Capítulo 2 - infinitelightnovel.files.wordpress.com · na luz da lua. A noite ainda ia alta. A...

1 Light Novel Project

Capítulo 2

A governanta que estava vivendo na casa foi a primeira a perceber a anormalidade.

Um fedor podia ser sentido na escuridão.

O fedor suspeito de sangue misturado com o cheiro particular de um animal.

Ela suspeitou inicialmente dos gatos de rua que viviam ao redor da mansão.

Um deles, um velho e esperto gato preto, uma vez havia entrado na mansão e comido

a cenoura da Senhora de uma forma grotesca.

A fúria da Senhora naquela hora tinha sido além do normal. Assim sendo, tivera sido

um problema para os servos. Um incidente que irrita só de lembrar.

É por isso que ela saiu da cama relutantemente e foi para a ala principal, se banhando

na luz da lua.

A noite ainda ia alta.

A cidade estava silenciosa e a mansão estava escura, com as luzes apagadas. Dava para

sentir um forte cheiro anormal na escuridão profunda.

“... Senhor?”

A governanta chamou quando ouviu alguma coisa enquanto subia as escadas.

Um estrépito ressoou abaixo dela.

Cacos de vidro estavam sobre o carpete. A janela do corredor havia sido forçada a

ponto do vidro quebrar.

E o senhorio estava caído desmaiado no quarto diante da janela partida.

“Você está bem, Senhor? O que aconteceu aqui...?”

A governanta estava surpresa e foi para ajudá-lo, mas parou assim que entrou na sala.

Ela prendeu a respiração.


O que estava caído não era mais o mestre dela, e sim um pedaço de carne em forma

humana.

O peito dele estava rasgado e o sangue que havia saído, tingia o quarto de preto.

As roupas dele haviam sido feitas em pedaços por garras afiadas. A expressão dele

estava congelada num estado de angústia.

A jovem dama também estava no quarto. Assim como a mãe dela, deitada ao contrário

numa tentativa de proteger sua filha.

“A-alguém...”

A governanta lentamente andou para trás e inconscientemente tirou os olhos dos

cadáveres.

Então ela percebeu. Alguma coisa estava se movendo dentro do quarto.

A coisa, que havia se escondido atrás dos corpos, levantou-se.

Ela parecia uma besta e era duas cabeças mais alta que um homem adulto. Era grande

e parecia ter múltiplas vezes o peso da baixa governanta.

Levantando a lupina cabeça, a coisa olhou para ela.

Um corpo coberto de pelos negros.

Um nariz pontudo e uma boca aberta. Olhos dourados.

Finalmente, músculos imensamente desenvolvidos nos membros.

“Hya! ...HYAAAAAAAAAH!!”

A governanta gritou.

Talvez a besta tenha ficado surpresa com a voz dela, talvez não. Mas girou com uma

agilidade inacreditável e atravessou a janela para fora.

Ela aterrissou no mato que cercava a mansão e então, por um momento, olhou para o

céu com o sangue em seu pelo brilhando.


Então a besta desapareceu nas sombras...


Capítulo 2 - Pedigree

Episódio 02: Mestiço

Parte 1

Um pub perto da estação de metrô estava cheio de pessoas querendo lanchar.

Refeições, das quais apenas as porções eram boas, estavam alinhadas no balcão e o

estalajadeiro barbudo estava ocupado.

Quase todas as visitas estavam usando roupas comuns e pareciam trabalhadores.

Muitos deles pareciam rudes e também havia alguns que já cheiravam a álcool.

No canto do pub, havia duas pessoas com uma atmosfera diferente da do resto.

Um jovem que tinha mais ou menos 20 anos e uma garotinha com longos cabelos

pretos.

O jovem estava usando um casaco de couro e tinha uma mochila pequena.

Sua aparência sincera implicava uma boa educação, mas ele também não parecia

ignorante a respeito do mundo. Era possível sentir a atmosfera de um soldado bem treinado

em cada um de seus movimentos.

“Vamos lá, Dalian... logo vai ser a hora do nosso compromisso.”

Olhando um relógio de bolso de uso militar, ele chamou a garota.

A garota de cabelos negros, chamada Dalian, olhou para ele sem expressão. Então,

disse com uma insolência que não se encaixava com a sua bela aparência:

“Espere, Huey. Eu ainda estou no meio da minha refeição.”

“No meio dela? Você ainda planeja comer mais?”

O jovem chamado Huey perguntou impressionado. Vários pratos vazios já estavam

empilhados na frente da garota. No prato que ela estava comendo, havia coisas como peixe e

batata-frita, torta de carne e pão frito açucarado.


Apenas comidas gordurosas que quase dava ataque do coração, apenas de olhar.

“Por que você precisa perguntar uma coisa tão óbvia?”

Dalian apontou para o balcão, enquanto comia.

“Esse pub tolo oferece ‘ coma tudo o que puder’ nos pães fritos! O preço é o mesmo,

assim sendo é muito mais vantajoso quando eu como muito. Você é tão estúpido pra não

conseguir fazer cálculos tão simples?”

“Não, eu sei disso mesmo sem calcular...”

Huey suspirou levemente. A garota do cabelo preto olhou para ele e disse:

“Nesse caso traga pra mim o próximo prato, seu bobo.”

“...”

Enquanto balançava a cabeça, Huey se levantou como pedido e andou para o balcão.

Percebendo o rosto azedo de Huey, o estalajadeiro levantou uma sobrancelha.

“Um rosto estranho. Vocês dois são estrangeiros?”

“Sim. Nós viemos no trem passado.”

Huey sorriu socialmente. Olhando pelo pub cheio, ele adicionou:

“Muito animado aqui. Eu esperava que essa cidade estivesse mais calma.”

Um grupo de cerca de quinze homens estavam gritando o tempo todo no centro do

pub. Um bando barulhento que parecia ser composto de caçadores ou ex-soldados.

O estalajadeiro olhou para eles incomodado, e então murmurou num tom baixo, como

se estivesse falando sozinho.

“Na verdade essa é uma cidade calma, sabe? Se não fosse pelo incidente.”

“... incidente?”

Huey inclinou a cabeça. O estalajadeiro respondeu enquanto cortava a carne na frente

dele.


“A Besta de Ashwell. Você não veio aqui por ter ouvido esse rumor?”

“Não. Sobre o que ele fala?”

Parecendo ter o interesse atraído, Huey se inclinou pra frente levemente.

O estalajadeiro pegou um jornal e entregou para ele. Um fino jornal em estilo tabloide.

Era a edição da semana anterior.

“É a grande notícia na primeira página. Um advogado que abriu seu negócio na cidade

foi assassinado.”

“Um advogado...?”

Enquanto olhava o jornal amassado, Huey apertou os olhos. Ashwell era o nome do

advogado assassinado. Leonard Ashwell. Morto aos 40 anos.

“O Sr. Ashwell era um advogado famoso nessa cidade, sabe? Ele aceitava casos com

um pagamento baixo, lutava contra policiais corruptos e processava senhorios que abusassem

de fazendeiros inquilinos... Para nós, pessoas comuns, ele era como um herói.”

“Esse herói... foi assassinado?”

“Sim.”, o estalajadeiro respondeu abruptamente.

“Não só o lorde. A mulher e a filha dele também foram assassinadas. Foi uma coisa

realmente cruel.”

“... E o culpado?” perguntou Huey.

“Hã?”

“Ainda é desconhecido? Quem os matou? De acordo com o que você me falou, ele

devia ter muitos inimigos.”

“Ah, bem sim... com certeza tinha muitas pessoas que não gostavam dele...”

O estalajadeiro disse obscurecido. Era uma voz cansada pelos lamentos.

“Mas nós sabemos quem é o culpado. E aí está o grande problema.”


“Quem é?”

“Não é um humano. É uma besta.”

“Uma besta?”

“Eu ouvi dizer que é mais alta que uma vaca comum e parece um lobo.”

Huey se manteve quieto por um momento e observou a cara barbada do estalajadeiro.

Então ele perdeu a concentração e expirou.

“Err... Pode-me falar mais sobre isso?”

O estalajadeiro suspirou profundamente.

“Uma serva dos Ashwells testemunhou isso. Como essa besta matou a família inteira, e

no final, escapou pela janela depois de comer um pouco deles.”

“Sério...?”

Huey perguntou perplexo. O estalajadeiro assentiu profundamente.

“Bem... A serva desmaiou logo depois da polícia chegar e a coisa sobre ser maior que

uma vaca provavelmente não é verdade. Mas eu também não acho que seja tudo mentira, já

que haviam cadáveres mordidos por uma besta. E também havia pelos e pegadas.”

“Entendo...”

Huey olhou de volta para o jornal. O conteúdo dele claramente corroborava as

palavras do estalajadeiro.

“Então as pessoas reunidas aqui estão planejando caçar a besta?”

Huey perguntou, olhando para a rua principal, que podia se ver da entrada do bar.

Havia 4 ou 5 cachorros, que pareciam ser treinados para a caça, presos ao poste de luz.

E as bagagens longas que vários visitantes carregavam, eram provavelmente as armas.

O estalajadeiro continuou numa voz indiferente.


“Vingança pelo lorde... muitas pessoas tiveram apoio dele, sabe? Especialmente

aquelas envolvidas com a maldita provocadora família Hurston...”

“Família Hurston?”

Huey inclinou a cabeça de novo. O nome não estava escrito no jornal.

O estalajadeiro parecia descontente.

“Você não percebeu quando chegou? Aquela maldita imensa fábrica de fertilizante.”

“Se você está falando do prédio que dá pra ver da janela do trem...”

“Sim, é esse mesmo. O membro do conselho da cidade, Roy Hurston está gerenciando

essa fábrica, mas esse maldito novato despediu uns 500 funcionários meio ano atrás.

Unilateral, só porque ele trouxe uma nova máquina!”

“Despediu? Mas o que aconteceu com eles...?”

Huey perguntou numa voz séria. O estalajadeiro deu de ombros.

“Sabe, não tem nenhuma outra indústria nessa cidade. Foi horrível. Quando eles

estavam a ponto de se enforcar ou virar criminosos, o Sr. Ashwell veio e os resgatou.”

“Resgatou...?”

“Se chama ‘ação de classes’. Ele informou a imprensa e causou tumulto com isso.

Parece que ele até conseguiu apoio das pessoas nobres e ricas dessa cidade. Graças a isso,

aquele novato Hurston foi severamente criticado em corte. Todo mundo ficou encantado

quando o Sr. Ashwell ganhou o processo na primeira instância.”

“Entendo.” Huey assentiu. Ashwell, com certeza podia ser chamado de herói.

“E agora os antigos empregados querem vingá-lo...?”

“Parece que eles estão planejando ir caçar junto com os caçadores e ex-soldados que

se reuniram dos lugares próximos. Alguns deles querem ficar ricos capturando essa besta

misteriosa viva... eu tinha certeza que você seria um deles. Quer dizer, você também já foi um

soldado, certo?”

“Não... eu era só um piloto.”


Huey balançou a cabeça com um sorriso.

O estalajadeiro olhou pensativo para Huey.

“Hmm... se você não está atrás da besta, então por que veio para essa cidade...?”

Huey endureceu levemente e assentiu.

“Bem... eu tenho um compromisso com o conhecido de um conhecido. Esse pão, eu

vou levar, tudo bem?”

“Hã, hã...?”

Huey rapidamente embalou um pouco de pão frito no papel e saiu. O estalajadeiro o

observou por um tempo. Huey fingiu não perceber isso e voltou com passos rápidos para a

mesa.

Dalian já estava esperando por ele com uma expressão zangada, abraçando o pote de

açúcar.

“Você demorou! Quanto tempo leva pra pegar um pouco de pão, seu pato?”

Mesmo antes de Huey se sentar, Dalian havia começado a brigar com ele. Huey fez

uma cara cansada e disse:

“... vamos lá, Dalian.”

A garota olhou para cima de boca aberta e levantou as mãos cobertas por protetores.

“Do que você está falando? Eu vou comer esse pão frito agora. Me dê ele logo.”

“A família do seu conhecido parece ser muito impopular nessa cidade... se eles

descobrirem que nosso destino é a casa dos Hurston, então provavelmente fariam uma grande

bagunça.”

Dito isso, Huey começou a juntar a bagagem deles. Vendo isso, Dalian entrou em

pânico. Levantando-se rapidamente, ela estendeu as mãos e disse:

“Ei Huey, por que você está guardando o pão? Eu ainda não coloquei açúcar nele.

Huey!”


“Também parece melhor nós não procurarmos uma carruagem aqui. Não tem jeito...

teremos que andar.”

“Ei! O que você está fazendo? Me largue. Onde você está me tocando? Que

pervertido!”

Huey pegou a garota que chutava e brigava quase como uma bagagem, nos seus

braços e saiu do pub.

Observando o pote de açúcar lamentavelmente deixado na mesa, Dalian murmurou

numa voz chorosa:

“Açúcar...”

Parte 2

Apesar da família Hurston não ser parte da nobreza, eles possuíam fortuna e

autoridade, como se fossem. Eles possuíam terras pela cidade e empregavam diversos

fazendeiros. Muitos dessa família também estavam trabalhando em empregos importantes na

cidade, como juízes ou membros de comitê.

A residência deles era uma grande mansão num planalto com vista da cidade.

Havia um jardim bem cuidado com flores em profusão e na fazenda adjacente, cavalos

de corrida caros estavam pastando. O próprio prédio era impressionante e mostrava a riqueza

da família.

Só havia uma coisa arruinando esse cenário, que era um grupo de 40 a 50 pessoas

circulando a porta da frente da mansão. Era um movimento de protesto contra a demissão dos

empregados da fábrica.

Olhando para eles através da janela do salão, Huey tomou um gole de seu chá preto

com uma expressão desconfortável. Dalian estava sentada num sofá, concentrada em ler livros,

em que ela havia pego numa estante da mansão. Como sempre, ela não tinha expressão, mas

parecia levemente divertida. Quando podia ler um livro raro, ela ficava quase sempre de bom

humor.


“Obrigado por esperar.”

Quando a xícara de chá de Huey estava meio-vazia, um homem alto usando um terno

americano foi guiado pelo mordomo e entrou na sala.

A idade dele era vinte e poucos. Ele era um jovem não muito mais velho que Huey.

Vendo Huey olhar para ele, o homem tentou fazer um vago sorriso. Mas ele

instantaneamente pareceu surpreso e parou.

Olhando para Dalian que estava lendo um livro silenciosamente, ele falou levemente

impressionado.

“Err... você é a Biblioprincesa Negra?”

“...”

Dalian gradualmente percebeu a existência dele e levantou o rosto. O homem sorriu

timidamente, enquanto ela se mantinha em guarda.

Mas a reação dele era razoável. Isso era porque Dalian tinha uma beleza como a de

uma boneca. Além disso, o vestido dela aumentava o enigma.

Pano decorado com laços negros. Uma saia abaulada por várias camadas de babados.

Linhas cobertas por protetores metálicos nas costas das mãos e um par de quixotes.

As roupas dela faziam lembrar os robes cerimoniais dos cavaleiros medievais, uma

mistura estranha que não podia ser chamada de vestido nem armadura.

E finalmente, no lugar de uma fita, ela estava usando um velho peitoral metálico.

Uma grande tranca, amarrada a ela por correntes prateadas.

Mesmo assim, o homem fez uma mesura educada para a garota vestida de preto.

“Por favor, perdoe minha rudeza. Eu não estava esperando uma dama tão bonita...”

Os cantos da boca de Dalian se contraíram quando ela ouviu as palavras dele. Se ela

fosse um gato, com certeza estaria ronronando a essa altura, satisfeita.


Por alguma razão, Dalian deu a Huey um olhar triunfante e puxou a manga dele. Então

ela murmurou numa voz baixa:

“Esse garoto é bem promissor. Você deveria seguir um pouco o exemplo dele.”

Huey suspirou.

“Isso não é só uma frase educada...? Ai...”

Ele teve a canela chutada pelas botas metálicas de Dalian e franziu o rosto.

O homem tímido e sorridente observou essa cena, confuso.

“Obrigado por fazerem uma jornada tão longa... eu estou aliviado em ver que vocês

chegaram sem problemas.”

Ele finalmente disse.

Então o homem olhou em direção a porta da frente da mansão.

“Os trabalhadores reunidos na frente da porta ainda estavam levantando cartazes do

outro lado da rua e ainda estavam levantando duas vozes. Seria necessário coragem para

passar através do círculo ameaçador.”

“Bem, de algum modo.”

Huey assentiu com um sorriso doído.

“Mas eu sinto pena do motorista da carruagem que foi atingido com ovos podres.”

“É mesmo...?”

O homem suspirou.

“Eu providenciarei um servo para o motorista depois, como desculpa.”

“... Esse grupo é constituído pelos trabalhadores despedidos da fábrica, não é?”

Huey perguntou indiferente.

O homem abaixou os olhos sentimentalmente.


“Sim. O movimento de protesto abaixou um pouco depois do julgamento, mas está

assim de novo já faz alguns dias... você já sabe sobre o advogado Ashwell?”

“Eu ouvi uma história sobre o estalajadeiro de um pub para o qual nós fomos... uma

besta o atacou?”

“B-bem, sim... tais rumores também estão em circulação...”

A voz do homem tremeu.

“Com a morte do advogado deles, os julgamentos daqui em diante serão mais difíceis.

Eu acho que essa é a razão dos antigos empregados estarem causando problemas. Eu espero

que o meu irmão reconheça que eles têm vidas e famílias para proteger.”

“Por ‘irmão’ você quer dizer...?”

“Aah, eu me esqueci de mencionar isso. Meu nome é Chez Hurston. O gerente da

fábrica é meu irmão mais velho, Roy Hurston.”

Novamente com um sorriso tímido, o homem estendeu sua mão direita.

“Meu nome é Hugh Anthony Disward, você pode me chamar de Huey. E ela é a Dalian.”

Com essas palavras, Huey recolheu a mão de volta. E subitamente percebeu uma coisa

inesperada.

Ele observou que a palma da mão de Chez era sólida e treinada, apesar dele parecer

muito tímido.

Ao invés do filho de uma família rica, aquela parecia ser a mão de um cocheiro ou de

um cavalariço, que criava cavalos.

“Er... eu ouvi que você veio para ver o meu avô... perdoe a pergunta, mas que tipo de

negócios...?”

Chez não percebeu o aturdimento de Huey e perguntou relutantemente.

Não Huey, mas Dalian respondeu a essa pergunta.

“Nós viemos entregar um livro. O velho Livro Fantasma que foi confiado a nós pelos

seus ancestrais.”


“Livro Fantasma...?”

Chez inclinou a cabeça. Dalian o observou sem expressão.

“Eu ouvi dizer que ele é considerado a comprovação do atual chefe da família.”

“É mesmo?... Entendo. Então o vovô está...”

Chez murmurou, compreendendo alguma coisa.

Logo depois disso, passos rudes puderam ser ouvidos do corredor e a porta do salão de

abriu violentamente.

Parte 3

“Chez...! O Chez está aqui?!”

Um homem de aparência austera com olhos afiados, entrou no salão.

Ele olhou a sala com arrogância e pareceu obviamente desagradado quando percebeu

Huey e Dalian.

“Irmão.”

Chez gemeu fracamente.

Huey e Dalian compararam os dois sem falar.

Aparentemente o homem, que era chamado de “irmão” por Chez, devia ser o membro

do conselho da cidade, Roy Hurston.

A idade dele estava próxima dos 30. Ele provavelmente poderia ser classificado como

um jovem oficial público. Ele era apenas 4 ou 5 anos mais velho que Chez.

Porém, as impressões que os irmãos davam eram bem diferentes. A aparência do

irmão mais novo era desamparada, mas educada e gentil, enquanto o irmão mais velho estava

cheio de autoconfiança e orgulho. De uma forma, a relação deles era óbvia.


“O que é esse bando do lado de fora da mansão? Eu não te falei pra cuidar dessa

bagunça?”

Roy repreendeu seu irmão sem se preocupar com os olhares de Huey e Dalian.

Chez mastigou as palavras.

“Mas olha, irmão. Eles não estão tentando causar nenhum mal. Eles apenas estão

querendo um emprego e então desejam discutir esse assunto novamente com você. Então,

por favor...”

“E daí?”

Roy perguntou com uma voz cínica.

“Não me faça rir. Não há nada para se discutir com esses mendigos. Que desperdício

de tempo.”

“... Mas não é essa sua atitude que fez eles se revoltarem assim?”

“Não seja absurdo. Você está me dizendo para abaixar a cabeça para esses vulgares?”

“Que absurdo.” Roy adicionou.

“Pra começar, não foi por causa da incapacidade deles que esses homens não

puderam manter o trabalho? Por que eu, Roy Hurston, deveria assumir responsabilidade por

isso? Ouça Chez, a habilidade de nós, humanos, não é igual. Pessoas superiores tem uma

função apropriada a sua habilidade e pessoas incapazes não podem atrapalhá-las.”

“Mesmo assim, despedir eles de repente é ir longe demais! Eles não se esforçaram

muito na fábrica até agora?”

Chez tentou desesperadamente convencer seu irmão.

Mas Roy apenas olhou para ele de uma forma fria.

“Não importa o quanto as pessoas incapazes se esforcem, elas não podem vencer

contra alguém com habilidade verdadeira. Você, mais do que qualquer um, deveria entender

esse fato, Chez.”

O irmão mais novo abaixou a cabeça diante das palavras cruéis de seu irmão.


Chez olhou para baixo miseravelmente, mas Roy não se importou e perguntou

rudemente:

“Aliás... quem são essas pessoas?”

Roy encarou Huey e Dalian com suspeita.

“Eles são nossas visitas! Os dois vieram se encontrar com o vovô... Sir Disward e Srta.

Dalian.”

Chez disse para seu irmão numa voz reprovadora.

Uma leve surpresa passou pelo rosto de Roy.

“... Sir Disward? Um parente de Wesley Disward?”

“Prazer em conhecê-lo.”

Huey sorriu desconfortável. Ele se levantou e apresentou-se educadamente.

Quando ele percebeu que os visitantes estranhos tinham relação com uma família

nobre, Roy mudou de atitude abruptamente. Ele se aproximou como se eles fossem íntimos e

sorriu de forma artificial.

“Bem vindo, Sir Disward! Eu sou Roy Hurston.”

“Eu ouvi dizer que você era um membro do conselho da cidade. Você parece ser uma

pessoa muito ocupada!”

Um pouco de cinismo estava misturado nas palavras de Huey, mas Roy assentiu

exageradamente.

“Sabe, a família Hurston é muito importante nessa cidade. Então, nós temos trabalhos

respeitáveis.”

Então, ele se virou para seu irmão mais novo.

“Você está planejando levar eles para o quarto do vovô depois?”

“Sim, isso é o que eu pensei...”


Chez respondeu numa voz baixa.

“Entendido. Eu irei te acompanhar.”

Roy disse interrompendo seu irmão.

“Inútil...”

Uma voz rouca pode ser ouvida de trás de Roy.

Um velho escoltado por servos chegou numa cadeira de rodas metálica barulhenta. Ele

parecia terrivelmente pálido.

“Isso não será... necessário... Roy.”

“Vovô?”

Roy virou-se para ele surpreso, enquanto Chez corria para o lado do velho.

“Vovô... e a sua saúde? Por favor, não se esforce demais...”

“Eu estou bem, Chez...”

O velho disse numa voz estalada que parecia uma manivela enferrujada.

“Seria um pecado contra as boas maneiras convidar a Biblioprincesa para a nossa casa

e não recebê-la adequadamente...”

Dalian andou para diante do velho.

Ela elegantemente esticou as mangas de seu vestido negro, parou e então proclamou

com um rosto tão sem expressão quanto o de uma boneca. A voz dela parecia levemente

solitária.

“Você ficou velho... não foi, Boyd Hurston?”

Um sorriso passou pelo rosto do velho. Ele beijou a mão dela que estava coberta com

um protetor metálico.

“E você não mudou, Biblioprincesa Negra... eu estou muito grato... por você ter vindo

realizar o meu desejo.”


Dalian assentiu silenciosamente.

“Baseado num velho contrato, eu vim entregar um livro. O Livro Fantasma selado pelo

seu ancestral num passado distante... ‘O Pedigree de Toda a Criação’.”

Ouvindo as palavras da garota vestida de preto, o rosto de Roy ficou obscuro.

“Livro Fantasma...? Vovô, o que isso...?”

O velho levantou o rosto desajeitadamente e olhou para seus dois netos.

“É um livro antigo... o novo chefe da família tem a permissão de lê-lo apenas uma vez

durante toda a sua vida. A comprovação do atual chefe da... nossa família.”

“Então isso significa... você os chamou hoje por que...”

“Vocês dois devem saber disso... eu não vou durar... por muito mais tempo. É uma

coisa... que eu tenho que passar para o novo chefe, antes de deixar esse mundo...”

Tendo falado demais, ele começou a tossir violentamente. Ele tossiu sangue e pareceu

piorar cada vez mais.

“Vovô...!”

Chez afagou as costas do velho. Enquanto isso, um servo colocou água em um copo e

deu para ele. O velho pegou a água com os dedos tremendo.

“Hoje a noite... venha para o meu quarto antes da data mudar... lá... eu irei conduzir a

herança... isso serve para você... Biblioprincesa Negra?”

O velho perguntou, enquanto respirava dolorosamente.

Dalian proclamou sem sequer uma mudança em sua expressão.

“Eu ouvi o seu desejo.”

Parte 4


Huey e Dalian decidiram passar no jardim o resto do tempo até o pôr do sol, como o

salão estava barulhento devido ao movimento de protesto. O jardim era muito mais bonito do

que parecia a distância, incontáveis rosas florescidas dentro dos campos de flores

meticulosamente manufaturados.

Porém, Dalian não apreciou a vista, e ao invés disso, sentou num banco e continuou a

ler um livro grosso sem falar. Huey não pareceu se incomodar e, enquanto bocejava, olhou

para uma campina na qual havia uma fonte.

Chez podia ser visto lá. Ele rolava na grama e brincava com vários filhotes.

Aparentemente, ele tinha soltado os filhotes de cão de caça que eles estavam criando no

abrigo de cães da mansão para cuidar deles.

“Cachorros... entendi. Então ele está cuidando de cachorros...”

Huey murmurou, olhando enquanto Chez brincava animado com os filhotes. Ele se

lembrou da palma sólida e treinada que havia sentido quando apertou a mão de Chez.

Era improvável que isso viria simplesmente de brincar com os cachorros. Podia se dizer

com certeza, que ele cuidava deles com muito entusiasmo.

“A família Hurston originalmente ganhou a maior parte de sua fortuna criando

cachorros de caça. Mesmo o canil real tem alguns cachorros criados daqui.”

Dalian disse, desinteressada, olhando por cima do livro.

“Aah, entendi... existem vários amantes de cachorros, mesmo nas famílias nobres e

reais. Eu imagino que cachorros criados por criadores famosos são vendidos por preços

incrivelmente altos.”

Chez pareceu perceber o olhar de Huey e acenou envergonhado. Então ele foi à

direção dos bancos junto com os filhotes.

Vendo isso, o rosto de Dalian se contorceu. Ela fechou o livro e foi para trás do banco.

Os filhotes seguiram Chez em ordem e, quando ele parou, eles se deitaram como que

para se juntar a ele. Era um impressionante relacionamento de confiança mútua. Dava para

ver que isso não era apenas devido ao bom treinamento deles, os filhotes também adoravam

ele.


“Eles parecem gostar de você.”

Huey disse, admirado.

Chez balançou a cabeça, corando.

“Isso é porque eu cuido deles desde criança.”

Os filhotes de cão de caça pareciam animais de pelúcia. Chez se ajoelhou com os

filhotes olhando para eles e acariciou as costas deles.

“Dalian, você não quer tocar neles também?... Dalian?”

Huey virou ainda segurando um filhote e ficou atordoado.

A garota vestida de preto havia se escondido atrás de um poste e estava olhando

cautelosamente. Além disso, ela mantinha o livro grosso que estava lendo na frente dela como

um escudo.

Huey perguntou numa voz levemente atônita.

“... O que você está fazendo aí, Dalian?”

“Não se preocupe com isso. Eu estou interessada nessa flor.”

Dalian disse com ignorância fingida e observou forçadamente a cama de flores em sua

frente. Ela estava claramente agindo de forma não natural. Huey tentou evitar rir.

“Não me diga... você tem medo de cachorros?”

“O quê?!”

As bochechas brancas de Dalian ficaram vermelhas. Então, ela disse numa voz artificial

sem entonação.

“O-o que você está dizendo? Por que eu teria medo de uma criatura que nem sequer

sabe ler? Q-que tolice.”

“...”


Huey se levantou sem falar e ainda segurando o filhote, se aproximou de Dalian e

deixou o cachorro no chão.

Dalian pareceu atrair a atenção do filhote, então ele balançou o rabo alegremente e

correu na direção dela a toda velocidade.

“I-iih?!”

Dalian gritou e congelou de medo, sem poder escapar.

“Ei, o que você está fazendo seu vira-lata? Pare com isso, eu não tenho um gosto bom!”


A garota vestida de preto tropeçou e acabou com o livro e o cachorro em cima dela,

enquanto se debatia desesperadamente. O rosto de Dalian estava azul e contorcido, mas de

longe parecia que ela estava simplesmente brincando com o cachorro.

Os ombros do Huey tremiam enquanto ele tentava desesperadamente não rir, mas

Chez não pode continuar olhando, então veio e tirou o filhote de perto de Dalian.

“Perdoe-me. Você está bem?”

Chez perguntou calorosamente, ao que Dalian assentiu desajeitada.

“Haa... haa... i-isso vai ter consequências, Huey...”

Ela disse, enquanto respirava fundo e olhou para ele, ressentida. Então, finalmente,

Huey não pode mais aguentar e começou a gargalhar.

“P-perdoem-me... eu vou levar eles para uma caminhada...”

Depois de se curvar várias vezes, Chez saiu levando os cachorros.

Havia, porém, outra pessoa chegando. Roy.

O filho mais velho da família Hurston olhou na direção de seu irmão, que estava rindo

inocentemente cercado por cachorros.

“Fuu...! Eu acho que ele não tem esperança. Brincando com cachorros nessa idade.”

Ele disse com um tom crítico.

Huey olhou para o rosto dele, surpreso.

“Você não ajuda a criar os cachorros, Roy Hurston?”

Roy deu de ombros com um sorriso.

“É claro que eu ajudo. Mas apenas a trabalho. Não é o bastante só brincar com eles.

Também é necessário jogar fora cachorros incapazes sem piedade. Meu estúpido irmão mais

novo não parece entender isso. Você sabe a diferença entre cachorros superiores e inferiores?”

“Não... qual é?”


“É a linhagem.”

Roy sorriu levantando os cantos da boca.

“Um cachorro que herdou o sangue de seus pais superiores vai ganhar habilidades

ainda mais superiores. Além disso, ele vai deixar ainda mais sangue superior quando cruzado

com um cachorro excelente do sexo oposto. Essa é a fundação da criação de cachorros. Um

indivíduo superior é diferente dos outros, desde o nascimento. É a mesma coisa com os

humanos.”

“Humanos também?”

“Sim. Pra dizer a verdade. Eu não tenho relação de sangue com o meu avô. O mesmo

se aplica ao Chez.”

Huey fez uma careta diante da súbita revelação de Roy. Mas ele adicionou numa voz

orgulhosa:

“Vovô procurou por homens e mulheres com uma linhagem excelente e criou os filhos

dessas pessoas como netos. Para criar uma linhagem mais superior para a família Hurston.”

“... Então, você não conhece seus pais verdadeiros?”

Huey perguntou relutante e sem expressão.

“Certo. Mas eu sou grato ao vovô! Graças a ele, eu nasci com habilidades superiores

aos outros. Eu consigo resultados melhores que os outros com o mesmo esforço e tenho

sucesso nos negócios. A decisão do vovô estava correta. Mas parece haver exceções.”

“Exceções?”

Roy apontou um sorriso duro para Huey que inclinou a cabeça.

“Olhe pro Chez! Mesmo quando você cruza dois cavalos de corrida excelentes, é

possível que saia um cavalo inútil que não consiga nem correr direito. Mesmo o criador mais

superior produz fracassos. Isso é o que eu estava tentando dizer.”

Não havia nenhum ódio ou crueldade no rosto de Roy quando ele disse isso. Ele só

estava falando o que considerava fato.


“Eu já ouvi sobre ‘O Pedigree de Toda a Criação’ antes.”

Roy deu uma olhada para Dalian, que voltou a ler seu livro.

“Um Livro Fantasma que cobre todas as características para descobrir as linhagens

com o objetivo de produzir excelentes descendentes... provavelmente é por causa desse livro

que a família Hurston teve sucesso na criação de cachorros. Ele certamente pode ser

considerado a prova do chefe da família.”

Huey se manteve em silêncio e assentiu.

Plantações, plantas de jardim, cães de caça, bichos de estimação, cavalos de corrida.

Incontáveis pessoas estão continuamente fazendo reprodução seletiva para obter indivíduos

melhores. E o lucro que os seguintes ganham é imenso. Produtores de cavalos de corrida

superiores podem ganhar quantidades inacreditáveis de dinheiro, apenas com as taxas de

cruza de seus cavalos.

Porém, isso tem a ver com seres vivos.

Não há garantia que os descendentes de pais superiores serão superiores também.

Existem problemas de compatibilidade e mutações. E também é possível que o filho só herde

as fraquezas de seus pais.

Mas se houvesse uma maneira de saber os resultados dos pares de cruza com

antecedência... Então, isso poderia ser visto como riqueza certa. Seria como um sonho para

pessoas vivendo da criação.

Mas, ao mesmo tempo isso significaria algo terrível.

Produzir confiavelmente tribos superioras também significa a destruição das tribos que

não são superioras.

Essa provavelmente era a razão pela qual “O Pedigree de Toda a Criação” foi selado.

Como um Livro Fantasma contendo conhecimento proibido, que não deveria existir

nesse mundo.

O chefe da família Hurston é o único escolhido que pode lê-lo uma vez na vida.

“Então, você acha que vai herdá-lo?”


Huey perguntou para Roy.

“É claro. Não tem mais ninguém qualificado.”

Roy disse sem hesitação. Não era um blefe. Ele estava cheio de pura confiança.

Roy subitamente apertou os olhos desagradados.

Dois homens, parecendo visitas, estavam andando num corredor da mansão. Roy

percebeu isso. Os dois estavam usando o mesmo tipo de roupa e irradiavam um tipo de

autoridade.

“Perdoe-me. Parece que a polícia veio de novo.”

Roy disse enquanto olhava para eles com olhos perversos. Huey achou suspeito.

“Polícia?”

“Para obter informação. Recentemente houve um incidente da família de um

advogado sendo massacrada. Tem um bando que está nos incomodando com rumores

infundados.”

Huey olhou pra ele ceticamente.

“Parece que o homem que foi assassinado enfrentou você no tribunal, certo?”

“Certo. É muito problemático. Graças a isso, nós somos suspeitos, mesmo ele tendo

sido mordido até a morte. Sabe, tem até uns rumores absurdos de uma besta gigante na cena

do crime...”

Roy não parecia se importar muito e sorriu.

“Bem, nós os deixamos investigarem a mansão o quanto quiserem. Não importa o

quanto procurem, eu não acho que eles vão encontrar um lobo monstro do tamanho de uma

vaca.”

Roy saiu com essas palavras e Huey olhou para ele silenciosamente. Então, pareceu ter

se lembrado de alguma coisa e virou para a garota vestida de preto.

Dalian tinha parado de ler e estava observando calmamente uma cama de flores.


A cerca estava decorada com ornamentos adoráveis e as gavinhas das rosas azuis

florescentes estavam torcidas ao redor dela.

“Rosas azuis...? Muito bonito.”

Huey falou com Dalian, depois de ter a visto admirando as rosas como se algo estivesse

fora do comum.

“Você sabe o significado da rosa azul na linguagem das flores, Huey?”

Dalian abriu a boca e disse subitamente sem mover um músculo. Huey balançou a

cabeça.

“Não, você pode me dizer?”

“Um objetivo inalcançável... ou alcançar o impossível.”

“... Alcançar o impossível?”

“Pigmentos azuis não existem em rosas. Não importa como você as combine,

estritamente falando, é impossível criar uma rosa azul.”

“Impossível você diz... mas, então, o que é isso?”

Huey tocou as rosas surpreso. A cor era realmente diferente, mas elas eram

definitivamente rosas. Camadas de pétalas adoráveis e espinhos nos caules.

Dalian assentiu descansada.

“Elas são rosas. Porém, os genes delas foram recombinados e a função de outra planta

foi adicionada para produzir pigmentos azuis. É uma rosa artificial...”

“Os genes...? É possível fazer isso...?”

“É impossível com o conhecimento e tecnologia da era atual. Mas existe uma coisa que

pode dar também esse conhecimento para a humanidade...”

“Os Livros Fantasmas que não deveriam existir nesse mundo... não é?”

Huey suspirou profundamente.


“Correto. Esse é o conhecimento proibido que o dono do ‘O Pedigree de Toda a

Criação’ obtém.”

Dalian murmurou e abaixou os olhos.

Huey pareceu ter percebido uma coisa e levantou o rosto.

“Dalian... se alguém com esse conhecimento é capaz de produzir tais rosas, ele

também poderia criar monstros que não deveriam existir? Por exemplo, um cão de caça

melhorado do tamanho de uma vaca e parecido com um lobo. Isso seria...”

“Correto. Provavelmente...”

Dalian respondeu rapidamente. Aparentemente, ela pensou na mesma coisa.

“Mas, quem faria tal coisa?”

“Eh?”

“O único ser vivo que já leu ‘O Pedigree de Toda a Criação’ é Boyd Hurston. Mesmo se

ele pudesse criar um monstro como esse, ele não poderia levá-lo para fora ou treiná-lo. Se

tivesse alguém que poderia fazer o trabalho...”

“Chez... mas ele não tem motivo para querer atacar o advogado Ashwell.”

Huey segurou o queixo e gemeu.

“O único que tem motivo é o irmão mais velho, Roy. Mas uma pessoa tão ocupada

teria tempo para treinar um monstro como esse...? Pra começar, como criá-lo para ficar tão

grande sem ser percebido? E onde escondê-lo? Trancá-lo seria suspeito demais.”

“Então... você acha que a família Hurston não tem nada a ver com a besta de Ashwell,

Dalian?”

Huey murmurou numa voz baixa.

Dalian ficou em silêncio por um momento, mas então respondeu:

“Nós falaremos sobre isso depois, Huey.”

Ela disse de repente, numa voz urgente.


Dava para ver suor aparecendo no macio rosto dela. Parecendo sentir perigo, Dalian se

virou abraçando o livro.

“Grh... a rota de fuga foi bloqueada.”

Os bonitos lábios dela tremeram e Dalian gemeu fracamente.

Cachorros estavam obstruindo o caminho dela.

Eles eram filhotes ainda menores do que aqueles com que Chez estivera brincando.

Dois que pareciam Spaniels estavam se aproximando de ambos os lados, balançando suas

curtas caudas.

A garota vestida de preto recuou lentamente, mas tropeçou na cama de flores e caiu

de cara pra cima.

Os filhotes pareceram achar que esse fosse um sinal de brincar e pularam alegremente

em cima dela.

“Ei, o que vocês estão fazendo? Parem com isso... Ah! Esse lugar não é bom. Não

lambam aí... o livro, não, o livro não é bom! Incorreto!”

O choro de Dalian ressoou no jardim ao entardecer.

Parte 5

Tarde da noite. Huey e Dalian foram guiados para um anexo da mansão.

A construção era feita de pedra calcária e fazia sentir a história da família Hurston. Essa

parte cinza-escura parecia ser a atual residência do chefe Boyd.

“Ah, vocês vieram...”

Boyd viu Dalian chegando e murmurou contente.

Além dele, apenas os irmãos Chez e Roy estavam no escritório do velho. Não havia

mordomos, nem qualquer servo.

“Obrigado por esperarem.”


A garota vestida de preto proclamou calmamente.

Ela estava carregando um livro velho embaixo do braço.

Mas não era um dos livros que ela pegou da mansão. A capa de couro havia ficado

mofada. A encadernação estava esplendidamente decorada com ouro. E o emblema gravado

no livro “O Pedigree de Toda a Criação”, esse era o título.

“Ooh... isso é exatamente... como aquela época...”

O velho estendeu suas mãos ossudas, mas então, desistiu e parou seus movimentos.

Livros Fantasma davam a seus leitores acesso a conhecimento proibido. Mas se alguém

possui um deles por tempo demais, isso causará várias distorções no mundo. Essa tendência é

ainda mais severa se alguém além do dono está segurando o livro. O velho sabe sobre isso. Ele

não é mais o dono do Livro Fantasma.

“Vovô... a passagem da herança da posição de chefe da família é importante, mas não

seria melhor fazer um anúncio público? E por que numa sala dessas...?”

Roy falou numa voz levemente irritada. Ele provavelmente não gostava de não saber

as intenções verdadeiras de seu avô.

Porém, o velho ignorou a pergunta de Roy.

“Pode abrir essa porta, Sir Disward?”

Huey pegou a maçaneta da porta que estava dentro do escritório, como instruído.

A espessa porta metálica abriu com um rangido alto. Atrás dela, havia uma escadaria

que levava para o subterrâneo.

“O que é isso...?!”

Dava para ouvir o sobressalto de Roy. E Chez estava escancarando os olhos.

As escadas não eram tão longas. A sala não estava completamente no subterrâneo,

parecia mais uma câmara secreta que era metade enterrada no chão. Comparada as outras

salas da mansão, aquela tinha metade do tamanho.


De um lado da sala sem janelas, produtos químicos estranhos estavam alinhados

organizadamente.

A sala estava cheia de incontáveis utensílios de experimento, como tubos de teste e

microscópios. Parecia mais o laboratório de um hospital ou universidade, do que a sala de

trabalho de uma família rica.

Roy gemeu, quando olhou pela sala enquanto descia as escadas com uma lâmpada de

óleo na mão.

“Eu nunca teria imaginado que havia um estabelecimento como esse embaixo do

anexo... o que é tudo isso, Vovô?”

“Uma sala construída, usando o conhecimento dado pelo ‘O Pedigree de Toda a

Criação’... é uma sala para cerimônias secretas proibidas.”

Boyd Hurston respondeu, com um leve sorriso.

Chez estava carregando o velho. Ele levantou seu avô junto com a cadeira de rodas e

desceu as escadas cuidadosamente. Ele era mais forte do que aquele corpo magro fazia

parecer.

“Nostálgico... não é...? Roy, Chez...”

O velho disse, cripticamente. Os dois irmãos se olharam ceticamente.

“É o lugar em que vocês foram criados!”

“O lugar em que nós fomos criados...? O que você quer dizer, vovô?”

Roy encarou ofendido o velho.

Ele sorriu.

“Nossa família está em contato com a Família Real, através dos cães... você sabe disso,

certo...?”

“Sim, é claro. É porque os cachorros criados por nós são excepcionais.”

Roy se estufou de orgulho. “Mhm” o velho assentiu.


“Nós não fomos instruídos apenas... para criar cachorros...”

“... O que quer dizer...?”

“É sobre um contrato secreto concluído durante a... época da antiga rainha... foi logo

depois da guerra na península no século passado. Já faz mais de sessenta anos...”

O velho fechou os olhos para reforçar a memória.

Na época da antiga rainha, o reino mandou seu exército para o continente europeu,

para lutar contra a Rússia, junto com outros países como França e Turquia. Essa ficou

conhecida como uma das guerras mais idiotas da história. Ela custou uma grande quantidade

de despesas de guerra e as vidas de incontáveis soldados, mas os países não conseguiram nada.

Foi realmente uma guerra tola.

E se sabe que as tropas do reino usaram cães de combate no campo de batalha.

É natural que a Família Real tenha contatado a família Hurston naquela época, pois

eles eram famosos criadores de cães.

“Vossa Majestade chorou... devido a grande perda... dos soldados desse país. O

mordomo não podia deixar ela assim e... consultou-me. Ele perguntou se não era possível

criar... soldados melhores e melhores como é feito com os cães... um novo tipo de humano...

com habilidades superiores... e que sobreviveria a qualquer campo de batalha, não

importando o quão cruel...”

“Criar... um novo tipo de humano...?”

Roy disse numa voz dissonante. Os ombros de Chez estavam tremendo de tanto medo.

A chama na lâmpada produzia uma sombra negra na face do velho.

“Quando eu herdei a posição de chefe da família Hurston... e descobri sobre a

existência de ‘O Pedigree de Toda a Criação’... eu percebi. Eu percebi que poderia conceder o

desejo da rainha... usando o conhecimento desse Livro Fantasma. É por isso que eu... construí

esse estabelecimento.”

Roy engoliu a saliva.

“Então... nessa sala...”


“Usando o conhecimento escrito no Livro Fantasma... eu examinei os genes de

milhares de pessoas... e produzi os seus pais. Eles, que nasceram com habilidades superiores...

foram adotados por pessoas que haviam perdido seus filhos na guerra, e viraram esplêndidos

adultos.”

Um sorriso louco apareceu na cara dele.

“Então, eu considerei que eles eram a primeira geração de novos humanos... e segui

para produzir a segunda... revisando mais uma vez os genes dos seus já superiores pais... um

novo tipo de humano que teria a habilidade de ser um soldado perfeito... o sucessor da família

Hurston...”

O longo monólogo do velho acabou. E então:

“Maravilhoso...!”

Roy estendeu os braços e olhou para o teto. Todo o corpo dele estava tremendo numa

emoção profunda.

“Então sou eu, Roy Hurston! Um novo humano melhorado, nascido como uma espécie

superior...!”

Porém, o velho o interrompeu com sua voz rouca.

“Oh, não... Roy... não é você.”

Roy ainda estava olhando para o teto, mas seu rosto assumiu um ar perplexo.

“... O quê?”

“Você não herdou... a nova característica... que eu buscava...”

Ouvindo as palavras frias de seu avô, a aparência de Roy ficou nervosa.

“O que você está dizendo... Vovô?! Essas minhas habilidades superioras não são a

prova de um novo tipo de humano?”

Roy chegou mais perto nervosamente, mas o velho nem sequer pensou em responder

a ele.


“Aquele apropriado para ser o chefe da família Hurston... meu sucessor... é você...

Chez.”

O velho virou. O rosto do jovem, que geralmente sorriu timidamente, endureceu

subitamente.

Roy estava do lado dele e apontou para seu irmão mais novo.

“Que absurdo... Vovô, você está dizendo que eu sou inferior a alguém como Chez?!

Não tem como uma coisa tão absurda ser verdade!”

“Você... é meramente um humano comum que é um pouco esperto. Você não é nada

parecido com um novo tipo de humano.”

O velho falou sem piedade.

“Roy... você é apenas um fracasso.”

Roy ficou tonto e parou lá.

“Um fracasso... eu sou... só um fracasso...?!”

Roy murmurou as palavras duras de seu avô e recuou até a parede.

No meio do caminho, a perna dele bateu numa cadeira, ele caiu, foi enterrado em

tubos de teste e jarros químicos, e finalmente se afundou no chão. Depois de ter olhar em

choque o velho, ele começou a chorar.

O fato de que o irmão, que ele considerava inferior, que havia roubado a posição de

chefe da família, o afetou de tal forma.

Chez tirou os olhos de seu irmão e encarou o velho.

“Por favor, espere Vovô. Não tem como eu servir pra...”

“Não se faça de bobo... é inútil, Chez... eu te conheço melhor... que qualquer outra

pessoa. A característica da nova humanidade que eu estava procurando é a habilidade que

você está tentando esconder tão desesperadamente...”

Chez deu um passo atrás, pesadamente. Abraçando seu próprio ombro em medo, ele

deu outro passo. O velho estendeu a mão como se quisesse tentá-lo.


“Certo, Chez... agora aceite o Livro Fantasma... e então espalhe sua raça pelo país

inteiro! Essa é a sua função. É uma honra que foi dada a você por nós, a família Hurston!”

“Não...”

Chez interrompeu seu avô com sua voz tímida.

“Chez?”

O velho abriu sua boca surpreso.

“Eu não desejo coisas como um Livro Fantasma ou conhecimento proibido... você só

está brincando com a vida e a morte!”

“O quê...? O que você está dizendo, Chez? Você, o primeiro e único sucesso...”

“Sucesso e fracasso na existência...? Você não tem o direito de decidir isso. E ainda

mais, você não tem o direito de abandonar um trabalho fracassado como liso.”

Chez rangeu os dentes.

“Eu admito que o talento não é dado igualmente para os humanos. Porém, não existe

ninguém que seja superior aos outros em tudo! Uma raça de cachorros criada através de

cruzamentos irracionais pode ter habilidades tremendas. Mas ela também tem pelo menos

uma grande fraqueza em outro aspecto.”

“Espere... Chez... me escute...”

O velho falou com receio. Porém, Chez apenas balançou a cabeça com um sorriso

gentil.

“Vamos acabar com essa história do chefe da família, Vovô! Como foi até agora, meu

irmão pode cuidar da fábrica e da mansão, e eu vou continuar a cuidar dos cachorros...”

“Chez...!”

O velho estava persistindo em seu desejo, e seu neto estava tentando persuadi-lo.

Huey observava a briga deles, sem falar.


Dalian estava olhando para o Livro Fantasma em seus braços e parecia entediada. Mas

subitamente, uma leve perturbação pode ser vista nos olhos dela.

Uma leve luz brilhou através do Livro Fantasma, fechado na sala subterrânea escura. O

Livro Fantasma estava emitindo poder mágico.

“Dalian...?”

Percebendo essa anormalidade, Huey se virou. Então o rosto dele se contorceu em

surpresa.

“Abaixe-se, Dalian!”

“Hã?!”

Levando a garota vestida de preto com ele, Huey se jogou no chão com grande vigor.

Logo depois disso, um disparo com intenção assassina passou por cima das cabeças

deles.

O tiro ressoou na sala subterrânea. Faíscas voaram dentro das trevas e o cheiro da

pólvora se espalhou.

“Irmão?!”

Chez gritou numa voz estridente.

Roy havia se levantado. Ele jogou a lâmpada de óleo no chão, pegou a pistola que ele

havia escondido e mirou.

“Chez...”

Uma voz distorcida escapou da boca de Roy.

“Você pensou que eu ficaria feliz com uma conclusão como essa, Chez...? Vivendo

como um trabalho fracassado e pedindo por sua simpatia...?”

Chez estava a ponto de chorar, mas ainda assim levantou sua voz desesperadamente.

“Por favor, espere, irmão... eu não...!”


“Cale a boca!!”

Roy puxou o gatilho sem hesitação. Uma luz branca brilhou no escuro.

“Ghuh...!”

Era o velho na cadeira de rodas que havia caído pra frente com um gemido baixo. Uma

mancha negra estava se espalhando ao redor do lugar onde o peito foi atingido e coágulos

sanguíneos saiam de dentro da boca dele.

“HAHAHA! Que aparência ridícula. Isso é pelo pecado de me chamar de fracasso.

Pague com sua vida, seu velho maldito!”

Roy riu alto.

Chez ficou pálido e abraçou o corpo de seu avô.

“Irmão... o que você fez...?”

“Fique quieto... essa garota é a próxima. Livro Fantasma? Biblioprincesa? Meu rabo!”

Depois de se virar, Roy apontou sua arma para Dalian.

“Ugh!”

Huey a protegeu ficando na frente e pegando sua própria pistola. Era um revólver

militar de largo calibre. Porém, Roy já havia preparado sua arma e seria mais rápido. Huey não

chegaria a tempo.

No momento desse pensamento-

“Pare!”

Chez pulou entre eles. Numa postura para proteger Huey e Dalian, ele recebeu a bala

que seu irmão tinha atirado. Uma bala, duas balas...

“Chez!”

Eventualmente a pistola de Huey abriu fogo antes de Roy executar seu terceiro tiro. E a

bala acertou o pulso da mão que Roy estava usando para segurar sua arma, com uma rota

exata.


Roy gritou como um animal. O braço direito dele se balançou sem força, e a pistola

manchada de sangue caiu.

“M... mwu braço... ghu... seu filho da puta... atirando no meu braço...!”

“Não se mova, Roy Hurston.”

Huey engatilhou a arma novamente, e avisou a Roy com palavras claras. O rosto dele

se contorceu em desgraça.

Huey olhou ao redor, enquanto mantinha a arma na mão sem negligência.

O fogo da lâmpada que Roy tinha deixado cair, havia colocado fogo no carpete e

iluminado a pequena sala subterrânea com uma luz brilhante.

O velho já havia morrido, mas Chez ainda estava respirando. Com tratamentos de

primeiros-socorros, ele poderia sobreviver. Porém, primeiro seria necessário amarrar o Roy,

mas quando Huey estava prestes a andar na direção dele:

“Para trás, Huey!”

Dalian gritou numa voz alta.

Ao mesmo tempo, um fedor intenso chegou ao nariz dele. O fogo havia atingido os

produtos químicos mantidos nessa sala. No momento que Huey percebeu isso, uma luz

brilhante seguida por uma explosão terrível veio na direção deles, e o campo de visão dele foi

coberto pela escuridão.

Parte 6

Parecia que Huey não havia perdido a consciência por muito tempo.

O sono dele desapareceu, devido a uma pessoa dando tapas fortes em suas bochechas.

“Ei, Huey! Quanto tempo você planeja dormir? Sua preguiça de três dedos! Perder a

consciência é sua única habilidade? Quão incapaz é você?”


Enquanto balançava seu longo cabelo negro, ela continuava a bater nas bochechas

dele com a palma da mão. Apesar das palavras dela serem rudes, ela parecia desesperada e os

olhos dela estavam prestes a se encher de lágrimas.

“Isso está doendo... Dalian...”

Huey pegou o braço dela e se levantou. Segurando a cabeça, ainda tonto, ele foi

checar o dano causado pela explosão.

A condição da sala subterrânea era terrível.

Um incêndio havia sido evitado, mas devido à explosão, os pilares sustentando o

telhado caíram e a sala estava parcialmente destruída.

O corpo do velho estava espremido junto com sua cadeira de rodas pelo entulho e Roy

não podia ser visto.

Era quase estranho que Huey e Dalian ainda estivessem vivos.

“Isso é...”

Huey engatilhou sua pistola reflexivamente.

Uma besta estava lá no escuro.

Ela tinha olhos dourados como os de um carnívoro noturno. Um nariz pontudo e

dentes afiados alinhados em sua boca.

O corpo dela estava coberto de cerdas, duro como uma armadura, ela tinha músculos

fortemente desenvolvidos e parecia ser mais que duas vezes maior que Huey.

Uma besta do tamanho de uma vaca e parecendo um lobo...

Era a Besta de Ashwell, sem dúvida. A besta que fora vista na cena da morte do

advogado.

Porém, Dalian entrou na frente da arma de Huey.

“Espere, Huey! Você não deve atirar!”

A garota vestida de preto abriu os braços para proteger a besta.


Vendo isso, Huey finalmente percebeu.

A besta não atacou Dalian. Era o oposto. A besta estava sustentando o teto caído com

suas costas e tentava salvá-los de serem enterrados vivos.

Então, Huey viu os pedaços de roupa presos na parte inferior do corpo da besta.

Era um terno americano. A roupa que Chez estava usando.

“Você é... Chez Hurston...? Essa aparência...”

Huey guardou a arma e Dalian se virou sem expressão.

A criatura gigante, que já fora chamada de Chez Hurston, respirou através de sua boca

partida.

“Eu sempre... achei que fosse estranha... minha aparência... meu corpo...”

As palavras da criatura estavam distorcidas e difíceis de entender, mas era a voz de

Chez. Ele apertou os olhos em autoescárnio.

“Mas eu entendi pela explicação do Vovô... eu sou uma raça melhorada, criada pelas

mãos dele... através da recombinação de genes humanos e experimentos científicos...”

Lágrimas fluíram pelos olhos dourados de Chez. Huey e Dalian não disseram nada e

apenas assistiram ele se lamentar. Bestas não choram. Apenas humanos podem derramar

lágrimas de tristeza.

“O soldado perfeito que sobrevive em qualquer campo de batalha... ESSA é a resposta

criada pelo conhecimento desse LIVRO FANTASMA?! ESSA é a forma da nova humanidade que

o Vovô procurava?!”

A criatura gritou. Sangue fresco fluía de sua boca. Ao mesmo tempo, Chez tropeçou,

alguns dos entulhos que ele estava sustentando caíram.

Chez havia sido atingido por Roy. Era um ferimento profundo que teria matado um

humano comum.


O corpo dele poderia ser especialmente forte devido a sua transformação, mas isso

não mudava o fato dele estar sustentando um grande número de tijolos com seu corpo para

protegê-los. Não parecia que ele poderia continuar isso por muito tempo.

Huey mordeu os lábios e olhou para os tijolos acima dele.

Porém, não havia abertura grande o bastante para um humano passar. E se ele se

movesse muito, então tudo poderia perder o equilíbrio e eventualmente até o pequeno

espaço sustentado por Chez desapareceria.

Chez levantou o rosto com uma respiração forte, parecendo ter sentido um cheiro.

Huey e Dalian também reconheceram esse cheiro imediatamente. Era gasolina.

Um homem ferido e manchado de sangue veio carregando um jarro de gasolina e a

derramou na sala subterrânea destruída.

Era Roy que contorcia seu rosto com ódio e derramava gasolina em cima deles.

E, em sua mão, estava um isqueiro. Roy havia conseguido escapar da sala e agora

estava prestes a colocar fogo em tudo para cozinhá-los vivos, enterrados nessa sala.

“Ugh... Irmão... não me diga...”

A criatura deixou escapar uma voz desesperada.

Roy acendeu o isqueiro em sua mão esquerda desajeitada.

A chama iluminou seu rosto terrivelmente distorcido. Quando Roy estava prestes a

jogar o isqueiro acendido...

“Huey. Eu te concedo o direito de abrir o portão.”

Dalian proclamou numa voz calma.

Ela levou a mão ao colarinho e abriu o vestido na parte de seu peito.

Um pescoço fino com pele branca macia foi exposto. Lá havia uma tranca. Uma velha

tranca. Ela estava acorrentada por correntes prateadas a um colar de couro negro e enterrada

no meio do peito da garota.


“...”

Huey levantou sua mão direita sem palavras.

Em sua mão ele estava segurando uma chave. Uma chave dourada com uma joia

vermelha.

Letras antigas estavam encravadas nela.

Huey as leu alto, pacificamente.

Como um cavaleiro jurando lealdade a sua princesa. Ou como um mago fazendo um

feitiço.

“Eu pergunto de ti... Eres tu, humanidade?”

Dalian respondeu ao chamado dele.

Numa voz fria e robótica, como a de um utensílio.

『Não. Nós sóis o Reino -- o Reino Infinito dentro deste teu Pequeno Recipiente. 』

Foi no mesmo momento, que o jovem inseriu a chave dourada dentro da tranca diante

do peito dela, e que Roy jogou seu isqueiro.

Uma luz tremenda encheu a sala subterrânea e chamas iluminaram as trevas.

Parte 7

Roy Hurston gargalhou, enquanto olhava para os restos da sala queimada e destruída.

Seu riso parou subitamente.

Ele sentiu alguma coisa atrás de si, virou e viu eles.

Pétalas de rosa azul estavam dançando na luz da lua escarlate que refletia as chamas.


Cercados por essas pétalas estavam um jovem carregando um livro estranho, uma

garota de cabelo preto usando um vestido preto aberto e finalmente uma besta que parecia

um lobo.

“Isso é absurdo... como vocês podem...”

Roy gritou com toda a força.

“Por quê?! Como vocês escaparam?! Não havia nenhum buraco grande o bastante

para passar!”

“Me desculpe, mas sabe... Livros Fantasma que abrem o portão para outro mundo

não são tão raros.”

O jovem, Huey, murmurou e fechou o livro que estava segurando silenciosamente.

Nem sequer havia qualquer significância em Roy saber que esse era um dos Livros

Fantasma que não deveriam existir nesse mundo. Esse era o grimório deixado para trás, por

um mago que adorava um deus chamado de “O Deus do Exterior”, que morava nos espaços

entre as dimensões.

“Foi você que matou o advogado Ashwell, não foi? Roy Hurston.”

Dalian disse numa voz indiferente, enquanto observava o perplexo Roy.

“O que você está dizendo a essa altura...?”

Roy riu sem alegria. Ele olhou triunfante para a criatura atrás da garota.

“Olhe para essa aparência horrenda do Chez! Vocês não veem que esse é o monstro

que foi visto na mansão Ashwell? Esse MONSTRO!”

“O monstro aqui é esse seu coração maligno.”

Dalian declarou friamente.

“O quê...?!”

“Quando nós conversamos com você no jardim, você disse que Ashwell tinha sido

mordido até a morte. Mas você falou que a besta gigante vista na cena do crime era um

‘rumor absurdo.’”


Roy ficou aturdido e arregalou os olhos. O rosto dele falava por ele. Ele nem conseguia

acreditar no que tinha deixado escapar.

“Então você sabia, Roy... que não foi uma besta gigante que matou os Ashwells, e sim

cães de combate treinados.”

Huey continuou as palavras de Dalian.

“Havia apenas algumas pessoas nessa cidade que desejavam a morte de Ashwell. E não

deve ser difícil chegar a você, se investigarem as pessoas que treinam cães de combate por

aqui. Chez tentou parar você. Eu acho que ele teve que se transformar para invadir a mansão...

ou... para cobrir pelo irmão dele, você...”

Depois de ouvir a explicação de Huey, o rosto dele se distorceu em um sorriso

estranho enquanto chorava.

O irmão mais novo que ele achava inferior havia acobertado as ações dele

secretamente. Ele percebeu esse fato.

“Sim, é isso mesmo... fui eu quem matou Ashwell, levando alguns cachorros comigo.

Originalmente eu estava planejando culpar cachorros selvagens pelo assassinato, mas... eu

nunca pensei que isso faria tanta bagunça.”

Roy colocou a mão no bolso de seu casaco e pegou uma faca que havia escondido lá.

Era uma faca grande, do tipo usado para duelos.

“E agora, eu nem posso mais escapar do assassinato do Vovô. Entendo. Então eu era

realmente só um fracasso. Uma besta horrível se alojou dentro do meu coração.”

Roy continuou encarando eles e segurando a faca com força. Vendo isso, Chez saltou.

“Pare com isso... Irmão!”

Com agilidade inacreditável, a criatura aterrissou na frente de Roy.

Mas Roy foi mais rápido. Ele colocou a lâmina no abdômen e cortou ele em um

movimento.


Chez gritou. Sangue fresco voou do corpo de Roy, e ele caiu com o fogo que se

espalhava, cobrindo ele.

“Irmão...”

A criatura gigante estendeu a mão para as chamas e estava prestes a abraçar o corpo

de seu irmão.

As costas dele tremeram.

Um disparo ressoou e perfurou o ombro da criatura.

Dalian parou aturdida, enquanto Huey mordeu os lábios e se virou.

Alguns homens, usando casacos longos, haviam percebido o fogo, escalado a cerca e

agora estavam apontando as armas para Chez. Huey os reconheceu.

“A polícia...?! Os caras que observavam o Roy! Por que numa hora dessas?!”

Huey tentou gritar para eles pararem, mas os homens não ouviram.

“É a besta... a Besta de Ashwell apareceu!”

“O Sr. Hurston está sendo atacado! Atirem...!”

Chez ficou de joelhos enquanto os tiros ressoavam continuamente. Mesmo assim ele

não largou o corpo de seu irmão. Juntando toda a força que tinha, ele estava prestes a sair

daquele lugar. Chez estava tentando escapar para a escuridão.

Se Huey e Dalian continuassem em silêncio, então ninguém jamais saberia que o velho,

agora enterrado em baixo de incontáveis tijolos, havia sido morto pelo Roy. O que restava era

carregar o corpo de Roy.

Se não houvesse o corpo dele, então toda a culpa iria para a “Besta de Ashwell”.

O assassinato do advogado, a destruição da casa, tudo.

Não pela família Hurston, mas para proteger a honra de Roy.

Chez estava planejando carregar toda a má reputação.


“Espere, Chez!”

E Dalian chamou o nome da criatura. A garota vestida de preto mostrou um livro para

ele.

O Livro Fantasma proibido que apenas o chefe da família Hurston tem permissão de ler.

“O Pedigree de Toda a Criação”!

“Esse Livro Fantasma escolheu você como dono! Com o conhecimento escrito nele,

não deve ser impossível fazer seu corpo voltar ao normal... então, por favor... leve ele com

você.”

A besta negra balançou a cabeça em resposta ao grito dela.

Então ela sorriu timidamente, ou foi o que pareceu.

Com uma força instantânea inacreditável, a criatura escalou a parede da mansão e

fugiu deles. Mas ainda assim, várias balas o perfuraram.

“Chez...”

Dalian largou o livro, que caiu ao chão.

As rosas azuis estavam sendo consumidas pelas chamas.


Finalmente, a besta gigante ferida se misturou as trevas e desapareceu.

Parte 8

Na manhã seguinte, Huey e Dalian estavam andando num trem para a capital.

Não havia muitos passageiros, provavelmente porque ainda era cedo. Os dois eram os

únicos naquele vagão.

Dalian estava obviamente de mau humor e lia um livro, sozinha.

Ela não estava muito entusiástica, já que a velocidade de leitura dela estava muito

menor que o normal. Até o pão frito, ela só havia comido a porção de duas pessoas.

Huey estava sentado no banco oposto e estava lendo o jornal comprado na estação de

trem. O trem acelerou lentamente e o sol da manhã brilhou diagonalmente pela janela.

“Parece que não conseguiram encontrar o corpo do Chez.”

Huey murmurou subitamente, enquanto segurava o tabloide.

Metade do artigo no jornal barato local estava cheio do tópico da “Reaparição da

Besta de Ashwell”. Toda a força policial cercou a besta e, apoiada pelos caçadores, circulou ela.

Então eles atiraram nela com incontáveis balas, e a besta caiu do penhasco. A morte da besta

foi tomada como garantida, mas parecia que eles não haviam encontrado o corpo mesmo

procurando até a manhã.

O resto do artigo era sobre Roy Hurston que foi assassinado pela besta. Suas

conquistas como membro do conselho da cidade e duas capacidades foram altamente

elogiadas. Chez só foi mencionado numa pequena coluna como vítima.

“... Eu não quero falar sobre esse cachorro estúpido.”

Dalian disse, enquanto levantava o rosto com uma voz aborrecida.

“Eu estava fazendo a ele um favor, entregando o livro e esse cachorro estúpido

escolhe carregar um corpo. Porque ele não podia carregar o corpo junto com o livro... eu não

sei mais sobre esse idiota... é por isso que eu odeio cachorros.”


A garota vestida de preto levantou os olhos com uma atitude irritada e olhou para o

céu pela janela. O aborrecimento, de algum modo, fazia parecer que ela estava segurando as

lágrimas.

Huey sorriu levemente.

“Minha opinião é um pouco diferente, eu acho.”

“... E qual é?”

Dalian pareceu ofendida quando perguntou.

“Não é que o Chez não queria o Livro Fantasma. Ele não queria que você ficasse no

meio da luta. Ele não queria te ferir!”

“Qualquer que seja a razão, um idiota é um idiota.”

Dalian ficou ainda mais mal-humorada. Ela levantou as sobrancelhas e fez uma careta

para Huey.

“E você é 100 anos jovem demais para dizer sua opinião para mim, apesar de ser

apenas Huey.”

Depois dessas palavras duras, Dalian fechou o livro. Então ela pegou o pão de Huey e

começou a comê-lo.

“Ora, ora.” Huey deu de ombros. Então ele se lembrou de uma coisa e pegou um

objeto de seu casaco. Era uma pequena flor cortada.

Huey esticou sua mão com agilidade e decorou um vaso com ela.

Era um broto que estava prestes a florescer com pétalas azuis.

“Você levou essa rosa com você?”

Dalian perguntou com a boca cheia de pão.

“Só havia uma sobrando.”

Huey dobrou o jornal e olhou para o lado de fora.


E disse como se falasse sozinho.

“Você pode ficar tranquila. Se ele ainda estiver vivo, ele virá nos encontrar com

certeza! Para aceitar o livro.”

Dalian olhou a rosa azul sem expressão e balançou a cabeça.

“Afinal, é só um ‘objetivo inatingível’.”

Huey sorriu e disse brincando.

“Não... é ‘alcançar o impossível’, certo?”

A flor que era a única restante no mundo estava silenciosamente se banhando no sol

da manhã.

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