CANTO · convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano...

2
Abre aspas: Macumba romântica - fecha aspas. Se fosse possível classificar canções, ou se fosse ainda necessário criar nossas próprias prateleiras, seria nessa que o novo disco de Alvaro Lancelloi, o segundo solo gravado em estúdio, repousaria. Mas não sem antes transitar por outras. Tocando no samba moderno ou ecoando o que se convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano Sampaio, as eletrônicas de Domenico Lancelloi, o violão de Pedro Costa e o baixo de Daniel Medeiros, Alvinho entoa um canto mântrico, um canto embarcação. Com ele, o cantor e compositor abre caminhos em mares ora míticos, ora reais ao longo das onze canções compostas por ele, duas em parceria com o irmão Domenico. Carioquizando “afro-sambas”, coreografando novas poéticas ou intuindo religiosidades, “Canto de marajó” apresenta o tempo da canção de Alvaro, um tempo próprio de Alvinho. Gravado em parte na serra de Petrópolis (no Estúdio Aldeia), em parte em Copacabana (no Estúdio 707), o disco, entre os arpejos do artista, os estúdios de gravação e sua mixagem final, maturou por quase dois anos até ganhar arte de Alexandre Fischer sobre o trabalho do artista uruguaio Carlos Paes Vilaró, a sereia hoje tatuada no braço do artista. Durante o navegar, o mar sonoro de Alvaro Lancelloi se expandiu. Suas canções ralentadas, de andamento suave, ganharam mais calor e força. O artista, que quase uma década atrás fundou a banda Fino Coletivo e se viu, sendo parceiro ou sendo gravado, entre artistas como Roque Ferreira, Maria Rita, Momo, Marcos Valle, Wado e cia, encorpou o samba pé descalço de sua estreia solo. Azulejou canções como “Balé”, “Canto de marajó” ou “Para voltar”. Em outras, como “Vejo” - uma das primeiras que Alvinho se permitiu fazer sem violão -, deixou surgir um erotismo delicado respirando entre o maculelê-funk carioca que embala a canção. O ritmo, aliás, entranhado no garoto que subia e descia o morro no Leme em bailes dias sim, dias também, nos anos 90, corta de cerol fino a melodia de faixas como “Vejo”, “Marejou” ou “Nossa horta / Merinha” - a última, uma pequena crônica de Merinha, moradora de rua do Leme, figura que marcou a infância e adolescência do compositor - costurando retalhos na rua, a mulher negra vivia a praguejar homens que imaginava responsáveis por seu despejo e pela morte de seu filho. O amor entre dois também ganhou espaço em sua crônica, na letra-conversa cotidiana de “Dia a dia”, que conta com voz e sotaque da sergipana Sandyalê. Em “Canto de marajó”, Alvaro mergulha em mantras, giras, pontos e batuques para aprofundar sua música. Com o corpo inteiro no mar, o disco revela um artista em movimento, como numa travessia, um percurso de barca. Mas balanço e ritmo parecem somente um complemento para as canções. O canto de Alvinho predomina, como guia, em tom ritualístico forte e embalado, e junto da percussão - já marcada por Adriano Sampaio, e agora reforçada pela presença (e o presente, o hoje) de Domenico, com bateria e MPC - carrega o disco mar adentro. Nesse sentido, Alvinho parece apenas deixar seu violão flutuar na água enquanto marca seu lugar onde quebram as ondas. “É bonito, é bonito”. OUTRO TEMPO: ALVARO LANCELLOTTI CONJUGA MANTRAS, RIO DE JANEIRO, SAMBA DE RODA E BAHIA EM “CANTO DE MARAJÓ” Quatro anos após estreia solo, Alvinho faz navegar onze composições próprias, duas em parceria com o irmão Domenico Lancelloi, em seus mares míticos CANTO DE MARAJÓ Alvaro Lancellotti por Julianna Sá

Transcript of CANTO · convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano...

Page 1: CANTO · convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano Sampaio, as eletrônicas de Domenico Lancellotti, o violão de Pedro Costa e o baixo

Abre aspas: Macumba romântica - fecha aspas. Se fosse possível classificar canções, ou se fosse ainda necessário criar nossas próprias prateleiras, seria nessa que o novo disco de Alvaro Lancellotti, o segundo solo gravado em estúdio, repousaria. Mas não sem antes transitar por outras. Tocando no samba moderno ou ecoando o que se convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano Sampaio, as eletrônicas de Domenico Lancellotti, o violão de Pedro Costa e o baixo de Daniel Medeiros, Alvinho entoa um canto mântrico, um canto embarcação. Com ele, o cantor e compositor abre caminhos em mares ora míticos, ora reais ao longo das onze canções compostas por ele, duas em parceria com o irmão Domenico. Carioquizando “afro-sambas”, coreografando novas poéticas ou intuindo religiosidades, “Canto de marajó” apresenta o tempo da canção de Alvaro, um tempo próprio de Alvinho. Gravado em parte na serra de Petrópolis (no Estúdio Aldeia), em parte em Copacabana (no Estúdio 707), o disco, entre os arpejos do artista, os estúdios de gravação e sua mixagem final, maturou por quase dois anos até ganhar arte de Alexandre Fischer sobre o trabalho do artista uruguaio Carlos Paes Vilaró, a sereia hoje tatuada no braço do artista.

Durante o navegar, o mar sonoro de Alvaro Lancellotti se expandiu. Suas canções ralentadas, de andamento suave, ganharam mais calor e força. O artista, que quase uma década atrás fundou a banda Fino Coletivo e se viu, sendo parceiro ou sendo gravado, entre artistas como Roque Ferreira, Maria Rita, Momo, Marcos Valle, Wado e cia, encorpou o samba pé descalço de sua estreia solo. Azulejou canções como “Balé”, “Canto de marajó” ou “Para voltar”. Em outras, como “Vejo” - uma das primeiras que Alvinho se permitiu fazer sem violão -, deixou surgir um erotismo delicado respirando entre o maculelê-funk carioca que embala a canção. O ritmo, aliás, entranhado no garoto que subia e descia o morro no Leme em bailes dias sim, dias também, nos anos 90, corta de cerol fino a melodia de faixas como “Vejo”, “Marejou” ou “Nossa horta / Merinha” - a última, uma pequena crônica de Merinha, moradora de rua do Leme, figura que marcou a infância e adolescência do compositor - costurando retalhos na rua, a mulher negra vivia a praguejar homens que imaginava responsáveis por seu despejo e pela morte de seu filho. O amor entre dois também ganhou espaço em sua crônica, na letra-conversa cotidiana de “Dia a dia”, que conta com voz e sotaque da sergipana Sandyalê.

Em “Canto de marajó”, Alvaro mergulha em mantras, giras, pontos e batuques para aprofundar sua música. Com o corpo inteiro no mar, o disco revela um artista em movimento, como numa travessia, um percurso de barca. Mas balanço e ritmo parecem somente um complemento para as canções. O canto de Alvinho predomina, como guia, em tom ritualístico forte e embalado, e junto da percussão - já marcada por Adriano Sampaio, e agora reforçada pela presença (e o presente, o hoje) de Domenico, com bateria e MPC - carrega o disco mar adentro. Nesse sentido, Alvinho parece apenas deixar seu violão flutuar na água enquanto marca seu lugar onde quebram as ondas. “É bonito, é bonito”.

OUTRO TEMPO: ALVARO LANCELLOTTI CONJUGA MANTRAS, RIO DE JANEIRO, SAMBA DE RODA E BAHIA EM “CANTO DE MARAJÓ”Quatro anos após estreia solo, Alvinho faz navegar onze composições próprias, duas em parceria com o irmão Domenico Lancellotti, em seus mares míticos

CANTO DE MARAJÓ

Alvaro

Lancellotti

por Julianna Sá

Page 2: CANTO · convencionou chamar de nova música brasileira, entre as batidas percussivas de Adriano Sampaio, as eletrônicas de Domenico Lancellotti, o violão de Pedro Costa e o baixo

1. Balé | Alvaro Lancellotti 2. Canto de marajó | Alvaro Lancellotti3. Vejo | Alvaro Lancellotti4. Dia dia | Alvaro Lancellotti5. Nossa horta / Merinha | Alvaro Lancellotti6. Maria | Alvaro Lancellotti7. O timbre do vento | Alvaro Lancellotti 8. Tempo | Alvaro Lancellotti9. Para voltar | Alvaro Lancellotti e Domenico Lancellotti10. O passo | Alvaro Lancellotti e Domenico Lancellotti 11. Marejou | Alvaro Lancellotti

produzido por Adriano Sampaio, Alvaro Lancellotti, Daniel Medeiros e Pedro Costa. Mixado por Mario Caldato Junior no estúdio

MCJ sound Rio e masterizado por Ricardo Garcia no estúdio Magic Master.

OUÇA EM:

ASSESSORIA DE IMPRENSA

CANTO DE MARAJÓ

JULIANNA SÁ(21) 9 9337 2544 [email protected]

TAY FERNANDES(21) 9 9471 [email protected]

SOBRE ALVARO LANCELLOTTI

Nascido e criado na música, Alvinho cresceu em meio aos sambas e boleros - canções, por fim - de Ivor Lancellotti, seu pai, perto das experimentações do irmão Domenico Lancellotti, e ainda nos bailes funk que frequentou por quase uma década. Mais tarde, foi um dos pilares do Fino Coletivo, banda com grande reconhecimento de crítica e público. Gravado por artistas como Marcos Valle, Maria Rita, Roque Ferreira, Momo, Wado, entre outros, lançou seu primeiro disco solo, “O Tempo faz a gente ter esses encantos”, em 2012, tendo as canções “Sexta-feira” e “Autoajuda” como parte da trilha sonora da série “Preamar”, do canal a cabo HBO. Em 2016, o artista lança seu segundo trabalho de estúdio, “Canto de Marajó”, com produção coletiva assinada por ele, Adriano Sampaio (percussões), Daniel Medeiros (baixo) e Pedro Costa (violões e guitarra), além de mixagem de Mario Caldato Jr.

[email protected]