Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As...

26
Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes Artroplásticos de Quadril Luiz Sérgio Marcelino Gomes - Mestre e Doutor em Ortopedia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da U.S.P. - Chefe do Serviço de Cirurgia e Reabilitação Ortopédico-Traumatológica de Batatais (SECROT-SP) - Chefe do Grupo de Quadril do Hospital e Maternidade Celso Pierro PUC-Campinas (SP) Julio Paim Rigol - Médico Assistente do Grupo de Quadril do Pronto Socorro de Fraturas de Passo Fundo - Membro Associado da Sociedade Brasileira de Quadril (SBQ). I. Introdução II. Conceito e Classificação de Falha III. Tipos de Falhas III.1 Modos de falha III.2 Origem das Falhas III.3 Mecanismos de Falhas A) Mecanismos de Ruptura A1. Fratura A2. Fadiga A3. Fluência A4. Deformação Plástica Macroscópica B) Mecanismos de Desacoplamento B1. Impacto entre Elementos do Implante e/ou Ósseos B2. Falência da Contenção Óssea e/ou do Cimento B3. Traumático B4. Desequilíbrio de Partes Moles B5. Desacoplamento por Mecanismos Associados C) Mecanismos de Soltura C1. Falência de Suporte do Manto de Cimento C2. Falência do Suporte Ósseo C3. Falência combinada (1 e 2) C4. Falência da Fixação Biológica D) Mecanismos de Desgaste D1. Adesivo D2. Abrasivo D3. Oxidativo/Corrosivo D4. Desgaste por Impacto repetitivo e Fretagem E) Mecanismos envolvidos na gênese do Quadril Protético Doloroso sem Falha Aparente F) Mecanismos de Distopia Primária do Implante Protético III.4 Efeitos e Conseqüências das Falhas IV. Diagnóstico e Codificação de Falhas em Implan- tes Artroplásticos de Quadril IV.1 Diagnóstico e Codificação Pré-operatória IV.2 Diagnóstico e Codificação Pós-operatória V. Bibliografia e Referências Bibliográficas I. Introdução A artroplastia total do Quadril (ATQ) se destaca entre outros procedimentos cirúrgicos, em função do grande sucesso clínico e da excelente relação custo/efetividade, proporcionando aos pacientes portadores de distúrbios destrutivos desta articulação a redução da dor, melhora da função e da qualidade de vida 1, 2 . Os implantes protéticos, utilizados neste procedimen- to, devem suportar os esforços oriundos da contração muscular, de forças inerciais, do suporte de carga estática e cíclica, e ainda precisam resistir ao desgaste das diversas interfaces, ao mesmo tempo em que não devem provocar reações adversas ao organismo 3-5 . Porém não há até o momento um material que atenda, simultaneamente, a todas as exigências mecânicas, metalúrgicas, funcionais e biológicas necessárias para um implante protético perfeito. Cada biomaterial apre- senta uma combinação de propriedades particulares, determinadas por sua estrutura, composição e pro- cessamento, que são benéficas em algumas situações, contudo podem ter um desempenho inferior e possíveis limitações em outras condições específicas 6, . Estas limitações tornaram-se patentes com o uso crescente deste procedimento, sobretudo em pacientes mais jovens, nos quais as situações de maior solicitação funcional e maior tempo em serviço dos implantes são requeridas 7,8 . Desta forma, aos benefícios clínicos e funcionais proporcionados pela ATQ, o tratamento de suas complicações igualmente se incorporou às atividades diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição óssea progressiva e assim podem não só dificultar como também comprometer os resultados dos procedimentos reconstrutivos futuros (Fig.57.1A e B). Fig.57.1. Radiografia da Pelve, no plano frontal (A) e quadril esquerdo, no plano sagital (B), mostrando a falha na reconstrução protética do quadril esquerdo em uma paciente de 38 anos de idade. Observe a grande perda óssea femoral e acetabular.

Transcript of Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As...

Page 1: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Capítulo 57

Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes

Artroplásticos de Quadril

Luiz Sérgio Marcelino Gomes

- Mestre e Doutor em Ortopedia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da U.S.P.

- Chefe do Serviço de Cirurgia e Reabilitação Ortopédico-Traumatológica de Batatais (SECROT-SP)

- Chefe do Grupo de Quadril do Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC-Campinas (SP)

Julio Paim Rigol - Médico Assistente do Grupo de Quadril do Pronto Socorro de Fraturas de Passo Fundo

- Membro Associado da Sociedade Brasileira de Quadril (SBQ).

I. Introdução

II. Conceito e Classificação de Falha

III. Tipos de Falhas III.1 Modos de falha

III.2 Origem das Falhas

III.3 Mecanismos de Falhas

A) Mecanismos de Ruptura

A1. Fratura

A2. Fadiga

A3. Fluência

A4. Deformação Plástica Macroscópica

B) Mecanismos de Desacoplamento

B1. Impacto entre Elementos do Implante e/ou Ósseos

B2. Falência da Contenção Óssea e/ou do Cimento

B3. Traumático

B4. Desequilíbrio de Partes Moles

B5. Desacoplamento por Mecanismos Associados

C) Mecanismos de Soltura

C1. Falência de Suporte do Manto de Cimento

C2. Falência do Suporte Ósseo

C3. Falência combinada (1 e 2)

C4. Falência da Fixação Biológica

D) Mecanismos de Desgaste

D1. Adesivo

D2. Abrasivo

D3. Oxidativo/Corrosivo

D4. Desgaste por Impacto repetitivo e Fretagem

E) Mecanismos envolvidos na gênese do Quadril Protético

Doloroso sem Falha Aparente

F) Mecanismos de Distopia Primária do Implante

Protético

III.4 Efeitos e Conseqüências das Falhas

IV. Diagnóstico e Codificação de Falhas em Implan-

tes Artroplásticos de Quadril IV.1 Diagnóstico e Codificação Pré-operatória

IV.2 Diagnóstico e Codificação Pós-operatória V. Bibliografia e Referências Bibliográficas

I. Introdução

A artroplastia total do Quadril (ATQ) se destaca entre

outros procedimentos cirúrgicos, em função do grande

sucesso clínico e da excelente relação custo/efetividade,

proporcionando aos pacientes portadores de distúrbios

destrutivos desta articulação a redução da dor, melhora

da função e da qualidade de vida1, 2

.

Os implantes protéticos, utilizados neste procedimen-

to, devem suportar os esforços oriundos da contração

muscular, de forças inerciais, do suporte de carga

estática e cíclica, e ainda precisam resistir ao desgaste

das diversas interfaces, ao mesmo tempo em que não

devem provocar reações adversas ao organismo3-5

.

Porém não há até o momento um material que atenda,

simultaneamente, a todas as exigências mecânicas,

metalúrgicas, funcionais e biológicas necessárias para

um implante protético perfeito. Cada biomaterial apre-

senta uma combinação de propriedades particulares,

determinadas por sua estrutura, composição e pro-

cessamento, que são benéficas em algumas situações,

contudo podem ter um desempenho inferior e possíveis

limitações em outras condições específicas6,

.

Estas limitações tornaram-se patentes com o uso

crescente deste procedimento, sobretudo em pacientes

mais jovens, nos quais as situações de maior solicitação

funcional e maior tempo em serviço dos implantes são

requeridas 7,8

.

Desta forma, aos benefícios clínicos e funcionais

proporcionados pela ATQ, o tratamento de suas

complicações igualmente se incorporou às atividades

diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em

algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

óssea progressiva e assim podem não só dificultar como

também comprometer os resultados dos procedimentos

reconstrutivos futuros (Fig.57.1A e B).

Fig.57.1. Radiografia da Pelve, no plano frontal (A) e quadril esquerdo,

no plano sagital (B), mostrando a falha na reconstrução protética do

quadril esquerdo em uma paciente de 38 anos de idade. Observe a

grande perda óssea femoral e acetabular.

Page 2: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

O manejo apropriado das falhas nas reconstruções

protéticas do quadril requer a identificação precoce, e o

entendimento das causas e mecanismos envolvidos em

sua gênese. Contudo, com muita freqüência, os insu-

cessos são relatados na literatura tendo como base

apenas grupos inespecíficos, que contribuem muito

pouco para o esclarecimento etiológico. Para o adequa-

do reconhecimento dos mecanismos primários envol-

vidos na falha são necessários critérios mais definidos,

e uma abordagem que leve em consideração, não só o

diagnostico pré-operatório, mas que também padronize

o conceito de falha e sistematize o processo de investi-

gação. Nesta circunstância, a observação clínica e intra-

operatória minuciosa, a análise macro e microscópica

dos implantes removidos (explantes) e, em alguns

casos, a análise microestrutural são requeridas9. Estas

informações nos permitem avaliar o ambiente mecânico

a que está sujeita a reconstrução protética, e também

identificar os processos envolvidos na falência do

implante para que, desta forma, seja possível diferenciar

causas de conseqüências10

.

Neste capítulo incorporamos aos conceitos já

amplamente descritos na literatura, a experiência de um

dos autores (LSMG) na definição, detecção, análise,

interpretação e tratamento das falhas dos implantes

artroplásticos de quadril. Estes conceitos estão funda-

mentados

em cerca de 25 anos de atuação como

pesquisador na área de desenvolvimento e análise de

falhas em implantes osteoarticulares, realizados em

conjunto com diferentes profissionais da área de

engenharia, física e química, em laboratórios de biome-

cânica do país e do exterior (Orthopaedic Biomechanics

Laboratory, Midwest Orthopaedic Research Foundation,

Minneapolis Medical Research Foundation and

University of Minnesota, MN, USA; LAMEF- Laboratório

de Metalurgia Física da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul RS; Laboratório de Engenharia Biome-

cânica da Universidade Federal de Santa Catarina SC;

Fundação CERTI - Centros de Referência em Tecnolo-

gias Inovadoras, Florianópolis, SC e Departamento de

Engenharia de Materiais da Universidade Estadual de

Campinas-Unicamp, SP).

II. Conceito e Classificação de Falha

Consideramos que um implante apresenta uma falha

patente quando sua função está comprometida, total ou

parcialmente, seja em decorrência de fatores relaciona-

dos primariamente ao implante, ao material ou ao meio

ambiente (mecânico ou biológico) adjacente, como tam-

bém decorrente de fatores técnicos durante a implan-

tação e de cuidados pós-implantação (mau uso), e que

obrigatoriamente impliquem em nova intervenção

cirúrgica9. Na ocorrência de fatores que possam predis-

por às falhas e re-intervenções futuras, denominamos

falha potencial 9,10

.

Quando um implante falha é preciso analisar como

falhou, porque falhou e também seus possíveis efeitos e

conseqüências. Desta forma devemos reconhecer a

maneira como a falha se apresenta ou se manifesta

(Modo); procurar determinar o local de sua ocorrência

(Origem); identificar os processos envolvidos em sua

gênese (Mecanismo); assim como as conseqüências

e efeitos associados9,10

.

A Tabela 57.1 apresenta nossa abordagem para o

diagnóstico, classificação, e codificação das falhas em

implantes artroplásticos de quadril, desenvolvida e

utilizada de maneira sistemática por um dos autores

(LSMG) com vistas ao reconhecimento, identificação e

planejamento cirúrgico dos procedimentos recons-

trutivos. Evidentemente esta padronização não objetiva

esgotar as inúmeras possibilidades de ocorrências

Tabela 57.1. Modos, Origens, Mecanismos e Efeitos das Falhas de Implantes Artroplásticos de Quadril.

Page 3: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

e de mecanismos envolvidos no complexo processo de

falência de implantes, mas tão somente orientar o

profissional da área para o reconhecimento das situa-

ções mais encontradiças na prática cirúrgica. Como

disposto na porção inferior do quadro, observamos que

os processos de identificação, classificação e

codificação das falhas devem ser feitos seqüencial-

mente pela observação clínica, funcional e de imagens,

inspeção e avaliação visual (intra e pós-operatória), e

laboratorial dos explantes, sempre que necessária. Com

estas informações, o processo de codificação pré-

operatória pode ser realizado e, posteriormente alterado

a partir do esclarecimento intra e pós-operatório dos

mecanismos envolvidos na falha.

III. Tipos de Falhas

III.1. Modos de Falhas.

O Modo de falha diz respeito à maneira como a

falha de um implante se apresenta (ou se manifesta) e

se refere não somente à falência do material, mas sim

do implante como um todo (falha do conjunto) e que,

portanto envolve, além das características do material

(composição, propriedades, processamento), a sua

estrutura (modelo), sua relação com o meio adjacente

(estabilidade em serviço do implante), assim como a

técnica de implantação e utilização.

O reconhecimento do modo de falha é o primeiro

passo no processo de análise e pode ser detectado pelo

exame clínico, de imagens ou avaliações funcionais pré-

operatórias.

A ruptura (Modo I, Fig. 57.2A) se refere não só à

efetiva falência mecânica do implante, manifesta por

solução de continuidade, como também aos diferentes

graus de deformação plástica macroscópica, que podem

implicar em distúrbio da função do implante (ruptura

funcional).

O desacoplamento (Modo II, Fig.57.2B) diz respeito

ao evento de natureza mecânica que se manifesta pela

perda total ou parcial da estabilidade e/ou do contato

entre duas superfícies opostas do implante, ou do

implante em relação às estruturas adjacentes.

Saliente-se que para o emprego do termo desaco-

plamento é necessário que não haja relação de adesão

(química e/ou biológica) prévia entre os elementos da

interface. Incluem-se neste Modo (II) o comprome-

timento da estabilidade entre os diferentes componentes

do implante (como entre elementos da superfície

articular, entre o colo protético e a cabeça modular, ou

entre os elementos modulares de implantes não

monolíticos), ou ainda do implante em relação ao

cimento ósseo nos casos em que o implante não tenha

relação de adesão mecânica com o cimento (como o

caso de hastes polidas, cônicas e sem colar) 11-13

.

Em contraposição ao desacoplamento, reservamos o

termo soltura (Modo III, Fig.57.2C) para a situação de

perda do travamento mecânico ou da adesão, química

ou biológica entre o implante e o meio adjacente

(cimento ou osso). Nesta condição é necessário que

previamente à falha, o implante apresente característi-

cas que pressuponham o travamento mecânico, poten-

cializado por mecanismos biológicos ou químicos como

acontece entre o cimento e implantes texturizados,

anatômicos ou pré-revestidos, ou ainda o travamento

mecânico e biológico direto com o tecido ósseo, como

nos componentes não cimentados.

Dentro deste conceito é preciso enfatizar que a

migração precoce de um implante não cimentado, ou

seja, antes da incorporação por osteointegração, é

classificada como desacoplamento e não soltura. Para

que haja soltura é preciso que previamente tenha havido

uma condição de fixação mecânica ou por adesão

(química e/ou biológica) entre os elementos da interface.

O desgaste (Modo IV, Fig.57.2D) é caracterizado pela

remoção contínua de material decorrente da movimen-

tação relativa entre os vários componentes do implante

ou entre o implante e o meio adjacente. Embora a

osteólise (seja por metal, polietileno ou cimento acrílico)

represente uma situação de falha iminente, ela ocorre

freqüentemente como conseqüência do desgaste, da

soltura ou da ruptura, não sendo, portanto considerada

um mecanismo primário de falha14

.

Assim, estas situações (Modos de falha) representam

a manifestação de diferentes respostas dos compo-

nentes protéticos aos ambientes mecânicos e/ou bioló-

gicos, que freqüentemente concorrem entre si para ini-

ciar ou agravar o dano ao implante. A soltura de um

componente protético pode predispor, em determinadas

condições, ao desgaste do implante e, em função do

ambiente (mecânico/biológico) resultante, podem levar à

ruptura do implante, ou à osteólise 6,15

.

Fig.57.2. Diferentes Modos de falha dos Implantes Artroplásticos. (A): Ruptura, (B): Desacoplamento (luxação protética) (C): Soltura de haste femoral cimentada (seta) (D): Desgaste do Polietileno acetabular, (E): Distopia do implante femoral com violação do invólucro ósseo.

Page 4: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Ainda que com baixa freqüência,o paciente submetido

à ATQ, pode queixar-se de dor crônica na região da

nádega, virilha ou coxa, sem que se consiga, contudo,

determinar o mecanismo primário envolvido em sua

gênese, seja a partir dos exames clínico ou subsidiários.

Esta circunstância, que denominamos Quadril Proté-

tico Doloroso sem Falha Aparente (Modo V de falha),

muitas vezes só é esclarecida a partir dos achados

intra-operatórios, ou através da avaliação dos explantes.

Por força do próprio conceito, incluímos ainda no

Modo de falha, sob a denominação genérica de

Distopia Primária do Implante Protético, os desvios

do posicionamento ideal dos componentes protéticos,

que podem predispor, ou simplesmente associar-se a

outros modos de falhas (Fig.57.2E). Esta denominação

restringe-se ao posicionamento do implante obtido no

ato operatório e por isto não inclui a migração dos

implantes, que pode ocorrer durante seguimentos mais

tardios (distopia secundária) e que representam, na

verdade, o efeito ou a conseqüência de outros diferen-

tes mecanismos de falhas, observados durante o

período em serviço do implante. Da mesma forma que

os outros modos de falha descritos acima, a distopia dos

implantes pode ser identificada por exame de imagens,

quando analisada comparativamente ao posiciona-

mento considerado adequado, segundo parâmetros já

estabelecidos pela literatura16-20

.

III.2. Origem das Falhas

Uma vez diagnosticado o Modo de Falha, utilizamos

ainda os recursos clínicos, funcionais e de imagens para

identificarmos a procedência ou o local de manifestação

(origem) da falha. É evidente que para cada modo

especifico de falha, estão associadas diferentes localiza-

ções (ou origens) mais comuns.

O modo de ruptura (Modo I) pode ocorrer nos

elementos metálicos (haste femoral, componente

acetabular metálico, ou componentes acessórios, como

os parafusos e implantes metálicos de compensação de

perda óssea); nos elementos poliméricos (Polietileno

ou Cimento Acrílico); ou nos elementos cerâmicos,

como a cabeça modular e implante acetabular protético

ou ainda em implantes cerâmicos utilizados para

compensação de perda óssea. As fraturas periprotéticas

estão incluídas nas situações em que se observa a

ruptura do elemento ósseo em regiões adjacentes ao

implante.

O Modo de Desacoplamento (Modo II) tem origem

tipicamente entre as interfaces dependentes de conten-

ção e estabilização primariamente mecânicas, sem a

atuação de mecanismos químicos e/ou biológicos

adicionais de fixação. Pode ocorrer entre interfaces

não constritas, onde o movimento é desejado, como na

superfície articular primária entre cabeça protética e

superfície articular do implante acetabular. Na situação

de desacoplamento desta interface caracteriza-se a

instabilidade protética, sob a forma de luxação ou

subluxação (tipo de falha IIA, ou seja, o desacoplamento

entre os elementos de uma interface não constrita

(superfície articular primária, Fig. 57.3A).

Na interface semiconstrita admite-se movimentos

discretos entre seus elementos constituintes, como o

caso de migração protética distal, de até 1 mm/ano

durante os primeiros 2-3 anos, no interior do manto de

cimento, observado no caso de hastes cônicas, polidas

e sem colar11,21,

.

Este tipo de haste tem uma relação de superfície não

aderida com o cimento adjacente e assim permite a

acomodação, pelo princípio do encunhamento

(migração restrita), no manto de cimento, e

estabilizando-se pela tensão circunferencial resultante

(force-closed mechanism)11,13,15,22

. Deslocamentos

maiores ou progressivos entre hastes polidas e cônicas

e o manto de cimento podem caracterizar o desacopla-

mento (interface haste/ cimento, tipo de falha IIB, Fig.

57.3B).

Na interface constrita o movimento não é esperado

bem como é indesejável, como por exemplo, na inter-

face entre a cabeça modular e o cone protético; entre o

inserto de polietileno e cúpula acetabular metálica ou

ainda entre porções modulares em implantes não

monolíticos (tipo de falha IIC, Fig. 57.3C). Observe que

a luxação da cabeça protética em relação ao compo-

nente acetabular bipolar é considerada um desaco-

plamento de interface constrita, uma vez que a cabeça

protética é mantida por um acoplamento mecânico que

Fig.57.3. Diferentes modos de desacoplamento ocorridos em (A): interface não constrita, sob a forma de luxação protética; (B): interface semiconstrita, manifesta por desacoplamento entre haste e cimento. Observe a demarcação radiotransparente (seta) que indica a intrusão do implante no manto de cimento; (C): interface constrita sob a forma de desacoplamento entre cabeça modular e cone da haste associada a luxação da articulação primária e (D); combinada, quando a luxação protética ocasionou a extrusão da haste femoral (o desacoplamento é observado em mais de uma interface).

Page 5: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

impede a sua saída (anel de trava). Embora os tipos de

falhas por desacoplamento, IIB e IIC, também possam

apresentar instabilidade da articulação primária, os

processos envolvidos na sua gênese são usualmente

diferentes. Deste modo, esclarecemos que quando o

desacoplamento da superfície articular primária for a

causa de outro desacoplamento, a origem da falha é

classificada como combinada (falha tipo IID, Fig. 57.3D).

Por outro lado, quando a instabilidade da articulação

primária for conseqüência do desacoplamento de

interfaces semiconstritas ou constritas, caracterizamos a

origem pela interface que ocasionou a instabilidade da

articulação primária (como nas falhas tipos IIB e IIC).

O modo de Soltura (tipo de falha III) refere-se à falha

da interface em que seus elementos são unidos por

acoplamento mecânico (superfícies aderidas) e adicio-

nalmente por processos químicos e/ou biológicos, situa-

ção em que há uma verdadeira adesão inicial entre

seus constituintes, previamente à falência da interface.

Em relação à sua origem, a soltura pode ser notada nas

interfaces cimento/implante (C/I, falha tipo IIIA, Fig.

57.4A), cimento/osso (C/O, falha tipo IIIB,

Fig.57.4B,C,D), implante/osso (I/O, falha tipo IIIC,

57.5A,B,C) ou simultaneamente em mais de uma destas

3 interfaces (soltura combinada, falha tipo IIID).

A soltura com origem na interface cimento/implante

indica perda da adesão entre a haste femoral e o manto

de cimento. Esta adesão mecânica pode ser obtida

inicialmente por detalhes do modelo protético (hastes

anatômicas), macroporosidades, microporosidades

(hastes rugosas) ou pré-revestimento (PMMA). Nestes

casos o acoplamento inicial é caracterizado pelo

travamento mecânico ou químico entre haste e cimento.

Assim, nas hastes rugosas ou com macroporosidades, o

manto de cimento penetra nas ranhuras e promove o

travamento mecânico do sistema. Nas hastes pré-

revestidas com PMMA existe adicionalmente uma

adesão química entre o cimento e o pré-revestimento da

haste. Do ponto de vista mecânico estas hastes estão

sujeitas a um ambiente mecânico tipo shape-closed e

funcionam como uma viga composta11,13,22

. Especifi-

camente para a interface cimento/implante, o compo-

nente acetabular apresenta baixa taxa de soltura ainda

que em comparação com o componente femoral, talvez

pelo fato do acetábulo estar sujeito principalmente aos

esforços de compressão, enquanto que no componente

femoral elevados esforços torcionais e de cisalhamento

estão presentes23

.

A soltura da interface cimento/osso é uma das

complicações que mais freqüentemente leva à cirurgia

de revisão do implante. O diagnóstico radiográfico de

soltura de componentes cimentados fundamenta-se nos

achados descritos em capítulos específicos (59 e 60).

Contudo, não é demais insistir na diferenciação entre as

linhas radiotransparentes oriundas da soltura e aquelas

oriundas do processo biológico de remodelação endos-

teal. A reação orgânica ao cimento se manifesta pela

produção de uma neocórtex indistinguível radiografica-

mente do manto de cimento24

. Porém entre esta neo-

córtex e a cortical externa, a espongiolização óssea,

origina um aspecto radiográfico manifesto também por

uma linha radiotransparente. Esta reação do organismo

deve ser diferenciada da soltura, principalmente pelo fa-

to de que, nesta última, as linhas radiotransparentes são

progressivas e associadas com a formação de linhas

escleróticas adjacentes. Estes achados dão suporte a

classificação de soltura proposta por Harris e McGann25

,

que denominam implantes provavelmente soltos quan-

do da ocorrência de uma linha radiotransparente

contínua, ocupando toda a interface cimento/osso, e

possivelmente soltos quando a linha radiotransparente

é incompleta, ocupando de 50 a 99% da interface

cimento/osso.

Entretanto, uma vez que a relação entre linhas radio-

transparentes e soltura nem sempre é real, outros

critérios mais específicos de soltura devem igualmente

ser observados, como a fratura ou migração progressiva

do implante ou ainda a fratura do manto de cimento.

Ao contrário da soltura da interface C/I, a soltura entre

cimento e o osso adjacente é mais comum no implante

acetabular. Com muita freqüência, sobretudo na soltura

acetabular, o quadro clínico pode evoluir de maneira

Fig.57-4.Origem de soltura em implantes cimentados. (A): A demar-cação radiotransparente progressiva na região proximal e lateral da haste (seta) indica soltura da interface entre o cimento e implante; (B); a demarcação circunferencial entre cimento e osso indica soltura do

implante acetabular; (C); a soltura da haste femoral cimentada é representada pela demarcação progressiva do implante na interface cimento-osso, afinamento e irregularidade cortical e migração distal do manto de cimento (seta,C), (D): que pôde ser confirmada pela remoção cirúrgica do manto em peça única (quase que na sua totalidade,seta)

Page 6: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

pouco sintomática, o que justifica o acompanhamento

radiográfico periódico dos pacientes.

A falha da interface implante/osso (falha tipo IIIC) se

refere à soltura de implantes não cimentados. Radio-

graficamente um implante femoral não cimentado,

adequadamente fixo, caracteriza-se pela presença de

pontos ou trabéculas de união, (spot welds, observados

mais comumente na porção distal da região de

revestimento poroso), atrofia óssea proximal e hipertro-

fia óssea distal (Fig.57.5A). A soltura desta interface é

manifesta pela presença de linhas de radiotransparência

progressivas ao redor do implante e a formação de um

pedestal ósseo na extremidade distal da haste.

Denomina-se fixação fibrosa estável a condição em que

não se observam evidências de soltura clínica ou

radiográfica (linhas radiotransparentes ou formação de

pedestal), porém os sinais de fixação também estão

ausentes (spot welds, atrofia óssea proximal e hiper-

trofia óssea distal)26

.

Para o implante acetabular não cimentado, sinais

óbvios de soltura são: a migração vertical do implante, a

quebra de parafusos ou a liberação de fragmentos

metálicos da superfície porosa. Não raramente ocorre o

aumento de densidade reacional do osso subcondral

(Fig.57.5B e C). A soltura combinada é diagnosticada

quando da falha simultânea de mais de uma interface

(falha tipo IIID).

O modo de desgaste (tipo de falha IV) pode originar-

se nas superfícies articulares primárias (participantes do

par tribológico, falha tipo IVA, Fig. 57.6A), nas super-

fícies articulares secundárias (por exemplo, na interface

entre o inserto de polietileno e a taça acetabular

metálica, falha tipo IVB, Fig.57.6B e C), nas superfícies

que não deveriam articular-se entre si (cabeça femoral e

osso pélvico ou taça metálica, falha tipo IVC, Fig.57.6D)

ou ainda de forma combinada, quando mais de uma

origem do desgaste está presente (falha tipo IVD,

Fig.57.6E e F).

Pacientes portadores de Quadril Protético Doloroso

sem Falha Aparente (Modo V de falha) devem ser

exaustivamente investigados quanto à possível origem

(intra-articular ou extra-articular), uma vez que na

ausência de indícios que apontem especificamente para

uma destas origens, qualquer ato cirúrgico deve ser

postergado, e causas não relacionadas ao quadril (dor

irradiada ou reflexa) devem ser consideradas.

Para isto devemos considerar os diagnósticos

diferenciais já discutidos em capítulos anteriores,

sobretudo em relação à soltura femoral.

O diagnóstico clínico de suspeição da soltura deve ser

feito sempre que ocorrer dor em virilha, nádega (soltura

acetabular) ou coxa (soltura femoral) no membro

operado, em um paciente previamente assintomático.

Tipicamente a dor relacionada à soltura se agrava com

o suporte de carga e com a movimentação do quadril,

particularmente às rotações, interna e externa, que

possivelmente está ligada à rotação da haste no interior

do canal femoral23

. Quando a soltura ocorre precoce-

mente no período pós-operatório, sem causa aparente,

a infecção deve ser descartada. A marcha é freqüente-

mente antálgica e em estágios subseqüentes o sinal de

Trendelemburg pode estar presente. O diagnóstico

diferencial deve incluir doença ou hérnia discal

degenerativa, estenose espinal adquirida, patologias

abdominais, tumores ósseos e bursite trocantérica ou do

ílio psoas.

A Distopia Primária dos Implantes Protéticos, que

ocorre durante o ato cirúrgico, pode ser originada por

mau posicionamento do componente acetabular,

femoral, componentes acessórios ou ancilares (como

parafusos acetabulares, anéis de reforço etc.) ou

envolver mais de um componente da substituição

protética (distopia combinada)16-20

.

III.3. Mecanismos das Falhas

Os mecanismos de falha se referem aos processos,

principalmente mecânicos, eletroquímicos e biológicos,

que estão envolvidos na gênese das falhas.

Fig.57-6. Diferentes origens de desgaste de implantes protéticos, (A): entre superfícies articulares não constritas (primárias);(B e C): entre

superfícies constritas (inserto acetabular e taça metálica; (D): entre cabeça metálica e osso acetabular ou combinada e (D e F): entre cabeça metálica e polietileno , que ao se romper permitiu o desgaste entre a cabeça e a taça metálica.

Fig.57-5. Padrão de soltura da interface implante/osso em componentes não cimentados. (A): A haste fixa é caracterizada pela presença de pontos ou trabéculas de união, (spot weld, setas) observados mais comumente na porção distal da região de revestimento poroso, atrofia óssea proximal

e arredondamento da região proximal-medial; (B): A soltura do implante acetabular é observada pela demarcação circunferencial do implante (seta grande), associada ao aumento da densidade óssea subcondral (cabeça de seta B) ou (C): migração (seta curva C) e ou demarcação do implante (seta reta C).

Page 7: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

A. Mecanismos de Ruptura:

Os principais mecanismos que podem levar à ruptura

do implante são: a fratura, a fadiga, e a fluência. A

deformação plástica macroscópica do implante, embora

se manifeste sem a solução de continuidade representa

uma falência mecânica (ruptura funcional), o que leva à

necessidade de sua substituição e, portanto é

considerada uma falha10

.

A.1. Fratura: A ruptura do implante por fratura ocorre de

maneira diferente caso o material seja dúctil ou frágil. A

fratura dúctil ocorre em materiais que se deformam

plasticamente antes de se romper (como os metais ou o

polietileno), enquanto que na fratura frágil o material se

fratura sem deformação significativa6 (é o caso

principalmente das cerâmicas e do cimento ósseo).

Os materiais podem ser tenazes ou frágeis ou ainda

alguma combinação dos dois, dependendo da deforma-

ção que podem suportar previamente à ruptura (Fig.57-

7). Algumas resinas, incluindo o cimento ósseo, quando

aquecidas podem alterar seu comportamento frágil para

um comportamento mais tenaz, passando a apresentar

uma região plástica definida, desde que ultrapassada

uma determinada temperatura crítica chamada Tempe-

ratura de Transição Vítrea (Tgs).

Nesta classificação reservamos o termo fratura, para a

ruptura do material (solução de continuidade do

implante) devido ao carregamento estático. Os metais

apresentam tipicamente um comportamento dúctil e

assim sua falência ocorre quase que exclusivamente por

fadiga (ver abaixo).

O cimento ósseo (PMMA), utilizado há cerca de 50

anos com o objetivo de acoplar implantes artroplásticos

ao tecido ósseo adjacente, é uma resina acrílica

resultante da polimerização do metacrilato de metila

(MMA). Do ponto de vista mecânico o PMMA é um sóli-

do com característica viscoelástica, de baixa rigidez (E=

2.3 GPa, comparado ao Eosso cortical:16 GPa, ECr-Co: 250

GPa). Porém quando comparado a outros polímeros

(como por exemplo, o polietileno), apresenta grande

rigidez e baixa ductilidade, e, portanto um comporta-

mento frágil. Estas propriedades devem ser considera-

das quando de sua utilização em artroplastias, situação

em que sua atuação como transmissor de esforços do

implante aos tecidos adjacentes é requerida. Com

características viscoelásticas o cimento pode fluir (ver

fluência, abaixo A.3), e assim permitir a migração de

implantes, muito embora a fluência no manto de cimento

seja de pequena magnitude frente ao que se observa

em situações clínicas27

.

Em artroplastias experimentais in vitro o cimento

ósseo está sujeito a tensões muito próximas do seu

limite de resistência quando em carregamento cíclico,

circunstância em que a fluência, após um período de

aumento rápido, tende a permanecer constante nos

ciclos subseqüentes11, 13

. Saliente-se, contudo que as

propriedades mecânicas do cimento são dependentes

de vários fatores como o peso molecular, proporção e

constituição do monômero, características e concen-

tração dos aditivos, temperatura, métodos de esteriliza-

ção e técnica de manejo. Desta forma a utilização do

cimento ósseo requer uma técnica adequada e racional

dentro dos preceitos recomendados pelo fabricante,

assim como do conhecimento dos fatores que possam

alterar seu comportamento mecânico.

A.2. Fadiga: Corresponde ao termo técnico utilizado na

engenharia para descrever a falha de materiais sob

carregamento cíclico, ou seja, submetidos a um

carregamento de tensões variáveis ao longo do tempo.

É sabido que o comportamento mecânico do material

depende do tipo de carregamento a que está sujeito. A

tensão que um material pode suportar ciclicamente é

muito menor que a suportável em condições estáticas.

Esta diminuição na carga máxima possível sob

aplicação cíclica é atribuída ao fato do material não ser

um sólido idealmente homogêneo. O limite de tensão

que permite um número quase infinito de ciclos é

chamado de limite de resistência à fadiga (Fig. 57-8)6.

Deste modo, em cada ciclo produzem-se pequenas

deformações, não totalmente reversíveis, que podem

Fig.57-8. Diagrama S-N típico para ligas de titânio, molibdênio e metais ferrosos em geral.. Observe que para elevadas tensões (δ) um pequeno número de ciclos (N) é suportado pelo material. Para tensões menores

um maior número de ciclos é possível, até que para uma tensão crítica (tensão de fadiga- δf) define-se o limite de fadiga, como a tensão abaixo da qual o material suporta um número infinito de ciclos.

Fig.57-7. Diagrama Tensão/Deformação. O material frágil (1) não apresenta deformação plástica significativa e apresenta baixa tenacidade ou resistência ao impacto. O material dúctil (2) se deforma plasticamente antes de se romper e apresenta maior tenacidade.

Page 8: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

evoluir para a formação de fissuras submicroscópicas, e

assim para a ruptura do implante. A ruptura por fadiga

está, portanto relacionada ao fato de, ao invés de se ter

um comportamento elástico ideal e reversível do mate-

rial têm-se na verdade uma deformação plástica não

uniforme. À parte de sua composição química e micro-

estrutural, vários outros fatores, que atuam através do

mecanismo de concentração de tensões, podem

interferir na resistência à fadiga de um implante artro-

plástico. Assim, mesmo um implante com adequada

composição química, microestrutural e de design, pode

sofrer fadiga quando sujeito às tensões localizadas de

magnitude anormalmente elevadas (concentração de

tensões). Imperfeições na superfície do implante, sob a

forma de perturbações grosseiras (geométricas ou

entalhes) ou mais discretas, como pequenos orifícios ou

sulcos podem atuar como concentradores de tensões e

assim predispor à fadiga do implante. Defeitos locais de

composição, podem também sofrer deformações plás-

ticas com cargas de menor magnitude, que inicialmente

não causam a deformação do material como um todo,

porém podem levar a fadiga do implante (Fig. 57.9A-E).

A ocorrência de perturbações da superfície do

implante ocasionadas por corrosão ou fretagem pode,

igualmente, gerar pontos de concentração de tensões.

O ambiente mecânico a que está sujeita a recons-

trução protética é também importante para a sua resis-

tência à fadiga. Nas situações em que o implante não

apresente uma fixação adequada em toda sua extensão

pode-se gerar um ambiente de viga em balanço (ou

cantílever). Nesta condição, a transição entre a região

fixa e a região em balanço (chamada ponto de engaste)

fica sujeita a elevadas tensões, e assim predisposta à

fadiga (Fig.57.10A e B)15

. Desta forma, o suporte

mecânico, seja por uma camada adequada de cimento

ósseo, ou primariamente por tecido ósseo é condição

determinante para a estabilidade e resistência mecânica

dos elementos protéticos.

Inclui-se, portanto, no conceito de viga em balanço,

a falta de suporte ósseo ao implante, circunstância em

que também se gera um ponto de engaste, como por

exemplo após a osteotomia trocantérica estendida

(suporte ósseo proximal inadequado), frequentemente

utilizada em conjunto com hastes de fixação distal

modulares.

Nesta situação, a circunstância de concentração de

tensões proximalmente, pode levar à fadiga das junções

modulares. Assim, o local de fadiga do implante é

variável e dependente da localização do ponto de

engaste (Fig.57.11).

A.3. Fluência (Creep): Materiais biológicos (como o teci-

do ósteo-ligamentar) e alguns biomateriais (polietileno e

cimento acrílico) têm suas propriedades mecânicas

Fig.57-9. (A):Haste femoral submetida à análise laboratorial.Observa-se a fratura na altura na transição dos 2/3 proximais com 1/3 distal. (B): Plano de fratura coincidente com a marcação de identificação. (C): Aspecto geral da fratura apresentando um intenso amassamento (seta) (D): Estrias de fadiga observadas em MEV. (E) : Micro trinca cuja origem coincide com a alteração micro-estrutural devida à marcação a laser. A marcação a laser impôs transformação da

microestrutura austenítica em alta temperatura.

Fig.57-10. Ruptura de implante femoral por fadiga. (A): Observe a condição de viga em balanço gerada pela falta de cimentação na região

proximal e lateral do implante. O ponto de engaste é representado pela

seta. (B): Neste local (seta) observa-se a ruptura do implante.

Fig.57-11. Diferentes locais de ruptura de implantes femorais, dependentes dos pontos de engaste, no mecanismo de viga em balanço, também chamado cantílever (Cortesia Dr. Milton Valdomiro Roos, CEOP – Passo Fundo, RS).

Page 9: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

governadas pela sua característica viscoelástica, que

lhes conferem uma curva tensão-deformação particular,

e que se altera com a velocidade de aplicação do esfor-

ço.

Do ponto de vista mecânico estes materiais conti-

nuam a se deformar mesmo quando submetidos ao

carregamento constante (Fig.57.12A,B). Esta deforma-

ção plástica e progressiva dos materiais em condições

de tensão constante é denominada fluência (creep ou

cold-flow na língua inglesa)6,15

.

Embora tanto o polietileno como o cimento acrílico

apresentem fluência quando submetidos ao carre-

gamento estático ou cíclico, estes materiais diferem-se

quanto à intensidade do processo de deformação

permanente. O PMMA, de maior rigidez (maior módulo

de elasticidade) tem comportamento frágil e sofre menor

deformação permanente (fluência) quando comparado

ao polietileno (Fig.57.12C). A viscoelasticidade origina

também a propriedade de Relaxação de Tensão que se

refere à diminuição do esforço necessário para manter

um determinado estado de deformação em um corpo6.

Em relação ao polietileno, o conhecimento da fluência é

importante, por exemplo, para se avaliar o desgaste em

substituições articulares protéticas. Quando calculamos

o desgaste do polietileno na superfície articular protética

através de medidas radiográficas, na verdade estamos

considerando não só o desgaste real do polietileno, mas

também sua deformação por fluência, esta de maior

magnitude no primeiro ano após a artroplastia. A taxa

de fluência é determinada em parte pela temperatura,

de modo que o cimento acrílico, por exemplo, pode fluir

em meio líquido à temperatura de 37ºC.

Quanto ao cimento acrílico, em sua função de

transmissão de carga na artroplastia, devemos conside-

rar que as solicitações impostas provocam a interação

de mecanismos de fluência e fadiga, que geram o

acúmulo progressivo de danos ao manto de cimento. A

fluência do cimento, contudo, reduz o nível de tensões

no manto o que, a princípio pode diminuir o efeito de

fadiga. O pico de tensões trativas pode ser reduzido pe-

lo fenômeno de relaxação por fluência, e assim ocasio-

nar a diminuição do processo de acúmulo de danos, que

é função da magnitude destes esforços de tração 11,13

.

Segundo Verdonschot e Huiskes 27

, a taxa de fluência

decresce com o tempo, indicando que embora continue

por um longo período, pode vir a ser insignificante em

longo prazo.

Quaisquer deformações permanentes no manto de

cimento sejam por fadiga ou fluência, são consideradas

indesejáveis, uma vez que podem permitir a migração

distal excessiva do implante femoral. Esta observação é

subsidiada pelos achados de migração excessiva do

implante femoral associada a um tipo de cimento de

baixo módulo de elasticidade (cimento de baixa rigidez).

Os maus resultados observados com tal formulação

culminaram com sua retirada precoce do mercado28

.

Vários autores propuseram a utilização de modelos

protéticos de hastes femorais que possam tirar vanta-

gem da fluência do manto de cimento e assim

preconizaram o design cuneiforme que pode, por

migração, se acomodar a este manto quando da sua

deformação2,11,13,22,23,29,30

. Para a otimização deste

efeito, sugeriram ainda a diminuição do atrito entre

haste e cimento e assim recomendam a utilização de

hastes polidas. Quando da acomodação da haste ao

cimento que fluiu, o design cuneiforme permite a

compressão radial do manto, criando um novo ambiente

mecânico mais estável.

Experimentalmente constatou-se a migração protética

decorrente da fluência, contudo de magnitude bastante

variável e sensível ao tipo de acoplamento da interface

metal/cimento, e à formulação do cimento31

. Embora a

migração distal máxima de 0,5 mm para hastes femorais

seja atribuída à fluência, ela é responsável pela falha

em fadiga da interface cimento/osso o que, conse-

qüentemente, pode levar à soltura do implante.

A menor resistência mecânica do osso trabecular,

adjacente ao cimento, pode permitir maiores deforma-

ções e a ocorrência de trincas no manto de cimento,

contudo sua relevância ainda está por ser determinada.

A.4. Deformação Plástica Macroscópica: Muito embora

na deformação plástica não haja solução de continuida-

de do implante ela representa a deformação permanen-

te do componente e, portanto determina uma ruptura

funcional (Fig.57.13A-C). A deformação plástica ocorre

também em pontos de concentração de tensões, e é

frequentemente resultante de características da estrutu-

ra e composição do material assim como de suas

propriedades mecânicas, como baixas dureza e rigidez.

B. Mecanismos de Desacoplamento:

Os mecanismos envolvidos no desacoplamento de im-

plantes protéticos são dependentes da relação de estabi-

lidade mecânica entre os diferentes elementos das inter-

faces e, portanto estão associados primariamente à ori-

gem deste modo de falha. No desacoplamento de inter-

faces não constritas (falha tipo IIA), a instabilidade pro-

tética, sob a forma de luxação ou subluxação, é a mani-

festação mais freqüente. Sua ocorrência pode ser devida

ao mecanismo de impacto entre diferentes porções do

implante (como entre o colo femoral e o componente

acetabular) entre os componentes do implante e estrutu-

Fig.57-12. A característica viscoelástica do cimento ósseo permite que ao ser submetido ao carregamento constante (A), sofra deformação progressiva por fluência (B). Contudo, comparado ao polietileno, o PMMA, de maior rigidez (maior módulo de elasticidade), tem compor-tamento frágil e sofre menor deformação permanente por fluência (C).

Page 10: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

turas ósseas adjacentes (como entre o colo femoral

protético e osteofitos acetabulares) ou entre estruturas

ósseas como a que pode ocorrer entre o grande

trocânter e a pelve. Na ausência de impacto patente,

mecanismos traumáticos ou secundários ao desequi-

líbrio de partes moles frequentemente estão associados

à instabilidade da reconstrução protética.

Nas interfaces semi-constritas, onde movimentos

discretos,como a fretagem, são observados, a magnitu-

de do atrito é determinante para a ocorrência do desa-

coplamento, por exemplo, entre haste e cimento.

Por outro lado nas interfaces constritas como ocorre

entre o cone Morse e a cabeça modular protética ou

entre o inserto acetabular e a taça metálica, o desaco-

plamento só irá ocorrer em virtude do comprometimento

dos elementos responsáveis pela estabilidade do

conjunto.

B.1. Impacto (Entre elementos do implante e/ou estrutu-

ras ósseas):

- Impacto Implante/Implante

Para as interfaces não constritas, como a superfície

articular primária, a instabilidade protética é mais fre-

quentemente causada pelo conflito entre duas porções

do implante. Neste caso a amplitude de movimentação

da articulação protética, livre de contato entre porções

do implante (folga ou clearance articular), está dimi-

nuída. Esta situação pode ocorrer em função de

detalhes do design protético ou ainda pelo posicio-

namento do implante durante o ato cirúrgico. Uma

característica importante do design protético é o offset

céfalo-cervical, definido como a razão entre o diâmetro

da cabeça protética em relação ao colo. Quando esta

relação tem valor inferior a 2, a diminuição do clearance

articular resultante aumenta o risco de impacto e,

portanto de instabilidade protética (Fig.57.14). Desta

forma cabeças de maior diâmetro não dotadas de ex-

tensões (skirt), e associadas aos colos trapezoidais são

recomendadas, se resultarem em offset céfalo-cervical

maior que dois. Esta relação, e não somente o valor

absoluto do diâmetro da cabeça protética, deve ser

considerada.

Neste sentido é de particular interesse o grande

diâmetro da cabeça protética nas artroplastias de

recapeamento, porém como o colo femoral (ósseo)

remanescente apresenta também grande diâmetro, a

relação céfalo-cervical deve ser cuidadosamente

observada. Outra característica relevante do design

protético é o formato da borda da superfície articular do

componente protético, seja com respeito ao chanfro

como também a presença de elevações localizadas.

Detalhes do chanfro e da topografia das elevações das

bordas do implante podem diminuir o clearance e assim

predispor ao impacto com o colo protético adjacente.

Fatores relacionados ao posicionamento dos implan-

tes protéticos têm adicionalmente grande relevância na

gênese do impacto. A lateralização, horizontalização e

versão do implante acetabular e femoral durante o ato

operatório podem também diminuir o clearance articular

e predispor ao impacto e à instabilidade protética.

Além da instabilidade protética, o impacto entre duas

porções do implante pode ocasionar fratura do inserto

acetabular cerâmico, metalose quando do impacto entre

2 porções metálicas e osteólise oriunda de partículas

resultantes do desgaste por impacto.

- Impacto Implante/Osso

O conflito implante/osso pode ocorrer entre o colo

protético e a borda acetabular nos casos em que o

tecido ósseo remanescente da borda acetabular

transcenda os limites da borda do implante. Neste caso,

os osteófitos devem ser removidos, ou caso um

componente acetabular sub-dimensionado ou exces-

sivamente medializado tenham sido implantados, sua

correção é imperativa.

Fig.57-14. Para um mesmo diâmetro externo de componente

acetabular de mesmo design, a utilização de cabeças de diâmetro crescente (28mm, 32mm, 36mm e 40mm) proporcionam amplitude de movimentação respectivamente de 123º, 130º, 136º e 152º, até o impacto. A distância crescente a ser percorrida pela cabeça protética também é demonstrada (d1 e d2). d2).................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

Fig.57-13. Deformidade Plástica Macroscópica de Implantes. (A): Radio-

grafia no plano frontal mostrando discreta deformidade plástica da haste

femoral na região do foco de fratura do cimento ósseo. (B): Detalhe do

explante mostrando a região da haste submetida às tensões de compres-

são (seta). (C): Cortesia Dr. Nelson Franco Filho que mostra radiografia n

no plano frontal com deformidade plástica acentuada do implante femoral

(seta) ao redor da região de não união de fratura periprotética diafisária.

Page 11: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

- Impacto Osso/Osso

O conflito osso/osso está também intimamente ligado a

fatores relacionados à técnica cirúrgica. A restauração

do centro de rotação do quadril protético em relação ao

seu offset e à sua altura promovem um clearance (folga)

articular adequado. Contudo, o offset e o comprimento

do membro diminuídos, podem predispor ao impacto do

fêmur contra a pelve. De particular importância para a

restauração do centro de rotação do quadril protético é o

ângulo cervico-diafisário, uma vez que dele dependem

tanto o offset quanto a altura do CR da cabeça

protética31

. Vários estudos têm demonstrado que hastes

femorais com opção única de ângulo cérvico-diafisário

são capazes de restaurar a topografia adequada do CR

em apenas 30-40% dos casos32-34

.

B.2. Falência do Suporte Ósseo e/ou do Cimento

Ósseo: Como já citado anteriormente, o mecanismo de

desacoplamento da interface cimento/implante pressu-

põe um comportamento mecânico de superfícies não

aderidas, como ocorre nas hastes polidas (rugosidade

de superfície menor que 0.25 μm). Para o adequado

esclarecimento deste mecanismo é preciso considerar

que a mecânica da haste femoral cimentada prevê duas

situações distintas:

- a de interface não aderida entre a haste e o cimento

como ocorre nos casos de hastes polidas (rugosidade

de superfície menor que 0.25 micrômetros – μm)

- ou de interface aderida como ocorre em hastes de

superfície fosca (ou opacas, “matte finished”, com

rugosidade entre 0.50 e 0.75 μm), hastes de superfície

jateada (1.75 a 2.50 μm, “grit blasted”), ou ainda hastes

com superfícies dotadas de macro-texturas ou design

anatômico.

No caso de hastes polidas, durante a cura, o cimento

se molda às discretas irregularidades da superfície do

implante, gerando um acoplamento mecânico que se

comporta como uma interface não aderida, de baixo

atrito.

A solicitação mecânica pode originar discretos movi-

mentos nesta interface que permitem, no caso de hastes

cônicas, o assentamento deste implante no interior do

manto de cimento, que por sua fluência se molda nova-

mente à superfície polida do implante, provendo esta-

bilidade mecânica através de tensões radiais. Esta aco-

modação da haste polida e cônica pode ser observada

radiograficamente como uma linha radiotransparente, de

poucos milímetros de espessura (< 2 mm), não progres-

siva, na região do “ombro” da haste súpero-lateralmen-

te, denominada na língua inglesa debonding (Fig.57.15).

Como conseqüência do baixo atrito, pouco ou nenhum

dano é ocasionado ao manto de cimento, porém

pequenas alterações da superfície do implante podem

ser notadas, como por exemplo, o polimento adicional.

Portanto, para hastes polidas e cônicas, o debonding é

um achado precoce, não progressivo, que se estabiliza

por volta do primeiro ano pós-operatório e que parece

proteger a interface cimento/ osso de tensões elevadas

de cisalhamento. Linhas radiotransparentes de maior

espessura e progressivas estão associadas à instabi-

lidade do implante e, portanto indicam falha potencial.

que podem permitir a migração distal excessiva do

implante femoral, caracterizando assim o desacopla-

mento (veja acima item A.3. Fluência). Em estudos

experimentais nós demonstramos11,13

, a exemplo de

outros autores, a importância da estabilidade rotacional

do implante femoral na migração protética.

Implantes de menor rigidez (menor módulo de

elasticidade, e menor preenchimento do canal medular

proximalmente) produzem maiores tensões no manto de

cimento e assim resultam no alargamento da cavidade,

tanto em suas dimensões ântero-posterior como médio-

lateral. De fato, constatamos que a rotação da haste

posteriormente precede a migração distal (Fig.57.16).

Este alargamento pode ser maior que o

permitido pela fluência do manto de cimento

propriamente dito, uma vez que a fluência do osso

esponjoso adjacente ao manto pode permitir o

alargamento da cavidade nestes planos. Estas são

constatações que justificam a caracterização deste

evento como falta de suporte mecânico, seja do cimento

ou do osso trabecular adjacente ao cimento.

Conjecturamos que talvez este seja o real motivo para

falhas mais precoces, caso se deixe osso esponjoso

residual na região medial do fêmur proximal, sem ser

preenchido por cimento ósseo. Além disto, este aspecto

pode justificar a maior longevidade em hastes que

possuam um grande preenchimento proximal da

cavidade medular, ainda que com um manto de cimento

de espessura não maior que 1-2milímetros (Paradoxo

Francês)35,36

.

Fig.57.15. Radiografia ântero-posterior da pelve em um paciente submetido ao implante de haste cônica, polida e sem colar. Observe a demarcação na região do ombro da haste (Debonding -seta). Este achado, de espessura menor que 1-2mm e não progressivo denota somente a acomodação da haste no interior do manto de cimento, e assim não caracteriza um desacoplamento.

Embora interpreta-

da como uma aco-

modação da has-

te, permitida pela

fluência do manto

de cimento e do

osso trabecular ad

jacente ao cimen-

to, alertamos que

quaisquer defor-

mações perma-

nentes no manto

de cimento, sejam

por fadiga ou

fluência, são con-

sideradas indese-

jáveis , uma vez

Page 12: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

É notório ainda, o fato constatado em nossas

observações experimentais13

e clínicas37

que mostram a

inexistência de debonding em hastes polidas e cônicas

seguidas em média por 7,8 anos, em que o

preenchimento proximal do fêmur pelo implante foi

maior que 60%, e a cimentação classificada como grau

A ou B de Barrack et al38

. Estas observações dão

suporte à nossa abordagem de fazer a diferenciação

entre desacoplamento e soltura do implante (ver item C,

Mecanismos de Soltura).

Um tipo particular de desacoplamento de

interfaces diz respeito aos implantes não cimentados,

femoral ou acetabular, na interface implante/osso, em

que na verdade a fixação biológica nunca foi obtida.

Implantes não cimentados que não apresentem

estabilidade imediata adequada, estão incluídos neste

mecanismo de desacoplamento. Implantes femorais

subdimensionados, ou componentes acetabulares e

femorais implantados sem a técnica de acoplamento por

pressão de contato (press-fit), podem predispor a não

fixação biológica, ou ainda a fixação por tecido fibroso e

não o tecido ósseo. Uma vez que estes implantes nunca

estiveram adequadamente fixos pela osteointegração,

acreditamos ser imprópria a utilização do termo soltura e

assim preferimos a denominação desacoplamento.Esta

situação ocorre principalmente na falta da estabilidade

mecânica inicial do implante protético, que pode

originar-se por inadequação técnica ou pela insuficiência

de suporte ósseo.

A osteointegração do implante requer condições de

estabilidade mecânica, frequentemente obtida por

press-fit, também chamada de interference-fit (quando o

implante tem maior diâmetro que a cavidade criada para

recebê-lo) ou por scratch-fit (quando somente a espes-

sura do revestimento poroso ultrapassa o diâmetro da

cavidade criada). No caso do exact-fit, implante e cavi-

dade têm o mesmo diâmetro e, portanto mecanismos

adicionais de estabilização devem estar presentes.

Muito embora a falta de suporte ósseo, seja ela

quantitativa (como na displasia do desenvolvimento, pós

fratura do acetábulo, protrusão acetabular entre outros)

ou qualitativa (pós-irradiação, doenças osteometa-

bólicas ou congênitas, por exemplo), a causa mais

freqüente da falha da osteointegração (desacoplamento)

é de natureza técnica.

A não obtenção de um assentamento adequado do

implante metálico não cimentado junto a um leito ósseo

sangrante dificulta ou, mais frequentemente impede a

fixação biológica. A dificuldade técnica de um assen-

tamento adequado do implante acetabular foi reportado

por Schwartz et al39

, que observaram um contato

inadequado na interface implante/osso em 100% dos

espécimes testados, ainda que em condições de

laboratório e realizado por cirurgiões experientes.

O diagnóstico do desacoplamento pode muitas

vezes passar despercebido por longo tempo uma vez

que os sintomas podem ser escassos, principalmente

quando não associado à migração do implante

(Fig.57.17).

No caso de implantes femorais, o desacoplamento

também é frequentemente ocasionado pela instabilidade

mecânica resultante do implante de um componente

subdimensionado. Os sintomas neste caso podem ser

mais intensos e representados principalmente pela dor

na coxa, de origem mecânica. Radiograficamente os

sinais de osteointegração não estão presentes (já

discutidos na origem das falhas).

Fig.57-16. (A): Radiografia do quadril direito em projeção ântero-posterior em um paciente submetido ao implante de haste cônica, polida e sem colar. Observe que não existe sinal característico de debonding (seta). (B): A projeção sagital do quadril mostra, contudo o alargamento do manto de cimento femoral associado à retroversão da haste, que pode ser constatado pela presença de grande radiotransparência entre o manto de cimento e a face anterior da haste (Setas). Este fato indica que a rotação posterior precede a migração distal da haste.

Fig.57-17. (A): Radiografia do quadril esquerdo em diferentes períodos de seguimento. O paciente não apresentava queixas clínicas signifi-cativas, exceto discreta dor na nádega ao levantar da posição sentada, que melhorava com a movimentação ulterior. (A): PO imediato mostrando assentamento inadequado do implante (seta) (B): 25 meses PO (C):62 meses pós PO, sem alterações significativas em relação ao PO Imediato. Aos 114 meses pode-se notar migração do componente acetabular, com desaparecimento da linha rádiotransparente (D). Observe o desgaste do polietileno, com migração superior da cabeça protética.(E): explante acetabular que não apresenta quaisquer sinais de osteo-integração F: Inserto de polietileno com desgaste na região superior e impressãso da cabeça do parafuso (G, seta)

Page 13: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

B.3. Traumático: A instabilidade das superfícies arti-

culares primárias (não constritas) podem apresentar-se

também sob a forma de luxação ou sub-luxação de

origem traumática, ainda que na ausência de impacto

repetitivo, por distopia dos implantes protéticos. Neste

caso, traumatismos ou movimentos inadequados que

levem a posições extremas, como a de flexão adução e

rotação interna em pacientes submetidos à artroplastia

primária por abordagem posterior, podem causar o

desacoplamento da superfície articular.

O desacoplamento de interfaces semi-constritas,

como pode ocorrer entre a haste femoral polida e cônica

e o manto de cimento, ocorre mais frequentemente, pela

migração da haste no interior do manto de cimento.

Porém em virtude desta superfície não aderida ter baixa

resistência mecânica aos esforços de tração, quando

sujeita ao arrancamento, por exemplo, durante a

luxação protética, a haste pode se desalojar do manto

de cimento (Fig. 57-3D), caracterizando assim um

verdadeiro desacoplamento do implante. Esta complica-

ção tem sido relatada na literatura com freqüência

crescente para hastes femorais com estas caracterís-

ticas (force closed), de tal forma que alguns autores têm

sugerido a aplicação de uma porção de cimento na

região supero-lateral do implante, de modo a prevenir o

arrancamento ou desalojamento traumático da haste

(desacoplamento)40

. As hastes femorais com carac-

terísticas de interface aderida (shape closed) têm um

comportamento mecânico distinto, que será abordado

abaixo nos mecanismos de soltura.

O desacoplamento entre interfaces constritas (como

exemplo entre o inserto e o suporte metálico acetabular,

entre cabeça modular e cone protético ou entre cabeça

e anéis de retenção) pode ocorrer por traumatismo

agudo ou também por impacto repetitivo. O desaco-

plamento entre cabeça modular e cone da haste em um

componente bipolar, quando não há falha do anel de

trava é um exemplo. Por outro lado a falha do anel de

trava deste componente ocasiona o desacoplamento

entre cabeça e o implante bipolar. Temos observado

alguns casos de desacoplamento entre cabeça modular

e cone protético, em pacientes referenciados, nos quais

as dimensões entre os componentes são incompatíveis

(Fig.57-18A e B). Embora neste caso devêssemos

esperar uma interface constrita, temos na verdade uma

interface semi-constrita.

O impacto entre o colo da haste e o inserto de

polietileno pode ocasionar o desacoplamento entre

inserto e taça metálica. Neste caso, frequentemente

ocorre a falha do mecanismo de trava do inserto, mais

comum na primeira geração de implantes acetabulares

não cimentados. Mecanismos inadequados de trava do

inserto também podem transformar uma interface que

originalmente deveria ser constrita, em uma interface

semiconstrita, devido, sobretudo a movimentos rotacio-

nais do inserto no interior da taça metálica.

B.4. Desequilíbrio de partes moles : O desacoplamen-

to, notadamente entre superfícies articulares não

constritas, pode ser ocasionado pela falta de

estabilização dinâmica da articulação protética. O

mecanismo envolvido nesta tensão diferencial das

partes moles periarticulares pode estar relacionado aos

fatores dependentes da técnica cirúrgica ou design do

implante, que resultem em offset medial inadequado, ou

ainda a fatores dependentes do paciente como maior

lassidão muscular (idosos, sexo feminino e número de

cirurgias prévias do quadril), comorbidades (distúrbios

neurológicos e cognitivos, alcoolismo), fraturas por

avulsão trocanteriana (traumática ou secundária à

osteólise), impacto (já descrito acima), abordagem

cirúrgica ou mau posicionamento dos implantes

protéticos.

B.5. Desacoplamento por Mecanismos Associados: Não

raramente, mais de um mecanismo pode estar presente,

simultaneamente, e assim determinar o desacoplamento

de implantes protéticos. Quando um mecanismo

isoladamente já é suficiente para ocasionar o

desacoplamento ele é classificado como causa primária.

Porém quando somente a associação de mecanismos é

que tornam possível o desacoplamento, como por

exemplo, quando do desalojamento da haste femoral do

canal femoral durante a luxação protética, é que

consideramos mecanismos associados.

C. Mecanismos de Soltura:

A soltura asséptica dos implantes protéticos do quadril

é um evento de natureza primariamente mecânica,

podendo ser agravado por fatores secundários sejam

eles mecânicos ou biológicos. Os mecanismos de

soltura variam em função da fixação do implante

(cimentado ou não cimentado), do suporte ósseo ao

implante, de seu design (polida, rugosa ou texturizada) e

da técnica cirúrgica (posicionamento dos implantes).

C.1. Falência do Cimento ósseo: Durante o seu período

em serviço na artroplastia de quadril, o cimento ósseo

está sujeito a tensões muito próximas ao seu limite de

Fig.57-18. Desacoplamento da interface entre cabeça protética e cone da haste femoral (interface constrita). Devido a incompatibilidade dimensional entre estes componentes (A, seta), ocorreu secun-dariamente o desacoplamento entre os componentes da superfície articular primária, não constrita (B). ....................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

Page 14: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

resistência e, portanto sujeito a falência por trincas e

soltura na sua interface com o implante e o osso. Após a

falência mecânica do manto de cimento, as trincas

passantes, e/ou o espaço articular efetivo permitem o

mecanismo de pressão hidrostática flutuante que,

potencializado pela resposta orgânica aos detritos

(debris) articulares, dão origem a reabsorção óssea

localizada e progressiva (osteólise)41

. A soltura da

interface cimento/osso é a causa mais freqüente de

revisão por soltura de implantes artroplásticos de

quadril.

Diferentemente do conceito de desacoplamento de

hastes polidas, a falência do cimento na presença de

hastes que apresentam superfície aderida com o manto

adjacente, é considerada soltura da interface. As

hastes que proporcionam superfície aderida com o

cimento, de alto atrito (shape closed), como nas hastes

de superfície fosca, jateada, pré-revestida, dotadas de

macro-texturas ou de design anatômico, promovem a

sobrecarga da interface cimento/osso e assim predispõe

a soltura do cimento em relação ao osso adjacente.

Além do mais, o atrito elevado e a aspereza da super-

fície, promovem danos consideráveis ao cimento e ao

implante quando de sua soltura. A soltura de outros

materiais interpostos entre o implante e o osso, como o

revestimento de hidroxiapatita ou de metacrilato de

metila, podem adicionalmente gerar uma interface de

atrito elevado.

Desta forma a migração e acomodação da haste no

manto de cimento é um processo inerente às polidas,

cônicas e sem colar, porém a migração na presença de

hastes com superfície aderida deve ser considerada

como soltura e, portanto falha do implante. Vários

fatores têm sido associados à maior ou menor taxa de

soltura das hastes femorais cimentadas. A espessura do

manto de cimento (entre 2-5 mm) parece proteger o

implante da soltura. O aumento da rigidez do implante

(diminuição da ductilidade) diminui a sobrecarga ao

manto de cimento, sobretudo em relação aos momentos

flexurais e rotacionais. Assim, materiais de maior

módulo de elasticidade e hastes com maior preenchi-

mento proximal têm sido associados à menor taxa de

soltura36,37,42,

. Segundo alguns autores, o preenchimento

proximal é um fator de extrema importância na

longevidade da reconstrução, mesmo que obtida às

custas de um manto de cimento mais fino. Este

fenômeno, conhecido como Paradoxo Francês36

, tem

justificado a utilização de hastes que permitem maior

preenchimento das dimensões do fêmur proximal

(>60%) e, portanto do canal medular, pelo implante

protético37

.

A longevidade da fixação do implante acetabular

cimentado é menor que a do componente femoral. Os

motivos alegados para este fato estão relacionados à

menor penetração do cimento no leito ósseo, ambiente

mecânico e técnica cirúrgica inadequada. Achados

histológicos de autópsia em componentes acetabulares

bem fixos radiograficamente mostraram a interposição

de membrana em quase toda extensão da interface

cimento/osso, à exceção de escassos pontos focais de

contato direto entre cimento e tecido ósseo adjacente24

.

A ausência de interdigitação no osso subcondral, na

periferia do acetábulo, permite que o mecanismo de

pressão hidrostática flutuante, potencializado pela

presença de debris oriundos da superfície articular

através do espaço articular efetivo, direcione estas

partículas para o osso adjacente, através das regiões de

pouca estabilidade da interface.

O ambiente mecânico parece ter importância, uma vez

que materiais para superfícies alternativas como o metal

ou a cerâmica também produzem resultados inferiores

quando cimentados. Ainda, a área exposta da superfície

do acetábulo é bem maior que a femoral, o que a torna

mais susceptível ao ingresso de detritos articulares

(debris).

C.2. Falência do suporte ósseo: Tanto os implantes

cimentados como os não cimentados necessitam de su-

porte ósseo para sua estabilidade mecânica e funcional

e, portanto para sua longevidade em serviço.

A utilização do cimento ósseo requer o travamento

mecânico do manto em osso esponjoso de boa qualida-

de.

Estudos post-mortem de espécimes avaliados por

histopatologia tridimensional, realizados por Draenert et

al24

, mostraram que em todos os casos nos quais o

cimento penetrou adequadamente no osso esponjoso,

as trabéculas resistiram à deformação quando do

suporte de carga, e permaneceram vivas, sem sinais de

reabsorção. Ao contrário, estas trabéculas encontraram-

se hipertrofiadas e reforçadas na sua estrutura lamelar

concêntrica. Portanto as lamelas ósseas reforçadas

pelo cimento apresentam maior rigidez e maior

resistência à deformação. Por outro lado, nas regiões

onde as trabéculas não foram envolvidas e reforçadas

por cimento ósseo, as lamelas evidenciaram um proces-

so de desmineralização e atrofia secundário à blinda-

gem de tensões. Os autores enfatizam que hastes

femorais cimentadas podem prover firme ancoragem se

o osso esponjoso for preservado e as trabéculas

circundadas por cimento ósseo. Esta condição está

intimamente ligada à qualidade da técnica da cimenta-

ção. Implantes femorais cimentados realizados com a

técnica de fresagem radial do canal medular, que

pressupõe a remoção de todo o tecido ósseo esponjoso

da superfície endosteal, não encontram estabilidade

mecânica adequada e têm sido associados a falha

precoce da interface cimento/osso. Realmente, Stone et

al43

encontraram 12% de falhas assépticas em apenas

68 meses de seguimento, em um tipo especifico de

haste femoral cuja técnica cirúrgica preconizava a

fresagem circunferencial do canal por meio de fresas

flexíveis, que removiam todo o osso esponjoso do

interior do canal femoral. De fato Dohmae et al44

em

estudos experimentais em fêmures de cadáver

submetidos à cirurgia primária, primeira e segunda

revisões, mostraram que a resistência ao cisalhamento

da interface cimento/osso na primeira revisão foi

somente 21% da obtida durante a cirurgia primária. Os

Page 15: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

autores discutem que a remoção de todo osso

trabecular residual expondo o endósteo, que se

apresenta polido, não produz o travamento adequado do

manto de cimento e assim resulta em soltura precoce.

Por estes motivos pessoalmente não indicamos hastes

femorais cimentadas em pacientes com canais femorais

anormalmente estreitos (Fig.57.19A) ou pós osteotomia

proximal do fêmur (Fig.57.19B e C). No caso de fêmures

com canais estreitos, a introdução do menor tamanho

de haste cimentada requer uma fresagem radial que

elimina todo o osso trabecular da cavidade medular,

deixando o cimento ósseo sem um travamento mecâni-

co adequado e simplesmente aposto ao endósteo.

Este fato talvez justifique também os melhores

resultados de hastes não cimentadas em pacientes com

anemia falciforme, uma vez que nestes pacientes,

infartos múltiplos e a corticalização do osso trabecular,

requerem a fresagem que resulta na remoção de todo o

escasso osso esponjoso existente no interior do canal

medular. Situação semelhante de corticalização do os-

so trabecular da cavidade medular do fêmur pode ocor-

rer após a osteotomia do fêmur proximal. Nesta condi-

ção a aposição do cimento ao osso cortical previne o

travamento mecânico e a estabilidade do manto.

O implante não cimentado deve, igualmente, ter uma

relação de estabilidade com o tecido ósseo adjacente. A

estabilidade imediata é condição necessária para a

osteointegração. A utilização do conceito de acoplamen-

to mecânico por pressão de contato (pressfit),

fundamentado na viscoelasticidade do osso adjacente

ao implante, requer a resistência mecânica adequada do

invólucro ósseo cortical.

A ocorrência de áreas osteolíticas de dimensões

progressivas ao redor do implante, sejam devidas aos

debris oriundos das superfícies articulares protéticas, ao

cimento ou à fretagem do implante, podem iniciar o

processo de soltura tanto de componentes cimentados

ou não cimentados, uma vez que o suporte ósseo, nesta

condição, fica comprometido. Muito embora a reabsor-

ção óssea progressiva (blindagem óssea6,15

ou stress

shielding) ocasionada pela rigidez diferencial entre

implante e osso represente uma condição de perda de

densidade mineral óssea, a repercussão clinica para a

instabilidade do implante não foi demonstrada.

C.3. Falência da Fixação Biológica: Os implantes ace-

tabulares de fixação biológica (não cimentados) reve-

laram bons e excelentes resultados clínicos aos 15 anos

de seguimento, com algumas variações em função do

design e material utilizado. Embora a taxa de desgaste

tenha-se mostrado pouco superior a dos implantes

cimentados, a incidência de soltura asséptica é menor.

Sua utilização é também atrativa pelo fato de poder ser

empregado em conjunto com superfícies articulares

modulares alternativas como metal e cerâmica.

Contudo há que se reconhecer algumas discrepâncias

entre os resultados clínicos e a análise de componentes

retirados de pacientes. Explantes removidos durante a

cirurgia de revisão, com seguimento médio de 8 meses

mostraram fixação biológica em apenas 16% (9 de 58

analisados)45

. Vários outros estudos confirmam este

achado de fixação biológica ausente ou mínima em

seguimentos de até 1 ano, acrescido do fato que

quando se observa a fixação biológica, ela ocorre em

cerca de apenas 15% da superfície do implante,

notadamente ao redor de dispositivos de fixação, como

parafusos, sendo o restante da área ocupada por tecido

fibroso denso46,47

. Por outro lado, explantes com boa

função, prévia à autopsia, e com seguimentos maiores

(38-50 meses) revelam maior área, porém ainda

proporcionalmente pequena, de fixação biológica (cerca

de 32%). Curiosamente estes estudos não revelaram

correlação entre a presença de fixação biológica nos

explantes e os achados radiográficos no que diz

respeito às áreas de radiotransparência. Desta forma

fica difícil definir se um componente acetabular não

cimentado realmente soltou-se, ou se na verdade nunca

esteve realmente adequadamente fixo por tecido ósseo.

Em nossa experiência clínica temos analisado

explantes removidos tardiamente (8-10 anos) em

cirurgias de revisão para troca do inserto de polietileno,

em pacientes pouco sintomáticos, e em que durante a

cirurgia os componentes metálicos se mostraram soltos

após a remoção dos parafusos, sem a presença de

qualquer evidência de fixação biológica (Fig.57-17).

A real soltura tardia de implantes acetabulares não

cimentados, ou seja a destruição de trabéculas ósseas

que possibilitaram a osteointegração prévia, é conjectu-

rada na literatura como resultado da fratura por fadiga

das trabéculas ósseas que penetram o implante, em

virtude da condição de perda óssea ao redor do

implante ocasionada por osteólise periprotética.

Por outro lado o componente femoral não cimentado

apresenta um percentual de fixação biológica mais

reprodutível e consistente, ao redor de 65%, observado

pela análise de explantes48

. Da mesma forma que para

os implantes acetabulares, os componentes femorais

podem não apresentar osteointegração, como no caso

de implantes subdimensionados, em que a estabilidade

imediata é inadequada. Nesta circunstância, uma linha

radiopaca ao redor de todo implante é observada

radiograficamente, assim como a formação de uma área

Fig.57-19. Situações em que a indicação de hastes femorais cimen-tadas é controversa. (A); Canais femorais extremamente estreitos nos quais a utilização de hastes cimentadas pressupõe a remoção do os-so esponjoso. (B): Osteotomias femorais proximais podem provocar a corticalização do osso esponjoso, através de (C) verdadeiras barras ósseas que impedem a ancoragem do cimento. TM:Trocanter maior, FP: Fossa Piriforme, Tm: Trocanter menor e CM: Cavidade medular.

Page 16: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

esclerótica ao redor da extremidade do implante

(pedestal). Adicionalmente os sinais radiográficos de

fixação biológica não são observados. A soltura tardia

pode ser observada somente nos casos de osteólise

periprotética, por mecanismo semelhante ao descrito

para os implantes acetabulares não cimentados.

Desta forma, uma vez ocorrida a fixação biológica, são

raros os eventos que podem culminar com a sua soltura.

O mais comum é a falta de fixação desde o momento da

implantação do componente (desacoplamento).

C.4. Falência combinada: A falência (soltura) do cimento

ósseo ou do implante não cimentado pode associar-se

ou levar à destruição óssea progressiva e assim

ocasionar um suporte ósseo inadequado ao implante,

agravando assim o processo de soltura e de

comprometimento do estoque ósseo.

D. Mecanismos de desgaste:

O desgaste é uma conseqüência inevitável do movi-

mento relativo entre duas superfícies opostas em

contato, em que a remoção de material devido à ação

mecânica pode gerar milhares de partículas nos tecidos

adjacentes a cada ciclo de marcha. Na articulação

protética o desgaste é determinado por diferentes

mecanismos, em função do atrito e da lubrificação do

meio adjacente (Fig. 57.20A-C)14

.

D.1. Desgaste Adesivo: Imperfeições do contorno ou da

esfericidade da cabeça, como a decorrente da usina-

gem, podem determinar pontos de maior contato entre

as 2 superfícies, regiões estas onde se formam verda-

deiras ligações químicas entre as superfícies opostas.

Com a movimentação, as partículas são transferidas pa-

ra a superfície oposta ou dela arrancadas, gerando uma

superfície áspera que amplifica o desgaste ulterior, e

causando assim a formação de detritos articulares (Fig.

57.20A).

Neste mecanismo de desgaste, chamado ade-

sivo ou por transferência, a intensidade da força de liga-

ção entre átomos e moléculas das superfícies opostas

tem grande influência, e pode ser uma importante fonte

de partículas, como nas elevadas forças de atração

entre elementos metálicos (ligação metálica) da articu-

lação metal/metal, quando também a alta ductilidade

promove maior adesão entre as superfícies em contato.

À medida que o material é progressivamente removido

dos pontos de maior contato, o conseqüente autopoli-

mento da superfície diminui a intensidade do desgaste

adesivo (Fig.57.22A).

Este mecanismo é responsável pelo run-in da

articulação metal-metal e pelo polimento do polietileno

nas articulações protéticas com este material.

D.2. Abrasivo (primário e por interposição ou 3º corpo);

O mecanismo mais freqüente de desgaste é a abrasão,

em que as asperezas superficiais funcionam como uma

lixa ao contato com o elemento oposto.

Esta ocorrência se justifica pelo fato de que, mesmo

em implantes polidos e aparentemente lisos, o atrito

pode ocorrer pelas irregularidades superficiais (rugosi-

dade) em nível microscópico, cujo perfil pode ser avalia-

do por aparelhos como o rugosímetro (Fig.57.21A-C).

A abrasão, ocasionada pela rugosidade das

superfícies do par tribológico, pode ser agravada pela

presença de contaminantes no interior da articulação

como fragmentos metálicos, ósseos ou de cimento

ósseo (chamados de terceiro corpo), que irão promover

maiores danos à superfície articular e assim ocasionar

um desgaste rápido e progressivo (Fig.57.22 B,E,F).

Este mecanismo (abrasão por terceiro corpo) é cons-

tatado em explantes pela presença de ranhuras e riscos

na superfície articular protética.

A abrasão é grandemente influenciada pelos

biomateriais constituintes do par tribológico, uma vez

que materiais mais duros, e com menor ductilidade

mostram-se mais resistentes à abrasão por

apresentarem menor desgaste e maior resistência ao

dano superficial, como a articulação cerâmica/

cerâmica.

D.3. Oxidativo e Corrosivo:

-Oxidativo; A movimentação e o carregamento

cíclicos entre as superfícies articulares podem iniciar a

fadiga do material através de microtrincas que ao se

propagarem promovem a delaminação de fragmentos

Fig.57.20. Diferentes mecanismos de Desgaste. No desgaste adesivo (A), as forças de atração intermolecular promovem, durante a movimentação, o arrancamento de partículas da superfície. No desgaste abrasivo (B) um dos materiais, dotados de irregularidades funcionam como uma lixa sobre o material oposto.. No desgaste oxidativo (C), a fadiga na região de altas tensões de contato promovem a delaminação da superfície. .

Fig.57.21. (A):Superfície de cabeça metálica polida e aparentemente lisa a olho nu apresenta (B): à microsocopia, irregularidades ou asperezas em sua superfície cujo (C): perfil pode ser determinado e mensurado (em Ra- rugosidade média) por aparelhos como o rugosímetro. Fonte: Gomes LSM

14.

Page 17: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

para o interior do espaço articular. Este desgaste por

fadiga gera, portanto partículas maiores que podem

atuar como terceiro corpo ou mesmo ocasionar bloqueio

articular. O polietileno é particularmente susceptível à

formação de partículas devido à fadiga de contato que

pode ocorrer pela combinação dos mecanismos de

rolamento e deslizamento entre os elementos do par

tribológico. No caso de rolamento, quando as tensões

de contato ultrapassam o limite de fadiga do material,

ocorre uma nucleação de fadiga na subsuperfície, e a

propagação deste processo culmina no destacamento

da partícula. No caso do deslizamento um elemento

desliza em relação ao outro, provocando tensões cícli-

cas superficiais, que quando maiores que as tensões

críticas, promovem a propagação do processo de fadiga

e assim o destacamento de partículas. Este mecanismo

é facilitado pela oxidação do polietileno (Fig.57.22C),

uma vez que a conseqüente alteração de suas pro-

priedades mecânicas diminui sua resistência à fadiga49

.

O desgaste pode ocorrer ainda por fenômenos

triboquímicos conseqüentes às reações químicas entre

as superfícies em contato e o meio adjacente. Na

articulação Metal/Metal a remoção e formação alter-

nadas da camada de óxido sobre as superfícies

articulares (camada de passivação), liberam partículas

no interior da articulação que são responsáveis pelo

desgaste oxidativo ou triboquímico. 50,51

Todos os metais sofrem corrosão, em maior ou menor

grau. A resistência à corrosão depende em grande parte

da presença de uma camada natural de óxido estável e

bem aderente ao substrato, camada de passivação, que

protege a superfície do implante da ação dos fluidos

biológicos adjacentes.

Durante o processo de fabricação, os implantes são

ainda submetidos à deposição adicional de óxidos em

sua superfície. Esta camada de passivação pode ser

removida por ação biológica ou mecânica. O teor

adequado de Cromo, Níquel e Molibdênio aumenta a

resistência à corrosão, enquanto o Manganês e o

Nitrogênio dão estabilidade à estrutura austenítica do

aço Inox e o Enxofre e Selênio facilitam o processo de

fabricação (usinabilidade). A presença de maior teor de

carbono pode aumentar a dureza e resistência do

material em prejuízo da ductilidade e em caso de

precipitação de carbonetos, predispor à sensitização (ou

corrosão intergranular).

D4. Impacto Repetitivo e Fretagem: Como já descrito

no impacto implante/implante, o desgaste da borda do

inserto da superficie articular protética ou da concha

metálica pode ocorrer pelo impacto repetitivo entre os

elementos protéticos (Fig.57.22D e E).

Uma forma freqüente de impacto é o carregamento de

borda (edge-loading). A introdução de ensaios com

simuladores de quadril trouxe grande avanço às

pesquisas experimentais, porém as articulações proté-

ticas ensaiadas com este método ainda falhavam em

reproduzir os danos observados em explantes. Mais

recentemente Lombardi et al52

confirmaram uma

característica in vivo da cinemática articular protética em

que, quando não solicitada em carregamento durante a

marcha (fase de balanço), a cabeça femoral protética

se desaloja parcialmente do implante acetabular. Com o

carregamento subseqüente (fase de apoio) a cabeça

volta a se alojar na cavidade, porém não sem antes

impactar contra a borda superior do componente

acetabular (edge loading – Fig.57.23A-D).

Fig.57.22. Explantes de insertos acetabulares de polietileno mostrando o

polimento (A e D), presença de 3º. Corpo (B e E Setas), oxidação (C

seta), desgaste por impacto repetitivo (D e E setas) e falência

catastrófica (F)

A utilização desta característica cinemática nos

ensaios em simuladores de quadril permitiu a reprodu-

ção dos danos mais encontradiços nos explantes

(Fig.57.23E), incluindo o desgaste em faixa (stripe wear)

observado em cabeças das articulações C/C53

e M/M.

Fig.57.23.(A) Em relação a sua posição durante o carregamento, (B) na

fase de balanço ocorre o desalojamento parcial da cabeça femoral

protética. (C) Quando do carregamento na fase de apoio, o

assentamento é feito pela borda superior do acetábulo causando o

impacto nesta região conhecido na literatura inglesa como edge-loading.

(D) O desgaste na porção superior permite que mesmo após o

assentamento, a cabeça seja dirigida superiormente. (E) Explante em

que se visualiza o desgaste de todo o chanfro na porção superior do

componente de polietileno (cabeças de seta) devido ao impacto na

borda durante o realojamento da cabeça, comparado ao chanfro intacto

na porção inferior (seta dupla) Fonte : Gomes LSM14

.

Fretagem (fretting): Por vezes o desgaste pode ser

devido a micro-movimentos entre duas superfícies em

contato, sujeitas a um carregamento cíclico que

promove movimentos oscilatórios discretíssimos entre

os corpos.

Page 18: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Denominado por vezes como desgaste por

agarramento ou gripamento, preferimos, embora não

totalmente adequado, utilizar o termo fretagem15

, como

tradução do consagrado termo fretting da língua Inglesa.

Este mecanismo de desgaste é frequentemente

agravado por ações corrosivas.

E. Mecanismos envolvidos na gênese do quadril proté-

tico doloroso sem falha aparente:

Muito embora a artroplastia total do quadril

seja um dos procedimentos ortopédicos de melhor

relação risco e custo/efetividade, em algumas ocasiões

nos deparamos com uma situação clínica de insucesso

(falha), ocasionada por dor persistente, não associada à

uma etiologia aparente, ou de difícil detecção ao exame

inicial. Não raramente os mecanismos envolvidos neste

tipo de falha só podem ser detectados pela análise

simultânea de informações obtidas através da investiga-

ção clínica, laboratorial, de imagens, de achados opera-

tórios e de análises dos explantes, sempre tendo como

referência a etiologia e os mecanismos mais encontra-

diços nestas circunstâncias (Tabela 57.2).

Evidentemente uma discussão detalhada sobre os

processos e mecanismos patológicos envolvidos no

quadril doloroso pós ATQ, foge ao escopo deste Capitu-

lo, e o leitor deve se referir aos capítulos específicos

para informações mais detalhadas.

As causas extrínsecas (dor irradiada ou referida ao

quadril), frequentemente são suspeitadas quando se

procede a um interrogatório e exame físico adequados,

e assim o diagnóstico pode ser confirmado por exames

complementares pertinentes.

Quando avaliamos as causas intrínsecas de dor, ou

seja, a que tem sua origem sediada no quadril, um

aspecto de grande relevância é distinguir entre proces-

sos assépticos e sépticos, pois deste fato irá depender a

abordagem mais adequada e assim o prognóstico para

a longevidade da reconstrução protética. Com o objetivo

de determinarmos os processos envolvidos na falha

utilizamos, em nosso serviço, uma abordagem que

preconiza além da anamnese e exame físico porme-

norizados, a distinção inicial entre:

- os implantes que apresentam alterações radiográficas,

ainda que discretas e/ou inconclusivas;

- e os implantes sem nenhum tipo de falha aparente

(Fig.57- 24).

Em ambos os casos, nos baseamos na veloci-

dade de hemossedimentação (VHS) e na proteína C

reativa (PCR) em conjunto, como screening inicial, com

um ponto de corte de 30mm (VHS) e 10 mg/dL(PCR),

ou seja, quando os dois exames se situam abaixo

destes valores, a infecção protética é causa muito pouco

provável da falha (valor preditivo negativo de 96%)54

.

Assim, neste caso, quando associados ao exame clínico

e radiográfico sugestivos de soltura não infectada, a

revisão asséptica é efetuada, porém 4-5 culturas são

colhidas intraoperatoriamente, como rotina. Caso VHS e

PCR se encontrem aumentados, a aspiração, com

controle fluoroscópico é efetuada. No líquido obtido é

realizada a contagem total de leucócitos (ponto de corte

3.000 células/ml), percentual de polimorfonucleares

(ponto de corte 80%). No caso de VHS e PCR

aumentadas associadas a mais de 3.000 células

brancas por mililitro, o valor preditivo positivo para

infecção é 95%. Quando considerada somente a

contagem diferencial associada à VHS e PCR, o valor

preditivo positivo é 93%. Estes casos devem ser

tratados, portanto como revisões sépticas. A cultura,

ainda que colhida intraoperatoriamente, demanda um

tempo maior para o processo decisório e apresenta um

falso positivo que varia entre 2.4% - 31.5%55

Para pacientes com implantes estáveis, VHS e

PCR negativas, a investigação para causas extrínsecas

deve ser efetuada. Porém, caso a VHS e PCR sejam

positivas, a aspiração combinada com bloqueio

anestésico da articulação deve ser realizado e assim se

ambos são normais as causa extrínsecas devem ser

reconsideradas. Caso ambos sejam positivos, a revisão

séptica se impõe. A re-aspiração está indicada quando o

bloqueio anestésico é positivo e a aspiração negativa.

Concomitantemente, a síndrome de impacto femoro-

acetabular, sinovite e osteólise devem ser pesquisadas

e, quando excluídas, a cintilografia trifásica com Tec99

associada ou não à cintilografia com Gálio é realizada.

Na circunstância de positividade de qualquer

uma das cintilografias, a re-aspiração está indicada.

Embora controversa e com resultados contraditórios em

relação a outros métodos de cintilografia atuais,

persistimos com o uso da associação da técnica trifásica

com tecnécio e Gálio, em virtude da sensibilidade, que

pode justificar a realização de novos aspirados

articulares, estes sim com maior especificidade.

Mais recentemente, um quadro doloroso pós

artroplastia total de quadril, tem sido associado ao par

tribológico metal/metal quando da ocorrência de reações

alérgicas ou de hipersensibilidade aos metais. Esta rea-

ção de hipersensibilidade do tipo IV ou tardia, mediada

por linfócitos tipo T, faz com que o quadro histológico

das falhas em relação aos outros biomateriais, mude de

um padrão macrofágico para um quadro histológico

linfocitário, que pode se estender, através do espaço

articular efetivo, para os tecidos periarticulares, e à

distância, através da corrente vascular e linfática.

Page 19: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Fig.57.24. Algoritmo para a análise de falha em quadris protéticos dolorosos sem falha aparente. A distinção entre quadros sépticos e assépticos é de fundamental importância para a instituição do tratamento adequado.

Esta reação linfocitária pode ocasionar na membrana

sinovial, um quadro de sinovite proliferativa descamante

que está frequentemente associado à dor de origem

desconhecida, quando da utilização de superfícies

protéticas metal/metal. Por outro lado, o infiltrado

linfocitário pode se alojar no interior do tecido ósseo e

predispor à soltura e mesmo à fratura do colo femoral

nas substituições por recapeamento.

A ocorrência do infiltrado linfocitário nas partes moles

periarticulares está associada à formação de granulo-

mas e aos chamados pseudo-linfomas56

.

F. Distopia primária do implante protético Denominamos distopia do componente protético à

condição cirúrgica que resulte em um posicionamento

do implante fora da topografia recomendada pela

técnica cirúrgica convencional. Excluem-se deste

conceito, portanto, as situações onde ocorra a migração

pós-operatória dos implantes.

Adotamos como padrão de topografia adequada do

implante os relatos da literatura científica que a asso-

ciam à maior longevidade da reconstrução articular

protética16-20

. Desta forma a distopia é sempre iatro-

gênica, ainda que intencional, como por exemplo, na

implantação do componente acetabular em posição

mais alta (elevação do centro de rotação do quadril ou

high hip center). Por estes motivos a distopia do

implante protético, embora não seja considerada uma

falha patente, representa uma situação de falha

potencial, predisponente ou associada a outros proces-

sos que podem evoluir para a falha patente da

artroplastia. Quer para os componentes acetabulares ou

femorais, a distopia pode ser classificada como desvios

do alinhamento no plano transverso (superior e inferior)

frontal (valgo/varo), sagital (antecurvato ou recurvato),

intrusão, extrusão e versão (anterior ou posterior).

Frequentemente, a distopia de componentes acessórios

ou ancilares pode igualmente ser descrita como intrusão

ou extrusão.

A distopia do implante acetabular deve ser considera-

da em relação à posição adequada do centro de rotação

do quadril. No plano transverso a distopia de posição

superior é a mais freqüente. Sobretudo em pacientes

portadores de seqüela de displasia do desenvolvimento

do quadril, a tendência para implantação superior do

componente é observada. Embora muitos autores acei-

tem o posicionamento superior (high hip center) , esta

condição está associada à alterações da biomecânica

do quadril, que podem promover maiores esforços e

assim predispor à soltura do componente ou ao maior

desgaste da superfície articular protética. Em patologias

unilaterais o centro de rotação deve ser sempre

comparado ao lado não afetado, aceitando-se como

posicionamento adequado somente os desvios que se

incluam dentro da margem de erro estatístico do

processo de mensuração radiográfica32

.

No plano frontal e sagital a determinação de uma

zona de segurança em relação à ocorrência de luxação

protética preconiza a implantação do componente

acetabular em 40º+10º de abdução e 15º+10º de

anteversão. Ainda com relação à zona de segurança

para a luxação protética, alguns autores relatam que a

soma da anteversão acetabular e femoral seja

aproximadamente 45º em homens e 40º em mulheres.

Os mecanismos envolvidos na distopia do implante

acetabular estão relacionados, dentre outros fatores, à

anatomia própria do paciente e ao posicionamento do

paciente para o ato cirúrgico. No posicionamento lateral

do paciente, ainda que se usem dispositivos para a

fixação da pelve, devemos considerar que a lordose

lombar fisiológica diminui em cerca de 25º-30º, quando

passamos da posição ereta para a posição operatória e

assim, mesmo seguindo a orientação de 15º de

anteversão, com o paciente ereto o implante terá situa-

ção de menor anteversão ou mesmo de retroversão.

Esta condição é agravada pelo fato de que a inclinação

anterior do paciente é muito comum no decúbito lateral,

o que aumenta as chances de se implantar o compo-

nente acetabular em posição de menor anteversão que

a desejada. Ainda, o posicionamento lateral do paciente

resulta em adução da pelve (entre 10º-15º) o que resulta

em uma tendência a se implantar o componente em

posição mais vertical (abdução ou valgo).

Em relação ao plano sagital o componente aceta-

bular deverá ser posicionado radiograficamente, adja-

cente à gota de lágrima (imagem radiográfica em U).

Preferimos esta última referência, quando bem distinguí-

vel radiograficamente, em detrimento da linha de Kohler

que apresenta grande variação em função do

posicionamento do paciente. O posicionamento mais

lateral em relação à gota de lágrima caracteriza a

extrusão do componente, e mais medial a sua intrusão.

Componentes ancilares como os parafusos, quando

utilizados, devem ser inseridos no quadrante póstero-

superior do acetábulo, evitando-se a coluna anterior.

O componente femoral, em relação ao plano frontal e

sagital, deve apresentar um posicionamento neutro em

relação à cavidade medular e, portanto sem desvios em

Page 20: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

valgo/varo ou antecurvato/recurvato. Hastes cimentadas

com mais de 5º de varismo estão associadas à maior

taxa de revisão. O posicionamento em valgo é mais

raro, pela limitação inerente do batente lateral do fêmur

na região trocantérica. Os desvios no plano frontal se

associam a deficiências do manto de cimento, que

diminuem sua resistência mecânica e permitem com

que mesmo pequenas trincas possam ser passantes

(envolver toda a espessura do manto) e assim eliciar

reações biológicas osteolíticas na interface cimento-

osso. Cabe salientar que os centralizadores protéticos

distais não garantem a implantação em alinhamento

neutro do componente femoral. Goldberg et al57

, em um

estudo sobre o papel do centralizador no alinhamento

do implante femoral, concluíram que os dispositivos

centralizadores garantem somente um alinhamento

adequado da haste em relação à cavidade criada pelo

cirurgião. Assim, quando a cavidade é criada em varo, a

extremidade da haste se choca contra a região antero-

lateral do fêmur e, desta forma, o centralizador se

quebra e a haste implantada em varo origina uma

camada de cimento fina ou ausente nas porções

anterior e lateral da diáfise femoral (Fig.57.25A e B).

Fig.57.25. A curvatura sagital do fêmur promove um impacto da

extremidade da haste com a cortical ântero-lateral (A), que provoca a

quebra do centralizador (B-seta). Uma vez que a cavidade medular

proximalmente ao istmo é retilínea e alinhada com a fossa piriforme (C),

a utilização de fios guias que se ajustam a região do ístmo permite a

centralização adequada do implante nos planos frontal e sagital (D e E).

Por este motivo, desde 1998 incorporamos como

rotina em nossa técnica cirúrgica, a utilização de fios-

guia dotados de expansões de diâmetros progressivos

em sua extremidade, que se ajustam ao istmo femoral e

assim garantem a centralização da cavidade que irá ser

criada pelo cirurgião (Fig.57.25B-E)58

.

Tão logo a cavidade seja instrumentada com o uso

de raspas canuladas, os fios-guia são removidos e a

cavidade preparada para cimentação a partir da

introdução do restritor de cimento e lavagem pulsátil do

tecido ósseo trabecular remanescente. Esta técnica tem

produzido um alinhamento adequado dos implantes,

quer no plano frontal como sagital37,58

, garantindo assim

um manto de cimento homogêneo ao redor do implante

(Fig.57.26A-D).

Fig.57.26. Ainda que com o uso de centralizadores, a cavidade formada pelo cirurgião produza um bom alinhamento no plano frontal (A), um recurvato da haste pode ser observado no plano sagital (B). Por outro lado a cavidade quando produzida em perfeito alinhamento com a cavidade medular, produz um excelente alinhamento da haste nos 2

planos mesmo que na ausência de centralizador distal (C e D).

O estado rotacional do implante femoral (anteversão

ou retroversão) é de grande importância na estabilidade

da reconstrução protética. Grande parte dos autores

preconiza a implantação do componente entre 10-15º de

anteversão. Na abordagem posterior, particularmente a

associação de retroversão femoral e falta de anteversão

acetabular é determinante da instabilidade.

O posicionamento no plano transverso, sobretudo

para hastes cônicas e sem colar deve considerar que

existe uma relação adequada de preenchimento da

cavidade medular pelo implante, e assim caso se

implante o componente mais extruso ou intruso, esta

relação não é estabelecida adequadamente com

prejuízos para as tensões no manto de cimento

proximal. De grande importância é o offset gerado pela

implantação do componente femoral, uma vez que dele

dependerá o equilíbrio de partes moles ao redor do

quadril, assim como a magnitude das tensões de

contato na superfície articular protética. Diminuição do

offset femoral pode estar associada a maiores tensões e

maior desgaste (Fig. 57.27 A e B).

Page 21: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Fig.57.27.Artroplastia bilateral do quadril realizada pelo mesmo cirurgião e mesmo tipo de implantes com 4 meses de intervalo entre os procedimentos. Resultados clínicos semelhantes com cerca de 4 anos pós–operatórios(A). Observe a verticalização do implante acetabular a direita, assim como a redução do offset (o) e clearance (c) femoral do mesmo lado . Com cerca de 7,5 anos pós-operatórios é possível

observar o desgaste acetabular à direita, enquanto à esquerda nenhum desgaste significativo do polietileno pode ser notado(B)

De difícil reprodução intra-operatória, a altura do centro

de rotação da cabeça femoral e o offset, devem ser

determinados a partir de guias que permitam, de modo

preciso e reprodutível, restabelecer os parâmetros

biomecânicos necessários à cinética e cinemática

adequada do quadril32

(Fig. 57.28 A e B).

III.4. Efeitos e Conseqüências das Falhas

Referem-se às possíveis conseqüências ocasionadas

pela falha dos implantes.

Estes efeitos podem atingir o implante diretamente, o

tecido adjacente, ou ainda produzir efeitos regionais

e/ou sistêmicos, através da reação orgânica metabólica,

imunológica, neoplásica ou bacteriológica.

Os Biomateriais podem ocasionar efeitos locais

(tecidos adjacentes), remotos (órgãos à distância) ou

sistêmicos, na dependência do tipo, quantidade,

tamanho e toxicidade das partículas e substâncias

liberadas, de sua resistência à corrosão e da resposta

orgânica aos seus produtos.

O organismo é bastante tolerante aos

biomateriais, sobretudo em condições de estabilidade do

implante. O PMMA enquanto um manto íntegro ao redor

do implante promove uma interface com o osso, sem a

interposição de membrana e sem sinais de reação

inflamatória (osteointegração do cimento).

Fig.57.28. (A) Instrumentais e guias que determinam o ângulo cérvico-

diafisário (a) orientam a restauração do offset (b), altura do C.R(c) da

cabeça femoral e (B) determinam o local da osteotomia (cabeça de

seta) podem ser de grande valor na reconstrução da cinética e

cinemática do quadril protético

A reação às partículas oriundas do desgaste do

polietileno, quando menor que 0.9mm/ano, pode permitir

uma sobrevivência da reconstrução protética em até

90% aos 10 anos de seguimento4,7,8

. Esta tolerância às

partículas ocorre porque algumas semanas após a

artroplastia forma-se uma pseudocápsula constituída na

sua porção mais superficial por tecido fibroso onde se

nota a presença de alguns macrófagos.

Em condições habituais, as partículas formadas pelo

desgaste são absorvidas pela pseudo-cápsula e em seu

interior são fagocitadas pelos macrófagos. A fagocitose

de partículas maiores requer a fusão de vários

macrófagos (células gigantes multinucleadas) que

resulta em verdadeiros granulomas de corpo estranho.

Outro destino das partículas é o espaço perivascular

linfático a partir do qual as partículas alcançam os vasos

linfáticos, linfonodos regionais e, eventualmente os

órgãos do sistema reticulo-endotelial, constituindo assim

um mecanismo de limpeza, porém também de disse-

minação das partículas (Fig.57.29). Na dependência das

características e toxicidade das partículas, ocorre a

liberação de quimocinas (M-CSF e MCP-1) que recru-

tam células inflamatórias, Prostaglandinas (principal-

mente E2) e citocinas (Interleucina 1β e 6, fator de ne-

crose tumoral α entre outros) que podem não só deter-

minar a necrose dos macrófagos, como também iniciar a

atividade osteoclástica, ou ainda levar à hapoptose do

osteoblasto, com conseqüente necrose e osteólise.

A disseminação de partículas ocorre também

através do chamado espaço articular efetivo, tendo

como meio de transporte o fluido articular, e assim as

partículas podem alcançar o tecido ósseo adjacente, a

interface cimento-osso e a interface cimento metal60

.

Aspenberg e van der Vis41

postularam que a flutuação da

pressão do líquido articular dentro do espaço articular

efetivo ocasionada pelo carregamento cíclico, pode

desencadear a reabsorção óssea (osteólise) pelo

mecanismo da hapoptose do osteócito, processo este

muito semelhante às erosões ósseas de vértebras

ocasionadas por um aneurisma contíguo.

O titânio é bem tolerado pelo organismo exceto em

condições de instabilidade protética ou de contato direto

com outros metais, ocasião em que sua baixa resistên-

cia ao desgaste leva à produção de um grande número

de partículas de óxido de titânio (TiO2).

Page 22: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

Estas partículas ao se depositarem nos tecidos adjacen-

tes produzem uma coloração escura denominada me-

talose, e intensa atividade inflamatória que resulta em

soltura do implante e intensa osteólise (Fig.57.30A-D).

Partículas metálicas, sobretudo os íons cromo,

cobalto e níquel podem agir como haptenos e eliciar

uma reação de hipersensibilidade tipo IV em indivíduos

previamente sensibilizados.

A toxicidade do Cobalto e Cromo tem sido motivo

de preocupação, sobretudo em articulações metal/metal,

onde uma grande quantidade destes íons é liberada e

pode ser detectada no sangue (entre 5 a 10 vezes a

concentração pré-operatória) e na urina em pacientes

submetidos a este procedimento60

.

Embora vários estudos epidemiológicos não demons-

trassem incidência aumentada de neoplasia ou outras

lesões em órgãos do sistema retículo-endotelial61

, e

malformações fetais em pacientes submetidos ao

implante de articulações metal/metal, alguns cirurgiões

preferem contraindicá-la em pacientes com insuficiência

renal e mulheres em fase reprodutiva.

Partículas cerâmicas, por sua estabilidade química

(baixa reatividade), e, portanto grande resistência a

corrosão, são muito bem toleradas pelo organismo. Dano aos materiais: em conseqüência do processo de

falha, diferentes danos podem ser ocasionados aos

implantes. A observação cuidadosa destas alterações

da superfície do implante pode auxiliar na elucidação

dos mecanismos envolvidos nas falhas. A erosão nos

casos de corrosão por pites, polimento da haste de

titânio ou do polietileno resultado do desgaste (ou sulcos

e riscos produzidos pela abrasão), depósito de substân-

cias (incrustações) e sulcos são comumente observados

(Fig.57.30, Fig.31A-D).

IV. Diagnóstico e Codificação das Falhas

em Implantes Artroplásticos de Quadril

Um sistema de codificação de falhas assépticas

dos implantes artroplásticos de quadril pode ter grande

relevância desde que pressuponha critérios bem

estabelecidos na definição, conceito e diagnóstico com

base em achados clínicos e de exames complementares

pré-operatórios, no sentido de orientar para as

dificuldades técnicas e procedimentos mais adequados

para o manejo destas falhas. Contudo, em virtude do

fato de que estas falhas são muito frequentemente,

relatadas na literatura tendo como base apenas grupos

Fig.57.29. Desenho esquemático do processo de reação orgânica às partículas de biomateriais. As partículas (pt) absorvidas pela pseudo

cápsula (pc) sofrem a ação de macrófagos (M) recrutados a partir de células progenitoras (P) pela ação de quimocinas (MCP: monocyte chemoattractant proteins , M-CSF: Macrophage colony stimulating factor).

Fig.57-31. Explantes femorais mostrando regiões de polimento (A), incrustações (B), corrosão (C), riscos e sulcos (D). A avaliação pormenorizada da superfície do explante nos auxilia no difícil processo de esclarecimento dos mecanismos envolvidos na falha.

Fig.57.30. (A) Radiografia pré-operatória mostrando intenso desgaste na porção superior do componente acetabular de implantes com 16 anos em serviço. (B e C): intensa metalose nos tecidos adjacentes ao implante.(D): Explantes mostrando a destruição do componente acetabular.

Page 23: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

genéricos, pouca contribuição é dada para o esclareci-

mento etiológico. Assim o sistema de codificação deve

permitir ajustes e complementos que levem em

consideração não só o diagnóstico pré-operatório, mas

que também padronize, sistematize e complemente a

investigação através da observação intra-operatória

minuciosa, da análise macro e microscópica dos

implantes removidos (explantes) e, em alguns casos, da

análise microestrutural.

Somente desta forma podemos avaliar o ambiente

mecânico a que está sujeita a reconstrução protética, e

os processos envolvidos na falha para que assim

possamos identificar e diferenciar causas de

conseqüências. Adicionalmente a codificação deve ser

de precisão aceitável, reprodutível e de fácil entendi-

mento e aplicabilidade, o que nem sempre é uma tarefa

de fácil execução para cirurgiões não familiares com as

características interdisciplinares do processo de falha,

que envolvem conceitos de ciência dos materiais,

mecânicos, metalúrgicos, químicos, físicos, biológicos e

de técnica cirúrgica especializada.

A metodologia que utilizamos desde 1998, e descrita

neste capítulo, tem-se mostrado bastante adequada a

estes propósitos, contribuindo para o melhor entendi-

mento dos intrincados mecanismos envolvidos na falha

e assim capaz de possibilitar um procedimento cirúrgico

que proporcione melhores resultados em longo termo.

Contudo não é o objetivo desta codificação esgotar as

infinitas possibilidades de ocorrências que se avolumam

progressivamente com novas técnicas e materiais, mas

sim contribuir não só para o reconhecimento e

entendimento do processo de falha, mas também como

ele pode influenciar a pesquisa e desenvolvimento de

novos materiais, processos e técnicas.

IV.1. Codificação Pré-operatória

A notação, que se baseia na classificação das falhas

constante na Tabela 1, se inicia pela letra F: ou A: para

nos referirmos especificamente ao componente Femo-

ral ou Acetabular (Fig. 57.32).

Às letras F e A acrescentam-se, sobrescrito, as letras

cm, para os implantes cimentados, e nc para implantes

não cimentados. Quando um componente não apresen-

ta falha aparente sua notação será 0 (zero).

Sempre iniciamos pelo componente femoral, inserindo

o Modo de Falha (classificado de I a V), seguido pela

Origem (A-D) e Mecanismo da Falha (1-5). Entre chaves

são inseridos todos os efeitos ou conseqüências das

falhas que possam ser observados pela avaliação pré-

operatória (a-m). A Distopia Primária do Implante

protético, quando presente, deve ser inserida entre

colchetes, ao final da codificação, e quando ausente

inserimos a letra A (Fig. 57.33). Nesta situação, a

notação Fcm

: I.A.2 b,d,f [B;2] , indica falha do implante

femoral cimentado (Fcm

), pelo modo de ruptura (I),

originada na haste metálica (A), mais provavelmente

pelo mecanismo de fadiga (2), o que foi confirmado pela

análise do explante. Como conseqüência da falha pode-

se observar a migração em varo da porção proximal do

implante (b), a dismetria (d) e a violação do córtex

lateral do fêmur proximal (f). Entre colchetes a letra B

indica distopia do componente femoral, no caso sua

inserção em varo (2), que pôde ser notada pela

radiografia prévia à falha. Observe que a notação Anc

0.0.0 0 [C;4] significa que não foi detectada falha do

implante acetabular não cimentado, porém durante sua

inserção, o parafuso acetabular (C) ultrapassou o limite

ósseo, intrudindo-se na pelve (4).

Observe que, inicialmente, o modo e a origem da falha

são codificados de acordo com os cinco diferentes

grupos já discutidos neste capítulo, com base simples-

mente na sua apresentação efetuada através do exame

clínico, de imagens e de investigações complementares,

quando realizadas.

Importante ressaltar que esta notação se refere à

causa principal ou primária da falha. Contudo, com al-

guma freqüência, mais de um modo de falha com sua

origem específica, podem ser identificados na avaliação

Fig.57-33. Codificação de falha em artroplastia de quadril (B), feita em comparação com a radiografia prévia à falha (A).. Ver texto para descrição detalhada.

Fig.57-32. Padronização da notação para codificação das falhas de implantes artroplásticos. Sequencialmente se inserem o componente Femoral (F) ou Acetabular (A), o Modo de Falha (I a V), a Origem (A-

D), o mecanismo (1-5), todos os efeitos e conseqüências (a-m) e a presença ou ausência de implantes distópicos (A-D), com o mau posicionamento associado.

Page 24: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

inicial pré-operatória (sobretudo em achados radio-

gráficos). Nesta circunstância,quando outro modo e

origem são igualmente chamativos ou evidentes ao

exame inicial, eles devem ser inseridos entre parênte-

ses, com sua codificação específica, logo após a nota-

ção do modo e origem da falha primária. Temos

observado que raramente mais de um modo e origem

adicionais de falhas são notados pré-operatoriamente e

assim a falha principal e outra falha concomitante (Modo

e Origem) são as situações mais encontradiças (Fig.

57.34).

A seguir o provável mecanismo de falha é anotado,

com base no modo e origem da falha primária, ou seja,

somente para o Modo principal. Isto porque quando

mais de um Modo estão presentes, os mecanismos

envolvidos frequentemente estão relacionados entre si.

Fig.57-34. Codificação da falha de reconstrução protética do Quadril. Ver texto ao lado.

Como conseqüência da falha observamos a presença

de osteólise (a), migração protética (b), dismetria cons-

tatada no exame clínico (d) e violação do invólucro

ósseo (f). No componente femoral não se observa

distopia primária e, portanto usamos a notação [A].

A radiografia do implante acetabular mostra soltura da

interface implante/osso (caracterizada pela migração

superior e medial) Modo III Origem C, com falha de

suporte ósseo (2). As conseqüências da falha são:

osteólise acetabular (a), migração protética medial e

superior (b), e violação do teto acetabular (f) e medial.

Esta migração é provavelmente secundária e, portanto

não caracteriza uma distopia durante a inserção.

Como outro exemplo, a notação: Fnc: III.C.4 a,f [A],

mesmo sem consulta às radiografias, podemos inferir

que se refere a falha do implante Femoral não

cimentado (Fnc) evidenciada por sua soltura (Modo III)

na interface implante/osso (C, origem que nesta

interface só pode se referir a um implante não

cimentado) com falência da fixação biológica (4). A

ocorrência de osteólise e perda do suporte ósseo do

implante (a,f) nos indica a necessidade de reconstrução

do batente ósseo e restauração do invólucro

circunferencial do fêmur. A notação [A] indica que não

houve distopia primária do implante, ou seja, seu

posicionamento foi tecnicamente adequado durante o

ato cirúrgico.

Caso a osteólise, femoral e/ou acetabular, seja

detectada na presença de implantes estáveis e sem

falha aparente, devemos considerar, como já explicado

anteriormente, que a osteólise é considerada como um

efeito ou conseqüência de falha. Importante ressaltar

que esta notação se refere à causa principal ou primária

da falha. Nesta notação pré-operatória nem sempre a

relação de causa e conseqüência pode ser estabelecida

com precisão, e assim somente os achados nitidamente

observados devem ser incluídos. Quando os processos

envolvidos não são claros ou até desconhecidos,

utilizamos a notação 0 (zero) para indicar esta condição.

Portanto a osteólise isolada, na presença de implantes

estáveis, femoral ou acetabular tem a seguinte

codificação, respectivamente:

- F -: 0.0.0. a [ ]. A presença ou ausência de distopia

deve ser informada.

- A-: 0.0.0 a [ ]. A presença ou ausência de distopia

deve ser informada.

Por vezes a falha pode não ser de fácil

caracterização pelo cirurgião não habituado ao

reconhecimento de falhas e dos tipos de implantes. Nes-

tes casos específicos, o tipo de implante e de falhas

poderão ser determinados mais facilmente durante o ato

cirúrgico, detalhes estes que justificam uma nova

codificação pós-operatória.

IV.2. Codificação Pós-operatória As observações intraoperatórias do estado das

estruturas periprotéticas e do implante, assim como a

avaliação laboratorial dos explantes, muitas vezes são

determinantes para uma caracterização mais correta

dos processos envolvidos na falha da reconstrução

articular. Por este motivo nova codificação deve ser

feita pelo cirurgião após o ato cirúrgico, e caso

persistam quaisquer dúvidas quanto à natureza da falha,

exames complementares como os relacionados à

infecção protética, ou a análise química e estrutural do

explante, devem ser solicitados.

V. Bibliografia e Referências Bibliográficas

1.Charnley J: Arthroplasty of the hip. Lancet. 1961;1:1129-1132 2.Charnley J. Low friction arthroplasty of the hip: theory and practice. Springer, Berlin Heidelberg New York Tokyo, 1979 3. Bergmann G,Graichen F, Rohlman A. Hip joint forces during walking and standing-measured in a patient with bi-lateral prostheses. J Biomech. 1993; 26:969-90 4. Sochard DH. Relationship of Acetabular Wear to Osteolysis and Loosening in Total Hip Arthroplasty. Clin Orthop Rel Res.1999; 363:135-150 5. Buchhorn GH,Willert HG. Wear and Osteolyses. In: Bone cements and cemeting technique,Springer-Verlag Berlin Heidelberg: 163-182,2001

Desta forma, a notação:

Fcm

: I.A.(III.D).2 a,b,d,f

[A] se refere a falha do

implante Femoral cimen-

tado (Fcm

) por ruptura

(Modo I) evidenciada no

corpo metálico (Origem

A) de mecanismo prová-

vel por fadiga (posterior-

mente comprovada pela

avaliação visual e mi-

croscópica do explante).

Porém a soltura com-

binada das interfaces

cimento/ osso e cimento

/implante (III.D) também

são observadas, (setas)

devendo igualmente ser

codificadas.

Page 25: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

6. Gomes LSM. Biomaterais em Artroplastia de Quadril: Propriedades, Estrutura e Composição. In: O Quadril. 2010; Rio de Janeiro, ed Atheneu. 7. Schmalzried TP, Shepherd EF, Dorey FJ et al. Wear Is a Function of Use, Not Time. Clin Orthop Rel Res. 2000; 381:36–46 8. Schmalzried TP, Huk OL. Patient factors and wear in total hip arthroplasty. Clin Orthop Rel Res. 2004;418:94–97 9. Gomes LSM. Falhas dos Implantes Artroplásticos: Proposta de Sistematização Analítica. 2006, IX Jornada Paulista de Patologia do Quadril (JOPPAQ), 28 a 30 de Setembro, Hotel JP,Ribeirão Preto (SP), Brasil. 10. Gomes LSM. Gerenciamento de Risco em Implantes Osteoarticulares. 2005, Curso ministrado para os técnicos da Gerência de Tecnologia de Materiais para Uso em Saúde GEMAT/GGTPS/ANVISA, 23 Set. 2005, Brasília, DF. 11. Griza S. Estudo comparativo da influência dos ângulos protéticos nos padrões de transmissão de carga e estabilidade in vitro de hastes femorais cimentadas, cônicas e polidas. Doctoral Thesis. Programa de pós-graduação em engenharia de minas,metalúrgica e materiais. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006. 12. Gomes LSM, Griza S, Cervieri A, Strohaecker T. Is removal and reinsertion of cemented femoral stems during revision hip arthroplasty a mechanically safe procedure? 2009; 10th EFFORT: Congress of the European Federation of National Associations of Orthopaedics and Traumatology, 3-6 Junho, Viena, Austria. Disponível em: http://www.efort.org/cdrom2009/FreePaperContent.asp?pid=F62 (20 ag. 2009) 13. Gomes LSM, Griza S, Cervieri A, Strohaecker T. Different designs of polished, collarless tapered stems influence the in vitro behaviour of cemented femoral hip implants. 2009; 10th EFFORT: Congress of the European Federation of National Associations of Orthopaedics and Traumatology, 3-6 Junho, Viena, Austria. Disponível em: http://www.efort.org/cdrom2009/PosterContent.asp?pid=P345 (20 ag.2009) 14. Gomes LSM. Tribologia de Superfícies Articulares Protéticas. In: Artroplastia Total do Quadril. Clinica Ortopédica da SBOT, Rio de Janeiro, Guanabara Koogan. 2009:25-40 15. Gomes LSM. Biomecânica dos ImplantesArtroplásticos. In: O Quadril. 2010; Rio de Janeiro, ed Atheneu. 16. Callaghan JJ, Salvati EA, Pellicci PM, et al. Results of revision for mechanical failure after cemented total hip replacement,1979 to 1982. J Bone Joint Surg. 1985;67A: 1074-1085. 17. Ebramzadeh E, Sarmiento A, McKellop HA et al. The cement mantle in total hip arthroplasty: analysis of long-term radiographic results. J Bone Joint Surg. 1994;76A: 77-87. 18. Olsson SS, Jernberger A, Tryggo D. Clinical and radiological long-term results after the Charnley-Muller total hip replacement:a 5 to 10 year follow-up study with special reference to aseptic loosening. Acta Orthop Scand. 1981; 52:532-542. 19. Lewinnek GE, Lewis JL, Tarr R. et al. Dislocation after total hip replacement arthoplasties. J Bone Joint Surg. 1978;60A: 217-220. 20. DiGioia AM III, Jaramez B, Plakseychuk AY, et al. Comparison of a mechanical acetabular alignment guide with Computer placement of the socket J Arthroplasty 2002;17:359-364.

21. Verdonschot N, Huiskes R. Cement Debonding Process of Total Hip Arthroplasty Stems. Clin Orthop Rel Res.1997; 336: 297-307 22. Shen G. Femoral stem fixation. An engineering interpretation of the long-term outcome of Charnley and Exeter stems. J Bone Joint Surg Br. 1998; 80B:754–756 23. Maloney WJ, Kang MN, Hartford JM. The cemented femoral component. In: The Adult Hip. 2007, 2nd ed. Philadelphia, Lippincott Williams and Wilkins: 917-939. 24. Draenert KD, Draenert YI, Krauspe R, Bettin D. Strain Adaptative Bone Remodelling in Total Joint Replacement. Clin Orthop Rel Res. 2005; 430: 12-27. 25. Harris WH, McGann WA. Loosening of the femoral component after use of the medullary-plug cementing technique. J Bone Joint Surg. 1986;68A:1064-1066. 26. Engh CA, Bobyn JD, Glassman AH. Porous coated hip replacement : the factors governing bone ingrowth, stress shielding and clinical results. J Bone Joint Surg [Br]. 1987; 69:45-55 27. Verdonschot N, Huiskes R. Acrylic cement creeps but does not allow much subsidence of femoral stems. J Bone Joint Surg [Br]. 1997; 79:665–669 28. Havelin L I, Espehaug B, Vollset S E, Engesaeter L B. The effect of the type of cement on early revision of Charnley total hip prostheses. A review of eight thousand five hundred and seventy-nine primary arthroplasties from the Norwegian Arthroplasty Register. J Bone Joint Surg Am. 1995; (77): 1543-1550. 29. Scheerlinck T, Casteleyn PP. The design features of cemented femoral hip implants. J Bone Joint Surg [Br] 2006: 88: 1409-1418 30. Hamadouche M , Francois Baque´ F, Lefevre N , Kerboull M. Minimum 10-year Survival of Kerboull Cemented Stems according to Surface Finish. Clin Orthop Relat Res. 2008; 466:332–339 31. Verdonschot N, Huiskes R . Surface roughness of debonded straight-tapered stems in cemented THA reduces subsidence but not cement damage. Biomaterials 1998;19:1773–1779 32. Gomes LSM, Do Carmo WM. Precise and reproducible preoperative planning methods for total hip arthroplasties do not need radiographic enlargement evaluation. Paper presented at the 11

th Effort Congress of the European Federation of National

Associations of Orthopaedics and Traumatology, 2010, June 2-5, Madrid Spain. 33. Noble PC, Lindahl LJ, Jay JL, Davidson J, Tullos HS. Femoral anatomy and the design of total hip replacements. Trans Orthop Res 1986;11:335. 34. Lecerf G,,Fessy MH , Philippot R et al. Femoral offset: Anatomical concept, definition,assessment, implications for preoperative templating and hip arthroplasty. Orthop Traumatol Surg Research. 2009 95, 210-219 35. Skinner JA, Todo S, Taylor M, Wang JS, Pinskerova V, Scott G. Should the cement mantle around the femoral component be thick or thin. J Bone Joint Surg 2003; 85-B:45-51 36. Langlais F, Kerboull M, Sedel L, Ling RSM. The Frech Paradox. J Bone Joint Surg 2003; 85-B:17-20. 37. Gomes LSM, Do Carmo WM. Cemented femoral stems implanted with the in situ cancellous-bone compaction technique during primary total hip arthroplasty. A follow-up study

Page 26: Capítulo 57 Mecanismos de Falhas Assépticas dos Implantes ... · diárias do ortopedista. As falhas dos implantes, em algumas circunstâncias, estão associadas à destruição

at a minimum of five years. Paper presented at the 11th

Effort Congress of the European Federation of National Associations of Orthopaedics and Traumatology, 2010, June 2-5, Madrid Spain. 38. Barrack RL, Mulroy RD, Harris WH.Improved cementing techniques and femoral component loosening in young patients with hip arthroplasty : a 12 year radiographic review. J Bone Joint Surg. 1992;748-A:385-389. 39. Schwartz JT, Engh CA, Forte MR et al. Evaluation of initial surface apposition in porous-coated acetabular components. Clin Orthop Rel Res. 1993;293:174-187. 40. Staal HM, Heylinger IC, Sluijs V . Stem displacement during reduction of a dislocated cemented total hip arthroplasty with a polished tapered stem. J Arthroplasty 2000;15(7):944–946 41. Aspenberg P, Van der Vis HM. Fluid Pressure may cause periprosthetic osteolysis - particles are not the only thing. Acta Orthop Scand.1998; 69:1-4. 42- Gjengedal E, Uppheim G, Bjerkholt H et al. Excellent results of a femoral press-fit stem cemented with a thin mantle: 116 hips followed for 11–18 year. Eur J Orthop Surg Traumatol .2007; 17:279–284 43. Stone KD, Lewallen DG, Ilstrup DM. Femoral loosening following third generation cemented total hip arthroplasty. J Artroplasty. 1996;11:228. 44. Dohmae Y, Bechtold JE, Sherman RE, et al. Reduction in cement-bone interface shear strength between primary and revision arthroplasty. Clin Orthop Rel Res. 1988;236:214-220

45. Collier JP, Mayor MB, Chae JC et al. Macroscopic and

microscopic evidence of prosthetic fixation with porous-coated

materials. Clin Orthop Rel Res. 1988;235: 173-180.

46. Cook SD,Thomas KA, Barrack RL et al. Tissue growth into

porous-coated acetabular components in 42 patients. Clin

Orthop Rel Res. 1992;283:163-170.

47. Sumner DR, Jasty M, Jacobs JJ et al. Histology of porous-coated acetabular components: 25 cementless cups retrieved after arthroplasty. Acta Orthop Scand. 1993;64:619-626. 48.Jasty M, Kienapfel H, Griss P. Fixation by ingrowth. In: The Adult Hip. 2007, 2nd ed. Philadelphia, Lippincott Williams and Wilkins: 195-206. 49. Ries MD, Pruitt L. Effect of Cross-linking on the microstructure and mechanical properties of Ultra-High Molecular Weight Polyethylene. Clin Orthop Rel Res. 2005 ; 440: 149-156

50. Konttinen YT, Zhao D, Beklen A et al. The microenviroment around total hip replacement prostheses. Clin Orthop Rel Res 2005; 430: 28-38. 51. Mischler D. Tribology and Implants. Cours Biomateriaux 2006. Disponível em: http://ltp2.epfl.ch/ Cours/Biomat/ BioMat-03.pdf. 52. Lombardi AV, Mallory TH, Dennis DA, et al. An in vivo determination of total hip arthroplasty pistoning during activity. J Arthroplasty 2000; 15: 702-709. 53. Nevelos J, Ingham E, Doyle C et al. Microseparation of the centres of alumina-alumina artificial hip joints during simulator testing produces clinically relevant wear rates and patterns. J Arthroplasty 2000; 15: 793-795 54- Schinsky MF, Della Valle CJ, Sporer SM, Wayne G. Paprosky WG. Perioperative Testing for Joint Infection in Patients Undergoing Revision Total Hip Arthroplasty. J Bone Joint Surg Am. 2008;90:1869-75 55. Spangehl MJ, Masri BA, O’Connell JX, Duncan CP. Prospective analysis of preoperative and intraoperative investigations for the diagnosis of infection at the sites of two hundred and two revision total hip arthroplasties. J Bone Joint Surg Am.1999;81:672-83. 56. Zustin J, Amling M, Krause M et al. Intraosseous lymphocytic infiltrates after hip resurfacing arthroplasty .A histopathological study on 181 retrieved femoral remnants. Virchows Arch. 2009; 454:581-588 57. Goldberg BA,Habbal G, Noble PC et al. Proximal and distal femoral centralizers in modern cemented hip arthroplasty. Clin Orthop Rel Res. 1998;349:163. 58. Gomes LSM. Novos Conceitos no implante do componente femoral cimentado: A compactação óssea autógena e a auto-centralização. Congresso Brasileiro de Ortopedia e Traumatologia, 2002, São Paulo (SP). 59. Schmalzried TP, Jasty M, Harris WH. Periprosthetic bone loss in total hip arthroplasty: polyethylene wear debris and the concept of effective joint space. J Bone Joint Surg Am 1992;74:849-863 60. MacDonald SJ. Metal-on-Metal Total Hip Arthroplasty. The Concerns. Clin Orthop 2004; 429: 86-93 61. Visuri T, Pukkala E, Paavolainen P, Pulkinnen P, Riska EB: Cancer risk after metal on metal and polyethylene on metal total hip arthroplasty. Clin Orthop.1996; 329(Suppl):S280-S289