CAMILA DE CASTRO CASTILHO POR NOVOS MATERIAIS...

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM CAMILA DE CASTRO CASTILHO POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS: GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+ CAMPINAS, 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

CAMILA DE CASTRO CASTILHO

POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM

OS MULTILETRAMENTOS: GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE

NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+

CAMPINAS,

2018

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CAMILA DE CASTRO CASTILHO

POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE CONTEMPLEM

OS MULTILETRAMENTOS: GAMIFICAÇÃO E ELEMENTOS DE

NARRATIVA TRANSMÍDIA NO AVENTURAS CURRÍCULO+

Dissertação de mestrado apresentada ao

Instituto de Estudos da Linguagem da

Universidade Estadual de Campinas para

obtenção do título de Mestra em Linguística

Aplicada, na área de Linguagem e Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Jacqueline Peixoto Barbosa.

Este exemplar corresponde à versão

final da Dissertação defendida pela

aluna Camila de Castro Castilho e

orientada pela Profa. Dra. Jacqueline

Peixoto Barbosa.

CAMPINAS,

2018

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“Ninguém pode prever as transformações do século XXI

durante a revolução tecnológica da informação. Nós

certamente não podemos continuar ensinando nossos

estudantes apenas os letramentos da metade do século XX, ou

simplesmente colocar na frente deles os letramentos mais

avançados e diversos de hoje. Precisamos ajudar essa

geração a aprender a usar sabiamente os letramentos e

esperar que eles saiam-se melhor do que nós”.

(LEMKE, 2010, p. 475).

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Ao grande Contador de Histórias e ao player 2,

que topou o jogo da vida ao meu lado.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à minha orientadora, Profª Drª Jacqueline Peixoto Barbosa, pela

competência e exemplo enquanto profissional e educadora, pela paciência e pelo

incentivo em explorar diferentes caminhos e possibilidades na pesquisa de um

objeto com categorias de análises inter/transdisciplinares. À sua atenção e

generosidade que marcaram essa trajetória, meus sinceros agradecimentos.

E à Profª Drª Roxane Rojo, com que tive o privilégio de iniciar as discussões na

área, que incentivou meu ingresso no programa e que enriqueceu minhas leituras

com seus textos, por sua contribuição para o estudo e a pesquisa, pelo aprendizado

e por engrandecer os momentos da qualificação e da defesa.

À minha querida amiga, colega editora e veterana, a então doutoranda Fabiana

Marsaro, pelas amizade, trocas e generosidade em dividir comigo aspectos da vida

tão caros para nós. Sem você não teria chegado à LA.

À minha mãe, Lucília, e minha tia, Marília, que sempre se sacrificaram e/ou

incentivaram meus estudos e permitiram que eu chegasse até esse momento,

permitindo que eu sempre seja a melhor versão de mim mesma. À Vânia, Tati,

Paula, Otávio, Alberto, Laura e Beto, que mesmo não compreendendo o que estudo

sempre torceram por mim. Assim como à minha avó, Joana, às minhas tias, Ione, Lu

e Maura, e ao meu pai, Alberto.

À Ana Amélia, Ane Caroline, Bruno, Camila, Cauê, Dani, Eduardo, Elaine, Elis,

Gabriel, Juliana, Kátia, Liliane, Nayara, Rosane, Vinícius e a todos que, em algum

momento, fizeram parte de grupos, disciplinas, trabalhos e eventos, por amizade,

contribuições, suporte e/ou lembranças, sobretudo à Naiara.

À Ana Carolina, Ana Paula, André, Babi, Breno, Bruna, Cláudia, Del, Didi, Eduardo,

Fabiana, Gabriela, Gabriele, Luciene, Mel, Newton, Priscila, Ramon, Ricardo,

Roberta, Rodrigo, Victoria e Wesley, por trazerem leveza e alegria a tantos

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momentos e por serem pacientes na minha ausência. Ao Del meu duplo

agradecimento pela revisão da dissertação com toda a sua competência.

À Célia Assis, Elza Fujihara, Pedro Cunha, Tomás Troppmair e outros colegas da

IBEP (Márcia, Val, Karina, Ivi), pelo incentivo durante o caminho e por terem se

comprometido e investido nesta etapa da minha formação. Em especial à Célia, à

Elza e ao Pedro por compreenderem os momentos de ausência e dedicação ao

mestrado. Ao Tomás pela ideia na criação e parceria na produção de materiais

didáticos transmídia, que inspiraram a pesquisa. Da mesma forma, agradeço à

Glaucia Miyazaki, Matheus Spedo e Andressa Karen, pelo incentivo e pela garantia

de que continuaria o mestrado no ano em que trabalhei na FS.

À Profª Drª Denise Bértoli Braga e à Profª Drª Daniela Palma, por marcarem

positivamente minha trajetória na Pós-Graduação. À Profª Drª Cláudia Hilsdorf, por

todas as interlocuções inspiradoras que tanto contribuíram para a realização do

trabalho, pelas trocas e ensinamentos e pela gentileza de aceitar compor a banca de

defesa.

À Profª Drª Ana Luiza Marcondes Garcia, por sua atenção e pelo privilégio de sua

presença na banca de defesa. À Profª Drª Lucila Maria Pesce de Oliveira, por sua

atenção e pelo aceite da suplência na banca de defesa. Ao Prof. Dr. João Carlos

Massarolo, pelos aprendizados que a leitura de seus textos proporcionou e por suas

contribuições na banca de qualificação.

A todos os funcionários do IEL, principalmente Cláudio e Miguel, da Secretaria de

Pós, pela eficiência e boa vontade com que me auxiliaram quando preciso. Aos

funcionários da SEE-SP, que permitiram meu acesso ao Aventuras Currículo+, em

especial à Liliane Costa, por sua gentileza, contribuições e disponibilidade em trocar

informações sobre o material sempre que necessário.

Ao Rafael, por estar comigo em todos os momentos, pelo cuidado, atenção e amor e

por me lembrar sempre do que realmente importa.

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RESUMO

A presente pesquisa é caracterizada por ser uma análise documental

inserida no campo da Linguística Aplicada, que tem como objeto de análise o

Aventuras Currículo+. Com o objetivo de atender a uma iniciativa da Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP), o material foi inicialmente concebido

para ser um projeto de recuperação de aprendizagem para estudantes da rede

estadual do Estado de São Paulo. Para tanto, esse material apresenta atividades

relativas à leitura e à escrita, cujas atividades são relacionadas por meio de uma

narrativa, além de contar com estratégias de gamificação na sua produção e com a

articulação com objetos de aprendizagem (OA), disponíveis na plataforma

Currículo+, e ferramentas digitais. Com a crescente demanda pela integração de

tecnologias digitais em novas práticas, que devem ser caracterizadas pela

diversidade de linguagens e multiplicidade cultural, tornam-se cada vez mais

necessários materiais que contemplem os multiletramentos e que sejam produzidos

a partir de novas estratégias. Por esse motivo, a análise do Aventuras Currículo+

destinou-se a avaliar se o material contempla os multiletramentos e de que forma,

além de verificar como se utiliza da estratégia da gamificação e em que medida se

aproxima de elementos da narrativa transmídia. Por meio da análise, foi possível

verificar que o Aventuras contempla os multiletramentos por meio de

textos/produções multissemióticas e da diversidade cultural trabalhados a medida

que alguns gêneros e textos/produções são explorados. No que diz respeito à

gamificação, o material faz uso de elementos de games na organização das

atividades, o que contribui para o desenvolvimento das habilidades e para a relação

dos alunos com os conteúdos de forma lúdica. Quanto à aproximação com os

elementos da narrativa transmídia, constatou-se que há pouca proximidade, porém

também há muitas possibilidades de o universo construído ser ampliado para que

essa aproximação seja mais efetiva, além de considerar outras adequações pensar

em diversidade de mídias e de gêneros no contexto de Língua Portuguesa.

Palavras-chave: Materiais Didáticos; Multiletramentos; Gamificação; Narrativa

Transmídia.

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ABSTRACT

The present research is characterized as a documental analysis of the

Aventuras Currículo+ inserted in the field of Applied Linguistics. With the purpose of

attending an initiative of the Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-

SP), the Aventuras Currículo+ was initially designed to be a recovery of learning

project for the state network. To do so, this material possesses activities related to

reading and writing, linked to a narrative, in addition to counting on gamification

strategies in its production and with the articulation with learning objects, available on

the Currículo+ platform, and digital tools. With the increasing demand for the

integration of digital technologies into new practices, which must be characterized by

the diversity of languages and cultural multiplicity, it becomes increasingly necessary

teaching materials that contemplate multiliteracies and are produced from new

strategies. For this reason, the analysis of the Aventuras Currículo+ was intended to

evaluate if the material contemplates the multiliteracies and, also, verify how it uses

the gamification strategy and approaches of the transmedia narrative’s elements.

Through the present analysis, it was possible to confirm that the Aventuras

contemplates the multiliteracies through texts/multisemiotics productions and cultural

diversity worked as some genres and texts/productions are explored. As far as

gamification is concerned, the material consists of elements of games in the

arrangement of the activities, which contributes to the development of the student’s

abilities and to the relation of them with the contents in a playful way. As for the

approximation with the elements of the transmedia narrative, it was verified that there

is little the proximity, but also there are many possibilities of the constructed universe

being enlarged so that this approximation is more effective, besides considering

other adaptations to think about diversity of media and genres in the context of

Portuguese Language.

Keywords: Didactic Material; Multiliteracies; Gamification; Transmedia Narrative.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Mapa da pedagogia dos multiletramentos .......................................... 19

Figura 2 Quadro diferenciando multimídia, crossmídia e transmídia ................ 34

Figura 3 O que é transmídia? ............................................................................ 37

Figura 4 Doze passos ou estágios da jornada do herói .................................... 53

Figura 5 Sete princípios da narrativa transmídia ............................................... 56

Figura 6 Página de entrada do Aventuras com trailer e espaço para inserir

usuário e senha ................................................................................... 66

Figura 7 Tela de Convocação para alunos, dos 6 e 7 anos ......................... 66

Figura 8 Cursos do Aventuras Currículo+ disponibilizados por ano/série

(visualização do professor) ................................................................. 67

Figura 9 Tela Missão 0, convocatória para professores, “Língua Portuguesa –

Professores” ........................................................................................ 68

Figura 10 Quadro com as missões do Aventuras Currículo+ ............................. 70

Figura 11 Tela “Conheça sua missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º

anos .................................................................................................... 71

Figura 12 Quadro com as fases das missões do Aventuras Currículo+ ............. 72

Figura 13 Tela “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º

anos .................................................................................................... 73

Figura 14 Quadro do Mapa das Missões (com gêneros, produções e mídias do

Aventuras Currículo+) ......................................................................... 77

Figura 15 Quadro das 7 (sete) missões selecionadas para análise em

multiletramentos .................................................................................. 80

Figura 16 Quadro da categoria de análise (1) multiletramentos ......................... 82

Figura 17 Quadro da categoria de análise (2) gamificação ................................ 84

Figura 18 Quadro da categoria de análise (3) narrativa transmídia .................... 86

Figura 19 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 1: Produções culturais”, Nível 1, Quiz – Questão 3

sobre o quadro Retirantes, de Portinari .............................................. 92

Figura 20 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 2: Quiz da fome”, Megadesafio – Questões 1 e 2

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sobre o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, declamado

por Raquel Trindade ........................................................................... 93

Figura 21 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,

projeção do professor ......................................................................... 94

Figura 22 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,

Arquivo secreto, Questões 1 e 2 ...................................................... 95

Figura 23 Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do

Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”,

Arquivo secreto, Questão 3 .............................................................. 96

Figura 24 Grade de avaliação da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos,

“Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQs?”,

Arquivo secreto ............................................................................... 100

Figura 25 Grade de avaliação da Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos,

“Fase 5: Seleção de contos e início da gravação”, Arquivo secreto

........................................................................................................... 101

Figura 26 Grade de avaliação da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos,

“Fase 6: Desafio final”, Arquivo secreto .......................................... 102

Figura 27 Quadro de avaliação dos jogos Zombie Tsunami e Odd Planet, dos 8º

e 9º anos, “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3 – O que avaliar em um

jogo?”, no Arquivo Secreto ............................................................. 103

Figura 28 Grade de avaliação da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1,

dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Virada Cultural”, Arquivo secreto ......... 104

Figura 29 Grade de avaliação da Missão 5: O poder das imagens – Parte 2,

dos 8º e 9º anos, “Fase 3: A imagem que denuncia”, Arquivo secreto

........................................................................................................... 105

Figura 30 Grade de avaliação da Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º ano,

“Fase 4: Música no ar”, Arquivo secreto ......................................... 106

Figura 31 Tela sobre Forma de organização das atividades do material “Língua

Portuguesa – Professores” ............................................................... 112

Figura 32 Tela inicial do material de 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+, de

Língua Portuguesa ............................................................................ 117

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Figura 33 Tela Halo 4 (2012) ............................................................................ 117

Figura 34 Tela da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, “Fase 2: Olhares

e opiniões”, “Nível 1 – Quiz”, dos 8º e 9º anos ................................. 125

Figura 35 Tela da Selos e patentes, dos 8º e 9º anos, de um usuário ativo ... 131

Figura 36 Quadro de selos e patentes de Língua Portuguesa .......................... 132

Figura 37 Transcrição das narrativas iniciais e das narrativas finais das missões

dos 6º e 7º anos (com grifos nossos) ................................................ 140

Figura 38 Transcrição do áudio e enunciados escritos das narrativas presentes

na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos ........................... 143

Figura 39 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 2: Quiz

de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”, Questão 1 (trecho com a narrativa) .... 145

Figura 40 Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De

leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQz?”, Arquivo

secreto ............................................................................................. 146

Figura 41 Relação das narrativas com suas respectivas mídias na Missão 2:

SOS Quadrinhos ............................................................................. 147

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAP – Avaliação da Aprendizagem em Processo

ABED – Associação Brasileira de Educação a Distância

ARG – Alternate Reality Games (Jogo de Realidade Alternativa)

AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem

BNCC – Base Nacional Comum Curricular

CC-BY-NC – Creative Commons Atribuição-NãoComercial

CETEC – Centro de Estudos e Tecnologia Educacionais

CGEB – Coordenadoria de Gestão da Educação Básica

DE – Diretorias de Ensino

EFAP – Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores de São

Paulo

Enem – Exame Nacional do Ensino Médio

FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

GNL – Grupo de Nova Londres

MEC – Ministério da Educação

PCNP – Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico

PNBE – Programa Nacional Biblioteca da Escola

PNLD – Programa Nacional do Livro e do Material Didático

OA – Objeto de Aprendizagem

ODA – Objeto Digitais de Aprendizagem

OED – Objeto Educacional Digital

LDDI – Livros didáticos digitais interativos

RPG – Role-playing game

SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica

SARESP – Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São

Paulo

SEB – Secretaria de Educação Básica

SSE-SP – Secretaria da Educação do Estado de São Paulo

TDIC – Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 16

CAPÍTULO 1. POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE

CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS 23

1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0 23

1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos 30

1.2 NOVAS ESTRATÉGIAS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS 39

1.2.1 Gamificação na educação 40

1.2.2 Narrativa transmídia na educação 46

1.1.3 Gamificação, narrativa transmídia e os materiais didáticos 65

CAPÍTULO 2. METODOLOGIA DE PESQUISA 74

2.1 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS 74

2.2 AVENTURANDO-SE COM O AVENTURAS CURRÍCULO+ 78

2.3 GERAÇÃO DE DADOS 90

CAPÍTULO 3. ANÁLISE DO AVENTURAS CURRÍCULO+ 102

3.1 OS MULTILETRAMENTOS NO AVENTURAS 102

3.1.1 Análise da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 102

3.1.2 Diversidade de linguagens e mídias no Aventuras 115

3.1.3 Diversidade cultural no Aventuras 124

3.2 A GAMIFICAÇÃO DO AVENTURAS 127

3.3 A NARRATIVA DO AVENTURAS E OS ELEMENTOS DA

NARRATIVA TRANSMÍDIA 152

CONSIDERAÇÕES FINAIS 168

REFERÊNCIAS 173

ANEXO 180

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INTRODUÇÃO

A motivação inicial para a realização da presente pesquisa deu-se com o

início de minha atuação como produtora e editora de materiais didáticos digitais, cuja

principal atividade é atender às solicitações dos editais das políticas públicas do

livro, sobretudo do Programa Nacional do Livro e do Material Didático1 (PNLD).

Nesse contexto, surgiu a necessidade e o interesse em conhecer e pensar em novos

materiais didáticos.

Consolidado desde 1930, o mercado editorial vem mudando com a

intenção de acompanhar e atender às demandas educacionais. Embora muitos

materiais2, como livros paradidáticos, enciclopédias, dicionários, CDs, DVDs, jogos

etc. existam desde 1980, as editoras ainda têm o livro didático impresso como seu

principal produto.

Com as tecnologias digitais da informação e da comunicação (TDIC) e a

cultura digital, o mercado percebeu a necessidade de diversificar a oferta de

instrumentos educacionais, incluindo em sua produção materiais que promovam a

integração das TDIC às práticas educativas. Do mesmo modo, há uma crescente

demanda por materiais digitais, sendo previstas produções a partir de diferentes

vias, incluindo os editais do PNLD.

Além dessas solicitações de materiais digitais, o Ministério da Educação

(MEC) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) seguem no

processo de elaboração e implementação de políticas educacionais relacionadas à

tecnologia e à inovação. Por meio da Secretaria de Educação Básica (SEB), MEC e

FNDE oferecem, por exemplo, o Guia de Tecnologias Educacionais que tem como

objetivo auxiliar gestores educacionais na aquisição de materiais e tecnologias para

uso nas escolas brasileiras.

1 O Programa Nacional do Livro Didático alterou a nomenclatura para Programa Nacional do Livro e do Material Didático, em decreto nº 9.099, de 18 de julho de 2017. Embora mantenha a sigla PNLD, o programa unificou as ações de aquisição e distribuição de livros didáticos e literários, anteriormente contempladas respectivamente pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e pelo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). A nova nomenclatura também tem como intuito ampliar seu escopo, incluindo o que o programa concebe como outros materiais de apoio à prática educativa. Segundo o site oficial do PNLD, esses materiais são: obras pedagógicas, softwares e jogos educacionais, materiais de reforço e correção de fluxo, materiais de formação

e materiais destinados à gestão escolar, entre outros. 2 Segundo Batista (2002, p. 555), os materiais complementares aos livros didáticos são: paradidáticos, livros de

referência, CD, DVD, entre outros de “satélites”, termo conhecido na área para designar materiais que servem de apoio na aprendizagem dos alunos.

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Também são comuns editais estaduais e municipais e outras demandas

específicas, que têm como base o currículo e os aspectos sociopolíticos,

econômicos, técnicos e pedagógicos da rede3. Um exemplo de material

desenvolvido com o objetivo de atender a uma dessas demandas específicas da

Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) é o Aventuras Currículo+

(doravante, Aventuras), objeto de estudo da presente pesquisa.

Produzido por meio de uma parceria entre a SEE-SP, Fundação Carlos

Alberto Vanzolini e Institutos Inspirare e Natura, o Aventuras foi concebido como

projeto voltado para a recuperação intensiva em Língua Portuguesa e Matemática

de alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio,

contribuindo para o desenvolvimento de competências e habilidades relativas à

leitura, à escrita e aos conhecimentos matemáticos.

O Aventuras é composto por atividades que foram desenvolvidas por

Professores Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNP) da rede, coordenados

por professores universitários e pesquisadores da área de ensino de Língua

Portuguesa e de Matemática, e que são articuladas ao uso de objetos de

aprendizagem4 (OA), disponíveis na plataforma Currículo+, e de ferramentas digitais.

O Aventuras está alocado no ambiente virtual de aprendizagem Moodle (AVA-

Moodle), o que requer conhecimentos funcionais para acessar, navegar etc.

Com a homologação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que

procura contemplar a cultura digital, será cada vez mais necessária a produção de

novos materiais didáticos, como o Aventuras, que integrem tecnologias digitais e

contemplem diferentes linguagens e letramentos5, propondo práticas pedagógicas

que propiciem o trabalho com competências e habilidades relacionadas à cultura

digital.

3 É preciso destacar que os materiais, impressos e digitais, que surgem a partir dessas demandas estão

inseridos em contextos e possibilidades de produção diferentes dos solicitados nos editais do PNLD, por exemplo, pois são demandas que se submetem a pré-requisitos específicos, cujas produções concebidas são, geralmente, em parceria com instituições, institutos, organizações, outras empresas privadas etc.

4 Também denominados objetos digitais, objetos digitais de aprendizagem (ODA) ou objetos educacionais digitais (OED), esses objetos surgiram na década de 1990, “em função da necessidade de se criarem novas estratégias de ensino-aprendizagem para a Web e da necessidade de economia pessoal e de tempo na elaboração de materiais instrucionais” (ARAÚJO, 2013, p. 181). Eles estão presentes em repositórios e são conteúdos que podem ter licença livre ou direitos autorais concedidos; são reutilizáveis, em qualquer contexto, acessíveis por meio da Internet etc. (CHINAGLIA, 2016, p. 48)

5 A BNCC para Educação Infantil e Ensino Fundamental – Anos Iniciais e Finais foi homologada em 20 de

dezembro de 2017. A proposta de contemplação da cultura digital pode ser conferida tanto na apresentação das competências gerais (p. 9), como em Língua Portuguesa (p. 68). Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/uploads/2018/06/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Isso porque, conforme afirma Rojo (2012), é necessário que a escola

contemple práticas letradas multiculturais e multissemióticas que façam uso de

multiplataformas de mídias e, consequentemente, de diversas linguagens, incluindo

aquelas que circulam nas mais variadas culturas. As multiplicidades de linguagens e

de mídias, além da diversidade cultural, característica das populações atuais,

também devem estar presentes nos materiais didáticos.

Nesse sentido, pode-se atribuir ao material aspectos que o categorizem

como “novo”, pois, no contexto das demandas da política pública do livro, esse tipo

de material didático distancia-se de propostas digitalizadas e das que reproduzem a

lógica do impresso.

Na presente pesquisa, considera-se “novo” o material didático que não se

limita a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, mas que enfoca os

multiletramentos6, que circulam na vida contemporânea dos alunos. Entre as

características, esses materiais precisariam ser interativos, multissemióticos e/ou

hipermidiáticos. Essas características assemelham-se às características indicadas

por Rojo (2017, p. 17) em relação aos livros didáticos digitais interativos (LDDI)7.

Ao entrar em contato com o Aventuras foi possível identificar que, apesar

de sua proposta ser voltada para o letramento da letra, o material apresentam

características interessantes de serem analisadas, que permitem considerá-lo como

sendo “novo” objeto.

Para que seja possível verificar em que medida o Aventuras não se limita

a enfatizar os letramentos da letra ou do impresso, é necessário analisar sua

proposta pedagógica identificando se ele contempla, conforme proposto acima,

práticas letradas multiculturais e multissemióticas, que se utilizem de diversas mídias

e linguagens, incluindo aquelas que circulam nas diferentes culturas.

6 Segundo Rojo (2017), “multiletramentos são as práticas de trato com os textos multimodais ou multissemióticos

contemporâneos – majoritariamente digitais, mas também impressos –, que incluem procedimentos (como gestos para ler, por exemplo) e capacidades de leitura e produção que vão muito além da compreensão e produção de textos escritos, pois incorporam a leitura e (re)produção de imagens e fotos, diagramas, gráficos e infográficos, vídeos, áudio etc.” (ROJO, 2017, p. 4).

7 O termo “interativo”, conforme afirma Rojo (2017) dá nome aos LDDI e “não é pouco importante, na medida em que indica a interatividade conectada que cada um desses materiais (seja LDDI, seja plano de aula, gamificação etc.) precisa ter para que o usuário possa fazer suas escolhas mais interessantes de percurso, assim como navegar pela Web. Trata-se de interatividade com a mídia e de interatividade com outros usuários remotos ou presentes no mesmo espaço físico, conforme requer uma pedagogia colaborativa por design.” (ROJO, 2017, p. 15).

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Outra característica do Aventuras interessante de ser analisada é a

estratégia utilizada na elaboração do material e na organização das atividades: a

gamificação. O material apresenta uma narrativa gamificada e estrutura as

atividades em missões, fases e níveis, além de apresentar pontos, premiações,

entre outros elementos próprios dos games com o objetivo de incentivar os alunos,

propiciando o engajamento, ao se aproximar das práticas contemporâneas da vida

dos alunos.

Segundo Kapp (2012), a gamificação tem relação com o uso de

mecânica, estética e pensamento dos games para motivar ações e a participação,

promover a aprendizagem e resolver problemas no contexto educacional.

E, embora o material apresente apenas a gamificação como estratégia de

elaboração e organização, foram identificados elementos de composição do material

que despertaram o interesse de análise de modo que fosse possível verificar a

aproximação da elaboração do material com a estratégia da narrativa transmídia.

Para que seja possível verificar essa aproximação, o conceito de narrativa

transmídia adotado tem como principal base teórica Jenkins (2009[2006]), mas que

teve que ser discutido e contextualizado para a educação, mais especificamente,

para a produção de materiais didáticos, como ele mesmo o faz em seu artigo

Transmedia Education: the 7 principles revisited, em 2010, quando discute os

conceitos de transmídia relacionados à educação, retomando algumas das lógicas

transmídias existentes8.

Embora Jenkins (2010) indique a transmídia learning (ensino transmídia)

como sendo a lógica da transmídia correspondente ao contexto educacional, o autor

afirma que há uma sobreposição entre as diferentes lógicas e que alguns aspectos e

princípios transitam entre elas. Um exemplo é o uso que se faz de franquias da

transmedia entertainment (transmídia de entretenimento), como Star Wars, Harry

Potter e Senhor dos Anéis, com o objetivo de aproximar os alunos dos conteúdos

por meio dessas narrativas ou mesmo da transmedia storytelling (narrativa

8

Jenkins (2010) diferencia as lógicas transmídia, como, por exemplo: transmedia branding (que tem como principal objetivo a promoção de marcas), transmedia entertainment (transmídia com foco nas franquias de entretenimento, como Star Wars), transmedia storytelling (narrativa transmídia, utilizada em diferentes contextos, mas com foco principal a construção de um universo narrativo) e transmedia learning (ensino ou

metodologia transmídia para a educação, que pode partir de um tema ou conteúdo). Essas são algumas das lógicas apresentadas por terem fluxos de conteúdo que permitem integração de mídias, criação de storytelling e participação do público.

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transmídia), que promove a convergência de mídias e, por meio da criação de uma

grande narrativa, engendra diferentes histórias contadas por múltiplas plataformas.

Essa última lógica pode estar presente no contexto educacional em

propostas que focam na ampliação de narrativas de clássicos de literatura –

sobretudo em atividades de produções de fanfics a partir desses textos – e o

trabalho com gêneros narrativos do campo artístico-literário, como contos,

romances, novelas etc.

No caso do Aventuras, a aproximação com a narrativa transmídia é

sugerida pelo fato de o material apresentar atividades articuladas a um universo

narrativo que, embora dialogue intertextualmente com diferentes narrativas de

entretenimento, foi pensado e criado para o contexto educacional, sem utilizar uma

franquia específica. A narrativa do material convida professores e alunos para

participarem da aventura, atuando como mestres e agentes.

Torna-se, portanto, necessário definir o conceito de narrativa transmídia e

esboçar uma breve discussão sobre a sua adequação para o contexto educacional e

sobre sua relação com a gamificação, sobretudo enquanto estratégias para a

produção de materiais didáticos.

Como área de investigação multi/pluri/interdisciplinar, a área de

Linguística Aplicada possibilita não apenas a integração entre teoria e prática como

incentiva as pesquisas por novos formatos de materiais didáticos, inclusive aqueles

que se proponham a integrar tecnologias digitais. Por esse motivo, os objetivos

desta pesquisa documental estão delineados no campo.

Por ser um material criado para atender à uma demanda da Secretaria de

Educação do Estado de São Paulo, a análise documental do Aventuras tem

relevância no que diz respeito às políticas públicas, assim como pelo fato de sugerir

a integração às TDIC, também pode contribuir com as pesquisas sobre materiais

didáticos.

A presente dissertação tem como objetivo geral analisar se o Aventuras

Currículo+, enquanto material didático de Língua Portuguesa, contempla os

multiletramentos e verificar de que modo a estratégia da gamificação está presente

no material e suas implicações para a proposta pedagógica, além de identificar em

que medida a narrativa criada se aproxima dos elementos da narrativa transmídia.

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Para possibilitar a análise de um material didático complexo como o

Aventuras, a pesquisa tem como objetivos específicos:

Identificar se os multiletramentos são contemplados e de que forma,

além de avaliar em que medida as atividades permitem aos alunos

atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores de sentidos

e transformadores e possibilitam a formação de designers.

Analisar os elementos da gamificação presentes na proposta editorial e

na organização do material (missões, níveis, fases, narrativa, interface

customizada etc.), verificando quais as implicações de seu uso para a

proposta pedagógica.

Analisar a grande narrativa, a sequência narrativa de algumas missões

e de suas respectivas fases, indicando se há diversidade de mídias,

linguagens e/ou gêneros e qual o papel do aluno nessas missões, de

que modo ele participa, com o intuito de verificar o grau de

aproximação desses elementos com as características da narrativa

transmídia.

Para que os objetivos apresentados possam ser atingidos, as seguintes

perguntas norteiam a análise documental:

As propostas de atividades do Aventuras Currículo+ contemplam os

multiletramentos? De que forma? Apresentam propostas que permitem

aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores

de sentidos e transformadores? Há atividades que contribuem para a

formação de designers?

Quais os elementos da gamificação presentes nas propostas editorial

(estrutura e interface) e do Aventuras e de que forma eles

potencialmente motivam as ações dos alunos e promovem situações

de ensino-aprendizagem?

O universo criado e as atividades costuradas por uma narrativa

apresentam aspectos que permitem aproximação com elementos da

estratégia da narrativa transmídia?

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Para responder a essas perguntas, a dissertação está organizada em três

capítulos, além da introdução e das considerações finais:

O Capítulo 1 contextualiza a pesquisa, discute os desafios da educação

em tempos de Web 2.0 e define os conceitos de cultura da convergência e de

multiletramentos e, em linhas gerais, a pedagogia dos multiletramentos. Também

apresenta e conceitua as estratégias da gamificação e da narrativa transmídia.

O Capítulo 2 apresenta a metodologia de pesquisa por meio da

justificativa da análise documental de abordagem qualitativa e interpretativa. O

Aventuras é apresentado enquanto objeto de estudo de forma mais abrangente. A

geração de dados e as categorias de análise são situadas e justificadas.

O Capítulo 3 apresenta a análise dos dados propriamente dita, dividida

nas três partes: (1) multiletramentos; (2) estratégias de gamificação; (3) aspectos

que aproximam o universo narrativo criado dos elementos da narrativa transmídia.

As considerações finais retomam os objetivos propostos, verificando se as

perguntas de pesquisa foram respondidas. Caberá discutir, brevemente, se ambas

as estratégias, de gamificação e narrativa transmídia, podem propiciar um trabalho

com os multiletramentos.

Por meio dessa pesquisa, acredita-se incentivar a relação entre a prática

da produção editorial e a problematização teórica da pesquisa acadêmica, com o

objetivo de promover maior contribuição para as mudanças necessárias aos

materiais didáticos do século XXI.

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CAPÍTULO 1. POR NOVOS MATERIAIS DIDÁTICOS QUE

CONTEMPLEM OS MULTILETRAMENTOS

O capítulo tem como objetivo contextualizar a pesquisa, discutindo os

desafios da educação em tempos da Web 2.0 e apresentando os conceitos de

cultura da convergência e de multiletramentos. Também serão apresentados os

embasamentos teóricos sobre os conceitos de gamificação e narrativa transmídia.

No que concerne aos multiletramentos, é importante para o embasamento

da pesquisa apresentar definir o que são os novos e multiletramentos e a pedagogia

dos multiletramentos, pois estes são relacionados aos desafios da educação em

tempos de Web 2.0 e devem ser conceitos presentes nas discussões sobre “novos”

materiais didáticos.

Em seguida, após conceituaremos gamificação e narrativa transmídia,

discutiremos suas possibilidades e adequações ao contexto educacional, situando

essas lógicas enquanto estratégias para a elaboração de materiais didáticos e

discutindo potenciais aproximações entre ambas.

1.1 OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE WEB 2.0

Atualmente, fazemos parte de uma sociedade multimidiática e digital, que

produz conteúdo em escala cada vez maior, em cujo cenário somos impulsionados a

sermos autônomos e, cada vez mais, a deixarmos de ser meros consumidores para

nos tornarmos divulgadores, reprodutores e produtores de conteúdos em rede.

Estamos imersos em processos coletivos de interação, buscas e seleção de

informações, desenvolvimento de habilidades e associações de recursos. Por esse

motivo, cada vez menos os conhecimentos acabados, definitivos e fixos têm lugar.

Nesse contexto, autores como Jenkins (2009[2006]) apontam para

necessidades intrínsecas à cultura da convergência, como acompanhar o fluxo de

informação em multiplataformas de mídia, modificar e criar simulações, remixar

conteúdos etc. O conceito de cultura da convergência parte da relação entre três das

características da sociedade contemporânea: convergência de meios de

comunicação, cultura participativa e inteligência coletiva.

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Segundo o autor, a convergência de meios de comunicação é uma

transformação cultural que vai além da interação com dispositivos:

A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica. A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o entretenimento. Lembrem-se disto: a convergência refere-se a um processo, não a um ponto final. [...] A convergência não é algo que vai acontecer um dia, quando tivermos banda larga suficiente ou quando descobrirmos a configuração correta dos aparelhos. Prontos ou não, já estamos vivendo numa cultura da convergência. [...] Alimentar essa convergência tecnológica significa uma mudança nos padrões de propriedade dos meios de comunicação. [...] A convergência está ocorrendo dentro dos mesmos aparelhos, dentro das mesmas franquias, dentro das mesmas empresas, dentro do cérebro do consumidor e dentro dos mesmos grupos de fãs. A convergência envolve uma transformação tanto na forma de produzir quanto na forma de consumir os meios de comunicação. (JENKINS, 2009[2006], pp. 44-46)

Trata-se, portanto, de um processo corporativo e de um processo do

público. De um lado, as empresas midiáticas aprendem a acelerar o fluxo de

conteúdo por canais de distribuição, com o objetivo de aumentar as oportunidades

de lucro, ampliar mercados e consolidar públicos. De outro, o público enquanto

consumidor utiliza-se das diferentes tecnologias para interagir uns com os outros por

meio de canais que promovem um fluxo mais livre de ideias e conteúdos.

No caso específico da atuação do público, que Jenkins (2009[2006])

chama de “processo alternativo”, contribui-se, entre outros aspectos, para a

transformação de sua condição enquanto receptor passivo. Com o surgimento e

adesão à cultural digital, houve uma mudança no modo como o público se relaciona

com os meios de comunicação, pois, além de receptor e consumidor, o público

tornou-se produtor.

Por meio da Web 2.0 também são possíveis ações coletivas, como a

solução de problemas e a criatividade alternativa, que são características da cultura

participativa. Nesse contexto, ao mesmo tempo em que as pessoas utilizam as

mídias para processos de consumo e produção de conhecimento, elas também as

utilizam como meios para discutir, questionar, divulgar, distribuir, verificar a

credibilidade e compartilhar informações, conteúdos e conhecimentos.

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As trocas possibilitam aos participantes compartilhar saberes em um

processo coletivo, associando recursos e habilidades. A definição desse processo

vem de Pierre Lévy, que o definiu como inteligência coletiva. Trata-se,

fundamentalmente, de:

Uma rede de pessoas interessadas pelos mesmos temas é não só mais eficiente do que qualquer mecanismo de busca [...], mas, sobretudo, do que a intermediação cultural tradicional, que sempre filtra demais, sem conhecer no detalhe as situações e necessidades de cada um. (LÉVY, 2002, p.101)

Portanto, a cultura da convergência pressupõe uma transformação nas

formas de participação, utilização e produção dos meios de comunicação, tendo os

participantes-usuários como corresponsáveis por controlar as mídias. Nesse sentido,

“a convergência não ocorre por meio dos aparelhos, mas, sim, dentro de cada

cérebro [...] e em suas interações sociais com os outros” (JENKINS, 2009[2006], p.

30).

Diante desse cenário, a responsabilidade da escola, dos educadores e

dos demais agentes envolvidos na área educacional aumenta e somos

constantemente impulsionados a pensar em como integrar a cultura digital, as

tecnologias digitais e as diferentes linguagens e mídias às práticas educativas. Mais

do que isso, faz-se necessário refletir sobre como incorporar novos textos,

procedimentos e mentalidades contemporâneos no contexto educacional.

Essa preocupação é urgente e constante, pois o desafio de compreender,

dialogar e formar as novas gerações de alunos é diário. Atualmente, os alunos da

Geração Z (nascidos do final da década de 1990 até o ano de 2010), também

chamados “nativos digitais”, ou seja, aqueles que são nascidos em um ambiente

digital estão, em sua maioria, em sala de aula.

A expressão cunhada por Prensky (2001) serve para diferenciá-los dos

denominados “imigrantes digitais”, que são aqueles que não nasceram em um

contexto completamente digital, mas em um ambiente mais analógico e linear ou

híbrido, como nos casos das Gerações X e Y9 (que hoje têm entre sessenta e trinta

9 Atualmente, o conceito de Geração C, criado por Dan Pankraz (2010), tem se tornado popular. Ele não está relacionado a uma época específica, mas ao tipo de comportamento. O Google definiu a geração como sendo própria do YouTube, e a letra C designa quatro comportamentos: criação, curadoria, comunidade e conexão. Entretanto, o conceito ainda é menos aceito que os demais.

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anos), tendo que se adaptar às mudanças trazidas pela cultura digital. Segundo o

autor, enquanto os imigrantes digitais enxergam as tecnologias como ferramentas e

utilizam-nas de forma instrumental, os nativos digitais as entendem como fundações

e não as reconhecem como novas.

Apesar de os estudos a respeito da Geração Z nomeá-los como “nativos

digitais” e caracterizá-los pela alta conectividade, é importante lembrarmos que as

inovações tecnológicas não estão, democraticamente, ao alcance de todos os

jovens, sobretudo em países com uma estrutura social diversa e desigual, como o

Brasil. Por esse motivo, o acesso e a formação desses jovens se fazem urgentes e

tornam-se mais um item de preocupação e responsabilidade escolar.

Coelho e Gallo (2010) afirmam a importância do papel estruturante que a

cultura digital exerce na constituição de novas habilidades e na ampliação do campo

de inclusão e formação social de educadores e alunos. De um ponto de vista mais

prático, Rojo e Barbosa (2015) reforçam que, embora a presença de computadores,

tablets e outros recursos nas escolas tenha crescido, ainda há problemas técnicos

com a velocidade da conexão e educacionais com a formação docente e com os

currículos, que, de uma forma geral, ainda contemplam as TDIC de maneira

instrumental.

Para Moran (2008), é necessário que a escola reaprenda a ser uma

instituição significativa e inovadora:

A escola precisa partir de onde o aluno está, das suas preocupações, necessidades, curiosidades e construir um currículo que dialogue continuamente com a vida, com o cotidiano. Uma escola centrada efetivamente no aluno e não no conteúdo, que desperte curiosidade, interesse. Precisa de bons gestores e educadores, bem remunerados e formados em conhecimentos teóricos, em novas metodologias, no uso das tecnologias de comunicação mais modernas. (MORAN, 2008, s/p)

As TDIC na sociedade contemporânea, assim como a cultural digital e as

redes de compartilhamento de informações, permitiram a descentralização de

conhecimento e de informação. O modelo ainda dominante na educação formal atual

é “centralizador”, tem o professor como “transmissor” do conhecimento. O papel do

aluno é limitado à recepção e à memorização de conteúdo. De modo geral, o ensino

é segmentado por disciplinas, os conteúdos são expostos coletivamente, mas com

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foco na aprendizagem individual e os temas são dissociados da realidade dos

alunos.

Por isso, desde a segunda metade do século XX, esse modelo vem sendo

mais fortemente questionado e algumas iniciativas buscam adotar novos modelos

pedagógicos em busca de uma mudança. Para Lemke (2010[1998]), existem dois

paradigmas de aprendizagem em disputa atualmente - o de aprendizagem curricular

e de aprendizagem interativa:

O paradigma de aprendizagem curricular é dominante em instituições tais como escola e universidades. O paradigma curricular assume que alguém decidirá o que você precisa saber e planejará para que você aprenda tudo em uma ordem fixa e em um cronograma fixo. Este é o paradigma do capitalismo industrial e da produção de massa baseada na fábrica. (LEMKE, 2010[1998], p. 9)

Apesar de o paradigma de aprendizagem curricular ser dominante nas

instituições escolares, para o autor, a cultura digital e as tecnologias digitais estão

relacionadas ao paradigma da aprendizagem interativa:

O paradigma da aprendizagem interativa domina instituições como as bibliotecas e os centros de pesquisa. Assume-se que as pessoas determinam o que elas precisam saber baseando-se em suas participações em atividades em que essas necessidades surgem e em consulta a especialistas conhecedores; que eles aprendem na ordem que lhes cabe, em um ritmo confortável e em tempo para usarem o que aprenderam. Este é o paradigma da aprendizagem das pessoas que criaram a internet e o ciberespaço. É o paradigma mais do acesso à informação do que da imposição à aprendizagem. É o paradigma de como pessoas com poder e recursos escolhem aprender. (LEMKE, 2010[1998], p. 9-10)

Estamos, portanto, retomando a antiga discussão da necessidade de se

pensar em uma nova escola e em um novo processo de ensino-aprendizagem e,

portanto, em uma nova estruturação curricular e em novos materiais didáticos.

Devemos considerar, entretanto, a possibilidade de uma terceira via que tenha como

ponto de partida o paradigma curricular, mas que se aproxime de características

importantes do paradigma da aprendizagem interativa.

Consequentemente, a produção e o uso dos materiais didáticos, o papel

do professor e a participação dos alunos em sala de aula também devem ser

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revistos, redesenhados e adequados. Para a presente pesquisa o que interessa são

as implicações desses desafios e paradigmas na produção de materiais didáticos,

mais especificamente os de Língua Portuguesa.

Choppin (2004[2002]) afirma que, durante muito tempo, os livros didáticos

foram negligenciados por historiadores e bibliógrafos, mas têm sido objeto de

pesquisa nos últimos trinta anos. Segundo o autor, o estudo histórico realizado com

os livros didáticos mostrou que esse objeto cultural pode exercer quatro funções,

dependendo do ambiente sociocultural, da época, da disciplina, do nível de ensino,

do método e/ou da forma de utilização.

Para Choppin (2004[2002], p. 552-553), o livro didático tem função

referencial, curricular ou programática quando é um suporte de conteúdos

educativos, que devem ser transmitidos às novas gerações; função instrumental

quando possui atividades e exercícios para facilitar a memorização de

conhecimentos e favorecer a aquisição de competências e apropriação de

habilidades; função ideológica e cultural quando é um instrumento de construção de

identidade; função documental quando fornece conteúdos com o objetivo de

desenvolver o espírito crítico do aluno.

O autor também reforça que o livro didático é um instrumento de poder,

que faz parte da educação dos jovens, e indica outros materiais didáticos que fazem

parte do universo escolar, tanto impressos (como mapas, enciclopédias) como em

outros suportes (CD-ROM, por exemplo) e afirma:

Eles podem, até mesmo, ser funcionalmente indissociáveis, assim como as fitas cassetes e os vídeos, nos métodos de aprendizagem de línguas. O livro didático, em tais situações, não tem mais existência independente, mas torna-se um elemento constitutivo de conjunto multimídia. (CHOPPIN, 2004[2002], p. 553)

Essa afirmação de Choppin reforça o caráter instrumental que as TDIC

vêm tendo nas práticas educativas e na produção de materiais digitais. Como as

práticas ainda estão ligadas ao ensino que consideramos “tradicional” e a um

currículo estabelecido a partir de uma pedagogia relacionada à “transmissão” de

conhecimento, o paradigma dominante na produção e no uso de materiais didáticos,

assim como nas instituições escolares, é o da aprendizagem curricular.

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Para que o paradigma educacional esteja voltado para uma

aprendizagem interativa, que dialogue com a cultura da convergência, faz-se

necessário pensar em novos materiais didáticos, que contribuam para a mudança

das relações entre professores e alunos, cuja estrutura curricular seja mais flexível,

com propostas de atividades colaborativas e coletivas. Porém, esse tipo de material

exige outra pedagogia.

Conforme indicado anteriormente, Rojo (2013) conceitua os livros

didáticos digitais interativos (LDDI), considerando-os como um tipo de material que

possui características hipermidiáticas, intuitivas e interativas. Esse tipo de material

contrapõe-se aos materiais digitais solicitados pelos editais do PNLD, que parecem

seguir um caminho oposto ao que a autora propõe por causa das limitações

tecnológicas (com pouca ou nenhuma multissemiose, hipermídia ou interatividade) e

pedagógicas (complementares e dependentes aos impressos).

Nesse sentido, se as demandas governamentais estivessem de acordo

com os documentos e referenciais oficiais e com os paradigmas contemporâneos,

estariam preocupados em solicitar a produção de materiais didáticos que:

Descortinam, efetivamente, um novo universo de possibilidades de ensino-aprendizagem em que os objetos de ensino e estudo, anteriormente abstratos, longínquos e que tinham de ser captados e compreendidos por meio de uma linguagem verbal escrita altamente complexa, agora podem estar presentificados no livro, por meio de imagens estáticas e em movimento e de áudio e vídeo (objetos e animações 3D interativos, galerias de imagens, imagens interativas, vídeos e áudios, gráficos, tabelas e infográficos animados, assim como quizzes, PDFs e apresentações Power Point animadas), facilitando muito a compreensão e análise de conceitos mais abstratos, como o de DNA ou de átomo, por exemplo. (ROJO, 2013, p. 23)

Mais especificamente, no que concerne à produção de novos materiais

didáticos para a Língua Portuguesa, estes deveriam ser produzidos de modo a

contemplar os campos de atuação, as práticas de linguagens e as multissemioses,

apresentando, portanto, diferentes textos orais, escritos e multissemióticos, na

perspectiva dos multiletramentos. Entretanto, para muitos, os materiais didáticos de

Língua Portuguesa ainda devem se configurar como uma coletânea de textos

canônicos que privilegiam em suas atividades os letramentos convencionais.

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Para podermos vislumbrar novos formatos de material didático que

contemplem os multiletramentos, é preciso primeiro conceituar os novos e os

multiletramentos e retomar algumas proposições da pedagogia dos multiletramentos

(GNL, 1996). Em seguida, pensaremos nas estratégias de produção editorial que

alguns aportes sobre gamificação e narrativa transmídia poderão nos ajudar.

Essa tríplice articulação – multiletramentos, gamificação e narrativa

transmídia – está presente na análise do nosso objeto: o Aventuras Currículo+.

1.1.1 Os multiletramentos e a pedagogia do multiletramentos

O caminho que a produção de materiais didáticos segue evidencia a

importância de uma discussão, que deve ser coletiva, participativa e colaborativa,

entre os diferentes agentes educacionais sobre a necessidade de políticas públicas

adequadas e relacionadas às solicitações de novos formatos.

Com o objetivo de verificar o que é apropriado aos alunos no contexto da

atual sociedade globalizada, que envolve fatores de diversidade, diante da

multiplicidade de linguagens, multissemioses, mídias envolvidas na criação de

significação de textos contemporâneos e considerando a pluralidade e a diversidade

cultural nos contextos de significação, o Grupo de Nova Londres10 (doravante, GNL)

elaborou e publicou, em 1996, o manifesto intitulado “Uma pedagogia dos

multiletramentos: desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies:

designing social future).

Em seu manifesto, o GNL (1996) propôs uma mudança do ensino formal,

voltado para uma estrutura monocultural, monolíngue e orientado por uma

linguagem para uma proposta de ensino multicultural, que valorizasse a diversidade

linguística e as diferentes linguagens e mídias, apontando para as multiplicidades

cultural e de semioses.

Ou seja, a proposta do Grupo voltou-se para os estudos semióticos de

textos que envolvem diferentes formas de produção, veiculação e consumo,

expandindo o conceito de letramentos e apontando que, diferentemente dos

10

Grupo de Nova Londres (doravante, GNL), grupo de pesquisadores, formado por teóricos como Bill Cope e Mary Kalantzis, James Paul Gee, Gunther Kress que, após uma semana de discussões na cidade de Nova Londres, Connecticut (USA), em 1996, publicou o manifesto “Uma pedagogia dos multiletramentos : desenhando futuros sociais” (A pedagogy of multiliteracies: designing social futures).

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letramentos da letra ou do impresso (focados nas práticas da cultura escrita), os

multiletramentos compreendem dois tipos de multiplicidade que estão presentes na

sociedade: a cultural e a semiótica/midiática, propondo o conceito de

multiletramentos:

Letramento é, talvez, o principal elemento do projeto de educação moderna. No presente capítulo trazemos três argumentos principais sobre como os educadores podem mudar o conceito e a pedagogia dos letramentos. Através destes argumentos, desafiamos o lugar atribuído ao letramento, entendido como a leitura e a escrita da língua culta. E redefinimos o conceito, que deve ser entendido de forma mais ampla como “multiletramentos”. (GNL, 1996, p. 63, tradução nossa).

Tratava-se, portanto, de aquisições indispensáveis, que, segundo Rojo

(2012), incluem, ainda, procedimentos, como gestos, capacidades de leitura e de

produção:

(a) eles são interativos; mais que isso, colaborativos; (b) eles fraturam e transgridem as relações de poder estabelecidas, em especial as de propriedade (das máquinas, das ferramentas, das ideias, dos textos [verbais ou não]); (c) eles são híbridos, fronteiriços e mestiços (de linguagens, modos, mídias e culturas). (ROJO, 2012, p. 23)

Em suma, os multiletramentos são práticas relacionadas aos textos

multimodais ou multissemióticos/multimidiáticos contemporâneos, tanto impressos

como digitais, que abrangem uma diversidade de procedimentos e capacidades de

leitura e de produção.

A multiplicidade de linguagens é decorrente das práticas sociais de dentro

e fora da sala de aula e está presente em diferentes “textos em circulação social,

seja nos impressos, seja nas mídias audiovisuais, digitais ou não” (ROJO, 2012,

p.18). Em sua maioria são textos compostos de múltiplas linguagens, que exigem

“capacidades e práticas de compreensão e produção de cada uma delas

(multiletramentos) para fazer significar.” (ROJO, 2012, p.19).

Para além da diversidade e integração de semioses e mídias, a escola

também tem que dar conta da diversidade cultural presente em sua sala de aula. A

democratização do ensino é a principal responsável pela multiplicidade de culturas

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na escola. Essa diversidade é ampla e vai além da diversidade de idade, gênero,

étnica ou/e classe socioeconômica, incluindo alunos com diferentes valores,

realidades, conhecimentos e possibilidades físicas e cognitivas.

Para COPE e KALANTZIS (2000[1996]), há quatro formas de a

multiplicidade cultural estar presente na sala de aula, por meio de: exclusão, quando

o aluno não compartilha da cultura erudita e, mesmo em meio à tentativa, ele acaba

falhando; assimilação, quando o aluno é bem-sucedido na educação

institucionalizada, sobretudo por meio do discurso de quem detém o poder;

multiculturalismo, quando há o reconhecimento das variedades culturais, entretanto

a de quem detém o poder é a que sobressai em relação às demais; pluriculturalismo,

o defendido pelos autores como representação cultural com maior abertura e troca,

uma vez que as múltiplas culturas coexistem e não se sobrepõem umas às outras:

“o processo pluralista de transformação, então, não é uma questão de progressos

verticais, mas de expansão de horizontes.” (COPE; KALANTZIS, 2000[1996], p.

124).

Mais do que expansão de horizontes, García-Canclini (2008[1997], p.

348) vai postular a existência de um hibridismo cultural, uma vez que vivemos em

um mundo onde “todas as culturas são de fronteira. Todas as artes se desenvolvem

em relação com outras artes [...] Assim, as culturas perdem a relação exclusiva com

o território, mas ganham em comunicação e conhecimento”. O hibridismo cultural

estaria, portanto, presente nas produções culturais letradas, de circulação social,

misturando o popular e o erudito, o culto e o inculto, a cultura erudita e a popular, o

cânone e a cultura de massa, o que coloca em questão essas dicotomias.

Consequentemente, o currículo tradicional, que busca cada vez mais

unificar unidades e objetos de ensino, e teria como principal objetivo transmitir os

conhecimentos do cânone ao consumidor massivo, estaria, por sua vez, em

dissonância com as demandas emergentes da sociedade contemporânea. Nesse

caso, os currículos deveriam levar em conta a multiplicidade cultural presente em

sala de aula, primando pela diversidade e propiciando o exercício de alteridade.

E como a multiplicidade semiótica, que constitui os textos e a

multiplicidade social, cultural e linguística da sociedade globalizada podem estar

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presentes no ensino? O GNL (1996) defende a pedagogia dos multiletramentos11,

que se apresenta como uma alternativa promissora na promoção de mudanças dos

sistemas educacionais:

Pedagogia é uma relação de ensino e aprendizagem que cria o potencial de construção da aprendizagem que leva à participação social plena e igualitária. A pedagogia dos letramentos tradicionalmente significa ensinar e aprender a ler e a escrever oficialmente, de modo formal, na língua materna. A pedagogia dos letramentos, em outras palavras, tem tido um projeto restrito cuidadosamente formalizado em uma única língua, uma única cultura e governado por regras formais da língua. [...] Nós decidimos utilizar o termo “multiletramentos” como um caminho para o foco nas realidades do crescimento da diversidade local e conectividade global. Lidar com as diferenças linguísticas e culturais tem se tornado o centro da pragmática do nosso trabalho, da vida cívica e a vida privada. [...] Acreditamos que haverá um benefício cognitivo para todos os alunos na pedagogia do pluralismo cultural e linguístico. (GNL, 1996, p. 60-62, tradução nossa).

Nesse contexto, o grupo propõe o trabalho com as três dimensões da vida

social dos alunos, sendo elas: pessoal, profissional e de participação cívica. E, para

contemplar essas dimensões, o GNL vale-se de uma concepção dinâmica de

representação baseada no Designing Meanings (em tradução livre, Design de

sentidos).

Ao se apropriar da palavra da dimensão profissional design, o GNL utiliza-

a fortuitamente uma vez que ela apresenta um sentido amplo e dinâmico em inglês,

pois descreve a estrutura e a morfologia ao mesmo tempo em que se refere ao ato

de construir.

Para o GNL, no contexto do Designing Meanings, a construção se dá no

processo de representar significados por meio da leitura, da escuta, da fala etc. No

contexto dos multiletramentos, o design apresenta três aspectos: o available

designs, designing e redesigned.

11

Em 2009, os autores escrevem um novo artigo, propondo mudanças na proposta de 1996. Devido às

aplicações da pedagogia na Austrália e ao diálogo estabelecido com autores, educadores e movimentos educacionais, teóricos como Cope e Kalantzis retrocederam e redefiniram alguns aspectos da proposta, retomando a proposta de “experimentar, conceituar, analisar e aplicar”. A presente pesquisa, entretanto, utiliza a proposta inicial do GNL para a pedagogia dos multiletramentos, mais adequada aos novos letramentos e novas práticas sociais e também porque as mudanças de 2009 dialogam com o movimento back to basics, contrário aos multiletramentos. Os conceitos de designs disponíveis, designing e redesigned não foram alterados.

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Resumidamente, o available designs é aquilo que é disponibilizado pelos

modos de significação; o designing, que se caracteriza pela capacidade de

representar, recontextualizar e transformar os conteúdos disponibilizados sem ser

por repetição; o redesigned, por sua vez, consiste em reorganizar, reproduzir e

transformar, a partir das práticas anteriores, novos significados ou um novo modo de

significação, intervindo no mundo.

Para viabilizar o processo de ensino-aprendizagem abrangendo os

designs, há quatro componentes: a prática situada, que se baseia na experiência de

construção de significados, que envolve experiências de mundo, identidades,

experiências e conhecimentos prévios; a instrução aberta, que trabalha a

metalinguagem explícita do design, a reflexão e a análise da linguagem, e seus

conteúdos, significação e função social; o enquadramento crítico, que interpreta

contexto e relações socioculturais, políticas, históricas e ideológicas ligadas aos

designs; a prática transformada, na qual os alunos tornam-se designers de futuros

sociais por meio da (re)criação de significação. Em relação às dimensões do

usuário, o GNL propõe o seguinte diagrama:

Figura 1 – Mapa da pedagogia dos multiletramentos. Fonte: COPE, B.; KALANTZIS, M. (Eds.). Multiliteracies: literacy learning and the design of social futures. New York: Routledge, 2006 [2000][1996], p. 35. Retirado de: ROJO, R.; MOURA, E. (Orgs.). Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola, 2012, p. 29.

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O diagrama apresenta uma proposta de pedagogia crítica, que

correlaciona o desenvolvimento de competências técnicas e conhecimento prático, a

prática transformadora, a criação e recriação de sentido e as análises, reflexão e

leitura críticas, em uma pedagogia por design.

Essa proposta é desenvolvida por meio de estratégias de ensino-

aprendizagem que contemplem: práticas situadas, que fazem parte das culturas dos

alunos e nos gêneros e designs disponíveis para essas práticas; instruções abertas,

análise sistemática e consciente das práticas vivenciadas e dos gêneros e designs

familiares aos alunos e de seus processos de produção e de recepção;

enquadramentos críticos, interpretação dos contextos sociais e culturais de

circulação e produção dos designs e enunciados; e práticas transformador(as), de

recepção ou de produção/distribuição (redesign).

Desse modo, o aluno deixa de ser um simples memorizador de conteúdos

e passa a ser um sujeito ativo, crítico, autoral, transformador, com voz e espaço. O

processo de ensino-aprendizagem passa a ser coletivo, colaborativo e participativo.

O papel do professor também tem novo sentido: sua função passa a ser a de

coautor, mediador, curador e co-designer.

Para iniciar uma mudança efetiva na educação e no processo de ensino-

aprendizagem na direção apontada, precisamos de uma mudança curricular e, por

isso, os currículos devem contemplar nas disciplinas já existentes os

multiletramentos. Consequentemente, tornam-se necessários materiais didáticos

que contemplem os multiletramentos e esse tipo de pedagogia. Mais do que isso, é

necessário, conforme afirmam Rojo e Barbosa12:

Complementar a matriz curricular na direção de contemplar os multiletramentos com diversidade de mídias, linguagens e culturas, de forma articulada com os conteúdos e expectativas de aprendizagem propostos para as disciplinas e áreas do currículo. (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 18)

12

A versão homologada da BNCC, que procura contemplar a cultura digital tanto nas competências gerais como

integrada aos conteúdos dos componentes curriculares, propõe, por exemplo, no componente curricular de Língua Portuguesa, que se considere as diferentes linguagens e os letramentos, o que propicia o trabalho com habilidades que relacionem as práticas de linguagens com textos multissemióticos, meios, mídias e linguagens próprios da cultura digital, na perspectiva de se considerar os novos e multiletramentos. (BRASIL, 2017, p. 68)

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Como visto, não basta materiais didáticos que enfatizem os letramentos

da letra ou do impresso, apresentando e trabalhando os gêneros discursivos de

tradição e do cânone:

Posso dizer que nem as tecnologias digitais e nem os novos multiletramentos da cultura digital efetivamente chegaram ainda às práticas escolares, que continuam aferradas ao impresso e a suas práticas. (ROJO, 2017, p 7-8)

As demandas atuais, que seguem considerando, por exemplo, os

materiais digitais como complementares e propiciando a produção de formatos

digitais próximos da lógica do impresso, não parecem promover uma integração

efetiva da cultura digital e das tecnologias digitais às práticas de sala de aula ou

mesmo encaminhar a educação para além dos desafios dos letramentos

convencionais.

A maioria dos critérios e exigências está, geralmente, focada em questões

de ordem técnica e utilizam os recursos de forma instrumental. Os textos,

procedimentos e mentalidades, próprios da cultura digital, e que deveriam ser

integrados às práticas educativas como objetos de ensino-aprendizagem, são

desconsiderados.

Embora Chartier tenha considerado o e-book uma revolução técnica, de

leitura e de escrita, que “desafia as categorias e práticas que definem a relação com

a escrita desde o século 18” (CHARTIER, 2011, s/p), quando falamos em uma

revolução advinda das novas tecnologias, não estamos falando apenas da parte

tecnológica, relacionada aos suportes e dispositivos digitais, já que esses suportes e

dispositivos não são nada sem conexão.

As TDIC na sociedade contemporânea, assim como a cultural digital e as

redes de compartilhamento de informações, permitiram a descentralização de

conhecimento e de informação. Pesquisas podem ser feitas em sites de busca e

confirmadas em estudos e sites oficiais de organizações e instituições de

credibilidade. Aulas são oferecidas à distância e os fóruns permitem que os alunos

tirem dúvidas com seus pares ou com especialistas no assunto. Os produtores de

conteúdo possuem seus próprios canais de comunicação digital, que lhes permitem

ter contato direto com suas audiências. Aprender, conhecer e criar fora do espaço

escolar tornou-se fácil e interessante.

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Por esse motivo, é importante conhecer o universo dos alunos, desde

suas referências no que diz respeito a filmes, músicas, séries e jogos, para

selecionar mídias necessárias que, combinadas ao universo vivencial, viabilizem o

ensino propriamente dito de conteúdos, competências e habilidades, que façam

sentido em suas práticas. Mais do que isso, é preciso incorporar algumas dessas

práticas, por exemplo, no uso de Twitter, WhatsApp, YouTube, Instagram etc.

Junto às tecnologias digitais, surgiram novos procedimentos, como, por

exemplo, cortar e colar, arrastar, selecionar, tocar, taguear, zipar, upar, escanear

etc. e, embora esses procedimentos tenham uma contraparte técnica, eles fazem

parte dos atuais comportamentos socioculturais e, por mais que muitas das práticas

cotidianas da cultura digital os inclua, não seria importante sistematizar esse

aprendizado e integrar essas habilidades enquanto parte delas a serem trabalhadas

no contexto da educação escolar?

Por isso, é importante pensar e elaborar novos materiais didáticos que

contemplem os novos e multiletramentos13. Para Lankshear e Knobel (2007), esses

procedimentos fazem parte de outra mudança significativa advinda das tecnologias

digitais: o surgimento de um novo ethos, de uma nova mentalidade, denominada

Mentalidade 2, análoga à Web 2.0, definida pelo ciberespaço e pelo período pós-

industrial, operando de forma mais participativa e descentralizada, menos

individualizada, diferentemente da Mentalidade 1, caracterizada por sua lógica

industrial, fechada, hierárquica, especialista e de ordem textual.

Rojo e Barbosa (2015, p. 9) referem-se às mentalidades modernas e

hipermodernas. Para as autoras, essas duas mudanças, de mentalidade e,

sobretudo, esse novo ethos, estariam no cerne do conceito de novos letramentos.

Nesse sentido, os novos letramentos alteram condutas, procedimentos e

comportamentos do letramento convencional:

Se, no letramento convencional, a autoria Individual é um valor precioso, a ponto de gerar processos por plágio, nos novos letramentos o valor é a colaboração, a participação contínua, a relação em rede. Se no letramento convencional a raridade e o ineditismo dos textos eram um valor importante, determinante de cânones intocáveis, nos novos letramentos, ao contrário, o valor é a distribuição mais ampla possível desses textos (reblogagem, compartilhamento) e a apreciação que deles se faz em rede (curtir,

13

Vale destacar que, segundo Rojo (2017, p. 4), os novos letramentos são um subconjunto dos multiletramentos.

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comentar, apropriar‐se deles remixando ou hibridizando diferentes

textos). Se no letramento convencional a distribuição dos textos era controlada por casas publicadoras, por editores e livrarias, por direitos de autor, nos novos letramentos a apropriação, a avaliação e a reelaboração (remix) dos textos em circulação é o principal modo de funcionamento. (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 9)

Há uma transgressão natural das relações de poder pré-estabelecidas e

do processo de ensino-aprendizagem, pois as novas tecnologias divergem do já

mencionado paradigma de aprendizagem curricular vigente, uma vez que conduta

presente é a da Mentalidade 2, mais compatível com o que Lemke define como

paradigma da aprendizagem interativa:

Hoje, o paradigma curricular está falhando desastrosamente nos Estados Unidos. Qualquer um que tenha gasto tempo em uma escola urbana, mesmo nas melhores, pode lhes dizer que as coisas vão pior do que os testes padrão e as estatísticas podem revelar. A maioria dos alunos realmente não vê utilidade naquilo que se quer que eles aprendam. Muitos sabem que não estão preparados para o programa de aprendizagem anual. (LEMKE, 2010[1998], p. 27)

Como visto, os novos letramentos incorporam novos procedimentos e

mentalidades que devem ser incorporados às práticas educativas tanto para uso

como para discussão e reflexão, de modo que permita aos alunos desenvolverem

um conhecimento crítico.

Se o objetivo é produzir materiais didáticos que possam servir ou

direcionar a prática para uma aproximação do paradigma da aprendizagem interativa

defendido por Lemke (2010[1998]), que tem muito mais sentindo para a Geração Z

com a mentalidade Web 2.0, é necessário que esses materiais promovam a

interação entre indivíduos e que seja interativo.

Centradas na discussão sobre a necessidade de se considerar os

desafios da educação e pensar em novos modelos e metodologias que atendam aos

paradigmas estabelecidos no século XXI, apresentamos, a seguir, duas estratégias

emergentes da cultura digital e da convergência que podem ser consideradas na

elaboração de materiais didáticos: a gamificação e a narrativa transmídia.

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1.2 NOVAS ESTRATÉGIAS E ELABORAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS

Como já destacado, em meio à cultura da convergência e às práticas de

linguagem e multiplicidades socioculturais contemporâneas, que cada vez mais

supõem os multiletramentos, a elaboração dos materiais didáticos ainda está

pautada por uma demanda educativa arcaica, baseada nos letramentos da letra, nos

gêneros tradicionalmente valorizados, com coletânea focada no cânone. Conforme

visto, a homologação da BNCC recoloca essa demanda. E, por esse e outros

motivos, torna-se urgente a discussão de novos materiais que contemplem os

multiletramentos.

Vale ressaltar que existem problemas tecnológicos nas escolas,

sobretudo relacionados à conexão limitada e falta de integração das TDIC nas

formações docentes, como aponta a pesquisa sobre o uso das Tecnologias de

Informação e Comunicação no Brasil, TIC Educação 2016, da Cetic.BR; assim, o

uso das tecnologias digitais ainda é instrumental e centrado no docente. Por esse

motivo, muitas vezes, aparelhos tecnológicos como notebook e Datashow são

utilizados, mas com propósitos de práticas letradas tradicionais e vinculadas a um

ensino transmissivo sob a condução do professor.

Por conseguinte, os materiais digitais ou os que trazem propostas mais

interativas, em geral, são utilizados para introduzir, ilustrar, complementar ou fixar

um conteúdo, partindo do professor a decisão de quando o aluno deve utilizar esses

materiais. Por mais recursos tecnológicos que o material possa contemplar, em

grande parte dos casos, seu uso permanece sendo tradicional pautado no

paradigma da aprendizagem curricular.

Portanto, é interessante que os materiais considerem práticas que se

aproximem do paradigma da aprendizagem interativa. Desse modo, devem ser

consideradas novas estratégias em sua elaboração, sobretudo aquelas que:

possibilitem conectar a escola ao universo dos jovens ao mesmo tempo em que

mantenham o foco na aprendizagem; apresentem estruturas diferenciadas e

organizações flexíveis; integrem práticas relacionadas à experiência, à autonomia e

ao protagonismo; envolvam professores e alunos emocional e cognitivamente, com

o objetivo de promover colaboração, participação, cooperação e compartilhamento.

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Duas estratégias, difundidas como sendo próprias da cultura da

convergência e que apresentam as possibilidades destacadas acima, sejam nas

características que possuem ou no design, são a gamificação e a narrativa

transmídia. Defendemos o uso dessas estratégias como sendo promissoras na

elaboração de materiais didáticos, sobretudo para apoiar práticas do paradigma da

aprendizagem interativa e a integração da TDIC em sala e aula.

Antes de apresentar as possibilidades de uso e refletir como essas

estratégias podem contribuir para o processo de ensino-aprendizagem, é necessário

conceituá-las, apresentando seus desdobramentos e configurações atuais,

verificando como podem ser ressignificadas no campo educacional, uma vez que

são utilizadas em diferentes áreas, principalmente, na área de marketing.

Em seguida, é interessante associarmos as estratégias, verificando como

suas características potencializam-se ao serem correlacionadas, e, por conseguinte,

apresentar algumas estruturas e técnicas para incorporar a gamificação e a narrativa

transmídia na elaboração dos materiais didáticos, atendendo às atuais

configurações da educação, que demandam novas propostas de modalidades de

ensino e de metodologias.

1.2.1 Gamificação na educação

O advento da cultura digital e das tecnologias digitais possibilitou que as

experiências lúdicas reconfigurassem e potencializassem a noção tradicional de

jogo. Logo, o ato de jogar, que anteriormente era restrito ao espaço, ao tempo e à

participação presencial, foi expandido com o auxílio das multiplataformas. Hoje em

dia, jogar está mais relacionado a ações como pensar, raciocinar, escolher,

interpretar etc.

Por ser uma prática próxima da realidade dos alunos, as pesquisas

acadêmicas sobre jogos, games e gamificação, aplicados ou não à educação, são

cada vez mais frequentes e têm como objetivo analisar tópicos como: estímulo à

criatividade, fator de imersão, engajamento, potencial sociocultural, benefícios

cognitivos, motivação, entre outros.

O que também acontece no contexto educacional é o estímulo à produção

de jogos e games voltados para conteúdos, com a promessa de que os jogos

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educativos são desafiadores como os games de entretenimento e, ao mesmo tempo,

eficazes no processo de aprendizagem:

O potencial dos jogos advém da motivação intrínseca ao ato de jogar, de avançar na exploração dos espaços e superar etapas, fases e desafios que resultam num processo de aprendizagem de natureza lúdica, motivada por uma história que se desenrola de forma significativa e contínua. (MASSAROLO, 2013, p. 39)

O que chega à sala de aula, de modo geral, são conteúdos multimídia e

atividades interativas com alguns elementos de game, que dificilmente engajam ou

contribuem para a aprendizagem de forma significativa, sendo, de fato, um recurso

multimídia com elementos, técnicas e/ou design de games, como os conteúdos

digitais produzidos para o PNLD 201414 ou, até mesmo, propostas mais lúdicas

como o jogo “Mistério dos Sonhos”, da Xmile15. Isso acontece porque se acredita

que, ao utilizar elementos ou estética de games em conteúdos multimídia, já se está

apresentando essa lógica adequada ao âmbito educacional.

Há iniciativas que têm como objetivo apoiar o desenvolvimento de

ambientes gamificados, como a do Ministério da Educação (MEC), por exemplo,

com o Geekie Games Enem16, plataforma online para o Exame Nacional para o

Ensino Médio (ENEM). Segundo o MEC, os resultados desse ambiente foram

considerados positivos, a ponto de se levantar a possibilidade de gamificar a

avaliação do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).

Para se pensar em possibilidades de aprendizagem utilizando-se da

mecânica, da lógica e da estética dos games, além de “criar espaços de

aprendizagem mediados pelo desafio, pelo prazer e entretenimento” (ALVES;

MINHO; DINIZ, 2014, p. 76), é necessário conhecer o conceito de gamificação.

14

Os conteúdos multimídias do tipo jogos produzidos para o PNLD 2014 pela FTD tinham que atender às especificações apresentadas pelo PNLD/2014: Ensino Fundamental – Anos Finais. Disponível em: http://www.ftd.com.br/pnldef2_2014/index.php?page=colection&dis=historia&col=12&oed=1. Acesso em: 29 jul. 2018.

15 Xmile. Mistério dos Sonhos. Site oficial. Disponível em:

http://www.xmile.com.br/index.php?p=misterio_sonhos1. Acesso em: 29 out. 2018. 16

A Geekie Games Enem é uma plataforma que se apresenta como jogo com videoaulas, exercícios e

simulados. Embora se diferencie dos materiais didáticos que integrem tecnologias digitais, propiciando que o usuário a personalização do percurso, o material ainda está voltado para a avaliação que envolve o letramento da letra e conteúdos transmissivos, sem possibilidade de participação e colaboração. Disponível em: https://geekiegames.geekie.com.br/. Acesso em: 29 out. 2018.

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Segundo McGonigal (2012), a gamificação consiste em utilizar a mecânica dos jogos

em atividades que não estão dentro do contexto dos jogos.

Se, por um lado, os jogos (termo mais amplo, que inclui, inclusive

atividades lúdicas) e os games (jogos em plataforma digital; videogames) são

cativantes, por outro, a gamificação, termo traduzido do inglês gamification, pode ser

definida como “um sistema em que jogadores se engajam em um desafio abstrato,

definido por regras, interatividade e feedback, que apresenta resultados

quantificáveis que, muitas vezes, provocam reações e emoções.” (KAPP, 2012, p.

08, tradução nossa).

Para Kapp (2012), a gamificação é “o uso de mecânicas, estéticas e

pensamentos dos games para engajar pessoas, motivar a ação, promover a

aprendizagem e resolver problemas.” (KAPP, 2012, p. 08).

No caso da mecânica dos games, Kapp (2012), refere-se aos elementos e

às técnicas indicando que, para se gamificar uma atividade ou criar um sistema

gamificado, deve-se contemplar: abstração da realidade, objetivos, regras, conflitos,

níveis, tempo, recompensas, feedback, repetições, curva de interesse e/ou narrativa.

Embora o autor indique que a narrativa não seja um elemento essencial

nos games, ele afirma que ela é fundamental para a gamificação, pois potencializa o

envolvimento e o engajamento dos jogadores.

Santaella (2004, s/p) retoma essa importância ao explicar que a

narratividade é um elemento essencial porque permite, entre outras ações, a

identificação encarnada, ou seja, a criação de um avatar ou a materialização do

jogador dentro do contexto apresentado. Dentro desse contexto, jogador e narrativa

tornam-se inseparáveis e um exerce controle sobre o outro, potencializando a

natureza participativa, a interatividade e a imersão.

A gamificação deve ser compreendida como uma estratégia que vai além

da mecânica e da estética de games. Pois se trata de uma construção de modelos

ou sistemas com foco nas pessoas, cuja premissa é a lógica dos games. Por isso,

seja na elaboração de propostas, atividades, ambientes ou materiais didáticos, essa

estratégia deve ter como foco as pessoas envolvidas, considerando motivações,

sentimentos e participação, o que é conhecido como Human-focused design

(“Design focado no humano”, tradução nossa).

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Um exemplo de gamificação que tinha como objetivo promover a

cooperação e a colaboração entre os participantes com foco na resolução de

problemas é o trabalho de McGonigal (2012) com os jogos de realidade alternativa,

conhecidos, em inglês, como Alternate Reality Games (ARG). Entre os anos de 2001

a 2012, McGonigal desenvolveu uma série de ARG desafiando os participantes a

resolver problemas reais.

Um dos exemplos mais conhecidos é o ARG World Without Oil (“O mundo

sem petróleo”, tradução nossa), proposto em 2017. A partir da proposta desse jogo

de prognóstico, o projeto teve uma prospecção massiva para múltiplos jogadores. A

partir da apresentação de uma situação-problema que colocava os Estados Unidos

em crise porque quase 22% dos norte-americanos não conseguiam acesso à

gasolina, os jogadores eram convidados a pensar em possíveis resoluções de forma

colaborativa e participativa. Mais de dois mil jogadores online participaram durante

seis semanas dessa simulação colaborativa em prol de um prognóstico imersivo do

futuro.

Além de se construir modelos que considerem os participantes e utilizem

mecânicas e estéticas de games, deve-se considerar o contexto, no caso, o

educacional, com o fim de direcionar objetivos, propostas e práticas, levando em

conta as motivações e as habilidades a serem trabalhadas. Os elementos e as

técnicas dos games também devem ter foco nas implicações do contexto. A escolha

de elementos como feedback, regras, conflitos, níveis, tempo etc. vai depender dos

objetivos de aprendizagem e como esses elementos e técnicas podem contribuir

com esses objetivos.

No entanto, é importante discutir o uso de alguns dos elementos e das

técnicas dos games em propostas e materiais didáticos. Um uso recorrente é o de

pontuação e ranking, elementos de game que, no contexto da educação, têm função

similar aos sistemas avaliativos tradicionais, como a nota e o ranqueamento. No

entanto, a gamificação apresenta outras possibilidades avaliativas, como o feedback

e a colaboração entre participantes com foco na aprendizagem coletiva.

Kapp (2012) afirma que a gamificação é, geralmente, utilizada para tornar

a aprendizagem mais fácil e trivial. Nesse contexto, vale ressaltar que elementos de

recompensas como pontuação e ranking não devem ser excluídos das propostas

gamificadas para a educação. Entretanto, deve-se verificar se esses sistemas,

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ambientes, materiais didáticos etc. serviriam às práticas do paradigma de

aprendizagem interativa.

A gamificação, no entanto, apresenta outras possibilidades avaliativas,

como o feedback e a colaboração entre participantes com foco na aprendizagem

coletiva. Há elementos, inclusive, que promovem o engajamento de diferentes perfis

de jogadores. Por esse motivo, é necessário compreender que a gamificação, assim

como os jogos e os games, possibilitam a identificação de tipos de jogadores e

padrões de jogabilidade.

Bartle (1996, apud Kapp, 2012) elabora o perfil dos jogadores com base

nos arquétipos, separando-os de acordo com suas características, preferências de

interação e pelo comportamento que costumam demonstrar nos games. O autor

descreve os seguintes perfis: a) predadores (killers), perfil mais competitivo, com

foco nos outros jogadores; b) conquistadores (achievers), perfil mais focado em

ações, com o objeto de acumular conquistas; c) socializadores (socializers), perfil

mais comunicativo, que tem como objetivo interagir com os demais jogadores e

comunicar-se com eles; d) exploradores (explorers), perfil mais desbravador, que

tem o objetivo de interagir com o mundo, descobrindo segredos, easter eggs, novas

funcionalidades etc.

Cada aluno/jogador pode ser enquadrado em um perfil porque possui

certas características específicas, mas pode apresentar traços dos demais perfis de

jogadores. De acordo com o autor, os tipos predadores e conquistadores são os

ativos, que querem conquistas; a diferença é que os predadores gostam de rankings

e competições contra adversários enquanto os conquistadores gostam do desafio

em si.

Os tipos socializadores e exploradores são mais interativos. Os

socializadores são mais comunicativos e gostam de compartilhar e interagir com os

outros jogadores, enquanto os exploradores gostam de interagir com o próprio jogo,

explorando ao máximo suas possibilidades.

Marczewski (2015, p. 65) acredita que os perfis criados por Bartle são

constantemente mal interpretados ao serem aplicados aos sistemas gamificados.

Por esse motivo, ele elaborou um hexágono de jogadores, separando-os em: seis

tipos de usuários (em um nível básico), sendo quatro tipos intrínsecos:

conquistadores (achievers), socializadores (socialiser), filantropos (philanthropist) e

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espíritos livres (free spirit), motivados pelos respectivos princípios de domínio,

relacionamento, propósito e autonomia, e outros dois tipos com motivações menos

radicais: disrruptivos (disruptors) e jogadores (players).

Resumidamente, socializadores são movidos por relacionamento e

querem interagir com os outros e criar conexões sociais; livres são motivados pela

autonomia com foco em criar e explorar; conquistadores, pelo domínio e procuram

aprender coisas novas e melhorar a si mesmos; filantropos, pelo propósito,

enriquecendo a vida dos outros de alguma maneira sem expectativa de recompensa;

jogadores são motivados basicamente por recompensas; desruptivos são movidos

pela mudança, promovendo mudanças positivas ou negativas (MARCZEWSKI,

2015, p. 70).

Apesar da ampliação proposta por Marczewki, vamos nos focar em

analisar como e se os conceitos de Bartle podem ser incorporados na gamificação

no âmbito educacional com o objetivo de apropriarmos esses conceitos das práticas

educativas.

Para tanto, é importante refletir sobre como é possível elaborar um

material que propicie que cada um dos perfis se sinta motivado, apresentando uma

proposta que garanta o engajamento de todos e, também, adeque a estratégia ao

contexto educacional, possibilitando a vivência de diferentes perfis de forma a

ampliar a experiência dos alunos enquanto jogador.

A presente pesquisa considera ambas as propostas em relação aos perfis

como elemento da gamificação e parte da proposta de elaboração pedagógica e

editorial do material, cuja intenção deve estar relacionada à possibilidade de

engajamento dos alunos.

O engajamento é uma das grandes intenções da gamificação. Isso porque

as etapas de um game podem se aproximar de situações e contextos da vida real.

Entretanto, diferentemente da vida real, na atividade, sistema ou material

gamificado, os alunos podem errar com maior frequência, retomando ou

recomeçando sua ação sempre que desejarem ou acharem necessário.

E, embora a gamificação suponha regras, que envolvem cognitiva e

emocionalmente os alunos na construção de sua identidade e posicionamento social

diante de desafios cotidianos, ela possui um grande benefício, que são as realidades

alternativas. Segundo McGonigal (2012),

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em comparação aos jogos, as tarefas do mundo real não nos envolvem tanto. Eles nos motivam a participar mais integralmente daquilo que estamos fazendo. Participar integralmente em algo significa estar automotivado ou autodirecionado, intensamente interessando e genuinamente entusiasmado. Se somos forçados a fazer algo ou se o fazemos com pouca convicção, não estamos de fato participando. Se ficamos esperando passivamente, não estamos de fato participando. (MCGONIGAL, 2012, p. 130)

Desse modo, podemos afirmar que a gamificação, incorporada ao

contexto educacional, pode propiciar e potencializar o desempenho dos alunos e

tornar a aprendizagem mais envolvente, recompensadora e colaborativa, ainda que

a aprendizagem seja o objetivo do material e não a gamificação, sendo possível

também trazer práticas da cultura digital que podem, inclusive ser tematizadas.

Vale ressaltar que a simples aplicação desses elementos não torna a

gamificação um modelo inovador para a educação, pois, dependendo da intenção,

pode ser apenas mais uma estratégia que repete padrões tradicionais dentro de uma

nova estética.

1.2.2 Narrativa transmídia na educação

Antes de propor o uso da narrativa transmídia enquanto estratégia, é

necessário apresentar algumas definições do conceito, emprestado da área de

comunicação, para, em seguida, conhecermos seus elementos e suas

potencialidades, de modo a compreender a necessidade de sua apropriação para o

âmbito educacional.

O termo transmedia, inglês para transmídia, aparece pela primeira vez na

área de comunicação no artigo Playing with Power in Movies, Television, and Video

Games: From Muppet Babies to Teenage Mutant Ninja Turtles, da educadora Kinder

(1991, p. 38), que vislumbrou um sistema chamado transmedia intertextuality, que

indicava como uma narrativa pode contribuir para projetos de entretenimento infantil,

por meio do uso de diferentes mídias e por prever níveis de interação e consumo de

produtos.

Em 2000, a designer Laurel escreve o artigo Creating Core Content in a

Post-Convergence World (2000, s/p), apresentando a importância de se pensar a

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transmídia desde o início de um projeto, definindo o significado de think transmedia.

Nesse sentido, o termo “transmídia” foi usado para designar uma mudança de

paradigmas devido à forma como a cultura estava sendo produzida e consumida e

como o conteúdo estava sendo (re)organizado em diferentes plataformas.

Mas a definição mais conhecida é a de Henry Jenkins, que começou a ser

delineada no início do século XXI. O pesquisador utiliza o termo pela primeira vez

em seu artigo Convergence? I Diverge (2001, p. 93), ao discutir a convergência de

mídias e apresentar o conceito de transmedia storytelling, ou narrativa transmídia,

como uma forma de convergência de mídias por meio da promoção de uma

narrativa, que teria seu desenvolvimento em múltiplas mídias para o entretenimento.

Em seu artigo Transmedia Storytelling, Jenkins (2003) define melhor o

conceito de narrativa transmídia e afirma que o futuro da indústria do entretenimento

está na capacidade de criar e disseminar histórias e personagens. Para o autor, a

convergência era possível a partir de uma grande história, que se utiliza do potencial

de cada mídia de forma autônoma para contar uma parte dessa narrativa:

Na forma ideal de narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor para que a história possa ser introduzida num filme, expandida através de televisão, romances e quadrinhos, e seu mundo pode ser explorado e experimentado também através de jogo. Cada entrada da franquia precisa ser bastante autossuficiente para permitir o consumo autônomo. (JENKINS, 2003, p. 02)

O conceito foi reelaborado pelo próprio Jenkins, em 2006, no capítulo “Em

busca do unicórnio de origami”, em Cultura da Convergência, quando o autor afirma

que a convergência é possível quando se utiliza o potencial de cada mídia de forma

autônoma para contar uma parte de uma grande história. Essa é a definição que

serve como base para sua conceituação.

Ao analisar a trilogia de Matrix das irmãs Wachowski, o autor afirma que

nenhuma outra franquia exigiu tanto de seu público desde o teaser do filme com a

pergunta O que é Matrix?, que levou as audiências a utilizarem sites em busca da

resposta, às ampliações e expansões do universo criado para games, animes, HQs

e livros.

Jenkins apresenta Matrix como um exemplo de entretenimento, narrativa

sinérgica e autoria cooperativa, visto que as empresas especializadas colaboraram

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desde o início para criação de conteúdos adequados a cada uma das mídias. Em

sua opinião, a franquia17 foi concebida pela inteligência coletiva para a convergência,

pois a história é ampla para uma única mídia e, por isso, foi projetada para ser

contada por diversas mídias, de forma autônoma. Desse modo, o autor define

narrativa transmídia como um processo que:

Integra múltiplos textos para criar uma narrativa tão ampla que não pode ser contida em uma única mídia [...] Uma história transmídia desenrola-se através de múltiplas plataformas de mídia, com cada novo texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal da narrativa transmídia, cada meio faz o que faz de melhor - a fim de que uma história possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisão, romances e quadrinhos; seu universo possa ser explorado em games ou experimentado como atração em um parque de diversões. Cada acesso à franquia deve ser autônomo, para que não seja necessário ver o filme para gostar do game, e vice-versa. (JENKINS, 2009[2006], p. 137-138)

Entretanto, Jenkins chama a atenção para dois fatos importantes da

narrativa transmídia: (1) utilizar esse modelo não significa, necessariamente,

aproveitar cada canal em sua potencialidade; (2) não existem bons critérios estéticos

para avaliar essas histórias e, por isso, as experiências são pouco conhecidas e

avaliadas. Posto isso, o autor reitera que nem todos os sistemas de franquias com

narrativas que se utilizam de diferentes mídias podem ser considerados transmídia.

Embora ainda seja um conceito e uma prática em constante evolução,

para consolidar a definição do termo e estabelecer parâmetros para a transmídia, é

preciso diferenciá-la dos conceitos de multimídia e crossmídia18.

17

Franquias de mídia são sistemas de venda de marca, direitos, infraestrutura, know-how etc. O termo segue o mesmo princípio do modelo utilizado no varejo desde os meados do século XX. Johnson (2009) define franquia como sendo uma sinergia que se constituiu em uma estrutura a expansão narrativa por meio de múltiplas mídias da experiência cultural. Segundo o autor, “toda narrativa transmídia é uma forma de franquia, mas nem toda franquia consegue ser classificada como narrativa transmídia”. (JOHNSON, 2009, p. 159).

18 Muito embora seus respectivos modelos narrativos apresentem pontos em comum, como interatividade,

intertextualidade e multissemiose, não são formas semelhantes e, portanto, não podem ser indicados como sinônimos.

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Para esclarecer as diferenças, apresentamos as especificidades de cada

termo:

TERMO SIGNIFICADO COMO FUNCIONA PÚBLICO EXEMPLO

MULTIMÍDIA Multi de

“muitos” ou “múltiplos”

A multimídia integra múltiplos modos de

expressão em uma única aplicação ou mídia.

A ação requerida do público é mais passiva e, muitas

vezes, a proposta é transmissiva.

Objeto de aprendizagem

(OA) pode combinar

arquivos de texto, imagens e vídeo, e ser acessado por uma ou mais

interfaces.

CROSSMÍDIA “Cruzar” ou “atravessar”

Na crossmídia, o conteúdo é distribuído por meio de diferentes mídias para atingir o

público, mas tudo acontece sem que a

mensagem tenha alteração significativa de

um meio para outro. O sentido básico do

termo é que uma pessoa possa acessar o mesmo conteúdo por diferentes

meios.

A ação requerida do público é

participativa, porém limitada e as ações

oriundas a cada mídia, que podem

ter proposta transmissiva ou

interativa.

Adaptação cinematográfica ou para game dos livros da saga Harry

Potter.

TRANSMÍDIA

“Ação de ir além de”, ou

seja, apresenta um conteúdo

que se sobressai às mídias e vai além delas

A transmídia designa diferentes funções às diversas mídias, que podem ser ou não

multimídia, híbridas ou multimodais, tradicionais

ou digitais, nas quais cada conteúdo e sua respectiva mídia têm

significação autônoma, funcionando de forma

individual e coletiva, de formas distintas.

A ação requerida do público é

participar ativamente por meio de ações

disparadas pelas diferentes mídias e seu engajamento é

decisivo para a integração,

composição e/ou construção do

universo proposto.

Franquias de universos que

integram filmes, quadrinhos, games etc.,

cujo conteúdo é autônomo em cada uma das mídias, como, por exemplo Matrix e Star

Wars.

Figura 2 – Quadro diferenciando multimídia, crossmídia19

e transmídia. Fonte: Produção nossa, baseada nos conceitos de Jenkins, 2009[2006].

A multimídia conta uma única história de diferentes maneiras, por meio de

diferentes linguagens combinadas. Nesse sentido, podemos afirmar que a multimídia

integra múltiplos modos de expressão dentro de uma única aplicação, por exemplo,

um objeto de aprendizagem (OA) que combina texto escrito, imagens e vídeo,

19

O exemplo apresentado para crossmídia de Harry Potter refere-se exclusivamente a história do personagem, contada nos livros, adaptada para o cinema e para os games. Esse é um exemplo de franquia que teve início como crossmídia e que passou a ser transmídia por meio da extensão do universo e ampliação de histórias. Entretanto, o que foi ampliado foi a história do universo, não do personagem, característica da narrativa transmídia como será indicada a seguir.

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tornando-os uma única mídia, embora multimodal e multissemiótica, tem fim em si

próprio.

Já a transmídia não tem como pretensão resumir suas intenções em

apenas uma única mídia. A narrativa é construída com a integração das mídias, e,

portanto, os suportes, canais e dispositivos, que se manifestam na integração de

suas diversas realizações, que incluem a participação da audiência. Nesse sentido,

podemos afirmar que a transmídia designa diferentes funções a diversas mídias, que

podem ser ou não multimídias.

Outra distinção importante é referente ao público e sua atuação. No

contexto da multimídia, a ação requerida é mais passiva e, muitas vezes, a ação é

transmissiva. Na transmídia, o público é convidado a participar ativamente por meio

de ações disparadas pelas diferentes mídias e seu engajamento é decisivo para a

integração da composição proposta.

No que diz respeito à narrativa multimídia, esta explora os recursos

multimidiáticos, como vídeo, infográficos etc., com o objetivo de construir um

discurso unificado, enquanto que a narrativa transmídia passa de uma mídia a outra

para contar histórias construídas a partir de uma grande narrativa, mas com

narrativas distintas e complementares, totalmente independentes.

Entretanto, ambas são hipermidiáticas, segundo Longhi (2009, p. 192),

pois “a hipermídia atua para a criação de narrativas nas quais o acompanhamento

de informações adicionais ao texto significa, por si só, um elemento fundamental da

informação online”.

O termo “crossmídia”, do inglês crossmedia; que significa “cruzar” ou

“atravessar” das mídias, por sua vez, refere-se ao uso de mais de uma mídia para

levar o mesmo conteúdo às audiências, apresentando-o por meio de diferentes

mídias. O tipo de narrativa na crossmídia é, portanto, um projeto que se vale de

multiplataformas ou diversas mídias, mas que divulga, basicamente, a mesma

história, com alterações e modificações necessárias e oriundas às adaptações de

cada mídia.

Para Dena (2010, p. 08), a crossmídia é uma estrutura narrativa de

caráter reticular, capaz desenvolver e expressar-se por meio da convergência de

multiplataformas, assim como a narrativa transmídia. A partir dessa afirmação,

Jenkins (2011) diferencia as narrativas crossmídia e transmídia, afirmando que a

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narrativa crossmídia vale-se de diversas mídias, mas para divulgar a mesma

história. Para o autor, embora a história seja adaptada de uma mídia para a outra, as

alterações sofridas são intrínsecas à linguagem da mídia escolhida, que pode ser

altamente literal ou transformada, mas para atender única e exclusivamente a

adaptação, não tendo como objetivo a extensão da narrativa ou a integração

midiática, como acontece na narrativa transmídia.

Para Jenkins (2009[2006]), a princípio, a narrativa transmídia, parte de

uma grande história, que se divide em várias histórias autônomas, distribuídas entre

as diferentes mídias, exatamente aquelas que possam expressar ou contextualizar

melhor sua parte do universo narrativo. Quando duas ou mais mídias convergem,

podendo ser mídias antigas ou novas, impressas ou digitais, as audiências têm a

noção expandida da grande história, além de serem convidadas a participar de

forma coletiva da construção de sentido de cada etapa e em cada mídia.

Em 2011, o autor revê esse conceito a partir da provocação de Dena

(2010) e, afirma que, em alguns casos, a narrativa de projetos, que não era em sua

gênese transmídia, pode passar a ser considerada assim ao passo que, ao se valer

de diversas mídias, é adaptada e estendida, procurando adicionar à história novas

informações, configurando alterações significativas e mudanças complexas no

mundo da narrativa.

Pratten (2015[2011], p. 02) complementa a proposta de Jenkins

(2009[2006]) apresentando as diferenças entre crossmídia e transmídia no contexto

das franquias de entretenimento, relacionando a crossmídia às franquias de meios

tradicionais, cuja soma apresenta-se como insatisfatória, e a transmídia como a

proposta atual, que propõe a formação de um todo satisfatório com a soma das

partes:

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Figura 3 – O que é transmídia?. Fonte: Pratten, 2015, p. 2, tradução nossa.

Embora a narrativa transmídia possa ser um processo complexo, sua

definição destaca elementos que são essenciais para a sua composição. A seguir,

apresentamos os três principais elementos que definem o conceito de Jenkins

(2009[2006]), que nos permitiu análise da narrativa transmídia enquanto estratégia

para a elaboração de materiais didáticos: a narrativa, o uso de diferentes mídias por

meio de estratégia multiplataforma e a participação da audiência.

Existem muitas nuances em cada um dos elementos indicados e na forma

como eles se relacionam e influenciam-se. Abordaremos brevemente algumas

questões importantes de cada um desses elementos, que são essenciais para o

processo de desenvolvimento da narrativa transmídia.

O primeiro elemento, a narrativa, apresenta uma atualização para o

sentido etimológico da palavra storytelling, ou narrativa, em português, a partir da

definição do termo de Jenkins (2009[2006]). Nesse sentido, o ato de narrar, uma das

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mais antigas manifestações culturais que acompanha o ser humano ao longo dos

séculos, ganha novos sentidos e assume diferentes significados. Segundo Barthes:

A narrativa está presente em todos os tempos, em todos os lugares, em todas as sociedades, começa com a própria história da humanidade; não há, nunca houve em lugar nenhum povo algum sem narrativa; todas as classes, todos os grupos humanos têm as suas narrativas, muitas vezes essas narrativas são apreciadas em comum por homens de culturas diferentes, até mesmo opostas: a narrativa zomba da boa e da má literatura: internacional, trans-histórica, transcultural, a narrativa está sempre presente, como a vida. (BARTHES, 1992, p. 103-104)

O fato é que estamos familiarizados com a estrutura narrativa tradicional

que ganhou a versão canônica, coesa e coerente, migrando da cultura oral para a

cultura escrita, ainda que a experimentemos de diferentes formas, sobretudo

atualmente, no contexto do ciberespaço. Devemos nos lembrar de que mesmo uma

boa história sendo a espinha dorsal de uma experiência transmídia ela não se limita

a uma única narrativa.

Uma história tradicional geralmente apresenta uma estrutura que suporta

o desenvolvimento de um conjunto de aspectos principais (enredo, cenários,

personagens etc.) e fornece detalhes sobre o contexto imediato do mundo em que

seus elementos existem. Esse nível de detalhe pode facilitar a narração da história.

Entretanto, é possível explorar o universo criado, ampliando e detalhando

as informações sobre esses elementos. Trata-se, portanto, de um lugar de

possibilidades e extensões da história principal, que permite criar muitos outros

personagens, cenários e ações. É nesse contexto que a experiência de narrativa

transmídia funciona.

Esse modelo narrativo diferencia-se dos convencionais por ser complexo

e criativo e, para isso, requer uma convergência de teorias e metodologias, que

representam uma tentativa de integração e reunião de pressupostos antigos e

contemporâneos das formas de narrativas.

Partindo das teorias narrativas classificadas como tradicionais, a narrativa

transmídia apoia-se nos modelos de narrativas da tragédia e da epopeia, pois busca

no enredo uma categoria para unificar a grande narrativa e pensar na criação do

universo que, ao contrário do personagem, organiza eventos e ações segundo a

lógica da causalidade, dando forma à tragédia e à epopeia:

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Se houver uma só personagem, isso não implica, como pensam alguns, unidade de enredo. Com efeito, numa só pessoa se concentra uma infinidade de acontecimentos, alguns dos quais não se podem reduzir a uma unidade; e também há muitas ações de uma só pessoa com as quais não se forma uma ação única. (ARISTÓTELES, 2015, p. 104)

Diante dessa dicotomia entre história e discurso; conteúdo e forma, os

elementos que constituem uma história distinguem-se do modo como ela é narrada.

Portanto, torna-se necessário separar estrutura de informação da experiência

narrativa maior, ou seja, distinguir fábula e trama, afinal, “toda narrativa é uma

escolha e uma construção; é um discurso, não uma série de acontecimentos”

(TODOROV, 2008[1969], p. 108).

Propp (2006[1984], p. 110) compreende a fábula (também denominada

história ou diegese) enquanto o plano da história e a trama (intriga ou plot) como o

plano do discurso. A fábula é o conjunto de acontecimentos ligados entre si e

expostos na ordem cronológica e casual, independentemente do modo como estão

dispostos na obra. Trata-se da passagem de uma situação para outra e é

caracterizada pelo conflito.

Por sua vez, a trama é o conjunto de acontecimentos na ordem e na

sequência com que aparecem dispostos na obra, ou seja, na construção artística.

Trata-se, portanto, de uma apropriação adequada à narrativa transmídia, pois,

segundo Gaudreault e Marion (2012, p.114), “a fábula é independente em relação às

mídias, [mas] isso não significa que é possível referir-se àquela fábula sem pensar

numa mídia”.

Desse modo, a narrativa pode possuir camadas de significação

autônomas, cuja estrutura pode ser isolada da mensagem como um todo e a

estrutura da história recontada de forma independente das técnicas que são usadas

para expressá-la. A composição narrativa também considera a transportabilidade da

história para sustentar o argumento de que é uma estrutura independentemente de

qualquer meio (BREMOND, 1999 p. 20), mesmo admitindo que o meio possa se

especializar em determinados efeitos narrativos em detrimento de outros.

Por fazer convergir antigas e novas tecnologias, a narrativa transmídia

integra o conceito de hipertexto com o pressuposto de que há uma ligação cultural

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entre textos, de modo que nenhuma obra existe separada de outras. No âmbito da

narratologia, o hipertexto possui uma dupla significação: a intertextualidade e o

desenvolvimento de modelos narrativos que enfatizam as propriedades intertextuais

na produção de discursos narrativos: “cada texto constrói-se a si próprio como um

mosaico de citações, cada texto é a absorção e transformação de outro texto”

(KRISTEVA, 1974, p. 64).

Em relação às teorias narrativas contemporâneas, apesar de

transportarem a herança teórica e metodológica da narrativa tradicional, elas

configuram abordagens distintas, derivadas de algumas especificidades das

tecnologias digitais e do impacto dos modelos de representação intrínsecos das

mídias digitais, seja por questões de remidiação de conteúdos, convergência

midiática e/ou hibridização.

Murray (2003), por exemplo, indica a interatividade como um caráter

próprio desse modelo narrativo, ao enfatizar as semelhanças estruturais entre jogos

e histórias, ressaltando que ambos pressupõem uma competição entre oponentes

com objetivos distintos e materializam-se na forma de puzzles. De certa forma, o

puzzle, tanto na narrativa como no jogo, pressupõe uma “disputa entre o

leitor/jogador e o autor/designer do jogo” (MURRAY, 2003. p.126).

A autora considera que esses produtos dos meios digitais são novas

formas de contar histórias, concebidas e desenvolvidas para refletir as aspirações

dos seus utilizadores e a cultura pós-moderna em que habitam.

Nesse mesmo contexto, Murray apresenta o conceito de imersão, que é

ambivalente e polissêmico. A imersão assume-se como um ideal estético,

decorrente da invisibilidade do meio. Para a autora:

Quando entramos em um mundo ficcional, fazemos mais do que apenas ‘suspender’ uma faculdade crítica; também exercemos uma faculdade criativa. Não suspendemos nossas dúvidas tanto quanto criamos ativamente uma crença. Por causa de nosso desejo de vivenciar a imersão, concentramos nossa atenção no mundo que nos envolve e usamos nossa inteligência mais para reforçar do que para questionar a veracidade da experiência. (MURRAY, 2003, p. 111)

Apesar de as narrativas orais e escritas proporem modalidades

discursivas não lineares e/ou multilineares durante os séculos - como é o caso de A

Odisseia, que se configura em uma coleção de textos orais, que foram organizados

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em uma narrativa de autoria única, unificada e linear; com o advento das tecnologias

digitais e do ciberespaço, houve a emergência de novos formatos e modalidades

configuradas nesses contextos.

Aarseth (2006) apresenta o termo “cibertexto”:

O conceito de cibertexto centra-se na organização mecânica do texto, como parte integrante do intercâmbio literário. No entanto, também centra a sua atenção sobre o consumidor, ou usuário, do texto, como mais uma figura integrada que decide os caminhos a percorrer. O desempenho do seu leitor realiza-se todo no seu cérebro, enquanto que o do utilizador do cibertexto também se exerce num sentido extranoemático20. (AARSETH, 2006, p. 19)

E apresenta o conceito de literatura ergódica21:

Durante o processo cibertextual, o usuário terá efetuado uma sequência semiótica, e este movimento seletivo é obra de uma construção física que os diversos conceitos de “leitura” não contemplam. Esse fenômeno é o que chamo de ergódico, utilizando um termo retirado da física que deriva das palavras gregas ergon e hodos, que significam “obra” e “via”. Na literatura ergódica, exigem-se diligências fora do comum para permitir ao leitor percorrer o texto. (AARSETH, 2006, p. 20)

Apesar das atuais preponderâncias multi e não lineares estarem

relacionadas aos paradigmas das tecnologias digitais e do ciberespaço, não são, de

todo, exclusivas do cibertexto. A ruptura com a linearidade era já preconizada por

algumas tendências literárias, que se propunham a libertar o leitor da linearidade

imposta pelo autor e, também, pelo surgimento de outras tecnologias, que

contemplavam a possibilidade de o texto gerar mais do que uma linha discursiva.

Para tal, Johnson (2005, p. 52) afirma que há formas de relação entre a audiência e

as características da ficção seriada que confirmam esse fato, tais como os enredos

múltiplos.

20

Extranoemático diz respeito a um processo que ocorre fora dos limites do pensamento humano. Nesse

sentido, o utilizador do cibertexto faz um esforço extranoemático não trivial que vai além de ações como mover os olhos com o passar da página.

21 “Literatura ergódica”, termo cunhado por Espen J. Aarseth, que diz respeito a obras que demandam um

processo de leitura não trivial. A partir de esforço relevante de leitura, o leitor atravessa o texto, que apresenta regras próprias para uso e constrói seus próprios requisitos de leitura, muitas vezes hipertextual. A literatura não-ergódica é aquela cujas obras demandam uma leitura trivial, pois requerendo do leitor, em termos extranoemático, apenas ações como mover os olhos e passar as páginas.

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Entretanto, a serialidade é diferente em um contexto de narrativa

transmídia. O modelo não corresponde ao mesmo da serialidade presente em uma

televisão novelística, mas pode ser caracterizado pela serialidade, conceituada por

Umberto Eco:

Muita arte, portanto, foi e é serial; o conceito de originalidade absoluta, em relação a obras anteriores e as próprias regras do gênero, é um conceito contemporâneo, nascido com o romantismo; a arte clássica era amplamente serial e as vanguardas históricas, de vários modos, deixaram em crise a ideia romântica da criação como estreia no absoluto (com as técnicas de colagem, os bigodes na Gioconda etc.). (ECO, 1989, p.133)

Não é necessária uma história sequencial. Pode-se interagir com muitos

elementos de histórias diferentes, mas relacionados, para reunir uma imagem rica

do mundo da história maior. Pode-se propor acessar tantas ou poucas histórias,

qualquer ordem e de qualquer mídia.

Isso porque a narrativa transmídia tem se apresentado cada vez mais

como arte de construção de universos, uma vez que se utiliza de estratégias que

impulsionam e promovem desdobramentos das histórias nas múltiplas plataformas

de mídia, levando em consideração ampliações dessas histórias e tendo como

referência a coesão e a coerência do universo criado inicialmente, que se

caracteriza como imersivo, colaborativo e interativo na recepção e na participação

das audiências:

À medida que os artistas criam ambientes atraentes que não podem ser completamente explorados ou esgotados em uma única obra, ou mesmo em uma única mídia. O universo é maior do que o filme, maior até, do que a franquia – já que as especulações e elaborações dos fãs também expandem o universo em várias direções. (JENKINS, 2009[2006], p. 158)

O universo criado é a espinha dorsal e, a partir dessas possibilidades,

podem ser criadas, compartilhadas e adicionadas outras informações. Todas as

histórias completas separadas em si mesmas, mas todas seguindo as mesmas

regras da realidade que as fazem claramente pertencer a um universo central maior,

mais complexo e comum. Experimentar histórias distintas que se encaixam em um

mundo compartilhado maior é um tipo de serialidade. E a maior parcela de

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desenvolvimento é progressivamente construída a partir de uma série de eventos

lineares e sequenciais:

Ao desenvolver uma narrativa que se estende por múltiplas plataformas de mídia, o mundo deve ser considerado um personagem principal da própria narrativa, porque muitas narrativas transmídias não são a história de uma personagem, mas a história de um mundo. Especial atenção deve ser dada ao desenvolvimento de uma fase em que múltiplas histórias (muitas vezes em diferentes tipos de mídias) podem surgir, e cada história tem que manter a coerência de mundo. (LONG, 2007, apud MASSAROLO, 2011, p. 66)

O uso de múltiplas plataformas de mídias é o segundo elemento essencial

da narrativa transmídia. Jenkins (2011) ressalta a importância da narrativa

transmídia na contemplação de letramento midiático22. Isso porque, ainda segundo o

autor, os professores só consideram o uso de tecnologias quando há computadores

na escola.

Entretanto, propõe-se que a narrativa transmídia, enquanto estratégia

utilizada na elaboração de materiais didáticos, pode propiciar a contribuição para

práticas educativas e promover maior participação dos alunos, com o objetivo de

propiciar experiências, individuais e coletivas, de integração com o conteúdo, de

participação na própria aprendizagem e de interação e colaboração.

Ainda sobre uso de diferentes mídias por meio de estratégia

multiplataformas, Jenkins (2009[2006], p. 49) afirma que a narrativa transmídia

“refere-se a uma nova estética que surgiu em resposta à convergência das mídias –

uma estética que faz novas exigências aos consumidores e depende da participação

ativa de comunidades de conhecimento”.

Trata-se, portanto, de um mundo estético a ser explorado. Por esse

motivo, a narrativa, conforme destacado anteriormente, não é apenas adaptada a

cada mídia, mas é adequada de modo que as histórias sejam autônomas e tenham

significado em si, ao mesmo tempo em que propiciam que uma grande narrativa

tenha lógica por meio da integração de uma, mais ou todas elas.

22

Defende-se que, em certa medida, o conceito de letramento midiático aproxima-se, em certos aspectos, da

definição de multiletramentos de modo a relacionar práticas e habilidades. Entretanto, esses conceitos não se sobrepõem. A diversidade cultural, por exemplo, argumento da definição dos multiletramentos, não é igualmente tratada, do mesmo modo que os letramentos midiáticos evidenciam mais as habilidades enquanto os multiletramentos consideram mais as práticas. De qualquer modo, há uma proximidade nos conceitos por meio do acesso aos textos por diversas mídias, sobretudo por conta da cultura digital.

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Cada uma das mídias integradas deve envolver, de alguma forma, as

audiências no ato de contar, criando extensões e propondo a ampliação das

histórias do universo construído. Nesse contexto, as tecnologias digitais contribuíram

para a sua produção e sua distribuição.

Os meios mais tradicionais de acesso às narrativas, como os livros ou os

filmes, ganharam reforços com o advento dos games, realidade virtual e realidade

aumentada, cinema interativo, mídias sociais etc. Podemos acessar o que gostamos

e quando queremos. As TDIC aumentaram consideravelmente as oportunidades da

narrativa transmídia e as maneiras tanto de alcançar as audiências como das

audiências participarem da narrativa.

Entretanto, para que essa sinergia seja possível, duas questões

complexas são postas: a da autoria cooperativa, que envolve a questão da cocriação

e do copyright, e a da criação de um universo canônico desde a prototipagem. Para

que o uso de multiplataformas seja possível, é preciso que exista cocriação entre os

diferentes experts, de modo que as diferentes empresas colaborem, criando as

respectivas narrativas considerando seus respectivos setores. Entretanto, esse nível

de integração e coordenação narrativa e de criação, além de lógica econômica tem

que estar alinhado estratégica e comercialmente.

Geralmente, quem detém a direção, bem como os direitos, são os

grandes conglomerados de mídia, que incentivam as equipes criativas a pensar em

termos de sinergia e franquia: “até agora, as franquias transmídias mais bem-

sucedidas surgiram quando um único-criador, ou uma unidade de criação, detinha o

controle” (JENKINS, 2009[2006], p. 150).

Outra questão é referente ao uso de multiplataformas em relação à

criação de um mundo canônico, ou seja, quando as estratégias de narrativa

transmídia são formuladas na protogênese do projeto. Segundo Jenkins

(2009[2006], p. 149), para que a narrativa transmídia funcione, ela precisa ser

concebida como tal desde o início.

Long (2007, apud MASSAROLO, 2011, p. 65) afirma que, no contexto da

narrativa transmídia, o potencial significativo da história não pode ser aproveitado e

expandido para as mídias e que ele deve ser concebido como canônico desde o

início. Por esse motivo, o autor considera adaptações redundantes, uma vez que

não têm a distinção como um elemento chave.

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Para Jenkins (2011, p. 19), entretanto, conforme indicado anteriormente,

há distinção entre adaptação e extensão. A adaptação repete a mesma história de

uma mídia para outra, enquanto que a extensão procura criar, adicionar algo novo à

história existente nesse processo. As adaptações podem ser altamente literais e

representam uma interpretação do trabalho em questão, não sendo apenas uma

reprodução, de modo que todas as adaptações até certo ponto aumentam a

amplitude de significados associados a uma história. Entretanto, não fazem parte da

narrativa transmídia.

Segundo o autor, as extensões procuram adicionar algo à história

existente à medida que se move de um meio para outro:

Nesse sentido, as extensões diegéticas23 formuladas estrategicamente na protogênese do projeto podem causar deslocamentos e tensões no interior do mundo canônico, tendo em vista que nem todos os componentes da história destinam-se a ser lidos e/ou experimentados para que possam ser compreendidos. (MASSAROLO, 2011, p. 68)

Para Jenkins, as histórias de fãs, por exemplo, podem ser consideradas

extensões que contribuem com a narrativa original caso construam argumentos por

meio de novas histórias.

Segundo o autor, uma boa história de fã referencia eventos-chave ou

pedaços de diálogo como evidência para dar suporte a sua interpretação particular

dos motivos e ações dos personagens: "a boa fanfiction mostra um profundo

respeito pelo que gerou a fagulha na imaginação ou curiosidade do escritor-fã.

Fanfiction é especulativa, mas também é interpretativa. E mais que isso, é criativa"

(JENKINS, 2011, p. 20).

Isso é possível, pois, uma vez que as comunidades de fãs evoluíram,

conquistando espaços, sobretudo, online, seus membros dedicaram-se à exploração

23

”Diegese” é um termo de origem grega, divulgado pelos estruturalistas franceses, que, no contexto da narratologia e dos estudos literários, diz respeito à realidade na dimensão ficcional da narrativa, sendo designado a partir do conjunto de ações que formam a história, segundo princípios cronológicos. Para Fechine (2013), em uma extensão diegética são informações complementares relacionadas ao “mundo ficcional” que contribuem para que o enunciatário amplie a experiência narrativa, contribuindo para uma alternância entre ficção e realidade. (FECHINE, 2013, p. 45). Nesse caso, os conteúdos de extensão requerem maior engajamento de ação por parte do público.

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e à discussão de informações, fatos pouco conhecidos, histórias de personagens

menos importantes, lacunas deixadas pelos autores etc.

Cada uma das mídias permite um tipo diferente de criação de histórias,

compartilhamento, narração e experiência de engajamento. As tecnologias digitais

conectaram as audiências não apenas entre si, mas também encorajam novos tipos

de engajamento, como, por exemplo, investigação de sites, estimulando a cultura

participativa, promovendo uma migração das audiências e expandindo as

comunidades de fãs.

Por esse motivo, o terceiro elemento intrínseco à narrativa transmídia é a

audiência, ou melhor, as audiências. Segundo Murray (2003), essas obras tendem a

atrair três tipos24:

Os espectadores em tempo real e comprometidos ativamente, que precisam encontrar suspense e satisfação em cada um dos episódios; o público de mais longo prazo, que busca padrões coerentes na história como um todo... [e] o espectador navegante, que tem prazer em acompanhar as conexões entre as diversas partes da história e em descobrir múltiplos arranjos do mesmo material. (MURRAY, 2003, p. 257)

No caso da narrativa transmídia, as audiências podem experimentar

elementos de histórias diferentes e não uma história completa com começo, meio e

fim. As lacunas presentes na narrativa transmídia convidam o público a participar

como coautor, como visto anteriormente. Isso significa que há espaço para o público

desempenhar um papel ativo e preencher essas lacunas, participando da história:

As narrativas contemporâneas de longa duração incentivam novos modos de engajamento das audiências, fazendo da cultura participativa um componente central dos mundos ficcionais. (MASSARROLO, 2011, p. 62)

Quanto mais o público interage com diferentes elementos da grande

narrativa, mais são recompensados com uma compreensão enriquecida do universo.

O uso das tecnologias digitais por meio dos processos midiáticos, possibilita a

participação das audiências de modo a torná-las mais ativas e fundindo-se com a

24

Por ser um conceito que transita entre diferentes áreas, o termo “audiência”, no contexto da narrativa transmídia, pode ser apresentado em sinonímia pelos termos: “público”, “espectador” e “consumidor”.

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prática cultural participativa contemporânea. Essa interação de audiências tem

potencialidade para se tornar uma integração de comunidades, que faz parte do

conceito de inteligência coletiva.

Para Jenkins, a narrativa transmídia é uma nova estética que, além de

emergir como modelo da convergência de mídia, apresenta novas exigências às e

das audiências, contando com a participação ativa das comunidades de

conhecimento, que contribuem com a arte da construção do universo. Segundo o

autor, as audiências participam da narrativa:

Perseguindo pedaços da história pelos diferentes canais, comparando suas observações com as de outros fãs, em grupos de discussão online, e colaborando para assegurar que todos os que investiram tempo e energia tenham uma experiência de entretenimento mais rica. (JENKINS, 2009[2006], p. 49)

Essa dinâmica das histórias que compõem a grande narrativa estimula os

movimentos migratórios das audiências de uma mídia a outra e o público pode

escolher a complexidade e a profundidade da sua participação. O público

participante é impelido a perseguir “pedaços da história pelos diferentes canais,

comparando suas observações com as de outros fãs, em grupos de discussão

online, e colaborando para assegurar que todos os que investiram tempo e energia

tenham uma experiência de entretenimento mais rica.” (JENKINS, 2009[2006], p.

138).

Com o advento das tecnologias impressas e cinematográficas, o público

tornou-se um consumidor mais passivo. O começo, o meio e o fim da história eram

definitivos. Nesses contextos, as audiências têm pouca oportunidade de explorar ou

moldar a narrativa maior do que é apresentado, com exceção das próprias

produções em busca de explicações ou extensões para essas narrativas.

Por sua vez, as audiências de narrativas transmídias têm pontos de

entradas diferentes e propõem uma participação ativa da audiência. Dependendo de

quanto esforço e tempo se quer dispender com as histórias e com as diferentes

mídias, que pressupõem interatividade e compartilhamento, o público tem maior ou

menor dimensão da grande narrativa:

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As narrativas contemporâneas de longa duração incentivam novos modos de engajamento das audiências, fazendo da cultura participativa um componente central dos mundos ficcionais. (MASSARROLO, 2011, p. 62)

Com base no panorama apresentado, propomos a discussão sobre a

apropriação do uso da narrativa transmídia na educação, refletindo sobre as

diferentes possibilidades e indicando uma abordagem que nos parece apropriada

para a elaboração de novos materiais didáticos.

Em seu artigo de 2010, Transmedia Education: the 7 principles revisited,

Jenkins discute os conceitos de transmídia relacionado à educação e redefine os

princípios da narrativa transmídia para o contexto educacional. O autor afirma que,

anteriormente, esses princípios eram pensados para o modelo comercial; voltados

para o entretenimento e, por isso, deveriam ser adequados, conforme veremos a

seguir.

Isso porque, segundo Jenkins (2010), mesmo não sendo o ensino

transmídia, a narrativa transmídia apresenta grande potencial pedagógico, pois está

relacionada com a intertextualidade e com a diversidade de linguagem, além integrar

propostas que propiciem a participação ativa dos alunos, incentivando a

colaboração, o compartilhamento e o protagonismo.

Outra premissa do uso da narrativa transmídia na educação é criar

conexões entre alunos e conteúdos de aprendizagem, ainda que essa relação se dê

por meio de uma narrativa ficcional, criada a partir da construção de um universo no

qual os alunos possam interagir, participar, criar e imergir.

Nesse sentido, o uso da “narrativa transmídia” enquanto estratégia no

âmbito educacional exige que novas habilidades sejam trabalhadas, entre elas: jogar

e experimentar como forma de resolver problemas, realizar performances, apropriar-

se e produzir conteúdos remixados, ser multitarefa, desenvolver cognição

distribuída, julgar e avaliar, utilizar as mídias de forma transversal etc.

Essas são algumas das habilidades necessárias para que os alunos

sejam capazes de: afiliar-se formal e informalmente a comunidades e outras

organizações sociais dentro e fora da escola; resolver problemas de forma

colaborativa; navegar, circular e produzir conteúdos para diferentes mídias; resolver

problemas; quebrar formas tradicionais de trabalho e socialização etc.

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Ao listar algumas das propostas, situações de ensino-aprendizagem e

habilidades que a narrativa transmídia propicia enquanto estratégia no contexto

educacional, é interessante retomar essa lógica de modo a verificar se ela contribui

com a proposta do GNL de contemplar os multiletramentos.

Conforme indicado, a narrativa transmídia pressupõe propostas que

devem levar em conta a multiplicidade mídias, modos ou multissemioses, além de

poder utilizar na narrativa os textos em circulação, digitais ou não, cujos temas

podem e devem ser de interesse dos alunos para que eles se sintam motivados e

convidados à imersão.

Tendo em vista o panorama apresentado e as apropriações propostas, a

possibilidade de uso da narrativa transmídia no contexto escolar deve estar voltada

às possibilidades práticas de que os alunos se transformem em participantes e

cocriadores de significações e, ao mesmo tempo, do universo narrativo criado por

meio de sua participação.

Para que isso seja possível, é necessário verificar de que forma as

características da narrativa transmídia podem se relacionar com os princípios da

pedagogia dos multiletramentos e com as dimensões de usuário, tendo em vista os

projetos discursivos, que podem se relacionar com os elementos e movimentos

dessa pedagogia, no sentido de promover atividades que propiciem: prática situada,

instrução aberta, enquadramento crítico e prática transformadora (GNL, 1996, p. 85-

87).

Sabe-se que, assim como a cultura de fãs, que propõem a criação de

extensões diegéticas e a discussão e a análise do universo narrativo, os alunos

podem ser convidados, por exemplo, a participar de análises críticas e as propostas

podem levá-los a pensar em diferentes modos de significação e diferentes coleções

culturais.

A narrativa transmídia também apresenta possibilidades de letramentos

críticos, por meio da interpretação dos diferentes meios de circulação e da produção

de (re)designs e enunciados, além de propiciar a participação ativa dos alunos, que,

dependendo da proposta e do processor, pode ser transformadora.

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1.1.3 Gamificação, narrativa transmídia e os materiais didáticos

Apesar de constituírem dois conceitos distintos, é possível relacionarmos

a gamificação e a narrativa transmídia. Se, por um lado, a gamificação utiliza-se de

uma narrativa como elemento para motivar, envolver e promover o engajamento dos

participantes, por outro, a narrativa transmídia promove imersão, pois um de seus

principais pilares é a participação do público. Desse modo, um dos elementos que

permite relacionar ambos os conceitos é a narrativa.

A integração das estratégias na elaboração de materiais didáticos pode

potencializar suas possibilidades. A gamificação e a narrativa transmídia podem

contribuir para que a proposta pedagógica seja mais significativa e que os alunos se

relacionem com o material por meio de um universo narrativo significativo, criativo e

referenciativo, com o objetivo de reforçar o protagonismo.

A gamificação tem sido utilizada para engajar e motivar os alunos,

fazendo com que eles permaneçam em uma tarefa por um longo período de tempo e

sintam-se conectados a ela, segundo McGonigal (2012). Lazzaro (2005) identificou

que os usuários jogam principalmente pela experiência que essa estratégia

proporciona, destacando as sensações, que podem ser semelhantes às dos jogos,

dependendo da proposta, entre elas as de adrenalina, espírito de aventura, desafio

mental etc.

Já o uso da narrativa transmídia pode ser complexo e dinâmico por

promover a participação dos alunos por meio de sua estética multissemiótica, que

promove a interação, a imersão e a identificação encarnada, proporcionando um

terreno fértil para que eles possam explorar, experimentar e contribuir com a

construção do universo da história.

Segundo Sharda (2010, apud GOSCIOLA, 2012), as propostas

educativas e os materiais didáticos que envolvem o uso de narrativa transmídia

podem potencializar aprendizagens, pois permitem a participação e o engajamento

dos alunos em uma história ao mesmo tempo em que propõem atividades presentes

em seus cotidianos, como, por exemplo, o trabalho colaborativo, a pesquisa e o

compartilhamento de informações.

É importante reforçar que essas estratégias não propõem um modelo

fechado, pois suas possibilidades são abertas. Também é relevante pensarmos que,

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para que o processo de elaboração de materiais didáticos baseado nos princípios

das lógicas da gamificação e da narrativa transmídia seja realmente eficiente, é

preciso haver mediação e engajamento dos professores também.

De acordo com Fredricks, Blumenfeld e Paris (2004), podemos distinguir

três definições para engajamento: o comportamental, o emocional e o cognitivo. O

comportamental está relacionado com a participação e o envolvimento dos alunos

com atividades escolares e extracurriculares, além de condutas positivas durante a

resolução das atividades. Enquanto que o engajamento emocional envolve reações

afetivas e emocionais diante de atividades, sujeitos e outros elementos que compõe

o ambiente escolar. O cognitivo está relacionado com o investimento psicológico na

aprendizagem e é marcado pelos níveis de compreensão que se podem atingir

sobre determinado conteúdo ensinado.

Além de engajamento, a gamificação e a narrativa transmídia contribuem

para o rompimento do modelo baseado na transmissão de conteúdos e com a

inovação da educação por meio de uma mudança radical no sistema de ensino que

possibilite o alinhamento da escola com a cultura digital e da convergência.

Mais especificamente em relação ao uso da gamificação na elaboração

de materiais didáticos, para compreendermos um pouco mais suas possibilidades,

vamos retomar alguns dos elementos de jogos segundo Kapp (2012), identificando

quais deles possibilitam a aprendizagem e/ou a resolução de problemas.

Comecemos pela abstração da realidade que, na maioria dos games, cria um

modelo de realidade que pode ou não ter semelhança com o mundo real. Assim, é

comum utilizar mundos fictícios, por exemplo.

Essa abstração tem suas vantagens, como, por exemplo, possibilitar

experiências que não seriam possíveis na vida real, testar efeitos sem causar

impactos desastrosos, remover fatores estranhos ou dispensáveis, como, por

exemplo, ir ao hospital assim que o personagem se machucar, reduzir o tempo para

entender um conceito ou processo, sem tê-la aprendido de verdade etc.

Entretanto, a abstração da realidade é diferente da narrativa. A abstração

está relacionada a qualquer gênero de game, enquanto a narrativa é elaborada,

utilizando uma ou mais formas narrativas combinadas dependendo do gênero: ação,

estratégia, aventura, RPG, simulação etc.

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A narrativa no contexto da gamificação é um elemento que faz principal

correlação com a narrativa transmídia, podendo ser, inclusive, parte da grande

narrativa. Por meio dela, é possível fazer com que o usuário apresente um

comportamento esperado frente a um contexto. As histórias são utilizadas para

propor imersão e engajar, promovendo a combinação do sistema com a história e

criando uma experiência interativa para o jogador, sobretudo quando ele se

transformar em um personagem ou personalizar o sistema de acordo com o seu

gosto, ensejando motivação, sentimento de posse e controle sobre o sistema.

Muitos dos guias para roteiristas retomam a “jornada do herói”,

popularizando as ideias de Campbell (2004) e designers de games são, do mesmo

modo, aconselhados a sequenciar as tarefas que seus protagonistas devem

desempenhar em provações físicas e espirituais semelhantes. De modo análogo, se

protagonistas e antagonistas são arquétipos óbvios, e não personagens

individualizados, romanescos ou complexos, são imediatamente reconhecíveis;

esses arquétipos emergem no contexto de uma sociedade cada vez mais

fragmentada e multicultural.

Desse modo, como forma de colocar o usuário no centro da atividade,

sistema ou material gamificado, podemos convidá-lo para ser, como jogador, o herói

dentro do universo construído na narrativa transmídia. Nesse contexto, o universo

permanece sendo maior do que ele, mas ele faz parte daquele mundo. A criação da

narrativa, portanto, pode valer-se de passos que estruturam a jornada do herói:

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Figura 4 – Doze passos ou estágios da jornada do herói. Fonte: Vieira, 2015, com base em Campbell, 2004.

Relacionados à narrativa estão os desafios, que servem para orientar os

jogadores sobre as missões que devem ser realizadas. Esses desafios podem estar

relacionados a níveis que, segundo Kapp (2012) podem ser divididos em duas

categorias: de jogo e de dificuldade.

Entre os níveis de jogo estão: o primeiro nível que é o progresso do

usuário na história e o início do engajamento, o segundo nível, que é o

desenvolvimento das habilidades do usuário, e o terceiro nível, que é o motivacional

e a continuidade do usuário no jogo. Já os níveis de dificuldade contemplam: os

níveis: fácil (iniciantes), médio (maior parte dos usuários) e difícil (experts).

Elementos como conflito, competição e cooperação devem ter suas

possibilidades discutidas, uma vez que, em um game, o conflito quase sempre está

presente. Ao mesmo tempo, jogos que possibilitam mais de um jogador ou simulam

outros jogadores e envolvem competição também podem estimular a cooperação,

isso porque requerem o trabalho coletivo e colaborativo. Há também o ranking, cujo

propósito é a comparação entre os usuários e serve como uma forma de visualizar

sua progressão dentro do ambiente e gera um senso de competição entre eles.

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Segundo Kapp (2012, p. 153), o ranking é um elemento a que se deve ter atenção

na elaboração de materiais didáticos, pois está relacionada ao tipo de metodologia

que se pretende adotar e, principalmente, que tipo de alunos pretende-se formar.

Outro elemento recorrente em gamificação é o feedback, que não se trata

de mensagens diretas sobre acertos e erros, como, por exemplo, "muito bom" ou

"tente novamente". O feedback é, geralmente, dado de forma contínua, a partir do

comportamento e das ações dos jogadores, que percebem e recebem feedbacks

positivos e negativos a partir das estrutura e lógica de jogo e das próprias escolhas,

mudando ou mantendo sua posição imediatamente a partir do resultado obtido.

Há, ainda, as recompensas, que podem ser apresentadas de muitas

formas. Hunicke, LeBlanc e Zubek (2004, p. s/p), por sua vez, destacam alguns

elementos do game por seu caráter social e de coleção, e por serem mais influentes

do que outros na elaboração de uma atividade, um sistema ou um material

gamificado. Segundo os autores, uma forma de recompensa, por exemplo, são os

pontos, que servem para controlar um placar, determinar se o jogador está saindo

dos parâmetros estabelecidos para a atividade ou sistema, podendo estar

relacionados a recompensas e/ou ao progresso do usuário, fornecendo feedback

etc. Os sistemas de pontos são abertos, diretos e motivacionais, o que permite o uso

de diferentes pontuações, dependendo do objetivo.

Já os badges (medalhas, selos etc.) são representações visuais da

conquista e uma representação mais significativa de pontuação, que indicam que o

usuário atingiu um nível ou realizou um conjunto de objetivos definidos por ele ou

pelo sistema gamificado. Eles são flexíveis e podem motivar comportamentos.

Também indicam importância do usuário, pois seu design pode ter significado,

funcionando como credenciais e podem supor coleções.

O tempo é um elemento que possui três dimensões. A primeira é em

formato de relógio, com contagem progressiva ou regressiva. A segunda é

relacionada a como o usuário planeja o tempo de cada ação no game. E a terceira é

a representação visual da passagem do tempo, pois, nos jogos, o tempo não passa

como o tempo na vida real e isso deve ser cuidadosamente pensado e planejado

pelo designer, de modo que fique coerente.

A curva de interesse refere-se a quanto o jogador permanece interessado

ao longo do game e é de grande utilidade na gamificação do ensino. Muitas vezes, o

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usuário tem uma expectativa ou motivação que deve ser mantida. Para que isso

ocorra, suas ações não podem ser extremamente fáceis ou difíceis, mas manterem

um equilíbrio e certa progressão.

Portanto, esses loops estão relacionados não apenas à criação e à

manutenção de emoções motivadoras no momento de uso, mas, e principalmente,

de modo que faça com que ele tenha vontade de voltar a utilizar o jogo. Próximo a

esse elemento está a repetição. A possibilidade de se fazer novamente uma tarefa

ou ação é uma das grandes vantagens da gamificação no ensino, pois o erro é

fundamental para a aprendizagem.

E, por fim, mesmo uma atividade, um sistema ou um material gamificado

deve ser composto por um conjunto de regras. Essas regras servem para limitar as

ações dos usuários e tornar o sistema gerenciável. As regras podem ser divididas

em: operacionais, que definem como o sistema funciona; constitutivas ou

fundamentais, que definem a estrutura formal da funcionalidade do ambiente e só

podem ser entendidas pelo design do game; implícitas ou de comportamento, que

determinam o contrato ou acordo entre dois ou mais usuários; e instrutivas, que

determinam a forma de aprendizado do usuário, geralmente explicitada por meio de

tutoriais.

No que diz respeito à narrativa transmídia e à elaboração de materiais

didáticos, deve-se considerar a oportunidade de utilizar a estratégia desde a

protogênese do projeto em prol de potencializar suas possibilidades. Conforme visto

anteriormente, Jenkins (2010) revisita os sete princípios25 da narrativa transmídia e

redefine-os para o contexto educacional:

25

É importante ressaltar que esses princípios estão diretamente relacionados aos três pilares da narrativa

transmídia, sendo, por exemplo, a performance mais relacionada à participação do usuário, enquanto a multiplicidade e a subjetividade, por exemplo, são mais relacionadas à narrativa. Já princípios como a construção do universo e a serialidade envolvem tanto a narrativa como a diversidade de mídia.

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Figura 5 – Sete princípios da narrativa transmídia. Fonte: Jenkins, 2010, s/p, tradução nossa.

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Esses princípios26 também devem ser considerados na elaboração de

materiais27. E, nesse contexto, trata-se da oportunidade de utilizar-se de alguns

deles, como, por exemplo, da multiplicidade, que propõe o uso de versões

alternativas. Para adequar a proposta para a produção do material de Língua

Portuguesa, uma possibilidade é focar na coletânea de textos, que geralmente

apresenta textos canônicos, inserindo outros textos. Ainda nesse aspecto, um

mesmo fato cotidiano ou histórico pode ser apresentado a partir de diferentes

perspectivas, com o objetivo de promover a multiplicidade de olhares e pontos de

vista sobre um mesmo acontecimento.

Outro exemplo que pode ser dado a partir da revisão dos princípios é o

caso de imersão versus extração, no qual o autor incentiva os alunos a

“mergulharem” na história, apropriando-se de todas as formas possíveis da narrativa

e extrair dela recursos para utilizar no cotidiano (de forma material como imaterial),

por exemplo, como parte da lição de Geografia. A construção de universos fictícios

dá lugar à criação inicial de uma geografia fictícia, para, depois, a recriação de fatos

históricos etc.

A partir desses princípios, dos pilares e dos conceitos de narrativa

transmídia apresentados ao longo do capítulo, consideramos importantes para a

construção de um universo na elaboração de materiais didáticos os seguintes

passos: a estrutura e o design da narrativa; as múltiplas plataformas que serão

utilizadas, de que formas elas serão utilizadas (apresentando que parte da história,

com qual conteúdo) e como elas vão se relacionar; a participação das audiências e

como elas serão convidadas a participar em cada uma das mídias. Os princípios

podem contribuir para direcionar o emprego e uso dos pilares.

Ainda, segundo Massarolo (2011), para criar a narrativa, o universo deve

ser maior do que qualquer personagem. Além disso, para criar uma estrutura e um

design próximo do que propõe a narrativa transmídia, devem-se considerar

elementos como: conflito central, eventos, personagens, objetos significativos etc.

26

Jenkins faz essas propostas partindo do seu ponto de vista enquanto pesquisador e estudioso de mídias

norte-americano. Por isso, é importante adequar a proposta ao utilizar um dos princípios indicados. Isso porque devem ser consideramos diferentes aspectos da educação brasileira, como as políticas públicas envolvidas, a estrutura curricular, as avaliações etc.

27 No contexto do Aventuras, os princípios a serem considerados serão: dispersão, multiplicidade, serialidade e

performance embora esta última nem sempre considere o interesse do aluno.

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Para se levar em conta a participação das audiências, é necessário

identificar aquelas em potenciais e propor possíveis gratificações, criar lacunas e

mensagens (inserir sementes, buracos, contradições, silêncios, potenciais etc.). E,

finalmente, pensar em recursos de interatividade, que permitam os “pontos de

entrada” ou extensões da grande narrativa, que podem ser, conforme indicado por

Jenkins (2012, p. 16-18): sementes, pedaços de informações introduzidos na

narrativa que não são desenvolvidos na história; buracos, elementos que fazem falta

e são centrais para a compreensão de uma ação ou personagem; contradições, dois

ou mais elementos, intencionais ou não que possibilitam alternativas, para os

personagens; silêncios, elementos excluídos da narrativa por consequências

ideológicas; potenciais, projeções sobre o que poderia ter acontecido além dos

limites da narrativa.

Na perspectiva educacional da narrativa transmídia, deve-se levar em

conta o contexto colaborativo, fator decisivo na construção do universo. Essa

construção sinergética e cooperativa representa um dos melhores sistemas de

motivação para resolução de problemas, o que pode potencializar o desempenho

dos alunos e tornar a dinâmica do aprendizado mais envolvente e colaborativa. Ao

serem convidados a participar da resolução de problemas por meio do contexto da

narrativa, os alunos, além de coautores, podem ser, também, personagens da

narrativa.

A seguir, apresentamos os procedimentos metodológicos da pesquisa.

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CAPÍTULO 2. METODOLOGIA DE PESQUISA

Conforme indicado anteriormente, este capítulo tem como objetivo expor

a metodologia de pesquisa, situando-a no campo da Linguística Aplicada enquanto

análise documental, além de apresentar uma descrição do objeto de pesquisa,

relacionando-a com as justificativas que embasaram a investigação apresentadas na

introdução e, em seguida, apresentar o levantamento de informações realizado

sobre o material para a geração de dados e a proposta de análise.

2.1 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

A presente pesquisa de base documental tem como objeto a ser

analisado o Aventuras do Currículo+, ofertado às escolas da rede estadual pela

Secretaria de Estado de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP).

Antes de apresentar o objeto a ser analisado, expor seu contexto de

produção e avaliar suas propostas e escolhas editoriais e pedagógicas, cabe

justificar a pertinência da pesquisa, situando o Aventuras Currículo+ enquanto objeto

de investigação.

Por se tratar de um material didático, a análise documental situa-se no

campo da Linguística Aplicada (doravante, LA) por meio de uma abordagem

qualitativa e interpretativista. Segundo Celani (2005, p. 109-110),

na pesquisa educacional crítica, no âmbito da Linguística Aplicada, os pressupostos e os procedimentos do paradigma qualitativo interpretativista têm implicações que merecem ser explicadas. Comecemos pelo próprio desenho da pesquisa. Um planejamento prévio é mais difícil, de vez que no paradigma qualitativo o que temos é mais um desdobrar-se do que um plano definitivo. Daí decorrem mais riscos e mais problemas imprevistos, pois se trata de uma situação aberta, com um fim não previsível (open-ended).

A afirmação da autora pôde ser compreendida no percurso da pesquisa,

sobretudo pelo fato de o objeto de investigação ser complexo, o que direcionou a

escolha por abordagens e análises igualmente complexas e múltiplas.

Consideramos o material didático enquanto objeto de investigação por

corresponder aos pressupostos da área da LA que dizem respeito à

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responsabilidade social da pesquisa. Segundo Rojo (2006), o objeto deve estar

relacionado a problemas de “relevância social suficiente para exigirem respostas

teóricas que tragam ganhos a práticas sociais e a seus participantes, no sentido de

uma melhor qualidade de vida, num sentido ecológico” (ROJO, 2006, p. 256).

Tendo em vista que o material didático possui relevância no enfoque da

problematização de questões do campo educacional, inclusive no que diz respeito à

integração das TDIC no contexto de sala de aula, ele constitui-se em um objeto

interessante para a LA por suas características complexas.

A escolha do Aventuras, conforme apresentado anteriormente, foi devido

ao fato de ser um material proposto para uma rede pública estadual – a rede de São

Paulo –, e por ser considerado inovador pela equipe gestora do Programa, tendo

boa aceitação pelos professores e alunos28.

A análise do Aventuras tem como objetivo avaliar em que medida as

escolhas e as estratégias utilizadas em sua concepção editorial e pedagógica

contribuem com a prática educacional, na direção apontada por Rojo (2006, p. 259):

Não se trata de simplesmente compreender e descrever as novas formas de comunicação e os novos discursos e gêneros emergentes em contextos virtuais, mas de fazê-lo para refletir sobre as novas possibilidades de melhoria da qualidade de vida das pessoas, a partir destes novos instrumentos, por exemplo, em processos de educação à distância (EAD), num país pobre e continente.

Outra característica da Linguística Aplicada relacionada à pesquisa

desenvolvida é sua característica híbrida. Enquanto campo, é próprio da LA

ultrapassar as fronteiras disciplinares, buscando a coexistência dos saberes das

diferentes áreas. Para que a análise do objeto de investigação da pesquisa fosse

possível, foi necessário estabelecer diálogo com outras áreas, como as de

educação, comunicação, entretenimento, sociologia e arte.

28

O Programa ganhou menção honrosa no Prêmio Mario Covas 2018, prêmio destinado às melhores iniciativas

de gestão pública. Vídeo sobre o Programa, em que uma professora da equipe gestora do Projeto fala sobre o Aventuras e sobre a importância da menção honrosa está disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=FqIOyKim90k. Acesso em: 29 out. 2018.

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Como Klein (1990, apud Moita-Lopes, 2006, p. 98) aponta, o

conhecimento vem sendo reestruturado com a criação de “campos híbridos” por

meio de trocas entre as áreas, uma vez que a LA assume uma “permeabilidade

crescente entre as fronteiras”, que tem como objetivo abarcar pesquisas de

relevância social que integrem as diferentes perspectivas das diversas áreas e

diminua as fronteiras:

esse movimento interdisciplinar de empréstimos é fundamental para a emergência de muitos dos enfoques atuais em LA, que vão buscar em outras disciplinas seus fundamentos e métodos. (MOITA-LOPES, 2006, p. 255)

Conforme indicado pela citação de Celani (2005), o olhar para o objeto foi

sendo modificado durante o processo, tornando necessário buscar, reformular e

ressignificar diferentes conceitos e concepções, refazer e repensar caminhos e

capítulos, buscar soluções e referências em diversas fontes, indicando, muitas

vezes, que as resoluções dos problemas e as respostas para as perguntas estavam

em diferentes áreas ou, ainda, algumas deveriam permanecer em aberto.

A pesquisa caracteriza-se enquanto análise documental, uma vez que o

objeto de investigação é um material didático concebido para a rede pública, que se

propõe a trabalhar habilidade de leitura e escrita por meio de diferentes gêneros,

utilizando-se de estratégias de gamificação e integrando objetos e ferramentas

digitais. Ainda que não haja, declaramente, a intenção de trabalhar com os

multiletramentos, o fato de o material envolver gêneros multissemióticos, objetos de

aprendizagem e ferramentas digitais, mobilizou-nos a investigar se e como os

multiletramentos são considerados no Programa.

Além disso, o material apresenta atividades costuradas por meio da

criação de uma narrativa, que é contada ao longo das diferentes missões,

perpassando diferentes gêneros e mídias, o que nos levou a perguntar em que

medida essa proposta relaciona-se com elementos da narrativa transmídia, embora

o material não apresente essa estratégia como escolha intencional em sua

concepção editorial-pedagógica.

É importante destacar que, segundo Lankshear e Knobel (2007, p. 208),

os documentos podem ser considerados uma base de pesquisa complexa, uma vez

que podem ser compostos por dados fotográficos ou dados escritos de diferentes

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gêneros que circulam no ciberespaço. Segundo os autores, esse tipo de análise

deve informar “decisões presentes e futuras sobre o ensino, estratégias de

aprendizagem, políticas da escola etc.” (LANKSHEAR, KNOBEL, 2007, p. 40).

O recorte qualitativo pretende investigar algumas missões do material

com a intenção de analisar e interpretar a proposta pedagógica de modo a analisar

se e como as escolhas editoriais, sobretudo o uso da estratégia da gamificação, e a

proximidade com os elementos da narrativa transmídia a serem analisadas por meio

das características, da estrutura composicional e da proposta narrativa do material.

Desse modo, a perspectiva interpretativista da pesquisa documental pode incluir,

entre outros aspectos, o potencial para fundamentar decisões relacionadas à

educação, que envolvem as práticas educacionais em salas de aula como as

políticas públicas do livro e a produção de materiais didáticos.

O Aventuras apresenta-se, portanto, como um objeto de investigação

adequado, por se tratar de um material didático que possibilita a fundamentação de

decisões, presentes e futuras, em relação à demanda e à produção de materiais

didáticos. Isso porque contém potencial para causar impacto na educação, embora

dependa de uma série de fatores, sendo eles: técnicos, financeiros e políticos; e, ao

mesmo tempo, constitui-se como um material que tem como intenção integrar

objetos e ferramentas digitais às práticas educativas.

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2.2 AVENTURANDO-SE COM O AVENTURAS CURRÍCULO+

O Aventuras Currículo+29 é uma iniciativa da Secretaria de Educação do

Estado de São Paulo (SEE-SP), por meio da Coordenadoria de Gestão da Educação

Básica (CGEB), do Centro de Estudos e Tecnologia Educacionais (CETEC) e do

Programa Currículo+30, com apoio da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos

Professores de São Paulo (EFAP).

O projeto tem como foco o desenvolvimento de competências e

habilidades previstas no Currículo Oficial do Estado31 e na matriz de avaliação do

SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo),

tendo sido originalmente concebido como um projeto de recuperação de

aprendizagem, envolvendo as disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, para

alunos de 6º ano do Ensino Fundamental a 3º ano do Ensino Médio da rede estadual

de ensino do Estado de São Paulo.

Isso porque a avaliação da educação básica do Estado de São Paulo,

realizada pelo SARESP, apontou que os resultados obtidos pelos alunos nas

disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática mereciam ser objetos de discussão

e de tomada de decisão por parte da SEE-SP, na tentativa de melhorar esses

números.

Por esse motivo, o Aventuras apresenta atividades relativas à leitura e à

escrita e aos conhecimentos matemáticos, que foram desenvolvidas por Professores

Coordenadores de Núcleo Pedagógico (PCNP) da Rede Estadual de São Paulo,

coordenados por especialistas, professores universitários e pesquisadores da área

de ensino de Língua Portuguesa e de Matemática, também autores das atividades,

tendo contado com o apoio financeiro dos Institutos Inspirare e Natura e com o apoio

tecnológico da Fundação Carlos Alberto Vanzolini.

29

Site oficial Aventuras Currículo+. Disponível em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out.

2018. 30

Lançada em 2014, Currículo+ é uma plataforma de objetos digitais que integra o Plano Plurianual do Governo

do Estado de São Paulo, que disponibiliza conteúdos digitais (vídeos, videoaulas, áudios, jogos, animações, simuladores e infográficos), articulados com o Currículo do Estado de São Paulo. Com o intuito de ampliar o incentivo e articular propostas de atividade à utilização desses recursos, o material do Aventuras Currículo+ foi concebido para promover maior participação dos alunos no processo educativo e o desenvolvimento de competências e habilidades em relação à leitura e à escrita. Site oficial da plataforma Currículo+. Disponível em: http://curriculomais.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out. 2018.

31 Conforme indicado na 2ª edição do documento oficial, o Currículo adota como competências a desenvolver

aquelas formuladas no referencial teórico do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem, 1998), que são entendidas como desdobramentos da competência leitura e escritora. O foco, portanto, estaria no letramento da letra para atender às competências relacionadas à leitura e à escrita indicadas no documento.

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Implementado em 2015, o material é considerado uma ação dentro das

estratégias de reforço da Secretaria da Educação com o objetivo de garantir uma

aprendizagem de qualidade a todos os alunos durante o percurso escolar de forma

mais igualitária, ao mesmo tempo em que incentiva a integração das tecnologias

digitais às práticas em sala de aula, objetivando maior interação do estudante com o

material e sua participação no processo educativo32.

Na 1ª edição do Projeto, o ingresso ocorria nas escolas estaduais por

meio da livre adesão pelas escolas. A adesão ao Aventuras acontecia por meio da

Resolução SE 11, de 17/3/2015 (SÃO PAULO, 2015, s/p) e o curso era oferecido

aos estudantes em período diverso do horário normal das aulas, contando com um

professor especialmente contratado para isso, que desenvolvia o projeto para

turmas de, no máximo, quinze alunos. Em outras duas edições do projeto, as

atividades foram propostas ao conjunto total de alunos e mediadas pelo próprio

professor de Língua Portuguesa das turmas regulares nos horários das próprias

aulas33.

A última atualização do material foi realizada em maio de 2017. Portanto,

o Aventuras+ teve três edições, sendo a 3ª edição objeto de análise do presente

trabalho. Para divulgar essa última edição, foram propostas duas frentes de atuação:

I. Ofertar cursos de mediação do Aventuras Currículo+: Língua Portuguesa

– 3ª edição de Aventuras Currículo+: Matemática – 3ª edição, destinados

aos Professores de Educação Básica dos Anos Finais do Ensino

Fundamental e do Ensino Médio das respectivas disciplinas34;

32

Fonte: BRASIL. Governo do Estado de São Paulo. Secretaria da Educação do Governo do Estado de São

Paulo. Regulamento Aventuras Currículo+: Língua Portuguesa. São Paulo: maio, 2017. Disponível em: http://www.escoladeformacao.sp.gov.br/portais/Portals/142/1Ed_2017%20-%20Regulamentos/Aventuras%20Curriculomais_1ed_2017_L%C3%ADngua%20Portuguesa_vf.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

33 O curso de mediação não foi o objeto de estudo da presente pesquisa, apenas o material do professor que

acompanha o material do aluno no Aventuras. Ainda assim, é importante indicar que houve um curso de mediação para a análise das condições de desenvolvimento do projeto e preparar o professor para atuar como mediador. Essa informação é digna de nota dada a mudança radical de condições de desenvolvimento do programa, pois, inicialmente, era para até quinze alunos por turma, mediado por outros professores em aulas no contra turno. Na 3º edição, quando o material deixa de ser utilizado apenas para recuperação e passa a ser utilizado no curso regular, passa para até quarenta alunos por turma, mediados pelo professor da sala nos horários convencionais, sem que adaptações significativas tenham sido feitas nas atividades.

34 O curso de mediação foi implantado a partir da 2ª edição do Projeto e tinha como objetivo incentivar os

professores a apropriarem-se de seu papel de mediador, reconhecendo suas próprias limitações e utilizando seus conhecimentos, além de propor desafios, sistematização e/ou aplicação. Embora indicado na descrição, o curso de mediação não será objeto de análise. Somente os materiais e as orientações para professores no AVA é que serão analisados.

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II. Ofertar as atividades do Aventuras Currículo+ aos alunos regularmente

matriculados nos Anos Finais do Ensino Fundamental ou em uma das

séries do Ensino Médio, para ser desenvolvido durante o período regular

das aulas das disciplinas de Língua Portuguesa e de Matemática

pelos(as) seus(uas) respectivos(as) docentes.

Assim, essa edição do Aventuras ofereceu curso de formação aos

professores de modo a capacitá-los a utilizar o material do Aventuras e, assim,

desenvolver as atividades com os alunos que, na 3º edição, deixou de ser utilizado

apenas na recuperação intensiva e passou a ser usado no período regular com o

objetivo de criar novas estratégias para o aprendizado de conteúdos e o

desenvolvimento das habilidades indicadas.

O material está ambientado no Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle

(AVA-Moodle) e pode ser acessado diretamente pelo site oficial ou por meio de um

link na plataforma Currículo+. Além da navegação por meio do AVA-Moodle, o

material apresenta em sua proposta editorial-pedagógica orientações de uso para os

professores, premissas elaboradas a partir da criação de um universo narrativo,

presença da estratégia de gamificação e atividades que supõem o uso de objetos de

aprendizagem (OA) e/ou de ferramentas digitais, que também estão disponíveis na

plataforma Currículo+. Usar os OA disponíveis na plataforma foi, inclusive, uma das

demandas para a elaboração do material.

A plataforma do Currículo+, enquanto inciativa da SEE de São Paulo,

assume função de referatório35 e, de modo a incentivar o uso desses objetos, as

atividades do Aventuras, ainda que ambientadas no AVA-Moodle, fazem uso de OA,

que podem ser acessados por meio de hiperlinks, que sempre remetem primeiro ao

site do Currículo+ e, depois, ao site da publicação do OA.

A página de entrada do Aventuras traz um trailer do vídeo36 de abertura

do Programa e área para login. Para acessar, é necessária a identificação de

usuário e senha, que são solicitados na página principal:

35

Referatório é um site na Web que não faz o armazenamento de objetos de aprendizagem e outros recursos

educacionais, mas indica os repositórios que detêm recursos sobre determinado assunto, como um “agregador” de fontes de informação que indica os locais mais prováveis para encontrar uma informação desejada. Fonte: ABED. Referatório. Site oficial da Associação Brasileira de Educação a Distância. Disponível em:

http://www.abed.org.br/site/pt/midiateca/referatorio/. Acesso em: 21 jul 2018. 36

Link para o trailer disponível no AVA em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/. Acesso em: 29 out. 2018.

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Figura 6 – Página de entrada do Aventuras com trailer e espaço para inserir usuário e senha. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

Ao efetuar o login com sucesso, os cursos disponíveis para o perfil são

apresentados na tela. Ao fazer login, o aluno tem acesso apenas à versão do

material do aluno do seu respectivo ano/série sem respostas e orientações para

mediação das atividades e também uma tela que traz o vídeo37 e o texto de

convocação (ver Anexo I):

Figura 7 – Tela de Convocação para Alunos, dos 6 e 7 anos (texto na íntegra, ver Anexo I). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

37

Vídeo disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=5, em plataforma de

compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acesso em: 29 out. 2018.

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Ao fazer login, o professor pode visualizar o material “Língua Portuguesa

– Professores” e os materiais do aluno com orientações e respostas. Para acessar

os materiais dos alunos, deve-se selecionar o boxe correspondente ao ano/série de

ensino:

Figura 8 – Cursos do Aventuras disponibilizados por ano/série – visualização do professor. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

No perfil dos professores, além de estarem disponíveis os materiais dos

alunos com respostas e orientações, aparece o material “Língua Portuguesa –

Professores”, que apresenta: convocatória exclusiva para os professores

(convidando-os, na Missão 0, a fazer parte da narrativa e das missões criadas, ver

Anexo II)38, regulamento39, tutorial de navegação, introdução ao Aventuras

Currículo+ (com objetivos e pressupostos, organização das atividades, premissas

das atividades, orientações sobre gestão de aula e aprendizagem), os materiais

Aventuras Língua Portuguesa (missões, orientações gerais para a mediação das

atividades e específicas para atividades de leitura, de produção de texto e para a

38

Vídeo disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=3, em plataforma de

compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acesso em: 29 out. 2018. 39

O regulamento está no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/resource/view.php?id=15 e, também,

fora dele, no link: http://www.escoladeformacao.sp.gov.br/portais/Portals/142/1Ed_2017%20-%20Regulamentos/Aventuras%20Curriculomais_1ed_2017_L%C3%ADngua%20Portuguesa_vf.pdf. Acessos em: 29 out. 2018.

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condução do jogo), patentes e selos e acesso para um fórum para interagir com

outros integrantes da comunidade de aprendizagem.

Figura 9 – Tela da Missão 0, convocatória para professores, “Língua Portuguesa – Professores” (texto na íntegra, ver Anexo II). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

A proposta é que os Professores Coordenadores do Núcleo Pedagógico

(PCNP), especialmente os de Tecnologia Educacional de Língua Portuguesa e

Matemática das Diretorias de Ensino (DE), acessem o AVA-Moodle com o objetivo

de conhecer o conteúdo e acompanhar as ações do projeto, além de serem

responsáveis pela mediação das discussões nos fóruns da comunidade de

aprendizagem.

Segundo introdução do material do professor, “Língua Portuguesa –

Professores”, o Aventuras oportuniza os docentes a:

a. Compreender os desafios e as possibilidades que as novas tecnologias trazem para educação, em especial no que tange ao projeto Aventuras Currículo+;

b. Compreender a recuperação como garantia de um direito;

c. Refazer representações: os alunos em recuperação e as aulas de recuperação;

d. Compreender a grande narrativa e o sentido da gamificação40;

40

O material apresenta o conceito de gamificação a partir de uma definição do site Porvir, como sendo, “a

integração dos elementos dos jogos, como níveis, badges e competição, às atividades. Antes, essa dimensão

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e. Vivenciar o protagonismo docente e incentivar o protagonismo discente;

f. Atuar como mediador nas aulas das atividades de leitura e de produção de texto;

g. Vivenciar a gestão da aula: do planejamento ao seu término;

h. Vivenciar a gestão da aprendizagem em formas de acompanhamento com adaptações necessárias. (SÃO PAULO, 2017, s/p).

O propósito de apoiar os professores nesse processo de recuperação e

na criação de novas estratégias de ensino no período regular tem como foco

expectativas de desenvolvimento de habilidades relativas, principalmente, à leitura e

à escrita, ou seja, práticas voltadas para o letramento da letra.

Ao mesmo tempo, professores e alunos são impulsionados a participar

ativamente do desenvolvimento do projeto, navegando no AVA-Moodle e acessando

as missões, os objetos e as ferramentas digitais.

Antes de apresentar o processo de geração de dados é importante,

portanto, conhecermos como os conteúdos, os objetivos, as práticas e os gêneros a

serem trabalhadas estão organizados no Aventuras.

Uma das condições de produção para a organização das missões foi a

articulação dos gêneros do discurso de diferentes esferas de atividade e de

comunicação (jornalística, artístico-literária e de divulgação científica) com as

habilidades de leitura e de escrita, cuja referência é o Currículo do Estado de São

Paulo: Área de Linguagens e as matrizes do SAEB, do SARESP e da Avaliação da

Aprendizagem em Processo (AAP).

As atividades são organizadas na forma de missões, que, por sua vez,

como já mencionado, estão articuladas em torno de uma grande narrativa

gamificada41:

vinha sendo chamada de educação baseada em jogos, mas foi ampliada na medida em que essa tendência, além de incluir as ferramentas necessárias para apoiar o aprendizado, também está envolta em uma cultura e em um design específicos.” (SÃO PAULO, 2017], s/p).

41 A narrativa gamificada será objeto de análise e, portanto, a grande narrativa terá sua transcrição apresentada no item 3.2 Gamificação no Aventuras. Visto que é importante para compreender conhecer a narrativa para compreender o objeto, segue os links para o vídeo que apresenta a grande narrativa ou narrativa inicial: Trailer. Disponível no AVA em: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/ e links dos vídeos com a grande narrativa

(convocação alunos e professores), disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/course/view.php?id=3, em plataforma de compartilhamento de vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=iAVxYMFENtE. Acessos em: 29 out. 2018.

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AVENTURA CURRÍCULO+ - MISSÕES LÍNGUA PORTUGUESA

6º E 7º ANOS (ANOS FINAIS – ENSINO FUNDAMENTAL)

Missão 0 Introdução ao curso

Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)

Missão 2 SOS Quadrinhos (Esfera jornalística/artístico-literária)

Missão 3 Alma penada (Esfera artístico-literária)

Missão 4 Tremores e aquecimentos (Esfera divulgação científica)

8º E 9º ANOS (ANOS FINAIS – ENSINO FUNDAMENTAL)

Missão 0 Introdução ao curso

Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)

Missão 2 Game over? (Esfera jornalística)

Missão 3 Coisas da vida (Esfera artístico-literária)

Missão 4 O Poder das imagens - Parte 1 (Esfera jornalística)

Missão 5 O Poder das imagens - Parte 2 (Esfera jornalística)

1º AO 3º ANO (ENSINO MÉDIO)

Missão 0 Introdução ao curso

Missão 1 O quarto poder (Esfera jornalística)

Missão 2 Ondas do rádio (Esfera artístico-literária)

Missão 3 Coisas da vida (Esfera artístico-literária)

Missão 4 Comida na mesa - Parte 1 (Esfera jornalística/divulgação científica)

Missão 5 Comida na mesa - Parte 2 (Esfera artístico-literária)

Figura 10 – Quadro com as missões do Aventuras Currículo+. Fonte: Produção nossa a partir das informações do Aventuras de Língua Portuguesa, 2018.

Organizadas no material por ano/série, as narrativas totalizam 12 missões

diferentes, sendo: 4 missões, de 6 e 7 anos; 5 missões, de 8 e 9 anos; e 5

missões de Ensino Médio. A Missão 1: O quarto poder está presente nos três

anos/série e apresenta propostas similares nos três níveis, havendo apenas um

acréscimo de atividades que exploram o sensacionalismo nos materiais de 8 ano,

9 ano e Ensino Médio (computada como 2 missões). A Missão 3: Coisas da vida

está presente nos 8 e 9 anos e Ensino Médio e apresenta as mesmas atividades

para ambos anos/séries (computada como sendo uma única missão).

A organização das missões a partir da articulação de gêneros do discurso

(que considera as esferas jornalística, artístico-literária e de divulgação da ciência) e

o trabalho com as habilidades de leitura (que tem como referência o Currículo do

Estado de São Paulo) são apresentados aos professores no material “Língua

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Portuguesa – Professores” (ver Anexo III), juntamente com uma relação de

habilidades e gêneros42.

Cada missão é aberta pela seção “Conheça sua missão”, composta por

um áudio43 e sua transcrição, que conta com uma narrativa relacionada à narrativa

principal, e que procura contextualizar os objetivos da missão. Segundo a

transcrição do áudio, a Missão 1: O quarto poder, do material de 6º e 7º anos:

Os dominatoriuns atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar todos os meios de comunicação - jornais, revistas, noticiários de TV e rádio, sites de notícias. Os solidariuns nos alertam que é preciso prestar muita atenção ao que é noticiado, porque os dominatoriuns podem estar querendo esconder, desvirtuar ou manipular fatos.

Sua missão será impedir que isso aconteça! Para isso, além de ficar de olhos bem abertos, precisará responder a duas questões-problema:

- Por que a imprensa é chamada por alguns de "O quarto poder”?

- É possível relatar fatos de forma totalmente neutra? Por quê?

Após cumprir essa missão, você estará apto a entrar para o Programa de treinamento intensivo para Agente Máster.”. (BRASIL, 2017, s/p).

Figura 11 – Tela “Conheça sua missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

42

Link do arquivo da Matriz de habilidades e gêneros (que também está no Anexo III). Disponível em:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/comum/LP-prof-habilidades-de-genero.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

43 Link para o áudio de “Conheça sua Missão” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=103. Acesso em: 29 out. 2018.

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Cada missão apresenta fases, cuja organização é marcada pelo mesmo

movimento metodológico, iniciando por atividades mediadas pelo professor e que

visam ao levantamento de conhecimentos prévios dos alunos e ao envolvimento

com questões e desafios que envolvem leitura e escrita, que devem ser enfrentados

e resolvidos pelos alunos, seguida de outras fases:

FASES TIPO DE ATIVIDADE

FASE 1

Atividades coletivas, sem solicitação de registro escrito de resposta, desenvolvidas sob a coordenação do professor que objetivam contextualizar e introduzir os conhecimentos, temas, gêneros etc., que serão trabalhados na Missão e levantar os conhecimentos prévios dos alunos em reação a esses temas.

FASE 2 Quiz, com questões fechadas e feedback automático, envolvendo leitura de textos pertencentes aos gêneros focados e/ou relacionados à temática em questão, que contemplam diferentes habilidades de leitura.

FASES 3 e 444

Leitura de outros textos pertencentes aos gêneros focados e/ou relacionados à temática em questão, seguidas de questões abertas e/ou fechadas – que contemplam diferentes habilidades de leitura ou produção de pequenos textos. As questões abertas estão em um Arquivo Secreto, que é um PDF editável, que pode ser baixado, salvo, preenchido, impresso e/ou compartilhado.

FASE 5 Produção de textos relacionados aos objetivos da missão, à temática e/ou aos gêneros trabalhados.

Figura 12 – Quadro com as fases das missões do Aventuras Currículo+. Fonte: Produção nossa a partir das informações das fases do Aventuras Currículo+, 2018.

Cada fase, por sua vez, é dividida em níveis. O estudante só pode

acessar uma nova missão quando atinge uma pontuação mínima, que é informada

pelo aluno, já que o sistema não computa automaticamente a pontuação. Quando

indica a pontuação obtida (que pode não ser verdadeira) o aluno recebe situação em

que também recebe um selo indicativo, relacionado à narrativa, passando a

pertencer a uma patente superior de Agentes45.

Na “Mensagem Final”46, há uma gravação anuncia o sucesso da missão,

parabenizando o aluno, retomando os feitos da missão e motivando-o para a

próxima, conforme transcrição do áudio na mensagem final da Missão 1: O quarto

poder, do material de 6º e 7º anos:

44

Algumas missões têm apenas uma dessas fases. Nesse caso, a fase destinada à produção de textos denomina-se como sendo a Fase 4.

45 Conforme indicado, não foi possível desenvolver a funcionalidade de computação automática de pontos.

Desse modo, é possível inserir um total que não seja, necessariamente, o valor real da soma dos pontos conquistados pelos alunos ao longo das Fases e Níveis. Como o sistema permite acesso a partir de 2500 pontos, o aluno pode declarar esse total e chegar ao final da missão.

46 Link para o áudio da “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=113&pageid=4&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.

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Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea. Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV. Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar. (BRASIL, 2017, s/p).

Figura 13 – Tela “Mensagem Final” da Missão 1: O quarto poder, dos 6º e 7º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa, 2018.

Após a última missão, além da patente, o aluno ganha um certificado (ver

Anexo IV) de Agente Especial Máster LP, por ter cumprido todas as missões em

defesa da Terra e demonstrado ter desenvolvido as habilidades de leitura e escrita,

propostas para o trabalho em Língua Portuguesa para o respectivo ano/série.

Como é possível observar pela Figura 12 – Quadro com as fases das

missões do Aventuras Currículo+ (p. 87), nem todas as atividades são

desenvolvidas no AVA. Toda a narrativa, bem com todas as comandas de atividades

estão no AV – mesmo que seja uma comanda dizendo que o professor, enquanto

mestre, vai propor algo – provavelmente, como forma de manter a integralidade da

narrativa e do percurso no ambiente.

Algumas atividades são realizadas apenas oralmente em sala,

coordenadas pelo professor (Fase 1), outras são realizadas no próprio AVA, como

os quizzes (Fase 2) e outros formatos de questão fechada com feedback automática

(que podem aparecer nas Fases 3 ou 4). Outras atividades são realizadas em um

arquivo PDF editável (Fases 3, 4 e/ou 5), que pode ser baixado, impresso, copiado,

preenchido e/ou distribuído para os alunos ou que pode ser respondido pelos

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alunos, não havendo lugar no AVA para que se efetue upload do arquivo47. Algumas

produções finais podem ser realizadas fora do AVA, em ferramentas, como

construtor de quadrinhos, agregador de conteúdos, editor de áudio etc.

Vale ressaltar que nem todas as funcionalidades foram habilitadas e/ou

desenvolvidas no AVA por razões relacionadas a prazos, custos, tamanho, banda e

banco de dados (na 1ª edição, foram 2.357 escolas participantes, dentre os quais,

95.874 alunos e 7.820 professores; na 2ª edição, foram 1.505 escolas, sendo

105.371 alunos e 8.147 professores cadastrados48) e banda disponível nas escolas49,

o que impossibilitava, por exemplo, a geração de relatório em tempo real em função

do tamanho do banco. Assim, para além da área de ambientação da narrativa e das

comandas das atividades, que contam com links para textos, atividades, OA e

ferramentas digitais, o AVA do Aventuras conta com o recurso de login, enturmação,

questões fechadas com feedback e alguns tipos de relatórios, por conta do grande

número de usuários, não são disponibilizados em tempo real.

O AVA também não conta com nenhuma ferramenta de questões abertas

nem de comunicação síncrona ou assíncrona nem com algum tipo de galeria ou

portfólio para armazenamento das atividades dos alunos e/ou dos retornos dados

pelo professor. Também não foi habilitada a ferramenta de avaliação, sendo toda a

pontuação registrada pelo aluno em um PDF por meio de uma Folha de Serviço50,

disponível no início da primeira missão de cada ano/série, que também traz os

vários selos, que devem ser assinalados ou pintados quando de sua conquista. Os

alunos também podem acompanhar a progressão da conquista de recompensas no

item Selos e patentes51 localizado no menu lateral junto com as missões e em um

boxe logo abaixo em que os badges conquistados ficam disponíveis.

47

Os PDF editáveis são de responsabilidade do professor, que devem buscar uma resolução técnica de como e

onde preencher, baixar, salvar e/ou e como da socialização dessas produções, que dificilmente circulam por causa das dificuldades técnicas, como: salvar em computadores ou pendrives, perder os arquivos que foram salvos, não ter canais de distribuição dos arquivos, não ter como imprimir as produções etc.

48 Fonte: CETEC. Relatório de participação da rede de ensino no Projeto Aventuras Currículo+. 2016. Os

números indicam usuários que acessaram o ambiente e não os que realizaram todas as atividades do projeto. 49

Informações obtidas junto à assessoria da área de Língua Portuguesa do Aventuras. 50

A Folha de Serviço traz a seguinte mensagem para o aluno: “Utilize esta folha para registrar os bônus obtidos

nas missões. O Mestre poderá verificar os bônus registrados e fornecer bônus extras, de acordo com seu desempenho nas atividades desenvolvidas. Caso você não alcance a pontuação necessária para a obtenção de cada selo, solicite orientações ao Mestre” (SÃO PAULO, 2017, s/p). disponível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=104. Acessos em: 29 out. 2018.

51 Selos e patentes, item do material do aluno, dos 6º e 7º anos. Disponível no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/badges/view.php?type=2&id=5. Também é possível atribuir selos e patentes de forma não automática. Os professores devem baixar a Folha de serviços e colorir os selos à

medida que os alunos conquistem as patentes. Acesso em 29 out. 2018.

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2.3 GERAÇÃO DE DADOS

Como indicado anteriormente, esta pesquisa é de base documental e tem

como objetivo analisar o Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa por meio de

uma abordagem qualitativa e interpretativa.

O Aventuras apresenta-se como um interessante objeto de análise por ser

um material didático produzido para a rede pública que, além de apoiar os docentes

no desenvolvimento da recuperação intensiva no desenvolvimento de habilidades de

leitura e de escrita, tem como objetivo “criar novas estratégias de ensino para

melhorar as aprendizagens” (SÃO PAULO, 2017 p.6), como integrar as tecnologias

digitais às práticas em sala de aula e tornar o processo de ensino-aprendizagem

mais lúdico e participativo por meio do uso de estratégias como a gamificação e a

criação de um universo narrativo.

Para verificarmos as implicações das escolhas e das propostas do

Aventuras, foram criadas três categorias de análise: (1) multiletramentos, para

analisar a proposta pedagógica; (2) gamificação e (3) elementos da narrativa

transmídia, para verificar as estratégias escolhidas para a produção editorial.

A cada uma dessas categorias de análise, correspondem questões de

pesquisa, que devem ser respondidas:

As propostas de atividades do Aventuras Currículo+ contemplam os

multiletramentos? De que forma? Apresentam propostas que permitem

aos alunos atuar como usuários funcionais, analistas críticos, criadores

de sentidos e transformadores? Há atividades que contribuem para a

formação de designers?

Quais os elementos da gamificação presentes nas propostas editorial

(estrutura e interface) e do Aventuras e de que forma eles

potencialmente motivam as ações dos alunos e promovem situações

de ensino-aprendizagem?

O universo criado e as atividades costuradas por uma narrativa

apresentam aspectos que permitem aproximação com elementos da

estratégia da narrativa transmídia?

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Para responder a essas questões, os dados analisados incluíram o

material “Língua Portuguesa – Professores”, tendo como foco a proposta de ensino-

aprendizagem por meio da verificação dos objetivos e pressupostos do material, da

premissa das atividades e das propostas de gestão, verificando como é proposto o

desenvolvimento das habilidades de leitura e de escrita.

Além do material com orientações para os professores, todas as missões

dos materiais dos anos/séries foram lidas. A partir desta primeira leitura, foi realizado

um levantamento sobre cada uma das missões de modo a evidenciar as seguintes

informações:

1. Série/anos de ensino;

2. Título da missão;

3. Proposta de leitura (gêneros do discurso presentes na missão);

4. Proposta de produção pelo aluno (gêneros do discurso presentes na

missão);

5. Mídias e suportes envolvidos;

6. Presença e/ou exploração da multissemiose/multimodalidade;

7. TDIC envolvidas;

8. Ambientes e formatos das atividades.

A compilação das informações elencadas foi inserida em um quadro

abaixo. O quadro a seguir apresenta a organização das missões presentes no

material e o levantamento dos dados dessas missões:

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AVENTURA CURRÍCULO+ - MAPA DE MISSÕES

MISSÕES GÊNEROS

(ATIVIDADES DE LEITURA)

GÊNEROS (ATIVIDA-DES DE PRODU-

ÇÃO)

MÍDIAS E SUPORTE

S DAS ATIVI-

DADES

MULTISSE-MIOSES/

MULTIMO-DALIDADE

TDIC

AMBIEN-TES /

FORMA-TOS DAS ATIVIDA-

DES

6º - 7º anos EFII

Missão 1

O quarto poder

Notícia | Carta do leitor | Charge

Resumo oral | Notícia

Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).

Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.

Texto impresso,

texto digitaliza-do, PDF digitável,

quiz digital e AVA.

Missão 2

SOS Quadri-nhos

HQ | Tirinha | Carta do leitor

Tirinhas |

Texto de opinião defenden-do as tirinhas e HQs

Tirinhas e HQs impressas, digitalizadas e digitais | Vídeo

Verbal: escrita | Visual: imagem estática (tirinhas e HQ) | Sonoro-visual (audiovisual).

Realizar pesquisa online | Assistir audiovisual | Utilizar OA.

Missão 3

Alma penada

Conto de assombro | Vídeo de animação de cordel | Ficha

Ficha descritiva | Leitura dramatizada com efeitos sonoros de contos de assombro

Textos escrito impresso e digital | Texto oral | Áudio | Vídeo | Podcast

Verbal: escrita, oral (leitura dramatizada e instruções) | Sonoro (efeitos sonoros e trilha sonora) | Sonoro-visual (animação em vídeo).

Realizar pesquisa impressa e online | Assistir audiovisual | Utilizar editor de áudio Audacity.

Missão 4

Tremo-res e aqueci-mentos

Notícia | Reportagem | Artigo de divulgação científica | Infográfico | Texto instrucional | Esquema

Nota jornalística

Jornal | Imagem | Áudio

Verbal: escrita, oral (entrrevista) | Visual: imagens estáticas (fotografias e infográfico) e imagens em movimento (infográfico animado).

Realizar pesquisa online.

8º - 9º anos EFII

Missão 1

O quarto poder

Notícia | Carta do leitor | Charge

Resumo oral | Notícia

Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).

Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.

Texto impresso,

texto digitalizado

PDF digitável,

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Missão 2

Game over?

Reportagem | Infográfico | Gameplay | Postagem de vlog | Vídeo de pegadinha | Game | Texto de divulgação científica | Resenha

Resenha de game

Game |

Vídeo | Imagem

Verbal: escrita | visual: imagem estática (ilustrações e infográfico) | Sonora-visual: (game e vídeos).

Realizar pesquisa online | Assistir vídeos no Youtube | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamente games.

quiz digital, AVA e tutorial.

Missão 3

Coisas da vida

Crônica | Notícia | Vídeo de texto didático | Game | Verbete

Crônica

Texto impresso | Jornal | Game | Vídeo

Verbal: escrita | Sonoro-visual: (game e vídeo).

Realizar pesquisa | Assistir vídeos | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamen-te games.

Missão 4

O Poder das imagens - Parte 1

Fotorreporta-gem | Reportagem

Edição de fotorrepor-tagem

Jornal | Imagem

Verbal: escrita | Visual: imagem estática (fotografia).

Realizar pesquisa e ler texto online | Utilizar e editor de imagem.

Missão 5

O Poder das imagens - Parte 2

Fotorreporta-gem | Fotodenúncia | Vídeo sobre microrroteiros | Sinopse

Fotodenún-cia

Jornal | Imagem | Vídeo

Verbal: escrita | Visual: imagem estática (fotografia) | Sonoro-visual (audiovisual).

Realizar pesquisa e ler texto online | Utilizar e postar em blog e tumblr.

1º a 3º anos EM

Missão 1

O quarto poder

Notícia | Carta do leitor | Charge

Resumo oral | Notícia

Jornal Verbal: escrita | Imagem estática (charge).

Realizar pesquisa | Ler/ouvir notícia impressa/ digital.

Texto impresso,

texto digitalizado

PDF digitável,

quiz digital, AVA e

tutorial (em texto escrito

e vídeo).

Missão 2

Ondas do rádio

Canção | Poema | Playlist comentada

Resumo | Playlist comentada

Vídeo | Áudio | Podcast

Verbal: escrita; oral (canção e playlist com

comentários) | Sonora (canção) | Sonoro-visual: (videoclipes).

Realizar pesquisa impressa e online |

Assistir audiovisual | Utilizar editor de áudio Audacity

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Missão 3

Coisas da vida

Crônica | Notícia | Vídeo de texto didático | Game | Verbete

Crônica

Texto impresso | Jornal | Game |

Vídeo

Verbal: escrita | Sonoro-visual: (game e vídeo).

Realizar pesquisa | Ler texto online| Assistir vídeos | Utilizar plataforma para jogar e avaliar criativamen-te games.

Missão 4

Comida na mesa - Parte 1

Artigos de divulgação científica | Notas jornalísticas | Infográfico | Reportagem | Tabela

Reportagem | Quadro-síntese

Texto impresso | Jornal | Imagem

Verbal: escrita | Visual: imagem estática (infográfico).

Realizar pesquisa | Ler texto online.

Missão 5

Comida na mesa - Parte 2

Entrevista | Canção | Verbete | Poema | Postagem em revista digital | Produções culturais (quadros)

Revista Digital

Vídeo | Revista digital

Verbal: escrita | Oral (declamação de poema) | Visual: imagem estática (infográfico) | Sonora (canção e gravação de uma declamação) | Sonoro-visual (vídeo e videoclipes).

Realizar pesquisa | Ler texto online | Utilizar editor de áudio Audacity |

Assistir vídeo no Youtube | Usar o Scoop.it [agregador de conteúdo]

Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (com gêneros, produções e mídias do Aventuras Currículo+, grifo nosso nas produções que serão analisadas). Fonte: Produção a partir das informações das missões do Aventuras Currículo+, 2018.

A geração de dados também foi organizada levando-se em conta as três

grandes categorias de análise: multiletramentos, gamificação e narrativa transmídia.

Para que fosse possível gerar dados a partir da seleção de missões que pudessem

contribuir para responder às questões das categorias de análise, foi necessário

identificar e avaliar a proposta de elaboração e de organização do Aventuras.

Os gêneros presentes e que podem ser verificados na Figura 14 –

Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94) são: da esfera jornalística: notícia, carta

ao leitor, fotorreportagem, artigo de opinião, resenha, reportagem, etc.; da artístico-

literária: conto de assombro, poema, crônica, HQ, videoclipe, playlist, canção etc.; da

escolar/divulgação científica: artigo de divulgação científica, mapa, tabela, texto

didático, verbete de enciclopédia etc. Há gêneros que estão presentes em duas

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esferas, como comentários, vlogs, charge e tirinhas, presentes na esfera artístico-

literário e na esfera jornalística; e infográfico, na esfera jornalística e na esfera

escolar/divulgação científica.

Como se pode observar, em todas as missões são contemplados textos

e/ou produções multissemióticas ao longo das atividades, mas que são explorados

de diferentes formas, de modo que: em 5 (cinco) das 12 (doze) missões, esses

textos/produções são mais explorados em atividades de leitura, estando em primeiro

plano a compreensão do conteúdo que veiculam e o processo de atribuição de

sentidos. Em 7 (sete)52 das 12 (doze) missões, os textos/produções multissemióticas

também são propostos como produção final53, o que aumenta as chances de haver

atividades que contemplem os multiletramentos e que aproximem ao perfil de

formação pretendido pela pedagogia dos multiletramentos.

Essas 7 (sete) missões foram selecionadas para serem analisadas e

responder às questões relativas à categoria (1) multiletramentos. São elas:

MISSÃO DESCRIÇÃO/JUSTIFICATIVA

Missão 2: SOS Quadrinhos (6º e 7º anos)

Diante do risco dos dominatoriuns acabarem com os quadrinhos, os textos propostos como produção final são: tirinha, que pode ser produzida em uma ferramenta de produzir quadrinhos ou no papel, como o aluno preferir, e um texto de opinião, defendendo a produção tirinhas. Durante as atividades, os alunos leem várias tirinhas e quadrinhos e elementos, como formato, número de quadrinhos, diálogos curtos recursos icônico-verbais próprios (como balões, onomatopeias etc.) são explorados.

Missão 3: Alma penada (6º e 7º anos)

Após descobrirem que os dominatoriuns têm medo de contos de assombração, por não entenderem seu caráter ficcional, a produção final proposta é um podcast com leituras dramatizadas de contos de assombro com efeitos sonoros, que seriam espalhadas pelo planeta. Durante as atividades, vários contos (de assombro e de outros tipos, dados a comparação) são lidos e uma “ficha criminal” do lobisomem é produzida. Para a última produção, é necessário gravar um podcast utilizando um editor de áudio.

52

De um primeiro nível de seleção das missões, restaram 6 (seis) missões. Uma sétima missão foi acrescentada nesse primeiro corte – a Missão 2: Game over?, de 8º e 9º anos –, pois, apesar de a produção final proposta ser uma resenha (gênero típico do letramento da letra), como a resenha é de um game, há atividades que exploram os elementos do game para que os alunos possam ter o que comentar na resenha.

53 Textos e produções destacados na Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94).

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Missão 2: Game Over? (8º e 9º anos)

Após descobrirem que os dominatoriuns pretendem utilizar games – dois em particular Zombie Tsunami e Odd Planet por conta do grande número de jogadores – para ter influência sobre os terráqueos. A produção final solicitada é a de resenha, mas para escrevê-la, os alunos devem jogar e avaliar criticamente os games. Durante as atividades, os alunos exploram games, gameplay postagem de vlog e elementos como elementos visuais, trilha sonora, jogabilidade, objetivos do jogo e, antes da escrita da resenha,

Missões 4 e 5: O Poder das imagens – Partes 1 e 2 (8º e 9º anos)

As Missões 4 e 5 que estão articuladas e se complementam. Ambas propõem o trabalho com fotografia no contexto do campo jornalístico após os solidariuns alertarem para o fato de que também se pode manipular e distorcer fatos por meio de imagens, e não só do uso da linguagem verbal. São trabalhados gêneros como fotorreportagem, fotodenúncia, reportagem etc. A Missão 4 apresenta como proposta de produção final a edição de uma fotorreportagem sobre um importante evento que acontece anualmente na cidade de São Paulo, a Virada Cultural, e a Missão 5 prevê a produção de fotodenúncia que coloquem em evidências situações-problema que precisam de algum tipo de intervenção para serem solucionadas, de forma a ajudar os terráqueos a enfrentar seus problemas.

Missão 2: Ondas do rádio (1º ao 3º ano, EM)

Ao descobrir que os dominatoriuns querem dominar os jovens terráqueos utilizando a música, a proposta de produção é de uma playlist comentada, que deve ser utilizada em um ataque-surpresa contra os dominatoriuns. Durante as atividades, os alunos exploram canções, poema e playlists comentadas. Para isso, os alunos entram em contato com áudio, vídeo e precisam utilizar um editor de áudio para gravar as playlists.

Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 (1º ao 3º ano, EM)

Após investigar algumas causas da fome e apontar formas de superar esse problema, os alunos são convidados a produzir uma revista digital sobre produções culturais com a temática da fome, retratando e denunciando-a, utilizando agregador de conteúdo. Ao longo das atividades os alunos entram em contato com produções culturais, relacionando-as aos diferentes gêneros, como entrevista, canção, verbete etc.

Figura 15 – Quadro das 7 (sete) missões selecionadas para análise em multiletramentos. Fonte: Produção nossa, a partir das informações das missões do Aventuras Currículo+, 2018.

Dentre as 7 (sete) missões, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 foi

selecionada para uma análise qualitativa mais pontual e detalhada, de modo que

sejam averiguados os dados relativos à contemplação dos multiletramentos.

Essa missão será descrita na íntegra, o que também serve de ilustração

da forma de organização e funcionamento das missões. Ela foi escolhida por lidar

com diferentes textos e produções multissemióticas e uma ferramenta pouco usual

em sala de aula: um agregador de conteúdo, que supõe a curadoria dos alunos,

prática que se aproxima dos novos letramentos.

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Além dessa Missão 5, serão consideradas as propostas de produção das

outras 6 (seis) missões e suas grades de avaliação, localizadas nos Arquivos

Secretos das fases de produção, que permitem inferir o que foi trabalhado e

analisar até que ponto as missões podem ser vistas como promotoras da formação

de designers.

Como forma de saber se e como a diversidade cultural foi contemplada,

também serão levantados os textos e produções culturais presentes nas atividades

das 7 (sete) missões.

Para a categoria de análise dos multiletramentos, as bases teóricas de

GNL (1996) e Rojo (2012) contribuíram para as questões referentes aos

multiletramentos, cuja intenção é verificar se os multiletramentos são contemplas no

Aventuras e, caso sejam, de que forma. Do mesmo modo, essas bases contribuíram

para a verificação da aproximação de uma formação que se aproxima dos princípios

da pedagogia dos multiletramentos54 e a verificação da possibilidade da formação de

designers. Lankshear e Knobel (2007) contribuíram para verificar se o material

contempla práticas letradas que supõem um novo ethos e uma Mentalidade 255.

QUESTÕES REFERÊNCIAS

(1) Os multiletramentos são contemplados no Aventuras? De que forma?

GNL (1996) Rojo (2012)

(2) É possível identificar nas atividades alguma aproximação com os princípios ou gestos didáticos da pedagogia dos multiletramentos? As missões podem contribuir para a formação de designers?

(3) O material apresenta uma proposta que dialoga com um novo ethos e uma Mentalidade 2?

Lankshear e Knobel (2007)

Figura 16 – Quadro da categoria de análise (1) multiletramentos. Fonte: Produção nossa, 2018.

Em relação à análise das categorias (2) gamificação e (3) elementos da

narrativa transmídia, diferentemente do que foi proposto para a verificação das

implicações das escolhas e das propostas pedagógicas do Aventuras no que diz

respeito à contemplação dos multiletramentos, serão verificadas as características

da proposta editorial do material, sobretudo a narrativa, a estrutura e a organização.

Assim, forma selecionadas missões ou partes do material que permitissem analisar

54

Na presente pesquisa a pedagogia dos multiletramentos será analisada de forma indireta por meio da

dimensão do usuário. 55

Lankshear e Knobel (2007) além de os novos letramentos colocarem em cena novas condutas, eles também

propiciam uma nova mentalidade, a Mentalidade 2, que faz analogia à Web 2.0.

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a presença/ausência e funcionamento de certos elementos relacionados à

gamificação e à narrativa transmídia.

Para averiguar a estratégia de gamificação utilizada no Aventuras é

necessário partir das informações presentes do material “Língua Portuguesa –

Professores”. É nesse material que o Aventuras indica que suas atividades foram

organizadas em forma de “missões” que, por sua vez, estão articuladas em torno de

uma grande “narrativa gamificada” e apresenta o conceito de gamificação aos

professores, conforme visto na descrição do objeto. Essa narrativa, presente no

vídeo e nos textos da Missão 0 dos professores e na Convocação dos alunos, é um

importante dado de análise - tanto para a gamificação como para a narrativa

transmídia, com veremos a seguir.

Outro dado a ser analisado a partir das informações apresentadas é a

estrutura do material de modo que sua organização em missão, fase e nível possa

ser verificada dentro de um mesmo ano/série. Além desse elemento, outros serão

identificados desde o ponto de vista editorial (que incluem, por exemplo, a

customização da interface e o uso dos recursos do AVA) aos elementos que possam

contribuir potencialmente com a proposta pedagógico (por exemplo, o uso do

recurso de tempo nas atividades ou de recompensas, como sistema de pontos ou de

atribuição de patentes etc.).

Além do material “Língua Portuguesa – Professores” e da grande

narrativa presente no vídeo e nos textos da Missão 0, da convocatória do professor,

e da Convocatória dos alunos, fez-se necessário selecionar missões para ilustrar

como os elementos estão presentes no material, embora, conforme indicado

anteriormente, esses elementos estejam presentes em todas as missões por serem

parte da proposta editorial do Aventuras e, assim, fazer parte de sua estrutura e de

sua organização.

A escolha pelas missões levou em conta critérios como: escolha de um

mesmo ano/série (sendo selecionadas apenas missões dos 8º e 9º anos de modo a

identificar uma unidade nas estratégias gamificadas), as narrativas em relação à

organização missões/níveis/fases, sistema de pontuação (de modo a verificar o

início de um ciclo a partir da Missão 1 e o final dele, com as Missões 4 e 5),

presença de elementos como regras, tempo, feedback, recompensa (pontos,

patentes e selos, certificados) etc.

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Para essa categoria de análise, as bases teóricas de Kapp (2012) e

Hunicke, LeBlanc e Zubek (2019) em relação aos elementos da gamificação e Kapp

(2012) e Mcgonigal (2012) em relação às contribuições da gamificação. Bartle (1996,

apud Kapp, 2012) contribuiu para a análise do perfil dos jogadores:

QUESTÕES REFERÊNCIAS

(1) Quais elementos de gamificação estão presentes no Aventuras (abstração da realidade, objetivos, regras, conflitos, níveis, tempo, recompensas, feedback, repetições, curva de interesse e narrativa)? Quais as recompensas presentes no Aventuras? Como se dá a interação desses elementos no Aventuras?

Kapp (2012) Hunicke, LeBlanc e

Zubek (2004)

(2) De que forma a gamificação pode potencialmente contribuir para engajar os alunos e motivar as boas situações de ensino-aprendizagem?

Kapp (2012) McGonigal (2012)

(3) Quais os perfis de jogadores estão presentes e quais os mais adequados ao Aventuras (predadores, conquistadores, socializadores ou exploradores)?

Bartle (1996, apud Kapp 2012)

Figura 17 – Quadro da categoria de análise (2) gamificação. Fonte: Produção nossa, 2018.

Ademais, a proposta da narrativa gamificada deve ser retomada para

verificar sua aproximação aos elementos da narrativa transmídia. Além da grande

narrativa, que se aproxima do pilar da narrativa transmídia de construção de

universo, a análise deve incluir outros aspectos que se aproximam dos outros dois

pilares da narrativa transmídia, sendo: a diversidade de mídias – que, no contexto de

um material didático de Língua Portuguesa, pode englobar também as diferentes

linguagens trabalhadas, não apenas as mídias – e a participação do público, nesse

caso os alunos.

A análise da narrativa no Aventuras e sua relação com as narrativas das

missões tem como ponto de partida, novamente, o vídeo e os textos da Missão 0,

de convocação dos professores, e da Convocação dos alunos. A partir da grande

narrativa, é importante verificar de que forma ela se articula às narrativas inicias e

finais das missões. Para essa parte da análise, foram selecionadas as narrativas

iniciais e finais dos 6º e 7º anos.

Em termos de sequência narrativa e com o objetivo de verificar se há ou

não autonomia entre as narrativas de um mesmo segmento, serão retomadas as

relações entre as narrativas iniciais e finais das missões dos 6º e 7º anos (por

apresentarem as missões sem separá-la em “partes”) e retomada a estrutura de

apresentação das missões dos 8º e 9º anos e 1º ao 3º ano do Ensino Médio (por

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apresentarem missões que se repetem nos materiais dos anos/séries anteriores e

ter duas missões que se dividem em “partes”, indicando interdependência).

Desse modo, espera-se que possam ser verificadas as relações entre: (1)

a grande narrativa e as narrativas das missões, (2) as narrativas das missões e as

sequências possíveis em um mesmo respectivo ano/série e, finalmente, (3) a

relação comparativa dos materiais de anos/séries diferentes, verificando a

progressão narrativa entre as missões.

Além das narrativas iniciais e finais das missões selecionadas, também

será verificada como a narrativa está presente nos enunciados de fases, níveis e

atividades, com objetivo de identificar a sustentação da narrativa e averiguar se há

autonomia de uma única missão em relação às missões do respectivo ano/série.

Em relação à diversidade de mídias e sua relação com a construção da

narrativa, é possível identificar, a partir da Figura 14 – Quadro do Mapa das

Missões (pp. 92-94), que entre as mídias presentes no Aventuras estão: impressa,

áudio, vídeo, game.

Também é possível verificar que, além das mídias, as missões propõem o

trabalho com diferentes de gêneros – alguns desses gêneros, inclusive, estão

presentes no título da missão, o que indica uma relação direta com a narrativa, não

sendo, portanto apenas objeto de estudo, mas parte importante da história.

A proposta pedagógica do Aventuras também apresenta diferentes

atividades a partir dos textos/produções multissemióticas, inclusive atividade de

produção final dos alunos. Nessa atuação dos alunos permite que seja verificado de

forma direta a atuação do público. Por meio da análise de uma proposta de

produção final, pretende-se verificar os aspectos que aproximam essa atividade de

uma participação ativa e se é possível contribuir e/ou ampliar com a grande narrativa

a partir da produção.

Para a geração de dados dessa verificação, recorremos, então, às 7

(sete) missões primeiramente selecionadas para analisar os multiletramentos a partir

da Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94).

Os critérios considerados para a seleção das missões de modo a gerar os

dados para a análise foram: (1) presença da diversidade de gêneros e/ou narrativas

cuja temática tivesse relação direta com os gêneros trabalhados; (2) presença de

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diferentes mídias ou de atividades que integrasse tecnologias digitais; (3) propostas

de produção do aluno que contribuíssem para a ampliação do universo criado.

Desse modo, as missões selecionadas para a análise são:

Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6 e 7 anos do Ensino Fundamental,

por apresentar uma proposta temática relacionada ao principal gênero

trabalhado. Desta forma, a escolha tem como objetivo contribuir para a

discussão do uso de diversas linguagens e mídias na apresentação e/ou

ampliação da narrativa.

E, finalmente, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos

do Ensino Médio, que possibilita a verificação da participação dos alunos

enquanto produtores e a possibilidade de ampliar a narrativa a partir da

produção da revista digital.

Para verificar se o material apresenta aspectos que se aproximam de

elementos da estratégia da narrativa transmídia e gerar os dados para análise,

temos como base teórica as principais postulações feitas por Jenkins (2009 e 2011)

e Massarolo (2011) para esta verificação:

QUESTÕES REFERÊNCIAS

(1) Foi criado um universo que, potencialmente, pode engajar ou motivar os alunos à aprendizagem?

Massarolo (2011)

(2) A narrativa é contada por diferentes mídias e as partes são autônomas entre si?

Jenkins (2009[2006])

(3) O público participa da construção da narrativa? De que maneira?

Figura 18 – Quadro da categoria de análise (3) narrativa transmídia. Fonte: Produção nossa, 2018.

Durante a análise da narrativa transmídia, mostrou-se necessário

questionar como o uso dessa estratégia – ou de elementos dela – pode contribuir

para o trabalho do componente de Língua Portuguesa, ao levar em conta que um

dos princípios da narrativa transmídia é a diversidade de mídias, enquanto que, no

contexto do componente também devemos considerar a diversidade de linguagens.

Do mesmo modo, é importante pensar na participação dos alunos, no que diz

respeito à participação do público, levando em conta que eles trazem suas

referências culturais para as atividades, incluindo as de produção, além de um

contexto diferente de produção.

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CAPÍTULO 3. ANÁLISE DO AVENTURAS CURRÍCULO+

3.1 OS MULTILETRAMENTOS NO AVENTURAS

Para verificar se o Aventuras contempla os multiletramentos, serão

averiguadas propostas de modo a averiguar a presença das multiplicidades de

linguagens e semioses, além da diversidade cultural.

Nesse contexto, serão analisados se e como os elementos das diferentes

linguagens são trabalhados ou se as atividades apenas propõem a compreensão

dos efeitos de sentido em atividades de leitura, escuta ou visionamento de vídeos.

De forma integrada, serão verificadas se as atividades possibilitam a

identificação de uma aproximação dos princípios da pedagogia dos multiletramentos,

propostos pelo GNL (1996), com o objetivo de verificar de que modo essa

aproximação ocorre, além de averiguar se elas contribuem para a formação de

designers. Por fim, é verificado se o material contempla os novos letramentos,

dialogando com um novo ethos e uma Mentalidade 2.

3.1.1 Análise da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2

Iniciamos com a análise qualitativa da Missão 5: Comida na mesa –

Parte 2, do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, de modo a averiguar os dados relativos à

contemplação dos multiletramentos. A missão foi selecionada por lidar com

diferentes textos e produções multissemióticas e com a ferramenta digital do

agregador de conteúdo.

Apresentada como “Parte 2” da aventura iniciada na Missão 4: Comida

na mesa – Parte 1, a narrativa inicial da Missão 5 do “Conheça sua missão”

pressupõe continuidade e serialidade em relação à primeira “parte”. É possível

perceber que ambas as missões falam do mesmo tema, desde os seus títulos,

embora elas o tratam por diferentes textos e produções.

Enquanto a Missão 4 apresenta a temática por meio de gêneros da

esfera jornalística para discutir a existência da fome no mundo, a Missão 5 promove

o contato com produções culturais que apresentem, discutam ou denunciem a fome.

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Segundo a transcrição do áudio56 que a missão propõe o seguinte desafio:

Você já investigou algumas das causas da fome e apontou formas de superar esse problema crônico no Planeta.

Agora, sua última missão é pesquisar produções culturais como canções, poemas, quadros, obras de arte e vídeos que retratem e denunciem a fome, analisá-las e produzir uma revista digital que divulgue essas produções para sensibilizar a população e atrapalhar os planos dos dominatoriuns57. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

Entre as atividades propostas em “Conheça sua missão” estão:

Pesquisar sobre produções culturais que abordem o tema da fome e discuti-las.

Analisar duas produções culturais sobre o tema da fome: a série Retirantes, de Portinari, e o poema Tem Gente com Fome, de Solano Trindade.

Declamar um poema.

Produzir uma revista digital que comente produções culturais sobre o tema da fome. (SÃO PAULO, 2017, s/p)

As habilidades a serem desenvolvidas são:

Localizar informações explícitas nos textos.

Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.

Inferir uma informação, opinião ou tese implícita em um texto.

Identificar o tema de um texto.

Interpretar textos com o auxílio de material gráfico diverso, relacionando o texto verbal com outras linguagens.

Estabelecer relação de causa/consequência entre partes e elementos do texto.

Perceber como aspectos ligados à sonoridade das palavras afetam a produção de sentidos em textos poéticos.

Divulgar produções culturais, produzindo comentários. (SÃO PAULO, 2017, s/p).

56

Link para o áudio no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=196. Acesso em: 29

out. 2018. 57

Segundo a transcrição do áudio do “Conheça sua missão” da Missão 4: Comida na mesa – Parte 1, o plano

dos dominatoriuns é: “espalhar ainda mais a fome no planeta, pois esse é um jeito seguro e eficaz de tornar as pessoas submissas e dependentes de comida”. (SÃO PAULO, 2017, s/p) E, na Missão 4, os alunos teriam pesquisado sobre as causas da fome no mundo para minarem o plano dos dominatoriuns.

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Ao apresentar as atividades propostas e as habilidades, é possível

relacioná-las e verificar que, de modo geral, as habilidades indicadas poderiam ser

ampliadas, levando em conta as características dos diferentes textos e produções

culturas ou mesmo em relação às produções finais, como seleção, curadoria, design

etc. De modo geral, as habilidades estão relacionadas, sobretudo, às características

dos textos verbais escritos e à interpretação desses textos, sem grandes desafios,

como inferências, intertextualidade ou análise de efeitos de sentido, ainda que esteja

presente a análise de elementos próprios de outras linguagens presentes em textos

multissemióticos.

A seguir, faremos uma breve análise de cada uma das fases da missão.

Na “Fase 1: Produções culturais”, a missão inicia-se com uma roda de conversas

como aquecimento, com o objetivo de promover o contato dos alunos com

produções culturais que têm como temática a fome. Nessa Fase, eles podem

acessar letra de canção, videoclipe, áudio de canções e entrevista com um rapper

brasileiro. As atividades propõem a análise coletiva de canções, que tematizam a

fome, e o início de uma entrevista com Criolo, que menciona a fome em um sentindo

mais amplo. Ao final, os alunos são convidados a pesquisar produções culturais que

tenham o tema da fome.

Nessas atividades iniciais, os alunos transitam por diferentes gêneros,

alguns já estabilizados na escola, como canção (no que diz respeito à letra) e

entrevista, e por outros que nem tanto, como videoclipe ou mesmo a canção tomada

enquanto letra e música.

O acesso aos textos e produções dá-se por meio de links externos ao

AVA-Moodle. Poucas perguntas são feitas a respeito das canções Comida e Miséria,

dos Titãs, da entrevista com o rapper Criolo e do videoclipe do Acústico dos Titãs, e

são voltadas, basicamente, para o conteúdo dos textos ou para o estabelecimento

de relações intertextuais – há perguntas sobre o sentido da palavra fome nos

diferentes textos e sobre o levantamento de palavras e expressões de mesmo

campo semântico e que dão o sentido de fome em uma letra de canção, que não o

da palavra que não é mencionada.

Nesse sentido, vale ressaltar que, embora a atividade seja de discussão

oral sobre letras de canções e produções culturais que envolvem videoclipes e

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música, as questões são predominantemente voltadas para o letramento da letra. As

atividades que exploram elementos de outra linguagem são poucas, como a

linguagem sonora, por exemplo, quando se pede aos alunos para comparar duas

versões da música Comida dos Titãs é uma exceção: “Qual das duas versões da

canção apresentadas tem maior tom de protesto? Justifique sua resposta.” (SÃO

PAULO, 2017, s/p).

No material do professor, as orientações trazem uma síntese das

diferenças em termos sonoros que conferem mais “agressividade” ao primeiro

arranjo e, portanto, maior tom de protesto:

A versão acústica de Comida, de 1997 (disponível em: < https://goo.gl/PlKZj7 >. Acesso em: 4 nov. 2016.), apresenta algumas mudanças bem marcantes: foram criados arranjos de cordas e metais, o sintetizador e o contrabaixo foram substituídos por instrumentos acústicos, sem contar com a interpretação vocal, que é suavizada na versão do Acústico MTV. O tom agressivo e contestador da versão original, de 1987, (disponível em: https://goo.gl/QtltH6. Acesso em: 4 nov. 2016.) foi substituído por um estilo mais melódico, mas ainda com um certo peso, graças principalmente aos metais e cordas. A música original dava à percussão posição central (estilo da época, anos 80). O contrabaixo tocado em slap (técnica que consiste em bater com o polegar da mão direita e puxar as cordas do instrumento para obter sons percussivos), a bateria eletrônica e o sintetizador dão o tom à canção; constroem uma sonoridade bem marcada, agressiva e metálica. A guitarra na canção original serviu somente para criar a base, diferentemente da versão para a MTV, em que o violão tem uma posição central, e a harmonia e a linha melódica são definidas pelo sintetizador e pelo contrabaixo. Na versão original, os vocais (tanto o principal, de Arnaldo Antunes, como os backing vocals) são mais graves e "gritados”. Esse tom mais percussivo, grave e "alto” confere à versão original um caráter mais de denúncia e de contestação do que a produção acústica. (SÃO PAULO, 2017, s/p)

Pode-se considerar que esse tipo de exploração, contempla os

multiletramentos na medida em que explora a linguagem musical e os diferentes

sentidos que as diversas combinações de elementos envolvem. Mas, vale salientar

que, tal exploração não está garantida no AVA; ela fica nas mãos do professor. Isso

porque as informações estão apenas no material com orientações e respostas de

acesso e uso exclusivos do professor. Portanto, o material do aluno não didatiza

essa proposta, dependendo da iniciativa do professor para a realização do que é

proposto.

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Ainda nas orientações do professor encontram-se indicações de outras

produções a serem consideradas que vão de canções, como: Miséria, dos Titãs –

uma versão de Adriana Calcanhoto –, Fome de Tudo, da Nação Zumbi, Novidade,

de Gilberto Gil ao hit de Michael Jackson e Lionel Richie, We Are the World, criado

com o objetivo de arrecadar fundos para o combate à fome na Etiópia; de telas do

Portinari a esculturas do pernambucano Abelardo da Hora, passando pelo

documentário Garapá que acompanha o cotidiano de pessoas que passam fome.

Essas indicações representam uma relativa diversidade cultural,

representada por pintores clássicos e contemporâneos, rock, manguebeat etc., mas

o material poderia trazer ainda mais vozes periféricas além das que estão presentes

no documentário. Novamente, as sugestões ficam nas mãos do professor. Não há

nenhuma referência a elas no material do aluno.

Ainda que o material tenha sido criado, a princípio, para apoiar os

docentes no desenvolvimento da recuperação intensiva no desenvolvimento de

habilidades de leitura e de escrita – e embora ele seja utilizado no período regular –,

esse tipo de conteúdo didatizado no material do aluno podem aumentar as

possibilidades de os alunos estudarem e trabalharem com diferentes textos e

linguagens e, ao mesmo tempo, ampliarem seus repertórios.

A partir da análise da atividade proposta ao final da “Fase 1: Produções

culturais”, constata-se que, além de navegar, acessar vídeos, realizar a leitura da

letra de canção e da entrevista em meio digital – que está mais próximo do cotidiano

dos alunos, eles são convidados a pesquisar em meio digital. A atividade de

pesquisa, inclusive, permite que os alunos tragam produções que fazem parte de

sua bagagem cultural propiciando a ampliação de referências com potencial

diversidade.

Conforme indicado, vale ressaltar que o conteúdo da entrevista aborda a

leitura de um texto que é raramente recorrente na coletânea de textos dos materiais

didáticos adotados na escola: uma entrevista com o rapper Criolo sobre o tema da

fome. De forma geral, as produções culturais selecionadas para a missão, inclusive,

propiciam o trabalho com uma diversidade cultural mais próxima do fânone58 do que

do cânone – no que diz respeito aos textos, geralmente, trabalhados na escola e que

estão presentes nas coletâneas dos materiais didáticos.

58

Fânone, do original fanon: “fan” (fã) e “canon” (cânone).

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A partir da “Fase 2: Quiz da fome”, os alunos são convidados a participar

da apreciação de produções culturais e de uma discussão inicial para verificação de

conhecimentos prévios, entrando em contato com a obra de arte de Portinari,

Retirantes, e com o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, relacionando

a obra de arte de um artista que, geralmente, está presente na escola com a

produção do poeta e folclorista de Recife (PE). Essa atividade permite que os alunos

percebam que há diferentes formas de se olhar para o mesmo tema por meio da

análise e da articulação entre duas linguagens diferentes.

Por meio de quiz, os alunos devem realizar a leitura de imagem,

identificando alguns elementos que o quadro de Portinari contém e o que podem

representar, não havendo explorações de outros elementos da linguagem a não ser

dos elementos figurativos:

Figura 19 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 1: Produções culturais”, “Nível 1, Quiz – Questão 3 sobre o quadro Retirantes, de Portinari. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

No que se refere à exploração do poema Tem gente com fome, de Solano

Trindade, a atividade conta com uma questão em que são dados quatro mapas do

Rio de Janeiro e pede-se para que os alunos os explorem, determinando o que seria

os nomes de locais mencionados no poema. O objetivo é que os alunos se deem

conta de que se referem aos nomes de estações de trem de regiões periféricas do

Rio de Janeiro.

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A seguir, é proposto um Megadesafio: relacionar o ritmo, a intensidade, a

curva melódica, dentre outros elementos, de uma declamação do poema Tem gente

com fome, realizada pela filha de Solano Trindade59 e o movimento do trem, de

forma a: “perceber como aspectos ligados à sonoridade das palavras afetam a

produção de sentidos em textos poéticos" (SÃO PAULO, 2017, s/p):

Figura 20 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 2: Quiz da fome”, Megadesafio – Questões 1 e 2 sobre o poema Tem gente com fome, de Solano Trindade, declamado por Raquel Trindade. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Ainda na Fase 2, é proposta a atividade Bônus extra, na qual os alunos

podem gravar a suas próprias declamações do poema, com orientações para a

gravação da declamação: “Declamar é atribuir sentido ao que é lido. Supõe

interpretar o poema e marcar essa interpretação no tom da voz, na altura, no ritmo,

na pronúncia e na entonação das palavras” (SÃO PAULO, 201, s/p). As orientações

são seguidas de um tutorial para o uso do editor de áudio Audacity60, o que também

indica a exploração de elementos da linguagem, nem que seja de forma

transmissiva.

59

Declamação do poema Tem gente com fome, de Solano Trindade por Raquel Trindade. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=bDWEGsNehEE. Acesso em: 29 out. 2018. 60

Link das orientações para a gravação da declamação – “Tutorial para utilização do Audacity” no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/6/docs/m5/LP_EM_M5_tutorial_audacity.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Na “Fase 3: Revista digital”, os alunos são convidados a conhecer e a

navegar por revistas digitais para saber como elas são organizadas e, em seguida,

poder produzir uma, conforme proposto no desafio da missão.

O material propõe que os alunos se familiarizem com o Scoop.it, uma

ferramenta de curadoria; agregador de conteúdo online que permite o

compartilhamento de produções publicadas na Web. Sua estrutura permite a criação

de posts com vídeos, áudios, gifs, memes e imagens estáticas, seguidos de

comentários e de espaço para interação (se o leitor estiver logado). A ferramenta de

conteúdo funciona como suporte para a criação de uma revista digital.

No “Nível 1 – Conhecendo revistas digitais”, as questões recortam a

temática da revista Engarrafado, disponível no Scoop.it61, e a posição do autor frente

à temática, recuperam o processo de elaboração da revista digital lida e demandam

um primeiro post coletivo, o que é privilegiado em termos de pontuação (sendo

atribuídos 200 pontos, contra os 50 pontos das demais questões). No “Nível 2 –

Ação contra a fome” propõe-se uma análise de post para a revista digital Planeta

sem Fome com base na projeção de dois posts sobre uma mesma imagem de

Portinari:

Figura 21 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, projeção do professor. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

61

Link para a revista Engarrafado. Disponível em: http://www.scoop.it/t/engarrafado. Acesso em: 29 out. 2018.

Page 110: CAMILA DE CASTRO CASTILHO POR NOVOS MATERIAIS …repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/333004/1/... · e por engrandecer os momentos da qualificação e da defesa. ... Otávio,

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Figura 22 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, Arquivo secreto

62, Questões 1 e 2.

Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Ainda que a questão colocada seja relevante no sentido de fazer o aluno

refletir o que um post pode conter e, mais do que isso, como isso pode – ou não –

obter mais ou menos a adesão de leitores, os exemplos dados para comparação são

muitos desiguais e a resposta se torna óbvia – o segundo post é claramente mais

adequado à finalidade proposta.

Em seguida, é proposto que os alunos criem um post para a mesma

revista sobre a outra obra de Portinari já vista na missão, a partir de uma listagem de

itens possíveis. A listagem de itens apresentada na “Questão 3” auxilia o aluno a

recortar elementos da linguagem e a se dar conta do que pode ser objeto de um

comentário.

62

Link de acesso para o Arquivo secreto do “Nível 2 – Ação contra a fome”. Disponível no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/6/docs/m5/LP_EM_M5_F3_N2.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Figura 23 – Tela da Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio, “Fase 3: Revista digital”, “Nível 2 – Ação contra a fome”, Arquivo secreto, Questão 3. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Por fim, no “Nível 3 – Nossa revista digital: produções culturais contra a

fome”, os alunos são convidados, em trios, a produzirem os próximos posts para a

Revista Planeta sem Fome.

Dependendo do tempo e da quantidade de computadores, cada trio deve

produz uma revista diferente, criando logins próprios na ferramenta ou criam dois

posts para a revista da classe, criada pelo professor, que compartilha o login com os

alunos. Para ajudar no manejo técnico do agregador, o material disponibiliza um

tutorial63. A última referência à narrativa na Fase 3 é, inclusive, o tutorial da

ferramenta digital Scoop.it, preparado pelos solidariuns.

As atividades de leitura e de produção propiciam que os alunos se tornem

designers ao propor que eles pensem na composição da revista digital, nos

conteúdos a serem inseridos e de que forma esses conteúdos devem ser

organizados e apresentados ao leitor. Mais do que isso, os alunos são convidados a

se tornarem curadores de conteúdo para selecionar as produções culturais que

devem fazer parte da revista digital.

A proposta de produção na Missão 5, portanto, permite uma participação

efetiva dos alunos enquanto produtores. A atividade, que inclui o uso do agregador,

aproxima-se dos novos letramentos, visto que supõe curadoria e redistribuição de

conteúdos, além de postagens criadas, acessadas e compartilhadas em meio digital.

63

Link para o arquivo Tutorial sobre o Scoop.it, presente no “Nível 3 – Nossa revista digital” no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/e-m/m5/lp_8_9_m5_tutorial_revista_digital_scoop_rev-ok.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Ao apresentar características que se aproximam de uma proposta de

prática transformadora, a atividade de produção permite que os alunos atuem não só

como criadores de significação, mas, também, como transformadores, propiciando o

uso dos conhecimentos aprendidos de modo a refletir e/ou contribuir com a

realidade proposta na atividade, produzindo uma revista que possa ser acessada e

compartilhada – eventualmente, a produção pode servir para outros usos relativos a

outras realidades. Desse modo, a produção possibilita que os alunos contribuam

para a ampliação da narrativa ao compor uma revista digital no contexto do universo

criado.

Após a produção, os alunos devem inserir o total de pontos para acessar

a “Mensagem final”, em áudio64 e transcrita em texto escrito, que os parabeniza pela

trajetória e missão cumprida:

Parabéns, missão cumprida! Foi um belo trabalho de equipe! A AIT recebeu uma mensagem intergaláctica enviada pelos solidariuns parabenizando você e os demais agentes pela produção da revista. Após as denúncias, os dominatoriuns foram desmascarados e decidiram abandonar a Terra para tentar colonizar outros povos, que se deixem manipular mais facilmente pelos meios de comunicação e não reflitam, com humor ou crítica, sobre seu dia a dia. Agentes especiais MAT estão organizando a saída dos dominatoriuns da Terra.

Seu esforço será recompensado e, em nome do Alto Comando da Agência de Inteligência Terráquea, declaro que, a partir de hoje, você é um Agente especial máster LP e está habilitado para viver muitas outras Aventuras! (SÃO PAULO, 2017, s/p).

Por fim, os alunos devem realizar uma autoavaliação, verificando se as

fases percorridas contribuíram ou não para seu aprendizado.

Após uma listagem das atividades realizadas, os alunos acessam o que é

denominado uma Pesquisa de Satisfação da Missão 5, a ser respondida no

próprio AVA, por meio da qual é possível verificar que a missão propicia o estudo de

diferentes textos e, também, de seus elementos com questões como:

64

Link no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=51&chapterid=110. Acesso em: 29

out. 2018.

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“1. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a compreender de forma mais aprofundada imagens/fotos?

2. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a compreender mais como o ritmo, o volume, a altura e a intensidade interferem nos sentidos de um texto falado/lido em voz alta?

3. Você acha que a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2: A indignação diante da Fome ajudou você a selecionar e analisar produções culturais sobre um tema (a fome)?” (SÃO PAULO, 2017, s/p)

De modo geral, a missão analisada propicia a leitura em meio digital por

meio dos textos do próprio AVA e leitura dos textos que estão presentes na

plataforma. E os demais textos, assim como os OA e ferramentas digitais poderiam

ser ancorados por meio do acesso aos hiperlinks selecionados, disponibilizados e

ancorados no meio dos textos e das orientações das fases da missão. Igualmente

de modo geral, embora muitos dos conteúdos sejam acessados por meio de

hiperlinks, as atividades apresentam conteúdos impressos digitalizados e os PDFs

ficam embedados na atividade.

Embora o acesso a alguns textos/produções, OA e ferramentas digitais

seja fora do AVA, as atividades propostas são construídas de modo a promover os

multiletramentos, utilizando-se de tecnologia de modo intrínseco às atividades, não a

tornando acessória, nem opcional. Ou seja, nesse caso, o acesso aos hiperlinks, a

navegação pelo ciberespaço e pelos textos upados em diferentes plataformas, como

o compartilhamento de vídeos, não é um complemento, mas fundamental para a

realização das atividades e cumprimento da missão.

No que diz respeito às questões de análise, a missão apresenta

atividades voltadas às leituras texto-verbal e visual de textos canônicos, mas,

também, para gêneros/produções próprios do cotidiano dos alunos, como

videoclipes, além de se aproximar dos novos letramentos com uso de ferramentas

digitais, como o Scoop.it.

Na Fase 1, a proposta identifica características da pedagogia dos

multiletramentos ao propor que os alunos pesquisem referências artísticas a partir

de um tema socialmente importante, sendo necessária a interpretação dos contextos

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sociais dos quais os textos foram produzidos, além de levar em conta a experiência

de construção de significados.

Ao apresentar a declamação e convidar os alunos a gravar sua própria

declamação do poema Tem Gente com Fome, de Raquel Trindade, a Fase 2

propicia o desenvolvimento de práticas provavelmente pouco frequentes no

cotidiano da maioria dos alunos. Desse modo, o material propõe a vivência de

práticas relacionadas a gêneros e designs familiares aos alunos, incluindo seus

processos de produção e de recepção.

Na Fase 3, sobretudo na produção da revista digital, a atividade coletiva

apresenta proposta de atuação ativa, pesquisa e curadoria, permitindo que os

alunos (re)criem, critiquem e transformam por meio se referências de produções

culturais (canções, poemas, filmes, quadros etc.) que tenham versões do tema da

fome.

Desse modo, a Missão 5 apresenta características da prática situada e,

por meio da abordagem do tema, também do enquadramento crítico. Propõe, ainda,

que os alunos atuem como usuários funcionais – tendo que manipular e utilizar um

gravador e editor de áudio, além de compreender como declamar um poema, como

gravá-lo nesse contexto, seja em gravação digital ou eletrônica – e atuar como

criadores de significação, possibilitado que se tornem designers de textos com

cunho de crítica social ao criar a revista digital.

O enquadramento crítico, inclusive, é uma característica que está

presente ao longo da missão, pois os alunos devem interpretar os textos

apresentados levando em conta os seus contextos sociais. Do mesmo modo, a

multiculturalidade está presente por meio das leituras dos diferentes gêneros, desde

os lidos aos que podem ser selecionados para compor a revista digital.

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3.1.2 Diversidade de linguagens e mídias no Aventuras

Com o objetivo verificar de forma mais abrangente se e como o Aventuras

contempla os multiletramentos, apresentamos as propostas de produção final e as

grades de avaliação das outras missões selecionadas65. Essa proposta nos permite

inferir o que foi trabalhado e verificar até que ponto essas atividades podem ser

vistas como promotoras da formação de designers.

Na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, há duas propostas de

produção final: a do “Nível 1 – Produzindo HQs?” e do “Nível 2 – Em defesa das

tirinhas e dos quadrinhos”. Pelo fato de apenas a primeira apresentar uma proposta

de produção multissemiótica, somente ela será analisada. Nessa proposta, o

objetivo os alunos é “produzir tirinhas e impedir que elas desapareçam” (SÃO

PAULO, 2017, s/p). Segundo a grade:

Figura 24 – Grade de avaliação da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQs?”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

65

As 6 (seis) missões que fazem parte dessa análise – e também do próximo item sobre diversidade cultural –, são: Missão 2: SOS Quadrinhos e Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, Missão 2: Game Over? e Missões 4 e 5: O Poder das imagens – Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos e Missão 2: Ondas do rádio, de 1º ao

3º ano, do Ensino Médio.

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A partir da grade de avaliação da missão, é possível inferir que os

recursos da linguagem quadrinhística foram trabalhados visto que o quadro faz

referência a elementos como balões, onomatopeia etc. Assim, percebemos que

elementos ou aspectos dos gêneros multissemióticos quadrinho/tirinhas foram

trabalhos e não fazem parte apenas do tema da missão.

Ainda, no contexto da proposta, os alunos são orientados em relação à

estrutura da tirinha, a partir da exploração de algumas propostas de análise

sistemática, e à utilização da ferramenta A Fábrica de Tirinha para a produção de

tirinha, de modo que possibilitasse a construção de personagens, cenários e

diálogos. Desse modo, os alunos podem atuam como criadores de sentido, sendo

esta uma atividade que pode, eventualmente, contribui para a formação de

designers.

A Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, apresenta como proposta

de produção um podcast com leitura de contos de assombro, com efeitos sonoros,

trilha e manuseio da ferramenta de áudio, que seriam tocados aleatoriamente pelo

planeta para deixar os dominatoriuns com medo, já que eles não saberiam que

esses contos são ficcionais – o que se refere ao contexto de produção, ainda que

relacionado à narrativa do universo criado.

Segundo a proposta da atividade, é possível verificarmos que, para

realizar a produção, foram trabalhados diferentes elementos da linguagem sonora:

altura, ritmo, tom e entonação da voz e efeitos e trilha sonora.

Figura 25 – Grade de avaliação da Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: Seleção de contos e início da gravação”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

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Também é possível verificar uma dimensão mais técnica do trabalho com

a linguagem sonora contemplada por meio de instruções e orientações para a

gravação do podcast no intem “para a utilização do software Audacity”.

Na Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, a produção final é:

“escrever uma resenha sobre um dos jogos desta missão” (SÃO PAULO, 2017, s/p)

para que ela seja enviada aos solidariuns e a outros agentes da AIT de modo a

auxiliá-los na análise de jogos de plataforma.

A princípio, a proposta parece estar somente relacionada ao letramento

da letra. Porém, como resenha (e a missão) é sobre games, alguns de seus

elementos foram explorados, o que também pode ser verificado na grade de

avaliação da missão:

Figura 26 – Grade de avaliação da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, “Fase 6: Desafio final”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

É possível deduzir, por meio da grade de avaliação, que foram

trabalhados elementos dos games, como: trilha sonora, jogabilidade, gráfico,

animação etc., além do contexto de produção e os objetivos dos games.

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Analisando algumas atividades da missão, observamos que esses e

outros elementos foram trabalhados em duas atividades principais, como, por

exemplo, na “Fase 4: Jogos de Plataforma”, no Arquivo Secreto, Questão 3, que

solicita a comparação entre os games Odd Planet e Zombie Tsunami, por meio de

características dos jogos – como uso de câmera, tipos de deslocamentos, contrastes

de cores, trilhas sonoras etc. –, e, também, na “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3

– O que avaliar em um jogo?”, no Arquivo Secreto, em que os alunos são

convidados a preencher um quadro avaliando os jogos Odd Planet e Zombie

Tsunami, considerando alguns de seus aspectos “muito bom”, “bom”, “ruim” e “não

tem”:

Zombie Tsunami Odd Planet

Enredo

Dificuldade

Tempo de duração de uma partida

Trilha sonora

Efeitos sonoros

Customização das personagens

Interface (o que está na tela e que permite a interação entre o jogador e os elementos do jogo)

Gráfico

Figura 27 – Quadro de avaliação dos jogos Zombie Tsunami e Odd Planet, dos 8º e 9º anos, “Fase 5: Análise de games”, “Nível 3 – O que avaliar em um jogo?”, no Arquivo Secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

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Nas Missões 4 e 5: O poder das imagens – Parte 1 e 2, dos 8º e 9º

anos, que são missões cujas temática e proposta pedagógica permitem que sejam

trabalhadas de forma integradas, apresentam produções relacionadas à

imagem/fotografia.

A Missão 4: O poder das imagens – Parte 1 propõe a publicação de

uma fotorreportagem no jornal – que é fictício, pois não há suporte – a respeito de

um importante evento que acontece anualmente na cidade de São Paulo, a Virada

Cultural, a partir da edição de fotos dadas, cuja seleção altera a perspectiva da

narrativa do evento. Já a Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 propõe que os

alunos produzam fotodenúncias que coloquem em evidência situações-problema

que precisam de algum tipo de intervenção para serem solucionadas.

A seguir, a grade de avaliação da Missão 4:

Figura 28 – Grade de avaliação da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Virada Cultural”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

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A partir do quadro, é possível inferir que, entre os aspectos trabalhados

durante a missão estão: legenda, relação entre textos escrito e imagem e sequência

visual. No primeiro item da grade, nota-se que o critério está relacionado à uma

estrutura simplificada da fotorreportagem. No segundo item, é solicitada a definição

de “ponto de vista“, relacionado, em seguida, ao que os alunos quisseram passar.

Neste aspecto, embora a estrutura seja simplificada, a proposta de a produção

apresentar o olhar dos alunos sobre o que é retratado, apresenta caracterítica do

enquandramento crítico.

A partir da grade de avaliação da Missão 5 é possível verificar que o

trabalho relacionado à exploração da multissemiose se complementa ao realizado

na missão anterior. Também é possível inferir o trabalho da relação entre o verbal e

o não verbal e sobre a discussão de “o que é denúncia?”:

Figura 29 – Grade de avaliação da Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º e 9º anos, “Fase 3: A imagem que denuncia”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Em ambas as propostas de produção final há atividades que propiciam

e/ou aproximam-se da formação de designers. No caso da Missão 4, por meio das

instruções para o projeto gráfico da fotorreportagem e, no caso da Missão 5, é

proposta a criação um Tumblr, com foco na publicação da fotodenúncia, o que

propicia a organização da produção para a criação de sentido. Atividade com o

Tumblr, inclusive, aproxima-se de práticas dos novos letramentos, por ser um

espaço para (re)criação e compartilhamento.

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E, por fim, a Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos do Ensino

Médio, apresenta como objetivo de produção final a gravação de uma playlist

comentada com músicas que transmitem mensagens sobre o valor da paz, da

liberdade, da democracia e da justiça.

O contexto de produção está na narrativa, no fato de a AIT sugerir que as

playlist a serem produzidas sejam tocadas em várias rádios da Terra e de outros

planetas como defesa contra a lavagem cerebral que os dominatoriuns estão

tramando contra os terráqueos.

A proposta de produção permite que os alunos entrem em contato com

playlist comentadas, defina o tipo de playlist, escolha as músicas – possibilitando

que atuem como curadores – e produzam o roteiro da playlist para, enfim,

apresentar dicas de uso de editor de áudio, o Audacity. Além da proposta de

produção da playlist comentada, a grade de avaliação da missão permite-nos inferir

que trabalho foi realizado ao longo da missão:

Figura 30 – Grade de avaliação da Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º ano, “Fase 4: Música no ar”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

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A partir do quadro, é possível verificar o trabalho com elementos da

linguagem sonora presente nas canções – que pode ser verificado no terceiro item

da grade. A atividade de produção de playlist comentada também envolve um passo

a passo que inclui conhecer a estrutura e os tipos de playlists, o trabalho de

curadoria na escolha das canções, a produção de roteiro – texto envolvido em

muitas das produções e práticas contemporâneas –, além da atuação como usuários

funcionais na gravação e edição, com auxílio de editor de áudio, e avaliação.

De modo geral, a partir das análises das propostas de produção final e

das grades das 7 (seis) missões selecionadas – considerando também a Missão 5:

Comida na mesa – Parte 2 –, é possível verificar que foram realizados trabalhos de

exploração das multissemioses, tendo sido contempladas:

A linguagem verbal (escrita): Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º

anos; Missão 2: Game over? e Missões 4: O poder das imagens –

Parte 1, dos 8º e 9º anos; Missão 2: Ondas do rádio e Missão 5:

Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º anos do Ensino Médio.

A linguagem verbal (oral): Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos;

Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos do Ensino Médio.

A linguagem sonora: Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos; Missão

2: Game over?, dos 8º e 9º anos; Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º

anos do Ensino Médio; Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de 1º a 3º

anos do Ensino Médio.

A linguagem visual: Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos;

Missão 2: Game over? e Missões 4 e 5: O poder das imagens –

Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos; Missão 5: Comida na mesa – Parte 2, de

1º a 3º anos do Ensino Médio.

A partir do que foi verificado, podemos afirmar, portanto, que mais do que

uma semiose, em todas as missões analisadas, pelo menos duas das semioses

foram trabalhadas de forma articuladas.

Também foram possibilitados trabalhos com ferramentas e ambientes

digitais – ferramenta de HQ, editor de áudio, apresentador de slides, agregador de

conteúdo e publicação no Tumblr. Essas missões propiciam a atuação dos alunos

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enquanto criadores de sentido, seja na produção de HQs ou na composição da

reportagem no projeto gráfico do jornal, contribuindo para a formação de designers.

Produzir tirinhas, podcasts com leituras orais com efeitos especiais,

fotodenúncia, playlists comentadas, revista digital e editar fotoreportagem, a partir do

conhecimento dos elementos dessas linguagens contribui para a contemplação de

uma dimensão estética, que deve partir da presença da diversidade de linguagens

nas práticas de sala de aula.

No que diz respeito às condições de produção das propostas de

produção, todas contam com um contexto, geralmente relacionado ao universo

criado. Porém esses elementos não são considerados na grade de avaliação. Em

alguns casos como na Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos, o contexto está

articulado à proposta de produção e é verrosímil à narrativa, pois a produção é de

um podcasts de contos de assombro para assustar os dominatoriuns.

Quando à circulação das produções, em algumas missões, como na

Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, há instruções no material para que a

produção individual seja compartihada com os colegas e, até mesmo, informações

para baixar o arquivo e salvá-lo no computador. Em casos mais específicos em que

há orientações no material do professor para disponibilizar a produção no mural ou

blog da escola ou por meio da ferramenta digital para a comunidade escolar, como

nas Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 e Missão 5: Comida na mesa –

Parte 2.

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3.1.3 Diversidade cultural no Aventuras

Com o objetivo de saber se e como a diversidade cultural foi contemplada

serão levantados, de forma breve, os textos e as produções culturais presentes nas

atividades das 6 (seis) missões.

Na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, há quadrinhos de

diferentes autores, a grande maioria da indústria cultural ou da grande mídia, como:

O menino maluquinho, de Ziraldo, Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa, Calvin e

Haroldo, de Bill Watterson, Garfield, de Jim Davis, Níquel Náusea, de Fernando

Gonsales; a exceção é o quadrinho “Brincadeira de gente Grande”66, que não

contém humor, mas que, segundo as orientações no material do professor, “faz uma

referência irônica ao trabalho infantil, criticando-o”. (SÃO PAULO, 2017, s/p).

A Missão 3: Alma penada, dos 6º e 7º anos trabalha com contos de

assombro e contos populares tradicionalmente contemplados pela escola, como: o

texto “O defunto que devia”, conto de tradição oral contado por Ângela Lago, no livro

Sete histórias para sacudir o esqueleto, ou A moça que dançou depois de morta,

história contada por Antonio “Nico” Augusto Fernandes – em comparação a esse

conto, foi inserida uma animação inspirada no cordel de J. Borges -, História

corrente, recontada por Nelson Albissu e O vaivém, de autor desconhecido. Há,

ainda, sugestões de música e imagens, que servem para dar um clima de mistério e

assombro à primeira aula, mas que fica nas mãos do professor a decisão de uso,

que são: uma música clássica de Sebastian Bach, a música-tema de série de ficção

científica X-Files, a música O Fantasma da Ópera e Mistérios da Meia Noite, de Zé

Ramalho.

No que diz respeito à Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, a própria

existência de uma missão sobre games já busca contemplar as culturas juvenis.

Ainda assim, a missão explora games com diferentes propostas estéticas, como o

Zombie Tsunami – game agility, ou seja, que o personagem corre ao longo da tela -,

e Odd Planet – um jogo de aventuras. Além dos games, os alunos entram em

contato com postagens de vlogs e gameplays, um deles jogados pelo casal de

66

O Aventuras não apresenta a autoria da HQ e o link atrelado a ele está incorreto, pois direciona para o HQ do

Níquel Náusea. Porém, não é um autor que circula na grande mídia.

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influenciadores digital Leon e Nilce dos canais Coisa de Nerd e Cadê a Chave.

Esses gêneros são próprios das práticas contemporâneas de muitos dos alunos.

As Missões 4 e 5: O poder das imagens – Parte 1 e 2, dos 8º e 9º anos,

contemplam imagens do fotojornalismo, com fotorreportagem para explorar a

percepção dos sentidos para certas seleções e combinações de elementos podem

trazer. Destaca-se a exploração das fotografias de fotorreportagens de Sebastião

Salgado, fotógrafo brasileiro premiado e reconhecido mundialmente por retratar os

excluídos socialmente.

A Missão 2: Ondas do rádio, de 1º a 3º anos, do Ensino Médio,

representa algumas vozes da periferia – e de outras partes do país – ao contemplar

de áudios e videoclipes de autorias como: o grupo O Rappa, a roqueira brasileira

Pitty, o grupo AfroReggae e Emicida. Desse modo, o material apresenta

textos/produções mais próximas do fânone do que do cânone – ao que a escola está

acostumada, com textos escritos e coletâneas de clássicos literários.

E, retomando, a Missão 5: Comida na mesa – Parte 1 contempla

diferentes produções culturais (imagens, vídeos, canções etc.) para a produção de

uma revista digital, que deve ser produzida com o agregador de conteúdo.

Além de os textos/produções apresentados, é possível verificar que os

gostos e conhecimentos pessoais relativos aos gêneros e produções solicitados são

levados em conta nas: Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, que verifica

os conhecimentos e preferências de histórias em quadrinhos, e na Missão 2: Ondas

do rádio, de 1º ao 3º ano, do Ensino Médio, que solicita a colaboração dos alunos

em relação aos estilos musicais preferidos e hábitos relacionados a ouvir música.

O mesmo acontece nas produções finais das Missão 3: Alma penada,

dos 6º e 7º anos (por meio da escolha de contos de assombração, mas que é feita

dentro de um universo dado), na Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º

ao 9º anos (pela liberdade de escolha da situação-problema que pretende retratar

com a fotodenúncia), e na Missão 2: Ondas do rádio, de 1º ao 3º ano, do Ensino

Médio (que indica que as músicas da playlist deve ser sobre certos temas, mas sem

definir estilo ou autoria), em que a proposta permitem que os alunos produzam a

partir de suas referências ou de uma escolha mais livre.

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De modo geral, a análise das 6 (seis) missões permitiram identificar que

material contempla os multiletramentos por meio do acesso e o trabalho de

textos/produções multissemióticas e da multiculturalidade.

A organização das missões tem relação com essa proposta, no que se

refere à articulação entre gêneros do discurso e as habilidades de leitura e de

produção (ver Anexo III). Conforme pode ser percebido, as escolhas dos

temas/gêneros contribuem para a contemplação dos multiletramentos.

A diversidade de textos está presente com dois objetivos: para que seja

feito um trabalho de compreensão com foco na temática e para que sejam

estudados os temas e os textos, levando em conta suas (multis)semioses.

Já a diversidade cultural permite o acesso às produções culturais que já

fazem parte do repertório escolar como àquelas que não estão, geralmente,

presentes nas escolas. Muitos dos textos e produções, inclusive, contemplam

questões de ordem social, focando ou tematizando os excluídos, como no caso das

fotografias de Sebastião Salgado ou as canções do Emicida.

Quando à aproximação com a pedagogia dos multiletramentos, de forma

geral, as atividades apresentam características de prática situada, por considerar

práticas, discursos e experiências dos alunos, e enquadramento crítico, de modo

que os alunos são convidados a se envolverem em práticas significativa que

apresentam propostas de reflexão e compreensão sobre relações históricas, sociais,

culturais, políticas e/ou ideológicas centradas no valor de determinados sistemas de

conhecimento e práticas sociais, como, por exemplo, as atividades indicadas acima.

Em alguns casos, como na produção da playlist comentada, da revista

digital e da fotodenúncia, é possível considerar algo na direção de uma prática

transformada, reconhecendo possibilidades de formação de designers, conforme

indicado anteriormente.

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3.2 A GAMIFICAÇÃO DO AVENTURAS

Para analisar a gamificação, verificaremos quais elementos e técnicas de

games estão presentes na elaboração e na organização do material – abstração da

realidade, objetivos, regras, conflitos, níveis, tempo, recompensas, feedbacks,

repetições, curva de interesse e narrativa – e sua adequação para o contexto

educacional. Além disso, teceremos considerações sobre os supostos perfis de

jogadores (BARTLE, 1996, apud KAPP, 2012).

A gamificação é apresentada e conceituada no material “Língua

Portuguesa – Professores”, em Introdução ao Aventuras Currículo+, no item

Forma de organização das atividades67, que também apresenta a proposta de uso

da estratégia para a organização das atividades, na forma de “missões”, indicando

que elas estão articuladas em torno de uma “narrativa gamificada”.

Figura 31 – Tela sobre Forma de organização das atividades do material “Língua Portuguesa – Professores”. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

67

Link do vídeo do item Forma de organização das atividades, que explica o uso da gamificação. No AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=3. Acesso em: 29 out. 2018.

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O material apresenta o conceito de gamificação como sendo:

a integração dos elementos dos jogos, como níveis, badges e competição, às atividades. Antes, essa dimensão vinha sendo chamada de educação baseada em jogos, mas foi ampliada na medida em que essa tendência, além de incluir as ferramentas necessárias para apoiar o aprendizado, também está envolta em uma cultura e em um design específicos. (SÃO PAULO, 2017, s/p).

Para dar mais insumos ao professor sobre o que é gamificação68, o

material apresenta um vídeo69, que indica as razões para propor atividades

gamificadas: despertar o interesse dos alunos, por se valer de elementos e lógicas

que estão próximas às suas práticas; desenvolver estratégias para solucionar

problemas e obstáculos, sendo encarado com um desafio e isso pode ser por meio

da narrativa ou pelo próprio ato de jogar; promover o contato com regras e com

resultados favoráveis e desfavoráveis, o que permite que os alunos lidem tanto com

o sucesso como com os erros e o fracasso; promover maior interação, de modo a

despertar o interesse, propiciando a colaboração e a participação dos alunos;

desenvolver a concentração e a perseverança, uma vez que ao jogar, os alunos são

motivados a continuar.

A justificativa para o uso da estratégia coloca em primeiro plano a questão

do interesse, da mobilização e/ou do engajamento dos alunos nas situações de

ensino-aprendizagem, na direção do que já apontaram os autores considerados no

capítulo teórico. Destaca-se também, para além das razões de ordem cognitiva, a

importância do desenvolvimento de estratégias voltadas, por exemplo, para a

resolução de situações-problemas, como aponta McGonigal (2012), propiciando que

sejam realizados trabalhos de ordem interacional, como participar, interagir,

interessar-se, e atitudinal, como lidar com regras, erros, concentrar-se e perseverar.

Além do objetivo de introduzir o lúdico e as demais motivações pautadas

nas situações de ensino-aprendizagem, o vídeo sobre gamificação apresentado aos

professores também indica outras razões para se utilizar a gamificação como

estratégia de elaboração e organização editorial-pedagógica, como: permitir que

68

Para que o professor possa conhecer mais sobre gamificação, há a indicação de uma matéria do Portal do

Porvir. Disponível em: http://porvir.org/gamificacao/. Acesso em: 29 out. 2018. 69

Link do vídeo sobre gamificação para os professores, disponível no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=3. Acesso em: 29 out. 2018.

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professor e alunos ocupem outros lugares, de modo que o aluno assuma um lugar

mais positivo, potente e protagonista, no caso do Aventuras enquanto agente

especial, enquanto que o professor possa ocupar o lugar de mestre, ou seja, de

mediador, conduzindo os alunos70.

Isso porque, por mais que o uso da gamificação potencialmente propicie

situações de ensino-aprendizagem mais interativas, nem a estratégia nem o material

gamificado anulam o papel e a importância do professor em sala de aula. Inclusive,

o uso da gamificação no contexto da educação possibilita – dependendo da

proposta – tanto o protagonismo dos alunos como do docente, mas não no sentido

de transmissor e detentor de saberes. Na proposta do Aventuras, é possível

relacionar a atuação e o protagonismo dos professores à figura do mestre das artes

marciais, por exemplo:

alguém que conduz os demais jogadores pela história, apresentando seus desafios e aplicando as regras [...] Como o mestre das artes marciais, o professor não precisa saber tudo ou ser invencível, mas deve ter uma sensibilidade aguçada. É preciso que se proponha a olhar cada aluno, procurando perceber quais são as suas dificuldades e qual é o melhor jeito de ajuda-lo, contando para isso com o apoio da gestão da escola. (SÃO PAULO, 2017, s/p).

À essa afirmação também podem ser relacionadas e aproximadas

algumas das características do Role Playing Game71 (RPG), que significa “jogo de

representação”, em português. Ainda que não seja declarado na documentação do

Aventuras, a proposta aproxima o papel de mestre do professor do mestre do RPG.

Isso porque, no jogo, é o mestre que, geralmente, é o responsável por organizar as

ações, conduzir dos jogadores pela narrativa, apresentar os desafios, aplicar regras

e auxiliar na superação de obstáculos.

Os papeis propostos pelo Aventuras aos professores e alunos enquanto

mestres e agentes são propícios para os novos matérias didáticos que integrem

70

Link de experiências com o Aventuras Currículo+. Vídeo da Secretaria da Educação, disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=Qk_nm7emYHc | Jogos auxiliam alunos da rede durante reforço escolar, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rpjSY4fBeIA | Produção dos alunos – rap, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QzzZsiY5JFs | Opinião sobre uso de games, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JW4SvUIZCJc. Acessos em 29 out. 2018.

71 Essa modalidade de jogo surgiu nos Estados Unidos, em 1974, e chegou ao Brasil, em 1985. Trata-se de uma

forma de interpretação que pode ser usado como um método para criar, contar e vivenciar histórias, no qual os jogadores assumem personagens e criam narrativas colaborativamente. Conhecidos por serem mais colaborativos e sociais do que competitivos, o RPG tem vários formatos: do jogo de tabuleiro e do jogo de cartas aos live action e online.

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novas tecnologias, isso porque permite que o professor atue como mediador,

criando estratégias que incentivem o pensamento crítico e a cooperação,

demonstrando aos alunos que eles também são fonte de conhecimento e conteúdo.

Enquanto que os alunos podem assumir o protagonismo, desenvolvendo autonomia,

capacidade criativa etc.

No caso do Aventuras, o mestre deve conhecer as missões, saber sobre

os gêneros e trabalhar as habilidades de leitura e escrita por meio de diferentes

estratégias. Assim como o mestre de artes marciais e/ou o do RPG, o professor é o

responsável por conduzir os alunos para a realização dos objetivos, aplicar as

regras, alterar estratégias, improvisar, alterar rotas, inovar e renovar a partir dos

percursos e dos conhecimentos dos alunos, visto que ele conhece as principais

características dos alunos.

Do mesmo modo, os alunos enquanto agentes espaciais não são

passivos em seus processos de aprendizagem, dado que são convidados a assumir

um lugar de maior destaque, a vencer desafios, produzir sentidos e conteúdos,

selecionar e apresentar informações e cooperar entre si etc.

A partir da proposta de os alunos assumirem um lugar positivo, potente e

protagonista em conjunto ao protagonismo do docente, o Aventuras apresenta

orientações aos professores na Missão 0, em “Introdução ao Aventuras Currículo+”,

nos itens Gestão da aula, uma instância fundamental para a efetivação do

projeto72 e Gestão da aprendizagem, outra instância fundamental para a

efetivação do projeto73 tanto para a sua atuação como mestres como para as

situações de ensino-aprendizagem nas quais os alunos devem atuar como agentes

espaciais.

Assim como em um game de aventuras colaborativo74, o Aventuras

propõe que os professores estabeleçam, por exemplo, um contrato didático no qual

os objetivos e as condutas devem ser previamente combinados com os alunos.

Também são apresentadas orientações aos professores sobre a necessidade de

(re)planejamentos e reformulações de modo a verificar as possíveis intervenções,

72

Link para o vídeo sobre Gestão da aula, uma instância fundamental para a efetivação do projeto no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=5. Acesso em: 21 jul 2018. 73

Link para o vídeo sobre Gestão da aprendizagem, outra instância fundamental para a efetivação do projeto no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/book/view.php?id=17&chapterid=7. Acesso em: 21

jul. 2018 74

Games como Gauntlet, Halo 3, Diablo 3, entre outros, permitem que os jogadores se conectem online e

vivenciem a mesma aventura, seja ela uma aventura heroica contra seres das trevas ou do espaço.

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prever adequações, ou mesmo, organizar os tempos e os espaços e as etapas do

projeto. Da mesma forma é apresentada a importância de se considerar os

diferentes percursos, ritmos e tempos de aprendizagem, reforçando que o papel do

professor nesse processo é o de acompanhar, tanto o levantamento de dados como

as possíveis intervenções.

Desse modo, torna-se importante retomarmos as propostas dos

paradigmas de aprendizagem para considerarmos a possibilidade de uma terceira

via, para um futuro próximo, que deve partir do currículo, mas que se aproxime de

características importantes do paradigma da aprendizagem interativa, defendido por

Lemke (2010[1998]). Nesse contexto, as propostas de duplo protagonismo, tanto

para o professor como para os alunos, as propostas para gestão da aula e da

aprendizagem, que levam em conta a importância dos planejamentos e do

replanejamento, e o processo dos alunos, que propiciam o acompanhando e a

intervenção sempre que necessário, seriam adequados para esse terceiro

paradigma - intermediário.

A partir das averiguações apresentadas, é necessário rever a afirmação

de Kapp (2012) sobre gamificação no ensino, visto que o autor indica que um de

seus propósitos é centrar-se nas propostas nos alunos. Entretanto, se

considerarmos que a gamificação pode ser utilizada enquanto estratégia para a

elaboração de materiais didáticos, temos de levar em conta que essas produções

são, de modo geral, para professores e alunos.

Via de regra, os materiais didáticos são produzidos para alunos e para o

professor, que recebe o mesmo material do aluno, com respostas, orientações e

conteúdo teórico. Ao utilizar a gamificação, que tem como um dos principais

objetivos motivar os alunos, deve-se levar em conta que o professor também deve

ser incluído nessa lógica e que, de certo modo, também deve ser motivado a

engajar-se no uso do material.

No caso do Aventuras, o professor tem o material “Língua Portuguesa –

Professores”, que apresenta orientações gerais do programa, e o material dos

alunos com respostas e orientações específicas. Os alunos, assim como acontece

nos livros didáticos, têm acesso é apenas ao material de seu respectivo ano/série.

Enquanto material gamificado, o Aventuras configura-se como um

conjunto de atividades gamificadas ambientadas no AVA-Moodle. Essa

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característica é importante, posto que sua proposta estético-visual teve de

considerar as características e as limitações do AVA. A customização do AVA e dos

materiais alocados e ambientados no AVA apresentam interfaces e layout em tons

de azul e com elementos galácticos, que se assemelham, de modo geral (e dadas

as devidas proporções), ao conhecido game Halo, da Microsoft Studio/Xbox, que,

como outros semelhantes, pode fazer parte do universo dos alunos.

Figura 32 – Tela inicial do material de 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+, de Língua Portuguesa. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Figura 33 – Tela Halo 4 (2012). Fonte: Microsoft Studio/Xbox.

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A partir da comparação entre as imagens da customização do AVA-

Moodle para a elaboração da estético-visual do Aventuras e da ambientação do Halo

4, é possível verificar os tons escuros de azul, cinza e preto, a presença de

representações de naves espaciais e outros elementos galácticos, como planetas. O

Aventuras apresenta tons mais claros que o game, provavelmente para que o foco

esteja na leitura e não na fixação e imersão completa, como acontece em Halo. O

ambiente customizado também propicia relacionar a proposta estético-visual

atribuída ao Aventuras com a narrativa, de modo a ambientá-la.

Apesar de ser uma referência direta, não é apenas o Halo 4 que tem

semelhanças com o Aventuras. Ao utilizar-se de imagens, cores e fontes que fazem

referências a filmes e seriados sci-fi antigos e recentes, o Aventuras aproxima-se de

referências como Star Trek e Star Wars, por conta da temática de invasão

alienígena e conflitos intergalácticos e pela estética do universo, sobretudo a

visualização dos planetas, contribuindo para a construção do universo, para uma

relação direta com as referências pessoais e conhecimento de mundo, além de

propiciar uma imersão imediata.

Para incentivar ainda mais a imersão dos alunos, as atividades do

Aventuras são estruturadas e articuladas em torno de uma narrativa, que conta que,

em 2032, a Terra está ameaçada por extraterrestres75. Na Missão 0 do material

“Língua Portuguesa – Professores” e nas Convocações dos alunos, é possível ter

acesso a ela. E, como mencionado anteriormente, por meio dessa narrativa,

professores são convocados para serem mestres e os alunos são convocados para

se tornarem agentes:

A maioria das previsões científicas feitas até o início do século XXI estava errada: não só existe vida fora da Terra, como existem seres com uma tecnologia superior. Eles criaram uma “máquina camaleoa”: o ser que entra nesta máquina assume a forma que for programada, até mesmo a forma humana. Esses extraterrestres são mais desenvolvidos tecnologicamente, mas tão descuidados como os terráqueos com o meio ambiente. Ao longo dos anos, seus recursos naturais se esgotaram e, agora, eles precisam de água, de outros elementos químicos e de uma diversidade de fauna e flora, para assegurar o reequilíbrio e a estabilidade de seus ecossistemas. Mas há uma disputa entre os alienígenas... Há os dominatoriuns. Eles defendem a colonização de planetas que possam fornecer recursos

75

Transcrição da narrativa apresentada no vídeo de abertura do material, presente na Missão 0, como parte da convocatória dos professores e nas Convocações dos alunos.

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ou servir de base para uma morada futura; em ambos os casos, a escravização de seus habitantes é uma ação prevista. Há os solidariuns. Eles defendem um fórum interplanetário onde haja uma discussão sobre como os planetas podem cooperar e superar os problemas atuais. Uma invasão combinada à Terra está planejada: marcianos, saturnianos, jupterianos e uranianos – que são dominatoriuns ou solidariuns – estão tomando a forma humana e desembarcarão na Terra em 10 dias. Mesmo querendo a dominação, os dominatoriuns sabem que uma luta armada destruiria os recursos de que necessitam. É preciso, então, adotar outra estratégia... Eles pretendem tomar controle da Terra, trazendo muitos dominatoriuns em suas poderosas naves. Muitos virão em forma de humanos, para infiltrar vírus em sistemas e tomar o controle dos principais meios de comunicação do planeta, conquistar territórios e espalhar bases inimigas... Conquistar a Terra! Mas, os solidariuns vão impedir que isso aconteça, ajudando os terráqueos a destruir as bases inimigas e defender territórios; a limpar os sistemas de computador, fazendo com que a população seja crítica em relação ao que lê e escuta e não se deixe levar pelas aparências... Sua missão e de seus colegas-convocados é defender a Terra contra as ameaças de infiltração e controle. Para isso, vocês terão que se preparar durante esse tempo para ingressar na equipe de agentes especiais da AIT (Agência de Inteligência Terráquea). Você deverá cumprir pequenas missões para se tornar um agente máster e ingressar na AIT. [...] Aspirantes a Agentes Língua Portuguesa. Como eles pretendem ocupar as empresas de comunicação, faz parte de seu treinamento prestar muita atenção ao que está sendo publicado diariamente pelos principais jornais e sites noticiosos. ALERTA! Mas também é preciso ajudar seus companheiros de jornada a fazerem o mesmo, no melhor estilo “um por todos e todos por um”. Ninguém pode ficar de fora! Identificar os solidariuns também ajudará a sua missão, pois eles são contra a exploração colonialista e conhecem os pontos fracos dos dominatoriuns. Pareceu uma missão impossível? Não se desespere! A AIT preparou um programa de formação intensivo para você, que vai habilitá-lo a se tornar um agente especial máster. Serão 5 missões para “Agentes Língua Portuguesa” [...]. Ao longo das missões, você vai realizar atividades que lhe garantirão bônus-habilidades, em formato de selos, que lhe permitirão conseguir o objetivo final. Prepare-se! Aventuras Currículo+. O futuro da humanidade está em suas mãos. (SÃO PAULO, 2017, s/p)

A narrativa criada contextualiza a proposta do material enquanto

atividades gamificadas de aventura a partir da situação inusitada apresentada, que

se passa com o planeta Terra: uma eminente invasão extraterrestre. Esse tipo de

narrativa tornou-se popular, sobretudo, após a década de 1930, com a transmissão

de Guerra dos mundos. Em 1938, Orson Wells e a companhia teatral The Mercury

Theatre on the Air narraram pelo rádio uma adaptação do livro Guerra dos mundos,

de H. G. Wells, publicado pela primeira vez em 1897.

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Quando os alunos são convidados para serem agentes espaciais, a

narrativa pode se aproximar do universo dos alunos, uma vez que remete a

referências da cultura pop de filmes/livros no estilo MIB - Homens de Preto, de 1997,

ou O Guia do Mochileiro das Galáxias, série de Douglas Adams, originalmente

transmitida na BBC Radio, em 1978, sendo adaptada para livros, jogos, quadrinhos,

série de televisão, e, em 2005, para o cinema.

Articuladas em torno dessa grande narrativa estão as missões. No que diz

respeito à relação entre a grande narrativa e as narrativas das missões, é preciso

considerar a estrutura e a organização dessas missões no material. A partir do menu

lateral, é possível identificar que as missões são enumeradas de 1 a 5 (com exceção

dos 6º e 7º anos em possui 4 (quatro) missões). Ainda que subjetivamente, o

material induz professores e alunos a seguirem a sequência proposta, iniciando as

atividades na Missão 1 e terminando na Missão 5 (ou Missão 4, como no caso

anteriormente mencionado.

A partir dessa descrição da estrutura e da relação entre as narrativas, foi

possível verificar que: (1) todas as missões dependem da grande narrativa, pois

partem dela para apresentar e contextualizar seus desafios; (2) no caso das últimas

missões de cada ano/série, há uma menção de que ela é a última missão do

ano/série, como se fosse uma etapa final da narrativa. Ainda assim, é possível

considerar a autonomia de algumas das missões, tendo em vista a relação principal

e individual com a grande narrativa e por apresentar uma proposta pedagógica

encerra-se potencialmente em si76 – isso será melhor explicado na categoria de

análise (3) elementos da narrativa transmídia.

As missões são estruturadas em fases, que, por sua vez, podem

apresentar um ou mais níveis. Com o objetivo de ampliar a jogabilidade, a

participação e a imersão dos estudantes, o material também apresenta: bônus

extras, missões ultrassecretas, megadesafios etc. que, em geral, envolvem

atividades mais sofisticadas de análise/compreensão de textos/produções e

produções de textos extras.

Mais do que ampliar a jogabilidade e incentivar a participação dos alunos,

a estrutura do material organizada em missões, fases e níveis (e demais atividades)

76

As exceções a isso são as Missões 4 e 5: O poder das imagens – Partes 1 e 2, dos 8º e 9º anos e as Missões 4 e 5: Comida na mesa – Partes 1 e 2, do 1º ao 3º ano do Ensino Médio, que pressupõem uma

integração tanto entre as propostas pedagógicas como a sequência narrativa.

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articula as propostas editorial e didático-pedagógica. Ou seja, a hierarquia permite

que o material tenha relativa padronização ao mesmo tempo em que cada etapa

apresenta uma função específica.

As missões, enquanto unidade maior entre os anos/séries, apresentam as

situações-problema que os alunos devem resolver como agentes. Toda missão inicia

com uma seção “Conheça sua missão”, que apresenta o desafio, contextualizado na

narrativa para propiciar o engajamento dos alunos, os objetivos pedagógicos da

missão e as habilidades a serem desenvolvidas, e uma seção “Mensagem final”,

com feedback da trajetória contextualizado na narrativa.

Em “Conheça sua missão”, os alunos conhecem a missão e seu objetivo

por meio da escuta do áudio e/ou da leitura da transcrição do áudio. Articulado à

narrativa, o áudio de convocação para a aventura lembra as mensagens presentes

na série de TV e nos filmes de Missão: impossível, que gravadas em áudio e se

autodestruídas em 5 (cinco) segundo, após a apresentação da missão77. No caso da

Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos, por exemplo, segundo

o “Conheça sua missão”, a missão78 é:

Os dominatoriuns perceberam que os terráqueos estavam atentos em relação às notícias impressas. Resolveram então atacar de outro modo: selecionar estrategicamente algumas imagens para manipular, publicar nos jornais e direcionar o olhar e a opinião dos leitores do planeta.

Sua missão: refletir sobre o poder da imagem a partir de materiais preparados pela cúpula da AIT em parceria com os solidariuns. Você terá que se colocar no lugar de um editor de jornal e selecionar fotos para matérias jornalísticas. Na missão seguinte, terá também que colher imagens. Pronto? Então, trate de ficar de olhos bem abertos.

Essa mensagem se destruirá em 5 segundos: 5, 4, 3, 2, 1...

(SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

Para que os alunos possam enfrentar esse desafio, as missões são

compostas de fases. Estas etapas apresentam, dentro de uma mesma missão, um

movimento metodológico (que pode ser verificado na Figura 12 – Quadro das fases

77

Essa referência só é percebida no áudio. A transcrição do áudio não apresenta o recurso sonoro ou mesmo a

contagem regressiva de destruição da mensagem. 78

Link para o áudio de “Conheça sua Missão” da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, dos 8º e 9º anos

no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=247. Acesso em: 29 out. 2018.

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das missões do Aventuras Currículo+79, p. 87). As fases iniciam-se por atividades

mediadas pelo professor, seguidas pelo envolvimento dos alunos com questões e

desafios que envolvem mais a leitura do que a escrita e terminam com a proposta de

produção final que permite prepará-los para o cumprimento do desafio proposto no

início da missão.

Ainda no que concerne às fases, estas são divididas em níveis, que

permitem a organização e a realização de um trabalho com diferentes

textos/produções, atividades e/ou resolução de questões dentro de uma mesma

etapa. Vale ressaltar que uma característica da “Fase 1” – e de outras atividades – é

a realização coletiva, o que impede a autonomia de percursos, já que os alunos são

conduzidos pelo professor e, nesses casos, participam coletivamente.

Já o uso de níveis permite que as situações de ensino-aprendizagem

sejam potencializadas, sem ser repetitivas. Por exemplo, no caso da Missão 4: O

poder das imagens – Parte 1, as fases são: “Fase 1: Imagens editadas e

manipuladas”, que propõe aos alunos que “compreendam o poder das imagens

fotográficas manipuladas pelos dominatoriuns ao discutir a importância da pós-

edição e da montagem e edição das fotografias e seus impactos no jornalismo;

“Fase 2: Olhares e opiniões”, que apresenta dois níveis: “Nível 1 – Quem substituirá

Neymar?”, com um quiz que verifica se os alunos são capazes de observar com

olhar crítico as imagens manipuladas pelos dominatoriuns sobre a Copa do Mundo

no Brasil, em 2014, e o “Nível 2 – Vamos analisar outra imagem?”, com o objetivo de

fazer uma análise crítica da imagem com capas de duas revista sobre o mesmo

assunto.

A “Fase 3: Mobilidade urbana” apresenta um texto jornalístico com lugar

para inserção de imagens dadas para que os alunos possam não só refletir sobre

como combiná-las com o texto escrito, mas possam também avaliar como podem ou

não alterar o sentido geral do texto. E, finalmente, a “Fase 4: Virada Cultural”, com a

proposta de publicação de uma fotorreportagem em jornal. Nesta fase, além da

proposta há orientações para a composição do projeto gráfico do jornal e para

compor a fotorreportagem.

79

As Missão 5: O poder das imagens – Parte 2 e a Missão 5: Comida na mesa – Parte 2 apresentam apenas 3 (três) fases enquanto que a Missão 2: Game over? possui 6 (seis) fases. As demais variam de 4 (quatro) a 5 (cinco) fases, conforme indicado na Figura 12 – Quadro das fases das missões do Aventuras Currículo+

(p. 87).

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Assim como as missões começam com o “Conheça sua missão”, elas

também finalizam com uma “Mensagem final”, que é apresentada por meio da

escuta do áudio e/ou da leitura da transcrição do áudio, contextualizados à narrativa

e que, geralmente, parabenizam os alunos pelo sucesso e pelo ao fim da missão –

feedback que será questionado na sequência.

Por exemplo, na Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, a

“Mensagem final”80, além de parabenizar o aluno por ter completado a missão

também indica o que ele deve fazer para a próxima, o que reforça a integração entre

missões “Parte 1” e “Parte 2” por meio da temática, mídia e/ou narrativa:

Parabéns! Você conseguiu completar mais uma missão. Mais do que isso, agora está apto para ler não só textos escritos, mas também as imagens, e poderá enfrentar os dominatoriuns de igual para igual.

Descanse, pois na sua próxima e última missão você vai aprofundar seu conhecimento sobre o poder da fotografia; vai conhecer o que são fotorreportagens e fará uma foto denúncia. Até lá, fique de olho nas imagens e no que os dominatoriuns podem estar fazendo com elas. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

De modo geral, a organização do Aventuras em missão, fases e níveis (e

atividades extras) – além de manter os alunos em clima de jogo – permite/supõe que

o professor atue como mestre ao longo das atividades de modo a mobilizar os

alunos para a missão, retomar os desafios que os alunos devem enfrentar, recuperar

conhecimentos prévios e referências dos alunos sobre conteúdos e gêneros que

serão trabalhados e realizar intervenções adequadas antes, durante e depois das

atividades de leitura e escrita, desafiando-os a continuarem a aventura como

protagonista (agente) de seu aprendizado.

Outro elemento que está presente no Aventuras e se relaciona com essa

organização são as regras. No contexto da gamificação, há diferentes tipos de

regras: operacionais, ou seja, que definem como o sistema funciona; fundamentais,

pautadas pela estrutura; e implícitas ou de comportamento, que são determinadas

por meio de um acordo. Ainda existem regras instrutivas, porém, no contexto do

Aventuras, esse tipo de regra está presente nos tutoriais, dicas e outras instruções,

80

Link para o áudio da “Mensagem final” da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=254&pageid=30&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.

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para uso de editor de áudio, agregador etc., e servem de orientação para os alunos

realizarem suas produções.

As regras operacionais presentes no material são referentes ao

funcionamento do AVA-Moodle, ou seja, como ele é acessado, quais são os

requisitos necessários para acessar as pastas, se o usuário é professor ou aluno;

quais publicações ele pode visualizar etc. Esse tipo de regra é, de modo geral,

implícito e uma determinação editorial, que não tem relação direta com as escolhas

dos usuários, embora seja necessário considerar os usuários e a proposta

pedagógica para programar tais regras.

As regras fundamentais e implícitas estão presentes na progressão de

uma fase para a outra em uma mesma missão. No que diz respeito às regras

fundamentais, por exemplo, os alunos de 8º e 9º anos só podem fazer as atividades

dos seus respectivos anos/séries. Isso é fundamental e está explícito porque é uma

regra fundamental e operacional, porém não há obrigatoriedade explícita dizendo

que o aluno tem que passar de “fase” para ir para a próxima, apenas na missão final

é que existe a obrigatoriedade de inserção de um número mínimo de pontos.

Entretanto, a mediação do professor exige uma sequência, ou seja, os alunos

devem estar mais ou menos nas mesmas atividades.

Conforme já indicado, o menu lateral e a indicação numérica crescente

nas missões e nas fases induzem a sequência de acesso do jogador, embora o AVA

não proíba o acesso não sequencial e/ou linear – embora colocada de forma

implícita, essa sequencialização não estaria próxima da estrutura apresentada pelos

materiais didáticos impressos organizados em unidades e capítulos? Mesmo

utilizando-se dos elementos das etapas e das regras fundamentais, não seria

interessante se os novos materiais didáticos apresentassem uma organização mais

livre e com possibilidade de acesso não sequencial? Nesse caso, a mediação do

professor também teria de que ser diferente e assim como o material teria que

prever diferentes percursos com o objetivo de permitir aos alunos maior autonomia,

mas, ao mesmo tempo, prever momentos e atividades coletivas.

De todo modo, o material também se vale dos conhecimentos prévios dos

alunos sobre jogos e games para considerar esse acesso sequencial entre fases e

missões, além de contar com a atuação e a mediação do professor, que deve

acompanhar a realização das atividades, verificando se os alunos finalizam uma

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fase para passar para a outra. Um arquivo que permite a verificação do cumprimento

dessas regras é a Folha de serviço81, que indica as fases, atividades e bônus

obtivo. Nesse caso, as regras fundamentais podem se relacionar com as regras

comportamentais.

As regras comportamentais, inclusive, devem ser explicitadas e

combinadas no pacto didático, no qual professores e alunos acordam que as

atividades devem ser cumpridas antes de seguirem a diante. Os contratos didáticos

são propostos no item Gestão da aula, uma instância fundamental para a

efetivação do projeto, localizado no material “Língua Portuguesa – Professores”,

devem ser destacadas e pactuadas com os alunos de modo que possam contribuir,

sobretudo, do ponto de vista pedagógico. Isso porque essas regras devem ser

habituais às dinâmicas de sala de aula por se tratarem de práticas sociais e de

cidadania. Saber reconhecer, estabelecer e cumprir regras, inclusive, faz parte do

trabalho em sala de aula.

Ainda em relação às regras fundamentais, elas também estão presentes

no preenchimento de questionários e quizzes. Essas regras são, por exemplo, no

número de tentativas que os alunos têm para responder a um quiz, que, geralmente,

têm, em média, 2 (duas) tentativas de resposta:

Figura 34 – Tela da Missão 4: O pdoer das imagens – Parte 1, “Fase 2: Olhares e opiniões”, “Nível 1 – Quiz”, dos 8º e 9º anos. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

81

Link para a Folha de serviços da Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, disponível no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/8-e-9/m0/LP-prof-8e9-M0-FS.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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O número de tentativas nos quizzes também permite a discussão sobre a

repetição, tentativa e erro no contexto da aprendizagem. Assim como alguns games

que apresentam um número restrito de tentativas para se passar de fase, atribuindo

ao jogador algumas “vidas”, os exercícios do Aventuras permitem que, quando há

erro na resposta, seja possível verificar e, se a resposta estiver incorreta, tentar

novamente, pelo menos uma vez.

Entretanto, a informação de “resposta incorreta” é genérica e não

apresenta qualquer orientação ou direcionamento que possa contribuir para uma

nova reflexão dos alunos, o que indica uma perda do potencial pedagógico que o

feedback pode ter. Nesse caso, é importante a atuação do professor. Ainda assim, a

possibilidade de os alunos errarem e ter uma nova tentativa de resposta em um

material didático permite-nos questionar tanto a vantagem sobre as possibilidades

do material didático impresso – que só permite uma nova tentativa a partir da

mediação do professor – como, também, a desvantagem, por exemplo, da

recorrência do recurso geralmente presente em atividades programadas de múltipla

escolha. A indicação de novas tentativas poderia estar em outras atividades do

material atividades

Desse modo, identificamos que o elemento da repetição também está

presente no Aventuras. A repetição não acontece apenas nas tentativas de resposta

aos questionários e quizzes, mas, também, no âmbito funcional por meio da

repetição de missões entre os anos/séries, como no Capítulo 1: “A possibilidade de

se fazer novamente uma tarefa ou ação é uma das grandes vantagens da

gamificação no ensino, pois o erro é fundamental para a aprendizagem.” (SÃO

PAULO, 2017, s/p). O sentido de repetição aqui, portanto, está relacionado com a

possibilidade de lidar com o erro, de tentar, novamente, superar obstáculos, resolver

problemas etc., aperfeiçoando estratégias ou utilizando outras.

De modo a ampliar o sentido de repetição, verificando este elemento sob

uma abordagem técnico pedagógica, é possível importante retomar a Figura 14 –

Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94), para identificar a repetição da Missão

1: O quarto poder, nos materiais dos três anos/níveis, e da Missão 3: Coisas da

vida, presente nos materiais de 8 e 9 anos e do Ensino Médio. Essa repetição

pode potencialmente ser notada pelos alunos, tornando-se uma desvantagem para o

material, no caso de serem utilizados para uma mesma turma, em anos distintos

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dois dos materiais, o dos 6º e 7º anos e, no ano seguinte, o dos 8º e 9º anos por

exemplo. A repetição da mesma missão nos três anos/séries pode ser

desanimadora, sobretudo se uma turma que utilizou no 7º ano pretende utilizar no 8º

ano82.

Em relação aos aspectos pedagógicos, a repetição também está presente

na estrutura das missões, na organização das fases (ver Figura 12 – Quadro das

fases das missões do Aventuras Currículo+, p. 87). Embora as missões não

apresentem estratégias alternativas, as orientações presentes no item Gestão da

aula, uma instância fundamental para a efetivação do projeto, do material

“Língua Portuguesa – Professores”, indicam a possibilidade de retomada de

mudança da estratégia.

Ainda no que diz respeito aos exercícios, questões e atividades, outros

dois elementos utilizados e relacionados a eles são: o uso do tempo e o feedback.

No caso do tempo, há dois usos de tempo que podem ser identificados no

Aventuras: um que incentiva o professor a mediar o tempo, respeitando o tempo dos

alunos, como pode ser verificado na Missão 5: Comida na mesa – Parte 2,

orientações do professor:

Após essa etapa, proponha que os alunos agrupem as preferências musicais da equipe. Eleja um agente para auxiliá-lo nessa tarefa. Determine um tempo para que organizem a proposta de agrupamento. Realizada a contento, a atividade rende 100 bônus para quem contribuiu adequadamente: ouviu e colaborou. Faça a gestão desse tempo durante sua aula, garantindo que a atividade não se estenda além do necessário, perdendo o foco e o objetivo. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).

O outro uso propõe um tempo determinado para a atuação dos alunos,

como pode ser verificado na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 3:

Treino Avançado em HQ”, “Nível 1 – Revisitando super-heróis”:

82

Como o material era, a princípio, para a recuperação de aprendizagem, essa questão não era,

necessariamente, problemática. Entretanto, a partir do momento em que o material passa a ser utilizada de forma regular, mais professores e alunos podem se interessar em utilizá-lo, tornando a repetição da Missão 1: O quarto poder nos três anos/séries uma questão a ser revista.

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A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando um ataque massivo contra os quadrinhos. Todos os agentes precisam estar prontos! É hora de ampliar as referências e lembrar dos super-heróis que ocupam um lugar de destaque nas histórias em quadrinhos.

Nesse nível, vocês só terão 30 minutos para responderem às questões propostas, e o Mestre controlará o tempo de todos. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

Ainda, o uso do tempo na Missão 4: Tremores e aquecimentos, dos 6º

e 7º anos, “Fase 3: Desvendando vulcões”, “Nível 3 – Vulcões no Brasil”, Desafio

vulcânico 4, que indica ao aluno:

Existem vulcões ativos no Brasil? Por quê? Você terá 10 minutos para buscar as repostas na internet. Consulte pelo menos três fontes e compare as informações encontradas. (400 bônus). (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

No primeiro caso, o uso do tempo pode ser compreendido como uma

regra flexível, sendo mais comportamental do que instrutiva. No segundo caso, o

uso de tempo torna-se uma regra fundamental e instrutiva, mas que pode fazer com

que eles respondam as questões sem qualquer reflexão. No terceiro caso, a

restrição do tempo de pesquisa coloca-nos a questão: é recomendável dar tempo

para consultas na Internet? Isso não pode incentivar os alunos a pegar as primeiras

fontes que aparecem? Em contrapartida, é possível dar liberdade de tempo tendo

em vista o tempo de aula?

Nesse sentido, o controle do tempo versus a determinação do tempo

apresenta propostas pedagógicas distintas e ambas – combinadas – podem ser

positivas para os alunos, sobretudo a partir da atuação do professor. A partir das

orientações sistematizadas, o professor deve ampliar ou limitar o tempo levando em

conta – e trabalhando – os diferentes tempos de aprendizagem dos alunos.

E, conforme indicado anteriormente, o Aventuras também apresenta o

elemento feedback. O feedback pode ter diferentes funções, sendo utilizado de

forma corretiva ou motivacional, contínua ou instantânea etc. No contexto do

material, os feedbacks são, em sua maioria, positivos e motivacionais, visto que

apresentam, sobretudo, felicitações pela realização das missões, como pode ser

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verificado nas “Mensagens finais” das missões. Exemplo: “Mensagem final” 83 da

Missão 1: O quarto poder, dos 8º e 9º anos:

Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea.

Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV.

Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).

Apesar de motivar os alunos, esse tipo feedback não os ajuda na

progressão de suas aprendizagens.

Em alguns casos, os feedbacks são tanto motivacionais como

orientadores. Esse tipo de feedback é mais implícito e pode ser localizado nos

enunciados entre uma fase e outra de uma mesma missão, como, por exemplo, na

Missão 4: O poder das imagens – Parte 1, “Fase 3: Mobilidade urbana”:

Você, agente, está se qualificando para não cair nas armadilhas visuais dos dominatoriuns e percebeu como, por meio das imagens fotográficas, é possível direcionar o olhar e a opinião de leitores sobre um determinado fato.

No entanto, as imagens também servem para ilustrar ou trazer mais informações, complementando o texto escrito. Assim, é útil pensar em como combinar palavras e imagens.

O Mestre vai fornecer informações ultrassecretas. Siga as orientações dele! (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).

Ainda assim, esse tipo de motivação não permite que os alunos repensem

seus caminhos, revejam seus erros ou repitam alguma fase, como acontece em

feedbacks contínuos e corretivos. Vale ressaltar que não se trata de defender o uso

de um elemento que apresente um feedback de certo ou errado para os alunos, mas

por apresentar atividades gamificadas, o material poderia levar em conta, conforme

propõe no item do material “Língua Portuguesa – Professores”, no item Gestão de

83

Link para o áudio da “Mensagem final” da Missão 1: O quarto poder, dos 8º e 9º anos no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/lesson/view.php?id=221&pageid=24&startlastseen=yes. Acesso em: 29 out. 2018.

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aprendizagem outra instância fundamental para a efetivação do projeto, “os

diferentes percursos, ritmos e tempos de aprendizagem” (SÃO PAULO, 2017, s/p).

Desse modo, o mais adequado, seria contemplar as diferentes

possibilidades mesmo nos enunciados, dialogando com os alunos de modo a

oferecer novas tentativas, reflexões e motivações, que dependem de seus

processos e desempenhos, permitindo aos alunos refletir sobre suas trajetórias e

propiciando novas chances de retomada das fases anteriores, caso desejem.

Outro elemento de game que tem como objetivo motivar os alunos são as

recompensas. Por meio dos pontos, os alunos conquistam patentes e selos de

agentes especiais máster de Língua Portuguesa pela AIT, a Agência de Inteligência

Terráquea.

Segundo Hunicke, LeBlanc e Zubek (2004, p. s/p), as recompensas são

elementos de games do nível mecânico e simples. Entretanto, é um elemento que

tanto se adequa à estrutura que o AVA permite como ao contexto educacional, por

ser de interesse dos próprios alunos, sobretudo se contextualizado em uma

narrativa, como as patentes e os selos.

Em relação aos pontos, o Aventuras apresenta articulação entre a

realização das atividades e a pontuação, ou seja, a cada atividade realizada, os

alunos recebem uma pontuação. Ao somar os pontos, os alunos podem avançar ou

não na “Mensagem final”, conquistando, desse modo uma nova patente e recebendo

um novo selo.

Caso eles realizem todas as missões, após a última missão, além da

conquista da patente e do selo, os alunos ganham o Certificado do Alto Comando

da Agência de Inteligência Terráquea (ver Anexo IV), que declara que eles

chegaram ao fim das missões do respectivo ano/série.

O sistema de pontuação no Aventuras, entretanto, conforme apresentado

na descrição do objeto, é aberto e motivacional. Isso porque a funcionalidade do

sistema que permitiria maior rigor na relação entre o cumprimento das etapas e a

pontuação não foi desenvolvida. Desse modo, é possível inserir um total que não

seja, necessariamente, o valor real da soma dos pontos acumulados – o sistema

permite acesso a partir de 2500 pontos – e os alunos chegam ao final da missão,

podendo, assim, acessar outra. Do mesmo modo que essa funcionalidade não foi

desenvolvida, o professor não consegue verificar a progressão dos alunos porque

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não há a automatização da pontuação entre as fases e os níveis. Dessa forma, é

preciso utilizar a Folha de serviços para inserir e acompanhar a pontuação.

A atribuição de selos e patentes também pode ser feita por meio da Folha

de serviços, embora o sistema forneça automaticamente os selos e as patentes

após o término de uma missão:

Figura 35 – Tela da Selos e patentes, dos 8º e 9º anos, de um usuário ativo no sistema. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

O professor deve ficar encarregado de acompanhar quais os selos e

patentes podem ser atribuídos aos alunos, por meio de um PDF disponibilizado no

material “Língua Portuguesa – Professor”, no item Patentes e selos84.

84

Link do material “Língua Portuguesa – Professores”, do item Patentes e selos, em PDF, no AVA:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/3/docs/comum/m0/LP-prof-m0-patentes-e-selos.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.

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Figura 36 – Quadro de Patentes e selos de Língua Portuguesa. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Em relação às Patentes e selos, do ponto de vista narrativo e estético-

visual, a elaboração dos selos e das patentes assemelha-se ao logo da CIA (Central

Intelligence Agency ou “Agência Central de Inteligência”) e do FBI (Federal Bureau

of Investigation ou “Gabinete Federal de Investigação”), dialogando com a proposta

narrativa e atribuindo maior credibilidade às atribuição e atuação dos alunos

enquanto agentes.

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Nesse sentido, é importante ressaltar o tom paródico do material, que

também está presente no uso da mensagem que se autodestrói, nos nomes de

certos especialistas inventados, dos solidariuns e dos dominatoriuns e no uso de

expressões como “a pergunta que não quer calar”. O humor presente dá

credibilidade ao universo criado por se basear em referências e ressignificá-las.

Ainda que a representação proponha uma brincadeira com a agência e

com o gabinete, propiciando a imersão e, até mesmo, fazendo referência –

novamente –, a narrativas cinematográficas como MIB - Homens de Preto, é

importante ter um olhar crítico para o uso de referências que sejam relacionadas à

hegemonia norte-americana. Sob uma perspectiva mais crítica, seria interessante

que as referências da narrativa e da customização de alguns elementos

apresentassem maior diversidade, aproximando-se de textos e produções –

contemporâneos ou não – nacionais e/ou de outros países que não os EUA.

A vantagem de se utilizar as referências para um material didático é que a

narrativa tem que dialogar com a proposta pedagógica. Os conflitos enquanto

elemento de game estão presentes na própria narrativa e contribuem para o

direcionamento da situação de ensino-aprendizagem: “Os dominatoriuns

atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar

todos os meios de comunicação” (SÃO PAULO, 2017, s/p).

Por se sustentarem ao longo das missões, fases, níveis e, até mesmo,

atividades, como, por exemplo, Arquivos Secretos85, a narrativa e os conflitos

permitem que outro elemento da gamificação seja destacado: a abstração da

realidade. Ao mesmo tempo em que as atividades apresentem temas, situações e

práticas, sejam elas polêmicas, sociais, culturais e políticas, é possível, por meio dos

enunciados, permanecer imerso na narrativa e, consequentemente, abstrair, em

alguma medida, a realidade.

Cabe ao professor, no papel de mestre, acompanhar os alunos no

cumprimento dos objetivos pedagógicos, mas também incentivá-los a “entrar” na

narrativa. Enquanto agentes responsáveis e imersos na narrativa, os alunos devem

85

Por exemplo, o Arquivo Secreto da Missão 2: Game over?, dos 8º e 9º anos, “Fase 4: Treino avançado em

games: jogos de plataforma”, Nível 2 – Odd Planet X Zombie Tsunami. Dispinível no AVA: http://aventuras.educacao.sp.gov.br/repository/coursefilearea/file.php/7/docs/m2/LP_8-9_M2_F4.pdf. Acesso em 29 out. 2018.

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se focar no cumprimento de suas funções, que estão relacionadas às demais

atividades gamificadas.

O início de cada missão apresenta, conforme visto, os objetivos – outro

elemento dos games –, que são apresentados de forma explícita para serem

atingidos, tanto do ponto de vista narrativo com do ponto de vista da aprendizagem.

A missão deve ser cumprida por meio da resolução de situações-problema e/ou de

produção final.

A gamificação propicia que os alunos atuem de diferentes formas nas

situações de ensino-aprendizagem para o cumprimento dos objetivos. Ou seja, os

alunos devem atuar por meio de questionamentos, que são dados aos alunos para

fazê-los pensar (observando); de informações adicionais sobre a grande narrativa e

às missões por meio de informações sobre o que os dominatoriuns e os solidariuns

conhecem ou desconhecem (explorando) e/ou de propostas em que os alunos

interpreta um papel e podem criar seu próprio entretenimento, por meio das patentes

(interpretando papeis).

Por exemplo, a Missão 5: O poder das imagens – Parte 2, dos 8º e 9º

anos, na “Fase 3: A imagem que denuncia”, o Arquivo Secreto, solicita aos alunos

que observem, explorem e/ou pesquisem:

O jornal Interplanetarium vai fazer um número especial para a publicação de fotodenúncias. E vocês, agentes, que já estão bastante qualificados, podem perfeitamente viver o lugar de um fotojornalista e incentivar a população a fazer o mesmo, de forma a perturbar a vida dos dominatoriuns. Agora falta pouco! Vocês vão compor imagens que explorem a força do registro fotográfico em favor dos terráqueos... (até 1.000 bônus).

Para isso, vocês deverão, na escola, no caminho até a escola ou em outro lugar da cidade, registrar uma fotodenúncia de relevância social. Ela pode ser relacionada a água, energia, lixo, mobilidade urbana, desrespeito à legislação de trânsito ou qualquer outro tema que mereça uma denúncia (a produção de um número grande de fotodenúncias ao mesmo tempo vai deixar os dominatoriuns furiosos).

Denúncias que contribuam com a comunidade ou com vida coletiva na cidade são essenciais ao cidadão crítico e atuante e podem ajudar a resistir ante os dominatoriuns. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso).

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Portanto, podemos afirmar que há diferentes formas de participação

relacionadas às categorias participativas e de organização de atividades. Essas

categorias são atividades individuais (solo), em grupo (equipe), individuais, mas que

devem ser tomadas coletivamente ou discutidas em conjunto (comunidade) e

colaborativa. Às vezes, as categorias se relacionam.

A categoria competitiva também está presente no Aventuras: nas

atividades em os alunos devem escolher o melhor texto produzido, por exemplo. E,

embora a competitividade seja uma categoria natural e recorrente no uso das

estratégias da gamificação, ao ser utilizada no contexto da educação, deve ser

repensada e discutida, pois pode fomentar o individualismo, indo contra a ideia de

uma educação para a cidadania social.

Uma abordagem possível é a experimentação de práticas que valorizem o

trabalho individual e coletivo de forma positiva e o protagonismo em diferentes

situações, como acontece no esporte. Caracterizado por orientar a comparação de

determinados desempenhos, o esporte é, geralmente, regido por um conjunto de

regras que definem as disputas e o nível de competição. Entretanto, essas

características não possuem um único sentido, nem fazem parte de práticas

exclusivas de profissionais ou “predatórias”, mas estão presente em práticas sociais,

podendo ser utilizadas ou recriadas no âmbito educacional, permitindo, por exemplo,

a regulação de ações, o estabelecendo critérios de cooperação e interação com o

adversário etc.

No que diz respeito aos perfis dos jogadores, os que parecem ser mais

privilegiados na proposta da gamificação do Aventuras são: o conquistador, por

conta do foco nas ações a serem desenvolvidas e nas recompensas, e o

socializador, uma vez que o trabalho em equipe está presente em vários momentos

e em muitas atividades eles devem socializar descobertas, reivindicações etc.

O perfil explorador é pouco previsto, estando presente somente quando

há necessidade de busca de informações fora do ambiente, de referência para a

produção de um microrroteiro, por exemplo – Missão 5: O poder das imagens –

Parte 2, dos 8º e 9º anos. Uma maior ênfase nesse perfil poderia contribuir de forma

mais sistemática para o desenvolvimento de habilidades de pesquisa e de curadoria,

por exemplo. O perfil do predador não foi localizado, mesmo porque é premissa

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apresentada no material para os professores que a intenção da gamificação do

Aventuras é colaborativa, o oposto da natureza perfil do predador.

Conforme mencionado anteriormente, o caráter competitivo não precisa

ser predatório e, por esse motivo os perfis de jogadores utilizado por Bartle (1996,

apud Kapp 2012) devem ser revistos – e mesmo os apresentados por Marczewski

(2015) - e ressignificados para o âmbito educacional de modo a verificar a

possibilidade não apenas de contemplar os diferentes perfis e, desse modo, motivar

os diferentes jogadores, mas com o objetivo de propiciar aos alunos a experiência

nos diferentes papeis ao longo das atividades, possibilitando que sua jogabilidade,

suas experiências e suas aprendizagens sejam ampliadas.

Resumidamente, além de permitir propiciar uma situação de imersão e

participação por meio de uma narrativa e da aproximação com o universo dos

alunos, o uso da estratégia da gamificação no Aventuras apresenta vantagens,

como combinar a estética com a funcionalidade de alguns elementos, assim articular

a proposta editorial e a proposta didático pedagógica.

Por fim, podemos afirmar que, ao utilizar-se de elementos de games,

como: objetivos, regras, etapas (missões, fases e níveis), feedback e recompensas,

o Aventuras possibilita não apenas uma organização das atividades nas quais os

alunos devem realizar com o objetivo de desenvolver habilidades e adquirir

conhecimentos de forma mais lúdica, como, também, permite que tanto professores

como alunos trabalhem de forma integrada, atuem conjunta e positivamente

enquanto protagonistas.

Entretanto, o material poderia ser enriquecido se considerasse, por

exemplo, diferentes percursos e, nesse caso, a mediação teria que considerar uma

proposta mais flexível de atuação do professor; se os feedbacks não fossem tão

genéricos e limitados; se as narrativas não se repetissem; se a pontuação

automática pudesse ser implementada.

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3.3 A NARRATIVA DO AVENTURAS E OS ELEMENTOS DA NARRATIVA

TRANSMÍDIA

Para analisar a aproximação do Aventuras com os elementos da narrativa

transmídia, verificaremos de que modo o universo foi criado e se ele tem potencial

para motivar os alunos para a aprendizagem, como a narrativa é contada – se por

diferentes mídias e se as partes são autônomas – e se a proposta propicia a

participação do público de modo a contribuir para a construção da narrativa.

Para analisar se a narrativa gamificada do Aventuras possibilitou a

criação do universo, devemos retomar a transcrição do vídeo de Convocação (p.

133) e as referências a ele. A narrativa do vídeo conta que, em 2032, a Terra está

ameaçada por extraterrestres. Conforme indicado anteriormente, as referências ao

tipo de narrativa “invasão extraterreste” é conhecida da cultura de massa por meio

de livros, séries, quadrinhos, filmes etc.

Entre as referências percebidas em relação à narrativa apresentada estão

Guerra dos mundos, de H. G. Wells e de Orson Welles, MIB - Homens de Preto, de

1997, O Guia do Mochileiro das Galáxias, de 2005, além de referências de franquias

como Star Wars e Star Trek.

O enredo é apresentado no vídeo das convocatórias: na Missão 0 do

material do professor e nas Convocatórias dos materiais dos alunos. Por esse

motivo, essa narrativa deve ser considerada como ponto de partida – obrigatório –

para as demais narrativas – das missões.

Em termos de construção da grande narrativa, o Aventuras apresenta

características do monomito, mais conhecido como “Jornada do herói”. Conforme a

proposta de Campbell (2004), por meio das Convocatórias, o material convida

professor e alunos para saírem de um mundo comum e embarcar em uma aventura.

A convocatória narra uma invasão, que deve ocorrer em 10 dias. O

professor é convocado a se tornar mestre, enquanto os alunos são convidados a ser

tornarem agentes especiais pela AIT, Agência de Inteligência Terráquea, como em

MIB. Como missão, eles devem impedir que os dominatoriuns colonizem o planeta

(grande missão). A narrativa apresenta os dominatoriuns como seres mais

desenvolvidos tecnologicamente, mas, também, como descuidados com o meio

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ambiente, tendo como os principais objetivos de invasão os recursos da Terra e a

escravização de seus habitantes, como em Guerra dos Mundos.

Para dificultar a ação dos agentes, esses extraterrestres criaram uma

“máquina camaleoa”, com a qual assumem a forma que programarem, inclusive a

humana. Essa estratégia é, geralmente, utilizada pelo vilão para infiltrar-se,

conquistar territórios e espalhar bases inimigas e/ou tomar o controle dos principais

meios de comunicação do planeta, como proposto nas atividades de Língua

Portuguesa.

Resumidamente, a narrativa indica aos agentes da AIT que eles podem

contar com a ajuda do solidariuns, seres extraterrestres que defendem um fórum

interplanetário, onde ocorrem discussões sobre como os planetas podem cooperar

para superar problemas intergalácticos. Sua missão é impedir a ação dos

dominatoriuns, ajudando os terráqueos a destruir as bases inimigas, defender

territórios e não se deixar manipular pelos meios de comunicação. Os agentes

precisam, então, fazer com que a população seja crítica em relação ao que lê e/ou

escuta na mídia e não deixar se enganar pelas aparências.

No contexto do material analisado, de Língua Portuguesa, por articular-se

à proposta pedagógica, a narrativa apresenta missões que abrangem diferentes

gêneros das três esferas jornalística, artístico-literária e divulgação científica,

conforme indicado anteriormente. Desse modo, as situações ficcionais criadas

propiciam a aproximação dos alunos desses textos e de seus contextos de

produção, social, cultural, político, como, por exemplo, no caso da leitura e da

produção de nota jornalística, permitindo que, enquanto agentes, os alunos possam

atingir os objetivos de suas missões e contribuir com o objetivo dos solidariuns.

Mas, para verificarmos em que medida a narrativa do Aventuras

aproxima-se dos elementos da narrativa transmídia, é necessário: conhecer a

construção da narrativa relacionando a grande narrativa às narrativas das missões,

verificando se há a criação de um universo.

Conforme defendido por Massarolo (2011), a criação do universo

narrativo não é centrada em um único personagem, embora dependa da audiência,

no caso professor e alunos, que, ao aderirem à convocação, acabam por “inferir a

consistência do mundo criado, a coesão dos arcos da história e das personagens

em busca de pistas migratórias” (MASSAROLO, 2011, p. 63). Para se criar um

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universo, é importante fundamentá-lo por meio de elementos reais como locais,

tempos, histórias, vestimentas, linguagens etc. Isto porque criar um universo não é o

mesmo que criar uma história. O chamado storyworld contém elementos e

experiência que não precisam ser parte de uma única narrativa, mas precisam estar

relacionadas aos valores e à concepção do universo criado.

Se o objetivo dos alunos enquanto agentes é o de defender a Terra contra

as ameaças de infiltração e controle dos dominatoriuns – o que também pode

render-lhes o ingresso na equipe de agentes da AIT e até mesmo a patente de

Agente especial máster da AIT –, o caminho a se seguir é o de aventurar-se nas

missões, aceitar os desafios e atingir os objetivos.

O encadeamento do material por missões, promove a construção de

sentido da narrativa maior e evidencia a serialidade do material, que é apresentada

em camadas: segmento, anos, missões, fases e níveis. Conforme visto na análise

da gamificação, a sequência de acesso às narrativas está limitada ao ano/série,

mas, também, de forma implícita, à sequência numérica das missões.

Para verificar como se dá a integração das narrativas das missões com a

grande narrativa apresentada na Convocatória, é importante relacioná-la, sobretudo,

às narrativas inicias e finais das missões, verificando se cada missão funciona como

uma narrativa autônoma e de que forma esta relação entre a grande narrativa e as

narrativas das missões se dá e, em um segundo momento, se e como estão

articuladas as narrativas das missões entre si no mesmo ano/série.

Para que essa verificação possa ser feita, segue a transcrição dos áudios

das narrativas iniciais e finais das missões dos 6º e 7º anos:

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MISSÕES – 6º E 7

º ANOS

TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO INICIAL DA MISSÃO – “CONHEÇA SUA MISSÃO”

TRANSCRIÇÃO DA MENSAGEM FINAL DE CADA MISSÃO

MISSÃO 1 – O QUARTO PODER

Os dominatoriuns atravessaram a barreira de entrada do nosso planeta e estão tentando controlar todos os meios de comunicação - jornais, revistas, noticiários de TV e rádio, sites de notícias. Os solidariuns nos alertam que é preciso prestar muita atenção ao que é noticiado, porque os dominatoriuns podem estar querendo esconder, desvirtuar ou manipular fatos. Sua missão será impedir que isso aconteça! Para isso, além de ficar de olhos bem abertos, precisará responder a duas questões-problema: - Por que a imprensa é chamada por alguns de "O quarto poder”? - É possível relatar fatos de forma totalmente neutra? Por quê? Após cumprir essa missão, você estará apto a entrar para o Programa de treinamento intensivo para Agente Máster.

Parabéns, você acaba de entrar para a Agência de Inteligência Terráquea. Ao término dessa missão, você deve ter percebido por que os dominatoriuns querem controlar os jornais, rádios e emissoras de TV. Mas, certamente, você estará pronto para identificar tentativas de manipulação dos fatos noticiados e contra-atacar.

MISSÃO 2 – SOS QUADRINHOS

O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira. Sua missão: salvar as HQs, as tirinhas e outros tipos de quadrinho do extermínio.

Parabéns! Você conseguiu superar muitos obstáculos e realizar sua missão. Por isso, ganhou o selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um agente! Descanse um pouco porque a próxima missão não tardará! Mas mantenha os olhos e ouvidos abertos, pois os dominatoriuns podem estar onde menos se espera, tentando acabar com o humor e a crítica!

MISSÃO 3 – ALMA PENADA

Folheando um caderno de final de semana de um jornal de grande circulação no Brasil, os solidariuns se depararam com casos assustadores: mortos que ressuscitavam, zumbis desorientados, criaturas sem cabeça, seres metade humanos, metade animais, almas penadas e tipos assim. Ficaram muito assustados! Líderes terráqueos esclareceram que se tratava de lendas e contos de mistério e assombração - histórias que o povo gostava de contar. Foi então que os solidariuns deram a ideia: espalhar as histórias assombradas por todo o planeta para que os dominatoriuns, que não sabem que são somente casos que o povo gosta de contar, fiquem com medo e desistam da colonização da Terra. Sua missão: selecionar histórias assombradas,

Parabéns, você conseguiu realizar a missão. O que será que os dominatoriuns estão pensando das histórias que começaram a ouvir por aí? Por causa do sucesso obtido com a missão, você vai ganhar um novo selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um Agente especial Jr.! Descanse um pouco, porque a próxima missão não tardará! Os solidariuns já disseram que apenas alguns dominatoriuns voltarão para os planetas de origem, depois de ouvirem as histórias de assombro. Muitos deles ainda permanecerão tentando dominar a Terra. Mas é aos poucos que se ganha uma batalha. Vamos em frente!

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gravar um podcast com as que foram selecionadas para que possam ser espalhadas por todo o planeta Terra. Contamos com você! Mas não esqueça que "a emoção mais forte e mais antiga do homem é o medo, e a espécie mais forte e mais antiga de medo é o medo do desconhecido” (H.P. Lovecraft).

MISSÃO 4 – TREMORES E AQUECIMENTOS

Você chegou à última etapa de treinamento para se tornar um Agente Especial Master da AIT e, agora, viverá sua prova de fogo. Sua última missão é delicada: enfrentar tremores de terra e temperaturas elevadíssimas! Os geólogos de todo o mundo estão desaparecendo misteriosamente e parecem ter sido abduzidos. Com isso, dominatoriuns infiltrados estão espalhando a notícia de que grandes terremotos ocorrerão e que vulcões inativos podem voltar à atividade a qualquer momento. Os solidariuns já estão em busca dos geólogos terráqueos desaparecidos. Sua missão: descobrir se podem ocorrer terremotos e se algum vulcão pode entrar em erupção no Brasil e informar a população do país a esse respeito.

Foi um belo trabalho de equipe! Enquanto os solidariuns resgatavam os geólogos abduzidos, você e a equipe de agentes ingressantes da AIT investigaram sobre a possibilidade de ocorrência de terremotos e de erupção de vulcões no Brasil e informaram corretamente a população. Assim, vocês tranquilizaram os terráqueos e frustraram os planos dos dominatoriuns em mais uma tentativa de dominar o planeta. Seu esforço será recompensado e, em nome do Alto Comando da Agência de Inteligência Terráquea, declaro que, a partir de hoje, você é um Agente Especial Master LP e está habilitado para viver muitas outras aventuras!

Figura 37 – Transcrição das narrativas iniciais e das narrativas finais das missões dos 6º e 7º anos (com grifos nossos). Fonte: Produção a partir das informações do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

A partir das transcrições, é possível identificar que em todos os casos, as

narrativas iniciais das missões apresentam acontecimentos que têm como ponto de

partida a narrativa inicial da Convocatória. Nesse sentido, embora as missões sejam

numeradas, as narrativas iniciais não impedem que as missões acessadas

individualmente e/ou em sequência não linear por conta da autonomia e da unidade

que elas apresentam. A exceção a essa afirmação é a Missão 4: Tremores e

aquecimentos, cuja narrativa inicial faz menção à uma sequência de treinamento

com a informação: “Você chegou à última etapa do treinamento para se tornar um

Agente Especial Master da AIT...” (SÃO PAULO 2017, s/p).

No que concerne as narrativas finais, estas indicam que há uma

sequência linear intencional entre as missões por meio da atribuição de patentes e

selos pela conquista do cumprimento da missão: na Missão 1, o aluno entre para a

AIT; na Missão 2, o aluno é considerado um agente; na Missão 3, um Agente

Especial Jr.; na Missão 4, um Agente Especial Máster de Língua Portuguesa. As

patentes e os selos supõem hierarquia e ordenam, inclusive visualmente, essa

sequência.

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A intencionalidade da linearidade no Aventuras fica ainda mais evidente

se averiguadas as sequências dos materiais de 8º e 9º anos e de 1º a 3º ano do

Ensino Médio, que, conforme analisado anteriormente, apresentam as Missões 4 e

5: O poder das imagens – Partes 1 e 2 e Missões 4 e 5: Comida na mesa –

Partes 1 e 2, respectivamente, que apresentam propostas temático-pedagógica

integradas, além da narrativa de uma fazer menção à outra.

A combinação sequencial e linear entre as missões de um mesmo

ano/série não evidencia sua intencionalidade, que poderia ser a progressão das

situações didáticos-pedagógicos, por exemplo. Tampouco a progressão das missões

em um mesmo ano/série apresenta elementos que fundamentam o universo criado.

As narrativas das missões, presentes nas narrativas iniciais e finais, mas também

nos enunciados das fases e dos níveis, apresentam informações a respeito dos

dominatoriuns para tornar os alunos aptos a derrotá-los naquela missão específica.

Isso porque, as narrativas das missões de um mesmo ano/série são

potencialmente episódicas, visto que elas repetem a mesma ação de invasão e

chamado dos agentes para defender a Terra. Em outras palavras, elementos como

tempos, histórias, vestimentas, linguagens não fazem parte das narrativas, que

poderiam contribuir para a criação do storyworld do Aventuras.

Por exemplo, não são apresentadas – mesmo que de forma episódica em

formato de flashbacks – mais informações sobre a origem dos dominatoriuns e sua

relação o planeta de origem antes de acabarem os recursos. Nesse sentido, para

que o universo do Aventuras tivesse a possibilidade de apresentar características

mais de uma narrativa transmídia, seria necessária a criação de outras narrativas,

que não precisariam ser, necessariamente, no formato de missões.

Embora a proposta narrativa do material apresente pouca proximidade

com os elementos característicos da narrativa transmídia, ela também não pode ser

totalmente classificada como uma narrativa multimídia, pois não integra múltiplos

modos de expressão em uma única mídia, visto que o AVA não pode ser considera

uma mídia. Ela também não se configura como uma narrativa crossmídia, pois o

conteúdo que está presente nas diferentes mídias e/ou missões não é exatamente o

mesmo.

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A característica episódica das narrativas das missões dá-se pelo fato de

as histórias serem descritas com foco na meta a ser cumprida, no caso, a produção

final. Assim, o seu desenvolvimento não tem como foco a ação narrativa, mas a

meta. Essa meta é um estado de motivação. Assim, a história se constrói em ordem

lógica a partir de um motivo, objetivo ou desafio, passando por uma ou mais

tentativas – no caso atividades, quizzes etc. – até sua consequência: a produção

final. O gancho entre uma narrativa episódica e outra – “Descanse um pouco porque

a próxima missão não tardará!” (SÃO PAULO, 2017, s/p) – não apresenta

progressão ou ampliação, apenas uma tensão para a repetição dessa mesma lógica

com outro pano de fundo.

Com o objetivo de verificar de forma mais qualitativa de que modo a

narrativa de uma missão se articula à grande narrativa, de modo a sustentar o

storyworld em enunciados de fases, níveis e atividades e averiguar se há relativa

autonomia de uma única missão em relação às demais do respectivo ano/série,

segue abaixo as transcrições dos áudios e os enunciados das fases e dos níveis,

disponibilizados apenas por texto escrito no AVA, da Missão 2: SOS Quadrinhos:

6º E 7º ANOS – MISSÃO 2: SOS QUADRINHOS

TRANSCRIÇÃO ESCRITA E ÁUDIO INICIAL DA MISSÃO – “CONHEÇA SUA MISSÃO”

Missão inicial O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira. Sua missão Salvar as HQs, as tirinhas e outras formas de quadrinho do extermínio.

FASE 1: NÓS LEMOS HQ!

Nível 1: Chuva de personagens de HQ? Os dominatoriuns estão espalhando falsas informações de que ninguém mais lê histórias em quadrinhos. A AIT decidiu provar o contrário! Seu Mestre vai fornecer informações secretas para você e os outros agentes fazerem uma "chuva de personagens de histórias em quadrinhos”. Seu objetivo: mencionar o maior número possível de personagens de HQ.

Nível 2: Exploração coletiva de tirinhas?

Agora que a AIT conseguiu reunir evidências de que os personagens são conhecidos, o Mestre vai reunir informações sobre outros elementos das histórias em quadrinhos. Seu objetivo: dizer o maior número possível de características das HQs.

Bônus extra Obtenha até 30 bônus extras com a leitura de

HQs da biblioteca da escola. Esses bônus serão fornecidos somente se você, durante a missão, retirar um HQ na biblioteca, ler e comentar com o Mestre o que leu. O Mestre determinará a quantidade de bônus extras que será fornecida pela atividade?

FASE 2: QUIZ DE TIRINHAS

A AIT conseguiu demonstrar aos solidariuns que seus agentes conhecem muitos personagens de histórias em quadrinhos. Agora, os agentes da AIT receberam a informação de que os dominatoriuns pretendem se disfarçar de editores-chefes de jornais e bagunçar a seção de quadrinhos ou tirinhas de diferentes sites e empresas jornalísticas. O editor-chefe é quem avalia o que pode ou não ser um bom quadrinho para ser publicado. Seu objetivo: acertar a maior quantidade de questões do quiz de tirinhas e demonstrar domínio na

compreensão de quadrinhos.

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Seu desempenho nesta atividade vai demonstrar que você está preparado para combater os dominatoriuns junto com os solidariuns. Preste atenção em tudo que é dito e mostrado em cada quadrinho para poder compreender as histórias.

FASE 3: TREINO AVANÇADO EM HQ

Nível 1: Revisitando super-heróis A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando um ataque massivo contra os quadrinhos. Todos os agentes precisam estar prontos! É hora de ampliar as referências e lembrar dos super-heróis que ocupam um lugar de destaque nas histórias em quadrinhos.

Nível 2: Circuito de quadrinhos A AIT identificou que os dominatoriuns estão preparando uma maratona de combate. O Mestre tem arquivos secretos para o treino de todos os agentes. Fique atento às suas orientações. Seu objetivo: concluir os circuitos dentro do tempo fornecido pelo Mestre.

FASE 4: HUMOR A SÉRIO

Nível 1: Humor e crítica?

Os dominatoriuns ainda não desistiram! Descobriram que os quadrinhos também podem ser críticos e perceberam o movimento dos agentes da AIT e dos solidariuns na interpretação de tirinhas. Todos os agentes foram chamados à base para um desafio. Todos devem colaborar prestando atenção a todos os detalhes, ajudando a construir a resposta e ouvindo os outros agentes. Fique ligado nas orientações do Mestre; se necessário, ele fornecerá pistas. Seu objetivo: compreender quadrinhos de alto grau de dificuldade e colaborar para a equipe vencer o desafio.

Nível 2: Indo além...?

A AIT sabe que o domínio completo dos quadrinhos exige que seus agentes sejam capazes de ir além. Completar este desafio comprovará que os agentes da AIT estão totalmente preparados para impedir que os dominatoriuns destruam diferentes tipos de quadrinhos. Seu objetivo: compreender quadrinhos de altíssimo grau de dificuldade e colaborar para a equipe vencer mais este desafio. O desafio também é coletivo: todos devem colaborar!

FASE 5: DE LEITOR A PRODUTOR DE HQ

Nível 1: Produzindo HQs? Os solidariuns interceptaram uma mensagem dos dominatoriuns. Eles acreditam ter uma fórmula para eliminar todas as tirinhas já existentes no planeta. A AIT sabe que não será possível exterminar as tirinhas se elas continuarem sendo produzidas. Equipes especiais estão sendo criadas! Os solidariuns selecionaram algumas tirinhas que poderão servir de fonte de inspiração e alguns programas para produzir quadrinhos para auxiliá-los. Seu objetivo: produzir tirinhas e impedir que elas desapareçam. O Mestre vai organizar as equipes com dois ou três agentes e fornecer instruções adicionais. Explore a ferramenta e fique atento às orientações.

Nível 2: Em defesa das tirinhas e dos quadrinhos

Chegou a hora. A missão está chegando ao fim, e todos os terráqueos precisam ser informados sobre a importância dos quadrinhos. Assim, todos poderão lutar em defesa deles! Os solidariuns pediram ajuda para escrever essa mensagem, e a AIT aceitou colaborar. Seu objetivo: escrever textos em defesa das HQs para publicação no Jornal Interplanetário e em outros jornais.

O Mestre vai organizar as equipes com três agentes e orientar o acesso à página secreta ou ao Arquivo Secreto com mais orientações.

TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO FINAL DA MISSÃO – “MENSAGEM FINAL”

Parabéns! Você conseguiu superar muitos obstáculos e realizar sua missão. Por isso, ganhou o selo e, a partir de hoje, pode ser considerado um agente! Descanse um pouco porque a próxima missão não tardará! Mas mantenha os olhos e ouvidos abertos, pois os dominatoriuns podem estar onde menos se espera, tentando acabar com o humor e a crítica!

Figura 38 – Transcrição do áudio e enunciados escritos das narrativas presentes na Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos. Fonte: Produção a partir da transcrição das narrativas presentes dos 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

A sequência narrativa presente na Missão 2: SOS Quadrinhos

apresenta relativa autonomia, pois se articula diretamente com a grande narrativa –

apresentada nas convocatórias –, não sendo necessário acessar, por exemplo, a

Missão 1: O quarto poder para compreender seu enredo, que tem começo, meio e

fim. Ainda que a narrativa final indique que “a próxima missão não tardará”, essa

frase pode ser compreendida como um incentivo aos alunos. Mesmo a informação

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sobre a atribuição da patente e do selo não atribui sentido linear, pois indica que o

aluno “pode ser considerado um agente”.

O objetivo da missão é apresentado como sendo “salvar as HQs, as

tirinhas e outras formas de quadrinhos do extermínio”, tendo como premissa que os

dominatoriuns ameaçam o humor. A narrativa é sustentada na “Fase 1: Nós lemos

HQ!”, que permite que os alunos apresentem seus conhecimentos sobre os gêneros

e compartilhem suas referências coletivamente. Nessa fase eles também entram em

contato com HQs e tirinhas digitalizados.

A fase seguinte, com quiz, propõe atividades para verificar o domínio dos

alunos na compreensão de quadrinhos, visto que “os dominatoriuns pretendem se

disfarçar de editores-chefes de jornal e bagunçar a seção de quadrinhos ou tirinhas

de diferentes sites e empresas jornalísticas”. A “Fase 3: Treino avançado em HQ”

amplia a proposta da fase anterior, permitindo o contato dos alunos com tirinha e

quadrinhos digitais e impressos.

A “Fase 4: Humor a série”, “Nível 1 – Humor e crítica” inicia-se a partir de

uma narrativa que motiva os alunos e, ao mesmo tempo, apresenta um novo

conflito: “os dominatoriuns ainda não desistiram! Descobriram que os quadrinhos

também podem ser críticos e perceberam o movimento dos agentes da AIT e dos

solidariuns na interpretação de tirinhas”, trecho que também dialoga com a fase

anterior. A “Fase 5: De leitor a produtor de HQ” apresenta as propostas de produção

de tirinhas por meio de um OA e de produção de “textos em defesa das HQs para a

publicação no Jornal Interplanetário e em outros jornais”. A narrativa é mantida pelos

enunciados das fases, dos níveis e das atividades, como pode ser verificada no quiz

da “Fase 2: Quiz de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”:

Figura 39 – Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 2: Quiz de tirinhas”, “Nível 4 – Quiz”, Questão 1 (trecho com a narrativa). Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

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E, também, no Arquivo secreto da proposta de produção de tirinha presente na

“Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQ?”:

Figura 40 – Tela da Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos, “Fase 5: De leitor a produtor de HQ”, “Nível 1 – Produzindo HQz?”, Arquivo secreto. Fonte: Site oficial do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Para ampliar a análise em relação à proximidade da narrativa do

Aventuras à criação e à sustentação de um universo que motive os alunos e

incentive ainda mais a imersão, é necessário verificar como a narrativa acontece em

todas as etapas da missão e a sua relação com o uso das diferentes mídias para a

construção dessa história.

Para que isso seja possível, é necessário retomar as mídias indicadas na

Figura 14 – Quadro do Mapa das Missões (pp. 92-94) atribuídas à missão e,

também os respectivos gêneros, textos/produções e proposta de produção final,

relacionando-os com as mídias e as narrativas.

De modo geral, a Missão 2: SOS Quadrinhos apresenta proposta de

trabalho com tirinhas e histórias em quadrinhos, além de carta do leitor. Como

propostas de produções finais, os alunos são convidados a criar uma tirinha e

escrever um texto de opinião defendendo as tirinhas e os quadrinhos. Entre as

mídias acessadas estão: tirinhas e quadrinhos digitais, digitalizados e impressos,

além de texto escrito e de um vídeo – necessário para responder as questões

propostas no Arquivo secreto da “Fase 2: Quiz de tirinhas”.

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Figura 41 – Relação das narrativas com suas respectivas mídias na Missão 2: SOS Quadrinhos. Fonte: Produção a partir das narrativas do Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos do Aventuras Currículo+ de Língua Portuguesa.

Embora o material se encontre dentro de um AVA, que tem potencial de

agregação de diversidade de mídias, esse potencial é pouco aproveitado. Conforme

indicado na descrição do objeto, o Aventuras funciona quase como um repositório

(ou referatório). As mídias que se encontram dentro do AVA são, de modo geral, as

mesmas da Missão 2: textos escritos, imagens ou textos/produções digitalizadas,

áudios e vídeos. As atividades apresentam indicações de textos/produções, OA e

ferramentas digitais em forma de hiperlink, direcionando os alunos para fora do

AVA86. No caso da missão verificada, tanto o vídeo do quiz sobre o homem de ferro

como o OA Fábrica de quadrinhos são acessados fora do Aventuras.

Desse modo, o uso das mídias é disperso, porém, diferentemente da

narrativa transmídia, a narrativa não acompanha esse movimento. Apenas as mídias

presentes no AVA são contextualizadas pelos enunciados, tornando-se parte do

universo criado. Nesse sentido, o Aventuras aproxima-se mais de uma narrativa

multimídia, visto que as mídias em si não contam ou contribuem para a construção

da narrativa – com exceção dos áudios iniciais e finais –, mas fazem parte dela, ou

86

A remissão externa foi anteriormente apresentada como condição de produção do material, que deveria utilizar

os OA alocados na plataforma Curriculo+. Os direitos autorais são outro motivo para que outros textos/produções e mídias não estivessem inseridos no AVA.

Narrativa final das missões

(Apresentada por áudio e transcrição escrita do áudio)

Narrativas das fases e dos níveis (Comandos escritos, com arquivos em PDF, quiz e/ou hiperlinks, atividades

com vídeo)

Narrativa inicial das missões

(Apresentada por áudio e transcrição escrita do áudio)

Grande narrativa

(Vídeo e escrita)

Convocação Missão 0

Missão 2

“SOS Quadrinhos”

Fase 1 – Fase 5

(Nível 1 e 2)

Mensagem final

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seja, assim como a narrativa multimídia é uma narrativa que apresenta seus

conteúdo com auxílio de diferentes mídias (texto escrito, imagens, áudio, vídeo etc.)

Além de apresentar diferentes mídias e textos/produções em suas

narrativas, em função dos objetivos do Aventuras de Língua Portuguesa de

contemplar vários gêneros, há indicações de diferentes gêneros ao longo das

missões. Em alguns casos, o próprio gênero é imbricado na trama da narrativa,

como é o caso da missão analisada Missão 2: SOS Quadrinhos, dos 6º e 7º anos.

Presente desde o título, a missão apresenta o próprio gênero como parte da

narrativa ao indicar que estão ameaçados de extinção:

O humor está ameaçado no Planeta Terra: forças retrógradas querem acabar com o riso porque acham que ele pode ser perigoso, por poder envolver uma boa dose de crítica ou mesmo por simplesmente proporcionar diversão. Povo feliz e crítico é algo que pode dificultar a escravização. Atento a esse movimento, os dominatoriuns começaram uma operação para acabar com as fontes de humor e diversão e os quadrinhos e as sessões de jornal destinadas às tirinhas estão na mira.

Sua missão: salvar as HQs, as tirinhas e outros tipos de quadrinho do extermínio. (SÃO PAULO, 2017, s/p, grifo nosso)

Os gêneros tirinhas e histórias em quadrinhos (HQ) não são apenas

objetos de estudo e meio pelo qual os alunos são motivados a participar da

narrativa, mas, também, fazem parte da história. Esse recurso aproxima-se da

proposta da narrativa crossmídia por propor a construção de uma narrativa por meio

do trabalho com conteúdos e habilidades relacionados a um gênero que é o tema da

narrativa, ampliando a cada fase a relação dos alunos com essa mesma mídia.

Entretanto, se considerarmos esse mesmo movimento em outras

missões, como, por exemplo, na Missão 2: Game over? ou nas Missões 4 e 5: O

poder das imagens – parte 1 e 2, dos 8º e 9º anos, é possível aproximar essa

característica de elementos da narrativa transmídia, uma vez que essas missões

contribuem não apenas para a construção (ainda que episódica) da grande

narrativa, como o conhecimento sobre os gêneros são construídos e/ou ampliados

por meio das narrativas – que estão presente nas atividades e na produções finais.

Isso nos permite pensar no uso do termo transgênero, uma vez que o gênero tem

função transversal dentro da missão com o objetivo de contribuir para a

contextualização, a compreensão e o cumprimento da missão.

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De um ponto de vista mais macro, o mesmo termo pode ser utilizado na

medida em que se leva em consideração que o Aventuras é estruturado por

diferentes missões que abordam gêneros, propiciando o contato dos alunos com

uma diversidade de textos/produções, inclusive multissemióticos, e que apresentam

diversidade cultural – o que permite identificar o princípio da multiplicidade no

contexto do Aventuras. Isso permite que as narrativas das missões estejam

correlacionadas, por serem, muitas vezes, da mesma esfera, que é ampliada por

meio do trabalho com os gêneros, que são objeto de estudo e foco da narrativa.

Por fim, a Missão SOS: Quadrinhos apresenta duas propostas de

produção: de tirinhas e de textos escritos em defesa das tirinhas. No caso da

produção de tirinhas a proposta parte do pressuposto que os dominatoriuns

descobriram a fórmula para eliminar todas as tirinhas existentes no planeta. O

argumento, apesar de frágil após quatro fases, propõe a produção. Enquanto que a

proposta de escrita dos textos em defesa das HQs retoma a narrativa, indicando que

a missão está “chegando ao fim” e que “os terráqueos precisam ser informados

sobre a importância dos quadrinhos” (SÃO PAULO, 2017, s/p).

Ao propor que os alunos produzam tirinhas e elaborem um texto escrito

que deve ser publicado no Jornal Interplanetário, a narrativa aproxima-se de

elementos da narrativa transmídia ao incentivar a participação dos alunos de modo a

contribuir para a narrativa, sobretudo no caso da segunda proposta, que deixa mais

explícito que os alunos devem escrever os textos enquanto agentes da AIT e os

textos devem ser publicados no Jornal Interplanetário. Embora a produção

apresente a possibilidade de ampliação da narrativa da missão por parte dos alunos,

como o jornal é fictício, as criações dos alunos não podem ser divulgadas ou

compartilhadas – ao menos não de forma contextualizada, em seu devido suporte

digital.

Diferentemente do que acontece na Missão 5: Comida na mesa – Parte

2, do Ensino Médio, que é um exemplo de participação dos alunos, que além de

apresentar a possibilidade de ampliação da narrativa a partir da produção dos

alunos, permite o compartilhamento e socialização da criação. Segundo a missão, a

proposta é produzir uma revista digital.

Para isso, os alunos são convidados a conhecer revistas digitais, produzir

o primeiro post para a revista e produzir a própria revista utilizando o agregador

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Scoop.it, conforme analisando anteriormente. A partir de propostas como essas, é

possível verificar que as produções não tratam de assunto aleatórios, mas podem

incluir informações relevantes sobre a narrativa, o que implica em sua ampliação.

Ainda assim, essas propostas de produção e participação são

direcionadas, além de serem contextualizadas pela narrativa, característica que se

aproxima das intenções da narrativa transmídia, quando esta é pensada desde o

projeto, tendo que direcionar, em certa medida, quando e como deve haver

participação das audiências. Se houver a liberdade de participação por parte dos

alunos é na produção de conteúdos a partir da obra87.

E em se tratando da ampliação da narrativa, há diferentes formas de

ampliar o universo narrativo do Aventuras: pelos próprios alunos, por meio propostas

de produções e de criações espontâneas, por meio dos “pontos de abertura” que a

grande narrativa apresenta, conforme indicado, e pela ampliação do material –

elaboração que deve incluir novas informações sobre o universo, contribuindo para

sua construção.

Tanto as contribuições espontâneas como a ampliação editorial do projeto

precisam identificar os “pontos de abertura” na narrativa para serem produzidos.

Ainda que os pontos não tenham sido criados intencionalmente, é possível identificá-

los com base na falta de informações sobre o universo criado, como, por exemplo, o

“buraco” que há na ausência das informações sobre o planeta de origem e as

condições dos dominatoriuns ou mesmo como foi inventada a “máquina camaleoa”.

A possibilidade de expansão do universo criado é um indício de que o

Aventuras possui características que se aproximam de elementos da narrativa

transmídia, visto que ele “convida” a audiência a participar e, ao mesmo tempo,

apresenta, de forma intencional ou não, “pontos de abertura”, propiciando a

ampliação da narrativa.

A extensão do universo é possível, conforme indicado anteriormente, mas

não apenas por meio da participação – direcionada ou espontânea – dos alunos

como, também, pela própria equipe de produção e ambientação do projeto.

87

É importante verificar que, embora as atividades sejam direcionadas, o material incentiva a apropriação das

atividades por parte de professor e alunos, o que permite a criação e ressignificação destas para seus respectivos contextos de modo que se tornem práticas significativas. Por exemplo, essa proposta de atividade de produção de rap gravada em audiovisual, a partir das propostas da Missão 2: Ondas do rádio. Disponível

em: https://www.youtube.com/watch?v=QzzZsiY5JFs ou a customização da apresentação de caso de sucesso. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=I-PIek_Y-5Q. Acessos em: 29 out. 2018.

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De modo geral, podemos considerar que o Aventuras possui, portanto,

características que potencialmente se aproximam da narrativa transmídia, a começar

da narrativa, que propicia a imersão de professores e alunos desde a convocatória

e, nas narrativas das missões, do “Conheça sua missão” à “Mensagem final”.

No que diz respeito à serialidade, a característica episódica do Aventuras

pode ser positiva no contexto do material didático porque ao mesmo tempo em que

atende à proposta didático-pedagógica também propicia o contato dos alunos com

diferentes mídias e gêneros, além de acrescentar algumas (poucas) informações à

construção do universo.

Além desses elementos, no material também há a presença de uma

diversidade de mídias e de gêneros. No caso das mídias, elas fazem parte das

narrativas, contribuindo de forma multimídia para o que está sendo apresentado. Em

contrapartida, há missões que se utilizam do gênero para contextualizar e construir a

narrativa da missão, tornando-o parte essencial dessa narrativa.

Em alguns casos, os gêneros propiciam o contato com diferentes

textos/produções e, nesse sentido, a diversidade de linguagens contribui para a

construção da narrativa articulando-a à proposta pedagógica, sobretudo no contexto

de produção de um material didático de Língua Portuguesa, em cujo qual a presença

da multiplicidade de linguagens é tão importante quanto a presença de diferentes

mídias.

Ainda, esses textos/produções propiciam o contato dos alunos com

diferentes pontos de vistas, vozes e opiniões, que, inclusive, contemplam questões

de ordem social, focando ou tematizando os excluídos. Nesse contexto, a

multiplicidade está presente no Aventuras por meio multiplicidade de linguagens e

da multiplicidade cultural.

Por fim, a participação parte da convocatória e professor e alunos são

incentivados a aceitarem novos papeis, o de mestre e o de agentes. É importante

destacar que a narrativa criada, para aproximar-se dos elementos da narrativa

transmídia, não deve ter como foco a história de um personagem, mas o universo

criado, como acontece no Aventuras que, além da apresentação da “invasão

alienígena”, o material redesenhar a história do próprio planeta Terra, alterando a

realidade que professor e alunos conhecem.

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A presença de elementos da narrativa transmídia – ou mesmo seu uso

enquanto estratégia – na produção de um material didático é uma proposta

relativamente nova e, por isso, não há uma definição estabelecida de como um

material didático pode se aproximar da narrativa transmídia, nem como os

elementos e os princípios da narrativa transmídia devem ou poderiam ser aplicados

em sua elaboração.

Uma apropriação desejável, por exemplo, seria, no caso do Aventuras, a

ampliação do universo e a possibilidade de acesso não linear entre as missões. Isso

seria possível, conforme indicado anteriormente, a partir de uma nova edição que

contemplasse novas informações sobre o universo e seus personagens, expandindo

a narrativa.

Do mesmo modo, essa ampliação poderia prever possíveis contribuições

espontâneas por parte de professores e alunos, por meio de sementes e buracos,

além do acesso não linear entre as missões. Neste caso, as atividades poderiam ser

organizadas, por exemplo, no formato de fascículos/episódios/missões digitais, que

tivessem autonomia, mas se relacionassem entre si.

Do mesmo modo, é possível apropriar-se da ideia de substituir a

diversidade de mídias pela diversidade de gêneros, sobretudo na elaboração de

materiais didáticos de Língua Portuguesa, adequando, assim, a lógica da narrativa

transmídia ainda mais à proposta didático-pedagógica.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Iniciamos a dissertação indicando a importância de novos materiais

didáticos que integrem tecnologias digitais e contemplem diferentes linguagens e

letramentos, propondo práticas pedagógicas que propiciem o trabalho com

competências e habilidades relacionadas à cultura digital.

Conforme visto, seria interessante que os materiais a serem elaborados

para a rede pública não se limitassem a enfatizar os letramentos da letra, mas que

contemplasse os multiletramentos, que circulam na vida contemporânea dos alunos.

Também indicamos que, entre as características, esses materiais precisariam ser

interativos, multissemióticos e/ou hipermidiáticos, aspectos que também são

propostos por Rojo (2017) para os livros didáticos digitais interativos (LDDI).

Com o objetivo de compreender melhor como deve ser esse novo

material didático, a presente dissertação analisou o Aventuras Currículo+ de Língua

Portuguesa de modo a verificar se as atividades propostas contemplam os

multiletramentos, se a estratégia da gamificação está presente no material e quais

são as implicações para a proposta pedagógica, além de identificar em que medida

o material se aproxima dos elementos da narrativa transmídia.

Por meio das análises realizadas, foi possível verificar que o Aventuras

contempla os multiletramentos por meio de textos/produções multissemióticas e de

diversidade cultural trabalhos a medida que alguns gêneros e textos/produções são

explorados.

O material inclui, ainda, o acesso aos OA, alocados da plataforma

Currículo+, e às ferramentas digitais, como editor de áudio e agregador de conteúdo,

além de articular as atividades em um AVA, promovendo o acesso ao material

didático em um suporte diferente do que os alunos estão costumados – livros

impressos – substituindo-os, nesse caso, pela tela.

Embora esteja em um AVA, como muitas funcionalidades não foram

desenvolvidas, o material acaba funcionando quase como um repositório (ou

referatório) ao incorporar hiperlinks que direcionam professor e alunos a: vídeos,

áudios, OA, ferramentas digitas etc., propiciando acessos e leituras não lineares. Os

textos/produções apresentam textos com uma multiplicidade cultural, promovendo

os multiletramentos em termos de diversidade cultural, unindo o cânone presente no

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contexto escolar, com o fânone, contemplando atividades que promovem a troca e a

ampliação dos referenciais culturais dos alunos.

O material também apresenta atividades individuais e coletivas de

produção de conteúdo, inclusive que se aproximam dos novos letramentos, como no

caso da revista digital, que permitem que os alunos se transformem em curadores e

“criadores de sentidos”, conhecendo meios para produzir conteúdos utilizando-se de

tutoriais e ferramentas digitais, como o agregador de conteúdo.

Da mesma forma, algumas dessas produções finais possibilitam uma

formação da perspectiva do designer, visto que para a elaboração dessas

produções, os alunos devem compreender como funcionam as ferramentas digitais,

como o podcast, o agregador etc., ressignificar textos, produzir novos sentidos,

baseando-se em suas próprias experiências, interesses e referências.

Embora o material se utilize da Web 2.0, ele se distancia da Mentalidade

2.0, por ter preocupações que estão relacionadas ao impresso, como, por exemplo,

os direitos autorais. Por ser um material educacional seria interessante apresentar

propostas que explorassem de forma mais autônoma a participação dos alunos.

De qualquer forma, a estrutura e a organização do Aventuras, alinhadas à

proposta didático pedagógica têm grande potencial para promover o interesse dos

alunos em relação a um novo espaço de interação e aprendizagem, como pode ser

verificado no vídeo88 sobre a menção honrosa na categoria “Melhoria dos Serviços

Prestados ao Cidadão”, prêmio Mário Covas, de 2017.

Ainda assim, o material demanda novos sentidos para o uso das

tecnologias digitais. Embora esteja em um AVA, o material poderia propiciar novas

perspectivas de leitura, de produção, de troca e ampliação culturais, de

comunicação, de acesso aos textos/produções, de interação e de interatividade.

Ao contemplar os multiletramentos, o material utiliza-se de novas

possibilidades para organizar as situações de ensino-aprendizagem de Língua

Portuguesa em missões. Isso não diz respeito somente à presença de uma

multiplicidade de textos/produção, mas, também, da diversidade cultural, que pode

ser contemplada pela participação da audiência, que pode ampliar suas referências.

88

Link para o vídeo do Aventuras Currículo+ sobre a menção honrosa Mário Covas. Disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=FqIOyKim90k. Acesso em: 29 out. 2018.

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De forma integrada e articulada à proposta pedagógica do material está o

uso da gamificação. Por isso, é necessário analisar o uso dessa estratégia enquanto

parte da proposta editorial do material e de verificar a aproximação da narrativa

gamificada com elementos da narrativa transmídia.

Isso porque, conforme indicado, alguns elementos e estéticas dos games

e da narrativa transmídia não são suficientes ou necessariamente adequados a

todas as propostas pedagógicas e, portanto, é necessário (re)planejar e selecionar

as características mais adequadas de cada estratégia.

No que diz respeito à gamificação, foi identificado o uso elementos de

games, como: objetivos, regras, etapas (missões, fases e níveis), feedback e

recompensas, na elaboração e organização das atividades do Aventuras, que

propiciam o desenvolvimento das habilidades e a relação dos alunos com os

conteúdos de forma lúdica. O material também convoca professor e alunos para

atuarem conjunta e positivamente enquanto protagonistas.

Também foi possível verificar que a estratégia da gamificação pode

contribuir para que o material contemple os multiletramentos de modo que os perfis

de jogadores possam ser pensados e explorados de modo a contribuir com a

atuação dos alunos em relação às dimensões de usuário nos dizeres da pedagogia

dos multiletramentos. Por exemplo, no caso do explorador e do socializar, ao propor

atividades que envolvam pesquisa e curadoria e que tenham como objetivo a

produção coletiva, podem contribuir para a atuação dos alunos enquanto criadores

de sentido.

Quanto à aproximação do Aventuras com os elementos da narrativa

transmídia, constatou-se a potencialidade de o universo construído ser ampliado por

meio de alguns princípios já estabelecidos que direcionam a criação de projeto de

narrativa transmídias, como: a imersão, a multiplicidade, a serialidade, a

performance, entre outras, visto que há a possibilidade de adequação da estratégia

em relação à reelaboração e à reedição de materiais didáticos.

Por meio da análise também foi possível perceber que a estratégia

narrativa transmídia pode contribuir para que um material didático contemple os

multiletramentos. Mais do que a narrativa ser contada por diferentes mídias, ela

pode ser contada por meio de práticas e de gêneros, como no caso do Aventuras,

alinhando-se à proposta didático-pedagógica.

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A multiplicidade de linguagem pode contribuir não apenas para o

letramento midiático, mas para os multiletramentos, considerando, inclusive,

textos/produções multissemióticas, inclusive aquelas presente em práticas

contemporâneas e/ou próprias das culturas juvenis. A multiplicidade cultural deve

estar presente nesses textos/produções, mas, também, o material deve contar com

o conhecimento de mundo e as referências dos alunos. Nesse sentido, os alunos

também devem ser compreendidos como coautores que, ao dominar o gênero,

produzem a partir dele, de forma contextualizada à narrativa.

Apesar de os conceitos de gamificação e narrativa transmídia

contribuírem para a elaboração de materiais didáticos e para a contemplação dos

multiletramentos, acreditamos que ainda há muito o que discutir, refletir e analisar,

com o objetivo de buscar diferentes adequações e possibilidades para essas

estratégias no que se refere à produção de novos materiais didáticos.

Por fim, tendo em vista as possibilidades apresentadas pelo objeto

analisado, a proposta de integração de tecnologias digitais em material didático, a

importância de um material contemplar os multiletramentos e a possibilidade de uso

das estratégias de gamificação e narrativa transmídia na proposta editorial de novos

materiais didáticos, propiciando que o material aproxime-se do universo dos alunos

por estarem relacionadas às cultura digital e da convergência, arriscamos indicar

mais alguns aspectos que poderiam estar presente, tanto nas demandas

governamentais como para a elaboração de novos materiais para a educação:

a) Contemplar práticas multiletradas e de letramentos próprios do digital

(ROJO, 2012; LANKSHEAR; KNOBEL, 2007);

b) Permitir a colaboração e o compartilhamento entre pessoas por meio

do uso de mecânica, estética e pensamento de game, considerando as

motivações, os sentimentos, as possibilidades de participações e práticas

colaborativas de professores e alunos (Kapp 2012; McGonigal 2012)

c) Trabalhar com texto/práticas multissemióticas de modo a ampliar o

universo narrativo, propiciando a imersão e na direção da participação de

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professores e alunos enquanto protagonistas (LEMKE, 2010[1998];

Jenkins 2009[2006]).

Desse modo, os novos materiais didáticos, de diferentes formatos,

podem/devem ser solicitados, seja nas demandas do PNLD ou nos editais mais

específicos, tendo em vista que podem apresentar diversas possibilidades e

potencialidades, além de poder contribuir na prática para a melhoria da qualidade do

ensino e da aprendizagem em um país com tantas desigualdades.

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ANEXO I

CARTA CONVOCATÓRIA PARA ALUNOS89 –

AVENTURA CURRÍCULO+

Caro(a) aluno(a)

Já pensou o que aconteceria se resolvêssemos listar ou falar em um gravador todas as coisas que já aprendemos na vida? Que loucura isso seria? Provavelmente, passaríamos dias falando ou escrevendo e, ainda assim, não conseguiríamos nos lembrar de tudo. Mas, mesmo que isso acontecesse, veríamos que é impossível alguém saber sobre todas as coisas, ter todos os conhecimentos do mundo. Sempre pode acontecer de não sabermos alguma coisa que precisamos para realizar determinadas atividades. E é por isso que um aluno pode ser grande conhecedor de certos assuntos e, ainda assim, não ter aprendido algumas coisas importantes na escola.

Mas isso não precisa continuar assim!

A primeira boa notícia é que todos os alunos podem aprender, desde que tenham condições adequadas para tanto. Isso quer dizer que não existe aluno incapaz! O que acontece algumas vezes é que se forma um ciclo vicioso: o aluno começa a não aprender porque perdeu alguma parte da explicação e, por isso, vai se desinteressando de uma determinada disciplina, já que deixa de ver sentido nela, e vai aprendendo cada vez menos e se desinteressando cada vez mais.

A segunda boa notícia é que esse ciclo vicioso pode ser quebrado. E o convite do projeto Aventuras Currículo+ é para que você não entre nesse ciclo, ou saia dele bem rapidinho!

As Aventuras Currículo+ pretendem ajudar você a relembrar de coisas esquecidas ou a aprender coisas que podem fazer com que você leia e escreva melhor. Só que essas aventuras pretendem proporcionar isso de uma forma diferente. Você vai cumprir missões (como um agente secreto) que colocam desafios ou situações-problema a serem solucionados. A ideia é que, ao resolvê-los, você possa aprender novas coisas e desenvolver habilidades, de forma a ir conquistando bônus (selos) que o ajudem a ler e a escrever melhor (e a se tornar um agente secreto especial máster).

Além de participar das missões, você vai avaliá-las, dizendo se elas ajudaram você a aprender algo ou não, e também vai tentar avaliar a si mesmo, procurando perceber o que aprendeu ou que habilidade desenvolveu e o que ainda precisa ser mais estudado ou desenvolvido. Assim, sua opinião também será importante para dizer se essa proposta de trabalho ajudou na sua aprendizagem e se deveria ser utilizada em outras situações. Está pronto? Então se prepare para conhecer sua grande missão. O planeta Terra conta com você!

Diretor-Presidente da AIT

89

Link para a Convocatória para Professores. Acesso no AVA do Aventuras. Disponível em:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/resource/view.php?id=101. Acesso em: 29 out. 2018.

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ANEXO II

CARTA CONVOCATÓRIA PARA PROFESSORES90 –

AVENTURA CURRÍCULO+

Caro(a) professor(a),

O projeto de recuperação Aventuras do Currículo+ tem como objetivo criar uma nova oportunidade para que os alunos possam aprender conteúdos e desenvolver habilidades básicas relativas à leitura, à escrita e aos conhecimentos de língua portuguesa.

Sabemos que oferecer aos alunos mais atividades do mesmo formato pode não ser uma ação eficaz no sentido de propiciar que aprendam o que não conseguiram aprender nas aulas regulares.

Por essa razão, além de prever o uso significativo de tecnologia e de objetos digitais na condução das atividades, o projeto apresenta uma estrutura gamificada, isto é, as atividades propostas são costuradas por uma narrativa que coloca uma grande missão a ser cumprida pelos alunos. Para tanto, eles devem realizar missões menores, que lhes rendem bônus importantes para o sucesso da grande missão.

A escolha da estratégia de gamificação não se deve somente ao fato de que, potencialmente, jogos despertam mais o interesse dos alunos. Muitos estudiosos da Educação já apontaram para o papel positivo que o lúdico pode desempenhar nas situações de ensino-aprendizagem - desenvolver estratégias para solucionar problemas ou superar obstáculos (o que pode envolver o desenvolvimento de diferentes habilidades); lidar com regras e com resultados favoráveis e desfavoráveis; promover maior interação com os colegas no caso de propostas mais cooperativas (como os jogos em equipe); desenvolver a concentração, perseverança etc, o que poderia por si só ser uma forte razão. Mais do que isso, a gamificação permite que os alunos em recuperação, que em geral têm uma imagem bastante negativa de si mesmos como estudantes, possam assumir um lugar mais positivo, potente e protagonista. Eles serão agentes que realizam missões e cujas ações podem trazer efeitos positivos para si, para sua equipe e, no limite, para a humanidade; cada um deles não é um aluno que simplesmente escuta passivamente.

A metáfora do game também parece bem adequada para o papel que se espera de você e dos demais professores nesse projeto. Em alguns jogos, como os de RPG, é comum a previsão da figura do Mestre: alguém que conduz os demais jogadores pela história, apresentando os desafios e aplicando as regras. O Mestre, portanto, não é alguém que apenas transmite conteúdos e fornece respostas, mas alguém que planeja e coordena situações, faz observações precisas, lança questões, problematiza respostas e interfere no processo quando percebe as poucas condições por parte do aluno de realizar autonomamente as tarefas no desenrolar das atividades; enfim, é alguém que efetivamente promove aprendizagens.

90

Link para a Convocatória para Professores. Acesso no AVA do Aventuras. Disponível em:

http://aventuras.educacao.sp.gov.br/mod/page/view.php?id=630. Acesso em: 29 out. 2018.

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Essa postura vai na direção contrária da que prevê um professor que só atua quando é chamado pelo aluno. Alunos protagonistas requerem professores protagonistas!

Assim como um mestre de artes marciais, o Mestre aqui não precisa saber tudo (não precisa ser invencível), mas deve ter uma sensibilidade aguçada. É preciso que ele se proponha a olhar para os alunos procurando perceber as dificuldades que apresentam e mostrando-se disposto a encontrar o melhor jeito de ajudá-los. Ainda que não saiba como, é importante que você procure compartilhar suas inquietudes com os gestores da escola ou da Diretoria de Ensino.

As missões ou atividades propostas são acompanhadas de orientações que objetivam fornecer subsídios para sua atuação nas aulas de recuperação. Não pretendem ditar o que você deve fazer, mas apontar caminhos. Adaptações serão necessárias, mas é preciso só garantir que preservem a intenção geral das propostas.

Sob a sua orientação, durante todas as missões, os alunos lançarão os bônus adquiridos em uma planilha. Você também terá à sua disposição um modelo de planilha para ajudá-lo no registro de dados do acompanhamento dos alunos. Em alguns momentos das missões, está previsto que você proponha caminhos alternativos se o desempenho dos alunos em algumas atividades não estiver se dando como esperado.

Você também avaliará cada uma das missões, apontando adequações e inadequações. Mais do que essa experiência singular, é preciso saber se esse tipo de estratégia pode dar certo e se deve ser usado em outras ocasiões. Ninguém melhor do que você para saber dizê-lo.

Fica o convite! Embarque nesse projeto e seja o Mestre que proporcionará boas situações de aprendizagem e, até mesmo, uma virada na vida escolar de alguns alunos.

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Leia o Regulamento para conhecer as regras. O envio das atividades avaliativas da edição 2017 tem o cronograma sugerido:

6º / 7º anos 8º / 9º anos e Ensino Médio

Missão Período de realização das

atividades avaliativas

Período de realização das

atividades avaliativas

Zero 22 a 29 de maio 22 a 29 de maio

1 30 de maio a 23 junho 30 de maio a 23 junho

2 24 de junho a 18 agosto 24 de junho a 18 agosto

3 19 de agosto a 15 de setembro 19 de agosto a 15 de setembro

4 16 de setembro a 18 de outubro 16 de setembro 04 de outubro

5

05 a 18 de outubro

Atualização das

atividades avaliativas 19 a 25 de outubro de 2017 19 a 25 de outubro de 2017

Preparado? Então, a primeira coisa a fazer é se apropriar das missões e atividades previstas para, depois, entrar na história e criar um clima junto aos alunos para que eles também possam mergulhar fundo nela!

Bom trabalho!

Última atualização: terça, 23 Mai 2017, 15:16

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184

ANEXO III

MATRIZ DE HABILIDADES E GÊNEROS –

AVENTURA CURRÍCULO+

Matriz de habilidades e gêneros – 6º e 7º anos91

Procedimentos de Leitura

Localizar informações explícitas em um texto.

Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.

Inferir uma informação implícita em um texto.

Identificar o tema de um texto.

Distinguir um fato da opinião relativa a esse fato.

Identificar o sentido denotativo de vocábulo ou expressão, selecionando aquele que pode

substituí-lo, por sinonímia, naquele contexto.

2. Implicações do Suporte, do Gênero e/ou do Enunciador na Compreensão do Texto

Interpretar texto com auxílio de material gráfico diverso (ilustração, quadrinho, foto etc.).

Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros.

Identificar o provável público-alvo de um texto.

Identificar elementos constitutivos da organização interna dos gêneros.

3. Relação entre Textos

Reconhecer diferentes formas de tratar uma informação na comparação de textos que

tratam do mesmo tema.

Reconhecer posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao

mesmo tema.

91

Fontes: Matrizes de referências do SAEB, do SARESP e da Avaliação da Aprendizagem em Processo e

Currículo do Estado de São Paulo: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.

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4. Coerência e Coesão no Processamento do Texto

Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições

que contribuem para a continuidade de um texto.

Identificar a tese de um texto.

Estabelecer relação entre tese e os argumentos oferecidos para sustentá-la.

Diferenciar as partes principais das secundárias em um texto.

Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.

Estabelecer relação de causa /consequência entre partes e elementos do texto.

Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções,

advérbios etc.

5. Relações entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido

Identificar efeitos de ironia ou humor em textos variados.

Identificar o efeito de sentido decorrente do uso da pontuação e de outras notações.

Reconhecer o efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou

expressão.

Gêneros

Conto, história em quadrinhos, tirinha. Notícia, carta de leitor, texto de opinião, charge,

infográfico, tabela. Texto didático, verbete de enciclopédia, artigo de divulgação científica,

esquema, infográfico. Instrução para produção de experimento.

Matriz de habilidades e gêneros – 8 º e 9o anos; 1ª a 3ª séries92

1. Procedimentos de Leitura

92

Fontes: Matrizes de referências do SAEB, do SARESP e da Avaliação da Aprendizagem em Processo e

Currículo do Estado de São Paulo: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.

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186

Localizar informações explícitas em um texto.

Inferir o sentido de uma palavra ou expressão.

Inferir uma informação, opinião ou tese implícita em um texto.

Identificar o tema de um texto.

Distinguir um fato da opinião relativa a esse fato.

Identificar o sentido denotativo de vocábulo ou expressão, selecionando aquele que pode

substituí-lo, por sinonímia, naquele contexto.

2. Implicações do Suporte, do Gênero e/ou do Enunciador na Compreensão do Texto

Interpretar texto com auxílio de material gráfico diverso (ilustração, quadrinho, foto etc.).

Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros.

Identificar o provável público-alvo de um texto.

Identificar elementos constitutivos da organização interna dos gêneros.

3. Relação entre Textos

Reconhecer diferentes formas de tratar uma informação na comparação de textos que

tratam do mesmo tema.

Reconhecer posições distintas entre duas ou mais opiniões relativas ao mesmo fato ou ao

mesmo tema.

4. Coerência e Coesão no Processamento do Texto

Estabelecer relações entre partes de um texto, identificando repetições ou substituições

que contribuem para a continuidade de um texto.

Identificar a tese de um texto.

Estabelecer relação entre tese e argumentos oferecidos para sustentá-la.

Diferenciar as partes principais das secundárias em um texto.

Identificar o conflito gerador do enredo e os elementos que constroem a narrativa.

Estabelecer relação de causa /consequência entre partes e elementos do texto.

Estabelecer relações lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções,

advérbios etc.

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5. Relações entre Recursos Expressivos e Efeitos de Sentido

Identificar efeitos de ironia ou humor em textos variados.

Identificar o efeito de sentido decorrente do uso da pontuação e de outras notações.

Reconhecer o efeito de sentido decorrente da escolha de uma determinada palavra ou

expressão.

Gêneros

Crônica, poema, canção. Notícia, carta de leitor, reportagem, fotorreportagem, artigo de

opinião, resenha, comentário, infográfico, tabela, charge. Texto didático, verbete de

enciclopédia, artigo de divulgação científica, resumo, esquema, infográfico.

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ANEXO IV

CERTIFICADO AVENTURA CURRÍCULO+