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. 111 . © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA CONCEITO O abdome agudo obstrutivo, síndrome decor- rente de uma obstrução intestinal, é uma afecção muito freqüente que engloba uma grande per- centagem das internações causadas por dor ab- dominal. É causado pela presença de um obstá- culo mecânico ou de uma alteração da motilida- de intestinal que impede a progressão normal do bolo fecal. A obstrução intestinal compreende dois grandes grupos, segundo a causa da interrupção do trânsi- to: causa mecânica, que leva aos quadros de obs- trução mecânica, e distúrbio da motilidade intesti- nal, que leva aos quadros de íleo adinâmico ou pa- ralítico ou neurogênico (pseudo-obstrução). As cau- sas mecânicas ocorrem pela presença de obstácu- los intraluminares, como, por exemplo, cálculos bi- liares e bolo de áscaris, ou por fatores extralumina- res, tais como as obstruções intrínsecas causadas por tumores, hematomas etc. ou pelas compressões extrínsecas, como, por exemplo, as aderências, hér- nias, tumores etc. Classificações distintas são utilizadas para dife- renciar as causas mecânicas: ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO 1. Alta, quando o obstáculo ao trânsito situa-se no delgado proximal, ou baixa, quando o obstácu- lo situa-se no delgado distal ou no colo; 2. Parcial, quando a oclusão da luz intestinal é incompleta, ou completa, quando a oclusão é total; 3. Aguda, quando de instalação abrupta, ou crô- nica (geralmente parcial), quando de instala- ção lenta, com períodos de melhora e piora que se estendem por vários dias ou meses (p. ex., nas doenças inflamatórias intestinais ou nas aderências); 4. Simples, quando o suprimento de sangue ao intestino encontra-se íntegro, não havendo comprometimento da vitalidade da alça, ou estrangulada, quando há comprometimento do suprimento sangüíneo, podendo levar à isque- mia e mesmo à necrose do intestino já obs- truído mecanicamente; 5. Em alça fechada (p. ex., hérnias, volvos), quando existe obstáculo em dois níveis, im- pedindo tanto a progressão quanto o reflu- xo do conteúdo da alça; nessas condições, pode ocorrer grande distensão e sofrimento da alça. Capítulo 8 CLÍNICA Gaspar de Jesus Lopes Filho José Roberto Ferraro

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CONCEITO

O abdome agudo obstrutivo, síndrome decor-

rente de uma obstrução intestinal, é uma afecção

muito freqüente que engloba uma grande per-

centagem das internações causadas por dor ab-

dominal. É causado pela presença de um obstá-

culo mecânico ou de uma alteração da motilida-

de intestinal que impede a progressão normal do

bolo fecal.

A obstrução intestinal compreende dois grandes

grupos, segundo a causa da interrupção do trânsi-

to: causa mecânica, que leva aos quadros de obs-

trução mecânica, e distúrbio da motilidade intesti-

nal, que leva aos quadros de íleo adinâmico ou pa-

ralítico ou neurogênico (pseudo-obstrução). As cau-

sas mecânicas ocorrem pela presença de obstácu-

los intraluminares, como, por exemplo, cálculos bi-

liares e bolo de áscaris, ou por fatores extralumina-

res, tais como as obstruções intrínsecas causadas

por tumores, hematomas etc. ou pelas compressões

extrínsecas, como, por exemplo, as aderências, hér-

nias, tumores etc.

Classificações distintas são utilizadas para dife-

renciar as causas mecânicas:

ABDOME AGUDO

OBSTRUTIVO

1. Alta, quando o obstáculo ao trânsito situa-se no

delgado proximal, ou baixa, quando o obstácu-

lo situa-se no delgado distal ou no colo;

2. Parcial, quando a oclusão da luz intestinal é

incompleta, ou completa, quando a oclusão é

total;

3. Aguda, quando de instalação abrupta, ou crô-

nica (geralmente parcial), quando de instala-

ção lenta, com períodos de melhora e piora

que se estendem por vários dias ou meses

(p. ex., nas doenças inflamatórias intestinais

ou nas aderências);

4. Simples, quando o suprimento de sangue ao

intestino encontra-se íntegro, não havendo

comprometimento da vitalidade da alça, ou

estrangulada, quando há comprometimento do

suprimento sangüíneo, podendo levar à isque-

mia e mesmo à necrose do intestino já obs-

truído mecanicamente;

5. Em alça fechada (p. ex., hérnias, volvos),

quando existe obstáculo em dois níveis, im-

pedindo tanto a progressão quanto o reflu-

xo do conteúdo da alça; nessas condições,

pode ocorrer grande distensão e sofrimento

da alça.

Capítulo 8

CLÍNICAGaspar de Jesus Lopes FilhoJosé Roberto Ferraro

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INCIDÊNCIA

As obstruções intestinais podem acontecer des-

de a idade prematura até a nona década de vida,

tendo seu pico máximo aos 50 anos. A idade do

paciente torna-se importante, pois certas causas

têm sua maior freqüência em determinadas faixas

etárias. Assim, no neonato, devem ser consideradas

as atresias, o volvo, o íleo meconial, a imperfura-

ção anal e a doença de Hirchsprung. Já nos lacten-

tes, devemos lembrar da invaginação intestinal, das

hérnias complicadas e das obstruções por compli-

cações do divertículo de Meckel. No adulto jovem

e na meia-idade, devemos considerar as aderên-

cias, as hérnias e a doença de Crohn. Quanto mais

idoso o paciente, maior a possibilidade de tratar-

se de neoplasias, seguida pelas aderências, hérnias,

diverticulites e fecalomas.

Cerca de 20% das internações em serviço de

cirurgia por acometimento agudo abdominal são

devidas a obstruções intestinais. As causas mais co-

muns de obstrução intestinal são as aderências, se-

guidas das hérnias inguinais complicadas e das

neoplasias intestinais. Cerca de 80% de todas as

obstruções ocorrem devido a essas três causas. Cer-

ca de 80% das obstruções são no intestino delgado

e 20% são no intestino grosso.

ETIOPATOGENIA

As causas da obstrução intestinal mecânica

podem ser classificadas de acordo com o modo

como a obstrução acontece. Assim, pode ocorrer a

obstrução da luz intestinal, como no íleo biliar, a

redução da luz por retração e o espessamento da

parede da alça por doença intrínseca do intestino,

como ocorre na enterite ou no câncer, e a obstru-

ção por compressão extrínseca do intestino, como

acontece na oclusão por aderências. Por outro

lado, as causas decorrentes dos distúrbios da mo-

tilidade intestinal levam aos quadros de íleo pa-

ralítico ou neurogênico.

Assim, podemos enumerar:

1. Obstrução da luz intestinal: intussuscepção in-

testinal, íleo biliar, impactação (bário, bezoar,

áscaris).

2. Doenças parietais: congênitas: atresias e este-

noses, duplicações, divertículo de Meckel; trau-

máticas; inflamatórias: doença de Crohn, di-

verticulites; neoplásicas; miscelânea: estenose

por irradiação, endometriose.

3. Doenças extrínsecas: aderências; hérnias; mas-

sas extrínsecas (pâncreas anular, vasos anôma-

los, abscessos, hematomas, neoplasias, volvo).

4. Alterações da motilidade do intestino delgado:

íleo paralítico, íleo espástico, oclusão vascular.

FISIOPATOLOGIA

Embora a obstrução intestinal mecânica sim-

ples, a obstrução com estrangulamento, a obstru-

ção em alça fechada e o íleo paralítico tenham

muitos aspectos em comum, existem diferenças

importantes na fisiopatologia e no tratamento des-

sas entidades.

OBSTRUÇÃO INTESTINAL MECÂNICA

SIMPLES

As principais alterações fisiológicas do intestino

com obstrução mecânica, porém com suprimento

de sangue intacto, são o acúmulo de líquido e gás

acima do ponto de obstrução e a alteração da mo-

tilidade intestinal, que, somados, levam a altera-

ções sistêmicas importantes.

Alguns autores demonstraram que o fator tóxi-

co da obstrução intestinal mecânica é a perda de

líquidos e eletrólitos por vômito e seqüestro na alça

intestinal obstruída. O acúmulo de líquido no inte-

rior da alça intestinal obstruída ocorre de modo

progressivo. O movimento de líquidos entre a luz

intestinal e o sangue ocorre de duas maneiras: ab-

sorção (movimento de líquido da luz intestinal para

o sangue) e secreção (movimento de líquido do

sangue para a luz intestinal). Após 48 horas de obs-

trução intestinal, o movimento de líquido é predo-

minantemente do sangue para a luz intestinal, au-

mentando muito a quantidade de líquido no intes-

tino obstruído. O mesmo fenômeno acontece com

o sódio e o potássio. A composição do líquido acu-

mulado na luz intestinal é semelhante à do plasma.

O principal componente do acúmulo de líquido na

alça intestinal obstruída é o aumento de secreção.

Acredita-se que a distensão abdominal aumenta a

secreção de prostaglandina, que, por sua vez, pro-

duz um aumento na secreção intestinal. O segmen-

to proximal à obstrução fica repleto de líquido e

eletrólitos, o que provoca mais distensão e compro-

mete a circulação. Esse conteúdo caminha em sen-

tido proximal, chegando a segmentos intestinais

que ainda possuem a capacidade absortiva. Caso a

obstrução não se resolva, esses segmentos proximais

também ficam distendidos e com a circulação e a

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absorção comprometidas. Esse processo pode com-

prometer todo o intestino proximal à obstrução.

Outro local de perda de líquidos e eletrólitos é a

parede do intestino obstruído. A parede intestinal

pode ficar bastante edemaciada a ponto de perder

líquido através da serosa para a cavidade perito-

neal. A quantidade de líquido e eletrólitos perdidos

na parede intestinal e na cavidade peritoneal de-

pende da extensão, da congestão venosa e edema

e do tempo de obstrução. A perda mais óbvia de lí-

quidos e eletrólitos é através do vômito ou do dé-

bito da sonda nasogástrica. A soma de todas essas

perdas depleta o fluido do espaço extracelular, pro-

duzindo hemoconcentração, hipovolemia, insufici-

ência renal, choque e morte, a não ser que o tra-

tamento seja instituído rapidamente.

O acúmulo de gás no interior do intestino cons-

titui um evento marcante na obstrução intestinal e

é responsável pela distensão, que faz parte do qua-

dro clínico da doença. O gás do intestino delgado

é composto de ar atmosférico, que, após ter sido

deglutido, foi acrescido de outros gases não encon-

trados no ar ambiente. A absorção do gás intestinal

depende da sua pressão parcial no intestino, no

plasma e no ar da respiração. O nitrogênio é pou-

co difundido, porque a sua pressão parcial é mui-

to semelhante nesses três locais. Já o dióxido de

carbono é muito difusível, porque a sua pressão

parcial é alta no intestino, intermediária no plasma

e baixa no ar. Por esse motivo, o dióxido de carbo-

no produzido no intestino contribui muito pouco

para a distensão intestinal.

Assim que a obstrução ocorre, o peristaltismo

intestinal aumenta como resposta do intestino a fim

de resolver a obstrução. Após algum tempo, o pe-

ristaltismo contínuo é substituído por períodos in-

termitentes de peristaltismo aumentado, intercala-

dos com períodos de acalmia. Os períodos de acal-

mia variam de acordo com o nível da obstrução.

Em geral, esses períodos são de três a quatro mi-

nutos na obstrução alta e de dez a 15 minutos na

obstrução intestinal distal ao nível do íleo terminal.

O peristaltismo aumentado pode ser violento o bas-

tante a ponto de traumatizar o intestino e provo-

car mais edema. A distensão intestinal proximal à

obstrução provoca uma inibição do peristaltismo

distal a ela.

OBSTRUÇÃO COM ESTRANGULAMENTO

Denomina-se obstrução com estrangulamento a

obstrução intestinal associada ao comprometimento

da irrigação sangüínea. A compressão dos vasos do

mesentério é a causa da interrupção do suprimen-

to de sangue ao intestino, acarretando isquemia e

necrose. Essa situação é mais freqüente na obstru-

ção por aderências, hérnias ou volvo. À compressão

das veias e à dificuldade do retorno venoso soma-

se o problema do acúmulo de líquido e gás já des-

crito, levando a pequenos sangramentos na luz in-

testinal e na parede das alças. O segmento de in-

testino necrosado libera substâncias tóxicas na ca-

vidade peritoneal e na luz do intestino. Os fatores

que mais interferem na fisiopatologia da obstrução

com estrangulamento são os seguintes: o conteú-

do da alça obstruída é tóxico; as bactérias aí pre-

sentes são importantes para a produção dessas to-

xinas; os segmentos de intestino que não estão ne-

crosados não participam na formação dessas toxi-

nas; as toxinas não passam através de mucosa nor-

mal; a absorção das toxinas é mais importante do

que a sua produção; e os sintomas podem estar

correlacionados com a formação dessas toxinas.

OBSTRUÇÃO EM ALÇA FECHADA

Quando uma alça intestinal encontra-se obs-

truída simultaneamente nas extremidades proximal

e distal, caracteriza-se uma obstrução em alça fe-

chada. A obstrução em alça fechada pode progredir

rapidamente para o estrangulamento. A interrupção

do suprimento sangüíneo pode ocorrer pela mesma

causa que provocou a obstrução em alça fechada

(aderências, hérnia ou volvo), ou simplesmente pela

grande distensão da alça obstruída. A pressão no in-

terior da alça obstruída pode atingir níveis iguais ao

do sistema venoso, interrompendo o fluxo de sangue

nas veias e aumentado o edema intestinal.

ÍLEO PARALÍTICO

O íleo paralítico pode apresentar-se sob três

formas: o íleo adinâmico, o íleo espástico e o íleo

da oclusão vascular. O íleo adinâmico é o mais co-

mum e costuma ocorrer após cirurgias abdominais.

A fisiopatologia do íleo adinâmico não está comple-

tamente esclarecida, porém parece envolver o com-

prometimento da resposta neuro-hormonal relacio-

nada ao intestino. A recuperação da motilidade in-

testinal no período pós-operatório de cirurgia

abdominal é diferente nos vários segmentos do tra-

to gastrointestinal. O intestino delgado recupera sua

motilidade em aproximadamente 24 horas, o estô-

mago, em 48 horas e o intestino grosso, em três a

cinco dias. Além da cirurgia abdominal, outras cau-

sas de inibição da motilidade intestinal são as in-

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flamações peritoneais, como a apendicite e a pan-

creatite aguda, as patologias que envolvem o retro-

peritônio, como a cólica ureteral, o hematoma re-

troperitoneal ou a fratura de coluna, as lesões to-

rácicas, como a pneumonia de base do pulmão, ou

as fraturas de costelas e as causas sistêmicas, como

a toxemia grave, a hiponatremia e a hipocalemia,

ou a hipomagnesemia. Drogas como a morfina, a

propantelina, os antiácidos, os anticoagulantes, as

fenotiazinas e os agentes bloqueadores gangliona-

res também podem provocar íleo adinâmico.

O íleo espástico não é comum, porém surge em

conseqüência de uma hiper-reatividade do intesti-

no. Pode ocorrer na intoxicação por metais pesados,

na porfiria e, às vezes, quando existe uremia.

O íleo com oclusão vascular caracteriza-se por

uma incapacidade de coordenação da motilidade

intestinal, em conseqüência da morte celular resul-

tante da isquemia.

QUADRO CLÍNICO

ANAMNESE

Nesse tipo de abdome agudo, a dor é em cóli-

ca e difusa em todo o abdome. Além da cólica, o

paciente apresenta distensão abdominal, que é

mais intensa quanto mais distal for a obstrução no

trato digestivo. Apresenta, ainda, parada de elimi-

nação de gases e fezes, náuseas e vômitos conse-

qüentes à obstrução. Como vimos, pode-se classi-

ficar o abdome agudo obstrutivo em alto ou baixo,

e a caracterização desses tipos é feita pelos aspec-

tos clínicos do paciente e não exatamente pelo local

da obstrução. Assim, na obstrução alta, as náuseas e

os vômitos precedem a parada de eliminação de

gases e fezes, pois o paciente continua a eliminar o

conteúdo intestinal a jusante do obstáculo. Já na

obstrução baixa, a parada de eliminação de gases

e fezes precede os vômitos, pois esses só acontecem

quando todo o intestino delgado a montante da

obstrução estiver distendido. A distensão abdomi-

nal é maior quanto mais baixo for o bloqueio.

Quanto à distensão, ela pode ser simétrica ou as-

simétrica. Na obstrução do colo esquerdo, se a vál-

vula ileocecal for continente, teremos a distensão

somente do colo, determinando um abaulamento

assimétrico do abdome. Se, no entanto, a válvula

ileocecal for incontinente, a distensão será univer-

sal e, portanto, o abaulamento abdominal será si-

métrico. O abdome agudo obstrutivo pode ser, ain-

da, complicado ou não-complicado, na dependên-

cia de a obstrução ter determinado (ou não) isque-

mia e/ou perfuração de víscera intraperitoneal.

EXAME FÍSICO GERAL

• Alteração do estado geral;

• Desidratação, fundamentalmente, devida aos

vômitos e ao seqüestro de líquidos nas alças in-

testinais; os vômitos podem acarretar, além da

perda líquida, perda hidroeletrolítica, determi-

nando, às vezes, alcalose hipocalêmica;

• Taquisfigmia, devida à desidratação;

• Geralmente, o quadro não é acompanhado de

febre; ela aparece quando temos uma complica-

ção do quadro (peritonite bacteriana);

• Hipotensão arterial pode estar presente em qua-

dros prolongados.

EXAME FÍSICO ABDOMINAL

• Distensão abdominal (simétrica ou assimétrica);

• Discreto desconforto à palpação, não caracteri-

zando sinais de irritação peritoneal, a não ser

quando há complicação do quadro;

• Ruídos hidroaéreos aumentados em número e

com alteração do timbre (timbre metálico); com

o evoluir do processo e, portanto, com a isque-

mia da alça intestinal envolvida, os ruídos ten-

dem a diminuir e, até, se tornar ausentes.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO

O diagnóstico da obstrução intestinal é feito

essencialmente com os dados da anamnese e do

exame físico e, geralmente, auxiliado pelos métodos

de imagem. O método de imagem mais freqüente-

mente usado é a radiografia simples do abdome,

realizada com o doente em posição de pé e deita-

do. Mais raramente, pode-se lançar mão de estu-

dos especiais, tais como o estudo contrastado do

trato gastrointestinal, a ultra-sonografia e a tomo-

grafia computadorizada.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

Aconselha-se realizar a dosagem da concentra-

ção sérica de eletrólitos, a dosagem do hematócri-

to, da creatinina, o estudo da coagulação e a do-

sagem de plaquetas e leucócitos, que são úteis para

se determinar a gravidade do quadro clínico e ori-

entar a reanimação do doente. Na suspeita de íleo

paralítico, a dosagem de eletrólitos séricos pode

contribuir para o esclarecimento diagnóstico.

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DIAGNÓSTICO POR IMAGEM

INTRODUÇÃO

Os sinais encontrados nas diversas modalidades

de imagem correlacionam-se com a fisiopatologia

da obstrução intestinal: acúmulo de fluido e eletró-

litos acima do ponto de obstrução, diminuição da

absorção pela mucosa e aumento da secreção para

a luz. Se a distensão for exagerada, como no caso

de obstrução em alça fechada, pode ocorrer isque-

mia e necrose da parede da alça. A maioria das

obstruções (80%) é decorrente de obstrução mecâ-

nica no delgado, sendo em 80% das vezes secun-

dárias a bridas ou aderências. Por outro lado, as

causas mais freqüentes de obstrução colônica são o

carcinoma, o volvo de sigmóide e a diverticulite, e

aderências respondem por apenas 4% das causas

de obstrução mecânica.

As quatro perguntas que precisam ser respon-

didas em pacientes com suspeita de abdome agu-

do obstrutivo são:

1. Existe obstrução?;

2. Qual o seu nível da obstrução?;

3. Qual é a causa da obstrução? e;

4. Existem sinais de estrangulamento ou isquemia?

Os diversos métodos de diagnóstico por ima-

gem são utilizados nesse sentido, principalmente a

radiografia simples do abdome e a tomografia

computadorizada.

RADIOGRAFIA SIMPLES DO ABDOME

A radiografia simples do abdome continua sen-

do a principal ferramenta para o diagnóstico do

abdome agudo obstrutivo (AAO). Freqüentemente,

é o primeiro, senão o único, método utilizado, ape-

sar da introdução de métodos seccionais de diag-

nóstico por imagem, como a ultra-sonografia (US)

e a tomografia computadorizada (TC). Nesse sen-

tido, é indispensável realizar todas as radiografias

preconizadas para o estudo do abdome agudo (ver

Capítulo 1).

Apesar de muito utilizada, a radiografia simples

do abdome para obstrução de intestino delgado

apresenta uma eficácia global que não ultrapassa

50 a 60%, tendendo a diagnosticar mais casos de

obstrução do que o número real, quando compara-

dos à laparotomia (padrão-ouro). No entanto,

quando há sinais claros de obstrução, a radiogra-

fia simples do abdome pode indicar o ponto da

obstrução em cerca de 80% dos casos. Os casos

duvidosos (cerca de 20 a 30%) podem ser reavalia-

dos com radiografias seriadas, aumentando assim a

eficácia do método. As obstruções proximais até a

metade do intestino delgado tendem a evidenciar

níveis de líquido predominantemente no quadrante

superior esquerdo (Fig. 8.1). Um número maior de

alças dilatadas com níveis de líquido, arranjadas ao

longo da raiz do mesentério, pode indicar obstru-

ção no delgado distal ou no ceco. É de extrema im-

portância a demonstração de sinais de obstrução e

sofrimento de alça, como pregas edemaciadas,

pneumatose intestinal e, eventualmente, gás na

veia porta, sugerindo obstrução em alça fechada e

pior prognóstico.

Os padrões anormais de distribuição de gás

variam conforme o ponto, o grau, o tempo de obs-

trução, a freqüência de vômitos e a presença de

sonda nasogástrica. Na obstrução gástrica, pode-

mos observar o deslocamento inferior do colo trans-

verso por um contorno com densidade de partes

moles, devido à distensão gástrica com líquido em

seu interior. Além disso, uma pequena quantidade de

gás quase sempre está presente, mesmo com o estô-

mago muito dilatado. Portanto, se obtivermos uma

radiografia em decúbito lateral direito, podemos

confirmar, pelo deslocamento do gás, que a densida-

de de partes moles que desloca o colo transverso in-

feriormente trata-se de líquido no interior do estô-

mago. O local mais comum de obstrução gástrica

é a região antro-piloro-duodenal (Fig. 8.2).

Nem sempre a distensão gástrica é resultado de

uma obstrução mecânica: alterações metabólicas

ou induzidas por drogas podem alterar a peristal-

se do estômago. Pacientes com diabetes crônico

podem apresentar atonia gástrica (gastroparesia

diabética), um sinal de neuropatia diabética qua-

se sempre associado à neuropatia periférica. Outras

causas de dilatação gástrica incluem uso de morfi-

na, uremia, hipocalemia, intoxicação por chumbo

e vagotomia prévia.

IMAGEMIoná GrossmanGiuseppe D’Hipolitto

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Fig. 8.1 — Oclusão intestinal por bridas. Ra-

diografia do abdome em anteroposterior, or-

tostática. Doente com oclusão intestinal por

bridas pós-operatórias (gastrectomia subtotal

há oito anos). O quadro clínico era de cólicas

e parada da eliminação de gases e fezes há

24 horas. Observam-se alças do delgado mui-

to distendidas (pontas de seta brancas), com

calibre superior a 3cm. As alças são longas e

contínuas com níveis de líquido de diferentes

alturas na mesma alça (setas brancas). Não

há gás no intestino grosso.

Fig. 8.2 — Obstrução antro-piloro-duodenal.

Radiografia do abdome em anteroposterior,

ortostática. Observa-se distensão da câmara

gástrica (Est) e nível de líquido (seta negra). O

colo transverso está deslocado para baixo

(ponta de seta negra). Trata-se de um doente

com estenose da região antro-piloro-duodenal

por adenocarcinoma.

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A obstrução do intestino delgado é responsável

por 80% das causas de AAO e é, com certa fre-

qüência, de difícil diagnóstico pela radiografia sim-

ples do abdome. Pode ser de causa extrínseca, in-

trínseca ou intraluminal.

Exemplos de causas extrínsecas são as adesões

ou bridas, as hérnias externas e internas, massas

abdominais extraluminais tumorais (linfoma, me-

tástases peritoneais, tumores mesenteriais) e mas-

sas extraluminais não-tumorais (diverticulite, doen-

ça de Crohn, aneurisma, hematoma e endometri-

ose). A maioria das obstruções do intestino delga-

do é causada por aderências pós-operatórias tar-

dias ou recentes e que podem ocorrer a partir do 3o

ao 5o

dia pós-operatório. As bridas representam

cerca de 60% das obstruções do intestino delgado,

sendo que mais de 80% destas são decorrentes de

cirurgias prévias, 15% de processos inflamatórios

(Fig. 8.3A, B e C) e as demais são congênitas ou de

causa indeterminada.

Fig. 8.3 — Distensão do delgado por processo

inflamatório na fossa ilíaca direita (apendicite).

Tomografia helicoidal sem contraste. A. O corte

efetuado na altura da bacia mostra imagem de

apendicolito (seta branca), demonstrada como

imagem ovóide de densidade cálcica. Há alças

de delgado dilatadas com conteúdo líquido. B.

Corte no nível da bacia, 3cm acima do corte da

figura anterior. Observa-se região com densida-

de elevada pela presença de processo inflama-

tório periapendicular (pontas de seta brancas).

Há alças de delgado dilatadas (del). C. Corte

efetuado no mesogástrio. Observam-se alças de

delgado dilatadas, com mais de 3cm de diâme-

tro (del) preenchendo toda a cavidade abdomi-

nal. Nota-se um nível de líquido (ponta de seta

branca). O colo ascendente está colabado (as-

terisco branco).

A

B

C

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Radiologicamente, a característica mais impor-

tante na obstrução por bridas é a mudança súbita

do calibre da alça vista no exame contrastado (ou

tomografia), estando muito dilatada proximalmen-

te à obstrução e colabada distalmente a esta. Na

ausência de história cirúrgica, deve-se suspeitar de

uma hérnia obstrutiva, e 95% delas são externas (in-

guinal, femoral, umbilical ou incisional). A presença

de alça com gás abaixo dos ramos púbicos sugere

hérnia inguinal como causa da obstrução.

São causas intrínsecas de obstrução intestinal

os tumores e processos inflamatórios envolvendo a

própria parede intestinal, como o adenocarcinoma,

o tumor carcinóide, o linfoma, a doença de Crohn

(Fig. 8.4), a tuberculose, a gastroenterite eosinofí-

lica, a isquemia, a enterite actínica, o hematoma

da parede e a invaginação (Fig. 8.5). Esta última

enquadra-se nessa categoria porque usualmente

apresenta uma causa intrínseca, como hipertrofia

do tecido linfóide intestinal ou pólipos, denomina-

dos “cabeça da invaginação”.

Entre as causas intraluminais destacam-se íleo

biliar (Fig. 8.6), bezoar, corpo estranho, áscaris e

mecônio. Radiograficamente, o íleo biliar caracte-

riza-se por gás na via biliar, obstrução intestinal e

pela presença de um cálculo radiopaco entremea-

do com gás intestinal, na alça obstruída. O conjun-

to desses sinais é denominado tríade de Rigler e foi

descrito na radiografia convencional. À medida que

o cálculo progride no intestino, aderem-se sedimen-

tos do conteúdo intestinal, fazendo com que o cál-

culo aumente em diâmetro. A maioria dos cálculos

obstrutivos mede mais de 2,5cm de diâmetro. A

tomografia é um excelente método para o diagnós-

tico, permitindo identificar com precisão os sinais

radiológicos antes citados. A ultra-sonografia pode

sugerir o diagnóstico quando se detecta ar na vesí-

cula biliar e distensão de alças de intestino delgado.

A diferenciação entre obstrução mecânica e íleo

adinâmico é, muitas vezes, necessária, e pode não

ser possível pela radiografia simples. No entanto,

alguns sinais radiográficos podem auxiliar na sua

distinção. Por exemplo, o grau de dilatação das al-

ças tende a ser maior em pacientes com obstrução

mecânica do que nos com íleo adinâmico. A disten-

são intestinal é geralmente progressiva na obstru-

Fig. 8.4 — Apresentação da fase es-

tenosante da doença de Crohn, le-

vando à distensão do delgado.

Radiografia do abdome em antero-

posterior obtida durante exame de

trânsito intestinal em paciente com

quadro clínico de semi-oclusão. A ra-

diografia mostra o contraste preen-

chendo o intestino delgado (del) e

também o ceco (ponta de seta negra)

e o colo ascendente (seta negra).

Uma alça do íleo distal aparece com

longa estenose e alterações no rele-

vo mucoso (setas brancas). Há sinais

de compressão extrínseca tanto da

alça estenosada quanto de alças

próximas (pontas de seta brancas)

pelo aumento da gordura adjacente

ou pela presença de abscessos.

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Fig. 8.5 — Suboclusão em doen-

te com invaginação. Radiografia

do abdome em anteroposterior

de trânsito intestinal com o con-

traste preenchendo todo o colo,

delgado e delgado terminal (del),

em doente com quadro clínico de

oclusões intestinais recidivantes. A

etiologia dos surtos de oclusão era

invaginação íleo-ceco-transverso,

sem causa definida aparente. A

alça de delgado invaginante (setas

brancas) é longa e afilada. O seg-

mento do transverso que envolve

a porção invaginada é claramen-

te demonstrado (pontas de seta

negras).

Fig. 8.6 — Íleo biliar. Corte de tomografia helicoidal realizado no nível do fígado (Fig)

e do baço (Bc) após a administração do contraste oral. Essa imagem mostra a vesícula

biliar (seta branca) com gás e contraste (ponta de seta negra) em seu interior. Alças de

delgado com sinais discretos de dilatação (seta negra) estão contrastadas.

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ção mecânica e os níveis de líquido tendem a ser

mais evidentes, bem como um padrão de “empi-

lhamento de moedas” que caracteriza o espessa-

mento das válvulas coniventes. O espessamento da

parede intestinal, caracterizado ao exame radioló-

gico simples pelo afastamento de alças contíguas, é

também um sinal que favorece o diagnóstico de

obstrução mecânica. É importante lembrar que

com freqüência nota-se uma distensão difusa das

alças do delgado e do colo no íleo adinâmico.

A principal causa de obstrução colônica são os

adenocarcinomas primários do colo, responsáveis

por cerca de 55% dos casos. O local mais provável

de obstrução tumoral nos colos é o sigmóide, por

ser a porção mais estreita e onde as fezes são mais

sólidas. Na radiografia simples, nota-se uma dila-

tação gasosa das alças proximais à obstrução e

uma pobreza ou ausência de gás no colo distal ou

reto (Fig. 8.7). O enema baritado com simples con-

traste pode ser realizado e, muitas vezes, é sufici-

ente para confirmar a presença e a causa da obs-

trução (Fig. 8.8). A tomografia e a ressonância

magnética, por sua vez, são os melhores métodos

para estadiamento da doença, na presença de neo-

plasia colorretal. A presença de gás no intestino del-

gado é variável nessa situação, de acordo com a

competência da válvula ileocecal. Se a válvula for

incompetente, permitirá o refluxo de gás para o in-

testino delgado, podendo produzir sinais radiográ-

ficos semelhantes àqueles de obstrução do delgado.

A perfuração colônica é uma possível complica-

ção da obstrução do intestino grosso, ocorrendo em

cerca de 7% dos casos, e mantém relação com o

grau de dilatação. Pode ocorrer no local da obstru-

ção ou proximalmente no local mais dilatado (ge-

ralmente o ceco), devido a alterações isquêmicas na

parede da alça. Alguns autores referem que o diâ-

metro de 9 a 12cm sugere risco iminente de perfu-

ração do ceco. Deve-se, contudo, considerar o fe-

nômeno de magnificação, particularmente em pa-

cientes em posição supina e a correlação clínica.

Radiografias seriadas com intervalos de 12 a 24

horas podem ser de maior valor, caso evidenciem

dilatações progressivas.

Fig. 8.7 — Obstrução baixa por adenocarci-

noma de sigmóide. Radiografia do abdome

em anteroposterior, decúbito dorsal. Obser-

va-se dilatação acentuada do ceco/ascen-

dente (seta branca) e do transverso (ponta de

seta branca). O reto contém pequena quan-

tidade de gás (ponta de seta negra).

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Assim como no intestino delgado, a obstrução

colônica precisa ser diferenciada da dilatação não-

obstrutiva (ou pseudo-obstrução). Essa condição é

conhecida por síndrome de Ogilvie, por quem foi

descrita, e está associada a diversas condições clí-

nicas, como inflamação intra-abdominal, queima-

duras, gravidez, pós-parto vaginal ou cesariana.

Acredita-se que sua fisiopatologia esteja ligada a

um desequilíbrio na inervação simpática e paras-

simpática. As radiografias também mostram acen-

tuada distensão colônica, geralmente restrita à

metade direita (ceco, ascendente e metade direita

do colo transverso).

O megacolo tóxico caracteriza-se por sintomas

infecciosos em um paciente com o colo muito di-

latado à radiografia. Tradicionalmente, está asso-

ciado à colite ulcerativa, mas pode ocorrer em ou-

tras situações (colite granulomatosa, amebíase,

colite pseudomembranosa). Radiograficamente, é

importante enfocar não só o grau de dilatação

colônica (principalmente do colo transverso e as-

cendente), como também a presença ou não de

pneumoperitônio.

A segunda causa mais comum de obstrução do

intestino grosso é a torção ou volvo, responsável por

cerca de 12% dos casos. Cerca de 60% a 75% dos

vôlvulos colônicos envolvem o colo sigmóide, 4%, o

colo transverso e 2% a 3%, o ceco. A radiografia sim-

ples é diagnóstica na maioria (75%) dos casos de

volvos do sigmóide: a alça dilatada preenchida por

gás pode assumir a configuração típica de um grão

de café gigante ou “U” invertido, sem haustrações,

que se estende até a porção superior do abdome

(Fig. 8.9). A persistência dessa condição pode sugerir

a possibilidade de obstrução em alça fechada com

comprometimento vascular, caracterizada pela ra-

diografia por espessamento da parede da alça, es-

vaecimento das plicas circulares e preenchimento do

segmento obstruído por fluido, formando uma den-

sidade arredondada de partes moles em contato

com a gordura intra-abdominal. No volvo de colo

transverso, a radiografia simples mostra a ima-

gem de “grão de café” no hemi-abdome superior

(Fig. 8.10A e B). Um enema com bário pode con-

firmar o diagnóstico (Fig. 8.10C). O termo vol-

Fig. 8.8 — Radiografia do abdome em antero-

posterior obtida durante a realização de enema

baritado com simples contraste, do mesmo do-

ente da Fig. 8.9, mostrando a clássica imagem

de “maçã mordida” do carcinoma anular este-

nosante do sigmóide.

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vo do ceco refere-se a uma rotação do ceco no seu

eixo axial, com uma dobra do colo direito, fazen-

do com que o ceco localize-se no mesogástrio ou

quadrante superior esquerdo. A radiografia simples

é diagnóstica em 75% dos casos de volvo cecal,

evidenciando uma alça de ceco dilatada, preenchi-

da por gás, em localização ectópica.

A terceira causa de obstrução do intestino gros-

so é a diverticulite, responsável por cerca de 10%

dos casos. O melhor exame nesses casos é a tomo-

grafia computadorizada, pois, além de confirmar o

diagnóstico, fornece informações a respeito das

possíveis complicações, como obstrução e coleções

pericolônicas.

RADIOGRAFIA CONTRASTADA DO

ABDOME

O trânsito intestinal com bário ou iodo e o ene-

ma opaco são exames contrastados que podem ser

utilizados na investigação diagnóstica do AAO.

Quando planejamos utilizar estudos contrastados

com bário, devemos estar atentos para o provável

nível de obstrução (através de radiografias simples

do abdome) e iniciar a investigação por um enema

opaco, caso a obstrução seja baixa, ou trânsito in-

testinal, no caso de obstruções altas. O estudo com

bário é seguro nessas situações. No entanto, o cirur-

gião pode não querer alças dilatadas preenchidas

com bário se tiver que realizar uma laparotomia

logo em seguida ao exame radiológico. O trânsito

intestinal está contra-indicado no AAO quando

existe suspeita de perfuração intestinal, estrangula-

mento e sofrimento de alça, obstrução mecânica de

longa evolução ou íleo adinâmico. Nessas situações,

e de uma maneira geral, os exames contrastados

podem e devem ser substituídos por estudos tomo-

gráficos (TC), quando disponíveis. Apesar de os

custos dos exames contrastados serem inferiores aos

da TC, esse método apresenta maior eficácia e ra-

pidez no diagnóstico do AAO e na definição da sua

causa, tendo sido utilizado como principal alterna-

tiva complementar a radiografia simples do abdo-

me nesse grupo de pacientes.

Fig. 8.9 — Volvo do sigmóide.

Radiografia do abdome em an-

teroposterior, decúbito dorsal,

em doente com quadro clínico

de oclusões intestinais recidivan-

tes. Observa-se dilatação do

colo sigmóide (seta branca)

com aspecto de “grão de café”.

A ponta de seta branca aponta

as paredes da alça de flexão.

Proximalmente ao volvo, o colo

apresenta-se distendido (seta

negra).

. 123 .© Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA

Fig. 8.10 — Volvo do colo transver-

so. A. Radiografia do abdome em

anteroposterior, decúbito dorsal. Ob-

serva-se a clássica imagem do “grão

de café” no epigástrio, que significa

alça do intestino grosso torcida sobre

si mesma. A alça torcida está disten-

dida (setas brancas), se mostradas as

paredes da alça de flexão (ponta de

seta branca). B. Radiografia do ab-

dome em perfil, ortostática. Observa-

se acentuada elevação das cúpulas

diafragmáticas (setas negras). A alça

de transverso torcida está muito dis-

tendida (seta branca). C. Enema ba-

ritado no volvo do colo transverso. O

contraste preenche o reto (R) e o

colo transverso (CTr), com aspecto

normal. O ponto de torção está as-

sinalado pela seta branca. Uma

pequena quantidade de contraste ul-

trapassa a torção (ponta de seta

branca).

A B

C

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No trânsito intestinal, é possível identificar al-

ças intestinais dilatadas, com diluição e lentidão da

progressão do meio de contraste, mudança abrupta

de calibre e espessamento do relevo mucoso. Radio-

grafias seriadas são realizadas no sentido de se al-

cançar o ponto de obstrução que pode ser alcança-

do somente após algumas horas de exame. A iden-

tificação desse ponto é crucial para definir não so-

mente o nível da obstrução mas também a sua

causa, a partir da análise dos contornos da alça

intestinal ocluída. Nos casos de brida ou aderência,

como causa da obstrução os contornos da extremi-

dade da alça são regulares, afilando-se progressiva-

mente. Na obstrução de causa neoplásica, nota-se

irregularidade e assimetria dos contornos, com efei-

to de massa.

Na suspeita de obstrução colônica, o enema

opaco permite não somente identificar rapidamente

e com precisão o ponto de obstrução como também

diferenciar as três principais causas de oclusão bai-

xa. Em pacientes portadores de câncer colorretal,

é possível identificar lesão estenosante, de início

abrupto e eventualmente com o típico aspecto em

“mordida de maçã”. A diverticulite aguda, por sua

vez, caracteriza-se por segmento espástico, com

espessamento regular de mucosa e presença de di-

vertículos. Finalmente, o vôlvulo de sigmóide é fa-

cilmente diagnosticado pela rotação da alça sobre

o seu eixo.

O trânsito intestinal com duplo contraste (ou

enteróclise) tem sido muito pouco utilizado em nos-

so meio. Mesmo em países onde esse método diag-

nóstico é mais difundido, tem sido substituído pela

TC na avaliação de pacientes com suspeita de AAO.

A enteróclise apresenta as mesmas contra-indica-

ções do trânsito intestinal convencional, com o

agravante de ser mais incômoda para o paciente,

pela necessidade de intubação gastrointestinal e por

requerer material específico e pessoal treinado, nem

sempre disponíveis.

ULTRA-SONOGRAFIA

A ultra-sonografia tem sido utilizada na avalia-

ção de pacientes com AAO, geralmente combinada

ao exame radiológico simples, com o intuito de dis-

tinguir um íleo paralítico de um quadro obstrutivo.

Nesses pacientes, a US permite identificar alças

intestinais distendidas, com níveis de líquido e au-

mento do peristaltismo. A US é também útil para

distinguir alças dilatadas de intestino delgado de

intestino grosso, através da identificação das vál-

vulas coniventes. Uma das principais vantagens da

ultra-sonografia é a demonstração da presença ou

não de peristalse em alças preenchidas por líquido

e avaliação da espessura da sua parede. A combi-

nação de peristalse, distensão com conteúdo líquido

e espessamento da parede sugere o diagnóstico de

infarto da parede intestinal.

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA

A TC tem sido cada vez mais utilizada na ava-

liação de pacientes com suspeita de abdome agu-

do e particularmente de AAO. As principais razões

pelo crescente interesse desse método no AAO são:

a) na TC, não há necessidade de administração de

meio de contraste intraluminal, pois o fluido retido

serve com agente de contraste (observar Fig. 8.3A,

B e C), os pacientes obstruídos têm muita dificul-

dade em ingerir quantidade suficiente de contras-

te e freqüentemente vomitam; b) a qualidade diag-

nóstica do exame independe da propulsão do con-

teúdo pela peristalse do intestino delgado, muitas

vezes diminuída ou ausente, fato esse que reduz

consideravelmente o tempo de exame, quando

comparado ao trânsito intestinal; c) não é adminis-

trado bário, portanto o exame pode ser realizado

com segurança mesmo na suspeita de perfuração e

imediatamente antes de intervenções cirúrgicas; d)

a TC permite uma avaliação panorâmica de toda

a cavidade abdominal e diagnósticos alternativos e;

e) a TC é o melhor método para o diagnóstico de

estrangulamento de alça intestinal, fornecendo in-

formações a respeito da perfusão da parede da alça

e de sua vitalidade, através do uso endovenoso de

contraste.

Os principais sinais tomográficos de obstrução

intestinal são a distensão de alças de delgado (aci-

ma de 2,5 a 3cm de diâmetro), presença de níveis

líquido e desproporção do calibre da alça, se iden-

tificados segmentos de fino calibre. Dessa forma, é

possível estabelecer o nível da obstrução e sua cau-

sa. A eficácia da TC no diagnóstico de AAO de grau

variado oscila entre 75 e 95%, com melhores resul-

tados nas oclusões completas. A TC é também útil

na diferenciação de oclusão mecânica e íleo adinâ-

mico. Nesse último caso, é possível identificar dila-

tação global de alças intestinais, sem desproporção

de calibre ou pontos de obstrução.

As hérnias internas (paraduodenal e mesentéri-

ca) são causas incomuns de obstrução intestinal e

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são raramente suspeitadas pela radiografia simples.

Elas geralmente ocorrem em pacientes com má

rotação do intestino delgado e colo em situação

usual. Os sinais tomográficos são os de má rotação

do intestino delgado (caracterizada pela ausência

da porção horizontal do duodeno e posicionamen-

to anormal da veia mesentérica superior, em situa-

ção ventral e à esquerda da artéria mesentérica

superior), agrupamento de alças de delgado no

mesogástrio, uma espiral de vasos jejunais ao redor

e à direita da artéria e veia mesentérica superior,

na direção do jejuno encapsulado na região para-

duodenal direita. A tomografia também pode

mostrar o encapsulamento do jejuno atrás do pân-

creas ou entre o pâncreas e o estômago.

As hérnias externas, como as inguinais ou incisio-

nais, são diagnosticadas através da TC, pela identi-

ficação de alças intestinais encarceradas no canal

inguinal ou parede abdominal, com distensão de al-

ças intestinais a montante. Acompanhando o seu

trajeto, é possível diferenciar alças de delgado e colo.

De maneira semelhante, a obstrução intestinal

de origem tumoral é caracterizada pela identifica-

ção de massa geralmente com densidade de partes

moles, envolvendo um determinado segmento in-

testinal e levando à dilatação de alças proximais.

Na ausência de sinais de processo expansivo

infiltrando alças intestinais ou evidências de hérnias

na TC, deve-se considerar por exclusão bridas ou

aderências como causas da obstrução intestinal.

Finalmente, a TC com contraste endovenoso

permite diagnosticar isquemia e sofrimento de alça

através de sinais tomográficos como a hipoperfusão

ou realce persistente da parede intestinal, pneuma-

tose intestinal, espessamento segmentar parietal e

gás no sistema porta (sinal do aeroportograma,

também identificado à radiografia simples). Nesse

sentido, a TC é o método diagnóstico mais eficaz.

CLÍNICAGaspar de Jesus Lopes FilhoJosé Roberto Ferraro

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

As dificuldades do diagnóstico diferencial entre

outros processos abdominais agudos e a obstrução

intestinal só ocorrem quando o paciente é visto tar-

diamente, já instalada uma complicação. Nessa

fase, a dor é contínua, como na úlcera péptica per-

furada, na apendicite aguda ou na pancreatite

aguda, não se ouve peristaltismo e há defesa mus-

cular e sinais de peritonite, como nessas entidades.

Uma anamnese bem feita é a chave do diagnósti-

co diferencial.

É oportuno lembrar a pseudo-obstrução do in-

testino, que se caracteriza por ser uma doença que

apresenta manifestações de obstrução intestinal

sem lesão orgânica. Todo o trato gastrointestinal

pode ser comprometido, porém é muito freqüente

que haja predomínio em segmentos de intestino

delgado. Uma forma aguda de pseudo-obstrução

muito conhecida compromete o colo, sendo deno-

minada síndrome de Ogilvie. Na pseudo-obstrução

do intestino delgado, os sintomas podem ser inter-

mitentes, durando anos. Os sintomas mais comuns

são vômitos, dor abdominal e distensão abdomi-

nal. A pseudo-obstrução pode ser causada por mi-

opatia visceral hereditária. Outras condições, não

raro associadas à obstrução intestinal, porém sem

uma ação causal definida, são o diabete melito, o

hipotireoidismo, o feocromocitoma, o hipoparati-

reoidismo, a dermatomiosite, o lúpus eritematoso,

a distrofia miotônica, a doença de Parkinson, a es-

clerose múltipla e a amiloidose.

TRATAMENTO

CLÍNICO

Na fase inicial do tratamento da obstrução intes-

tinal, de maneira geral, a abordagem clínica se apli-

ca a todos os doentes. Uma vez firmado o diagnós-

tico, deve ser tomada a decisão de operar imediata-

mente ou continuar sob tratamento clínico.

Em alguns doentes, portadores de obstrução

mecânica parcial, o tratamento clínico apresenta

alto índice de sucesso e não possui morbidade sig-

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nificativa. Exemplos dessas situações são os doen-

tes portadores de aderências, doentes em período

pós-operatório imediato, doentes portadores de

doença intestinal inflamatória, enterite por irradia-

ção ou diverticulite, doentes com neoplasias avan-

çadas com carcinomatose peritoneal e crianças com

bolo da áscaris, entre outros.

O tratamento clínico inicia-se com a descom-

pressão gástrica, pela passagem de sonda nasogás-

trica, hidratação parenteral, correção de distúrbios

eletrolíticos, eventualmente presentes, e analgesia.

A nutrição parenteral pode ser iniciada, caso se

acredite que o doente não possa receber dieta en-

teral ou oral pelo menos nos cinco dias seguintes.

Admite-se que, quando indicado adequadamente,

o tratamento clínico pode obter sucesso em cerca

de 90% dos casos de obstrução parcial. Quando o

doente tem antecedentes de cirurgias abdominais

prévias e suspeita-se de obstrução por aderências,

o conhecimento do tipo de cirurgia realizada pode

auxiliar na conduta, pois se admite que a possibi-

lidade de sucesso com o tratamento clínico é me-

nor nas obstruções conseqüentes a alguns tipos de

procedimentos, como as cirurgias da aorta abdomi-

nal, cirurgias de anexos pélvicos, de apendicite e

para tratamento de obstrução por neoplasias. Nes-

ses doentes, deve-se considerar a possibilidade de

tratamento cirúrgico precoce. A ausência de melho-

ra clínica nas primeiras 12 horas é sugestiva de in-

sucesso do tratamento clínico e, depois de 48 ho-

ras de tratamento clínico sem resolução do quadro,

as chances de resolução sem cirurgia diminuem e o

índice de complicações aumenta consideravelmen-

te. Assim, em princípio, não havendo melhora, ou

havendo piora nas 12 horas iniciais de tratamento

clínico, deve-se considerar a conveniência de indi-

car o tratamento cirúrgico.

É geralmente difícil estabelecer o diagnóstico

diferencial entre íleo paralítico e obstrução intesti-

nal no pós-operatório precoce de cirurgias abdomi-

nais, pois os sintomas em ambos os casos são muito

semelhantes. A radiografia simples do abdome pode

contribuir para o diagnóstico, mas raramente os si-

nais radiológicos são conclusivos. O estudo do trân-

sito intestinal com contraste baritado é útil para a

diferenciação entre a obstrução mecânica e o íleo,

mas apresenta falhas em até 30% dos casos. A efi-

cácia da ultra-sonografia do abdome nesses casos

ainda não está determinada. A grande maioria (até

90%) das obstruções mecânicas no pós-operatório

precoce é causada por aderências, e as principais

indicações para a cirurgia nesses doentes são a

piora do estado clínico e dos sintomas de obstrução

e a não-resolução do quadro após duas semanas de

tratamento clínico.

CIRÚRGICO

Excetuando-se os casos de doentes terminais e

os que apresentam carcinomatose peritoneal, todos

os doentes com diagnóstico de obstrução intestinal

mecânica completa devem ser operados em condi-

ção de urgência. Outra indicação para a cirurgia de

urgência é o insucesso do tratamento clínico por

24 a 48 horas. O doente deve ser sempre avalia-

do e, quando necessário, reanimado adequada-

mente para suportar a cirurgia. Deve-se ter em

vista, entretanto, que a demora em realizar o tra-

tamento cirúrgico está relacionada a aumento im-

portante da morbidade, da mortalidade e do cus-

to de tratamento.

O tratamento cirúrgico inicialmente consiste em

laparotomia exploradora. Após a revisão da cavida-

de, com a finalidade de diminuir a distensão abdo-

minal, os líquidos acumulados na luz das alças de-

vem ser ordenhados para o estômago e aspirados

através da sonda nasogástrica. Essa manobra tem

o intuito de facilitar a abordagem da causa da obs-

trução e de evitar as lesões acidentais das alças que

se apresentam, muitas vezes, bastante dilatadas.

Dependendo da lesão, podem ser realizadas

enterotomias e colostomias proximais à obstrução.

Derivações internas, tais como gastroenterostomias

e ileotransversostomias ou ressecções intestinais,

também podem ser efetuadas para a remoção da

causa da obstrução. Outras manobras cirúrgicas

podem ser efetuadas, tais como lise de aderências,

correções de hérnias complicadas ou de intussus-

cepções intestinais.

Às vezes, durante o ato operatório, ocorrem dú-

vidas sobre a viabilidade de uma alça. Existem al-

gumas maneiras de avaliar essa viabilidade, tais

como o uso de fluoresceína, da transiluminação, do

azul de metileno ou do Doppler intra-operatório.

Na prática, nem sempre se dispõe desses recursos e,

nessas situações, pode-se tentar melhorar a viabi-

lidade de uma alça por meio da injeção de novo-

caína ou de papaverina na raiz do mesentério. Se

persistir a dúvida, é preferível optar pela ressecção

intestinal.

Nas obstruções intestinais por bridas, caso se

faça a incisão cirúrgica na parede abdominal sobre

a cicatriz da incisão antiga, aconselha-se o acesso

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à cavidade peritoneal, em local fora da cicatriz de

laparotomia prévia, bem como a liberação caute-

losa das alças intestinais e a análise crítica da in-

dicação da ressecção de segmentos longos de intes-

tino, diante do risco de possíveis ressecções em fu-

turas recidivas da obstrução intestinal.

É reconhecida a tendência apresentada por al-

guns doentes à formação repetida de aderências,

sempre que submetidos à laparotomia. No passa-

do, alguns autores descreveram técnicas que ti-

nham como objetivo evitar a formação de novas

aderências. Dentre essas técnicas podem ser citadas

a de Noble e a de Child-Philips. A técnica de No-

ble consiste na fixação das alças umas às outras,

por sutura seromuscular que as mantém em posi-

ção paralela entre si. A técnica de Child-Philips

consiste também em manter as alças paralelas en-

tre si, porém por meio de pontos em “U” transfi-

xantes do mesentério das alças. Outra opção des-

crita é a colocação de tubo longo intraluminar, fi-

xado com um balão insuflado no ceco, e exteriori-

zado, como se faz na jejunostomia, no delgado pro-

ximal e na pele. Essas técnicas possuem valor his-

tórico, mas não apresentaram bons resultados e,

por esse motivo, não têm sido muito utilizadas.

Em relação às hérnias complicadas, em princí-

pio, recomenda-se usar a via de acesso usual para

a herniorrafia correspondente, mesmo para os ca-

sos em que seja necessária a ressecção de alça, re-

correndo-se à laparotomia caso a incisão inicial se

mostre inadequada. Quando se realiza já de início

a laparotomia, é preferível fazer a herniorrafia por

inguinotomia (nas hérnias inguinais), evitando-se o

simples fechamento do saco herniário pela incisão

de laparotomia.

Nos casos de bolos de áscaris, a indicação de

laparotomia pressupõe o insucesso do tratamento

clínico e/ou presença de risco de sofrimento de alça.

Se a alça é viável, deve-se tentar malaxar os ver-

mes para o ceco, dispensando-se a enterotomia. Se

a malaxação é impossível ou se há sofrimento de

alça, deve-se malaxar os vermes para o interior

desta e ressecá-la. A simples enterotomia e remo-

ção dos vermes podem ser feitas em infestações li-

mitadas sem sofrimento de alça. A reconstituição

do trânsito é feita por sutura ou anastomose primá-

ria. Deve-se associar sempre o tratamento a um

vermífugo.

Em relação à intussuscepção intestinal, durante

a realização do enema baritado, o radiologista ex-

periente poderá obter, sob visão direta, a redução

de pequenas invaginações ileocólicas. Uma alça

necrosada poderá não dar sintomas típicos, por es-

tar contida no interior de uma alça íntegra. Na ci-

rurgia, deve-se optar pela ressecção imediata se

não houver evidências de necrose; caso contrário,

tenta-se apenas a desinvaginação, tracionando-se

delicadamente a alça invaginada e, simultanea-

mente, comprimindo a cabeça de invaginação; ha-

vendo insucesso, deve-se proceder à ressecção.

Havendo suspeita do diagnóstico de íleo biliar,

deve-se fazer a investigação apropriada da via bi-

liar pré-operatoriamente e prever a utilização de

exame radiológico da via biliar durante a cirurgia.

Na cirurgia, uma vez localizado, o cálculo é remo-

vido por enterotomia, feita preferencialmente em

alça menos comprometida pelo edema e/ou dilata-

ção. Geralmente, o cálculo é oriundo da vesícula,

sendo freqüente a presença de uma fístula colecis-

toentérica. Nesses casos, existe uma controvérsia a

respeito da realização do tratamento da doença

biliar nesse mesmo ato operatório. A maioria dos

autores recomenda a realização do tratamento si-

multâneo da doença biliar quando, após o trata-

mento da obstrução intestinal, o paciente apresenta

boas condições clínicas e a equipe cirúrgico-anes-

tésica considera que não haverá acréscimo de ris-

co operatório.

ELEMENTOS DE PROGNÓSTICOS

Com os recursos atuais de tratamento, a mor-

talidade dos doentes portadores de obstrução in-

testinal é menor do que 10%. As seqüelas mais im-

portantes que merecem consideração são a ocor-

rência de obstruções intestinais repetidas no mes-

mo doente e a síndrome do intestino curto.

A síndrome do intestino curto pode ser uma se-

qüela muito grave do tratamento da obstrução in-

testinal. O intestino pode ficar curto, devido a res-

secções intestinais repetidas em várias cirurgias rea-

lizadas para o tratamento da obstrução de repeti-

ção ou pode ser resultado de uma ressecção única,

porém extensa. Seja qual for a causa, o doente

apresenta grande dificuldade de absorção intesti-

nal, podendo desenvolver desnutrição importante

acompanhada de diarréia crônica ou de evacuações

freqüentes.

A obstrução de repetição que exige reopera-

ções freqüentes, em geral, ocorre por aderências.

Nesses doentes, talvez a insistência no tratamen-

to clínico diminuísse a necessidade de reopera-

ções, que costumam ser progressivamente mais

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difíceis e podem provocar lesões intestinais duran-

te a dissecção. Estas lesões podem exigir ressec-

ções ou suturas, aumentando as taxas de morbi-

dade e de mortalidade.

O ponto crucial do tratamento da obstrução

intestinal é a realização do diagnóstico preciso e

precoce, através da utilização de recursos simples,

como a anamnese, o exame físico e a radiografia

simples de abdome, deixando-se os recursos mais

sofisticados, tais como a tomografia computadori-

zada e o trânsito intestinal, apenas para os casos

mais complexos e em que persiste a dúvida quan-

to à presença ou não da obstrução. Uma vez feito

o diagnóstico de obstrução, deve-se tentar classifi-

car adequadamente o tipo de obstrução, para que

o melhor tratamento possa ser indicado pronta-

mente. Nos casos em que existe indicação de cirur-

gia por insucesso do tratamento clínico, a operação

deve ser realizada tão logo quanto possível. Para a

realização da intervenção cirúrgica, o doente deve

ser adequadamente preparado com hidratação e

reposição das perdas eletrolíticas, a fim de que ele

suporte a anestesia e a operação. A profilaxia an-

timicrobiana está sempre indicada e deverá ser

continuada ou não na dependência dos achados no

período intra-operatório. Todo segmento de intes-

tino inviável deve ser ressecado e, de preferência,

deve-se tentar restabelecer de imediato o trânsito

intestinal. Não sendo possível o restabelecimento do

trânsito, pode-se lançar mão da exteriorização do

intestino.

Finalmente, é importante que se entenda que

os quadros abdominais, muitas vezes, não se

apresentam de forma característica, o que faz

com que o diagnóstico seja mais difícil de ser feito

e, portanto, freqüentemente, o tratamento deve

ser retardado.

Algumas mensagens finais, verdadeiros aforis-

mos dos quadros abdominais agudos, merecem ser

lembradas:

1. Atende melhor um abdome agudo aquele que

mais vezes atendeu.

2. Não devemos medicar nenhum paciente com

dor abdominal que ainda não esteja esclare-

cida, sob pena de podermos estar contribuin-

do para o atraso do diagnóstico, e, com isso,

aumentando a morbidade e mortalidade do

paciente.

3. No atendimento à dor abdominal a esclarecer,

devemos fazer uso de duas armas fundamen-

tais, mais importantes que qualquer exame

subsidiário, que são:

• A observação clínica e

• O bom senso.

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