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Disciplina: Fundamentos de Meteorologia (EAM-010) – Prof. Marcelo de Paula Corrêa – v.1.0.1 Universidade Federal de Itajubá – Instituto de Recursos Naturais 1 CAPÍTULO 2 – RADIAÇÃO SOLAR E TERRESTRE 2.1. O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO O espectro de emissão do sol apresenta intensas variações decorrentes da absorção dos componentes atômicos, como hidrogênio, magnésio, alumínio, etc., presentes na atmosfera solar. Esses espectros de absorção são denominados Linhas de Fraunhofer , em homenagem ao seu descobridor Joseph Fraunhofer (1887-1826), e permitem analisar a composição química do Sol à distância. A emissão ou absorção de um fóton por um átomo se realiza quando um elétron muda de órbita. A emissão ocorre se o nível de energia da órbita de chegada é menor que o do nível de partida, com o contrário ocorrendo na absorção. Quando o equilíbrio termodinâmico é atingido, ou seja quando o fluxo de energia emitido é igual ao absorvido, o elemento passa a atuar como um corpo negro. No caso da fotosfera, a temperatura decresce com a altitude e, portanto, um fóton que escapa atravessa um meio mais frio. Desse modo, ele será absorvido por átomos em temperatura inferior e, por conseqüência, com taxas de emissão inferiores. Há, portanto, um déficit que pode ser traduzido por uma absorção. Pode-se dizer que o Sol emite energia em, praticamente, todos os comprimentos de onda do espectro eletromagnético (figura 2.1) permeados pelas diversas linhas de absorção. 44% de toda essa energia emitida se concentra entre 400 e 700 nm (obs: 1 nm = 10 -9 m), denominado espectro visível de energia (tabela 2.1). O restante é dividido entre radiação ultravioleta (< 400nm) com 7%, infravermelho próximo (entre 700 e 1500nm) com 37% e infravermelho (> 1500nm) com 11%. Menos de 1% da radiação emitida concentra-se acima da região do infravermelho, como seja, microondas e ondas de rádio , e abaixo da região ultravioleta, como raios X e raios γ . Vermelho Laranja Amarelo Verde Azul Violeta 780 622 622 597 597 577 577 492 492 455 455 390 Tabela 2.1 - Comprimento de onda aproximado das cores no espectro visível (em nm) Figura 2.1 - O espectro eletromagnético

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Universidade Federal de Itajubá – Instituto de Recursos Naturais

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CAPÍTULO 2 – RADIAÇÃO SOLAR E TERRESTRE

2.1. O ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO

O espectro de emissão do sol apresenta intensas variações decorrentes da absorção dos componentes

atômicos, como hidrogênio, magnésio, alumínio, etc., presentes na atmosfera solar. Esses espectros de

absorção são denominados Linhas de Fraunhofer, em homenagem ao seu descobridor Joseph Fraunhofer

(1887-1826), e permitem analisar a composição

química do Sol à distância. A emissão ou

absorção de um fóton por um átomo se realiza

quando um elétron muda de órbita. A emissão

ocorre se o nível de energia da órbita de chegada é

menor que o do nível de partida, com o contrário

ocorrendo na absorção. Quando o equilíbrio

termodinâmico é atingido, ou seja quando o fluxo

de energia emitido é igual ao absorvido, o

elemento passa a atuar como um corpo negro. No

caso da fotosfera, a temperatura decresce com a

altitude e, portanto, um fóton que escapa atravessa

um meio mais frio. Desse modo, ele será

absorvido por átomos em temperatura inferior e,

por conseqüência, com taxas de emissão

inferiores. Há, portanto, um déficit que pode ser

traduzido por uma absorção. Pode-se dizer que o

Sol emite energia em, praticamente, todos os

comprimentos de onda do espectro

eletromagnético (figura 2.1) permeados pelas

diversas linhas de absorção. 44% de toda essa energia emitida se concentra entre 400 e 700 nm (obs: 1 nm =

10-9 m), denominado espectro visível de energia (tabela 2.1). O restante é dividido entre radiação ultravioleta

(< 400nm) com 7%, infravermelho próximo (entre 700 e 1500nm) com 37% e infravermelho (> 1500nm)

com 11%. Menos de 1% da radiação emitida concentra-se acima da região do infravermelho, como seja,

microondas e ondas de rádio, e abaixo da região ultravioleta, como raios X e raios γ.

Vermelho Laranja Amarelo Verde Azul Violeta 780 622 622 597 597 577 577 492 492 455 455 390

Tabela 2.1 - Comprimento de onda aproximado das cores no espectro visível (em nm)

Figura 2.1 - O espectro eletromagnético

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É importante lembrarmos que a radiação emitida pelo sol, assim como toda radiação

eletromagnética, viaja a velocidade da luz, isto é, aproximadamente, 300.000 km/s. Deste modo, pode–se

estabelecer uma relação entre a velocidade da luz (v [m/s]), o comprimento de onda (λ [m]) e a freqüência da

onda (f [Hz]):

v f= λ (2.1)

2.2. GRANDEZAS RADIOMÉTRICAS

Nesta seção vamos conhecer algumas das grandezas mais usuais do estudo da radiação.

a) Fluxo (F): É a potência radiante. Ou seja, é quantidade de energia (U) observada (ou detectada) por

unidade de tempo. (Unidade: W, que corresponde a J/s)

UFt

Δ=Δ

(2.2)

b) Intensidade (P): É o quociente entre o fluxo observado associado a um dado feixe, num dado ponto do

espaço, e o ângulo sólido correspondentes à origem ou ao destino deste fluxo. (Unidade: W/sr)

UPtΔ

=Δ ΔΩ

(2.3)

Mas o que é o ângulo sólido ?

Um ângulo plano (α) corresponde a um arco de comprimento L sobre um círculo de raio R, tal que α = L/R

radianos. Por analogia, um ângulo sólido (Ω) corresponde a uma superfície de área A sobre uma esfera de

raio R, tal que Ω = A/R2 ster–radianos. A figura 2.2 mostra uma representação do ângulo sólido.

figura 2.2 - Ângulo sólido

c) Irradiância (I): É o quociente entre o fluxo observado num certo elemento de superfície de área deste

elemento. (Unidade: W/m2).

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UIt AΔ

=Δ Δ

(2.4)

No caso de irradiância emitida por uma fonte, denominamos de emitância (E).

d) Radiância (L): É uma medida da quantidade de radiação, recebida por um ponto ou emitida por

uma fonte, em uma determinada direção. Isto é, é o quociente entre a intensidade observada num certo

elemento de superfície, numa dada direção, e a área da projeção ortogonal deste elemento de superfície num

plano perpendicular à direção tratada. (Unidade: W/m2sr)

PLA cos

=Δ θ

(2.5)

Substituindo 2.3 em 2.5, tem–se que:

U L t A cosΔ = Δ Δ ΔΩ θ (2.6)

Por exemplo, se numa determinada situação a radiância é constante, então a quantidade de energia vai

diminuir (ΔU < 0), quando: 1) a duração do fluxo for menor (Δt < 0); ou 2) quando a área diminuir (ΔA < 0);

ou 3) quando o ângulo sólido for mais estreito (ΔΩ < 0); ou ainda, 4) quando o ângulo de inclinação do feixe

se aproximar do horizonte (θ for pequeno).

Figura 2.3 – radiância

e) Dose (D): Integrando-se a irradiância durante um certo intervalo de tempo obtém-se a dose total de

energia recebida por um certo alvo. (Unidade: J/m2)

t

D Idt I tΔ

= Δ∫ (2.7)

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ER 2.1. Uma estrela de raio R tem certa temperatura T. Essa estrela emite energia a uma taxa igual a Eo

W/m2, de forma isotrópica para todo espaço. Calcule o fluxo e a intensidade de energia emitida por essa

estrela.

Resolução

Supondo que a estrela seja uma esfera, um observador receberá a energia emitida por um círculo de área A =

4πR2.

Das equações 2.2 e 2.4, temos que o fluxo será dado por: 2o o2

F FI I F E 4 RA 4 R

= ⇒ = ⇒ = πΔ π

Das equações 2.2 e 2.3, tiramos que a intensidade é dada por: FP =ΔΩ

Como o ângulo sólido é um círculo completo, temos que ΔΩ = 4π, então: P = EoR2.

2.3. INTERAÇÃO DA RADIAÇÃO COM OS MATERIAIS

A radiação solar interage com os elementos que compõem a atmosfera terrestre, tais como

moléculas, gases, nuvens, aerossóis, etc., e, também, com aqueles que estão sobre a superfície terrestre. Isto

é, quando a radiação solar atinge o topo da atmosfera e viaja até a superfície, sofre atenuações devidas às

interações com estes elementos. Deste modo, definimos a atenuação como a subtração de uma fração de

energia do fluxo incidente.

A atenuação se dá por meio da absorção ou do espalhamento da radiação em outras direções que não

a do alvo em superfície. A absorção é a fração subtraída do fluxo incidente que é incorporada à energia

interna do meio atravessado. Portanto, parte da energia é retirada do feixe, causando um aumento da energia

interna do elemento de volume (Por esse motivo, é relacionada ao aquecimento de camadas atmosféricas). O

espalhamento é a fração subtraída do fluxo incidente que é re-irradiada para diferentes direções do espaço.

Parte da radiação não sofre nenhum tipo de interação e é inteiramente transmitida, através do volume de

matéria, no mesmo sentido do feixe incidente.

Na figura 2.4 temos um esquema dessas interações com base na energia solar atravessando a

atmosfera terrestre.

Figura 2.4 – atenuação da radiação incidente por um elemento de matéria

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No entanto, os corpos que absorvem radiação, emitem parte da mesma em diferentes comprimentos

de onda. Deste modo, a radiação recebida pelo alvo sofre um acréscimo de energia devido a emissão do

elemento de matéria.

Figura 2.5 – interação entre a radiação incidente e um elemento de matéria

Finalmente, o elemento de matéria também pode receber energia de outras fontes e espalhar esta

energia na direção do alvo. Desta forma, a radiação que atinge o alvo receberá um incremento de energia e

temos a seguinte configuração:

Figura 2.6 – interação entre a radiação incidente e um elemento de matéria (2)

Assim, num caso típico da radiação solar atravessando a atmosfera, a radiação medida em um

determinado alvo à superfície é dada pela relação:

alvoR RI RE RA RM RO= − − + + (2.8)

2.3.1. O espalhamento de radiação solar na atmosfera terrestre

Parte da radiação solar que atravessa a atmosfera é espalhada, ou seja, tem sua direção e sentido

desviados por moléculas e partículas presentes no caminho óptico. A natureza do espalhamento depende do

tipo de agente que realiza tal fenômeno. Isto é, o espalhamento causado por uma molécula de um gás tem

características distintas do espalhamento causado por um aerossol ou por uma gotícula de nuvem. Além do

agente causador, o espalhamento também vai depender do comprimento de onda da radiação. Por exemplo, a

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radiação ultravioleta é espalhada com mais intensidade por uma molécula do que a radiação visível. Deste

modo, a medida do espalhamento vai depender destes dois fatores: o comprimento de onda e a natureza do

agente espalhador.

Espalhamento Rayleigh é nome dado ao espalhamento de radiação por partículas muito pequenas, de

forma que o comprimento de onda da radiação incidente seja muitas vezes maior do que a dimensão da

partícula (r << λ). Esse tipo de fenômeno para radiação solar é geralmente promovido por moléculas e micro-

partículas em suspensão na atmosfera e, por esta razão, é também chamado de espalhamento molecular. Esse

tipo de interação começou a ser estudado no século XIX, por Lord Rayleigh (1842-1919), em virtude de

observações da luz e da coloração do céu. No espalhamento Rayleigh a intensidade do espalhamento

molecular é inversamente proporcional à quarta potência do comprimento de onda. Esta relação é a

responsável pela coloração azul do céu. Apesar de a cor violeta apresentar o menor comprimento de onda e,

portanto, a melhor eficiência de espalhamento, é a cor azul que se faz notar com maior facilidade. Isso

acontece pois a radiação de cor azul é transmitida com maior facilidade através da atmosfera e, também, por

que o olho humano é mais sensível à comprimentos de onda próximos do azul.

No caso de partículas maiores, como aerossóis e gotas em nuvens, o espalhamento recebe o nome de

espalhamento Mie, devido ao tratamento físico e matemático adotado para o fenômeno. Ao contrário dos

gases, o espalhamento da radiação por partículas possui um grau de complexidade maior. Por exemplo, a

variabilidade das características físico-químicas dos aerossóis é tamanha que não se pode generalizar o

conhecimento adquirido sobre a forma do espalhamento e suas dependências com o comprimento de onda.

Um exemplo dessa heterogeneidade é apresentado na tabela 2.2 com uma divisão simplificada das quatro

categorias básicas de partículas em suspensão na atmosfera:

Nome Raio Forma Índice de refração Aerossóis 0,1 – 1 μm irregular altamente variável

Gotas (nevoeiro) 0,1 – 1 μm esférica Conhecido Gotas (chuva) 1 – 10 μm esférica Conhecido

Cristais de gelo 1 – 100 μm irregular Conhecido Tabela 2.2 - Características das partículas em suspensão na atmosfera

O tratamento matemático do espalhamento Mie se baseia na hipótese de que as partículas são esferas

homogêneas e com intensa descontinuidade do índice de refração em suas superfícies. Neste caso, considera-

se também que a radiação é espalhada igualmente em todos os comprimentos de onda. Por esta razão, as

nuvens parecem brancas. Em dias muito poluídos e, portanto, com alta concentração de aerossóis a névoa

também é esbranquiçada.

O pôr e o nascer do sol têm cores que tendem para o amarelo e o vermelho. Nestes casos a luz tem

que atravessar um caminho óptico bem maior e, portanto, a atenuação de radiação também é maior. Como os

comprimentos de onda menores espalham com mais facilidade, resta apenas radiação de comprimentos de

onda maiores, portanto, amarelo ou vermelho.

Quando o raio das partículas é muito maior que o comprimento de onda da radiação, a distribuição

angular da radiação espalhada é descrita pelos princípios da óptica geométrica. Neste caso está o

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espalhamento de luz visível por gotas de chuva ou gotas maiores em nuvens e partículas de gelo. Este tipo de

fenômeno explica a formação de arco íris, auréolas, halos, coroas, dentre outros.

Sugestão: Realizar uma pesquisa sobre fenômenos ópticos como arco íris, auréolas, halos, coroas, etc.

2.3.2. Absorção de radiação solar na atmosfera terrestre

Quando um feixe de radiação atravessa um determinado volume de gás, parte de sua energia pode

ser absorvida pelas moléculas e átomos presentes nesse volume. Em contrapartida essa mesma massa de gás

pode emitir energia em outros comprimentos de onda. Esses fenômenos se refletem tanto no balanço da

energia mecânica, relacionada aos modelos de translação, rotação e vibração da molécula, quanto no balanço

da energia eletrônica, relacionado à estrutura detalhada do núcleo e dos elétrons. Neste nível, a absorção e a

emissão são observadas quando os elétrons sofrem transições de um estado para outro de energia. As

primeiras investigações sobre as transições eletrônicas tiveram início no começo do século XX, em estudos

sobre o espectro do átomo de hidrogênio, onde se mostrou que as órbitas circulares dos elétrons são

quantizadas. Isto é, que seus momentos angulares são múltiplos de um valor básico. Dessa forma, os átomos

podem existir em certo estado básico, de nível mínimo de energia, no qual não há emissão de radiação. A

mesma só ocorre quando o átomo realiza uma transição de certo estado de energia Ei para outro inferior, Ei-1.

A absorção, por sua vez, ocorre de maneira inversa, quando o elétron salta para uma órbita posterior. Neste

caso, se diz que o átomo está em seu estado excitado. Matematicamente tem-se que:

i i 1I I hf−− = (2.9)

Onde hf representa o quantum de energia contido no fóton emitido durante a transição (h = constante de

Planck = 6,626068 × 10-34 m2 kg/s). Essa equação é denominada relação de Planck.

No espectro solar, os principais gases absorvedores são o vapor d’água, o oxigênio, o ozônio, o

nitrogênio, o gás carbônico, além das espécies monoatômicas do oxigênio e nitrogênio. Outros espectros de

absorção são observados para constituintes menores como o monóxido de carbono, a amônia e o óxido

nitroso. Os espectros de absorção devido às transições eletrônicas do oxigênio e nitrogênio, atômicos e

moleculares, ocorrem predominantemente na região ultravioleta, enquanto aquelas relacionadas às transições

vibracionais de moléculas triatômicas como o vapor d’água, ozônio e gás carbônico ocorrem na região do

infravermelho.

Na figura 2.7 são apresentados os espectros de absorção. Observa-se que abaixo de 0,3 μm a

radiação é completamente absorvida pelo ozônio e oxigênio estratosféricos. Portanto, dizemos que a

atmosfera é opaca para a radiação neste intervalo espectral. Entre 0,3 e 0,8 μm, na região visível e no final do

espectro UV, a atmosfera é praticamente transparente. Ou seja, quase toda radiação solar atinge a superfície.

A região infravermelha é de forte absorção, principalmente pelo vapor d’água e pelo gás carbônico. Somente

entre 8 e 12 μm é que também há uma grande região transparente, com exceção da banda de 9,6 μm onde o

ozônio absorve fortemente. Esta região de transparência é chamada de janela atmosférica.

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Figura 2.7 – Espectros de absorção (adaptado de Varejão-Silva, 2005)

Observa-se, portanto, características bem marcantes para a radiação. Enquanto a atmosfera é

praticamente transparente para a radiação solar, ela é praticamente opaca para a radiação terrestre (com

exceção da janela atmosférica). Esse comportamento explica o efeito estufa, que podemos entender fazendo

uma analogia com um carro parado sob o sol. A radiação solar penetra o vidro, mas a radiação de onda longa

(emissão) não consegue sair. Resultado: aumento excessivo de temperatura dentro do carro. Parte do balanço

de radiação do planeta é controlado pelas nuvens que refletem a radiação solar e absorvem fortemente a

radiação terrestre, inclusive na região da janela atmosférica. Com isto, evita-se um forte aquecimento diurno

e um forte resfriamento noturno.

2.4. CONCEITOS BÁSICOS IMPORTANTES

Nesta seção serão definidos alguns conceitos importantes para o estudo da radiação atmosférica.

a) Corpo negro (CN): Trata-se de um corpo hipotético capaz de absorver toda radiação incidente sobre ele.

b) Emissividade (ελ): É definida como a razão entre a energia emitida por um determinado corpo, num

determinado comprimento de onda, e a correspondente energia emitida por um CN à mesma temperatura do

corpo considerado. Portanto, εCN = 1.

c) Absortância (aλ): É a razão entre a quantidade de energia absorvida e o total de energia que incide sobre

um volume de matéria, para um dado comprimento de onda. Portanto, aCN = 1.

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d) Refletância (rλ): É a relação entre a energia refletida para o hemisfério de origem e a radiação incidente,

para um dado comprimento de onda. Pela definição de CN, rCN = 0.

e) Transmitância (tλ): É a relação entre a energia transmitida e o total incidente, para um dado comprimento

de onda. Um CN tem tCN = 0.

Pela Lei da Conservação de Energia, temos:

a r t 1λ λ λ+ + = (2.10)

2.5. LEIS DA RADIAÇÃO

2.5.1. Lei de Planck (Max Planck, 1900)

Estabelece a distribuição espectral associada à máxima radiância espectral que pode ser emitida por

um corpo em equilíbrio termodinâmico à uma dada temperatura T. A energia emitida por um corpo negro é

depende de sua temperatura e do comprimento de onda em questão. Matematicamente é dada por:

( )CN

2

5

2hcLexp hc KT 1λ =⎡ ⎤λ λ −⎣ ⎦

[W m-2 sr-1 /m] (2.11)

Onde: c = velocidade da luz no vácuo = 299.792.458 m/s ≈ 3 × 108 m/s;

h = constante de Planck = 6,6262 × 10-34 Js;

K = constante de Boltzmann = 1,3807 × 10-23J/K;

T = temperatura do corpo negro [K];

λ = comprimento de onda [m].

A equação 2.11 também pode ser expressa em termos de freqüência (Hz) da onda eletromagnética:

( )CN

3

f 2

2hfLc exp hf KT 1

=⎡ ⎤−⎣ ⎦

[W m-2 sr-1 /Ηz] (2.12)

2.5.2. Lei do deslocamento de Wien (Wilhelm Wien, 1894)

Estabelece uma relação de proporcionalidade inversa entre a temperatura de um corpo negro e o

comprimento de onda associado ao máximo relativo da respectiva função de Planck. Ou seja, a derivada, em

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função do comprimento de onda, da função de Planck é nula para o comprimento de onda cuja emitância é

máxima.

máxE 0λ∂

= ⇒ λ = λ∂λ

Portanto, para o comprimento cuja emitância espectral seja máxima, temos:

3

máxT cte 2,897756 10 mK−λ = = × (2.13)

Esta constante é denominada Constante de Wien.

ER 2.2. Considerando que a Terra e o sol emitam como corpos negros a temperaturas aproximada de 300 e

5770 K, aproximadamente, determine o comprimento de onda de máxima emissão destes astros.

Resolução

Da equação 2.13, tem-se:

Para a Terra: 3 6T T.300 2,897756 10 9,7 10 9,7 m− −λ = × ⇒ λ = × = μ

Para o Sol: 3 7S S.5770 2,897756 10 5,0 10 0,5 m− −λ = × ⇒ λ = × = μ

A Terra tem o pico de emissão em torno de 10μm (infra-vermelho), enquanto o sol tem o pico de emissão em

0,5μm (região visível do espectro). Pela lei de Planck, é fácil verificar que a Terra emite radiação entre 3,0 e

200 μm e o sol emite entre 0,2 e 3,0 μm. Por este motivo, chamamos a radiação solar de radiação de onda

curta e a radiação terrestre de radiação de onda longa.

2.5.3. Lei de Stefan-Boltzmann (Josef Stefan, 1879; Ludwig Boltzmann, 1884)

Estabelece uma relação de proporção direta entre a irradiância emitida por um corpo negro, já

integrada sobre todo espectro eletromagnético, e a quarta potência da temperatura deste corpo. Se

integrarmos a equação 2.11 em todo espectro eletromagnético, vamos obter a radiância integrada, ou seja:

CN0

L(T) L d∞

λ= λ∫

CN

4 4 3 4 44

2 3 x 2 30 0

2K T x 2 KL(T) L d d Tc h e 1 15c h

∞ ∞

λπ

= λ = λ =−∫ ∫ (2.14)

Onde x = hc/λKT. Para determinarmos a emitância devemos integrar L(T) no hemisfério:

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2 2

0 0

E cos L(T)sen d d L(T)π

π

= θ θ θ φ = π∫ ∫ (2.15)

Substituindo 2.14 em 2.15, tem-se:

5 4

4 8 42 3

2 KE T 5,67 10 T15c h

−π= = ×

A constante é denominada constante de Stefan-Boltzmann (σ) e esta equação é rescrita como:

4E T= σ (2.16)

ER 2.3. Determine a emitância radiante total de um corpo negro à temperatura do sol (~5770K) e à

temperatura da Terra (~300 K)

Resolução 4E T= σ → ES = 5,67.10-8.(5770)4 = 6,28.107 Wm-2 = 62,8 MWm-2

ET = 5,67.10-8.(300)4 = 459,3 Wm-2

ER 2.4. Determine a emitância espectral de um corpo negro à temperatura do Sol (5770 K), na faixa verde

do espectro eletromagnético.

Resolução

De acordo com a tabela 2.1, o verde está no intervalo espectral entre 492 e 577 nm.

Para avaliarmos a emissão neste intervalo espectral, vamos considerar a equação 2.14 da seguinte forma:

CN

577 5774 4 3

2 3 x492 492

2K T xL(T) L d dxc h e 1λ= λ =

−∫ ∫ , para x = hc/λKT.

A fração x não depende só de λ ou de T, mas sim do produto entre ambos. Isto quer dizer que, por exemplo,

a fração da intensidade emitida por um corpo negro na região do espectro entre 0 e 10 nm a 1000 K é a

mesma que a fração da intensidade emitida entre 0 e 5 nm a 2000 K. Para calcular a integral devemos usar o

método de Simpson ou a seguinte aproximação:

Vamos definir a função F(x) dada por:

3 3 x

4 x 4 xx x

15 x 15 x eF(x) dx dxe 1 1 e

∞ ∞ −

−= =π − π −∫ ∫

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12

O termo 1–e–x pode ser expresso como uma soma de potências e–x desenvolvendo-se o binômio -1 2 3 4(1-z) =1+z+z +z +z +... . Então:

3 x 2 3 44

x

15F(x) x e (1+z+z +z +z +...)dx∞

−=π ∫

Integrando por partes, temos:

23

4 2 3n 1

15 exp( nx) 3x 6x 6F(x) xn n n n

=

⎛ ⎞−= + + +⎜ ⎟π ⎝ ⎠

Usando uma planilha excel ou um fazendo um pequeno programa em Fortran, podemos calcular F(x492) e

F(x577). A intensidade total emitida neste espectro será de:

4

1 2E [F(x ) F(x )] T= − σ

Desta equação podemos tirar as seguintes conclusões: A baixas temperaturas praticamente toda radiação é

infravermelha. A altas temperaturas a contribuição da radiação UV é cada vez maior e as radiações visível e

IV se fazem cada vez menores. A contribuição de radiação visível é máxima em 7100 K.

Podemos também tirar conclusões acerca da cor aparente de um corpo a uma data temperatura. Por exemplo,

a 2000 K um corpo emite luz em todo espectro visível, mas a maior intensidade se dá no vermelho extremo

(baixa freqüência e comprimento de onda grande) e o corpo é visto como um vermelho brilhante. A 3000 K,

a temperatura aproximada de uma lâmpada incandescente, a quantidade relativa de luz azul aumenta, mas

ainda predomina a componente vermelha. Portanto, a vemos num tom amarelado. A 6000 K, que é

aproximadamente a temperatura do sol, a distribuição é quase uniforme em todo o visível e o corpo aparece

branco brilhante. Acima de 10000 K a luz azul é emitida com maior intensidade que a vermelha e o corpo é

visto em tom azulado (estrelas quentes).

O resultado obtido para a emissão de um corpo negro à temperatura de 5770 K, no espectro de cor

verde, é de, aproximadamente, 6,9×106 W/m2.

Sugestão: Reproduza este resultado, faça o mesmo para outros espectros e compare.

2.5.4. Lei de Kirchhoff (Gustav Kirchhoff, 1859)

A emissividade de um corpo, para um dado comprimento de onda, dividida pela absortância deste

mesmo corpo, para o mesmo comprimento de onda, é igual a emissividade de um corpo negro. Ou seja, a

energia absorvida por um corpo a uma dada temperatura em um determinado comprimento de onda é igual a

energia emitida por esse corpo a esta mesma temperatura e a este mesmo comprimento de onda. Ou seja, aλ =

ελ.

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CN1a λ

λ

λ

ε= = ε (2.17)

Para um corpo não-negro (denominado corpo cinza), a emissividade é menor do que 1. Neste caso a

emitância é dada pela seguinte equação:

CC CN.λ λλε =∈ ε (2.18)

Onde ∈λ é denominada emissividade.

Substituindo essa equação em 2.16, temos que a emitância radiante total de um corpo cinza (ECC) é:

4E T=∈σ (2.19)

Na tabela 2.1 são apresentados alguns valores de emissividade:

Material ∈ Material ∈ Material ∈ Concreto 0,92 – 0,97 Papel preto 0,90 Solo seco 0,92

Vidro 0,92 Papel verde 0,85 Solo saturado 0,95 Gelo 0,97 Papel branco 0,68 Água 0,95 PVC 0,91 – 0,93 Areia 0,90 Alumínio anodizado 0,77 Neve 0,80 Pele humana 0,98 Alumínio polido 0,05

Tabela 2.1 – Alguns valores de emissividade

ER 2.5. Um planeta de raio Rp realiza uma órbita em torno de uma estrela de raio RE. Esta estrela é

isotérmica à temperatura TE e emite radiação como um corpo negro. Qual é o fluxo total emitido por essa

estrela ?

Resolução

Do ER 2.1 vimos que: 2o o2

F FE E F E 4 RA 4 R

= ⇒ = ⇒ = πΔ π

Da equação 2.16, vimos que: 4E T= σ .

Portanto, para essa estrela, temos: 4 2E EF T 4 R= σ π

ER 2.6. A órbita do planeta em torno da estrela do exercício 2.5 é excêntrica a ponto da distância que os

separa sofrer variações de cerca de 20% em relação à média. Avalie a irradiância incidente no planeta nos

pontos de máximo e mínimo afastamento.

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Resolução 2 4 2 4E E E E

mín 2 2

4 R T R TFE 1,56A 4 (0,8d) d

π σ σ= = =Δ π

2 4 2 4E E E E

máx 2 2

4 R T R TFE 0,69A 4 (1,2d) d

π σ σ= = =Δ π

Ou seja, Emín = 1,56 Emédia, enquanto Emáx = 0,69 Emédia

2.5.5. Lei de Beer-Bouguer-Lambert (August Beer, Pierre Bouguer, Johann Heinrich Lambert)

A lei de Beer é assim definida: “Um feixe monocromático de radiação sofre uma atenuação

exponencial ao atravessar um meio homogêneo.” Matematicamente, a mesma pode ser rescrita como:

k s

oI I e λ

λ

−λ = (2.20)

Onde kλ é o coeficiente espectral de extinção e s é o caminho óptico.

A lei de Beer, expressa em 2.20, é representada na figura 2.8.

Figura 2.8 – Representação para a Lei de Beer

No entanto, o fluxo de radiação pode incidir de maneira inclinada sobre a superfície. Assim, se

redesenharmos a figura 2.8 levando em consideração o fluxo de radiação, temos:

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Figura 2.9 – Fluxo inclinado na superfície

Sobre a superfície, o fluxo incidente é dado por:

N1

FIA

=

IN é denominada irradiância normal, ou seja, perpendicular à superfície.

No entanto, o fluxo atinge perpendicularmente uma determinada área A2, cuja irradiância é dada por:

2

FIA

=

Como o fluxo é o mesmo, pode-se escrever que:

1N

2

AI IA

=

Como a relação A1/A2 é o cosseno do ângulo ζ,, então escreve-se que:

NI I cos= ζ (2.21)

2.6. ESTIMATIVAS DE IRRADIÂNCIA SOLAR DIRETA, GLOBAL E DIFUSA

A radiação solar que incide no topo da atmosfera varia basicamente com a latitude e o tempo, isto é,

a época do ano e a hora do dia. Ao entrar na atmosfera parte da radiação solar interage com os elementos

presentes e parte atinge a superfície sem que haja interações. Assim, denomina-se de Radiação Direta a parte

da energia solar que atravessa a atmosfera e não sofre interações com o volume de matéria, chegando

“diretamente” à superfície. Portanto, a densidade de fluxo deste tipo de radiação é chamada de irradiância

solar direta (ID). A Radiação Difusa é a parte da radiação solar que sofreu algum tipo de interação com o

volume de matéria e atinge a superfície vinda de outras direções que não aquela do sol. Relativa a este fluxo,

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denomina-se irradiância solar difusa (Id). A soma de ambas irradiâncias é denominada irradiância total (I).

Assim, tem-se:

D dI I I= + (2.22)

Para uma superfície horizontal, a equação 2.22 pode ser rescrita como:

N dI I cos I= ζ + (2.23)

Onde IN é a irradiância normal à superfície e ζ é a distância zenital do sol.

Uma vez conhecidas as componentes (direta, difusa e global) da radiação, vamos estudar algumas

técnicas empíricas (ou semi-empíricas) para estimativa destas componentes:

2.6.1. Irradiância solar no topo da atmosfera

A irradiância instantânea (Io) sobre uma superfície horizontal no topo da atmosfera é dada por:

2

odI S cosd

⎛ ⎞= ζ⎜ ⎟

⎝ ⎠ (2.24)

Onde S é a constante solar, definida como a irradiância solar normal a uma distância média Terra-Sol na

ausência de atmosfera. Seu valor é de, aproximadamente, 1367 Wm-2. O valor de 2

dd

⎛ ⎞⎜ ⎟⎝ ⎠

é dado pela equação

1.1 e ζ é a distância zenital do sol.

No entanto, para muitos estudos, é de interesse determinar a quantidade total de radiação incidente

ao longo de um dia. Ou seja, a irradiância solar diária (ou a dose) sobre a superfície. Para tanto, basta

usarmos a equação 2.7:

p

n

2t

ot

dD S cos dtd

⎛ ⎞= ζ⎜ ⎟

⎝ ⎠∫ (2.25)

Onde tn e tp são os instantes de nascer e do pôr do sol, respectivamente.

Combinando as equações 2.23 e 1.13, temos:

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( )p

n

2t

ot

dD S sen sen cos cos cos H dtd

⎛ ⎞= ϕ δ + ϕ δ⎜ ⎟

⎝ ⎠∫ (2.26)

Algumas aproximações podem ser feitas em 2.26. Em um único dia, a distância Terra-Sol (d) e a declinação

(δ) são praticamente constantes. Portanto, como a latitude também é constante, podem “sair” da integral. Isto

é:

p p

n n

2 t t

ot t

dD S sen sen dt cos cos cos Hdtd

⎛ ⎞⎛ ⎞= ϕ δ + ϕ δ⎜ ⎟⎜ ⎟ ⎜ ⎟⎝ ⎠ ⎝ ⎠

∫ ∫ (2.27)

Para facilitar a integração de cosH, podemos relacionar o tempo (t) com o ângulo horário (H),

através da velocidade angular de rotação da Terra (ω), já que:

dh 1 dt dhdt

= ω ⇒ =ω

(2.28)

Então, 2.27 pode ser rescrita como:

2 H H

oH H

S dD sen sen dh cos cos cos Hdhd

+ +

− −

⎛ ⎞⎛ ⎞= ϕ δ + ϕ δ⎜ ⎟⎜ ⎟ω ⎝ ⎠ ⎝ ⎠

∫ ∫ (2.29)

Integrando e substituindo os valores de S e de ω temos:

( )2

odD 37,6 H sen sen cos cos senHd

⎛ ⎞= ϕ δ+ ϕ δ⎜ ⎟

⎝ ⎠ (2.30)

Sendo H em radianos e Do em MJ/m2.

→ Tente calcular a irradiância solar diária no topo da atmosfera sobre Itajubá (22,41°S; 45,44°W) para hoje.

2.6.2. Irradiância global à superfície

Normalmente os valores de irradiâncias (global, direta ou difusa) são obtidos através de medidas

realizadas por instrumentos instalados em superfície ou a bordo de satélites. Veremos mais detalhes sobre

instrumentação meteorológica em um tópico especial. No entanto, é possível avaliar, de uma maneira

aproximada, as irradiâncias numa determinada localidade onde não haja instrumentação adequada.

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Dentre muitas aproximações empíricas existentes na literatura, a mais difundida é aquela que utiliza

a técnica estatística dos mínimos quadrados. Neste caso, a irradiância global é representada pela seguinte

equação:

onI I a bN

⎛ ⎞= +⎜ ⎟⎝ ⎠

(2.31)

Onde, os termos a e b são determinados empiricamente através de regressão linear de medidas prévias

realizadas em uma determinada localidade; n é a duração do brilho solar observado e N a duração

astronômica do período diurno (n e N em horas).

Para determinar a e b, rescreve-se a equação 2.31 da seguinte forma:

Y a bX= + (2.32)

Com Y = I/Io e X = n/N. Podemos então escrever o seguinte sistema de equações:

1

2

Y K a b X

Y K a b X

⎧ = +⎪⎨

= +⎪⎩

∑ ∑∑ ∑

(2.33)

Onde o termo K1 e K2 indicam o número de pares de valores observados (X,Y) usados. O ajuste da

reta é feito pelo coeficiente de regressão linear (r). O valor de r varia de –1 ≤ r ≤ +1 e a reta é tão melhor

quanto r se aproxima de 1. O coeficiente r é dado por:

( ) ( ) 2 22 2

K XY X Yr

K X X K Y Y

⎡ ⎤−⎣ ⎦=⎡ ⎤ ⎡ ⎤− −⎢ ⎥ ⎢ ⎥⎣ ⎦ ⎣ ⎦

∑ ∑ ∑∑ ∑ ∑ ∑

(2.34)

Varejão-Silva (2005) destacam algumas observações importantes para uma boa estimativa. Quando

existem muitos pares de valores (I, n) diários, é conveniente separá-los em conjuntos relacionados com a

quantidade de nebulosidade. Desta forma, obter-se-á um coeficiente de regressão para cada caso e os

resultados, por conseqüência, se tornam mais representativos. Estudos mostram que quando há muita

nebulosidade (n pequeno), o ajuste tende a ser pior do que aquele observado para céu claro (n grande). Isso

ocorre, pois não há como um heliógrafo (sensor que registra o tempo de insolação) diferenciar situações de

nuvens que podem influenciar bastante na relação de radiação direta/difusa e, portanto, pode apontar

medidas semelhantes para diferentes condições de nebulosidade.

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2.6.3. Irradiância solar direta à superfície

Também existem diversos métodos empíricos para se determinar o valor de irradiância solar direta.

Vianello e Alves (1991) apresentam a relação de Brooks para irradiância direta normal (IN) sob condições de

céu limpo: 2

NdI Sd

⎛ ⎞= τ⎜ ⎟

⎝ ⎠ (2.35)

Onde τ é a transmitância atmosférica dada por:

0,75 0,60

0,90pm Wmexp 0,089 0,174 0,083(dm)1013 20

⎡ ⎤⎛ ⎞ ⎛ ⎞τ = − − −⎢ ⎥⎜ ⎟ ⎜ ⎟⎝ ⎠ ⎝ ⎠⎢ ⎥⎣ ⎦

(2.36)

Em 2.36, p é a pressão atmosférica (em hPa) e d é a espessura óptica (parâmetro de atenuação) relacionada

aos aerossóis (adimensional). O valor de d depende de quão poluída é a região. Por exemplo, uma localidade

urbana apresenta d ~ 0,5 em condições poluídas. m é a massa óptica (também adimensional) dada por:

2m 35 1 cos= − ζ (2.37)

Repare que m varia de 1 (quando ζ = 0° → sol no zênite) até 35 (quando ζ = 90° → sol no horizonte).

E W é a quantidade de água precipitável na atmosfera, na direção do zênite, (em mm), dada pela fórmula de

Hann:

W 2,5e= (2.38)

Onde e é a pressão de vapor em hPa. Veremos mais sobre esta fórmula no próximo capítulo.

Um exemplo de modelo mais complexo e preciso para cálculos de irradiâncias diretas e difusas pode

ser visto em http://rredc.nrel.gov/solar/pubs/spectral/model/spectral_model_index.html.

2.6.4. Irradiância solar global sobre superfícies inclinadas

No caso de superfícies inclinadas, o valor instantâneo da irradiância global para céu claro é dado por:

2 2

N d N dI I cos I cos ( / 2) R(I cos I )sen ( / 2)= θ+ α + θ+ α (2.39)

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Onde α é a inclinação da superfície e R é a refletância (albedo) da superfície inclinada. O termo cos2(α/2)

corresponde à fração do céu vista da superfície inclinada. θ é o ângulo de incidência dos ângulos solares

diretos. A figura 2.10 auxilia esquematiza o fenômeno.

Figura 2.10 – Irradiância em plano inclinado

O cosseno de θ é calculado através das informações geográficas da localidade e da inclinação da superfície:

cos cos H(cos cos cos sen cos A cos sen ) +senH sen senA cos sen sen cos sen cos A cos sen

θ = ϕ δ α + α δ ϕ +α δ+ ϕ δ α − α δ ϕ

(2.40)

2.7. ESTIMATIVAS DE RADIAÇÃO DE ONDA LONGA

Tanto a Terra, quanto a atmosfera emitem radiação, aproximadamente, como um corpo negro.

Portanto, se as temperaturas da Terra e da atmosfera são conhecidas, é possível estimar os fluxos emitidos

através da equação de Stefan-Boltmann (2.14). Sabemos também, pela Lei de Wien (2.13), que, devido às

suas baixas temperaturas, a emissão máxima do sistema Terra-atmosfera se dá na faixa do infravermelho

(ondas longas). Como a atmosfera apresenta uma grande variabilidade de seus componentes como o vapor

d’água, gotas de água e cristais de gelo, é muito difícil determinar o comportamento radiativo deste sistema.

De qualquer forma, existem algumas equações empíricas que nos ajudam a estimar esses fluxos de

radiação. O saldo de radiação de onda longa (E) medido à superfície é dado pela diferença entre o que chega

da atmosfera (EA) e o que é emitido pela superfície (ES):

A SE E E= − (2.41)

Em intervalos de tempo pequenos, o valor de E pode ser positivo, negativo, ou mesmo, nulo. Em intervalos

maiores, geralmente é negativo, já que a superfície emite mais radiação do que recebe da atmosfera. Apesar

dos erros grosseiros que possam acarretar, as fórmulas empíricas promovem resultados relativamente

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confiáveis se aplicadas nas condições para as quais foram desenvolvidas. Dois exemplos destas fórmulas são

fornecidos por Varejão-Silva, 2005:

a) Fórmula de Brunt (1932)

4E 1440 T (1 a b e)= − σ − − (2.42)

Onde e é a pressão de vapor (em hPa) e T é a temperatura absoluta (em K). Os coeficientes a e b, valem

0,256 e 0,065, respectivamente. Em 1939, Brunt aperfeiçoou a equação 2.42 para condições de nebulosidade,

incluindo o parâmetro m para cobertura do céu (em décimos):

4E 1440 T (c d e)(1 0,09m)= − σ − − (2.43)

Onde c = 0,56 e d = 0,092.

b). Fórmula de Brunt-Pennman (1948)

Propõe-se a substituição do parâmetro m pelos parâmetros de insolação (n) e fotoperíodo (N) na

fórmula de Brunt e a equação passa a ser:

4E 1440 T (c d e)[1 0,09(n / N)]= − σ − − (2.44)

c) Fórmula de Swinbanck (1963)

Para dias de céu claro:

4E K(0,195 T 17,09)= σ − (2.45)

Com K = 1 para resultados em mW/cm2 ou K = 0,01433 para resultados em cal/cm2min

2.8. BALANÇO DE RADIAÇÃO

O balanço de radiação é dado pela diferença entre a energia recebida e a perdida, em ondas curtas e

longas, pela superfície, camada atmosférica ou, até mesmo, todo o planeta. Nesta seção veremos o balanço

de energia à superfície e o balanço no planeta, isto é, considerando todos os mecanismos de emissão,

espalhamento e absorção de radiação que ocorre entre a superfície, a atmosfera (gases, nuvens e aerossóis) e

o espaço.

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2.8.1. Balanço de radiação à superfície

Para melhor compreensão do balanço de radiação em uma superfície, observemos a figura 2.11:

Figura 2.11 – Balanço de radiação em superfície

(R – Refletância da superfície; ID – Irradiância direta; Id – Irradiância difusa ES – Emitância da superfície; EA – Emitância da atmosfera)

Da figura 2.11, vamos escrever os balanços de onda curta e onda longa:

OC D d D dB I I R(I I ) I RI I(1 R)= + − + = − = − (2.46)

OL A SB E E= − (2.47)

Então, o balanço à superfície (BS) é dado pela soma dos balanços de onda curta (BOC) e onda longa (BOL):

S A SB I(1 R) (E E )= − + − (2.48)

Obs: Para o balanço de onda longa, Brunt propôs a seguinte relação:

[ ]9 4OLB 4,8989 10 T (0,09 e 0,56) 0,1 0,9(n / N)−= × − + (2.49)

2.8.2. Balanço de radiação no sistema Terra-atmosfera

O balanço de radiação envolvendo toda superfície e a atmosfera terrestre é bem complexo. Na figura

2.12 é apresentado um esquema dos percentuais de radiação absorvida, emitida e refletida pelo planeta e a

atmosfera. Considerando que a energia solar que chega no topo da atmosfera seja de 100 unidades quaisquer,

parte dela é absorvida pela atmosfera (19), parte refletida por nuvens (20) e parte é espalhada pela atmosfera

(6). Como a superfície reflete, em média, 4% da radiação que a atinge, então a energia absorvida pelo solo é

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de 51 unidades. O albedo planetário, como se denomina a radiação refletida pelo sistema, é dado pela soma

dos termos espalhados pelas nuvens, pela atmosfera e pela reflexão da superfície, resultado em 30 unidades.

Figura 2.12 – balanço de radiação no sistema Terra-atmosfera

Quanto à onda longa, a superfície emite 117 unidades, das quais a maior parte é absorvida pela

atmosfera (111) e apenas uma pequena porção se perde para o espaço (6). A atmosfera, incluindo as nuvens,

também recebe energia das fontes de evaporação e convecção da superfície, tornando-se uma grande fonte de

emissão (160). Para a superfície a atmosfera emite 96 unidades, enquanto que para o espaço perdem-se 64

unidades. Obviamente, estes valores são aproximados e dependem de todos os fenômenos meteorológicos

que ocorrem na atmosfera terrestre.