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PRTICA POLICIAL BSICA Caderno Doutrinrio 1INTERVENO POLICIAL, VERBALIZAO E USO DE FORA

MissoAssegurar a dignidade da pessoa humana, as liberdades e os direitos fundamentais, contribuindo para a paz social e para tornar Minas o melhor Estado para se viver.

VisoSermos excelentes na promoo das liberdades e dos direitos fundamentais, motivo de orgulho do povo mineiro.

Valoresa) Respeito aos direitos fundamentais e Valorizao das pessoas. b) tica e Transparncia. c) Excelncia e Representatividade Institucional. d) Disciplina e Inovao. e) Liderana e Participao. f ) Coragem e Justia.

PRTICA POLICIAL BSICA Caderno Doutrinrio 1INTERVENO POLICIAL, VERBALIZAO E USO DE FORA

Belo Horizonte 2010

Direitos exclusivos da Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG) Reproduo proibida circulao restrita.

Comandante-Geral da PMMG: Cel.PM Renato Vieira de Souza Chefe do Gabinete Militar do Governador: Cel.PM Luis Carlos Dias Martins Chefe do Estado-Maior: Cel.PM Mrcio Martins Santana Comandante da Academia de Polcia Militar: Cel.PM Fbio Manhes Xavier Chefe do Centro de Pesquisa e Ps-Graduao: Ten.-Cel.PM Antnio L. Bettoni da Silva Tiragem: 2.000

MINAS GERAIS. Polcia Militar de. Interveno Policial, Verbalizao e Uso de Fora M663i - Belo Horizonte: Academia de Polcia Militar, 2010. 120 p. (Prtica Policial Bsica. Caderno Doutrinrio 1) 1. Interveno policial. 2. Uso de fora. 3. Atuao policial. 4. Tcnica e ttica policial militar. 5. Verbalizao policial. I. Ttulo. II. Srie CDU 355.014 CDD 363.22

Ficha catalogrfica: Rita Lcia de Almeida Costa CRB 6 Reg. n.1730

ADMINISTRAO: Centro de Pesquisa e Ps Graduao Rua Dibase 320 Prado Belo Horizonte MG CEP 30410-440 Tel.: (0xx31)2123-9513 Fax: (0xx31) 2123-9512 E-mail: [email protected]

SUMRIO1 APRESENTAO............................................. 9 2 PREPARO MENTAL............................................15 2 .1 Estados de prontido.........................................18 2 .1 .1 Classificao dos estados de prontido.............................18 2 .2 Estados de prontido e a atuao policial............................21 3 AVALIAO DE RISCOS.........................................25 3 .1 Metodologia de avaliao de riscos................................27 3 .2 Aplicao................................................29 4 PENSAMENTO TTICO..........................................31 4 .1 Quarteto do pensamento ttico..................................33 4 .1 .1 Leitura do ambiente........................................36 4 .1 .2 Alinhamento do estado de prontido..............................37 4 .2 Processo mental da agresso....................................39 5 INTERVENO POLICIAL........................................ 43 5 .1 Nveis de interveno.........................................45 5 .2 Etapas da interveno........................................46 5 .3 Abordagem policial..........................................48 5 .3 .1 Fundamentos da abordagem policial pessoa em atitude suspeita...........50

6 VERBALIZAO POLICIAL ........................................53 6 .1 Comunicao na abordagem policial...............................57 6 .2 Verbalizao do policial face ao comportamento do abordado...............62 6 .2 .1 Abordado cooperativo.......................................62 6 .2 .2 Abordado resistente passivo...................................64 6 .2 .3 Abordado resistente ativo.....................................67 6 .2 .4 Verbalizao no caso de priso..................................68 6 .3 Consideraes finais.........................................69 7 USO DE FORA.............................................71 7 .1 . Princpios do uso de fora......................................76 7 .1 .1 Nveis de resistncia da pessoa abordada...........................81 7 .1 .2 Uso diferenciado de fora.....................................82 7 .1 .3 Modelo do uso de fora......................................87 7 .1 .4 Responsabilidade pelo uso de fora...............................88 7 .2 Uso da arma de fogo.........................................89 7 .2 .1 Regras gerais de controle.....................................89 7 .2 .2 Normas de segurana.......................................90 7 .2 .3 Usar ou empregar arma de fogo.................................91 7 .2 .4 Atirar ou disparar arma de fogo ..................................93

7 .2 .5 Objetivo do disparo.........................................93 7 .2 .6 Procedimentos para o disparo da arma de fogo........................97 7 .2 .7 Circunstncias especiais para o disparo de arma de fogo..................98 7 .2 .8 Procedimentos aps o disparo de arma de fogo...................... 103 7 .3 Relatrios sobre o uso de fora e arma de fogo........................ 104 7 .3 .1 Confeccionados pelo policial.................................. 104 7 .3 .2 Roteiro bsico de apurao referente ao uso de fora e arma de fogo......... 106 GLOSSRIO............................................... 109 REFERNCIAS............................................... 117

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APRESENTAO

Caderno Doutrinrio

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1 APRESENTAOOs fundamentos aplicados neste Caderno Doutrinrio esto em conformidade com a legislao brasileira e com os documentos oriundos da Organizao das Naes Unidas (ONU), no que forem aplicveis funo policial, quais sejam: Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF), o Cdigo de Conduta para os Encarregados pela Aplicao da Lei (CCEAL), o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos (PIDCP), o Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econmicos e Culturais (PIDSEC) e a Conveno Contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruis, Desumanas ou Degradantes1. Expressar toda a complexidade da atividade policial em um conjunto de textos desafiador. Cada interveno singular e exige flexibilidade do profissional. Mas necessrio ter parmetros bem definidos que deem sustentao s aes policiais, mesmo considerando essa versatilidade. Diante dessa realidade, caracterizada por tantas variveis, imprescindvel respeitar os princpios legais e ticos que conferem identidade e legitimidade profisso policial e aplicar tcnicas e procedimentos consolidados pela experincia de seus integrantes. A construo do escopo doutrinrio declara o que esta atividade tem de essencial, constante e estvel; uma estrutura slida que servir de guia sobre o qual a criatividade, quando necessria, dever se referenciar. A Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG) apresenta um conjunto de Cadernos Doutrinrios que estabelecem mtodos e parmetros que propiciam suporte sua prtica profissional e, por isso, consistem em instrumentos educativos e de proteo, tanto para o policial quanto para o cidado. Este Caderno Doutrinrio 1 Interveno Policial, Verbalizao e Uso de Fora tem como finalidade apresentar orientaes bsicas para a efetividade das intervenes policiais e deve ser tomado como referencial obrigatrio para os demais Cadernos Doutrinrios.1 Ressalta-se que as normas internacionais em que o Brasil signatrio, se incorporam ao ordenamento jurdico brasileiro, via de regra, com fora de lei ordinria.

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A seo 2 trata do preparo mental e dos estados de prontido, ressaltando a importncia de o policial ensaiar possibilidades para antecipar respostas e observar sua capacidade de reao para as diferentes situaes do cotidiano operacional. A seo 3 traz a metodologia para proceder avaliao de riscos, ferramenta necessria para diagnosticar as diversas situaes de ameaa e as condies de segurana para uma interveno. O pensamento ttico outro recurso importante para o diagnstico de cada ocorrncia, fornece elementos para analisar e controlar as diferentes reas do teatro de operaes e buscar interferir no processo mental do agressor, subsidiando o planejamento da interveno. Ser desenvolvido na seo 4, em complemento seo anterior. A seo 5 aborda o tema interveno policial, suas etapas e classificao em trs nveis diferentes, em funo dos objetivos e riscos avaliados. A abordagem policial, como exteriorizao da interveno, tambm tratada nesta seo, contudo, de forma introdutria, pois ser retomada mais detalhadamente nos outros Cadernos Doutrinrios, devido sua importncia na atividade policial. A verbalizao policial tema da seo 6, destacando a importncia dos elementos verbais e no verbais do processo de comunicao, como instrumento facilitador em qualquer interveno, aplicvel em todos os nveis de uso de fora pela polcia. Finalizando, a seo 7 dispe sobre o uso de fora, seus diferentes nveis, alm de trazer consideraes e orientaes sobre o uso de arma de fogo e de fora potencialmente letal, consistindo num referencial para que o policial tenha segurana em utiliz-la, desde que em conformidade com os princpios ticos e legais que regem seu emprego. importante acrescentar que a elaborao desta seo contou com a colaborao destacada de instrutores formados no mbito do projeto de integrao das normas de Direitos Humanos prtica policial, promovido pelo Comit Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

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Caderno Doutrinrio

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Este conjunto de Cadernos Doutrinrios operacionais denomina-se Prtica Policial Bsica e ser composto pelos seguintes documentos: Caderno Doutrinrio 1 Interveno Policial, Verbalizao e Uso de Fora Caderno Doutrinrio 2 Ttica Policial, Abordagem a Pessoas e Tratamento s Vtimas Caderno Doutrinrio 3 Blitz Policial Caderno Doutrinrio 4 Abordagem a Veculos Caderno Doutrinrio 5 Cerco, Bloqueio e Interceptao Caderno Doutrinrio 6 Escoltas Policiais Caderno Doutrinrio 7 Abordagem a Edificaes

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PREPARO MENTAL

Caderno Doutrinrio

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2 PREPARO MENTAL fato que cada ocorrncia policial possui um conjunto de variveis que a torna nica. Cada interveno singular, exigindo que o policial seja verstil e capaz de adaptar-se s peculiaridades de cada situao do cotidiano operacional. Nesse contexto, a segurana do policial, na execuo das suas tarefas, est diretamente relacionada ao seu preparo mental2. Considera-se preparo mental o processo de pr-visualizar e ensaiar mentalmente os provveis problemas a serem encontrados em cada tipo de interveno policial e as possibilidades de respostas. Essa antecipao desencadeia um conjunto de alteraes fisiolgicas e psicolgicas, colocando o policial num estado de prontido que ampliar sua capacidade de resposta a cada situao. A falta do preparo mental do policial durante uma interveno prejudicar o seu desempenho, levando a um aumento de seu tempo de resposta agresso e, assim, o uso de fora poder ser inadequado (excessivo ou aqum do necessrio para cont-la). Num cenrio mais grave, o policial pode ser levado a uma paralisia ou a um bloqueio na sua capacidade de reagir, comprometendo, consequentemente, a segurana e os resultados da ocorrncia. Visualizar as situaes e respostas possveis prepara o policial para a tomada de decises. Mesmo em circunstncias adversas (por exemplo, ferido ou sob estresse), o policial bem treinado ter como responder adequadamente, dentro dos padres tcnicos, legais e ticos. O treinamento policial baseado em situaes prticas que se aproximam do cotidiano profissional, somado anlise crtica de erros e acertos vivenciados na experincia real contribuem para o desenvolvimento da habilidade do policial pensar sobre como ele agiria nas diversas situaes, visualizando mentalmente suas respostas e definindo previamente o seu procedimento bsico. Dessa forma, ele criar rotinas seguras para sua atuao. Por isso, o treinamento policial deve ser contnuo, valorizando o preparo mental, tanto quanto todas as atividades da capacitao profissional.2 No Manual de Prtica Policial Geral / Volume 1 (2002), o termo utilizado no Ttulo do Captulo II condicionamento mental.

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LEMBRE-SE: ao desenvolver o preparo mental, o policial antecipa-se, fazendo uma avaliao preliminar das ameaas e considerando possibilidades de atuao.

2.1 Estados de prontido3Na atividade profissional, o policial lida com diversas situaes caracterizadas por diferentes nveis de risco e complexidade. Cada momento exigir dele uma habilidade de se antecipar e reagir ao perigo e atuar em um estado de prontido diferente. Os estados de prontido so definidos por um conjunto de alteraes fisiolgicas (frequncia cardaca, ritmo respiratrio, dentre outros) e das funes mentais (concentrao, ateno, pensamento, percepo, emotividade) que influenciam na capacidade de reagir s situaes de perigo. importante destacar que os estados de prontido dependem de fatores subjetivos, tais como experincias anteriores, domnio tcnico e relacionamento com a equipe de trabalho, que influenciam no modo como cada policial percebe e responde a um mesmo estmulo.

2.1.1 Classificao dos estados de prontidoOs diferentes estados de prontido so classificados da seguinte forma:a) Estado relaxado (branco) caracterizado pela distrao em relao ao que est acontecendo ao redor, pelo pensamento disperso e pelo relaxamento do policial. Pode ser ocasionado por crena na ausncia de perigo ou mesmo por cansao. O policial encontra-se despreparado para um eventual confronto e, caso uma interveno seja necessria, aumentar consideravelmente os riscos e comprometer a sua segurana individual e a de sua guarnio.3 No Manual de Prtica Policial Geral / Volume 1 (2002) so chamados de estados de alerta. De um modo geral tratado internacionalmente como Early Warning System, ou seja, sistema de alarme prvio, utilizado em vrias atividades, principalmente em Defesa Civil.

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Exemplo: o policial de folga almoando com sua famlia pode se encontrar no estado relaxado. Por outro lado, num patrulhamento, escutando msica com fone de ouvido ou conversando ao celular assuntos diversos do policiamento ora executado, colocar a sua segurana e a de seu grupo em risco, caso tenha que fazer sua prpria segurana e de sua equipe numa interveno inesperada.

ATENO! Na atividade operacional ou em deslocamento fardado, o policial NO pode estar no estado relaxado (branco).

b) Estado de ateno (amarelo) Neste estado de prontido, o policial est atento, precavido, mas no est tenso. Apresenta calma, porm, mantm constante vigilncia das pessoas, dos lugares, das coisas e aes ao seu redor por meio de uma observao multidirecional e da ateno difusa (em 360). No estado de ateno (amarelo), o policial estar preparado para empregar aes de respostas adequadas s situaes de normalidade. No h identificao de um ato hostil e, embora no haja um confronto iminente, o policial est ciente de que uma agresso seria possvel. Percebe e avalia constantemente o ambiente, atento a qualquer sinal que possa indicar uma ameaa em potencial. Exemplos: o policial, realizando patrulhamento em sua rea de responsabilidade e interagindo com comerciantes, orientando-os quanto a dicas de segurana e, ao mesmo tempo, estando atento a toda a movimentao de pessoas dentro e fora do estabelecimento comercial; o deslocamento do policial fardado durante sua folga. c) Estado de alerta (laranja) Neste estado de prontido, o policial detecta um problema e est ciente de que um confronto provvel. Embora ainda no haja necessidade imediata de reao, o policial se mantm vigilante, identifica se h algum que possa representar uma ameaa que exija uso de fora e calcula o nvel de resposta adequado (ver Uso de fora seo 7).

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Manter-se no estado de alerta (laranja) diminui os riscos do policial ser surpreendido, propiciando a adoo de aes de resposta, conforme a situao exigir. Deve-se avaliar se necessrio pedir apoio de outros policiais e identificar provveis abrigos (protees) que possam ser utilizados. Exemplos: o policial acionado pelo rdio (CICOP) para atender a uma ocorrncia de uma briga entre vizinhos devido perturbao do sossego (barulho de msica e conversa alta), em um local considerado zona quente de criminalidade ou de um roubo mo armada ocorrido na sua regio de patrulhamento, desloca-se a fim tentar realizar a priso dos agentes. d) Estado de alarme (vermelho) Neste estado de prontido, o risco real e uma resposta da polcia necessria. importante focalizar a ameaa (ateno concentrada no problema) e ter em mente a ao adequada para control-la, com interveno verbal, uso de tcnicas de menor potencial ofensivo ou fora potencialmente letal, conforme as circunstncias exigirem. O preparo mental e o treinamento tcnico recebido possibilitaro ao policial condies de realizar sua defesa e a de terceiros e, mesmo em situaes de emergncia, decidir adequadamente. Exemplos: o policial intervindo no atendimento de uma ocorrncia, como num conflito entre vizinhos, e um deles ameaa o outro com uma arma de fogo; ou quando se depara com um veculo que acaba de ser tomado de assalto, iniciando-se um acompanhamento a veculo em fuga. e) Estado de pnico (preto) Quando o policial se depara com uma ameaa para a qual no est preparado ou quando se mantm num estado de tenso por um perodo de tempo muito prolongado, seu organismo entra num processo de sobrecarga fsica e emocional. Nesse caso, podem ocorrer falhas na percepo da situao, comprometendo sua capacidade de reagir adequadamente ameaa enfrentada. Isso caracteriza o estado de pnico (preto). O pnico o descontrole total que produz paralisia ou uma reao desproporcional, portanto ineficaz. chamado assim porque a mente entra

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em uma espcie de apago, o que impossibilita ao policial dar respostas apropriadas ao nvel da ameaa sob a qual estaria exposto. Durante o estado de pnico (preto), poder ocorrer o retorno parcial e momentneo ao estado de alarme (vermelho), o que at poder propiciar alguma capacidade de reao. Contudo, importante interpretar essas oscilaes dos estmulos fisiolgicos (percepo, ateno ou pensamento) como um grave sinal de perigo e esgotamento mental, e no como indicativos de que o policial suporta bem o estresse oferecido pela situao. Exemplo: o policial poder abandonar um abrigo e atracar-se fisicamente com um agressor, utilizar a arma de fogo sem controle, atirando de maneira instintiva e descontrolada, ou, at mesmo, entrar em uma situao de letargia fsica ou paralisia momentnea, deixando de acompanhar sua guarnio, quando em deslocamento no local da ocorrncia.

2.2 Estados de prontido e a atuao policialO estado de ateno (amarelo) o estado de prontido no qual o policial deve operar durante uma situao de normalidade (exemplo: patrulhamento ordinrio), dando prioridade para a identificao de possveis riscos. Durante uma interveno, policiais podem ser feridos em decorrncia de situaes de riscos que no anteciparam, no viram ou no estavam mentalmente preparados para enfrentar. No transcorrer da ao, quando uma mudana de estado de prontido exigida, aumentando o nvel de ateno e concentrao do policial (para o estado de alerta - laranja ou alarme - vermelho), a partida do estado de ateno (amarelo) muito mais fcil do que um salto do estado relaxado (branco). Como j foi dito anteriormente, nesse ltimo caso, partindo do estado relaxado (branco), o policial estaria to despreparado que poderia at entrar numa situao de pnico (preto). Ressalta-se que o estado de ateno (amarelo) pode ser mantido por um perodo mais prolongado sem sobrecarregar as funes fsicas e mentais. Contudo, o estado de alerta (laranja) e o estado de alarme (vermelho) podem ser mantidos pelo organismo e pela mente apenas por perodos de tempo relativamente curtos, pois exigem um dispndio maior de energia. Operar continuamente nesses avanados nveis de prontido pode desencadear reaes adversas, tanto no mbito fsico quanto psicolgico, levando a sndromes de esgotamento (estresse crnico)

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Caso a ocorrncia tenha exigido atuao no estado de alarme (vermelho), quando cessada a situao de ameaa, importante incentivar o policial a retornar ao estado de ateno (amarelo), se as condies de segurana do ambiente assim permitirem. Essa medida favorece o retorno do organismo s condies de funcionamento normal, sem muito desgaste. Esse processo pode ser conduzido, logo aps o desfecho da ocorrncia, pelo prprio comandante da guarnio, incentivando o grupo a conversar sobre a experincia vivida. A manuteno do esprito de equipe e da confiana entre lder e liderados so fatores importantes para minimizar o desgaste do profissional. Posteriormente, durante os horrios de folga, os policiais devem ser incentivados a buscar um repouso (estado de relaxamento branco), a participao em atividades junto famlia ou amigos, a prtica de esportes ou em atividades culturais, e at mesmo, o contato com profissionais da rea da psicologia4. Caso no haja preocupao com essas medidas, o policial estar mais propenso a desenvolver um quadro de estresse crnico. Comportamentos de irritabilidade, intolerncia e impacincia so sintomas comuns e, agindo sobre os efeitos deste quadro, o policial poder responder de forma impulsiva quando se deparar com situaes de ameaa e perigo, ou ainda, com reaes exageradas mesmo em ocorrncias com baixo nvel de risco e complexidade (nvel de fora incompatvel com a anlise de risco e reao do abordado). Tudo isso pode favorecer o surgimento de estados de pnico (preto) durante o servio operacional. Medidas que incentivam o retorno ao estado relaxado (branco) e de ateno (amarelo) so, portanto, estratgias que contribuem tanto para a preveno da sade mental do profissional de segurana pblica quanto para evitar a banalizao de atos de violncia nas intervenes policiais. Assim, o estado de prontido do policial considerado to fundamental quanto os equipamentos e armamentos colocados sua disposio no servio ou patrulhamento, pois, juntamente com o domnio tcnico e o condicionamento fsico, ele que determinar sua condio de resposta situao apresentada.4 Interpretao institucional da PMMG do princpio 21 dos Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF) e em conformidade com o Memorando 10.162/ 98 EMPM/ PMMG que recomenda o encaminhamento de policial militar envolvido em ocorrncias com mortos e feridos ao psiclogo.

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Quanto melhor preparado mentalmente, melhor condio o policial ter para:

detectar sinais de riscos e ameaas; colocar-se no estado de prontido apropriado a cada situao; ter autodomnio para passar para um nvel mais alto ou mais baixo de prontido, de acordo com a evoluo da interveno.

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AVALIAO DE RISCOS

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3 AVALIAO DE RISCOSToda interveno envolve algum tipo de risco potencial que dever ser considerado pelo policial. O risco a probabilidade de concretizao de uma ameaa contra pessoa e bens; incerto, mas previsvel. Cada situao exigir que ele se mantenha no estado de prontido compatvel com a gravidade dos riscos que identificar. Uma ponderao prvia ir orientar o policial sobre a necessidade e o momento de iniciar a interveno, escolhendo a melhor maneira para faz-lo. Toda ao policial dever ser precedida de uma avaliao dos riscos envolvidos, que consiste na anlise da probabilidade da concretizao do dano e de todos os aspectos de segurana que subsidiaro o processo de tomada de deciso em uma interveno, formando um componente importante do pensamento ttico (ver Pensamento Ttico - seo 4). O policial dever ter em mente que, em qualquer processo de tomada de deciso em ambiente operacional, a polcia tem o dever funcional de servir e proteger a sociedade, preservar a ordem pblica e a incolumidade das pessoas e do patrimnio, garantindo a vida, a dignidade e a integridade de todos5.

3.1 Metodologia de avaliao de riscosEsta metodologia compreende cinco etapas, sendo elas:a) Etapa 1 - identificao de direitos e garantias6 sob ameaa: consiste em identificar quais so os indivduos expostos ao risco, os bens mveis e imveis sujeitos a algum tipo de dano, as circunstncias e o histrico dos fatos, o comportamento das pessoas envolvidas, o tipo de delito e a possibilidade de evoluo do problema. b) Etapa 2 - avaliao das ameaas: consiste em avaliar as caractersticas dos fatores que ameaam direitos e garantias, identificar pontos de foco e pontos quentes (ver Pensamento Ttico seo 4) e selecionar o nvel de fora adequado para control-los (ver Uso de Fora seo 7). Para tanto, o policial deve:5 Inciso V do artigo 144 da Constituio Federal Brasileira e Identidade Organizacional da PMMG. 6 Os direitos e garantias so os previstos na legislao internacional e na Constituio Federal de 1988.

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obter informaes sobre o agressor em potencial e dos envolvidos

(idade, sexo, compleio fsica, estado emocional e psicolgico, motivao para o ato, armas empregadas, trajetria criminal, registro anterior de agresso ou da ao contra policiais, entre outros);

estar atento s condies do ambiente e a geografia urbana que

possam interferir diretamente na interveno policial, presena de rvores, postes, caambas, pontos de nibus em alvenaria, hidrantes, rochas (podem servir como abrigos), concentrao de residncias, presena de becos e vielas, s caractersticas do terreno (curvas e colinas, descampados e grandes retas) e ao fluxo de pessoas.

c) Etapa 3 classificao de risco: a classificao de risco permite ao policial agir dentro de padres de segurana, auxilia na escolha do comportamento ttico mais adequado, alm de lhe propiciar melhores condies para assegurar os direitos e proteger todos os envolvidos. A classificao de risco est estruturada em 3 nveis: risco nvel I: caracterizado pela reduzida possibilidade de ocorrerem

ameaas que comprometem a segurana. Este nvel de risco est presente em situaes rotineiras do patrulhamento e intervenes de carter educativo e assistencial. O estado de prontido coerente com o risco de nvel I o estado de ateno (amarelo);

risco nvel II: caracterizado pela real possibilidade de ocorrerem ame-

aas que comprometem a segurana. So situaes nas quais o risco conhecido, mas que a interveno policial ainda de carter preventivo. O estado de prontido coerente com o risco de nvel II o estado de alerta (laranja); de extenso da ameaa. So situaes nas quais a interveno policial de carter repressivo7. O estado de prontido coerente com o risco de nvel III o estado de alarme (vermelho).

risco nvel III: caracterizado pela concretizao do dano ou pelo grau

d) Etapa 4 anlise das vulnerabilidades: consiste em analisar os recursos que existem para responder ameaa, dentre eles: competncias profissionais dos policiais e da equipe como um todo

para agir no cenrio em funo das tcnicas e tticas adequadas aos tipos de ameaas;

7 A palavra repressivo admite conotao depreciativa relacionada, principalmente, a fatores histricos, polticos, culturais e ideolgicos referentes trade classe, raa e gnero. Contudo, no mbito da atividade policial, o termo empregado para caracterizar aes de cunho tcnico e profissional voltadas a coibir de atos ilcitos que ameaam direitos fundamentais.

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efetivo policial suficiente para atuar com supremacia de fora; meios de que o policial dispe para intervir de forma efetiva e segura

(armamento, colete balstico, equipamento para comunicao, veculos, entre outros); reao da populao local diante da interveno policial (positiva ou

negativa). e) Etapa 5 - avaliao de possveis resultados: a anlise da relao custo-benefcio da interveno policial diante de cada situao de risco. Cabe ao policial calcular quais sero os resultados de suas aes e seus reflexos na defesa da vida e das pessoas, no reforo de um cenrio de paz social e na imagem da PMMG.

Ao fazer a avaliao de risco, o policial tem subsdios para avaliar a oportunidade e a convenincia de uma interveno e decidir sobre a ao e o nvel de fora adequado para controlar a ameaa, seja por meio da verbalizao, fora fsica ou mesmo a fora potencialmente letal, conforme as circunstncias assim exigirem8 (ver Uso de fora seo 7).

3.2 AplicaoA avaliao e classificao de risco possibilitam o uso de tcnicas e tticas adequadas s diversas formas de interveno policial (ver Interveno policial seo 5). Para cada nvel de risco determinado, haver uma conduta operacional estabelecida como referncia para a ao policial, cabendo-lhe selecionar os procedimentos mais adequados a cada situao. Cada atuao da polcia cercada de particularidades. No existem ocorrncias iguais, contudo possvel desenhar um conjunto de situaes bsicas que podem servir de modelos aplicveis ao treinamento.8 Interpretao institucional da PMMG do princpio 4 dos Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF) e em conformidade com o artigo 3 do Cdigo de Conduta para os Encarregados pela Aplicao da Lei (CCEAL).

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A sistematizao das respostas esperadas a partir da identificao e classificao de riscos em uma interveno policial viabiliza a seleo e a aplicao de procedimentos adequados soluo de problemas, como ser visto na seo seguinte.

LEMBRE-SE: no possvel afastar completamente o risco em uma interveno policial, mas o preparo mental, o treinamento e a obedincia s normas tcnicas garantem uma probabilidade maior de sucesso.

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PENSAMENTO TTICO

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4 PENSAMENTO TTICOPensamento ttico o processo de anlise do cenrio da interveno policial (leitura do ambiente). Consiste em mapear as diferentes reas do teatro de operaes em funo dos riscos avaliados, identificar permetros de segurana para atuao, priorizar os pontos que exijam maior ateno e tentar interferir no processo mental do agressor. Enquanto o preparo mental ocorre antes da interveno e consiste numa anlise de possibilidades, o pensamento ttico consiste num diagnstico que utiliza os dados e informaes concretas obtidas por meio da avaliao de riscos de um teatro de operaes especfico. Num processo dinmico, atualiza-se em funo da evoluo da ocorrncia. AVALIAO DE RISCOS + PENSAMENTO TTICO = DIAGNSTICO DA INTERVENO

4.1 Quarteto do pensamento tticoO pensamento ttico norteado pelo quarteto: rea de segurana, rea de risco, ponto de foco e ponto quente.

FIGURA 1 Quarteto do pensamento ttico

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Ao aplicar esses conceitos, o policial ter melhores condies para avaliar e reagir adequadamente aos riscos que possa vir a enfrentar, mesmo sob estresse. O emprego do pensamento ttico permite ao policial: dividir em diferentes nveis de perigo o local onde se encontra ou para

onde se dirige (teatro de operaes);

formular um plano de ao; estabelecer prioridades para dirigir a ateno e determinar pontos que

devam ser controlados;

manter a segurana individual e da equipe no desenrolar da ocorrncia; controlar ameaas que possam surgir.

Os conceitos que se seguem devem ser entendidos de maneira ampla e sistmica, sendo adaptveis s diversas situaes operacionais.a) rea de segurana

a rea na qual as foras policiais tm o domnio da situao, no havendo, presumidamente, riscos integridade fsica e segurana dos envolvidos. o espao onde o policial deve, primeiramente, se colocar durante a interveno, evitando se expor a perigos desnecessrios. Exemplo: arredores de uma residncia onde, no seu interior, se encontra o suspeito da prtica de um delito.b) rea de risco

Consiste num espao fsico delimitado, no teatro de operaes, onde podem existir ameaas, potenciais ou reais, que ponham em perigo a integridade fsica e a segurana dos envolvidos. a rea na qual o policial no detm o domnio da situao, por ainda no ter realizado buscas, sendo portanto, uma fonte de perigo para ele ou terceiros, e por isso requer que os riscos envolvidos sejam rigorosamente avaliados (ver Avaliao de Riscos seo 3).

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Exemplo: a residncia onde se encontram suspeitos da prtica de um delito. ATENO! O policial somente dever transpor a rea de segurana e adentrar na rea de risco, depois de certificar-se de que tem o controle das fontes de perigo que l se encontram.

c) Ponto de foco

Os pontos de foco so partes dentro da rea de risco que requerem monitoramento especfico e demandam imediata ateno do policial, uma vez que deles podem surgir ameaas que representem risco segurana dos envolvidos. Portas, janelas, escadas, corredores, veculos, obstculos fsicos, escavaes, uma pessoa, ou qualquer outro elemento no local de atuao que possa oferecer ameaa, mesmo que no imediatamente visvel ou conhecida, podem ser considerados como pontos de foco. Seguindo o exemplo do item b) rea de Risco, os pontos de focos podero ser as janelas da residncia onde se encontram suspeitos da prtica de um delito.d) Ponto quente

Os pontos quentes so partes do ponto de foco que possuem um maior potencial de se tornarem fontes reais de agresso e que, por isso, devem ser cautelosamente monitorados para garantir a segurana de todos os envolvidos. O policial direcionar sua ateno, energia e habilidade para essas fontes a fim de responder adequadamente, considerando os princpios e as regras para o uso de fora (ver Uso de Fora seo 7) . Seguindo o exemplo do item c) Ponto de Foco, o ponto quente ser o suspeito da prtica de um delito, que est posicionado numa das janelas da residncia. necessrio compreender que a definio do que ser ponto de foco e ponto quente ocorre de maneira contnua e dinmica, decorrente da avaliao de

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riscos. Isso permite ao policial reclassific-los medida que os locais de onde podem partir as ameaas vo sendo identificados e/ou controlados, mais especificamente. No exemplo anterior, no primeiro momento, o suspeito na janela foi definido como um ponto quente. Contudo, quando o policial identifica que ele est com uma arma de fogo, a partir de ento, o abordado ser considerado como um ponto de foco e suas mos passam a ser o ponto quente. Outro exemplo: um veculo suspeito ser considerado ponto de foco e um indivduo que est em seu interior o ponto quente. Esse mesmo indivduo poder tornar-se o ponto de foco e suas mos sero definidas como o ponto quente. Igual ateno dever ser dada s janelas, portas e porta-malas, pois so locais provveis para o surgimento de ameaas (pontos quentes).

4.1.1 Leitura do ambienteExistem trs questes chaves para uma correta leitura do ambiente, que levam identificao dos riscos presentes numa interveno policial: Onde esto os riscos potenciais nesta situao?

Ao se aproximar de uma residncia para atendimento de uma ocorrncia, uma mulher sai correndo de dentro da casa na direo do policial. Considere: a mulher, em si mesma, uma ameaa? Onde esto as portas e janelas das quais o policial pode ser visto e atingido por algum que se encontre dentro da residncia? Que outros locais podem abrigar um agressor que no foi visto? Esses riscos esto controlados?

Na cena descrita, existem locais de ameaa que o policial ainda no controla. Qualquer foco de ameaa que no esteja sob o controle visual de pelo menos um policial um risco que no se controla. No exemplo, o policial no deve se colocar parado no passeio em frente residncia, exposto a tais pontos de foco, pois aumenta o perigo potencial de sofrer um ataque.

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Se esses riscos no esto controlados, como faz-lo?

Nesse exemplo, o policial pode considerar os possveis abrigos prximos: uma grande rvore, uma coluna de varanda, um carro estacionado, uma caamba ou outro meio de proteo. Abrigado numa rea de segurana, o policial utiliza a verbalizao para identificar e direcionar a mulher para uma posio segura e, simultaneamente, checa, periodicamente, o ambiente em sua volta, avalia a rea de risco, identifica os pontos de foco e visualiza os pontos quentes.

LEMBRE-SE: ao se colocar num estado de prontido adequado, passando do estado de ateno (amarelo) para o estado de alerta (laranja) ou para o estado de alarme (vermelho), quando necessrio, o policial estar melhor preparado para identificar os pontos de foco e seus pontos quentes.

4.1.2 Alinhamento do estado de prontido possvel alinhar os conceitos do pensamento ttico com o estado de prontido. Quando o policial se aproxima da rea de risco e comea a analis-la, o seu estado de prontido deve ser o de alerta (laranja), precavendo-se contra situaes adversas e estando consciente de que o perigo pode estar presente. Ao chegar ao local de interveno, necessrio avaliar a rea de risco, procedendo identificao dos pontos de foco e seus pontos quentes. O policial deve questionar se possvel controlar todos os pontos (todas as pessoas e suas mos, casas e suas janelas e portas, dentre outros). Ao identificar um ponto de foco, o policial dever esforar-se ainda mais para manter o controle visual da situao. O estado de prontido poder subir para o estado de alarme (vermelho), conforme o caso. O policial dever estar atento e preparado para fazer uso de fora diante de uma possvel agresso. Quando localiza um ponto quente, o estado de prontido dever atingir, definitivamente, o estado de alarme (vermelho), contribuindo para que o policial esteja em condies de controlar a ameaa.

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Em algumas situaes, a avaliao de riscos leva o policial concluso de que no possui condies suficientes (efetivo de policiais, armamento, treinamento, entre outros.) para agir imediatamente (etapa 4 da avaliao de riscos). Nesse caso, recomenda-se ao policial no adentrar a rea de risco. O objetivo do policial em uma ocorrncia , de modo geral, impedir o agravamento de qualquer situao e solucionar os problemas. Quando o policial no se expe a perigos desnecessrios e trabalha sem invadir a rea de risco, identificando e controlando os pontos de foco, ele possui mais chances de evitar confronto direto e ter mais tempo e maior segurana para decidir quando e como agir. Em situaes em que h mais de um policial, possvel dividir os pontos de foco de uma rea de risco. O nmero de policiais empregados em uma interveno deve ser, sempre que possvel, capaz de proporcionar o controle de todos os pontos de foco e seus pontos quentes. Algumas vezes, policiais se concentram em um mesmo ponto de foco deixando outros sem controle. Todos os pontos de foco devem estar sob vigilncia e, para isso, dever ocorrer uma ao coordenada por parte dos policiais. Jamais um ponto de foco pode ser desconsiderado. O policial que verbaliza manter contato visual com o abordado, sempre olhando para ele. Isso interferir no processo mental do agressor, reduzindo sua capacidade de reao. Se uma ameaa real surge de um ponto de foco, a habilidade e o preparo mental para entender e controlar os seus pontos quentes sero os suportes para a resposta correta do policial. Nesse sentido, duas consideraes so importantes:

No dispersar e no dividir a ATENO!

Pode ser possvel monitorar mais de um ponto de foco, ao mesmo tempo, pelo policial, dependendo da situao, da distncia em que se encontram e do tempo necessrio para a reao. Mas ele no conseguir controlar, plenamente, mais de um ponto quente por vez. O estado de alarme

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(vermelho) demanda muita ateno quando um ponto quente identificado, sendo necessrio avaliar qual ameaa a mais sria e imediata e nela concentrar esforos. Estando ela dominada, a probabilidade de agresso diminui. No confundir ateno concentrada com viso em tnel:

Em uma situao de risco iminente, o policial deve concentrar toda a sua fora e energia para controlar a ameaa o mais rpido possvel. Por outro lado, a viso em tnel ocorre quando o policial fixa seu olhar e sua ateno em apenas um ponto, perdendo a capacidade de percepo do que se encontra sua volta. Como conseqncia, poder eleger um objetivo incorreto ou um conjunto de aes inadequadas para atingi-lo.

O policial, na sua prtica operacional diria, deve lidar com a probabilidade de riscos, preparando-se para enfrentar ameaas onde quer que elas possam ocorrer. No possvel eliminar todos os riscos da sua atividade, mas, usando corretamente os princpios do pensamento ttico, haver uma reduo substancial do perigo.

4.2 Processo mental da agressoConsiste nas etapas percorridas por uma pessoa que intenciona agredir o policial, da seguinte maneira: identificar: captar o estmulo por meio da viso, dos sons, da intuio ou

de outra forma de perceber a presena do policial;

decidir: definir o que fazer, isto , preparar-se para o ataque ou ocultar-se; agir: colocar em prtica aquilo que decidiu.

Conhecer esse processo identificar os estgios de pensamento que uma pessoa seguir para agredir o policial. Utilizar essa informao no contexto das aes e operaes possibilita minimizar ou evitar uma ameaa direta. Usualmente, as etapas do processo mental da agresso percorridas pelo suspeito ocorrem nesta sequncia (IDENTIFICAR, DECIDIR E AGIR), porm, ocasionalmente, podem no ocorrer nesta ordem. Exemplo: o suspeito pode estar

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com a arma pronta para disparar, apontada para a esquina de um beco em um aglomerado urbano, antes mesmo de identificar um alvo. Qualquer que seja a ordem, um provvel agressor tem apenas esse processo de pensamento para percorrer. Isso coloca o policial em desvantagem, pois, enquanto o agressor passa por TRS passos para executar o ataque, o policial ter, necessariamente, QUATRO fases, a fim de responder a ameaa.

IDENTIFICAR CERTIFICAR DECIDIR AGIRAps identificar a provvel agresso, o policial ter, obrigatoriamente, que se certificar de que o agressor est, de fato, iniciando um ataque, para depois decidir e agir em consonncia com os princpios do uso de fora (legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderao e convenincia), e com os parmetros ticos (ver Uso de fora seo 7.1). O conhecimento do processo mental do agressor propicia a construo de ideias em um pequeno espao de tempo para antecipar o perigo, identificar e entender o ato de agresso que est ocorrendo. Sabendo que o tempo para reagir curto, a melhor maneira de trabalhar com essa desvantagem alongar e manipular o processo mental do agressor. Cinco fatores so teis na tentativa de compensar as possveis desvantagens entre os processos mentais do agressor e do policial:a) ocultao: se o agressor no sabe exatamente onde o policial est, ele ter dificuldades em IDENTIFIC-LO para um ataque. Assim, poder atirar ou atac-lo a esmo, em um esforo cego para atingi-lo, mas, muito provavelmente, sua tentativa ser intil, caso o policial se encontre devidamente abrigado e coberto (oculto) na rea de segurana. b) surpresa: evitar que o agressor possa antecipar suas aes. Surpresa, por definio, anda lado a lado com a ocultao. , em outras palavras, agir sem ser percebido diminuindo as possibilidades de ser agredido. Se o policial pode ocultar-se ou mover-se de modo imperceptvel, diminuir a possibilidade de ser identificado e sofrer a ao decorrente de um plano de ataque.

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c) distncia: de uma maneira geral, o policial dever manter-se a uma distncia que dificulte qualquer tipo de ao por parte do abordado. Certamente, se um ataque fsico a preocupao, quanto maior a distncia a ser percorrida pelo agressor para atacar, mais tempo ele demorar para atingir o policial que, por sua vez, ter mais tempo para identificar, certificar, decidir e repelir a ameaa. Quanto mais prximo de um agressor, maiores so as chances do policial ser atingido. O policial estar mais seguro, quando permanecer a uma distncia adequada e sob a proteo de um abrigo. d) autocontrole: na nsia de ver o xito de suas atuaes, os policiais, frequentemente, abreviam boas tticas ou se lanam dentro da rea de risco na presena de um suspeito potencialmente hostil. Por outro lado, se o policial faz com que ele venha at a rea de segurana, que est sob seu controle, estar provavelmente interferindo em todo o processo de pensamento do agressor, desarticulando, desse modo, suas aes. e) proteo: este princpio , sem dvida, o mais importante entre todos. Se o policial pode posicionar-se atrs de algo que verdadeiramente o proteja dos tiros e, ao movimentar-se utiliza abrigos, um agressor ter muita dificuldade em atac-lo com sucesso. O abrigo tambm lhe dar mais tempo para identificar qualquer outra ameaa que se apresente.

Em resumo, o policial deve procurar aumentar o tempo de deciso do agressor, enquanto simplifica e encurta o seu prprio processo mental. Entender este processo ajudar a avaliar as reas de risco, estabelecendo permetros de segurana e determinando corretamente as prioridades, segundo os respectivos pontos de foco que se apresentarem.

ATENO! O policial deve adentrar a rea de risco somente depois de se certificar de que detm o controle de todas as ameaas que ela possa oferecer, transformando-a em uma rea de segurana.

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INTERVENO POLICIAL

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5 INTERVENO POLICIALEntende-se por interveno policial, a ao ou a operao que empregam tcnicas e tticas policiais, em eventos de defesa social, tendo como objetivo prioritrio a promoo e a defesa dos direitos fundamentais da pessoa. Toda interveno policial deve ser transformadora da realidade, objetivando, de modo geral, a preveno e a resoluo de conflitos, em conformidade com os princpios do policiamento comunitrio e os ditames dos direitos humanos. Uma interveno da polcia pode ter como objetivos: o esclarecimento de dvidas ou o fornecimento de informaes junto a um transeunte; a realizao de uma busca pessoal, em um veculo ou em uma edificao; uma ao de auxlio a uma pessoa acidentada ou perdida; o cumprimento de mandado de priso; a imobilizao, a algemao e a conduo de pessoas; disparar arma de fogo de acordo com os princpios do uso de fora e outras formas de contato do policial com a sociedade. Ao iniciar uma interveno, o policial deve observar os aspectos ticos, normativos e tcnicos que regulam e orientam a sua execuo. O conhecimento do conjunto normativo, somado ao treinamento diuturno, garantir o sucesso dessas aes.

5.1 Nveis de intervenoOs nveis de interveno so classificaes em funo da respectiva avaliao de risco (ver Avaliao de Riscos seo 3), que podem ser adotadas como referncia para a atuao policial. Esto estruturados em trs nveis:a) Interveno - nvel 1: adotada nas situaes de assistncia e orientao. A finalidade das aes policiais neste nvel promover um ambiente seguro por meio de contatos com a comunidade, para orientar e/ou educar e, dificilmente, implicam realizar buscas em pessoas ou bens (risco nvel I). No entanto, sempre necessrio lembrar que as situaes rotineiras no podem provocar diminuio no nvel de ateno do policial. O estado de prontido, neste tipo de interveno, dever ser o estado de ateno (amarelo). O policial deve estar preparado para o caso da situao evoluir e ser necessrio o uso de fora (ver Uso de fora seo 7).

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b) Interveno - nvel 2: adotada nas situaes em que haja a necessidade de verificao preventiva. Neste caso, a avaliao de risco indica que existe indcio de ameaa segurana (do policial ou de terceiros). Assim, o policial dever manter-se em condies de respond-la. (risco nvel II e estado de alerta - laranja). Neste tipo de interveno, alm das aes descritas no nvel 1, podem ser realizadas buscas em pessoas, veculos ou edificaes, pois as equipes envolvidas iniciam suas aes com algum risco j conhecido (indcio) e o policial dever estar pronto para enfrent-lo. Exemplo: abordagem a pessoa ou veculo com caractersticas semelhantes s de envolvidos em delitos; execuo de patrulhamento e verificaes em locais com histrico de violncia. c) Interveno - nvel 3: adotada nas situaes de fundada suspeita ou certeza do cometimento de delito, caracterizando aes repressivas. Neste caso, a avaliao de riscos indica a iminncia de algum tipo de agresso (risco nvel III e estado de alarme - vermelho). Os policiais devero estar prontos para o emprego de fora, quando assim a situao exigir, sempre com segurana, e observando os princpios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderao e convenincia (ver Uso de fora - seo 7). Exemplo: um infrator avistado no momento de uma ameaa direta vtima ou que, logo aps, empreende fuga e acompanhado pela polcia; um agente de crimes procurado pela Justia e que identificado pelo policial.

5.2 Etapas da intervenoUma interveno policial deve ser dividida em etapas para garantir o seu sucesso:a) Etapa 1 - diagnstico: elaborado a partir das informaes sobre o motivo, o abordado e o ambiente, obtidas por meio da avaliao de risco, da anlise de cenrio feitas a partir do pensamento ttico. b) Etapa 2 - plano de ao: consiste na deciso, acerca das atribuies de cada policial, dos mtodos e procedimentos para alcanar objetivos da interveno. Os policiais, trabalhando em equipe, devem ter atitudes coerentes entre si, fruto de uma mesma avaliao de risco e um consequente escalonamento da fora. imprescindvel considerar os dados que subsidiaram o diagnstico, os fundamentos da abordagem, os princpios do uso de fora e os recursos disponveis (pessoas e equipamentos). O plano de

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ao deve ser elaborado de forma simples e verbal, ou exigir maior estruturao, conforme a avaliao da complexidade (ver Avaliao de riscos seo 3). O policial precisa responder s seguintes perguntas: Por que estamos intervindo? Quem, ou o que iremos abordar? Onde se dar a interveno? O que fazer? Como atuar? Qual a funo e posio de cada policial? Quando intervir?

c) Etapa 3 - execuo: a ao propriamente dita, resultante das fases anteriores. Consiste na aplicao prtica do plano de ao, bem como da adoo de medidas decorrentes da prpria interveno (prestao de auxlio ou orientao, busca pessoal, priso e/ou conduo do agente e o registro do fato em BO/REDS). d) Etapa 4 - avaliao: as condutas individuais e do grupo, os resultados alcanados e as falhas notadas em cada interveno devem ser, posteriormente, discutidas e analisadas, e possveis correes devem ser apresentadas, visando aperfeioar as competncias profissionais.

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FIGURA 2 Etapas da interveno policial

5.3 Abordagem policialNa relao cotidiana entre a polcia e a comunidade, a abordagem policial a forma de interveno policial mais comum, sendo executada em todos os nveis, como veremos a seguir. Trata-se de um conjunto de aes policiais ordenadas e qualificadas para que o policial possa se aproximar de pessoas, veculos ou edificaes com o intuito de orientar, identificar, advertir, realizar buscas e efetuar detenes. Para tanto, utiliza-se de tcnicas, tticas e meios apropriados que iro variar de acordo com as circunstncias e com a avaliao de risco. Qualquer contato do policial com as pessoas, decorrente da atividade profissional, considerada abordagem. Exemplos: orientaes diversas, coleta de informaes, contatos comunitrios, medidas assistenciais, buscas pessoais, imobilizaes fsicas, priso e conduo.

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O contato fsico, necessrio e inevitvel em alguns tipos de abordagem (aquelas que geram busca pessoal, principalmente), se torna um momento crtico, tanto para os policiais quanto para os envolvidos. Por um lado, o abordado pode se sentir constrangido pela interveno qual foi submetido e, por outro, pode oferecer riscos ao policial. Por isso, ao realizar este procedimento, deve-se atuar, respeitando a dignidade e os direitos fundamentais, sem descuidar-se das medidas de segurana. Na abordagem policial, a busca pessoal, prevista e fundamentada no Cdigo de Processo Penal, realizada de ofcio a partir de circunstncias de fundada suspeita e que se impe, independentemente, de concordncia da pessoa (ver Caderno Doutrinrio 2). A posio em que o policial sustenta sua arma durante a abordagem depender da avaliao de riscos da interveno. O policial deve manter-se sempre atento ao comportamento do abordado e no descuidar da sua segurana. Quando, inicialmente, o abordado no apresentar indcios de suspeio, como nos casos de orientao ou assistncia, a abordagem dever ser iniciada com a arma no coldre.

ATENO! Em relao s posies das armas 1, 2, 3 e 4, descritas na seo 7.2.3 sobre o uso de arma de fogo, LEMBRE-SE SEMPRE: ARMA LOCALIZADA: possibilidade de ruptura da normalidade, sensao que a situao pode agravar-se RISCO NIVEL II; ARMA EM GUARDA BAIXA OU ALTA: possibilidade de risco segurana do policial e terceiros (anlise subjetiva) RISCO NIVEL II; ARMA EM PRONTA RESPOSTA: est ocorrendo ameaa real segurana do policial e terceiros (percepo objetiva) RISCO NVEL III.

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5.3.1 Fundamentos da abordagem policial pessoa em atitude suspeitaAo realizar este tipo de abordagem, o policial dever observar os fundamentos que seguem, para potencializar suas aes e assegurar que o objetivo proposto seja alcanado:a) segurana: caracteriza-se por um conjunto de medidas adotadas pelo policial para controlar, reduzir ou, se possvel, eliminar os riscos da interveno policial (ver Avaliao de Riscos - seo 3). Antes de agir, o policial dever identificar a rea de segurana e a rea de risco, monitorar os pontos de foco, controlar os pontos quentes e certificar-se de que o permetro est seguro (ver Pensamento ttico - seo 4). Sempre que possvel, o policial dever agir com supremacia de fora; d) surpresa: a percepo do abordado quanto ao policial. O planejamento da ao permitir ao policial surpreender o abordado, reduzindo o tempo de sua reao. O policial deve considerar que, quanto menos esperada for sua ao, maior ser a chance de interferir no processo mental da agresso, aumentando o tempo de resposta do abordado; c) rapidez: a velocidade com que a ao policial processada, o que contribui substancialmente para a efetivao da surpresa. No se pode confundir rapidez com afobamento ou falta de planejamento. Em uma abordagem que resulta em busca pessoal, o policial deve usar todo o tempo necessrio para uma verificao exaustiva por objetos ilcitos ou indcios de crime; d) ao vigorosa: a atitude firme e resoluta do policial na ao, por meio de uma postura imperativa, com ordens claras e precisas. No se confunde com truculncia. O policial deve ser firme e direto, porm corts, sereno, demonstrando segurana, educao e bom senso adequado s circunstncias da interveno; e) unidade de comando: a coordenao centralizada da interveno policial que garante o melhor planejamento, fiscalizao e controle. Da mesma forma, cada policial envolvido na abordagem deve conhecer sua tarefa e qual a sua funo especfica naquela interveno, interagindo de forma harmnica, sabendo a quem recorrer, respeitando a cadeia de comando.

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LEMBRE-SE: o treinamento constante propicia condies ao policial para agir com rapidez, sem descuidar dos princpios da segurana.

A aplicao dos conceitos apresentados nesta seo e a observao das etapas da interveno e dos fundamentos da abordagem so essenciais para o resultado satisfatrio das intervenes policiais. A educao e a polidez devem sempre ser observadas nas abordagens, uma vez que alguns desfechos so agravados pela postura inadequada adotada pelo policial.

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VERBALIZAO POLICIAL

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6 VERBALIZAO POLICIALA comunicao um processo de interao estabelecida no mnimo entre duas pessoas, construindo entre ambas um intercmbio de sentimentos e ideias. Este processo, por si s, j remete a uma srie de interpretaes diferenciadas, pois, com caractersticas nicas que temos, podemos entender distintamente as mensagens. A maior dificuldade de interpretao est em fatores como a escolha de palavras utilizadas na fala e na escrita, gestos e postura corporal, bem como o meio pelo qual a mensagem transmitida e estabelecida. Este canal tambm pode estar sujeito aos rudos (celulares que tocam em hora errada, barulho do trnsito, tom de voz alto ou baixo demais) e tantos outros problemas que atrapalham a compreenso da mensagem enviada. A falta de clareza e a adequao para o tipo de pblico, a impropriedade da tcnica, a urgncia com que a mensagem transmitida, e outros fatores, podem dificultar ou mesmo impossibilitar a compreenso. ATENO! Para que a comunicao atinja o seu objetivo, o melhor caminho a simplicidade.

Simplicidade quer dizer que o emissor transmite uma mensagem para o receptor de forma clara, fcil e possvel de ser entendida. Emissor aquele que fala, escreve, desenha, faz mmica; o ponto de onde

parte a mensagem.

Receptor aquele que quer ou precisa ouvir e apreender; o destinatrio

da mensagem.

Mensagem o contedo do que se quer dizer e comunicar.

O processo de comunicao, como um dos fatores mais importantes das intervenes policiais, se bem realizado, um grande facilitador para o sucesso da abordagem. Por isso, o policial deve dar ateno a este processo, para maximizar resultados positivos na sua atividade profissional.

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Uma das formas da comunicao a verbalizao. Verbalizar9 significa expressar ou exprimir algo na forma de palavras. Na tcnica policial, o conceito de verbalizao diz respeito ao uso da fala e de comandos verbais que, apesar de constiturem um dos nveis de uso de fora, conforme seo 7, estaro presentes em todo tipo de interveno policial. LEMBRE-SE: a comunicao eficaz til, persuasiva e convincente. Portanto, deve ser utilizada na prtica policial em todos os nveis de uso diferenciado de fora.

Alm da palavra falada, as pessoas transmitem uma gama significativa de informaes por meio da postura, gestos, atitudes, aparncia e at mesmo vestimentas. Consequentemente, parte dos resultados de uma comunicao vem do comportamento no verbal. Corre-se o risco de uma idia ser expressa em discordncia com o que o locutor desejaria, por interferncia de outros indicativos fsicos e psicolgicos (elementos no verbais). Portanto, no processo de comunicao, no pode haver preocupao apenas com as palavras de forma isolada, mas tambm com toda a mensagem veiculada. Nas teorias de comunicao, diz-se que, uma informao somente eficaz quando apresenta, dentre outras, duas caractersticas fundamentais:a) clareza: utilizao de linguagem de fcil compreenso; b) preciso: grau de detalhamento suficiente para produzir o resultado desejado (ser prtico, objetivo, direto).

As tcnicas de comunicao estabelecem que antes mesmo de haver a troca de palavras propriamente dita entre as pessoas, existem elementos verbais e no verbais que interagem entre o emissor e receptor. Os elementos verbais esto ligados aos contedos falados, envolvem escolha das palavras que vo compor a mensagem. Os no verbais dizem respeito entonao da voz, gestos e posturas.9 FERREIRA, Aurlio Buarque de Holanda. Minidicionrio da lngua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

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6.1 Comunicao na abordagem policialO policial no deve alimentar a expectativa de que o abordado sempre se disponha a colaborar de forma espontnea. Assim, deve buscar o controle da situao por meio de uma verbalizao adequada, emitindo ordens legais, claras, objetivas e pertinentes. Para potencializar o uso da comunicao nas intervenes policiais, sero apresentadas, a seguir, algumas orientaes baseadas em reas especficas do conhecimento (fonoaudiologia, psicologia e neurolingustica). O primeiro contato com o abordado de fundamental importncia, haja vista que ir construir mentalmente uma imagem do policial (e da Polcia), por meio da anlise da postura, apresentao pessoal e, principalmente, da fala e gestos. Esses fatores contribuem para a credibilidade, legitimidade e confiana na autoridade.

A APRESENTAO PESSOAL O CARTO DE VISITA DO POLICIAL. Uma boa imagem representada por detalhes importantes como: fardamento limpo e adequado e cuidados com a higiene pessoal, dentro dos padres estabelecidos pelas normas da PMMG. Outros comportamentos como o uso irregular de cobertura e de acessrios exticos ou extravagantes transmitem a ideia de descaso e relaxamento.

Algumas atitudes contribuem para a soluo pacfica dos conflitos e o alcance dos objetivos institucionais e, consequentemente, para a boa imagem e a legitimidade de suas intervenes. Dentre elas, o policial deve ser:a) firme: agir de forma segura, estvel, constante, comunicando por meio de comandos firmes, de maneira polida e sem truculncia. preciso que fique claro ao receptor que a melhor opo para ele obedecer;

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b) justo: atuar de acordo com o ordenamento jurdico e em conformidade com os princpios ticos, a filosofia dos direitos humanos e da polcia comunitria, respeitando a dignidade da pessoa; c) corts: o policial deve ser educado, atencioso e solcito. A seriedade e a firmeza necessrias no podem ser confundidas com indiferena ou grosseria.

Durante a abordagem, o policial deve explicar os motivos da interveno e o comportamento que se espera do abordado. O dilogo entre o policial e o abordado pode ser prejudicado e sofrer interferncias diante de uma postura que denote agressividade, arrogncia ou descaso. Exemplo: o policial que aponta o dedo indicador para o abordado, ou se lhe apresenta com os braos cruzados ou com o rosto sisudo. Ao dirigir-se s pessoas, o policial no deve fazer uso de grias ou palavras vulgares porque transmitem uma m impresso e afetam a credibilidade junto aos envolvidos. Mantendo uma linguagem firme e cordial, o policial demonstra profissionalismo e controle da situao. Outro aspecto importante da comunicao o volume da voz. O policial deve atentar para este aspecto, a fim de facilitar sua comunicao, adequando-o s diversas situaes, podendo modific-lo para alcanar melhor acatamento dos seus comandos. O volume da voz deve se adaptar ao nvel de cooperao do abordado, devendo aumentar ou diminuir, conforme o nvel de fora empregado. O som da voz deve chegar claramente ao ouvinte, para que ele possa entender e interagir com o policial. Dessa forma, a entonao da voz do policial poder se tornar mais enrgica e o volume mais alto, demonstrando a seriedade da situao e impondo a autoridade, caso o abordado demonstre resistncia ao acatamento das ordens. Cabe ao policial fazer uma leitura do ambiente, para adequar o uso da voz a cada situao, lembrando que o volume muito baixo inviabiliza a comunicao, por dificultar o entendimento, e o volume muito alto, quando desnecessrio, pode se tornar agressivo, incmodo e deseducado. Devem ser levadas em considerao as possveis interferncias sonoras (rudos) presentes em um determinado ambiente.

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Outros fatores como o timbre (qualidade sonora que identifica a voz de uma pessoa), a dico (pronncia correta dos sons das palavras) e a velocidade com que se fala so determinantes para a qualidade da comunicao estabelecida. Nos treinamentos, o policial deve buscar o timbre em que sua voz fique mais clara, pronunciar as palavras com calma e correo e em velocidade que possibilite ao interlocutor compreender exatamente o que est sendo dito. A fala confusa ou vagarosa causa a impresso de indeciso ou desnimo, gera descrdito e insegurana. Em contrapartida, falar muito rpido denota ansiedade, dvida e desateno. O silncio tambm pode transmitir mensagens no verbais. O policial, ao se comunicar, deve utilizar-se de pausas em suas falas, verificando o nvel de cooperao do abordado, proporcionando tempo para que este entenda e cumpra o que lhe foi determinado. Pausas eficazes na interlocuo e um processo de perguntas e respostas logicamente ordenadas podem ser determinantes para o sucesso da verbalizao. O dilogo deve ter uma sequncia lgica. A fala do policial deve ser concisa, expressa por meio de comandos simples, de fcil compreenso e execuo e que podero ser repetidos se necessrio. Conforme o quadro 1.

Quadro 1 Elementos da comunicao em relao postura do policialElementos de Comunicao ENrGICo Expresso VerbalVoz Fala Interpelao Olhos/Olhar Msculos faciais Alta Rpida e Imperativa Sentena exclamatria Determinado e Repreensivo Tensos (contrados) Moderada Fluente e persuasiva Frases declarativas Firme e Confiante Normais Branda Pausada e solicita colaborao Pedido ou apelo Ameno e Pacfico Relaxados

Postura do Policial FIrME aMENo

Expresso Facial

Expresso Corporal Ver Posturas Tticas (Caderno doutrinrio 2)

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Outro aspecto a ser considerado que toda pessoa tem um espao (rea fsica em seu entorno) que considera psicologicamente reservado para aqueles que so ntimos a ela. Ao aproximar-se demasiadamente de uma pessoa, o policial invade este espao pessoal e pode provocar, no abordado, o desejo inconsciente de afastar, fugir, ou defender-se. Qualquer palavra dita nessa situao poder soar agressivamente. Ao abordar, no aponte o dedo indicador para a face do abordado, nem toque no seu corpo, salvo nos casos em que se faz necessrio o controle de contato, o controle fsico e a busca pessoal (ver Uso de Fora - seo 7). Respeitando seu espao pessoal, ser mais fcil obter sua cooperao. Assim sendo, o policial dever estabelecer o contato inicial com o abordado, a uma distncia segura (ver Caderno Doutrinrio 2), para criar um vnculo verbal e de confiana, explicando o que ser realizado, antes de se aproximar. Exemplo: Fique parado! Vamos realizar uma busca pessoal. Voc me entendeu?. O policial precisa preocupar-se com a autoridade que representa, dar sua fala um contedo imperativo, proporcional ao nvel de cooperao do abordado, e primar pelo bom tratamento dispensado s pessoas. O policial modificar e adequar os elementos da comunicao (volume, timbre, entonao e postura) de acordo com a necessidade, caso o abordado demonstre algum tipo de resistncia. importante ressaltar que os elementos no verbais utilizados na comunicao durante a abordagem influenciam na percepo que policial e abordado constroem um do outro. Por isso, os policiais devem estar atentos aos efeitos que suas mensagens no verbais provocam e, ao mesmo tempo, observar e retirar concluses dos elementos emitidos pelo abordado. A comunicao bem trabalhada pode evitar o emprego de nveis de fora superiores, facilitando o desenrolar das intervenes policiais. O policial passa a ter um maior controle da situao, minimizando, em grande parte dos casos, a possibilidade de uma reao indesejada. O modo de agir, de se postar e falar com o abordado interfere diretamente na sua reao, auxilia no nvel de cooperao e no acatamento das ordens. Dessa forma, a postura do policial militar, durante a abordagem, pode evitar manifestaes de descontentamento que exijam a adoo de medidas coercitivas pela polcia, como os controles de contatos e

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os controles fsicos, as tcnicas de menor potencial ofensivo e, como medida extrema, o uso da arma de fogo.

ATENO! A verbalizao pode e deve ser empregada em conjunto com todos os outros nveis do uso de fora. Deve estar presente durante toda a interveno policial (ver Uso de fora, seo 7).

O policial deve manter o equilbrio e o autocontrole, mesmo se o abordado no obedecer, se fizer comentrios ofensivos, ignorar a sua presena ou atrair a ateno de pessoas em volta. A linguagem que deve prevalecer a do policial e no a do abordado. Manter um dilogo claro, direto, no emocional e sem abusos, demonstra profissionalismo e domnio da situao. Dessa forma, o policial ganha credibilidade junto populao e atrai a confiana de testemunhas, que podero confirmar que foram dadas todas as chances ao abordado para cooperar, sem utilizar a fora, mas que ele se recusou a acatar. O policial deve transmitir ao abordado uma mensagem clara, de que poder agir em resposta s suas agresses ou falta de cooperao. Por meio de um dilogo moderado e incisivo, o policial deve explicar que seus comandos so ordens legais e que o descumprimento pode configurar infrao penal e resultar no uso de fora. Deve ser considerada a possibilidade da pessoa abordada ter dificuldade na compreenso e no cumprimento da ordem, por tratar-se de pessoa portadora de necessidades especiais (fsicas e/ou mentais) ou por estar sob efeito de substncias como lcool, drogas ou medicaes especficas, que alteram a capacidade cognitiva. O policial deve ter conscincia da existncia de uma insatisfao natural das pessoas quando so abordadas. O policial se apresenta como autoridade, intervindo momentaneamente no direito de ir e vir, podendo ainda causar uma exposio constrangedora do abordado perante seus familiares ou o pblico presente. Exemplo: possibilidade de se gerar atraso em deslocamentos para compromissos, devido a operaes do tipo Blitz.

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Um grande nmero de pessoas no gosta de ser parado pela polcia, ainda que seja para uma simples verificao de rotina, visto que, na maioria das vezes, seja de senso comum a ideia de que foi escolhido por ter sido considerado suspeito. Nesses termos, razovel que o abordado, nas diversas intervenes, tente argumentar ou questionar a forma ou a legalidade da ao policial, no cumprindo de imediato as recomendaes, alegando no admitir ser tratado como infrator. importante diferenciar essa compreensvel sensao de incmodo vivenciada pelo abordado, de outra conduta mais sria que configure os crimes de resistncia, desobedincia e/ou desacato. Dessa forma, o policial deve iniciar a comunicao, sabendo que os elementos de empatia, na maioria das vezes, estaro ausentes. Por isso, deve aumentar sua preocupao com os aspectos no verbais, de forma a garantir que suas mensagens sejam claras e precisamente transmitidas. Para evitar percepes equivocadas por parte do abordado e prejuzo na comunicao, o policial deve treinar constantemente, de preferncia diante de um espelho, analisando a sua imagem, considerando todos os elementos verbais e no verbais, enquanto pratica os comandos tpicos de uma abordagem policial.

6.2 Verbalizao do policial face ao comportamento do abordadoO policial deve variar sua comunicao, de acordo com as diferentes formas de reao do abordado. Seguem abaixo, exemplos de dilogos que podem servir de referncia.

6.2.1 Abordado cooperativoMantendo-se no estado de alerta (laranja), aps realizar a avaliao dos riscos e decidir por executar a abordagem, o policial inicia o contato verbal.- Bom dia! Eu sou o Sargento ... (dizer o posto / a graduao e o nome), da Polcia Militar. Tudo bem? (utilize o complemento POLCIA MILITAR DE MINAS GERAIS, caso esteja em operao prximo divisa / fronteira do Estado).

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Deve utilizar pausas e interromper a sua fala, aguardando a resposta do abordado, para verificar se houve entendimento da sua mensagem e qual o nvel preliminar de cooperao demonstrado. Utilizando comandos simples e sequenciais, o policial explica para a pessoa o que est ocorrendo e, se possvel, o que motivou a abordagem.- Esta uma operao policial preventiva. O procedimento tomar apenas alguns minutos. Para a sua segurana, siga as minhas orientaes, OK...?

Por se tratar, a princpio, de abordado cooperativo, o policial d sequncia s ordens, pausadamente, dando tempo para que o abordado cumpra as determinaes, mantendo-se atento aos elementos verbais e no verbais do abordado, para facilitar o processo de anlise de riscos.- Qual o seu nome? - Permanea parado, coloque as mos para cima. (ou ...lentamente, levante os braos ou... coloque as mos sobre a cabea e entrelace os dedos). - Pare! Vire-se de frente para a parede. (ou Vire-se de frente para mim). - Pare! Preste ateno! Lentamente, tire sua mo do bolso (sacola, mochila ...).

conveniente fazer perguntas ao abordado e mant-lo constantemente com a ateno voltada para o policial que verbaliza. Isso contribuir para reduzir sua capacidade de reao (ver Processo mental da agresso - seo 4). Terminada a abordagem, explique ao cidado sobre a importncia da pesquisa ps-atendimento.- Senhor (nome)! A Polcia Militar realiza uma pesquisa de ps-atendimento para verificao da qualidade e aperfeioamento do nosso trabalho.

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- Preciso que indique o dia da semana, o horrio e o nmero de telefone, para que possamos entrar em contato, sem que cause incmodo. (Aguarde, anote a resposta, agradea e despea-se) - Agradeo pela colaborao e conte com o nosso servio. Tenha um bom dia!

6.2.2 Abordado resistente passivoCaso o abordado descumpra algum comando, agindo de forma passiva, morosa, aptica ou indiferente (mas que no constitua agresso), o policial deve, inicialmente, alert-lo sobre as consequncias da desobedincia ordem legal. Persistindo tal comportamento, deve agir com superioridade de fora, usando os meios necessrios e moderados para compeli-lo ao cumprimento da determinao legal. O estado de prontido, nesses casos, dever ser o de alerta (laranja). A desobedincia do abordado e a resistncia em cumprir as ordens devero ser entendidas como indicativos de ameaa. Nesse caso, o policial deve estar pronto para responder a algum tipo de agresso. O policial dever verificar, por meio de verbalizaes, se o abordado compreende o que est sendo dito:- Voc est me entendendo? ou - O que est acontecendo? Por que voc no me obedece? ou - Est tudo bem? Voc est com algum problema?

Se o abordado demorar a responder ou a acatar as determinaes, mas no estiver esboando algum tipo de agresso, o policial dever insistir na reco-

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mendao dada, repetindo a mesma ordem por duas ou trs vezes. Esse procedimento de repetio literal da ordem, de forma pausada, sistemtica e firme, refora a autoridade profissional da polcia, demonstrando determinao e convico, alm de contribuir para que as eventuais testemunhas possam confirmar a legalidade da ao. Utilize expresses que facilitem a aproximao com o abordado. No seja rspido ou impaciente. Procure alcanar o receptor com seu discurso. Ao invs de responder com negativas, use afirmativas que desestimulem a sua falta de cooperao:- Entendo o seu ponto de vista! Mas uma questo de segurana. ou - Entenda, o meu dever. Se voc obedecer, ser mais seguro para todos.

Caso o abordado continue descumprindo as ordens, dever ser advertido quanto a este comportamento, esclarecendo tratar-se de infrao penal (desobedincia).- Obedea! Desobedincia crime! ou - Cidado, isto uma ordem legal! Faa o que estou mandando! ou - Isto uma advertncia de uso de fora!

O policial deve considerar que podero existir diversas razes para que o abordado possa resistir de maneira passiva s ordens dadas pelo policial, por exemplo: quando no compreende a ordem emanada pela autoridade;

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quando no acata, simplesmente porque quis desafiar a autoridade ou

desmerecer a ao policial, tentando, assim, exp-lo a uma situao humilhante frente ao pblico, ou ainda, provocar o uso excessivo de fora;

quando busca conseguir a simpatia de pessoas a sua volta, colocando-as

contra a atuao da polcia, assumindo assim uma posio de vtima;

quando tem algo para esconder (armas, drogas, outros) e busca distrair a

ateno do policial;

quando quer ganhar tempo para fugir ou enfrentar fisicamente os poli-

ciais, isto , com resistncia ativa.

O policial procura, ento, identificar no comportamento do abordado, as possveis causas da sua resistncia, devendo estar atento para no se deixar levar por provocaes do abordado, o qual procura fazer-se de vtima, diante da interveno. Nesses casos, o policial deve se resguardar, sempre que possvel, por meio do testemunho de pessoas presumidamente idneas que estejam prximas ao local, acionando-as para que presenciem a repetio da ordem legal emitida e o descumprimento, ou resistncia/relutncia do abordado em cumpri-la.- Ei! Voc! Por favor, me acompanhe! Preciso que o senhor presencie esta situao. (Repita a ordem ao abordado diante da testemunha). - A polcia est dando uma ordem legal a este cidado. Ele se recusa a colaborar / foi advertido de que ser usada fora contra ele / foi alertado de que poder ser preso por desobedincia.

Os recursos tecnolgicos (aparelhos telefnicos celulares que tiram fotos, filmam, gravam udio, ou outros similares) que estejam acessveis para comprovar a atuao legtima do policial e a resistncia do abordado, podem ser utilizados. Nesse caso, o policial deve proceder com especial ateno, com relao a sua postura e segurana, de forma que no se torne vulnervel durante este procedimento, e alertar formalmente ao interlocutor que estar registrando a interveno.

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ATENO! Cuidado com o uso e a destinao do material registrado. O direito imagem parte da dignidade humana e cabe ao policial proteg-la. Esses registros eletrnicos s podero ser utilizados de maneira oficial, sendo vedada a divulgao ou a distribuio imprensa ou a outros rgos10.

6.2.3 Abordado resistente ativoCaso a ao por parte do abordado se materialize em algum tipo de agresso, caracterizando a resistncia ativa, a ao policial deve prosseguir na reao, utilizando o nvel de fora proporcional sem, contudo, interromper a verbalizao. Nos casos de resistncia fsica, o policial deve mensurar e avaliar as atitudes do abordado, adaptando a verbalizao, sendo mais imperativo e impositivo, alertando imediatamente o restante da equipe sobre essa resistncia do abordado, com foco na segurana dos policiais e de terceiros. Diante da agresso, o policial reagir com controle de contato e reforar o volume de voz, emitindo ordens diretas, devendo advertir o abordado de que tal procedimento implica crime (desacato ou resistncia).- Parado! No se aproxime! - No faa movimentos bruscos. Obedea ordem policial! - Vou empregar a fora!

O estado de alarme (vermelho) o mais indicado. Nesse caso, o abordado j iniciou algum tipo de agresso e o policial deve estar pronto para reagir (ver Uso de fora seo 7).

10 Conforme artigo 4 do Cdigo de Conduta para os Encarregados pela Aplicao da Lei (CCEAL).

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6.2.4 Verbalizao no caso de prisoAps a constatao de uma situao que se configure em priso do abordado, so adequadas as seguintes frases:- Fulano ... (citar o nome da pessoa presa). Sou o ... (citar o posto ou a graduao e o nome do policial condutor da priso). - Voc est preso pelo cometimento do crime de (citar o delito). - Voc tm o direito de permanecer calado. - Voc tem direito a assistncia da sua famlia e de advogado. - Voc ser encaminhado delegacia... (citar o local onde ser feito o encerramento do BO/REDS) - Na delegacia, sua famlia ou a pessoa indicada por voc poder ser comunicada.

conveniente fazer perguntas pessoa presa, na presena de testemunhas, tais como:- Por favor, confira seus pertences! - Quer registrar algum fato referente a esta ao policial?

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6.3 Consideraes finaisAlgumas atitudes por parte do policial podem contribuir para tornar a comunicao simples, rpida e eficaz, por abrangerem pontos importantes para o sucesso em uma abordagem, dentre elas:

a) saber ouvir e compreender a mensagem do abordado, sendo capaz de responder ao que foi perguntado; b) adaptar a mensagem a cada tipo de pblico, sem perder a clareza e a objetividade; c) escolher o momento certo para realizar a comunicao; d) ser paciente, pois cada pessoa tem um ritmo, um modo e uma capacidade de internalizar e compreender a mensagem; e) demonstrar segurana e confiana.

Uma das principais funes do policial moderno a resoluo pacfica de conflitos11. A verbalizao uma ferramenta fundamental colocada disposio do policial na resoluo de conflitos. O uso correto das tcnicas aqui apresentadas aumenta a segurana nas intervenes policiais e diminui, consideravelmente, a necessidade do uso de fora em nveis mais elevados.

11 Interpretao institucional da PMMG do princpio 20 dos Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF).

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SEO 7

USO DE FORA

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7 USO DE FORA necessrio ter um conceito claro e objetivo de fora. A palavra tem significados diferentes dependendo do contexto. Geralmente, fora representa energia, ao de contato fsico, vigor, robustez, esforo, intensidade, coercitividade, dentre outros. A fora, no mbito policial, definida como sendo o meio pelo qual a polcia controla uma situao que ameaa a ordem pblica, a dignidade, a integridade ou a vida das pessoas. Sua utilizao deve estar condicionada observncia dos limites do ordenamento jurdico e ao exame constante das questes de natureza tica12. O presente contedo dever ser aplicado como referncia de doutrina institucional da PMMG para todas as intervenes policiais que exijam o uso de fora. As particularidades referentes ao uso de fora pela polcia de forma coletiva (formaes de tropa), tais como aes de controle de distrbio civil, rebelies em presdio, eventos com grandes pblicos e outras operaes tpicas de polcia de choque, alm do contedo desta seo, sero complementadas em Caderno Doutrinrio prprio. O uso de fora um tema que engloba muitas variveis e possibilidades de ao. De acordo com as circunstncias, sua intensidade pode variar desde a simples presena policial at o emprego de fora potencialmente letal como o disparo da arma de fogo contra pessoa, sendo, neste caso, considerado como o ltimo recurso e de medida extrema de uma interveno policial. O Estado detm o monoplio do uso de fora que exercida por intermdio dos seus rgos de segurana. Assim, o policial, no cumprimento de suas atividades, poder us-la para repelir uma ameaa sua segurana ou de terceiros e estabilidade da sociedade como um todo (uma violncia contra o policial um atentado contra a prpria sociedade).1312 Interpretao institucional da PMMG do princpio 1 dos Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF). 13 Texto adaptado do Prembulo dos PBUFAF.

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A fora aplicada por um policial um ato discricionrio, legal, legtimo e profissional. Pode e deve ser usada no cotidiano operacional, sem receio das consequncias advindas de seu emprego, desde que o policial cumpra com os princpios ticos e legais que regem sua profisso. Deve ficar claro para o policial que o uso de fora no se confunde com violncia14, haja vista que esta ltima uma ao arbitrria, ilegal, ilegtima e no profissional. O uso excessivo de fora configura ato de violncia e abuso de poder. O policial poder usar a fora no exerccio das suas atividades, no sendo necessrio que ele ou outrem seja atacado primeiro, ou exponha-se desnecessariamente ao perigo, antes que possa empreg-la. O seu emprego eficiente requer uma anlise dinmica e contnua sobre as circunstncias presentes, de forma que a interveno policial resulte num menor dano possvel. Para tanto, essencial que ele se aperfeioe, constantemente, em procedimentos para a soluo pacfica de conflitos, estudos relacionados ao comportamento humano, conhecimento de tcnicas de persuaso, negociao e mediao, dentre outros que contribuam para a sua profissionalizao nesse tema15.

14 O assunto foi discutido no artigo Uso de Fora e a Ostensividade na Ao Policial, de Jacqueline Muniz, Domcio Proena Junior e Eugnio Diniz, publicado no peridico Conjuntura Poltica. Boletim de Anlise - Departamento de Cincia Poltica da UFMG, BELO HORIZONTE, pp:22-26, 20 de abril de 1999. 15 Interpretao institucional da PMMG do princpio 20 dos PBUFAF e conforme artigo 3. do Cdigo de Conduta para os Encarregados pela Aplicao da Lei (CCEAL).

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CDIGO DE CONDUTA PARA OS ENCARREGADOS PELA APLICAO DA LEI Adotado pela Assemblia Geral das Naes Unidas, no dia 17 de Dezembro de 1979, atravs da Resoluo n 34/169.Artigo 1 Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei devem sempre cumprir o dever que a lei lhes impe, servindo a comunidade e protegendo todas as pessoas contra atos ilegais, em conformidade com o elevado grau de responsabilidade que a sua profisso requer. Artigo 2 No cumprimento do dever, os funcionrios responsveis pela aplicao da lei devem respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os direitos humanos de todas as pessoas. Artigo 3 Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei s podem empregar a fora quando estritamente necessria e na medida exigida para o cumprimento do seu dever. Artigo 4 Os assuntos de natureza confidencial em poder dos funcionrios responsveis pela aplicao da lei devem ser mantidos confidenciais, a no ser que o cumprimento do dever ou necessidade de justia estritamente exijam outro comportamento. Artigo 5 Nenhum funcionrio responsvel pela aplicao da lei pode infligir, instigar ou tolerar qualquer ato de tortura ou qualquer outro tratamento ou pena cruel, desumano ou degradante, nem nenhum destes funcionrios pode invocar ordens superiores ou circunstncias excepcionais, tais como o estado de guerra ou uma ameaa de guerra, ameaa segurana nacional, instabilidade poltica interna ou qualquer outra emergncia pblica, como justificativa para torturas ou outros tratamentos ou penas cruis, desumanos ou degradantes. Artigo 6 Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei devem garantir a proteo da sade de todas as pessoas sob sua guarda e, em especial, devem adotar medidas imediatas para assegurar-lhes cuidados mdicos, sempre que necessrio. Artigo 7 Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei no devem cometer quaisquer atos de corrupo. Tambm devem opor-se vigorosamente e combater todos estes atos. Artigo 8 Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei devem respeitar a lei e este Cdigo. Devem, tambm, na medida das suas possibilidades, evitar e opor-se com rigor a quaisquer violaes da lei e deste Cdigo. Os funcionrios responsveis pela aplicao da lei que tiverem motivos para acreditar que houve ou que est para haver uma violao deste Cdigo, devem comunicar o fato aos seus superiores e, se necessrio, a outras autoridades competentes ou rgos com poderes de reviso e reparao.

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7.1 Princpios do uso de foraOs Princpios Bsicos sobre a Utilizao da Fora e de Armas de Fogo pelos Funcionrios Responsveis pela Aplicao da Lei (PBUFAF) foram adotados no Oitavo Congresso das Naes Unidas sobre a Preveno do Crime e o Tratamento dos Infratores, realizado em Havana, Cuba, de 27 de agosto a 7 de setembro de 1990, e constituem em 26 comandos que descrevem as diretrizes referentes s disposies gerais e especficas sobre o uso de fora, o policiamento de reunies ilegais e de indivduos sob custdia, a habilitao, formao e orientao de funcionrios com funes policiais, e os procedimentos de comunicao e reviso de incidentes. Essas normas genricas foram desdobradas pela PMMG, em consonncia com os oito artigos do Cdigo de Conduta para os Encarregados pela Aplicao da Lei (CCEAL), em ateno recomendao da ONU de transform-las em normas procedimentais aplicveis funo policial, tomando-se em conta as peculiaridades regionais referentes a fatores sociais, econmicos e culturais. Essas regras devem ser respeitadas em todas as circunstncias de interveno operacional da PMMG, no sendo justificativa para descumpri-las, situaes excepcionais ou de emergncia pblica16. O uso de fora pelos policiais deve ser norteado pela preservao da vida, da integridade fsica e da dignidade de todas as pessoas envolvidas em uma interveno policial e, ainda, pelos princpios essenciais relacionados a seguir:a) Legalidade

Constitui-se na utilizao de fora para a consecuo de um objetivo legal e nos estritos limites do ordenamento jurdico. Este princpio deve ser compreendido sob os aspectos do: RESULTADO: considera a motivao ou a justificativa para a interveno

da polcia. O objeto da ao deve ser sempre dirigido a alcanar o objetivo legal. Deste modo, a lei protege o resultado da ao policial17.

16 Interpretao institucional da PMMG do princpio 8 dos PBUFAF e em conformidade com o artigo 5 do CCEAL. 17 Interpretao institucional da PMMG do caput do princpio 5 dos PBUFAF.

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Exemplo: o princpio da legalidade no est presente se o policial usa de fora fsica (violncia) para extrair a confisso de uma pessoa. A tortura vedada em qualquer situao e no justifica o objetivo a ser alcanado, por meio de mecanismos que infringem o direito do indivduo de no produzir prova contra si mesmo ou declarar-se culpado. PROCESSO: considera que os meios e os mtodos utilizados pelo policial

devem ser legais, ou seja, em conformidade com as normas nacionais (leis, regulamentos, diretrizes, entre outros) e internacionais (acordos, tratados, convenes, pactos, entre outros)18.

Exemplo: o policial no cumpre o princpio da legalidade se, durante o seu servio, usar arma e munies no autorizadas pela Instituio, tais como armas sem registro, com numerao raspada, calibre proibido, munies particulares, dentre outras. b) Necessidade

Um determinado nvel de fora s pode ser empregado quando outros de menor intensidade no forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos. Contudo, sendo necessrio utilizar imediatamente um nvel de fora mais elevado, o policial no precisa percorrer os demais nveis. O uso de fora num nvel mais elevado considerado necessrio quando, aps tentar outros meios (negociao, persuaso, entre outros) para solucionar o problema, torna-se o ltimo recurso a ser utilizado pelo policial19. Exemplo: o policial pode utilizar a fora potencialmente letal (disparo de arma de fogo), para defender a