas so centros catalisadores de mais de uma experincia comunitria, pois renem alunos de distintos espaos sociais. Ns educadores precisamos reconhecer a autonomia das condies culturais da comunidade onde nossa escola est localizada, as origens culturais e sociais de nossos alunos; e a partir delas assumir um ponto de vista relacional, segundo o qual toda cultura, por ser produzida num tempo e espao, no esttica, est em comunicao permanente com outras.

A educao um dos ambientes da cultura, um ambiente em que a sociedade reprocessa a si mesma numa operao sem fim, recriando conhecimentos, tecnologias, saberes e prticas. Independentemente da rea em que nos formamos, ns professores trabalhamos em territrios culturais. Entretanto, diversas pesquisas1 (mesmo depois da obra de Paulo Freire!) sobre o universo escolar atestam que a criana vista, geralmente, como universal e a histrica, determinada biolgica e psicologicamente, como ser em desenvolvimento2. Ou seja, nos acostumamos a abordar nosso aluno como objeto de conhecimento, separado do complexo universo cultural a que pertence.

Estaria a escola sabendo agir sob a tica da diferena? Seramos ns, professores brasileiros contemporneos, capazes de estabelecer relaes verdadeiras com nossos alunos? Com os saberes de seus pais? Essas indagaes nos convidam a refletir sobre como as diferenas esto organizadas a partir de relaes de foras. E neste aspecto no podemos ser ingnuos: lidar com diferenas de saberes tambm lidar com diferenas de poderes, o que torna tudo mais delicado e tenso.

Como ento estruturar aes pedaggicas para educao integral constitudas entre o saber escolar e aquele experienciado nas comunidades, por crianas e jovens possuidores de vidas complexas, mas que geralmente repetem que nada sabem? Que sistemas de relaes podem ser desenvolvidos entre um e outro? Que continuidades os atravessam?

Este trabalho tambm foi inspirado nas idias de alguns antroplogos e pensadores da cultura contempornea3 e busca aproveitar essas contribuies

1 Ver nota 3.

2 Sommer, Luis Henrique: A ordem do discurso escolar. Revista Brasileira de Educao, n 34, vol. 12. Rio de Janeiro: Editora Anped, 2007.

3 Nestor Canclini, Clifford Geertz, Pierre Bourdieu, Michel Foucault, Boaventura de Souza Santos e Umber-to Eco.

3. As diferenas na escola, a comunidade sem lugar


tericas para a construo de propostas interculturais para educao integral. Esses autores nos ajudam a compreender as condies atuais das trocas culturais pensando o problema a partir da inter-relao entre culturas. Eles embasam nosso esforo de rever a prpria noo de cultura, compreendendo-a como um sistema de relaes.

Como educadores, nossa prtica nos situa entre tantos e por isto somos desafiados a nos voltar para o pensamento da antropologia, j que precisamos ampliar nossas vises do outro. O problema com que lidamos, do encontro de saberes oriundos de diferentes contextos, um dilema-chave nas polticas socioculturais: a educao no Brasil precisa, alm de reconhecer as diferenas, corrigir desigualdades e promover os ambientes de trocas.

Uma questo importante: o diferente sempre compreendido do ponto de vista da carncia (ou seja, por aquilo que lhe falta; ele diferente de mim porque no...). Olhamos para o outro como diferente porque ele no possui as experincias que temos.

Somos, ento, convocados a construir uma multiviso, como no movimento cubista da arte moderna, renunciando idia de um nico ponto de vista, como na arte clssica. Atualmente, vrios olhares e pontos de vista determinam simultneas imagens do real e nossa posio uma entre outras, nosso ponto de vista intermedirio. Para pensarmos sobre ns mesmos no precisamos desprezar posies alheias: eu tambm me reconheo, ento, como um diferente entre diferentes.

Podemos afirmar que freqentemente ns professores reconhecemos que nossos alunos so diferentes de ns, mas nem sempre estabelecemos condies de trocas com os saberes que eles detm. O que sabemos de nossos alunos? Quem so? Que experincias possuem? E o ponto de vista da comunidade? Os moradores reconhecem a escola como patrimnio cultural local? Como a utilizam?

O olhar cubista nos revela que a realidade (neste caso o rosto de mulher) composta de muitos pontos de vista simultneos, ou seja, o cubismo nos revela a multiplicidade e a diversidade que nos envolve.

Pablo Picasso Mulher chorando, 1937


A interculturalidade remete ao encontro e ao entrelaamento, quilo que acontece quando os grupos entram em relaes de trocas. Os contextos interculturais permitem que os diferentes sejam o que realmente so nas relaes de negociao, conflito e reciprocidade. Escola e comunidade so desafiadas a se expandirem uma em direo outra e se completarem.

Assim, se queremos uma educao integral intercultural (situada entre culturas/saberes), preciso prestar ateno aos processos que falseiam os vnculos entre escola e comunidade. Ou seja, observar se estamos abertos para as experincias diferentes das nossas. No queremos negar as diferenas, mas tornar complexo o espectro de nossas possibilidades culturais. interessante notar, quando nos referimos s trocas culturais, que as diferenas poderiam ser experimentadas como espao de enriquecimento impulso para a transformao. Se assumirmos ora o ponto de vista da escola, ora o ponto de vista das experincias diferenciadas dos alunos, no construiremos as pontes; e somente atravs delas que poderemos avanar na conquista da qualidade necessria para a escola pblica brasileira.

As relaes que estabelecemos com os outros so parte muito importante de nosso papel como educadores interessados na formulao de educao intercultural. Isto porque nosso trabalho alimenta-se da complexidade de saberes de todos os envolvidos. Portanto, o espao do inter decisivo. Ao postul-lo como espao de investigao, reflexo e prtica, buscamos mobilizar recursos entre escolas e comunidades para a construo de alternativas e superao de distncias. Nossos alunos tero sucesso na escola na mesma medida em que conseguirmos estabelecer dilogos entre escolas e comunidades.

na maneira como nos relacionamos uns com os outros que aprendemos a ser interculturais. Quando nos relacionamos, comunicamos significados que so reprocessados e recodificados, ou seja, nos transformamos quando podemos aprender uns com os outros. preciso primeiro identificar para em seguida analisar em que medida escola e comunidade recusam e hostilizam o saber da outra. Nessas situaes de confronto assduo pouco avanam, transformam-se e enriquecem-se, uma com a experincia da outra. Ao contrrio, estratificam-se processos e criam-se fronteiras, o que pode tornar sem sentido para estudantes e professores o desafio de construir conhecimento, porque sem as trocas a relao arbitrada e disciplinada e no livre e imprevisvel como nos solicita o exerccio da cultura e educao.

A circulao de saberes e bens culturais pode ser uma operao pedaggica e poltica, suscetvel de instaurar outras formas de organizao social bem como outras vises de aprendizagem estruturadas em noes mais amplas de saberes. Queremos uma educao integral pensada a partir da ampliao da prtica escolar atravs de uma estratgia pedaggica que surja de um eixo central constitudo de um projeto de educao onde a prtica escolar amplia-se em direo comunidade. Para isso, estruturamos uma Mandala de Saberes capaz de recuperar e construir o dilogo entre temas transversais, disciplinas, saberes e prticas cotidianas escolares e comunitrias.


A Mandala para o programa Mais

Educao funciona como ferramenta de auxlio construo

de estratgias pedaggicas para educao integral capaz de promover

condies de troca entre saberes

diferenciados.Emblema Mandala de Rubem Valentim


AMandala de Saberes que o programa Mais Educao apresenta, como uma estratgia possvel para o dilogo de saberes, na perspectiva da educao integral, nasceu no Rio de Janeiro, em meio ao estado de stio que cerca as favelas cariocas, em uma experincia de educao integral realizada por meio de aes dos Ministrios da Educao e da Cultura. Na Casa das Artes1, um grupo de educadores com diferentes experincias e formaes criou um instrumento capaz de orient-lo frente aos desafios pedaggicos que enfrentava.

Por que uma Mandala? A Mandala, como todos sabem, o smbolo da totalidade (aparece em diversas culturas primitivas e modernas) e representa a integrao entre o homem e a natureza. O psicanalista e estudioso de smbolos Carl Jung2 afirmou que a Mandala retrata as condies nas quais construmos nossa experincia humana, entre o interior (pensamento, sentimento, intuio e sensao) e o exterior (a natureza, o espao e o cosmo). Presente em civilizaes distintas como a egpcia, grega, hindu, chinesa, islmica, tibetana, azteca, europia e aborgine de vrios continentes, as mandalas tm um importante papel na formao do imaginrio humano. No Brasil est presente em vrias obras e monumentos, desde a catedral de Braslia at as obras de Rubem Valentim, entre outros.

Ela foi escolhida pelo grupo por representar inmeras possibilidades de trocas, dilogos e mediaes entre a escola e a comunidade.

A Mandala para o programa Mais Educao funciona como ferramenta de auxlio construo de estratgias pedaggicas para educao integral capaz de promover condies de troca entre saberes diferenciados. A educao intercultural pode ser comparada a um sistema dinmico, imprevisvel, um rduo trabalho de liberdade, de devir histrico, um esforo incessante de nos reconhecer em constante mutao. A educao pode ser vista, assim, como um laboratrio de experincias culturais, sociais e histricas em que a realidade e o conhecimento adquirem sucessivamente novas formas.

Essa estratgia pedaggica em desenvolvimento no Rio de Janeiro tem sido responsvel por um interesse crescente da criana pela escola, bem como desta pela criana. Mais prximas, atravs dessa reviso da idia de aprendizagem, escola e comunidade reagem de forma original aos desafios que vivenciam, pois podem se perceber aliadas, uma vez que esto diante da mesma questo: a garantia da qualidade na educao brasileira.

1 A Casa das Artes (www.casadasartes.org.br) uma organizao que atua h nove anos em favelas cario-cas em parceria com governos, empresas e institutos, promovendo educao de qualidade para crianas e jovens.

2 Jung, Carl G. O homem e seus smbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

4. Apresentando a Mandala


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importante ainda lembrar que fomos habituados a opor o saber e o fazer. A teoria e a prtica esta diviso est muito arraigada

em nossa cultura e, portanto, as escolas

e comunidades tambm tm,

interiorizados, esses valores.


Antes de iniciar a construo da Mandala seria importante que nos detivs-semos na compreenso da natureza dos saberes envolvidos. trata-se de esforo necessrio para que possamos garantir que as trocas entre saberes nos levem a uma prtica pedaggica aberta ao contnuo processo de transformao, que no se caracterize como espao de dominao e aprisionamento cultural/intelectual.

Entre escolas e comunidades circulam, pelo menos, dois grandes grupos de saberes1. De um lado esto os saberes avalizados pela sociedade atravs da produo acadmica, de teses, publicao de livros etc. Conhecimentos que se estruturam atravs do desenvolvimento de idias, que so sucessivamente reprocessadas. Estes costumam ser cumulativos e lineares; ou seja, construdos na direo do menor para o maior, nunca retornando a experincias passadas, se no para rev-las. Um conhecimento que aspira formulao de leis busca observar as regularidades, privilegia o como funcionam as coisas e no seu fim. Estes conhecimentos so desenvolvidos em reas especificas, distintas entre si (embora este aspecto j seja questionado dentro do prprio pensamento acadmico).

Em relao direta com a vida esto os saberes que tm origem no fazer, que tm a experincia como grande fonte. Estes conhecimentos privilegiam qual o fim das coisas, respondem a necessidades humanas. trata-se de conhecimentos processados de forma circular, que muitas vezes retornam para avanar. tambm importante dizer que eles no esto organizados por reas e suas fontes quanse nunca esto em livros.

Ambos os saberes possuem limitaes e possibilidades semelhantes.

importante ainda lembrar que fomos habituados a opor o saber e o fazer. A teoria e a prtica esta diviso est muito arraigada em nossa cultura e, portanto, as escolas e comunidades tambm tm, interiorizados, esses valores. Aqui vale destacar algumas palavras de Boaventura: A viso cientfica do mundo levou ao desperdcio e destruio de muitas outras experincias humanas2.

O desafio a que nos propomos quando buscamos formular uma educao intercultural ampliar os espaos de continuidades e trocas entre saberes distintos. O pensamento cientfico no precisa estar em oposio ao saber local, preciso recuperar o encantamento e a confiana e para isto relacion-lo aos nossos desafios

1 Souza Santos, Boaventura. Um discurso sobre as cincias. So Paulo, Ed Cortez 2008.

2 idem

5. Os Saberes e as Mandalas...divino saber...

Gilberto Gil


cotidianos. medida que avanarmos no dilogo entre escolas e comunidades, conseguiremos formular um pensamento sntese, capaz de fazer desaparecer a distino hierrquica entre o conhecimento cientfico e o cotidiano, impulsionando-nos para uma prtica reflexiva ou para uma filosofia da prtica. Para Boaventura, este pensamento sntese estaria na ordem de um novo paradigma onde o conhecimento total, tem como horizonte a totalidade da experincia humana, seja local ou universal. Neste raciocnio o conhecimento avana medida que o objeto se amplia, ampliao que se d atravs do reconhecimento de suas inmeras possibilidades de dilogo com diversos outros conhecimentos.

Considerando-se que o saber produzido socialmente pelo conjunto das pessoas nas relaes por elas estabelecidas em suas atividades prticas, isto , no seu trabalho, deve-se levar em conta que o indivduo aprende, compreende e transforma as circunstncias ao mesmo tempo em que por elas transformado.

todos ns educadores, principalmente depois de Paulo Freire, reconhecemos que para caminharmos em direo de uma educao de qualidade preciso que ambos os saberes encontrem espaos de interseo, mas nossos resultados ainda so muito tmidos. Quais as condies que as polticas educacionais brasileiras estruturaram para que formulemos uma educao integral a partir de uma noo de conhecimento ampliada? Estaro as escolas e a universidade de fato abertas para as contribuies de quem no as freqentou? E os detentores do que denominamos saberes populares eles conseguem espaos na sociedade (fora de suas localidades) para manifestar-se? Como enfrentar tais desigualdades?

Como professores, muitas vezes voltamos nossas atenes para o domnio do contedo que ensinamos e esquecemos que nosso trabalho fazer com que o aluno aprenda. Mas aprender o qu? Como?

Chegamos a um ponto importante na estruturao deste trabalho. No se trata de formular um plano pedaggico, mas de construir um instrumento, entre outros, que dialogue com a diversidade brasileira e os desafios escolares. Os princpios que apresentamos so inspirados em processos de criao da arte contempornea e popular brasileira. Foi com este interesse que chegamos s idias de Umberto Eco. Eco publicou em 1962 um livro que denominou Obra aberta3, em que apresenta um modelo terico para explicar a arte contempornea a partir da idia de que as obras possuem diversos significados, todos em relao direta com o fruidor (o espectador). Com isto, retira do artista o papel de criador da obra, pois estabelece que a criao se dar na relao entre artista e espectador. Para Eco, a obra de arte contempornea intencional (ou seja, no depende da inteno de quem a criou, mas das possibilidades que oferece para quem se relaciona com ela, o espectador). Esses aspectos so importantes porque nos incitam a pensar um instrumento pedaggico sob a mesma condio: a Mandala de Saberes atua como obra que no encerra em si suas possibilidades, mas se abre para que diferentes sujeitos possam escolher suas condies, seqncias, formas... transformando a prtica educacional em espao de dilogo e negociao, ou talvez em espao de criao.

3 op cit.


O trabalho de Ricardo Basbaum

Voc quer participar de uma experincia

artstica? foi construir um

objeto NBP (Novas Bases para a

Personalidade) e convidar diversos artistas e grupos

sociais a inventarem o que fazer com

ele, a produzirem respostas diferentes

a partir de suas experincias e

interesses.Uma performance

corporal, um espao para preparar uma

torta, os ecos do objeto na arquitetura

de uma edificao imponente, um barco

foram alguns dos resultados obtidos.

A diversidade representada pelos

participantes expressa a multiplicidade de

nossas possibilidades diante da mesma

obra.


A educao no se realiza somente na escola, mas em todo um territrio e deve expressar

um projeto comunitrio. A cidade

compreendida como educadora, como territrio

pleno de experincias de

vida e instigador de interpretao e

transformao.

Nas idias de Eco, autoria e co-autoria acabam se confundindo de tal maneira que no mais possvel falar de uma obra de arte, mas de vrias obras. Cumpre lembrar que, apesar de seu carter indeterminado, que pode culminar num sem-nmero de configuraes formais, segundo a viso de Eco, pode-se falar de obra nica e individual, na medida em que as vrias possibilidades combinatrias esto de antemo previstas na estrutura da obra que se prope aberta.

Esses aspectos nos interessam ao pensarmos na Mandala de Saberes como um instrumento pedaggico capaz de sustentar o dilogo de diferentes. Sob esta tica, ela pode ser vista como dotada de uma estrutura que desafia constantemente os envolvidos a construir sentido, diante dos contextos em que se encontrem. De certa forma, portanto, as Mandalas de Saberes podem ser comparadas s obras de arte contemporneas (e abertas, como queria Eco), pois se transformam a partir do reprocessamento de saberes sucessivamente.

A mxima sugerida por Eco, de que somos todos autores, amplia poltica e filosoficamente nossa atuao como educadores. A construo de projetos pedaggicos capazes de reunir diferentes saberes transforma a educao num frum permanente: professores e comunidades tornam-se co-autores.

Assim como os artistas precisam expor-se s interferncias dos seus espectadores, ns educadores devemos nos deixar envolver pelos comentrios de alunos/comunidade, pois dessa forma estaremos em meio a um processo educacionional e no no centro dele; estaremos engajados no processo de construo de conhecimento, reavaliando nosso poder sobre ele, pois experimentaremos a noo de que nosso poder existe na justa medida em que o compartilharmos.

Um projeto de educao interessado no dilogo entre culturas precisa estar atento metodologia de pesquisa interdisciplinar e em buscar espaos de aprendizado baseados nas trocas e na capacidade de nos relacionarmos. Queremos atrair pessoas, umas na direo das outras, a escola em direo comunidade e a comunidade em direo escola. O educador que atua a partir de uma Pedagogia das trocas4 se transforma num pesquisador das experincias da cultura no mundo em que age e aprende a trabalhar como se respira: de fora para dentro e de dentro para fora.

Esta proposta parte da premissa de que identidade no um assunto ontolgico, mas poltico: os sujeitos esto situados no meio de espaos de diferenas de classe, gnero, e sem dvida cabe a ns, educadores, promover a comunicao entre os diversos saberes e prticas.

As Mandalas de Saberes propem-se como estruturas de dupla codificao: nem isto ou aquilo, mas isto e aquilo. Nessa perspectiva, o educador abre todos os seus poros, trabalha junto com e no mais sozinho. O seu lugar no mais somente dentro da escola, mas dentro do grupo em que a escola atua. A educao no se realiza somente na escola, mas em todo um territrio e deve expressar um projeto comunitrio. A cidade compreendida como educadora, como territrio pleno de experincias de vida e instigador de interpretao e transformao.

4 Texto disponvel em www.casadasartes.org.br

A Mandala de Saberes do Programa

Mais Educao nasce da integrao

dos saberes comunitrios,

escolares e programas do

governo federal.

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Erradicao do trabalho infantil

Centros vocacionais e tecnolgicos

Juventude e meio ambiente

Escola que protegeEscola aberta

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OPrograma Mais Educao tem como objetivo contribuir para a formao integral de crianas, adolescentes e jovens, por meio da articulao de aes, de projetos e de programas do Governo Federal e suas atribuies s propostas, vises e prticas curriculares das redes pblicas de ensino e das escolas, alterando o ambiente escolar e ampliando a oferta de saberes, mtodos, processos e contedos educativos. O programa ser implementado por meio do apoio realizao, em escolas e outros espaos socioculturais, de aes socioeducativas no contraturno escolar, incluindo os campos da educao, artes, cultura, esporte, lazer, mobilizado-os para a melhoria do desempenho educacional, o cultivo de relaes entre professores, alunos, comunidades...1

O projeto se realiza atravs de parcerias entre escolas, membros das comunidades, famlias, poderes pblicos, organizaes sociais etc. em torno de uma ao comunitria e escolar comum. Queremos, mediante ampliao de tempo e espao, repensar os processos de aprendizagem, seus nexos e possibilidades de forma a ampliar tambm os contedos e metodologias na relao ensinoaprendizagem.

Para elaborarmos projetos pedaggicos para educao integral, utilizaremos os desenhos das Mandalas. A que desenhamos para apresentar as estratgicas do Mais Educao estrutura-se a partir do dilogo entre os saberes comunitrios, os escolares e os programas de governo (federal e municipal). Esta Mandala pode ser comparada a uma Mandala Me (pois dela nascem diversas outras), a partir do encontro de possibilidades dos saberes e programas envolvidos. Ela um instrumento para a construo de projetos de educao integral.

Esta Mandala uma sntese, ela rene os principais ingredientes que devem integrar a elaborao dos projetos pedaggicos.

1 PortariaNormativaInterministerialn17,de24deabrilde2007.

6. Mandala do Mais Educao

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1. Ao centro o objetivo: a construo de Projeto de Educao Integral

2. No segundo crculo situar os saberes comunitrios selecionados.

3. O crculo seguinte o espao reservado para a identificao dos Macrocampos. Eles apresentam as reas onde se situam os programas de governo.

4. Em seguida aparecem as reas onde se situam os ministrios que compem o programa.

5. Os saberes escolares integram o crculo seguinte.

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Os saberes comunitrios representam o

universo cultural local, isto , tudo aquilo que nossos

alunos trazem para a escola.

Esses saberes so os veculos para a aprendizagem

conceitual: queremos

que os alunos aprendam atravs

das relaes que possam ser

construdas entre os saberes.

As pessoas vivem em algum lugar e tendem a viver naturalmente juntas. Isso nos faz pensar em espaos mais ou menos delimitados de complexidade social. Mesmo a menor cidade divide seus habitantes e suas casas em grupos. Podemos chamar de comunidade os territrios ou bairros, um conjunto de bairros, algumas ruas, mas sempre so locais onde as pessoas conseguem alguma familiaridade social, geogrfica e histrica, onde vivem processos sociais, econmicos e polticos relativamente comuns.

A marca da comunidade o bem comum, seus membros esto sempre numa relao de igualdade entre si, sem mediaes. Possuem geralmente o sentimento de unidade e destino comum.

Um territrio , segundo Milton Santos1, um lugar onde diversos atores sociais compartilham vida comum. Cada um exercendo uma funo especfica na vida social se individualiza e simultaneamente desenvolve laos de dependncia.2

Cada lugar , sua maneira, o mundo... todos os lugares so virtualmente mundiais. Mas, tambm, cada lugar, irrecusavelmente imerso numa comunho com o mundo, torna-se exponencialmente diferente dos demais.3

Os saberes comunitrios representam o universo cultural local, isto , tudo aquilo que nossos alunos trazem para a escola, independentemente de suas condies sociais. Esses saberes so os veculos para a aprendizagem conceitual: queremos que os alunos aprendam atravs das relaes que possam ser construdas entre os saberes. Os alunos devem, portanto, ser estimulados a usar seus saberes e idias a fim de formularem o saber escolar.

Procuramos identificar aspectos gerais que possam ser aplicados a diversos contextos, uma vez que se trata de reas articuladas estrutura da realidade social e cultural brasileira. Selecionamos onze reas distintas de saberes (este modelo pode ser ampliado ou revisto por cada articulador/escola/comunidade), so eles:

Habitao Como se caracterizam as experincias com o espao? O sentido de prximo/distante; grande/pequeno? Onde e como moram os habitantes deste territrio? Como so construdas as casas? Identificam-se tcnicas especficas? Quais influncias (heranas culturais) podem ser reconhecidas? Quais os materiais

1 Santos, Milton. A natureza do Espao. So Paulo: Edusp, 2004.

2 Ver Caderno Gesto Intersetorial no Territrio, desta coleo.

3 Idem pg. 314.

7. Saberes Comunitrios

Obras da mostra Arte e Diversidade Cultural no Brasil, Palcio das Artes/MG em 2007: Caboclo da Mata, Barra/BA; lamparina de seringueiro, Rondnia; Luiz Gonzaga, escultura em durepox, Pernambuco; e vasilha de chimaro, Porto Alegre/RS.

Fotos: Mila Petrillo


mais utilizados? As casas foram planejadas? Quem as construiu? Que rea ocupam? Quanto aos espaos comuns, como caracteriz-los? H servios bsicos como gua, esgoto, luz, correio, endereo? Que outras construes e servios existem? Fbricas, comrcios, distribuidoras? Bibliotecas? Praas?

Corpo/vesturio Como os membros dessa comunidade/territrio movimentam seu corpo no cotidiano e nas festas? Que experincias corporais possuem? H esportes ou danas que marcam a vida comunitria? Que gestos e gingas so mais usados, e em quais circunstncias? Quais as influncias de outros povos e culturas nessa experincia corporal identificada? Como se vestem? As roupas tm caractersticas comuns? O que valorizado? Quem costura? Que materiais so mais utilizados? Por qu? As matrias-primas so locais?

Alimentao Como se alimentam? H falta ou abundncia de alimentos? H desperdcio (como, de qu)? Quais so as comidas prediletas das distintas geraes? Quem cozinha? E em que condies? Como combinam os alimentos? Como distribuem e compram os diversos alimentos? A comunidade produz alimentos industrializados ou agrcolas? Que relaes podem ser estabelecidas entre as comidas e o calendrio de festas?

Brincadeiras Quais so as brincadeiras favoritas (observar as faixas etrias e suas caractersticas)? H diferenas entre as brincadeiras e jogos desenvolvidos na escola e na comunidade? As regras so as mesmas independentemente do contexto?


O que muda? Por que muda? As brincadeiras no tempo (observar as relaes com a tradio oral). Como brincaram as outras geraes? As brincadeiras e as novas tecnologias, o brinquedo ontem e hoje.

Organizao poltica todos os grupos sociais buscam na organizao poltica responder ativa e coletivamente aos desafios que se apresentam. Observe como instauram a idia de lei, de justo/injusto, proibido/permitido. A ordem social se estrutura a partir das relaes entre o poder, direitos, deveres e os cidados. Como, neste territrio, se desenvolvem essas relaes? Como o grupo vivencia as regras sociais? Quais os conflitos mais freqentes? Entre quais atores e interesses sociais?

Condies ambientais Quais as caractersticas geogrficas da comunidade? Como o meio ambiente influencia as condies de vida? Qual a histria e quais os desafios do desenvolvimento da regio? Houve preocupao ambiental nesse processo? Quais os atuais desafios ambientais? Como so enfrentados?

Mundo do trabalho (moedas de troca) Quais os trabalhos mais comuns nesta comunidade? possvel identificar relaes entre o mundo do trabalho e a organizao poltico-cultural, com as condies ambientais e outros? Qual a qualidade de vida produzida? Atravs de seu trabalho a comunidade vem encontrando sadas para os desafios locais? O dinheiro a nica moeda de troca entre os moradores

Instrumentos musicais feitos com semente de sapucaia (tambor) e castanha-do-par (chocalho)

Foto: Mila Petrillo


da comunidade? E quanto troca de servios, como so desenvolvidas as redes de solidariedade? Explorar as relaes entre os valores e as prticas comerciais, as trocas de servios etc.

Curas e rezas Como cuidam da sade? Quais os hbitos? Como solucionam os males fsicos que enfrentam? Quais as relaes da sade com as condies ambientais? Alm da medicina tradicional, quais as tradies e remdios utilizados? Quais as receitas? Como so preparados esses remdios? Por quem? Utilizam rezas para a cura? H relaes entre as rezas e as plantas ou remdios populares?

Expresses artsticas Elas integram o universo da produo do simblico, que se expressa em pelo menos quatro linguagens distintas, embora nem sempre independentes. Muitas festas populares e manifestaes mais contemporneas renem mais de uma rea de expresso numa mesma criao. Podemos, para fim deste trabalho, considerar tambm as expresses:

VERBAIS: H particularidade na forma de se comunicar? Quais as expresses mais utilizadas? Quais as grias? Que relaes podem ser estabelecidas entre as expresses verbais e as lendas e as narrativas locais?

VISUAIS: (refere-se ao mundo da imagem) Quais as expresses visuais produzidas? Cartazes? Vesturios? Decoraes de festas? Murais?

CORPORAIS: Quais as festas e danas? H dramatizao teatral?

MUSICAIS: H tradio musical especfica? Quanto indstria cultural ou cultura de massa, como so estabelecidas as relaes?

Narrativas locais A vida comunitria marcada por diversas histrias, algumas ocorridas (fatos comprovados) e outras das quais no se tem certeza, mas s quais todos se referem (as lendas); todas possuem o mesmo valor pois estruturam o imaginrio local. interessante pesquisar esse repertrio de histrias e as relaes com as outras reas de experincias comunitrias, como as rezas e curas, as receitas, expresses artsticas etc.

Calendrio local interessante reconhecer e valorizar as datas representativas para a experincia comunitria e compar-las com o calendrio socialmente institudo. O calendrio comunitrio geralmente composto de crenas, homenagens, personagens, e expressa as histrias daquele grupo.


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Ao ingressar na escola, os alunos trazem os sentidos particulares que atribuem a si prprios como pessoas, passando, ento, a viver a experincia de compreender o significado social que esta instituio e os que a compem lhes atribuem. Eles possuem diferentes experincias no mundo que se constituem num desafio ao professor, no sentido de relacion-las aos contedos processados nas escolas.

A escola costuma ser um dos primeiros espaos pblicos apresentados s crianas e, por sua organizao e modo de ser, abre portas de um mundo normativo e menos particularizado. 1

Nosso objetivo na elaborao de um instrumento para a construo de projetos de educao integral dinamizar a formao do estudante atravs de um processo de educao capaz de fazer da escola uma comunidade de aprendizagem. Para isto importante que passemos a pensar a vida escolar para alm dos desafios que os diversos contedos propem cotidianamente a nossos estudantes.

Optamos por trabalhar com enunciados mais ou menos gerais, buscando vincular conceito, aplicao e mobilizao do conhecimento. A nfase, no entanto, est no desenvolvimento do esprito de pesquisa na formao de estudantes. Acreditamos que este esprito, quando bem alcanado, estrutura a conquista de qualquer vida acadmica e comunitria. Quando utilizamos a expresso saberes escolares, preciso esclarecer, nos referimos s propriedades e estratgias do fazer e do pensar, aos procedimentos passveis de produzir uma prxis diferenciada para estudantes em formao. Aqui os saberes escolares se constituem alm dos contedos especficos de cada disciplina escolar; so tambm as habilidades, procedimentos e prticas que nos tornam sujeitos formuladores de conhecimentos.

Hoje, mais do que nunca, ns professores precisamos de muita clareza para desenvolver o que realmente importante na relao ensino-aprendizagem, principal-mente porque vivemos em um mundo repleto de informaes potencialmente interessantes.

O que queremos que os alunos possam conferir significado e sentido quilo que aprendem. Somente desta forma se consegue que a aprendizagem de contedos especficos cumpra a funo que lhe determinada e que justifica sua importncia: contribuir para o crescimento pessoal do aluno e sua socializao.

1 CENPEC. Parmetros das aes socioeducativas, conceitos e polticas. Prefeitura de So Paulo/Secre-taria de Assistncia Social. 2008.

8. Saberes Escolares


Saberes escolares:

Acuriosidade:querersaber,quererconhecer;

Oquestionamento:noaceitar,buscarconfirmar;

Aobservao:estudaralgocomateno;

Odesenvolvimentodehipteses:estimar;

Adescoberta:revelar,daraconheceralgo;

Aexperimentao:tentar,praticar,verificar;

Odesafio:ojogocomopesquisa;

Aidentificao:reconhecerocarterdealgo;

Aclassificao:distribuiremclasses,determinarcategorias;

Asistematizao:criarouidentificarrelaesentreparteseobjetos;

Acomparao:estabelecerconfrontoentreparteseobjetos;

Asrelaes:estabeleceridentidadesediferenasentreparteseobjetos;

Asconcluses:realizarsnteses;

Odebate:confrontarpontosdevista;

Areviso:verdenovo,comacapacidadedealteraropontodevistaoriginal;

Ocriar:darforma,produzir,imaginar,suscitar;

Jogar:colocar-seemrisco,aceitarcombinaesnoprogramveis,experimentar;

Acuriosidade:voltaraseperguntar.

As reas do conhecimento escolarA seguir apresentamos alguns aspectos gerais das distintas reas do currculo

escolar para auxiliar nas relaes que podem ser estabelecidas entre os saberes escolares e comunitrios. Inspiramo-nos nos Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio (PCNEM), documento que foi produzido em 2000 por tcnicos e especialistas. Este material nos ajuda a pensar a relao entre contedo e contexto, levando-nos a uma viso interdisciplinar de nosso trabalho. Ele apresenta as disciplinas (Lngua Portuguesa, Estrangeira, Matemtica, Geografia, Histria, Cincias, Artes e Educao Fsica) estabelecendo a diviso do conhecimento escolar por reas que, quando reunidas, compartilham o mesmo objeto de estudo.

A abordagem aqui apresentada foi adaptada aos desafios do ensino fundamental e assumiu a seguinte configurao:

Linguagens,CdigosesuasTecnologiasrenelnguaportuguesa,estrangeira,artes, informtica, educao fsica e literatura.

CinciasdaNaturezaeMatemticas,comportandoasmatemticaseascincias.

SociedadeeCidadania,ondesedebatemfilosofia,cinciashumanas,histriae geografia.


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AMandala de Relaes de Saberes foi criada para demostrar que os saberes comunitrios e os escolares possuem pontos comuns de investigao embora com metodologias e formulaes diferenciadas.

Os conhecimentos so socialmente construdos isto , so resultados de prticas que mobilizam recursos intelectuais de diferentes tipos, vinculados a contextos e situaes especficas. O trabalho do professor buscar relacion-los.

Esta mandala quer mostrar que no existe entre escolas e comunidades uma relao assimtrica: doador (escola) x recipiente (comunidade); conhecimento (escola) x ignorncia (comunidade); ensinar / aprender; pensar / agir; recomendar / seguir; desenhar / implementar.

9. Relaes de Saberes


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Na estratgia do Mais Educao os programas de governo so mediadores de saberes, ou seja, apresentam as estratgias diferenciadas para a caracterizao da educao integral. Os diversos programas possuem vocaes e habilidades especficas; cada um deles facilitador de determinados aspectos da vida comunitria ou escolar. Sugerimos que os programas sejam escolhidos de acordo com os desafios e potencialidades locais.

O Ministrio da Educao/SECAD estruturou sete Macrocampos que dialogam diretamente com os programas de governo. So eles: acompanhamento pedaggico, meio ambiente, esporte e lazer, direitos humanos e cidadania, cultura e artes, incluso digital e comunicao e sade, alimentao e preveno. Atravs de cada um deles o MEC/SECAD apresenta os recursos e materiais disponveis para as escolas. Sua descrio mais detalhada encontra-se no Roteiro Manual PDDE 24.04 disponvel no site do FNDE.1

A seguir, apresentamos um resumo de cada programa de governo e suas interfaces com as escolas e comunidades:

Ministrio dos Esportes Esporte e Lazer e Segundo tempo.

Ministrio da Cultura Cineclube na Escola, Cultura Viva, Casas do Patrimnio.

Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome Programa Ateno Integral Familia, ProJovem Adolescente, Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social CREAS e Programa de Erradicao do trabalho Infantil PEtI.

Ministrio da Cincia e Tecnologia Casa Brasil Incluso Digital, Centros Vocacionais tecnolgicos e Centros Museus da Cincia.

Ministrio da Educao Com Vidas Comisso Meio Ambiente e Qualidade de Vida, Educao e Direitos Humanos, Educao Inclusiva: direito diversidade, Escola que Protege, Escola Aberta, Educar na Diversidade, Salas Recursos Multifuncionais e ProInfo.

Ministrio do Meio Ambiente Sala Verde, Municpios Educadores Sustentveis e Viveiros Educadores.

1 Sugere-se a leitura do Caderno Gesto Intersetorial no Territrio, desta coleo.

10. Programas de governo que integram o Mais Educao


Ministrio do Esporte

Programa Segundo Tempo

Apresentao: O programa promove o acesso a atividades esportivas e complementares no contraturno escolar, em espaos fsicos pblicos ou privados, tendo como enfoque principal o esporte educacional.

Objetivos: Democratizar o acesso ao esporte educacional de qualidade, como forma de incluso social, ocupando o tempo ocioso de crianas, adolescentes e jovens, mediante a oferta de condies adequadas para as prticas esportivas e estimulando o pblico-alvo a manter uma interao efetiva que contribua para o seu desenvolvimento integral.

Pblico-alvo: Crianas, adolescentes e jovens em situao de risco social.

Interfaces pedaggicas:

Oferta de atividades esportivas, integradas ao projeto pedaggico da escola;


Utilizao dos espaos fsicos j existentes e ociosos;

Vinculao de recursos humanos das reas da Educao Fsica, Pedagogia ou Esporte, oportunizando a experincia profissional e a qualificao;

Oferta de atividades esportivas a cada beneficiado;

Incentivo realizao de eventos que promovam a integrao entre beneficiados, famlia e comunidade;

Acompanhamento e avaliao permanente das aes;

Integrao do programa com outros projetos e aes sociais que possam potencializar o atendimento promovido.

Programa Esporte e Lazer na Cidade

Apresentao: Programa de incentivo s atividades esportivas e de lazer, que se estrutura em dois eixos ou ncleos:

Organizao e implantao de oficinas (esportes, artes, teatro, msica etc.) e eventos de lazer (gincanas, colnias de frias, festivais, passeios tursticos etc.), integrando estudantes, famlias e comunidade;

Voltado para o desenvolvimento cientfico e tecnolgico do esporte e do lazer, visa organizao de centros de fomento pesquisa e difuso de eventos cientficos relacionados ao tema.

Objetivo: Promover o acesso ao esporte e ao lazer como direito social, tratando-os como Poltica Pblica de Estado a fim da garantir a universalizao do acesso por meio de aes continuadas, tendo como foco as escolas da rede pblica que integrem o Mais Educao.

Pblico-alvo: Estudantes (crianas e adolescentes), idosos, portadores de necessidades especiais e professores da rede pblica.


As escolas devero viabilizar espaos esportivos prprios ou de terceiros;

O Ncleo de Esporte Recreativo e de Lazer ser responsvel pela organizao e implantao de oficinas e prticas esportivas diversificadas (jogos, artes, teatro, msica etc.) e eventos de lazer (gincanas, colnias de frias, festivais, passeios tursticos etc.);

O Ncleo Cientfico e tecnolgico do Esporte e Lazer deve contribuir para a produo e sistematizao do conhecimento acerca do lazer e do esporte;

As famlias sero chamadas a participar das atividades dos Ncleos, de modo a que se estimule o desenvolvimento das relaes famlia-escola e estudantes-famlias.


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Ministrio da Cultura

Programa Cultura Viva

Apresentao: Programa responsvel pela organizao e articulao dos Pontos de Cultura (ncleos que promovem aes que ampliam os meios de produo e difuso da cultura). O Cultura Viva est dividido em Cultura Digital (favorece o uso de software livre para produo audiovisual), Agentes Cultura Viva (promove qualificao profissional de jovens nas reas da cultura), Gris ou Mestres da tradio Oral (promove valorizao dos conhecimentos de mestres da cultura popular) e Ao Escola Viva (promove atividades culturais nas escolas e valorizao da cultura como forma de inteligibilidade das diversidades locais e da identidade nacional).

Objetivo: Prover recursos para manifestaes artsticas populares, prioritariamente para a fruio, produo e difuso da diversidade cultural brasileira.

Pblico-alvo: Estudantes da rede pblica de ensino, educadores, famlias, agentes culturais, artistas e comunidade em geral.


Os Pontos de Cultura so geralmente oriundos de estruturas comunitrias j mobilizadas e fortalecem as manifestaes culturais locais;

Os Pontos de Cultura podem desenvolver parcerias com as escolas atravs de oficinas culturais e recreativas, espetculos artsticos, visitas a museus, parques, teatros etc., criando uma rede cultural sustentvel.

Favorece o desenvolvimento de projetos comunitrios para a educao, fortalecendo a comunidade de aprendizagem, as redes locais.

Programa Cineclube na Escola

Apresentao: O Programa promove a exibio de filmes nacionais nas escolas, em horrios livres, estimulando a integrao entre comunidade e escola.

Objetivos: Aproximar a comunidade escolar da cinematografia nacional, atravs da difuso do audiovisual na rede pblica de ensino. Promover a educao para a mdia audiovisual.

Pblico-alvo: Escolas (professores e alunos), famlias e diversos atores comunitrios.


Atividades de difuso do audiovisual;

Debates e atividades culturais e educativas, a partir dos filmes exibidos, entre geraes, estudantes e comunidade em geral;


Incorporao da cultura audiovisual rotina educativa;

Oficinas para a preparao dos educadores, com temas como cineclubismo e as possibilidades educomunicativas do audiovisual;

Enriquecimento dos instrumentos pedaggicos disponveis para as escolas;

Ocupao das escolas fora do horrio escolar, favorecendo a integrao entre comunidade e escola e incrementando a formao de platias.

Programa Casas do Patrimnio

Apresentao: O Programa tem como foco a formao de educadores-multiplicadores que desenvolvero aes de Educao Patrimonial junto aos educandos e comunidade em geral.

Objetivos: Formar educadores como agentes multiplicadores da Educao Patrimonial. Promover aes capazes de levar crianas e adultos a um processo ativo de construo de conhecimento atravs da valorizao e da reinterpretao dos bens culturais comunitrios.

Pblico-alvo: Educadores (direto); estudantes e famlias (indireto).


Aes educativas e oficinas para formao de educadores-multiplicadores;

Observao das manifestaes culturais para anlise crtica, formulao de hipteses e soluo de problemas;

Estmulo Educao Patrimonial como tema fundamental na Educao Bsica;

Participao das escolas em aes conjuntas com a comunidade, em prol da proteo e da promoo dos bens culturais;

Ampliao dos instrumentos pedaggicos de preservao e valorizao do patrimnio cultural e natural, material e imaterial, nas escalas local, regional e nacional;

Implantao das Casas do Patrimnio, representaes regionais do Iphan que tm como foco a dinamizao da cultura local e o atendimento a estudantes, professores e comunidade, atravs de eventos, exposies e oficinas permanentes de Educao Patrimonial, restaurao e preservao. As Casas servem tambm como pontos de referncia para turistas interessados em conhecer as identidades culturais da regio;

Ampliao da noo comunitria de patrimnio para alm das edificaes, incluindo pessoas, costumes, saberes, sabores, o suor, o sonho (ou seja, alm do tangvel: o imaterial).


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Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome

Os programas que so apresentados pelo Desenvolvimento Social promovem a garantia de direitos e proteo social, por meio de servios de ateno direta e avaliao do grau de proteo de grupos vulnerveis. So importantes aliados de escolas e comunidades na organizao de uma rede de apoio direta a famlias, crianas e jovens em situao de risco social.

ProJovem Adolescente Servio Socioeducativo

Apresentao: um servio socioeducativo de convvio de assistncia social, que integra as aes de proteo social bsica do SUAS, sendo ofertado pelo Centro de Referncia de Assistncia Social (CRAS) ou a ele referenciado, com nfase no fortalecimento de vnculos sociais familiares e comunitrios, como objeto de trabalho da Poltica Nacional de Assistncia Social (segurana bsica da convivncia familiar e comunitria). Distingue-se da execuo de medidas socioeducativas previstas no ECA, embora abra espao para a participao de jovens cumprindo medidas, acompanhados concomitantemente pela Proteo Social Especial.

Objetivos: Complementar a proteo social bsica famlia, criando mecanismos para garantir a convivncia familiar e comunitria; e criar condies para a insero, reinsero e permanncia do jovem no sistema educacional.

Pblico-alvo: Jovens de famlias beneficirias / no perfil de renda do Programa Bolsa Famlia; egressos de medida socioeducativa de internao ou em cumprimento de outras medidas socioeducativas em meio aberto; em cumprimento ou egressos de medida de proteo; egr

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