CARACTERíSTICAS COMPOSICIONAIS DOS SEDIMENTOS 1....

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l - 115 - 11.3 - CARACTERíSTICAS COMPOSICIONAIS DOS SEDIMENTOS 1. INTRODUÇAO No capitulo precedente efectuou-se um primeiro reconhecimento da regional das caracterlsticas texturaís e granulometricas dos sedi- mentos da plataforma continental portuguesa setentrional, com particular incidência no que se refere à areia. Neste capitulo efectuar-se-a um tipo de abordagem similar no referente às caracteristícas composicionais. 2. COMPOSIÇAO DA FRACÇAO FINA o estudo mineralogíco semi-quantitativo das inferiores a e a utilizando de raios X, foi efectuado por Grade e Casal Moura no Laboratório da DGGM (Porto). As amostras estudadas, em numero de 70, localizam- se a N do paralelo de Aveiro. Verifica-se que em ambas as fracções estudadas a ilite é predominante, sendo a clorite abundante. A caulinite, pouco abundante na fracção apresenta maior abundância relativa na fracção O mesmo se verifica com a montmorilonite e os interestratificados, os quais são raros ou ausentes na fracção Tendência inversa verifica-se, em geral, com O feldspato potassico, a plagioclase e o quartzo. 3. COMPOSrçAO DO CASCALHO Como se referiu no capitulo anterior, o cascalho apresenta tendência para ocorrer em duas bandas grosseiramente paralelas· à costa. O mapa da fig.46 representa a distribui,ão do cascalho terr!geno (na amostra total). Da observação deste mapa e da comparação com a distribuição do cascalho total da amostra (fig.36) conclui-se que a banda interna (menos profunda) continua bem marcada. Na banda externa as percentagens de cascalho terrigeno são muito reduzidas (quase sempre <5%), ao contrario do que ,se verifica com o cascalho total, em que se registam percentagens bastante superiores que, nalguns casos, ultrapassam 25% ou mesmo 50% da amostra. Advem tal facto, como e óbvio, da banda interna ter composição essencialmente terrigena e da banda externa ser predominantemente biogenica. Os elementos do cascalho da banda interna são constituidos, essencialmente, por quartzo e quartzito, apresentando-se normalmente rolados, por vezes muito bem rolados ou sub-rolados. O aspecto geral e amarelo-alaranjado (patinada) embora, raramente, apareçam elementos avermelhados. As caracteristicas morfometricas do cascalho estão, por via de regra, em continuidade com as da areia, as quais serão objecto de descrição detalhada em capitulo posterior. Os elementos poli-mineralicos não são abundantes, manifestando tendência para ocorrer em maior nUmero no sector setentrional da plataforma que no meridional. Entre estes elementos avultam os de gnaisse e os de granito. Ocasionalmente aparecem elementos que chegam a atingir mais de 4cm. Nesta banda interna, a fracção cascalhenta escassa. t constituída, fundamentalmente, moluscos, em geral perfurados e corroidos, com malmente despolidas (com menos frequência de orIgem biogenica e muíto por fragmentos de conchas de arestas roladas, superficies nor- lustrosas), e tonalidade geral

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11.3 - CARACTERíSTICAS COMPOSICIONAIS DOS SEDIMENTOS

1. INTRODUÇAO

No capitulo precedente efectuou-se um primeiro reconhecimento da distribui~ão regional das caracterlsticas texturaís e granulometricas dos sedi­mentos da plataforma continental portuguesa setentrional, com particular incidência no que se refere à areia. Neste capitulo efectuar-se-a um tipo de abordagem similar no referente às caracteristícas composicionais.

2. COMPOSIÇAO DA FRACÇAO FINA

o estudo mineralogíco semi-quantitativo das frac~ões inferiores a 20~ e a 2~, utilizando difrac~ão de raios X, foi efectuado por Grade e Casal Moura no Laboratório da DGGM (Porto). As amostras estudadas, em numero de 70, localizam­se a N do paralelo de Aveiro. Verifica-se que em ambas as fracções estudadas a ilite é predominante, sendo a clorite abundante. A caulinite, pouco abundante na fracção <20~ apresenta maior abundância relativa na fracção <2~. O mesmo se verifica com a montmorilonite e os interestratificados, os quais são raros ou ausentes na fracção <20~. Tendência inversa verifica-se, em geral, com O

feldspato potassico, a plagioclase e o quartzo.

3. COMPOSrçAO DO CASCALHO

Como se referiu no capitulo anterior, o cascalho apresenta tendência para ocorrer em duas bandas grosseiramente paralelas· à costa. O mapa da fig.46 representa a distribui,ão do cascalho terr!geno (na amostra total). Da observação deste mapa e da comparação com a distribuição do cascalho total da amostra (fig.36) conclui-se que a banda interna (menos profunda) continua bem marcada. Na banda externa as percentagens de cascalho terrigeno são muito reduzidas (quase sempre <5%), ao contrario do que ,se verifica com o cascalho total, em que se registam percentagens bastante superiores que, nalguns casos, ultrapassam 25% ou mesmo 50% da amostra. Advem tal facto, como e óbvio, da banda interna ter composição essencialmente terrigena e da banda externa ser predominantemente biogenica.

Os elementos do cascalho da banda interna são constituidos, essencialmente, por quartzo e quartzito, apresentando-se normalmente rolados, por vezes muito bem rolados ou sub-rolados. O aspecto geral e amarelo-alaranjado (patinada) embora, raramente, apareçam elementos avermelhados. As caracteristicas morfometricas do cascalho estão, por via de regra, em continuidade com as da areia, as quais serão objecto de descrição detalhada em capitulo posterior. Os elementos poli-mineralicos não são abundantes, manifestando tendência para ocorrer em maior nUmero no sector setentrional da plataforma que no meridional. Entre estes elementos avultam os de gnaisse e os de granito. Ocasionalmente aparecem elementos que chegam a atingir mais de 4cm.

Nesta banda interna, a fracção cascalhenta escassa. t constituída, fundamentalmente, moluscos, em geral perfurados e corroidos, com malmente despolidas (com menos frequência

de orIgem biogenica e muíto por fragmentos de conchas de

arestas roladas, superficies nor­lustrosas), e tonalidade geral

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Dias, J. M. Alveirinho (1987) - Dinâmica Sedimentar e Evolução Recente da Plataforma Continental Portuguesa Setentrional.. Dissertação de Doutoramento, 384p., Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
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Fig.46 - Di9tribui~ão das percentagens de cascalho terrlgeno na amostra.

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r amarelada ou alaranjada. apresentando-se, neste caso,

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Raramente aparecem conchas com aspecto recente inteiras ou evidenciando pequena fractura~ão.

Os elementos do cascalho da banda externa apresentam caracteristicas em grande parte analogas às referidas acima. Como se disse, o cascalho desta banda tem origem predominantemente biogeníca. Os clastos terrigenos, pouco fre­quentes, são quase exclusivamente de quartzo e de quartzito. Os elas tos biogenícos são essencialmente derivados de cônchas de moluscos, muito fractura­dos, de côr acastanhada, acinzentada ou, mais raramente, esverdeada, apresentando-se sub-angulosos a sub-rolados. Poucas são as conchas inteiras, as quais, normalmente, não evidenciam indicias de modernidade. Pelo contrÁrio, quer as conchas inteiras, quer os fragmentos, apresentam-se, em geral, muito corroidos, perfurados, com aspecto "envelhecido", sendo as superficies, por vezes, baças e pulverulentas.

4. COMPOSIÇAO DA AREIA

4.1. Caracteristicas Principais

Uma das caracteristicas mais relevantes da compos1çao da are1a de uma pla­taforma continental e a origem predominante do material que a compõe, isto e, se a principal influência que nela se faz sentir e a terrigena, a biogenica ou a autigenica. Com o objectivo de averiguar tais caracteristicas construiu-se o mapa da fig.47, no qual se indicou qual das componentes consideradas (terrigena, biogenica e autigenica) predomina na areia.

Verifica-se que ate cerca dos 100m de profundidade domina a componente terrigena e que a maiores profundidades, pelo menos ate perto do bordo da pla­taforma, predomina em geral a componente biogenica. Nalgumas zonas do bordo da plataforma a componente maioritaria da areia é a terrigena. Noutras, a com­ponente autigenica predomina, embora nestes casos o nivel de abundância seja, frequentemente, da mesma ordem de grandeza da componente biogénica. t o que se verifica, por exemplo, entre os canhões de Aveiro e do Porto e perto do canhão submarino da Nazaré.

Frequentemente, as razões entre os valores percentuais das diferentes com­ponentes conduzem a resultados mais significativos que os expressos pelas pr6prias percentagens. Com efeito,· a abundância relativa de determinada classe de parti cu las é fortemente afectada pela introdu~ão e mistura (dilui~ão) de particulas das outras classes. Determinando razões entre os valores percentuais (abundâncias relativas) dos tipos de particulas que se pretendem investigar, obtêm-se valores "absolutos", isto é, independentes da influência numérica con­ferida pelas quantidades das particulas que não interessam directamente ao assunto particular que esta a ser averiguado.

Assim, para melhor averiguar qual a importância e regiões de influência quer do material terrigeno, quer do biogénico, elaborou-se o mapa da fig.48 baseado na relação entre as frequências de particulas de origem biogenica e as de origem terrigena. Não se entrou em linha de conta, consequentemente, com a componente autigénica. O padrão de distribuição e, aqui também, "grosso modo", paralelo à costa. Os valores menos elevados (correspondentes a maior abundância de materiais terrigenos) distribuem-se até prÓximo da batimetrica dos 100 metros. Os valores mais elevados estão presentes na plataforma externa. A transição entre estas duas zonas efectua-se, aparentemente, de forma gradual.

O bordo da plataforma apresenta, frequentemente, valores inferiores a um (isto é, com maior abundância de terrlgenos). A quase inexistência de valores superiores à unidade na amostragem colhida nas proximidades do canhão da Nazare, bem como nas zonas em que o bordo da plataforma se apresenta mais abarrancado

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Fig.47 Distribui~ão da predominante na areia.

componente Fig.48 Distribuição regional dos valores da relação partlculas bioclAsticas I partlculas terrlgenas.

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(como na parte setentrional, por exemplo), parecem abonar a hípotese da existência de factores, possivelmente de origem hidrodinâmica, em resultado dos quais se verifica, nestes pontos, um enriquecimento em materiais terrigenos. De acordo com esta hipotese, verificar-se-ia, nestes locais, erosão diferencial, sendo remobilí,zadas determinadas particulas com origem biogénica, enquanto partlculas terrlgenas de volume anàlogo permaneceriam depositadas devido ao seu maior diâmetro de sedimentação. O mapa analisado sugere ainda a entrada de materiais terrlgenos provenientes da plataforma galega.

Factores ressaltantes deste mapa são, principalmente: a) a aparente simpli­cidade do padrão de distribuiç.ão, o qual sugere controle batímetrico; b) a forte influência terrigena da plataforma com profundidade inferior a 100m; c) a importância da componente biogenica na plataforma externa e d) a abundância de material terrigeno no bordo da plataforma.

No sentido de melhor averiguar e pormenorizar o padrão espacial de distribuição dos diferentes constituintes da areia, desenhou-se o mapa da fig.49 onde se representaram as classes composicionais maioritarias na areia. As classes consideradas na construção deste mapa foram: quartzo, mica, outros terrigenos, clastos de moluscos, carapaças ou fragmentos de foraminlferos, outros bioclastos e glauconite. Este mapa permite confirmar o caracter eminen­temente terrigeno e quartzifero da plataforma continental portuguesa seten­trional. Efectivamente, ate à batimetrica dos 100m, a classe maioritária da areia e, com poucas excepç.ões, a do quartzo, o qual, em geral, representa mais de metade desta fracção textural. De modo geral, a ocidente das batimetricas dos BOm-100m desenvolvem-se depósitos sedimentares em que os clastos de moluscos (a norte de 41°10') ou as carapa~as de foraminiferos (a sul do paralelo referido) constituem a classe maioritária da areia.

A nivel local verifica-se que outras classes atingem pOSlçao maioritária. ~ o que sucede com os "outros bioclastos" (briozoarios, cirrlpedes, ostracodos etc.) que, por vezes, parecem apresentar tendência para se desenvolverem em relação com zOnas de afloramentos de rochas consolidadas. ~ ainda o que acon­tece com os "outros terrigenos" (feldspatos, minerais pesados, etc.) no limite setentrional da zona estudada e que poderão estar relacionados com os produtos debitados pelos rios do norte português (nomeadamente pelo rio Minho) e, eventu­almente, pelos rios galegos. ~ o que se verifica, ainda, com a mica, que se revela abundante nas proximidades da foz de alguns rios que afluem à parte norte da zona estudada e, mais ao largo (como na zona entre 41 0 10'N e 4l0 20'N), em conexão possivel, tambem, com as cabeceiras do canhão submarino do Porto.

No bordo da plataforma a classe maioritária da areia torna a ser o quartzo o qual, por vezes, constitui mais de metade da amostra. Localmente, a glaucon­ite chega a constituir a classe maioritária, como acontece no bordo da pla­taforma frente a Aveiro, e pelos 120m de profundidade junto ao canhão submarino da Nazare.

~.~. Componente Terrigena

Como atras se concluiu, a componente mais abundante da cobertura sedimentar da plataforma estudada e a terrlgena. A distribuição regional dos valores per­centuais desta componente (fig.50) revela particular abundância (>75%) até cerca dos 100m de profundidade, sendo estas percentagens frequentemente superiores a 90%. A maiores profundidades a abundância em terr!genos decresce rapidamente, chegando a atingir valores da ordem dos 3%.

Verifica-se tendência para a existência de um alinhamento, na plataforma externa, em que as percentagens de terrlgenos são minimas, a qual se localiza, em geral, a profundidades da ordem dos 120-140m no sector meridional (a sul do

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CLASSE COMPOSI MAIORITÁRIA

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Fig.49 - Distribuição das classes compo­sicionais que apresentam frequência mais elevada na areia.

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Fig.50 - Distribuição das percentagens de partIculas terrIgenas na areia.

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canhão do Porto) e a profundidade um pouco menor no sector setentrional (a norte do referido canhão).

Junto ao bordo da plataforma, a abundincia em terrigenos volta a aumentar, chegando os sedimentos a ser constituldos, localmente, por maiS de 90% de partlculas desta origem'. Como atras foi referido, este comportamento pode ser atribuldo aos processos de dinâmica sedimentar desta zona fisiografica.

As tendências referidas estão expressas tambem no diagrama da fig.51, no qual se representaram as medias ponderadas a intervalos de 25m de profundidade, da amostragem localizada nas linhas perpendiculares à costa. ~ bem nItido, nesta figura, a importância dos materiais provenientes do continente, ate cerca dos 75m de profundidade, profundidade a partir da qual as percentagens medias de partI cu las terr!genas decresce rapidamente, ate atingir os valores minimos entre os 125 e os 150m. Este comportamento pode ser explicado por "diluiç.ão" provocada pelo aumento relativo de partlculas biogenicas e por menor abundância de material terrigeno susceptível de deposição.

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60%

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OUTROS BIOCLASTOS

NÃO IDENTIFICADOS

Fig.51 - Distribuição percentual media, segundo classes de 25m de profundidade, das classes composicionais da areia •

.!!..l.l. Quartzo

o quartzo é mais abundante na plataforma restante plataforma portuguesa. A média, 48,9% na região estudada e de apenas 36,8% na tuguesa. Considerando a zona de profundidade medias são respectl'vamente de 64% d 48 8% o e e , •

portuguesa setentrional do que na ate aos 200m de profundidade, e de globalidade da plataforma por­

inferior a 80m, essas percentagens

A distribuição regional fig.52, confirma a forte

da abundância de quartzo, infllJªncia terrLgena na

representada plataforma

no mapa da considerada,

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QUARTZO NA AREIA

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Fig.52 _ Distribuição da abundância relativa de quartzo na areia.

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Fig.53 a) -10 a

Dístribui~ão da abundância relativa de quartzo nas fr8c~ões 00; b) 00 a 10; c) 10 a 20; d) 20 a 30; é) 30 a 40.

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da areia:

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principalmente no domlnio dé profundidades inferiores a 100m. A percentagem de quartzo parece estar relacionada com os locais de desembocadura dos rios que drenam regiões granlticas. A extensão e coalescência das manchas sugere a influência de acentuado transporte, principalmente por deriva litoral. Aparen­temente contraditaria é a baixa percentagem de quartzo detectada na plataforma interior e media do sector setentrional. Deve-se tal facto à abundância de mica nestes sedimentos, a qual induz diminui~ão da abundância relativa de quartzo. A forma das manchas e as variações das abundâncias relativas do quartzo traduzem provavelmente diferenças de maturidade dos sedimentos.

A abundância media de quartzo atinge valores minimos na plataforma externa, entre os 125m e os 150m (fig.51), o que pode ser devido, como mais atrÁs se referiu, ao efeito acumulativo da menor quantidade de material desta natureza disponivel para deposição, e da "diluição" induzida pelos bioclastos, os quais apresentam maiores frequências nesta zona. Na parte mais profunda da plataforma externa e no bordo da plataforma verifica-se tendência para aumento das percen­tagens de quartzo, o que provavelmente està relacionado com as caracteristicas da dinâmica sedimentar desta zona de fronteira entre a plataforma e a vertente continental, caracterIsticas essas a que jà atràs se fez alusão e que serão objecto de explanação mais desenvolvida em capItulas posteriores.

Na fig.53 representaram-se as distribuições percentuais do quartzo nas fracções granulométricas (intervaladas de 10) da areia. O quartzo inc1uldo na classe granu10métrica da areia muito grosseira (-10 a 00) revela tendência para se dispôr segundo as duas bandas longitudinais que têm vindo a ser aludidas. Os valores mais elevados encontram-se entre os 40m e os BOm de profundidade, sendo possivel, muitas vezes, deduzir relações de origem com rios importantes. ~ de notar a deficiência do sector setentrional em quartzo muito grosseiro, o que se explica, como atràs se referiu, pela existência, nesta zona, de elevadas percen­tagens de mica, de grãos polimineràlicos e de outras particulas terrIgenas alem das mencionadas. Tambem a plataforma externa se revela deficitària neste tipo de quartzo quando comparada com a plataforma media e interna.

As caracteristicas ultimamente referidas são tambem evidentes nos mapas de distribuição do quartzo grosseiro (00 a 10) e médio (10 a 20). A expressão das zonas em que o quartzo e muito abundante (>75%) e progressivamente maior à med­ida que a dimensão do quartzo diminui até 20. Neste mapa de distribuição (10 a 20) não e visivel a faixa da plataforma externa caracterizada por maiores per­centagens de quartzo, certamente porque os grãos deste mineral se encontram aqul muito diluidos por particulas biogenicas, nomeadamente por carapaças de foraminlferos.

A distribuição do quartzo fino (20 a 30) revela um padrão que se pode con­siderar de transição entre os referidos acima e o do quartzo fino (30 a 40). Nesta fracção, o quartzo raramente atinge percentagens superiores a 75%, o que aponta para uma menor maturidade das areias destas dimensões. Todavia, ao contrario das fracções antes consideradas, revela expressão significativa (>2S%) praticamente em toda a plataforma. ~ de realçar a existência de Áreas mais enriquecidas em quartzo fino junto do bordo da plataforma. Tal pode resultar da actuação dos processos hidrodinâmicos desta zona transicional, bem como do com­portamento diferencial do quartzo e das outras particulas ai presentes perante os niveis energeticos que sobre elas actuam.

Como se tera oportunidade de verificar nos capitulas posteriores, indicios vàrios apontam para a possibilidade da existência de relações fortes entre as fracções mais grosseiras do quartzo e a localização de litorais antigos, e entre as fracções mais finas e a dinâmica sedimentar actual.

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4.2.2. Mica

A mica e excepcionalmente abundante na plataforma portuguesa Visto que os comportamentos hidrodinâmicas da moscovite e anÁlogos, não se efectuou aqui a distin~ão entre estes minerais, encontram englobados numa ú.nica classe denominada "mica".

setentrional. da biotite são

os quais se

A percentagem media de mica ate os 200m de profundidade e de 3,6%, bastante superior à media da plataforma total que e de 1,6%. Considerando apenas a zona de profundidade inferior a 80m, a media a Norte do canhão da Nazare e de 4,9% e a da totalidade da plataforma portuguesa e de 2,3%. Comparando estas medias na plataforma setentrional e na restante plataforma portuguesa situada a sul do canhão da Nazare (excluindo, portanto, a àrea estudada), o contraste torna-se ainda mais evidente pois que, nesta última, a mica se restringe a valores de 0,8% (ate os 200m de profundidade) e de 0,9% na zona de profundidade inferior a 80m.

Comparando com outras plataformas, verifica-se que a percentagem de mica presente nos sedimentos da plataforma estudada é invulgar. Refere-se, por exem­plo, que na plataforma SE dos Estados Unidos a percentagem maxima de mica total observada é da ordem de 0,25%, valor este infimo quando comparado com o obser­vado na plataforma estudada, onde essa percentagem atinge valor superior a 35% (DIAS et al., 1984). Estas diferen,as ampliam-se quando se comparam, por exem­plo, aS--frac,ões 20 a 30. No SE estadunidense as percentagens mÁximas observam-se no bordo da plataforma e são superiores a 0,8% (DOYLE et a1., 1968). Na plataforma estudada, as maiores percentagens ocorrem na parte NE --(perto da costa) e são ocasionalmente superiores a 50%.

Os valores detectados nesta plataforma são, até certo ponto, da mesma ordem de grandeza dos observados em plataformas localizadas na dependência de grandes rios sujeitos a cheias, como e o caso da plataforma junto ao Niger (ADEGOKE & STANLEY, 1972) ou israelita, pr6ximo do Nilo (POMERANCBLUM, 1966). O padrão de distribui~ão e os valores determinados sugerem que a plataforma portuguesa setentrional e um caso intermedio entre os dois tipos de plataforma atras referidos.

A mica é, normalmente, constituinte menor dos sedimentos das plataformas continentais. Tem sido, por isso, geralmente, objecto de pouca aten~ão. Estu­dos recentes, no entanto, revelaram que a mica, devido às suas caracteristicas fisico-quimicas, ao habito em que ocorre, e à sua presen~a praticamente con­stante nos sedimentos recentes, pode ser utilizada como indicador expedito e eficaz da dinâmica sedimentar de vastas regiões. Os principais trabalhos publi­cados sobre este assunto são: o de NEIHEISEL (1965) relativo a sedimentos da plataforma da Georgia, nos Estados Unidos; o de POMERANCBLUM (1966) sobre a pla­taforma de Israel; o de DOYLE et alo (1968), que a partir da mica tenta deter­minar os regimes deposicionais na margem SE dos Estados Unidos; O de ADEGOKE & STANLEY (1972), onde estes minerais são utilizados como indicadores dos niveis energeticos na plataforma nigeriana; e o de DIAS et al. (1984) em que se tenta investigar o significado ambiental da mlca na plataforma portuguesa seten­trional.

Um dos problemas que se mantem ainda em aberto e tem inibido uma malar precisão na sua utilização como indicador ambiental, é o da equivalência hidrÁulica da mica. NEIHESEL (1965) e POMERANCBLUM (1966) sugerem que as palhe­tas de mica são equivalentes hidráulicos de materiais das dimensões das argilas. No entanto, DOYLE ~~. (1983) concluem, com base em medições das velocidades de sedimentação, que a mica da classe dimensional areia é hidraulicamente equivalente a esferas de quartzo com diâmetros 4 a 12 vezes menores, sendo a mica fina e muito fina (20 a 40) equivalente hidrÁulico do silte. Mais

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Fig.54 - Distribui~ão da abundância percentual da mica na areia (em base terdgena) .

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Dias, J. M. Alveirinho (1987) - Dinâmica Sedimentar e Evolução Recente da Plataforma Continental Portuguesa Setentrional.. Dissertação de Doutoramento, 384p., Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
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recentemente, todavia, KOMAR ~ aI. (1984), baseados em medi~ões muito precisas das velocidades de sedimenta~ão da mica e do quartzo presentes em turbiditos mio-pliocenicos da Calif6rnia, determinaram relações de equivalência entre diâmetros compostos da mica e do quartzo que sugerem que a equivalência apontada por DOYLE et ai. (1983) está, provavelmente, sobrevalorizada.

A problematica relacionada com a equivalência hidraulica da mica e complexa mas extremamente importante para a utilização destas part!culas minerais como indicadores da dinâmica sedimentar. O conceito de equivalência hidráulica, ori­ginalmente formulado por RUBEY (1933b), envolve a deposi,ão simultânea de partlculas com a mesma velocidade de sedimentação. No entanto, como se sabe, fenomenos varios podem actuar aquando da deposi~ão, ou em episodios de remobiliza~ão e transporte pos-deposicional, em consequência dos quaIs a equivalência hidraulica das particulas do deposito pode não se verificar.

As micas constituem tipo especial de particulas em que o diâmetro de sedimentação é fortemente afectado pelo factor forma, e em que o habito em que ocorrem nos sedimentos lhes confere comportamento especifico. Assim, o tran­sporte conjunto de palhetas de mica e de outras particulas com esfericidade mais elevada conduz a interac~ões que podem modificar a velocidade com que essas partlculas sedimentam. Esta modifica~ão afectara, principalmente, as micas devido à grande àrea relativa que apresentam. Como é obvio, tais modificações serão tanto 'maiores quanto maior fôr a concentra~ão de particulas.

As condi~ões existentes quando se verifica transporte junto ao fundo, em que a pressão dispersiva pode desempenhar papel determinante na deposição das part!culas (o que conduziu SALLENGER, 1979, à formula,ão do conceito de "equivalência dispersiva"), bem como o conjunto de processos ocorrentes na deposi,ão e remobiliza,ão (que levaram SLINGERLAND, 1977 e 1984, a desenvolver o conceito de l1equivalência de arraste"), alteram seguramente as relações de equivalência hidraulica originais. Quando a problematica das equivalências da mica fôr mais profundamente investigada, esta podera revelar-se indicador bas­tante preciso dos niveis energeticos e dos ambientes deposicionais. No actual estado de conhecimentos, no entanto, as palhetas de mica continuam a poder for­necer indicações valiosas, embora apenas aproximativas, do tipo de dinâmica sedimentar da região em que ocorrem.

A abundância de mica na areia, na plataforma estudada, cujo mapa de distribuição esta representado na fig.54, parece estar relacionada com a natureza e proximidade do soco antigo e com as desembocaduras dos cursos de agua que efectuam a respectiva drenagem directamente para a plataforma. ~ relevante que se diga, no entanto, que devido à agitação aquando da peneiração, a mica tem tendência a desagregar-se em palhetas, podendo, consequentemente, as abundâncias relativas, determinadas por contagem à lupa binocular, estar de algum modo sobrevalorizadas.

No mapa da fig.55 representaram-se as distribuições das abundâncias rela­tivas da mica nas frac~ões da areia. Os valores apresentados foram determinados em rela~ão apenas ao conjunto das particulas terrigenas estando, por consequência, minimizados os problemas inerentes à dílui~ão por materiais biogénicos.

As maiores frequências detectam-se junto à costa, a norte do paralelo 41 oN, região onde o soco polimetamorfico e eruptivo se prolonga para a plataforma con­tinental interior. Aqui, a mica apresenta-se, normalmente, em palhetas pouco alteradas que, nalgumas amostras, chegam a ter frequência elevada mesmo nas frac,ões mais grosseiras (O~ a 1~ e -l~ a O~), revelando as palhetas espessura por vezes consi·deràvel, o que indica origem bastante prúxima. Existem também altas percentagens de mica relacionadas com a foz do rio Mondego (o qual efectua

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Fig.55 - Distribui~ões da abundância relativa de mica nas determinada em base terrigena: a) -10 a 00; b) 00 a 10; c) e) 30 a 40.

fracções da areia, 10 • 20; d) 20 a 30;

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a drenagem de granitos da Serra da Estrela) e no complexo sedimentar existente junto as cabeceiras do canhão submarino do Porto.

Pelas dimensões e aspecto de alteração que apresentam, as micas dos sedi­mentos que ocorrem a pequenas profundidades (até cerca de SOm) revelam origem mais pr6xima na zona setentrional que na zona a sul do paralelo 41 oN. A quase ausência de mica ao largo de Aveiro (excepto na fracção mais fina) pOdera estar relacionada com o facto de se verificar reten~ão destas parti cu las na laguna onde, como e sabido, o rio Vouga desemboca.

Em geral, a abundância relativa da totalidade da mica no conjunto das fracções da areia (fig. 54) decresce rapidamente com a profundidade. Com efeito, este componente da areia fica geralmente reduzido a participa~ão vestigial, ou ate mesmo ausente, nas zonas mais profundas da plataforma. Porem, junto ao bordo da plataforma verifica-se aumento da percentagem de mica. A analise dos mapas referentes a este tipo de particulas nas frac~ões da areia (fig.55) sugere que estas palhetas transitam desde perto do litoral ate esta zona, sofrendo ape­nas deposi~ão temporaria seguida de ressuspensão, encontrando aqui condi~ões para deposi~ão definitiva ou, pelo menos, mais estavel. Os mapas apresentados denotam ainda os efeitos da ac~ão intensa das correntes de deriva litoral e da interac~ão da morfologia do fundo com os factores oceanograficos, nomeadamente na zona do canhão submarino do Porto.

As medias das percentagens 25m de profundidade (fig.51) ilac~ões acima expendidas.

de mica na areia, determinadas para. classes de estão, de um modo geral, em concordância com as

4.2.3. Agregados (fragmentos llticos)

Na classe composicional "agregados" incluiram-se todos os grãos polimineralicos identificados aquando das contagens. Esta classe integra três sub-classes importantes, geneticamente bem diferenciadas: IIfragmentos liticos", derivados da erosão de rochas bem consolidadas; "arenitos com cimento carbona­tado" , cuja genese se verificou, provavelmente, na àrea abrangida pela pla­taforma continental; "agregados silto-argilosos", cUJa forma~ão e, possivel­mente, actual.

A percentagem media de lIagregadosll e, na plataforma estudada, de 0,70%, análoga à determinada para o conjunto da plataforma portuguesa (0,75%). Todavia, a media das amostras provenientes da zona de profundidades inferiores a BOm e, nesta região, sensivelmente superior à que se verifica nessas mesmas pro­fundidades na totalidade da plataforma (respectivamente 1,1% e 0,8%) o que, pos­sivelmente, esta relacionado com as caracteristicas dos rios que afluem à região estudada.

Entre os diferentes tipos de "fragmentos l!ticos ll identificados nas amos­tras, merecem especial referência, pela abundância que revelam, os de granito, os de gnaísse, os de xisto e os de arenito bem consolidado. A presen~a de calcaria foi tambem detectada. No entanto, nem sempre e fÁcil distinguir, à lupa binocular~- os grãos provenientes de rochas calcarias, das particulas rola­das provenientes de conchas fragmentadas. ~ possivel que alguns grãos incluidos na classe IInâo identificados" sejam efectivamente fragmentos de calcaria.

Como se referiu, outra importante sub-classe de agregados polimineralicos detectados nas amostras e constituído por fragmentos de arenitos com cimento carbonatado. Nalguns casos, e segura a origem em rochas ante-quaternarias aflorantes na plataforma, tendo-se inclusivamente observado fragmentos que incluem foraminlferos (ou partes destes) não actuais. Noutros casos, por~m, a origem e controversa. O aspecto geral faz lembrar o de algumas "rochas de

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praia" (beach-rock) descritos na bibliografia. DevicYo às profundas diferen"as genetícas e de significado paleo-ambiental que certamente existem entre os dois casos referidos, os primeiros foram integrados na sub-classe "fragmentos l1ticos ll por, com esta sub-classe terem, provavelmente, maiores afinidades. A sub-classe denominada "arenitos com cimento carbonatado" (tendo-se evitado apelidá-la de "rocha de praia", devido à conotação genetica deste termo), inclui, portanto, apenas as partlculas que a seguir se descrevem.

Segundo KOMAR (1976d), as "rochas de praia" são constituidas por areias de praia cimentadas por carbonato de calcio, formando rochas cujo estado de consolida;ão varia entre o friavel e o bem consolidado. Segundo o autor refer1:do, embora as "rochas de praia" se constituam, geralmente, em praias de areias carbonatadas, podem também desenvolver-se em praias de areias quartzicas

e com outras composi~ões.

Os fragmentos de lI aren ito com cimento carbonatado ll encontrados nas amostras provenientes da região estudada são constituidos maioritariamente por quartzo cimentado por carbonato. Apresentam-se, geralmente, mais ou menos friaveis, embora, menos frequentemente, exibam bom estado de consolida~ão. Em classifica~ão expedita, Como é a que geralmente se efectua à lupa binocular aquando das contagens, tais fragmentos foram considerados como provÁveis frag­mentos de "rocha de praia ll

, embora sem excluir a hipatese de terem orIgem

diferente.

A classifica~ão apontada é questionavel. Efectivamente, a forma~ão das "rochas de praia ll modernas esta limitada às regiões tropicais quentes (KOMAR, 1976d), especificamente entre as latitudes 35 0 N e 35

0S (FRIEDMAN & SANDERS,

1978), bastante a sul da região estudada. Por outro lado, e a ajuizar pelas descri~ões de "rocha de praia ll existentes na bibliografia consultada, a abundância de elementos de quartzo presente nos fragmentos observados parece não ser tlpico destas rochas. O tipo de partlculas presentes, bem como o estado de cimenta~ão, sugerem passiveI origem recente e é compatlvel com forma~ão a partir de areias de praia, embora não seja de excluir a hipatese de terem proveniência em dunas consolidadas.

Os fragmentos de possivel "rocha de praia" ocorrem em estado não vestigial, (isto é, com percentagens superiores a 1% da areia), apenas em nUmero muito reduzido de amostras. O padrão de ocorrência e, aparentemente, aleatario. Verifica-se, no entanto, alguma tendência para aparecerem preferencialmente em amostras colhidas entre os 40m-60m de profundidade e na plataforma externa. Relativamente às outras regIoes da plataforma continental portuguesa, esta região setentrional parece ser deficitÁria em fragmentos de possiveis ttrocha de praia tt • Verifica-se mesmo tendência para enriquecimento progressivo das areias em part!culas deste tipo à medida que se caminha para Sul, com incidência maxima na plataforma algarvia.

Outra sub-classe de agregados presente nas amostras e constituido por agre­gados: de partlculas de dimensões silto-argilosos, não raro incluindo fragmentos bíogeriicos (p.ex.: fragmentos de carapa~as de foraminlferos). Normalmente fazem alguma efervescência com Hel, perante o qual, normalmente, se desagregam. Foram considerados como "pe16ides". De acordo com FRIEDMAN & SANDERS (1978), tais partlculas podem ter origem fecal, mas podem tambem originar-se de outras formas como, por exemplo, pela desidrata~ão devida a exposi~ão sub-aerea de lodos car­bonatados.

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4.2.4. Outros Terrigenos

Entre os Qutros elementos terrlgenos encontrados nas amostras estudadas podem referir-se os feldspatos e os minerais pesados. Não se procedeu à identificação sistemática e contagem destes minerais. No entanto, principal­mente os feldspatos parecem apresentar tendência para ocorrerem em maior número e em grãos de maiores dimensões na parte NE da região estudada.

~ de assinalar ainda a ocorrência, de certo modo frequente, de carvão e escórias (crackling). Parte destes fragmentos tem proveniência, certamente, na zona emersa. Outra parte, porem, està provavelmante relacionada com a navega~ão a vapôr, tendo tido origem, nomeadamente, na limpeza das caldeiras dos navios. Embora geralmente assumam caracter vestigial, é grande o nÚmero de amostras em que estes fragmentos foram detectados, verificando-se tendência para a ocorrência sistematica em certas àreas, corno sejam, por exemplo, a parte NE da plataforma (prbximo da costa a norte de 41 0 N), a zona perto do litoral a sul do Cabo Mondego, a plataforma externa e bordo da plataforma em frente à Figueira da Foz, e a plataforma adjacente ao bordo norte do canhão submarino da Nazare.

4.3. Componente Biogenica

o padrão de distribui,ão regional da componente biogénica (fig. 56) é, até certo ponto, complementar do da componente terrigena atras referido. Os desvios desta complementaridade são devidos à componente autigenica, a qual, geralmente, 50 tem influência relevante a profundidades superiores a 75-100 metros. Refere-se novamente que os mapas de distribui~ão apresentados pretendem apenas ilustrar tendências verificadas a nivel regional, na abundância relativa de cada classe. Consequentemente, não é possivel tentar interpreta-los em termos de tendências ecológicas, o que, alias, esta fora do âmbito deste trabalho.

Com o estudo das particulas de origem biogenica da classe dimensional areIa pretendeu-se contribuir para o conhecimento dos significados sedimentologico e genético-evolutivo de tais particulas. Por outro lado, a maior parte dos estu­dos recentes sobre a frac~ão carbonatada da areia tem incidido em plataformas caracterizadas por sedimenta~ão carbonatada. O interesse do estudo desta frac~ão numa plataforma como a portuguesa setentrional, onde a componente terrigena se revela dominante é, portanto, obvia.

Da observa~ão do mapa referido pode extrair-se a conclusão (ja evidenciada na analise de outros mapas apresentados) de que a plataforma estudada é essenci­almente terrlgena até cerca dos BOm-100m de profundidade, sendo os bioclastos abundantes a profundidades maiores.

A componente carbonatada da plataforma estudada integra-se na associa~ão

"foramol" (LEES & BULLER, 1972), em que a presen,a de foraminlferos e moluscos é ublqua, a de equinodermes e briozoarios e, com frequência, importante, e a de outros organismos e esporadica. O padrão de distribui~ão do material carbona­tado apresenta analogias com O que se verifica em muitas outras plataformas do globo. A uma zona mais próxima do litoral, com poucas particulas carbonatadas, sucede-se outra, mais profunda, em que a percentagem relativa destas partlculas aumenta progressivamente, atingindo-se os maiores valores na plataforma externa, onde os foraminiferos dominam a frac~ão areia.

4.3.1. Clastos de Moluscos

As conchas dos moluscos bivalves servem, como se sabe, de protec~ão a esses· organismos, sendo essas partes duras utilizadas por algumas espécies biologicas como substrato. As espécies litofagas e perfurantes provocam, com frequência, a morte destes bivalves. Por outro lado, muitas esp~cies predadoras conseguem

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Fig.56 Distribui~ão da abundância relativa de bioclastos na areia.

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Fig.57 relativa areia •

Distribuiç:ão de elas tos

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da abundância de moluscos na

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partir a concha e alimentar-se das partes moles dos moluscos. FRIEDMAN & SANDERS (1978), por exemplo, referem o caso de caranguejos e lagostas que que­bram as conchas com as pinças e, para aproveitarem ao máximo as partes comestlveis, cortam os fragmentos resultantes em pedaços do tamanho da areia. Assim, a percentagem de clastos de moluscos num sedimento e função não 56 da abundância destes organismos, mas tambem, entre outros factores, dos processos biológicos a que tais moluscos estão sujeitos.

Na plataforma considerada, os clastos de moluscos constituem, em média, a classe mais abundante da componente bíogenica. A percentagem media desta classe representa cerca de 40% da componente referida.

o padrão de distribui~ão regional da abundância relativa de clastos de moluscos (fig.57) revela que estes são, por via de regra, pouco abundantes malS perto do litoral e mais abundantes na plataforma externa. Junto ao bordo da pla­taforma, em geral, a percentagem de moluscos decai de forma drástica. Este com­portamento encontra-se tambem bem expresso no diagrama representativo das per­centagens ponderadas das diferentes classes composicionais agrupadas em classes de 25m de profundidade (fig.51).

Este padrão de distribui~ão parece ser, ate certo ponto, anomalo. Com efeito, em muitas plataformas, os clastos de moluscos são mais abundantes na plataforma interna que na externa, o que esta de acordo com o facto de a maior parte dos moluscos viverem na zona eufotica (SIESSER, 1972). Todavia, noutras plataformas, constata-se tendência inversa, o que tem sido interpretado como resultado da variabilidade natural da existência de moluscos em fun~ão dos diferentes ambientes, mas tambem da Ifdilui~ão" dos elas tos destes organismos por Outras partlcu1as (MULLER & MILLlMAN, 1973).

Não obstante os condicionalismos que advêm da carência de amostragem, a delimita~ão da zona com menos de 10% de moluscos na areia reflecte diluição por terrigenos. A relação existente entre as percentagens relativas das particulas de origem terrlgena e as dos elas tos de moluscos esta bem expressa no diagrama da fig.51, pelo menos ate aos 100m de profundidade. A profundidades maiores, onde as percentagens de clastos de moluscos atingem valores mais elevados, estas são afectadas principalmente por outras partlculas biogenicas, nomeadamente pelas carapaças de foraminlferos e, localmente, pela glauconite. Todavia, este tipo de "diluição" tem significado completamente distinto do provocado pelas partlculas terrlgenas, daI sendo posslvel extrair i1ac~ões não sÓ do ponto de vista ambiental, como tambem quanto à dinâmica sedimentar e à evolução recente da plataforma, como se constatara em capitulos subsequentes.

Junto ao bordo da plataforma, a percentagem relativa de clastos de moluscos diminui, não so em consequência de restrições do tipo ambiental, mas tambem devido à influência da dupla "diluição fl por particulas terrigenas e por outros bioclastos (principalmente por carapaças de foraminiferos). ~ ainda de con­siderar, localmente, a influência da componente autigenica.

A analise do mapa referido permite concluir, ainda, que existe desigual distribuição latitudinal da abundância de clastos de moluscos. Com efeito, na faixa de maior abundância destas partlculas na plataforma externa, as percen­tagens observadas são, em geral, bastante maiores na zona localizada a norte do canhão do Porto que na zona situada a sul deste canhão submarino. As amostras em que esta classe composicional revela as maiores percentagens localizam-se, tambem, na zona setentrional da plataforma. Tal facto poderà advir de circun­stancialismos ambientais, mas poderá tambem estar relacionado com fenomenos de menor " d iluição ll por outras partlcula"s. Neste caso, ê provavel que a relação entre a disposi~ão geral da batimetria e a direc~ão da agitação marltima dom­inante (principalmente a mais energetica) seja factor determinante. A energia

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disponlvel para ressuspensão e transporte de particulas finas e muito finas serÁ aI maior que na parte meridional. Verificar-se-ia, assim, 1l1avagem" dos sedimen­tos a norte (aI permanecendo os clastos de moluscos, geralmente de maior dimensão), e passiveI redeposíção preferencial das outras particulas mais a sul, devido a perda de competência transportadora dos factores hidrodinâmicas. Tal interpretação é suportada pela distribuição de outros parâmetros sedimentologicos jà analisados, nomeadamente pelo da distribuição das classes texturais mais finas.

4.3.2: Carapaças de Foraminiferos

Existem semelhanças entre o padrão de distribuição da abundância de carapaças de foraminlferos (fig.58) e os outros mapas anteriormente apresenta­dos. De modo geral, os foraminlferos estão ausentes, ou apenas se encontram em quantidades vestigiais, ate aos BD-100m de profundidade. Verifica-se, então, aumento gradual destas partlculas no sentido de zonas mais profundas, registando-se percentagens superiores a 25% da areia na plataforma externa a sul do canhão do Porto. A variabilidade existente na distribui~ão das carapa~as de foraminlferos e atribulvel não so a condicionalismos do tipo ecologico, mas tambem a factores hidrodinâmicas e à "diluição" por outras partlculas, quer de origem terrlgena, quer biogenica, e localmente, à existência de elevadas percen­tagens de glauconite. A percentagem media de carapaças de foraminlferos na pla­taforma estudada (ate aos 200m de profundidade) e de 0,7%, bastante inferior à media da totalidade da plataforma portuguesa (3,8%), o que provavelmente se deve, entre outros, aos fenómenos que temos referido sob a designação de "diluição".

o contraste, referido no ponto anterior, entre as zonas da plataforma externa situadas a norte e a sul do canhão submarino do Porto, encontra-se bem marcado no mapa em anÁlise. Ao contrÁrio do que se verifica no sector meri­dional, a abundância de foraminlferos na areia e frequentemente escassa ou mesmo nula na plataforma externa da zona setentrional. Esta tendência corrobora a hipotese da t'lavage~' dos sedimentos expendida no final do ponto anterior. A velocidade de sedimentação das carapaças de foraminlferos (porosas e ocas) confere-lhes comportamento hidrÁulico anÁlogo ao de partIculas de quartzo volumetricamente muito menores. Serão, consequentemente, ressuspensas e exporta­das para fora desta zona, conjuntamente com outras partlculas granulometri­camente finas, provocando, deste modo, aumento local da percentagem relativa de partIculas maiores, como e o caso, por exemplo, dos clastos de moluscos.

SIESSER (1972) refere que os foraminlferos da faml1ia Elphidiidae predom­inam em zonas de sedimentar;ão rápida, enquanto os foraminlferos porcelanoides (como os miliolIdeos) são ma1S abundantes em ZOnas de sedimentar;ão lenta. Embora se não tenha procedido à identificar;ão sistemática dos foraminIferos, a identificar;ão esporÁdica de algumas especies e as suas relar;ões aparentes com as taxas de acumular;ão deduzidas para esta plataforma (capItulo 111-2) parece, em geral; estar de acordo com as afirmar;ões acima referidas.

Normalmente, a abundância relativa das carapaças de foraminIferos planctonicos aumenta com a profundidade ate proximo do bordo da plataforma. Os foraminlferos bentonicos aparecem, de modo geral, apenas com caracter vestigial a profundidades inferiores a BOm-100m, aumentando a sua abundância a maiores profundidades. Provavelmente, estas variações devem-se mais a fenomenos de "diluir;ão" por outras partlculas que a modificações rea1S da produr;ão de foraminlferos. Os padrões de distribuição das carapaças de foraminiferos planctonicos e de foramÍnlferos bentonicos são, na generalidade, parecidos. O seu aspecto e anÁlogo ao da totalidade das carapa,as destes organismos (fig.58).

Provavelmente, a distribuição das carapar;as de foraminlferos na plataforma

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FORAMINIFEROS NA AREIA

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Fig.58 Distribuição relativa de carapaças (ou seus fragmentos) na

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da abundância de foraminlferos areia.

Fig.59 relativa na areia.

Distribuição de fragmentos

da abundância de equinodermes

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estudada depende, por um lado, das caracterlsticas hidrÁulicas destas partlculas, e por outro, das caracterlsticas fisíco-qulmicas das àguasa A deficiência do sector setentrional em foraminiferos (relativamente ao sector meridional) poderia, assim, estar relacionada com o facto de ai desaguar a maior parte dos rios que afluem a esta plataforma, com o consequente incremento dos acarreios de materiais terrigenos e com modifica~ões das caracterlsticas flsíco-qulmicas das àguas que cobrem a plataforma.

As maiores percentagens de foraminlferos bentonicos na plataforma externa e no bordo da plataforma são ainda devidas, certamente, a fenomenos de "upwel­lingl!, responsàveis pelo transporte, de zonas mais profundas, de Águas mais frias, ricas em fosfatos, nitratos e silicatos e onde prospera o fitoplancton, nomeadamente as diatomÁceas, principal alimento dos foramin!feros. Correla~ões positivas entre fenomenos de "upwelling lt e a abundância de foraminlferos bentonicos foram já determinadas em várias plataformas, nomeadamente na pla­taforma ocidental da Africa do Sul (SIESSER, 1972).

4.3.3. Eguinodermes

Nas amostras estudadas, as particulas atribu!veis a equinodermes consistem principalmente em espiculas, fragmentos de carapa~as e placas. A maior parte destas particulas pertence, provavelmente, a equinoides. No entanto, pe~as pro­venientes de asteroides e ofiuroides estão tambem, por certo, presentes, isto a avaliar pelo número de exemplares destas classes recolhidos nalgumas opera~ões de amostragem.

As abundâncias relativas detectadas para esta classe são sempre pequenas. Na maioria das amostras, estas partlculas não estão presentes, ou existem apenas vestigialmente. A percentagem media destas partículas na plataforma estudada e de apenas 1,4%, quase metade da media determinada para a totalidade da pla­taforma portuguesa (2,2%). O valor máximo observado foi de 11% (frente a Viana do Castelo, a 110m de profundidade).

o diagrama representativo das percentagens das diferentes classes composi­cionais em fun~ão da profundidade (fig. 51) revela tendência para maior abundância de fragmentos de equinodermes na plataforma externa, onde se verifi­cam as maiores percentagens medias (2,4% entre 100m e 125m de profundidade e 2,0% entre 125m e 150m de profundidade). O mapa de distribui~ão respectivo está representado na fig.59, onde se pode constatar tendência para aumento relativo destas particulas com a profundidade. Todavia, junto ao bordo da plataforma, verifica-se geralmente diminuição destas percentagens.

Os equinodermes tendem, em geral, a ser gregÁrios, ocorrendo em grande nÚmero em Áreas localizadas, onde as condições lhes são favorÁveis. As caracteristicas da distribuição espacial das particulas incluidas nesta classe composicional reflectem, provavelmente, este facto, a que se adicionam fenomenos de "diluição" por outros tipos de particulas. A maior incidência na plataforma externa pode ser explicada ainda pelo pequeno diâmetro de sedimenta~ão que estas' parti~ulas normalmente possuem, tendendo consequentemente, quando isoladas do organismo, a serem removidas de zonas com dinâmica mais activa para zonas mais calmas.

4.3.4. "Outros Biogenicos"

Na classe composicional "outros biogenicos" incluiram-se as partlculas derivadas de organismos não contemplados nas classes anteriormente referidas. Parte do material encontrado não foi identificado em termos de sistematica biologica. Entre o material mais frequente, identificado de forma expedita pela observa~ão com lupa binocular, citam-se coraliarios, briozoÁrios, ostracodos,

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Dias, J. M. Alveirinho (1987) - Dinâmica Sedimentar e Evolução Recente da Plataforma Continental Portuguesa Setentrional.. Dissertação de Doutoramento, 384p., Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
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esplculas de espongiarios e espinhas de peixe. Embora se não tenha procedido, de forma sistematica, à contagem dos diferentes tipos de partlculas incluídas nesta classe composicional, anotou-se sempre a sua presença quando tal acon­tecia, assinalando-se as percentagens respectivas quando se observava abundância significativa de partlculas de um tipo especifico. O conjunto dos "outros biog~nicost' apresenta, na plataforma estudada, percentagem m~dia de 3,7%, niti­damente inferior à media para a totalidade da plataforma que é de 9%.

Quer o mapa de distribuição regional da classe "outros biogenicos" (fig.60), quer o diagrama que representa a percentagem media das classes compo­sIcIonais em fun~ão da profundidade (fig.Sl), revelam tendência para valores mais elevados das percentagens relativas desta classe na plataforma externa. Tal facto e atribuivel a três ordens de factores: a) circunstancialismos ecol6gicos, pois que e nesta zona que os depósitos (que servem de substrato aos organismos) são mais lodosos e mais carbonatados, e as outras caracteristicas ambientais (pressão, temperatura, salinidade, luz, etc.) revelam, seguramente, certa especificidade; b) menor "dilui~ãoll provocada por terrigenos, pois que, estando esta zona mais afastada da costa, a sedimenta~ão de terrigenos pro­venientes do continente e menos acentuada; e c) factores relacionados com o com­portamento hidràulico das particulas, as quais apresentam, frequentemente, forma muito afastada da esferica (espiculas, placas, tubos, etc.), sendo por vezes Ocas ou porosas, o que lhes confere, em geral, diâmetros de sedimenta~ão baixos (menores que os de grãos de quartzo com diâmetros de peneira~ão anàlogos), o que facilita a remo~ão destas particulas para ambientes com dinâmica mais calma, como certamente são os da plataforma externa.

Alguns dos organismos integrados nesta classe composicional podem eventual­mente fornecer indica~ões no que respeita à dinâmica sedimentar. t o caso, por exemplo, dos briozoàrios, os quais, segundo STACH (1936) e LAGAAIJ & GAUTHIER (1965) são muito sensiveis não só a vari~ões ambientais, nomeadamente as que se referem ao tipo de substrato e à profundidade, mas tambem à quantidade de sedi­mentos que chegam às zonas onde estes organismos vivem. Segundo os últimos autores referidos, a taxa de sedimenta~ão controla directamente a abundância de briozoàrios, sendo as àreas em que se verifica deposi~ão ràpida de sedimentos desfavoràvel para a proliferação destes organismos. SIESSER (1972), na pla­taforma sul-africana, constatou que a abundância relativa de particulas pro­venientes de briozoàrios apresenta tendência para aumentar com a profundidade, relacionando tal facto com O decrescimo do fornecimento de materiais terrigenos nas zonas mais profundas. Este autor relacionou ainda a presen~a de abundâncias relativas muito elevadas de briozoàrios, em àreas de pequena profundidade, com a existência de substratos favoràveis e de afluxo muito baixo em terrigenos.

Na plataforma estudada, a localiza~ão das amostras com quantidades signifi­cativas de briozoàrios apresenta, aparentemente, padrão aleatório. Todavia, as maiores abundâncias foram detectadas abaixo dos BOm-100m de profundidade, sendo estas particulas praticamente inexistentes junto ao bordo da plataforma. Como se verà em capitulo posterior, estes factos podem correlacionar-se razoavelmente bem com as taxas de acumula~ão deduzidas para estes locais.

Muitas são as informações sobre ambientes de sedimenta~ão e caracteristicas vàrias da dinâmica sedimentar que se podem extrair da anàlise cuidada das partes esqueleticas de organismos presentes nos sedimentos e das varia~ões percentuais que apresentam na Area em estudo. A investiga~ão do tipo de relações existentes entre os diferentes organismos e o ambiente de sedimenta~ão està ainda no inicio. O conhecimento do comportamento hidràulico destas particulas so agora começa a ser estudado em pormenor (p.ex.: MAIKLEM, 1968; BRATHWAITE, 1973; FLEM­MING, 1977). Este conjunto de conl)ecimentos permitirA, eventualmente, deduzir quando e que a ocorrência de determinadas particulas biogenicas e devida essen­cialmente à existência desses organismos nessa Area, ou quando e qlle essas

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Fig.60 - Distribui~ão da abundância per­centual da classe composicional "outros biogénicos" na areia.

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Fig.61 - Distribuição da abundância per­centual de glauconite na areia.

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partlculas são provenientes de outros locais, e para ali foram transportadas e depositadas em fun~ão da dinâmica sedimentar existente na zona.

4.4. ~ Componente Autigenica (Glauconite)

Alem da glauconite, outros componentes ditos autigenicos estão presentes nas amostras estudadas. ~ o caso, por exemplo, da fosforite, a qual foi detec­tada sob forma de grãos bíoclasticos fosfatados nalgumas amostras colhidas na plataforma continental externa e junto ao bordo da plataforma (identífíca~ão por L. Gaspar, utilizando metodo colorimetrico). Alias, a presen~a de fosforite autigenica nos sedimentos da margem continental portuguesa entre os cabos de Sines e de São Vicente foi já antes noticiada, geralmente em associa~ão com materiais carbonatados. De facto, NUTTER (1969) referiu a existência, na zona a sul do rio Mira, de sedimentos com teores em P20S que, com frequência, excedem os 0,2%, tendo detectado um maximo de 0,79% de P20S numa amostra proveniente do fundo do canhão submarino de São Vicente, a 670m de profundidade. Mais recen­temente, GASPAR (1982) referiu a presen,a de nódulos fosfatados na região das Montanhas dos prlncipes de Avis, com teores máximos em P205 de 21,5%.

A identificação da fosforite por observa~ão à lupa binocular e dificil e problematica. As particulas analisadas por metodo colorimetrico que revelaram, como se disse, estar fosfatadas, eram bioclasticas e tinham sido incluIdas, pro­vavelmente, na classe composicional (biogenica) correspondente aquando das con­tagens para determina~ão da composl~ao da areia. Face às dificuldades de identifica~ão do material fosfatado por observa~ão à lupa, e tendo em atenção os objectivos deste trabalho, não se efectuaram novas contagens nem quaIsquer correcções. Anotou-se simplesmente o facto quando se efectuou a identificação referida. Assim, as eventuais .partlculas fosfatadas estão integradas nas classes bioclasticas correspondentes.

A glauconite (que e autigenica mas pode ocorrer nos sedimentos tambem como detritica) constitui, no caso vertente, em exclusividade, a componente autigeníca. Refira-se que "glauconite" e utilizado neste trabalho, à semelhança do que se verifica em trabalhos deste género (p.ex.: CURRAY, 1960; FRIEDMAN & SANDERS, 1978; BORNHOLD & GIRESSE, 1985), no sentido comum do termo, isto é, significando o aspecto morfol6gico e a côr das particulas. Deste modo, o termo glauconite refere qualquer partlcula terrosa, em geral mais ou menos arredon­dada, de côr verde, cuja tonalidade pode varIar de clara a escura, quase negra.

Regra geral a glauconite aparece de forma significativa na areIa apenas abaixo dos 100m de profundidade. Situa~ão análoga se verifica entre os cabos Raso e EspicheI (MONTEIRO & MOITA, 1971), ao largo de Sines (MOITA, 1971) e em muitas outras plataformas do globo. Em compara~ão com a totalidade da pla­taforma portuguesa, a região estudada parece ser ligeiramente deficitaria em glauconite pois apresenta uma percentagem media de 2,1% da areia, um pouco infe­rior à media da plataforma total, que e de 2,58%. Os valores determinados para as sub-regiões de profundidades inferiores e superiores a BOm (0,17% e 3,72% respectivamente) são tambem ligeiramente inferiores aos calculados para as mes­mas sub-regiões da totalidade da plataforma portuguesa (0,39% e 4,29% respec­tivamente). ° valor máximo encontrado para a glauconite (40%), nas amostras provenientes da plataforma setentrional, e superior ao divulgado por MONTEIRO & MOITA (1971) para a plataforma entre os cabos Raso e Espichel (20%), mas infe­rior ao indicado por MOITA (1971) para a plataforma ao largo de Sines (52%). Este ultimo valor é idêntico ao que encontràmos no estudo da amostragem pro­veniente dessa mesma área e cujos resultados agora se divulgam (51%).

° mapa de distríbui~ão regional da setentrional esth reproduzido na fig.61. ite nas amostras colhidas a profundidades

glauconite na plataforma AI se constata a escassez

inferiores a 100m, e a

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abundância na plataforma externa. Em media, a zona em que a glauconite ocorre com maiOres percentagens localiza-se entre os 125m e os 175m de profundidade (fig.51), aproximadamente coincidente com o intervalo de profundidades (132m a 165m) a que BORNHOLD & GIRESSE (1985) detectaram as maiores concentra,ões de areias glauconlticas na plataforma de Vancouver, na Columbia Britânica, onde estes minerais tambem aparecem de forma significativa apenas abaixo dos 100m. No entanto, no caso indicado, a glauconite apresenta abundância bastante maior que na plataforma portuguesa. Os autores referidos apontam uma percentagem màxima superior a 80% da areia e percentagem media (das amostras com glauconíte) de 21%. Este último valor é de apenas 5,8% na plataforma entre os cabos Raso e Espichel (MONTEIRO & MOITA, 1971) e de 4,4% na plataforma portuguesa seten­trional.

A glauconite foi detectada em todas as frac,ões da areia (fig.62). No entanto, apresenta tendência para ocorrer com mais abundância nas frac~ões 10 a 20 e 20 a 30. Chega, nalguns casos, a atingir 80% da frac,ão, como acontece a WNW de Aveiro, pelos 160m de profundidade, e junto ao bordo norte do canhão da Nazare. Estas dimensões preferenciais de ocorrência da glauconite condizem com as que se têm observado noutras plataformas (WILLIAMS et ~., 1954; MERO, 1965; McRAE, 1972; BORNHOLD & GIRESSES, 1985). Todavia, nos casos em que a glauconite e mais abundante, estes grãos chegam a ter frequência superior a 10% na frac~ão 00 a 10.

Foram observados, nas amostras estudadas, todos os tipos morfologicos referidos por TRIPLEHORN (1966), sendo mais frequentes os moldes internos de foraminiferos e os grãos esferoidais e ovalóides. Observaram-se mesmo vÁrios estÁdios de transição desde carapaças de foraminlferos com pequenos indicias de glauconitização, ate moldes internos constituidos exclusivamente por glauconite.

Segundo McRAE (1972), as conchas dos micro-organismos constituiriam micro­ambientes propicias às transformações minera16gicas que culminam na glauconite. A materia orgânica ai em decomposição provocaria as condições de oxi-redução necessarias à forma,ão deste mineral autigénico (CLOUD, 1955). Simultaneamente, devido ao facto desses ambientes serem semi-confinados, o meio estaria ao abrigo do efeito diluente da àgua do mar, permitindo, contudo, trocas ibnicas, lentas mas determinantes, com a fase liquida envolvente (ODIN & LtTOLLE, 1978; ODIN & MATTER, 1981).

No que se refere à côr, verifica-se que nos moldes e enchimentos das carapaças dos foraminiferos a côr da glauconite e verde azeitona, verde claro e, por vezes, acastanhada. Nos grãos ova16ides e lobados a côr tem tendência a ser mais escura, às vezes quase negra. Esta associação preferencial de tonalidades com certos tipos morfol6gicos de glauconite tem sido referida, tambem, em varias plataformas do globo, inclusivamente na plataforma portuguesa ao largo de Sines (MOITA, 1971) e ao largo da peninsula de Setúbal (MONTEIRO & MOITA, 1971). Detectaram-se, no .entanto, excepções frequentes, tendo-se inclusivamente obser­vado que, por vezes, grãos mais claros possuem zonas mais escuras. EHLMANN et al., ,(1963) atribuem essa côr mais escura dos grãos à oxidação do ião ferroso quando a particula se liberta do meio confinado em que se constituIu e fica sujeita à ampla actuação da agua do mar.

Nas amostras estudadas observou-se que os grãos maIS claros, bem como o preenchimento dos foraminlferos, em presença de HCl se desagregavam, frequen­temente, em pequenas partlculas da dimensão das argilas. Regra geral, os grãos mais negros eram muito menos afectados pelo àcido referido. Tal facto podera estar de acordo com a hipôtese de EHLMANN et alo (1963), segundo a qual a côr negra traduz estado mais evoluldo da glauconít;.

Como atràs se referiu, a glauconite apresenta tendência para ocorrer em

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Fig.62 areia:

- Oistribui~ões .) -10 • 00; b)

da abundância relativa 00 • 10; c) 10 • 20; d)

de glauconite 20 a 30; e) 30

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carapa~as de foramíniferos ou como grãos individualizados. O primeiro modo de ocorrência levanta problemas no significado das contagens para determinação da composição da areia. Visto que aparecem desde carapaças com glauconítízação incipiente (pequenas pontuações) at~ moldes internos perfeitos, passando por diferentes casos intermedios (incluindo grãos de glauconite ainda com fragmentos da carapaça do fora~inlfero onde, presumivelmente, se verificou a autig~nia), e dificil decidir quando e que estas partlculas devem ser incluidas na classe com­posicional "foramíniferos" ou na da Itglauconite". Utilizou-se, nestes casos, cri teria subjectivo. Quando, pela observação do grão, este era constituldo, aparentemente, por menos de 50% de glauconite, incluiu-se na classe dos foraminlferos. Quando mais de metade do grão parecia ser constituIdo por glau­conite, este foi incluldo nesta ultima classe composicional. Tal cri teria introduz factor de erro na composição da areia. Verificou-se, inclusivamente, que carapaças com pequenas ocorrências de glauconite (integráveis, portanto, nas classes dos foraminiferos) revel~ram, apos ataque com HCI, terem o interior com­pletamente preenchido por glauconite. ~ de esperar, todavia, que o factor de erro introduzido pela aplicação do cri teria aludido seja aceitável para os objectivos deste trabalho.

~ de referir que, ocasionalmente, a glauconite aparece noutros suportes biocLlsticos além das carapa~as de foraminlferos. Por exemplo, fragmentos de conchas muito perfuradas, provenientes da plataforma externa, revelaram, por vezes, pontuações verdoengas de glauconite. Nestes casos, a tonalidade era verde escura, diferente da que, em geral, se encontra na glauconite que se for­mou nas carapaças de foraminlferos. Esta diferença parece estar 'de acordo com as hipóteses de forma~ão e evolu~ão da glauconite expendidas por EHLMANN et aI. (1963) e ODIN & LtTOLLE (1978). Com efeito, as perfura~ões nas conchas dos moluscos constituiriam micro-ambientes menos confinados que os das carapaças de foraminlferos, estando, portanto, mais sujeitos à actuação da àgua do mar e con­sequente oxidação do ião ferroso.

A formação da glauconite e favorecida por taxas de acumulação pequenas ou ate negativas (erosão). Tais condições, juntamente com outras condições favoráveis, podem ser encontradas durante transgressões marinhas (RECH-FROLLO, 1963; McRAE, 1972; HOUTEN & PURUCKER, 1984). Este facto explica a razão pela qual a glauconite ocorre frequentemente em relação com sedimentos não modernos, anteriores à subida do nivel do mar que se verificou apos a ultima glaciação (ALLEN, 1965; CLARKE, 1969). Como se terÁ oportunidade de verificar em capitulas posteriores, as ocorrências de glauconite na plataforma estudada pare­cem estar tambem relacionadas com depositas atribuiveis a esses nIveis maiS baixos que os actuais.

Segundo ODIN & LtTOLLE (1978), são necessÁrios mil a dois mil anos de evolução para se desenvolverem minerais autigenicos do tipo esmectite, sendo o suporte original ainda reconheclvel. Para que o suporte desapareça e o mineral autigenico apresente estado de maior maturação (a glauconite no sentidQ mineralogico), e necessária evolução bastante mais longa, da ordem dos 105 a 10 b

anos. Por outro lado, vários autores sugerem que a glauconite presente actual­mente nos sedimentos das plataformas e fundamentalmente detritica, tendo origem na erosão de forma~ões glauconiticas em terra (p.ex.: BELL & GOODELL, 1967; BIRCIl et alo, 1976; LOGVINENKO, 1982). Na plataforma estudada não existe relação aparente entre a distribuição dos grãos de glauconite e formações glauconlticas antigas. Tambem o aspecto morfologico dos grãos não sugere, fre­quentemente, erosão e transporte, apontando antes, em muitos casos, para formação in situ.

Atendendo ao que atrás se expôs, parece poder concluir-se que a glauconite na plataforma portuguesa setentrional e, pelo menos na maior parte, autigenica, tendo-se formado, possivelmente, pelo menos em grande parte, apos o último

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máximo glaciário. A idade de 8 a 10 mil anos apontada por BORNHOLD & GIRESSE (1985) para a forma,ão da glauconite da plataforma da ilha de Vancouver, no Canada, é compativel com o que se observa na plataforma portuguesa. ~ mesmo passIveI que a glauconitiza~ão continue ainda actualmente activa.

5. SmtULA

1) O padrão de distríbui~ão regional das varias classes composicionais da areia evidencia, "grosso modo", certo paralelismo à costa. O mesmo se verifica com o desenho das batimetricas, O que permite concluir da existência de controle batime~rico (e/ou influência de distância à costa) na composi~ão da areia.

2} A plataforma continental considerada apresenta, no que se refere à areia, caracteristicas predominantes de sedímenta~ão terrigena (a media da per­centagem de particulas terrigenas é superior a 70%) com forte predominância de particulas de quartzo (média de cerca de 50%).

3) As percentagens de quartzo e de mica parecem estar relacionadas com os locais de desembocadura dos rios que drenam regiões graniticas. ~ passiveI ainda concluir que, principalmente na plataforma interna, estas classes composicionais da areIa sofrem a influência de acentuado transporte, principalmente por deriva litoral.

4) A componente biogenica da areia tem, em geral, malar importância na pla­taforma externa. As classes bioclasticas com maior peso percentual são as dos clastos de moluscos e a das carapaças e fragmentos de foraminiferos.

5) A componente sua influência na bordo da plataforma.

autigenica plataforma

da areia (dominada pela glauconite) faz externa e, em especial, nalgumas zonas

sentir a junto ao

6) Os fenomenos de "diluição" de umas classes composicionais por outras são complexos e dificultam a interpretação dos padrões regionais de distribuição.

7) A dinâmica sedimentar ocorrente junto à zona transicional do bordo da plataforma parece induzir fenomenos de barreira ou, mais provavelmente, de fil­tro selectivo, nas particulas sedimentares que ai afluem.

8) Em vÁrios dos mapas analisados é possivel identificar clara sugestão de importação de materiais provenientes da plataforma galega.

9) Junto aos canhões submarinos e nas zonas onde a vertente continental e o bordo da plataforma se encontram mais abarrancadas, os dados analisados permitem deduzir a existência de uma dinâmica presumivelmente mais turbulenta. No entanto, com os dados ate agora analisados, não e possivel deduzir as suas caracteristicas.

10) Existe, nalguns dos mapas estudados, acentuado contraste entre a pla­taformd externa localizada a norte e a sul do canhão submarino do Porto. A hipotese de diferenças nos niveis energeticos actuantes junto ao fundo e resul­tantes da interacção dos factores oceanograficos com a batimetria permite expli­car tal contraste.

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Dias, J. M. Alveirinho (1987) - Dinâmica Sedimentar e Evolução Recente da Plataforma Continental Portuguesa Setentrional.. Dissertação de Doutoramento, 384p., Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.