CARACTERIZAÇÃO OCEANOGRÁFICA E ......Baia Norte Baia Sul Rio dos Defuntos Rio Tavares Saco dos...

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000. 11 CARACTERIZAÇÃO OCEANOGRÁFICA E BIOGEOQUÍMICA DOS ESTUÁRIOS DOS RIOS TAVARES E DEFUNTOS, RESERVA EXTRATIVISTA DE PIRAJUBAÉ, FLORIANÓPOLIS, SC SCHETTINI, C.A.F.; PEREIRA Fo., J. & L. SPILLERE CTTMar/UNIVALI – Cx.P. 360 - Itajaí, SC, 88302-202 RESUMO Este artigo apresenta uma caracterização preliminar das condições oceanográficas e biogeoquímicas dos estuários dos rios Tavares (ERT) e Defuntos (ERD), localizados no Saco dos Limões, Reserva Extrativista de Pirajubaé, Florianópolis, SC. Nos dias 30 de junho e 1 de julho de 2000 foram realizadas campanhas de coleta de dados em cada estuário durante ciclos completos de maré, 13 horas, sob condição de maré de sizígia. Nestas campanhas foram monitorados: velocidade e direção de corrente, salinidade, temperatura, material particulado em suspensão (MPS), pH e oxigênio dissolvido, e concentração de nutrientes inorgânicos dissolvidos (amônio, nitrito, nitrato, fosfato e silício). Apesar de estarem distantes menos de 1 km, os estuários apre- sentaram significativas diferenças na variação intramareal dos parâmetros amostrados. Os parâmetros observados no ERT apresentaram maior coerência com as fases de enchente e vazante de maré, ao passo que no ERD as variações apresentaram padrões mais complexos. Em termos de transporte residual, observou-se que o ERT exporta sedimentos e nutrientes para o Saco dos Limões enquanto o ERD importa sedimentos, porém exporta nutrientes. Além da influên- cia principal da maré astronômica semi-diurna sobre os estuários, seiches também desempenham papel importante, apresentando estes períodos entre 1 e 2 horas. Palavras-chave: estuários, Santa Catarina, Florianópolis, Pirajubaé, Rio Tavares, Rio dos Defuntos. OCEANOGRAPHIC AND BIOGEOCHEMICAL CHARACTERIZATION OF TAVARES AND DEFUNTOS RIVERS ESTUARIES, PIRAJUBAÉ EXTRACTIVIST RESERVE, FLORIANÓPOLIS, SC ABSTRACT This paper presents a preliminary assessment on the oceanographic and biogeochemical characteristics of the Tavares River (ERT) and Defuntos River (ERD) estuaries, located in the Limões Bight, Pirajubaé Extractivist Reserve, Florianópolis, SC. Field surveys were carried out in the estuaries at June 30 th on July 1 st , 2000, along complete tidal cycles, 13 hours, under spring tide condition. At every survey the follow parameters were monitored: current speed and direction, salinity, temperature, particulate suspended matter (PSM), pH, dissolved oxygen, and inorganic dissolved nutrients concentration (ammonium, nitrite, nitrate, phosphate and silicon). In spite of being close one another less than 1 km, the estuaries showed considerably differences in the intra-tidal variation of the monitored parameters. The parameters in the ERT showed good coherence with flood and ebb tidal phases, meanwhile in the ERD they showed more complex pattern. In terms of net transport, the ERT exports PSM and nutrients towards Limões bight, and the ERD imports PSM though exports nutrients. Beside the major influence of the astronomical semi-diurnal tide, seiches are also important to these estuaries. The main seiches periods ranged between 1 and 2 hours. Keywords: estuaries, Santa Catarina, Florianópolis, Pirajubaé, Tavares River, Defuntos River.

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000.

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CARACTERIZAÇÃO OCEANOGRÁFICA E BIOGEOQUÍMICADOS ESTUÁRIOS DOS RIOS TAVARES E DEFUNTOS,

RESERVA EXTRATIVISTA DE PIRAJUBAÉ,FLORIANÓPOLIS, SC

SCHETTINI, C.A.F.; PEREIRA Fo., J. & L. SPILLERE

CTTMar/UNIVALI – Cx.P. 360 - Itajaí, SC, 88302-202

RESUMO

Este artigo apresenta uma caracterização preliminar das condições oceanográficas ebiogeoquímicas dos estuários dos rios Tavares (ERT) e Defuntos (ERD), localizados no Saco dosLimões, Reserva Extrativista de Pirajubaé, Florianópolis, SC. Nos dias 30 de junho e 1 de julho de2000 foram realizadas campanhas de coleta de dados em cada estuário durante ciclos completosde maré, 13 horas, sob condição de maré de sizígia. Nestas campanhas foram monitorados:velocidade e direção de corrente, salinidade, temperatura, material particulado em suspensão(MPS), pH e oxigênio dissolvido, e concentração de nutrientes inorgânicos dissolvidos (amônio,nitrito, nitrato, fosfato e silício). Apesar de estarem distantes menos de 1 km, os estuários apre-sentaram significativas diferenças na variação intramareal dos parâmetros amostrados. Osparâmetros observados no ERT apresentaram maior coerência com as fases de enchente evazante de maré, ao passo que no ERD as variações apresentaram padrões mais complexos. Emtermos de transporte residual, observou-se que o ERT exporta sedimentos e nutrientes para oSaco dos Limões enquanto o ERD importa sedimentos, porém exporta nutrientes. Além da influên-cia principal da maré astronômica semi-diurna sobre os estuários, seiches também desempenhampapel importante, apresentando estes períodos entre 1 e 2 horas.

Palavras-chave: estuários, Santa Catarina, Florianópolis, Pirajubaé, Rio Tavares, Rio dos Defuntos.

OCEANOGRAPHIC AND BIOGEOCHEMICAL CHARACTERIZATION OFTAVARES AND DEFUNTOS RIVERS ESTUARIES, PIRAJUBAÉ

EXTRACTIVIST RESERVE, FLORIANÓPOLIS, SC

ABSTRACT

This paper presents a preliminary assessment on the oceanographic and biogeochemicalcharacteristics of the Tavares River (ERT) and Defuntos River (ERD) estuaries, located in theLimões Bight, Pirajubaé Extractivist Reserve, Florianópolis, SC. Field surveys were carried out inthe estuaries at June 30th on July 1st, 2000, along complete tidal cycles, 13 hours, under spring tidecondition. At every survey the follow parameters were monitored: current speed and direction,salinity, temperature, particulate suspended matter (PSM), pH, dissolved oxygen, and inorganicdissolved nutrients concentration (ammonium, nitrite, nitrate, phosphate and silicon). In spite ofbeing close one another less than 1 km, the estuaries showed considerably differences in theintra-tidal variation of the monitored parameters. The parameters in the ERT showed good coherencewith flood and ebb tidal phases, meanwhile in the ERD they showed more complex pattern. Interms of net transport, the ERT exports PSM and nutrients towards Limões bight, and the ERDimports PSM though exports nutrients. Beside the major influence of the astronomical semi-diurnaltide, seiches are also important to these estuaries. The main seiches periods ranged between 1and 2 hours.

Keywords: estuaries, Santa Catarina, Florianópolis, Pirajubaé, Tavares River, Defuntos River.

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

INTRODUÇÃO

Estuários são ambientes aquáticos cos-teiros onde ocorre a diluição mensurável da águamarinha pela água doce proveniente da drena-gem continental, tendo uma livre conexão como mar aberto (Cameron & Pritchard, 1963), comseu limite continental determinado pelo limitesuperior da penetração da onda de maré(Fairbridge, 1980), sustentando espécies bio-lógicas eurihalinas pelo menos em parte de seuciclo de vida (Perillo, 1995). Estes ambientesapresentam grande diversidade fisiográfica, bemcomo grande diversidade de padrões de mistu-ra e condições hidrodinâmicas. Ageomorfologia destes ambientes associadacom os regimes de maré e de descarga fluvialgeram padrões de circulação distintos paracada estuário, podendo estes atuar como fil-tros ou como exportadores de matéria para azona costeira adjacente (Shubel & Kennedy,1984). Alterações dos condicionantes da cir-culação estuarina podem acarretar mudançasno comportamento de um determinado estuá-rio em relação ao balanço de massa de quanti-dades escalares.

Decorrente da concentração do desen-volvimento humano nas zonas costeiras, estu-ários são ambientes onde é comum observarimpactos ambientais de diversas naturezas.Estes impactos variam desde o lançamento deefluentes domésticos, agrícolas ou industriais,até a alteração da morfologia da bacia estuarinapara que esta se adeqüe às necessidades hu-manas, tais como dragagens, aterros e retifi-cações de canais. O sistema estuarino das ba-ías Norte e Sul em Florianópolis (Figura 1) éum caso típico de impactos ambientais gera-dos pelo crescimento urbano. Diversos peque-nos estuários fluem para as baías, sendo quepor apresentarem dimensões reduzidas rece-bem pouca ou nenhuma atenção no que serefere a conservação ambiental. Muitas vezesestes ambientes são simplesmente canaliza-dos e sua vegetação marginal derrubada parafins de urbanização.

Em 1998 foi iniciada a obra de aterro hi-dráulico da Baía Sul para a implementação daVia Expressa Sul, o qual alterou significativa-mente a morfologia do Saco dos Limões emtoda sua orla leste. Na região sul do saco estálocalizada a Reserva Extrativista de Pirajubaé,que inclui uma região de baixios e manguezal.Cruzando o maguezal há alguns estuários, sen-do o maior o estuário do Rio Tavares, que maisou menos delimita o início do manguezal à les-te. Os outros estuários são menores e bastan-te parecidos entre si. O presente trabalho ob-jetiva fornecer uma caracterização oceanográ-fica dos estuários do Rio Tavares e do Rio dosDefuntos, sendo este último representativo dosdemais estuários.

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho é baseado em dados físi-cos e biogeoquímicos amostrados próximos dadesembocadura nos estuários dos rios Tavares(ERT) e dos Defuntos (ERD; Figura 1), em cam-panhas de coleta em dias sucessivos abran-gendo um ciclo completo de maré cada (13horas). As campanhas foram realizadas nosdias 30 de junho e 1 de julho de 2000 sob con-dição de maré de sizígia. No estuário do RioTavares a campanha iniciou às 8 e encerrou às20 horas, e no estuário do Rio dos Defuntos,iniciou às 9 e encerrou às 21 horas. Duranteestas campanhas foram coletadas informaçõesin situ de nível da água, velocidade e direçãode correntes, salinidade, temperatura, materi-al particulado em suspensão (MPS), oxigêniodissolvido e pH. Amostras de água foramcoletadas para posterior análise em laborató-rio da concentração de nutrientes inorgânicosdissolvidos.

Dados de nível da água foram coletadosa cada 10 minutos com um marégrafo de pres-são RichardBrancker™ TG-205, instalado nopier da Marina Veleiros da Ilha, no limite norte-oeste do Saco dos Limões (Figura 1). Os da-dos de nível de água foram coletados continua-mente a partir das 8:00 horas do dia 30 até às

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23:50 do dia 31. A Figura 2 apresenta a varia-ção do nível da água durante os dias 30 dejunho e 1 de julho, com o período deamostragem em cada estuário em negrito. Emfunção da falta de referência de nível, os dadosforam referenciados ao nível médio de cada diade amostragem. Dados de velocidade e dire-ção de corrente foram obtidos com fundeio deum correntógrafo acústico Falmouth™ 3D-ACM© próximo à desembocadura nos estuári-os. O correntógrafo aquisitou dados à 0,5 mabaixo da supefície, com médias de 2 minutoscom taxas de aquisição de 5,5 Hz. Ocorrentógrafo aquisitou também dados de tem-peratura e turbidez com um turbidímetro deretroespalhamento ótico SeaPoint™. Oturbidímetro foi calibrado para conversão do si-nal para MPS para o estuário do Rio Itajaí-açu(Schettini & D’Aquino, 1998), e os valores obti-dos foram interpretados como aproximação nafalta de uma curva específica para estes estu-ários.

No estuário do Rio Tavares a salinidadefoi obtida em perfis verticais a cada hora comuma sonda tipo CTD SensorData™ SD202 pró-

ximo ao local do fundeio do correntógrafo. Noestuário do Rio dos Defuntos o CTD ficou fixona estrutura de proteção do correntógrafo,aquisitando dados à cada 10 minutos. Concen-tração de oxigênio dissolvido e pH foramcoletados a cada hora com uma sondamultiparâmetro Horiba™ U10. Amostras deágua de superfície foram coletadas para deter-minação de nutrientes inorgânicos dissolvidosem laboratório. Logo após a coleta, as amos-tras de água foram filtradas com filtrosWhatman® GF/F, divididas em alíquotas e con-geladas para posterior análise. Foram determi-nadas as concentrações de amônio (NH

4+),

nitrito mais nitrato (NO2

- + NO3

-), os quais so-mados fornecem o nitrogênio inorgânico dis-solvido (NID), fosfato (PO

43-) e silício (Si). Para

as determinações foram utilizados métodoscolorimétricos clássicos adaptados deStrickland & Parsons (1972).

Em função da descida da maré e da pre-sença do plano intermareal que impossibilitouo acesso ao ponto de amostragem no ERD, ascoletas de amostras de água e de parâmetroscoletados com a sonda multiparâmetro Horiba

Ilha de Florianópolis

Continente

Oceano Atlântico

Baia Norte

Baia Sul

Rio dosDefuntos Rio

Tavares

Saco dos Limões

NEstações de Coleta

1 km

Manguezal

M

A B

Figura 1: Localização dos estuários do Rio Tavares e do Rio dos Defundos. Em A, o ponto indicado com “M” é o localonde foi instalado o marégrafo. Em B, os pontos indicam as estações de amostragem.

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

cessaram às 18 horas, porém o correntógrafoe o ctd permaneceram até o dia seguinte.

Os dados de velocidade e direção decorrente foram reduzidos para fornecer a velo-cidade longitudinal ao canal, convencionandoque valores positivos representam correntes paramontante, e valores negativos para jusante. Osdados de corrente foram posteriormente redu-zidos para valores horários com médias de 10minutos a partir de cada hora cheia. Estes va-lores foram utilizados para estimar o transpor-te de MPS e nutrientes dissolvidos pelo produ-to simples, fornecendo o transporte em quilo-gramas por metro quadrado de seção transver-sal. O transporte residual foi obtido pelapromediação temporal de todos os valores. Osdados de nível de água foram analisadosespectralmente para identificar as principaisperíodos de oscilação presentes no sinal. Foiutilizada a rotina padrão do aplicativo MATLAB(MathWorks Inc.TM) ‘spectrum’, a qual utiliza operiodograma promediado de Welch e janelamóvel Hanning de 256 pontos, após a remoçãode tendência da série.

RESULTADOS

Os resultados das campanhas de cole-ta de dados oceanográficos nos ERT e ERD

estão sumariados nas Tabelas 1 e 2 em ter-mos de média, desvio padrão, máximo e míni-mo, com o transporte residual para um ciclode maré para o MPS e nutrientes inorgânicosdissolvidos. As Figuras 3 e 4 apresentam asvariações temporais de nível de água, velocida-de de corrente longitudinal, salinidade, tempe-ratura e MPS, e OD, pH, NH

4+, NO

2- + NO

3-,

NID, PO4

3- e silício, respectivamente, para oestuário do Rio Tavares (ERT). As Figuras 6 e7 apresentam os mesmos parâmetros para oestuário do Rio dos Defuntos (ERD).

Nível da água

A variação de maré foi de 1,14 e 1,21 mnos dias 30 de junho e 1 de julho de 2000,respectivamente, sendo representativos de con-dições extremas de sizígia. A baixamar no dia30 ocorreu às 9:00, com preamar às 14:30, enova baixamar às 20:00 (Figura 4A). No dia 31a primeira baixamar ocorreu às 9:40, com pre-amar próxima às 15:00, e com a segundabaixamar às 21:00 (Figura 5A). Em ambos osdias a segunda preamar foi 0,30 m acima daprimeira, em função da natureza mista da marésemi-diurna regional (Schettini et al., 1996). Avariação da maré apresentou-se bastante si-métrica entre enchente e vazante.

Figura 2: Variação do nível da água nos dias 30 de junho e 1 de julho, com resolução temporal de 10 minutos. Osperíodos onde a linha está em negrito representam os períodos de coleta de dados, sendo o primeiro no estuário doRio Tavares e o segundo no estuário do Rio dos Defuntos.

8 12 16 20 0 4 8 12 16 20 0-0.75

-0.50

-0.25

0.00

0.25

0.50

0.75

30 Junho 1 Julho

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Corrente longitudinal

Considerando os dados reduzidos pelasmédias de 10 minutos a cada hora cheia, avelocidade de corrente média foi bastante si-milar em ambos os estuários, em torno de- 0,03 m.s-1. Este valor próximo de zero indicaque a amostragem foi eficiente em abrangerciclos completos de maré, validando as esti-

mativas de transporte. As velocidades máxi-mas, por outro lado, foram bem distintas, sen-do os valores observados no ERT 0,15 m.s-1

superiores aos observados no ERD, tanto paraas correntes de enchente quanto de vazante.A magnitude das correntes de enchente e va-zante apresentaram-se praticamente iguais emambos os estuários, a despeito da desigualda-de semi-diurna da maré.

Tabela 1: Sumário dos parâmetros medidos e analisados do estuário do Rio Tavares. V.C.: velocidade de corrente(média de 10 minutos para cada hora cheia); MPS: material particulado em suspensão; O.D.: oxigênio dissolvido;NH4

+: amônia; NO2- + NO3

-: nitrato e nitrito; NID: nitrogênio inorgânico dissolvido; PO43-: fosfato; Si: silício; D.P.: desvio

padrão; T.R.: transporte residual (negativo significa saída, e positivo entrada, e o mesmo vale para a velocidade).

Tabela 2: Sumário dos parâmetros medidos e analisados do estuário do Rio dos Defuntos. V.C.: velocidade decorrente (média de 10 minutos para cada hora cheia); MPS: material particulado em suspensão; O.D.: oxigêniodissolvido; NH4

+: amônia; NO2- + NO3

-: nitrato e nitrito; NID: nitrogênio inorgânico dissolvido; PO43-: fosfato; Si: silício;

D.P.: desvio padrão; T.R.: transporte residual (negativo significa saída, e positivo entrada, e o mesmo vale para avelocidade).

Parâmetro Média e D.P. Mínimo Máximo T.R.(kg.m-2.ciclo-1)

V.C. (m.s-1) -0,03 ± 0,28 -0,35 0,37Salinidade (‰) 30,1 ± 4,6 20,0 34,8Temperatura (°C) 19,3 ± 0,3 18,8 19,8MPS (mg.l-1) 36 ± 24 11 111 -11O.D. (mg.l-1) 7,9 ± 1,6 5,4 9,6pH 7,6 ± 0,3 7,2 8,0NH4

+ (µMol) 14,6 ± 9,2 4,6 35,5 -41,2 × 10-3

NO2- + NO3

- (µMol) 5,1 ± 4,0 1,5 13,3 -22,9 × 10-3

NID (µMol) 19,7 ± 12,4 6,1 42,7 -64,0 × 10-3

PO43-

(µMol) 0,58 ± 0,30 0,29 1,36 -5,0 × 10-3

Si (µMol) 33,9 ± 22,8 9,7 69,9 -222,8 × 10-3

Parâmetro Média e D.P. Mínimo Máximo T.R.(kg.m-2.ciclo-1)

V.C. (m.s-1) -0,04 ± 0,12 -0,22 0,23Salinidade (‰) 27,5 ± 1,8 23,1 30,5Temperatura (°C) 19,8 ± 1,0 17,8 21,8MPS (mg.l-1) 46 ± 37 8 173 +5,0O.D. (mg.l-1) 7,4 ± 1,9 3,9 11,0pH 7,6 ± 0,3 7,0 8,1NH4

+ (µMol) 13,6 ± 3,9 8,7 19,3 -9,9 × 10-3

NO2- + NO3

- (µMol) 5,1 ± 1,4 3,3 7,8 -1,0 × 10-3

NID (µMol) 18,7 ± 4,8 12,3 26,0 -10,9 × 10-3

PO43-

(µMol) 0,67 ± 0,19 0,52 1,03 -1,7 × 10-3

Si (µMol) 52,3 ± 11,8 33,2 67,9 -94,0 × 10-3

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

Figura 3: Variação temporal dos parâmetros coletados in situ no estuário do Rio Tavares. A: nível da água, resoluçãotemporal (rt) = 10 min; B: velocidade de corrente, negativa significa escoamento para jusante, rt = 2 min; C: salinidade,rt = 1 hora; D: temperatura, rt = 2 min; e E: material particulado em suspensão, rt = 2 min.

-0.75

-0.50

-0.25

0.00

0.25

0.50

0.75

22

24

26

28

30

32

18.9

19.2

19.5

19.8

20.1

-0.75

-0.50

-0.25

0.00

0.25

0.50

0.75

8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 200

20

40

60

80

100

120

A

B

C

D

E

Horas (30 de junho de 2000)

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Figura 4: Variação temporal dos parâmetros biogeoquímicos no estuário do Rio Tavares. A: pH; B: oxigênio dissolvi-do; C: nitrogênio inorgânico dissolvido (NID), amônio (NH4

+) e nitrito + nitrato (NO2- + NO3

-); D: fosfato (PO43-); e E:

silicato (Si).

7.2

7.4

7.6

7.8

8.0

8.2

6

7

8

9

10

20

30

40

0.3

0.6

0.9

1.2

8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 200

20

40

60

A

B

C

D

E

Horas (30 de junho de 2000)

NIDNHNO + NO

4+

-2 3-

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

Figura 5: Variação temporal dos parâmetros coletados ín situ no estuário do Rio dos Defuntos. A: nível da água,resolução temporal (rt) = 10 min; B: velocidade de corrente, negativa significa escoamento para jusante, rt = 2 min;C: salinidade, rt = 10 min; D: temperatura, rt = 10 min; e E: material particulado em suspensão, rt = 2 min.

-0.50

-0.25

0.00

0.25

0.50

0.75

-0.15

0.00

0.15

0.30

24

26

28

30

18

19

20

21

22

9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 210

50

100

150

Horas (1 de julho de 2000)

A

B

C

D

E

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Figura 6: Variação temporal dos parâmetros biogeoquímicos no estuário do Rio dos Defuntos. A: pH; B: oxigêniodissolvido; C: nitrogênio inorgânico dissolvido (NID), amônio (NH4

+) e nitrito + nitrato (NO2- + NO3

-); D: fosfato (PO43-);

e E: silicato (Si).

7.2

7.5

7.8

8.1

4

6

8

10

5

10

15

20

25

0.6

0.8

1.0

9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 2130

40

50

60

70

Horas (1 de julho de 2000)

NID

A

B

C

D

E

NH

NO + NO4+

-2 3-

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

A variação da velocidade de corrente noERT acompanhou de maneira coerente a varia-ção do nível da água, contudo apresentandouma notável oscilação em torno de 0,20 m.s-1,com período aproximado de 1 hora, tanto noperíodo de enchente quanto que no de vazan-te. Uma outra feição observada foi a aparenteestabilização das velocidades máximas deenchente e vazante, invertendo-se em funçãoda maré, em torno de + 0,50 m.s-1 e - 0,40m.s-1, respectivamente (Figura 3B).

A variação temporal da velocidade decorrente no ERD foi ainda mais peculiar do quea observada no ERD. Até aproximadamente às11:00, a velocidade apresentou-se estável em- 0,08 m.s-1, virando e subindo até + 0,25 m.s-

1 até às 11:30, e oscilando a partir de então demaneira similar ao observado no ERT. Contu-do, os picos de oscilação variaram bastante,chegando ao máximo de + 0,35 m.s-1 às 15:20,próximo da preamar. Após a virada da maré acorrente inverteu para vazante, oscilando commenor amplitude em torno de - 0,15 m.s-1 (Fi-gura 5B). Pouco após às 19:00 ocorreu umperíodo de enchente de 10 minutos, com refle-xo também na salinidade, temperatura e MPS.

Salinidade e temperatura

A salinidade média no ERT foi 30,1 ±4,6 ‰, tendo uma variação máxima de 15 ‰,e no ERD a salinidade média foi 27,5 ± 1,8 ‰,com variação menor de 7 ‰. Ambos os estuá-rios apresentaram distribuição vertical homo-gênea. A salinidade apresentou resposta coe-rente com a maré no ERT, com valores míni-mos de 22 ‰ na baixamar, às 9:00 e 10:00,subindo com a elevação da maré até 32 ‰, às11:00, permanecendo estável até às 18:00quando começou a diminuir (Figura 3C). NoERD, em função de que o CTD coletou infor-mações à cada 10 minutos, foi possível verifi-car a variação da salinidade com melhor reso-lução temporal. Durante a baixamar, asalinidade era de 29 ‰, e ao contrário do ob-servado no ERT, ela diminui com a subida damaré até às 14:00, atingindo 23 ‰. A partir

deste ponto observou-se uma rápida elevaçãoaté 31 ‰ às 15:30, e uma nova diminuição,menos intensa do que a observada anteriormen-te, até o fim da campanha (Figura 5C).

A temperatura apresentou valor médioem torno de 19,5 °C em ambos os estuários,com maior amplitude de variação para o ERD,4 °C, enquanto que a variação no ERT foi de 1°C. A temperatura no ERT seguiu o padrão dasalinidade, porém elevando depois e diminuin-do antes que esta. A temperatura permaneceuestável em torno 19 °C do início da campanhaaté às 12:00, subindo a partir de então até às15:00, atingindo o máximo de 19,9 °C, e vol-tando a diminuir até às 19:00, e aparentemen-te estabilizando-se novamente em torno de 19,0°C (Figura 3D). No ERD, a temperatura per-maneceu estável até às 11, em torno de 18 °C,apresentando uma repentina elevação até qua-se 22,0 °C às 11:30, diminuindo a partir de en-tão até às 15:00 e estabilizando até o final dacampanha em torno de 19,8 °C (Figura 5D).

Material particulado em suspensão - MPS

A concentração média de MPS no ERTfoi 36 ± 24 mg.l-1, um pouco menor ao encon-trado no ERD, 46 ± 37 mg.l-1. Os valores míni-mos foram 11 e 8 mg.l-1 e máximos foram 111 e177 mg.l-1, para ERT e ERD, respectivamente.No ERT o MPS permaneceu estabilizado emtorno de 20 mg.l-1 durante a baixamar, subindorepentinamente até mais de 100 mg.l-1 no iní-cio da enchente, às 10:30, porém voltando adiminuir rapidamente pouco tempo após para40 mg.l-1. Próximo às 11:30 houve um novo picono MPS, porém atingindo 60 mg.l-1, e retornandoa descer. Das 12:00 até às 16:30 o MPS per-maneceu baixo, ~ 20 mg.l-1, subindo até 80mg.l-1 no fim da vazante após às 17:00, perma-necendo elevado e com a ocorrência de umpico máximo, pouco antes das 19:00, a partirdo qual diminui para 20 mg.l-1 no final da cam-panha (Figura 3E).

No ERD o MPS também permaneceuestável em torno de 15 mg.l-1 até o início daenchente, onde elevou-se até mais de 150

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000.

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mg.l-1 às 12:00. Durante o período de enchenteo MPS apresentou vários picos de intensidadedecrescente até às 14:00, apresentando a par-tir de então oscilações menores em torno de75 mg.l-1. Pouco a pós o início da vazante, às16:00, o MPS diminuiu rapidamente para 15mg.l-1, permanecendo assim até o final da cam-panha, com exceção de um curto pico às 19:30(Figura 5E).

pH e oxigênio dissolvido – OD

O pH apresentou valores médios prati-camente iguais em ambos os estuários, 7,6 ±0,3, com uma variação um pouco maior no ERD,onde variou de 7,0 até 8,1. Em ambos estuári-os o pH respondeu diretamente à variação demaré, com valores menores na baixamar, au-mentando na preamar. No ERT a variação dopH foi bem similar à da salinidade (Figura 4A).No ERD observou-se um pico imediatamenteapós o início da subida da maré, acima de 8,decaindo após e estabilizando em torno de 7,7(Figura 6A).

O comportamento do O.D. foi bastantesimilar ao observado para o pH. A concentra-ção média de oxigênio dissolvido foi similar emambos os estuários, 7,9 ± 1,6 e 7,4 ± 1,9 paraERT e ERD, respectivamente, com variaçãomais expressiva para o último, de 3,9 até 11,0mg.l-1, enquanto que no ERT variou de 5,4 até9,6 mg.l-1. No ERT o O.D. variou sem mudan-ças bruscas, acompanhando as fases da maré(Figura 4B); no ERD houve também um picomáximo logo no início da subida da maré, al-cançando 11 mg.l-1, diminuindo e estabilizan-do em torno de 8 mg.l-1 depois (Figura 6B).

Nutrientes inorgânicos dissolvidos

Embora os nutrientes inorgânicos dis-solvidos tenham apresentados valores médiosdentro de uma mesma ordem de grandeza emambos os estuários, as variações máximas detodos foram maiores no ERT. A concentraçãomédia de amônio (NH

4+) foi 14,6 ± 9,2 µM, vari-

ando de 4,6 até 35,5 µM no ERT, e 13,6 ± 3,9

µM, variando de 8,7 até 19,3 µM no ERD. Aconcentração média da soma do nitrito e nitra-to (NO

2- + NO

3-) foi 5,1 ± 4,0 µM, variando de

1,5 até 13,3 µM no ERT, e 5,1 ± 1,4 µM, varian-do de 3,3 até 7,8 µM no ERD. A concentraçãomédia de fosfato (PO

43-) foi 0,58 ± 0,30 µM,

variando de 0,29 até 1,36 µM no ERT, e 0,67 ±0,19 µM, variando de 0,52 até 1,03 µM no ERD.A concentração média de silício (Si) foi 33,9±22,8 µM, variando de 9,7 até 69,9 µM no ERT,e 52,3 ± 11,8 µM, variando de 33,2 até 67,9 µMno ERD.

O NID no ERT apresentou valores emtorno de 35 µM durante a baixamar, com umpico de máxima às 11:00, alcançando quase43 µM, e depois decaindo para valores em tor-no de 10 µM, e apresentando picos menoresàs 15:00 e às 18:00 de 20 µM. A variação doNID foi determinada diretamente pela concen-tração de NH

4+. O NO

2- + NO

3- apresentaram o

maior valor às 9:00, ~ 13 µM, e depois decain-do e permanecendo em torno de 1,5 µM até às17:00, e voltando a subir com a descida da maré(Figura 4C). No ERD a variação do NID e doNH

4+ foi mais ou menos similar, porém com o

pico de máxima ocorrendo com uma hora deatraso de fase em relação ao observado no ERT,às 13:00. O NO

2- + NO

3- apresentou valores

baixo na baixamar, e subindo até seu valormáximo durante o pico de NH

4+, e depois

retornando a cair para os níveis encontradosna baixamar (Figura 6C).

O PO4

3- em ambos os estuários apre-sentou os valores máximos na baixamar e noinício da enchente, às 9:00 no ERT, e às 10:00e 11:00 no ERD, e depois decaindo e perma-necendo em um patamar de 0,4 µM até o fimdas campanhas (Figuras 3D e 5D). O Si noERT apresentou um comportamento diretamen-te inverso ao da salinidade, com pico máximoobservado às 9:00 na baixamar, e mínimo du-rante o final da enchente até o fim da vazante(Figura 3E). No ERD o comportamento do Sifoi bem mais complexo, sendo que o máximotambém foi observado durante a baixamar, con-tudo não decaindo da mesma maneira como

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

observado no ERT, e apresentando-se bastan-te irregular durante todo o período (Figura 5E).

DISCUSSÃO

Os dois estuários estudados neste tra-balho, apesar de estarem distantes menos de1 km um do outro, apresentaram diferençassignificativas na maior parte dos parâmetrosmonitorados. O comportamento diferenciadoentre eles está relacionado com as caracterís-ticas fisiográficas e hidrológicas de cada siste-ma. O bacia hidrográfica do Rio Tavares apre-senta 27,5 km2, enquanto que a do Rio dosDefuntos apresenta apenas 3,5 km2. Além dasdiferenças de dimensões de suas respectivasbacias, a maior parte da bacia do Rio dos De-funtos está situada em uma região demanguezal, com pouca utilização urbana. Poroutro lado, grande parte da bacia do Rio Tavaresapresenta-se ocupada por aglomerados urba-nos da cidade de Florianópolis e zonasagropecuárias, o que certamente acarreta umamaior carga de efluentes.

O ERT deságua no Saco dos Limões noseu extremo sul, no limite do aterro hidráulico.Ali ainda encontram-se diversos pescadores ehá um canal dragado conectando esta regiãocom as partes mais profundas do saco parapermitir a navegação mesmo durante a marébaixa. Esta conexão faz com que as águas doERT sejam mais efetivamente trocadas a cadaciclo de maré com o saco. No ERD, por outrolado, a circulação durante a baixamar de sizígiafica totalmente restrita pela planície de maréque se prolonga centenas de metros para ointerior do saco. Isto faz com que as trocas deáguas sejam efetivas somente acima de umdeterminado nível.

Um outro aspecto a ser consideradocomo determinante das variações intra-mareaisobservadas em ambos estuários é o fato dedesaguarem em um corpo estuarino maior, nocaso, a Baía Sul. O complexo estuarino dasBaías Norte e Sul recebe o aporte de inúmerospequenos estuários, sendo o maior destes odo Rio Cubatão, na margem continental da Baia

Sul. A hidrodinâmica destes estuários internos,similar ao que ocorreria em estuários desaguan-do diretamente no oceano, é controlada princi-palmente pela descarga fluvial e oscilações demaré. Contudo, um outro aspecto que se tornarelevante nestes ambientes é a oscilação na-tural do corpo receptor. A oscilação natural dosistema, ou seiche, é função da sua extensãohorizontal e profundidade, e ocorre em qual-quer corpo de água restrito. Em função da com-plexidade da gemorfologia da bacia, muitosmodos de oscilação podem estar presentes,e.g., longitudinais e transversais (Pugh, 1987).No registro de nível de água (Figura 2) a oscila-ção mais notável está claramente relacionadacom o sinal semi-diurno, de aproximadamente12 horas, sendo as demais oscilações pratica-mente imperceptíveis. Porém, o espectro depotência do sinal (Figura 7), indica a presençade oscilações de períodos menores tambémassociadas à oscilações de maré astronômi-cas, de 6 e 4 horas de período, bem como os-cilações de períodos menores ainda com pi-cos em 1,92, 1,48, 1,14 e 0,98 horas. Estasúltimas possívelmente são seiches gerados apartir de diversos modos de oscilações natu-rais do complexo de baías.

Embora os seiches sejam pouco notá-veis no sinal de nível de água, o sinal de cor-rentes longitudinais no ERT apresentou umadestacada variação de intensidade com perío-do aproximado de 1 hora (Figura 3B). Esta va-riação de intensidade coincide em período comos picos no espectro de potência (Figura 7),para a região de 1 até 1,5 horas. Porém, a maiordensidade espectral do nível de água está as-sociada à um período de 2 horas. Esta diferen-ça pode ser interpretada pela posição do estu-ário no limite leste da baía, estando assim maissujeito à oscilações laterais, estimadas emtorno de 1 hora a partir dos registros de corren-tes. As oscilações de 2 horas de período tal-vez estejam relacionadas mais diretamente aoeixo longitudinal do complexo de baías, ondeinduziriam maiores amplitudes no estreito ounas barras. Também foram observadas oscila-ções no sinal de velocidade longitudinal no ERD,

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000.

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principalmente durante o período de enchente,porém não tão regulares quanto às observadasno ERT (Figura 5B). Este comportamento pos-sivelmente é resultado da complexidade da cir-culação sobre o plano de maré e no interior domanguezal, onde a pouca profundidade induzà um maior efeito friccional do fundo sobre oescoamento.

A despeito da complexidade do sinal decorrentes no ERT, a salinidade apresentou boacoerência com a variação da maré (Figura 3C).O fato de ocorrer a estabilização do sinal emtorno de 32 ‰ com a enchente possivelmenteestá relacionado com a salinidade média pre-sente no complexo de baías, e a menorsalinidade observada durante os períodos debaixamar associada com efeitos locais próxi-mos da margem do Saco dos Limões e peladiluição causada pelo aporte fluival da bacia doRio Tavares. No ERD a variação da salinidadenão seguiu o mesmo comportamento, onde foiobservado que a salinidade diminuiu com asubida da maré, aumentando somente próxi-

mo da preamar, a partir de então baixando como descida da maré (Figura 5C). Isto pode serinterpretado pela pequena bacia de drenagemque este estuário apresenta, sendo então queas variações da salinidade são mais diretamen-te influenciadas por variações que ocorrem noSaco dos Limões. Considerando a menor am-plitude de variação da salinidade no ERT, e quea menor salinidade observada foi um poucosuperior à mínima observada no ERD, é possí-vel explicar a diminuição desta com a subidada maré considerando que a água que entroudurante a maior parte da fase de enchentecomo sendo da pluma estuarina do ERD dis-persada para oeste durante a baixamar. Estepadrão sugere que durante a condiçãoamostrada, houve uma circulação residual comsentido horário no interior do Saco dos Limões,com deslocamento de leste para oeste na re-gião do plano intermareal defronte aos estuári-os.

A variação da temperatura no ERT foirelativamente discreta ao longo do período ob-

Figura 7: Distribuição de densidade espectral dos dados de nível de água próximo ao estreito de Florianópolis. Osnúmeros indicadores dentro do gráfico estão em horas.

12,20

6,564,06

1,92

1,481,14

0,98

Freqüência (hora )-1

0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,00,010-8

10-6

10-4

10-2

100

102

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

servado, sendo provavelmente causada pelaoscilação térmica diurna, por troca direta coma atmosfera. Por outro lado, o mesmo não foiobservado no ERD. Das 9 até às 11 horas atemperatura permaneceu estável, em torno de18 °C, subindo rapidamente e atingindo seu picomáximo de 22 °C logo no início da enchente, epassando a diminuir e estabilizando (Figura 5D).Durante a baixamar toda o plano de maré esta-va exposto diretamente à radiação solar. Du-rante o período de coleta praticamente não haviacobertura de núvens, o que causou a absorçãode enegia pelo sedimento. A medida que a marésubiu, calor foi transferido para a água de con-tato de enchente, e quando esta passou atra-vés da seção de amostragem refletiu no picode máxima temperatura. Com a subida da marée consequentemente um maior volume de águasobre o plano, este processo deixou de serimportante e provavelmente durante o resto doperíodo a temperatura variou em função de tro-cas diretas com a atmosfera similar ao obser-vado no ERT.

A concentração de MPS no ERT apre-sentou dois picos distintos durante a enchen-te, e outros dois durante a vazante. Em ambosos casos a diferença entre picos foi aproxima-damente 1 hora (Figura 3E). Comparativamen-te, na enchente o primeiro pico foi superior aosegundo, e o contrário foi observado para ospicos de vazante; também, os picos de enchen-te apresentam também menor espraiamentotemporal do que os picos observados de va-zante. Este padrão sugere a existência de duaszonas de maior turbidez associadas com aentrada e saída de água do ERT. Consideran-do a diferença no espraiamento temporal dospicos de enchente e vazante, supõe-se que aorigem do MPS está no interior do estuário.Durante a vazante estas massas de água commaior concentração de MPS são espraiadasna região vizinha à desembocadura formandoa pluma fluvial do ERT, com retorno parcial destematerial durante a enchente. O processo deretorno parcial de massas de água corroboraàs observações de salinidade do ERD, onde adiminuição da salinidade com a subida da maré

seria causada pela pluma estuarina do ERT quenão retornou para este. No ERD, a máximaconcentração de MPS observada logo no iní-cio da enchente após um período inicial de baixaconcentração nas primeiras horas (Figura 5E),é interpretado como efeitos da ação daresuspensão de sedimentos do planointemareal por ondas de vento. A medida que onível de água sobe, o plano de maré é gradual-mente submerso, formando uma zona de má-xima turbidez associada com a água de conta-to de enchente. As variações posteriores po-dem ter sido causadas também por variaçõesdo regime hidrodinâmico do saco. A abruptadiminuição logo no início da vazante, quando aconcentração de MPS decaiu para ~15 mg.l-1,reflete o comportamento do manguezal comobacia de sedimentação. Durante as últimashoras de enchente e início da vazante omanguezal foi alagado. Devido à densa vegeta-ção a superfície da água nesta região pratica-mente não sofre influência direta do vento, e apresença de caules e raízes aéreas aumenta africção do escoamento resultando em veloci-dades de corrente bastante baixas, acarretan-do a sedimentação do MPS. Com a vazante, ocanal do ERD atua como dreno da água quese encontrava no maguezal com baixa concen-tração de MPS, uma vez que uma parte signi-ficativa deste sedimentou. O transporte residu-al de MPS reflete estes padrões, onde o ERTatua com exportador de MPS, enquanto que oERD atua como importador.

As variações temporais do OD e pH fo-ram similares em cada estuário, porém distin-tas entre eles. No ERT a variação destes doisparâmetros seguiu coerentemente a variaçãoda maré, tal qual foi observado para asalinidade. No ERD, a variação destesparâmetros foi mais similar ao comportamentodo MPS, onde se observou um pico máximono início da enchente, após um período de va-lores constantes durante a baixamar. Este com-portamento está relacionado à hidrodinâmicalocal associada aos processos biogeoquímicosde produção e decomposição da matéria orgâ-nica nos estuários e no plano intermareal situ-

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000.

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ado defronte à eles. No ERT, os menores valo-res de pH e OD ocorreram no início da manhãdurante a maré baixa, entre 08 e 10 horas (Fi-gura 4). Estes baixos valores podem ser expli-cados em função da presença de uma águacom maior influência fluvial e em função delesrepresentarem o balanço dos processos deprodução e mineralização da matéria orgânicaocorridos durante a noite. Durante o períodonoturno ocorre predominância dos processosde mineralização, os quais resultam no consu-mo de OD e na produção de CO

2. Assim, du-

rante o ciclo diário é esperado encontrar osmenores valores de OD e pH no início da ma-nhã. Além disso, entradas de esgotos no estu-ário aumentam a carga orgânica, resultando naintensificação dos processos de mineralização.A partir das 10 horas ocorreu o aumento tantodo OD como do pH paralelamente ao aumentoda salinidade com a entrada de água da baía.Este aumento pode ser explicado pela predo-minância dos processos de produção de ma-téria orgânica por organismos autotróficos so-bre a mineralização. Com a disponibilidade deluz os processos de produção primária tornam-se pronunciados, principalmente no plano inter-mareal situado em frente ao estuário, uma vezque recebe o aporte de nutrientes do estuário.O mesmo mecanismo explica as variações dopH e OD no ERD. Entretanto, durante os mo-mentos de maré baixa este estuário fica isola-do da baía, de modo que os processosbiogeoquímicos associados ao mangue predo-minam. Neste estudo foram obsrvados valoresbaixos de pH e OD até as 11:00 horas (Figuras6A e B), em um período de maré baixa. Com aelevação da maré, verificou-se o aumento des-tes parâmetros, o que pode ser explicado pelaentrada da água do plano intermareal, o qualapresenta características ideais para os pro-dutores primários, conforme descrito acima.

Em ambos estuários o NH4

+ foi a princi-pal forma de NID durante toda a campanha,correspondendo em média a 75 % do NID noERT e 79% no ERD. Apesar das médias se-melhantes, os maiores valores absolutos foramobtidos no ERT. As concentrações de NH

4+ re-

presentam o reflexo das entradas de efluentese esgotos, e dos processos de reciclagem emambientes costeiros (Braga et al, 2000). Asconcentrações elevadas observadas durante amaré baixa refletem o maior grau de influênciaantropogênica no ERT. Este estuário recebe oesgoto doméstico de várias residências em suabacia de drenagem e os maiores valores ob-servados são próximos aos encontrados emoutros ambientes impactados, como é o casodo estuário do Rio Camboriú (Pereira Filho etal, 2001), situado cerca de 80 km ao norte.Este estuário recebe uma grande carga de es-gotos clandestinos, além do efluente da esta-ção de tratamento de esgoto do município deBalneário Camboriú. Para termos comparati-vos, Braga et al (2000), encontraram valoresde NH

4+ próximos a 40 µM na região interna do

sistema estuarino de Santos e São Vicente,no litoral sul de São Paulo, sendo esta umaregião altamente impactada. A dominância deNH

4+ é indicativo de grande carga orgânica pre-

sente, já que esta é a forma de nitrogênio dire-tamente relacionada à decomposição de ma-téria orgânica.

No ERD, a predominância de NH4

+ so-bre no NID representa a influência dos proces-sos biogeoquímicos de degradação da matériaorgânica que ocorrem no mangue e na regiãoadjacente sobre a composição da águaestuarina. O ERD, consistindo basicamente deum pequeno canal de maré, sofre influênciamais direta do mangue, o qual é um ambientede acúmulo de matéria orgânica. A matéria or-gânica acumulada no sedimento, ao ser de-composta, pode levar a diminuição substanci-al do OD, principalmente quando o canal ficaisolado da baía durante a maré baixa. Particu-larmente nos períodos do início da manhã, sea maré estiver baixa, o OD pode cair a tal pon-to na coluna d´água que o ambiente pode setornar redutor, o que explicaria a predominân-cia do NH

4+. Os maiores valores de NH

4+ foram

registrados às 13:00 e 14:00 horas, quandotambém foi o período de menor salinidade nes-te estuário. Entretanto, a diminuição desalinidade ocorreu durante a enchente, ao con-

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

trário do que seria esperado, porém explicadopelo padrão de circulação do Saco dos Limõesexplicado acima. Parte do NH

4+ observado no

ERD pode ter sido originado no ERT.Além do NH

4+, o NID é composto pelo

NO3

- e pelo NO2

-. O NO3

- normalmente é a for-ma predominante de NID em águas bem oxi-genadas com baixa atividade biológica, pois éa forma mais oxidada dos nutrientesnitrogenados (Spencer, 1975; Chester, 1990).O NO

2- representa o estado intermediário entre

o NH4

+ e o NO3

-, sendo normalmente a formamenos abundante em ambientes aquáticos. Elepode ser formado tanto pela oxidação do NH

4+,

em condições óxicas, como pela redução doNO

3-, em condições anóxicas. Neste estudo

as duas formas não foram separadas, sendoconsideradas em conjunto. Em ambientes oxi-genados com baixa atividade biológica e ondeos processos de decomposição de matéria or-gânica não são pronunciados, o NID está pre-sente principalmente na forma de NO

3-. Isto

ocorre em função da oxidação bacteriana doNH

4+ em NO

2- e deste em NO

3-, num processo

denominado de nitrificação, e o NO3

- é a formamais estável sob estas circunstâncias. No casode ambos os estuários, a pequena proporçãodo NO

2- + NO

3- sobre o NID é um indicativo da

presença de grandes quantidades de matériaorgânica e dos processos associados à suadegradação, os quais resultam em NH

4+. Tanto

para o ERT como para o ERD, o comporta-mento do NO

3- foi similar, sendo que os valores

obtidos em ambos ficaram muito próximos.Sendo ambientes oxigenados e com grandedisponibilidade de NH

4+, o NO

2- e o NO

3- são

constantemente formados pela nitrificação. Aintensidade deste processo aumenta com adisponibilidade de NH

4+, originado da decom-

posição orgânica, estimulando o desenvolvi-mento da flora bacteriana nitrificante. Assim,os maiores valores de NO

2- + NO

3- coincidiram

com os períodos de maior concentração deNH

4+, registrados nos períodos de menor

salinidade. O comportamento do PO

43- seguiu a

mesma tendência dos demais nutrientes no

ERT, com os maiores valores sendo registradosnos períodos de maior influência de água fluvi-al. As menores concentrações registradas nosperíodos de maré alta resultam da diluição daságuas fluviais, ricas em PO

43-, pelas águas da

baía com menores quantidades deste nutrien-te. No ERD esta tendência não fica tão clara,já que as trocas com a baía não são tão efeti-vas. Neste estuário os processosbiogeoquímicos relacionados à decomposiçãoda matéria orgânica assumem uma maior im-portância do que a simples diluição das águasfluviais pela entrada da água salgada. Os mai-ores valores de PO

43- no ERD foram registrados

no período da manhã, durante a maré baixa.Nesta condição o estuário fica isolado da baía,de modo que os processos de reciclagem damatéria orgânica estuarina exercem grande in-fluência sobre a composição química da água.Estes processos resultam no aumento dasconcentrações de PO

43-, mesmo sem que ocor-

ra predominância de água fluvial (Figura 6D).Além disso, como neste caso a maré baixaocorreu pela manhã, após um período sem luz,as variáveis da coluna de água representam oresultado dos processos de mineralização ocor-ridos durante a noite, conforme mencionadoanteriormente, resultando também em baixasconcentrações de oxigênio e baixos valores depH registrados neste momento. A predominân-cia de NH

4+ sobre os nutrientes nitrogenados

observada neste período é outra evidência des-te comportamento.

O comportamento do Si inorgânico dis-solvido evidenciou claramente a influência fluvi-al sobre a distribuição de nutrientes no ERT.As maiores concentrações foram observadasnos momentos de baixa salinidade, aumentan-do progressivamente com a diminuição dasalinidade, evidenciando sua origem às águasfluviais. O Si é originado pelo intemperismo dasrochas e não participa diretamente no ciclo damatéria orgânica, a não ser quando ocorre odesenvolvimento de organismos que utilizameste elemento em suas carapaças, tais comoas diatomáceas. Dentre os nutrientes, o Si foio que apresentou o comportamento mais

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NOTAS TÉC. FACIMAR, 4: 11-28, 2000.

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conservativo no ERT, mostrando participaçãodiscreta nos processos biogeoquímicos desteestuário. Tal qual observado no ERT, os maio-res valores de Si no ERD foram registrados nosperíodos de menor salinidade. Entretanto, ape-sar de sofrer menor influência direta da águadoce, o ERD apresentou concentrações eleva-das de Si quando comparadas às observadasno ERT. Isto pode estar relacionado com a in-fluência dos processos biogeoquímicos queocorrem no plano intermareal e da plumaestuarina do ERT. Desta forma, o Si inorgânicodissolvido chega à enseada a partir do ERT, namaré baixa. No plano intermareal, um ambien-te já com grande influência de água salgada ecom baixa turbidez, ocorre o consumo desteSi por organismos silicosos. Este consumoresulta em conversão do Si dissolvido em Siparticulado na forma de estruturas de organis-mos. O Si particulado como parte do MPS éresuspendido e/ou carreado para o ERD, re-sultando no pico de turbidez observado no iní-cio do período de enchente. No fim do períodode enchente e início da vazante, com omanguezal alagado, verifica-se diminuição dadinâmica, propiciando a sedimentação do ma-terial particulado como já discorrido acima. Esteambiente propicia então a redissolução do Siparticulado, explicando os valores elevados deSi dissolvido no ERD mesmo com salinidadeelevada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estuários dos rios Tavares e Defun-tos são dois sistemas de escalas bastante re-duzidas inseridos em um cenário grandementeinfluenciado por diversas atividades antrópicas.Ambos os sistemas deságuam no Saco dosLimões, onde foi realizado nos últimos anosum aterro hidráulico em toda a sua porção in-terna. Estes sistemas estuarinos, apesar deestarem distantes apenas algumas centenasde metros, apresentaram grandes diferençasnas variações dos parâmetros monitorados.

O principal agente regulador edeterminante da hidrodinâmica, em ambos os

estuários, foi a maré astronômica semi-diurna,com período de 12:25 horas. Contudo, tambémfoi constatado que seiches formados por dife-rentes modos de oscilação natural no sistemade baías também apresentam uma forte com-ponente sobre a hidrodinâmica, sendo notavel-mente observados no sinal de correntes longi-tudinal do ERT. A análise espectral sobre osdados de nível de água indicaram que estesseiches apresentam períodos de 1 até 2 ho-ras.

Também em função de se localizaremem uma região com um extenso planointermareal defronte, estes estuários estãosujeitos a processos hidrodinâmicos,sedimentológicos e biogeoquímicos que aliocorrem. O plano intermareal representaria oelo entre a baía e os estuários, onde os pro-cessos de produção de matéria orgânica seri-am particularmente importantes. Em função dapouca profundidade, alta concentração de nu-trientes e relativa baixa turbidez, o planointermareal constitui um local ideal para os pro-dutores primários. Os estuários, principalmen-te o ERT, exportam nutrientes para a região doplano intermareal. Estes nutrientes são utiliza-dos principalmente na maré baixa, e com aenchente parte desta água parcialmente mis-turada com a água da baía retorna aos estuári-os seguida por esta última, provocando a dimi-nuição dos nutrientes e parâmetros relaciona-dos. Estes processos são mais evidentes noERD, em função de sua drenagem reduzida esua comunicação restrita com a baía. Os re-sultados também mostram que a água de en-chente no ERD é influenciada pela pluma doERT, o que sugere a existência de um padrãode correntes horário no interior do Saco dosLimões, com transporte residual de leste paraoeste na região da reserva.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi realizado com o supor-te financeiro do Departamento de Estradas eRodagem – Santa Catarina (DER-SC), dentrodo programa de Monitoramento Ambiental na

Page 18: CARACTERIZAÇÃO OCEANOGRÁFICA E ......Baia Norte Baia Sul Rio dos Defuntos Rio Tavares Saco dos Limões N Estações de Coleta 1km Manguezal M AB Figura 1: Localização dos estuários

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Schettini et al.: Oceanografia e biogeoquímica dos estuários dos rios Tavares e Defuntos.

Área de Abrangência das Obras da Via Expres-sa SC-Sul, Florianópolis, SC. Agradecemos aoSr. Valdenir Manoel Inês pelo apoio logísticodurante as campanhas de coleta e ao Iate Clu-be Veleiros da Ilha, por gentilmente nos cedersuas dependências para a instalação domarégrafo e realização do processamento dasamostras.

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