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CARROS DE ASSALTO: SEU PRIMEIRO COMANDANTE NO BRASIL - 1921 João Marcos Macedo Louro 1 , Bacharel em História pela UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF. [email protected] RESUMO: Esta monografia analisa a atuação do oficial José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque durante seu comando na Companhia de Carros de Assalto, primeira unidade mecanizada, blindada, do Brasil e seu exército, no período de 1921 a 1923. Esta monografia analisa as situações ocorridas durante a compra do seu material (os carros de combate), sua introdução na força brasileira e sua capacitação como organização militar, aos olhos de sue primeiro comandante, que foi também responsável pela aquisição de seu material, e recebeu instrução do exercito francês após lutar em suas fileiras durante a Primeira Guerra Mundial. Meu objetivo é mostrar o papel deste oficial na inclusão do elemento mecanizado no exército de nosso país, usando suas memórias e um livro escrito por ele a respeito deste tema. 1 Texto extraído da Monografia apresentada pelo autor ao Departamento de História da Universidade Federal Fluminense para obtenção do Grau de Bacharel em História, 1º semestre de 2008. Professor orientador: Luis Felipe da Silva Neves. Eixo Cronológico: Contemporâneo. Eixo Temático: Poder e Idéias Políticas.

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CARROS DE ASSALTO:

SEU PRIMEIRO COMANDANTE NO BRASIL - 1921

João Marcos Macedo Louro1, Bacharel em História pela UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF.

[email protected] RESUMO: Esta monografia analisa a atuação do oficial José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque durante seu comando na Companhia de Carros de Assalto, primeira unidade mecanizada, blindada, do Brasil e seu exército, no período de 1921 a 1923. Esta monografia analisa as situações ocorridas durante a compra do seu material (os carros de combate), sua introdução na força brasileira e sua capacitação como organização militar, aos olhos de sue primeiro comandante, que foi também responsável pela aquisição de seu material, e recebeu instrução do exercito francês após lutar em suas fileiras durante a Primeira Guerra Mundial. Meu objetivo é mostrar o papel deste oficial na inclusão do elemento mecanizado no exército de nosso país, usando suas memórias e um livro escrito por ele a respeito deste tema.

1Texto extraído da Monografia apresentada pelo autor ao Departamento de História da

Universidade Federal Fluminense para obtenção do Grau de Bacharel em História, 1º semestre de 2008. Professor orientador: Luis Felipe da Silva Neves. Eixo Cronológico: Contemporâneo. Eixo Temático: Poder e Idéias Políticas.

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1 -O MOEDOR DE CARNE NÃO MOE MOEDAS 2:

“A l l t o g e t h e r n ow . A l l T o g e t h e r n ow .

A l l t o g e t h e r n ow , i n n o ma n ’ s l a n d ”

( L e t r a d a mú s i c a A l l t o g e t h e r n ow , d a b a n d a T he F a rm . ) .

1 . 1 -Fogo e l ama:

O i n i c i o d a p r ime i r a Gue r r a Mund i a l t o rnou -s e p a ra mu i t os h i s t o r i ado r es o marco que se rv iu p a r a f e cha r o s écu l o XIX e i n i c i a r o s écu lo XX. In i c i ado com um a t en t ado con t r a a v ida d e uma pe s soa (O herde i ro do t r ono do an t i go Impé r io Aus t ro -Húnga ro , o Arqu iduque Fr anc i s co Ferd i nando ) , que d e tonou en t ão vá r i a s a çõe s e r e ações po l í t i c a s , a ma io r i a d e t eo r ag r e s s ivo ou be l i coso , o s p a i s es eu ropeu s f o r am ameaçando uns ao s ou t ros , a t i vando suas a l i anças m i l i t a r es p a r a f aze r em o mesmo . Na r e ação em cade i a que s e s egu iu a gue r ra a cabou po r s e r d ec l a r a n a Eu ropa . Vár io s m i lhões acaba r i am mor to s n a s eqüênc i a do s even t os .

De 28 de j unho a 4 d e ago s t o d e 1914 , a s duas a l i ança s f o rmadas mob i l i z a r am suas t r opa s : As po t ênc i a s c en t r a i s , a T r íp l i c e Al i ança f o rmada en t r e Al emanha , Impé r io Aus t ro -Húnga ro e I t á l i a ( que mai s t a rde s a i r i a d es s a a l i ança ) ; a T r í p l i ce En t en t e , f o rmada po r Ing l a t e r r a , F r ança e o Impé r i o Russo 3.

A 4 d e ago s to de 1914 , a Al emanha i nvad i a a Bé l g i ca , cumpr i ndo s eu P l ano de Gue r r a – O P l ano Sch l i e f f en – que v i s ava f l anquea r a F r ança a t r avé s d e Bé l g i ca e Ho l anda , t omar P a r i s e b a t e r o s f r ances e s em 40 d i as . Os f r ance s es r e sponde r am l ançando s eus d i s po s i t i vos no P l ano XVII , a t a cando a Al emanha a t r avé s d a A l s ác i a e d a Lo rena a 8 d e ago s to , que f r a ca s s a r i a . O r esu l t ado de t odo es s e p r ime i ro mov imen to f o i a F r ança s e r r epe l id a , a A l emanha man t e r s eu avanço , embo ra n ão den t ro do p r azo e spe rado , e a expec t a t i v a d e que a guer r a t e r i a um f im r áp ido , an t e s do Na t a l d e 1914 , como t odos o s m i l i t a r es d e ambos o s l ado s a c r ed i t avam .

Mas a s i t u ação mudou . Po r mod i f i c açõe s no p l ano a l emão , e d ev i do a v á r i a s s i t u ações i n espe r adas po r e l e – l en to t r an spo r t e d e t r opas e sup r imen tos a t r avé s do t e r r i t ó r io i nvad i do , r e s i s t ênc i a i n im iga Be l ga , ma io r do que a e spe rada , r emoção de t r opas p a r a f r en t e Or i en t a l , mudanças no P l ano Sch l i e f f en o r ig i n a l – a O fens iva f o i p e rdendo fo r ça e e f e i t o , s endo f i n a lmen t e i n t e r rompida po r um con t r a - a t aque do s exé r c i t o s d a En t en t e em 5

2 O título é relacionado ao surgimento do “tank” na Primeira Guerra Mundial. O titulo é uma alusão aos massacres contínuos ocorridos ao se expor a infantaria ao poder de fogo crescente da metralhadora e do canhão de tiro rápido. A moeda seria o blindado. 3 A respeito da mobilização dos exércitos e do jogo político que levou às declarações de guerra, uma boa descrição dos acontecimentos é Tuchman, Bárbara. Canhões de Agosto, Bibliex, 1998.

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s e t embro de 1914 , n a Ba t a l h a do Marne , onde os A l emães s o f r e r am s eu p r imei ro r evé s s é r i o 4.

En t r e 14 de s e t embro e 17 de novembro do mesmo ano , ambos o s ex é r c i t o s t en t a r am s e f l anquear , em d i r e ção ao Cana l da Mancha , no que a cabou conhec i do como a Cor r i d a p a ra o Mar , que cu lminou na p r ime i r a b a t a l h a d e Ypre s . Ao f i na l d e l a , s em que nenhum exé r c i t o cons egu i s s e uma manobra s i gn i f i c a t i v a d e f l anco ao adve rs á r i o , f i ca r am ambos f r en t e a f r en t e , com sua s t ropas en t r i n che i r ando -s e p a r a pode r em s e p ro t ege r do f ogo in imigo . Acabava nes se momen to a f a s e conhec ida como Gue r r a de Mov imen to , i n i c i ando- s e a f a s e que ma rca r i a a P r imei r a Gue r ra Mund i a l : a f a s e da Gue r r a d e Tr in che i r a s .

1 .2 - Impass e :

Os Impé r i os eu ropeu s en t r a r am em uma gue r r a p a r a a qual n ão es t avam p r epar ados , ao menos não na men t a l i d ade dos s eu s t eó r i co s mi l i t a r es . As mudanças p ropo rc i onadas pe lo s novos equ i pamen tos mod i f i c a r am a v i s ão que an t es ex i s t i a sob r e o que a con t ec i a em um campo de b a t a lh a . Como d i z J ohn Keegan :

A P r ime i r a G u e r r a Mund i a l f o i uma g u e r r a d e t r i n c h e i r a s . O s ú b i t o a ume n t o d o p o d e r d e f o go , p r o vo c a d o p e l o s f u z i s d e r e p e t i ç ã o , p e l a me t r a l h a d o r a e p e l a a r t i l h a r i a d e t i r o r á p i d o no c ome ço d o s é c u l o XX , f o r ç o u t o d o s o s e x é r c i t o s d a E u r o p a , t ã o l o go s e e n c o n t r a r am em c amp o s d e b a t a l h a em a g o s t o d e 1 9 1 4 , a c a v a r p a r a s o b r e v i v e r . [ . . . ] Em p o u c o t empo , t o d o s o s e x é r c i t o s c r i a r am s i s t ema s d e t r i n c h e i r a s s eme l h a n t e s , a s s im c omo s im i l a r e s r o t i n a s d e t r i n c h e i r a s . A l i n h a d o f r o n t , p r o t e g i d a p o r um ema r a n h a d o d e a r ame f a r p a d o , t i n h a uma l i n h a d e a p o i o p a r a l e l a a a l g uma s c e n t e n a s d e me t r o s d a r e t a g u a r d a , a l ém d e uma l i n h a d e r e s e r v a ma i s a t r á s . [ . . . ] A T e r r a d e n i n g u ém e n t r e a s l i n h a s d e f r o n t o p o s t a s p o d i a me d i r d e me n o s d e 5 0 me t r o s a t é q u a s e me i o q u i l ôme t r o d e l a r g u r a . ( K e e g a n , 2 0 0 4 , p g . 2 0 8 ) .

Pa r t i cu l a rmen t e , a combinação me t ra lh ado ra / t r i n che i r a / a r ame

f a rpado , t o rnava p r a t i c amen t e imposs ív e l p a r a a i n f an t a r i a , p e l o menos ex t r emamen t e d i f í c i l , a t a r e f a d e r e a l i z a r um a t aque que pudess e sub juga r o i n im igo . E a inda mai s s e fo s s e con s t i t u í do e s s e a t aque de um as s a l t o f ron t a l , em ondas d e s o l dados co r r endo em pé , que e r a uma t á t i c a comum em ambos os exé r c i t o s em 1914 . Mesmo com a a r t i l h a r i a , que ganhou p r edominânc i a n es s a gue r r a , a s t r opa s en f r en t avam in imigos a inda o rgan iz ados e s o f r i am s eve ra s b a ixas ( p a r t i cu l a rmen t e s e en f r en t as sem o s a l emães , que c avavam suas t r i n che i r as me lho r e ma i s f undo , t an to em p ro fund i dade no so l o quan to no campo de b a t a l h a ) .

O mas s ac r e e r a óbv io , e a s s im ocor r eu . Todas a s ba t a l h as o co r r id a s no f ron t Oc iden t a l a cabavam - p e l o menos a t é 1917 – em g r andes b a ix as , t an to p a r a o l ado que a t a cava quan to pa r a o l ado de f enso r . O impass e as s im fo rmado l evou a uma e s t agnação das f r en t e s de b a t a lh a ( ou f ron t s ) , com t r i n che i r as que i am

4 Para melhor entender essa primeira manobra da primeira grande guerra, ver Keegan, John. Agosto de 1914. Irrompe a Grande Guerra. Renes, 1978.

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v i r t u a lmen te do Cana l da Mancha à f r on t e i r a d a Su í ça , e cons equen t emen t e a uma t e r r í v e l e cus to s a gue r ra d e a t r i t o .

1 .3 -So lução :

Em ambos o s l ado s b e l i ge r an t e s s e bus ca r am uma so l ução pa r a es s e impass e . Como E r i c Hobsbawn 5 d e ix a no s eu r e l a t o s ob r e a p r ime i r a gue r r a , em s eu l i v ro s ob r e o s écu lo XX, a P r imei r a Gue r r a Mund i a l pa s sou a s e r uma gue r r a d e p rodução indu s t r i a l ( gue r r a de ma t e r i a l ) , e t ambém t ecno lóg i ca . A ên f as e d ada a e s s as duas á r ea s pon t uou a e s t r a t ég i a d e t odos o s p a í s e s , em e spec i a l a In g l a t e r r a e a Alemanha , que v i s avam b loquea r uma a ou t r a o a ce s so d e suas i ndús t r i a s à s á r eas p rodu t o r a s d e maté r i a -p r ima v i t a l ao es fo r ço de gue r r a , n as t en t a t i va s d e b loque i o e conômico .

Do pon to d e v i s t a t e cno l ógi co , bu s cou -s e a t e cno log i a p r in c i p a lmen t e pa ra a l t e r a r a s i t u ação ex i s t en t e nos t e a t r os d e ope r ação 6. Os Al emães d es envo lve r am o gá s , com v i s t a a d e s a l o j a r o i n imigo de s ua s t r i nche i r as , s endo po s t e r i o rmen t e imi t ados ne s s a i d é i a p e l os s eu s i n im igos .

J á o s Br i t ân i cos e F r ances e s t en t a r am , en t r e ou t r as i dé i as , uma que s e r eve l a r i a r evo l uc i oná r i a pa r a o s écu lo XX, em mat é r i a d e u so mi l i t a r : o Tanque , ou Ca r ro d e Comba t e .

Ou t r o p a s s o p a r a r e s o l v e r o p r o b l ema d a imo b i l i z a ç ã o c o n s i s t i a [ . . . ] n o d e s a rmame n t o d o d e f e n s o r , t o r n a n d o i n e f i c a z e s s e u s f u z i s e me t r a l h a d o r a s . I s t o p o d e r i a s e r c o n s e g u i d o p r o t e g e n d o o a t a c a n t e c om um e s c u d o à p r o v a d e b a l a s e c om d ime n s õ e s s u f i c i e n t e s p a r a c o b r i r s e u c o r p o q u a n d o s e d e s l o c a s s e . Como s e r i a mu i t o p e s a d o p a r a o h omem t r a n s p o r t a r , t e r i a q u e s e r mo n t a d o s o b r e uma v i a t u r a a u t o p r o p u l s a d a , a q u a l n e c e s s i t a r i a t amb ém s e r b l i n d a d a . C omo e s t a v i a t u r a t e r i a q u e d e s l o c a r - s e a t r a v é s d e c amp o s d e b a t a l h a c o b e r t o s d e t r i n c h e i r a s , t e r i a q u e s e r d o t a d a d e l a g a r t a s n o l u g a r d e r o d a s . E s t a s t r ê s c o nd i ç õ e s l e v a r am à a d o ç ã o d o C a r r o d e c omb a t e , p e q u e n a f o r t a l e z a mó v e l , o u c omo f o i i n i c i a lme n t e d e nom i n a d o , “ n a v i o t e r r e s t r e ” . ( F u l l e r , 1 9 6 6 , p g . 1 6 5 )

Es s a fo i a exp l i c ação dada p e lo au to r J . F .C . Fu l l e r sob re o r a c io c ín i o que l evou homens como o Co rone l E rn s t Swin ton , o p r in c i p a l i d ea l i z ado r do “ t ank” b r i t ân i co , a bus ca r n a t e cno l og ia i ndus t r i a l a s o lução pa r a r e tomar a su rp r es a t á t i c a e a mob i l i d ade de a ção de s eu s exér c i t o s .

O nome é d e r iv ado da exp l i c ação que os i ng l e s es d avam aos ope r á r io s que t r aba lhavam no p r imei ro p ro j e t o do s ca r ro s de

5 Além de Hobsbawn, vários autores que estudaram a primeira guerra observaram que foi a primeira guerra de material, de produção industrial da história. Marc Ferro, J.F.C. Fuller e Basil Liddell Hart são entre eles. O próprio Erich Ludendorff, comandante alemão, foi um dos homens que previu a nova importância desta “guerra”, denominada por ele materialschlaft, guerra de material. A importância de manter uma grande produção para equipar grandes exércitos passou a ser vital na estratégia. 6 A respeito da importância da tecnologia, ver Liddell Hart, Basil. The Revolution in Warfare, Yale University Press, 1947. Também a respeito da evolução tecnológica das armas, Jones, Archer. The Art Of War on Western World, Oxford Press, 1998. E também um apanhado geral mais recente, nos primeiros capítulos da obra de Liang, Qiao e Xiangsui, Wang. Unrestricted Warfare, PLA Literature and Arts Publishing House, 1999.

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comba t e b l i ndados : e l e s d i z i am que e s t avam s endo cons t ru í dos r e s e rva t ó r i os d e combus t ív e l , ou “ t anks” . F i cou o nome “Tank” . As s im , os b r i t ân i cos cons t r u í r am o s p r ime i ros c a r ros d e combat e .

Os F r ances es t i v e ram a mesma i d é i a p r a t i c amen te ao mesmo t empo . Ao invés d e t r aba lha r em em um p ro j e to un i f i cado , o s a l i ado s r eso l ve r am t e r c ada um s eu p ro j e t o .

Os b r i t ân i co s con s t r u í r am o Mark I , um t anque g r ande , d e f o rma to r omboida l , com uma g r ande e s t e i r a d e l aga r t a co r r endo a t r avé s do c a r ro , e a rmamen to embasado na s l a t e r a i s . Con t a r am ba s i c amen t e com e l e po r t oda a gue r r a , apenas ape r fe i çoando -o p a r a melho r a r sua con f i ab i l i d ade no campo de ba t a lha . Cons t ru í r am um ve í cu lo mai s l eve chamado Whippe t , ma i s r áp ido e menos b l i ndado , p a r a i n f i l t r a ção , em con j un to com a c ava l a r i a .

Os f r ance se s , che f i ado s n e s s a p esqu i s a p e l o co rone l ( depo i s gene r a l ) E s t i enne , c r i a r am do i s mode lo s d e g r ande po r t e que e ram capaz es d e c ruz a r t r i nche i r as e e r am bem a rmados , mas e r am l en to s d emai s e queb ravam f ac i lmen t e ; e r am o s mode los Sa in t -Chammond e Schne ide r . Mas e r am mode lo s d e “ . . . i d é i a mui to r ud imen t a r . ( . . . ) No u l t imo ano da gue r r a e l es qua se que fo r am comp l e t amen t e b an i do s dos c ampos de b a t a l ha” (Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC-FGV) .

Ao f i n a l d e vá r ios mode lo s , o s f r ance s es ap r es en t a r am-se melho r com um mode lo meno r , o Renau l t FT -17 , um t anque l eve , o ma i s p roduz ido po r e l e s . Seu des enho t i nha como r evo luc i oná r i o a t o r r e g i r a t ó r i a , que p e rmi t i a d i spa r a r s uas a rmas em qua l que r a l vo ao r edo r do c a r ro . Fo i u s ado p r in c ip a lmen t e no a companhamen to e s upo r t e d a i n f an t a r i a . Acabou s endo o me lho r t anque l eve da p r ime i r a Gue r r a Mund i a l , s endo u t i l i z ado po r vá r i os p a í s e s pos t e r io rmen t e , i nc l us i v e o s Es t ados Un idos da Amér i ca e o Bra s i l 7.

Uma nova t e cno l og i a chega ao c ampo de b a t a lh a ; mas a chegada do “ t anque” ao f ron t n ão e r a a s imp l es so lução do p rob lema do impas s e t á t i co d a s t r i n che i r as . Como c i t am vá r io s au to r es , uma nova t e cno l og i a adv i nda ao campo de b a t a l h a r eque r t odo um novo pen samen to no campo da t á t i c a e d a es t r a t ég i a . Nas p a l av r as d e Marc Fe r ro :

A f a l t a d e e s p í r i t o c i e n t í f i c o , a s ub e s t ima ç ã o d o q u e é t é c n i c o , a i g n o r â n c i a a b s o l u t a d a r e l a ç ã o q u e e x i s t e e n t r e o s c o n he c ime n t o s d e uma é p o c a , a s p o s s i b i l i d a d e s i n d u s t r i a i s e a p r á t i c a d a g u e r r a , c a r a c t e r i z am a me n t a l i d a d e d a q ue l e s q u e t i n h am a r e s p o n s a b i l i d a d e d e c o nd u z i r a s o p e r a ç õ e s m i l i t a r e s . ( F e r r o , 1 9 6 9 , p g . 1 5 3 )

A o f i c i a l i d ade , p r in c ip a lmen t e os gene r a i s ma i s g r aduados ,

e s t ava em f ace d e uma gue r r a nunca imag inada po r e l e s , i s so a inda an t es d e s e u t i l i z a r t anques e av i ões em ma io r e s ca l a . Como d i s s e

7 Sobre os Blindados, vários livros podem ser encontrados, mas para rápida leitura sobre esse período é recomendável Orgill, Douglas. Tanques-1918, Editora Renes, 1978.

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Lo rde Ho ra t io He rbe r t K i t chene r , o Min i s t r o d a Gue r r a Br i t ân i co : “ Is t o n ão é gue r r a” 8.

Na p r imei r a apa r i ç ão dos “ t ank s” , em 15 de s e t embro de 1916 , du r an t e a o f en s iv a do Somme, os “ t anks” a t é t i v e r am a s u rp r es a i n i c i a l e a t e r ro r i z a r am o s adve rs á r i o s , mas queb ra r am , a ma io r i a po r d e f e i t o t é cn i co . Fo i um ba l de d e água f r i a n a s e spe ranças dos c r i ado r es do “ t ank” . Os c a r ros d e combate a cabar am r ecebendo des c r éd i to a t é mesmo dos so ldados que l u t avam com e l es .

Mas nem t odos fo r am a f e t ados po r i s s o . O p róp r i o J ohn F r ede r i ck Cha r l es Fu l l e r e r a exemp lo d i s so . Quando v i u um “ t anque” p e l a p r ime i r a v ez , e l e p en sou t e r “ r eso lv ido o X da equação v i t ó r i a ” . Pa r a a l gun s ou t ro s o f i c i a i s , a r eação f o i i d ên t i c a . O f i c i a i s como Fu l l e r , J ohn Monash , Hugh E l l es e o f r ancês E s t i enne , v i am nos “ t ank s” o f im do s p rob l emas da mob i l i d ade p e rd ida n a gue r r a d e t r i n che i r as . E s t e s , apes a r do i n i c io ru im do s c a r ros d e comba t e , r e so l ve r am busca r a s novas t á t i c as que aque l e novo engenho nece s s i t ava p a r a s e s ob r epo r f a ce ao i n im igo e s ub juga r s uas pos i çõe s d e fens ivas .

Às 06 ( s e i s ) ho ra s e 20 (v i n t e ) minu t os do d i a 20 (v i n t e ) d e novembro de 1917 , o co r r eu a b a t a l h a d e Cambra i , onde houve pe l a p r ime i r a vez uma t en t a t i v a d e a t aque t endo os c a r ro s de comba te como e l emen to p r in c ip a l do as s a l t o , em g r ande número , com apo io d a i n fan t a r i a , s em bombarde i o p rév i o d e a r t i l ha r i a , p a r a con segu i r o e f e i t o s u rp r es a , e com apo io a é reo ( embo ra no d i a e s t i v es s e nub l ado e o apo i o t enha s ido f r a co po r c au sa d as cond i çõe s do a r ) . O a s s a l t o fo i um comp le to s uce s so ; ma io r a t é do que e r a e spe rado pe lo s Br i t ân i co s , t an to que não pode s e r ap rove i t ado dev ido a pouca concen t r ação de r es e rva s e do de sp r epa ro do s b r i t ân i cos em apo i a r r ap idamen t e a nova a rma .

A inda a s s im , como demons t r a ção da f o r ça do ca r ro d e combat e , Cambra i fo i um suce s so :

Não o b s t a n t e , a b a t a l h a d e C amb r a i s e r v i u p a r a mo s t r a r a o ma i s i n c r é d u l o a p o t e n c i a d o s “ t a n k s ” , o s e u p o d e r d e r omp e r n um a t a q u e f r o n t a l a l i n h a i n im i g a , s o l u ç ã o p r o c u r a d a d e s d e a e s t a b i l i z a ç ã o d o “ f r o n t ” (Cavalcanti de Albuquerque, 1921 ) .

O método u t i l i z ado em Cambra i pa s sou a s e r cop i ado pe lo s a l i ado s n as sua s con t r a -o f en s i vas em 1918 , s endo e s s enc i a l p a r a a v i t ó r i a n a s egunda ba t a lh a do Marne , n es s e ano . O ca r ro d e combat e , embo ra não t enha s i do a ma io r c au sa d a d e r ro t a a l emã , fo i um do s mo t ivos p a r a e l a . No d i a do a rmi s t í c i o , o s a l i ados , ago r a t ambém com os No r t e - amer i c anos , t i nham s eu s co rpos e b r i gada s d e t anques , com uma quan t i dade s u f i c i en t e p a r a f az e r d i fe r enc i a l em comba te . P l anos e s t avam s endo c r i ado s p a r a s ua u t i l i z ação em 1919 , a l ém de novos mode l os que pe rm i t i s s em ma io r p ene t r a ção no t e r r i t ó r io i n imigo , e mu i t os novos espec i a l i s t a s n a nova a rma t endo maio r r e sponsab i l i d ade em t oda es s a p rog r amação . 8 Retirado do verbete Primeira Guerra Mundial, de: Teixeira da Silva, Francisco Carlos. Enciclopédia de Guerras e Revoluções do Século XX: as Grandes Transformações do MundoContemporâneo. Campus/Elsevier, 2004.

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O f im da p r ime i r a Gue r r a Mund i a l t eve , no en t an to , um f i n a l con t r á r io . Os c r i ado r es do c a r ro d e combat e a caba r am po r r e t ro cede r em t odo o p en s amen to s ob r e o uso dos b l i ndados , con t ando apenas un s poucos p ens ado re s a t r a t a r d es se a s sun t o . E ss e s p ens ado res , b r i t ân i cos como Bas i l L i dde l l Ha r t e J ohn F . C . Fu l l e r , pub l i c ando suas i d é i as a r e spe i to do s b l i ndados , s eu uso t á t i co e a s e s t r a t ég i a s que melho r s e rv i r i am a e l e s , a caba r am po r n ão v i r em e l as a s e r ado t adas mesmo po r s ua p róp r i a n ação 9.

Do l ado inver so , o s a l emães , de r ro t ados e humi l hados po r uma “paz c a r t ag i ne s a” , no d i z e r d e Fu l l e r , s en t i r am que dev i am co r r i g i r s eus e r r os ado t ando a s i dé i as v i s t a s em 1917 e 1918 , e t ão ap r egoadas p e l os au t o r es b r i t ân i co s . Acaba r am por c r i a r a s d iv i s õe s P anz e r , pondo em p r á t i ca o novo conce i t o de u so dos c a r ros d e combate , da av i ação de apo io , e r evo l uc i onando o conce i t o d e gue r r a móve l an t es d e s eus adve rs á r i o s , que t i v e r am de s upo r t a r s eve r as d e r ro t a s no i n i c io d a s egunda Gue r r a Mund i a l .

Quan to ao Bras i l , d e fo r a em g r ande p a r t e d e s s a h i s t ó r i a , mas a i nda a s s im a p a r dos a con t ec imen tos , coube ao no sso p a í s t e r a p r ime i r a f o rmação b l i ndada da Amér i ca La t i n a , s ob o comando do en t ão cap i t ão J os é P es sôa Cava l can t i d e Albuque rque , h i s tó r i a a s e r r e l a t ada a s egu i r .

2 -UM ANÃO QUERENDO ARMAS DE GIGANTE 10:

“R ea lm en t e , t emo s , c omo o s c i v i s , p r a t i c a d o e r r o s ,

m a s t emo s t i d o a v i r t u d e d e p r o c u r a r c o r r i g i - l o s . ” ( J o s é P e s s ô a C a v a l c a n t i d e A l b uq u e r q u e , D i á r i o d e M i n h a V i d a ) .

2 . 1 -No Bras i l :

Na de f i n i ç ão de Jo s é P es sôa sob re a s i t uação do Bras i l n a Repub l i c a Ve l ha :

“Ou ç o d i z e r q u e t o d o no s s o ma l p r o v ém d a imp r e n s a ( . . . ) , é , s o b r e t u d o d o s p o l í t i c o s s em c o n s c i ê n c i a , d e j u i z e s q u e p r e v a r i c am , d e m i l i t a r e s s em p a t r i o t i smo , d e f u n c i o n á r i o s r e l a p s o s . . . a P á t r i a s ó s e d e f i n e q u a nd o r e p r e s e n t a o i n t e r e s s e d a s u a c o b i ç a , E n c o s t am - s e n o s p o t e n t a d o s , i n v a d em o s g a b i n e t e s , a s r e p a r t i ç õ e s , p e n e t r am em t o d a p a r t e , q u e r em t u d o e a t o d o s p r o c u r am em d e f e s a d a s c a u s a s me s q u i n h a s p r a t i c a n d o i n j u s t i ç a s d e t o d a a n a t u r e z a . . . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

9 Tanto Fuller quanto Liddell Hart serão muito lidos e comentados nas décadas entre as duas Grandes Guerras. Ambos serão grandes defensores do uso em massa dos blindados, diferindo apenas quanto à situação do apoio da infantaria. Liddell Hart em especial será lido pelos alemães, principalmente Heinz Guderian, criador das Divisões Panzer, que adotará grande parte dos seus ensinamentos, em especial em relação a manobras com formações blindadas. José Pessôa também leu ambos, ainda antes de escrever seu próprio livro sobre os tanques, citando-os várias vezes. 10 O título se refere a uma breve passagem histórica pela situação vivenciada pelo exercito brasileiro no momento que será apresentado no tema, ou seja, o período da República Velha, até meados de 1923.

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O pe r íodo conhec i do como P r imei ra Repúb l i c a Bra s i l e i r a ( 1889 -1930) f i cou ma rcado como um pe r í odo em que houve p r edomín io do pode r d a s o l i ga rqu ia s c a f e i cu l to r a s do Bra s i l , que r evez avam s eu s cand i da to s no pode r p r e s id enc i a l (Po l í t i c a do Ca fé com Le i t e , onde r evez avam p r es i d en tes dos es t ados de Minas e S ão Pau lo ) ; onde hav ia o a co rdo de que o pode r f ede ra l n ão s e i n t romet e r i a no s pode r es e s t adua i s , en t ão no pode r d e s s as o l i ga rqu ia s ( a chamada Po l í t i ca dos Gove rnado res ) . O con t ro l e po l í t i co po r apenas uma c l a s s e s oc i a l n ão e r a t o t a l (mas p r edominava) , mas t i nha a s i t u ação do pa í s s ob s eu con t ro l e . A c l as s e méd i a do p a í s e r a p equena , embo ra c r es cen t e , mas o pode r po l í t i co a i nda não t i nha s a ído das g r andes f azendas em d i re ção ao s cen t ros u rbanos . A nece s s i dade de s e f i rma r como c l as s e t ambém com pode r es po l í t i co s ex i s t i a , e com o numero c r e s cen te d e c a rgo s púb l i co s e l a i a aumen tando e s s as pos s i b i l i d ade s .

A c l a s s e t r aba lhado ra , nos c en t ro s u rbanos mai s i ndus t r i a l i z ados , i a c r e s cendo e s e o rgan iz ando . Nes s as d écadas a s i d é i as ana rqu i s t a s e comun i s t a s a judavam na o rgan iz ação de s ind i ca t os e p a r t i do s po l í t i co s dos ope r á r io s e d emai s t r aba lhado res , l evando t ambém à o rgan iz ação dos p r ime i ro s p ro t es to s po l í t i cos e a s p r ime i r as g r eve s .

Houve t ambém c r i s es e r evo l t a s , de cunho po l í t i co e / ou s oc i a l , como a s Revo l t a s d a Esquadra e d a Armada , em 1891 e 1893 ; d a Esco l a Mi l i t a r em 1895 , 1897 e 1904 ; Canudos em 1897 , a C r i s e do Acre em 1902 , a Revo l t a d a Vac ina em 1904 , O mov imen to Sa l vac i on i s t a n a d écada de 1910 , a s Revo l t a s do Con te s t ado em 1914 ; o Tenen t i smo em 1922 acabou po r s e r o auge ( a p róx ima revo l t a s e r i a a Revo lução de 1930 , que po r i a f im a Repub l i c a Ve l ha ) .

2 .2 -No Exérc i to :

Em que s i t u ação es t ava o Ex ér c i t o Bra s i l e i ro n ess e p e r í odo? Observando es sa s p r in c i p a i s r evo l t a s , pode- s e p e r ceber que e l e t i nha p ape l a t i vo , t an to do l ado do pode r como con t r a e l e ( s endo que a p r i nc ip io e l e d e t i nha o poder f ede r a l , com Deodo ro da Fonseca e F l o r i ano Pe ixo t o , Marecha i s e P r e s id en t es ) . Ao l ado do pode r , o Ex ér c i t o conso l i dou a r epub l i c a que e l e mesmo p roc l amara , mas s ac rou r evo l tosos em Canudos , sub jugou sua s p róp r i a s r evo l t a s i n t e rnas n a Esco l a Mi l i t a r da P r a i a Ve rmelha ( o que l eva r i a ao seu f e chamen to em 1904 ) , comba teu i n im igos i n t e rnos e ex t e rnos em s eu p róp r io t e r r i t ó r io no Acre , no no rdes t e , em San t a Ca t a r i na e n a Cap i t a l Fede r a l . Ab rangeu o p a í s i n t e i r o com es t es en f ren t amen to s . Mas a s i t u ação do p róp r i o Exé r c i t o i n t e rnamen t e e r a p r ecá r i a : O f i c i a i s t r e i n ados mai s como Bacharé i s e Dou to r es do que como p ro f i s s i ona i s d e a rmas , p r aças r e c ru t ados po r s o r t e i o ou na b as e d e pun i çõe s po r c r imes , a ma io r p a r t e de l es ana l f abe to s . A p ro f i s s ão m i l i t a r ( e quando uso e s t a exp r es s ão não me r e f i ro à ma r i nha , cu j a s i t u ação e r a d i f e r en t e d a do Exé r c i t o ) e r a ma l v i s t a pe l a c l a s se

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ma i s a l t a e t emida p e l a c l a s s e mai s b a ixa . A c l as s e méd i a v i a o m i l i t a r como fuga p a r a s eus p rob l emas e conômico s , v i s t o que a educação dada ao a l uno da e sco l a mi l i t a r e r a boa e g r a tu i t a . A fo rmação dos o f i c i a i s e r a ma i s f i l o só f i c a que mi l i t a r , e g r aça s ao p en s amen to pos i t i v i s t a d a E sco l a d a P r a i a Vermelha , e ra t ambém con t es t ado r a do poder po l í t i co v i gen t e . Somada a um quad ro de p r aça s a l t amen t e i n s a t i s f a tó r io e p r ecá r i o , a pos i ção do Exé r c i t o como P ro t e to r d a n ação e r a ex t r emamen t e f r a ca . I s s o a i nda s em f a l a r na b a ixa c apac i dade i ndu s t r i a l do pa í s , que e r a i n su f i c i en t e p a r a equ i pá - lo e man t ê - lo equ i pado . A nece s s i dade de compra d e mat e r i a l d e ou t ro s p a í s es e r a cons t an t e , s endo t ambém mai s cus t os a . Med ida s p a r a a l t e ra r a s i t u ação den t ro do Exé r c i t o ex i s t i r am , e f o r am mui t a s , mas a ma io r i a ca í a quando o gove rno mudava s eu P r es id en t e ou Min i s t ro d a Gue r ra , ou e r a a t r a sada pe l a l en t id ão do p roces so pa r l amen t a r . Um exemp lo d i s t o f o i a adoção do a l i s t amen to mi l i t a r p e l a nova Le i d e Sor t e io Mi l i t a r , que f o i a ce i t a em 1908 , v i s ando ap rox imar a s c l a s s es méd ia e a l t a do s e rv i ço m i l i t a r , mas que s ó en t r ou em func i onamen to em 1915 , com a e c l os ão da guer r a na Eu ropa e o apo i o do poe t a Ol avo Bi l a c . En t r e o s p r in c i pa i s r e fo rmadore s podemos de s t a ca r o Marecha l He rmes da Fonseca , que t eve impo r t an t e p ape l como comandan t e d a Esco l a P r epa ra tó r i a d e Rea l engo , em 1904 , s u focando o l evan te d e s t a e s co l a , e t ambém como r e fo rmado r do Ex é r c i t o du r an t e s eu p e r íodo como Min i s t r o d a Gue r r a e P r es id en t e d a Repub l i c a (1906 a 1915 ) . Sua s r e fo rmas s e rv i r am par a t o rna r a o rgan iz ação do Exér c i t o ma i s e s t r u tu r ada e comp l exa . Uma das conseqüênc i as b ené f i c a s d as r e fo rmas d e He rmes da Fonseca f o i a d e env i a r a l guns dos o f i c i a i s p a r a ex er c í c i os no ex t e r io r , que env iou g rupos d e s t es pa r a t r e in amen to n a A l emanha en t r e 1908 e 1912 . Ao r e t o rna r , f a s c in ados p e l o mé todo de o rgan iz ação e p ro f i s s i ona l i smo do Exé r c i t o a l emão , e s t e s o f i c i a i s bus ca r am r e fo rmar po r d en t ro a i n s t i t u i ç ão . S e r i am e l es d enominados d e “Jovens Tu rco s” 11. En t r e e l e s e s t avam mui tos o f i c i a i s que ganhar i am impo r t ânc i a na h i s t ó r i a do Exé rc i t o , como Be r t o ldo Kl inge r e Euc l id es F i gue i r edo (p a i ) . E s s e s o f i c i a i s v i savam à r e fo rma do t r e i no e d a fo rmação de o f i c i a i s e p r aças do Exé r c i t o Bras i l e i r o , o aumen to do ens i no t é cn i co aos o f i c i a i s , e s e r i am r e sponsáve i s po r c r i a r uma v i são que bus cava d i s t anc i a r o o f i c i a l d a a t i v id ade po l í t i c a . Mui t o combat idos no p r inc i p io , o s “Tu rcos ” a caba r am po r t e r su a s i dé i as ao s poucos i n co rpo r ada s p e l a i n s t i t u i ç ão , p r i n c ip a lmen t e p e l o i n cen t ivo dado a e l e s p e l o gene r a l Jo s é Cae t ano de Far i a que , d e 1910 a 1914 , fo i che f e do Es t ado Ma io r do Ex é r c i t o e pos t e r io rmen t e Min i s t ro d a Guer r a a t é 1918 , e e r a s impa t i z an t e d as i d é i as dos “Joven s Tu rco s ” . Ou t ro r e fo rmado r f o i J o ão Pand iá Ca l óge r as , M in i s t ro c i v i l d a p as t a do Min i s t é r io d a Gue r r a , que e r a no p r i n c í p io ma l v i s t o t an to po r r e fo rmado res como pe l a opos i ção , po r s e r c i v i l e d e

11 Seriam também eles fundadores do periódico A Defesa Nacional, que tratava de assuntos envolvendo treinamento militar e outros assuntos técnicos do exercito.

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o r i gem e s t r ange i r a 12. Mas Ca lóge r a s v iu a n eces s id ade po r que p a s s ava o Exé r c i t o Bra s i l e i ro , n as p a l av r a s d e J os é P es sôa :

“Ao c h e g a r em a o g o v e r n o e n c o n t r a r am e s s e s d o i s c i v i s ( E p i t á c i o P e s s ô a , P r e s i d e n t e d a R e p úb l i c a ; e J o ã o P a nd i á C a l ó g e r a s , M i n i s t r o d a G ue r r a ) um E x é r c i t o amo l e n t a d o p e l a b u r o c r a c i a , a b s o r v i d o c om a f i g u r a ç ã o em p a r a d a s , d e s p r e o c u p a d o s d o s s e u s p l a n o s d e o p e r a ç ã o e d a o r g a n i z a ç ã o d e s u a s r e s e r v a s , ma l a rma d o e ma l i n s t r u í d o ; ( . . . ) a s p r omo çõ e s n o s q u a d r o s d e p e n d i am d o c amb a l a c ho o u d a t r o c a d e v o t o s ; a i n d ú s t r i a d e g u e r r a , i n c i p i e n t e ; ( . . . ) q u a r t é i s em r u í n a s , o e q u i p ame n t o a l a rma v a o e s p í r i t o m a i s o t im i s t a ; a b u r o c r a c i a e a i n e f i c i ê n c i a l a v r a v am p o r t o d a p a r t e ” . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC -FGV) .

J o ão Pand i á Ca l óge r a s f o i r e sponsáve l p r i n c i p a lmen t e p e l a

r e fo rma nos qua r t é i s e equ i pamen to s do Ex é rc i t o , e v endo que e r a n ece s s á r i a a c r i a ção de uma indús t r i a d e gue r r a que pudes s e sup r i r o Exé r c i t o de equ ipamen tos , t r an spor t e e a rmas . Fo i du r an t e s ua admin i s t r a ção que chegou ao Bra s i l a M is são Mi l i t a r F r ance s a , que p ropo rc iona r i a t r e i n amen to e ape r f e i çoamen to aos o f i c i a i s B ra s i l e i ro s , M is s ão e s s a chegada em 1920 . Todos es s es r e fo rmado res aux i l i a ram na r e fo rma , t an to t é cn i ca quan t o i d eo lóg i ca , do Ex ér c i t o Bras i l e i ro , e t a i s r e fo rmas a caba r i am po r s e r impo r t an t es t an t o no ape r f e i çoamen to da i n s t i t u i ç ão quan t o no ap ro fundamen to d e sua s d i f i cu ldades .

O exé r c i t o , que t i ve r a um c r es c imen to d e 220% num p r azo de 40 anos (1890 -1930 ) , a i nda e r a ma l equ i pado e ma l t r e i n ado (Ca rva l ho , 2005 ) . A indú s t r i a não c res ce r i a de uma ho r a p a r a ou t r a , l eva r - se - i am anos , s endo só v i s to s o s f r u t os d e s s a bu s ca po r i ndus t r i a l i z a r a de f e s a apenas no Es t ado Novo . O ex ce s so de i n t romis sõe s d e i d é i as m i l i t a r e s e s t r ange i r as ( aqu i s e v i a um con f l i t o t ambém en t re F r ança e Al emanha ) con fund i a e con f l i t ava p a r t e d a o f i c i a l i dade en t r e s i 13.

A economia do p a í s , que mai s f avo rec i a impo r t a ção que a p rodução em so l o p á t r i o , s e r i a ou t ro mot ivo das d i f i cu ldades , f a zendo com que impor t ás s emos a t é mun i ção , que e ra p roduz ida aqu i , mas a cu s to mai s e l evado (McCann , 2007 , pg .238 ) . Com uma economia vo l t ada a b ene f i c i a r apenas a s o l i ga rqu i a s c a f ee i r as , pouco sob r ava p a ra o i nve s t imen to do es t ado em á r eas t ão c a r a s (mas t ão n ece s s á r i a s ) como a á r ea d e d e f e sa . P i o ra r i a em 1929 com a r e ces s ão econômica mund i a l . As mudanças no pen s amen to e n a p a r t i c ip ação po l í t i c a dos o f i c i a i s l eva r am não a um d i s t anc i amen to , mas a uma maior compreen são da s i t u ação em que se encon t r ava a sua c l a s s e p ro f i s s i ona l no p a í s , que s e rv i a mui t a s v ez es p a r a man t e r um 12 Foi o único civil a ocupar a pasta, sendo político com grande interesse nas relações internacionais e na área de defesa. Era Brasileiro, mas filho de imigrantes gregos, e um pouco francófilo, daí o motivo para a oposição tanto no quartel como no meio civil. 13 Haviam oficiais, como os “Jovens Turcos”, que eram mais favoráveis às idéias alemãs, e oficiais que preferiam as idéias francesas, sendo José Pessôa um deles; havia ainda os que liam livros e trabalhos de ingleses e norte-americanos, e os que preferiam uma busca por trabalhos mais “nacionais”. Tudo isso acabava por conflitar com os treinamentos, visto que cada oficial tentava dar à instrução dos praças seu ponto de vista particular, até a chegada da Missão Francesa, que fez com que o Estado Maior obrigasse a todos a seguir os manuais publicados pelo Exército.

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gove rno cada vez menos cond iz en t e com as n ece s s id ades d a n ação ; s omado a um s i s t ema que p romov i a s eus o f i c i a i s po r f avo r i t i smo po l í t i co , s endo l en to n a p romoção do s d emai s , e a inda ex t r emamen te endógeno . Tudo i s so a caba r i a po r l eva r aos mov imen tos Tenen t i s t a s em 1922 , e pos t e r io rmen t e ao Mov imen to Pac i f i c ado r d e 1930 .

2 .3 -Jo s é Pessôa :

Ness e p e r íodo de impor t ânc i a h i s t ó r i c a p a r a o Exé rc i t o e o Bra s i l fo i que i ngr e s sou em s e rv i ço J os é P e s sôa Cava l can t i d e A lbuque rque . Vindo de uma f am í l i a t r ad i c iona l do e s t ado da P a r a íb a , J o sé P es sôa t eve ao a l cance a po ss ib i l i d ade de d e ixa r s ua r eg i ão p a ra s egu i r com os es t udos , que du r an t e sua i n f ânc i a f o r am r eceb i do s n a an t i ga c ap i t a l do s eu es t ado . O co l ég io s ecundá r io e l e cu r sou no R io d e J ane i r o , no Co lég i o D . P ed ro I I , e f i n a l i z ou -o em 1902 , p r es t ando no mesmo ano p rova p a r a a Es co l a P repa r a tó r i a e d e P r a t i c a do Rea l engo . O con t a t o d e J os é P es sôa com as a rmas f o i po r e l e mesmo na r r ado em s eu “Di á r i o d e Vida” , s u a au t ob iog r a f i a . Con t a e l e que quando c r i ança v i u a s t r opa s do gove rno a c aminho de Canudos , d e p a s s agem po r umas da s c i d ades em que e l e r e s i d i u . Aqu i lo s egundo e l e marca r a -o como o p r ime i ro con ta t o com o Exér c i to , embo ra f o s s e a inda mui t o j ovem pa r a compreende r o que s e pas s ava . O s egundo con t a to , e que s e r i a ma i s impo r t an t e , f o i du r an t e 1902 , onde e l e e ra j á f o rmado em s eus e s t udos , consc i en t e d a s i t u ação de s eu p a í s , e v i u s u rg i r a i n t e rvenção nac i ona l no Ac re . J os é e s eu i rmão de p ron to s e a l i s t a r am em de s e jo de combat e r , mas po r o rdem f ede r a l s o l d ados s em t r e i no não poder i am s egu i r p a r a o Acre , d e sapon t ando Jo s é e s eu i rmão . O inc i den t e f o i s u f i c i en t e p a r a mos t r a r a s eus p a i s que o j ovem pod i a f aze r c a r r e i r a m i l i t a r . Com a a juda de s eu t i o , o en t ão Min i s t ro da J u s t i ç a Ep i t ác io P es sôa , J os é P es sôa i ng r e s sou na Esco la d e Rea l engo . O ano de 1903 e 1904 s e r i a con t u rbado no R io d e J ane i r o . A Revo l t a d a Vac i na e d a E sco l a Mi l i t a r d a P r a i a Verme lha p e s a r i am nos ens i n amen to s d a v i da mi l i t a r do j ovem a l uno . Mai s a i nda l h e p e s a r i a o ex emplo do s eu comandan t e , Gene r a l He rmes da Fonseca , que l he s e r i a d e exemplo da impo r t ânc i a d e se r m i as um mi l i t a r de p ro f i s s ão do que apenas um es tud i oso de un i fo rme . A p ro f i s s i ona l i z ação pa s s a r i a a s e r a l go que J o sé P e ssôa bus ca r i a s empre como impor t an t e r equ i s i t o p a ra s e r um bom so l dado . T r ans f e r ido p a ra a E s co l a Mi l i t a r d e Po r t o Al egr e , a l i J o s é P es sôa conc l u i u s eu s es t udos . No pos t o d e Al f e re s , em 1909 , época d e r e fo rmas d e He rmes , e l e começou sua c a r r e i r a . As r e fo rmas e a s i d é i as co r r en t e s n es s e p e r íodo (He rmes , o s “ Jovens Turco s ” ) fo r am bem r eceb i das p e l o j ovem o f i c i a l , que s impa t i z ava com pa r t e d e l as , p r in c i p a lmen t e no que s e r e f e r i a à p ro f i s s i ona l i z ação mi l i t a r 14.

14 A força da personalidade do general Hermes da Fonseca em conter seus alunos em 1904 seria um exemplo extremamente importante para José Pessôa quanto ao exemplo e à determinação de um líder em ensinar seus comandados. O tempo dele sob comando de Hermes seria por ele mesmo citado varias vezes

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Com o s Movimen tos S a l vac i on i s t a s ( a d i spu t a d e pode r en t re a s o l i ga rqu i as do No rde s t e , com u so de j agunços que a cabavam abusando da f o rça que r e ceb i am e p a r t i ndo ao band i t i smo) e a s ub s eqüen t e i n t e rvenção mi l i t a r f ede r a l , J o sé P e s sôa vo l t ava pa r a p e r t o d e sua t e r r a , e s t ando em s e rv i ço . Nes s e p e r í odo e l e s e s ag rou em comando e comba t e , s endo en t ão p romovido a S egundo Tenen t e após r e to rna r do s e r t ão . De vo l t a , r ecebeu de bom g r ado a s i dé i as do novo s i s t ema de Se rv i ço Mi l i t a r , em 1914 , e ade r i ndo à p r egação de O l avo B i l a c , O Tenen t e P es sôa s e t o rnou o r e sponsáve l p e lo t r e in amen to dos c i v i s en t ão a luno s d a Facu ldade de D i re i t o d e S ão Pau lo . Ness e mov imen to J o sé P es sôa t a lv ez p e r cebes s e p e l a p r ime i r a vez que e ra n ece s s á r io maio r envo lv imen to d a s oc i edade nas camadas do Ex é r c i t o . Como In s t ru t o r Mi l i t a r n es s e p e r íodo , p e r cebeu o p ape l c í v i co que o t r e inamen to mi l i t a r pode r i a d a r ao c idadão , n a s ua f o rmação como t a l . Ao f im de s t a t a re fa , r e cebeu Jos é P es sôa a chance de se r um dos o f i c i a i s membro s d a mi s s ão do gene r a l Napo l eão Fe l i p e Aché , onde p a r t i r i am par a a F r ança , em p l ena Gue r r a Mund i a l , p a ra r e cebe r i n s t r u ção m i l i t a r num Exé rc i t o ma i s p ro f i s s i ona l i z ado e mode rno 15. A í , n a Eu ropa , o con t a to de J o s é P es sôa com a Grande Gue r r a e com o combat e p e s ado da r eg i ão da F l and res em 1918 s e r i am momentos , s egundo e l e , d e e t e rna memór i a , t an to d e bons como de maus momen to s p as s ados n a l i nha d e f r en t e 16. Depo i s d e s e r l i b e rado de s eu es t ág i o p a r a pode r i n co rpo r a r -s e ao Exé r c i t o F r ancê s , p e lo Min i s t é r i o d a Gue r r a do Bra s i l , J os é P es sôa e a l gun s ou t ros o f i c i a i s i ng r es s a r am nas f i l e i r a s F r ance sa s , r e cebendo comando e a l guns s e s ag r ando g r andes so ldados . J os é P es sôa fo i um de s t es , s endo a l o cado à 2 ª D iv i s ão de Cava l a r i a F r ance sa , no f amoso e t r ad i c i ona l 4 º Reg imen to de Dragões , r e cebendo po s t e r io rmen t e o comando de uma companh i a d e s t e r eg imen to . E mai s t a rde r e cebendo , po r sua b ravu ra em combat e , v á r i os e l og io s d e s eus comandan t es , a l ém da meda lha C ruz de Gue r r a (C ro ix d e Gue r r e ) F r ance s a .

em vários momentos de sua autobiografia, principalmente se José Pessôa quisesse evocar algo que envolvesse o ensino do profissional de armas. 15 O general José Caetano de Faria, enquanto Ministro da Guerra, era favorável a missões no estrangeiro, mas completamente contra que fosse trazida para o Brasil uma missão estrangeira. A Missão Aché é pouco citada em trabalhos a respeito do exercito Brasileiro, sendo muitas vezes apenas citada como uma missão para buscar oficiais franceses para a Missão Francesa. Frank D. McCann e José Murilo de Carvalho são os dois que diferenciaram sua função ao citá-la. 16 José Pessôa relata melhor seu momento na França no seu Diário de Minha Vida. Mas seus relatos são carentes principalmente de datação, sendo difícil dizer quando ele chegou à França e quando viu combate. Sabe-se que ele esteve a serviço do General Mangin, nas contra-ofensivas de 1918. Ele serviu na 2ª Divisão de Cavalaria Francesa, no 4º Regimento de Dragões, 3º Pelotão, comandando o 1º Esquadrão.

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3 -OH, CAPITAINE! 17

3 .1 -O Cap i tão e sua mi s são :

Ao f im da gue r r a e após s eu b a t i smo de fogo , J os é Pe s sôa Cava l can t i d e Albuque rque , ago r a c ap i t ão , s e r i a r e ceb i do com mai s uma m is s ão , d es t a v ez nova e d i f e r enc i a l : s e r i a r e sponsáve l p e l a f o rmação da p r ime i r a un i dade b l i ndada da s f o r ça s a rmadas do Bra s i l . Recebeu es sa mensagem em s e t embro de 1919 . Su rge en t ão um momento imp rev i s to n a fo rmação do en t ão Cap i t ão J os é P es sôa . E l e s e rv i r a du r an t e a gue r r a na c ava l a r i a , a rma j á aná l oga ao t e a t r o d e ope r ações eu ropeu . S em i ns t r u ção , s em p r epa ro , como s e rv i r i a pa r a c r i a r e s s a un idade num Exé rc i t o che io d e con t r ad i çõe s e p rob l emas de o rgan iz ação e equ ipamen to?

”T e n d o f e i t o a g u e r r a c om a c a v a l a r i a , d e s c o n he c i a , c o n t ud o a t é c n i c a e o emp r e g o d o s v e í c u l o s me c a n i z a d o s d e c omb a t e . ( . . . ) P o nd e r e i a o G e n e r a l a má e s c o l h a d a m i n h a p e s s o a p a r a d e s emp e n h a r m i s s ã o a l g o c omp l i c a d a ” ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC -FGV) .

Com es t a dúv i da e l e s e d i r i g iu ao s eu comandan t e , gene r a l J os é Le i t e d e Cas t r o , che f e d a mi s s ão de Aqu i s i ç ão de Ma t e r i a l Bé l i co . Te r i a d e bus ca r t r e in amen to em so lo F r ancês , o que l h e f o i a r r an j ado pe lo f u t u ro che f e d a Mis são Mi l i t a r F rance sa no Bra s i l , o Gene r a l Mau r i c e Gus t ave Gamel i n 18 (McCann , 2007 ) ; o Governo F r ancê s n es s a época fa z i a d e t udo pa r a me lhor imp res s iona r o s Bra s i l e i ro s , p a r a consegu i r o a co rdo da Mis são e a v enda de mat e r i a l bé l i co que s ob r a r a da gue r r a . E f o i o que con segu i u , i ng r e s s ando na Esco l a d e Ca r ro s de Ve r s a i l l e s , n a Fr ança a inda , s endo um de do i s o f i c i a i s e s t r ange i ro s a r e cebe r e s s a chance , e o ún i co de s t e s a s e f o rmar no cu r so . In g r e s so como e s t ag i á r io no 503° Reg imen to d e Ar t i l h a r i a d e Ca r ro s d e As sa l t o . Conc l u í do o cu r so , f ez ou t r a e spec i a l i z ação na Esco l a de Ar t i l h a r i a d e As s a l t o , em Crey (p róx ima a Ve rs a i l l e s ) . Após a conc lu s ão des t a , j á s e achava o c ap i t ão J os é Pe s sôa ap to ao comando de uma un idade b l i ndada :

Ao d e i x a r e s s a e s c o l a , a p ó s v e r e s e n t i r o v a l o r d o s C a r r o s d e A s s a l t o ( n ome p r im i t i v o d a d o a o s c a r r o s d e c omb a t e p e l o s F r a n c e s e s ) , a m i n h a f é n o f u t u r o d e s s e s e ng e n h o s d e g u e r r a e a c o n v i c ç ã o d e s u a e f i c i ê n c i a c r e s c e n t e n a g u e r r a mod e r n a t o r n a r am- s e i n a b a l á v e i s . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

17 Alusão ao posto ocupado pelo oficial aqui estudado), será passado a análise dos escritos de José Pessôa Cavalcanti de Albuquerque com relação à arma mecanizada. Escritos estes obtidos na sua Autobiografia e no livro que ele escreveu sobre os “tanks”. 18 Gamelin havia sido chefe de operações do estado maior francês durante a Primeira Guerra, tendo sua escolha como chefe da missão francesa no Brasil sido apontada pelo próprio Marechal Foch. O general Gamelin ficaria ainda mais famoso na Segunda Guerra, quando assinaria a rendição francesa após a derrota contra os alemães, em 1940, frente à nova tática da BlitzKrieg.

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P as s ava e l e en t ão ao comando da s ua nova un i dade p r imei r amen t e como r esponsáve l pe l a compra de s eu s p róp r io s c a r ros . Ta r e f a e s sa que s e r eve l a r i a mu i t a s v ez es d i f í c i l , como ve r emos a s egu i r .

3 .2 -O Cap i tão e s eu “Tank”:

Os F r ance s es t en t a r am s e l i v r a r d e s eu equ ipamen to v e l ho e u s ado , v endendo -o b a r a t o p a r a quem qu i se s s e comprá - lo . O gove rno Bra s i l e i r o p agou pe lo s t anques Renau l t FT -17 , o mode lo mai s u t i l i z ado e ma i s f ab r i c ado pe l os F r ances es du ran t e a gue r r a . P agou- s e , no en t an t o , pe lo s c a r ro s em bom es t ado de con se rvação , s endo função en t ão do Cap i t ão J osé P es sôa , como espec i a l i s t a g r aduado pe lo s F r ance s es , o ava l d a compra quando e l e encon t r a s se o s c a r ro s adequados . Su rg i am ago ra pa r a a mi s s ão dua s d i f i cu ldades : A p r ime i r a d i f i cu ldade cons i s t i a em a l go que o s F rance s e s n ão espe r avam ao vende r o s c a r ros : encon t r a r um comprado r que os conheces s e e en t endes s e d e sua mecân ica . O cu rso fe i t o p e l o c ap i t ão J os é P es sôa t ambém en s i nava s ob r e a manu t enção e cons e rvação dos c a r ro s Renau l t , o que s e r i a p a r a o s F r ance s e s uma “ f aca d e do i s gumes” po r e l e s t en t a rem vende r ma t e r i a l u s ado . ao Bra s i l . A s egunda e r a d ev ido ao f a t o de J o s é P es sôa t e r s empre p r e f e r ido a compra dos c a r ros i ng l e s es Whippe t , cons ide r ados po r e l e me lho r es p a r a a t a r e f a . Mai s t a rde , com a d emora em e s co lhe r a s v i a tu r as , o s F r ance s es chega r i am a a cu s á - l o d e e s t a r ameaçando a compra , em p ro l dos c a r ros i ng l e se s . Ve r emos me lho r e s s e i n c iden t e mai s à f r en t e . Na bu sca p e los v e í cu lo s , começam o s con t r a t empos :

Qua ndo f o i a v i s a d o à m i s s ã o q u e o s v e í c u l o s e n c ome nd a d o s p o r n ó s e s t a v am p r o n t o s p a r a s e r em e n t r e gu e s , s e g u i u - s e uma v e r d a d e i r a p e r e g r i n a ç ã o p e l o s d e p ó s i t o s d e t a nq u e s d o t e r r i t ó r i o f r a n c ê s , s e nd o e u s emp r e c o n s t r a n g i d o a r e j e i t a r t a l ma t e r i a l p o r v e r i f i c a r s e r em e n g e n h o s v e l ho s , r e c u p e r a d o s , d a g u e r r a r e c ém f i n d a . A s s im , n a p e n ú l t ima v e z q u e s e c o n v i d o u p a r a r e c e b e r a q u e l e s e n g e n ho s , d e u - s e um e p i s o d i o d i g no d e me n ç ã o : d e s c o n h e c i a e u um r e l a t ó r i o f r a n c ê s q u e h a v i a s i d o e n v i a d o a o R i o d e J a n e i r o . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

E s s e e r a o r e l a t ó r io env i ado pe lo gove rno f rancês ao gove rno Bra s i l e i ro d emons t r ando que s e achava des con f i ado das i n t enções do cap i t ão quan t o à e s co lha do mat e r i a l . O t e l eg r ama acabou po r c au s a r um impo r t an t e i n c iden t e :

Ne s s a o c a s i ã o , p o r ém , o g e n e r a l L e i t e d e C a s t r o , a l e g a nd o , em c o n ve r s a q u e t i v emo s n a s e d e d a m i s s ã o , q u e d e s e j a v a c o n he c e r d e p e r t o a e f i c i ê n c i a e o p o d e r c omb a t i v o d a s n o v a s ma q u i n a s d e g u e r r a , o f e r e c i -me d e s p r e o c up a d ame n t e p a r a a c omp a n h á - l o na p r ó x ima v i a g em d e i n s p e ç ã o a o s “ t a n k s ” em q u e s t ã o . A s s im c omb i n a d o , e a o s e r d i a s d e p o i s a v i s a d o p a r a n o v a i n s p e ç ã o , p r e v e n i a o g e n e r a l q u e s e f e z a c omp a n h a r d o Ma j o r E d u a r do

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L ima , s e u s e c r e t á r i o , e n a ma n h ã c omb i n a d a p a r t imo s o s t r ê s , d a g a r e d e L yo n , a o d e s t i n o d o c ampo d e B o u r o n , n o i n t e r i o r d a F r a n ç a , o n d e s e e n c o n t r a v a o ma t e r i a l p a r a o d e v i d o e x ame . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

Dev i do à r e c l amação F r ances a , o che f e do c ap i t ão Pes sôa , gene r a l Le i t e d e Cas t ro , t eve d e bus ca r s aber da s i t u ação con f l i t an t e , e v e r o que oco r r i a d e v e rdade com a m i s s ão de compra dos c a r ros ;

Lá c h e g a nd o , o g e n e r a l p ô d e v e r o s c a r r o s , c a p r i c ho s ame n t e p i n t a d o s , c om a a p a r ê n c i a e n g a no s a d e n o vo s , c a u s a nd o - l h e b o a imp r e s s ã o . Ma s e r a me u d e v e r l h e e s c l a r e c e r q u e e r a e s s e o a s p e c t o q u e t i n h am t o d o s o s d ema i s q u e e u r e j e i t a r a a n t e r i o rme n t e . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV )

A mesma s i t u ação . Os F r ances e s t en t avam vender equ i pamen to j á u sado po r e l es como s e f os s e novo . No d i z e r popu l a r , “ compra r ga t o po r l eb r e” . O cap i t ão Pes sôa r e so lveu mos t r a r en t ão que não e r a enganado fa c i lmen t e , e ao mesmo t empo mos t r a r que pos su í a noção de uso do que e s t ava p r e s t es a comanda r .

Em s e g u i d a , t e nd o p e rm i s s ã o p a r a r e v i s t a r o s “ t a n k s ” , p e d i a um d o s o f i c i a i s F r a n c e s e s e n c a r r e g a d o s d e e n t r e g á - l o s , q u e s e f i z e s s e r e a b a s t e c e r um d e t e rm i n a d o “ t a n k ” p a r a e n s a i o s e , a p ó s , t oma nd o a s u a d i r e ç ã o , mo v ime n t e i o v e i c u l o à p i s t a d e e n s a i o s . Ap ó s v á r i a s ma n o b r a s , f i z o c a r r o t r a n s p o r a l g u n s o b s t á c u l o s e , d e s e n v o l v e nd o a s u a v e l o c i d a d e má x ima , e c om t o d a a f o r ç a d e s e u mo t o r , l a n c e i - o c o n t r a uma p e q u e n a p o n t e e a í f i z o v e i c u l o g i r a r s o b r e o s e u e i x o , d e s c r e v e nd o um c í r c u l o d e 3 6 0 ° ( e n s i n ame n t o q u e e u a p r e nd e r a em V e r s a i l l e s ) . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV )

No l i ngua j a r dos g rupos d e “pega” , n a s manob ras d e au tomóve l , o c ap i t ão t en tou da r um “cava l o -de -pau” . Manob ra que em ve í cu l os d e es t e i r a é ma i s f á c i l , e no ca so do t anque , em combat e , pode se r impo r t an t e s e r bem ex ecu t ada ;

Naq u e l e mome n t o , s e n t i o v e i c u l o e s t a n c a r e uma d e s u a s l a g a r t a s f r a gme n t o u - s e d e b a i xo d o s me u s p é s . D e s c e nd o d o v e í c u l o , v e r i f i q u e i q u e o s e i x o s d o s p a t i n s d o r o l ame n t o a p r e s e n t a v am- s e mu i t o d e s g a s t a d o s p e l o u s o e , a o me smo t empo , v i q u e t o d o s o s c ama r a d a s c o r r i am a t r a v é s d o c ampo a o me u e n c o n t r o . O g e n e r a l L e i t e d e Ca s t r o e r a o ma i s a p r e e n s i v o , c o n ve n c i d o , c omo me d i s s e d e p o i s , d e t e r e u c ome t i d o a l g uma imp r u d ê n c i a , e a s s im , t e r d e i n d e n i z a r o v e i c u l o a c i d e n t a nd o . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

Demons t r ando pe r í c i a no mane jo do ve í cu l o , o c ap i t ão pôs à p rova o mat e r i a l e d emons t rou que e l e e r a r ea lmen t e us ado . Consegu iu en t ão a t r a i r a a t enção de seu super io r p a r a o p rob l ema que v i a en f ren t ando quan to a aqu i s i ç ão do mat e r i a l ;

Vendo -me , p o r ém , t r a n q ü i l o , a o mo s t r a r o e s t a d o d o ma t e r i a l , t omo u o g e n e r a l a p a l a v r a , u s a n d o d a q ue l a f r a nq u e z a r u d e , q u e t o d o s n ó s c o n h e c emo s , e s c o nd i d a n um c o r a ç ã o d e c r i a n ç a . ”Nad a

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d i s t o ” , d i s s e e l e , “O c a p i t ã o P e s s ô a e s t a b e l e c e r á a o s s e n h o r e s d e h o j e p o r d i a n t e , a s c o nd i ç õ e s d e v o l t a rmo s a e x am i n a r s eme l h a n t e ma t e r i a l . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

Ago ra o c ap i t ão adqu i r i r a a t r anqü i l i d ade p a r a impor aos F r ance se s suas cond i ções e ganha r t empo pa r a t e r o que d e me lhor pudess e h ave r no a r s ena l f r ancês , com d i r e i t o a t é a s e d iv e r t i r à cu s t a d a s i t u ação a r r an j ada pe lo s F r ance s e s con t r a e l e s p róp r io s :

Ac r e s c e n t e i : ” Só vo l t a r e i a e x am i n a r o s s e u s “ t a n k s ” q u a nd o f o r em n o v o s e c o n s t r u í d o s s o b a s m i n h a s v i s t a s . E s t a é a q u i n t a v e z q u e p e r c o o me u t emp o n e s s a s l o n g a s v i a g e n s ” . D i t o i s t o , um d o s o f i c i a i s , q u e a t é e n t ã o n ã o t i n h a p r o n u n c i a d o uma s ó p a l a v r a d u r a n t e t o d a a n o s s a c o n v e r s a ç ã o , i n t e r p e l o u -me s e n o E x é r c i t o B r a s i l e i r o h a v i a c u r s o d e e s p e c i a l i z a ç ã o d e c a r r o s d e a s s a l t o . R e s p o nd i , f a z e n d o “ b l a g u e ” , q u e s im , o n d e , a l i á s , t i n h a s i d o um ma u a l u n o . O g e n e r a l , q u e ma r c h a v a n a n o s s a f r e n t e , g o s t a n d o d a a t o a r d a , d i s s e : “C a l c u l em o s s e n h o r e s s e e l e f o s s e d o s me l h o r e s ! ” . . . R e v e l a v am o s a n t a g o n i s t a s d e s c o n h e c e r q u e a E s c o l a d e C a r r o s d e As s a l t o d e Ve r s a i l l e s , a t é e n t ã o i n t e r d i t a a o e s t r a n g e i r o s , à q u e l e a n o d u a s ma t r i c u l a s t i n h a c o n c e d i d o , uma d e s t i n a d a a um B r a s i l e i r o ( i n f l u e n c i a d o g e n e r a l G ame l i n ) , a o u t r a a um ma j o r D i n ama r q uê s q u e , a l i á s , d e s i s t i u n o me i o d o c u r s o . E x i g i a - s e , e n t r e t a n t o , c omo c o n d i ç ã o f u n d ame n t a l t e r o c a nd i d a t o f e i t o a g u e r r a e n g a j a d o no E x é r c i t o f r a n c ê s . Aq u e l a s p e q u e n a s d i s c o r d â n c i a s e r am f r e q ü e n t e s e n t r e F r a n c e s e s e B r a s i l e i r o s a t r a v é s d e s s a s n e g o c i a ç õ e s . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

Mas o mat e r i a l po r f im fo i comprado . E ra r e cém f abr i c ado , novo , a i nda n ão u t i l i z ado . Após a i n speção na fáb r i c a , o c ap i t ão d eu s eu ava l e f i n a lmen t e s a í r am da Fr ança os p r imei ro s b l i ndados do Exé r c i t o Bras i l e i r o . Chegando o mat e r i a l ao Bra s i l , pa s sou a inda po r uma i nspeção do cap i t ão , que encon t rou ava r i a s n a s maqu inas d ev ido ao t r an spo r t e e d epós i to . Fez e l e a i nda a l gumas mod i f i c ações no s v e í cu l os , p r i n c i p a lmen t e no c a l i b r e da s a rmas e n a p a r t e mecân i ca , p a r a melho r adap t a - l o s ao uso Bra s i l e i r o 19. F i c a a i nda aqu i um comen t á r i o a r e spe i t o d a p r ed i l e ção do cap i t ão Pe s sôa p e lo c a r ro i ng l ê s Whippe t . E l e d ed i cou , ma i s t a rde , em s eu l i v ro sob re o s “ t anks” , t odo um cap i tu lo compa rando os do i s mode l os . O Whippe t e r a p a r a e l e me lho r po r s e r ma i s v e l oz e ma i s a rmado , um ve i cu l o u t i l i z ado pa r a r up t u r a d a f r en t e , s endo , no en t an t o mai s cus to so . Quan t o ao Renau l t , s e r i a ma i s ú t i l po r s e r ma i s l en t o e d e f á c i l a companhamen to d a i n fan t a r i a , t endo t ambém que ope r a r em con jun t o com e l a ; s e r i a ma i s ú t i l no i n i c i o pa ra t r e i n a r a s gua rn i çõe s do s c a r ro s e h ab i tu a - l os no comba te , j un t amen t e com o t r e i no da i n fan t a r i a . O cap i t ão Pes sôa a caba r i a po r p ropor a compra pos t e r i o r do Whippe t p a r a uso em con j un to com o Renau l t FT .

19 Na pasta sobre viaturas, no Arquivo Histórico do Exército (AHEx), há o documento onde José Pessôa diz quais alterações foram feitas. Pequenas alterações, como correntes de motor e calibre de armas, apenas.

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3 .3 -O Cap i tão e s eu s in s t ru ídos :

S e quan to a s i p róp r io o Cap i t ão J osé P e s sôa j á e r a ex igen te s ob r e a i n s t r u ção p ro f i s s iona l , em r e l a ção aos s eus comandados e l e s e r i a no mín imo de i gua l ex i gênc i a , po r con s ide r a r a impo r t ânc i a d e s e t e r gen t e p repa r ada p a r a l i d a r com o mat e r i a l t r az i do : “Par a t i r a r de s t e engenho de gue r r a t odas a s v an t agens d e que é c apaz , o p r imo rd i a l cons i s t e em con f i á - lo à s mãos d e t é cn i co s . . . ” (Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC -FGV ) .

Mas com a s i t u ação que s e pa s s ava no Exé r c i t o Bras i l e i r o com r e l a ção ao r e c ru t amen to , e t ambém com o e s t ado dos quar t é i s ex i s t en t es , e r a ou t ra mi s s ão d i f í c i l . Quan to aos qua r t é i s o e s t ado , p a ra a Companh i a d e Ca r ro s d e As sa l t o , e r a t e r r í ve l . Não hav i a a i nda l o ca l onde e l es pudes s em s e i n s t a l a r . F i c a r am a p r i nc ip io n as i n s t a l a çõe s do 1 º Reg imen to d e In f an t a r i a ( ho j e R .E . I – Reg imen to -Esco l a d e In f an t a r i a ) . Onde f i c avam “em duas d ependênc i a s : numa do rm i am os homens sob re co l chões , n ão hav i a c amas . Nou t ra , uma pequena s a l a ( . . . ) f unc ionavam o s d epa r t amen tos d a no ss a admin i s t r a ção .” (Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC -FGV ) . A s i t u ação não e ra só d i f i cu ldade ge r a l no Ex ér c i to . E r a d i f i cu l t ada a inda mai s p e l o f a t o d e s e r o “ t ank” uma a rma a inda de s ac r ed i t ada em no sso Exé r c i t o :

. . . T ud o e r a d i f i c u l t a d o à u n i d a d e em f o rma ç ã o , a t é me smo o s e l eme n t o s p a r a c o n s e r v a ç ã o d e s e u ma t e r i a l . ( . . . ) A o p i n i ã o g e r a l , n o E xé r c i t o , e r a d e q u e s e a b a nd o n a s s e s eme l h a n t e ma t e r i a l , c omo o b s o l e t o , a p e s a r d a s oma v u l t o s a q u e t í n h amo s d e s p e n d i d o n a s u a a q u i s i ç ã o . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

A i n s t r u ção do s o f i c i a i s , no en t an t o con t inuou mesmo sob e s s as cond i ções : “ . . . a l i , n aque l e ambi en t e d e d e s con fo r t o e n ece s s i d ades , i n i c i amos a i n s t r u ção do s p r ime i ros o f i c i a i s . ” O f i c i a i s e s t e s v indos d a s a rmas d a Cava l a r i a e d a In f an t a r i a , s egu indo o mode lo que o c ap i t ão J os é P es sôa ap r ender a no Ex é r c i t o f r ancês . O cap i t ão t eve a i d é i a d e d a r ao s s eu s comandados a s ens ação de que se rv i am numa t r opa de e l i t e do Exérc i t o , uma fo rma de man t e r e l evado o mo ra l d a s ua t r opa : ” É p r ec i so que a nova a rma s e cons t i t u a d e uma t r opa , que p e l o s eu aspec t o f í s i co , i n s t r u ção t á t i c a e t é cn i ca e v a l o r mo ra l s e j a con s ide r ada d e e l i t e , que a t odos c aus e admi r ação e imponha con f i ança . ” 20 Ado tou -s e um un i fo rme e spec i a l , d i f e r enc i ado , com uma bandana na p e rna e c apace t e e spec i a l d a s t r opa s b l i ndadas , s eme lhan t e ao u t i l i z ado pe l as t r opa s Fr ances a s . Os ca r ros ganha r am nomes de impo r t an t es b a t a lh as do Ex é rc i t o Bra s i l e i ro , como “Huma i t á ” , “Tuyu t i ” e “ I t o ro ró” . Buscava t ambém o cap i t ão o rgan iz a r b a i l e s p a r a os p r aças e s a rgen to s 21.

20 Cavalcanti de Albuquerque, José Pessoa. Os Tanks na Guerra Européia, Albuquerque e Neves, 1921, pg. 220. 21 No principio de seu livro, Hiram de Freitas Câmara dá um bom exemplo de como era o serviço dos praças na Companhia, ao contar o relato de um praça que ele por acaso encontrou em Recife. Atualmente é quase impossível termos fontes como essa.

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O mora l e r a con se rvado a bom n í ve l , mas mesmo com o e s t ado do s eu e s t abe l ec imen to , e r a d i f í c i l o s e rv i ço . No en t an to a s i t u ação mudou com a v i s i t a do Min i s t r o d a Gue r r a Pand i á Ca l óge r as à companh i a . Na mesma hor a em que v iu a s i t u ação , e l e p romet eu um novo qua r t e l pa r a os Ca r ros d e Ass a l to . De imed i a t o a s ob r as p a r a es s e qua r t e l começa r am .

Os manua i s , au s en t e s n a noss a l í ngua , h av i am s ido t r az i do s d a F r ança p e l o cap i t ão P e s sôa . Fo i n ece s s á r io a e l e e ou t ro s do s o f i c i a i s a t r adução s i s t emát i c a de l es , pa r a uso de t oda a companh i a , p a r a a no ss a l í ngua po r tugues a . E s t a mi s são acabou s endo bene f i c i ada p e l a chegada da Mis são F r ances a , cu jo che f e , Gene r a l Game l i n , d e r a apo io d a pa r t e d e s eu s o f i c i a i s p a r a a conc l us ão de s s e t r aba lho . Fa l t ava a inda uma demons t r a ção púb l i c a d a companh i a p a r a que s e ca l as s em a s voz es con t r a o s novos c a r ro s . Jo s é P es sôa a cabou po r con s egu i r i s t o du r an t e a v i s i t a do genera l f r ancês Mang in , onde , p a ra r e cebê- lo , f o i o rgan iz ada uma pa r ada mi l i t a r . S abedo r d e que o gene r a l Mang in ap r ec i ava os b l i ndados , J o sé P es sôa p ed i u que a companh i a t i v es s e p a r t e no des f i l e , no Campo dos Afonsos . P ed ido ace i t e , a companh i a s e p r epa rou a rduamen te p a r a a t a r e f a , s endo no d i a do de s f i l e ( 20 de ou tub ro d e 1921) a p r in c i p a l a t r a ção . O suce s so dos c a r ros no des f i l e ganhou a manche t e do s j o rna i s d a Cap i t a l Fede r a l , d esmis t i f i c ando mui t a s op i n i õe s con t rá r i a s ao “ t ank” e s ua u t i l i dade no ex é r c i t o Bra s i l e i ro . Após o s uce s so da p a r ada , o co r r eu o p r ime i ro ex er c í c io da Companh i a em con j un to com in f an t a r i a e av i ões . O exe r c í c i o a t r a iu v a r i a s au t o r i dades ao l o ca l , como o ex -p r es id en t e He rmes , o m in i s t ro d a guer ra Ca l óge r as e o comandan t e do Exé rc i t o na c ap i t a l , gene r a l J os é d a S i lv a P es sôa . Tendo o ex erc í c io a t i ng i do o ob j e t i vo e spe r ado , que e r a de spe r t a r o i n t e r e s s e d as au to r i d ades p e lo e l emen to mecan izado do Exé r c i t o , a Companh i a de Ca r ro s de As sa l t o pa s s a r a ao s t a tu s d e t r opa d e e l i t e f i n a lmen t e :

“Em ú l t ima a n á l i s e , a n o s s a a rma q u e t i n h a a j u d a d o a g a n h a r a p r ime i r a G u e r r a Mund i a l , e n t r e n ó s s e f i rmo u p a r a r e f o r ç a r a e s t r u t u r a e a me n t a l i d a d e d o E x é r c i t o . ” ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDOC -FGV) .

O qua r t e l novo acabou po r f i c a r p ron t o no An ive r s á r i o d a

Companh i a , a 3 de ou t ub ro d e 1922 22. Houve a i nda mai s um de s f i l e em que a Companh i a p a r t i c i pou , ab r indo o d es f i l e , em 7 de s e t embro de 1922 , e um ex e rc í c io d e ma rcha , ambos sob o comando do Cap i t ão Pes sôa . No p r i n c i p io d e 1923 Jos é Pes sôa s e r i a p romovido a ma jo r e p as s a r i a o comando da Companh i a ( ago ra d enominada Companh i a d e Ca r ros d e Comba t e ) ao s eu ad jun t o , em 19 de maio d e 1923 .

22 Aqui cabe um comentário: A Companhia de Carros de Assalto foi criada pelo decreto de lei número 15.235, de 31 de dezembro de 1921. Mas a Companhia por si já existia desde 3 de outubro de 1920. O capitão José Pessôa e seus comandados preferiram manter este dia como data da fundação da unidade.

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3 .4 -O Cap i tão e a mecan i zação :

Ness e p edaço p ropõe - s e obs e rva r a s v i s ões e comen t á r io s d e J os é P es sôa a r e spe i to d a mecan iz ação in i c i ada n a década 1920 , s endo a s ua un i dade o p r in c i p a l embl ema de s s e p roces so . Po r t e r comandado e s sa o rgan iz ação mi l i t a r , e l e a cabou s endo mu i t as v ez es c i t ado pe lo s mi l i t a r e s d a s ge r ações v indoura s como o po ss í v e l “pa t r ono da mecan iz ação” . A fo rma de ava l i a r s eu p ens amen to a r e spe i to d e s s e t ema é obs e rva r o que e l e e s c r eveu a r e spe i t o no s eu l i v ro Os “Tanks” na

guer ra Europé i a , pub l i c ado em 1921 ; a l ém do seu c ap i t u l o sob r e a mecan iz ação no Exé r c i t o , n a s ua Au tob iog r a f i a , o Diár io d e m inha

V ida , gua rdado no Cen t ro d e P esqu i s a e Documen t ação da Fundação Ge tú l io Varga s . F i c a c l a ra a v i s ão que t eve J o s é P es sôa com r e l a ção ao s avanço s t e cno lóg i cos p roporc ionados p e l a p r ime i r a Guer r a Mund i a l , que e l e c i t a em momentos em sua b iog r a f i a :

A c i ê n c i a , em t o d o s o s s e u s r amo s , a me c â n i c a d a g u e r r a e s p e c i a lme n t e , t e v e c omo t e r á , n a g u e r r a d o f u t u r o , um p a p e l p r e p o n d e r a n t e , e q u e a o mo t o r c a b e r á a p r ima z i a n a t e r r a e n o e s p a ç o , a t r a v é s d o c a r r o b l i n d a d o e d o a v i ã o . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV )

No caso dos c a r ros d e combat e , e l e e r a a inda ma i s en f á t i co :

. . . a p ó s v e r e s e n t i r o v a l o r d o s c a r r o s d e c omb a t e , a m i n h a f é n o f u t u r o d e s s e s e n g e nh o s d e g u e r r a e a c o n v i c ç ã o d e s u a e f i c i ê n c i a s e t o r no u i n a b a l á v e l . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c -FGV)

J o s é P es sôa s e apegou com pa ixão ( a t é t a lv ez ex ces s iv a ) à m i s s ão de comanda r uma un idade , a p r ime i r a no Bra s i l , b l i ndada . S eu l i v ro sob r e o a s sun t o f o i apenas mai s um f ru t o d es s e apego. Nes t a ob ra e l e t r a t a me lho r sua v i s ão s ob r e a mecan iz ação . Sob re a s i t u ação da i n f an t a r i a na mecan ização , e l e a c r ed i t ava que es t a con t i nua t endo sua mesma impo r t ânc i a : man t e r o t e r reno conqu i s t ado : “ . . . a a r t i l ha r i a e o “ t ank” conqu i s t am , a i n f an t a r i a o cupa . 23” Também cons ide r ava s e r desneces s á r i o b l i ndar t oda a i n fan t a r i a , c i t a ção que f a r i a d i v e r s as v ez e s . A função da i n f an t a r i a e r a do s eu pon to d e v i s t a , p r eponde r an t e nos t e a t ro s d e ope r ação . Quan to à a r t i l h a r i a , J os é Pe s sôa c i t a a s i d é i as do s F r ance s e s d e c r i a r um “canhão de a companhamen to” 24, uma a r t i l ha r i a s ob re l aga r t as , r e sponsáve l po r t i ro i nd i r e t o , s endo equ ipada com a rmamen to que d i s pa r as s e em ângu lo ob l i quo , como obuse i r os e mo r t e i ro s , de s t i n ado a d emol i r pon t os fo r t e s e cen t ros d e r e s i s t ênc i a i n imigos , e t ambém em coope r ação com a i n f an t a r i a . D i f e re do que t emos ho j e como a r t i l h a r i a au t op ropu l s ada po r s e r e s t a conceb ida como acompanhan t e do ca r ro d e b l i ndado , p a r a

23 Cavalcanti de Albuquerque, José Pessoa. Os Tanks na Guerra Européia, Albuquerque e Neves, 1921, pg. XVI. 24Cavalcanti de Albuquerque, José Pessoa. Os Tanks na Guerra Européia, Albuquerque e Neves, 1921, pg. 123.

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r áp i da p rog r es são , e n ão da i n f an t a r i a , d e l en t a p rog r e s são em campo . Quan to à o rgan iz ação das f o rmações , J o s é P es sôa a c r ed i t ava que a gue r r a h av i a d ado mot i vo s su f i c i en t es p a r a s e man t e r uma o rgan iz ação i ndependen te , como o “Tank Co rp s ” Br i t ân i co , s e rv indo em s epar ado da i n f an t a r i a , mesmo que a t u as s e com e l a em campo . J os é P es sôa a ce r t a em comen t a r a impo r t ânc i a que Ca r ro d e combat e e av i ão p as s a r i a a t e r no fu tu ro , embo ra e l e t enha es c r i t o que a s i d é i a s a r e spe i to de s s a combinação av i ão -ca r ro de combate no c ampo t á t i co t enham s i do po r e l e l i d a no s t r aba lho s d e J . F .C . Fu l l e r s ob r e o s “ t anks” n a Grande Gue r r a . Ass im como os a l emães , e l e v i u nos t r aba lho s de Fu l l e r e n a expe r i ênc i a d a Gue r r a que a ope r ação em con jun t o d e s s es do i s engenhos d a mecan iz ação e ra e s s enc i a l p a r a s e v encer um t e a t ro d e ope r ações , s e j a o av i ão aux i l i ando no r e conhec imen to e n a comun icação como no a t aque de bombarde i o t á t i co . Ma i s a i nda , J o s é P es sôa t ambém v i u o av i ão como ve i cu l o d e r eaba s t e c imen to p a r a o s t anques , função que s e r i a l a rgamen t e u t i l i z ada p e l os a l emães n a S egunda Guer r a Mund i a l 25. No mai s , J os é P es sôa pôde p e r ceber a impor t ânc i a de s e man t e r um a t aque b l i ndado ( apenas com t anques ) que fo s s e c apaz d e a t i ng i r p ro fundamen t e a s l i nhas i n imiga s , c aus ando con fu s ão e d e so rdem. Fu t u ramen t e e s s a s e r i a a t á t i c a ap l i c ada p e l a b l i t z k r i eg p a r a v encer na Europa a pa r t i r d e 1939 ; n ão que r endo d i ze r e l e pudess e an t ever a t á t i c a d a Bl i t zk r i eg 26Alemã . A r e spe i t o do f im que t eve a mecan iz ação após 1923 , J o s é P es sôa r e l a t a em sua au t ob iog r a f i a , em ca r t a e s c r i t a po r e l e em 28 de maio d e 1948 :

A p r o p ó s i t o d a mo t ome c a n i z a ç ã o n ã o me p a r e c e q u e a n o s s a s i g a um r o t e i r o c e r t o . I n f e l i zme n t e j á a v emo s ( a a rma b l i n d a d a ) c om o s me smo s d e f e i t o s e h á b i t o s d a s n o s s a s v e l h a s a rma s v i v e n d o d e s a p a r e l h a d a s e i n s u f i c i e n t e s . I l o g i c ame n t e c ome ç amo s p o r o n d e o s o u t r o s ( a s g r a nd e s p o t ê n c i a s ) , p o s s u i d o r e s d e l a r g a e x p e r i ê n c i a e g r a nd e s e x é r c i t o s , t e rm i n a r am : a D i v i s ã o B l i n d a d a . É um ó r g ã o i n a d e q ua d o a o s e x é r c i t o s p o b r e s , d e a q u i s i ç ã o c u s t o s a , d i f í c i l ma n u t e n ç ã o e c h e i a d e d i f i c u l d a d e s . ( . . . ) T o d a v i a , h á 2 8 a no s , q u a nd o c ome ç amo s n o s s a me c a n i z a ç ã o , o o b j e t i v o f o i , d e a c o r d o c om o s e n s i n ame n t o s d a p r ime i r a G r a nd e G u e r r a , um e n g e n h o d e a c omp a n h ame n t o d a i n f a n t a r i a , o q u a l p e l a p r o t e ç ã o , me n o r v i s i b i l i d a d e e d e s l o c ame n t o d e 8 km / h , s o b r e p u j a v a a v e l o c i d a d e d a I n f a n t a r i a . . . N a q u e l a o c a s i ã o , j á p r e v e nd o o p r o g r e s s o q u e t e r i a o s e n g e n h o s b l i n d a d o s , p e d imo s uma o r g a n i z a ç ã o c omp a t í v e l c om um b a t a l h ã o d e d i v i s ã o d e i n f a n t a r i a , e um c e n t r o d e e s t u d o s e t r e i n ame n t o p a r a f o rma ç ã o d e q u a d r o s d e e s p e c i a l i s t a s ; o ma i s s e r i a e s p e r a r p e l a e vo l u ç ã o d o ma t e r i a l ( o s c a r r o s d e c omb a t e ) . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDoc - FGV)

25 Cavalcanti de Albuquerque, José Pessoa. Os Tanks na Guerra Européia, Albuquerque e Neves, 1921, pg. 179. 26 E n ã o p o d e r i a c om o s mo d e l o s e x i s t e n t e s em 1 9 2 1 , ma s t a l v e z s im , s e e l e a i n d a e s t i v e s s e n a a rma b l i n d a d a em 1 9 3 4 , q u a n d o s e d e u o e x e r c í c i o d o B r i g a d e i r o P e r c y Hob a r t , d o Ro ya l T a n k R eg ime n t , s o b r e u s o d e i n f a n t a r i a mo t o r i z a d a , b l i n d a d o s e a v i õ e s p a r a s e f a z e r um a t a q u e em p r o f u n d i d a d e , i d é i a s d e B a s i l L i d d e l l H a r t .

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Ao t e rminar , J os é P es sôa p ede ao r e sponsáve l p e l a mecan iz ação do Exé r c i t o Bras i l e i r o um cu i dado :

D e v emo s t e r c u i d a d o s e s p e c i a i s c om a mo t ome c a n i z a ç ã o d e s t i n a d a a j o g a r , s e f o r d e s g r a ç a d ame n t e n e c e s s á r i o , um p a p e l p r e d om i n a n t e n o s n o s s o s t e a t r o s d e o p e r a ç ã o d o s u l e d o o e s t e . ( Cavalcanti de Albuquerque, CPDo c - FGV)

P a r a t e rmina r e s se c ap i t u lo , f i c a a obs e rvação de que J o sé P es sôa , como cap i t ão comandan t e d a Companh i a d e Ca r ros d e As sa l t o (pos t e r io rmen t e mudado pa r a Car ros d e Combate ) , pode s e r cons ide r ado como um so ldado que v iu s eu dever cumpr ido . S eu conhec imen to sob re o que comandar i a , bus cado com e smero ; a noção de conhece r mesmo a s p eças em m iúdos d e seu s c a r ros ; o t r a to com o s o f i c i a i s comandados , o cu idado com os p raças e o aqua r t e l amen to de s ua un idade ; a l u t a po r man t e r a o rdem i ndependen t e d a s i t u ação em que s e encon t r as s e s eu p e s soa l ( a s d i f i cu ldades que s eu p róp r i o Ex ér c i t o l h e caus ava , d ev i do ao de s caso , p r in c i p a lmen t e do pode r pub l i co ) ; t odas es s as qua l i d ade s d evem s e r l evadas em con t a p a r a ava l i a r s eu p e r íodo no comando de s t a un idade . F i c am par a a conc l us ão pon t os que p a s s a r am enquan to se co r r eu os r e l a to s d a p as s agem de J os é P es sôa p e l a mecan ização ; pon to s que fo r am mai s l evados em con t a n a concepção de s eu t r aba lho que du r an t e sua cons t r u ção .

4 -CONCLUSÃO:

Como d i s s e uma vez o p ro f es so r Exped i t o Ca r l os S t ephani Bas to s (P ro f es so r e P e squ i s ado r d e a s sun to s mi l i t a r es d a Un ive r s i d ade Feder a l d e J u i z d e Fo ra , numa conve rs a po r e -mai l com e s t e au t o r ) , o s m i l i t a r e s Bra s i l e i r os nunca en t ender am bem o pape l do c a r ro d e combat e . Apenas a t r avés da cons t r u ção de s t e t r aba lho sob re a un idade p ione i r a do s c a r ro s d e combat e no Bras i l , é que s e pôde p e r cebe r o s en t i do des s e comen t á r io . Mesmo o p róp r i o J os é P es sôa , j á d écadas d epo i s , f ez um comen t á r io a lu s i vo a i s s o . Não hav i a s en t ido quan to ao emprego do ca r ro d e combat e no Bra s i l , em 1920 . E r a r e a lmen t e um engenho de gue r ra c a ro , cus to so e e s t r anho a um Exé rc i t o a i nda mui to p r ecá r io , em mat é r i a de mat e r i a i s , e spaço f í s i co p r epar ado (poucos qua r t é i s e d epós i t o s ) , i ndús t r i a d e d e f e s a i n ex i s t en t e ; o comando do Exé rc i t o a inda e r a de l en t a pe r cepção das s ua s nece s s i d ades ; a i n s t r u ção do o f i c i a l e r a f r a ca , embo ra t i v es s e j á mu i t as r e fo rmas em andamen to a e s s e r e spe i t o . O ca r ro d e combat e no Bra s i l em 1920 e r a a l go anac rôn i co ao s eu Ex é rc i t o , e pode - s e d i z e r que aque l es que t i v e r am com e l e con t a t o , i n c lu indo s eu comandan te , s e t o rna r am anac rôn i cos . Embo ra ho j e n ão ha j a e s s a ana log i a , c a r ece - se a i nda encon t r a r o p ape l do c a r ro de comba te no Bras i l , n ão quan to ao s eu u so t á t i co , mas quan to ao s eu emprego , su a u t i l i d ade es t r a t ég i ca ,

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p r i n c i p a lmen t e em época em que s e vo l t am os o lhos do p e s soa l d a á r ea d e d e f e s a do pa í s em d i r e ção a um t e a t ro que lh e é imp róp r io : a Amazôn i a . E s t e t r aba lho de ixa a l guns pon to s que não puder am se r exp l o r ado s , d ev i do em pa r t e à f a l t a de t empo , e à d i s t anc i a que se d a r i a em r e l a ção ao t ema ca so qu i s e s s e ap ro funda r -me ne l e s . Um dos pon to s é em r e l a ção à h i s t ó r i a mi l i t a r b r as i l e i r a . J o sé Mur i l o d e Ca rva lho d i z que há c e r t o d i s t anc i amen to dos c i v i s quan to a e s tudo s m i l i t a r es , em espec i a l s e o a s sun to não t em r e l a ção d i r e t a a um t ema po l í t i co . E ss e ab i smo t em t i do pon t e s cons t r u í d as p e lo s do i s l ados , c iv i s e m i l i t a r es , com v i s t a s a f az e r a l i gação en t r e e s sa s dua s pa r t e s , t ão n ece s s á r i a s ao e s t udo e s t r a t ég i cos e d e f es a do p a í s (Ca rva l ho , 2005 , p a r t e I I I , c ap .2 ) . Ou t ro pon to que es t e e s tudo p rocu rou mos t r a r fo i em r e l a ção à compra d e equ i pamen to d e d e fe s a em pa í s e s t r ange i ro . I s t o é a l go que t em se bu s cado r eduz i r n a po l í t i c a d e d e f e s a a tu a l , po i s j á t i nha se t o rnado co s t ume em a l gumas á r eas d e noss a s Fo r ças Armadas . E s t e t r aba l ho ap r e sen t ou um r e l a t o s ob r e a aqu i s i ç ão de um mat e r i a l d e d e f e s a ; n ão en t rou em t e rmos de e conomia , mas mos t rou as d i f i cu ldades oco r r id a s à época , em r e l a ção à f é do vendedo r do p rodu t o (que bus cava um meio d e r eduz i r s eus ga s t os com a guer r a r e cém- f i nda ) como t ambém do comprado r ( cu s tou aos nos so s o f i c i a i s ve r a u t i l i d ade daque l e s c a r ro s , e mesmo a s s im , s ua u t i l i z ação fo i m ín ima ) . S e h i s t ó r i a é en s i na r ex emp los p as s ados p a r a melho r p e r cebe rmos o p r e s en t e e ma i s a inda ag i r me lho r no f u tu ro , o ex emplo dado pode s e r d e a lguma va l i a 27. Fa l t am a inda es t udo s - e i s t o f o i o que mai s p rob l emas cau sou – a r e spe i t o d e aqu i s i ç ão de mate r i a l po r p a r t e do Ex é r c i t o Bra s i l e i ro . E s tudos pub l i c ados , po rque mu i to s e a chou p r in c i p a lmen t e en t r e a s monogra f i a s d a Esco l a d e Comando e E s t ado -Ma io r do Ex é r c i t o (ECEME) . Fa l t a o pon t o d e v i s t a h i s t ó r i co n e s s e t ema , em e spec i a l no pe r íodo en t r e 1900 e 1945 .

A mis s ão Aché f o i uma ve rdade i r a t en t ação ao desv io do t ema de s t e t r aba l ho , v i s t o s e r t ão pouco o que a che i em r e l ação a e l a . E s t a mi s s ão m i l i t a r , d a qua l p a r t i c i p a r am a l guns o f i c i a i s que t e r i am i n f lu ênc i a no Ex é r c i t o no s anos s egu in t e s , c a r ece d e e s t udos t an to em r e l a ção ao s eu env i o , s uas f unções , su a pos i ção , que t a l v ez s e encon t r em em a rqu i vo s l o ca l i z ado s aqu i no Bras i l .

A inda mai s i n t e re s s an t e n a mi s s ão Aché é s abe r que a l gun s de s eus membros t omaram pa r t e n a l u t a no Exé r c i t o f r ancês na p r ime i r a Gue r r a Mund i a l , e d a qua l não há r e l a to s ma io r e s ex ce t o a l gumas r emin i s cênc i as . Uma bu sca a a rqu ivos n a F r ança em r e l a ção a e s t e t ema s e f a r i a f u t u r amen t e n eces s á r i a . Como hav ia e s c r i t o an t e s , i s t o s e d i s t anc i ava do meu t ema 28.

Um ú l t imo pon t o t r a t ado nes t e t r aba l ho f o i com re l ação a a l guns m i to s c r i ado s s ob r e J os é P e s sôa em r e l a ção a sua f unção

27 Temos hoje, por exemplo, o Projeto F-X, da Aeronáutica, que serve para a compra de um caça de ultima geração. 28 Além de José Pessôa, outros Oficiais Brasileiros estiveram a serviço da França, em combate. Não vi menção sobre eles, além de seus nomes e a organização militar a que foram destinados. Até onde sei, todos retornaram com vida.

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como c r i ado r da s un i dades b l i ndadas no Bra s i l . E l e r e a lmen t e p rovou en t ende r do a s sun to , s abe r d a n ece s s i d ade de s e mode rn i z ar a v i s ão do Ex é r c i t o d e sua época , mas n ão t i nha como – mai s po r s ua p a t en t e que po r s ua von t ade – imbu i r no e sp í r i t o do s s eus companhe i ros de a rma es t e gos t o que e l e t eve s ob r e o s c a r ros d e combat e . E l e i n i c iou b em um t r aba l ho – a mecan iz ação – que f o i d e ix ada de l ado a s s im que e l e pa r t i u de s eu comando 29.

P ecou e s t e t r aba lho em r e l a ção a d e s c r i ç ão de a l guns d e t a l h es t é cn i co s em r e l ação aos t anques ; t ambém quan t o ao de s en ro l a r h i s t ó r i co d a p r ime i r a Gue r r a Mund i a l , e em r e l a ção a r e l a to s o co r r idos du r an t e o p e r íodo r e l a t ado da Repub l i c a Ve lha . Admi to i s t o , mas p rocu r e i c i t a r o s u f i c i en t e pa r a n ão de ix a r o s l e i t o r es d e f o r a do con t ex to h i s t ó r i co do t ema , e apenas me demore i ma i s quando o as sun t o t e r i a ma io r impo r t ânc i a po s t e r io r . Ev i t e i t ambém expo r r e l a t os sob re a v id a d e J os é P es sôa que não t i v es sem r e l a ção com o t ema ; i s t o f o i em pa r t e d ev ido ao d i s t anc i amen to que s e r i a d ado quan t o ao t ema , e d ev ido a mui t a s cons ide r ações f e i t a s sob r e e l e t e r em o r i gem na Case rna , s endo de c e r t a dúv i da quan to à s ua v e r ac i dade .

Agradec imen tos aos que a t é aqu i v i e r am .

29 Posteriormente, faria melhor: Coronel teria sob seu comando a Escola de Realengo, reformando seu ensino completamente, principalmente no tocante à tradição. José Pessoa mais tarde talvez percebesse que a grande falha de seu tempo foi a instrução militar produzir poucos resultados por ser uma instrução fraca. Suas reformas quanto ao ensino militar profissional (do oficial), e a idealização da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) seriam a grande obra de sua vida.