CARACTERÍSTICAS MOTIVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRAS Q ... · son's individual characteristics...

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ARTIGO CARACTERÍSTICAS MOTIVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRAS Q ---Q Q P • Cecnia Whitaker Bergamini Consultora de Empresas e Professora da área de Recursos Humanos da EAESP/FGV e da FEAlUSP. * RESUMO: Este artigo resume os resultados princi- pais de um estudo sobre comportamento motivacional, fei- to em 250 empresas brasileiras. Os dados empíricos cole- tados permitem concluir que a personalidade de cada um afeta o grau em que as variáveis motivacionais podem se deixar refletir no comportamento observável. O principal enfoque apresentado mostra que os estímulos externos não são suficientemente fortes para influenciar a direção desse comportamento motivacional. Não foi descoberta nenhu- ma possível relação entre o estilo de comportamento moti- vacional e as variáveis ambientais. * PALAVRAS-CHAVE: Estilo de comportamento mo- tivacional, diferenças individuais, personalidade, intensi- dade e direção comportamental. * ABSTRACT: This article deals with the main find- ings of a study about motivational behavior conducted at 250 Brazilian organizations. Evidence is that each per- son's individual characteristics aftect the degree to which motivational variables may be reflected on observable be- havior. The main approach presents externai stimuli as not strong enough to influence the direction of motivatio- nal behavior. It has not been found any possible relation- ship between the style of motivational behavior and enoi- ronment variables. * KEY WORDS: Style of motivational behavior, indivi- dual difterences, personality, behavior direction, behavior intensity. Revista de Administração de Empresas São Paulo, 30 (4) 41-52 Out./Dez. 1990 41 ~--~---~ -- ---

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ARTIGO

CARACTERÍSTICAS MOTIVACIONAISNAS EMPRESAS BRASILEIRAS

Q---QQP

• Cecnia Whitaker BergaminiConsultora de Empresas e Professora da área deRecursos Humanos da EAESP/FGV e da FEAlUSP.

* RESUMO: Este artigo resume os resultados princi-pais de um estudo sobre comportamento motivacional, fei-to em 250 empresas brasileiras. Os dados empíricos cole-tados permitem concluir que a personalidade de cada umafeta o grau em que as variáveis motivacionais podem sedeixar refletir no comportamento observável. O principalenfoque apresentado mostra que os estímulos externos nãosão suficientemente fortes para influenciar a direção dessecomportamento motivacional. Não foi descoberta nenhu-ma possível relação entre o estilo de comportamento moti-vacional e as variáveis ambientais.

* PALAVRAS-CHAVE: Estilo de comportamento mo-

tivacional, diferenças individuais, personalidade, intensi-dade e direção comportamental.

* ABSTRACT: This article deals with the main find-ings of a study about motivational behavior conducted at250 Brazilian organizations. Evidence is that each per-son's individual characteristics aftect the degree to whichmotivational variables may be reflected on observable be-havior. The main approach presents externai stimuli asnot strong enough to influence the direction of motivatio-nal behavior. It has not been found any possible relation-ship between the style of motivational behavior and enoi-ronment variables.

* KEY WORDS: Style of motivational behavior, indivi-dual difterences, personality, behavior direction, behaviorintensity.

Revista de Administração de Empresas São Paulo, 30 (4) 41-52 Out./Dez. 1990 41

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1. GOOCH, B. G. & McDO-WELL, B. J. "Use anxiety tomotivate". Personne/ Jour-na/, EUA, abril, 1988, p. 51.

2. LEVY-LEBOVER, C. Lacrise des motivations. Paris,Presses Universitaires deFrance, 1984, p. 31.

3. Idem, ibidem, idem.

4. Idem, ibidem, idem.

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INTRODUÇÃO

Poucos artigos ou mesmo trabalhos maisextensos, cujo objetivo principal tenhasido o de pesquisar em maior profundi-

dade o fenômeno da motivação humana den-tro das empresas brasileiras, têm vindo a pú-blico. Isso representa uma lacuna que precisaser preenchida a fim de que os administrado-res possam caminhar com passos mais segu-ros sobre esse terreno. Essa segurança nãopode tomar por base simples opiniões oucrenças, mas sobretudo, exige o apoio de da-dos fornecidos pela pesquisa empírica.

O presente trabalho deverá esboçar algu-mas conclusões às quais foi possível chegar,depois de quase dez anos de pesquisa junto aorganizações tipicamente nacionais. Alémdisso, serão retomados alguns pressupostosteóricos com o objetivo de caracterizar, o maisclaramente possível, sob que aspectos, enfo-ques ou conceitos está-se entendendo o termomotivação, uma vez que numerosos e diferen-tes pontos de vista existem sobre esse assuntona atualidade, dentro do capítulo denomina-do comportamento organizacional.

A DINÃMICA DA MOTIVAÇÃO

Recentemente, num interessante artigo, Go-och e McDowell assim se exprimiram: "Muitofreqüentemente, as pessoas não fazem aquilo quelhes pedimos para fazer, simplesmente porque elasnão querem fazer esse tipo de trabalho". Um pou-co mais adiante, complementam suas idéiasda seguinte maneira: "A motivação é uma forçaque se encontra no interior de cada pessoa e quepode estar ligada a um desejo. Uma pessoa nãopode jamais motivar a outra, o que ela pode fazer éestimular a outra. A probabilidade de que uma pes-soa siga uma orientação de ação desejável está dire-tamente ligada à força de um desejo'",

Outros autores também se referem de ma-neira semelhante a esse aspecto interior do fe-nômeno da motivação, deixando sempre im-plícita a crença de que nada se pode fazer emtermos motivacionais, a menos que a própriapessoa não esteja pessoalmente envolvidanesse processo: "É evidente que todo o desempe-nho supõe que duas condições sejam preenchidas:que se seja capaz de executá-lo (aptidões) e que setenha a vontade (motioação)">. Para concluir seupensamento, Leboyer acrescenta: "Mas nossopropósito aqui não é o de analisar os determinan-tes do desempenho, mas somente situar e definirconcretamente a motivação. Tenhamos em mente,então, que essencialmente se trata de um processoque implica na vontade de efetuar um trabalho oude atingir um objetivo, o que cobre três aspectos:

fazer um esforço, manter esse esforço até que o ob-jetivo seja atingido e consagrar a ele a necessáriaenergia. Em outros termos, por motivação, enten-de-se, ao mesmo tempo, a direção e a amplitude dascondutas, quais comportamentos são escolhidoscom que vigor e qual intensidade">. Assim sendo,as pessoas consagram mais tempo às ativida-des para as quais são motivadas. Portanto, "amotivação é, em última análise, uma distribuiçãodo tempo disponioel'", é uma questão de aloca-ção de tempo. E, então, possível considerarque a motivação do ser humano seja uma fun-ção tipicamente interna a cada pessoa, umaforça propulsora que tem suas fontes freqüen-temente escondidas no interior de cada um ecuja satisfação ou insatisfação fazem parte in-tegrante de sentimentos que são tão somenteexperimentados dentro de cada pessoa.

Não foram considerados, para fins da pre-sente pesquisa, aqueles aspectos defendidospela corrente comportamentalista ou behavio-rista. Está sendo assumido que todos os com-portamentos exibidos pelas pessoas, a partirda presença de reforçadores extrínsecos aelas, podem ser caracterizados como reação aestímulos, O que permite classificá-los comocomportamentos condicionados. Procurou-sepesquisar o homem a partir da visão fenome-nológica, na qual aquilo que mais importa éconfigurar a ação motivacional a partir darealidade existencial dos sujeitos pesquisadosnos seus ambientes naturais de trabalho.

UMA PESQUISA BRASILEIRA

Várias hipóteses foram estabelecidas numapesquisa levada a efeito na Universidade deSão Paulo. As hipóteses escolhidas tinhampor objetivo investigar sistematicamente aexistência de dependência entre as diferentesorientações motivacionais e algumas variá-veis que fossem relevantes à melhor compre-ensão do fenômeno em si.

A primeira hipótese a ser comprovada peloestudo feito procurou pesquisar a ligação ne-cessária entre os traços de personalidade e ca-racterísticas próprias dos diferentes-estilos decomportamento motivacional. Em termosconcretos, aquilo que interessou no estudo foiverificar até que ponto o comportamento ob-jetivamente reconhecível pode ser entendidocomo uma decorrência necessária de aspectosinternos à pessoa e que não são, portanto, di-retamente acessíveis à observação imediata.

Dessa forma, pressupõe-se que as caracte-rísticas intrínsecas da personalidade podemdeterminar orientações comporta mentais es-pecíficas, naquilo que dizem respeito à psico-dinâmica motivacional. Essa ligação de causa

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ras de serviços. Tais organizações estavam es-palhadas por todo o Brasil, isto é, eram origi-nárias de todos os estados da federação, nãose privilegiando nenhuma região em especial.

O uso do teste de hipótese de dependência(X2) entre as duas variáveis permitiu concluirque estilos comportamentais diferentes apre-sentam diferentes preferências motivacionais.A descoberta desse aspecto, ao mesmo tempoúnico e intrínseco da personalidade, é tambémconfirmada pelas concepções cognitivas dapersonalidade, particularmente aquelas apre,-sentadas por Michel Huteau, que afirma: "Eentão possível definir a personalidade como a uni-dade estável e individualizada de todo um conjuntode condutas": Percebe-se que o autor põe emevidência a noção de totalidade, como se apersonalidade devesse ser considerada comoo produto final de um vasto conjunto de inva-riâncias pessoais, fazendo jus à sua origem eti-mológica: lia máscara do autor de teatro da anti-guidade (persona), que exprime bem certas caracte-rísticas individuais estáveis que se manifestam nasmais diferentes situações, por assim dizer, algunsaspectos mais proeminentes da personalidade'":

Para defender e reafirmar a sua própria in-dividualidade, cada pessoa se defenderá, nor-malmente, de situações que tenham o poderde desintegrar a sua estabilidade e totalida-de. Embora o comportamento motivacionalimplique numa ação por parte do indivíduo,ele está ligado a es!ruturas de personalidadeque são estáveis. E, então, possível concluirque, como a personalidade apresenta estabili-dade de traços característicos, também as ca-racterísticas motivacionais de cada um per-manecem de alguma forma estáveis. Tal fatopermitirá o delineamento de um perfil estru-tural básico, uma espécie de modelo interior,que é responsável por aquilo que neste traba-lho está sendo chamado de estilo de compor-tamento motivacional.

Em termos práticos, todas as vezes que al-guém se vê diante da ameaça de não ser atendi-do em suas expectativas motivacionais, depara-se com uma situação de ameaça à destruição daprópria individualidade. As pessoas trazem,então, dentro de si, seus potenciais motivacio-nais, necessidades, pulsões ou desejos, mas aforma pela qual eles são atendidos é que colocaem jogo maiores ou menores níveis de satisfa-ção motivacional. Se as organizações estives-sem devidamente atentas para tal aspecto, evi-tariam muitas medidas consideradas desmoti-vadoras. Da mesma forma, desistiriam de pro-curar fórmulas gerais ou medidas impessoaisno afã de terem empregados motivados.

Se, no ato motivacional, as pulsões inte-riores são de ordem emocional, elas não ex-

e efeito é tão nítida que permite o reconheci-mento das diferenças individuais naquilo quese chama de estilo de comportamento moti-vacional. Esses aspectos podem considerarnão somente o indivíduo em si, como um serúnico, mas também procuram compreender eexplicar o tipo de percepção e, conseqüente-mente, de interação que ele estabelece comseu ambiente organizacional.

A metodologia utilizada consistiu da apli-cação paralela de dois questionários que visa-vam, respectivamente, aos diagnósticos de es-tilos de liderança e ao diagnóstico das princi-pais características motivacionais numaamostra composta de 830 indivíduos. Os su-jeitos estudados submeteram-se a um progra-ma de desenvolvimento de pessoal com dura-ção aproximada de 16 horas. Durante o pro-grama de desenvolvimento, os participantes,reunidos em grupos de no máximo 20 pesso-as, passaram por várias fases de diagnósticoe vários tipos de sondagem a respeito dassuas características de personalidade. Assimsendo, não só eram solicitados a preencher osquestionários, como também deveriam, atra-vés de exercícios introspectivos, se pronunciara respeito de suas características pessoais.Por meio dos recursos oferecidos pelos exercí-cios em pequenos grupos, recebiam informa-ções dos coparticipantes a respeito de comoeram percebidos por seus colegas.

Sendo três as fontes de informações, a res-peito das características individuais de com-portamento de cada pessoa, foi possível asse-gurar o máximo possível a validade dos re-sultados conseguidos. Essas três fontes de in-formações abrangiam, portanto, a imagemque cada pessoa fazia a respeito de si mesma,os resultados numéricos dos questionários dediagnóstico e a imagem percebida pelos de-mais membros do grupo, informação esta queofereceu a caracterização do eu social de cadaum. Em virtude de todos os cuidados toma-dos na fase de coleta dos dados primários em-píricos, a pesquisa estendeu-se por quatroanos de trabalho.

A escolha dos participantes da pesquisa écaracteristicamente não probabilística, isto é,só foram estudados indivíduos que estavamdispostos a participar dos programas de trei-namento e que, por isso mesmo, estavam inte-ressados em colaborar na prestação de infor-mações sobre si mesmos. Esse foi o recurso es-colhido para que se pudesse ter um graumaior de confiança nas informações prestadas.

Fazem parte da amostra participantes re-presentativos de organizações públicas e pri-vadas, bem como pertencentes à categoria deempresas industriais, comerciais e prestado-

5. HUTEAU, M. Les concep-tions cognitives de la perso-nalité. Paris, Presses Uni-versitaires de France, 1985,pp.25-26.6. Idem, ibidem, idem.

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7. LORENZ, K. L'envers dumirroir - Une histoire natu-relfe de la connaissance.França, Ed. Flamarion, 1975,p.19.

8. BALLV, G. EI juego comoexpresión de liberdad. Bue-nos Aires, Fondo de CulturaEconômica, 1964, p.9.

9. LORENZ, K. A demoliçãodo homem. São Paulo, Bra-siliense, 1986, p.65.

10. DE VRIES, M. K. & MIL-LER, D. L'entreprise névto-sée. Paris, McGraw-Hill,1985, p.13.

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plicam integralmente o comportamento mo-tivacional; não se pode omitir a caracteriza-ção do intelecto como elemento igualmentedecisivo à melhor compreensão de todo o fe-nômeno. Um dos aspectos vitais do intelectoé a percepção de cada um, consideradacomo porta de entrada de todo o conteúdopsíquico.

E particularmente na psicodinâmica moti-vacional que a percepção tem um importantepapel a cumprir, quando a pessoa busca en-contrar os fatores que satisfarão suas carên-cias e expectativas pessoais. Portanto, é elaque seleciona, dentre os numerosos fatoresque estimulam o indivíduo, aqueles que apre-sentam aspectos particularmente significati-vos para ele, seja no meio ambiente, seja den-tro do seu próprio mundo interior. Como dizLorenz: "Para a abelha, a persistência das cores sereveste de uma importância capital, pois é necessá-rio que ela esteja em condições de reconhecer umacerta categoria de flores a partir da cor, que é umadas características constantes dessas flores; emcontrapartida, para o gato, que caça na obscurida-de, a cor não possui absolutamente nehuma im-portância, ele precisa discriminar os movimentos;quanto à coruja, é a partir de suas faculdades au-ditivas que ela localizará de maneira acústica apassagem de um camondongo eic/", Assim comoos animais, os seres humanos também perce-berão, no ambiente que os envolve, aquiloque lhes interessa por ser um importante fatorao atendimento de suas necessidades ou ca-rências pessoais.

Segundo as descobertas de Konrad Lorenz,pode-se dizer que ninguém jamais conseguirámotivar ninguém. São as necessidades que es-tão dentro das pessoas e não os fatores quesatisfazem aquilo que de,e ser consideradocomo fonte da sinergia motivacional. Cadapessoa tem sua personalidade estruturada demaneira particular, apresentando, conseqüen-temente, um correspondente tipo de compor-tamento motivacional que lhe é próprio, por-tanto, diferente dos demais.

Não somente a análise dos dados obtidosatravés da pesquisa empírica, como tambémnumerosas teorias mostram que, do ponto devista da interação do indivíduo com seu am-biente profissional, o enfoque mais adequadonão é aquele tradicionalmente adotado atéhoje. Torna-se indispensável rever uma gran-de parte daquilo em que se acreditou por al-gum tempo. Sabe-se, atualmente, que as pes-soas podem ter todos os tipos de necessida-des interiores e tender para os mais variadosobjetivos sem que seja necessário estabeleceruma prioridade hierárquica entre tais objeti-vos.

DIFERENÇAS INDIVIDUAIS E MOTIVAÇÃO

Sendo a motivação tipicamente interna acada indivíduo, para estudá-la há que se ob-servarem certas regras segundo as quais o serhumano age espontaneamente.

O brinquedo e o jogo são atividades natu-rais do ser humano. Ninguém pode forçaruma criança a brincar, caso ela não o queira,da mesma forma que um adulto não se diver-tirá simplesmente porque é coagido a fazê-lo.

Gustave Bally considera o jogo como umaconduta instintiva, própria à natureza humanae animal, sendo indispensável aos dois. DizBally: "A origem do jogo se encontra na condutainstintiva; no entanto, ele não se torna possível se-não quando as limitações ao instinto se relaxam.Esse relaxamento é garantido ao animal jovem peloscuidados com os filhqs e ao homem pela proteçãodada pela sociedade. E esta segurança que oferece amargem dentro da qual está sua liberdade", Eleconsidera, então, que as restrições da socieda-de constituem fatores que impedem a saciaçãode uma necessidade instintiva.

Sob essa perpectiva, o ato instintivo e o atomotivacional guardam estreitas ligações. Tan-to a motivação como o jogo são atividades es-pontâneas e gratuitas, uma vez que depen-dem tão simplesmente de predisposições in-ternas: todos os dois devem levar à satisfaçãode estados de carência latentes. Tanto na si-tuação de jogo como na motivação, existepara o indivíduo um curso normal de açãoque, uma vez interrompido, provoca a insatis-fação. Como diz Lorenz: "O jogo e a curiosida-de têm, cada qual, suas motivações; nem o jogo,nem a exploração ocorrem jamais a serviço de al-guma outra motivação especüica'".

Em princípio, as necessidades são própriasao ser humano e podem ser consideradascomo forças igualmente impulsoras para to-dos; todavia, a maneira pela qual as diferen-tes pessoas se organizam para atendê-las éparticular a cada uma delas. O estilo de com-portamento motivacional é a maneira pessoale preferencial de cada um lutar para chegaraos objetivos motivacionais. Como afirma DeVries: "Os estilos de personalidade podem expli __car toda uma diversidade de comportamentos". Ea isso que ele chama de "conjunto de condutasque permanecem relativamente estáveis ao longodos anos">,

Assim sendo, a possível solução para ummelhor conhecimento da motivação não seráorganizar as pessoas em função dos conjuntosde objetivos motivacionais parecidos, mas,sim, descobrir a maneira pela qual cada umpersegue diferentes caminhos para chegar aum mesmo objetivo. O ser humano, quando

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cilmente O comando, e possui espírito inova-dor bem como convicções firmes, conseguin-do convencer facilmente os demais.

Fromm denominou essa orientação compor-tamental de exploradora, sendo que ela apare-ce no programa UFO de Atkins e Katcher soba denominação de estilo toma e controla.

elabora para si mesmo uma estratégia compor-tamental, escolhe um caminho que seja o maisnatural ao seu tipo de característica motiva cio-nal. Esse é o percurso preferido porque ele sesente mais à vontade, mais produtivo, sendoesse estilo de ação o responsável pela eficácia epelo sucesso em conseguir satisfação própria.Dessa forma, pode-se dizer que as principaisdimensões das atividades da vida cotidianapertencem a um esquema de preferências com-portamentais que servem de referencial a cer-tos grupos e que excluem desse enquadramen-to outros grupos diferentes de pessoas.

Estudos feitos pelas ciências comporta-mentais mostram que, ao se levar em conside-ração a tipologia oferecida por elas, torna-sepossível caracterizar quatro orientações bási-cas que descrevem os quatro organizadoresdos diferentes estilos motivacionais. Os fato-res de satisfação perseguidos são participar,agir, manter e conciliar. Na prática, o reconhe-cimento dessas diferentes condutas é feitocomo se segue:

- Manter: é o organizador do comportamen-to motivacional das pessoas cujo estilo pró-prio se baseia na reflexão, na lógica, na análi-se dos fatos concretos, bem como no cuidadoconstante em determinar a melhor linha deação possível de conduta, antes de passarem àação concreta.

Aqueles que convivem com uma pessoaque tem como principal orientação motivacio-nal a manutenção, geralmente descrevem-nacomo alguém organizado, que tem os pés naterra e a cabeça sobre os ombros, preocupan-do-se com a continuidade das coisas, apoian-do-se sobretudo na experiência anterior paraassegurar o sucesso das ações futuras.

Fromm descreve esta como a orientaçãoacumuladora da personalidade, sendo queela aparece no trabalho de Atkins e Katchersob o nome de estilo mantém e conserva.

- Participar: é o organizador do comporta-mento motivacional das pessoas cujo estilobusca o desenvolvimento pessoal e auto-aper-feiçoamento, valoriza os talentos dos outros ebusca a contribuição que o seu auto-desenvol-vimento pode trazer à organização da qual fa-zemparte.

Aqueles que convivem com uma pessoacuja principal orientação motivacional é a daparticipação descrevem-na, geralmente, comoalguém que tem elevadas exigências a respei-to de si mesmo e a respeito dos outros, queaceita e assume a responsabilidade, sendoleal, sensível, cooperador por estar sempredisponível, caso dele se necessite.

Originalmente, esse estilo é descrito porFromm" como a orientação receptiva, o quedeu origem ao estilo dá e apóia, de Atkins eKatcher", cujo questionário de estilos de lide-rança foi utilizado na aplicação paralela aoquestionário de diagnóstico de estilos decomportamento motivacional.

- Conciliar: é o organizador do comporta-mento motivacional das pessoas cujo estilo sebaseia na preocupação com a busca de rela-ções harmoniosas, no interesse pelo conheci-mento do maior número possível de pessoas,dos seus valores, atitudes e as reações a fimde interagir o melhor que podem com pes-soas dos mais diferentes tipos.

Aqueles que convivem com uma pessoacujo principal orientador motivacional é o deconciliação, descrevem-na como alguém ale-gre, jovial, flexível quanto a seus pontos devista, tendo grande diplomacia e possuindoum enfoque otimista e positivo a respeito dosproblemas, mostrando grande sensibilidadeàs expectativas dos outros.

Essa é a orientação de marketing descritapor Fromm e o estilo de liderança de Atkins eKatcher denominado adapta e negocia.

- Agir: é o organizador do comportamentomotivacional cujo estilo se guia pela importân-cia dada àqueles que se mostram capazes deaproveitar todas as oportunidades de atuar demaneira eficaz. São pessoas descritas comocheias de vida e energia, prontas a enfrentar odesafio, que fogem da rotina e buscam semprese impor por sua competência pessoal.

Aqueles que convivem com uma pessoacujo principal organizador motivacional é oda ação a descrevem, geralmente, como al-guém naturalmente diretivo, que assume fa-

As pesquisas a respeito da tipologia com-portamental dentro das ciências comporta-mentais indicam que todas as pessoas pos-suem, ao mesmo tempo, as quatro orientaçõescomportamentais. O que diferencia uma pes-soa da outra é a ênfase que cada uma dá a es-ses orientadores comportamentais. Os orienta-dores mais enfatizados é que vão dirigir o pro-cesso da percepção para a busca de esquemasprodutores, que são os fatores mais adequadosà satisfação das carências dos indivíduos. Des-

11. FROMM, Erick. A Análi-se do Homem. Rio de Janei-ro, Zahar, 1978.12. ATKINS, S. & KATCHER,A. A importância de servocê mesmo. São Paulo,Atlas, 1985.

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13. BERGAMINI, Cecília W.Determinantes do Estilo deComportamento Motivacio-nal: planejamento e valida-ção de um instrumento dediagnóstico - base teóricada contingência motivacio-nal. (VoLlI) São Paulo, teseapresentada à FENUSPcomo parte dos requisitospara obtenção do título deLivre Docência, em novem-bro de 1988. O trecho citadoestá na p.214.

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sa forma, na medida em que seja possível co-nhecer o conjunto de norteadores motivacio-nais de uma pessoa, seu comportamento serámais facilmentepercebido e será possível com-preender as razões mais prováveis de certoscomportamentos objetivamenteobserváveis.

A comprovação da hipótese de dependên-cia viabilizou-se na medida em que foi anali-sada a ordenação seqüencial das orientaçõescomportamentais dos diferentes estilos de li-derança juntamente com a ordenação seqüen-cial dos organizadores de comportamentomotivacionaL Obtendo-se resultado positivoquanto à hipótese de dependência entre asduas variáveis, tornou-se possível aceitar queas orientações particulares que cada pessoaimprime ao seu comportamento motivacionaltomam como base os constituintes de perso-nalidade que retratam a diferença individualde cada uma delas e que são diferentes dasdemais com as quais convive.

Apenas a título de ilustração, parece válidomencionar que a seqüência do aparecimentodos norteadores comportamentais como oprimeiro organizador do estilo de comporta-mento motivacional mostra a distribuiçãoapresentada no quadro 1, conforme a amostrabrasileira estudada neste levantamento.

MOTIVAÇÃO E VARIÁVEIS ORGANIZACIONAIS

Uma vez tendo conseguido comprovar aligação necessária entre as características depersonalidade e as orientações motivacio-nais delas decorrentes, a segunda investiga-ção procurou determinar que variáveis ex-trínsecas ao indivíduo também poderiam ounão se mostrar dependentes de um tipo par-ticular de estilo de comportamento motiva-cionaI.

Foram feitos estudos que visavam à com-provação da hipótese de dependência entreo estilo de comportamento motivacional eos seguintes aspectos organizacionais: área

na qual os participantes da pesquisa esta-vam desenvolvendo suas atividades de tra-balho, o nível hierárquico no qual se encon-travam essas pessoas, a formação escolar ouacadêmica que possuíam, sua idade e sexo.

Das variáveis extrínsecas ao indivíduo, aúnica que permitiu a comprovação da hipó-tese de dependência foi a primeira delas, istoé, a área ou setor no qual as pessoas esta-vam alocadas. A utilização do teste de X2

permitiu concluir favoravelmente pela exis-tência de dependência, sendo então possívelafirmar que, nas empresas brasileiras, "há de-pendência entre as características individuais doestilo de comportamento motivacional e a área deespecialização profissional na qual as pessoas de-senvolvem suas atividades de trabalho na empre-sa"13.. Levando-se em conta que 36 é o maior nú-

mero de pontos que podem ser obtidos noquestionário de diagnóstico, o menor é de 9pontos e a mediana se situa próxima a 21pontos, foi possível construir o quadro 2, de-monstrativo da ordenação das áreas em quese pesquisou a distribuição desses estilos.

Um exame do quadro 2, que apresenta aclassificação das áreas de trabalho segundoas médias de pontos do primeiro estilo, deacordo com os resultados do questionário deLevantamento de Estilos de ComportamentoMotivacional (LEMO), parece ilustrar a filo-sofia que norteia o comportamento motiva-cional de cada estilo. Por exemplo, áreas taiscomo recursos humanos atendem a necessi-dade que têm as pessoas cujo primeiro estiloé o da participação, favorecendo que traba-lhem a favor do desenvolvimento e aprimo-ramento das pessoas dentro das organiza-ções. Nada melhor do que a área de produ-ção para pessoas de ação, que aí podem darvazão à sua grande sinergia pessoal e rapidezde conduta no atingimento de resultados,metas e prazos. O estilo de manutenção devesentir-se à vontade na área financeira, onde

Quadro 1: Seqüência de aparecimento do estilo de comportamento motivacional nas empresas brasileiras

Primeiro estilo Participação N =474 57%

Segundo estilo Ação N = 190 22%

Terceiro estilo Manutenção N = 114 13%

Quarto estilo Conciliação N = 52 6%

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poderá utilizar sua lógica de raciocínio e sis-tematização, ao trabalhar analisando dadosconcretos dos demonstrativos financeiros vi-sando a evitar erros e perdas. Os indivíduosde conciliação, em virtude das suas médiasmais altas, posicionam-se em primeiro lugarna área comercial, na qual poderão servir-seda sua habilidade social, conseguindo evi-denciar aos clientes as vantagens dos produ-tos que adquirem. Inversamente, o examedos estilos posicionados nos últimos lugares,a partir das suas médias de pontos, evidenciaaquilo que menor peso tem para cada umdesses estilos, portanto, aquilo que encerramenor potencial de provável satisfação paracada um deles.

O trabalho em si representa aquilo queatende à motivação intrínseca preconizadapor Deci, a partir da qual cada indivíduotraz dentro de si necessidades inatas e orgâ-nicas de competência e autodeterminação,visando a atingir estados de reconhecidobem estar e autonomia. Para ele, "as necessi-dades intrínsecas de competência e autodetermi-nação motivam o processo habitual da busca e

conquista do nível ótimo de desafio, do livre cur-so dos impulsos e emoções procurando situaçõesque atraiam o interesse, que requeiram o uso dacriatividade e recursos pessoais. Essas necessida-des buscam desafios que venham de encontro àcompetência, não sendo nem muito fáceis, nemmuito difíceis"]4.

A confirmação da dependência entre avariável características motivacionais e aárea ou o tipo de atividades desenvolvidaspelo indivíduo ressalta a importância do seuenvolvimento nas práticas correntes de pla-nejamento de carreira para os empregadosde uma organização. A falta de respeito àsua individualidade, no tocante a necessida-des e expectativas pessoais, e o planejamen-to de sua carreira facilmente podem setransformar num fator contrário à satisfaçãomotivacional. A variável trabalho propõe-secomo importantíssimo fator de desbloquea-mento da sinergia motivacional de cada pes-soa. Sérias frustrações podem ser evitadas,na medida em que se compreenda e respeiteo sentido que cada indivíduo dá ao trabalhoque faz.

Quadro 2: Ordenação das áreas segundo a ênfase do organizador de comportamento motivacional nasempresas estudadas

PARTICIPAÇÃO Y AÇÃO Y,

1. Recursos Humanos 27,82 Produção 23,72-

2. Geral 27,25 Comercial 23,01

3. Planejamento 26,81 Geral 22,57

4. Financeira 26,74 Financeira 22,55

5. Administrativa 26,68 Administrativa 22,38

6. Produção 26,01 Planejamento 22,04

7. Comercial 25,67 Recursos Humanos 21,46

MANUTENÇÃO Y CONCIUAÇÃO Y

1. Financeira 23,72 Comercial 19,83

2. Planejamento 22,41 Recursos Humanos 19,67

3. Administrativa 22,12 Planejamento 18,76

4. Produção 21,84 Administrativa 18,72

5. Geral 21,77 Produção 18,44

6. Comercial 21,25 Geral 18,43

7. Recursos Humanos 21,05 Financeira 18,1714. DECI, E. L. Intrinsicmo-tivation.New York, PlenumPress, 1975, p.32.

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15. Idem, ibidem, p.19.

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DEMAIS ESTUDOS DE DEPENDÊNCIA

o estudo seguinte procurou comprovar ahipótese de dependência entre estilo de com-portamento motivacional e nível hierárquicodo cargo ocupado pelas pessoas pesquisadas.Depois de calculado o X2

, concluiu-se pelanão dependência entre essas duas variáveis,ou seja, a caracterização de estilos de com-portamento motivacional não difere signifi-cativamente, quer as pessoas estejam mais al-tamente posicionadas na pirâmide organiza-cional, quer estejam em posições de menordestaque. Como se pode ver, atribuir diferen-ças de expectativas motivacionais entre indi-víduos posicionados em níveis hierárquicosmais elevados ou inferiores não tem apoio napesquisa empírica.

Em muitas empresas brasileiras, os proce-dimentos em avaliação de desempenhoacham-se ligados a planos de promoçõesverticais no quadro de carreira, deixandosubjacente a crença de que pessoas mais al-tamente posicionadas no organograma daempresa poderiam estar mais motivadas, fa-zendo, portanto, jus a salários mais altos. Decerta forma, essa filosofia administrativanão se tem mostrado muito saudável. É pos-sível perceber que se instaurou dentro des-sas empresas um comportamento indeseja-velmente competitivo, uma vez que as pes-soas se deixaram envolver pela busca pura esimples de cargos de nível hierárquico maisvalorizados, fazendo dessa recompensa ex-trínseca a grande razão do seu comprometi-mento para com a organização. Não raro,nessa busca de ascensão, as pessoas eramcolocadas em atividades que não correspon-diam às suas verdadeiras expectativas de sa-tisfação intrínseca.

É nesse estado de insatisfação generaliza-da, tanto por parte das organizações que nãose sentem confiantes quanto ao desempenhodo seu pessoal, quanto por parte dos empre-gados que não se acreditam suficientementereconhecidos ou recompensados por parte daempresa, que se torna possível questionar osprocedimentos tradicionais em administraçãode pessoal.

O sucesso profissional que é efetivado pormeio de promoções verticais, acompanhadasde maiores recompensas pecuniárias, deve serentendido como uma espécie de condiciona-mento do trabalhador a fatores extrínsecos.Ele tem valor representativo ou simbólico epode desorganizar o processo intrínseco moti-vacional. Como acrescenta Deci: "As atividadesintrinsecamente motivadas são aquelas para asquais não existe recompensa aparente, exceto a ati-

vida de em si mesma. As pessoas demonstram en-gajar-se nessas atividades em seu próprio benefí-cio e não porque elas levem a recompensas extrín-secas. As atividades se tornam um fim em si mes-mas, em lugar de serem um meio para se atingir aum fim. Esta definição é comumente aceita comoconceito de motivação intrínseca e serve, de ma-neira bastante adequada, como operacionalizaçãoda motivação intrtnseca"".

A independência das variáveis estilo decomportamento motivacional e nível hierár-quico ocupado pela pessoa sugere a necessi-dade de ser revista toda uma série de procedi-mentos voltados a progressões na carreira,com freqüência propostos pela maioria dasorganizações. Há estilos que se sentirão bemperfazendo uma carreira ascensional rumo aotopo da organização, mas isso não deve sergeneralizado, como se todas as pessoas pos-suissem as mesmas aspirações quanto às suaspossibilidades de acesso a certos níveis maiselevados.

Um outro aspecto que chama a atenção napesquisa é o fato de não se ter encontrado de-pendência entre características de estilo moti-vacional e o tipo de escolaridade formal dosparticipantes da amostra estudada. Em prin-cípio, a profissão escolhida pelas pessoas de-veria ser um dos meios mais naturais de aten-der a suas grandes aspirações motivacionais.No entanto, verifica-se nas empresas brasilei-ras uma alta freqüência de pessoas que de-sempenham atividades profissionais que na-da têm a ver com a sua escolaridade formal.Isso sugere que o título universitário talvezseja valorizado por elas como um fim em simesmo, independente da especialidade e desua função instrumental para a realizaçãopessoal em determinada profissão. Mas podetambém estar encobrindo uma profunda faltade sincronia entre o sistema de ensino e as ne-cessidades da estrutura produtiva, tanto emtermos de qualificação, quanto do número deprofissionais em cada especialidade. Não sepode daí deduzir que o erro na escolha deuma profissão a transforme, necessariamente,em fator de contra-satisfação motivacional.Mas, com maior freqüência do que se imagi-na, a profissão pode estar representando umdos obstáculos que se interpõem entre as as-pirações interiores das pessoas e sua contínuabusca de satisfação. E isso pode, finalmente,ser mais uma das causas da crise motivacio-nal observada tão amiúde no ambiente dasorganizações.

Foi também pesquisada a hipótese de de-pendência entre as variáveis idade e estilo decomportamento motivacional. Numa ampli-tude de idades que variava de 20 a 60 anos,

CARACTERÍSTICAS MOTIVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRASRAE

imagem ou o eu ideal, experimentando-se, assim,uma perda de auto-estima que resulta num au-mento de agressão contra nós mesmos (freqüente-mente projetada nos outros sob forma de culpa),sentimentos de culpa ou resseniimenios'": Por-tanto, a carreira que o indivíduo planejou parasi mesmo, ao longo de vários anos, tem muitoa ver com aquilo que ele elegeu como idealpara si. Sem a percepção clara desse delinea-mento, o próprio indivíduo pode traçar seucaminho rumo à desmotivação.

Finalizando os estudos de dependência en-tre variáveis, não foi possível optar pela hipó-tese que comprovasse uma ligação necessáriaentre características motivacionais e sexo paraos sujeitos estudados na pesquisa. Assim sen-do, pode-se concluir que tanto os homensquanto as mulheres que trabalham nas em-presas brasileiras têm, aproximadamente, asmesmas características de comportamentomotivacional. Com isso, surge também a pre-ocupação em se reconsiderarem alguns pré-julgamentos que norteiam a contratação e oaproveitamento das pessoas do sexo femininoem situações de trabalho. A simples crença deque as mulheres não estão aptas a desempe-nhar determinadas tarefas pode estar se cons-tituindo em situação de contra-satisfação mo-tivacional no trabalho para elas.

não foi encontrada ligação necessária entre es-ses dois aspectos. Isso sugere que as pessoasestudadas não estão apresentando um tipo es-pecífico de orientação motivacional a cada fai-xa etária diferente, não havendo um perfilmotivacional específico ou particular paracada uma das faixas de idades, que tinhamintervalos de cinco anos.

Essa descoberta reafirma a tese da invari-ância das características comportamentais aolongo da vida de cada pessoa, sendo incorretoacreditar-se em mudanças profundas das ca-racterísticas individuais de personalidadeocorridas com o passar dos anos. Ao assumirque as características principais, que indivi-dualizam a personalidade de cada um, nãomudam, não se está negando ao homem a suacapacidade de adaptar-se. No entanto, é pre-ciso entender que essa adaptação ocorre aonível de modificações mais superficiais e sem-pre a partir da aquiescência de cada um. Issoquer dizer que, para que as modificaçõesocorram, ele está disposto a aparar certasarestas do seu comportamento que o colocamem situações que julga não desejáveis.

Não havendo confirmação da hipótese dedependência entre a idade e as preferênciasmotivacionais, torna-se indispensável rever al-guns procedimentos já consagrados pelo usono tocante ao planejamento de carreira dentrodas empresas. As normas devem ter suficienteflexibilidade para que cada um possa, no de-correr da sua vida de trabalho, ter maior liber-dade de opção quanto ao rumo a tomar. In-galls apresenta um interessante ponto de vistaa esse respeito, propondo: "todos nós temos umautoconceito e uma auto-imagem. Esta é basica-mente a maneira como nós nos vemos. Nós tam-bém projetamos nossas idéias sobre nós mesmos da-quilo que gostaríamos de ser. Esse é o nosso eu ideal.Em virtude da existência desse ego ou eu ideal emcada pessoa, a maioria dos comportamentos huma-nos é orientada para objetivos e propósitos. Quan-do falhamos, abre-se uma lacuna entre nossa auto-

ESTILOS E PREFERÊNCIAS MOTIVACIONAIS

Como não se consegue trabalhar concreta-mente com os desejos e necessidades dos se-res humanos, uma vez que são eminentemen-te internos a cada um, muito se tem procura-do escrever, especialmente sobre os resulta-dos tangíveis do processo motivacional. Acrença simplista de que todas as pessoas bus-cam as mesmas coisas no intuito de satisfazersuas carências motivacionais determinou avalorização de fatores extrínsecos como espe-cialmente perseguidos por todos. Ao se po-rem especialmente em relevo os fatores ex-

16. INGALLS, J. D. The hu-man energy - the criticaifactor for individual and or-ganizations. EUA, Adilson-Wesley Publishers Com-pany, 1976, p.194.

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CARACTERÍSTICAS MOTTVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRAS RAE

Ouadro 3: Ordenação dos fatores motivacionais de Herzberg a partir dos diferentes organizadores docomportamento motivacional

PARTICIPAÇÃO AÇÃO

1. Auto-realização 1. Possibilidade de progresso

2. O trabalho em si 2. Desenvolvimento pessoal

3. Responsabilidade 3. Reconhecimento

4. Desenvolvimento pessoal 4. Responsabilidade

5. Reconhecimento 5. O trabalho em si

6. Possibilidade de progresso 6. Auto-realização

MANUTENÇÃO CONCILIAÇÃO

1. Responsabilidade 1. Possibilidade de progresso

2. Reconhecimento 2. Reconhecimento

3. O trabalho em si 3. Desenvolvimento pessoal

4. Desenvolvimento pessoal 4. Auto-realização

5. Auto-realização 5. Responsabilidade

6. Possibilidade de progresso 6. O trabalho em si

Quadro 4: Ordenação dos fatores de higiene de Herzberg a partir dos diferentes organizadores docomportamento motivacional

PARTICIPAÇÃO AÇÃO

1. Políticas administrativas 1. Salário

2. Competência do supervisor 2. Segurança

3. Status 3. Status

4. Relacionamento interpessoal 4. Políticas administrativas

5. Segurança 5. Competência do supervisor

6. Salário 6. Relacionamento interpessoal

MANUTENÇAO CONCILIAÇÃO

1. Políticas administrativas 1. Salário

2. Relacionamento interpessoal 2. Relacionamento interpessoal

3. Segurança 3. Segurança

4. Competência do supervisor 4. Competência do supervisor

5. Status 5. Status

6. Salário 6. Políticas administrativas

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CARACTERÍSTICAS MOTIVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRASRAE

trínsecos da motivação, um grande númerode pesquisas sobre o assunto passou a enu-merar extensas listas daqueles objetivos moti-vacionais que mais freqüentemente eram per-seguidos por todos. Como conclusão, foi pro-posto que, para se terem empregados motiva-dos, era necessário oferecer indistintamentetais objetivos, que teriam o condão de gerarmaior satisfação motivacional no ambiente detrabalho.

Foi dentro dessa concepção que trabalhostais como os de A. Maslow, D. McGregor e F.Herzberg" gozaram de grande prestígio e ti-veram a mais ampla divulgação e aceitação.Os dois primeiros preocuparam-se especial-mente em ordenar a seqüência de apareci-mento e valorização dos objetivos motivacio-nais, enquanto Herzberg apresenta um enfo-que já mais diferenciado, separando esses fa-tores em dois tipos distintos.

A pesquisa de Herzberg levada a efeito emempresas americanas, especialmente na TexasInstruments, habilitou-o a afirmar que quali-tativamente existem dois tipos de fatores ouobjetivos motivacionais. No primeiro grupo,estão os fatores que ele chamou "motivacio-nais". Nesse caso, quando o fator está presen-te, oferece grande satisfação motivacional. Nosegundo grupo, estão os fatores que ele deno-minou "higiênicos" que, quando presentes,não trazem satisfação, mas, quando ausentes,determinam grande insatisfação. Como essesfatores são diferentes, sendo os primeiros deordem intrínseca e os segundos de ordem ex-trínseca ao indivíduo, o autor acaba por con-cluir que o contrário de satisfação não é insa-tisfação, mas nenhuma satisfação e o contrá-rio de insatisfação não é satisfação, mas ne-nhuma insatisfação. Para Herzberg, os fatoresextrínsecos ao indivíduo não o motivam, ape-nas previnem a sua insatisfação. A empresadeverá garantir os fatores de higiene e, então,oferecer os fatores de motivação, caso queiracontar com contribuintes realmente satisfeitose motivados.

Embora os estudos de comprovação da hi-pótese de dependência não tenham permitidoconcluir pela ligação necessária entre as carac-terísticas do estilo de comportamento motiva-cional e a valorização dos dois tipos de fato-res de Herzberg, foi feito um trabalho no sen-tido de se conhecerem as principais preferên-cias motivacionais dos sujeitos estudados napesquisa, tomando por base seu principalnorteador de estilo motivacional.

Mais a título de ilustração qualitativa, oquadro 3 mostra a importância que cada gru-po de pessoas pesquisadas dá aos fatoresmotivacionais, reunindo-as a partir da prin-

cipal orientação de comportamento motiva-cional.

Como se pode observar, cada diferentenorteador, posicionado como primeiro estilo,determina uma diferente ordem de preferên-cia por determinados objetivos motivacionais.Essa ordenação parece poder ser explicada namedida em que seja confrontada com as ca-racterísticas que descrevem cada estilo decomportamento motivacional.

O mesmo pode ser verificado quando fo-ram priorizados os fatores de higiene dentrodas quatro subdivisões formadas pelo primei-ro organizador do comportamento motivacio-nal. Isso quer dizer que alguns dos estilos sesentem mais freqüentemente insatisfeitos pelaausência de uns e não de outros fatores ex-trínsecos. Cada fator de higiene, portanto,tem valor diferente, conforme o perfil motiva-cional da pessoa estudada (ver quadro 4).

Não se está pretendendo que tal tipo de es-tudo ofereça condições de certeza a respeitode que valores sejam mais ou menosimportantes face a um determinado organiza-dor motivacional. Essa maneira de organizartais dados pode ser levada em conta, pelo me-nos como ponto de partida, dentre inúmerosfatores que podem colaborar ou impedirmaiores níveis de satisfação ou frustração mo-tivacional. O importante também é considerarque o estilo de comportamento motivacionalpode inclinar, com maior freqüência, os indi-víduos à busca de uns e não de outros fatores.

CONCLUSÕESSob o ponto de vista concreto, não tem sido

fácil aceitar que, praticamente, nada se possafazer para motivar ou administrar a motiva-ção dos outros. Esperou-se muito das ciênciasdo comportamento em termos dos recursosque elas poderiam fornecer para suavizar osentimento de impotência pessoal face a talimpossibilidade.

Bastante numerosos foram os enfoques teó-ricos que ofereceram esperanças de se conse-guir intervir no curso do comportamento daspessoas em geral. Enquanto teorias, essespontos de vista obtiveram grande sucesso epopularidade e puderam contar com um vo-lumoso número de adeptos. Assim sendo, énatural que muito se espere de uma pesquisaempírica, feita a respeito de motivação, nosentido de que ela possa trazer recomenda-ções práticas sobre como se conseguir empre-gados mais produtivos e, particularmente,mais dóceis aos objetivos organizacionais.

Os dados colhidos e as possíveis interpre-tações que eles permitem frustram, pelo me-

17. MASLOW, A.H. Towardsa psychology of being. EUA,Litton Educational Publis-hing, Inc., 1968 (2a. ed.);McGREGOR, D. Motivação e~iderança. São Paulo, Brasi-hense, 1966; HERZBERG, F.;MAUSNER, B. & SNYDER-MAN, B. Motivation to Work.New York, John Wiley &Sons, Inc., 1959.

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CARACTERiSTICAS MOTIVACIONAIS NAS EMPRESAS BRASILEIRAS RAE

18. MINARIK, E. MotivationindividueI/e, c/é du succêsde /'entreprise. Paris, Leseditions d'organisation,1987, p.30.

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nos em parte, aquelas expectativas de tipomais imediatista. Exceto no caso da depen-dência evidenciada entre características docomportamento motivacional e a área de tra-balho, todos os demais estudos que procura-ram encontrar a ligação necessária entre va-riáveis individuais e extra-individuais foraminconclusivos. Portanto, não é justo afirmar-seque determinadas circunstâncias, alheias ousituadas fora do próprio indivíduo, sejam ca-pazes de influenciar o aumento ou diminui-ção do seu nível de satisfação motivacional.Embora não se tenha atendido às esperançasdaqueles que pensavam resolver todas assuas dúvidas a respeito de como "funcionam"as pessoas, um grande passo parece ter sidodado, no entanto.

A descoberta da independência e da auto-nomia do comportamento motivacional nãorepresenta que se tenha voltado ao ponto departida no tocante ao conhecimento da psico-logia dos seres humanos; muito pelo contrá-rio. Essa descoberta chega oportunamente,num momento em que as crenças ingênuasnos mitos criados a respeito de como seriamotivar pessoas deixam claras e evidentessuas fraquezas. Os estudos superficiais e sim-plistas a respeito de um ser humano abstraídoda sua realidade existencial contribuirampara uma visão não autêntica de um ser hu-mano desintegrado.

Diante de tudo isso é que se pode entendercomo o homem foi se deixando desmotivar,perdendo o seu significado diante da vida detrabalho e diante da sua própria vida pessoal.Como não foi possível entender os sintomas,nem as doenças causadas pela desmotivação,os remédios utilizados pelas teorias adminis-trativas e organizacionais se mostraram desas-trosos. Tais enfoques acentuaram ainda maisas disfunções do comportamento humano etomaram crônicas agudas crises de desmotí-vação. Não tardou, portanto, que se passasse aadmitir como normal o fato de que não se pre-cisa estar motivado para trabalhar, uma vezque do trabalho não se pode esperar felicidadepara o ser humano. Apesar de se reconhecerque foram incontáveis os enganos cometidosem nome da tentativa de se conhecer o verda-deiro significado da motivação, sempre have-rá oportunidade de se recomeçar a caminhadae isso não depende só de cada um isolada-mente, mas também de todos ao mesmo tem-po. Isso deverá necessariamente implicar noconhecimento do verdadeiro mundo interiorde cada pessoa, seus sonhos, esperanças e an-siedades, o que ultrapassa as barreiras pura-mente técnicas para mergulhar numa verda-deira filosofiade gestão administrativa.

Mais cedo ou mais tarde, as organizaçõesque pretenderem aproveitar melhor a fontede sinergia motivacional da sua mão-de-obraprecisarão abandonar as rígidas propostas demedidas administrativas "manualescas" e im-pessoais. Isso implicará na preparação e nodesenvolvimento das habilidades interpes-soais desde o mais alto administrador até osupervisor de primeira linha. Será, então, ne-cessário adotar princípios administrativos eorganizacionais que se sobressaiam por suaflexibilidade.

Em verdade, parece que não se podendomotivar ninguém, o que resta a ser feito é fa-cilitar o livre curso da energia motivacionalcontida no interior de cada pessoa. A maiorpreocupação se desloca do que fazer paramotivar empregados para o que fazer paranão os frustrar ou desmotivar. Dentro desseprocesso, cada um, seja lá quem for, deveparticipar ativamente da adequação entresua vida pessoal e sua vida de trabalho, har-monizando esses dois aspectos de forma arestituir ao trabalhador a unidade indivisí-vel que é a sua personalidade integral. Tal-vez seja isso que Minarik pretenda transmi-tir ao propor seu conceito de individualismocriativo: "A base de toda motivação pessoal éum potencial global que varia de indivíduo paraindivíduo. É, portanto, um individualismo cria-tivo. Ele está determinado tanto pelas predispo-sições hereditárias como pela educação e o desen-volvimento.

O potencial é, então, ao mesmo tempo, um dome uma aquisição. (...)

A pessoa que possua tal aptidão gostará de uti-lizá-la. Esse 'desejo natural' é vivido como um es-tado afetivo intenso e estimulante. É a motivaçãointerior">.

Embora ainda não se esteja muito habitua-do com esse tipo de enfoque, é preciso consi-derá-lo corajosamente, mesmo que seja neces-sário chegar às suas últimas conseqüências,que podem implicar no replanejamento orga-nizacional do tipo "individualização de car-gos", que parte do aproveitamento de apti-dões e interesses pessoais. E importante quese abandonem as esperanças de que as pesso-as mudem para servir ao trabalho. Tudo mu-da na empresa, menos as pessoas.

Quando se conseguem condições organiza-cionais que facilitem o livre curso da forçamotivacional interior, ela impelirá cada indi-víduo a utilizar mais plenamente suas apti-dões. Uma vez bloqueada a motivação pelasrestrições do ambiente de trabalho, os senti-mentos de frustração serão enormes. Esse pa-rece ser o grande desafio da administração depessoal para a década que se inicia!O