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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE PSICOLOGIA CARREIRA, ADAPTABILIDADE E PERSONALIDADE: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NUMA AMOSTRA DE JOVENS E ADULTOS TRABALHADORES Ana Catarina de Castro Bernardo MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA Secção de Psicologia dos Recursos Humanos, do Trabalho e das Organizações 2013

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

CARREIRA, ADAPTABILIDADE E PERSONALIDADE:

UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NUMA AMOSTRA DE JOVENS

E ADULTOS TRABALHADORES

Ana Catarina de Castro Bernardo

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Secção de Psicologia dos Recursos Humanos, do Trabalho e das Organizações

2013

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

CARREIRA, ADAPTABILIDADE E PERSONALIDADE:

UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NUMA AMOSTRA DE JOVENS

E ADULTOS TRABALHADORES

Ana Catarina de Castro Bernardo

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Secção de Psicologia dos Recursos Humanos, do Trabalho e das Organizações

Dissertação orientada pela Professora Doutora Maria Eduarda Duarte

2013

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i  

ÍNDICE GERAL

p.

RESUMO/ABSTRACT iii

AGRADECIMENTOS iv

INTRODUÇÃO 1

1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO 2 1.1. Perspetivas conceptuais que respondem às realidades sociais

e laborais do século XX 2

1.2. A Perspetiva Construtivista e a Teoria da Construção de Carreira 3

1.2.1. A Adaptabilidade de Carreira 7

1.2.2. O Aconselhamento de Carreira e o Questionário sobre

Temas de Carreira (QTC) 9

1.3. A Personalidade e o Modelo dos Cinco Fatores 11

2. MÉTODO 15

2.1. Participantes 15

2.2. Instrumentos 15

2.2.1. Inventário sobre Adaptabilidade de Carreira 15

2.2.2. NEO-FFI 15

2.2.3. Questionário sobre Temas de Carreira 16

2.3. Procedimentos 16

3. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 17

3.1. Inventário sobre Adaptabilidade 17

3.2. NEO-FFI 18

3.3. Questionário sobre Temas de Carreira 19

3.4. Inventário sobre Adaptabilidade, NEO-FFI e Questionário sobre

Temas de Carreira 20

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES 24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 27

ANEXOS CD-ROM

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ii  

ÍNDICE DE QUADROS

Quadro nº p.

3.1.1 Médias e Desvios-padrão das dimensões do Inventário

sobre Adaptabilidade (amostra total) 17

3.1.2 Comparações entre grupos etários (amostra total) em dimensões

do Inventário sobre Adaptabilidade (teste de Mann-Whitney). 18

3.2.1 Médias e Desvios-padrão das dimensões do NEO-FFI

(amostra total). 18

3.2.2 Comparações entre grupos etários (amostra total) na

dimensão Amabilidade do NEO-FFI (teste de Mann-Whitney). 19

3.2.3 Comparações entre géneros (amostra total) no

NEO-FFI (teste de Mann-Whitney). 19

3.3.1 Categorização das respostas às questões 1, 2, 3, 4

do Questionário sobre Temas de Carreira 20

3.4.1 Correlações entre as dimensões de Adaptabilidade de Carreira

e as dimensões do FFM (amostra total). 22

3.4.2 Teste de Mann-Whitney no Inventário sobre Adaptabilidade

e na questão 4 do QTC (n=53). 22

3.4.3 Teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney na

dimensão Amabilidade do NEO-FFI e na questão 1 do QTC (n=44). 22

3.4.4 Teste de Mann-Whitney na dimensão Extroversão do NEO-FFI

e na questão 4 do QTC (n=53). 23

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iii  

RESUMO

Este estudo investiga a eventual relação entre Adaptabilidade de Carreira, Personalidade e Temas de Carreira. É constituída uma amostra comunitária (n=55), incluindo participantes de ambos os sexos que respondem ao Inventário sobre Adaptabilidade, ao NEO-FFI e ao Questionário sobre Temas de Carreira. Considerando a variável idade, são observadas diferenças estatisticamente significativas nas dimensões Preocupação, Controlo, resultado total de Adaptabilidade e Amabilidade. Os resultados revelam também relações significativas entre as dimensões de Adaptabilidade e as dimensões do modelo de Personalidade dos Cinco Fatores (Five-Factor Model, FFM), destacando-se a Conscienciosidade, que se correlaciona positivamente com todas as dimensões da Adaptabilidade. Verificam-se relações significativas entre os Temas de Carreira e a dimensão Controlo, o resultado total de Adaptabilidade e a dimensão Amabilidade. Os resultados são discutidos à luz da Teoria de Construção da Carreira, do modelo de Adaptabilidade de Carreira e do modelo dos Cinco Fatores. Por último, são referidas possíveis limitações do presente estudo, bem como linhas para investigação futura.

Palavras-chave: Adaptabilidade de Carreira, FFM, Temas de Carreira

ABSTRACT

This study examines the relationships between Career Adaptability, Personality and Career Themes. A general population sample of 55 individuals (both female and male) is set. Participants of the sample are subject to CAA-S Career Adapt-Abilities Scale, NEO-FFI Neo Five-Factor Inventory and Career Themes Questionnaire. Evidence of significant statistically differences are observed regarding Age, as well as dimensions of Concern, Curiosity, Adaptability total score and Amability. In addition, results suggest significant relationships between Career Adaptability dimensions and Big Five Personality Model having Conscientiousness the greatest expression being positively associated with all Career Adaptability dimensions. Relationships between Career Themes and Control dimension, Adaptability total score and Amability. Results are discussed in light of Career Construction Theory, Career Adaptability model, and Five Factor Personality Model (FFM). Finally, limitations of this study are drawn, as well as suggestions for future researches.

Keywords: Career Adaptability, Career Themes, Five Factor Model (FFM).

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iv  

AGRADECIMENTOS

À minha família: Alda, Eduardo, Pedro, António e Sasha sem os

quais nada disto teria sido possível e ao Alexandre, o meu Norte.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

1  

INTRODUÇÃO

No século XXI o mundo do trabalho apresenta desafios diferentes dos requeridos

outrora, nomeadamente em termos do esforço pessoal a investir, do auto-conhecimento

e da auto-confiança do trabalhador. Os trabalhos instáveis, com transições constantes,

são característicos da crise económica que se vive à escala global. Terminou o tempo

em que a carreira, vista sob a perspetiva das teorias desenvolvimentistas (Super, 1980;

1990) se caracterizava pela estabilidade e segurança de trabalho ao longo do ciclo de

vida.

No decurso do século XX foi proposto um vasto conjunto de reflexões e de

práticas, que se consubstanciaram em teorias, que de formas distintas procuraram

descrever os mecanismos psicológicos internos, inerentes às escolhas vocacionais e aos

processos desenvolvimentistas para chegar a essas escolhas. As mudanças ocorridas no

contexto social e económico do mundo do trabalho, bem como a consequente teorização

permitiu, por sua vez, chegar à fase em que se entende necessária uma maior atenção à

forma como o indivíduo se constrói a si próprio, nos diversos contextos em que atuou,

atua e poderá vir a atuar (Duarte, 2009). Tal é proposto na Teoria da Construção da

Carreira (Savickas, 2002; 2005) e nos recursos que esta propõe permitindo, aos

indivíduos, formar estratégias que direcionam os seus comportamentos adaptativos,

sendo o construto Adaptabilidade de Carreira, conceptualizado a partir das dimensões

Preocupação, Controlo, Curiosidade e Confiança (Savickas & Porfeli, 2012).

O aconselhamento de carreira que assenta numa perspetiva construtivista,

privilegia a comunicação entre os clientes e os conselheiros, de forma a permitir que os

clientes construam e narrem histórias que retratem a sua carreira e a sua vida, com

coerência e continuidade, de forma a melhor entenderem os seus temas de carreira

(Savickas, 2002; 2005; 2011b).

O modelo de Personalidade dos Cinco Fatores é considerado uma taxonomia de

traços amplamente aceite e validada para a compreensão da influência da personalidade

nos comportamentos de carreira e de trabalho (McCrae & Costa, 1987). Assim, as

dimensões Neuroticismo, Conscienciosidade, Abertura à Experiência, Amabilidade e

Conscienciosidade do modelo, podem fornecer informação relevante para o processo de

aconselhamento de carreira, relativamente aos contextos individuais dos clientes

(Györkös et al., 2012).

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

2  

O presente trabalho visa explorar eventuais relações entre Adaptabilidade de

Carreira, Personalidade e Temas de Carreira, numa amostra que integra trabalhadores

jovens e adultos. Estrutura-se em três secções principais: uma secção de enquadramento

teórico em que se expõem os conceitos em estudo e respetivos modelos teóricos, uma

secção metodológica em que se descreve a amostra e os instrumentos utilizados e por

fim, uma secção relativa às conclusões, aos contributos e às limitações do estudo, bem

como a sugestões para investigações futuras.

1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO 1.1. Perspetivas conceptuais que respondem às realidades sociais e laborais do

século XX

No início do século XX, a teoria e a prática da orientação vocacional começam a

surgir em vários países. Neste novo domínio do conhecimento, podem destacar-se

pioneiros como Parsons nos Estados Unidos da América, Munsterberg na Alemanha,

Christiaens na Bélgica, Claparède na Suiça, Binet e Piéron em França, Faria de

Vasconcelos em Portugal, Mira y López e Germain em Espanha (Ferreira Marques,

1993, pp-67-68).

Até aos anos 50 do século XX, a orientação teve como principal objetivo o apoio

à escolha de uma profissão e a obtenção do sucesso profissional. O papel do orientador

consistia em analisar as capacidades do indivíduo e compará-las com as exigidas pela

profissão, promovendo-se a escolha da profissão que melhor se adequava. Nestes

termos, a conceção da escolha vocacional estava limitada ao momento que precedia a

entrada num emprego ou numa profissão; a escolha era estática, valorizava os aspetos

não dinâmicos e a tomada de decisão não era encarada como um processo (Duarte,

2000).

Com origem etimológica no latim medieval via carraria, o termo carreira significa,

segundo Martins (2001), uma estrada rústica para carros. Este conceito ganhou

expressão numa época marcada pela Revolução Industrial e respetivas mudanças

sociais. Surgiu, por esta altura, a noção da importância de se procurar uma relação entre

desempenho e sucesso, trazida pelos modelos desenvolvimentistas que vieram

impulsionar a transição de orientação vocacional para aconselhamento de carreira

(Duarte, 2009).

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3  

Emergia, com efeito, nesta época, a necessidade de ajudar os indivíduos a

encontrarem o trabalho a que melhor se ajustassem, estando presente a noção de

dependência hierárquica e relações estáveis apresentadas por Arthur, Inkson e Pringle

(1999). Os trabalhadores do século XX podiam ser vistos como trabalhadores

permanentes numa mesma profissão e em organizações que lhes asseguravam um

desenvolvimento de carreira seguro e estável.

Por conseguinte, estavam criadas as bases que viriam a lançar as teorias

desenvolvimentistas da carreira, com especial destaque para a teoria de Super (1980,

1990). O autor sugeriu que a escolha e o desenvolvimento de carreira consistia,

essencialmente, num processo de desenvolvimento e implementação do auto-conceito.

De acordo com Super (1990), o auto-conceito é visto como o produto de interações

complexas, num determinado conjunto de fatores, incluindo o crescimento físico e

psicológico, as experiências pessoais e as características dos contextos.

Super (1980; 1990) propôs um quadro desenvolvimentista das diferentes fases do

ciclo de vida: Crescimento, Exploração, Estabelecimento, Manutenção e Declínio. Em

cada uma destas fases, o indivíduo deveria gerir de forma eficiente as tarefas de

desenvolvimento vocacional, socialmente expectáveis para a sua idade cronológica

(life-span). O autor propôs também a importância de atender aos diversos papéis de vida

que o indivíduo desempenha nos cenários ou espaços de vida em que se move (life-

space), considerando que a vida integra, a qualquer momento, um agregado de papéis

que o indivíduo assume com maior ou menor importância relativa.

As teorias desenvolvimentistas assumiram, com efeito, um papel fulcral até ao final

do século XX, constituindo uma grelha de leitura sobre como o indivíduo se desenvolve

e progride na sua carreira, ao longo do ciclo de vida. No entanto, numa sociedade em

que a mudança é constante e cada vez mais rápida e em que os indivíduos devem

acompanhar ou responder a essa mudança, novas abordagens são necessárias.

1.1. A Perspetiva Construtivista e a Teoria da Construção de Carreira

A abordagem de Super viria a ser criticada por presumir a existência de um

mecanismo atuante a partir de um processo de desenvolvimento maturativo (Savickas,

2002). Propostas posteriores chamaram a atenção para a necessidade de uma ênfase

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mais forte, quer ao nível dos efeitos dos contextos, quer ao nível da influência recíproca

que os indivíduos estabelecem entre si (Savickas 2002; 2005; 2008).

Partindo da noção de Super sobre o auto-conceito enquanto construto pessoal,

Savickas (2002), subscreve a perspetiva construtivista e propõe a teoria de Construção

da Carreira que consiste, primordialmente, num conjunto de processos que ajustam o

comportamento vocacional do indivíduo e lhe permitem a construção de si mesmo,

conferindo direcionamento e sentido, exprimidos subjetivamente através da construção

da sua carreira. Esta perspetiva apresenta soluções para o mundo atual, o chamado

mundo da revolução digital, com organizações flexíveis e sociedades fluidas (Bauman,

2000). O novo mercado de trabalho, apoiado numa economia incerta, transforma a visão

de outrora, de estabilidade e de comprometimento com uma organização e um único

empregador, numa venda recorrente de serviços a diversos empregadores, que têm

como objetivo último assegurar a concretização atempada de projetos (Savickas, 2012).

Paralelamente às mudanças rápidas que ocorrem no atual mundo do trabalho, é

possível constatar uma reconsideração dos construtos estabelecidos pelas investigações

e práticas das teorias da carreira, reposicionando-os de forma a acompanharem o

presente e a permanecerem relevantes nos contextos atuais. Savickas (2011a) argumenta

que as conceções estruturadas e inflexíveis do desenvolvimento de carreira estão mortas

e o desenvolvimento de carreira necessita de ser conceptualizado em termos de uma

descoberta contínua do self por parte do indivíduo, tendo em conta a natureza de

mudança e de instabilidade do mundo do trabalho.

A Teoria da Construção de Carreira (TCC) surge como uma proposta de

explicação e interpretação dos processos inter-pessoais, através dos quais os indivíduos

se constroem a si mesmos, conferindo direção ao seu comportamento vocacional e

dando significado às suas carreiras (Savickas, 2013). Com o objetivo de poder ser

entendida numa economia global, dentro de uma sociedade multi-cultural, a teoria

fornece uma explicação contemporânea das carreiras e indica um modelo para o

aconselhamento de carreira. Nela se abordam as formas como os indivíduos constroem

as suas carreiras.

A TCC aborda a questão das carreiras a partir de uma visão contextual, que

conceptualiza o desenvolvimento como um processo de adaptação ao contexto, em

detrimento de uma visão de maturação de estruturas internas. Concentra a sua atenção

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na construção do self (Savickas, 2013), considerando primeiramente, como os

indivíduos se tornam em quem eles são e descrevendo posteriormente, as perspetivas

contemporâneas da carreira. Savickas (2001) diferenciou inicialmente a TCC em traços,

temas e tarefas, tendo McAdams e Olson (2010), introduzido a TCC com três

componentes: ator, agente e autor. Savickas (2011a) vem posteriormente apresentar uma

diferenciação da TCC em três perspetivas centrais: objeto, sujeito e projeto.

De forma a alcançar uma teoria compreensiva que inclua todas as perspetivas,

Savickas (2013) aborda o construcionismo social como uma meta-teoria, afirmando que

a realidade não é independente do indivíduo, isto é, o indivíduo constrói a realidade a

partir dos processos sociais e das relações inter-pessoais. Cada uma das componentes do

self como objeto, sujeito ou projeto fornece uma perspectiva e forma diferentes para o

comportamento vocacional e construção da carreira. Descrevem-se as três perspetivas

do self:

O self como objeto pode ser entendido como o self ator, em que o indivíduo

interpreta comportamentos individuais que delineiam uma história da sequência de

posições ocupadas pelo indivíduo, desde a entrada na escola até ao período de reforma.

Caracteriza-se pela dominância de uma visão objetiva do ajustamento pessoa-meio,

permitindo a correspondência entre os indivíduos e as profissões. Esta visão foi

introduzida por Holland, (1997), no seu Modelo RIASEC (Realista, Intelectual,

Artístico, Social, Empreendedor, Convencional) sobre a congruência entre escolhas

vocacionais e ambientes de trabalho, designada como a componente da Personalidade

Vocacional (Savickas, 2013).

O self como sujeito pode ser entendido como o self agente. Esta perspetiva

emergiu após a segunda Guerra Mundial, funcionando como um suplemento da visão

objetiva do self, inspirada nas crenças humanísticas de descoberta e atualização do self.

O agente surge após o ator no palco do drama familiar ser reconhecido como tal, isto é,

o ator adaptou-se à sua família de origem e deve, agora como agente, adaptar o seu self

à escola e à comunidade. Isto significa uma formulação dos objetivos a alcançar,

seguidos dos projetos e culminando, eventualmente, numa carreira. Inscrito no self

agente, o termo Adaptabilidade de Carreira é proposto por Savickas (1997) para

designar um construto psico-social, caracterizado pelos recursos individuais de

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estratégia para lidar, tanto com tarefas correntes de desenvolvimento vocacional, como

com a sua antecipação, transições profissionais e traumas de trabalho (Savickas, 2013).

O self como projeto pode ser entendido como o self autor, o self que narra uma

história de carreira. Com a mudança para uma sociedade de informação e para uma

economia global, a estrutura corporativa da carreira dissipou-se já não sendo atualmente

possível falar na construção de uma carreira longa, numa única organização. Embora o

emprego a tempo inteiro permaneça como forma dominante de trabalho, os contratos

temporários e as posições de part-time estão progressivamente a substituir os empregos

a tempo inteiro e permanentes. Para muitos indivíduos, o trabalho toma agora a forma

de um projeto, com um contrato inicial e um produto final. Por conseguinte, o trabalho

do século XXI é visto como inseguro, depositando nos trabalhadores, um presente e um

futuro incertos. É, assim, impreterível a aposta nas capacidades de flexibilidade dos

indivíduos, de forma a manterem a sua empregabilidade, através de aprendizagens ao

longo da vida e adaptando-se às transições profissionais, numa reconstrução contínua do

self (Savickas 2013).

Desde a escola primária até à adolescência, o agente ator comporta uma

complexa amálgama de influências e identificações. Uma vez chegado ao final da

adolescência, o indivíduo confronta-se com a expectativa social de integrar as suas

ações e a sua agência numa identidade singular, suportada por uma história de vida

unificada. À medida que o indivíduo aprende mais sobre si próprio como ator e agente

motivado, torna-se apto para dirigir a sua constelação de objetivos e projetos, numa

história coerente e credível. A TCC defende, de uma forma geral, que o indivíduo

constrói a sua carreira através do significado que atribui ao comportamento vocacional.

Se é certo que o self como ator e o self como agente lidam, respetivamente, com o quê

(o que o indivíduo fez) e o com o como (como o indivíduo o fez), também é certo que

existe um porquê (por que o indivíduo o fez) que está ligado ao self como autor

(Savickas, 2013).

Surgem, assim, os Temas de Carreira, revelados na história de carreira,

permitindo ao indivíduo realizar escolhas significativas e ajustar-se aos papéis de

trabalho. Apesar da importância das interpretações do self enquanto ator e da

importância do processo de Adaptabilidade de Carreira, estas variáveis deverão ser

analisadas como dinâmicas integrantes de um self completo e definido, ao invés de se

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visualizarem como dois conceitos separados. O significado essencial de uma carreira e

das dinâmicas da sua construção, são revelados em histórias de auto-definição acerca de

tarefas de desenvolvimento vocacional, transições profissionais e traumas de trabalho,

assumindo-se, com efeito, os Temas de Carreira como um componente vital na TCC

(Savickas, 2013).

As histórias de carreira, construídas a partir da história narrada pelo indivíduo

sobre a interação do self com a sociedade, explicam por que os indivíduos fazem

determinados tipos de escolhas e qual a razão significativa que direciona essa escolha. A

partir destas histórias prototípicas sobre a vida de trabalho, os conselheiros de carreira

procuram compreender, por um lado, os temas de vida que constroem as carreiras e por

outro lado, os motivos e os significados que dão corpo à vida de trabalho. Na TCC o

tema é a parte fulcral da história de vida do indivíduo, permitindo-lhe entender o

significado e propósito do seu trabalho, conferindo-lhe maior importância e

compreendendo que as ações contributivas para a sociedade, são relevantes para os

outros indivíduos. É precisamente esta crença de que o que o indivíduo faz, tem

importância para os outros indivíduos, que permite moldar a identidade e promover um

sentido de significado e de maior relevância às realizações de carreira/vida e às relações

sociais (Savickas, 2013).

A TCC tem sido posta em prática a partir do modelo de aconselhamento de

carreira (Savickas, 1989, 2011b). Embora neste modelo o enfoque do aconselhamento

se centre no indivíduo enquanto autor, estão incluídos tanto os elementos que

direcionam o indivíduo enquanto ator na escolha de papéis de trabalho, como os

elementos que direcionam o indivíduo enquanto agente na sua preparação para a

adaptação às transições. É importante compreender que a reorganização social do

trabalho, no século XXI, levou à formulação de um novo paradigma para a teoria da

carreira: a construção do self no seu projeto de vida, o chamado life-design (Savickas et

al., 2009). A intervenção de carreira no século XXI assume assim, um papel crucial na

preparação do indivíduo para a forma da construção da sua vida de trabalho, não se

limitando a orientá-lo na busca da vida de trabalho que melhor se lhe ajustaria.

1.2.1 A Adaptabilidade de Carreira

Savickas e Porfeli (2012) definem os recursos de Adaptabilidade de Carreira

como forças ou capacidades de autorregulação, utilizadas pelos indivíduos, para

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resolver problemas complexos, indefinidos ou desconhecidos, provenientes das tarefas

de desenvolvimento vocacional, das transições profissionais e dos traumas de trabalho.

É entendível que, pelo facto de se tratar de um construto psico-social, os recursos não se

encontram no centro do indivíduo mas na interseção entre o indivíduo e o meio.

A adaptabilidade molda a extensão do self no ambiente social na medida em que

os indivíduos se conectam com a sociedade e regulam o seu próprio comportamento

vocacional. A TCC define quatro dimensões globais da Adaptabilidade de Carreira:

Preocupação, Controlo, Curiosidade e Confiança. Estas dimensões são as representantes

dos recursos e estratégias gerais de Adaptabilidade. Descrevem-se as quatro dimensões

da Adaptabilidade de Carreira:

Preocupação. Consiste na aptidão para estar consciente de e para planear um

futuro vocacional. É a orientação de um futuro, a importância da preparação para o

amanhã. Atitudes de planeamento e otimismo fomentam no indivíduo a sensação de

preparação, uma vez que o torna consciente das tarefas vocacionais e das transições

profissionais que terá de enfrentar, bem como acerca das múltiplas escolhas que terá de

efetuar, num futuro iminente ou mais distante. O indivíduo que carece de recursos no

âmbito da dimensão Preocupação apresenta, geralmente uma atitude de indiferença face

à carreira, revelando apatia, pessimismo e falta de planeamento (Savickas, 2013).

Controlo. Consiste na sensação subjetiva de auto-governação e decisão,

relativamente a um futuro vocacional. Envolve auto-disciplina e processos de

conscienciosidade, deliberação, organização e decisão no desempenho de tarefas de

desenvolvimento vocacional e de transições profissionais. Indivíduos com um leque de

opções profissionais mais estreito poderão exercitar a dimensão Controlo explorando

um número limitado de possibilidades que os tornem, pessoalmente mais significativos

e aperfeiçoando-se, de forma a melhor se ajustarem às opções disponíveis. A atitude

conscienciosa e a crença na responsabilidade pessoal possibilitam, ao indivíduo,

direcionar de forma intencional as suas ações vocacionais. O indivíduo que carece de

recursos no âmbito da dimensão Controlo apresenta geralmente uma indecisão de

carreira, confusão, procrastinação e impulsividade (Savickas, 2013).

Curiosidade. Consiste na tendência para explorar o ambiente. A partir do sentido

de auto-controlo, emerge a iniciativa para aprender sobre os tipos de trabalho que o

indivíduo deseja realizar, bem como acerca das oportunidades profissionais para o poder

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fazer. Refere-se ao inquirir e à exploração do ajustamento entre o indivíduo e o mundo

do trabalho. Quando colocada em prática, a Curiosidade produz um fundo de

conhecimento que possibilita escolhas ajustadas entre o indivíduo e a situação.

Explorações sistemáticas e reflexões em experiências exploratórias casuais,

transformam o indivíduo ingénuo em conhecedor, ao possibilitar-lhe aprendizagens

sobre o funcionamento do mundo. Atitudes inquisitivas possibilitam ao indivíduo a

análise e a exploração do ambiente, permitindo-lhe aprender mais sobre si e sobre as

situações. A crença no valor de estar aberto a novas experiências e experimentar

eventuais selves diferentes, perspetivados em diversos papéis, incrementa, a vontade

para procurar coisas novas. Atitudes e disposições que favorecem a exploração e a

abertura levam a experiências que influenciam o aumento de competências, tanto no

auto-conhecimento como na informação profissional. O indivíduo que apresenta

dificuldades ao nível da dimensão Curiosidade apresenta geralmente falta de realismo

acerca do mundo do trabalho e uma imagem inadequada de si próprio.

Confiança. Consiste na tendência para se sentir eficiente e apto na resolução de

problemas concretos de carreira. Os indivíduos necessitam de confiança para agirem de

acordo com os seus interesses. Caracteriza-se por sentimentos de auto-eficácia para

executar com sucesso um curso de ação necessário, de forma a realizar e a implementar

escolhas vocacionais e educacionais adequadas. O papel fundamental da dimensão

Confiança na construção de carreiras reflete-se na extensa literatura sobre o papel da

autoestima e da auto-eficácia, nas teorias da Psicologia das Carreiras. Está presente na

resolução de problemas encontrados nas atividades diárias, como tarefas domésticas,

trabalhos de casa e hobbies. O facto do indivíduo reconhecer a sua utilidade e

produtividade neste tipo de tarefas, incrementa a auto-aceitação. O indivíduo com fracos

recursos na dimensão Confiança apresenta geralmente dificuldades em atualizar/assumir

papéis e na preserverança para alcançar objetivos.

1.2.2 O Aconselhamento de Carreira e o Questionário sobre Temas de Carreira

(QTC).

O aconselhamento de carreira apresenta como principais objetivos: aceder às

histórias vocacionais narradas pelos clientes sobre as suas vidas de trabalho, sobre as

transições correntes e sobre os traumas profissionais; integrar as histórias vocacionais

numa narrativa sobre o self e o trabalho; utilizar essa narrativa para dar significado a

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

10  

eventuais transições, bem como regular emoções; orientar o cliente na escrita do seu

próximo passo profissional; impulsionar o indivíduo a construir, ativamente, uma vida

profissional mais satisfatória (Savickas, 2013). Os conselheiros de carreira utilizam

instrumentos como o QTC (Duarte & Soares, 2010) constituído por um conjunto

uniforme de questões, ao longo das quais, os indivíduos narram pequenas histórias que

traduzem um determinado tipo de linguagem e imagem. A linguagem e a imagem são,

precisamente, as ferramentas de construção que os indivíduos utilizam para construir o

self, moldar uma identidade e construir uma carreira. As palavras repetidas e os temas

resultantes das histórias narradas são atos de identidade, através dos quais os clientes

mostram os seus selves e buscam papéis sociais.

A exploração de temas de carreira, como é pretendido pela aplicação do QTC,

permite aos clientes construírem, desconstruírem, reconstruírem e co-construírem a sua

história de carreira (Savickas, 2013). Na recente versão, My Career Story (Savickas,

2011b), conselheiro e cliente exploram a forma como este construiu um self como ator.

O conselheiro solicita que o cliente enuncie uma personalidade, atual ou histórica, que

veja como um modelo a seguir; em seguida, para avaliar o self como agente, questiona o

cliente acerca das revistas ou programas de televisão favoritos; em terceiro lugar, o

conselheiro avalia o self como autor, questionando o cliente sobre o seu livro ou filme

favorito; em quarto lugar explora o seu lema de vida, para apurar recursos de

adaptabilidade e ações de adaptação necessárias para que o cliente possa avançar na sua

vida profissional; em quinto lugar, o conselheiro questiona o cliente quanto às suas

primeiras memórias de vida.

A fase de desconstrução toma lugar sempre que uma história despoleta, no

cliente, sentimentos negativos, quer ao nível do exagero das suas expectativas, quer ao

nível de ideias insidiosas. Neste sentido, a desconstrução permite revelar e eliminar

ideias auto-limitativas, confinação de papéis e barreiras culturais, abrindo espaço para

caminhos que outrora não seriam possíveis ou visíveis, uma vez que os clientes fazem

as suas escolhas tendo em conta, apenas, o mundo que conhecem. A fase de

reconstrução caracteriza-se pelo momento em que o conselheiro seleciona o tema de

carreira de entre as histórias vocacionais narradas pelo cliente, isto é, de forma a

prevenir a possível confusão causada pelas eventuais contradições e complexidades do

cliente, o conselheiro foca a sua atenção na cola que junta todos os factos narrados num

todo, ao invés de se focar nos factos em separado. Neste sentido, a fase de reconstrução

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

11  

permite transformar um problema pessoal numa força pública e até, posteriormente,

numa contribuição social (Savickas, 2013).

Os conselheiros ajudam os clientes a ganhar interesse, mostrando-lhes como

determinadas ocupações ou passatempos estão, diretamente, relacionados com as suas

preocupações e que, ao envolverem-se com os mesmos, conseguem resolver os seus

problemas. A fase de coconstrução, acontece, após a fase de reconstrução

caracterizando-se, pelo momento em que o conselheiro apresenta ao cliente um esboço

do seu retrato de vida. À medida que o cliente se envolve e se integra emocionalmente

nesse retrato de vida, é encorajado pelo conselheiro a expô-lo e a partilhá-lo. Esta fase

envolve aperfeiçoamentos, ajustamentos e alterações, uma vez que o cliente necessita de

modificar o retrato de vida, de forma a torná-lo credível para ser vivido e experienciado

e consequentemente, ajustado ao futuro (Savickas, 2013).

É importante entender a extrema relevância deste trabalho por parte do cliente, uma vez

que foi por esta razão que o cliente procurou aconselhamento. Assim, os clientes que

encontram as palavras adequadas e que se permitem experienciar os sentimentos,

conseguem criar os alicerces para a auto-construção, essencial para poderem dar o passo

seguinte na vida profissional. A coconstrução do retrato de vida, consegue situar o

desvio do indivíduo, clarificando prioridades, mobilizando tendências centrais e

aumentando a sua possibilidade de transformação e desenvolvimento. Esta fase ocorre

quando os clientes conseguem aceder ao conhecimento e aos diferentes significados,

abrindo novas possibilidades e reiniciando iniciativas outrora estagnadas (Savickas,

2013).

1.3 A Personalidade e o Modelo dos Cinco Fatores

Existem diversas definições de personalidade. Allport (1937) considera este

conceito como o mais abstrato da linguagem humana, listando cinquenta significados

distintos, distribuídos pelos diferentes campos científicos como a teologia, a filosofia, a

sociologia, o direito e a psicologia. Embora exista alguma discrepância em relação à

definição do termo entre os teóricos contemporâneos da personalidade existe, por outro

lado, concordância relativamente ao facto de que, as ações dos indivíduos são

influenciadas por características estáveis, isto é, pela personalidade.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

12  

Hogan (1991), defende duas definições distintas para a personalidade: em

primeiro lugar, sugere que a personalidade é a reputação social de uma pessoa,

referindo-se à forma como um indivíduo é percebido pelos outros e em segundo lugar,

refere-se à personalidade como as estruturas, as dinâmicas, os processos e as propensões

que explicam por que é que uma pessoa se comporta de uma forma característica.

McCrae e Costa (1989) descrevem a personalidade como estilos contínuos emocionais,

inter-pessoais, experienciais, atitudinais e motivacionais que explicam o comportamento

em diferentes situações. Funder (2001) descreve a personalidade como um padrão

característico, individual de pensamento, emoção e comportamento, que atua em

conjunto com os mecanismos psicológicos subjacentes a esse padrão. De um modo

geral, os traços de personalidade referem-se às características consideradas estáveis ao

longo do tempo, fornecem as razões que justificam o comportamento de um indivíduo e

são de natureza psicológica.

Existe uma literatura vasta que reúne consenso relativamente ao Modelo de

Personalidade dos Cinco Fatores, frequentemente designado FFM (Five-factor Model),

sendo utilizado para descrever os diversos aspetos da personalidade (Digman, 1996).

A evidência indica que o FFM pode ser transmissível hereditariamente e

generalizável, praticamente, a todas as culturas, para além de apresentar estabilidade ao

longo do tempo (Costa & McCrae, 1988; McCrae & Costa, 1997; Digman, 1989).

Propõe-se, assim, este modelo como um quadro de referência, de onde poderá partir a

nova geração de teorias da personalidade, assumindo-se como um modelo

compreensivo, suficientemente parcimonioso para trabalhar com um número reduzido

de variáveis, permitindo um compromisso entre a explicação da enorme variabilidade

do comportamento humano e a focagem num nível de abstração, ainda utilizável na

prática (Barros, 1997).

As cinco dimensões que compõem o FFM são o Neuroticismo, a Extroversão, a

Abertura à Experiência, a Amabilidade e a Conscienciosidade. De acordo com Costa e

McCrae (1988), o Neuroticismo é o traço mais invasivo das medidas de personalidade.

Leva, pelo menos, a duas tendências relacionadas: a primeira, ligada à ansiedade e à

propensão para o stress; a segunda, relacionada com o bem-estar do indivíduo, como a

insegurança pessoal e a depressão. O Neuroticismo, está geralmente associado a uma

carência no ajustamento psicológico e na estabilidade emocional. Indivíduos que

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

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apresentam resultados elevados no Neuroticismo, experienciam problemas diversos, tais

como humores negativos (ansiedade, medo, depressão e irritabilidade) e sintomas

físicos.

A Extroversão é conhecida por consistir em sociabilidade. No entanto esta

dimensão é bastante ampla, pelo que inclui outros fatores. Segundo Watson e Clark

(1997), os indivíduos extrovertidos são mais sociáveis mas são, também, descritos como

mais ativos e impulsivos, menos disfóricos, introspetivos e preocupados do que os

introvertidos. Assim, os indivíduos extrovertidos tendem a ser orientados para a vida

social mostrando-se, ao mesmo tempo, dominantes, ambiciosos e ativos (aventureiros e

assertivos). A Extroversão está relacionada com a experiência de emoções positivas e os

indivíduos extrovertidos estão associados a papéis de liderança, bem como a terem um

grande número de amigos próximos.

A Abertura à Experiência é caracterizada pela imaginação ativa (filosófica e

intelectual), pelo não convencional (indivíduo imaginativo, autónomo, não-

conformado), pela sensibilidade estética, a atenção aos estímulos internos, a preferência

pela variedade, a curiosidade intelectual e a independência no julgamento. Indivíduos

com cotação elevada nesta dimensão, tendem a ser curiosos acerca do mundo, vivendo

as emoções com intensidade. Indivíduos que apresentem resultados fracos nesta

dimensão, tendem a ser conservadores, optando pelo que lhes é familiar, em detrimento

de coisas novas ou diferentes. A Amabilidade caracteriza-se pela cooperação (confiança

e preocupação para com os outros) e pela simpatia (indivíduo bem-intencionado, gentil,

agradável). Indivíduos que apresentam resultados baixos em Amabilidade caracterizam-

se por serem desagradáveis, antagonistas, egocêntricos e desconfiados.

A Conscienciosidade, que, segundo Barrick e Mount (1991), emergiu como a

dimensão mais consistentemente relacionada com o desempenho profissional,

manifesta-se em três facetas relacionadas: indivíduos orientados para os objetivos

(trabalhadores e persistentes), indivíduos confiantes (responsáveis e preocupados) e

indivíduos organizados (com capacidade de planeamento). É o grau de auto-controlo e a

necessidade de atingir objetivos, mostrar persistência e organização.

Numa abordagem exploratória procura-se, por conseguinte, analisar as

correlações disposicionais da Adaptabilidade de Carreira. Especificamente, analisar-se-

ão as cinco dimensões do FFM em relação com as quatro dimensões da Adaptabilidade

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

14  

de Carreira. De acordo com Savickas e Porfeli (2012), os indivíduos diferem na sua

capacidade para adotarem comportamentos de adaptação devido a determinados traços

psicológicos, que consubstanciam uma disposição que os autores designam por

adaptividade. Assente nesta perspetiva, considerou-se a pertinência de averiguar de que

forma certos traços ou disposições de personalidade poderão relacionar-se com as

quatro dimensões da adaptabilidade, com recurso ao instrumento que operacionaliza o

FFM. Tomando como distintos os construtos de personalidade e de adaptabilidade, a

recolha de dados sobre aspetos disposicionais (ou traços de personalidade) considera-se

útil para explorar como aspetos relativos à personalidade vocacional (o quê) se

articulam com as dimensões da adaptabilidade (o como) e ainda os temas de

carreira/vida (o porquê).

Desta forma viabiliza-se o estudo de como se relacionam, numa amostra

específica de participantes, indicadores das três componentes da TCC (Savickas, 2012).

Estudos anteriores como o de Teixeira et al (2012), mostraram a dimensão

Neuroticismo correlacionada negativamente com todas as dimensões da Adaptabilidade

de Carreira, enquanto a Conscienciosidade e a Abertura à Experiência se destacaram

como as dimensões do FFM que mais se relacionaram estatisticamente com as

dimensões da Adaptabilidade de carreira.

Por conseguinte, é esperado, neste estudo, que a Abertura à Experiência se

correlacione positivamente com a Curiosidade, uma vez que os indivíduos abertos à

experiência se caracterizam pela imaginação ativa, pela atenção aos estímulos internos,

pela preferência à variedade e pela curiosidade intelectual, tendendo a ser curiosos

acerca do mundo exterior e interior, vivendo as emoções com intensidade. É esperado

que a Extroversão se correlacione positivamente com a Confiança e a Curiosidade, uma

vez que os indivíduos extrovertidos tendem a ser orientados para a vida social

mostrando-se, ao mesmo tempo, dominantes, ambiciosos, ativos, aventureiros e

assertivos, estando associados aos papéis de liderança.

Espera-se que a Preocupação, o Controlo e a Confiança se correlacionem

positivamente com a Conscienciosidade, uma vez que os indivíduos conscienciosos

apresentam um grau elevado de auto-controlo, uma preocupação de orientação para os

objetivos, são indivíduos confiantes, responsáveis, preocupados, persistentes e

ordenados, com capacidade de planeamento e organização.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

15  

Posteriormente, analisar-se-ão as relações da Adaptabilidade de Carreira e do

FFM com os Temas de Carreira.

2. MÉTODO

2.1. Participantes

Os participantes do estudo, selecionados por amostra de conveniência, totalizam

55 indivíduos adultos trabalhadores entre os 21 e os 39 anos de idade, com diferenças ao

nível das habilitações literárias, variando desde o 9º ano completo até à pós-graduação.

Cerca de 62% dos participantes são do sexo feminino e cerca de 38% são do sexo

masculino.

Cerca de 66% dos participantes apresenta habilitações literárias ao nível do

ensino superior, 20% dos participantes apresenta o 12º ano completo e cerca de 4% dos

participantes refere ter o 9º ano completo. Seis dos participantes não fizeram referência

às suas habilitações literárias. Ao nível da idade, cerca de 66% dos participantes têm

entre 21 e 30 anos e cerca de 34% têm entre 31 a 39 anos de idade.

2.2. Instrumentos

2.1.1. Inventário sobre Adaptabilidade(ver anexo II)

O Inventário sobre Adaptabilidade, adaptado e traduzido a partir do Projeto Life

Design International Design Group (2010), com coordenação internacional de Mark

Savickas e coordenação nacional de Maria Eduarda Duarte, engloba o conjunto de

instrumentos e modelos psicológicos desenvolvidos pelo projeto, que apoiam a

investigação e a intervenção na construção de projetos de vida/carreira (Duarte et. al,

2012). O Inventário é constituído por 28 itens de resposta em escala tipo Likert, de 1 a 5

em que 1 corresponde a Muito Pouco, 2 corresponde a Pouco, 3 corresponde a

Razoavelmente, 4 corresponde a Bastante e 5 corresponde a Muito. Os 28 itens estão

divididos em quatro escalas, cada uma delas com sete itens que medem, respetivamente,

as dimensões Preocupação, Controlo, Curiosidade e Confiança.

2.2.3. Inventário NEO-FFI (ver anexo II)

O Inventário NEO Five Factor Inventory (NEO-FFI), versão reduzida do NEO-

PI (R): NEO Personality Inventory Revised, adaptado por Lima e Simões (1995), avalia

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

16  

as cinco grandes dimensões da Personalidade (Neuroticismo, Extroversão, Abertura à

Experiência, Amabilidade e Conscienciosidade), a partir de 60 itens de resposta em

escala tipo Likert em que o indivíduo tem cinco opções de resposta desde DF, que

corresponde a Discordo Fortemente, D, que corresponde a Discordo, N, que

corresponde a Neutro, C, que corresponde a Concordo e CF, que corresponde a

Concordo Fortemente.

O Inventário apresenta três questões finais, em que se questiona o indivíduo

sobre as respostas que solicitou, questionando-o se respondeu a todas as questões de

forma honesta e correta, se respondeu a todas as questões e se colocou as respostas na

área indicada.

2.2.2 Questionário sobre Temas de Carreira(ver anexo II)

O Questionário sobre Temas de Carreira, adaptado e traduzido a partir da técnica

Career Style Interview, de Savickas (1998), por Duarte e Soares (2010), é constituído

por 10 questões de resposta aberta, das quais foram utilizadas quatro (questões 1, 6, 8 e

9), escolhidas atendendo à sua relevância para o presente estudo, constituindo-se como

as quatro questões fundamentais neste estudo para os Temas de Carreira. O questionário

tem como objetivo reconstruir as respostas dos entrevistados de forma a criar um padrão

consistente de significados, transformando as pequenas histórias contadas em cada

questão, numa história única, maior e mais abrangente, sobre a história de carreira do

indivíduo. A primeira questão refere-se aos heróis (reais, fictícios, atuais ou históricos)

que o indivíduo admirava quando era criança ou que admira na atualidade, e que

constitua, para o mesmo, um modelo a seguir; a segunda questão refere-se ao lema ou

mote de vida do indivíduo; a terceira questão refere-se à decisão mais importante que o

indivíduo tomou na vida; a quarta questão solicita o indivíduo para descrever a sua

memória mais antiga.

2.3 Procedimentos

Os participantes foram abordados direta e individualmente, tendo-lhes sido

solicitado a sua colaboração no presente estudo, na perspetiva da obtenção do seu

consentimento informado. Foram explicitadas as instruções de resposta aos

instrumentos utilizados. Dos 74 indivíduos abordados, participaram 55. O processo de

recolha de dados decorreu entre novembro de 2012 e maio de 2013.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

17  

3. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

São apresentados, em seguida, os resultados obtidos a partir das aplicações do

Inventário sobre Adaptabilidade (CAA-S), do Inventário NEO-FFI e do Questionário

sobre Temas de Carreira. Procedeu-se, inicialmente, ao cálculo das medidas de

tendência central, seguindo-se o cálculo de eventuais relações entre as variáveis em

estudo e as variáveis idade, sexo e habilitações literárias. Analisaram-se,

posteriormente, as correlações entre as dimensões da Adaptabilidade de Carreira e as

dimensões do FFM, obtidas através do Coeficiente de Correlação de Pearson e por fim,

utilizaram-se os testes não paramétricos Kruskal Wallis e Mann-Whitney para verificar

possíveis relações entre a variável nominal Temas de Carreira e as variáveis ordinais de

Adaptabilidade de Carreira e de Personalidade.

3.1 Inventário sobre Adaptabilidade

As médias e os desvios-padrão dos itens do Inventário sobre Adaptabilidade,

sugerem, conforme se verifica no Quadro 3.1.1, que a resposta típica para a dimensão

Preocupação foi a resposta Bastante, que variou entre 3.73 e 4.05; a resposta típica para

a dimensão Controlo variou entre a resposta Bastante e Muito, com valores médios

entre 3.76 e 4.53; a resposta típica para a dimensão Curiosidade foi a resposta

Bastante, variando desde 3.56 a 4.02; a resposta típica para a dimensão Confiança foi a

resposta Bastante, variando entre 4.02 e 4.35.

Quadro 3.1.1 – Médias e Desvios-padrão das dimensões do Inventário sobre

Adaptabilidade (amostra total)

Dimensões M DP Min Max

Preocupação 3.88 0.77 3.73 4.05

Controlo 4.09 0.79 3.76 4.53

Curiosidade 3.85 0.80 3.56 4.02

Confiança 4.12 0.77 4.02 4.35

Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (p<.05) relativamente

à Adaptabilidade de Carreira e idade, verificando-se que os participantes entre os 31 e

os 39 anos apresentam resultados mais elevados em Preocupação, Curiosidade e no

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

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resultado total de Adaptabilidade de Carreira do que os participantes entre os 21 e os 30

anos, como se pode observar no Quadro 3.1.2

Quadro 3.1.2 – Comparações entre grupos etários (amostra total) em dimensões

do Inventário sobre Adaptabilidade (teste de Mann-Whitney).

Dimensão Grupo Etário n Média Mann-Whitney

Z Sig.

Preocupação 21 a 30 anos 36 26.47 -2.133 0.033*

31 a 39 anos 19 28.42

Curiosidade 21 a 30 anos 36 26.25 -3.013 0.003**

31 a 39 anos 19 28.47

Resultado total 21 a 30 anos 36 109.25 -2.090 0.037*

31 a 39 anos 19 114.74

*p < .05; **p < .01 Nota: São referidas apenas as dimensões para as quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre o sexo e as

dimensões de Adaptabilidade de Carreira.

3.2 NEO-FFI

Para os itens do Inventário NEO-FFI, as médias e os desvios-padrão sugerem

que a resposta típica para a dimensão Neuroticismo, apresenta uma variação desde o

Discordo até ao Concordo, com valores médios entre 2.31 e 3.91; a resposta típica para

a dimensão Extroversão variou entre a resposta Neutro e Concordo, com valores médios

entre 2.64 e 4.20; a resposta típica para a dimensão Abertura à Experiência variou entre

a resposta Neutro e Concordo, com valores médios entre 2.78 e 4.24; a resposta típica

para a dimensão Amabilidade variou entre a resposta Neutro e Concordo, com valores

médios entre 2.80 e 4.31; a resposta típica para a dimensão Conscienciosidade variou

entre a resposta Neutro e Concordo, com valores médios entre 3.38 e 4.42.

Quadro 3.2.1 – Médias e Desvios-padrão das dimensões do NEO-FFI (amostra

total)

Dimensões M DP Min Max

Neuroticismo 2.83 1.04 2.31 3.91

Extroversão 3.52 0.96 2.64 4.20

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

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Abertura à Experiência 3.06 1.03 2.78 4.24

Amabilidade 3.80 0.93 2.80 4.31

Conscienciosidade 3.85 0.88 3.38 4.42

Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas (p < .05) entre a

idade e o modelo FFM, conforme se pode observar no quadro 3.2.2. Constata-se que os

participantes com idades compreendidas entre os 21 e os 30 anos, apresentam resultados

mais elevados em Amabilidade do que os participantes entre os 31 e os 39 anos de

idade.

Quadro 3.2.2 - Comparações entre grupos etários (amostra total) na dimensão

Amabilidade do NEO-FFI (teste de Mann-Whitney).

Dimensão Grupo Etário n Média Mann-Whitney

Z Sig.

Amabilidade 21 a 30 anos 36 47.00 -2.403 .016*

31 a 39 anos 19 42.79

*p < .05 Nota: São referidas apenas as dimensões para as quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas.

Encontraram-se diferenças estatisticamente muito significativas (p < .01) entre o

sexo e a Amabilidade e o resultado do total de FFM como se pode observar no Quadro

3.2.3, constatando-se que os participantes do sexo feminino apresentam resultados mais

elevados em Conscienciosidade e no resultado total de FFM, do que os participantes do

sexo masculino.

Quadro 3.2.3 - Comparações entre géneros (amostra total) no NEO-FFI (teste de

Mann-Whitney).

Dimensão Género n Média Mann-Whitney

Z Sig.

Conscienciosidade Feminino 34 48.12 -3.029 .002**

Masculino 21 43.00

Resultado total Feminino 34 211.47 -2.106 .035*

Masculino 21 202.57

*p < .05; **p < .01 Nota: São referidas apenas as dimensões para as quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas.

3.3 Questionário sobre Temas de Carreira

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

20  

Relativamente ao Questionário sobre Temas de Carreira e conforme se verifica no

Quadro 3.3.1, a resposta típica para a questão 1 foi categorizada em Familiares/Amigos,

que totalizou 23.6% das respostas dos participantes, seguindo-se a categoria

Personalidade Histórica que totalizou 21.8%, seguindo-se a categoria Personalidade

Real Atual com 18.2% e por fim, com 16.4%, a categoria Personagem Fictícia. 11

participantes não responderam a esta questão; Observa-se que a resposta típica para a

questão 2 foi categorizada em Viver o dia, que totalizou 36.4% das respostas dos

participantes, seguindo-se a categoria Viver por princípios/Valores que totalizou 29.1%

e finalmente a categoria Outros que perfez 27.3% dos participantes. Quatro

participantes não responderam a esta questão;

A resposta típica para a questão 3 foi categorizada em Estudos/Carreira, totalizando

43.6% das respostas dos participantes, seguindo-se a categoria Constituir Família/Amor

com 29.1% e por fim, a categoria Outros com 25.5%. Um dos participantes não

respondeu a esta questão; A resposta típica para a questão 4 foi categorizada em

Família/Segurança/Proteção, totalizando 74.5% das respostas dos participantes,

seguindo-se a categoria Acidente/Incidente com 21.8%. Dois participantes não

responderam a esta questão.

Quadro 3.3.1 – Categorização das respostas às questões 1(1), 2(2), 3(3) e 4(4) do

Questionário sobre Temas de Carreira

Categoria Freq. %

Personagem Fictícia (Questão 1)

Exs. Batman; A Pequena Sereia 9 16.4

Personalidade Real Atual (Questão 1)

Exs. José Mourinho; Felix Cane 10 18.2

Personalidade Histórica (Questão 1)

Exs. Fernando Pessoa; Martin Luther King 12 21.8

Familiares/Amigos (Questão 1)

Exs. Mãe; Professor; Namorado. 13 23.6

Viver o dia (Questão 2)

Exs. Viver um dia de cada vez; Viver o dia a dia, aproveitando o momento. 20 36.4

Viver por princípios/Valores (Questão 2)

Exs. Viver segundo aquilo em que acredito; Lutar pelo que quero mas sem 16 29.1

prejudicar o próximo; Viver por amor e paixão.

Outros (Questão 2)

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

21  

Exs. Viver a vida no limite. Vive e deixa viver. Ter uma boa vida. Saber viver. 15 27.3

Constituir família/Amor (Questão 3)

Exs. Ser mãe; Casar com a mulher que amo. 16 29.1

Estudos/Carreira (Questão 3)

Exs. Ter escolhido ir para a Faculdade. Mudar de empresa de trabalho. 24 43.6

Outros (Questão 3)

Exs. Ter comprado um carro. Ter deixado de fumar. 14 25.5

Família/Segurança/Proteção (Questão 4)

Exs. Brincar na praia com o meu primo. Estar em casa com amigas a

ouvir a chuva a cair. Estar abraçada à minha mãe. 41 74.5

Acidente/Incidente (Questão 4)

Exs. A minha primeira operação. Escorregar de uma árvore e ser 12 21.8

socorrido pela minha irmã.

(1)“Refira a pessoa ou personagem (real, fictícia, atual ou histórica) que admirava quando era criança, ou que admira na atualidade, e que constitua para si um modelo a seguir. O que admira nessa pessoa?” (44 respostas em 55 participantes).

(2)“Qual é o seu lema ou mote de vida? (Pode ser você próprio a inventá-lo). Que comentário lhe suscita este lema de vida?” (51 respostas em 55 participantes).

(3) “Qual foi a decisão mais importante da sua vida (tomada por si)? Porque tomou essa decisão?” (54 respostas em 55 participantes).

(4)“Descreva a sua mais antiga memória (o primeiro episódio ou acontecimento de que tem memória). Escreva um breve título para essa memória.” (53 respostas em 55 participantes).

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas nas variáveis

idade e sexo relativamente aos Temas de Carreira.

3.4. Inventário sobre Adaptabilidade, NEO-FFI e Questionário sobre Temas

de Carreira

Relativamente aos coeficientes de correlação entre as dimensões da Adaptabilidade

de Carreira e as dimensões do FFM é possível, observar, no Quadro 3.3.1, que a

dimensão Conscienciosidade apresenta uma correlação estatisticamente muito

significativa (p<.01) com todas as dimensões de Adaptabilidade de Carreira, assim

como com o resultado total de Adaptabilidade, variando entre (.37) e (.51); a

Extroversão apresenta uma correlação estatisticamente muito significativa (p<.01) com

o Controlo, com a Confiança e com o resultado total de Adaptabilidade, variando entre

(.36) e (.49); a Abertura à Experiência apresenta uma correlação estatisticamente

significativa (p<.05) com a Curiosidade, com a Confiança e com o resultado total de

Adaptabilidade, variando entre (.31) e (.34); a Amabilidade não apresenta correlação

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

22  

estatisticamente significativa com nenhuma das dimensões de Adaptabilidade; por fim,

o resultado total do FFM apresenta correlações estatisticamente muito significativas

(p<.01) com as dimensões Controlo, Curiosidade, Confiança e o resultado total de

Adaptabilidade e apresenta correlações estatisticamente significativas (p<.05) com a

dimensão Preocupação, variando entre .31* e .46**.

Quadro 3.4.1 – Correlações entre as dimensões de Adaptabilidade de Carreira e as

dimensões do FFM (amostra total).

Dimensões de Adaptabilidade

Preocupação Controlo Curiosidade Confiança Resultado total

Neuroticismo -.03 -.23 .05 -.20 -.14

Extroversão .25 49** .26 40** .36**

Dimensões Abertura à Experiência .11 . 24 33* .34* .31*

Do FFM Amabilidade -.02 04 .00 20 .04

Conscienciosidade .48** . 46** 37** .51** .45**

Resultado total 31* .36** 40** .46** .38**

*p < 0.05; **p < 0.01

Relativamente às dimensões de Adaptabilidade e aos Temas de Carreira, não se

encontram diferenças estatisticamente significativas quer para a questão 1, 2 ou 3.

Relativamente à questão 4 dos Temas de Carreira, observam-se diferenças

estatisticamente muito significativas (p < .01) e significativas (p < .05), em que se

verifica, respetivamente, que os participantes cujas respostas cotam na categoria

Acidentes/Incidentes das memórias mais antigas, apresentam resultados mais elevados

em Controlo e no resultado total de Adaptabilidade do que os participantes que cotam

na categoria Família/Segurança/Proteção, como se pode observar no Quadro 3.4.2.

Quadro 3.4.2 – Teste de Mann-Whitney no Inventário sobre Adaptabilidade e na

questão 4 do QTC (n=53).

Dimensão Questão 4 n Média Man-Whitney

Z Sig.

Controlo Fam./Seg./Prot.1 41 27.80 -2.275 .023*

Acid./Incid.2 12 30.75

Escala Completa Fam./Seg./Prot. 41 108.61 -2.000 .046*

Acid./Incid. 12 116.58

*p < .05 Nota: São referidas apenas as dimensões para as quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

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1 Família/Segurança/Proteção 2 Acidente/Incidente

Relativamente às dimensões do FFM e aos Temas de Carreira encontraram-se

diferenças estatisticamente significativas (p < .05) para a questão 1 (Quadro 3.4.3).

Assim, os participantes que referem como modelo uma Personalidade Real Atual

apresentam resultados mais elevados em Amabilidade do que os participantes que

referem como modelo uma Personalidade Histórica. Do mesmo modo, os participantes

que escolhem Familiares/Amigos apresentam resultados mais elevados em Amabilidade

do que os participantes que escolhem a Personalidade Histórica.

Quadro 3.4.3 – Teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney na dimensão

Amabilidade do NEO-FFI e na questão 1 do QTC (n=44).

Dimensão Questão 1 n Média Kruskal-Wallis Man-Whitney

X2 Sig. Comparação Z Sig.

P. Fictícia1 (1) 9 45.89 9.28 .026* (1) – (2) -.53 .59

Amabilidade P. Real Atual2 (2) 10 46.50 (1) – (3) -1.71 .09

P. Histórica3 (3) 12 42.83 (1) – (4) -1.64 .10

Fam./Amig.4 (4) 13 48.54 (2) – (3) -2.12 .03*

(3) – (4) -2.57 .01*

*p < .05 1 Personagem Fictícia 2 Personalidade Real Atual 3 Personalidade Histórica 4 Familiares/Amigos

Nota: São referidas apenas as dimensões para as quais foram encontradas diferenças estatisticamente significativas

Na questão 4 dos Temas de Carreira, encontram-se diferenças estatisticamente

significativas (p <. 05) para a Extroversão, como se pode verificar no Quadro 3.4.4

Constata-se que os indivíduos cujas respostas cotam na categoria Acidentes/Incidentes

das memórias mais antigas, apresentam resultados mais elevados em Extroversão do

que os indivíduos que cotam na categoria Família/Segurança/Proteção.

Quadro 3.4.4 – Teste de Mann-Whitney na dimensão Extroversão do NEO-FFI e na

questão 4 do QTC (n=53).

Dimensão Questão 4 n Média Man-Whitney

Z Sig

Extroversão Fam./Seg./Prot. 41 41.27 -2.93 .003**

Acid./Incid. 12 46.17

**p < .01 Nota: é referida apenas a dimensão para a qual foram encontradas diferenças estatisticamente significativas.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

24  

2. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

São apresentados e discutidos, em seguida, os principais resultados obtidos neste

estudo:

Os indivíduos com idades compreendidas entre os 31 e os 39 anos apresentam

resultados mais elevados nas dimensões Preocupação, Curiosidade e no resultado total

de Adaptabilidade do que os indivíduos com idades compreendidas entre os 21 e os 30

anos. Este aspeto, se na dimensão Preocupação se torna, relativamente entendível, tendo

em conta a fase de Estabelecimento (entre os 25 e os 44 anos), do ciclo de vida do

indivíduo (Super, 1990), concretamente a subfase Consolidar, onde o indivíduo mostra

preocupação na procura de segurança no trabalho, bem como a subfase Promover, onde

o indivíduo tem a preocupação de procurar autonomia e aumento do nível financeiro;

por outro lado, contrariamente ao que se poderia esperar, a dimensão Curiosidade não

mostra maior impacto na faixa etária mais jovem. Isto pode estar ligado ao facto de a

fase de Exploração (Super, 1990), ter o seu início na adolescência, por volta dos 15

anos, estendendo-se até ao início da idade adulta, 24 anos.

Repare-se que a amostra deste estudo foi dividida em duas categorias: dos 21 aos

30 anos e dos 31 aos 39 anos não sendo, estas, categorias correspondentes às das fases

de desenvolvimento de Donald Super. Outra explicação, poderá estar relacionada,

novamente, com a fase de Estabelecimento, prendendo-se com o facto de que, de forma

a progredir na carreira, é importante que o indivíduo continue a planear e a explorar

oportunidades, dentro e fora da organização havendo, assim, relevo para a dimensão

Curiosidade.

Relativamente à dimensão Amabilidade, os indivíduos da faixa etária mais jovem

(21 a 30 anos) apresentaram resultados mais elevados do que os indivíduos entre os 31 e

os 39 anos. Este resultado não corrobora estudos anteriores, que defendem que os

indivíduos de meia-idade evidenciam um maior nível de empatia quando comparados

com indivíduos jovens adultos e com indivíduos da terceira-idade (O’Brien et. al.,

2012). Relativamente à dimensão Conscienciosidade e ao resultado total do FFM, os

participantes do sexo feminino apresentam resultados mais elevados do que os

participantes do sexo masculino. Este resultado está de acordo com estudos como o de

Feingold (1994) e Costa et al., (2001) que verificaram resultados mais elevados das

mulheres, relativamente aos homens, em algumas facetas da dimensão

Conscienciosidade, como a Organização, Deveres e Auto-disciplina.

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

25  

O padrão de correlações observado entre a Adaptabilidade e o FFM é, de um

modo geral, consistente com as expectativas do estudo. Era esperado que a

Conscienciosidade e Abertura à Experiência fossem as dimensões com maior relação

com as dimensões da Adaptabilidade. Por conseguinte, a dimensão Conscienciosidade,

destaca-se como a dimensão mais positivamente correlacionada com as dimensões de

Adaptabilidade, principalmente com a Confiança (.51) e com a Preocupação (.48),

seguindo-se a relação com o Controlo (.46) e mais moderadamente com a Curiosidade

(.37). Estas correlações vêm enfatizar o estudo de Barrick & Mount (1991) que destacou

a Conscienciosidade como a dimensão mais consistentemente relacionada com o

desempenho profissional, o que pressupõe uma pré-disposição do indivíduo para melhor

se adaptar profissionalmente.

Neste estudo, a Extroversão mostrou uma correlação positiva maior com as

dimensões de Adaptabilidade, especificamente com o Controlo (.49) e a Confiança

(.40), do que a Abertura à Experiência, que mostrou correlações moderadas com a

Confiança (.34) e com a Curiosidade (.33). Estes resultados vão, parcialmente, ao

encontro do que era esperado; os indivíduos extrovertidos são, consequentemente,

indivíduos sociáveis, que facilmente assumem papéis de liderança, que só podem ser

atingidos por indivíduos confiantes, isto é, por indivíduos com níveis elevados de

autoestima e auto-eficácia. Foi encontrada uma correlação positiva entre a Extroversão e

o Controlo que pode ser compreensível, uma vez que os indivíduos extrovertidos

tendem a ser dominantes, ambiciosos e assertivos, características que estão ligadas ao

Controlo, conferindo aos indivíduos a sensação de auto-governação e decisão. Não foi

encontrada correlação entre a Extroversão e a Curiosidade.

Em relação à Abertura à Experiência, foi possível confirmar a sua correlação

positiva com a Curiosidade (.33) e com o resultado total de Adaptabilidade (.31) tendo-

se, ainda, observado um dado adicional: uma correlação positiva e moderada da

Abertura à Experiência com a Confiança (.34). Este resultado pode ser compreendido se

se entender que os indivíduos abertos a novas experiências terão, naturalmente,

sentimentos de auto-eficácia relativamente às suas aptidões para executar, com sucesso,

um curso de ação necessário, culminando no ato de o indivíduo se permitir, aventurar,

numa direção nova. O resultado total do FFM correlacionou-se positivamente (p < .01)

com as dimensões de Adaptabilidade: Confiança (.46), Curiosidade (.40), resultado total

de Adaptabilidade (.38) e Controlo (.36) tendo-se, ainda, correlacionado positivamente

(p < .05) com a Preocupação (.31).

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

26  

Relativamente aos Temas de Carreira, verificou-se que os indivíduos cujas

respostas cotam na categoria Acidente/Incidente da memória mais antiga, apresentam

resultados mais elevados na dimensão Controlo e no resultado total de Adaptabilidade,

do que os indivíduos cujas respostas cotam na categoria Fam./Seg./ Prot. Este resultado

é compreensível se se tiver em conta que, na presente amostra, os indivíduos que

referem como memória Acidente/Incidente apresentam, eventualmente, uma maior

tendência e necessidade de auto-disciplina, sensação subjetiva de auto-governação,

estando mais alerta para os processos de conscienciosidade, deliberação, organização e

decisão no desempenho de tarefas, característicos da dimensão Controlo. Relativamente

à questão 1 do Questionário sobre Temas de Carreira, verificou-se que tanto os

indivíduos que referem como modelo uma Personalidade Real Atual, como os

indivíduos que referem como modelo Familiares/Amigos, apresentam resultados mais

elevados na dimensão Amabilidade do FFM do que os indivíduos cujas respostas cotam

na Personalidade Histórica. Este resultado sugere que, na presente amostra, indivíduos

que referem como modelo uma Personalidade Atual, ou uma pessoa que lhes é familiar,

poderão identificar-se em maior nível, com o contexto sócio-económico atual, tornando-

os mais recetivos ao mundo, às vivências e às personalidades atuais comparativamente

aos indivíduos que referem como modelo uma Personalidade Histórica que,

eventualmente, poderão apresentar maior identificação com uma época passada e assim

revelar maior inflexibilidade, com uma menor cooperação, gentileza e confiança,

características típicas da dimensão Amabilidade.

Na questão 4 do Questionário sobre Temas de Carreira, os indivíduos cujas

respostas sobre a memória mais antiga cotam na categoria Acidente/Incidente,

apresentam resultados mais elevados na dimensão Extroversão do FFM, do que os

indivíduos cujas respostas cotam na categoria Fam./Seg./Prot. Este resultado pode

apontar para o facto de que, na presente amostra, tendo em conta que os indivíduos com

respostas categorizadas em Acidente/Incidente apresentam resultados mais elevados em

Controlo do que os indivíduos com respostas categorizadas em Fam./Seg./Prot. e tendo

em conta que, na presente amostra, as dimensões Controlo e Extroversão são as

dimensões que apresentam maior correlação positiva (.49) é de esperar: que os

indivíduos que referem como memória Acidente/Incidente apresentem, eventualmente,

uma maior tendência e necessidade de auto-disciplina, conscienciosidade, deliberação,

organização e decisão no desempenho de tarefas, características típicas da dimensão

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Carreira, Adaptabilidade e Personalidade

27  

Controlo que, por sua vez, estão relacionadas com indivíduos ambiciosos, dominantes e

assertivos, características da dimensão Extroversão.

As diferenças estatisticamente significativas observadas entre as medidas de

Personalidade, de Adaptabilidade, e a frequência das categorias encontradas para os

Temas de Carreira sugerem tratar-se de um domínio de estudo que importa prosseguir,

no sentido de aprofundar a compreensão da interacção entre esta tríada de indicadores

das três componentes da Teoria da Construção da Carreira, o quê, o como e o porquê

(Savickas, 2002, 2005). Até ao momento, variados estudos empíricos têm sido

realizados, sobretudo no âmbito da relação entre medidas da Adaptabilidade e outras,

como, por exemplo, medidas de Personalidade (Teixeira et. al, 2012).

Contudo, a integração, de indicadores no âmbito dos Temas de Carreira é ainda

escassa, tornando ainda mais relevante a realização de estudos exploratórios que

integrem esta componente narrativa, necessária ao entendimento do sentido imprimido

ao quê e ao como, enfim, necessária a uma perspetiva integrada da construção da

vida/carreira.

Por outro lado, o facto de não se terem encontrado relações ao nível da idade ou do

sexo no Questionário sobre Temas de Carreira, nem ao nível das habilitações literárias

para o Inventário sobre Adaptabilidade, para o NEO-FFI, ou para o Questionário sobre

Temas de Carreira, vem sugerir que os resultados encontrados podem estar

condicionados a algumas limitações do presente estudo: a amostra apresenta um número

de participantes relativamente reduzido; o estudo é transversal e realizado com uma

amostra de conveniência.

As questões analisadas no presente estudo apresentam relevância para investigação

mais aprofundada, dada a atual conjuntura sócio-económica. Por outro lado seria

importante no futuro, analisar a relação entre os indicadores de Adaptabilidade,

Personalidade e Temas de Carreira com recurso a uma amostra de maior dimensão, num

estudo de natureza longitudinal, de modo a possibilitar a replicação e a descrição, com

maior detalhe, da interação entre a Adaptabilidade, a Personalidade e as histórias

narradas a partir dos Temas de Carreira, no indivíduo, ao longo do ciclo de vida.

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