CAPÍTULO 1.1. Introdução -...

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CAPÍTULO 1 1.1. Introdução . A elaboração de um projeto de abastecimento de água exige o conhecimento das vazões de dimensionamento das diversas partes constitutivas do sistema. Por sua vez, a determinação dessas vazões implica no conhecimento da demanda de água na cidade, que é função: a) do número de habitantes a ser abastecido; b) da quantidade de água necessária a cada indivíduo. Os problemas de dimensionamento das canalizações, estruturas e equipamentos, implicam em estudos diversos que incluem a verificação do consumo médio por pessoa, a estimativa do número de habitantes a ser beneficiado e as variações de demanda, que ocorrem por motivos vários. 1.2. Usos da Água . A água conduzida para uma cidade enquadra-se numa das seguintes classes de consumo ou de destino: a — doméstico b — comercial ou industrial c — público d — perdas e fugas. 1.2. 1. Água para uso doméstico É a água consumida nas habitações e compreende as parcelas destinadas a fins higiênicos, potáveis e alimentares, e à lavagem em geral. Diversos autores efetuaram estudos sobre a quantidade necessária para esse fim. Estudos mais recentes apontam como representativos para as condições atuais os seguintes valores: Bebida e cozinha 10-20 litros/hab. dia Lavagem de roupa 10-20 Banhos e lavagens de mãos 25-55 Instalações sanitárias 15-25 Outros usos 15-30 Perdas e desperdícios 25-50 100-200 As vazões destinadas ao uso doméstico variam com o nível de vida da população, sendo tanto maiores, quanto mais elevado esse padrão. Nos Estados Unidos, costuma-se incluir nessa classificação a água utilizada para irrigação de jardins e gramados particulares, muito comuns naquele país. Essa parcela pode atingir uma quantidade apreciável, a ponto de ser admitida uma classificação especial. A lavagem de automóveis em casa, com o emprego de esguicho, é uma prática que está se

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CAPÍTULO 1 1.1. Introdução .

A elaboração de um projeto de abastecimento de água exige o conhecimento das vazões de dimensionamento das diversas partes constitutivas do sistema. Por sua vez, a determinação dessas vazões implica no conhecimento da demanda de água na cidade, que é função: a) do número de habitantes a ser abastecido; b) da quantidade de água necessária a cada indivíduo.

Os problemas de dimensionamento das canalizações, estruturas e equipamentos, implicam em estudos diversos que incluem a verificação do consumo médio por pessoa, a estimativa do número de habitantes a ser beneficiado e as variações de demanda, que ocorrem por motivos vários.

1.2. Usos da Água .

A água conduzida para uma cidade enquadra-se numa das seguintes classes de consumo ou de destino:

a — doméstico

b — comercial ou industrial

c — público

d — perdas e fugas.

1.2. 1. Água para uso doméstico

É a água consumida nas habitações e compreende as parcelas destinadas a fins higiênicos, potáveis e alimentares, e à lavagem em geral.

Diversos autores efetuaram estudos sobre a quantidade necessária para esse fim. Estudos mais recentes apontam como representativos para as condições atuais os seguintes valores:

Bebida e cozinha 10-20 litros/hab. dia

Lavagem de roupa 10-20

Banhos e lavagens de mãos 25-55

Instalações sanitárias 15-25

Outros usos 15-30

Perdas e desperdícios 25-50

100-200

As vazões destinadas ao uso doméstico variam com o nível de vida da população, sendo tanto maiores, quanto mais elevado esse padrão.

Nos Estados Unidos, costuma-se incluir nessa classificação a água utilizada para irrigação de jardins e gramados particulares, muito comuns naquele país. Essa parcela pode atingir uma quantidade apreciável, a ponto de ser admitida uma classificação especial.

A lavagem de automóveis em casa, com o emprego de esguicho, é uma prática que está se

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ampliando e merece um estudo, devido à influência que exerce no consumo doméstico.

1.2.2. Água para uso comercial ou industrial.

Com relação à água para uso comercial, destaca-se a parcela utilizada pelos restaurantes, bares, hotéis, pensões, postos de gasolina, e garagens, onde se manifesta um consumo muito superior ao das residências.

Quanto às indústrias, aquelas que utilizam a água como matéria prima ou para lavagens e refrigeração apresentam consumos mais elevados.

Em ambos os casos, é difícil conhecer a demanda provável numa cidade sem que seja feito um levantamento das necessidades de cada estabelecimento.

Conhecem-se valores médios de consumo relacionados a cada tipo de atividade, em função de unidades de produção ou de outros dados tomados como referência. A Tabela 1.1 indica alguns valores que poderão ser utilizados na previsão de consumo de estabelecimen tos comerciais e industriais.

QUADRO 1.1.

Consumo de água em alguns tipos de estabelecimentos comerciais e industriais

Natureza Consumo

Escritórios comerciais 50 1/pessoa .dia Restaurantes 25 1/refeição

Hotéis, pensões 120 l/hóspede . dia

(sem cozinha e sem lavanderia) Lavanderia 30 l/kg. roupa

Hospitais 250 l/leito.dia

Garagens 50 l/ automóvel, dia

Postos de serviço para veículos 150 l/veículo.dia

Indústrias (uso sanitário) 70 l/operário. dia

Matadouros - Animais de grande

porte

300 l/cabeça abatida

Matadouros - Animais de pequeno

porte

150 l/cabeça abatida

Laticínios 1.5 l/kg de produto

Curtumes 50- 60 l/kg de couro

Fábrica de papel 100-400 l/kg de papel

Tecelagem (sem alvejamento) 10 -20 l/kg de tecido

1.2.3. Água para uso público

Inclui-se nesta classificação a parcela de água utilizada na irrigação de jardins, lavagem de ruas e passeios, edifícios e sanitários de uso público, alimentação de fontes, esguichos e tanques fluxíveis de redes de esgoto.

1.3. Consumo médio per capita .

Numa cidade com sistema de água em funcionamento regular, obtém-se o valor do consumo médio "per capita", dividindo-se o volume total de água distribuída durante um ano, por 365, e pelo número de habitantes beneficiados. É expresso geralmente em litros por habitantes por dia (l/hab. dia).

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Assim, Volume distribuído anual q = 365. População beneficiada

Cálculos já efetuados para um grande número de cidades permitem conhecer com razoável aproximação o seu valor e, assim, aplicá-lo quando se pretende elaborar novos projetos.

No Brasil são poucos os dados divulgados, que resultaram de medições sistemáticas e seguras, associadas a levantamentos cuidadosos de população.

As condições indispensáveis para um estudo criterioso, são a continuidade de medição da água aduzida para a cidade (feita por meio de aparelhos apropriados) e a existência de um sistema que seja capaz de fornecer água ininterruptamente aos consumidores, sem, necessidade de forçar a restrição do consumo. Se isto ocorrer por deficiência de água nos mananciais, insuficiência de equipamentos e instalações, frequentes interrupções de energia elétrica, ou ainda de má operação do sistema, os resultados poderão ser falhos.

Na elaboração de projetos para cidades ainda não providas de qualquer sistema distribuidor, utilizam-se dados mais ou menos consagrados de consumo médio "per capita", para se calcular a quantidade de água necessária no decorrer de determinado período de tempo.

No estado de São Paulo os valores adotados são de 200 a 300 l/hab. dia. Órgãos federais adotam recomendados, para cidades com até 50.000 habitantes, de 150 a 200 l/hab. dia, e mínimo 100l/hab. dia.

A razão de ser desses valores, quando não decorrentes de pesquisas cuidadosas, poderá ser justificada através de suposição razoável dos diferentes destinos da água. No caso da Norma do extinto Departamento de Obras Sanitárias do Estado de São Paulo, aplicável aos projetos de cidades do interior, o valor indicado de 200 l/hab. dia, resultou da soma das seguintes parcelas de consumo específico, então admitidas.

1.4. — Fatores que afetam o consumo.

Consideram-se como os mais importantes os seguintes:

— Clima;

— Hábitos e nível de vida da população;

Para fins domésticos 85 l/hab. dia 42,5%

Para fins industriais e comerciais 50 I/hab. dia 25,0%

Para fins públicos 25 1/hab. dia 12,5%

Perdas 40 l/hab. dia 20,0%

200 l/hab. dia 100,0%

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— Natureza da cidade;

— Tamanho da cidade;

— Medição do consumo;

— Pressão na rede.

1.4.l. Influência do clima.

Quanto mais quente a região maior o consumo. A umidade também exerce influência, sendo maior o consumo em zonas mais secas que nas mais úmidas.

O Eng. M. R. Garcia, observando o consumo de diversas cidades do México, estabeleceu uma relação entre tipos de clima da classificação Thorntwaite e consumos "per capita". Segundo o mesmo, os valores oscilam de 150 1/hab. dia para clima semifrio e úmido, até 300 l/hab. dia para clima tropical muito seco.

Não se conhece trabalho semelhante realizado no Brasil estabelecendo valores de consumo em função do clima.

1.4.2. Influência dos hábitos e nível de vida da população.

Os hábitos da população refletem na utilização direta ou indireta da água, tais como em banhos, lavagem de pisos, lavagem de logradouros, irrigação de jardins e de gramados públicos e particulares.

Sobre a influência do nível de vida, tem-se como certo que, quanto mais elevado o estágio econômico e social da população, maior o consumo, em decorrência de um maior campo de utilização da água, resultante do emprego de máquinas de lavar roupa, de lavagem de automóveis e de numerosas outras aplicações que visam trazer conforto e facilidades. O aumento do consumo de água com a elevação do nível de vida identifica-se, com o fenômeno que se verifica também com relação ao consumo de energia elétrica.

Tem sido observado que uma família de bairro residencial fino consome muito mais água que outra com mesmo número de habitantes de bairro residencial médio ou pobre.

1.4.3. Influência da natureza da cidade

As cidades industriais destacam-se como as que apresentam maior consumo "per capita", em consequência dos gastos elevados de água, que geralmente se verificam na maior parte das indústrias. Há, entretanto, certas espécies de indústrias em que o consumo não é tão significativo. Exemplo: Indústria de calçados, de móveis, de confecções.

Os agrupamentos tipicamente residenciais como as vilas operárias, cidades satélites de centros industriais e conjuntos habitacionais, são os que apresentam consumo mais baixo, pelo fato de não existir atividade profissional da população que acarrete uma demanda com -plementar à verificada nas residências.

1.4.4. Influência do crescimento da cidade.

A experiência tem mostrado que o consumo "per capita" tende a aumentar à medida que aumenta a população da cidade.

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Entre os fatores determinantes desse fato destacam-se a maior demanda industrial e comercial, logicamente ocorrente, as maiores possibilidades de perdas nas extensas e, muitas vezes, obsoletas redes distribuidoras, e o uso para fins públicos, que pode assumir proporções mais amplas com a prosperidade da administração local e a preocupação em manter e ampliar o serviço de limpeza de pavimentos, edifícios, monumentos e parques.

A FIGURA 1.l mostra a curva média de consumo "per capita" de 8 cidades da Argentina, segundo estudos realizados pelo Eng Alberto Busto. O consumo relativamente elevado que se nota, comparativamente aos verificados entre nós, decorre da inexistência do serviço medido nessas cidades, aliás, comum naquele país. A partir dessa curva torna-se possível, mediante projeção, prever aproximadamente o consumo "per capita" que se verificará no futuro, para fins de planejamento de obras.

Fig. 1.l — Curva média do consumo "Per capita" de 8 cidade da Argentina possuindo redes de esgoto, mas com regime de

torneira livre (Segundo Eng° Alberto Busto).

1.4.5. Influência da medição

A presença de medidores de consumo nas instalações prediais é um fator que muito influencia o consumo de água. A ausência de controle impede que a taxação seja feita com

base no consumo efetivo; consequentemente, desaparece o temor de que um gasto exagerado causado por desperdícios e fugas possa ocasionar contas elevadas.

Em todas as cidades em que o serviço medido não foi implantado, observa-se que o consumo "per capita" é bem mais alto comparativamente a cidades semelhantes onde há medição, parcial ou total.

1.4.6. Influência da pressão na rede

Quando os aparelhos e torneiras de uma instalação predial são alimentados diretamente pela rede pública na qual reina uma pressão muito elevada, o consumo médio aumenta devido à saída maior de água, mesmo com pequena abertura das válvulas e torneiras e, também, devido às maiores fugas ocorrentes na própria rede. Se a alimentação for indireta, isto é, através de reservatórios domiciliares, os defeitos de registros de boia serão mais frequentes e ocasionarão, igualmente, perdas de água e, portanto, maior consumo.

Por isso, às redes distribuidoras devem trabalhar a pressões tanto quanto possível reduzidas, desde que assegurem abastecimento adequado a todos os prédios servidos.

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1.5. Variações de consumo .

A água distribuída para uma cidade não tem uma vazão constante, mesmo considerada invariável a população consumidora. Devido à maior ou menor demanda em certas horas do período diário ou em certos dias ou épocas do ano, a vazão distribuída sofre variações mais ou menos apreciáveis. Também nisto, os hábitos da população e as condições climáticas têm influência.

1.5.1. Variações diárias

O volume distribuído num ano dividido por 365 permite conhecer a vazão média diária anual.

A relação entre o maior consumo diário verificado, e a vazão média diária anual fornece o coeficiente do dia de maior consumo.

Assim,

Seu valor varia entre limites mais ou menos amplos, geralmente entre 1,2 e 2,0 dependendo das condições locais.

Exemplo:

As normas para projetos adotadas em cada localidade, estado ou região estabelecem o valor do coeficiente do dia de maior consumo a ser adotado nos estudos.

Utiliza-se esse coeficiente na determinação da vazão de dimensionamento de várias partes constitutivas de um sistema de fornecimento público de água, entre as quais: obras de captação, casas de bombas, adutoras e estações de tratamento.

1.5.2. Variações horárias

Também no período de um dia há sensíveis variações na vazão de água distribuída a uma cidade, em função da maior ou menor demanda no tempo. As horas de maior demanda situam-se em torno daquelas em que a população está habituada a tomar refeições, em consequência do uso mais acentuado de água na cozinha, antes e depois das mesmas.

O consumo mínimo verifica-se no período noturno, geralmente nas primeiras horas da madrugada. A Fig. 1.2 mostra uma curva de variação horária de consumo referente ao

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Bairro de Vila Maria na cidade de São Paulo, e a Fig. 1.3 corresponde ao consumo observado numa cidade do interior do Estado de São Paulo.

Para o traçado dessa curva é necessário que haja um medidor instalado na saída do reservatório de água para a cidade, capaz de registrar ou permitir o cálculo das vazões distribuídas em cada hora.

A relação entre a maior vazão horária observada num dia e a vazão média horária do mesmo dia define o coeficiente da hora de maior consumo, ou seja:

Observações realizadas em diversas cidades mostram que seu valor também oscila bastante, podendo variar entre 1,5 e 3,0. Entre nós, é usual adotar-se para fins de projeto o valor 1,5.

Fig. 1.2 — Curva de variação horária de consumo referente ao bairro de Vila Maria em São Paulo, no dia 25-9-60 (Segdo. Eng.° Thierry C. de Rezende).

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Fig. 1.3 — Curva de variação horária observada em uma cidade do interior do Estado de São Paulo no dia 1-5-59

Este coeficiente é utilizado quando se pretende dimensionar os condutos de distribuição propriamente ditos que partem dos reservatórios, pois permite conhecer as condições de maior solicitação nessas tubulações.

Conforme será estudado em outro capítulo, uma das funções do reservatório é atender às demandas que se verificam nos períodos de maior consumo. Assim sendo, a tubulação que alimenta o reservatório não necessita ser dimensionada para a vazão da hora de maior consumo, bastando considerar a vazão do dia de maior consumo.

1.5.3. Variações acidentais

Decorrem de circunstâncias especiais imprevisíveis e não podem ser transformadas em coeficientes.

A não ser que se conheçam quantitativamente essas variações ou que hajam normas especiais estabelecendo critérios para levá-las em conta, não são geralmente consideradas nos cálculos.

1.6. Período de projeto .

O projeto de um sistema de abastecimento de água, para uma cidade comum deve levar em consideração a demanda que se verificará numa determinada época em razão de sua população futura. Admitindo ser esta última variável e crescente, é fundamental fixar a época até a qual o sistema poderá funcionar satisfatoriamente, sem sobrecarga nas instalações ou deficiências na distribuição.

O tempo que decorre até atingir essa época define o período de projeto.

O período de projeto pode estar relacionado à durabilidade ou vida útil das obras e equipamentos, ao período de amortização do capital investido na construção ou, ainda, a outras razões. Os problemas relativos às dificuldades de ampliação de determinadas estruturas ou partes do sistema, como também o custo do capital a ser investido e o ritmo de crescimento das populações são aspectos a

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serem igualmente considerados.

Se, por exemplo, o crescimento populacional for muito rápido, os períodos de projeto longos acarretarão obras grandiosas que oneram demais a comunidade nos anos iniciais.

Nos grandes sistemas, o período de projeto poderá ser mais amplo, no caso específico de estruturas ou partes constitutivas em que a ampliação for difícil. É o caso das barragens e condutos de grande diâmetro, em que se consideram períodos de 25 a 50 anos.

No Brasil, raramente se admitem períodos superiores a 25 ou 30 anos. É comum adotar-se o período de 20 anos para as instalações pequenas e médias, comuns no interior do país, e indistintamente para todas as partes constitutivas do sistema.

1.7. Previsão de população.

Fixado o período de projeto, é necessário conhecer-se a população de projeto, ou seja, a população que se espera encontrar na localidade ao fim do período admitido. Com isto, poderá ser feita uma estimativa do consumo de água na época considerada.

Diversos são os métodos aplicáveis para o estudo do crescimento populacional.

A expressão geral da população de uma comunidade, em função do tempo, pode ser assim apresentada:

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Essa fórmula, embora sem aplicação prática imediata tem o mérito de por em evidência os fatores intervenientes no crescimento populacional. O fenômeno é de grande complexidade e está sob a dependência das incertezas de fatores econômicos, políticos, sociais e outros.

Várias hipóteses simplificadoras têm sido introduzidas para se estimar numericamente a população futura.

No método matemático, o cálculo da produção é feito mediante uma equação matemática definida, cujos parâmetros são obtidos a partir da experiência passada. São muito conhecidos os processos de crescimento aritmético, geométrico e logístico, os quais pressupõem que o aumento da população em função do tempo obedeça, respecti -vamente, a uma progressão aritmética, a uma progressão geométrica e à chamada curva logística.

No método histórico, admite-se que o aumento populacional de uma comunidade seja um aspecto da evolução dos organismos sociais. Embora não haja regra matemática rígida ou lei natural governando os acontecimentos históricos, admite-se que a marcha da civilização, nos vários países, promova a ocorrência de ciclos ou fases de desen-volvimento. Nestas condições, a curva de evolução de uma comunidade mais desenvolvida lança luz sobre o que se pode esperar em outras áreas que estão a caminho das mesmas fases de expansão.

Na prática, são aplicados diversos processos de previsão, alguns deles combinados entre si. Essas diferentes hipóteses de cálculo conduzem a uma variação de resultados numéricos, a qual indica a magnitude das incertezas envolvidas e, assim, oferece melhor orientação para a escolha judiciosa dos valores a 'serem adotados no projeto.

1.7.1. Processo aritmético

1.7.1.1. Procedimento de cálculo

Obtêm-se os valores das populações, Po e P1 correspondentes a duas datas anteriores, t0 e t1 (por exemplo, referentes a dois censos).

Calcula-se o incremento populacional nesse período:

Resulta a previsão da população P, correspondente à data futura t:

1.7.l.2. Comentários

Este processo admite que a população varie linearmente com o tempo.

Verificação rápida dessa hipótese pode ser feita por meio de gráfico, representando as datas de vários censos em abscissas e tomando-se os correspondentes valores da população, como ordenadas.

Para previsão e prazos muito longos, torna-se acentuada a discrepância com a realidade histórica, uma vez que o crescimento é pressuposto ilimitado.

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1.7.2. Processo geométrico

1.7.2.1. Procedimento de cálculo

a . C a l c u l a - s e a r a z ã o d e c r e s c i m e n t o s g e o m é t r i c o n o p e r í o d o c o n h e c i d o :

b . R e s u l t a a p r e v i s ã o d e P :

1 . 7 . 2 . 2 . C o m e n t á r i o s

No processo geométrico, considera-se o logarítmo da população variando linearmente com o tempo.

Por meio de gráfico, em papel monologar itmico, pode-se verificar essa linearidade, representando as datas dos vários censos em abscissas e os logar itmos dos valores da população como ordenadas.

Também neste caso o crescimento é pressuposto ilimitado.

1.7.3. Processo da curva logística

1.7.3.1. Procedimento de cálculo

a . O b t ê m - s e o s v a l o r e s d a s p o p u l a ç õ e s , P 0 , P 1 e P 2 , c o r r e s p o n d e n t e s a t r ê s d a t a s a n t e r i o r e s , t 0 , t 1 e t 2 .

b . A d o t a - s e , c o m o c u r v a d e c r e s c i m e n t o p o p u l a c i o n a l , u m a c u r v a d e f i n i d a p o r e s s e s t r ê s p o n t o s e q u e o b e d e ç a à e q u a ç ã o s e g u i n t e :

o n d e :

b é a r a z ã o d e c r e s c i m e n t o d a p o p u l a ç ã o

K é o l i m i t e d e P ( v a l o r d e s a t u r a ç ã o d a p o p u l a ç ã o ) ;

a é u m v a l o r t a l q u e p a r a t = a / b h á u m a i n f l e x ã o ( m u d a n ç a n o s e n t i d o d a c u r v a t u r a ) n a c u r v a .

c . F a z - s e a d e t e r m i n a ç ã o d o s t r ê s p a r â m e t r o s , a , b e K , p a r a a c o m p l e t a i n d i v i d u a l i z a ç ã o d e s s a e q u a ç ã o . P a r a i s s o , r e s o l v e - s e o s i s t e m a d e 3 e q u a ç õ e s n a s 3 i n c ó g n i t a s a , b e

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K , o b t i d a s m e d i a n t e i n t r o d u ç ã o d e c a d a u m d o s v a l o r e s c e n s i t á r i o s r e f e r i d o s .

1.7.3.2. Comentários

a. A resolução do sistema de 3 equações acima fica bastante simplificada se os três pontos censitários forem cronologicamente equidistantes.

Isto é, fazendo-se:

t0= 0

t1= d t = 2d

t: contado a partir de to resultam:

A aplicabilidade da curva logística, entretanto, fica na dependência de estar satisfeita

a condição:

b. Sob a hipótese da curva logística, como se viu, a população cresce assintoticamente para um limite K.

1.7.4. Processo de extrapolação gráfica

A extrapolação gráfica, também chamada de processo de prolongamento manual, consiste no traçado de uma curva arbitrária que se ajuste aos dados já observados, sem se procurar estabelecer a equação da mesma. As extrapolações ou previsões de populações futuras obtêm-se prolongando a curva obtida, de acordo com a tendência geral verificada, usando um julgamento próprio.

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No prolongamento do crescimento, podem ser utilizados, como elementos auxiliares, os dados de populações de outras comunidades que já tenham maior número de habitantes. Marcam-se, neste caso, em um mesmo diagrama, os registros de população da cidade em estudo e das outras maiores que ela. Traçam-se as correspondentes curvas de crescimento observadas. A partir do ponto referente ao dado mais recente da cidade em estudo, desenham-se segmentos paralelos às curvas pertinentes às cidades maiores, segmentos esses começando no ponto em que estas atingiram a mesma população. Através do feixe de curvas assim resultante, traça-se uma curva média de previsão para a cidade em estudo.

Este método requer uma escolha criteriosa dos dados a serem usados como elementos de comparação, levando-se em conta as condições de semelhança entre os respectivos fatores de desenvolvimento.

1.7.5. População flutuante

Em certas cidades, além da população residente, devem ser considerados os afluxos maciços de pessoas, em determinados períodos. É o caso, por exemplo, de períodos de férias ou de fins de semana em cidades balneárias ou em estâncias climáticas e hidrominerais.

Os estudos de previsão da população futura flutuante são feitos por métodos análogos àqueles utilizados para a população fixa. Levantam-se dados estatísticos sobre as ocorrências anteriores e pressupõe-se o crescimento futuro em conformidade com as curvas observadas na própria cidade, e em cidades semelhantes.

1.7.6. Distribuição demográfica

Para o projeto de redes de água, é importante analisar como as futuras populações se distribuirão sobre a área da cidade.

As previsões de densidades demográficas são feitas mediante aplicação dos métodos gerais de previsão populacional, em cada uma das áreas parciais em que a cidade se divide. Estas áreas parciais são delimitadas em função dos fatores que governam a intensidade de ocupação da área urbana, tais como: condições topográficas, facilidades de expansão da área urbana, preço de terrenos, planos urbanísticos, zoneamento, facilidades de transporte e comunicações, hábitos e condições socioeconômicas de população, existência de serviços de água, de esgotos e águas pluviais, etc.

Nesses estudos, são muito úteis os levantamentos cadastrais da cidade, assim como as fichas detalhadas por distrito, obtidas por ocasião dos censos nacionais.

Na cidade de São Paulo, a densidade demográfica por distrito varia desde 40 até cerca de 400 habitantes/hectare, conforme a zona. Em certas áreas limitadas, atingem-se densidades, as mais elevadas.

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Os valores apresentados no QUADRO 1.2 são encontrados com frequência:

QUADRO 1.2.

Densidades demográficas observadas em zonas urbanas

1.7.7. Considerações finais sobre a previsão de população.

Os fatores que presidem o crescimento de uma cidade, principalmente nos países em fase de transição, apresentam características de instabilidade que tornam duvidosas as previsões em longo prazo. Por razões econômicas, entretanto, o período de projeto abrange prazo relativamente longo, da ordem de 20 a 25 anos. Nestas condições, ao se analisar o problema do crescimento populacional, deve-se ter presente a recomendação muito oportuna de Aristóteles, segundo a qual, não se deve procurar em certos domínios do conhecimento humano, maior positividade do que a que estes domínios comportam.

Evidentemente, no decurso do período de projeto, fatores inicialmente intangíveis poderão esporadicamente atuar na lei de crescimento, fazendo com que os valores reais da população sofram desvios em tomo da curva de crescimento previamente definida. Por esse motivo estatístico, ao invés de fazer previsões futuras em termos de pontos no diagrama, é mais recomendável definirem-se faixas de valores. Dentro destas, serão finalmente escolhidas as populações de projeto, em função das conveniências de escalonamento das obras, conveniências

essas decorrentes de motivos de ordem hidráulica, estrutural, financeira, etc.

Os valores das populações de projeto, portanto, têm a finalidade precípua de definir a magnitude das etapas de execução, de forma que as obras se sucedam através de um escalonamento lógico. Se, em função de fatos novos, houver futuramente uma aceleração ou um retardamento no prazo para atingir-se uma data etapa, dever-se-á proceder a um reajustamento do programa de obras, mediante antecipação ou prorrogação de determinadas etapas previstas.

Qualquer que seja o modelo matemático que tenha sido usado na previsão populacional, deve ele ser verificado periodicamente e ajustado às informações mais recentes, por exemplo, fornecidas por um novo censo. O postulado de que a equação matemática representativa da experiência passada continuará a subsistir no futuro, é mera hipótese de cálculo.

Os modelos matemáticos, anteriormente descritos, chamados de modelos determinísticos, conduzem a um único valor de P, para cada t fixado. É o caso, por exemplo, da progressão geométrica.

Modernamente, vêm sendo desenvolvidos estudos para aplicação do chamado modelo

Page 15: CAPÍTULO 1.1. Introdução - civilunorp2019.com.brcivilunorp2019.com.br/onewebmedia/saneamento_2016-cap1.pdf · aproximação o seu valor e, assim, aplicá-lo quando se pretende

estocástico, com o qual, para cada valor de t obtém-se uma série de valores de P associados às suas respectivas probabilidades de ocorrência. Isto é, procura-se levar em conta a flutuação a que estão sujeitos os valores da variável "população", no decorrer do tempo. A cada data futura, vai corresponder, portanto, uma faixa de populações prováveis previsíveis, em lugar de um único valor numérico.

1.8. Áreas a serem abastecidas. Concepção e etapas de projeto.

Paralelamente ao crescimento populacional, verifica-se em geral uma expansão da área urbanizada da cidade.

Nos projetos de abastecimento de água, deve ser levado em conta também esse aspecto, em especial na localização de reservatórios e no traçado dos condutos principais e redes distribuidoras, mediante estudo criterioso das prováveis zonas de crescimento. Sem essa consideração, há o risco de se concentrar todo o sistema distribuidor numa área restrita, mais ou menos coincidente com a área atualmente ocupada pela cidade, ocasionando um dimensionamento inadequado dos condutos.

Importante é também conceber o projeto de modo que a execução das obras não acarrete um investimento inicial incompatível com os recursos que poderão ser obtidos.

Executadas algumas estruturas cuja construção se aconselha ser completada para a capacidade final, a maioria das partes constitutivas de um sistema pode ser executada ou montada por etapas, à medida das necessidades. No caso de redes distribuidoras, é possível localizar e dimensionar as tubulações principais de maneira a permitir ampliações sucessivas, sem introduzir modificações profundas e custosas e capazes de prejudicar o ritmo de atividade de um centro urbano.

As etapas de projeto não devem, contudo, ser em número exagerado, a ponto de obrigar um permanente estado de execução das obras.

Para um período de projeto de 20 anos, em cidade com ritmo de crescimento normal, serão suficientes duas ou, no máximo, três etapas de construção.

Em cidades de crescimento explosivo e irregular, as estimativas, de população e de demanda de água podem afastar-se apreciavelmente das previsões atuais. Nestes casos, aconselha-se uma revisão periódica dos planos de abastecimento, ajustando-os aos novos fatos que venham modificar as hipóteses assumidas inicialmente.

1.9. Volume de água a ser distribuído numa cidade.

A estimativa do volume de água normalmente necessário para distribuição numa cidade, poderá ser feita com o conhecimento dos elementos já apresentados, de população de projeto, consumo "per capita" e prováveis variações de consumo.

Se a cidade em estudo tiver ou vier a ter indústrias, hospitais, quartéis, ou outras instituições que apresentem elevada demanda de água, será necessário considerá-los à parte, tanto para o cálculo da vazão necessária global como para o dimensionamento de condutos que irão abastecê-los.

Sendo frequente a existência de estabelecimentos dessa espécie, as inspeções realizadas na cidade, na fase que precede à elaboração do projeto, deverão incluir inquéritos e medições cuidadosas para conhecer e avaliar o consumo dos mesmos.

Ainda que não seja usual, entre nós, o dimensionamento de redes distribuidoras que assegurem vazão suficiente para dar combate a incêndios, é possível que em certas áreas de grande atividade industrial ou comercial haja conveniência de serem consideradas as correspondentes demandas para fins de projeto de redes e reservatórios.