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45 Reprodução das Plantas Cultivadas A flor contém as estruturas de reprodução sexual das plantas. De suas partes componentes - sépalas, pétalas, estames e pistilo, apenas as duas últimas funcionam na reprodução, com produção de gametas. Geralmente o estame consta de um filamento, o filete, que suporta a antera, dentro da qual se formam os grãos de pólen. O pistilo consiste de uma estrutura aumentada na base, ou ovário, que contém os óvulos, um prolongamento em forma de tubo fino, denominado estilo ou estilete, e o estigma, sobre o qual se depositam os grãos de pólen. No ovário se encontram os óvulos que, depois de fecundados, dão origem às sementes. O número de óvulos pode variar de um, em gramíneas como arroz, cevada, e trigo, a várias centenas, como é o caso do fumo, berinjela, tomate, etc. Flores perfeitas ou andróginas são as que contêm os estames e o pistilo na mesma estrutura floral e, imperfeitas, quando falta um desses verticilos. A maior parte das plantas cultivadas é do primeiro tipo. Como exemplos tem-se o trigo, aveia, cevada, centeio, arroz, sorgo, algodão, fumo, beterraba açucareira, soja, feijão e a maioria das gramíneas e leguminosas forrageiras. As flores imperfeitas são estaminadas, quando possuem somente os estames, ou pistiladas, somente com pistilo. A planta do milho, por exemplo, tem flores estaminadas no pendão (inflorescência masculina) e pistiladas, na espiga (inflorescência feminina). As flores imperfeitas são sempre incompletas. Quando se encontram os dois sexos na mesma planta, porém separados, trata-se de espécie monóica; quando em indivíduos diferentes, a espécie é dióica. Outro conceito é o de plantas polígamas - são as que possuem flores andróginas e unissexuais, podendo ocorrer as três formas reunidas: masculina, feminina e andrógina, como no mamoeiro. 5.1. REPRODUÇÃO SEXUAL E ASSEXUAL NAS PLANT AS CUL TIV ADAS A reprodução sexuada é, basicamente, a regra nas plantas superiores, embora em muitas delas ocorra, naturalmente, a propagação assexuada ou vegetativa, de forma facultativa ou mesmo obrigatória.

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Reprodução das Plantas Cultivadas

A flor contém as estruturas de reprodução sexual das plantas. De suas partescomponentes - sépalas, pétalas, estames e pistilo, apenas as duas últimas funcionamna reprodução, com produção de gametas. Geralmente o estame consta de umfilamento, o filete, que suporta a antera, dentro da qual se formam os grãos depólen. O pistilo consiste de uma estrutura aumentada na base, ou ovário, quecontém os óvulos, um prolongamento em forma de tubo fino, denominado estilo ouestilete, e o estigma, sobre o qual se depositam os grãos de pólen. No ovário seencontram os óvulos que, depois de fecundados, dão origem às sementes. Onúmero de óvulos pode variar de um, em gramíneas como arroz, cevada, e trigo, avárias centenas, como é o caso do fumo, berinjela, tomate, etc.

Flores perfeitas ou andróginas são as que contêm os estames e o pistilona mesma estrutura floral e, imperfeitas, quando falta um desses verticilos. Amaior parte das plantas cultivadas é do primeiro tipo. Como exemplos tem-se otrigo, aveia, cevada, centeio, arroz, sorgo, algodão, fumo, beterraba açucareira,soja, feijão e a maioria das gramíneas e leguminosas forrageiras. As floresimperfeitas são estaminadas, quando possuem somente os estames, ou pistiladas,somente com pistilo. A planta do milho, por exemplo, tem flores estaminadas nopendão (inflorescência masculina) e pistiladas, na espiga (inflorescência feminina).As flores imperfeitas são sempre incompletas. Quando se encontram os doissexos na mesma planta, porém separados, trata-se de espécie monóica; quandoem indivíduos diferentes, a espécie é dióica. Outro conceito é o de plantaspolígamas - são as que possuem flores andróginas e unissexuais, podendo ocorreras três formas reunidas: masculina, feminina e andrógina, como no mamoeiro.

5.1. REPRODUÇÃO SEXUAL E ASSEXUAL NAS PLANTASCULTIVADAS

A reprodução sexuada é, basicamente, a regra nas plantas superiores,embora em muitas delas ocorra, naturalmente, a propagação assexuada ouvegetativa, de forma facultativa ou mesmo obrigatória.

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5.1.1. Reprodução Sexual

Gametogênese

As sementes provêm do desenvolvimento dos óvulos e seus tecidosenvolventes. Na reprodução sexual normal a fusão dos gametas masculino efeminino é essencial à produção de sementes. O ovário pode conter um únicoóvulo (cereais) ou muitos (fumo). Gametogênese, como o próprio nome indica,é o processo de formação dos gametas masculino e feminino.

Microsporogênese

É o processo de formação dos gametas masculinos. Numa antera imaturaencontram-se quatro cavidades que contêm numerosos micrósporos, ou células-mãe. Cada um passa por duas divisões nucleares sucessivas, formando umatétrade de quatro micrósporos, que podem transformar-se num grão de pólen,com a divisão de seu núcleo, para formar um núcleo vegetativo e outro generativo.Este último, por sua vez, origina, por divisão, dois núcleos espermáticos. Àmedida que a antera amadurece, os sacos polínicos se abrem, dispersando osgrãos de pólen, produzidos em grande número. No milho, um único pendãopode conter de 20 a 50 milhões de grãos de pólen.

Macrosporogênese

É o processo de formação dos gametas femininos. A célula germinal femininadesenvolve-se dentro do óvulo por uma sucessão de etapas semelhante à queocorre na microsporogênese. No interior de cada óvulo encontra-se uma célulaindividual, chamada célula-mãe ou megasporócito. Essa célula também sofre duasdivisões nucleares sucessivas, produzindo uma tétrade de quatro megásporos.

Desses, três se degeneram; o outro continua submetendo-se a mitosessucessivas, formando finalmente o saco embrionário, com oito núcleos, dosquais, dois constituirão as sinérgidas, situadas ao lado de um terceiro, na regiãoda micrópila, que formará a oosfera; três, situar-se-ão em sentido oposto,formando as antípodas; os dois restantes, denominados de núcleos polares,se localizarão na parte central do saco embrionário.

Polinização e Fertilização

Polinização consiste na transferência de grãos de pólen da antera para oestigma, na mesma flor, ou de uma flor para outra. Os meios de transferênciado pólen variam de conformidade com a espécie. O pólen do milho é transportado

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pelo vento, atingindo outras plantas; porém, uma pequena parte pode cair sobreestigmas da mesma planta. Plantas forrageiras e centeio também são, em grandeparte, polinizadas através do vento. Em muitas leguminosas, como a alfafa e otrevo roxo, o transporte se dá por insetos. Na soja, trigo, feijão e outras culturasparte do pólen cai diretamente sobre o estigma da mesma flor, à medida que asanteras se abrem. No trigo, aveia, cevada e arroz, os estames e o pistilo seencontram dentro das brácteas florais que tendem a evitar a polinização compólen de outras flores. O estigma é a parte do pistilo que recebe o pólen, que aígermina, emitindo o tubo polínico; este cresce através do estilete e penetra noóvulo através de uma abertura chamada micrópila. As células germinaismasculinas, ou núcleos espermáticos, movem-se através do tubo polínico esão descarregadas dentro do saco embrionário. Fertilização ou fecundaçãocompreende a fusão dos gametas masculino e feminino. O processo éesquematizado na Figura 5.1. Nem sempre a polinização é seguida de fertilização,seja pelos grãos de pólen não atingirem o estigma da própria flor ou de outrasflores, ou em função dos mecanismos naturais. Esta questão será discutida noCapítulo 11.

Após a penetração dos dois núcleos espermáticos no saco embrionário,

um deles funde-se com a oosfera, formando o zigoto. Esse processo constitui a

fertilização. O outro núcleo espermático une-se com os dois núcleos polares,

fundidos anteriormente ou no momento dessa união, originando o endosperma,

a partir do núcleo endospermático primário. Os dois processos, de dupla e

tríplice fusão, constitui o que se conhece por dupla fertilização, da qual origina-

se a semente. O ovo ou zigoto desenvolve-se, formando o embrião que, após a

germinação, originará nova planta. O endosperma é um tecido de reserva. Nas

monocotiledôneas, acumula amido, açúcares, óleo, proteína, e outras

substâncias utilizadas pelo embrião até a fase inicial de desenvolvimento da

planta, como ocorre nas gramíneas. Nas sementes de dicotiledôneas como

soja, feijão, amendoim e outras leguminosas, o endosperma é absorvido pelo

embrião em desenvolvimento e o material de reserva é armazenado nos

cotilédones.

Na semente, apenas o embrião toma parte no processo hereditário,

embora possa haver participação de genes localizados em organelas

citoplasmáticas. Sendo uma estrutura meristemática o embrião oferece pouca

oportunidade para a expressão de caracteres. No entanto, muitas plantas têm

exibido diferenças genéticas no estádio de seedlings e, subseqüentemente,

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muitas características contrastantes aparecem. O endosperma, quando presenteem quantidades proporcionalmente grandes, como nas sementes de cereais,pode exibir vestígios de diferenciação característica do pólen. Este fenômenofoi notado por Focke, em 1881, recebendo o nome de xenia. A semente normalinclui também vários remanescentes dos tecidos maternos, dependendo daespécie vegetal. Elementos da nucela e integumento podem persistir. Em algunscasos tais tecidos, como parte do fruto, podem ser influenciados nodesenvolvimento, pela natureza das combinações parentais, o que foi descritopor Swingle, em 1926, com a denominação de metaxenia. Um bom exemplodesse efeito é o estímulo diferencial do desenvolvimento da fibra de algodão,que é um prolongamento (crescimento externo) do tegumento da semente. Porconseguinte, uma semente normal pode ser considerada como uma quimera,em que coexistem tecidos de origem e natureza diferentes.

Várias exceções do sistema normal de reprodução podem ocorrer, taiscomo a poliembrionia e a apomixia.

FIGURA 5.1. Processos envolvidos na reprodução sexual (adaptado de Ebert,1970).

Sistemas reprodutivos das plantas

Do ponto de vista da estrutura reprodutiva, as espécies de plantascultivadas podem ser divididas em dois grupos, dependendo de serem,predominantemente, autopolinizadas e autofecundadas (autógamas) ou deserem, em grande parte, de polinização e fecundação cruzada (alógamas). Os

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métodos de melhoramento aplicáveis ao grupo de plantas autógamas são nogeral, diferentes daqueles que se aplicam às espécies alógamas. A diferençaimportante entre os dois grupos está relacionada com o efeito da endogamiaem contraposição à polinização livre, ao acaso, sobre a estrutura genética daspopulações (Allard, 1971).

Nas populações de espécies alógamas todas as plantas são altamenteheterozigotas e, quase sem exceção, a endogamia forçada resulta numadeterioração geral do vigor e em outros efeitos adversos. A heterozigose é, namaioria dos casos, uma característica essencial das cultivares dessas espéciese, conseqüentemente, deve ser mantida durante o programa de melhoramento,ou restaurada nas etapas finais do programa.

Ao contrário, populações de plantas autógamas, pouco ou nadamelhoradas, consistem, geralmente, de misturas de muitas linhagenshomozigotas, com alto grau de parentesco e que se reproduzem isolada ouindependentemente. O objetivo da maioria dos programas de melhoramentoem espécies desse grupo consiste na obtenção de uma linha pura. Além da suainfluência em determinar as características gerais do programa de melhoramento,a biologia reprodutiva de uma espécie tem um papel importante na determinaçãodos procedimentos mais específicos que deverão conduzir ao sucesso desseprograma. Por exemplo, o tipo de programa mais adequado para o milho, ondea autofecundação é fácil e a hibridação em larga escala é economicamenteviável, torna-se diferente tanto no objetivo como na execução em relação a umprograma mais apropriado para alfafa, que também é uma espécie alógama,porém na qual tanto a autofecundação como o cruzamento controlado sãodifíceis. De maneira semelhante, a facilidade com que sementes deautofecundação ou sementes híbridas, em quantidade razoável, podem serobtidas numa planta autógama, como o fumo, por exemplo, permite maiorflexibilidade na escolha do programa de melhoramento do que para aveia, quetambém é uma espécie autógama, porém, onde híbridos artificiais só podemser reproduzidos com muito trabalho e custo.

Muitas espécies apresentam um grau de autofertilização tão elevado que

se tornam desnecessárias medidas para a proteção contra os cruzamentos

mesmo nos campos de melhoramento, onde muitos tipos diferentes são

cultivados lado a lado. Já em outras espécies, onde os cruzamentos são

freqüentes, é essencial adotarem-se certas medidas para o controle da

polinização.

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O conhecimento dos sistemas reprodutivos é fundamental para omelhoramento de plantas e, portanto, deve ser considerado na seleção dosmétodos. No restante deste capítulo, serão discutidos alguns sistemas maiscomuns pelos quais as plantas cultivadas se reproduzem. Simplificações dastécnicas de melhoramento de plantas serão consideradas, de maneira geral,com mais detalhes em capítulos posteriores.

Mecanismos naturais de controle da polinização

Mecanismos diversos determinam se uma planta superior serápreferencialmente autopolinizada ou se estará sujeita a cruzamentos. Em geral,esquemas eficientes de endogamia são mais facilmente desenvolvidos de queesquemas igualmente eficientes de cruzamentos, porque para a endogamianão se necessita de diversidade genética entre os indivíduos. Dificuldades parao cruzamento são quase sempre devidas à cleistogamia ou a dispositivos comefeitos semelhantes. Cleistogamia consiste na polinização e fecundação antesda abertura da flor andrógina. A eficiência dos mecanismos de endogamia estásujeita a modificações, tanto por causas genéticas como ambientais. Assim, afreqüência de cruzamentos varia de uma cultivar para outra e com as diferentesestações do ano e locais. São interessantes alguns exemplos de semelhançasestruturais entre flores de plantas de sistemas reprodutivos diferentes, como otrigo e o centeio. Nas flores do trigo, que é uma planta autógama, as anterasabrem-se antes da sua extrusão, de tal modo que as anteras vazias pendentesnão têm qualquer função. Isso corresponde a uma cleistogamia efetiva, quenão ocorre no centeio, que é alógama. O comportamento das flores de trigopermite, entretanto, uma baixa freqüência de cruzamentos.

No tomate, a polinização é seguida da abertura da flor, porém, os estames

formam um cone envolvendo o estigma, de tal maneira que a autopolinização é

quase garantida. Entre as espécies cultivadas de tomate existe alguma variação

no comportamento do estilo, que se prolonga para fora do cone de estames,

resultando tipos longistilos. Com essa variação na morfologia floral, pode ocorrer

alta freqüência de cruzamentos. O importante é considerar que variações em

caracteres, tais como morfologia floral e época da deiscência do pólen por

serem devidas a um único gene, podem alterar drasticamente o sistema

reprodutivo da espécie.

Existem evidências de que espécies autógamas se originam por evolução

de alógamas, como estratégia adaptativa, porém, a reversibilidade da autogamia

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para alogamia é discutível, Jain (1976). Alguns autores, como Mather (1943),sugerem que essa direção evolutiva é devida à maior flexibilidade da estruturagenética das populações alógamas, permitindo que se adaptem melhor àsmudanças de longo prazo no ambiente do que as autógamas, que sãogeneticamente menos flexíveis. Assim, alógamas são potencialmenteoriginadoras de autógamas, uma vez que essas, por sua uniformidadeacompanhada de homozigose, são capazes de grande adaptação imediata.Isso permite-lhes fazerem face às mudanças do ambiente, em curto prazo, melhordo que as suas ancestrais alógamas, que são mais variáveis. Essa linha deraciocínio parece explicar a situação das espécies cultivadas, muitas das quaissão autógamas, talvez devido à grande importância que é dada à adaptaçãoimediata nas condições de cultivo.

Se por um lado a autogamia é vantajosa por possibilitar a exploraçãomais eficiente dos recursos de ambiente, na natureza, a longo prazo, isso poderestringir a flexibilidade que é, teoricamente, necessária para fazer face aosdesafios das mudanças do ambiente que ocorrem com o tempo. Realmente,segundo Allard (1971) existem muito mais mecanismos para evitar a autogamiado que para facilitá-la; o número de alógamas entre as espécies selvagens émaior do que entre as espécies cultivadas.

Dispositivos que favorecem a endogamia podem ter um controle genéticosimples, uma vez que a diversidade genética entre os indivíduos não é importantenesse caso. Existem também vários dispositivos que favorecem o cruzamento eque não necessitam de diversidade genética. Entre os mais comuns estão aquelesque fazem com que os gametas masculinos e femininos estejam bastanteseparados entre si, como na monoicia e dioicia. Espécies monóicas, tais comomilho, noz e moranguinho, constituem exemplos desse tipo. Na protandria eprotoginia, que são formas de dicogamia, as anteras e estigmas de uma flor setornam maduros em tempos diferentes. A cenoura e a framboesa são exemplosde espécies protândricas, em que primeiro ocorre a liberação do pólen; abacatee noz são espécies protogínicas, em que o estigma está receptivo antes daliberação dos grãos de pólen. Outro exemplo de mecanismo biológico favorecendoo cruzamento é dado pela alfafa, em que o estigma só fica receptivo após orompimento de uma membrana protetora que o envolve. Isto é conseguido porum impacto, pois os estames e os estigmas crescem dentro da quilha onde sãomantidos sob forte tensão. Quando essa tensão é liberada por pressão mecânica,que na natureza é feita pelas abelhas, o estigma se projeta contra o estandarte,

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a membrana se rompe e o pólen é libertado, sendo que parte deste adere-se àpilosidade do corpo do inseto e finalmente, irá polinizar a próxima flor.

Os mecanismos discutidos são pouco conhecidos quanto à sua eficiênciarelativa, uma vez que observações cuidadosas têm sido feitas em apenas poucasespécies. Certamente podem ser muito eficientes, como no milho, que é umaplanta essencialmente alógama, com mais de 90% de cruzamentos, por efeito deação combinada de monoicia e protandria. A beterraba, que apresenta protandria,também é altamente alogâmica. O mesmo ocorre com o trevo vermelho (Trifoliumpratense). Parece que a dicogamia não é o único mecanismo favorável aoscruzamentos, nessas espécies. O trevo vermelho é altamente auto-incompatível,além de apresentar protandria. A alfafa, além de sua polinização entomófilacomplicada, apresenta, em parte, um sistema de incompatibilidade. Além dissoobservou-se nessa espécie um tipo de esterilidade somatoplástica, em queembriões obtidos por autofecundação sobrevivem em menor grau do que aquelesproduzidos por cruzamento, favorecendo a heterozigose.

Monoicia, protandria e protoginia facilitam o cruzamento entre plantas.No entanto, podem apenas dificultar e não evitar completamente aautofertilização, pois barreiras reprodutivas só passam a existir quando sedesenvolve algum tipo de diversidade genética. A dioicia ou diferenciação sexualé conseqüência desse tipo de diversidade, e constitui, evidentemente, umdispositivo de cruzamento, impedindo a autofecundação, porém não evitapolinizações entre indivíduos de uma mesma família, o que viria constituir umaforma de endogamia menos pronunciada. A dioicia, que se assemelha ao sistemaquase absoluto de acasalamento dos animais, ocorre com baixa freqüênciaentre as plantas superiores. Espécies dióicas importantes entre as plantascultivadas são a tamareira, o cânhamo, o lúpulo, o mamoeiro e o aspargo. Naverdade algumas dessas espécies produzem comumente indivíduos andróginas.O controle genético da dioicia em plantas superiores é, razoavelmente, bemconhecido (Westergaard, mencionado por Allard, 1971). O mamoeiro, comoserá visto adiante, não apresenta muita regularidade quanto à reprodução, anão ser os indivíduos com flores femininas.

A auto-incompatibilidade é muito comum entre as plantas superiores.Nestas, ocorrem dois esquemas básicos de auto-incompatibilidade: gametofíticoou sistema haplo-diplóide, no qual a incompatibilidade depende do genótipo dogametófito, e esporofítico ou sistema diplo-diplóide, onde a incompatibilidade édeterminada no genótipo pelo seu progenitor esporofítico. No sistema

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gametofítico, em que autofecundações não são possíveis, os efeitos daincompatibilidade são facilmente classificáveis. Efetuando-se polinizaçõescruzadas a proporção de grãos de pólen abortados pode ser zero, 50 ou 100%. A classificação é ainda mais simples para o sistema esporofítico; comautopolinização não são obtidas sementes, enquanto em polinização cruzada aproporção de aborto de grãos de pólen pode ser zero ou 100%.

O controle genético desses resultados já é bem conhecido. Deve salientar-se que a auto-incompatibilidade não é necessariamente absoluta, permitindo,assim, que os melhoristas que a desejem possam autofecundar espéciesaltamente incompatíveis, empregando algum artifício ou técnica especial. Embrássicas, por exemplo, é comum a autofecundação de plantas auto-incompatíveis no estádio de botão floral, com produção de sementes suficientepara emprego nos programas de melhoramento.

Outro fenômeno que ocorre no reino vegetal é a esterilidade masculina,que tem sido utilizada como um mecanismo de auxílio ao trabalho dosmelhoristas. Sendo uma anormalidade, inicialmente foi considerada comoindesejável e era então eliminada pela seleção nas populações em segregação.A partir do interesse na utilização da heterose ou vigor híbrido, a esterilidademasculina passou a ser empregada com a grande vantagem de se evitarem ostrabalhos árduos das emasculações manuais. Além da esterilidade devida airregularidades meióticas, como a falta de pareamento cromossômico, ocorretambém baixa viabilidade do pólen ou dos óvulos. Como exemplos citam-secasos de estames ou estilos mal formados, e pólen e óvulos inviáveis pordeficiência estruturais. Essas caraterísticas reprodutivas conduzem naturalmenteà alogamia, e são aproveitadas no melhoramento do milho e da cebola, nosquais ocorre a chamada esterilidade masculina citoplasmática ou genético-citoplasmática. Como se trata de um caráter genético é controlada por um alelorecessivo ms que pode ocorrer espontaneamente em plantas alógamas ouautógamas. O assunto será estudado com mais detalhes em capítulo específico.

5.1.2. Propagação assexuada

A reprodução por meio assexual é comum entre as plantas superiores.Os meios mais conhecidos de reprodução assexuada são constituídos porescamas bulbares, bulbos, rizomas, estolões, tubérculos ou outros órgãosvegetativos. Plantas que são normalmente propagadas na prática agrícola, poresses meios, ou por gemas ou por enxertia, incluem praticamente todas as

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frutíferas, moranguinho, framboesa e outras espécies de Rubus, videira, abacaxi,quase todos os arbustos e plantas ornamentais e várias culturas como cana-de-açúcar, batatinha e batata-doce. A experiência dos melhoristas indica queas variedades agrícolas que se propagam assexuadamente são altamenteheterozigotas e segregam amplamente quando se reproduzem por via sexual.Isto é esperado, uma vez que os tipos selecionados, para constituírem variedadescomerciais, devem ser vigorosos e sabe-se que, na maioria das espécies, existeuma correlação positiva entre vigor e heterozigose.

A reprodução assexuada proporciona a perpetuação de genótipossuperiores com grande precisão, o que se denomina de propagação clonal.Define-se clone como toda a descendência a partir de um indivíduo, por viaassexuada. Como só ocorrem mitoses, os indivíduos serão genotipicamenteidênticos. Nesse tipo de reprodução, a herdabilidade no sentido amplo,usualmente superior à herdabilidade no sentido restrito, é de grande interessepara o melhorista pois todos os tipos de ação e interação gênicas sãointegralmente explorados.

A propagação vegetativa pode ser de grande vantagem no melhoramentode plantas, uma vez que um número muito grande de indivíduos geneticamenteidênticos pode ser obtido, independentemente do grau de heterozigose dogenótipo. O melhorista pode, portanto, aproveitar imediatamente os indivíduosexcepcionais que ocorrem em qualquer estádio do programa de melhoramento.Por essa razão, o melhoramento dessas plantas é, em certos aspectos, maisfacilitado do que o de outras espécies.

Além dos tipos de reprodução vegetativa comumente usados naagricultura, existem outros englobados sob a denominação de apomixia. Nareprodução apomítica, quase sempre são produzidas sementes, porém, nãoatravés do processo normal de meiose e fertilização. A apomixia do tipoembriogenia nucelar é responsável pela reprodução assexual em citros.Importantes espécies forrageiras como aquelas pertencentes aos gênerosBrachiaria e Panicum são também apomíticas. O efeito principal da apomixiaconsiste num aumento da proporção de indivíduos maternais, evitando-se oumodificando-se a segregação e recombinação genética. A apomixia, entretanto,nem sempre é estável, de sorte que espécies reconhecidas como apomíticaspodem apresentar variabilidade. Descrições detalhadas e classificação dosinúmeros tipos de apomixia têm sido apresentadas por vários autores, comoStebbins (1941), e não serão consideradas aqui.

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Reprodução das Plantas Cultivadas

5.1.3. Formas de reconhecimento do sistema reprodutivo

O sistema reprodutivo e a taxa de cruzamento natural são razoavelmente

bem conhecidos para a maioria das espécies agronômicas, apesar de algumas

dúvidas que ainda persistem com relação à variação das taxas de cruzamento

natural, em função de variações ambientais, principalmente. Para a condução

eficiente de um programa de melhoramento, portanto, é mais recomendável a

determinação da taxa de cruzamento dentro de uma espécie, para a região a

que se destina o programa de melhoramento. Procedimentos simples podem

ser usados para determinar se a espécie é de autopolinização ou de polinização

cruzada: 1) A primeira etapa, naturalmente, consiste no exame da estrutura floral.

Plantas dióicas obviamente evidenciarão alogamia. De maneira semelhante, a

dicogamia, monoicia, ou outros dispositivos para cruzamento, fornecem indício

de que a espécie é alógama, assim como a cleistogamia é uma evidência de

autogamia; 2) Na segunda fase isolam-se plantas individuais e observa-se se há

ou não produção de sementes. É preferível o isolamento no espaço, uma vez

que o isolamento por meio de sacos ou caixas pode acarretar condições de

ambiente adversas à produção de sementes. A não produção de sementes em

isolamento é uma indicação quase certa de que a espécie é alógama. Entretanto,

a recíproca não é necessariamente verdadeira, porque muitas plantas alógamas,

como o milho, por exemplo, são auto-férteis. Conclui-se que a determinação de

alogamia é mais precisa do que a de autogamia; 3) Finalmente, procura-se verificar

o efeito da endogamia, colhendo sementes das plantas individuais isoladas e

autofecundadas e avaliando sua progênie. Se não for notada depressão por

endogamia, a espécie é, provavelmente, autógama.

A seguir deve-se conhecer a proporção de cruzamento natural quando

ocorre proximidade de diferentes genótipos. A proporção ou taxa de cruzamento

natural é geralmente determinada pelo plantio de genótipos com um alelo

marcador dominante, intercalados com genótipos apresentando o

correspondente alelo recessivo. As sementes são colhidas nas plantas que

apresentarem o fenótipo recessivo e a taxa de cruzamento natural é calculada

a partir da proporção de indivíduos recessivos e dominantes da progênie. Para

maior eficiência em estudos dessa natureza, são preferidos os caracteres visíveis

em sementes ou plântulas. Os alelos como aqueles que determinam endosperma

amiláceo versus glutinoso, em gramíneas, ou cotilédone branco versus verde

nas leguminosas, constituem bons marcadores, permitindo pronta determinação.

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No caso de cor da flor há necessidade de se esperar mais tempo, até que aplanta oriunda do cruzamento inicie o florescimento. Em feijão, soja e outrasleguminosas, a cor violeta é dominante sobre branca. Para o cafeeiro, porexemplo, em razão do ciclo perene, essa determinação é ainda mais demorada;um gene marcador para essa espécie é o que confere a cor do endosperma dasemente, usando-se o mutante cera, de endosperma amarelo intercalado complantas normais, cujo endosperma é verde. Nesse caso em que a ação de umalelo dominante proveniente do progenitor masculino é observada já noendosperma da semente formada, tem-se o efeito de xenia.

Alguns fatores devem ser considerados na condução de estudos dessanatureza, como a época do florescimento, por exemplo, porque variedadesflorescendo em épocas diferentes não se cruzarão com a mesma intensidadede outras com florescimento simultâneo. Esses experimentos podemproporcionar informações sobre o comportamento dos insetos vetores de pólen,efeito da direção e intensidade do vento, temperatura e interações entre essesfatores, bem como sua influência sobre o grau de cruzamento natural. Éimportante que os estudos sejam conduzidos por vários anos e em locaisdiferentes, pois a taxa de cruzamento natural nos diferentes genótipos podeser muito influenciada pelo ambiente.

Experimentos semelhantes podem também ser usados para se estabelecera distância necessária entre as áreas de plantio, com ou sem culturasintermediárias, a fim de se evitarem contaminações por pólen estranho,particularmente nos campos de produção de sementes comerciais de cultivaresmelhoradas.

Na determinação do sistema reprodutivo, para algumas espécies asinformações disponíveis não são muito seguras, podendo exigirreclassificações, assim que outras mais precisas sobre os sistemas dereprodução forem obtidas. A classificação feita até hoje baseou-se naproporção de autopolinização ou polinização cruzada. A autopolinização énaturalmente apenas um dos vários sistemas reprodutivos e apenas um dosmeios pelos quais as populações podem se tornar endógamas. Ascucurbitáceas constituem um bom exemplo. Muito embora sejam monóicas,estas plantas não sofrem depressão pela endogamia e a estrutura genéticadas suas populações é, sob vários aspectos, mais similar à das autógamasdo que à das alógamas. Existem várias explicações para isso, tanto do pontode vista biológico como econômico. As cucurbitáceas constituem plantas que

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Reprodução das Plantas Cultivadas

ocupam bastante espaço. Em geral, para satisfazer as necessidades dequalquer agricultor, são necessárias relativamente poucas plantas.Conseqüentemente, essas espécies devem ter se mantido em colôniaspequenas, tanto na natureza como em cultivo, como ainda é comum, e essarestrição no tamanho da população pode ter produzido endogamia, apesardo mecanismo floral favorecer o cruzamento. Nessa condição, alelos deletériosnas populações selvagens de cucurbitáceas devem ter sido eliminados pelaprópria seleção natural, à medida em que surgiam na condição homozigota.

Algumas espécies alógamas menos estudadas do que as cucurbitáceaspodem constituir exemplo semelhante. Por isso tem sido necessário classificartodas as espécies de polinização cruzada como alógamas, embora talclassificação nem sempre possibilite inferências precisas da resposta decorrenteda endogamia ou de métodos de melhoramento adequados. Nesse aspecto asautógamas são muito mais homogêneas. Nenhuma dessas espécies sofre efeitosvisíveis de depressão pela endogamia e os mesmos métodos de melhoramentosão, em geral, aplicáveis a todos os membros do grupo. Já as alógamas, pelavariação entre espécies na depressão pela endogamia e mesmo pelaimpossibilidade de se realizar autofecundações em alguns casos (como naautoincompatibilidade gametofítica, por exemplo), os métodos de melhoramentonão podem ser generalizados, necessitando de adaptações conforme a espécietrabalhada.

O conhecimento da taxa de fecundação cruzada entre as plantasautógamas torna-se importante, principalmente porque relaciona-se àcontaminação nas progênies obtidas. Diferenças entre variedades podemocorrer em relação aos cruzamentos naturais. E ainda, a taxa de cruzamentopara uma variedade pode ser muito influenciada por mudanças do ambiente.Desse modo, as generalizações acerca da taxa de cruzamentos naturaisesperada em espécies autógamas são válidas somente dentro de limitesdefinidos em termos de variedades específicas e em condições de ambientebem delimitadas. De qualquer modo, em certas espécies deste grupo, comoalgodão e sorgo, é bom precaver-se contra valores relativamente altos decruzamentos naturais, que podem chegar a 50%, em diferentes condições deambiente. Em outras espécies, tais como feijão, soja, cevada, aveia, arroz ealface, a taxa de cruzamento natural raramente vai além de um por cento paraqualquer variedade, sendo, portanto, praticamente desprezível. Outras espéciesapresentam valores até cerca de 10%.

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos

Os mecanismos que determinam a taxa de cruzamento natural podemvariar de espécie para espécie, dificultando a classificação quanto ao modo dereprodução. Muitas vezes isso é resultado da seleção das plantas cultivadas,como pode ser exemplificado pelas mudanças ocorridas no comportamentoreprodutivo do moranguinho. Ambos os ancestrais (Fragaria virginiana e F.chiloensis) são espécies dióicas. Plantas dióicas são menos desejáveis do queos tipos com flores perfeitas, porque esses são frutíferos mesmo quandoplantados isoladamente. Conseqüentemente, os melhoristas, procurandoexplorar a biologia floral dessas espécies, preferiram os tipos andróginasemergentes, em cuja direção a seleção foi conduzida. Hoje, praticamente, todasas variedades existentes são autofrutíferas. Já há algum tempo tal procedimentovem sendo adotado em muitas outras plantas cultivadas, com eliminação deplantas dióicas, monóicas e autoincompatíveis, até que permaneçam somentetipos completamente autofrutíferos. Exemplos são encontrados na videira e outrasespécies de frutíferas.

Na cultura do mamoeiro o tipo ideal para o mercado é a planta feminina,cujos frutos são formados com o auxílio de um polinizador, embora esta espéciepossa apresentar as seguintes expressões sexuais: a) Plantas masculinas. Emalgumas épocas do ano produzem flores andróginas; b) Plantas andróginas.Produzem flores femininas estéreis em algumas épocas do ano; c) Plantasfemininas. São estáveis quanto à expressão sexual.

As cucurbitáceas, quase sempre monóicas, podem apresentar osseguintes tipos de plantas: Ginóicas - só produzem flores femininas; Andróicas -somente flores masculinas; Andróginas - produzem flores perfeitas;Andromonóicas - produzem flores masculinas e andróginas. Podem aindaocorrer plantas polígamas, as quais possuem flores andróginas e unissexuais,sendo possível encontrar, numa mesma planta, flores andróginas, masculinase femininas.

5.1.4. Sistemas reprodutivos e constituição genotípica das plantas

Quando se pretende aplicar um programa de melhoramento genético auma espécie é necessário que se conheça primeiramente a constituição genéticada população inicial. É o modo de reprodução da espécie que vai determinar sea população base, ou de trabalho, será homogênea ou heterogênea e se osindivíduos que a compõem serão predominantemente homozigotos ouheterozigotos.

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Reprodução das Plantas Cultivadas

Em autógamas os gametas que se unem provêm da mesma planta eprovavelmente são geneticamente idênticos, produzindo, conseqüentemente, plantashomozigotas. Se a planta é alógama, os gametas provêm de indivíduos distintos,sendo portanto diferentes, originando plantas heterozigotas. A autogamia e a alogamiaabsolutas estão limitadas a poucas espécies na natureza. O que ocorre maiscomumente é uma predominância de um ou outro desses tipos de reprodução.

Nas plantas alógamas há uma recombinação genética constante, já queos gametas de uma planta se unem aos de outras e nesse intercâmbio, degeração para geração, mantém-se, portanto, um nível de heterozigose quepode atingir valores altos. Para se entender isso, basta fazer abstrações,conforme sugere Brauer (1973), as quais são ilustradas nos Quadros 5.1, 5.2 e5.3. Supondo o cruzamento de dois indivíduos homozigotos, sendo um AA e ooutro aa, colocados num local onde não existem outros indivíduos da mesmaespécie e considerando uma alogamia absoluta, a progênie será compostasomente por indivíduos heterozigotos Aa, todos híbridos. A combinação ao acasode seus gametas, na geração seguinte, é aquela conhecida em Genética.Surgem novamente indivíduos homozigotos, mas os heterozigotos já constituemapenas 50% da descendência, como é mostrado no Quadro 5.1.

Este é o mesmo resultado que se obteria na geração F2 do cruzamentode dois progenitores homozigotos (25% AA : 50% Aa: 25% aa). Assim, aindacom 100% de alogamia, na geração seguinte à do cruzamento, 50% dosindivíduos são heterozigotos e 50% são homozigotos. A diferença fundamentalentre as plantas autógamas e alógamas aparece, todavia, na geração seguinte,pois nas alógamas, os grãos de pólen não ficam retidos na própria flor, mas sãoliberados por um mecanismo qualquer, como vento e insetos. Isto significa quea combinação de todos os gametas das plantas se efetua ao acaso, e, portanto,a composição genotípica dos indivíduos resultantes depende de sua freqüência.Entre os gametas que comporão a próxima geração, 50% conterão o alelodominante e 50% o recessivo, de modo que repete-se na geração seguinte aproporção de 50% de heterozigotos e 50% de homozigotos.

QUADRO 5.1. Recombinação ao acaso de um par de alelos, na segunda geraçãodepois de um cruzamento.

Gametas A a

A AA Aa

a Aa aa

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos

Pode-se então questionar, porque, em plantas alógamas, aspopulações são altamente heterozigotas, em contraste com uma populaçãoautógama, altamente homozigota. Considerando-se um único gene comdois alelos a população poderia ser chamada tanto de heterozigota quantode homozigota. Na realidade, não é o que se verifica, ou seja, cada indivíduocarrega não um, mas um grande número de genes, que apresentam comfreqüência um número de alelos superior a dois para cada loco. Para melhorcompreensão esse número de genes será aumentado de um em um. Osquadros seguintes são característicos de recombinação com dois e trêsgenes, com apenas dois alelos cada. Em ambos pode observar-se que osúnicos homozigotos totais são os que ocupam a diagonal que baixa daesquerda à direita, representando 4/16 = ¼ da população, para dois genese 8/64 = 1/8, para três genes.

QUADRO 5.2. Recombinação ao acaso de dois genes em uma planta autógama,supondo-se que em todos os locos dois alelos com a mesma freqüência (50%).

QUADRO 5.3. Recombinação ao acaso de três genes. Os indivíduos homozigotosresultam quando os gametas que se unem levam a mesma constituição genética;todas as demais combinações são heterozigotas pelo menos para um loco.

Gametas ABC Abc AbC aBC Abc aBc abC abc

ABC AABBCC AaBbCc

Abc AABBcc AaBbCc

AbC AAbbCC AaBbCc

aBC aaBBCC aABbCc

Abc AaBbCc AAbbcc

aBc AaBbCc aaBBcc

abC AaBbCc aabbCC

abc AaBbCc aabbcc

Gametas AB Ab aB ab

AB AABB AABb AaBB AaBb

Ab AABb AAbb AaBb Aabb

aB AaBB AaBb aaBB aaBb

ab AaBb Aabb aaBb aabb

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Reprodução das Plantas Cultivadas

Observa-se que a proporção de homozigotos totais na população variacomo se segue:

Para um gene -1/2Para dois genes - 1/4 = (1/2)2

Para três genes - 1/8 = (1/2)3

Para n genes - (1/2)n

Segundo Brauer (1973), uma planta somente é estritamente homozigotaquando sua progênie obtida por reprodução sexual é exatamente igual a ela,ou seja, não há variação. Considerando o que sucede numa população inteirade polinização cruzada, onde a herança dos caracteres de cada indivíduo estádeterminada por um grande número de genes com vários alelos cada um, podeafirmar-se com certeza, que a probabilidade de se achar uma planta totalmentehomozigota em uma população alógama é extremamente baixa. Supondo quesó interesse a herança determinada por 20 genes, com dois alelos cada um, oshomozigotos totais se achariam na população com uma probabilidade de (1/2)20, ou seja, um em 1.048.000 indivíduos. Nessas circunstâncias é perfeitamentejustificável afirmar que uma população alógama é heterozigota.

Considera-se que uma população alógama é heterozigota mas não sepode precisar o grau de heterozigose dos indivíduos que a formam. Para tanto,tem que considerar-se também o número de genes nessa condição.Observando-se novamente os Quadros 5.1, 5.2 e 5.3, percebe-se obviamenteo grau máximo que se obtém com todos os genótipos em heterozigose. NoQuadro 5.3 os genótipos totalmente heterozigotos ocupam a diagonal que sobeda esquerda para a direita e que eles têm, na população, a mesma proporçãodos homozigotos totais, ou seja, (1/2)n. A estrutura genética de uma populaçãoalógama deve ser entendida considerando-se que cada loco pode ter aalternativa de ser homozigoto ou heterozigoto, combinando-se com os demaisde todas as maneiras possíveis. Assim, a distribuição da composição genéticanuma população, considerando a freqüência dos indivíduos, é binomial. Nessetipo de distribuição, a freqüência mais alta corresponde à freqüência dosindivíduos que têm a metade dos locos em homozigose e a outra metade emheterozigose. O equilíbrio de Hardy-Weinberg, referente a populaçõespanmíticas, não é alterado a não ser que ocorram fatores como mutação,migração ou redução do tamanho da população. Definine-se a populaçãopanmítica como aquela de tamanho teoricamente infinito, cujos indivíduosintercruzam-se ao acaso.

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos

O homem pode modificar a proporção de alogamia mediante a polinizaçãoartificial e variar o tamanho das populações que utiliza para a reprodução,conduzindo a seleção no sentido que lhe convenha, ou pode também introduzirnovo germoplasma à população, e ainda provocar mutações artificiais, alterandoassim as freqüências dos genótipos conforme seu interesse.

5.1.5. Exemplos de espécies agrupadas conforme o sistemareprodutivo

A seguir, são apresentadas algumas das espécies mais cultivadas,classificadas segundo o seu sistema reprodutivo.

Autógamas

Alface - Lactuca sativa

Feijão-comum - Phaseolus vulgaris

Amendoim - Arachis hypogaea

Fumo - Nicotiana tabacum

Arroz - Oryza sativa

Linho - Linum usitatissimum

Batata - Solanum tuberosum

Soja - Glycine max

Cevada - Hordeum vulgare

Tomate - Lycopersicon esculentum

Trigo - Triticum aestivum

Ervilha - Pisum sativum

Autógamas com alogamia freqüente

Algodão - Gossypium spp.

Quiabo - Hibiscus esculentus

Berinjela - Solanum melongeana

Sorgo - Sorghum bicolor

Café (arábica) - Coffea arabica

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Reprodução das Plantas Cultivadas

Alógamas Andróginas:

Abacate - Persea americana

Eucalipto - Eucalyptus spp.

Alfafa - Medicago sativa

Girassol - Helianthus annum

Batata-doce - Ipomoea batatas

Goiaba - Psidium guayava

Beterraba - Beta vulgaris

Maçã - Malus spp.

Crucíferas em geral (couve- flor, repolho, colza, etc.)

Manga - Mangifera indica

Café (robusta) - Coffea canephora

Maracujá - Passiflora spp.

Cacau - Theobroma cacao

Pêra - Pyrus communis

Cana-de-açúcar

- Saccharum spp.

Rabanete - Raphanus sativus

Centeio - Secale cereale

Cenoura - Daucus carota

Monóicas

DióicasAspargo, Cânhamo, Espinafre, Lúpulo, Pinheiro do Paraná e Tâmara.

Cucurbitáceas, em geral - Cucurbita spp. - Abóbora, moranga, melão, melancia, pepino.

Euforbiáceas, em geral Mandioca - Manihot esculenta Mamona - Ricinus communis

Milho - Zea mays (milho comum e pipoca)

Seringueira - Hevea brasiliensis

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